Mobilidade nas metrópoles: problemas e perspectivas

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MOBILIDADE NAS METRÓPOLES: problemas e perspectivas


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Encontros Democráticos são publicações do Espaço Democrático, a fundação para estudos e formação política do PSD

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A MOBILIDADE NAS METRÓPOLES: esse drama tem solução?

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uestão essencial da qualidade de vida dos moradores de qualquer cidade, a mobilidade urbana deve ter prioridade nos planos de governo de todo candidato a gestor público, mas o sucesso nesse campo exige liderança, visão de futuro, planejamento e muita integração entre as diversas modalidades de transporte. Foi o que afirmaram no Encontro Democrático realizado em julho de 2016 dois especialistas e dois vereadores de São Paulo, mostrando os principais desafios para a elaboração de um projeto que realmente atenda às necessidades da população nesse campo. O primeiro a tratar do tema “Mobilidade nas metrópoles: problemas e perspectivas” foi Marcelo Branco, engenheiro e ex-secretário municipal de Transportes de São Paulo, que já foi também presidente da Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo e da SPTrans – São Paulo Transportes. Ele defendeu a importância de uma visão urbanística de futuro no trato com o problema e lembrou que a atenção ao pedestre é fundamental em qualquer plano de mobilidade. Sérgio Avelleda, ex-presidente do Metrô de São Paulo e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, traçou com números um impressionante retrato dos milhões de deslocamentos realizados diariamente pelos paulistanos e apontou como a metrópole poderia trabalhar para dar mais racionalidade a esses fluxos. O vereador paulistano Andrea Matarazzo lembrou que parcela importante desses deslocamentos é feita a pé e destacou a importância de a Prefeitura investir na qualidade dos 35 mil quilômetros de calçadas existentes na cidade, deixando de lado a ideia de que calçadas são de responsabilidade dos proprietários de imóveis. E o vereador José Police Neto defendeu medidas como o estímulo ao compartilhamento de veículos particulares nos deslocamentos urbanos. Para ele, o poder público precisa induzir as pessoas a optarem pelo deslocamento compartilhado, pois não é possível que as mais de 14 milhões de viagens feitas diariamente em carros na cidade sejam realizadas com apenas 1,3 pessoas por veículo, como ocorre hoje, quando poderiam transportar até quatro pessoas. Este Caderno Democrático traz a íntegra das intervenções desses experientes gestores públicos. Boa leitura. 3


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SÉRGIO RONDINO: Boa noite a todos. Quero agradecer muito a presença de vocês neste Encontro Democrático. O nosso tema de hoje é a mobilidade urbana, ou a imobilidade, como parece ser a realidade dos dias atuais nas metrópoles. Quero saudar a presença da Alda Marco Antonio, coordenadora nacional do PSD Mulher, e também de todas as mulheres que fazem parte desse movimento tão importante; e dos pré-candidatos e todos os que vão disputar essa próxima eleição pelo PSD. Uma parada difícil. Nós esperamos que o tema de hoje seja útil a todos. Nós temos aqui a presença hoje de dois especialistas da mais alta categoria no assunto. O primeiro deles é Sérgio Avelleda, ex-presidente do Metrô, advogado com atuação na área do Direito Público, tem larga experiência na estruturação de concessões e parcerias público-privadas, foi presidente da CPTM, que é a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos de São Paulo, e do Metrô de São Paulo e do Rio de Janeiro. Vocês estão vendo que o currículo é vasto. 4

Outro belíssimo currículo é o do Marcelo Branco, que foi secretário municipal de Transportes de São Paulo, na gestão de Gilberto Kassab. Ele é administrador de empresas, mestre em engenharia pela Poli e também foi presidente da CET, Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo, e da SPTrans. Portanto, está mais do que habilitado para tratar dessa questão tão preocupante, tão grave, das metrópoles brasileiras. Vamos começar com a palestra do Marcelo e na sequência ouviremos o Sérgio Avelleda.

MARCELO BRANCO: Muito obrigado, Rondino! Pedi para fazer a primeira etapa desta apresentação, uma introdução, contando com o Sérgio Avelleda para dar um aprofundamento maior nas questões de transporte. Quero dar uma primeira visão do que imagino que sejam ideias que nós devemos contemplar antes de fazer um plano de governo. Estamos todos aqui imaginando como é que nós vamos contribuir, como


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É preciso que o líder enxergue como ele quer a cidade lá para a frente e desenhe os projetos que façam com que a gente chegue lá.

vereadores, como prefeitos, como munícipes ou em qualquer tipo de participação política, numa próxima gestão ou num próximo plano de governo. Então, antes de entrar nos assuntos voltados à mobilidade ou transporte, a gente deve observar alguns conceitos que devem nortear um plano de transporte. A primeira coisa, quando você se propõe a fazer a gestão de uma cidade ou de um governo qualquer, estadual, federal ou municipal, é que você precisa de um líder, uma liderança. A primeira coisa que se imagina, quando alguém se candidata a um cargo eletivo – e não é candidato da situação - é que ele tenha algumas ideias que mudem o que tem acontecido até aquele momento. Mas por que ele seria melhor do que aqueles que já estão no governo? A primeira premissa é que o futuro não precisa ser uma repetição do passado. Isso parece uma coisa simples de se imaginar, mas é fundamental quando você vai gerir uma cidade ou uma instituição. Quer

dizer, acreditar que aquele futuro que você enxerga, ou que você desejaria para a sua instituição ou cidade, pode ser atingido. Não se deve pensar... “Ah, isso é muito difícil”. Vou falar aqui um pouquinho para os amigos do Gil. Dizem que é muito difícil disciplinar o uso da motocicleta em São Paulo porque já é assim há muito tempo, já morre muita gente. E como é que a gente faz isso? Proíbe a moto de circular? De forma alguma. Você tem que ter uma projeção para a frente que seja diferente do passado. É por isso que se troca a gestão de uma determinada instituição. A grande pergunta a ser feita é: O que é que não dá para fazer hoje mas, se fosse feito, mudaria a qualidade de vida na nossa cidade? Um grande líder é capaz de enxergar claramente o futuro e intervir nele com aquela visão de futuro que ele deseja para sua instituição. É preciso que o líder enxergue como ele quer a cidade lá para a frente e desenhe os projetos que façam com que a gente chegue lá. 5


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Eu estou falando isso porque um dos grandes problemas de qualquer gestão é a atuação empírica. Por mais boa vontade que você tenha em montar determinados projetos, muitas vezes as pessoas acabam não chegando a lugar algum porque um começa a fazer um projeto pra cá, outro pra lá, um não conversa com o outro, não há unidade de pensamento, nem visão de futuro. Quando a gente assume o comando de uma organização tão complicada como uma Secretaria de Transportes ou o Metrô, a CPTM, como o Sérgio já fez, logo vai receber pessoas que trabalham lá há 20 anos e vêm te dizer: “Olha, isso que você quer não dá pra fazer, aquilo não dá pra fazer porque é assim, porque é assado..” Por que? “Por causa disso e daquilo...” e começam a apresentar todos os problemas ocorridos durante os últimos 15 ou 20 anos. Sobre isso, acho extremamente importante uma frase de Joel Barker, um grande planejador estratégico americano: “Você tem que se livrar de todos os seus paradigmas. Quais são os problemas do passado? Isso eu não quero saber. Quero saber qual é a minha visão de futuro, aonde eu quero chegar”. A partir daí você vai ver que aquele futuro tão desejado é possível e de trás para a frente você começa a ver que os problemas não são intransponíveis. Mas aí você tem uma linha, uma reta, e um plano de governo bastante objetivo e com todos os programas e projetos para chegar onde você deseja. Bom, eu me adiantei um pouquinho na fala. Obrigatoriamente nós temos que partir de uma visão de futuro, isso é extremamente importante, na minha opinião. Um segundo ponto, do qual se fala muito hoje, é que o Brasil está crescendo a taxas muito pequenas nos últimos cinco ou dez anos. Mas será que um bom crescimento econômico é suficiente para o desenvolvimento de uma ci-

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dade? Nós chegaremos ao país ideal se o crescimento econômico for grande? Eu acho que é evidente que não. Se você não tiver a tal da visão de futuro, se não tiver bons projetos, bons programas, o crescimento por si da economia pode ser até prejudicial a um determinado projeto ou a um determinado assunto, como é a mobilidade. É necessária a atuação do Estado como indutor ou como direcionador. Mas, de novo, sem perder a visão de futuro. Vou dar alguns exemplos, para ficar um pouco mais simples entender essa colocação. Em dado momento, o Governo Federal resolveu baixar o IPI do automóvel, pensando no crescimento econômico, na movimentação da economia com a venda de mais carros. Resolveu diminuir o preço dos combustíveis para as pessoas circularem mais. E resolveu terminar com a inspeção e manutenção, permitindo a circulação de carros mais velhos. É evidente que nenhum desses três itens contribuiu para a mobilidade em São Paulo. Ou seja, são ações pontuais voltadas para uma movimentação econômica, mas que em nada contribuíram para um projeto maior, ou para uma visão de futuro de uma cidade melhor para se morar e com uma mobilidade muito melhor ou muito mais ágil. Então, é preciso que as pessoas tenham visão do futuro para fazer essa construção dos projetos. Não dá pra resolver o problema no dia a dia, conforme ele se apresenta. Tem que ser planejado. A propósito de visão de futuro, quero citar aqui dois exemplos de cidades com projetos de urbanismo bastante distintos. Não se trata de dizer que uma é boa, outra é ruim, são visões urbanísticas completamente distintas. Uma é Barcelona, na Espanha. É uma cidade compacta, onde todos os modos de transporte são interligados, você tem uma extrema motivação para não usar o carro, você nem tem onde parar, você vai pagar 30, 40 euros por dia de diária num estacionamento. E você tem um sistema de transporte


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todo interligado, as pessoas circulam em Barcelona a pé, de bicicleta, isso interligado ao metrô, aos trens de subúrbio. Enfim, o que você não consegue inserir nesse contexto é o carro. O carro é o estranho no ninho numa cidade como Barcelona, uma cidade feita de uma forma compacta, ou seja, onde todos os bairros e todas os quarteirões são de uso misto, então você tem edifícios de escritório, edifícios de moradia e comércio, quando não no mesmo quarteirão, no mesmo edifício. Tem as três modalidades. Ou seja, uma cidade compacta e projetada para você usar os transportes públicos e andar a pé. A cidade de Orlando, nos Estados Unidos, é uma cidade extremamente espalhada, uma rede para veículos extremamente competente, tem muita estrada, muita rua, mas ela é voltada para você andar de carro. Para ir de um banco a uma lanchonete vizinha você tem de andar 600 metros, porque os terrenos são

gigantes, as construções são bem afastadas da rua, então para você chegar na rua já anda 200 metros, vai andar mais 300 para entrar no outro... e todos os lugares têm estacionamento. Ou seja, foi um modelo de visão de futuro completamente diferente de Barcelona. Um se projetou para fazer você andar de transporte público e a pé. O outro quis se preparar para deixar que todos andassem de carro. Bom, tendo essas duas visões em mente, dois modelos de cidade, fica evidente que urbanismo é fundamental para induzir o uso dos sistemas. No caso de Barcelona, dos sistemas coletivos; no caso de Orlando, dos sistemas individuais. Até aqui, não estamos tratando da competência ou eficiência de cada um dos modais, nem dizendo que Barcelona é melhor que Orlando. Estou dizendo que o desenho urbanístico da cidade configurou um determinado modal de transporte, um coletivo, outro individual.

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Aí nós entramos um pouquinho mais no particular, que são as cidades espalhadas versus as compactas. Qual a diferença urbanística entre as duas cidades? Uma é toda espalhada, com um viário bastante competente, a outra é compacta e feita para você circular com as formas coletivas. Uso múltiplo versus condomínios residenciais. Quando você está nos Estados Unidos, em uma casa daqueles grandes bolsões de moradia, precisa sair de carro para ir até uma padaria. Ou seja, a configuração urbanística da cidade é feita para você usar o transporte individual. Na cidade de uso múltiplo, como é Barcelona – estou falando Barcelona porque acho que é a mais icônica desse aspecto – você não anda um quarteirão sem passar por um comércio, por um escritório e por uma residência. Aqui nós começamos a falar de mobilidade. A escolha é a cidade dos automóveis ou a cidade das pessoas? Uma é feita para mobilidade humana, outra é feita para a mobilidade do automóvel. Logicamente, levando as pessoas, mas o conceito é completamente distinto. Falando mais particularmente do modelo de transporte coletivo, qual é o ponto fundamental quando você quer ter uma cidade que dê prioridade ao transporte público coletivo? É a intermodalidade. Você não conseguirá atender com transporte público uma cidade inteira ou todas as origens e todos os destinos se não prever intermodalidade, desde quando a pessoa sai da porta de casa até quando entra na porta do seu destino. Então, por exemplo, a pessoa vai andar um trecho a pé, um trecho de ônibus, outro de metrô, outro de ônibus e mais um a pé. Mas a intermodalidade é a soma desses diversos trechos percorridos. E aí, se existe intermodalidade, é preciso obrigatoriamente cuidar do pedestre. É impossível pensar

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em qualquer tipo de modalidade de transporte público sem prever que haja um percurso feito a pé. Senão teria que haver uma estação de metrô na porta de cada prédio de apartamento e uma estação de metrô na porta de cada escritório, por exemplo, no centro da cidade. Ou seja, é absolutamente impossível imaginar que não haja o percurso a pé nessa ligação de origem e destino. Qualquer sistema intermodal pressupõe deslocamento a pé. Em Paris, de qualquer ponto que você saia, em 500 metros você tem uma estação de metrô, na área mais central, evidentemente. É impossível imaginar um sistema de BRT, metroviário, cicloviário, sem a estrutura complementar para pedestre. Portanto, é fundamental cuidar de todo o contexto urbano. Não adianta fazer estações do metrô e ignorar o que ocorre da porta da estação pra fora, porque ninguém vai usar o metrô se a intermodalidade não estiver prevista. Da mesma forma que não existe uma prefeitura que possa fazer o seu planejamento sem contemplar as estações do metrô. Ou o monotrilho, ou seja lá o que for. Esse conceito urbanístico é fundamental para escolher um modelo de cidade, um modelo de utilização de transporte, individual ou coletivo. A calçada, portanto, também é viário. E aí eu defendo que o entorno das estações de metrô sejam consideradas áreas estratégicas para pedestres. Isso me parece óbvio. É fundamental que em pelo menos 500 metros de raio dessas estações as calçadas sejam absolutamente convidativas para as pessoas andarem a pé, para estimular o uso do metrô. Então eu deixo uma ideia aqui. Recapear ruas e não reformar calçadas estimula deixar o carro em casa? De forma nenhuma. Se você tiver uma estação de metrô a 500, 600 metros da sua casa, e até lá


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você não tiver um metro de calçada, tiver que passar por um lugar cheio de buracos, com falta de segurança, falta de iluminação, você vai pegar o seu carro e vai para o destino final, não anda os 500 metros para pegar o metrô ali adiante. O fundamental é imaginar que as pessoas são clientes. Por que é importante essa frase? Eu vou mostrar algumas fotografias em seguida e vocês vão entender por que os equipamentos são secundários em relação aos pedestres, por mais importantes que sejam. Eu usei a palavra equipamento considerando qualquer equipamento público ou qualquer equipamento que esteja no viário ou na calçada pública numa cidade. Eu vou mostrar aqui um equipamento que defendo muito, mas não quando ele atrapalha o pedestre, porque o viário é para o pedestre e não para os equipamentos. Esta é a fotografia.

Então é impossível você imaginar que alguém vai andar por um local assim para ir até uma estação de metrô. Se ela tiver um carro, vai preferir usar. A árvore é extremamente importante pra São Paulo? Sim, só que as pessoas são mais importantes do que as árvores. E eu peguei a árvore por ser um ícone de proteção de todos nós.

Agora vejam esta...

É possível imaginar algo assim? Não é uma montagem, é uma fotografia de uma rua em São Paulo. Não precisa mais nada para explicar o que significa dar prioridade para as pessoas em vez... aqui não é nem de equipamentos, é de qualquer coisa. Acho que não tem muito o que dizer além disso. Mas é evidente que você não consegue ter um sistema de transporte eficiente, prevendo intermodalidades, se tratar a cidade desse jeito. E aqui pode ter metrô, pode ter o que for, que as pessoas não vão andar. Me parece absolutamente fácil de entender, evidente, mas poucas pessoas enxergam a cidade como eu acho que nós devemos enxergar antes de fazer um plano de governo, vendo o que incentiva a intermodalidade, e o que desestimula. Então, esta é a primeira parte do que eu queria dizer: é preciso enxergar que o projeto urbanístico é fundamental num projeto de transporte. A segunda parte é a seguinte: como transformar ou como enxergar a cidade de São Paulo como uma cidade compacta? Eu disse no começo da explanação que Barcelona é uma cidade mais compacta e onde todos as origens e destinos estão interligados, porque é uma cidade de uso misto. Bom, como é que a gente poderia en-

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O que é uma cidade de 30 minutos? É um conceito que eu li e que achei extremamente interessante. Esse era o tamanho da cidade na época medieval, quando as pessoas só podiam andar a pé ou de carroça. Não se gastava mais do que 30 minutos para atravessar a cidade de um lado a outro, e esse foi um conceito utilizado na origem dos bondes.

carar com visão de futuro uma cidade como São Paulo, que é extremamente espalhada? Onde uma pessoa da Zona Leste percorre enormes distâncias para ir ao centro da cidade, ou para a Zona Sul? Nós temos que transformar a cidade de São Paulo com uma visão de multimodalidade em setores regionalizados. Regionalizar a cidade, transformála numa cidade coletiva. A racionalidade do sistema, os usos múltiplos, levam à sustentabilidade. O que é uma cidade de 30 minutos? É um conceito que eu li e que achei extremamente interessante. Li há muitos anos que esse era o tamanho da cidade na época medieval, quando as pessoas só podiam andar a pé ou de carroça. Não se gastava mais do que 30 minutos para atravessar a cidade de um lado a outro, e esse foi um conceito utilizado na origem dos bondes. Os bondes também previam uma cidade de 30 minutos. Com o tempo foram criando outras cidades no entorno das grandes cidades e, pela mobilidade proporcionada pelos veículos, foram ampliando esse grande eixo, criando uma rede que hoje é absolutamente insustentável. Então a ideia aqui é que haja uma sustentabili-

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dade no sistema de transporte, onde você enxergue essa cidade de 30 minutos. Não é de forma alguma desestimular ou proibir os trajetos de quem quer vir dos bairros para o centro da cidade ou vice-versa. É prover esses bairros de todos os benefícios que outras regiões têm. Como é a cidade de Barcelona. Se você tem condomínios fechados, são cinquenta quarteirões só residenciais, e você tem a 3, 4, 5, 10 quilômetros só os escritórios, você naturalmente vai ter uma cidade cara, uma cidade difícil, não vai conseguir fazer uma cidade de 30 minutos. Mas se você prever a multiutilização dos quarteirões, dos bairros, aí você consegue desenhar uma cidade que, ao longo do tempo, com uma visão de futuro, se transforme num aglomerado de cidades de 30 minutos. Ou seja, você tem que prever que as pessoas consigam resolver a sua vida a no máximo 30 minutos do ponto de origem ou de sua residência. Essa é a ideia da cidade de 30 minutos. Jamais uma ideia de segregação, mas uma ideia de oferecer a todas as pessoas da cidade todos os serviços que ela precisa lazer, estudo, hospital, comércio... tudo a 30 minutos da origem ou da sua moradia.


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Escolhido esse modelo mais coletivo, que eu considero muito mais lógico para São Paulo, modelo da intermodalidade, mais compacto, o Estado tem que ser indutor. Não adianta achar que o mercado se resolve. Isso é uma frase que se usa em muitas coisas, mas no serviço público infelizmente ela é completamente equivocada. O Estado existe exatamente porque o mercado não resolve tudo. Senão você não precisaria do Estado. Então existe a necessidade do Estado ser indutor dessas políticas, ou seja, levar os munícipes àquela visão de futuro, e estabelecer políticas estratégicas que estimulem, induzam a utilização e aumentem a eficiência do sistema escolhido. Orientem os eixos de desenvolvimento dos transportes e da economia. É importante que o Estado, na minha visão, oriente esses eixos de desenvolvimento. E é com redução de imposto, de ISS, ou de ICMS, enfim, tem uma série de formas de você induzir crescimento. Mas é extremamente importante o Estado que direciona a cidade para uma visão de futuro maior. Atendam às necessidades sociais coletivas, valorizem as soluções mais econômicas, com menor consumo energético e menor emissão de poluentes. De novo vou dar aqui um exemplo, falando agora de Brasil. O Brasil fez o que pôde para desestimular o projeto do Pró-Álcool. Eu acho que é uma das maiores temeridades que tivemos nos últimos 30 anos. Nós tivemos um grande programa de utilização de combustível não fóssil e o Brasil deixou o mercado resolver essa questão. Hoje nós temos a maior produção de veículos flex do mundo, que podem utilizar álcool, e nenhuma indução para que se utilize esse tipo de combustíveis. Imaginem se lá naquele começo a gente tivesse dito “olha, a redução de IPI vai existir para estimular a indústria, mas só vai ser para veículo a álcool”. Era uma forma de induzir.

Você tem muitas formas de induzir e acho que o Brasil perde grandes oportunidades de fazer essa indução. Outro ponto que eu acho extremamente importante é a informação à população. O sistema de informações é algo relegado ao segundo plano em muitas gestões administrativas públicas. É fundamental que as pessoas confiem nos projetos do município. É preciso que todos caminhem numa direção só, naquela visão de futuro de que a gente falava. E para isso é preciso primeiro explicar cada um dos projetos e dizer onde queremos chegar. Não adianta soltar os projetos, começar a soltar licitações e ninguém entender nada do que está sendo feito.... Isso gera questionamentos de quem perdeu algum privilégio e não consegue enxergar quais são os ganhos coletivos que aquele projeto vai produzir. É fundamental ter essa transparência. O sucesso de qualquer projeto de mudança de comportamento inclui esse convencimento das pessoas. Não é pela força que você convence os munícipes, é pelo convencimento, mostrando aquela visão de futuro e qual o benefício que todos vão colher se cada um abrir mão de um pouquinho do seu privilégio. Importante, também, é um balanço socioambiental como instrumento principal. Serviço público, por definição, não dá prejuízo. Se alguém for contra essa frase que eu usei e quiser conversar um pouquinho... eu direi que, se um serviço público, em tese, der prejuízo, ele não é serviço público. Por exemplo, se um governante põe dinheiro num determinado projeto de habitação popular, quem estará levando uma casa com desconto? Alguma pessoa individual. Então isso me deu prejuízo porque eu paguei

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impostos, puseram meu dinheiro naquela casa que o cara comprou pela metade do preço... e eu não levei nada. Errado. Tem que mostrar que há uma conta diferente por trás disso. Pessoas morando em favelas no município reduzem a produtividade da coletividade como um todo. Portanto, é preciso provar que, quando você põe dinheiro na mão daquele indivíduo, você está elevando a qualidade de vida de todos, portanto não deu prejuízo. E esses números são absolutamente comprováveis, não é um número chutado, não pode ser um número chutado. É absolutamente fundamental que a sociedade saiba quais são esses números. Dou um outro exemplo de balanço social: metrô. Se você pegar o balanço anual do metrô, provavelmente na operação ele dá algum prejuízo anual. Não sei de quantos milhões... 10, 20, 30, não sei... mas ele pode dar algum prejuízo na operação. Se você não demonstra que o fato de existir metrô em São Paulo gera alguns bilhões de benefícios para a sociedade, você deveria fechar o metrô, porque se ele dá 30 milhões de prejuízo por ano, vamos fechar e ter 30 milhões de economia. E todo mundo sabe que não é verdade, se você fechar o metrô você vai ter 10 bilhões de prejuízo em vez de ver 30 milhões de economia. Isso se chama balanço social. Você tem que demonstrar que aquele serviço público que está utilizando dinheiro de todos justamente traz um benefício que é muito maior que o investimento que o Estado fez ali. Finalmente, o que é fundamental? Visão de futuro, a gente saber onde quer chegar, qual a cidade que nós queremos lá adiante, quais são os projetos de transporte que nós queremos para chegar naquela visão de futuro. Cuidado

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urbanístico adequado, pedestre é fundamental. Ir além dos equipamentos para intermodalidade. A integração é fundamental e o pedestre passa a ser fundamental. Informação abundante, confiável, em tempo real. E o balanço sócio-ambiental permanente. Essas são ideias e sugestões para todos nós levarmos em consideração quando formos fazer um plano de governo. Muito obrigado a todos vocês!

RONDINO: Obrigado Marcelo. Agora é a vez do Sérgio Avelleda.

SÉRGIO AVELLEDA: Boa noite a todos! Quero agradecer imensamente o convite que me foi feito pelo Espaço Democrático, por esta fundação que vem se empenhando na difusão de ideias e políticas públicas. São dezenas de encontros como este, reunindo pessoas preocupadas em discutir temas importantes para a nossa cidade, para o país, e isto é fundamental. Eu fico muito honrado de ser convidado para tomar parte de eventos desta natureza.


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Estamos na região de uma macrometrópole no Estado de São Paulo, com 173 municípios, 32 milhões de habitantes, 75% do Estado de São Paulo, 16% do número de habitantes do Brasil, e 83% do PIB estadual e 1 terço quase do PIB brasileiro. É onde nós vivemos ...

Vou fazer aqui um raio X do tamanho do problema da mobilidade. E apesar de que o foco de todos que estão aqui nesta noite talvez seja uma eleição municipal, já que nós estamos às vésperas deste evento e temos aqui muitos pré-candidatos, pré-candidatas, militantes interessados em se aprofundar para enfrentar o embate político que virá, nós não podemos ignorar um dado da realidade: nós não vivemos mais no município. Vivemos na região metropolitana de São Paulo e eu desafio aqui alguém a me dar com precisão a divisa entre São Paulo e Guarulhos, ou São Paulo e São Caetano do Sul. Onde está esse marco divisor? Ele já não existe mais e, do ponto de vista de vários itens de planejamento urbano, isto é grave. Mas se há um setor em que isto é bastante intenso, é no campo da mobilidade urbana. Estamos na região de uma macrometrópole no Estado de São Paulo, com 173 municípios, 32 milhões de habitantes, 75% do Estado de São Paulo, 16% do número de habitantes do Brasil, e 83% do PIB estadual e 1 terço quase do PIB brasileiro. É onde nós vivemos, numa região absolutamente concentrada do ponto de vista territorial, densamente ocupada e com uma série de problemas e contradições que precisam ser enfrentados.

Nesta macrometrópole fica a região metropolitana de São Paulo. Temos 8 mil quilômetros quadrados, 20 milhões de habitantes e 39 municípios - e aqui a gente começa a enfrentar a essência do problema de transporte. Quando eu era presidente do Metrô e da CPTM era demandado o dia inteiro, o Marcelo sabe bem disso, sobre superlotação e incapacidade do sistema de transporte atender à demanda, e incapacidade de ampliar o sistema de transporte de forma a atender a demanda. Normalmente as pessoas faziam essa pergunta como se a raiz do problema fosse o sistema de transporte. Na verdade, a raiz do problema, a questão essencial, está nos mapas de densidade de população e de oferta de empregos na cidade de São Paulo. Há mais residências, por exemplo, nas regiões de Guaianazes e São Miguel, na Zona Leste, e Grajaú, na Zona Sul, densamente povoadas. É onde as pessoas vivem.

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Mas onde estão os empregos na região metropolitana de São Paulo? Observem neste mapa o nível de concentração de empregos nesta pequena região. Percebam a quase ausência de oferta de empregos nas regiões ao redor do Centro, e mesmo já mais próximas ao Centro, mas também com índice muito baixo de oferta de empregos.

Isto faz com que, no dia a dia, a gente tenha um movimento muito intenso de busca de mobilidade, porque, como bem disse o Marcelo, nós não vivemos numa cidade compacta, vivemos numa cidade absolutamente espalhada e que, por erros do passado, por circunstâncias do passado, circunstâncias econômicas, urbanísticas, sociais, cresceu de uma maneira completamente desordenada. E as pessoas foram sendo empurradas para viver cada vez mais longe, e os empregos cada vez mais concentrados em uma única região. Eu lembro quando estava na CPTM, fazendo um esforço danado para modernizar a linha 8. Compramos 36 trens, reformamos estação, trocamos sistema elétrico, compramos um sistema de sinalização para aumentar a capacidade da linha, que era superlotada, com trens muito antigos, não confiáveis. Um domingo, eu em casa lendo jornal, abro o caderno de classificados e vejo uma série de lançamentos imobiliários em

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Osasco. Uma série de lançamentos! Uma quantidade imensa de apartamentos sendo lançados em Osasco. Já devem estar todos prontos, isso foi em 2009, 2010. Eu olhei para aquilo e pensei: “Estamos enxugando gelo”. Nós vamos aumentar a capacidade da linha, ninguém vai fazer um planejamento econômico urbanístico adequado, vão incentivar a moradia ao redor da linha, mas não vão levar o emprego para o redor da linha. Não vão levar o desenvolvimento econômico e social, os equipamentos públicos, equipamentos de saúde, de lazer, de educação necessários para fazer com que as pessoas não precisem gastar três, quatro horas por dia, cinco horas por dia, às vezes até seis horas por dia nos seus deslocamentos. Então a gente tem que olhar - e o Marcelo foi muito feliz na sua fala sobre isso – para a questão do planejamento urbanístico ao lado ou até antes da gestão do sistema de transporte, do planejamento de transporte. Eu costumo dar outro exemplo que me chama muito a atenção. Todos aqui conhecem a avenida Paulista e conhecem o Conjunto Nacional. Provavelmente um dos metros quadrados mais caros do Brasil e quiçá do mundo. Dentro do Conjunto Nacional tem uma empresa de telemarketing. E deve ter gente ali trabalhando em todos os turnos, 24 horas por dia, 7 dias por semana. Deve gerar ali no mínimo 10 mil empregos. Eu tenho certeza de que quase todos aqueles trabalhadores moram a mais de cinco ou dez quilômetros aquele lugar. Compreendo que uma loja de grife queira estar na avenida Paulista, porque ela quer vender lá, mas não compreendo que uma empresa de telemarketing, que é um back office, que poderia estar em qualquer lugar do mundo, queira estar pagando o aluguel e o IPTU que se paga na avenida Paulista, e gerando 10 mil deslocamentos lá da Zona Leste, da Zona Sul, para a avenida Paulista. E aí vem o papel do Estado


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...não compreendo que uma empresa de telemarketing, que é um back office, que poderia estar em qualquer lugar do mundo, queira estar pagando o aluguel e o IPTU que se paga na avenida Paulista, e gerando 10 mil deslocamentos lá da Zona Leste, da Zona Sul, para a avenida Paulista.

do qual o Marcelo fala. O Estado precisa induzir. “Ah, mas não há estrutura de internet em Itaquera para fazer com que essa empresa tenha incentivo para ir para lá”. A Prefeitura tem que chamar os fornecedores de serviço de internet, toda essa estrutura, para dizer que não há sentido em fazer com que essas pessoas venham todo dia para avenida Paulista, sofrendo num sistema de transporte, quando essa empresa poderia estar instalada e oferecendo empregos onde essas pessoas moram. Infelizmente, a gente gera a expansão de áreas habitacionais cada vez mais distantes do centro de empregos, e uma concentração dos empregos cada vez mais no Centro, gerando uma demanda crescente por viagens. É uma situação que o sistema de transporte pode ajudar a mudar - e o Marcelo também abordou isso. A questão, por exemplo, da localização de estações parece ser uma coisa simples, em que você deve mesmo favorecer o acesso ao pedestre. Mas uma estação, um terminal de ônibus ou um sistema de alta capacidade como o Metrô e a CPTM podem ser um indutor da atividade econômica. Uma intervenção

urbanística na região que favoreça a criação de centros comerciais, de centros de serviços, que gerem emprego e que gerem desenvolvimento econômico naquela região. É essencial olhar para São Paulo com a multiplicidade que esta cidade tem. É essencial criar, como disse o Marcelo, centralidades econômicas regionais, que atraiam renda e desenvolvimento social para outras regiões que não sejam a Faria Lima, a Berrini, a Paulista, o Centro, os Jardins, o Morumbi... enfim, para que cada vez mais pessoas possam, dentro da região onde vivem, conseguir a sua renda, o seu lazer e o seu acesso a equipamentos públicos como educação e saúde. Isso pode fazer a gente ter um sistema de transporte mais racional. Se, por exemplo, nós combinarmos de nos encontrar amanhã na estação Guaianazes da CPTM, às 6h30, para vir até a Luz, não conseguiremos embarcar senão lá pelo sexto, sétimo trem. Uma luta para embarcar... Em compensação, se nós pegarmos essa mesma linha 11 e embarcamos às 6h30 na estação Luz em direção a Guaianazes, cada um de nós irá num carro do trem, sentado, sozinho, e o trem

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irá batendo lata daqui até lá. Porque não há atração para irmos para lá pela manhã. Imagina a ineficiência econômica desse sistema, que vem cheio e volta vazio. E a mesma cena se repete em sentido inverso no final do dia. É o grande sintoma da doença urbanística da cidade de São Paulo. Sempre que eu falo nisso, alguém diz “ah, isso é muito fácil falar, mas até hoje não se conseguiu fazer”. Mas é preciso ser feito. É preciso que a Prefeitura de São Paulo atue com muita energia para induzir o desenvolvimento regional, eleger áreas na cidade, criar mecanismos de incentivo de verdade, enfrentar todos os problemas de infraestrutura nestas regiões, mas fazer com que este movimento efetivamente ocorra. Eu me lembro quando eu ainda era gerente jurídico do Metrô, quando o Metrô assinou o contrato para construção do shopping Itaquera. O shopping Itaquera, que está ao lado da estação do Metrô, é construído num terreno do Metrô, que é dono daquela área e tem uma concessão para uma empresa privada explorar o shopping. O McDonald´s do Shopping Itaquera é um dos que mais vendem no mundo. O cinema do Shopping Itaquera é um dos que mais vende no mundo. Exatamente pela carência de equipamentos dessa natureza naquela região. Com a inauguração daquele shopping já diminuiu o desejo de viagem das pessoas, que no final de semana ou durante a semana já têm onde passear, onde fazer compras, onde ir ao cinema, onde fazer uma refeição. Induzir o desenvolvimento dessa região é muito importante. E aí a gente vê o valor que teve a gestão do prefeito Gilberto Kassab quando decidiu apoiar a construção do estádio naquela região. Aquilo já mudou o entorno, você já vê ali uma intervenção urbanística, um equipamento que já contribui para favorecer o desenvolvimento regional e diminuir a necessidade de deslocamento.

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Agora um raio X do tamanho da encrenca na região metropolitana de São Paulo. Por dia, são realizadas 43,7 milhões de viagens na cidade de São Paulo. Viagem é qualquer deslocamento, de um ponto a outro ponto. Então, eu ter vindo do meu escritório para cá, para fazer essa apresentação hoje, é um deslocamento, eu estou aí nessa estatística de 43,7 milhões de viagens por dia. Como é que as pessoas fazem essas viagens? 30 milhões são feitas de forma motorizada, quer dizer, no carro, no ônibus, no sistema de transporte público. Dos 30 milhões, 16 milhões estão nos diferentes sistemas de transporte coletivo. E 13,6 milhões de viagens são feitas por veículos particulares. Então a gente continua tendo uma maioria das viagens motorizadas sendo feita por transporte público, o que é uma inversão da tendência anterior registrada nas pesquisas de Origem-Destino. A gente detectou uma inversão, uma volta da busca pelo transporte público a partir de 2007 na cidade de São Paulo. E 14 milhões de viagens, um número bastante expressivo, maior que o de viagens de carro, são viagens não motorizadas, isto é, 13 milhões e 700 mil viagens feitas a pé e 300 mil viagens com bicicletas.


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Então, por aí se vê o acerto do que o Marcelo disse sobre o pedestre. Porque todo usuário de qualquer sistema em algum momento ele é pedestre, em algum momento ele precisa caminhar, se deslocar a pé. Portanto, se a gente quer fazer uma política pública eficiente para a mobilidade e para favorecer o uso de sistemas públicos, é preciso focar na pessoa, no cidadão, e na sua condição de pedestre. E aí passa pelo equipamento de via, que é fundamentalmente o passeio, a calçada, em que a segurança tem duas dimensões: uma é a segurança pública, com iluminação nas ruas e urbanismo, sem cenas como aquela que a gente viu, de uma rua cheia de carros abandonados, para não favorecer a criminalidade e aumentar a segurança do cidadão. Outra é a proteção física do cidadão, é ele saber que terá preferência na travessia, que o semáforo funciona, que sua presença é respeitada pelos demais viajantes que estão em outros meios. Isto é fundamental. Uma política pública de mobilidade que não contemple isto está manca na origem. É deficiente na origem. Como disse o Marcelo, quando a gente fala de transporte público a gente fala de intermodalidade, a gente fala de sistema. Não é possível ter política de transporte público que olhe para um único modal. Alguém diz assim “Eu vou privilegiar o transporte de ônibus”. É muito importante, mas se você não olhar para ele como parte de um sistema, você corre o risco de provocar um desastre na sua política pública. Se você não entender que o ônibus cumpre um papel num sistema que tem metrô, trem, ônibus, carro, bicicleta, viagem a pé, táxi, viagem compartilhada, que a eficiência depende do diálogo e integração desses sistemas... se você olhar só para um lado, esse sistema será manco. Eu digo, por exemplo, como ciclista. Bicicleta tem que ser incentivada, protegida, isso é uma política corretíssima, mas como parte do sistema. É muito difícil al-

guém sair do Grajaú e ir até Santana de bicicleta. É bastante improvável. Agora, é possível imaginar que da minha casa até a estação do Metrô, até o terminal de ônibus, eu possa ir de bicicleta e lá me integrar ao ônibus. E ter uma outra bicicleta à minha disposição, emprestada, para usar ao descer do ônibus até meu destino final. Isso é falar de sistema de articulação. Às vezes as pessoas dizem “Ah, mas por que não se faz metrô no lugar de todas essas coisas?”. Você nunca vai conseguir atender uma cidade com metrô em todos os seus destinos. O metrô é um sistema estrutural para grandes corredores, para grandes conexões, das grandes distâncias, porque ele carrega muita gente. O Metrô tem capacidade de carregar até mais do que 50 mil pessoas numa hora, num sentido. De Itaquera à Sé, de manhã, o metrô de São Paulo consegue carregar 60, 70 mil pessoas em uma hora. Isso é formidável. Metrô + CPTM juntos são capazes de carregar mais de 100 mil pessoas em uma hora de Itaquera até o Centro de São Paulo. Aí você passa para um monotrilho, que nós já temos aqui em São Paulo, ou você vai para um corredor de ônibus... O sistema de ônibus é muito importante, porque tem um investimento muito mais baixo que o do metrô, um tempo de execução muito menor, mas em contrapartida tem uma limitação. Ele não consegue carregar muito além de 22 mil pessoas/hora/ sentido. Precisa ser um sistema de BRT (“Bus Rapid Transit”) muito parrudo, com muita competência na operação, para ultrapassar essa marca de 22 mil passageiros/hora/sentido. Ou seja, ele é mais barato, mais rápido de ser feito, mas carrega menos gente. Então em um lugar onde a demanda já esteja acima disto, se eu implantar um corredor ele nasce superlotado, eu já não consigo atrair pessoas para ele, porque ele já vai estar superlotado.

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Aí as pessoas dizem: ‘Ah, como seria bom ter um VLT em São Paulo”. O VLT é o bonde, como esses que inauguraram no Rio de Janeiro agora, o bonde moderno, bonito. Ele carrega um pouco menos gente que o BRT, ou corredor de ônibus. Então. qual é a vantagem em relação ao BRT? É exatamente esta: do ponto de vista urbanístico, ele provoca menos impacto negativo do que o BRT. Do ponto de vista tecnológico, ele atrai mais usuários do que o BRT. Só que talvez ele seja mais caro para implantar, demora um pouco mais para implantar e não carregue tanta gente. Depois vem o sistema de ônibus de baixa capacidade... é esse ônibus que anda na rua, comum, que não tem faixa exclusiva. Ele carrega bem pouquinho. Para que serve? Para levar as pessoas até o estrutural, fazer a alimentação do sistema estrutural. Então, quando você planeja transporte, você tem que olhar para isto como sistema e fazer uma política de integração desse sistema. Eu estava no Metrô quando o prefeito José Serra brigou pela implantação do Bilhete Único no Metrô. O Bilhete Único já estava implantado nos ônibus do município de São Paulo e o prefeito disse: “Nós vamos por isso no metrô”. O Metrô, que transportava 1 milhão e 600, 2 milhões de passageiros por dia, viu sua utilização ultrapassar 4 milhões de passageiros em dois anos. Por que? Porque se promoveu a integração, o diálogo entre dois sistemas. Essa integração - e aqui eu estou querendo chegar a um ponto importante - se dá do ponto de vista físico. Um terminal de ônibus integrado a uma estação de metrô. Um terminal de ônibus que integre várias linhas de ônibus alimentadoras com linhas estruturais. Uma estação da CPTM que tenha um terminal do lado, uma estação da CPTM integrada ao Metrô, enfim... essa integração física é fundamental, a inteligência do sistema está em desenhar essas integrações. Mas

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não adianta eu criar essas integrações se as tarifas são diferenciadas. Se eu tenho um custo muito grande para me integrar. Quanto menos eu cobrar pela integração, maior será a utilidade do sistema para a população em geral. Meio de pagamento é outro item importante. De que adianta ter um cartão por um sistema e outro cartão para outro sistema? Desfavorece a integração. De que adianta ter diferentes sistemas de gratuidades e vantagens geridos por diferentes autoridades? Desfavorece a integração. Promover esse diálogo pela integração é aumentar a utilidade do sistema de transporte e, portanto, a eficiência, o ganho, a qualidade de vida, a redução do tempo de viagem. Vou falar rapidamente sobre a diferença de sistemas. A principal diferença é entre segregado e não segregado, ou seja, o que tem interferência e não tem interferência. Uma linha de metrô quase nunca para por interferência externa. É muito raro. Ela não tem semáforo, não tem que dar preferência para ninguém, ninguém consegue entrar. Com isso, ela desenvolve uma velocidade muito alta. Ou seja, aumenta a capacidade de atendimento da população. Em contrapartida, quando a gente fala de VLT, a principal característica do VLT é não ser segregado, é ser integrado com a paisagem urbana. O Marcelo falou bastante de Barcelona, que tem todas as linhas de VLT gramadas. Coisa mais linda do mundo! Vamos imaginar o VLT na região da Barra Funda, em São Paulo. É um pecado que ali exista uma linha de trem na superfície. Ela atrasou um correto desenvolvimento urbano da Barra Funda e agora o que está acontecendo ali me assusta muito, que é a construção de espigões, espigões, espigões!! Todas as pessoas ali precisarão de carro para ir à padaria, porque não se pensou ali em atividades econômicas de serviços e comércio e tudo mais. Então, do ponto de vista exclusi-


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vamente urbanístico, ali o ideal seria, talvez, um sistema de VLT, porque haveria a integração com o entorno.

O VLT, por ter interferência, vejam aqui na foto, anda numa velocidade menor, tem que parar para o pedestre, tem que parar no semáforo, e por isso acaba transportando pouca gente, 12 mil passageiros por hora no pico, enquanto que no trem metropolitano, segregado, a gente consegue ultrapassar a marca de 80 mil passageiros por hora. Nesse assunto, então, o sistema sobre trilhos tem graduações conforme o tamanho do trem, o intervalo que oferece.

E aqui algo que é muito importante. O governo do Estado de São Paulo é responsável por gerir 40,7% das viagens feitas dentro da cidade de São Paulo. Através do sistema de transporte metropolitano, do ônibus, da CPTM, da linha 4 e do Metrô. E o município de São Paulo, dentro da cidade de São Paulo, faz a gestão de 59,3% dessas viagens. O usuário não está muito interessado em saber quem faz a gestão. O que ele quer é integração nos níveis que eu já citei aqui, facilidade de acesso, meios de pagamento, pouco importando quem faz a gestão. No entanto, não há um canal institucional em que esses entes falem adequadamente, planejem adequadamente e executem adequadamente, em harmonia. O Estado tem as suas autoridades, o município as suas autoridades. Quando dá existe algum alinhamento institucional – eu acho que, no tempo em que o Marcelo era secretário municipal e nós estávamos no governo com o Portella, com o Serra, a gente tinha um diálogo muito bom. Aliás, implantamos várias coisas em conjunto. Mas quando não há esse alinhamento dos astros, e normalmente não há, nós temos políticas que às vezes são divergentes, que às vezes são competitivas, que às vezes desviam o foco que deve ser a pessoa, a qualidade do serviço, a integração, a redução do tempo de viagem. Então há um déficit institucional muito importante, que seria a criação de uma autoridade metropolitana de transporte, que fizesse a gestão unificada do planejamento e até mesmo da operação do sistema de transporte. Eu vou aqui caminhando para as minhas conclusões falando de algo que o Marcelo também já disse e eu vou reforçar: a gente não pode olhar a política de transporte público como atendimento da demanda de deslocamento. Uma política de transporte público deve ser vista como parte de

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uma política urbanística que promova a eficiência das cidades do ponto de vista econômico, ambiental, social e urbanístico. Quando se pensa em um corredor de ônibus, quando se pensa uma linha de metrô, quando se pensa um novo sistema de ônibus, por exemplo, que favoreça as pessoas que usam carro, para que elas venham para o sistema de transporte público, você deve olhar para criar valor na cidade do ponto de vista ambiental, aumentando a eficiência energética, reduzindo a necessidade de energia nos deslocamentos. Quando você está no seu carro individual, são 70, 80 quilos sendo transportados por uma máquina de tonelada e meia, duas toneladas, imagine a ineficiência energética que isso tem. Do ponto de vista econômico, favorecer a atividade econômica, criar condições para o favorecimento da atividade econômica. Do ponto de vista urbanístico, intervenções que melhorem, ou seja, não adianta fazer uma estação de corredor de ônibus em que o usuário fique na chuva, ou que ela apague o mundo ao redor. Ou que ela destrua o comércio, o serviço de quem vive ao redor dela. Ela precisa se integrar e ser um elemento de agregar valor. Quando a gente pensa numa estação de ônibus, a gente deve pensar num elemento urbanístico para aquela região, para aquele lugar, que aquilo agregue valor, que transforme para melhor e não destrua o valor do lugar. E do ponto de vista social, aumentar a qualidade de vida das pessoas. A criação de rede é fundamental, é a intermodalidade que reduz o tempo de deslocamento e melhora a condição de vida. Que dá eficiência ao sistema. Então, primeiro a integração, por exemplo, com a CPTM sem aumento de tarifa; depois, integração com a rede municipal de ônibus, integração com bicicletas e automóveis... isso é fundamental.

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As estações de trem, de metrô, têm que ser convidativas para a bicicleta e têm que ser convidativas para o automóvel. Se a gente conseguisse fazer aquela pessoa que anda de carro 15 quilômetros por dia andar só 3, só 4... já era um ganho substancial. Ou seja, se houvesse um estacionamento que incentivasse a pessoa a estacionar o carro ali no terminal Butantã, por exemplo, entrar no metrô e, a partir dali, fazer o deslocamento no sistema coletivo, já seria um ganho para a cidade. Com a integração com a rede intermunicipal de ônibus, a integração de todos os modais, físicos, operacionais e tarifários... a gente faria uma metrópole conectada. Então, reforçando alguns pontos e valores fundamentais... em primeiro lugar, o elemento essencial de toda política pública no sistema de transporte é o pedestre. Segundo, a segurança. Quando a gente fala de mobilidade urbana, o primeiro valor deve ser segurança. Não é possível mais a gente admitir a carnificina que é o trânsito brasileiro. O Brasil tem um compromisso com a ONU de até 2020 reduzir em 50 por cento o número de acidentes, de mortos no trânsito. O compromisso com o valor segurança é, antes de tudo, um valor ético. Não é possível alguém dizer que isto não é o mais importante, que o mais importante é a fluidez e não a segurança. Não é possível do ponto de vista ético. Autoridade de trânsito de uma cidade como São Paulo tem que estar olhando para a vida das pessoas antes de mais nada. Do ponto de vista de engenharia, de fiscalização, de educação, de controle. Depois vem todo o resto, que é meio ambiente, fluidez... depois vem todo o resto. Para terminar, vou reforçar um pouco do que o Marcelo falou: integração de todos os modais, integração de comunicação. Não tem nada mais inteligente do que usar o transporte público. É mais


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racional. O usuário de transporte público busca o melhor caminho, o mais rápido. Quer aprender a usar metrô? Fique olhando uma pessoa que usa faz tempo, porque ela sabe tudo, é igual água, busca sempre o caminho mais curto para se locomover. Por que a gente vai para um sistema de transporte público e não vai para outro? O principal atributo é a rapidez. Mas mais do que a rapidez, confiabilidade. Eu até aceito que demore um pouco mais, desde que eu tenha certeza do que vai acontecer. É por isso que o metrô ganha muito do ponto de vista de atratividade do usuário em relação ao ônibus, porque o ônibus tem interferências e não consegue dar ao usuário uma previsão exata como o metrô consegue dar, porque está isolado, segregado, como eu falei. Mas a gente consegue diminuir muito a imprevisibilidade do ônibus com tecnologia. No último encon-

tro de que eu participei aqui, o tema foi exatamente o da tecnologia aplicada aos serviços públicos. Sem fornecer ao cidadão acesso a uma informação precisa, o sistema de transporte coletivo vai perder a corrida. Eu preciso ter no meu celular a hora em que o meu ônibus passa, um aviso, saber onde ele está, ser avisado se acontecer alguma coisa na linha... e hoje não há grande dificuldade para fazer isso, do ponto de vista tecnológico. O meu meio de pagamento tem que ser o mais fácil possível, eu tenho que poder colocar crédito no cartão via internet, eu deveria poder entrar no ônibus usando o meu celular, me aproximar do ônibus e já debitar de algum lugar... quanto mais facilidades eu criar, melhor será. Mas fundamentalmente... confiabilidade. O cidadão quer usar um sistema de transporte em que confie, quer saber que ele vai passar no horário e chegar no horário. Para isso é

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preciso criar cada vez mais vias preferenciais para o sistema de transporte coletivo, para aumentar a velocidade e fundamentalmente dar confiabilidade, para que as interferências do trânsito não afetem a operação desse sistema. A integração de planejamento significa pensar junto, todo mundo que opera nessa cidade ter o mesmo organismo de planejamento, e fundamentalmente uma integração institucional. A região metropolitana de Madrid criou a autoridade metropolitana de transportes há muito tempo. A criação da autoridade metropolitana aumentou em 30% a utilização do transporte público, porque se criou racionalidade, se criou eficiência e economia. É preciso demonstrar para a sociedade as suas razões. É preciso dialogar. Não adianta ter boa intenção, não adianta fazer algo que no mérito está correto se você não explica, se você não convence, se você não ganha a sociedade para a sua ideia. E, do ponto de vista de mobilidade, qualquer alteração de política tem ganhos para uma série de pessoas, mas há trade offs, você tem que fazer escolhas, muitas vezes alguém vai perder para que outros tenham ganho. Se você não explicar para essas pessoas que vão perder que, na verdade, elas estão perdendo individualmente mas é para um ganho como um todo, e que ao final elas também vão ganhar porque, se a cidade toda ganha, elas também ganham, você ganhará inimigos muito poderosos para a sua política. Você ganhará uma oposição injusta no mérito, mas correta, porque você foi arrogante e prepotente. Então é fundamental que o prefeito, as autoridades de trânsito, os vereadores, tenham a capacidade de estabelecer esse diálogo. Eu lembro do Marcelo, quando ele implantou o programa de proteção ao pedestre... ele não saía das rádios expli-

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cando o que era aquilo. Era o dia todo explicando por que é que ia ter restrição para carro passar em cima de faixa de pedestre, por que o carro ia ter que dar preferência para o pedestre, que é algo que parece muito óbvio, mas não é para quem está dirigindo. Quem dirige aqui sabe que não é fácil perceber a faixa de pedestre, e o pedestre. Não é do dia pra noite que você percebe aquilo e muda um comportamento de anos. É preciso explicar, é preciso convencer. Agora, ao mesmo tempo é preciso uma política rigorosa de cumprimento das leis para que a gente reduza os acidentes e as mortes que acontecem no trânsito. Eu vou parar por aqui para que a gente possa debater com vocês. Obrigado!

SÉRGIO RONDINO: Peço agora algumas palavras do vereador Police Neto, por favor, sobre o tema da mobilidade.

POLICE NETO: A gente vem dialogando muito sobre a análise diagnóstica, não é? A gente consegue reunir dados, informações, mas temos dificuldade para colocar as realizações que serão perseguidas


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ao longo de um mandato para buscar aquela cidade sonhada de 30 minutos, em que nenhum dos nossos deslocamentos seja superior a esse tempo. Acho que nós temos que apresentar atributos e argumentos que mostrem ao cidadão como a gente vai fazer essa transformação de cidade nos próximos quatro anos. Nós podemos apresentar, sim, propostas consistentes, com métrica e resultados ao final de quatro anos. A primeira proposta que eu quero comentar é aquela que me levou a enfrentar a lógica do transporte individual de passageiro no carro pessoal e no táxi. E a aceitar a tecnologia como meio de colocar mais pessoas dentro dos carros que rodam na cidade de São Paulo, hoje com média de 1,3 passageiros. Fazendo um cálculo simples, se estamos próximos de 15 milhões de viagens realizadas com 1,3 passageiros, estamos desperdiçando diariamente 40 milhões de assentos, uma vez que o combustível está pago, a obstrução da via está feita, a emissão de gás que produz o efeito estufa também está sendo realizada. Então um dos primeiros enfrentamentos é sair do solitário deslocamento individual que a cidade tem. Nós temos uma dificuldade muito grande para tirar esse passageiro do carro individual e levá-lo para o coletivo. Não adianta a gente querer imaginar que vamos atrair rapidamente esse passageiro. Portanto, um dos primeiros desafios, e há fórmulas públicas para isso, é incentivar que as pessoas que se deslocam de carro individual e não aceitam ainda ir para o transporte coletivo, sejam induzidas a trocar uma, duas ou até três das suas viagens da semana por um deslocamento compartilhado. A segunda proposta objetiva é sobre essa ampla maioria que faz deslocamentos não motorizados. Neste ano nós teremos mais deslocamentos a

pé, na média do ano, do que os motorizados individualmente. Pela primeira vez, andar a pé, andar de bicicleta, patinete, do que for, será mais do que qualquer um dos outros modais juntos - individuais, lógico. Isso nós temos que promover e é algo que me encanta. O Andrea Matarazzo trabalha por isso desde quando foi secretário municipal de Coordenação das Subprefeituras e subprefeito da Sé, buscando dar incentivo ao pedestre. É fundamental qualificar as calçadas, encontrar um regime de financiamento para oferecer uma calçada atrativa, para que um daqueles deslocamentos que historicamente é feito de ônibus para chegar ao trem, um deslocamento às vezes de um ou dois quilômetros, possa ser realizado a pé, sim. Isso a gente não tem. Ou que possa ser realizado de bicicleta, e esse incentivo a gente também não tem, porque ainda falta um processo de integração. Então, esta já é uma segunda fórmula que se pode oferecer objetivamente como alternativa ao transporte motorizado. E tem uma terceira proposta, que é sobre essa imensidão do transporte público coletivo – trem, metrô e ônibus – que ainda se isola dos outros modais. Infelizmente temos aqui hubs com estações e terminais monumentais, mas nenhum como os que se vê pelo mundo, e que deram certo. Lá a atividade econômica está instalada no entorno e a recepção do cidadão pedestre, do cidadão que vem no seu carro individual, é qualificada. A gente sabe que os entornos das estações da CPTM e do Metrô e de muitos dos nossos terminais de ônibus são os espaços mais feios da cidade. Mas quando a gente vê esses espaços internacionalmente, vê que são os espaços de maior valor agregado do mundo. Em Tóquio, onde estão os principais hubs de negócio? Estão onde o está o transporte público coletivo. Quando você vai a Nova York,

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ilha de Manhattan, o maior valor agregado está onde estão os hubs de transporte. Portanto, a gente agrega valor à cidade quando começa a pensar nesses espaços. Eu tenho o orgulho de poder dizer que nós escrevemos o artigo 90 da Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (“Ficam permitidas novas construções, reformas com ampliação de área construída e regularização de edificações e instalações existentes nas áreas operacionais do sistema de transporte público coletivo e nas áreas públicas remanescentes de desapropriação relacionadas ao transporte público coletivo”). Eu falo nós porque o trabalho teve presença efetiva do Andrea Matarazzo. Isso permitiu que a terra pública, que é a área da estação do metrô, da estação da CPTM, da estação da SPTrans, do terminal da SPTrans, que nunca teve oportunidade de negócio em cima dela, passe a ter o mesmo valor e a mesma condição que a terra privada tem nos hubs de negócios. Isso pode, sim, ter um papel protagonista na busca da integração modal, que pode reduzir e muito o volume de deslocamentos e dar à cidade vantagens concorrenciais em relação ao mundo. Então a gente traz aqui uma receita de cidade que não é carrodependente. Continuaremos dependendo do carro. O carro é confortável, o carro é gostoso, leva nossa família, isso a gente nunca vai deixar de ter. Mas a gente vai ter uma cidade que, além do carro, tem outros modais que nos encantam também. E isso foi muito trabalhado pelos dois homens públicos que aqui estão ao lado do Rondino. É isso.

SÉRGIO RONDINO: Obrigado. Agora é a vez de ouvirmos Andrea Matarazzo.

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ANDREA MATARAZZO: Boa noite, muito obrigado pela recepção. Depois das pessoas que falaram aqui, é muito difícil falar a respeito de transporte. Mas alguns pontos eu gostaria de comentar, três especificamente. Um deles é a questão de calçadas, que o Police lembrou aqui, ele que me ajudou muito quando era secretário. Na época, ele e a Mara Gabrilli é que me despertaram para a importância das calçadas, que medem 35 mil quilômetros de extensão na cidade de São Paulo. A maior parte delas intransitáveis, como todo mundo sabe. E não só para as pessoas com deficiência, porque nem os atletas conseguem andar hoje nas calçadas que nós temos. O conceito de que o proprietário do imóvel é o responsável pela calçada sempre me pareceu estranho. Porque eu nunca vi nem ouvi falar de alguém que saísse de sua própria casa com uma picareta na mão, quebrasse a calçada na frente de casa e voltasse para dentro. Calçadas são sempre quebradas por quem? Pela Prefeitura, para fazer alguma obra, ou quando planta uma árvore. Aí a árvore cresce e começa a quebrar a calçada, você pede à Prefeitura para podar ou retirar e ela leva 3 anos para fazer isso.


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As empresas de serviços públicos, de água, gás ou TVs a cabo, são agora as novas destruidoras de calçadas. E vi também que, se você deixar por conta do proprietário, cada um vai fazer a calçada como bem entender, como tem acontecido. Por mais padrão que você coloque, a gente sabe que fiscalização é alguma coisa quase impossível numa cidade do tamanho de São Paulo. Você vai multar a calçada da casa do fulano no Cantinho do Céu, ou no Grajaú... vai multar quem, se ele não tem nem escritura da própria casa? Então a casa teoricamente não existiria lá. E assim por diante. Na medida em que a responsabilidade da calçada é minha, se eu moro numa subida e não quero que o meu carro entre torto em casa, eu vou fazer o degrau, meu carro vai entrar retinho, como a gente vê em todos os lugares. Então, insistir nisso não funciona. Eu fiz uma lei aqui que justamente transfere para o poder público a responsabilidade de fazer e, principalmente, manter as calçadas. A primeira calçada é sempre feita por quem estiver construindo o imóvel, mas dali para a frente ela passa para o poder público. E por que isso? Primeiro, porque grande parte das calçadas já é feita pelo poder público. Todas as vias estruturais são feitas pelo poder público. Avenidas principais também. Nós tivemos que fazer uma lei que incluía nisso as rotas estratégicas, caso da avenida Paulista. Nunca iria sair a reforma da avenida Paulista se ela dependesse dos proprietários dos prédios, até porque cada um queria a frente do seu prédio de um jeito. Para as pessoas, a calçada em São Paulo é muito mais um elemento decorativo do que um acessório técnico da cidade. Então, para mim calçada é a via pública do pedestre, da mesma forma que a ciclovia é a via pública do ciclista, o corredor é a via pública do ônibus, a rua é a via pública do carro. Tem que ter padrão e tem que

ter especificação técnica. Hoje, se fizermos 7 ou 8 mil quilômetros de calçadas, cobriremos 80 por cento dos trajetos das pessoas. Essas são as chamadas rotas estratégicas. É preciso, claro, fazer a conta do custo dessa transferência da calçada para o poder público, quantificar isso. E não é preciso fazer todas as calçadas do dia para a noite, pode-se ir fazendo. O segundo ponto que eu quero comentar é a questão dos motoboys. Motoboy é uma realidade na cidade de São Paulo. Digo isso porque eu sou motociclista, ando em recesso depois do último tombo, mas gosto. E São Paulo tem quase 400 mil motocicletas, que circulam hoje de forma desordenada, até porque nunca se parou para pensar qual é a função deles, qual é a participação deles na economia da cidade, e quais são as normas que deveriam obedecer. Eu sei que eles também não ajudam muito, cada vez que se estabelece uma norma tem os protestos conhecidos. Mas precisamos de normas para aumentar a segurança dos próprios motoboys. Mas os motoboys são uma atividade econômica importante na cidade de São Paulo, e uma atividade econômica importante tem que ser bem incentivada e facilitada dentro do que for possível. E bem protegida. O terceiro ponto, que no fundo é a causa de todo o problema de transporte numa cidade como São Paulo, é a questão da regularização fundiária. A gente sabe que São Paulo tem metade da população dentro do centro expandido e metade fora. Mas 100% da atividade econômica estão dentro do centro expandido. Então temos metade da população que mora fora do centro expandido tendo que vir trabalhar no centro expandido. Por que? Porque a gente sabe que boa parte da periferia de São Paulo é irregular e por isso não tem atividade econômica.

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A regularização fundiária ampliaria a capacidade econômica de São Paulo, ou seja, a possibilidade de expandir os negócios. Tenho certeza de que quando o seu Ikesaki fez a filial da loja dele lá em São Miguel, as vendas dele cresceram muito. Claro que parte daqueles clientes de São Miguel compravam no Ikesaki aqui no centro, mas certamente, indo para lá ele adquiriu milhares de clientes novos que não precisam mais se deslocar até aqui. E ao mesmo tempo gerou empregos para as pessoas que trabalham lá. Então quando se faz a regularização fundiária, você leva a cidade até as pessoas, faz com que os empregos cheguem perto das pessoas, eliminando a imensa dependência do transporte público que nós temos hoje em São Paulo. Outro ponto, como disse o Police, é que não adianta querer eliminar o automóvel. Ele usou uma expressão certa: estimular os outros meios de transporte e manter sempre o automóvel. Isso é o razoável, não fazer o que está fazendo a atual gestão da Prefeitura, que acha que vai matar o motorista a pauladas. Não vai. Acho que o prefeito acorda de manhã e diz “Como é que eu vou atrapalhar hoje quem tem carro?” E não está surtindo efeito. Por exemplo, as ciclovias: eu acho que é ótimo o que o prefeito Haddad fez, porque todo o ônus da crítica já está com ele. O que temos de fazer? Melhorar essas ciclovias, planejar melhor, dar mais segurança, arrumar melhor. Como o Police é ciclista usuário da cidade inteira, outro dia ele foi parar em Ermelino Matarazzo de bicicleta – ele foi e voltou! Eu achei que ele ia colocar a bicicleta em um carro lá e mandar de volta, mas ele voltou pedalando! Mas, voltando à questão da regularização fundiária, que é dar títulos de propriedade, legalizar as áreas, é uma coisa essencial para reduzir as distâncias. E é engraçada a falta de planejamento. Imagi-

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nem na década de 70 quando decidiram construir os conjuntos habitacionais de Cidade Tiradentes. Cidade Tiradentes era uma fazenda Santa Etelvina, está há 45 quilômetros do Parque Dom Pedro e ninguém imaginou que as pessoas iam ter que trabalhar aqui? É até engraçado, porque fizeram... acho que são 70 mil habitações lá, moram 280 mil pessoas em Cidade Tiradentes, e tem só cinco alvarás de funcionamento. Cinco! Um deles é do supermercado Negreiros, onde funciona a Subprefeitura porque não se encontrou um lugar legalizado para se instalar. Absurdo criar essa necessidade de infraestrutura, porque a partir do momento em que colocaram 200 mil pessoas morando lá, é óbvio que elas iriam precisar de transporte. É óbvio que seria preciso colocar iluminação para todas essas pessoas. Então, por que não legalizar as áreas para estimular a ida de empregos para lá? Hoje, as pessoas gastam duas horas de ônibus pra ir e duas horas pra voltar, dormem mal. Eu acho que boa parte da população de São Paulo dorme menos do que cinco horas por noite na cama, o que é desumano, e aí você vê nos ônibus e metrô, está todo mundo dormindo de exaustão. Isso tira as pessoas de casa por muito tempo, mantendo as crianças longe dos pais... com quem ficam essas crianças durante as 13 horas em que um pai ou mãe ficam fora de casa? Três horas na escola e depois? Com quem? Você não tem também nada de atividade, nada de proteção, etc. Então tem várias consequências. Por isso eu acho que a regularização fundiária seria um passo para melhorar a qualidade de vida do paulistano, para permanecer mais tempo com as famílias, diminuir a dependência do transporte público, as distâncias imensas. De automóvel a gente leva uma hora e 15 minutos do centro até Cidade Tiradentes ou São Mateus. Então, temos que procurar facilitar a vida das pessoas levando a cidade até perto delas. Muito obrigado.


Presidente Guilherme Afif 1º Vice-presidente Vilmar Rocha

Conselho Superior de Orientação Presidente – Gilberto Kassab Guilherme Afif Henrique Meirelles Omar Aziz

2º Vice-presidente Diretor de Relações Internacionais Alfredo Cotait Neto

Raimundo Colombo Otto Alencar Claudio Lembo

Secretária Alda Marco Antonio

Ricardo Patah

Diretor Superintendente João Francisco Aprá

Guilherme Campos

Vilmar Rocha Robinson Faria

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