EVARISTO V. FERNANDES
SUCESSOS DOS INSUCESSOS ESCOLARES E EDUCATIVOS
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ÍNDICE CAPÍTULO I SUBSISTEMAS DOS ÓRGÃOS DE APRENDIZAGENS HUMANAS E DE SUAS INTERACTIVAS RECIPROCIDADES ..........................................................................5 I – O POTENCIAL GENÉTICO-COGNITIVA NAS AQUISIÇÕES DE SABERES.....7 II – DINAMISMOS BIOCEREBRAIS DAS APRENDIZAGENS .................................9 III – PROCESSOS NEUROCEREBRAIS E COGNITIVO-EMOCIONAIS DAS APRENDIZAGENS........................................................................................................12
CAPÍTULO II OS APRENDENTES NOS PROCESSOS DE APRENDIZAGEM ..............................20 I – ESTRUTURAS MENTAIS DO CONHECIMENTO DO ACTO DE PENSAR......26 II – DESENVOLVIMENTO E FORMAÇÃO DA MENTAL INDIVIDUAL ..............28 III – DESENVOLVIMENTO DE ESTRUTURAS E DE DINAMISMOS DO CONHECIMENTO.......................................................................................................................32
CAPÍTULO III MECANISMOS PROCESSUAIS DAS EFICIÊNCIAS E DAS INEFICIÊNCIAS .....36 I - DINAMISMOS ESTRUTURAIS DO PENSAMENTO NAS APRENDIZAGENS 42 II – ACÇÕES DOS SISTEMAS LÍMBICO-EMOCIONAIS NAS DINÂMICAS PROCESSUAIS DAS APRENDIZAGENS.................................................................. 51 III – O EU PSICOEMOCIONAL E CORPORAL DO INDIVÍDUO NAS AQUISIÇÕES E DESENVOLVIMENTOS DAS APRENDIZAGENNS ..................................58 IV – ACÇÕES DAS EMOÇÕES NEGATIVAS NOS COMPORTAMENTOS PSICOCOGNITIVOS ................................................................................................................62 V – EFEITOS DOS MEDOS NAS DINÂMICAS SOCIOEMOCIONAIS E NOS PROCESSOS COGNITIVOS ........................................................................................66 CAPÍTULO IV PROCESSOS E MECANISMOS DE INADAPTAÇÕES E DE DIFICULDADES DOS APRENDENTES ............................................................................................................78
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I – ESCOLAS REGULARES NAS DINÂMICAS DAS INCLUSÕES EDUCATIVAS.................................................................................................................................82 II - PORTADORES DE NECESSIDADES EDUCATIVAS NAS ESCOLAS REGULARES ............................................................................................................................84 III – DINÂMICAS SÓCIO-PSICO-ESCOLARES NOS COMPORTAMENTOS DOS APRENDENDENTES COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS.............86 IV – DIMENSÕES PSICOPEDAGÓGICAS DA INCLUSÃO NAS ESCOLAS REGULARES .................................................................................................................90 CAPÍTULO V SISTEMAS ESCOLARES NOS PROCESSOS DE INCLUSÃO DOS APRENDENTES.............................................................................................................96 I – ACÇÕES PSICO-EDUCACIONAIS NOS DINAMISMOS DAS INCLUSÕES DO ENSINO REGULAR.......................................................................................................98 II- MULTIDIFERENCIAÇÃO COGNITIVA E COMPORTAMENTAL NAS ESCOLAS REGULARES.......... ..............................................................................................99 III – DIMENSÕES EDUCATIVAS DA ESCOLA INCLUSIVA................................103 IV – ESCOLAS E AGENTES DE EDUCAÇÃO NAS NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS .........................................................................................................106 V – EDUCANDO COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS NAS ESCOLAS REGULARES.......................................................................................................109 CAPÍTULO VI DINAMISMOS COGNITIVO-EDUCACIONAIS DAS PEDAGOGIAS ESCOLARES …...................................................................................................................................115 I – ACÇÃO DOS DINAMISMOS BIOPSÍQUICOS NO DESENVOLVIMENTO DOS MECANISMOS COGNITIVOS .................................................................................116 II – DINAMISMOS DOS SENTIDOS NOS PROCESSOS DE COGNIÇÃO …………………………………………….............................................……..............120 III – EMOÇÕES E AFECTOS NAS EFICIÊNCIAS DAS APRENDIZAGENS ………………………………………….........................................................……......124 IV – COMPORTAMENTOS PSICO-CORPORAIS NOS DESENVOLVIMENTOS DAS INTELIGÊNCIAS ...............................................................................................131 V- MECANISMOS BIO-GENÉTICOS E PROCESSOS PSICO-EMOCIONAIS NAS EFICIÊNCIAS DAS APRENDIZAGENS....................................................................136 BIBLIOGRAFIA...........................................................................................................144 2
“O mundo está cheio de maravilhas mas nada é tão maravilhoso quanto o próprio Homem”
Sófocles
Porém:
− Pai, porque não usas os outros três quartos do teu cérebro? Pai: − Oh! Está bem... isso... o problema é que eu também tive professores e eles encheram-me cerca de um quarto do meu cérebro com teias de aranhas. Depois li jornais e ouvi o que outras pessoas diziam e isso encheu outro quarto com nevoeiro. Filha: − E o outro quarto pai? Pai: − Oh!, esse é confusão que gerei para mim próprio enquanto tentava pensar?? Gregory Bateson, in Metadiálogos
“Devemos transcender as nossas próprias crenças limitadoras para crescermos para além delas, ou para termos experiências que nos permitam crescer”!
John Lilly
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CAPÍTULO I
SUBSISTEMAS DOS ÓRGÃOS DE APRENDIZAGENS HUMANAS E DE SUAS INTERACTIVAS RECIPROCIDADES
Sendo o cérebro humano fruto de uma longa evolução sócio-biológica, ele é constituído pela parte do sistema nervoso central, que constitui o órgão privilegiado do pensamento e da coordenação nervosa e, incluindo os centros nervosos superiores, ele recebe estímulos dos órgãos dos sentidos, interpreta-os e correlaciona-os com impressões, estímulos e mensagens oriundas das mais variadas partes do organismo, gerando impulsos motores, sensações e percepções, que não só controlam, mas, também, activam as funções vitais do indivíduo. Considerado na sua totalidade, o cérebro humano é um super-sistema de sistemas e, cada sistema do super-sistema é formado por microscópicas regiões corticais e núcleos subcorticais que, por sua vez, possuem complexos circuitos locais, formados por neurónios interligados por sinapses. Da funcionalidade de sua sistémica hipercomplexidade emerge o psiquismo, e, do psiquismo a mente. Cérebro, psiquismo e mente formam, então, a indissociável trilogia definidora da natureza do ser humano. A partir daí material e imaterial, cérebro e mente influenciam-se mútua e reciprocamente. O cérebro, sendo formado por substâncias bioquímicas, estruturas neuronais, fibras nervosas, moléculas, células e neurónios, está localizado dentro do crânio e pode ser visualizado, tocado e manipulado. A mente, emergindo das reciprocidades das interacções organismo-cérebro, é a entidade cuja essência permite ao indivíduo pensar e perceber, aprender e recordar, sentir e percepcionar, amar e odiar, comunicar, criar ou destruir, resolver problemas, evoluir ou involuir. No entanto, emergindo tais funções do cérebro, sem cérebro não existe mente. Uma tal máquina bio-mental é dotada de funções, de arquivos e de programas dinamizados em função da natureza bioneurocerebral do indivíduo e da consciência de cada um, e, destas interacções resultam as orientações dos marcadores somáticos do indivíduo, áreas propulsoras das sensações e das emoções, dos sentimentos e dos afectos, dos esquemas psíquicos e das associações mentais. Porém, sendo o cérebro humano o sistema mais complexo do universo ele é formado por neurónios e por seus prolongamentos, organizados em camadas e núcleos de substância cinzenta com vias entre cruzamentos e feixes de substância branca. As suas funções geram tanto os comportamentos como os processos mentais, as emoções e os sentimentos, a memória e os conhecimentos, os actos voluntários e as aprendizagens. É também através do cérebro que o ser humano processa, conserva e expressa as informações, governa e regula as suas adaptações e envolve-se em seus processos de transformações, inovações, mudanças e criatividades. Embora não seja preocupação dominante das investigações neuropsicológicas localizar o pensamento no cérebro, à boa maneira cartesiana, não há dúvida que todas as áreas da cartografia anatómica do cérebro estão directa ou indirectamente envolvidas no 4
desenvolvimento do aparelho neuropsíquico e das funções mentais do indivíduo. Regiões anatómicas, áreas cerebrais, estruturas e fibras nervosas, neurónios e células estão ao serviço do psiquismo. No entanto, estruturas de áreas anatómicas específicas não só originam, mas, também, desenvolvem funções essenciais à vitalidade das restantes áreas, como sucede, por exemplo, com a espinal medula, que envia impulsos nervosos ao organismo e ao cérebro e controla os reflexos simples, como a medula que regula o ritmo cardíaco e a respiração; o cerebelo que coordena o movimento muscular e o equilíbrio; o hipotálamo que regula a temperatura, o comer, o dormir, o sistema endócrino; o tálamo que envia a informação sensorial ao córtice cerebral, o corpo caloso que relaciona a informação entre os dois hemisférios cerebrais e o córtice cerebral que controla o pensamento, as funções sensoriais e os movimentos voluntários, etc.. Assim, da medula partem os nervos com destino ao corpo; do tronco cerebral partem os nervos cranianos que inervam, sobretudo, a cabeça; da medula partem os movimentos reflexos e os automatismos motores comandados pela utilização dos nervos sensitivos. No tronco cerebral centralizam-se as mensagens sensitivas e as ordens motoras para que o organismo funcione como um todo unificado, tanto para a sua vida de relação como para o bom funcionamento das vísceras. É o tronco cerebral que recebe ainda as mensagens que vêm dos sentidos superiores, como do ouvido, da vista, do gosto e do olfacto. O córtice cerebral, região central do cérebro, os gânglios, os núcleos centrais, os corpos estriados, o tálamo e o hipótalamo e o corpo caloso geram e activam as funções superiores do ser humano, a unificação do corpo e a indissociável unidade mente-corpo. Com efeito, apresentando-se o cérebro humano como o sintetizador da evolução-histórica, a sua hipercomplexidade emerge, fundamentalmente, dos efeitos das interacções de suas estruturas e dinamismos bioneurocerebrais com os meios, as evoluções, contingências e circunstâncias. Dos efeitos de tais interacções, da sua utilização, investimento e reorganizações emerge o magno paradigma das suas potencialidades e aptidões, capacidades e eficiências, operacionalizações e habilidades, apesar de existir, porém, ainda hoje, amplo desconhecimento acerca da eficiente utilização do cérebro, de seu funcionamento e da potencialização das suas variadas formas de actuar. Porém, embora o cérebro seja formado por três unidades e estruturas fundamentais (cérebro reptílico ou primitivo, cérebro-mamífero ou límbico e cérebroracional ou neocórtice). Os três interagem e completam-se com o sistema imunitário, o sistema nervoso central e o sistema periférico, originando e interactivando emoções e sentimentos, funções cognitivas e mentais. Porém, emergindo a acção e o comportamento de um indivíduo das funcionais interacções de suas potencialidades e operacionalizações, tanto umas como outras procedem de sistemas bio-eléctricos, variáveis em função da intensidade da excitação, dos estados fisiológicos, das fibras nervosas, das ondas dos influxos nervosos etc.. Tanto estes sistemas como seus estados são diferentes de indivíduo para indivíduo, e, isto, tanto em quantidade como em intensidade, em ligações como em interligações, o que origina tipos diferentes de aprendizagem, maneiras diferentes de retêr as informações e diferentes tipos de sensibilizações e de comportamentos, apesar de adaptáveis através dos treinos e dos desenvolvimentos, das interacções sociais e das socializações. As recíprocas interacções entre as estruturas, os dinamismos e os factores não só activam, mas, também, reforçam e orientam a dinâmica intencional do próprio indivíduo, dinâmica resultante de subsistemas de intenções, geradores de atribuições e de referências corporais, emocionais, cognitivas e mentais. As suas origens processuais emergem dos genes e das acções das moléculas.
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As alterações, tanto das intencionalidades como dos conteúdos, efectuam-se através das acções dos vários sistemas de memória do cérebro, das sensações e dos sentidos, das percepções e das emoções, agentes essenciais dos processos mnésicos e primordiais interventores nos vários tipos de memória do indivíduo: memórias conscientes e inconscientes, explícitas e implícitas, declarativas e não-declarativas, armazenadas em milhões de sinápses, e, cujos efeitos das suas acções não só alteram as energias e as sensibilidades das sinápses, mas, também, dos neurónios, modificações que, progressivamente, alteram a própria arquitectura do cérebro do indivíduo, significando isto que, tanto as experiências como os efeitos das aprendizagens, efectuam alterações estruturais na cartografia cerebral do ser humano. Tanto essas alterações como as mudanças efectuam-se a nível de natureza das moléculas, das células, das fibras nervosas, dos sistemas neuronais, dos processos cognitivos, dos sistemas imagéticos e associativos, modificações cuja positividade não só desencadeia, mas, também, reforça, activa e desenvolve energias neuronais, que se deslocam para o interior e para o exterior das células e, graças à sua despolarização, as células geram potenciais de acção excitadora, a qual percorre as dendrites e o corpo celular do neurónio, ao longo de todo o cumprimento do axónio, até aos terminais pré-sinápticos, onde o neurónio entra em contacto com outra célula nervosa. Estas células tanto podem possuir receptores excitadores como inibidores e, na primeira situação, desencadearão potencial de acção na célula e, na segunda, e evitamento da acção. Estas intercomunicações entre as células nervosas são portadoras de sinais e de mensagens, cujos armazenamentos, em diferentes subsistemas anatómicos do indivíduo, dão origens a diferentes tipos de memória: memória-inconsciente, memória-emocional, memória-afectiva, memória-sensorial, memória-cognitiva, memória-consciente, memória a curto prazo, a longo prazo, memória de trabalho, etc..
I - O POTENCIAL GENÉTICO-COGNITIVO NAS AQUISIÇÕES DE SABERES
A base dos anteriores alicerces, tanto das aprendizagens elementares como secundárias, encontra-se na acção dos genes, das moléculas, dos neurónios sensoriais e dos neurónios motores. Os genes transportam os planos das proteínas e transmitem a informação de geração em geração, através do processo de replicação. Por sua vez, certos tipos de moléculas transportam mensagens de grande utilização para os processos neurofisiológicos da aprendizagem. A activação dos neurónios sensoriais estimula os reflexos, interactiva a acção das sinapses e liberta a acção inibidora dos repressores. Os neurónios motores, ligados aos neurónios sensoriais, fazem com que estes sejam mais transmissores, mais sensitivos e mais activos e, das recíprocas interacções entre uns e outros, resultam, para o indivíduo, não só hierarquias de estímulos, mas, também, de condicionamentos. Genes, moléculas, neurónios sensoriais e neurónios motores, interactivamente, estabelecem um positivo biofeedback e, reciprocamente, activam-se e desactivam-se, inibem-se e desinibem-se, constróiem-se e destróiem-se, regulam-se e desregulam-se. A acção comportamental de um tal positivo bioneurofeedback interactiva a área sensorial, motora e somestésica do cérebro, a área visual, auditiva e as áreas pré-frontais e, de tais mútuas e recíprocas interactivações, resultam a coordenação dos movimentos corporais, a coordenação das mensagens e das informações que têm origem na pele e 6
nos músculos, no reconhecimento e na coordenação das mensagens captadas através dos olhos e dos sons, e, graças às funções das áreas pré-frontais, as funções das anteriores áreas sensoriais, são coordenadas e unificadas, resultando, de tais efeitos, a psicossensorialidade, a psicomotricidade, a psico-visão e a psico-audição. Constituindo as anteriores áreas e suas respectivas funções os fundamentos essenciais do potencial cognitivo do indivíduo, é das suas orientações, interacções, estímulos e desenvolvimentos que se gera a eficiência nas aprendizagens. Porém, a nível de pragmatismo cognitivo, uma tal eficiência interdepende enormemente do grau de imersão do indivíduo no universo dos estímulos bioneuropsíquicos, do grau de maturação cerebral, do nível de integridade neurofisiológica, das potencialidades adaptativas do sujeito cognoscente, de sua flexibilidade cognitiva, de seu desenvolvimento emocional e de sua maturidade psico-afectiva, visto estes serem predicados essenciais à expansão do potencial bioenergético do sujeito e à mobilização dos seus padrões e esquemas motores, facilitadores de suas interacções com os meios exteriores, visto conhecer implicar não só saber ou saber fazer mas, também, o saber adquirir o saber, comportamento que implica não só disponibilidade, mas, também, maleabilidade ou plasticidade bioneurocerebral, bem como implicação e envolvimento nos estímulos do meio, da acção e dos comportamentos para o desconhecido e abertura ou disponibilidade para que este se una, se reunifique e se reorganize no conhecido, visto as aprendizagens, positivamente normais, interdependerem das sistémicas interorganizações e reorganizações das funções e das actividades de todas as áreas cerebrais. Na realidade, sendo o cérebro o órgão privilegiado da aprendizagem, os fundamentos desta encontram-se nas experiências e nas vivências somestésicas, sensoriais e motoras conservadas no cérebro e por este reflectidas. Essas experiências emergem das condições internas e externas ao indivíduo, do seu desenvolvimento e da sua acção sobre si e sobre os meios, as coisas e os objectos. Durante um tal processo, o cérebro recruta, de forma selectiva, inúmeras constelações de neurónios, estimula umas e inibe outras, o que faz com que ele se organize em padrões de auto-regulação e de autoreferência e se active e desenvolva em consonância com as energias dos estímulos interiores e as acções das motivações oriundas do exterior, visto o cérebro estar constituído como um sistema integrador, coordenador e regulador entre o meio e o organismo, graças ao facto de ser nele que residem as memórias, as aprendizagens, as linguagens, os pensamentos e os raciocínios. É também no cérebro que residem os cheiros, a visão e as sensações, o sono e o sonho, a criatividade e a imaginação. É também o cérebro que controla a temperatura, a fome e a sede. Por isso, tanto os comportamentos como as aprendizagens emergem da totalidade funcional do cérebro e, uma tal totalidade não só é maior, mas, também, diferente da soma das suas áreas. Por tal razão, opera como um órgão total e dinâmico no qual algumas das suas áreas participam mais activamente que outras, nestas ou naquelas aprendizagens, nestes ou naqueles comportamentos. Daí a existência das múltiplas e hipercomplexas diferenças a nível de processos de cognição, de aprendizagens e de comportamentos. Na base das dinâmicas de tais processos, porém, encontram-se o genético e o hereditário, o inato e o adquirido. Sendo o inato o que está contido no código genético ele já está presente no indivíduo aquando do seu nascimento. No entanto, o desenvolvimento do inato requer acções dos meios ambientes, visto o inato, não dependendo da vontade do ser cognoscente, jamais se desenvolveria sem a acção do conjunto dos efeitos das interacções dos meios com o genético e o hereditário. É de tais interacções que emergem tanto os comportamentos como as
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aprendizagens, as aptidões como as capacidades, a partir das quais se desenvolvem as sensações e as percepções, a consciência e a memória, o pensamento e os raciocínios.
II – DINAMISMOS BIOCEREBRAIS DAS APRENDIZAGENS
O potencial do cérebro e de seus respectivos desenvolvimentos possuem, como seu ponto de partida, as informações que o cérebro possui e as estruturas neurofisiológicas que as sustentam. Estas informações, desenvolvidas através de estímulos, projectam-se para o exterior em forma de resposta e, por sua vez, os órgãos receptores ou sentidos, recebendo informações através dos olhos, dos ouvidos, da pele, dos contactos, do olfacto, etc., transmitem-as aos nervos aferentes, os quais conduzem-as ao sistema nervoso central, conectando, por tais mecanismos, exterior-interior. A unidade de processamento central das informações do sistema nervoso (encéfalo, espinal medula e biliões de neurónios interligados) funciona em interligação com o sistema nervoso periférico (conjunto de nervos e fibras nervosas), e, irradia para as restantes áreas do cérebro e zonas do organismo os efeitos das suas mensagens e informações. É da reciprocidade interactiva do sistema nervoso central com o sistema nervoso periférico e seus respectivos efeitos que emergem as informações acerca do estado interior do organismo e do ambiente exterior a ele, analisando-se, a partir daí, os seus elementos e iniciando-se as respostas adequadas à satisfação de certos objectivos como, por exemplo, a sobrevivência, a tentativa de evitar a dôr física, a fuga ao perigo e a manutenção de todas as funções do organismo, iniciadas, inconsciente e automaticamente, no sistema nervoso imunitário e autónomo. Respostas a posteriores necessidades e objectivos como, por exemplo, necessidades de experienciar emoções positivas e evitar emoções negativas, sentimentais e afectivas, emergem, fundamentalmente, de programas incorporados no sistema límbico do cérebro, os quais auxiliarão a memória e as aprendizagens do indivíduo. Porém, sendo as unidades básicas do sistema nervoso formadas por células nervosas ou neurónios, estes constituem, pelo menos, três estruturas neurofisiológicas, relacionadas com o comportamento do indivíduo, isto é: a estrutura dos neurónios sensoriais ou aferentes, que recolhem a informação do meio exterior e conduzem-a ao sistema nervoso central, significando isto que transportam a mensagem da periferia à espinal medula e ao cérebro; a estrutura dos neurónio motores ou eferentes, os quais transmitem a informação do sistema nervoso central para os órgãos efectores (músculos e glândulas), e a estrutura dos neurónios de associação, os quais interpretam as informações e elaboram as respostas. Por isso, é função essencial dos neurónios transmitir mensagens e informações e, em qualquer comportamento e aprendizagem, está presente a actividade dos neurónios responsáveis pelas transmissões das mensagens. Encontrando-se a totalidade do cérebro envolvida em suas actividades informativas, tanto através da recolha de informações como no seu envolvimento de execução, certas zonas ou áreas cerebrais são mais activas e responsáveis que outras. Assim, os hemisférios cerebrais, do ponto de vista organizacional, são fundamentalmente idênticos até um determinado nível de complexidade, de processamento e, a partir daí, distribuem assimetricamente as suas responsabilidades. A informação que chega, por exemplo, ao tálamo e, de uma forma geral, ao sistema límbico, é sentida como um estímulo sensorial dos dois lados do cérebro. No 8
entanto, é interpretada, de forma diferente, por cada um dos hemisférios. Uma tal diferenciação interpretativa deve-se ao facto de que cada um dos hemisférios cerebrais é dominante para um conjunto de operações distintas. Com efeito, parece sobejamente conhecido que o hemisfério direito do cérebro está mais envolvido em tarefas de exploração visual e espacial, empenhando-se na percepção dos grandes conjuntos, e, o hemisfério esquerdo está mais envolvido em tarefas de selecção de pormenores. Efectuando-se as comunicações neurocerebrais a partir de sua complexa estrutura neuronal, com prolongamentos de entradas (dendrites) e de saídas (axónios), existem estruturas cerebrais que são mais importantes no tratamento de informações que outras, como sucede, por exemplo, com o tálamo, que pode ser considerado computador da percepção, com os corpos estriados, que coordenam e comandam os movimentos em conjunto com o cerebelo; com o hipotálamo, que gere a vida vegetativa através da hipófise e das hormonas, e, com o córtex, composto por uma enorme densidade de neurónios. As anteriores estruturas cerebrais são de capital importância, não só para os processos de aprendizagem, mas, também, para sua activação, visto os fundamentos dos processos cognitivos basearem-se na aquisição de novas informações, as quais, fixadas, conservadas e reproduzidas, consoante a maior ou menor dependência de suas estruturas neuronais, dão origem a várias tipologias de memórias. Assim, a memória figurativa emana das imagens dos objectos anteriormente percepcionados e da memória dos movimentos realizados; a memória emocional dos sentimentos e afectos vivenciados; a memória semântica dos pensamentos ouvidos ou expressos; a memória lógico-verbal dos pensamentos exteriorizados através das palavras, que são o invólucro material do pensamento, e, a memória sensorial emana da acção dos sentidos, sobretudo, da visão, da audição, do tacto, do paladar, do olfacto, etc.. Sendo a memória sensória-motora ou biológica a primeira a desenvolver-se logo que surge o feto, e, sendo sua função a de reconhecer as sensações e de responder automaticamente através de acções adequadas, ele tem, por natureza, uma memória inconsciente, visto suas ordens não serem controladas cognitiva nem intelectualmente. Por seu lado, esta memória constitui estrutura essencial da memória afectiva, visto serem funções desta a selecção de sensações e de emoções fortes, desencadeadoras de recordações-imagens, emanadas de sensações e de percepções agradáveis ou desagradáveis, sem outra regra de hierarquização que não seja a subjectividade do indivíduo. Por tal razão, a memória afectiva mistura imagens-recordações, não faz distinção entre o passado e o presente e ignora a temporalidade. Apresenta-se como intermediária entre a memória sensória-motora e a memória lógica. A memória lógica ou social, servindo-se de dados emanados da memória sensória-motora e da memória afectiva, é uma memória objectiva, efectua a clivagem entre passado e presente, efectua deduções das significações e constitui-se, no seu conjunto, como sendo o mais prestigioso auxiliar da aprendizagem intelectual. Ora, emanando tanto as recordações como as imagens das interacções efectuadas entre áreas, estruturas e códigos, elas escapam ao controlo da vontade, originando-se, por isso, não só maiores ou menores lapsos de memória, mas, também, ausências totais, factos que nos fazem, por exemplo, esquecer factos ocorridos no dia anterior e recordarmo-nos de pormenores de acontecimentos vividos na infância, na adolescência ou de acontecimentos vivenciados há anos. A evidenciação de tais factos orienta-nos para a conatural afirmação de que as emoções, os sentimentos e os afectos desempenham funções capitais nos processos de estabilização e de alterações da memória, visto a maioria das falhas serem de recuperação e não de armazenamento, como sucede, por exemplo, quando pretendemos 9
recordar algo em determinado momento e não conseguimos. Mais tarde, em momento inesperado, conseguimos recordar ou, então, quando queremos saber algo que sabemos que conhecemos, mas, nesse momento, não conseguimos saber o que é, e, mais tarde, ao dizerem-nos o que é, verificamos que conhecíamos. Com efeito, a memória e suas funções estão profundamente implicadas nos fenómenos de aprendizagem, visto esta efectuar-se quando, perante um facto novo adaptamos essa realidade aos conceitos anteriormente aprendidos. E é uma tal interacção do novo com o adquirido que gera não só as aprendizagens, mas, também, as suas modificações e a sua conservação, factor essencial para reconhecimento da nossa identidade pessoal e cultural. Por isso, sem memória não haveria consciência nem possibilidade de utilização das capacidades adquiridas, não possuiríamos recordações e, estaríamos condenados a viver num presente extremamente circunstanciado, que nem sequer reconheceríamos como nosso. Parece óbvio, por conseguinte, que, de uma forma geral, todas as estruturas e funções do cérebro estão, mais ou menos directamente, implicadas nos processos e funções das memórias. Assim, o que anatomicamente é designado por cérebro primitivo ou meramente biológico, é centro de encruzilhadas das referências e de padrões sensoriais e motores, possibilita a sobrevivência biológica do indivíduo, dita-lhe comportamentos de aproximação e de afastamento, de ataque e de defesa. Além disso, esta estrutura do cérebro humano, influenciada por estruturas superiores, aprende e desenvolve outros mecanismos essenciais à sobrevivência. Por sua vez, o sistema límbico do cérebro, apresentando-se como cérebro emocional ou intermediário, tem por funções essenciais: escolher o que é melhor e o que é pior, o que faz com que o indivíduo passe a ter acesso a uma enorme quantidade de emoções e de sentimentos conforme as situações, os interesses e as histórias da vida individual com que o sujeito se depara, atribuindo, a partir daí, dimensões positivas ou negativas afectivamente, geradoras de correntes de emoções de capital importância para os processos de memória. Estas memórias, emanadas fundamentalmente de emoções, sentimentos e afectos, estruturam a personalidade, individualizam as atitudes, hierarquizam os valores, determinam ou condicionam as constelações de reacções perante os acontecimentos e caracterizam a nossa identidade. Desenvolvendo e aperfeiçoando as funções do cérebro primitivo, o cérebro emocional, constituído por vários núcleos do sistema límbico, nomeadamente o hipocampo, que memoriza os factos brutos, e, a amígdala, que lhe atribui preferências, reconhece as situações vividas, atribui-lhe significados afectivos e retêm ou memoriza os acontecimentos, criando e desenvolvendo não só padrões comportamentais, mas, também, hierarquias de preferências, emocionais, sentimentais e afectivas. A evolução da espécie humana, no entanto, originou uma tripla estrutura cortical: o neocórtice. Representando este o ponto mais elevado da integração e do desenvolvimento do indivíduo, desenvolvimento que distingue o homem dos restantes seres biológicos, tal desenvolvimento desencadeou, no humano, capacidades de antecipação, de previsão, de levantamento de hipóteses possíveis e de projecção no futuro. O neocórtice, cérebro racional ou intelectual, possui capacidades de integrar todas as actividades do cérebro, de gerar conhecimentos subjectivos, e de criar conhecimentos objectivos; de reter e evocar informações emanadas de todo o cérebro, e de interligar emoções e afectos, memórias e raciocínios. Não há dúvida, portanto, que emoções, sentimentos e afectos, para o melhor e para o pior, influenciam, de forma acentuada, os raciocínios, pois são as emoções que reforçam as componentes cognitivas da razão, facilitam os comportamentos adaptativos 10
e enriquecem a vida do indivíduo, não só a nível do quotidiano e de suas respectivas vivências, mas, também, a nível da construção, da personalidade e do desenvolvimento de sua própria identidade. Parece evidente, portanto, que, após os resultados das mais recentes investigações sobre Neuropsicologia humana, a luta entre razão e emoção, entre pensamento e sentimento, corpo e mente, passa a ser um mero capítulo pertencente à história da investigação do comportamento e dos pensamentos humanos.
III -PROCESSOS NEUROCEREBRAIS E COGNITIVO-EMOCIONAIS DAS APRENDIZAGENS
Tendo-se tornado evidente que tudo age sobre o cérebro como o cérebro age sobre tudo, ele orienta, naturalmente, suas intencionalidades para obtenção e desenvolvimento do conhecimento e da compreensão; do sentir, do ser e do devir. Assim, o conhecimento apresenta-se no cérebro como resultado de uma complexa rede de malhas e de fios, cujos tecidos ou fios da malha só geram um sentido enquanto estão ligados a tecidos de outras realidades tanto interiores como exteriores. O processo de obtenção do conhecimento é, no entanto, a aprendizagem e esta efectua-se através da acção, da implicação, do desenvolvimento e do envolvimento do próprio cérebro. Porém, apesar das aprendizagens interdependerem das funcionalidades, individualizações e integrações do cérebro na acção, as aprendizagens processam-se de forma lenta, e, em função das adaptações dos objectivos ao cérebro e das estimulações sensoriais e motoras, comunicativas e sociais do cérebro aos objectos cognoscentes. Colocado o problema de aquisição dos conhecimentos como efeito das dinâmicas interacções neuropsíquicas do cérebro com os objectos e os seus processos imediatos, as aprendizagens interdependem das acções do organismo, nomeadamente do cérebro sobre o ambiente, os meios e as circunstâncias, gerando conhecimento que, devido à funcionalidade deste, torna-se cada vez mais complexo. De tal interactiva funcionalidade e respectiva complexidade emergem os símbolos, as representações, os esquemas, a linguagem, as estruturas operacionais lógicas e matemáticas, que fazem com que o indivíduo se adapte aos meios e se organize em função destes. A recíproca troca entre o sujeito e os meios gera o conhecimento, mas, este, emana, fundamentalmente, do desenvolvimento, da maturação e maturidade do indivíduo em suas recíprocas interacções e influências dos meios físicos e sociais. Emergindo de tais interacções, funcionalidades e desenvolvimentos, o organismo, progressivamente, assimila e acomoda-se às situações e, de tais características, emergem desenvolvimentos e adaptações das estruturas cognitivas aos meios. A assimilação, a acomodação e a equilibração passam, então, a serem características dominantes do cérebro, que o conduzem ao processamento e integração dos dados do meio. Os efeitos de tais processamentos modificam o aprendente, transformam o seu comportamento, estabilizam algumas de suas características e criam ou desenvolvem novas. O conjunto das anteriores alterações e mudanças emerge do facto de o cérebro ter fibras nervosas, que, durante os processos de assimilação, acomodação, adaptação e equilibração, adquirem novas propriedades moleculares e novas interligações, emanan11
do, daí, alterações durante os processos de aprendizagem, alterações que se mantêm e continuam ao longo da vida. Uma tal dinâmica de operacionalizações das células nervosas, sendo efectuada em conjunto com os circuitos neurais, dá origem aos processos básicos das memórias e das aprendizagens. Por isso, células e fibras nervosas, moléculas, circuitos neurais, estruturas cerebrais e comportamentos estão na base dos processos de aprendizagem, os quais, desencadeando mudanças nas estruturas e nos dinamismos do cérebro, mudam também os comportamentos do indivíduo, as suas percepções, acções, representações e eficiências. Estes processos de mudanças, no entanto, raramente são imediatos ou completos mas sim processos de desenvolvimento efectuados durante um considerável período de tempo, visto a acção do cérebro, através dos movimentos e das exercitações efectuadas, diminuir as resistências de seus receptores, os quais, por sua vez, captando cada vez mais estímulos internos e externos, não só originam, mas, também, desenvolvem habilidades, conhecimentos e memórias. Por tais processos, cérebros e organismos estabelecem mediações inteligíveis com o meio e, dessas mediatizações, desenvolvem-se emoções, sentimentos e afectos, memórias e conhecimentos, aprendizagens e actos voluntários de cujas interacções resultam mais mudanças pessoais, desenvolvimentos de novas aptidões e capacidades, aquisições de novos saberes e de novos e diferentes tipos de interacções com os outros, com os meios e com as realidades envolventes. Sendo as aprendizagens efeitos de tais processos e de dinamismos de mediatizações, tanto as aprendizagens verbais como as sociais emanam de suas constelações, mas, os efeitos de tais processos surgem das operações internas do aprendente. Tanto as suas generalizações como transferências emanam do armazenamento efectuado em seu sistema cognitivo. A maior ou menor riqueza e potencial de um tal armazenamento interdepende dos estímulos dos meios, das motivações do aprendente, da percepção que ele possui acerca da utilidade dos conhecimentos adquiridos e das compensações obtidas através dos processos de aprendizagens anteriores. As anteriores características de aquisições de conhecimentos e de aprendizagens eficientes são geradoras de modificações comportamentais e de reorganizações de estruturas do indivíduo, tanto biopsíquicas como neurofisiológicas, sensoriais como motoras, emocionais como afectivas. As equilibradas e dinâmicas integrações de tais dimensões tornam-se, então, fundamentos das activações das cognições, dos conceitos e das representações dos factos; das coisas e das realidades, características e suportes essenciais ao levantamento de hipóteses, às associações de ideias, imagens e mapas mentais, essenciais à fecundação, desenvolvimento e expansão de raciocínios tanto lógicos como operacionais. No interior das dinâmicas de tais processos, porém, a estrutura e dinâmica bioneuropsíquicas de cada indivíduo caracterizam os seus processos de obtenção, de organização e de utilização dos conhecimentos. Por isso, uns aprendentes encontram maiores facilidades nas aprendizagens de sinais que nas aprendizagens de estímulosrespostas, outros nas aprendizagens verbais que nas aprendizagens em cadeia; outros nas aprendizagens de princípios que nas aprendizagens de discriminações múltiplas, e, outros nas aprendizagens de contexto que nas aprendizagens de resolução de problemas. Os anteriores tipos de aprendizagens, mais emanados da natureza e dinâmica neuropsíquica de cada um que dos efeitos da socialização e dos modelos sociais, orientam, tendencialmente, os aprendentes mais para esta ou aquela tipologia de aprendizagens que para outra, significando isto que, apesar de tanto os modelos cognitivos como sociais serem de capital importância, a verdadeira aprendizagem de cada um
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emerge de seus processos cognitivos internos em interacções com os processos e dinâmicas externos. As maiores ou menores influências dos factores que interagem nas reciprocidades de tais interacções são influenciadoras não só deste ou daquele tipo de desenvolvimento cognitivo, mas, também, deste ou daquele estado mental, os quais, mútua e reciprocamente, agem e interagem não só nas eficiências ou ineficiências das aprendizagens, mas, também, nas respectivas tipologias e comportamentos dos apreendentes. Daí o facto de serem as estruturas neurocerebrais e biopsíquicas, os comportamentos dos meios e os estados das acções da mente que não só constituem, mas, também, condicionam e determinam os processos cognitivos e suas respectivas aprendizagens. Em tal sentido, H. Gardner, partindo da análise e de uma visão global, e, simultaneamente, pluralista da mente humana, analisando as diversas dimensões e respectivas competências dos vários comportamentos dos indivíduos, competências que designou inteligências, fez salientar vários tipos, isto é: inteligência linguística ou verbal, lógico-matemática, somato-cinestésica, espacial, rítmica, musical, mecânica, intrapessoal, interpessoal, visual, cognitiva, emocional e criativa. As maiores ou menores dimensões desta ou daquela competência, devem, no entanto, interagir com as restantes, pois, aprendente age como um todo e não apenas com algumas dimensões da sua totalidade. Todas estas dimensões são de capital importância para as organizações e desorganizações, construções e desenvolvimentos das aprendizagens, processos que, progressivamente, deverão orientar um indivíduo em seu amplo e vivenciado processo de auto-organização e de reorganização dos conhecimentos novos com os já adquiridos, processos que fazem com que as aptidões individuais se transformem em capacidades, e, estas em acções comportamentais, as quais valorizarão os estímulos e as acções dos meios, as respostas positivas, as comunicações com os outros e as reciprocidades interactivas, o que, por sua vez, não só reforça, mas, também, estimula os interesses cognitivos, o envolvimento no cognoscível e na concentração; a utilidade do aprendizável, a sua generalização e transferência. Um tal conjunto de características essenciais às aprendizagens, bem como os fundamentos de suas dinâmicas emergem do conjunto de interacções e de reciprocidades efectuadas entre o cérebro, o organismo e os meios. É importante recordar, no entanto, que existem áreas cerebrais e regiões do organismo com funções e características específicas tanto a nível dos comportamentos como das aprendizagens. No entanto, a aprendizagem, no seu todo, emerge da totalidade das funções e das representações do cérebro e do organismo em interacção com os meios, emergindo, daí, factos de que o que interessa, a nível de aprendizagem, é o que eles fazem e não, necessariamente, o que são. E eles modificam o sistema nervoso, a arquitectura do cérebro, os padrões do organismo, e, alteram as conecções sinápticas entre as células, bem como os seus componentes bioquímicos e neuronais. E isto porque, como o afirmou Kandel (1982, p. 35): “a capacidade potencial de um organismo para muitos comportamentos é parte intrínseca da estrutura do seu cérebro e está nesse sentido sob o controlo genético e do desenvolvimento. Os factores ambientais e a aprendizagem fazem surgir estas capacidades latentes ao alterar a eficácia dos canais de acção preestabelecidos, levando assim à expressão de novos padrões de comportamentos”. Com efeito, parece tornar-se evidente que a plasticidade cerebral desempenha não só importantíssimas funções nos processos de aprendizagem, mas, também, nas suas modificações, e, a dinâmica funcional de uma tal plasticidade interdepende enormemente não só da arquitectura do cérebro, mas, também, das influências dos meios em que um tal cérebro-organismo-órgão se cria, vive e desenvolve.
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De facto, encontrando-se as aprendizagens alicerçadas nos sistemas biopsíquicos do indivíduo cognoscente, as estruturas e dinamismos de seu sistema nervoso encontram-se ao serviço do psiquismo, da mente e do pensamento e, aquelas, são, por sua vez, influenciadas por estes. Não existe, porém, uma área, região ou zona do indivíduo em que se encontre o pensamento. Existem, no entanto, e, de facto, indivíduos, seres únicos, com personalidades únicas, processos e estilos de conhecimentos únicos, com maneiras ou modos de enfrentar as tarefas e concretizarem as funções únicos e, com maneiras de analisar ou sintetizar as temáticas, desenvolverem estratégias mentais, recordarem informações ou transferirem conhecimentos também de forma ou maneira única. Estes seres cognoscentes únicos, possuem, também, experiências de vida únicas, níveis socioculturais e maneiras de enfrentarem as aprendizagens também únicas. Estas formas de ser, de agir e de se comportar únicas geram também estratégias de aquisição únicas, constituindo-se um conjunto de diferenças individuais que geram não só estilos cognitivos únicos, mas, também, organizações e funcionamentos mentais únicos. Apesar disso, porém, não é de forma alguma displicente recordar o facto de que a maior ou menor eficiência nos processos de aprendizagem interdepende da intensidade da actividade com que o indivíduo cognoscente se envolve no cognoscível. Interferem, também, nas eficiências das aprendizagens a saúde física do indivíduo, a sua psicomotricidade relacional, as suas estruturas e estados emocionais, os seus dinamismos psico-afectivos e a sua inteligência cognitiva, bem como as acções dos meios socioculturais em que o indivíduo se insere. Os anteriores predicados de um indivíduo, fundamentais aos desenvolvimentos e organizações de personalidades positivas, e, factores essenciais de sucessos, tanto pessoais como sociais, geram marcadores de comportamentos maleáveis e flexíveis, sociais e integrativos. E tudo isto porque os efeitos de tais atitudes e comportamentos agem e retroagem sobre o próprio indivíduo, consolidam e reforçam as suas estruturas e os seus dinamismos sócio-cognitivos, emocionais e afectivos, alavancas essenciais dos desenvolvimentos e das organizações de sensações de bem-estar e de equilíbrio, de percepções positivas e de juízos de valor despidos de negatividade. A interiorização e a vivência dos anteriores constituintes de uma individualidade positiva não só orientam, mas, também, conduzem o indivíduo a aberturas e a disponibilidades sensoriais e perceptivas, a processamentos cognitivos, a elaborações de imagens e a associações de ideias, constituintes de amplos mapas mentais, originadores de envolvimentos e de experiências, de reconhecimentos e de vivências de processos interiores, desenvolvedores não só de si mesmo, mas, também, de sucessivos níveis de modalidades de relações com as realidades exteriores, factores essenciais de elaborações de positivos e de eficientes reanelamentos: interioridade individual-exterioridade sócioambiental. Face ao anterior não há dúvida que cognição, afecto e emoção constituem os pilares essenciais de eficientes, reais e objectivos processos de aprendizagem. Afectos, sentimentos e emoções positivas retroagem sobre os processos bioquímicos e neurocerebrais do indivíduo, facilitam as necessárias modificações das células e das sinapses, auxiliam as acções do sistema de armazenamento das aquisições, estimulam as funções mnésicas do cérebro e geram dinamismos e vitalidades aos sistemas cerebrais. Estes sistemas, alicerçados no sistema nervoso, geram percepções, acções e pensamentos; representações e imagens próprias da natureza do ser humano, as quais, por sua vez, com maior ou menor acentuação, vão não só construindo, mas, também, desenvolvendo e alterando as conecções e as sinapses, o que faz com que os sistemas neuroquímicos e biocelulares do cérebro se alterem, os padrões das conecções neurais 14
se modifiquem e se auto-seleccionam em função dos estímulos recebidos, dos resultados e das competições efectuadas entre diferentes constelações de neurónios. Tanto as experiências como as vivências, as aprendizagens como os comportamentos criarão categorias e desenvolverão orientações específicas. Os anteriores processos de modificações, alterações, selecções e orientações de natureza bioquímica, neurocerebral e biopsicológica não são somente efeitos de acção do meio interior do indivíduo, mas, também, e, sem dúvida, com maior acentuação, efeito das acções dos meios exteriores sobre a própria unicidade bioneurocerebral do indivíduo. E isto porque, na realidade, é impossível conceber um ser humano despido da sua realidade interactiva com os meios. Todo o organismo interage continuamente com o meio em busca de efectuações, de objectivos e de competências. De tais competências emergem representações, operações e inter-relações direccionadas para objectivos que, por sua vez, geram especializações derivadas das funções representacionais daí emergentes. Daí o facto de serem a acção individual e a acção social os constituintes essenciais tanto da eficiência como da ineficiência cognitiva. E isto porque, a nível de pragmatismo, a funcional optimização dos processos cognitivos interdepende do uso que o aprendente faz de seus próprios recursos neurobiológicos, psicoemocionais e socioculturais, e, todos eles, em interactivas interdependências e correlativas funcionalidades. São factores dos recursos neurobiológicos a organização neuronal do indivíduo, os seus potenciais perceptivos, cognitivos e informativos, somáticos e sinestésicos, sensoriais e linguísticos. A nível de recursos e de potenciais psicoemocionais destacam-se as integrações e os desenvolvimentos sensório-motores, as inter-relações afectivas, as experiências e os desenvolvimentos perceptivos, afectivos e emocionais; as positivas adaptabilidades dos meios, os meios transparenciais de cognição, a integridade do indivíduo aprendente, o seu autoconceito, as suas vivências do passado, etc.. São recursos e potenciais socioculturais, as acções das dimensões afectivo-emocionais, os níveis e os padrões socioculturais e sócio-económicos do aprendente, as expectativas pessoais e o estatuto da família, os desenvolvimentos efectuados anteriormente, as estimulações precoces efectuadas, as imagens de si mesmo, da realidade, do mundo, etc., etc.. Os efeitos das reciprocidades interactivas dos anteriores factores desenvolvem no indivíduo conjuntos de habilidades gerais e específicas, que o conduzem, progressivamente, à compreensão de si, dos outros, das realidades e das circunstâncias. Um tal potencial de compreensão, denominado inteligência, é, simultaneamente, potencial de adaptação a situações novas e reais e, um tal potencial, não só é criador de símbolos e imagens, mas, também, de significados e de condutas, de instrumentos e de resolução de problemas e conflitos. Porém, sendo o comportamento inteligente do ser humano emanado da sua totalidade, isto é, do seu organismo e do seu cérebro, não são apenas as estruturas dos dinamismos neocorticais do indivíduo que agem e interagem no dinamismo da compreensão e da inteligência, mas, também, os dinamismos das estruturas sensoriais e perceptivas, emocionais e afectivas. Com efeito, o resultado das interacções entre os diversos sistemas do indivíduo, tanto internos como externos, são de fundamental importância para a percepção e compreensão das realidades. No entanto, as fontes de tais inter-relações são efectuadas pelas emoções, as quais originam a denominada inteligência emocional, que é, no fundo, a capacidade de estudar o outro, de ler e interpretar os sentimentos, de controlar as pulsões, de manter a calma face a realidades diferentes e o optimismo quando confrontados com provações.
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Uma tal dimensão da inteligência privilegia a pessoa como centro de comunicação e de inter-relações, como alguém que é portador de impulsos, sentimentos e afectos, valores, necessidades e capacidades. Por isso, razão e emoção, ou seja, sistema racional e sistema emocional originam o comportamento inteligente do ser humano, o qual, não sendo inato, desenvolve-se, constrói-se e organiza-se, dinâmica e progressivamente, ao longo da vida e em função da maturação neurocerebral do sujeito, da maturidade psicoemocional dos meios, ambientes e experiências, factores que deverão ser orientados para consecução dos fins e objectivos adaptados a meios e a circunstâncias, e, organizados e interiorizados consoante a natureza bioneuropsicoemocional do sujeito aprendente, visto ser toda a sua natureza e dinâmica, consciente e inconsciente, manifesta e latente, que se envolve em seus processos de aprendizagem. Ora, emanando as aprendizagens da totalidade do ser humano, elas são sensoriais e motoras, perceptivas e emocionais, discriminativas e selectivas, sociais e verbais, conceptuais e pragmáticas. Por isso, resultando as aprendizagens das recíprocas interacções dos indivíduos com os meios, das quais emergem aquisições dos conhecimentos, desenvolvimentos de aptidões, de capacidades e de competências sensoriais e motoras; biopsíquicas e cognitivas, emocionais e afectivas, racionais e intelectuais. As aprendizagens motoras, fundamentos de equilíbrios biopsíquicos, emergindo de sequências de movimentos, de manipulações de objectos e de instrumentos, partindo de actos e de movimentos simples até aos mais complexos, geram não só autoconfiança individual, mas, também, desenvolvem e consolidam novos e posteriores níveis de aprendizagem. Em posteriores níveis de aprendizagens efectuam-se as aprendizagens sociais, as quais, sendo resultado de interacções biopsíquicas do indivíduo com os meios, fazem com que o indivíduo observe, constate e imite atitudes e comportamentos e se oriente por referências e modelos. De tais interacções com os meios sócio-humanos resultam modelações comportamentais e identificações sociais, o que reforça e activa as anteriores aprendizagens e disponibilizam o indivíduo para novas. De entre os novos processos de aprendizagem, o indivíduo, progressivamente, não só selecciona, mas, também, se adapta melhor a certas hierarquias de estímulos que a outras e, tanto o seu organismo como o seu cérebro, o seu psiquismo como a sua mente, progressivamente, desenvolvem hierarquias de sensações e de percepções, geradoras de aprendizagens discriminativas. Os tipos de aprendizagens anteriores são não só alimento, mas, também, reforço actualização e activação da aprendizagem verbal do indivíduo. É que, sendo esta, alicerçada na palavra e, a palavra é expressão de conceitos que emergem da acção laboriosa do organismo e do cérebro em interacção com os meios. Ora, sendo o conceito representação mental de alguma coisa ou realidade, são estes que permitem ao ser humano não só organizar mas também hierarquizar informações sobre a realidade. Os conjuntos de informações obtidas pelo indivíduo são utilizados por este para encontrar, mediata ou imediatamente, soluções para problemas ou dificuldades, servindo-se, melhor ou pior, de seus sistemas de raciocínios, do seu conjunto de associações, de seus mapas mentais e de seus poderes de eliminação de hipóteses. Quando, apesar de tudo, os problemas ou as dificuldades não foram resolvidos, os esforços investidos permanecem em incubação para posteriores utilizações. As utilizações, por sua vez, activam e reforçam o pensamento, redimensionam a mente e mergulham o indivíduo na acção.
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Com efeito, sendo a mente, em si, entidade individual transcendente e muito superior às sensações e às percepções, ao intelecto e ao pensamento, à memória e à consciência, todos estes produtos-funções são elementos integrativos da própria mente. Por isso, todo o organismo possuidor de mente possui também acção. E tanto a acção corporal como psicoemocional são agentes essenciais do funcionamento da mente do indivíduo, a qual, tanto próxima como remotamente, emerge das actividades dos circuitos neurais e de seus respectivos efeitos, actividades e acções. As interactividades e acções dos circuitos neurais também geram pensamento e, pensar, é acção que mobiliza células, neurónios, fibras nervosas, músculos, etc., e, sendo um acto, precedido pela acção, ele pode emanar de recordações e de concentrações, de representações e de imagens mentais, de conceitos e de preposições, de concretizações e de abstracções. Por isso, a associação de imagens, de ideias e de conceitos originam o pensamento e, tal função cognitiva da mente humana gera diálogos interiores e exteriores, comportamentos inteligentes ou simbólicos relacionamentos com os meios e os ambientes, informações acerca de si mesmo, do seu psico-corpo, dos meios e dos ambientes. Um tal percurso do pensamento emerge de intencionalidades, de leis, de objectivos e de finalidades, pois a dinâmica do pensar apoia-se em inferências, em induções e deduções, em relações entre os indivíduos, em situações e em coisas, conjunto de elementos que, progressivamente, vão organizando e dinamizando a estrutura do pensamento, o qual, não sendo inato, também não é fruto da determinação genética, hereditária ou biológica, mas, sim, produto das recíprocas interacções do inato com o adquirido, através das acções, das envolvências, dos investimentos psicoemocionais e dos esforços orientados para o agir e o pensar. As interactividades e dinâmicas das anteriores características deverão conduzir o pensamento e a mente individuais a uma plenitude educacional, através da orientação dos conhecimentos, dos valores e dos comportamentos, graças à possibilidade de selecção de experiências, ministração de conteúdos e orientações de desenvolvimentos proporcionadores de auto-satisfações, de auto-descobertas e de autodesenvolvimentos capazes de originarem auto-compreensão da natureza dos aprendentes, sentimentos de autoconfiança e auto-prevenção de orientações erradas. Para tal, o aprendente deverá desenvolver-se despido de angústias e de bloqueamentos emocionais, concentrar-se no que deve fazer e não no que deve evitar, e, aproveitar as oportunidades de ser e aprender com prazer, envolvimento e satisfação. No entanto, tanto no que concerne à educação do pensamento como da mente, tanto a pedagogia experimental como a psicologia cognitiva ainda não conseguiram fornecer contributos substanciais orientados para uma tal necessária educação. Uma tal e necessária educação da mente, dos pensamentos e dos raciocínios, deverá fundamentar-se na acção e nos desenvolvimentos dos processos indutivos, através dos quais os aprendentes são convidados a observar os factos e a compará-los, para captarem as regularidades mais ou menos constantes e tirarem daí conclusões mais gerais. Estes processos conduzem o cognoscente não só a explorar o real, mas, também, a reflectir sobre ele, a analisar as suas virtualidades e a construir o futuro a partir dos dados do actual. Um tal processo cognitivo faz com que o indivíduo reflicta sobre o real, sobre si mesmo e sobre o seu próprio funcionamento. Das reciprocidades emanadas das interacções efectuadas entre tais elementos emanará a indução cognitiva, a capacidade processual de generalizar a partir de experiências específicas e de formar conceitos novos e mais abstractos que os do ponto de partida, inferindo-se, a partir da análise das semelhanças e das diferenças, características gerais das classes e dos objectos, dos acon17
tecimentos e das situações, desenvolvendo-se, a partir daí, regras, ideias ou conceitos gerais, os quais, aplicados a novas experiências, não só aperfeiçoam, mas, também, modificam os conhecimentos, o pensamento e a acção. Um tal conjunto de modificações não se reflecte apenas na mente do indivíduo, mas, também, sobre seus sistemas biopsicológicos e cognitivos. E isto porque, de facto, tanto o tipo como a natureza da mente de um indivíduo age, mais ou menos acentuadamente, não só sobre sua natureza neuropsíquica, mas, também, biofisiológica. A mente age sobre as células e as células agem sobre seus genes e estes reprimem-se ou descomprimem-se, expressam-se ou inibem-se através da acção da própria mente, fazendo com que as mensagens fluam ou se bloqueiem, activem ou desactivem, gerando níveis de acção ou de desactivação tanto biofisiológica como o neuropsíquica, cognitiva como mental. De facto, células e genes descomprimidos activam as inter-relações neurais, os nervos sensoriais, os neurónios motores e geram bioenergias não só emocionais, mas, também, psíquicas. Os anteriores efeitos de alterações e de mudanças têm por base de apoio tanto a plasticidade como a maleabilidade das sinapses, características essenciais das alterações neuro-anatómicas, já em 1894 previstas por Ramón Y Cajal, ao afirmar: “o exercício mental facilita o maior desenvolvimento dos colaterais nervos da parte do cérebro que está a ser utilizada. Desta forma, as ligações já existentes entre grupos de células poderiam ser reforçadas pela multiplicação de ramificações terminais”. Por isso, genes, moléculas, células e sinapses, constituindo o cerne da biologia moderna, estão não só na base da psicologia cognitiva, mas, também, do intelecto humano. E o intelecto, sendo o suporte da cognição, é, simultaneamente, o processador e o operador dos conhecimentos e das funções cognitivas e mentais. As funções mentais, por sua vez, geram actividades intelectuais e, estas, utilizam informações e conhecimentos para compreender, raciocinar, adquirir novos conhecimentos e resolver problemas. A compreensão, os raciocínios e as resoluções de problemas, no seu contínuo, geram esquemas cognitivos, mapas mentais, guiões comportamentais e variados processos de inferências. Tanto uns como outros não só tipificam a natureza da actividade intelectual de um indivíduo, mas, também, a activam ou bloqueiam.
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CAPÍTULO II OS APRENDENTES NOS PROCESSOS DE APRENDIZAGENS
Sendo o cérebro humano o órgão privilegiado dos processos de aprendizagens, de seus factores e condicionamentos, é da sua actual estrutura, evolução e dinâmica que emergem os efeitos das transformações e das mudanças operadas nos espaços e nos tempos durante milhões de anos. Desde há dezenas de milhares de anos que se desenvolveram as capacidades de falar, cantar e desenhar; posteriormente de ler, escrever e contar e, muito mais recentemente, de conversar com os microprocessadores que o próprio cérebro inventou. No entanto, tanto as evoluções como as mudanças nem sempre foram, e, nem são, as mais harmoniosas e as mais funcionais. Daí o facto da existência de indivíduos com perturbações, desvios e disfunções a nível de sentidos e órgãos dos sentidos; a nível de motricidade e movimentos; a nível de símbolos e de comunicações, de linguagem e de escrita, de sensações e de emoções, de sistema nervoso e de conhecimento, de intelecto e de mente. Crianças, adolescentes ou jovens, com uma ou várias de tais perturbações, desvios ou disfunções incluem-se na categoria de crianças com dificuldades de aprendizagem. Porém, tais crianças, não são, necessariamente, deficientes e, muito menos, doentes mentais. São apenas crianças com desordens neuropsicológicas, com afectações no sistema nervoso, privações sensoriais, culturais ou educativas que geram atrasos e discrepâncias entre o nível de realização esperado e o adquirido. Dificuldades de aprendizagem não são, no entanto, e, necessariamente, incapacidades de aprender mas apenas efeitos de disfunções neuropsíquicas com ou sem outras disfunções, desvios ou discrepâncias colaterais como, por exemplo, a nível de audição, de visão, de socialização e mesmo de adaptação emocional. Por isso, a criança com dificuldade de aprendizagem pode revelar inteligência, mas apresentar baixo rendimento escolar, não possuir o devido aproveitamento e manifestar tais dificuldades através de comportamentos vários, os quais podem ser ou não provocados por disfunções neuropsicológicas e manifestarem-se, com relativa frequência, através de dificuldades nos processos de informação, tanto a nível receptivo como expressivo, integrativo como psicomotor. São crianças que, em geral, manifestam dificuldades a nível de percepção e de atenção; a nível de memória e a nível de linguagem, a nível psico-cognitivo e a nível emocional. Geralmente, esforçam-se por aprender, mas, não conseguem; desorientam-se facilmente, coordenam mal os movimentos, sabem muitas coisas mas não conseguem aprender a ler, escrever ou contar. As suas causas emergem das interacções das hipercomplexas dimensões da natureza do indivíduo, como, por exemplo, existência de lesões ou de disfunções cerebrais, perturbações emocionais, desordens nos processos de aprendizagem, ou seja, na percepção, na integração e na expressão tanto verbal como não-verbal; desordens nos processos psicológicos básicos e psicomotores envolvidos na compreensão e no uso da linguagem falada ou escrita, etc., conjunto de causalidades e de características que fazem com que, 19
em síntese, se defina criança com dificuldades de aprendizagem “a criança que demonstra uma deficiência substancial num aspecto particular do rendimento escolar, devido a desvantagens perceptivas ou perceptivo-motoras, independentemente da etiologia ou de outros factores contribuintes”. Na realidade, as origens causais das dificuldades de aprendizagem podem ser de natureza intrínseca ou extrínseca, neurológica ou cognitiva, afectiva ou psíquica, emocional ou educativa. Não raras vezes, porém, várias das anteriores causas encontram-se, simultaneamente, nas origens das dificuldades de aprendizagem, as quais, não se confundindo com problemas de aprendizagem, visto estes possuírem suas origens, a maioria das vezes, em condições pedagógicas, em dissonâncias cognitivas, em situações orgânico-institucionais, ou seja, em problemas exteriores à natureza do indivíduo. As causas das dificuldades de aprendizagem circunscrevem, transitória ou duradouramente, o desenvolvimento e a concretização das capacidades de certas aprendizagens específicas do indivíduo. As limitações, os condicionalismos, os subdesenvolvimentos ou desvios de certas capacidades de operacionalizações de certas aprendizagens não fazem, necessariamente, de um tal indivíduo, um sujeito deficiente e, muito menos, um doente mental, mas sim, apenas, e, em certo sentido, um indivíduo com desvios em certas dimensões relacionadas com os processos de aprendizagem, fundamentalmente, o escolar. Os seus comportamentos e suas respectivas sintomatologias comportamentais evidenciam a existência de problemas neurológicos ligeiros, de hiperagitações e de hiperactividades psico-comportamentais, de labilidade emocional e ausência de auto-estima; problemas a nível de psicomotricidade e de orientação geral, agressividade e impulsividade; dificuldades de concentração, de memória e de raciocínio; problemas de audição, de visão, de fala e de linguagem em geral, e, dificuldades específicas nas aprendizagens escolares, manifestadas através da existência de dislexia, de discalculias, disgrafias, disortografia, etc.. Por tais razões, a criança com dificuldades de aprendizagem não é deficiente, mas, também, não é normal. É simplesmente uma criança diferente. É diferente a nível de funcionamento cerebral, genético, bioquímico e psicofisiológico. É diferente por razões das anteriores interacções sociais, linguísticas e verbais, que, no seu conjunto, dificultam ou obstaculizam as acções das operações neurofisiológicas e neuropsíquicas inerentes às aprendizagens escolares. Um tal conjunto de dificuldades debilita as acções dos processos cognitivos do indivíduo e, este, em relação aos colegas de seu grupo escolar, do mesmo nível etário, permanece atrasado, o que, geralmente, não o deixa sem complexos de inferioridade e com atitudes ou comportamentos apáticos ou agressivos. Os anteriores comportamentos, mais de natureza psicoemocional que cognitiva, conduzem o aprendente a mais e a maiores dificuldades de aprendizagens, pois não só as aprendizagens superiores da mente e dos raciocínios necessitam de sólidos fundamentos nas emoções, nos sentimentos e nos afectos, mas, também, nas aprendizagens básicas, como sejam, por exemplo, falar, ler, escrever, calcular, etc.. No entanto, tanto os potenciais de cognição como os de aprendizagem podem ser de uma inteligência dita normal mas, apenas a sua funcionalidade de ser diferente, nomeadamente nos domínios das aprendizagens escolares ou académicas, sobretudo a nível de certos domínios, disciplinas ou matérias concretas, como sejam, por exemplo, a linguagem, a leitura, a escrita, a matemática, a música, etc.. Apesar de tais dificuldades, não raras vezes, um tal tipo de crianças apresenta um quociente intelectual médio e, mesmo, superior. Os anteriores desvios das aprendizagens ditas normais encontram-se, no entanto, impregnados pela força da acção do sócio-organizativo e institucional da escola e pelas 20
acções de seus respectivos meios, pois, tanto a primeira como as segundas caracterizam tanto o indivíduo com dificuldades de aprendizagem como o desviante, em função da execução das tarefas e das funções, das atitudes e dos comportamentos exigidos pelas ditas normas tanto institucionais como ambientais e, a partir de tais caracterizações, a nível de aprendizagens escolares, instala-se a incompreensão mútua entre aprendentes e ensinantes, o que leva o aprendente a fechar-se sobre si mesmo e a desenvolver processos de incompreensão, de angústia, de desmotivação e de desinteresse, factores desencadeadores de bloqueamentos relacionais, de comportamentos inactivos e de atitudes anómalas, despidos de objectivos e de realizações, de concretizações e de integrações. Ora, sendo um facto que muitas das dificuldades de aprendizagem são causadas por problemas comportamentais, emocionais e afectivos, os portadores de tais características tornam-se muito mais lentos e desinteressados face às aprendizagens e com muitos mais bloqueamentos ou perturbações a nível de suas concentrações selectivas e de aprendizagens específicas. Considerando, no entanto, que a maioria absoluta das dificuldades de aprendizagem só se constatam após a entrada da criança na escola, a existência de psicodiagnósticos precoces e suas respectivas e correctas intervenções evitariam elevada percentagem de crianças com insucessos escolares. Tanto os psicodiagnósticos como as necessárias intervenções daí emanadas deverão identificar as possíveis dificuldades escolares da criança, e, isto a partir da análise das variáveis das suas condições internas e das exigências impostas pelas necessárias tarefas escolares. No seio de tais variáveis dificultadoras das aprendizagens escolares, o cérebro, órgão essencial da aprendizagem, não só se modifica, mas, também, é modificável. Com efeito, movimentos, aprendizagens, estímulos, motivações, envolvências, interacções indivíduos-meios, reciprocidades organismo-cérebro, desenvolvimento e educações das emoções, dos sentimentos e dos afectos não só estimulam e desenvolvem as capacidades cerebrais, mas, também, organizam e reorganizam novos padrões de acção e de comportamento neurocerebral. É que, devido às suas interactuações, as interligações sinápticas tanto podem ser enfraquecidas como reforçadas, modificadas e mesmo alteradas estruturalmente, graças ao enorme potencial de plasticidade do cérebro, essencial não para a adaptação às sucessivas circunstâncias e mudanças dos meios, mas, também, para o equilíbrio psicocorporal e sócio-mental de cada indivíduo. Por isso, a arquitectura cerebral de cada indivíduo modifica-se, organiza-se e reorganiza-se, reforça-se ou fragiliza-se consoante as condições dos meios, os investimentos e as acções cerebrais, cognitivas e emocionais de cada indivíduo, na interdependência da sua constituição genética e hereditária, social e cultural. A percepção individual, os seus desenvolvimentos e orientações constituem um dos denominadores essenciais de tais modificações. De facto, alterando-se as percepções, altera-se o nível e a forma do percepcionamento das informações oriundas do exterior. As sensibilidades ou performances dos sentidos modificam-se e as informações que chegam ao córtice, as que chegam, são analisadas por ele de maneira diferente do que seriam, caso tais modificações perceptivas não se tivessem efectuado. Estes processos modificam, também, os mapas mentais do indivíduo, os quais, por sua vez, influenciam não só a acção da percepção cognitiva, mas, também, o comportamento da unidade psico-corporal do indivíduo. Um tal conjunto de modificações, de mudanças e de alterações, tendo como seu epicentro mobilizador as experiências de cada um, tanto podem ser positivas como negativas e, em função de tal positividade ou negatividade, não só o cérebro em si mesmo fica acentuadamente influenciado, mas, também, o todo do comportamento do 21
indivíduo, factos tornados evidentes através das análises positivas ou negativas das emoções, dos sentimentos, dos afectos ou de traumatismos cerebrais. Emoções, sentimentos e afectos, cérebro e organismo constituem uma unidade indissociável e, qualquer mudança ou alteração numa das suas dimensões influencia, em maior ou menor grau, as restantes, e, isto, tanto positiva como negativamente, como se demostra, por exemplo, através dos processos de eficiências cognitivas após um indivíduo ter organizado e desenvolvido positivamente seu universo emocional desorganizado, ou no aparecimento de desorganizações e de incapacidades psico-cognitivas, após a existência, transitória ou duradoura, de perturbações emocionais, sentimentais e afectivas ou traumas cerebrais, como, de facto, se demostra, através do aparecimento de neuroses ou do desencadeamento de psicoses, comportamentos cujas causas afectam acentuadamente não só os comportamentos do indivíduo, mas, também, as percepções e seus raciocínios. E tudo isto porque, emanando a mente das acções e das interacções dos circuitos neurais, por sua vez, também a mente orienta e comanda, de forma acentuada, a funcionalidade de tais circuitos. Por isso, possuindo a mente humana os seus alicerces nos dinamismos do organismo-cérebro, qualquer disfunção cerebral mínima, ligeira ou média, que pode surgir desde a gestação até vários anos depois do nascimento, pode prejudicar, de forma mais ou menos acentuada, não só os dinamismos da cognição, mas, também, a dinâmica equilibradora do comportamento do indivíduo. Doenças infecciosas, tanto pré-natais como pós-natais, traumatismos crânio-encefálicos, perturbações ou disfunções a nível de neurotransmissores cerebrais, deformações hereditárias ou adquiridas no período fetal, na infância ou mais tarde; desarmonias nas direcções cerebrais, fadiga nervosa, etc., etc., podem causar não só disfunções, perturbações ou dificuldades tanto nos comportamentos como nas aprendizagens, nos dinamismos da psicomotricidade como nos sistemas da memória. A base de tais dificuldades encontrar-se-á então nos atrasos maturativos ou nas disfunções do sistema nervoso, nas insuficiências, alterações ou perturbações dos dinamismos do sistema neuromotor, nas dificuldades de se inter-relacionar, na sensação, percepção, emoção e acção-motora, nas percepções e no controlo do próprio corpo e nas descoordenações psico-corporais. As descoordenações psico-corporais emergem de imaturações e de disfunções do sistema nervoso, o que origina dissimetrias de movimentos, discinésias, descontrolos, desorganizações espaço-temporais, etc., originando-se tanto comportamentos hiperactivos como hipoactivos influenciadores, negativamente, dos processos de cognição, das aprendizagens, dos sentimentos e dos afectos. Uma tal estrutura e seus alterados dinamismos repercutem-se, negativamente, na atenção, na concentração e na memória. Reconhecendo a Neuropsicologia, hoje em dia, que não existe no cérebro humano uma área específica e única, tanto da memória como das capacidades e dos potenciais de retenção, não há dúvida que existem fibras e constelações nervosas que desempenham funções mais importantes nos processos de memória que outros. No entanto, sendo verdade que os processos de memorização geram complexas transformações a nível das sinápses e, por conseguinte, recíprocas modificações tanto a nível de alterações bioquímicas como a nível de neurotransmissores e de suas respectivas actividades neurais, o que, por sua vez, desencadeiam não só modificações mas, também, mudanças a nível de sistema límbico, nomeadamente a nível de amígdala e de hipocampo, o que gera modificações a nível do emocional e do afectivo, do motórico e do sensorial.
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As anteriores modificações demostram sobejamente que não é possível conceber-se o ser humano biológico sem o psíquico, nem o social sem o emocional. Porém, a hipercomplexidade do ser pensante reside, fundamentalmente, nos incessantes inter-relacionamentos da dialéctica funcional entre o humano e a natureza e entre o social e o cultural. Face a uma tal hiper-problemática não poderemos deixar de dar razão a Pascal, quando este argumentava que, quanto mais se cresce na esfera do conhecimento, mais os contactos com as esferas da ignorância se multiplicam, e, que, no fundo, quanto mais nós conhecemos e quanto mais adquirimos conhecimentos extraordinários acerca do cosmos, da natureza, da vida, mais nós desembocamos nas profundidades dos mistérios. Parece, no entanto, estar isento de qualquer mistério a afirmação do facto que cada ser humano é uma entidade única e indissociável, ao contrário do que pretendeu afirmar Decartes e, sobretudo, seus deturpadores científicos, tanto neurofisiologistas como empiristas, idealistas como angelistas.
Esta indissociabilidade da natureza individual de cada ser humano é demonstrável através das dificuldades mnésicas do indivíduo e suas possíveis perturbações, pois tanto as amnésias parciais como totais, as perturbações de memória como os distúrbios nas capacidades de reprodução mental ou as falsificações da memória demostram que tais faculdades emergem, simultaneamente, de processos biofísicos e psíquicos, os quais, produzindo-se através de acontecimentos anteriores, longínquos ou próximos no tempo, modificaram, de modo persistente, o estado do psico-orgânico do indivíduo, e isto tanto a nível de suas dimensões sensoriais como motoras, psicológicas como mentais. Por isso, constituindo as modificações e as mudanças, as organizações e as reorganizações características essenciais da normalidade neuropsíquica e cognitivointelectual, deverá ser entendido como normal o comportamento do indivíduo que obedece a tais preceitos, regras e normas. Será, em contrapartida, diferente, excepcional ou mesmo anormal, tanto em seus desenvolvimentos como em seus comportamentos, o indivíduo que foge à norma-padrão, geralmente, considerada definitiva. Em tal perspectiva será considerada normal a criança que tem estádios de desenvolvimentos próprios e bem definidos em conformidade com a norma, com um ritmo de crescimento próprio e características, que vão surgindo e desenvolvendo-se a um ritmo considerado normal pela psicologia clínica, isto é, com características psíquicas e motoras específicas e um desenvolvimento psicológico correcto e equilibrado. Os anteriores critérios fundamentais da funcional normalidade de uma criança, envolvedores de desenvolvimentos de características gerais e particularidades individuais, são geradores de estruturas funcionais estáveis, progressivas, e, cada vez mais, complexas e diversificadas. Estas diversificações, resultantes das interacções dos potenciais genéticos do indivíduo com os meios, geram níveis de equilíbrio progressivamente mais elevados. Porém, resultando, de tais elevações, interacções das organizações interiores do indivíduo com as adaptações aos meios, tais processos nem sempre se efectuam de forma positiva, gerando-se, então, o insucesso da pessoalidade. E isto porque o desenvolvimento individual, concreto do indivíduo, não está previamente fixado por determinismos genéticos ou hereditários mas, em seus aspectos qualitativos, interdependem, enormemente, de variados factores imponderáveis, que são fonte de diversidade e de imprevisibilidade, pois as condições do meio, ao qual o indivíduo tem de adaptar-se, não sendo nunca idênticas, constituem, em primeiro lugar, desde o início, factores de diferenciações entre os indivíduos. Um segundo e poderoso factor de diferenciação intervém no desenvolvimento do ser humano a partir do momento em que o seu organismo atinge um nível de 23
complexidade, tal que lhe permite inscrever, no seu programa genético, a capacidade de aprender, ou seja, de reter e de organizar informação a partir das experiências vividas e de as utilizar em novas situações. Apesar da existência de tais factores de imprevisibilidade, acasos e erros, existem certas previsibilidades contidas nos potenciais da educabilidade do ser humano. Uma tal potencialidade gera aprendizagem e aprendizagem orienta verso a educação, a qual, tanto intencional como institucionalmente, reduz não só os factores de diferenciação, mas, também, de imprevisibilidade do desenvolvimento do indivíduo, visto ser através do sócio-educativo que o recém-nascido, unidade biológica, rapidamente desenvolve actividades de natureza sensorial e motora, as quais, por sua vez, originam funções de relação e de consciência, de expressões de emotividade e de intencionalidade. Os critérios e características de uma normal funcionalidade do ser humano são, não raras vezes, destruídos por causalidades de natureza sensorial e psicomotora, sócioambiental, emocional e afectiva, cognitiva e intelectual. Apesar disso, existem muitas outras causas cuja origem e natureza são pouco claras e, não raras vezes, desconhecidas. E, tanto a primeira categoria como a segunda fazem com que seus portadores sejam indivíduos diferentes do anteriormente concebido como normal, diferença que pode ser caracterizada por infradotação ou sobredotação. É, no entanto, infradotada a criança que apresenta um atraso em seu desenvolvimento intelectual, manifestado através da compreensão da realidade e do modo como se adapta e lida com esta, não correspondendo ao esperado pela maioria das crianças da sua idade biológica. E isto porque o seu desenvolvimento processou-se de forma lenta, o que originou um modo de reter, de organizar e de utilizar as experiências de forma idêntica a crianças com muito menos idade. Um tal subdesenvolvimento, originador de atraso, vai reflectir-se na comunicação, na sociabilização, na autonomia, na compreensão, na consciência de si mesmo e na resolução de seus próprios problemas, funções, tarefas e deveres. Pelo contrário, é criança sobredotado aquela que manifesta desempenhos acima da média em todas as suas actividades ou, então, alguém que se destaca, revelando um talento especial para uma ou várias das suas expressões: música, pintura, matemáticas, permanente sucesso escolar, etc., o que conduzirá a criança a resultados ou a conhecimentos excepcionais numa ou em mais áreas de actividade ou do conhecimento. No entanto, de uma forma geral, a sobredotação é a expressão de um conjunto de factores interactuantes, que resulta na manifestação de destaque de um ou vários desempenhos, nomeadamente a nível de motivações e de criatividade, de iniciativa e de liderança. No plano das aprendizagens escolares, o sobredotado destaca-se por seu avançado vocabulário em relação à sua idade, por hábitos de leitura, por iniciativa própria, preferindo livros que, normalmente, interessam a crianças mais velhas; por um rápido domínio da informação e pela facilidade na evocação de factos; pela capacidade de compreensão dos princípios subjacentes e pela capacidade para generalizar conhecimentos, ideias e soluções. De um modo geral, tanto a criança sobredotada como a infradotada é uma criança “excepcional” e, uma tal excepção, manifesta-se por seu comportamento atípico ou desviante da norma, por seus talentos ou deficiências, manifestados, tanto uns como outras, por suas características físicas, neuromotoras e sensoriais; por suas capacidades de comunicação, por seu comportamento social, por suas características mentais ou por suas múltiplas características ou deficiências.
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As crianças infradotadas, a nível de escola, possuem atrasos significativos em relação às outras da sua idade e são, então, consideradas com atraso de desenvolvimento intelectual. Têm dificuldade de perceber as informações do meio, de memorizar e de se exprimir, de imaginar coisas novas e de resolver problemas. Pelo contrário, outras dominam rapidamente as aprendizagens comuns à sua idade e manifestam dotes excepcionais num ou noutro domínio. Recebem facilmente as informações do meio, adquirem conhecimentos, desenvolvem-nos e exprimem-se melhor, porque as suas capacidades de percepção, de memória, de atenção e de imaginação são mais desenvolvidas que as das outras. No entanto, tanto umas como outras apresentam problemas aos sistemas escolares, e, isto, porque se umas pensam e reagem às situações como crianças muito mais novas, outras mostram serem capazes de raciocínios mais complexos o que as outras da sua idade. Apesar disso, os sistemas educacionais de hoje, apenas progressivamente, vão institucionalizando medidas, técnicas e intencionalidades disponíveis para o apoio ao desenvolvimento de crianças, adolescentes e jovens infradotados, com necessidades educativas especiais, através da oferta da escola inclusiva. Concernente a infradotação, constituída por um vasto conjunto de crianças ou alunos portadores de atrasos intelectuais e escolares, com ou sem deficiências visíveis, os sistemas escolares reconhecem a necessidade de educação especial. Assume-se, por isso, oficialmente, que alunos com défices físicos, sensoriais, sociais, emocionais, intelectuais ou com qualquer combinação destes encontram-se afectados em seus processos de aprendizagem e, por isso, são necessários a alguns ou a todos acessos especiais ao currículo, ao currículo especial ou modificado ou a condições de aprendizagem especialmente adaptadas para que o aluno seja educado adequada e eficazmente, significando isto, em geral, que tanto as crianças como os jovens que requerem educação e serviços específicos de apoio, para a realização do seu potencial humano, são portadores de necessidades educativas especiais ou específicas, situadas, de uma forma geral, a nível de motricidade, de sensorialização, do emocional, dos processos cognitivos e mentais.
I - ESTRUTURAS MENTAIS DO CONHECIMENTO DO ACTO DE PENSAR
Sendo o pensamento resultado de efeitos e de organizações de capacidades e de actividades superiores do ser humano, são objectivos do pensamento: recordar, reflexionar, julgar, meditar, inferir, concluir, decidir, opinar, deliberar, desenvolver associações, criar mapas mentais, etc.. Um tal conjunto de atitudes e de comportamentos superiores do ser humano emerge de suas estruturas e dinamismos neurocerebrais, cognitivos, psicológicos, intelectuais e espirituais, envolventes do todo individual do ser humano. Este todo envolve suas dimensões sensoriais e perceptivas, neurais e cognitivas, conscientes e inconscientes, simbólicas e mágicas, lógicas e racionais, técnicas e ambientais. O pensamento é, por isso, o acto que sintetiza os efeitos das actividades, das faculdades e das aptidões, das operações e dos desenvolvimentos efectuados pelo indivíduo. Pensar é efectuar operações e, estas, possuindo seus fundamentos em estruturas e dinamismos bioquímicos, psicofísicos, psicológicos e sociológicos, geram, simultaneamente, efeitos de transcendência e de retorno, ultrapassando e reforçando
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suas fontes matriciais e sequências de equilibração mediante actuação e operacionalização sobre a experiência e a vivência, sobre os inatos e os adquiridos. Um tal modo de operar do indivíduo emerge dos efeitos de suas interacções do genótipo com o fenótipo, de suas dinâmicas biossociológicas, das interacções do organismo com o ambiente social, cultural, técnico e mental dos meios e de suas respostas aos estímulos dos meios, o que fará com que se torne um ser único, tanto em suas atitudes como comportamentos. Com efeito, os circuitos bioquímicos, neurais e biopsíquicos da indissociabilidade cérebro-corpo não só interiorizam, mas, também, se adaptam aos factores e agentes dos meio do indivíduo. A partir daí, não só alargam, mas, também, redimensionam suas potencialidades, as quais edificam-se, organizam-se e adaptam-se, gerando pensamentos, envolvências e adaptações, reorganizações e desenvolvimentos. São, por isso, as sensações e os movimentos, as sensorizações e as percepções, os meios e os ambientes, as atitudes e os comportamentos que desenvolvem não só as faculdades do pensar, mas, também, as capacidades de aprendizagem, as maneiras de ser e de estar, pois ninguém nasce sábio ou delinquente, marginal ou virtuoso. São, também, as habilidades cognitivas do indivíduo que, progressivamente, vão construindo o pensamento e este, através de induções e deduções, envolvimentos e inferências, sucessivamente vai adquirindo e desenvolvendo, cada vez mais, complexidade, na tentativa de compreender as relações causais e as finalidades, tanto das coisas como das situações. Na base de tais processos, mais indirecta ou directamente, encontram-se o cérebro e o organismo do indivíduo, a razão e a emoção, as sensações e as percepções, o inato e o adquirido, e é das acções e das reciprocidades interactivas de tais dimensões do indivíduo que, progressivamente, emerge o pensamento e suas diferentes formas de pensar, como sinteticamente se exemplifica através da evolução do pensamento de uma criança. O pensamento de uma criança, em seu estado de desenvolvimento das operações concretas, caracteriza-se por sua velocidade e pela reversibilidade cognitiva, pelo abandono do intuitivo, da confusão do real com o irreal, do exterior com o interior. A partir de um tal estádio de desenvolvimento, o das operações concretas, iniciase o enfraquecimento dos comportamentos bruscos, violentos e impulsivos; começa o processo de mudança da sua imagem, da adaptação à escola e à comunidade, demonstrando maior concentração mental e interiorização das suas percepções e emoções. A eficiência de um tal estádio de desenvolvimento interdepende não só de desafios da sociedade, da família e da escola, mas, também, da maturação neurofisiológica, da maturidade psíquica e do desenvolvimento emocional. E, a coerência do pensamento do indivíduo, interdependerá da coerência da própria interioridade do indivíduo. Interioridade-exterioridade, acção-pensamento e suas interactivas e mútuas reciprocidades dão origem aos comportamentos inteligentes e adaptados, emanados das interacções do inconsciente e do consciente, da emoção e da razão. Das reciprocidades interactivas de tais dimensões, deste ou daquele indivíduo, emerge o seu psiquismo, estrutura dinamizadora ou bloqueadora do pensamento, pois, sendo o psiquismo efeito elaborado de processos neurocerebrais, bioquímicos e sócioemocionais ele é gerador de evolução, de totalidade, de auto-regulação, de reorganização, de adaptação e de comunicação; de temporalidade, actualização, inferência, autoreferência, etc., características essenciais dos processos e dos dinamismos, das aprendizagens, das evoluções e reorganizações. Por isso, qualquer tipo de aprendizagens interdepende da actividade do psiquismo individual, dos factores dos meios e das características individuais dos sujeitos, isto é, da inteligência, da idade, da motivação, das 26
experiências anteriores etc.. Resistências a tais interacções ou existências de sistemas de defesas podem gerar não só insuficiências a nível de aprendizagens, mas, também, deficiências cognitivas ou desvios comportamentais, visto a realidade, que se pretende aprender, ser filtrada pela estrutura conceptual existente no momento, a qual possui suas estruturas de integração e de organização, de eficiência e ineficiência, de activação e de inactivação, o que faz com que o pensamento de um indivíduo resulte do sucesso ou do insucesso das suas interacções consigo mesmo e com os meios. O aparelho psíquico, unidade central da cognição, desenvolve, desempenha e concretiza imensas, diversificadas e complexas funções que emergem e se integram em sua unidade. Assim, como a unidade do corpo, que apresenta partes, sistemas e aparelhos pode ser estudada isoladamente, também existem actividades psíquicas que podem ser analisadas separadas das demais, visto possuírem características e funções próprias, denominando-se estas “funções psíquicas”. Porém, o corpo tem uma configuração física, para cada aparelho ou sistema e o psíquico não tem. O psíquico manifesta, por um lado, apenas as suas actividades e funções que, por sua vez, são compostas por outras actividades mais simples, isto é, por sub-funções. Por outro lado, o indivíduo não nasce com o psiquismo superiormente formado, mas, progressivamente, vai-se desenvolvendo e formando através da acção do corpo e do desenvolvimento do psíquico da criança, a qual atinge certa plenitude no inicio da adolescência e a plenitude no auge da maturidade. Porém, qualquer que seja o estádio de desenvolvimento do psíquico do indivíduo, ele possui, em maior ou menor escala, necessidades do apoio de suas bases neurofisiológicas, emocionais, perceptivas, sensoriais, afectivas, cognitivas, experienciais e cognitivas, bases essenciais das entradas dos estímulos oriundos do exterior, das elaborações e dinâmicas dos estímulos interiores e das reorganizações e dinamismos dos efeitos das interacções de umas com outros. O conjunto de tais efeitos gera e desenvolve agrupamentos de funções: integradoras e aferentes, neuropsíquicas e cognitivas, afectivas e conectivas. Por sua vez, as funções geram aptidões, capacidades ou actividades, isto é, funções instrumentais, denominadas, consoantes as manifestações, de inteligência, memória, intuição, psicomotricidade, sensação e percepção, que, no seu conjunto, e, consoante a integração de seus processos e dinamismos, desencadeiam as maiores ou menores eficiências nas aprendizagens. A ausência de tais integrações ou o enfraquecimento de seus factores e agentes pode desencadear não só debilidades psíquicas, mas, também, bloqueamentos, desagregações e deteriorações do pensamento, o qual, gerando-se através do processamento do fluxo de ideias, deverá ser direccionado intencionalmente e, numa sequência lógica, possuir, princípio, meio e fim, o que nem sempre acontece tanto em relação ao real como em relação aos meios e aos contextos, às coerências e às crenças. As fragmentações do pensamento, as inibições, os bloqueios, as interrupções e as desagregações são do âmbito da patologia psíquica.
II – DESENVOLVIMENTO E FORMAÇÃO DA MENTE INDIVIDUAL
Sendo a realidade humana de um indivíduo indivisível e centro de sua própria identidade, ela está na sociedade e a sociedade encontra-se nela, está na cultura e a
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cultura está nela, está na espécie e a espécie está nela, pois é na espécie, numa sociedade e numa cultura que nascemos e nela estamos impregnados. Uma tal triunidade, geradora da indivisibilidade do ser humano, graças à mente do indivíduo, manifesta-se tanto corporal como mentalmente a partir da sua totalidade única e indivisível. Ora, sendo a forma e o modo de operar da mente efeitos das interactivas reciprocidades dos sistemas psico-corporais e socioculturais, a mente dinamiza os sistemas, orienta-os e controla-os; gera e activa funções, atitudes e comportamentos e, na sua intrinsidade vivificadora, não se pode isolar do cérebro como também o cérebro não pode ser isolado da mente. É por isso que deteriorizações da mente influenciam o cérebro-organismo e disfunções do cérebro-organismo influenciam a mente. Por isso, embora a mente transcenda o organismo do indivíduo, ela é, simultaneamente, emanente e, por isso, molda e organiza o psico-orgânico de acordo com as suas propriedades. É imaterial mas dinamiza o material, activa o simbólico, estimula o sensorial, impulsiona o motórico e unifica as funções psíquicas do indivíduo, gerando esse sucessivo acontecer individual captado pela própria consciência através de vivências e conteúdos de vivências, de emoções e sentimentos, desejos e afectos, percepções e volições, ideias e valores, esquemas e mapas mentais. E isto porque, na formação da mente, encontra-se o genético e o hereditário, o neurológico e o psicofísico, o experiencial e o cultural e tem como seu órgão físico-material não só o cérebro como também o organismo corporal. Ora, estando o cérebro humano programado para a aprendizagem, as aprendizagens desenvolvem a mente e suas funções estimulam as aprendizagens. Genético, hereditário, social, experencial, cultural e psíquico constituem então fundamentos essenciais da mente do indivíduo. O equilíbrio da funcionalidade mentecorpo encontra-se nas actividades neurocerebrais do indivíduo, harmoniosamente conjugadas com as condições históricas, pessoais e culturais, estimuladoras da sua afirmação, crescimento, expansão e realização. Por isso, circuitos bioquímicos e neuronais, funções psíquicas e mentais constituem os dinamismos essenciais não só das aprendizagens mas, também, de todas as hierarquias de atitudes e de comportamentos do indivíduo. Na base das aprendizagens e do desenvolvimento das construções do conhecimento encontra-se a reflexão sobre as próprias experiências e vivências, através da qual se gera e se desenvolvem regras e modelos mentais, os quais adaptar-se-ão as novas experiências, gerando não só mudanças, mas, também, novas adaptações e, por conseguinte, novos conhecimentos, isto é, configurações mentais da realidade, as quais actuam sobre ela, modificam-na e fazem compreender ao indivíduo o modo como se processa tal modificação. As anteriores modificações geram novos patamares e novas dimensões dos esquemas mentais e dos padrões comportamentais que, por sua vez, dinamizam e reorganizam as interacções do indivíduo com os meios, gerando modificações a nível de estruturas cerebrais e de funções psíquicas e mentais, potencializadoras de novas estruturas cognitivas, facilitadoras de novos relacionamentos e de novas reorganizações não só em relação ao aprendido, mas, também, em relação ao que o indivíduo se propõe a aprender. Os anteriores dinamismos cognitivo-estruturais, em recíprocas interacções com as funções psíquicas e mentais do indivíduo, orientam-o para seus necessários equilíbrios neuropsíquicos, emocionais e afectivos, essenciais aos necessários processos de adaptação ao real.
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Com efeito, as inadaptações ao real não só são efeitos de ausências de assimilações do real, mas, também, de demasiadas acomodações, o que pode gerar não só conflitos cognitivos, mas, também, perturbações comportamentais. No entanto, a resposta à necessidade de mobilidade cognitiva do indivíduo orienta-o na procura de dar sentido às suas experiências e, por isso, em tal processo de procura, o indivíduo não só reorganiza seus sistemas mentais, mas, também, cria novos para responder às situações e, adaptativamente, desafiar a realidade. Para conseguir esse novo estado, patamar e nível de equilibração, o indivíduo substitui os esquemas anteriores, agora desadaptados, por esquemas mais avançados e mais eficazes para adaptação ao meio. Estes novos esquemas geram novos padrões psico-comportamentais, cognitivos e psíquicos, que estimulam o indivíduo para novos comportamentos, desenvolvimentos de novas aptidões e competências, conhecimentos e saberes, os quais, por sua vez, reorganizam ou geram novas estruturas cognitivas e dão origem a novos mapas mentais. Das acções de suas atribuições emergem criatividades, mudanças e inovações. Reconhecendo-se as funções psíquicas e mentais por suas actividades, as principais são as do permanente acontecer e desenvolver funções e actividades, conjuntos de funções e de actividades, que, sendo activadas ou desactivadas pelo Eu do indivíduo em qualquer momento, são as representantes das suas potencialidades tanto físicas como psíquicas, racionais como emocionais, conscientes como inconscientes. Todas as potenciais actividades das funções do indivíduo são úteis, não só para os comportamentos, mas, também, para as aprendizagens, embora umas sejam mais úteis que outras em determinados processos ou circunstâncias como sucede, por exemplo, com as funções das estruturas neuropsíquicas da inteligência e da memória nos processos de aprendizagem e de desenvolvimento dos conhecimentos e dos saberes. A utilização e o desenvolvimento das actividades de tais funções não só modifi-cam as estruturas e os mapas cognitivos, mas, também, geram alterações nos níveis dos padrões neuronais, de seus circuitos e intercomunicações, nomeadamente a nível de interligações entre as células, nas fibras nervosas, nos mecanismos moleculares, e, em certos sistemas neurofisiológicos do cérebro, de maneira particular nos de maior intercomunicação do cérebro com o organismo, ou seja, a nível de amígdala, de hipocampo, de cerebelo, de medula espinal, etc.. A acção dos anteriores sistemas é de capital importância para as aprendizagens, visto as aprendizagens equilibradas deverem partir do sensorial e do perceptivo, do emocional e do cognitivo, isto é, dos sentidos e das percepções, das emoções e das cognições. É que, na realidade, parece seguro, cientificamente, que determinados sistemas sensoriais e motores, usados nas aprendizagens, influenciam a área cerebral onde a informação é armazenada, como sucede, por exemplo, quando um indivíduo interage com coisas vivas e objectos grandes através da visão e da côr. Tal tipo de aprendizagens influencia a acção do lobo temporal. Por sua vez, quando um indivíduo aprende acerca de objectos inanimados, ferramentas, mobílias, etc., isto é, através de sistemas manuais, tais aprendizagens influenciam não só o córtice frontal, mas, também, o lobo parietal, etc.. As anteriores e simples exemplificações demostram que o conhecimento efectuado através dos sentidos integra o indivíduo em si mesmo e relaciona-o com o meio envolvente, mobilizando, solidariamente, todos os sentidos do indivíduo, e, não apenas a visão e a audição, como tem sucedido até ao presente, mas, também, o tacto, o olfacto e a própria pele. Na realidade, o conhecimento processado a partir dos sentidos elimina o fosso, tradicionalmente aceite, entre o que é conhecido imediatamente e o que pode ser 29
conhecido por inferências, através de operações lógicas efectuadas com coerência, rigor e clareza, características essenciais da elaboração de uma activante e criativa linguagem do pensamento. As anteriores e essenciais características de sólidas aprendizagens, emergentes das intrínsecas, mútuas e recíprocas interacções dos sistemas sensório-motor e cognitivo do indivíduo, alicerçam-se, fundamentalmente, nos dinamismos de seus sistemas sensoriais e motores, emocionais e cognitivos, inconscientes e conscientes. De facto, os sentidos e seus interdependentes sistemas, face a um ou a vários sentidos, desencadeiam sequências de movimentos, emanados de padrões e de estruturas neurocerebrais, possuidores de memórias não manifestas e, por conseguinte, inconscientes, portadoras de sensações, de percepções, de tendências, de informações e de hábitos, não só são, estimuladores, mas, também, orientadores de constelações de neurónios e de suas respectivas funcionalidades. Tronco cerebral, amígdala, hipocampo, lobo temporal médio e neocórtice; sistema límbico e sistema racional envolvem-se e são envolvidos em tais processos, gerando aprendizagens, desenvolvidas e acumuladas de forma lenta, através de repetições e, expressas através de desempenhos, de acções e de verbalizações. Os anteriores processos, próprios da intrinsidade cognitiva do indivíduo, não só geram e modificam padrões cognitivos, mas, também, neurocerebrais, e, são mais de natureza perceptivo-sensorial e inconsciente que consciente. Porém, as aprendizagens modificam as capacidades dos neurónios, seus sinais e suas intercomunicações, e, tanto as estimulações como as modificações dos neurónios estimulam as aprendizagens e desenvolvem potenciais mnésicos. Os anteriores potenciais mnésicos ou de memórias são, a maioria das vezes, inconscientes como, de facto, é demostrado, sobejamente, por todas as correntes psicanalíticas, nomeadamente através da exploração e da análise dos traumas, dos recalcamentos, das emoções, dos sonhos, das intuições e das associações, fenómenos neuropsíquicos que não só alteram os padrões das fibras nervosas, mas, também, modificam os comportamentos cognitivos mnésicos e mentais do indivíduo. No entanto, os potenciais tanto podem facilitar as aprendizagens como inibi-las, bloqueá-las, distorcê-las ou mesmo deteriorá-las. E, isto, porque tais processos constituem uma hipercomplexa categoria de conhecimentos, que operam, em simultâneo, tanto com os potenciais como com as formas dos conhecimentos declarados, demostrando-se, então, a existência de processos mentais, cuja natureza é inconsciente e, por isso, não raras vezes, tal natureza torna-se matriz de conflitos, de entraves e de bloqueamentos, não só em relação ao consciente, mas, também, incompatível com os necessários comportamentos inteligentes do indivíduo. Comportamento inteligente, à luz da Psicologia social e das exigências dos sistemas educativos, é o comportamento que se orienta para a consecução de fins previstos, que se adapta aos meios, que soluciona os problemas apresentados pelos meios e pelas circunstâncias; que organiza, interioriza e vivencia os dados, evitando os erros e que representa as realidades através de símbolos. As anteriores características do “denominado” comportamento inteligente, excessivamente estimuladas pelos tradicionais sistemas de ensino-aprendizagem, opõem-se tanto à existência do comportamento como do pensamento divergente, caracterizado tanto pela exploração cognitiva como mental de várias soluções originais e diferentes para o mesmo problema, mas, convergente com a própria individualidade do aprendente. De facto, sendo a inteligência declarativa manifestação do resultado das interacções das múltiplas aptidões e capacidades do indivíduo: determinantes genéticas, 30
factores socioculturais, percepções, memória, aptidões espaciais e visuais, capacidades de compreensão e de inferência, capacidades de assimilação e de adaptação, de raciocínios indutivos e dedutivos, etc., as interacções de tais aptidões e capacidades, quer em quantidade como em qualidade, em intensidade como em eficiência, são diferentes de aprendente para aprendente. Daí o facto de tornar-se evidente que o indivíduo, que não obtém sucessos escolares, não é, necessariamente, por falta de inteligência, mas, fundamentalmente, por razões de natureza neuropsíquica, por ausência de estímulos e de motivações, por ausências ou não aproveitamentos das oportunidades educativas, por discrepâncias entre suas emoções e seus processos cognitivos ou por outros problemas interdependentes de alterações de personalidade.
III - DESENVOLVIMENTO DE ESTRUTURAS E DE DINAMISMOS DO CONHECIMENTO
Emergindo a mente humana dos resultados das interacções dos sistemas e subsistemas bioneuropsíquicos do ser humano, apesar de ainda muito desconhecidos, as suas potencialidades e comportamentos, as ideias, os conceitos, as associações, as regras, os esquemas e os mapas mentais apresentam-se como comportamentos manifestos. As suas manifestações, porém, tanto intrínsecas como extrínsecas, psicológicas como sociais, divergem de indivíduo para indivíduo. E isto não só porque os seus dinamismos genéticos e hereditários são diferentes, mas, também, as suas potencialidades de filtração, de absorção e de interiorização das realidades factuais dos meios e dos ambientes, das oportunidades e das circunstâncias, que não só estimulam constelações neurais e fibras cerebrais, mas, também, emoções, sentimentos e afectos, crenças e ideias. Por isso, tanto as Neurociências do Conhecimento como as Ciências da Mente devem alicerçar-se, fundamentalmente, sobre a Neuro-psicofisiologia, a Sociologia e a História da Ciência e, da simbióse de todos esses dados, emergir a Ciência do Conhecimento. Tal Ciência deverá possuir como seus alicerces fundamentais não só os estudos dos conhecimentos e das mentes, mas, também, as análises das diferenças entre seres humanos, as suas normalidades e excepções, as suas biotipologias e personalidades, os seus estímulos e motivações, a inteligência natural e a artificial, os contextos sociais e os ambientes culturais dos indivíduos, as modalidades sensoriais e os sistemas simbólicos, os sistemas representativos e mentais, operacionais e cognitivos dos indivíduos. Com efeito, emergindo o cognitivo-individual das hipercomplexas variáveis anteriormente enunciadas, que se encontram na base das estruturas cognitivas, estas necessitam de permanentes estímulos e de constantes motivações para prosseguimento de suas actividades e concretização de seus fins. Para tal urge não só o acompanhamento do desenvolvimento das estruturas de cognição do indivíduo-aprendente, mas, também, a identificação e o reconhecimento de seus processos cognitivos e habilidades intelectuais nas diferentes fases do seu desenvolvimento, escolhendo-se, assim, criteriosa e adaptativamente, as actividades e os conceitos dentro dos objectivos a atingir, tendo em consideração que, as tarefas a proporem aos aprendentes, deverão ser consentâneas com seu ritmo de desenvolvimento, evitando, então, discrepâncias entre as 31
necessidades intelectuais das tarefas da aprendizagem e as habilidades anteriormente desenvolvidas pelos aprendentes. No entanto, emanando o desenvolvimento cognitivo da resolução dos conflitos derivados dos processos e dos mecanismos de assimilação, de acomodação e de equilibração, ou, da acção e experiência, da confrontação e do desafio, da reflexão e da integração, factores causais do desenvolvimento cognitivo. O desenvolvimento construído sobre tais factores, mobilizadores das potencialidades do aprendente, desencadeiam neste estímulos e motivações, autonomia e independência. A partir daí tanto a etero-avalição como a auto-avaliação positiva das tarefas, das atitudes e dos comportamentos do aprendente orientam este verso a auto-eficiência e eficácia. No caso de crianças, adolescentes ou jovens, em processos de formação escolar ou académica, torna-se necessário o permanente encorajamento por parte dos professores, a transmissão de confiança, a congratulação com seus sucessos, a escuta das suas dificuldades e a permanente disponibilidade de ajuda. De facto, sendo o ser humano uma realidade indissociável, e, possuindo intrínseca necessidade de conhecimentos pertinentes, aplicáveis e eficazes, é a partir do conhecimento de suas capacidades de aplicação e de inserção nos contextos que ele desenvolve sua autoconsciência de desenvolvimento cognitivo. Por isso, desenvolver o cognitivo implica não só activar as estruturas e os dinamismos neuronais do indivíduo, mas, também, os genéticos, constituindo-se, então, um positivo feedback entre genes, neurónios e cognição. A acção de um tal feedback, envolvedor dos genes, não só activa a funcionalidade dos neurónios sensoriais, de capital importância para a memória de longo prazo, mas, também, estimula, activa e consolida as interfuncionalidades das restantes estruturas e dinamismos, tanto moleculares como neurocerebrais, cognitivos como mentais. Desde as bases do seu desenvolvimento o ser humano sente que é uma unidade e, tanto seus comportamentos psíquicos como físicos ou motores não são uma sequência linear uns dos outros mas sim uma realidade, apesar de suas manifestações poderem tornarem-se mais ou menos manifestas em tempos diferentes, pois, de um lado, encontra-se a subjectividade onde o corpo do indivíduo vive, e, do outro lado, a forma objectiva que o corpo exprime, visto ser apenas através da análise das atitudes, dos comportamentos e das acções que o outro poderá compreender o que vai no interior do analisando. Não sem razão, por isso, Piaget centralizou suas investigações sobre o paradigma do desenvolvimento integral e integrado da criança, desenvolvimento que envolve predomínios essenciais, isto é, o psicomotor, o afectivo e o cognitivo, dimensões de um todo indissociável, e, vivenciado não só através dos comportamentos dos indivíduos, mas, também, através das suas dinâmicas da cognição. Por tal razão, criança que possua problemas a nível afectivo, caso estes não sejam sanados ou resolvidos, manifestará, com certeza, dificuldades a nível de aprendizagens nas quais se incluem dificuldades a nível psicomotor, a nível de consciência de si mesmo, de linguagem, de representações mentais, etc., etc.. Constituindo os resultados das interacções das anteriores variáveis os fundamentos dos processos pessoais, cognitivos e mentais do ser humano, este encontra-se, vive e desenvolve-se em meios e ambientes reais e concretos. Família, comunidade e escola, constituem factores essenciais de seus posteriores desenvolvimentos. Estímulos emanados do interior do indivíduo e situações motivacionais oriundas de seus meios facilitam ou obstaculizam seus envolvimentos experienciais ou suas vivências situacionais, o que influencia o desenvolvimento de suas expectativas e de seus modos de operacionalizar 32
tanto cognitiva como emocionalmente, visto os efeitos das acções no social não só estimularem ou condicionarem o desenvolvimento das expectativas individuais, mas, também, os possíveis investimentos cognitivos e afectivos, emocionais e intelectuais. As anteriores componentes comportamentais de um indivíduo são geradoras da dinâmica nuclear tanto das expectativas de resultados como das expectativas de eficácia pessoal, o que conduzirá ou não o indivíduo ao desenvolvimento de autoconfiança pessoal e, por conseguinte, à organização e reorganização de suas atitudes e comportamentos orientados para a eficácia, a eficiência e o sucesso. O construto de auto-eficácia, investido em contextos escolares, é pilar essencial de desenvolvimento de consolidação de processos cognitivos e de sucessos escolares. Por isso, as experiências de sucesso e de insucesso, bem como determinadas práticas de ensino-aprendizagem, podem afectar, positiva ou negativamente, as percepções de auto-eficácia dos educandos. Estas percepções influenciam os comportamentos dos alunos ao nível da escolha de diferentes tipos de actividades, do esforço e persistência colocados na execução das tarefas e no desenvolvimento das funções mentais, bem como em seus padrões de pensamento e de reacções emocionais. Por isso, uma eficácia pessoal elevada pode realizar com sucesso determinados tipos de tarefa, e, levar, por um lado, os educandos a desenvolverem mais esforços e a se envolverem mais nas tarefas escolares, o que, sem dúvida implicará uma melhoria na sua realização escolar. Por sua vez, os professores com elevados níveis de eficácia, ao acreditarem que a aprendizagem dos alunos pode ser influenciada pelo ensino eficiente, dedicarão mais tempo a assuntos ligados com os processos de ensino-aprendizagem e assumirão responsabilidades pelo fracasso de seus alunos. Apesar disso, face à discrepância existente entre esforços e resultados, os seus efeitos poderão gerar o que Seligman designou por “desânimo aprendido”, e, cuja causa de tal desânimo reside, fundamentalmente, na dinâmica estrutural das percepções do indivíduo, as quais, sendo modificáveis, organizáveis e reorganizáveis não só estimulam ou condicionam a auto-imagem do indivíduo, mas, também, os seus processos de cognição e os seus níveis de captação das informações, características essenciais não só do desenvolvimento das aprendizagens, mas, também, das elaborações dos padrões individuais de cognição. Sendo os padrões de cognição processos neuropsíquicos e mentais, relativamente estáveis, do controlo cognitivo e da forma como o indivíduo percepciona, pensa, aprende, resolve problemas e se relaciona com os outros, alicerçados sobre as diferenças individuais, as quais caracterizam não só integração dos acontecimentos exteriores, mas, também, as formas de organização e de processamento da informação e das experiências individuais. É sobre tais padrões que assentam os estilos de aprendizagem dos indivíduos, isto é, os seus modos de respostas aos estímulos físicos, sociais, ambientais, emocionais e psíquicos. Ora, emergindo os estilos cognitivos fundamentalmente das estruturas e dos dinamismos das percepções dos indivíduos e, sendo os estilos de aprendizagem fortemente condicionados pelas variações das condições e dos métodos dos processos de ensino-aprendizagem, a eficiência de seus desenvolvimentos requer maturação neurobiológica e maturidade psíquica e emocional do sujeito. Apesar disso, no entanto, a continuidade bio-funcional do indivíduo nem sempre manifesta continuidade no desenvolvimento cognitivo. E isto porque o desenvolvimento das capacidades é um processo latente e não necessariamente uma permanente e contínua manifestação. Estas manifestações, porém, exteriorizam-se manifestam-se nuns indivíduos através de transformações estruturais, noutros através da manifestação de desenvolvimentos de aptidões e de capacidades, através de acentuados desenvol-
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vimentos e de consolidações nos modos de operar, nas eficiências das lógicas, das analogias e das transferências mentais. No entanto, tanto os processos de maturação como os mecanismos de maturidade psíquica, de estabilidade emocional como de desenvolvimento cognitivo, não se processam e nem se efectuam de forma linearmente previsível, controlada ou lógica. São, não raras vezes, caracterizados por conflitos e por dinamismos resultantes de forças antagónicas, que se chocam e se gladiam, mas, no fundo, completam-se. E isto porque, por um lado, a estrutura psíquica do indivíduo apela à vivência no princípio do prazer, à realização do imediato, da vivência sem tensões e com envolvimento do próprio inconsciente ou não-consciente. Essa necessidade do psico-intelectual e cognitivo de viver sobre o princípio do prazer entra, não raras vezes, em conflito com a zona consciente do indivíduo, dominada pelo princípio da realidade, o qual, impondo restrições e condicionalismos ao princípio do prazer, deverá fazer com que o indivíduo se adapte ao mundo exterior, o qual, por sua vez, apresentar-se-á como princípio revelador de processos cognitivos e mentais, de atitudes e comportamentos que, por sua vez, orientarão o indivíduo para a tomada de consciência das exigências do meio-ambiente e para as necessidades não só de as aceitar, mas, também, de lhe dar respostas. A satisfação das exigências do exterior pelo indivíduo orienta-o não só para a adaptação, mas, também, gera nele mecanismos de inserção na realidade social. A partir daí, seu comportamento interior, bem como sua autoconsciência descortinam quais as funções do seu inconsciente que podem ou não ser satisfeitas. As necessidades fundamentais não satisfeitas tornar-se-ão matrizes de anti-valências comportamentais, de conflitos intra-psíquicos, de inseguranças e mal-estares; de complexos, de sentimentos de culpabilidade, de angústias, ansiedades e depressões. E isto porque todas as necessidades, atitudes e comportamentos inconscientes, mais ou menos contidos, actuam sobre o comportamento consciente, e influenciam o pensamento elaborado e consciente do indivíduo. Não raras vezes, porém, o inconsciente asfixia, descontrola e desregula o próprio consciente.
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CAPÍTULO III
MECANISMOS PROCESSUAIS DAS EFICIÊNCIAS E DAS INEFICIÊNCIAS COGNITIVAS
Emergindo o pensamento humano das interacções que o indivíduo efectua e mantém com a realidade, os objectos, as coisas, as pessoas e as circunstâncias, tanto umas como outros resistem à acção intencional do indivíduo, e, isto, tanto pelas circunstâncias como por sua especialidade e temporalidade; tanto pelas suas formas como por seus conteúdos. Da parte do sujeito humano, do indivíduo aprendente, os mecanismos de resistências subjacentes são mais acentuados nuns indivíduos que noutros, e, tais resistências encontram-se na inadequação do sujeito ao objecto, na falta de familiarização com este, na ausência de percepção das suas formas, de captação e de identificação dos seus conteúdos, dos seus significantes e dos significados. É que, de facto, uma tal relação do sujeito-indivíduo com o universo exterior a si mesmo implica adaptação e enquadramento, acomodação e assimilação, apreensão e recombinação, interiorização e vivência. O conjunto de tais processos de elaboração do pensamento individual, de imagens, associações e raciocínios daí emanados emergem da acção do organismo, de suas estruturas neurocerebrais, de seus movimentos biopsíquicos, de suas disposições e disponibilidades para a acção; das orientações de suas intencionalidades e das organizações de suas próprias percepções. A energia e a força vitalizadora de tais intencionalidades, movimentos, adequações, organizações e reorganizações encontram seus elementos componentes de base nos dinamismos somestésicos e sensoriais do indivíduo apreendente, visto aqueles encontrarem-se nas bases das captações das informações e das mensagens, oriundas tanto do interior como do exterior do indivíduo, apesar de, só por si ou isoladamente, não possuírem as necessárias potencialidades para identificarem o todo da realidade envolvente. Desenvolvimento cognitivo, psicofísico, informativo e interpretativo, emergindo de tais dinamismos, desenvolvem-se e aperfeiçoam-se, reforçam-se e consolidam-se reciprocamente, originando estruturas de representações e de categorizações, de imagens e de associações, de esquemas cognitivos e de mapas mentais individuais, factores essenciais não só aos desenvolvimentos dos pensamentos e de suas sequenciações, mas, também, das vitalidades e organizações. Os anteriores processos de desenvolvimento, tanto da cognição como do raciocínio, da aprendizagem como da afectividade podem ser bloqueados, inibidos ou reduzidos por mecanismos de fuga do indivíduo à realidade, à envolvência e à participação activa; por receios ou medos; por bloqueamento das emoções, dos afectos e dos sentimentos; por fuga aos conteúdos e fixação nas formas; por estranheza do novo e não vivência interiorizada do antigo; por medos e ansiedades, angústias e depressões, etc., o que não só gera indivíduos com pensamento fugidio à realidade, mas, também, inibido, 35
com pensamento lento ou apático, distraído ou ilógico, incoerente ou desagregado, imperseverante ou vazio de conteúdo, fantasmagórico ou autista, etc.. Frustrações, inadaptações e impotências apresentam-se, então, como denominadores básicos das estruturas e dos dinamismos de tais personalidades. As simples expectativas ou desejos não realizados, os esforços não compensados, os investimentos não rentabilizados podem tornar-se e tornam-se indutores de bloqueamentos de emoções, desencadeadores de sentimentos negativos ou de associações importadoras de traumas e de vivências auto-punitivas, etc., etc.. O desencadeamento de tais atitudes e comportamentos, enumerados a título de exemplo, não só podem bloquear as emoções do indivíduo, mas, também, desviar suas energias, intencionalidades e acções do objecto ou objectos, das circunstâncias ou dos meios de se adaptar à realidade ou realidades desejadas ou envolventes. A continuação de tais atitudes tende a gerar comportamentos de inadaptações e de inadequações a esta ou àquela realidade, dessensibiliza o indivíduo, gera-lhe sentimentos de inferioridade, apatia na sua vontade e sensações de impotência face às suas intrínsecas necessidades de reorganizar suas relações com a realidade. Imbuído de tais temores, o sistema límbico do indivíduo inibe-se, os estímulos do interior reduzem-se e a força das motivações, oriundas do exterior, deixa de gerar os necessários efeitos positivos. O indivíduo tende, então, a entrar em seu ciclo vicioso, e, um tal ciclo, originado por bloqueamentos das emoções, tende a formar ansiedade patológica, comportamento de extremo prejuízo à necessária actividade do neocórtice. Estas inadequações e inadaptabilidades entre sistema límbico e sistema racional geram no indivíduo não só comportamentos ineficientes, mas, também, inadequados, reduzidos e, sumamente, empobrecidos, não só a nível de estruturas e de dinamismos sensoriais e perceptivos, mas, também, emocionais e cognitivos. De facto, pobreza de sentimentos e bloqueamentos de emoções não só empobrecem o conteúdo do ser do indivíduo, mas, também, depauperam sua linguagem, seus fluxos de comunicação e de enobrecimento, tanto dos significantes como dos significados, visto a sua força de acção, dinamismo e mobilidade permanecer não só bloqueada, mas, também, não raras vezes, involutiva. Por isso, o pensamento não flui, as associações mentais não se efectuam e os raciocínios permanecem em seus patamares de primarismos comportamentais, fugidíos às realidades envolventes e às expectativas e necessidades dos indivíduos, e, com manifestas incoerências ou desagregações sem directa aproximação do objectivo, alvo do conhecimento, o que fará com que o sujeito cogniscente se desmotive, se torne apático e se isole, interiormente, em pensamentos e raciocínios circulantes, sem fluidez e inadequados aos objectivos, os quais, não raras vezes, passam a dominar as estruturas neurocerebrais da quase totalidade do psiquismo individual. Os anteriores comportamentos não só fazem com que o indivíduo não só desenvolva, mas, também, elabore hierarquias de medos face a novas emoções, sentimentos e afectos, e, também, possua medo de novos pensamentos e de novos raciocínios. O medo irracional ou inconscientemente recalcado passa, então, a dominá-lo. Medos, pânicos e fobias da mais variada natureza desencadeiam-se, tomando posse do indivíduo, e, suas necessárias e recíprocas interacções entre inconsciente e consciente, permanecem em ruptura. Crianças, adolescentes, jovens ou adultos com suas emoções longamente bloqueadas geram couraças e mecanismos de defesa à realidade, ao novo e ao diferente, e, sua energia interior transforma-se em raiva, agressividade e ódio; ansiedades e tensões musculares. 36
Os comportamentos de tais indivíduos passam a ser inadaptados, reactivos ou neuróticos. Os seus conflitos interiores, por um lado, vão-se acumulando, as suas sensibilidades e afectos desaparecem e o seu processo de despersonalização manifestase através de ideias fixas, paranóias, psicoses. Por outro lado, um vasto conjunto de manifestações pertencentes aos domínios do psicopatológico aparecem. Quando os sentimentos, as emoções e os afectos permanecem bloqueados, as sensibilidades proprioceptivas do indivíduo reduzem-se. Os movimentos e os fluxos psicomotores asfixiam-se e o indivíduo encerra-se em seus próprios auto-bloqueamentos, com nefastos, negativos e prejudiciais efeitos a nível de sensibilidades, a nível do cognitivo, do intelectual e do mental. Entre interior e exterior geram-se, então, rupturas em suas fontes de comunicação, e, tanto os desequilíbrios emocionais como as obnubilações da consciência sucedem-se. A partir de um tal nível de disrupção individual o cérebro deixa de controlar os comportamentos, e, as ansiedades, as angústias, os medos e os pânicos tomam conta do indivíduo. Emoções patológicas, bloqueamentos neurocerebrais, profundas sensações de mal-estar consigo mesmo e com os outros, e, doenças mentais de variadas manifestações caracterizam, então, o comportamento da pessoa em causa. Um tal conjunto de processos inicia-se, geralmente, com o bloqueamento das próprias emoções, o qual gera mal-estar, tristeza inicial, medo, passividade, inadaptação e sensações de fraqueza, de debilidade ou fragilidade. A negatividade, então, instala-se e os sentimentos de incapacidade, de inutilidade e de inferioridade passam a elaborar sua auto-imagem negativa. A partir daí as aquisições dos conhecimentos são sofridas, as depressões são constantes, as acentuadas fugas à realidade são permanentes e as profundas dependências dos outros são massacrantes. O universo intrapsíquico de um tal indivíduo é resultante de conflitos internos, de auto-avaliações negativas, de hipersensibilidades e de exagerados autocontrolos, o que desencadeia rupturas nas necessárias sequências cognitivo-afectivas e emocionaisadaptativas. Medos, passividade, desinteresse, desmotivação, irrequietude, mal-estar generalizado caracterizam então os comportamentos de tal aprendente. As verdadeiras e reais necessidades de tal indivíduo ficam por satisfazer, os seus desejos e as suas emoções permanecem bloqueados, as suas pulsões e intencionalidades não encontram seus objectivos e direccionamentos e, então, suas experiências emocionais são filtradas negativamente, o que, não raramente, orienta o indivíduo para atitudes e comportamentos auto-punitivos, masoquistas ou sádicos. As análises efectuadas anteriormente demostram, sobejamente, que emoções, sentimentos, afectos e cognições são dimensões integrantes de uma só e única realidade: a do indivíduo. A integração e positividade de tais dimensões são absolutamente indispensáveis para uma eficiente aprendizagem, para uma positiva auto-avaliação, para coerência comportamental, contínua disponibilidade e abertura a novas realidades, aquisições, aprendizagens e comportamentos, visto maximizar aprendizagens e conhecimentos implicar não só disciplinar o pensamento, mas, também, auto-organizá-lo, o que, por sua vez, efectuará organizações e reorganizações de mais e melhores potenciais cognitivos. Ora, encontrando-se a reciprocidade das anteriores características nos fundamentos dinamizadores de uma autoconsciência positiva, amplamente difusa e interinfluenciadora de seus subsistemas, as suas energias dinamizadoras e activantes emergem das naturezas, acções, características e qualidades das inseparáveis reciprocidades comportamentais do Eu corporal e do Eu psíquico do indivíduo. Estas interacções, simultaneamente geradoras de luz e de opacidades, encontram-se na base dos progressi-
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vos conhecimentos e dificuldades, das aberturas do indivíduo e de seus encerramentos, das introjeccões auto-cognitivas e das projecções individuais. Uma tal luz, a do auto-conhecimento, não só ilumina, mas, também, activa os sentidos e os órgãos dos sentidos do indivíduo, os seus subsistemas sensoriais e perceptivos, emocionais e atractivos, importadores de sinais, de informações e de mensagens para o cérebro, oriundas das mais diversas dimensões da dinâmica do somático do próprio indivíduo. No entanto, os canais importadores e transmissores de tais informações para o sistema nervoso central e para as fibras nervosas são diferentes de indivíduo para indivíduo, não só em quantidade, mas, também, em qualidade pulsional e energética e envolvem a totalidade do indivíduo, nomeadamente a sua dimensão cutânea, a medula espinal, o tronco cerebral, o sistema límbico, os córtices cerebrais, etc., e, têm, como seus suportes de comunicação, não só as fibras nervosas, mas, também, a corrente sanguínea. Por isso, sensibilidades interiores e viscerais, sensibilidades tácteis e somatossensoriais, músculos e tendões desempenham funções capitais nos processos de activações de tais patrimónios informativos do indivíduo. Endossistemas, mesossistemas e exossistemas, sob a acção marcante dos macrossistemas, agem e interagem sobre a própria individualidade do ser humano, e, este, torna-se um ser único, indivisível e diferente de todos os outros, adaptando-se, modificando-se ou inovando-se consoante as acções e as orientações que dá a seus próprios subsistemas. De tais orientações interdependerão não só as intensidades, mas, também, as qualidades da energia vital de cada um, seus próprios patamares de expectativas, suas interacções sociais e seus próprios estilos de cognição, factores essenciais não só ao alargamento e consolidação de sua consciência social, mas, também, fundamento do reforço de sua consciência individual. No entanto, constituindo a consciência individual o cerne da identidade do indivíduo, esta alarga-se, organiza-se e reestrutura-se em função dos níveis e dos estilos de aprendizagens, dos dados introduzidos pelos vários tipos de memória e pelos maiores ou menores graus de confluências dos subsistemas constituintes do indivíduo em sua unidade biossociopsíquica. Consciência individual e consciência social, consciência nuclear e alargada, interioridade e exterioridade, inconsciente e consciente constituem as bases essenciais de uma tal unidade do humano. Sendo uma tal unidade realidade, ela tende, via normal, para outras realidades, e, tomando consciências destas, gera no indivíduo consciência de sua própria existência e, através desta, progressivamente, vai tomando consciência dos outros, dos meios e das circunstâncias, dos factos e dos fenómenos, dos objectos e das coisas, das relações entre estes, entre si e os outros e, por tais meios, desenvolve memórias, raciocínios, imagens e associações e modifica não só as relações entre os seres, entre si e os outros, mas, também, consigo mesmo e com suas auto-imagens, desenvolvendo linguagens e comunicações, gerando inovações e mudanças, criatividades e necessidades de transcendência. No seio de um tal dinâmico existir, a realidade que o indivíduo encontra diante de si, não raras vezes, escapa tanto a seus esquemas como a seus mapas mentais. Entre ele e a realidade, entre seu interior e exterior, geram-se conflitos, mas, tanto as intencionalidades de suas estruturas e dinâmicas neurocerebrais como sua autoconsciência, orientadas verso os meios e as circunstâncias, as pessoas, os outros e as relações, moldam-se e adaptam-se mútua e reciprocamente. O “em si mesmo” do indivíduo, o sujeito do conhecimento e o objecto cognoscível interagem, adaptam-se, dinamizam-se 38
e geram conhecimentos, sem radicalismos nem certezas e abertos a paradoxos de evolução e de mudança, de reestruturação e de organização. E tudo isto porque conhecimentos e raciocínios, esquemas mentais e mapas associativos emergem mais da dinâmica totalizante do sujeito cognoscente que da realidade cognoscível, constatações acentuadamente evidenciadas, por exemplo, quando uma criança transita de seu estádio de operações pré-operatórias para as operatórias e o adolescente das operatórias concretas para as abstractas ou formais. Entretanto, a sua consciência individual como o seu discurso interior mudam não só a nível de percepções das realidades, mas, também, a nível da relação com elas. E, isto, não só a nível das dimensões, mas, também, a nível de quantidade e qualidade. Tanto essas modificações como as mudanças tornam-se alavancas dinamizadoras de novos processos sensoriais e perceptivos, emocionais e cognitivos, os quais, por sua vez, ramificam-se, expandem-se, difundem-se e orientam-se verso realidades singulares, estimuladoras de novas aptidões e capacidades, destrezas e habilidades gerais e específicas. Estas últimas tornam-se, então, geradoras das características essenciais deste ou daquele tipo de comportamento, desta ou daquela forma de conhecer, de sentir e de percepcionar, efeitos das interacções da consciência individual e da identidade pessoal com as características dos meios, das realidades, dos objectos e das pessoas; das circunstâncias e das situações. Um tal conjunto de agentes e de factores activa ou inibe as pulsões, dinamiza ou não as emoções, estimula ou não a vontade e facilita ou não o encontro das intencionalidades neuropsíquicas dos indivíduos com as realidades exteriores. De tais encontros, e, de seus maiores ou menores graus, geram-se níveis de adequação entre vontade, intencionalidades, pulsões e emoções que, por sua vez, constituem os fundamentos alicerçadores das maiores ou menores eficiências cognitivas. No seio de tais hierarquias, de maiores ou menores eficiências cognitivas, o espírito anímico do indivíduo, o seu élan vital, a sua força de vontade, o seu equilíbrio e dinâmica somatopsíquica são de valor inquestionável para uma tal eficiência e sucesso, visto, no ser humano, nada ser alheio a seus equilíbrios e comportamentos, aprendizagens e desenvolvimentos. Organismo e cérebro, sistema imunológico, sistema nervoso central, sistema periférico, etc., constituem não só alicerces dinamizadores dos próprios equilíbrios somatopsíquicos, mas, também, dos processos e dinamismos de aprendizagem. A relação positiva com os objectos cognoscíveis gera eficiência em tais processos, visto o encontro com a realidade ter facilitado as motivações desencadeadas e os envolvimentos efectuáveis, constituindo-se, assim, pressupostos essenciais de uma positiva programação neuropsíquica e mental. A orientação e a incidência de uma tal programação sobre os conteúdos e os contextos das aprendizagens a efectuar desencadeiam estímulos e motivações para a criação e o desenvolvimento, a produção e a reprodução de mapas mentais, os quais, por sua vez, orientam o sujeito cognoscente não só para as descobertas de novos métodos, mas, também, de novas estratégias do aprender e do viver, do sentir e do percepcionar. A não aceitação desta ou daquela emoção, imagem, associação ou a ideia de que mapas parciais ou imperfeitos, desordenados ou obscuros não servem, as inseguranças e as faltas de confiança pessoal, os medos ou os receios do novo ou do diferente, etc., são factores que em nada favorecem uma programação neuropsíquica positiva e eficiente. Porém, ainda a tal nível, os medos, os pânico, as ansiedades e as angústias, quando desencadeadas de maneira profunda e de modo irracional não só geram generalizado mal-estar, mas, também, bloqueamentos e asfixias a nível psico-corporal pois, se os objectos reais ou fantasmagóricos apresentam-se como ameaçadores à inte39
gridade do indivíduo, as inexistências de objectos, directa ou indirectamente, geradoras de sensações de perdas antecipadas ou existentes, são desencadeadoras de angústias e, por conseguinte, de componentes de depressões. E, tanto as ansiedades como as angústias, geradas por medos reais ou fantasmagóricos, são transformadas, pelo indivíduo, em entidades ameaçadoras não só da sua integridade psicoemocional, mas, também, dos desenvolvimentos de seus equilíbrios cognitivos e intelectuais, mentais e afectivos. As anteriores causalidades de perturbações, de desequilíbrio e de doenças mentais indiciam, à priore, a existência de desorganizações emocionais no cérebro. Ora, como a emoção e a cognição são dimensões da mesma realidade individual do ser humano, caso as pretendêssemos hierarquizar, diríamos que a emoção persegue sempre a cognição, e, a cognição pode ou não estimular a emoção, facto que conduz o próprio cérebro a discernir que algo é positivo ou negativo mesmo antes de o conhecer. No entanto, a nível de processos cognitivos, cerebralmente, estes processam-se em localizações diferentes dos processos emocionais, não significando isto que as suas bases de sustentação não sejam as mesmas, e, isto, apesar dos processos cognitivos possuírem mais flexibilidade e adaptabilidade que o próprio processo emocional. Porém, tanto os processos emocionais como os sentimentais e os afectivos envolvem muitas mais características, necessidades e existências que os próprios processos cognitivos. Torna-se evidente, por isso, que desequilíbrios e rupturas entre emoções e cognições são geradores não só de perturbações a nível do pensamento, mas, também, do corpo; a nível de estados da personalidade do indivíduo como a nível de interacções e de relações interpessoais e inter-realidades. É que, na realidade, tanto o equilíbrio emocional como o equilíbrio dinâmicocognitivo implicam não só activação, mas, também, dinamização dos sistemas somestésicos do indivíduo, de seus sentidos e órgãos dos sentidos, de suas percepções, sentimentos e afectos. Com efeito, tanto a ausência de emoções como os bloqueamentos destas não só perturbam a sistémica unidade do ser humano, mas, também, podem dissociá-la. E isto porque a ausência de emoções não só desestimula ou inactiva a própria consciência do indivíduo como também a perturba, ofusca e obnubila, fazendo, simultaneamente, com que os dinamismos cognitivos do indivíduo permaneçam sem as necessárias e imprescindíveis energias para a sua actuação e respectiva dinâmica. De facto, emoção, consciência e razão são sistemas reciprocamente interdependentes e, por isso, motores de acção da própria unidade psico-corporal do ser humano. E isto porque, se por um lado, as emoções secundárias agem essencialmente sobre o mental e o cognitivo do indivíduo, as emoções de fundo e as primárias agem sobre os estados internos do corpo, sobre seus sistemas de auto-regulação, somestésicos, sensoriais e perceptivos e activam a consciência da própria identidade do indivíduo. É que emoções geram sentimentos, sentimentos geram centros de interesses e orientações comportamentais, e, orientações comportamentais desencadeiam estímulos e motivações tanto a nível psico-comportamental como mental, cognitivo como corporal. Por sua vez, a existência de emoções bloqueadas gera no indivíduo disfunções a nível do sistema vegetativo e imunológico, rigidez muscular, percepções somáticas de angústia, desprazeres e sensações de profundo mal-estar. E, isto, graças às acumulações e ausências de descargas dos potenciais bio-eléctricos existentes no próprio indivíduo. A ansiedade, a angústia, o desprazer e o mal-estar minam não só os mecanismos superiores da mente humana, mas, também, corroem os fundamentos da personalidade 40
básica do indivíduo, pois as sensações de impotência invadem-o, os complexos de inferioridade possuem-o, as suas percepções alteram-se, a sua consciência fica obnubilada e a sua razão, ficando sem a necessária vitalidade, ofusca-se. Além dos anteriores efeitos das ausências, perturbações e disfunções das emoções, tais disfuncionamentos, em geral, inibem, de forma acentuada, não só os dinamismos biopsíquicos da cognição, mas, também, as capacidades das funções mentais do ser humano, gerando-se, simultaneamente, mecanismos de resistência ao novo e ao diferente, processos de supressão da própria evolução, maturidade e crescimento; ausência de comunicação tanto com o exterior como com seu próprio interior, rígida fixação em certas ideias, etc., conjuntos de factos e de atitudes comportamentais desencadeadores de personalidades neuróticas e, não raramente, psicopatas. No seio de uma tal desorganização pessoal, o indivíduo sente-se em desarmonia consigo mesmo, entra em conflitos, sente sentimentos de culpa, de incapacidade e de inutilidade, dificuldades de se relacionar com os outros, com seus meios e ambientes e perde seus mecanismos de auto-regulação biopsicossocial, o que o deixa despido das necessárias energias para enfrentamento da realidade e adaptação aos meios ambientes. Porém, enfrentar-se e assumir-se a si mesmo e adaptar-se à positividade dos meios são as alavancas essenciais da reedificação do próprio indivíduo. Em relação à adaptação aos meios, o próprio Pasteur, nos finais da sua existência afirmou : “o germe não é nada, é o terreno que é tudo”. Por isso, positividade dos meios e acção psico-corporal do indivíduo são os factores essenciais não só dos seus equilíbrios e crescimentos, mas, também, da sua autoconfiança e maturidade individual. É através do psico-corpo que o indivíduo interioriza suas experiências, elabora seus pensamentos e organiza seus raciocínios, suas imagens mentais e suas representações da realidade.
I – DINAMISMOS ESTRUTURAIS DO PENSAMENTO NAS APRENDIZAGENS
Sendo o pensamento resultado das funções superiores da mente individual, ele manifesta-se como sendo a entidade dinâmica da própria actividade psíquica. O sujeito pensante atribui-lhe um significado e, o sentido deste é gerado pelas sensações, percepções, emoções e vivências do próprio sujeito. O sujeito, no entanto, é um ser de movimentos e de gestualidades e, estes, são facilitadores da interiorização das acções, da elaboração e desenvolvimento dos símbolos e da criação das representações mentais das realidades exteriores. Por isso, tudo o que é sentido, percepcionado e vivido pelo sujeito: emoções, sentimentos, imaginação, conhecimento, juízo, intenções, etc., são partes integrantes e indissociáveis do pensamento. Pensar, resulta, então, dos efeitos das interacções vividas consigo mesmo e com o mundo, ou seja, do seu falar silencioso consigo, com as próprias realidades dos meios e com as circunstâncias, de interacções geradoras de imagens, comunicações, linguagens e desenvolvimentos que, por sua vez, desenvolvem, activam e reorganizam habilidades cognitivas, tornadas cada vez mais complexas após o aparecimento e desenvolvimento da linguagem na criança, seu crescimento, maturação e maturidade. A complexidade do pensamento emerge das inter-relações efectuadas pelo ser pensante, as quais, efectuadas através de processos elementares de dedução e de 41
indução, levam o pensante a efectuar inferências, classificações, analogias e muitas outras habilidades organizadas, lógica e contextualmente, com intenção de compreender as relações e as finalidades das coisas e das situações. Porém, sendo característica essencial do pensamento substituir os objectos por símbolos, imagens, palavras ou números e organizá-los em sucessões de ideias ou de imagens mentais, mais ou menos ordenadas e concretizadas em raciocínios, estes, não raras vezes, devido às desagregações do pensamento, são alterados. E, sendo múltiplas as possibilidades de alterações do pensamento, estas influenciam, negativamente, não só as capacidades de aprendizagem do indivíduo, mas, também, suas atitudes, seus comportamentos e seus discursos. Estas alterações podem manifestar-se a nível do fluxo do pensamento, do ritmo, do conteúdo e do domínio. As alterações do fluxo do pensamento são geralmente causadas por bloqueamentos, isto é, por manifestações das interrupções repentinas do pensamento com o aparecimento, algum tempo depois, de uma nova corrente de ideias sem relação aparente com a primeira. As alterações do ritmo manifestam-se através da alteração da velocidade das associações de ideias, alteração que poderá ser acelerada nos estados maníacos, por exemplo, ou lentificada nas depressões. As alterações dos conteúdos manifestam-se através de ideias ou de interpretações falsas ou fora da realidade, manifestações que podem corresponder a delírios. No caso das alterações do domínio do pensamento, este faz com que o indivíduo sinta que perdeu o controlo e que seus pensamentos estão a ser controlados por outrém, como sucede, não raras vezes, em certos tipos de obsessões em que o indivíduo se sente dominado por imagens ou ideias desagradáveis, mas, não consegue controlá-las, reconhecendo ter ultrapassado o domínio do normal e entrar na esfera do psicopatológico. As anteriores formas e maneiras psico-comportamentais do indivíduo não só assentam na debilidade e enfraquecimento da sua própria mente, mas, também, são geradoras de progressivos enfraquecimentos de seus potenciais cognitivos e de deterioração de suas funções mentais, afectando, negativamente, tanto o todo como complexas dimensões de sua própria personalidade, nomeadamente a nível de vivências, de valores morais e afectivos, de raciocínios e de lógica, de autocrítica e julgamento. Deixando de parte, aqui, a análise das causalidades de natureza neurofisiológica, a maioria absoluta das causas de tais perturbações encontram suas origens nos processos e activações emocionais e afectivas do aprendente. Com efeito, definindo afectividade como sendo o conjunto de todas as emoções e sentimentos que um ser humano tem para ser capaz de experienciar e vivenciar, não restam dúvidas que ela constitui o impulso motor e o elan vital da acção de um indivíduo que tanto estimula como condiciona suas dimensões cognitivo-comportamentais e sócio-emocionais. Por isso, inspirando-se nas teorias de Jean Piaget, Jean-Marie Dolle, seu colaborador, constata o desenvolvimento da afectividade em paralelo ao desenvolvimento cognitivo. É a afectividade que impulsiona o processo de estruturação do indivíduo e que o orienta para sua adaptação ao mundo exterior, o que faz com que em tais processos se desenvolvam não só mecanismos de cognição, mas, também, novos níveis e dimensões da inteligência, pois é a afectividade e a inteligência que orienta o indivíduo para seus processos de recíprocas interacções, subjectivo-objectivo, sujeitomeio, interior-exterior. É pela afectividade, segundo Jean-Marie Dolle, que a criança até aos dois anos de idade socializa as suas condutas, dos dois até aos doze anos socializa o pensamento e dos doze anos até aos dezasseis socializa a personalidade. O presente processo de consolidação da personalidade individual efectua-se, a maioria das vezes, inconscientemente. Na base de tais processos encontram-se as acções 42
e os dinamismos das emoções do indivíduo, as quais, apresentando-se como estímulos agradáveis ou desagradáveis, desenvolvem mecanismos de fuga ou de aproximação e, por conseguinte, de rejeição ou vivência das coisas e das circunstâncias, dos objectos ou das pessoas, dos fins e dos objectivos. Os anteriores mecanismos processuais de fuga ou de aproximação manifestamse em diferentes níveis de intensidade e de qualidade e, por isso, tanto estimulam e reforçam a vontade do indivíduo como geram a sua apatia, desenvolvem nele harmonia e motivação ou geram-lhe conflitos tanto intrapsíquico como sociopsicológicos, comportamentos de fundamental importância e de capital incidência não só nos processos de harmonia ou de desarmonia do desenvolvimento da personalidade do indivíduo, sobretudo da criança e do adolescente, e, de estrutural dinâmica, negativa ou positiva, em seus processos de desenvolvimento das estruturas e dinamismos de cognição. É que, sendo a afectividade a capacidade que um indivíduo possui para vivenciar o conjunto de suas pulsões, emoções, sentimentos e afectos, tanto sua intensidade como qualidade são constituintes essenciais das dinâmicas cognitivas do indivíduo. Com efeito, sendo a cognição o conjunto de actividades geradoras do conhecimento e de suas respectivas funções, tanto as sensorizações como os movimentos, as pulsões como as emoções, os sentimentos como os afectos são agentes essenciais e estimuladores das funções cognitivas, nomeadamente, pela positiva, a alegria, a surpresa e a simpatia e pela negativa, o medo, a vergonha, a agressividade, a cólera, etc.. Por isso, sendo a afectividade caracterizada pela capacidade que um indivíduo possui de vivenciar suas emoções, sentimentos e afectos, não há dúvida que ela constitui-se como dimensão essencial do psiquismo pois permite ao indivíduo percepcionar a tonalidade agradável ou desagradável dos diversos factos e fenómenos psíquicos e manifestar seus efeitos tanto através de níveis de intensidade comportamentais como através de suas modificações, tanto a nível de expansão como de condicionamento, de individualidade como de identidade, visto a afectividade ser atribuição envolvente da totalidade do humano individual. Ora, estando a afectividade subjacente a toda a acção ela constitui o motor vital não só das hierarquias de motivações do indivíduo, mas, também, dos dinamismos de seus estados mentais e psicológicos, interpessoais e sociais. As suas origem são, fundamentalmente, de natureza inconsciente e disponibilizam suas manifestações básicas através de energias que podem comunicar-se a um domínio qualquer (libido) e das inclinações ou tendências para alguém ou alguma coisa (afectos). Por isso, bloquear, inibir ou asfixiar os dinamismos fundamentais da afectividade de um indivíduo (pulsões, emoções, sentimentos e afectos) é orientá-lo para o desencadeamento de problemas comportamentais e dificuldades de aprendizagens. É que, na realidade, o bloqueamento dos afectos manifesta perturbações ou desvios nas emoções e, tanto umas como outros, geram não só atitudes e comportamentos inibidos, mas, também, dificuldades de concentração, incapacidades de pensar e desinteresses nas aprendizagens. Estes desinteresses, manifestados por comportamentos abúlicos ou apáticos, indiferentes ou agressivos, inadaptados ou desviantes estão na base das causas essenciais de uma maioria das dificuldades de aprendizagem dos educandos. Estes, apesar de não possuírem, estruturalmente, problemas de natureza neurofisiológica, o seu sistema nervoso não recebe, não organiza, não armazena nem transmite informações da mesma forma que uma criança não bloqueada. Os efeitos de tais comportamentos repercutem-se, de forma acentuada, negativamente, sobre suas estruturas e dinamismos neuropsíquicos. A nível neuropsíquico apresentarão imaturação, ausência de estímulos e imaturidade; a nível emocional instabilidade e dependência em relação a outras pessoas; a nível cognitivo desinteresses; a nível social inadaptações e a nível de inter-relações 43
não só problemas de comunicação, mas, também, de adaptação à realidade. E isto porque os bloqueamentos afectivo-emocionais não só afectam os processos de aprendizagem, mas, também, as estruturas neurocerebrais e comportamentais do indivíduo. Este, bloqueado no seu ser e no seu devir, tenderá, via normal, a permanecer bloqueado nos seus desenvolvimentos e nas expansões, nas suas manifestações e nos seus comportamentos. Emergindo, porém, a maioria das causas de tais manifestações de mecanismos e processos inconscientes do indivíduo, elas manifestam-se, particularmente, a nível de percepções e de memória, de atenção e concentração, de associação de ideias, de captação de informações e mensagens. Estas causas, no entanto, não são, de modo algum, irreversíveis mas os seus efeitos poderão sê-lo. E isto porque as dificuldades de aprendizagem, sobretudo as de causas invisíveis, constituem sérios problemas não só para os próprios educandos, mas, também, para seus pais, para a escola, a sociedade e as futuras inserções profissionais em geral. Porém, elevada percentagem das anteriores dificuldades de aprendizagem como de perturbações comportamentais não emanam simplesmente da dinâmica estrutural do indivíduo, mas, também, das pressões, recalcamentos e ausência de reais e verdadeiros valores humanos dos meios envolventes do indivíduo. Por um lado, tais dificuldadesconflitos emergem das ausências de respostas dos meios às suas necessidades interiores, às suas pulsões e à força de sua autoconsciência e, por outro lado, são resultantes de ansiedade individuais e de emoções primárias negativas: medo, vergonha, cólera, ira, culpa, etc., que encerram o indivíduo em si mesmo, e, este, isola-se e refugia-se em suas fantasias como se fossem realidades. A existência de tais comportamentos de defesa reforça seus mecanismos e o indivíduo torna-se cada vez não só mais ansioso, mas, também, mais reprimido, menos natural e menos espontâneo, menos autêntico e menos autoconfiante. Estes viciosos círculos de comportamentos psico-emocionais não só inibem, reprimem e recalcam suas energias de crescimento e de expansão, mas, também, deformam a sua personalidade, deformações geradoras de desajustamentos psicossociais, de socializações inadequadas e de contínuas pressões individuais, desencadeadoras de extremismos comportamentais, isto é, de solidão, agressividade, fugas, marginalidades, delinquência, etc.. Ora, encontrando-se as causas dos anteriores comportamentos, fundamentalmente, na existência e dinâmicas de perturbações tanto emocionais como afectivas do indivíduo, não restam dúvidas, que a formação e o desenvolvimento de personalidades harmoniosas e equilibradas deverá tornar-se núcleo central de todos os processos educativos. É que, devendo conceber-se a personalidade de um indivíduo como a entidade assente na dinâmica do seu próprio Eu, este apresenta-se, a si mesmo, não só como o filtrador das realidades exteriores, mas, também, como o organizador das hierarquias de seus processos e sistemas biológicos, psicofísicos, emocionais, afectivos, cognitivos e intelectuais. Por isso, Eu pessoal e personalidade individual deveriam funcionar em permanente harmonia, interacção e dinâmica. Os construtos sociopsicológicos das realidades sociais e educativas, porém, não emanam das respostas às necessidades anteriores, mas apresentam a personalidade como sendo a percepção exterior do indivíduo, isto é, sua máscara, e, tal máscara, elaborada a partir das interpretações efectuadas pelas plateias sociais. Estes antagonismos são, sem dúvida, geradores de conflitos entre o indivíduo e os sistemas, entre os sistemas e os meios ambientes. No seio de uma tal conflitualidade, o indivíduo, autoconsciente de sua necessidade de permanente desenvolvimento, sente-se e vivencia-se como ser inacabado, inves44
te suas energias na dinâmica e organização de seus processos interiores e exteriores, psíquicos e sociais, emocionais e afectivos, resultando daí uma entidade indivisível, organizada e dinâmica, global e articuladora de todos os seus processos e estruturas biossociopsíquicos, gerando-se, a partir daí, uma personalidade integrada e harmoniosa, individual e singular. Uma tal personalidade, efeito de um desenvolvimento construtivo da acção do indivíduo e das envolventes interacções sociais, valorativas, étnicas e culturais, possui, em seus fundamentos, dados do aleatório, dos acasos e dos erros oriundos do seu genoma, de sua história filogenética e, de cujas interacções resultam certos condicionalismos mas não determinações. Os condicionalismos são, essencialmente, efectuados através dos processos de desenvolvimento, circunstâncias, situações, oportunidades e respectivos aproveitamentos a partir do nascimento do indivíduo. É que, sendo o ser humano originário em seus processos e singular em seus comportamentos ele é um ser jamais repetível e jamais igual a qualquer um outro. As suas expressões, interacções e inter-relações tanto na família como nos contextos familiares, nos processos ensino-aprendizagem como nos ambientes escolares, nas suas relações interpessoais como sociais jamais são iguais. Poderão, no entanto, parecerem idênticas mas tais parecenças são efectuadas mais pelas acções, níveis e estilos de vida familiar, social, cultural e económico que por seus condicionalismos genético-hereditários. Ainda que ao genético-hereditário se atribuísse o valor reclamado por certos prestigiosos geneticistas e por certa psicologia genética, cada indivíduo, desde o seu nascimento, percepciona o meio, as acções e os comportamentos dos ambientes de maneira diferente tanto do irmão como do vizinho, o que evidencia o facto de que tanto as atitudes como os comportamentos são próprios de cada um e contribuem para caracterizar, e, também, orientar o tipo de interacções que tal indivíduo efectua com o universo que o circunda. Porém, tais interacções podem conjugar-se, contrariar-se ou aniquilar-se, provocando experiências no indivíduo tanto positivas como negativas, tanto desenvolvedoras como asfixiadoras. E é a partir de tais harmonias, disrupções e conflitos que um indivíduo se organiza ou não, que se desenvolve consoante o seu potencial ou se distorce, se expande ou asfixia. E, é, em consonância com a organização de tais atitudes e comportamentos e suas respectivas hierarquias, que as constelações neurais do indivíduo se expandem ou restringem, que o seu sistema nervoso se activa ou precondiciona e as suas bioenergias alargam seus campos de acção ou os diminuem. É a partir de tais comportamentos individuais que não só se elaboram, mas, também, se organizam tanto os sentidos como os órgãos dos sentidos, centros de recepção de informações e de mensagens; que a sua cinestesia se desenvolve e a organização de seus sistemas de acção, de suas capacidades de auto-aceitação e de compreensão se estabelecem como padrões mais ou menos flexíveis e maleáveis e mais ou menos abertos e disponíveis a novas atitudes e comportamentos. No centro de toda esta hipercomplexidade organizativa encontra-se, no entanto, o cérebro do indivíduo. Este, constituído por três camadas morfológicas essenciais ou unidades cerebrais: cérebro-primitivo, cérebro-intermediário e cérebro-racional contém, em si mesmo, os potenciais de desenvolvimento, de emoção, de afecto e de socialização. Com efeito, o cérebro-primitivo ou reflexo é o mais potente de todos pois tem, basicamente, a informação de todo o processo evolutivo, é capaz de manter e efectuar a vida; comunica com o corpo, identifica eventuais anomalias no processo de formação e de comando, sintetiza a pulsão da vida em sua cadeia evolutiva e é responsável pela manutenção da vida vegetativa do indivíduo. A segunda camada estrutural do cérebro, 45
isto é, o cérebro intermédio, é essencialmente o cérebro responsável pela vida emocional e afectiva do indivíduo. Sendo constituído essencialmente pelas estruturas do sistema límbico, vivificadoras dos cérebros dos mamíferos, tem por funções essenciais as coordenações das emoções, o desenvolvimento de funções afectivas, interpessoais e relacionais pois é ele que permite a distinção entre o que agrada ou desagrada, entre o prazer e o desprazer. Por sua vez, a terceira camada estrutural do cérebro, ou, neocórtice, unidade superior, racional ou unidade do cérebro pensante, sendo essencialmente composta pelos dois hemisférios cerebrais, e, por alguns conjuntos de neurónios subcorticais, é o cérebro dos mamíferos superiores, incluindo os primatas e, consequentemente, do ser humano. É a unidade que, sendo constituída por uma rede complexa de células nervosas, é capaz de produzir linguagem simbólica, desempenhar tarefas intelectuais como leitura, escrita, calculo, consciência de si, pensamento abstracto, sequências adaptativas, evoluções permanentes, etc.. No entanto, o harmonioso funcionamento do cérebro humano implica a existência de contínuas reciprocidades interactivas entre as três unidades cerebrais pois, caso isso não aconteça, não só se instalarão défices cognitivos, mas, também, anormalidades psicofisiológicas ou anomalias comportamentais. E isto porque, metaforicamente falando, o ser humano é uma pessoa montada num cavalo que se apoia num crocodilo. Orientar os movimentos, as atitudes e os comportamentos do cavalo não é o suficiente pois, caso o crocodilo, de repente, virar para a esquerda ou para a direita a pessoa cai e a crise existencial do ser humano aparece. Significando o anterior que se torna fundamental a coordenação dinâmica e funcional das três unidades do cérebro, a essência do educacional possui intrínseca necessidade de tomar consciência de uma tal realidade. E isto porque é do sistema límbico que emergem as emoções, os afectos e as memórias, os reconhecimentos das situações vividas, as atribuições de significados positivos ou negativos, as atitudes perante as realidades, os estilos de respostas e as reacções comportamentais tanto automáticas como instantâneas. O neocórtice ou cérebro do pensamento, por sua vez, como unidade de estrutura e de dinâmica racional, demostra que as unidades do cérebro não são estanques. Por isso, as relações entre afectividade e cognição, entre razão e emoção são mútuas e recíprocas e não de rivalidade. Daí a recíproca e fluída dinâmica do “penso, logo existo, e, existo, logo penso”. Sendo as três unidades do cérebro, isto é, a totalidade do cérebro humano, formadas pelas emoções, pelos sentimentos e pelos afectos, não há dúvida que tanto umas como outros estão, pelo menos potencialmente, programadas e o cérebro preparado para sentir, vivenciar e percepcionar tanto emoções como afectos gerados por padrões neuronais do cérebro como se evidencia, por exemplo, através do choro do bebé quando este nasce e, através da aprendizagem, dentro de semanas ou meses após o nascimento sorri. Em seguida, graças ao desenvolvimento sensorial e motor, emocional e cognitivo, a criança irá aprendendo a controlar certas emoções e a discernir quando é adequado chorar ou sorrir. Porém, para tal, é necessário que haja estímulos, oportunidades e possibilidades de associar determinadas emoções a certas situações e circunstâncias, como de facto se torna evidente através de análises e de estudos efectuados em certas camadas sociais ou em certas culturas, nomeadamente nas diferenças existentes entre o choro e o sorriso nas culturas ocidentais e orientais. E isto porque, como muito bem o acentua a Psicanálise, o desenvolvimento das estruturas emocionais e afectivas de um indivíduo não se pode separar do seu desenvolvimento cognitivo. E este desenvolve-se, estrutura-se, organiza-se
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e reorganiza-se em função das condições ambientais e dos suportes afectivo-emocionais fornecidos ao educando. Apesar disso, a civilização contemporânea, sobretudo a civilização ocidental, com seus sistemas educativos e seus processos de ensino-aprendizagens acentuam, ainda hoje, a tendência para reprimirem as expressões emocionais, as interacções e interligações entre afecto e cognição, entre sentimentos e emoções, entre motivações e valores, pilares essenciais das objectais inter-relações: organismos-objecto, objectomudança relacional do organismo. As anteriores interactivas sequências de relações organismo-objectos possuem, como essência de seus fundamentos, o movimento do ser humano e sua respectiva transcendência, visto o movimento não se limitar à superfície do corpo mas projectar o autor do movimento no envolvimento de outro ser, mundos e realidades. Tal é a acção da motricidade humana, a qual transcende o indivíduo e se expande no meio em que este vive, fenómeno que gera, simultaneamente, vida, presença e conhecimento, visto imprimir suas marcas não só ao desenvolvimento fisiológico do indivíduo, mas, também, às suas diferentes fases de desenvolvimento. Um tal movimento do ser humano inicia-se já em sua vida fetal. Pelo quarto mês de gravidez a mãe começa a sentir as primeiras deslocações activas do feto. Após o nascimento um tal movimento persiste e, respondendo a certos estímulos, estabelecemse determinados sistemas de gestos e de atitudes tanto a nível de reflexos cervicais como a nível vestibular e espacial. A partir daí os centros nervosos vão alcançando certo grau de maturação e, com o avançar da idade, progressivamente, vai manifestando-se um certo equilíbrio funcional, diferente de indivíduo para indivíduo, resultando, daí, certas tipologias psicomotoras diferentes, visto as inter-relações entre tonicidade individual e psiquismo serem efectuadas através de equilíbrios e não-equilíbrios de atitudes e de inter-relações existentes entre cérebro, meios, emoções, sensibilidades e afectos. Por isso, das interacções dos efeitos sensoriais com os movimentos resulta a união de diferentes campos sensoriais, isto é, a psicomotricidade, e, a partir daí, como escreveu Henry Wallon: “é o mundo das emoções que mais tarde origina o mundo da representação, através das atitudes e simulacros postos em jogo pelo movimento”. Psicomotricidade, movimento e acção constituem, então, as bases fundamentais do Eu do indivíduo, alicerce da unidade e da indivisibilidade da pessoa, sede da consciência individual e lugar das manifestações inconscientes, que se enriquecem e se desenvolvem, progressivamente, através das qualidades dos objectos, dos movimentos de aproximação e de afastamento, das sensações de prazer e de desprazer. Por isso, sendo o Eu individual o regente do comportamento humano ele encontra-se integrado na consciência, a qual possui variações próprias, funções gerais e específicas, resultando a existência de um Eu integrado do desenvolvimento biopsicossocial harmonioso do indivíduo. Porém, as variáveis de um desenvolvimento biopsicossocial harmonioso vão desde a percepção do próprio corpo, através dos órgãos dos sentidos, ao conhecimento do ambiente, em que o indivíduo vive, incluindo a organização e a interpretação das percepções, o desenvolvimento das actividades motoras, cognitivas, intelectuais, sociais e linguisticas em processos evolutivos, interactivos e cumulativos de aquisições, fontes de equilíbrio, de energia e de poder face a si mesmo e aos meios circundantes. Resultando o Eu do indivíduo das interactividades efectuadas entre o inato e o adquirido é através das sensações corporais, dos movimentos e das relações com as pessoas e os objectos que o inato se desenvolve e os factores, as características e as experiências do meio se adquirem. Os resultados desta interacção interior-exterior estão, simultaneamente, na base do Eu do indivíduo e também na do não-Eu. O Eu, por sua 47
vez, conduz à integração e ao sentimento da unidade do ser individual e permite à criança o desenvolvimento individual da sua personalidade. Por isso, sendo núcleos activos e centralizadores da personalidade a acção do indivíduo, a assimilação e a simultânea interiorização das imagens, oriundas do exterior, os comportamentos do indivíduo caracterizam-se pela permanente busca de sua identidade, ancorada, umas vezes, em modelos exteriores, outras, em projectos individuais, e, outras em necessidades intrinsecamente enraizadas na natureza individual da pessoa. E isto durante o percurso de vários ciclos de vida de uma pessoa, os quais vão desde a fertilização até às mais prodigiosas transformações do embrião, do feto, do recém-nascido, do bebé, da criança, do adolescente e do adulto, através das quais se destacam, como denominador comum, as interacções dos aspectos biopsíquicos com os psicossociais. No domínio do biopsíquico encontra-se a natureza psicofisiológica das emoções, a vivência do psicossocial e os desenvolvimentos das dimensões sócio-afectivas do indivíduo. Envolvendo a acção das emoções a totalidade do ser humano, elas são factores activadores das sensações e das motivações, das integrações e das expansões da natureza de cada indivíduo. De facto, sendo a sua natureza de origem biopsíquica, elas agem sobre a circulação sanguínea e o aparelho respiratório, sobre os potenciais bioenergéticos e sobre a intensidade das contracções cardíacas, sobre o aparelho digestivo e sobre os centros nervosos, sobre as sensações e os estados afectivos, sobre as relações consigo mesmo e sobre as relações interpessoais, sobre as alterações neuromusculares e neurofisiológicas, sobre o biopsíquico e as alterações de consciência. Por isso, as emoções, fazem com que o indivíduo, no caso de emoções positivas, possua elevado nível de motivações, elevado grau de auto-estima e de autoconfiança, o que conduz os indivíduos a gostarem de si mesmo, a saborearem a vida, a criarem situações e a enriquecerem comportamentos. A nível fenomenológico poder-se-á descrever, então, emoção como um estado intensivo de afectos, desencadeador de reacções orgânicas, de sentimentos, de propensões para a acção e para actividades especiais com manifestações de prazer ou de desprazer, influenciadoras das reacções bioquímicas e dos comportamentos neurofisiológicos do indivíduo, dos seus comportamentos sociais e de seus processos cognitivos. Ora, sendo a emoção encarada como uma reacção do todo humano, tanto sua natureza como seus elementos psíquicos e orgânicos, bem como seus efeitos modificam o indivíduo tanto no seu corpo como no seu psíquico, no seu espírito como na sua mente. Por isso, quando uma emoção, pela surpresa, provoca intenso choque, o indivíduo sente-se inadaptado tanto em relação à notícia-surpresa como ao acontecimento existente. Não raras vezes, o indivíduo, em tais situações perde não só o controlo do acontecimento, mas, também, de si mesmo. Com a tomada de consciência, a emoção suaviza-se e integra-se no universo dos sentimentos. Os sentimentos são duráveis, organizáveis e fáceis de investir e de orientar para as coisas, os objectos e as pessoas e, por conseguinte, reorganizadores do equilíbrio interior do indivíduo e estabelecedores da ponte de comunicação interior-exterior. De facto, sendo os fundamentos das emoções de natureza biopsíquica, tanto as suas acções como os seus efeitos desencadeiam no indivíduo alterações e mudanças tanto orgânicas como sentimentais, afectivas como psíquicas, cognitivas como intelectuais. A nível orgânico, as emoções podem afectar tanto as secreções internas como externas (frios, suores, lágrimas, adrenalina, etc.); o sistema simpático e parassimpático (rubor, palidez, riso, aperto na garganta, etc.); a nível psíquico, mudança de representações e de comportamentos, como, por exemplo, (fujo porque tenho medo; choro porque estou triste, etc.). 48
Apesar disso, existindo sempre um certo conteúdo da emoção, ela é encarada pelo indivíduo em consonância com o fenómeno que a desencadeou. Esses fenómenos são, geralmente, de natureza representativa, afectiva e psíquica. E, tanto as emoções como os sentimentos geram mais emoções e mais sentimentos, estruturantes e estruturadores da vida afectiva. A nível intelectual, as emoções, seguindo-se às representações, desencadeiam nos indivíduos elementos de natureza psíquica e reacções mentais de maior ou menor intensidade, processo este que evidencia o facto das emoções serem não só o fundamento da inteligência emocional mas também da razão. E isto porque, como escreveu Daniel Goleman (1997:54) sendo a inteligência emocional a “capacidade da pessoa se motivar a si mesma e persistir a despeito das frustrações, de controlar os impulso e adiar a recompensa; de regular o seu próprio estado de espírito e impedir que o desânimo subjugue a faculdade de pensar; de sentir empatia e de ter a esperança”, demostra-se que a mente emocional é constituída por um sistema de conhecimento “impulsivo e poderoso”, informador das operações da mente racional, a qual aperfeiçoa ou proíbe as contribuições das emoções, visto esta, a mente racional, predominantemente preocupada com o pensamento, a consciência, a atenção e a reflexão nem sempre valorizar a importância das emoções, sobretudo das emoções positivas. No entanto, quer o cérebro emocional, quer o racional estão envolvidos nos pensamentos, nos raciocínios, nas aprendizagens. A nível de aprendizagens, o cérebro emocional procura essencialmente sensações que desencadeiam reacções e o cérebro racional procura elaborar as classificações das informações sensoriais, pois o cérebro emocional, apoiando-se em suas bases neurofisiológicas, perceptivas, sensoriais, afectivas, experienciais e cognitivas, importa eficiência ao cérebro racional. Com efeito, o cérebro emocional, essencialmente constituído pelas estruturas e dinamismos do sistema límbico, morfologicamente constituído pela amígdala, hipocampo, tálamo, hipotálamo, giro cingulado, tronco cerebral, etc., possui e desenvolve funções imprescindíveis não só à funcionalidade do cérebro racional, mas, também, ao equilíbrio e sobrevivência do próprio indivíduo. Assim, sendo a amígdala o centro identificador do perigo, ela gera no indivíduo ansiedade, acciona situações de alerta e prepara o indivíduo para fugir ou lutar. O seu núcleo central contém axónios que podem modelar os circuitos de sobressalto, os ritmos cardíacos, a pressão arterial e facilitar o desenvolvimento das memórias, fundamentalmente das memórias emocionais, não declarativas e tanto positivas como negativas, gerando nos indivíduos sentimentos de simpatia ou de antipatia que resultam de experiências passadas. Por isso, uma lesão na amígdala pode fazer com que o indivíduo perca o sentido afectivo das percepções das informações exteriores. Além disso, o sistema da amígdala funciona em inter-relação com o hipotálamo, o qual, sendo a parte mais importante do sistema límbico, mantém vias de comunicação com todos os níveis e controla várias dimensões do comportamento humano, como sejam, por exemplo, a temperatura do corpo, o impulso de comer ou de beber, as denominadas funções vegetativas, etc.. As partes laterais do hipotálamo estão envolvidas com o prazer e a raiva, enquanto a parte mediana parece estar ligada à aversão, ao desprazer e à tendência do riso incontrolável. A nível psicoemocional, o hipotálamo desempenha funções de capital importância na expressão e nas manifestações sintomáticas dos estados emocionais, e, a acção de seus estímulos efectua-se nos dois sentidos. O hipocampo, por sua vez, está envolvido com os fenómenos da memória a longo prazo e possibilita a comparação com situações similares, orientando-as na tomada de decisões do indivíduo nesta ou naquela situação. Por sua vez, o tronco cerebral, ponte de comunicação entre a coluna cervical, a medula 49
espinal e o próprio sistema límbico, é fonte de acção energética das reacções emocionais permitidas. As reacções do tronco cerebral participam dos mecanismos de alerta, de sobrevivência e também nos ciclos de manutenção vigília-sono. A área pré-frontal do cérebro, não fazendo parte integrante do sistema límbico, tem conecções com o tálamo, a amígdala e com outras áreas subcorticais e, por isso, desempenha não só primordial função nos estádios afectivos do indivíduo, mas, também, nos processos de maturação e da maturidade, das responsabilidades, da concentração e da abstracção, essenciais aos sistemas da razão, das aprendizagens, dos raciocínios e das imagens mentais. Face ao exposto não admira, por isso, que conceituados investigadores acerca das emoções divirjam não só em relação à natureza das emoções como em relação aos seus objectivos, às suas especificações como às suas categorizações. Isabel Fillozat, por exemplo, analisa a existência de quatro grandes emoções, isto é, do medo que aguça os sentidos; da ira, que é uma reacção à frustração e à injustiça; da tristeza que acentua o vazio e a falta da alegria que é a comunhão com o universo que rodeia o indivíduo. Por sua vez, o autor da inteligência emocional, Daniel Goleman considera a existência de emoções primárias e respectivas famílias, isto é: ira: fúria, ultraje, ressentimento, cólera, ódio, irritabilidade, etc.; tristeza: dor, pena, desânimo, solidão, desespero, melancolia, etc.; medo: ansiedade, nervosismo, receio, pavor, horror, pânico, etc.; prazer, felicidade, alegria, alívio, satisfação, orgulho, agrado, etc.; amor: aceitação, amizade, confiança, bondade, adoração, etc.; surpresa, choque, espanto, assombro, admiração; aversão; desprezo, desdém, troça, nojo, repulsa, desagrado, etc.; vergonha: culpa, atraso, desgosto, remorso, humilhação, etc..
II – ACÇÕES DOS SISTEMAS LÍMBICO-EMOCIONAIS NAS DINÂMICAS PROCESSUAIS DAS APRENDIZAGENS
Sendo as aprendizagens humanas resultados das interacções biopsíquicas, cognitivas e mentais de um indivíduo, tanto consigo mesmo como com os outros, com os objectos, com as realidades do exterior e com os meios, não raramente, a acção processual da interactividade de tais energias fica bloqueada, inibida, distorcida, diminuída ou perturbada em seus potenciais de eficiência ou em seus efectivos canais de fluência e expansão. As causas de tais efeitos são de múltiplas naturezas e envolvem múltiplas modalidades, que vão desde a existência de anomalias ou anormalidades congénitas ou adquiridas à existência de lesões cerebrais no domínio neurofisiológico; perturbações de carácter, distorções de personalidade, défices a nível de psico-maturidade, deficiente orientação e condução das pulsões bioenergéticas e dos afectos no domínio psicoemocional a perturbações a nível do sensório-motor, das percepções e das sensações a nível da psicomotricidade. As anteriores causas gerais da existência de níveis e de modalidades de défices de aprendizagens, a maioria das vezes invisíveis, manifestam-se, fundamentalmente, por alterações da memória, distorções do pensamento, perturbações da consciência e transtorno da personalidade.
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Com efeito, sendo a memória a faculdade de fixar, de armazenar e de evocar recordações que permitem a persistência do passado no presente e de projectar o presente no futuro, qualquer tipo ou modalidade da memória (memória sensorial, motora, social; memória perceptiva, a curto ou a longo prazo, memória de trabalho, etc.) são de capital importância para a vida de acção e de desenvolvimento do indivíduo, pois ela não só é de suma e capital importância para as actividades escolares, sociais e profissionais, mas, também, para a descoberta e afirmação tanto da identidade pessoal como cultural do ser humano. Por isso, sendo a memória o suporte essencial da aquisição e do desenvolvimento de todo o conhecimento, os seus processos emergem das estruturas e dinamismos bioquímicos e neurocerebrais do indivíduo, de maneira particular das áreas constituintes do sistema límbico do cérebro. Estas áreas e seus efeitos interactivos estão sujeitos às transformações positivas e negativas, aos enfraquecimentos e aos reforços, às reduções e aos alargamentos, às disfunções e às deteriorações, às degenerações e aos envelhecimentos. Qualquer uma das anteriores causas ou de simultaneidade causal, como a existência de lesões em qualquer uma das áreas integrantes do sistema límbico, pode ocasionar perda de memória, parciais, totais, amnésias, e, então, o indivíduo, esquece recordações, acontecimentos, factos e ideias. A partir de tais situações, o pensamento do indivíduo possui situações psicopatológicas tanto a nível qualitativo como quantitativo. Nos casos do pensamento aparecer alterado, umas vezes por aceleração ou fuga de ideias, outras vezes por lentificação, esta manifesta-se, fundamentalmente, por bloqueamentos, por comportamentos inibidos e por interrupções súbitas do curso do pensamento. Outras vezes, ainda, o pensamento é fixo, insistente sobre ideias e prazos, sem distinção entre o essencial e o acessório, incoerente, incompreensível e sem lógica, com falta de continuidade no sentido, fragmentado, sem conecções associativas normais, etc.. Sendo as últimas características anteriormente enunciadas próprias do pensamento do esquizofrénico, geradoras de alterações da consciência individual, tal comportamento emana, fundamentalmente, de uma contínua fuga de si mesmo, isto é, fuga ao conhecimento de si, das suas sensações e das suas percepções, dos seus meios e dos seus ambientes. Ora, sendo a autoconsciência do indivíduo efeito da intuição que sua mente tem dos seus estados e dos seus actos, das suas sensações e das suas emoções, das suas percepções e das suas experiências, das suas recordações e das suas imagens, torna-se imperioso que, todo e qualquer acto educacional, tenha por objectivo essencial fazer com que o educando tome consciência daquilo que é e daquilo que ele mesmo procura, não só no seu interior mas também no exterior. Um tal imperativo, porém, exige do acto educacional centralização sobre o educando. E isto porque, como é obvio, o “material” da consciência resulta das emoções, das sensações, das percepções, dos sentimentos e dos afectos; das ideias e dos pensamentos do indivíduo e, tanto umas como outros, são produtos de interactividades bioquímicas e neuropsíquicas efectuadas através de milhões de impulsos que, em cada segundo, chegam ao cérebro através da espinal medula e das fibras nervosas. Tais interactividades, transportadoras de informações recebidas pelos sentidos, são recebidas, seleccionadas e retidas pelo cérebro, o qual, após sua transformação, faz com que o essencial se torne parte integrante da consciência reflexiva do próprio indivíduo. Desvios, fugas e evitamentos a uma tal consciência, em maior ou menor grau, desencadeiam disfunções, perturbações ou desvios no normal e autêntico desenvolvimento da personalidade do indivíduo, manifestados através de rigidezes comportamen51
tais, inadaptações às mudanças, inadequações às realidades e perturbações a nível de relacionamentos interpessoais. Um tal conjunto de comportamentos distorcidos emerge, fundamentalmente, quer do temperamento, quer do caracter do indivíduo; das suas emoções como dos seus processos cognitivos, das suas motivações como das suas formas de acção, visto tais indivíduos desviarem-se da funcionalidade normal, as suas emoções e os seus sentimentos não serem autênticos e suas capacidades de relacionamentos com sua interioridade e exterioridade saldarem-se por rupturas, distorções ou fantasias. Embora ninguém seja igual a alguém, seguindo uma metodologia de aproximações e de certas afinidades, poder-se-ão, sumariamente, distinguir três grandes grupos de indivíduos com personalidades perturbadas. O primeiro grupo engloba indivíduos com ideias e pensamentos estranhos, com tendência ao isolamento ou a comportamentos excêntricos, como sucede, por exemplo, com os indivíduos que suspeitam e desconfiam de tudo; com os emocionalmente frios, que possuem enorme dificuldade no estabelecimento de relações sociais e com os que vivem o imaginário como se fosse realidade. No segundo grupo encontram-se os que constantemente apelam ao dramático, os que expressam emoções negativas com intensidade, os grandes hiperagitados, egocêntricos, narcisistas; os que quase permanentemente desvalorizam os outros, os que constantemente se manifestam contra o social e os que a nível de relações afectivas são acentuadamente instáveis. No terceiro grupo poder-se-ão englobar os que por tudo e por nada manifestam medos, ansiedade generalizada, evitamentos de encontros consigo mesmo, hipersensibilidades às criticas alheias, inseguranças pessoais, dependências relacionais, acentuadas passividades em seus funcionamentos e autonomias, comportamentos compulsivos, rigidez e frieza emocionais, contínuos mecanismos de resistências, funcionamentos inadequados tanto em relação ao social como ao escolar, ao familiar como ao profissional. Os anteriores comportamentos de educandos manifestam perturbações de sua personalidade, que podem possuir diversificadas causas, serem de vários tipos e revelarem naturezas diferentes. E isto porque a personalidade tem natureza genética, social e pessoal. É resultado de um processo que, emergindo do património genético-hereditário do indivíduo, integra, em si, as vivências da infância e da adolescência, dos meios familiares e sociais, escolares e culturais. Tais comportamentos resultam dos interactivos efeitos dos intercâmbios indivíduo-meios, reveladores de sua unidade e originalidade, tanto em suas expressões como em suas inter-relações face aos meios sóciofamiliares, sociais, culturais e conteúdos da realidade. Por isso, o ser humano, único, unitário e original, não só se desenvolve, mas, também, condiciona-se consoante a qualidade do seu habitat, a natureza e os tipos de suas comunicações, de seus inter-relacionamentos, de suas percepções, emoções e afectos, desencadeadores ou inibidores de expectativas e ambições, de valores e autoorganizações, não só estimuladores, mas, também, organizadores da natureza e das intencionalidades do próprio cérebro do indivíduo, o que explica a existência de atitudes e de comportamentos próprios desta ou daquela personalidade. Por sua vez, o conjunto de atitudes e de comportamentos do indivíduo orienta o desenvolvimento da sua maneira de ser, de estar e de se relacionar, e, organiza ou desorganiza, estimula ou contraria as naturais funcionalidades de seu sistema nervoso, as quais possuem enormes influências, tanto positivas como negativas sobre o próprio sistema imunológico. As múltiplas variabilidades dos conjuntos de atitudes e de comportamentos pessoais e inter-relacionais fazem com que, nas escalas das diferenças, uns indivíduos sejam muito diferentes dos outros. 52
No entanto, sendo a diferença a característica essencial dos seres humanos, uns são mais diferentes que outros, como acontece, por exemplo, com as crianças ou alunos formalmente ditos normais, em que suas diferenças são diferentes das crianças deficientes. Estas diferenças, devendo ser reconhecidas, possuem potencialidades de dinamismo e de aceitação, de desenvolvimento e de promoção, não só a nível de acções e de realizações, mas, também, de emoções, de sentimentos e afectos, para que, apesar das suas deficiências, o indivíduo se sinta e vivencie equilibradamente com suas capacidades e aptidões, sentimentos e afectos, interacções e relações. E isto porque personalidade perturbada gera indivíduos não só a nível social e escolar, com comportamentos disruptidos, mas, também, a nível cognitivo, com ineficiências ou dificuldades em seus processos de aprendizagem, de socialização e de integração. De facto, deixando de parte, pelo momento, problemas de natureza bio-anatómica, de patologia ou de lesões neurocerebrais, a maioria das causas das perturbações da personalidade são de natureza emocional, sentimental e afectiva, e, manifestam-se, fundamentalmente, através de alterações comportamentais, de apatias afectivas, de instabilidades emocionais, de irritabilidades, angústias, fobias, depressões, alterações da linguagem e da vontade, o que, a nível de processo de cognição e de aprendizagem, gera insuficiências nos desempenhos da actividade, consuetudinariamente admitidas por comuns ou normais, e, a nível perceptivo-emocional, alterações na intensidade das sensações, ilusões perceptivas, fugas de ideias, inibições de pensamento, distracções, obnubilações mentais, etc.. Estes comportamentos, geradores de atitudes, de imagens e de comportamentos negativos, fazem com que as relações consigo mesmo, com o meio ambiente e com os outros se tornem cada vez mais pobres, as experiências reduzidas e os potenciais de acção cognitiva e psico-comportamental bloqueados. Com efeito, sendo as emoções humanas “centrais” de energias fisiológicas e psíquicas, sentimentais e afectivas, as suas orientações e investimentos, distorções ou desvios constituem o núcleo central tanto dos investimentos positivos como negativos do indivíduo. Personalidades equilibradas ou desequilibradas têm como seu fundamento a harmoniosa integração ou desintegração das emoções. Emoções desintegradas fazem com que o indivíduo altere sua percepção de si mesmo, perca sua auto-estima, se comporte com acentuada instabilidade, procure dependências, não tolere a frustração, possua acentuados problemas a nível de comunicações interpessoais e enormes dificuldades de adaptação à realidade. Por isso, os alunos com perturbações emocionais, a nível de sua personalidade, não só apresentam comportamentos hipercinéticos, mas, também, falta de perseverança nas actividades que implicam envolvimentos cognitivos, atitudes organizadas e comportamentos disciplinados. A nível de atitudes relacionais tais indivíduos são, frequentemente, impulsivos e imprudentes, sujeitos a acidentes e infractores às regras sem premeditação nem desafios deliberados. As relações de tais alunos com os professores e os adultos em geral são, frequentemente, marcadas por ausências de inibições sociais, por ausências de prudências e de reservas e, via normal, são impopulares com os colegas, tornando-se, geralmente, indivíduos isolados. Apesar de suas frequentes atitudes agressivas, a nível global, o seu comportamento manifesta evidentes perdas de auto-estima pessoal. As ausências de auto-estima desencadeiam sentimentos de exclusão e de rejeição, de insucesso e abandono, de hostilidade e impulsividade; falta de avaliação critica, de discernimento, de percepção social, de cooperação e de aceitação, pois, raramente, antecipam, reflectem e antevêem as consequências de suas perturbações emocionais, das indisciplinas escolares e dos descontrolos comportamentais. 53
Os repetidos círculos de tais atitudes comportamentais conduzem os indivíduos às perdas de suas iniciais ambições e expectativas, levam-os à criação e desenvolvimentos de medos e resistências, de angústias e fobias não só em relação a si mesmo, mas, também, em relações às funções e tarefas tanto escolares como sociais. E isto porque, na realidade, ninguém consegue viver bem com o fracasso ou o insucesso, e, indivíduos, instalados no insucesso, geram mais insucessos. As causas de tais tipos de insucessos, porém, têm, fundamentalmente, suas origens em problemas de natureza emocional e afectiva, sentimental e educativa, as quais, por sua vez, não só perturbam ou distorcem o desenvolvimento de personalidades harmoniosas, mas, também, bloqueiam, asfixiam e desenvolvem anomalias no funcionamento e na activação das conaturais intencionalidades do cérebro. A partir de tais situações, caso estas não sejam invertidas, os indivíduos coleccionam fracassos, geram e envolvem-se em sucessivos conflitos, tornam-se inadaptados e primam por suas atitudes e comportamentos sociopáticos, por desvios às normas do social e por marginalidade, delinquência e crime. Os indivíduos que, sucessivamente, manifestam tais comportamentos, a nível de emoções, são instáveis, pouco tolerantes, não aceitam as frustrações, são geralmente agressivos, muito ansiosos, tensos, opositores, e, não raras vezes, com a mania da perseguição, com as percepções distorcidas, com dificuldades de comunicação e inadaptações à realidade. A nível de afectividade, tais indivíduos tanto se tornam extremamente dependentes como extremamente exaltados, ansiosos como deprimidos, indiferentes aos relacionamentos com os outros como alienados de suas próprias percepções sensoriais e emocionais. No entanto, subjacentes a tais causalidades comportamentais encontram-se as influências e os comportamentos afectivo-emocionais dos primeiros anos de vida do indivíduo, isto é, a qualidade dos afectos e das emoções vividos e interiorizados durante a infância e a adolescência. De facto, tanto as perturbações emocionais como as afectivas são originadas, muitas vezes, de conflitos com o meio, em especial com os meios familiares, que perturbam, geralmente, a criança em seus desenvolvimentos harmoniosos e equilibrados, repercutindo-se, não raras vezes, nos comportamentos escolares e sociais, cognitivos e morais. E isto porque uma criança interdepende, enormemente, dos que vivem a seu lado, e, é a partir das acções de um tal meio que ela desenvolve e organiza ou não seus interesses e suas orientações, sua identidade e sua individualidade, suas expectativas e sua avidez. A positiva e integrada organização individual de tais psicoemocionais energias fazem com que o indivíduo integre, em seu próprio Eu, suas tendências e necessidades de envolvimento, de afecto, de sensações, pulsões e desejos. Uma tal harmoniosa integração do indivíduo faz com que este oriente suas dimensões biológicas, emocionais e psíquicas para os objectos, para as funções e as tarefas em causa e, de tais envolvimentos, resulta, cada vez mais, dinamismos psicocognitivos de adaptação a situações novas e às novas realidades com que, constantemente, o indivíduo se depara, dinamismos processuais que, permanentemente, não só codificam o Eu do indivíduo, mas, também, com maleabilidade e flexibilidade, sociabilidade e adaptabilidade, o reorganizam. É que, como escreveu um dos colaboradores da Escola de Palo Alto, Zimbardo Philipe, G. (1972:86): “as crianças precisam de confiar no seu meio ambiente e sentirem segurança nas suas relações, a fim de poderem crescer e aprender bem. A confiança e a segurança de bem se viver num mundo em que existe uma certa ordem com imprevisibilidade, bem como com flexibilidade e liberdade para 54
se poder experimentar, explorar e fazer face a novas situações... Se os professores forem carinhosos e compreensivos, poderão ajudar as crianças a aprender a partilhar o espaço, o equipamento, os materiais, a afeição e a atenção umas com as outras, e, sentirem-se felizes e bem adaptadas à vida em grupo”. No entanto, se as perturbações emocionais e afectivas são geradoras de alterações comportamentais, de desequilíbrios psíquicos, de inquietações, de medos pessoais, de sensações de pânico, de terror e pavor, deixando o cognoscente sem a suficiente e necessária bioenergia psíquica, emocional e afectiva para desenvolver processos cognitivos, psíquicos e intelectuais à medida de suas próprias potências, capacidades e aptidões e, por conseguinte, sem estímulos e motivações, também a superabundância destes pode gerar perturbações e distorções, tanto a nível sensorial como cognitivo, psicológico como intelectual, como se constata, por exemplo, quando é imposta a uma criança aprendizagem da escrita ou da leitura antes da necessária maturação neurocerebral e maturidade psico-afectiva, o que, com grande probabilidade, pode provocar sobrecargas cerebrais e bloqueamentos a nível de captação das informações, e, posteriormente, desencadear descontrolos emocionais. E, tanto as perturbações emocionais como as afectivas, desencadeadas pelas carências de estímulos e de motivações como pelas sobrecargas, originam comportamentos de auto-rejeições, de medo e de pânico face a novas mudanças, a novas perspectivas e a novas aprendizagens. Tornam-se crianças ansiosas, angustiadas e deprimidas, pessimistas e fóbicas, derrotistas e com pânico face ao diferente, ao desconhecido e ao imprevisível. Geram-se, então, paragens ou deficiências em suas evoluções, atrasos e distorções nas suas percepções, na linguagem e na socialização; dificuldades nas relações interpessoais e, apesar de poderem ser crianças com elevado potencial intelectual e mesmo motivação a nível de aquisição dos conhecimentos, instalam-se no insucesso. Por outro lado, a maioria de um tal tipo de crianças possui dificuldades em descobrir quais os reais e verdadeiros interesses, as utilidades e as aplicações de elevada percentagem das aprendizagens impostas pela escola institucionalizada. Apesar de tudo isso não há dúvida que são as emoções, os sentimentos e os afectos os agentes mais estimulantes e motivadores tanto da actividade sensório-motora, como pulsional; psicológica como mental do cérebro normal, pois as suas áreas entram em actividade através de suas conecções interactivas, facto este que evidencia a existência da profunda e real necessidade do processo de ensino-aprendizagem, individual e pessoal, dever ser integrador, possuindo como objectivos o desenvolvimento pleno e harmonioso dos educandos, a instrução e a aquisição dos conhecimentos por parte dos alunos-educandos. Muitas das anteriores perturbações da personalidade e dos comportamentos negativos de um indivíduo, porém, têm origem em traumas infantis. O trauma (grego: ferida, furo), inicialmente reservado a lesões do organismo resultantes de violências exteriores, passou após a descoberta do homem psicológico efectuado por Freud, a designar efeitos de choques violentos e de suas consequências sobre o conjunto da organização da personalidade, os quais não só acarretam perturbações duradouras no funcionamento bioenergético do indivíduo, mas, também, no fluir de suas emoções, em seu aparelho psico-afectivo, em seus potenciais relacionais e em suas relações interpessoais, o que faz com que o indivíduo deixe de funcionar segundo o princípio de seu autêntico e real prazer e necessidades de expansão e realização. Estas dificuldades de elaboração, de organização e de reorganizações do Eu psíquico fazem com que o indivíduo se sinta permanentemente impedido por uma espécie de “corpo estranho”, impeditivo de integrar em sua personalidade consciente os efeitos de suas experiências, fazendo com que desenvolva mecanismos de defesa contra acontecimentos e vá acumu55
lando e avolumando efeitos de experiências negativas e passe agir, de modo acentuado, sobre e com seus primarismos comportamentais. Com efeito, indivíduos traumatizados trazem consigo inúmeros problemas, tanto de fragilidade ou de enfraquecimento do seu próprio Eu como a nível de inter-relações com o mundo exterior, sentindo que este o agride, tornando-se um revoltado ou um indivíduo meramente passivo, que não tolera as frustrações, ou, simplesmente, se deixa invadir por elas. Tanto os primeiros como os segundos tornam-se crianças, alunos ou pessoas com enormes dificuldades, tanto a nível de atenção como de concentração nos desempenhos de determinadas tarefas e funções; a nível de estímulos e de motivações, de participações e de interactividades, de cooperação e acção. No entanto, tanto os traumas como os seus efeitos, as perturbações da personalidade como as distorções das percepções não são, de forma alguma, irremediáveis. É que quaisquer que sejam as variações socioculturais, ambientais, emocionais, sentimentais e afectivas dos meios e as circunstâncias em que um indivíduo vive ou se circunscreve, as estruturas psico-biológicas do indivíduo possuem conjuntos de disposições capazes de modificar psíquica e socialmente, de forma flexível e adaptável, a sua interioridade e, por conseguinte, também os seus comportamentos exteriores. Com efeito, sendo o Eu do indivíduo caracterizado por sua unidade, unificadora de todos os seus sistemas e subsistemas e, simultaneamente, diferenciadora, o Eu possui, em seus núcleos centralizadores, flexibilidade, maleabilidade, adaptabilidade e mutabilidade. Uma tal mutabilidade, porém, em sua harmoniosa totalidade, é mais lenta que, a maioria das vezes, se deseja. E isto porque as operações das mutabilidades implicam não só mudanças no Eu psíquico e emocional dos indivíduos, mas, também, em seu Eu bio-corporal, isto é, mudanças em suas estruturas e dinamismos biopsíquicos e nervosos. No caso do ser humano, considerando as enormes possibilidades de escolhas e as possíveis variadas respostas a certos estímulos e motivações, a problemática da mudança torna-se hipercomplexa, apesar da homeostasia funcional de cada ser humano orientar seus sistemas e subsistemas para a sua integração, harmonia e eficácia. As anteriores e necessárias orientações de mudanças comportamentais podem e devem buscar no fundo do indivíduo, enormes reservatórios de disposições, de energias e de vitalidade inatas ainda inexploradas, e, através das experiências, vivências e aprendizagens, elaborá-las, orientá-las e investi-las em função do seu “em si mesmo”, com segurança e autoconfiança, positividade e harmonia, projecções e interiorizações reorganizativas. Os anteriores processos de projecções, com intuitos inconscientes e conscientes de interiorizações reorganizativas, evidenciam-se mesmo através da linguagem psicocorporal do indivíduo. Tanto os sinais como as mensagens vindas dos objectos, e, recebidos sensorialmente, desencadeiam, no organismo, conjuntos de adaptações motoras, necessárias ao prosseguimento da recolha de sinais acerca dos objectos, bem como respostas emocionais. As respostas emocionais são de diversos tipos e dinamizam diversos sensores, capazes de detectarem sinais, informações e mensagens no corpo, no cérebro e no meio exterior ao corpo, isto é, no exterior do indivíduo. A acção, predecessora do conhecimento, requere um corpo que actua num espaço e no tempo, e, a acção psico-corporal do ser humano, ao permitir a explicitação das suas disposições informativas, não recupera apenas dados sensoriais, mas, também, motores, emocionais, sentimentais, afectivos, associativos, psíquicos, criativos e mesmo imaginativos. As interacções de tais explicitações, únicas e inerentes ao veicular da natureza do próprio indivíduo, não só produzem e organizam mudanças biocerebrais, mas, 56
também, cognitivas, mentais e sociais, ficando o indivíduo, a partir daí, com esquemas cognitivos e mapas mentais diferentes dos anteriores, o que o orientará não só para diferentes atitudes e comportamentos em relação a si mesmo e aos outros, aos meios e ao próprio futuro pessoal, levando-o a reorganizar e a interiorizar novos padrões comportamentais e marcos de referências diferentes dos anteriores. Os anteriores processos de mudanças, caso não sejam efectuados equilibrada e harmoniosamente, contêm em si mesmo, potenciais não só de insegurança e instabilidade, mas, também, de crises emocionais, afectivas, psíquicas e de disrupções neuropsíquicas, bem como deficiências e doenças de natureza psico-emocional.
III – O EU PSICOEMOCIONAL E CORPORAL DO INDIVÍDUO NAS AQUISIÇÕES E DESENVOLVIMENTOS DAS APRENDIZAGENS
Constituindo o Eu individual do ser humano o centro de controlo e de integração funcional da sua personalidade, é Ele que estabelece e activa a ponte de equilíbrio, de defesa, de estabilidade e de dinâmica entre si, a sua interioridade e o meio exterior. É através da percepção e do sentimento que tem de si mesmo que percepciona as realidades exteriores e promove a sua adaptação a ambas as realidades. Daí o facto de ser a partir do Eu individual que emergem as principais funções psíquicas do indivíduo como, por exemplo, a orientação, o controlo motor, a percepção, a memória, a afectividade, o pensamento e os raciocínios, o qual, constitui, em simultâneo com o inconsciente e o superego, umas das três estruturas essenciais da mente humana. É, no entanto, da descoordenação, do desequilíbrio ou da ausência de interacções entre os dinamismos de tais estruturas que emergem perturbações emocionais, défices psíquicos, problemas comportamentais e dificuldades cognitivas. As perturbações emocionais geram, não raras vezes, distúrbios psicológicos, manifestado através de ausência de força vital, da constante fatigabilidade tanto física como psíquica, da ausência de entusiasmo e envolvimento, da falta de iniciativa e de criatividade, de diminuição da actividade das funções psíquicas, das permanentes sensações de debilidades organo-psíquicas (neurastenia), dos constantes estados de abatimento de sentimentos e de incapacidades, da irritabilidade nervosa, das cefaleias, da dôr, tonturas, esgotamentos (psicastenia). Porém, tanto as neurastenias como as psicastenias são, na maioria dos casos, resultados de tensões emocionais inconscientes, originadas pelas acções de recalcamentos individuais, que absorvem a maioria das forças vitais do indivíduo. E isto porque, entre todos os mamíferos, o ser humano é aquele que possui constelações e redes de conecções entre as áreas pré-frontais corticais do cérebro e suas estruturas límbicas, isto é, com as emoções, os sentimentos e os afectos. As emoções são energias que se movem, movimentam e se deslocam, com maior ou menor qualidade e intensidade, para certos tipos de acções. Agem directa ou indirectamente, e, parcial ou totalmente, sobre diversos sentidos e órgãos, e, intervêm, tanto positiva como negativamente, consoante a natureza das emoções, na lógica dos raciocínios, nos bloqueamentos das ideias e nos equilíbrios ou nas perturbações psicocomportamentais. Sendo os sentimentos definidos como estados afectivos, mais duráveis que as emoções, eles originam vivências menos intensas, com menor repercussão sobre as 57
funções orgânicas e com menos interferências sobre a razão e os comportamentos, como sucede, por exemplo, com os sentimentos de amor ou medo, em vez da cólera, da paixão, do pavor ou pânico, que são emoções. Por sua vez, sendo os afectos resultados das interacções entre emoções e sentimentos, estes apresentam-se como conjuntos de fenómenos psíquicos manifestados através da acção de prazer ou de dor, de satisfação ou de insatisfação, de agrado ou de desagrado, de alegria ou de tristeza. Das interacções ou não entre emoções, sentimentos e afectos resulta a dinâmica psicoemocional do indivíduo, essencial ao equilíbrio e à eficiência da própria razão. Na realidade, embora sejam múltiplas e variadas as causas dos défices mentais e cognitivos do indivíduo, como, por exemplo, genopatias, cromossomopatias, factores pré-natais, perinatais e neo-natais, tanto o Eu total do indivíduo como a sua personalidade em geral não podem ser exaustivamente compreendidos sem estudo e análise das suas dimensões psicomotores, institivo-emocionais, linguísticas, imagens psico-corporais do seu “em si mesmo”, de seus aspectos perceptivo-gnósicos, práxicos, etc., visto, tanto as forças vitais como as energias e os condicionamentos de um indivíduo encontrarem, em suas condições biopsicológicos, sócio-emocionais e psico-afectivas, o que através de suas inter e retroactividades, não só origina, mas, também, organiza e reorganiza o todo biopsíquico e afectivo-emocional do indivíduo, e, cujos dinamismos estruturais essenciais são: corpo-cérebro, emoção-razão, social-psicológico, binómios sujeitos a acondicionamentos, a estímulos e a motivações; a relacionamentos e imitações; a afirmações e oposições. As anteriores dimensões e circunstâncias em que um indivíduo vive não só o estimulam como o condicionam, expandem como o circunscrevem e, a partir dos efeitos de tais sequências, ele se tonifica e expande, fragiliza, asfixia ou perturba em suas dimensões psicológicas e cognitivas, bio-orgânicas e somatopsíquicas. De facto, o não desenvolvimento, as distorções ou as asfixias das estruturas, intencionalidades e dinâmicas do “psico-corpo”, epicentro do desenvolvimento das personalidades equilibradas e harmoniosas, constituem uma das causas essenciais dos conflitos e perturbações de vária ordem, nível e natureza, como, por exemplo, alineação do mundo exterior e empobrecimento do interior, dificuldades nos desenvolvimentos de suas potencialidades de adaptabilidade, fuga aos relacionamentos interpessoais, permanente sensações de fadigabilidade, dissociações e de desintegrações do Eu psicológico do Eu corporal, etc.. Com efeito, as anteriores hierarquias de distorções cognitivas, de perturbações psico-emocionais e de desvios sócio-comportamentais possuem suas causas essenciais na má ou na falsa formação do Eu pessoal do indivíduo. É que o Eu de um indivíduo é, antes de tudo, entidade corporal e, como tal, tem origem nos dados sensoriais, motores e perceptivos, resultantes do movimento realizado pelo sujeito, o qual, originando o processo biopsíquico, origina, por sua vez, o Eu psicológico. Por isso, o sentimento do Eu de um indivíduo ou de sua identidade resulta da fusão do sentimento do Eu psíquico com seu Eu corporal, o qual orienta e protege sua interioridade e suas relações com o exterior e, alimentando-se tanto de suas sensações interoceptivas como das percepções esteroceptivas, gera vários saberes e conhecimentos, estímulos e energias, reais e verdadeiros alicerces das aquisições e das interiorizações de novos saberes e conhecimentos. A perturbação ou a desorganização dos anteriores desenvolvimentos desencadeia sempre perturbações mais ou menos acentuadas a nível de perturbação do desenvolvimento da personalidade do indivíduo, e, suas interiorizações assumem vários tipos comportamentais como, por exemplo, dismorfias, fobias sociais ou escolares, lentidão
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nos processos cognitivos, fadiga permanente, abulia comportamental, distorções do real, dificuldades de concentração, bloqueamentos a nível de potencialidade mnésicas, etc.. Embora tais comportamentos, quais círculos viciosos, provoquem distorções, disfuncionalidades, asfixias e mesmo lesões nas estruturas e nos dinamismos bioneurocerebrais do indivíduo, a maioria dos indivíduos, com pequenas e mesmo médias ou moderadas dificuldades de aprendizagens, não manifestam existência de lesões cerebrais. Estes são constituídos por uma vasta e hipercomplexa gama de alunos que possuem dificuldades concretas de aprendizagem, atrasos em certas dimensões das aprendizagens ou disciplinas, causados, geralmente, por atrasos ou disfunções em suas áreas motoras e perceptivas, instrumentais e emocionais e de origem ambiental, familiar e sociocultural empobrecida. Apesar disso, porém, a maior quantidade de crianças, adolescentes e jovens com ligeiras e, mesmo moderadas dificuldades de aprendizagens, manifestam suas causalidades como sendo emanadas de suas estruturas e dinâmicas emocionais e afectivas, fundamentalmente, através de seus complexos, medos e traumas. Ora, sendo os complexos conjuntos organizados de representações, estas emergem de recordações e de vivências de forte e acentuado valor emocional, afectivo e psíquico, estruturadoras e dinamizadoras ou bloqueadoras das emoções, dos sentimentos e dos afectos, das relações interiores e exteriores, das adaptações, atitudes e comportamentos, parcial ou totalmente inconsciente. Assumindo, geralmente, os complexos funções de negatividade, ao serem integrados na personalidade do indivíduo, invadem e repercutem-se em todo o seu ser e geram nele dificuldades de várias ordens e natureza, como atitudes e comportamentos de inibição, vivência de situações dolorosas, ausências de afirmação, isolamentos psicoemocionais, frustrações e conflitos interiores que, directa ou indirectamente, se projectam verso o exterior, atitudes e comportamentos de regressão, etc.. Embora uma maioria de causas de complexos, que são fundamentalmente de natureza psicoemocional e afectiva, encontre em sua origem causas físicas como, por exemplo, problemas de visão, de estrabismo ou miopia, gaguez, diferença social ou cultural, gordura, altura ou pequenez, eles manifestam-se, quase a maioria das vezes, através de complexos de inferioridade. Quer o complexo de inferioridade seja ou não matriz de outros complexos (disputa: Freud-Adler), o facto é que o seu portador vivencia sentimentos de incapacidades e incompetências, de rejeições e isolamentos, de inseguranças e ciúmes, de contínuos julgamentos pelo olhares dos outros e má consciência pessoal, o que o leva não só a atitudes de desvalorização individual, mas, também, a comportamentos autodestrutivos, visto trazer, permanentemente consigo, a sensação do fracasso e de não fazer tão bem, como seus colegas, aquilo que se propõe ou e aspira fazer. Um tal contínuo sentimento de fracasso faz com que o indivíduo desista facilmente do que está ou pretende efectuar, pois, dominado por seus sentimentos e incapacidades, refugia-se em diversões sado-masoquistas ou imaginações utópicas, o que desencadeia, em si mesmo, sentimentos de culpabilidade, sentido-se responsável pelo que corre mal ou pelo que não consegue fazer. No seio de tais mecanismos de aprisionamentos e de bloqueamentos de suas capacidades e aptidões, todo o indivíduo possui potenciais capacidades não só de sanar, mas, também, de ultrapassar tais complexos de inferioridade, através das realizações de acções e de comportamentos para os quais se sente dotado, e, através de dedicações e treinos em acções que até aí realizavam, acabando por concretizá-los na perfeição, visto o sistema nervoso do indivíduo e suas estruturas cerebrais possuírem insondáveis
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potenciais, e, as dimensões emocionais e afectivas possuírem enormes capacidades de flexibilidade e maleabilidade, de adaptabilidade e sociabilidade. Embora os anteriores complexos possuam acentuados efeitos a nível de estruturas e de dinamismos psicoemocionais, sentimentais e afectivos, existem outros complexos cujas causas emergem, essencialmente, das estruturas afectivas e emocionais dos indivíduos: os complexos de Édipo e de Electra são disso um exemplo. Segundo Sigmund Freud, pai da Psicanálise, inspirando-se na lenda do rei Édipo, para denominar um dos maiores conflitos psicoemocionais dos desenvolvimentos humanos, lendas, segundo a qual, o oráculo escreveu que um dia mataria seu pai e casaria com sua mãe, embora sempre tentasse fugir a tal trágico destino, quis o acaso que Édipo, sem o saber, matasse seu pai e, igualmente, sem o saber, casasse com a sua mãe biológica. Após vivência em comum de vários anos, tomaram consciência da realidade, e, Jocasta, sua mãe, enforcou-se e Édipo furou seus próprios olhos, partindo, em seguida, para o esílio com sua filha Antígona. Freud, transpondo tal tragédia para as vivências afectivo-emocionais da relação triangular: criança-mãe-pai quis afirmar, simplesmente, que entre os três−sete anos de idade desenvolve-se na criança uma relação afectivo-emocional simultaneamente hipercomplexa e dolorosa. O rapaz ama a mãe e hostiliza o pai; a menina ama o pai e hostiliza a mãe; o rapaz experiencia o desejo de possuir a mãe e considera o pai como rival, e, a menina entra em rivalidade com a mãe em busca da conquista do pai. As vivências de tais sentimentos geram, tanto num como noutra, sentimentos de angústias, de receios e medos; atitudes e comportamentos agressivos, sentimentos de culpabilidade e medos de castração. E isto porque o menino, a competir com o pai, para possuir relacionamento privilegiado com a mãe, vivencia o pai como algo de incómodo e indesejável. Porém, a sua hostilidade com o pai, fá-lo tornar-se merecedor de um castigo grave, o que, inclusivamente – pensa ele – pode fazer-lhe perder uma parte muito importante do corpo. Convencido, mais tarde, que não poderá desembaraçar-se do pai procura sua aprovação e consideração, moldando-se, então, aos seus desejos e substituindo o afecto possessivo e exclusivo que sentia por sua mãe por uma atitude mais independente, mais segura e mais autónoma. A menina, por sua vez, apegada quase exclusivamente à mãe, sente que ela se interessa particularmente pelo pai. Descobre, então, que é anatomicamente diferente e carente em alguma coisa, em relação aos rapazes, e, portanto, passa a sentir-se inferior. Inicia, um processo de conquista do pai, dedica-lhe todo o carinho, e, por vezes, chega a mostrar-se caprichosa e insolente com a mãe. Apesar disso, porém, e, perante a evidência da realidade e de ser diferente dos rapazes, centraliza, em si mesmo, o afecto particular do pai. Face a uma tal realidade não lhe resta outro remédio senão o de assemelhar-se à mãe para poder alcançar, um dia, o afecto exclusivo de um homem. Então, a menina, aproxima-se de novo da mãe. Procura ajudá-la em trabalhos tipicamente femininos, dispondo-se a executar um dia, em relação às suas filhas, idênticas ordens que recebe da sua mãe. O anterior processo de relação afectivo-emocional da menina com sua mãe, de atracção pelo pai e de ciúmes da mãe, chegando mesmo a desejar que ela desapareça, é denominado de complexo de Electra. A culpabilidade da menina em relação à mãe gera nela a sensação de que a mãe já não a ama, o que a torna agressiva em relação à pessoa que lhe deu tanto cuidado e da qual ainda tem necessidade. Acusando a mãe por seu estado de castração, apaixona-se pelo pai, esperando que este venha a recompensar a ausência do pénis, dando-lhe um filho. Constatando a impossibilidade de um tal acontecimento, a menina, progressiva60
mente, através de identificações, aproxima-se da mãe, e, assume, lenta, mas, progressivamente, seus papéis e funções de menina e mulher. As anteriores relações afectivo-emocionais: filho-filha-pai-mãe constituem fundamento de organização da personalidade do educando pois, a partir da melhor ou pior resolução de tais conflitos, o educando transfere desloca, multiplica e generaliza tanto para os outros como para os meios em que viverá, e, para a sociedade em geral, tais comportamentos e situações referenciais. A partir daí e de um amor demasiado exclusivo pelo progenitor do sexo oposto poderá conduzir o educando a flagrantes e acentuadas dificuldades de adaptação tanto aos outros como à sociedade. O menino com laços demasiado intensos em relação à mãe pode transformar-se num adulto sem virilidade, caso não utilize sua adolescência e puberdade para iniciar seu processo de captação de amor materno. Por isso, no estado de latência ( 6 /11 anos) deverá deixar-se falar a criança de suas dúvidas e angústias, de seus sentimentos e de suas emoções e mostrar-lhe que se compreende o que se passa com ele, dando-lhe, assim, hipóteses de, progressivamente, entrar na realidade e, assim, facilitar a identificação do filho com o pai e da filha com a mãe. Apesar disso, no entanto, não é raro, tanto filhos como filhas, em sonhos como em representações, possuírem imagens dos pais como reis, rainhas, anjos, demónios, bruxas ou monstros, sentimentos que não são completamente explicáveis por fenómenos das relações linearmente psico-comportamentais, mas apenas através de mitos e memoriais das experiências ancestrais constitutivos do “inconsciente colectivo”. Além da existência dos anteriores efeitos dos analisados dinamismos afectivos, emocionais, psíquicos e comportamentais, subjacentes à dinâmica e organização da personalidade de cada indivíduo, subsistem, nas crianças, medos, inibições e receios, que deixam ou podem deixar marcas, efeitos ou características negativas, não só durante todo o processo de desenvolvimento e formação da própria personalidade, mas, também, para toda a existência do indivíduo.
IV – ACÇÕES DAS EMOÇÕES NEGATIVAS NOS COMPORTAMENTOS PSICO-COGNITIVOS
As anteriores constelações de dinamismos emocionais, sentimentais e afectivos no desenvolvimento e na formação da personalidade de um indivíduo geram, não só no imediato, mas, sobretudo, a médios e longos prazos, atitudes e comportamentos medrosos, ansiosos e angustiantes que, caso não sejam em seus devidos tempos corrigidos e libertados, impregnam-se na personalidade do indivíduo, permanecendo esta com germes de contínuas perturbações face a certos relacionamentos, objectos, experiências e vivências. E isto porque, sendo o medo uma das emoções básicas do ser humano, ele aparece como resposta a uma ameaça tanto conhecida como desconhecida, consciente como inconsciente, interna ou externa, concreta ou abstracta, e, não necessariamente, com origem em conflitos. Os seus efeitos psico-orgânicos são vários e de natureza psicológica e orgânica, como a exteriorização de medos através de pânicos, receios, timidez e inibições, e, a nível bio-orgânico, através de palidez, rubor, suor, rigidez, descontrolo dos esfíncteres, paralisia de certos músculos, etc., comportamentos cujas essências causais não deixam de ser psico-emocionais. 61
Considerando o facto do medo ser um acontecimento frequente na existência dos indivíduos, a nível neuropsicológico ele apresenta-se como sinal de alerta, o qual, não raramente, desencadeia reacções fisiológicas desagradáveis, como imobilidade, aceleração das pulsações cardíacas, secura da boca, transpiração da pele, palidez, pressão sobre o sistema nervoso, tremor dos músculos, etc.. Na análise da causa dos medos constata-se que estes acompanham a existência dos seres humanos. Quando a criança nasce e chora não é só devido aos efeitos das reacções do oxigénio nos pulmões, mas, também devido ao facto do medo da nova realidade. Ao deixar, pouco a pouco, seu estado de inconsciência e passar para o estado de semi-inconsciência, e, mais tarde, para o de consciência, progressivamente, aprende a conhecer o medo, e, passa, então, de um medo primitivo para um medo aprendido e socializado. A criança, através de seu conhecimento e emergência de sua individualidade, é obrigado a envolver-se no novo, no desconhecido e no diferente e, tais processos, geram maiores ou menores medos e receios. Os sistemas familiares da criança possuem suas estruturas, seus mecanismos e suas inseguranças. Os seus medos vão, então, sendo aprendidos por condicionamentos: medo do cão quando associado a uma experiência negativa ou a uma aparição súbita, por auto-sugestão indutiva “vais cair” por imitação “medos das tempestades, dos relâmpagos, dos trovões” quando sente que a própria mãe tem medos destes, etc.. Por volta dos dois anos de idade, a criança consegue raciocinar sobre tais medos e, progressivamente, consegue, pelo menos parcialmente, libertar-se deles. No entanto, outros aparecem: medos de movimentos súbitos ou de ruídos fortes, medos de situações insólitas de pessoas estranhas, medos dos animais, do escuro, etc.. Os anteriores medos são, fundamentalmente, desencadeados pelas sensações que as crianças têm verdadeiramente de estarem em perigo. Porém, com a entrada para a escola, as crianças não só têm medo do desconhecido, mas, também, da rejeição por parte dos colegas e dos professores, bem como de tudo aquilo que eles associem à vida escolar. Daí o facto de exageros, mentiras e mesmo fobias à escola e, tanto em relação aos comportamentos dos professores como na existência de doenças, para não irem à escola. Porém, apesar do medo ser um sinal de alerta face a situações desagradáveis ou perigosas, existem crianças passivas, que parecem encontrar-se como que envolvidas numa atmosfera de medos, e, outras, fortes e activas, frequentemente corajosas perante os perigos. No entanto, os medos variam, de maneira bastante previsível, com a idade e o sexo, a classe sócio-económica, o nível de desenvolvimento sócio-cognitivo, e, em função de outras áreas variáveis, de natureza biopsicológica, individual e social. No entanto, reacções frequentes e intensas de medo são incompatíveis com comportamentos estáveis, eficientes e construtivos. No caso de medos exagerados e de sensações de perigo imediato, desencadeadores de fobias e de ataques de pânico, tais reacções são altamente perturbadoras e causadoras de grande sofrimento para o indivíduo. Estas reacções são, no fundo, respostas de adaptação e mecanismos de defesa de situações potencialmente perigosas, quer estas sejam reais ou imaginárias. No entanto, qualquer situação, comportamento ou objecto inofensivo para um pode desencadear noutros reacções de medo, se estes o revestirem de significados ameaçadores, visto os medos serem, essencialmente, efeitos de reacções emocionais do indivíduo e, por isso, efeitos das interacções de predisposições inatas com os resultados de processos de desenvolvimento de educação e aprendizagem. A nível de funcionalidade operacional, elevados níveis de medos geram confusão e antivalência nas atitudes e nos comportamentos, e, a nível psicoemocional, 62
sensações de mal-estar, com acentuadas características de sentimento de insegurança, instabilidade e imagem negativa de si mesmo. A nível psico-comportamental e intelectual, o indivíduo sente seu próprio Eu profundamente fragilizado, diminuído em suas capacidades de autodeterminação, confuso e com dificuldades em suas associações de ideias e de imagens, podendo ir até ao ponto de regressões ao pensamento mágico-primitivo, ser invadido pela obnubilação de consciência e mesmo chegar, parcial ou totalmente, à perda total daquela. E isto porque o indivíduo com medo, geralmente, não domina o pensamento nem a vontade. Torna-se, por isso, menos responsável ou mesmo irresponsável em suas atitudes, actos e comportamentos. Perde facilmente a serenidade, isto é, a presença do espírito, e, suas capacidades de memória ficam perturbadas, tornando-se difícil a lembrança de actos, atitudes e situações. Tanto a atenção como a concentração, a reflexão como as capacidades de aprendizagem enfraquecem. Muitos desses medos, no entanto, sobretudo nas crianças, por um lado, são medos aprendidos e desenvolvidos nos meios familiares, como sucede, por exemplo, com a superproteção, a rejeição, a ansiedade, a preocupação e a apreensão exagerada dos pais face à vida dos filhos. Por outro lado, existem pais que adoptam a educação por meio de medos, através de ameaças, punições ou castigos; através de sucessivas advertências ou constantes brigas do casal, acompanhadas de ameaça na presença dos filhos, o que pode desencadear os mais diferentes medos, como, o medo de ser culpado da briga, de um dos progenitores sair de casa, de agressões físicas, de represálias afectivas, de rejeições afectivas, etc.. As anteriores constelações de medos desencadeiam, nos indivíduos, enorme sofrimento visto, a maioria das vezes, em relação a tais situações, desencadearem ansiedade antecipada, que se estende ou pode estender por vários dias e até semanas, podendo levar a criança a um fraco desempenho, real ou percebido, das funções a executar, de maneira particular face às aprendizagens escolares, às provas, aos eventos sociais, etc., situações de medo-ansiedade que faz sentir-se inseguro e perturbado face aos testes, à participação nas aulas e aos encontros com grupos de amigos ou colegas. No caso da existência de crianças com medos, angústias ou ansiedades de separação, quando se afastam de casa ou são obrigadas a se separar das figuras de vinculação, frequentemente, precisam de saber o paradeiro delas e sentem necessidade de permanecer em contacto com elas. Algumas de tais crianças, quando estão longe de casa, sentem-se desconfortadas, e, tal desconforto, leva-as à doença. Não raras vezes sentem-se invadidas por temores de acidentes, doenças deles próprios ou daqueles a que estão visceralmente apegados. Sentem enorme desconforto quando viajam sozinhos e evitam ir a qualquer lugar sem companhia. Por vontade própria nunca se separavam dos pais. Afirmam terem medo de se perderem, recusam ir à escola e a acampamentos, a visitar ou a pernoitar em casa de amigos ou a saírem para pequenas incumbências. Têm, geralmente, perturbações de sono, correm para os quartos dos pais durante a noite e, se a entrada lhes é impedida, deitam-se a dormir junto à porta. Tentam esquivar-se de contextos sociais, devido à preocupação de serem separadas ou com preocupações acerca da necessidade da presença de um dos pais, quando isso é inadequado. As crianças perturbadas por tais medos fóbicos exteriorizam suas perturbações através de reais queixas somáticas, de vómitos, de dôres abdominais, de dôres de cabeça, etc.. Um tal tipo de crianças, quando é extremamente perturbado, frente à perspectiva da separação, podem apresentar raiva, e, até, agredir, fisicamente, a pessoa que os está a forçar à separação. São, normalmente, descritas como crianças exigentes, intrusivas e necessitando de constante atenção.
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No entanto, transformam-se numa fonte de frustração para os pais, provocando ressentimentos e conflitos familiares. Não raras vezes, têm medo de irem a um quarto vazio ou escuro da casa. Ficam apavoradas por saírem à rua; agarram-se, insistentemente, aos pais e pedem para dormir no quarto deles. Acordam sobressaltados a meio da noite. Sentem-se, não raras vezes, invadidos pelo terror nocturno, insistem para deixarem de ir à escola e não querem sair para brincarem com outras crianças. Manifestam, também, exagerada preocupação com os pais e os irmãos, sobretudo mais novos, e sentem muito medo que alguém da sua família seja assaltado ou morra. Qualquer que seja a causa, natureza ou origem dos medos (medo de criaturas imaginárias, de assassinos ou ladrões; do escuro, de objectos e pessoas estranhas; de ruídos, da solidão, da dôr, de animais, de acidentes, de armas, bruxas, papões ou monstros; medo da hospitalização ou do fracasso escolar) e tanto uns como outros dos medos retraem o desenvolvimento da criança, obstaculizam o seu crescimento e a sua maturidade, geram dependências, inseguranças e instabilidades, e, criam, no indivíduo, complexos de inferioridade, com efeitos a níveis de bloqueamentos, de mal-estares e de sofrimentos variados. A nível psico-cognitivo desenvolvem-se, em tais crianças, constelações de inibições psíquicas e, tanto suas atitudes como seus comportamentos, são retraídos. Evitam as pessoas e manifestam medos de experiências novas, acabando por terem graves dificuldades, não só a nível de aprendizagem, mas, também, a nível de integração sócio-escolar. Quando as dificuldades de aprendizagens escolares são em várias áreas, não raras vezes, tais crianças são confundidas com crianças deficientes. A nível de identidade, a sua interioridade é palco de conflitos: seus mecanismos de detecção de estímulos exteriores permanecem, de forma geral, acentuadamente bloqueados, as suas potencialidades de associações mentais inibidas e o refúgio num imaginário irreal torna-se evidência. Uma tal estrutura psicoemocional do sujeito torna-o, então, desequilibrado; as suas relações com os outros e com os ambientes alteradas, os seus sentimentos de impotência contra as ameaças tornam-se galopantes, os seus meios de auto-afirmação fragilizados, a acção do seu Eu psico-corporal acentuadamente diminuída, e, as formas primitivas do seu pensamento invadem-o. Apesar disso, emergindo os medos de um indivíduo mais de seu sistema emocional, isto é de seu sistema límbico, que de seu sistema racional, ou seja, do neocórtice, o indivíduo, com personalidade alterada pela impregnação dos medos, sofre de ansiedades e de angústias, de pânico e terrores e, tais patologias, desencadeiam respostas orgânicas e psicológicas de acentuadas negatividades. A nível de motricidade manifesta permanentes reacções de evitamento das situações ou dos objectos geradores de medos. A nível neurovegetativo gera-se perda do equilíbrio funcional entre o sistema nervoso simpático e o parassimpático, e, tais desequilíbrios, desencadeiam reacções hormonais de vários tipos e natureza. A nível de cognição e de linguagem, o indivíduo é, constantemente, invadido pela presença de imagens agressivas, e, manifesta, constantemente, expressões de desagrado da não aprovação e rejeição. A nível psico-comportamental os seus raciocínios perdem clareza, os seus objectivos e propósitos modificam-se constantemente. A sua individualidade deixa de ser espontânea, as dúvidas atormentam-o, a sua atenção é espectante, o seu permanente temor do insucesso asfixia-o, os seus centros neurocorticais inibem-se, os seus comportamentos de retracção invadem-o e a permanente sensação de fragilidade e de impotência do seu Eu toma conta de si.
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A nível psicoemocional a sua ansiedade e angústia estão relacionadas com perspectivas de acontecimentos maléficos: entrega-se à apatia e à indiferença, e, tanto pesadelos como delírios desencadeiam-se. V - EFEITOS DOS MEDOS NAS DINÂMICAS SOCIOEMOCIONAIS E NOS PROCESSOS COGNITIVOS
Originando os medos uma série de factores e de comportamentos, na sua maioria, nocivos a nível biopsicológico, emocional, psico-afectivo e cognitivointelectual, tanto a sua origem e natureza como a sua qualidade e intensidade, desencadeiam, mais inconsciente que conscientemente, efeitos psico-comportamentais denominados: timidez, inibição, ansiedade, angústia, depressão, etc.. Não sendo a timidez o mesmo que inibição, os efeitos psico-comportamentais de uma e de outra, não raras vezes, são idênticos, e, por isso, a nível concreto, torna-se difícil distinguir o que é efeito da timidez e da inibição. Criança, adolescente ou adulto tímido tem dificuldade de comunicação com os outros, bloqueia a exteriorização de suas emoções e de seus sentimentos, e, permanece, normalmente, mais calado que os restantes mas, capta e interioriza, mais que estes. Sendo as atitudes do tímido, geralmente, contrafeitas e reprimidas, com falta de jeito e olhares fugidios, tanto a sua fragilidade a nível de vontade como os seus complexos de inferioridade encontram-se por detrás de suas atitudes e comportamentos de timidez. Estas manifestações, a nível psicossomático, são de palidez, rubor, aceleradas palpitações cardíacas, contracções do estômago, dôres abdominais, etc.; a nível psicocognitivo o tímido caracteriza-se por suas contínuas hesitações, por ausências de motivações, por bruscas e forçadas passagens ao acto, por lentas reacções, ideias confusas, frequentes vazios mentais e por várias manifestações de amnésias ou de esquecimento. Os anteriores comportamentos fazem com que o indivíduo tímido evite, permanentemente, as situações que o podem pôr à prova, e, devido a tal evitamento, reforça seu sentimento de culpabilidade. Este sentimento faz com que o indivíduo constrinja sua existência em apertados esquemas mentais, super-organizados, não deixando lugar à existência de factos ou acontecimentos inesperados, imprevisíveis ou ocasionais. Por isso, reage, não raras vezes, com atitudes inadaptadas às situações, e, por falta de diálogo ou de escuta dos outros e falta de aceitação das diferenças, torna-se autoritário, agressivo, e, mesmo violento, visto pretender impôr aos outros a sua própria imagem, imagem que é de desprezo por si mesmo, em termos de igualdade com os outros. A nível sociopsicológico estes comportamentos emergem, fundamentalmente, de educações familiares demasiado rígidas e severas, exigentes ou de super-proteccionismos, os quais fazem com que tais crianças e jovens vivam em ciclos fechados e impedidos de socializações normais. Certo grau de timidez estrutural desencadeia, na personalidade do tímido, comportamentos fóbicos, tanto de claustrofobias como agorafobias, de fobias obsessivas como de neuroses, os quais fecham-se à novidade social; não sabem como se relacionar com os outros; restringem seus potenciais tanto de sociabilidade como de socialização, sentem-se, permanentemente, desconfortados e são invadidos por um contínuo mal-estar de sofrimento psicofísico e afectivo-emocinal, perturbador da organização da sua personalidade e de suas relações interpessoais, tornando-se, então, impossível diagnosticar o quanto sofre, o que gostaria de fazer, aquilo que pensa e que rumo pretende dar à sua vida. 65
Ensaiando as buscas das causas da timidez do ser humano, psicólogos clínicos, sociopsicólogos e psicanalistas diagnosticaram uma série de causas que nem sempre são concordantes. Porém, sendo a timidez um dos efeitos dos medos, parece de razoável aceitação a tese da timidez possuir um certo enraízamento filogenético, visto, em certas alturas, apresentar-se como mero mecanismo de defesa. No entanto, a maioria absoluta das causas são de natureza sociopsicológica, e, isto, porque tanto a criança como o adolescente ou adulto tímidos manifestam: − múltiplas dificuldades de convivialidade e de socialização, − esforçam-se, permanentemente, para passarem despercebidos, tanto em salas de aulas como em situações de recreio, em situações sociais como profissionais, − demostram muita insegurança, mas, também, manifestam sentimentos de integridade quando se tornam centro de atenções, − hesitam sem saber o que fazer e julgam-se, constantemente, submetidos a olhares e a críticas, − quando interrogados apresentam vários sintomas como: corar, palidez, tremuras, dificuldades de comunicação, balbuciar, gaguejar, etc.. Ora, sendo as hierarquias dos anteriores comportamentos emanadas, fundamentalmente, das intolerâncias pessoais, das inseguranças e das imagens negativas de si mesmo, não há dúvida que a maioria absoluta das causas da timidez não são genéticas nem hereditárias, mas, sim resultados das acções dos meios, das construções, dos desenvolvimentos e das organizações da personalidade de cada um. Não restam dúvidas, porém, que elevada percentagem de pais de crianças tímidas são também eles mesmos tímidos, e, em quase nada positivistas nos processos de educação e de relacionamento com seus próprios filhos, factos que geram, depreciações, núcleos de negatividade no seio da personalidade do próprio filho. Por isso, individualidades tímidas, são, essencialmente, resultados ou efeitos de experiências e de vivências negativas, de défices a nível de aquisição, de desenvolvimentos e de desorganizações das aptidões das capacidades sociais essenciais; efeitos de inseguranças face a algo que se faz ou pretende fazer, e, a nível de maior profundidade, resultado de acentuada imagem negativa de si mesmo, de menosprezo e de contínua auto-anulação, caracterizados, por exemplo, através de afirmações como: “não presto para nada, não sou capaz, etc.”. Na integridade de tais indivíduos, essencialmente na dos tímidos, imperam dinamismos intrapsíquicos perturbadores da própria personalidade. Estes conflitos são essencialmente de natureza psicoemocional, afectiva e relacional. Em tais situações, as instâncias de sua personalidade não funcionam harmoniosamente e, tanto suas atitudes como seus comportamentos são debilitantes. O seu inconsciente, zona dos instintos e das pulsões, possui dificuldades de se integrar na realidade, e, por isso, não facilita a coadjuvação da acção da natureza do ego do indivíduo, o qual possui, como função essencial, decidir o que deve ser feito, evitar o que não deve ser feito e moderar a acção comportamental do seu todo. Estas duas instâncias essenciais da formação da personalidade, não raras vezes, no entanto, sentem-se constrangidas pela acção do super-Eu, o qual, pretendendo ser monitor da moral e da ética, não raras vezes, injecta, na personalidade do indivíduo, tabús e preconceitos, ideias falsas e megalomanias perturbadoras. O Eu do indivíduo, porém, quando devidamente desenvolvido, activado e equilibrado, e, harmoniosamente desenvolvido, possui, em si mesmo, potencialidades não só de satisfazer, mas, também, de equilibrar as funcionalidades entre as instâncias da personalidade, orientando-se por atitudes e comportamentos que dão respostas às necessidades do inconsciente, filtram os comportamentos emanados da instância do 66
super-Eu e organizam a totalidade do indivíduo em função do desenvolvimento, do equilíbrio e da harmonia da totalidade de seu próprio ser. E isto porque o Eu individual do sujeito humano possui capacidades de dar respostas às necessidades de seu Inconsciente e Consciente sem violar os códigos sociopsíquicos do super-Eu, apesar da timidez encerrar um indivíduo num circulo vicioso, visto, no quotidiano, o comportamento da pessoa tímida originar e desenvolver experiências de timidez, o que gera, no indivíduo, tanto uma aprendizagem como uma personalidade cristalizadas. No entanto, tudo o que se aprende também se pode desaprender, e, isto, não só em relação à timidez, mas, também, às fobias, aos maus hábitos e costumes, aos comportamentos desviantes, etc.. Para tal é necessário alterar-se as imagens negativas do indivíduo, modificar-se seus comportamentos inseguros e mudar suas acções e envolvimentos ineficazes e ineficientes, fazendo com que o indivíduo tímido abandone seus receios de enfrentar as vicissitudes do quotidiano, da sua existência e da sua vida. O auto-negativismo critico dos tímidos ultrapassa, regra geral, os limites da razoabilidade. Suas ideias de beleza e de perfeição são pouco realistas. Transmitem, geralmente, imagens de tristeza e de melancolia; de solitários e de apáticos. Os rapazes, geralmente, percepcionam-se como gordos, fracos, feios, muito altos, menos fortes, menos atraentes que os seus colegas não-tímidos, e, as raparigas como magras ou gordas, pouco atraentes ou feias. Tanto rapazes como raparigas sofrem o drama de sua solidão interior, da qual, geralmente, têm medo. Afirmam-se como sendo menos inteligentes, porque, de facto não se evidenciam, mas, na realidade isso não significa que o sejam. Professores, pessoas de idade, do sexo oposto, quando falam publicamente ou em grupo, participam nas aulas ou em situações novas etc., reforçam, em tal tipo de indivíduos, os seus sentimentos de vulnerabilidade e acentuam seus complexos de inferioridade, fazendo com que não expressem suas opiniões, não defendam seus direitos nem manifestem seus valores, o que faz com que os outros se sintam impossibilitados de avaliar as suas aptidões e as capacidades, os seus interesses e suas orientações. No entanto, a um nível de maior profundidade, isto é, a nível de formação e de desenvolvimento da personalidade de um indivíduo encontram-se as inibições. Estas, apresentando mecanismos idênticos aos da timidez, são essencialmente do domínio das emoções, dos sentimentos e dos afectos, e, são bloqueadoras de actividades e de funções, de reacções e iniciativas, de activações e de criatividades. Sendo as suas causas não só oriundas de factores exteriores, mas, essencialmente, emanadas de processos interiores, elas não só obstaculizam os positivos efeitos das motivações oriundas do exterior, mas, também, bloqueiam, distorcem ou mesmo paralisam as acções dos estímulos do interior do indivíduo, impedindo ou não deixando que o indivíduo atinja suas metas, seus fins ou objectivos, tanto a nível pessoal como social, de aprendizagens como de performances. Sendo as inibições resultantes de processos antagónicos às activações, aos estímulos e às motivações elas geram nos indivíduos diminuição ou suspensão das actividades do sistema ou dos sistemas em causas, de modo particular a nível de funções e de actividades de aprendizagens e de memórias, de atitudes e de comportamentos, e, isto, através dos efeitos de seus processos de interferências nas actividades dos sistemas, de sua diminuição ou suspensão. Em certos casos, porém, as inibições tornam-se positivas ao imporem-se como freios de comportamentos negativos, evitando que os indivíduos cometam actos lamentáveis, que vão contra os seus sistemas de valores progressivamente adquiridos e contra a consciência e regras de comportamentos que interiorizou.
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Na maioria das restantes situações, porém, as inibições interferem na acção das funções, reduzem-a ou suspendem-a e atingem a acção do indivíduo no seu todo ou em parte, empobrecendo a sua identidade, restringindo as suas energias, bloqueando as suas potencialidades e perturbando a sua personalidade, fazendo com que os seus comportamentos atinjam patamares de anormalidade psicoemocional e comportamental, que podem ir desde o simples patamar fronteiriço à mais complexa anormalidade ou patologia. A nível de aprendizagens escolares, o aprendente inibido manifesta-se tímido e apagado, sem curiosidade nem a disponibilidade dos outros, permanece retraído, foge das pessoas, manifesta medos de novas situações e de novas experiências, não revela centros de interesses nem se preocupa com o aprender. Por isso, os inibidos são diagnosticados pelo professor como sujeitos pouco inteligentes ou simplesmente como indivíduos incapazes de compreender certos conteúdos ou temáticas. Face a tais situações, de profundo e acentuado sofrimento psicoemocional, físico e social, os alunos inibidos, por ausências de equilibradas elaborações emocionais, afectivas e psíquicas, e, sem as necessárias e equilibradas reorganizações interiores, desenvolvem processos de irracionalidade, de evitamentos de estímulos e de mecanismos de fugas a si mesmos, a objectos, a animais, pessoas, espaços, situações e circunstâncias. A irracionalidade comportamental de tais indivíduos faz com que eles, entrando em relações, reais ou imaginárias, com certos objectos, pessoas, situações ou circunstâncias, sejam possuídos por enorme medo, timidez, inibição ou pânico. Sendo estes medos de rejeição de tais relações de origem e natureza diversa, também tais fobias se multiplicam consoante suas causas. Daí a existência de fobias a animais, insectos; fobias a viagens, a alturas, transportes, espaços pequenos ou grandes, etc., situações cujo mínimo de racionalidade demostra não existir perigo algum. No entanto, seres humanos, crianças, adolescentes, jovens e adultos com comportamentos fóbicos aparecem cada vez mais. À luz da psicanálise, porém, as fobias são efeitos de doenças do imaginário e de medo do real ou, em termos mais concretos, medo do medo ou medo de não ter medo. Porém, resultando as fobias das discrepâncias efectuadas pelo indivíduo entre seu imaginário e a própria realidade, os seus maiores ou menores níveis da discrepância são geradores de acentuadas perturbações a nível da personalidade, de obstáculos sociais e de acentuadas dificuldades nas aprendizagens. É que os efeitos das fobias, de um modo geral, são muito mais exagerados e persistentes que suas próprias causas. Não raras vezes, a consciência fica bloqueada, as actividades psico-cognitivas são distorcidas, as emoções desorientadas e as ideias desfasadas das temáticas ou dos conteúdos em causa e, a vontade, parcial ou totalmente inibida. Uma tal irracionalidade, emanada de estruturas e de dinamismos não conscientes, não raramente, é devida a mecanismos de deslocação. No entanto, no seu interior, o sujeito não ignora seus medos, desenvolve e reforça mecanismos de sublimação e procura responder, de forma aceitável, às exigências e solicitações dos outros e dos meios. A sua interioridade sofre enorme desgaste, as suas inseguranças aumentam, e, seus estados afectivo-emocionais impregnam-se de instabilidade, de falta de resiliência e de ausência de força de vontade. Tanto os seus esquemas como os seus mapas mentais tendem a ser elaborados através de evitamentos da realidade e com enorme envolvimento do imaginário, desenvolvendo-se, a partir de tais níveis psico-comportamentais, fugas ao real, e desencadeiam-se, então, medos de rupturas objectais, fobia da separação da casa, da mãe, dos meios; fobia à escola, ao professor, aos colegas, etc..
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Ora, sendo os medos-fóbicos emanados das estruturas e dos distorcidos dinamismos emocionais e afectivos dos sujeitos, tais fobias podem encontrarem-se em crianças e adolescentes, cognitiva e intelectualmente considerados normais, infra-normais ou mesmo sobredotados, visto a causa essencial das fobias encontrar-se no subdesenvolvimento da maturidade afectiva-emocional, o que não acompanha, necessariamente, tanto o desenvolvimento como a maturação cognitivo-intelectual. No entanto, manifestando-se as fobias escolares através de enorme relutância ou de recusa em ir para a escola, devido ao intenso medo que sente em relação aos meios ou sistemas escolares, no início das fases escolares, tais medos podem não estarem relacionados com a escola, mas, apenas, com o medo da separação dos pais ou do ambiente familiar, sendo, então, a escola simples objecto de projecção de tal medo. A fobia escolar, propriamente dita, advém das dificuldades na relação com os colegas e com os professores; das críticas por parte dos professores, do baixo rendimento escolar, da disciplina rígida, da falta de interesse e da motivação pela escola; da baixa auto-estima pessoal, da ausência de autoconceito positivo e psicossomática como, por exemplo, diarreias, náuseas, dôres de barriga, cefaleias, febres, dificuldades respiratórias, suores, etc.. Sendo múltiplas e de natureza vária, as causas das fobias, nomeadamente das fobias escolares, quando através de meios e de técnicas psico-educacionais ou terapêuticas não são equilibradamente sanadas, os indivíduos fóbicos facilmente desenvolvem tendências para situações de isolamento e de delinquência, de alcoolismo e de droga. E isto porque as fobias são essencialmente originadas por perturbações e desequilíbrios emocionais e afectivos. Sentimentos não menos difusos, desagradáveis e subjectivos, são os que resultam da ansiedade, visto esta ser ou processar-se como efeito de uma resposta interna a uma ameaça desconhecida. A desagrabilidade gera vários comportamentos psicossomáticos em simultâneo, como sejam, por exemplo, sensações de vazio, palpitações cardíacas, suores, febres, etc.. Distinguindo-se a ansiedade do medo pelo facto deste ser uma resposta a uma ameaça desconhecida, e, a ansiedade uma resposta a uma ameaça desconhecida originada pela acção conflituante do inconsciente, o seu objecto, a nível cognitivo, não é mensurável. Porém, a ansiedade dita “normal” constituie uma advertência antecipada em relação a certos perigos como, por exemplo, danos físicos, possíveis punições, ameaças ao sucesso, separação de entes queridos e problemas que poderão ser evitados, caso se enfrente tais situações ou se tome as medidas adequadas. No caso da existência de respostas inadequadas, tanto pela intensidade como pela duração a determinados estímulos, a ansiedade atinge um nível de anormalidade patológica e, seus efeitos, tornam-se acentuadamente negativos, não só a níveis de estruturas e de dinamismos sócio-psico-afectivo-emocionais, mas, também, a nível de equilíbrios da própria personalidade. Embora a maioria absoluta de crianças, de adolescentes e de jovens não exteriorizem verbalmente a sua ansiedade, tanto suas manifestações como seus comportamentos ansiosos, manifestados exteriormente, são efeitos de suas dolorosas sensações interiores e estas manifestam-se essencialmente através de nervosismo, de tiques, de aborrecimento, de amedrontamentos, irritabilidades, inquietudes, inibições, medos de participarem na sala de aulas, medos de se exporem perante os grupos face aos colegas, etc.. De facto, constituindo a ansiedade, a nível ligeiro, um potencial factor de adaptação, a nível médio torna-se factor de stress, distorcedora de emoções e de sentimentos, de atitudes e comportamentos. No entanto, enquanto nos medos existem 69
objectos reais ou imaginários, nas ansiedades não se encontram objectos ameaçadores, mas, apenas, vivências, cujos desfechos gostariam de se conhecer. Por isso, sendo a ansiedade essencialmente de origem psíquica os seus efeitos são, fundamentalmente, de natureza psicossomática. Ultrapassando certo patamar: o de adaptação, a nível bioenergético a ansiedade faz com que o sujeito se torne asténico; a nível de sono com insónias; a nível de alimentação com anorexia; a nível corporal com manifestações hipocondríacas, a nível libidinal com impotências e a nível mental com obsessões. Muito idêntico à ansiedade, mas, constituindo entidade clínica diferente, é a angústia. Sendo a angústia uma entidade psico-clínica ainda mais complexa que a ansiedade, esta resulta de profundos níveis de angústia e, suas manifestações são múltiplas, tanto a níveis somáticos como neurovegetativos. As angústias podem ir desde ataques de pânico até níveis de paralisias totais e sempre acompanhadas de intensa dôr psíquica. Muitas das suas manifestações, porém, são idênticas às das ansiedades, essencialmente às manifestações intermédias. De uma forma geral, o objecto desencadeador da angústia emana do interior do indivíduo. Porém, permanecendo tal objecto desconhecido, desencadeia, tanto a nível corporal como psíquico do indivíduo, reflexos primitivos ou arcaicos, geradores de sentimentos e de afectos que geram sensações interiores de opressão e de asfixia, de recalcamento ou fuga face ao medo real ou imaginário, e, um grande sofrimento ou um profundo mal-estar, face aos quais o sujeito sente-se, totalmente, impotente para se defender. O objecto causador da angústia, segundo Freud, não existe, mas, segundo J. Lacan, a angústia emerge sempre das relações entre o sujeito e o objecto perdido, mesmo antes de ter existido, mas, formado, simbolicamente no inconsciente, é, por isso, os indivíduos profundamente angustiados viveriam em permanente busca de tal objecto. Sendo, por um lado, as causas da angústia de natureza inconsciente, involuntária e automática, explicáveis através de vivências de situações identificáveis com aquelas que põem em perigo a própria vida do indivíduo, por outro lado, outra origem da angústia encontra-se a nível de consciente e emana do Eu do indivíduo face ao encontro de situações de perigo real. Em tal situação a angústia teria, então, por função tentar evitar tal perigo, perigo situacional que faria com que o indivíduo se submetesse a situações de grande mal-estar, de desprazer e de sofrimento, acumulando várias tensões neuromusculares. O psiquismo perderia, então, a energia para efectuar as necessárias e devidas descargas. O angustiado é, permanentemente, acompanhado de sensações de temor, de apreensão, de palpitações, de apertos no peito, de sensações de asfixia, de asma, de vertigens, etc.. A nível psico-comportamental, os indivíduos angustiados manifestam, simultaneamente, comportamentos e atitudes de extrema irritabilidade, de inquietude, de instabilidade, de insegurança, de falta de auto-estima e de autoconfiança. Porém, sendo a angústia, de modo global, resultante de sentimentos desagradáveis, que provocam mal-estar e apreensão, preocupações e expectativas, intranquilidades e desamparos, ela é, essencialmente, de natureza emocional, sentimental e afectiva e possui várias manifestações clínicas, com múltiplas e variadas mutações. No primeiro semestre de sua vida, o bebé apenas conhece seus estados desagradáveis de tensão fisiológica. No segundo semestre, progressivamente, reconhece o rosto materno e possui percepção da sua ausência. Tanto o estado de tensão fisiológica como o do reconhecimento do rosto materno constituem os primeiros organizadores de sua elaboração psíquica. O apego do bebé à sua mãe emerge de uma necessidade primária, cuja não satisfação desencadeia o aparecimento da angústia primária. Quando as crianças, muito pequenas, têm de passar algum tempo longe das famílias, entregues aos cuidados de outras pessoas ou em hospitais, quase todas elas manifestam angústia ime70
diata. Caso tais situações se prolonguem a seguir a um tal período, a criança manifesta apatia, infelicidade e aparente desapego dos pais. A criança angustiada, a nível de sono, não raras vezes, sofre terrores nocturnos: acordar bruscamente, gritos de pânico, movimentos motores agitados e repetitivos, pupilas dilatas, expressões de terror, transpiração abundante, erecção pilosa, respiração rápida e pulso acelerado, etc., são alguns de tais sintomas, que podem ocorrer habitualmente, com intervalos de dias ou semanas, mas, é possível acontecer durante noites seguidas. Embora a nível psicológico a criança angustiada se expresse através de comportamentos hiperagitados, de crises de cólera, de fugas, de exigências insaciáveis e de outras variadas manifestações comportamentais, como o assinalou Sigmund Freud, “não é a presença ou a ausência da angústia, a sua qualidade ou mesmo a sua quantidade que permitem predizer o equilíbrio psíquico ulterior ou a doença. O que é significativo, neste aspecto, é, unicamente, a capacidade do ego para dominar a angústia...”. De facto a nível psico-comportamental tanto a criança como o adolescente ou o jovem angustiado é um indivíduo que vira ou introjecta para si, e, em si mesmo, os sentimentos de agressividade. Por outro lado, tem a impressão de que os outros possuem, em relação a ele, os mesmos sentimentos que ele possui em relação a si, vivendo, por isso, na contínua expectativa de uma agressão que, na realidade, é muito pouco provável que aconteça. A nível de exterioridade, os sentimentos do indivíduo angustiado manifestam-se por intensos ataques de pânico: suores frios, arritmias cardíacas, palpitações, dificuldades respiratórias, etc.; com estados de ansiedade crónica, com permanentes mecanismos e atitudes de defesa e com comportamentos de dependência; com dificuldades de concentração nas tarefas, com insónias ou dificuldades em dormir, etc., e, por síndromas hipocondríacos, isto é, tendências para viver suas ansiedades e conflitos psíquicos como doenças somáticas. A nível de aprendizagem escolar, tanto as crianças como os adolescentes ou jovens angustiados, têm, a maioria das vezes, atitudes e comportamentos desconcertantes: tensos, irritáveis, instáveis, hiper-emotivos, incapazes de manter por muito tempo a mínima actividade e, por outro lado, vivos e agitados numas alturas e sonhadores ou apáticos noutras. Nos seus relacionamentos interpessoais umas vezes são violentos e outros agressivos, e, outras vezes moles e indiferentes, incapazes de se defenderem de agressões evidentes. Não raras vezes aprendentes ansiosos passam por sujeitos débeis mentais, e, isto, por causa dos seus maus resultados, visto estes serem oscilatórios, ou seja, interdependentes da sua instabilidade (muito bons numas alturas, muito maus noutras, visto, nestas últimas, as suas atenções serem solicitadas para outros campos) e, o seu Eu não controlar a orientação de suas necessárias concentrações. E, isto, até porque a própria emotividade do indivíduo angustiado, de forte intensidade emocional ou afectiva ou de pulsões muito violentas, gera neles situações traumatizantes, desencadeando neles insuficiências em seu normal sistema de autocontrolo. As presentes manifestações de angústia podem ser emanadas, simplesmente, de conflitos originados por um sistema educativo demasiado rígido e austero, gerando um super-Ego demasiado rígido, incompatível com suas normais funções de desenvolvimento afectivo-emocional, de crescimento e de expansão biológica, agindo, então, como agentes de situações traumatizantes. A existência de tais situações orientam o indivíduo para mecanismos de defesa, de tensão, de vivência e de reorganização de sua própria interioridade, sentida e vivida como angústia e culpabilidade, tanto a nível de socializações como de aprendizagens. 71
As anteriores perturbações comportamentais, desencadeadas por ansiedade, pânico e fobias; angústias e obsessões; depressões e reacções compulsivas; histerias e hipocondrismos, obsessões, etc., são perturbações emanadas do psiquismo, o qual, apesar de provocar desordens comportamentais, nem sempre afecta, profundamente, as funções essenciais da mente do indivíduo. Constituindo tais perturbações, separadas ou em conjunto uma entidade psicoclínica, denominada neurose, esta, assumindo vários epítetos, com variadas tipologias, emerge, essencialmente, da existência de conflitos intrapsíquicos existentes no indivíduo e tem suas causas em perturbações emocionais e afectivas; familiares, sociais e mesmo culturais. E isto porque, tanto em sua génese como em seu desenvolvimento, as sequenciações efectuadas entre estímulos e necessárias respostas aos estímulos foram mal adaptadas ou não devidamente interiorizadas e integradas pelo indivíduo, fazendo com que este, devido às pressões e aos recalcamentos existentes em seu fluir individual e devir pessoal, passe a utilizar, inconscientemente, mecanismos de defesa. Por isso, as neuroses, perturbações do aparelho psíquico do indivíduo, popularmente conhecidas como doenças do sistema nervoso, têm, em suas origens, as insatisfações dos desejos, das pulsões, dos estímulos e de um variado conjunto de motivações, tanto a nível do organismo como do cérebro, do psiquismo como do mental, dimensões geradoras de disfuncionamentos tanto psico-corporais como cognitivo-mentais. Por isso, conflitos infantis, conflitos juvenis e conflitos actuais perturbam, de forma mais ou menos profunda e acentuada, as necessárias e harmoniosas funcionalidades das emoções e dos sentimentos, das ideias e dos comportamentos de um indivíduo. Estas perturbações podem tornar-se reversíveis, visto o sujeito neurótico estar consciente do seu estado, e, desejar, obviamente, sair dele. Ninguém deseja, indefinidamente, permanecer fechado em sua neurose do fracasso ou do destino, mas, sim, conseguir tomar decisões e desenvolver atitudes e comportamentos que vão de encontro à real e necessária satisfação de suas naturais pulsões, estímulos e interesses totais. Também ninguém deseja entrar em pânico quando se encontra num lugar fechado ou é obrigado a atravessar espaços descobertos, como, também, ninguém se sente realizado ao sentir-se impelido para executar rituais complicados, tentando, através de tais ritualismos, esconjurar seus temores da poeira, dos micróbios, dos objectos pontiagudos, etc.. Ora, sendo a neurose, de um modo geral, manifestação de pulsões e de bioenergias inconscientemente recalcadas e, por isso, efeito de uma fragilização do próprio Eu individual, as suas exteriorizações são, de modo geral, de fraqueza emocional e de debilidades psicológicas. Os desfasamentos ou rupturas entre as bioenergias pulsionais do inconsciente e as parcas manifestações do Consciente geram no indivíduo perturbações psicossomáticas e motoras, comportamentos depressivos e manifestações agressivas, passando a desenvolver-se comportamentos de anulação ou de deslocamento de tais conflitos: repressão e recalcamento de tais energias, isolamento ou afastamento da realidade envolvente, destruição do real, desenvolvimento do imaginário desejado ou identificação com uma qualidade ou funções que desejaria ter mas, na realidade, não possui. Os anteriores mecanismos de defesa, utilizados pelo neurótico, são utilizados na tentativa de diminuir a sua tensão interior, de evitar a ansiedade, de neutralizar a angústia, etc., mas, no entanto, a ansiedade activa-se, a angústia acumula-se e a tensão, a nível de sua própria interioridade, reforça-se. A liberdade interior restringe-se, as suas fontes de estímulos sociais depauperizam-se, a sua morbidez psico-comportamental evidencia-se e, a nível escolar, o desinteresse aparece, manifestado através de desesperantes lentidões do trabalho, em trabalhos inacabados, cadernos mal arranjados, sujos 72
e em desordens, com comportamentos inibidos e com ausências de envolvimentos, com inacções e com apatias, etc.. Considerando-se, porém, a neurose como resultado de paragem ou de retrocessos nas conaturais evoluções do indivíduo, este, restringindo suas naturais limitações, desenvolve, portanto, inúmeros mecanismos de defesa, fecha-se no imaginário, foge do real e, com o tempo, faz com que o mundo real lhe pareça estranho. Estes, como muitos outros comportamentos, são, a maioria das vezes, oriundos de suas próprias vivências com sua realidade individual, familiar, social, económica e cultural. E, indivíduos que foram maltratados, abandonados e, afectivamente carenciados; socialmente rejeitados e, culturalmente, não estimulados, não possuem as hierarquias de estímulos ou de motivações capazes de conjugarem, em seu aparelho psico-corporal, o princípio da realidade com o princípio do prazer. No entanto, ao longo dos séculos, a população infantil, envolvida em todos tipos de maltratos, parece vaticínio, pois o abuso da criança foi sempre uma realidade desde que existe raça humana. Os povos antigos idolatravam os primogénitos por acreditarem que estes tinham sorte e venciam as batalhas. Nas grandes civilizações de outrora, o infanticídio era o meio para eliminar todos os recém-nascidos com defeitos físicos. Na Grécia antiga existiam pais que sacrificavam o primogénito quando o rei estava em perigo para, assim, acalmar a ira dos deuses. Na antiga Roma os bebés não só eram sacrificados em altares exclusivamente preparados para tais fins, mas, também, eram projectados contra as paredes ou abandonados às intempéries do tempo. Ainda hoje pais desfazem-se dos filhos com toda a facilidade, abandonam-os sem o menor sentimento de culpa, e, ainda, face às violências físicas e maus tratos psíquicos, quando os levam aos médicos, ensaiam a descrição de acidentes estranhos para explicar a razão das múltiplas feridas e fracturas que marcam o corpo dos filhos. Os maus tratos, porém, não são só de natureza física. Na vida intra-uterina, gravidezes não desejadas, estão, não raras vezes, sujeitas aos medos, às angústias e às ansiedades das mães, comportamentos que impregnam não só negatividades estruturais no aparelho bioneuroemocional do feto, com efeitos negativos no posterior desenvolvimento psico-mental do futuro bebé, criança, adolescente ou jovem. Muitos de tais comportamentos, acrescidos das múltiplas atitudes e acções efectuadas pela mulher para magoar, intencionalmente, o feto, com finalidade de interromper o estado da gestação, geram lesões, não raramente, irreversíveis. Após o nascimento muitas dessas crianças não só são maltratadas fisicamente, mas, também, afectiva e emocionalmente. A recusa do aleitamento materno, nos primeiros seis meses de idade, é geradora de frustrações afectivo-emocionais. As más e incorrectas alimentações, tanto por alimentação inadequada como por carências ou superabundâncias são também de consequências extremamente negativas. Não menos graves que os exemplos anteriores, embora de efeitos fisicamente menos visíveis, são os abandonos da criança e seus respectivos efeitos; as atitudes e os comportamentos de rejeição e todos os mais e variados comportamentos, que geram nos desenvolvimentos das estruturas individuais carências afectivas. As anteriores estruturas afectivamente carenciadas, resultantes do síndroma de abandonismo, não são apenas efeito de abandonos físicos, mas, fundamentalmente, dos abandonos afectivos, muito próprios dos tempos modernos. Porém, muitas vezes, os abandonos afectivos são efeitos dos abandonos físicos, e, a essência de tal problemática encontra-se, fundamentalmente, nas carências e ausências de relações afectivas dos pais com os filhos, o que gera dificuldades e problemas a nível de desenvolvimento e de personalidade dos filhos, problemas a nível de desenvolvimento biopsicológico, cogni73
tivo, mental e afectivo, nomeadamente a nível de inadaptações sócio-escolares, de complexos de rejeição e de inferioridade, de fixações e de obsessões; de perturbações psicossomáticas, de instabilidades comportamentais e de insuficiências intelectuais. A nível de desenvolvimento e de organização da própria personalidade, o abandono afectivo é matriz de neuroses e de desenvolvimentos de atitudes e de comportamentos tanto masoquistas como agressivos, bem como de cristalizações de angústias e de suas respectivas sequências de frustrações, visto o cérebro humano ser extremamente sensível não só às carências e ausências de estímulos emocionais e afectivos, mas, também, é extremamente vulnerável aos factores adversos dos meios ambientes, de maneira particular em suas fases de evolução, rápida e crítica, como sejam, a infância e a adolescência, fases em que as carências afectam, cumulativamente, várias áreas do seu desenvolvimento, de maneira particular do desenvolvimento emocional e afectivo, cognitivo e mental, visto tornar-se “lei suprema” que não só a existência de cuidados maternos, mas, também, a sua qualidade, têm importância fundamental no futuro desenvolvimento psicológico do indivíduo. O papel da mãe é importantíssimo e a sua ausência traz consequências graves tanto física como psiquicamente. O papel do pai activa o funcionamento psíquico do filho e permite a sua integração na sociedade. De facto, existe em todo o ser humano, desde os primeiros momentos e, parece também ser verdade para todos os mamíferos em geral, que existe uma intrínseca e enraizada necessidade de se ser envolvido por uma espécie de “empatia afectivoemocional”. Uma tal empatia é condição essencial do novo ser e da abertura e disponibilidade às naturais necessidades de sua própria natureza, tornando-se, por isso, necessário que os agentes do meio e se dediquem à natureza do novo ser. No caso da criança, esta necessita de ser aceite, olhada, observada e admirada, características essenciais dos seus ulteriores processos de auto-estima, de aceitação e desenvolvimento de seus dinamismos bio-emocionais inconscientes e de suas bioenergias psico-comportamentais. No caso em que tais processos não se tenham desenvolvido com o mínimo de eficiência, as dinâmicas de suas estruturas inconscientes permanecerão fragilizadas, e, o super-Eu, oriundo mais do inconsciente colectivo que do consciente racionalizado, tenderá a asfixiar o Eu do indivíduo, desencadeando, a partir daí, acentuadas perturbações comportamentais não só entre o inconsciente e o consciente, mas, também, constelações de enormes conflitos geradores de frustrações pessoais, sentimentos de vazio interior e de profundas atitudes de baixa auto-estima, comportamentos desencadeadores de sensações de asfixia face aos pais, aos adultos, aos professores, aos superiores e à sociedade em geral, comportamentos que não só bloqueiam as emoções e os afectos do indivíduo, mas, também, suas energias pulsionais e seus sentimentos, suas capacidades cognitivas e suas aptidões intelectuais. A nível psico-afectivo, os seus posteriores comportamentos serão de angústia e de depressão, de regressão comportamental e de exacerbada possessão afectiva, de revolta e de marginalidade, de delinquência e de desvios sexuais. De facto, sendo as estruturas e as dinâmicas emocionais e afectivas de um indivíduo essenciais aos seus harmoniosos equilíbrios, as suas ausências, privações, carências, distorções ou deteriorações prejudicam não só os crescimentos e os desenvolvimentos do indivíduo, mas, também, os seus processos de maturidade, de cognição, de aprendizagem, de envolvência nos meios e de inserção sócio-profissional. Ora, sendo as principais carências do ser humano de natureza afectivo-emocional, sentimental, alimentar, educacional e económica, umas, mais que outras, influenciam os desenvolvimentos dos indivíduos a nível de maturidade psicoemocional, de
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segurança pessoal, de confiança individual, de maturação neuropsíquica, de desenvolvimento cognitivo e de eficiência nas aprendizagens. Embora um tal conjunto de carências exija respostas e satisfações progressivas, hierarquicamente, as carências afectivas ocupam o primeiro lugar na formação e no desenvolvimento de personalidades equilibradas. E isto porque, sendo a afectividade uma dimensão integrante do desenvolvimento e do equilíbrio do indivíduo, ela é inerente a todo o tipo de actividade humana. Por isso, alterações, transtornos e perturbações da afectividade são mais que suficientes para alterar, afectar ou perturbar a própria identidade do indivíduo, a construção e o desenvolvimento de sua auto-imagem e os processos de desenvolvimento e de reforço de seus mecanismos cognitivos. A nível de estruturação mental, carências afectivas prolongadas ou frustrações contínuas geram efeitos extremamente negativos não só nos equilíbrios psicoemocionais do indivíduo, mas, também, em seus processos de saúde mental e psicossomática, originando entidades psico-comportamentais analisadas nos âmbitos da Psicopatologia humana. Os anteriores efeitos psico-comportamentais emergem, frequentemente, de crianças rejeitadas e continuamente maltratadas, tanto pelos pais como por seus substitutos; nos filhos de família que enfrentam problemas graves como, por exemplo, problemas de saúde, de alcoolismo, de toxicodependência, de violência doméstica ou, simplesmente, em famílias cujos membros são incapazes de manifestarem afecto ou carinho pelos próprios filhos. Embora os anteriores comportamentos familiares sejam de extrema negatividade para formação e desenvolvimento dos próprios filhos, não há dúvida que também a organização sócio-laboral da vida moderna não é, em nada, favorável ao desenvolvimento dos equilíbrios dos próprios indivíduos. Cada vez mais os pais têm necessidades profissionais que os mantêm afastados dos filhos. Um tal afastamento provoca danos profundos no desenvolvimento de sua personalidade, pois, mesmo quando os pais possuem algum tempo material para estarem com eles, o próprio cansaço priva-os da paciência necessária para os escutar, ouvir e dialogar. Apesar disso, sendo a afectividade mais uma questão de qualidade que de quantidade, as actuais e profundas mudanças sócio-valorativas da Sociedade Tecnológica fizeram com que entre pais e filhos se gerassem grandes desencontros a nível de perspectivas de vidas, de valores e de centros de interesses. Daí a capital importância, de tanto professores como educadores, orientadores como prelectores, possuírem elevadas formações e desenvolvimentos pessoais nos domínios do emocional e do sentimental, do afectivo e do psicológico, projectando, integra e assumidamente, tais individualizados valores em seus relacionamentos didáctico-comunicativos e na execução de suas funções nos processos ensino-aprendizagem pois, sem educação cognitivo-emocional e afectivo-sensorial, não existe harmonia nem equilíbrios psico-comportamentais. Os anteriores requisitos essenciais de um professor-educador, não só se concretizam, mas, também, desenvolvem-se no seio da autoridade moral e não da anarquia ou ditadurismo. E isto porque todos os educandos e aprendentes possuem intrínseca necessidade de guias-orientadoras. Rejeitam as ausências de regras e de sanções, pois, como é obvio, o indivíduo que cresce e se desenvolve sem barreiras nem referências, mais tarde terá imensas dificuldades em limitar os seus actos ou em saber o que é correcto ou incorrecto, autorizado ou interdito, bem ou mal, factos evidenciados por comportamentos de indivíduos cujos pais se demitiram do seu papel de educadores, umas vezes por desinteresse, e, outras vezes, por falta de tempo; umas vezes por medo de frustrarem os filhos e, outras vezes, por medo de enfrentarem os conflitos intergera75
cionais, situações que, na maioria das vezes, levam os pais a grande sentimento de culpabilidade e, na tentativa de o redimirem, satisfazem todas as vontades dos filhos ou evitam tudo o que vai contra vontade deles. Devastadores efeitos de tais comportamentos emergirão das profundas carências educacionais dos indivíduos. Com efeito, educandos com respostas adaptadas, tanto às suas necessidades afectivas como educacionais, reconhecem e assumem o seu valor, são autoconfiantes e envolvem-se no meio que os rodeia, agindo e interagindo com ele e usam-o como agente de estímulos e factor de motivações. Envolvem os seus dinamismos e processos, os seus mecanismos e potencialidades afectivo-cognitivos nas acções e nos desenvolvimentos e organizam e reorganizam suas estruturas cognitivas, desenvolvendo-as, adaptando-as e socializando-as. No entanto, de uma forma geral, não estando a família preparada para uma tal hipercomplexa ajuda educacional dos filhos, tais tarefas e responsabilidades competem à escola, visto esta dever possuir fins e objectivos de organizações e de desenvolvimentos afectivo-emocionais e cognitivo-intelectuais integrados nas estruturas e nos dinamismos psicofisiológicos dos educandos. E isto porque são as emoções e os sentimentos, os afectos e as apetências que orientam e estimulam os indivíduos para relações objectais positivas e para criação e desenvolvimento de esquemas cognitivos e de mapas mentais eficientes, produtivos, e, cada vez mais, estimuladores, e, isto, não só a nível individual, mas, também, a nível social e cultural. Por sua vez, tanto as carências afectivas como as educacionais geram nos educandos labilidade comportamental, inibições psico-afectivas e indiferenças, tanto a nível de relacionamentos pessoais como a nível de envolvimentos socioculturais, emergindo, daí, acentuados disfuncionamentos psico-afectivos, emocionais, sociais e culturais, com seus redundantes efeitos a nível de dificuldades de aprendizagens, de integrações sociais e de adaptações sócio-profissionais, factores constituintes e caracterizadores dos comportamentos dos indivíduos que integram os números dos alunos não só com dificuldades educativas especiais, mas, também, com dificuldades de aprendizagens generalizadas. Apesar disso, a nível de estruturação da personalidade, tais carências e lacunas geram, pela negativa, uma hipercomplexidade muito maior que a anterior. A organização do seu Super-Eu é ou torna-se extremamente frágil, devido à ausência de sistemas de censura e inconsistência na organização dos sentimentos de culpabilidade, fazendo com que seu Super-Eu seja extremamente rígido, primitivo, arcaico e cruel, organizando seu narcisismo negativamente, chegando-se ao extremo em que “ser mau é a melhor maneira de ser bom”, e, isto, apesar da existência de seu dinâmico sentimento de prosseguir na via de sua interior autodestruição, via dominada pelo ódio contra si mesmo e contra os outros, e, na qual, não raras vezes, se encontram manifestações megalómanas, marcantes exteriormente, mas, interiormente, vazias e, das quais, tais indivíduos, se tornam dependentes.
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CAPÍTULO IV
PROCESSOS E MECANISMOS DE INADAPTAÇÕES E DE DIFICULDADES DOS APRENDENTES
Estatísticas de natureza sócio-educativa e psicopedagógica demostram que 30 a 35% de jovens e adolescentes, frequentadores da escolaridade obrigatória, apresentam uma súmula de problemas situados a nível de comportamentos e de socialização, de adaptação e de integração escolar, de desmotivação e de desinteresse, de insuficiências cognitivas e de dificuldades de aprendizagem. A maioria, porém, não apresenta, exteriormente, problemas de saúde física, nem de deficiência psíquica ou motora. Manifestam, no entanto, em relação às exigências cognitivas e processuais da escola regular, certas insuficiências, fragilidades e debilidades, que fazem deles indivíduos com dificuldades de acompanhar os desenvolvimentos e as aprendizagens dos colegas do mesmo grupo etário, de interagirem com os demais e de se integrarem activamente nos padrões e nos dinamismos comportamentais dominantes e instituídos no grupo-turma. A presente problemática constatativa levanta o problema do ideologicamente institucionalizado na dita escola regular e do privilegiar, fundamentalmente, a inteligência teórico-cognitiva e sócio-integrativa dos educandos. Um tal oligárquico comportamento de um instituído pedagógico-educativo não só minimiza, mas, também, ignora, a nível de pragmatismo, os restantes e multivariados factores componentes do cognitivointelectual e de seus respectivos processos de acção e de desenvolvimento, de interacção e reforço, de continuidade e descontinuidade. E isto porque, na realidade, o apreendente é um todo e não apenas aquilo que medem ou avaliam tantos os testes psicológicos como as avaliações escolares. Um tal tipo de avaliações predominou, e, predomina, ainda hoje, tanto nas avaliações escolares como nas perspectivas da psicologia tradicional ou psicométrica, comportamentos psicológicos e pedagógicos, que não só escamoteiam a realidade do educando como, também, asfixiam, distorcem ou anulam o desenvolvimento de potencialidades individuais, sociais, inter-relacionais e funcionais, em nada inferiores às capacidades cognitivas e intelectuais do indivíduo, e, cujos padrões de emergência neuropsíquica e socioemocional são as necessárias respostas às intrínsecas necessidades de expansão e plenitude, eficiência e realização, integração e sociabilidade. A anterior perspectiva psico-educacional, dominante ainda tanto nas teorias psicológicas como no funcionalismo dos sistemas educacionais, constata apenas efeitos, avalia produtos e compara indivíduos mas não analisa causas nem situações, processos ou mecanismos. No entanto, tanto as causas como os processos das múltiplas variedades dos resultados dos testes psicológicos, como das avaliações cognitivas, pedagógicas, comportamentais e escolares, são de hipercomplexa causalidade, e, não só interdependem da organização e dinâmica do sistema nervoso do indivíduo, mas, também, de suas potencialidades bioneurocerebrais, da potencialidade e dinâmica de seus sistemas bioenergéticos e respectivas orientações funcionais; de seus dinamismos psicomotores e 77
de suas intencionalidades pulsionais, dos estímulos de sua interioridade e de suas capacidades ou oportunidades de adaptação às exigências do sócio-escolar. A maior ou menor variabilidade de tais características individuais, inter-relacionadas, difusas ou dispersas, podem estar, como na realidade, a maioria das vezes estão, na base causal da insuficiência mental de um indivíduo e, por conseguinte, na base das dificuldades dos processos de aprendizagem. O presente conceito de insuficiência mental é relativo às exigências da sociedade, dos meios e das situações escolares em que o indivíduo se encontra e, suas causas, são de natureza sócio-ambiental, cultural, emocional, sócio-afectiva, psicobiológica ou bioneurocerebral. A insuficiência mental ou debilidade ligeira, interdependente das exigências da organização do social, varia de sociedade para sociedade, de idade para idade ou de grupo para grupo, e, não é, de forma alguma, irreversível, visto a criança, com insuficiências mentais ou cognitivas, passar, biopsicologicamente, por idênticos estados de desenvolvimento aos das crianças ditas “normais”. Fazem-o, porém, de uma forma mais lenta ou, então, possuem um ou vários défices específicos, que as fazem raciocinar e aprender de forma distinta, mesmo quando se encontram no mesmo estádio de desenvolvimento das crianças ditas normais, o que impõe interdisciplinar diagnóstico das causas, dos factores e dos processos que fazem com que umas crianças sejam mais diferentes que outras, diferenças que, a maioria das vezes, não são diagnosticadas através de métodos bio-médicos nem puramente clínicos. São apenas crianças que não conseguem, ao mesmo tempo que as ditas crianças normais, atingir os objectivos escolares e cognitivos institucionalizados pela dita escola regular. Rotular esta ou aquela criança de deficiente ou de anormal, simplesmente porque possui um quociente intelectual um tanto abaixo da média estatística das outras crianças é tão anormal como uma criança com um quociente intelectual muito superior à média. O anterior analisado pretende simplesmente demonstrar que, fazer depender a definição de anormal ou de insuficiente mental das correlações efectuadas entre idade mental e idade cronológica, não passa de uma seriação erradamente efectuada por psicólogos matematizadores ou pretensos quantificadores dos produtos ou dos efeitos dos processos cognitivos e professores-educadores, amantes da homogeneidade comportamental e alérgicos às divergências perceptivas, cognitivas e psico-emocionais. Um tal conjunto de crianças, que, tanto por seu nível inferior como superior, transgridem o padrão de mediania, são simplesmente crianças diferentes. No entanto, apesar de todo e qualquer indivíduo ser diferente um do outro, estes são mais diferentes do comum que os diferentes. É, então, no seio dessas diferenças que se estabelecem vários níveis ou graus de diferenças mentais, cognitivas e comportamentais. Seguindo uma tal perspectiva da dinâmica psico-comportamental dos indivíduos, serão indivíduos de insuficiências cognitivas os tradicionalmente denominados falso débeis, e, cuja origem, de tal insuficiência ou debilidade pulsional, se encontra, num na natureza e dinâmica de suas emoções e afectos, estímulos interiores e motivações exteriores, e não necessitam, para atingirem o seu normalizante padrão de desenvolvimento, de grandes modificações em suas estruturas e dinamismos psico-orgânicos. Outros, pelo contrário, necessitariam de profundas e acentuadas reorganizações biopsíquicas ou neurofisiológicas, visto as causas de seus défices serem de natureza genética, hereditária, orgânica ou provocada por lesões no sistema nervoso do indivíduo. Na estreia das conclusões das análises internacionais de suas causalidades, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu deficientes mentais como sendo “indivíduos com uma capacidade intelectual sensivelmente inferior à média, que se 78
manifesta ao longo do desenvolvimento e está associada a uma clara alteração dos comportamentos adaptativos”. Uma tal definição, no entanto, apresentando-se como evidente constatação dos factos, negligencia, de forma acentuada, elevadíssima percentagem dos factores causais de tais deficiências, como sejam, por exemplo, drogas, fármacos, cansaços, stresses, negativas interacções com os meios, condições familiares e ambientais deficitárias, etc., etc., conjunto de causas factoriais, reveladoras de situações originadoras de crianças ou de alunos com necessidades educativas especiais. São, normalmente, crianças, adolescentes ou jovens com necessidades educativas especiais, a nível mental, os que possuem maiores ou menores dificuldades em seguir os processos regulares da normalidade escolar instituída pelas normas sóciopedagógicas das situações e instituições vigentes. Daí o facto de um tal tipo de alunos encontrar-se na literatura pedagógica etiquetado como aluno diminuído, incapacitado, subnormal, diferente ou mesmo deficiente psíquico. Uma tal etiquetagem, de forma alguma, previne a existência de necessidades educativas especiais, facilita a intervenção psicopedagógica junto de tais indivíduos ou estimula a sua integração tanto na escola como nos meios e ambientes circundantes. A Organização Mundial de Saúde, no entanto, continua a manter as classificações de deficiência mental: deficiência limite, ligeira, média, severa e profunda a partir do resultado da avaliação do quociente intelectual do indivíduo. Encontram-se, no limite, entre o normal e o anormal, os que apresentam um quociente intelectual que ronda entre os 68% e os 85%, crianças que apresentam dificuldades a nível de operacionalizações concretas e certos atrasos nos processos de aprendizagem, revelando, colateralmente, muitas outras potencialidades como, de facto, se comprova através de análises sociopsicológicas de crianças oriundas de meios culturais e socialmente desfavorecidas. O segundo nível de deficiência é apresentado por aqueles que, geralmente, revelam dificuldades de aprendizagem das técnicas instrumentais a nível dos sistemas escolares obrigatórios, com incidência nos domínios emocionais, perceptivos e psicomotores, causas cuja maioria das vezes são resultados de ausências de estímulos e de motivações, de intervenções e de desenvolvimentos a nível de primeira e segundas infâncias. Deficientes mentais ligeiras são os que, face à avaliação psicométrica, manifestam um quociente intelectual situado entre 52 e 68. Não raras vezes, porém, uma tal categoria de alunos apresentam enormes capacidades de comunicação social, de inter-relacionamentos sociais, de adaptações familiares e de integrações profissionais. Nos casos das deficiências mentais, médias ou moderadas, com quociente intelectual, situado entre os 36 e os 51, as dificuldades a nível de aprendizagem escolar: escrita, leitura e cálculo, apresentam-se, regra geral, de forma acentuada. Quando bem estimulados, e, socialmente motivados, adquirem hábitos de autonomia pessoal e de comunicação verbal, embora revelem dificuldades a nível de compreensão dos convencionalismos sociais e de certos desenvolvimentos a nível psicoemocional. Os indivíduos com deficiências mentais severas e profundas, de quociente intelectual inferior a 35, geralmente, necessitam de protecção e ajuda, pois o seu nível de autonomia pessoal e social é acentuadamente pobre. De uma forma geral apresentam acentuadas dificuldades psicomotoras, verbais e comunicacionais, físicas e intelectuais. As três primeiras categorias de défices intelectuais ou mentais: limite, ligeira e média, poderão ser classificadas de insuficientes intelectuais e constituem a maioria da população com necessidades educativas especiais. As restantes categorias de deficiência mental, isto é, severa e profunda, constituem, de facto, a categoria das deficiências verdadeiras. 79
Os indivíduos com insuficiências intelectuais ou dificuldades nos processos de aprendizagem, integrados nos grupos de crianças com dificuldades educativas especiais, são crianças ou adolescentes acentuadamente mais lentos que os companheiros da mesma idade no uso da memória, de associação e da classificação das informações; dos raciocínios, da execução das tarefas e da concretização dos desempenhos. São, de uma forma geral, classificados de falsos débeis, pois são capazes de um desempenho médio, se receberem um programa educacional e funcional adequado. São, geralmente, oriundos de meios com acentuadas privações socioculturais e linguísticas, com enormes carências afectivas dos meios e dos ambientes e incapazes de beneficiarem suficientemente do programa escolar regular. No entanto, são educáveis a nível de formação e de desenvolvimento básico e elementar, a nível de socialização familiar e comunitária e integráveis, quando jovens e adultos, em situações profissionais. Para que tais indivíduos, porém, não entrem nas vias da inadaptabilidade ou da marginalização: relações inadequadas entre o indivíduo e o seu meio-ambiente, prolongadas inadequações entre as vivências do indivíduo e as do meio, ausências de participações no socialmente aceitável, fugas ou alienamentos aos contextos sociais tidos como normais (convivência, grupo, família, profissão, etc.), as integrações sócioescolares constituem conjuntos de causas factuais que impedem os indivíduos da marginalização, ou, então, de uma forma geral, de comportamentos anti-sociais e de atitudes disfuncionais. As inadaptabilidades conduzem os indivíduos à criação e ao desenvolvimento de demoníacos círculos viciosos, de vivências de duradouras situações, de “abandono aprendido”, de baixo autoconceito, de acentuada insegurança, ausência de auto-estima e falta de auto-respeito, características fundamentais, das ausências de motivações individuais, de estímulos pessoais e de falta de envolvimentos nos processos de cognição e aprendizagem. Não raras vezes, porém, de entre um tal conjunto de crianças, adolescentes ou jovens com comportamentos de marginalidade encontram-se indivíduos com um quociente intelectual normal mas, devido aos seus desajustamentos pessoais, manifestam acentuados comportamentos agressivos, incapacidades para desenvolvimentos de emoções positivas e de estreitamentos de laços afectivos, conflitos familiares, inseguranças pessoais e choques com seus meios-ambientes, o que lhes origina dificuldades nos processos de aprendizagem e, por conseguinte, o seu fracasso e insucesso escolar. As duradouras permanências do indivíduo em tais situações conduzem-o a uma certa habituação à vivência de seu princípio de exclusão, facilitador do desenvolvimento de seu egocentrismo sado-masoquista, rejeitando-se do princípio de inclusão no social, no grupo ou na comunidade concreta. A partir daí tal indivíduo tende a procurar seus congéneres comportamentais e a integrar ou reforçar grupos, cujas egocêntricas inteligências, interagindo umas com as outras, criam, geram ou regeneram inteligências disfuncionais, comportamentos antisociais e grupos de exclusão social. Porém, comunicação, heterogeneidade comportamental, sociabilidade e comunidade são características essenciais de toda a orgânica vital de uma sociedade em mobilidade e fundamento do princípio da realidade integrativa, a qual, no ser humano, é de natureza biopsicológica, emocional e afectiva e impele o indivíduo a desenvolver-se e a expandir-se como um todo indissociável. No entanto, de modo particular, a nível de desenvolvimento do humano, também aqui a natureza não faz saltos. Por isso, a criança, por exemplo, que se adapta rapidamente à realidade adulta, estará propícia a situações de fracasso no futuro, e, aquela que vive uma infância feliz, possuirá um Eu forte, maleável e adaptável à realidade envolvente. Esta adaptabilidade à realidade, constitutiva do princípio do prazer e do 80
bem-estar acciona o princípio da funcionalidade individual, desloca as energias do indivíduo do centro para a periferia, diminui a sua tensão interna e provoca nele sensações de prazer, fazendo que ele oriente suas potencialidades e energias para as pessoas e os objectos, para as concretizações e as realizações tanto individuais como sociais.
I – ESCOLAS REGULARES NAS DINÂMICAS DAS INCLUSÕES EDUCATIVAS
As acentuadas tendências massificadoras dos ensinos e aprendizagens propostas pelos tradicionais sistemas da escola regular, dita normal, jamais aceitaram benevolamente crianças, adolescentes ou jovens que não se integrassem no que, institucionalmente, se definia como média-padrão. Educandos ou apreendentes que, durante um certo tempo, não se integrassem em tal média, não eram aceites, ou, regra geral, eram ou sentiam-se excluídos da escola regular, começando, a partir daí, e até à declaração de Salamanca, a ser etiquetados como crianças diferentes, sub-normais, anormais, inadaptados, deficientes, etc., etc.. Era, no entanto, o elitismo institucionalizado, sociopedagógico e educativo que, no seio das sociedades democráticas, marginalizava os educandos, impedindo-os dos desenvolvimentos de suas potencialidades, competências e aspirações, votando elevado número da população à exclusão escolar e, por conseguinte, também, à exclusão social e profissional, fazendo-a integrar, nas melhores das hipóteses, em sistemas de aprendizagem que, dificilmente, se cruzavam com os sistemas ditos de aprendizagens regulares, comuns aos normais. Estes institucionalizados princípios comportamentais de exclusão sócio-escolar regular partiam das convicções de que, insuficientes ou então deficientes, eram indivíduos incapazes de conviver com os outros e de efectuar aprendizagens nas escolas regulares. Os sistemas de natureza simplesmente biomédica, psicométrica e cognitivista-comportamentalista estimulavam tais segregações sócio-educativas, originando-se, então, de forma assistencial, benévola ou caritativa, sistemas, instituições e organizações de educação especial. A lenta mas progressiva tomada de consciência de tais realidades segregacionistas levou técnicos, peritos e investigadores a constatarem que, numa população infantil, geralmente, apenas 2 a 4% das crianças, adolescentes ou jovens apresentam deficiências. Os restantes sujeitos, que não se integram no dito padrão de normalização escolar, seriam, então, considerados como crianças com necessidades educativas especiais. Primeiramente na Inglaterra através do Warnock Report e, mais tarde em todo o mundo civilizado, fundamentalmente após a declaração de Salamanca, aprovada em Junho de 1994 pelos representantes de 92 governos e 25 organizações internacionais, a maioria das crianças, adolescentes ou jovens com dificuldades de aprendizagem, de socialização ou integração, passaram a ser denominadas crianças, adolescentes ou jovens com “Necessidades Educativas Especiais”. De acordo com Warnock são crianças com necessidades educativas especiais todas aquelas que, em idade escolar, não conseguem atingir os objectivos propostos pela instituição escolar, e, então, por isso, torna-se necessário encontrar meios específicos de acesso ao currículo, facilitar a tais crianças um currículo especial modificado e dar especial atenção ao meio ou ambiente educativo em que decorre o processo de ensinoaprendizagem dessas crianças. 81
A declaração de Salamanca não só alarga, mas, também, redimensiona um tal conceito de necessidades educativas especiais, e, afirmando que cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidade de aprendizagem que lhe são próprias, ela expressa, explícita e, directamente, faz opção pela escola inclusiva, dando as orientações necessárias para a acção a nível nacional e internacional, com vista à implementação de uma escola para todos. Por isso, consciente da gravidade de que se revestem as necessidades educativas especiais das crianças, jovens e adolescentes, a declaração de Salamanca pugna pela qualidade da oferta educativa, pela distribuição dos recursos e pelas experiências pessoais, apelando e incitando todos os governos a adoptar, como matéria de lei ou como política, o princípio da educação inclusiva, admitindo todas as crianças nas escolas regulares, a não ser que haja razões que obriguem a proceder de outra maneira. No entanto, para que tal se efectue, as escolas regulares devem adaptar-se às crianças e aos jovens com necessidades educativas especiais, através de uma pedagogia centrada neles, capaz de ir ao encontro dessas necessidades para lhe dar uma resposta adequada, o que implica planificação dos sistemas educativo e a existência de programas implementados com o intuito concreto de dar respostas à diversidade das características e necessidades dos educandos. As orientações psico-educacionais de tais perspectivas implicam abertura de mentalidades, existência de comunidades escolares abertas, solidárias e disponíveis, pois as respostas às necessidades educativas não se obtêm, de forma alguma, através do simples encaminhamento das crianças e jovens com necessidades educativas para o ensino regular, mas, sim, através de uma profunda reforma tanto das mentalidades dos educadores-professores como do ensino regular, visto este dever assumir-se, tanto a nível de organização como de professores ou de classe, como sendo o responsável principal do sucesso ou do insucesso dos educandos. É que, pretendendo a Escola Inclusiva assumir-se como sistema de educação e de ensino, no qual tanto alunos com necessidades educativas especiais, como alunos com deficiências serão educados na escola do bairro, em ambientes de salas de aulas regulares, com colegas que não têm deficiência e onde lhe são oferecidos ensino e apoio de acordo com as suas capacidades e necessidades individuais. Estes sistemas implicam mudanças organizativas, tanto a nível de gestão como de pedagogia; mudanças ao nível dos professores-educadores como mudanças ao nível dos vários intervenientes pedagógico-educativos, isto é, mudanças ao nível das dimensões filosóficas da democracia escolar, da natureza e da estrutura do currículo, dos modelos de apoio aos educandos, das planificações e programações interdisciplinares, do trabalho de equipa, das orientações e decisões pedagógico-educativas etc., etc.. A filosofia de uma tal psicopedagogia educacional implica implementação e desenvolvimento de estratégias pedagógicas que ajudem todas as crianças a desenvolver todas as suas potencialidades e a progredirem, tanto quanto lhes for possível, em suas dimensões de desenvolvimento, de acção, de socialização e de integração. A concretização e o desenvolvimento de tais objectivos e finalidades implicam mudanças a nível educacional, isto é, preocupação com as necessidades e os dinamismos das escolas para “atenderem melhor todos os alunos”. Na perspectiva de melhor atendimento a todos os alunos, não há dúvida que a acção cooperativa, o trabalho intersolidário, os trabalhos em grupo, poderão constituir uma pedagogia diferenciada, centrada em princípios da inclusão escolar e de envolvência dos participantes nos processos integrativos de cada um. No que concerne a identificação e concretização dos objectivos da escola inclusiva, os princípios orientadores do despacho conjunto n.º 105/97 são claros: “centrar nas 82
escolas as intervenções diversificadas necessárias para o sucesso educativo de todas as crianças e jovens; assegurar, de modo articulado e flexível, os apoios indis-pensáveis ao desenvolvimento de uma escola de qualidade para todos”; conferir “clara prioridade à colocação de pessoal docente e de outros técnicos na escola, consubstanciando as condições para integração e sucesso de todos alunos”; reconhecer “a importância primordial na actuação dos professores com formação especializada”. A multiplicidade das necessidades de implementações das diversificadas estratégias psicopedagógicas, emanadas dos diversos, mas, complementares objectivos educacionais, resultam do facto que crianças com dificuldades especiais apresentam as mais diversificadas características e, também, os mais diversos diagnósticos, os quais têm origem não só na existência de lesões cerebrais, em deficiências físicas, mas, também, em carências afectivas, desordens emocionais, perturbações de comportamento, dificuldades de comunicação e, mesmo na existência de talentos ou dotes especiais.
II – PORTADORES DE NECESSIDADES EDUCATIVAS NAS ESCOLAS REGULARES
Educandos ou apreendentes, portadores de Necessidades Educativas ou de outras similares, necessitam de serviços e de processos educativos específicos, tanto a nível de apoios como a nível de aprendizagens, para desenvolvimento e realização total das suas potencialidades humanas. O conjunto de serviços e de apoios psicopedagógicos e cognitivos, afectivos e emocionais deverão emergir não só das organizações escolares a nível psico-físico e escolar, de treino vocacional e de entregabilidade, mas, também, dos meios, da comunidade local e da sociedade em geral, visto tanto a deficiência como a debilidade alicerçarem-se sobre preconceitos do normal e do anormal. É com base na relatividade de tais critérios que o tradicionalismo pedagógicoescolar define “necessidades especiais” como sendo, globalmente, o conjunto de necessidades que possuem todas as crianças e jovens que apresentam tanto deficiências como dificuldades nos processos de escolarização e de aprendizagem. Apesar da relatividade de tais conceitos e definições, porém, existem factos de irrecusável evidência. E isto porque todo o ser humano vive em permanente compromisso com suas tarefas, sempre inacabadas, e, por isso, em permanente atitude de descoberta e de posicionamento face à sua existência e aos meios circundantes, o que o leva ao permanente questionamento de si próprio, dos outros e dos meios-ambientes. Face às pressões do exterior, o indivíduo não pode não actuar e procurar significados para as suas acções, propondo objectivos para a sua existência, relacionados consigo, com os outros e com os meios. Face a estas múltiplas necessidades de acções e de interacções uns conseguem melhor resposta que outros, e, é perante tal hierarquia de respostas, que a diferenciação entre o normal e o anormal, entre o débil e o não-débil, o adaptado e o não-adaptado aparecem. Os efeitos de tais aparecimentos, no entanto, sendo de natureza adaptativa, emocional, afectiva e intelectual, integrativa e cognitiva, possuem múltiplas e variadas causalidades. Na base genérica de tais causas encontram-se as doenças, as lesões orgânicas e as doenças ou perturbações pulsionais. Nas perturbações pulsionais existem 83
maiores probabilidades de tratamento ou de reequilibro que nas perturbações causadas por lesões neurocerebrais. No entanto, se as lesões cerebrais causam perturbações mentais também as perturbações mentais danificam o funcionamento cerebral. Tal fragilidade ou debilidade mental, bem como seus níveis, separam a saúde mental da doença. Tanto a fragilidade como a debilidade, seus níveis e graus, têm causas endógenas e causas exógenas e podem ser harmónicas ou desarmónicas. As debilidades endógenas têm, geralmente, sua causalidade principal nas deficiências do sistema nervoso central, apesar de, não raras vezes, não ser diagnosticado, e não se ter lesão alguma a nível de sistema nervoso. As causas exógenas resultam, geralmente, de perturbações obtidas antes, durante ou após o nascimento do indivíduo, as quais geraram défices ou perturbações no sistema neuromotor, na percepção, no comportamento emocional, no pensamento, nos processos cognitivos, etc.. E tanto as causas endógenas como as exógenas encontram-se nas origens da existência de crianças, adolescentes, jovens ou adultos com deficiências intelectuais de maior ou menor severidade, de défices cognitivos e debilidades ou insuficiências mentais. As eficiências ou debilidades mentais harmónicas são as que apresentam uma certa constância a nível de resultados escolares, ligados à idade cronológica e com problemas ou perturbações a nível de adaptação ou socialização. Pelo contrário, são crianças com debilidade intelectual desarmónica aquelas que, além de apresentarem um certo grau de insuficiência intelectual, em comparação às crianças da sua idade, apresentam, simultaneamente, uma série de comportamentos ou de perturbações a nível de sua adaptabilidade ao meio, às pessoas e às situações, manifestadas, geralmente, através de sua instabilidade e agressividade, excitação ou apatia, comportamentos repetidos e, até mesmo, perversos. Apesar disso, no entanto, tanto as debilidades harmónicas como as desarmónicas apresentam denominadores comuns, isto é, insuficiências psico-intelectuais. São, no entanto, insuficientes psico-intelectuais os que apresentam um desenvolvimento intelectual limitado, com ou sem comportamentos inadaptados, com reduzidas capacidades de aprendizagem e de desempenho abaixo da média. Por isso, manifestam dificuldades a nível de memorização, de interiorização, de aprendizagens adequadas, de descobertas de estratégias, de organização cognitiva, de associação de ideias, de simbolizações e de representações mentais; têm dificuldade de concentração, estão a maioria do tempo desatentos, e, são, não raras vezes, hiperactivos ou apáticos. A nível de escolaridade revelam um aproveitamento escolar limitado, ficando muito aquém dos seus colegas da mesma idade cronológica em todas as áreas de realização. O seu baixo aproveitamento é, geralmente, mais pronunciado em áreas como a leitura, sobretudo na compreensão da leitura, como no raciocínio aritmético. Estas e outras dificuldades, apresentadas por crianças e alunos na idade de escolaridade obrigatória, constituem a vasta e hipercomplexa problemática das crianças ditas com “Necessidades Educativas Especiais”, que segundo o Warnock Report (1968) é constituída por “uma em cada cinco crianças”, as quais necessitam, na sua escolaridade, de algumas formas de educação especial. Não são, no entanto, todas deficientes e, por conseguinte, o autor propõe a abolição das categorias de deficientes substituindo-as pelo conceito de “Necessidades Educativas Especiais”. No entanto, a resposta a tais necessidades educativas especiais deverá ser encontrada no âmbito da escola regular, visto a integração entre crianças deficientes e não deficientes ser de suma importância para o desenvolvimento das qualidades e características exigidas pelos normalizantes sistemas da vida familiar, social e profissional. 84
A avaliação objectiva, tanto psicopedagógica como sociopsicológica de uma criança, adolescente ou jovem com necessidades educativas especiais, não pode alicerçar apenas em seus resultados escolares ou em resultados obtidos através da realização de testes psicológicos, mas efectuados, também, através de análises sóciofamiliares, sócio-ambientais e socioculturais, como sucede com as crianças oriundas de sistemas familiares desfavorecidos culturalmente ou com os filhos oriundos de etnias culturais ou etnias raciais, visto os educandos, alunos ou apreendentes desta ou daquela instituição ou organização escolar serem fruto das interacções dos vários sistemas em que o indivíduo vive, coabita ou se move. Por outro lado, as aprendizagens dos meios sócio-familiares, não raras vezes, são desprezadas, rejeitadas ou não aceites pela escola, factos que, além de criarem rupturas entre sistemas familiares e sistemas escolares, inferiorizam os educandos e geram neles não só sentimentos de marginalidade, mas, também, de ausências de comunicação com tudo que seja instituição e organização escolar, o que desencadeia nos educandos sentimentos de mal-estar consigo e com os outros, com os meios e os ambientes escolares. E, tudo isto, porque os mecanismos do inconsciente colectivo da organização escolar diagnosticam mais os alunos por aquilo que eles não são do que por aquilo que eles são, isto é, agentes de experiências e de vivências, de saber e de conhecimentos, de sensações e de emoções, de interesses e necessidades, de capacidades de acção e de aprendizagens.
III – DINÂMICAS SÓCIO-PSICO-ESCOLARES NOS COMPORTAMENTOS DOS APRENDENTES COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS
Ausências de dinamismos psicopedagógicos adaptados às estruturas e aos processos dos microssistemas sócio-familiares e culturais, étnicos e multiculturais tornam-se causas e factores essenciais das dificuldades da aprendizagem de elevado número de alunos em sua fase de escolaridade obrigatória. A anterior problemática de ausência educacional desencadeia a necessidade, por parte da escola, de ir de encontro às necessidades dos alunos, das famílias e de seus respectivos sistemas familiares, visto tornar-se evidente que as escolas são para os alunos e, não necessariamente, os alunos para a escola. As ausências de interacções, de inter. e retroacções das escolas com os alunos, com seus meios e sistemas familiares, são matrizes geradoras de elevadíssima percentagem da existência de alunos com necessidades educativas especiais. E isto porque, como o pretende a Associação Americana de Atrasados Mentais, insere-se na definição de alunos com necessidades educativas especiais. O aluno que apresenta um quociente intelectual de 70 a 75 ou inferior e que manifesta incapacidades ou disfunções significativas em duas ou mais áreas das habilidades adaptativas antes dos 18 anos de idade. Muitas dessas disfunções, no entanto, são de origem emocional e afectiva, sóciofamiliar, social e integrativa, realidades factuais não menos cruciais e problemáticas para o futuro dos indivíduos, das comunidades locais e da sociedade em geral que as próprias incapacidades físicas ou atrasos mentais. No entanto, o quantitativo de crianças e alunos deficientes é uma minoria em relação àqueles que formam ou integram o conjunto dos indivíduos com necessidades educativas especiais. A maioria deste é caracterizada por debilidade psico-intelectual, 85
acentuada instabilidade emocional, fragilidade psíquica e estruturadas carências afectivas. As anteriores causalidades geram, não raras vezes, como o demonstrou René Spitz e seus colaboradores em relação às carências afectivas, não só indivíduos com ausências de estímulos e de motivações, mas, também, com comportamentos anómalos e psicopatológicos, marginais e delinquentes. Ora, constituindo as crianças, adolescentes ou jovens, com tais comportamentos, parte integrante dos indivíduos com necessidades educativas especiais, eles não são necessariamente deficientes. E isto porque, sujeitos com necessidades educativas especiais são aqueles que, por uma razão ou outra, não se integram na generalidade dos comportamentos, sentem-se ou são excluídos dos padrões de normalização consciente ou inconscientemente, padrões elaborados pelas instituições sociais, pelas comunidades locais ou pelas organizações sócio-educativas e ambientais. Por isso, crianças com necessidades educativas especiais, são as que pelas suas características, propriedades, atributos ou ausência deles: comportamentos, inteligências, processos cognitivos, aprendizagens, eficiências ou rentabilidades se desviam da norma instituída, quer este desvio seja interior ou transcendente à própria norma. No entanto, as reflexões e análises acerca dos princípios de “igualdade de oportunidades” e de “integrabilidade” das últimas décadas originaram os conceitos e consequentes derivados de normalização social e de integração escolar. As anteriores pertenças e concretizações, alicerçadas, teoricamente, nos princípios de direitos fundamentais: igualdade para todas as pessoas, quaisquer que seja as suas limitações ou incapacidades, e, igualdades de oportunidades, trouxeram, como corolários, a maxificação escolar, integrando, na escola normal ou regular, grande contingente de crianças, adolescentes e jovens sem o necessário rendimento escolar adequado aos objectivos da escola. Os anteriores princípios de positivas intencionalidades negligenciaram, porém, as existências das diferenças e, ao não se respeitar o direito às diferenças individuais, aumentaram-se, acentuadamente, as desigualdades. Por isso, os conceitos de norma, de normalidade, de integração e de inclusão escolar são conceitos profundamente relativos, tanto em suas dimensões sociopsicológicas como psico-comportamentais. De facto, uma tal relatividade emerge da natureza e das causalidades dos desvios à norma. E isto porque, de uma forma geral, para efeitos de integração escolar não se têm efectuado distinções entre ligeiros, médios e profundos atrasos mentais, entre debilidades intelectuais e deficiências mentais ou mesmo entre deficiências motoras e psicofísicas, cujas causas e efeitos são e podem ser de natureza multivariada, isto é, irreversível e reversível, recuperável e irrecuperável, treinável e educável, duradoura ou transitória. Na realidade, nem todas as crianças, adolescentes ou jovens com necessidades educativas especiais são deficientes. No entanto, todos os deficientes possuem necessidades educativas especiais. Urge, por conseguinte, eliminar-se a confusão ou ambiguidade existente, tanto nos meios educativos como psicopedagógicos ou sociais, entre deficiências e necessidades educativas especiais. No entanto, “deficiência é uma de entre todas as possibilidades do ser humano” e, tal forma de ser, não deve fazer com que os outros não reconheçam tanto as habilidades como as capacidades, as destrezas como as potencialidades dos próprios deficientes. Todos os deficientes possuem potencialidades em maior ou menor grau e, por isso, não devem, de forma alguma, deixar-se entregues às suas incapacidades, quer estas sejam de natureza ou etiologia fisiológica quer sejam de natureza ou origem mental. 86
Os indivíduos com défices de natureza mental, diferentes dos padronizados como normais, tanto em níveis mentais ou psicológicos como em seus processos cognitivos, são, simplesmente, especiais em relação à maioria do seu grupo etário, e, incluem crianças de famílias normais como crianças da rua, crianças de populações emigradas como crianças de minorias linguísticas, crianças de grupos desfavorecidos ou marginais como crianças de minorias étnicas ou culturais, sendo, por tais factos, tratadas discriminatoriamente, discriminação que pode ser positiva, quando favorece os desfavorecidos; negativa, quando o tratamento de certas diferenças favorece os já anteriormente favorecidos e neutra quando tais tratamentos nem favorecem uns nem outros, de maneira particular os deficientes, isto é, os indivíduos cujas incapacidades provocam-lhes dificuldades na sua relação com o meio, com as exigências da sociedade e com os objectivos ou as pretensões da organização escolar. O conjunto das incapacidades, com seu maior ou menor nível, dimensões e interrelacionamentos entre elas, dão origem à noção de deficiência. Deficientes são as pessoas que, por razões de anomalias congénitas ou adquiridas, perdas fisiológicas, psíquicas ou intelectuais permanecem ou ficam em desvantagens para o exercício das actividades sociais, profissionais ou escolares consideradas normais, tendo em conta a sua idade cronológica e seu grupo etário, o sexo e os factores socioculturais dominantes nos meios. Tal conjunto de desvantagens manifesta-se, fundamentalmente, a nível das características mentais do indivíduo, de suas aptidões sensoriais, sinestésicas, neuromusculares e corporais; a nível de atitudes e comportamentos emocionais, afectivos e sociais, e a nível de aptidões de comunicação e de inter-relações, factos e fenómenos causais cujas manifestações revelam atrasos ou subdesenvolvimentos motores, comportamentais, mentais ou psíquicos em certas áreas ou domínios do seus desenvolvimentos. No entanto, embora as fases de desenvolvimento de uma criança com atraso mental sejam idênticas às da criança dita normal, no caso das crianças com atraso mental, diz Zazzo (1969) “ as diferenças quantitativas e qualitativas entre os processos intelectuais e outros, num determinado momento evolutivo, não são constantes”. A inconstância psico-comportamental da criança com atraso intelectual manifesta-se através das suas dificuldades de adaptabilidade e adaptação ao grupo, à turma e às normas escolares em geral e exterioriza tais inadaptações através de atitudes e comportamentos apáticos ou hiper-emotivos, instáveis ou agressivos, desobedientes e indisciplinados. O anterior conjunto de crianças, adolescentes e jovens com contínuos ou quase permanentes conjuntos de atitudes e de comportamentos podem, de uma forma geral, serem considerados deficientes pois, devido aos seus défices físicos, psíquicos ou mentais, necessitam de ajudas, fundamentalmente nos campos da educação escolar, do treino vocacional, do emprego, da comunicação e das inter-relações psico-comportamentais, visto o conceito de deficiência, apoiando-se em juízos convencionais, é um conceito com acentuada relatividade e jamais irreversível, de maneira particular no que concerne as deficiências mentais ou os atrasos intelectuais oriundas de privações familiares, socioculturais e educativas. Na realidade, embora a dinâmica e a consolidação dos desenvolvimentos das funções cerebrais impliquem relativa hierarquização de umas com as outras, a realidade é que nem sempre assim acontece. Não raras vezes, o desenvolvimento da capacidade B não só estimula, mas, também, consolida o desenvolvimento da capacidade A (inferior), constatação evidenciada, por exemplo, quando uma criança interioriza seus mecanismos de linguagem ou adquire certos processos de informação, tornados aceleradores de processos de maturação cérebro-mente. No entanto, tais processos de desenvolvimento, sem o mínimo de maturação neurocerebral, não seriam possíveis. Tais possibilidades 87
tornam-se concretizáveis quando, por exemplo, certas crianças com atrasos mentais são integradas em meios e ambientes ricos em estímulos e motivações sociais, culturais e escolares. Apesar disso, torna-se necessário acentuar que existe profunda carência de estudos tanto neuropsicológicos como psíquicos acerca da problemática do atraso mental. A maioria absoluta de tais estudos emanam de perspectivas sociológicas e insistem no facto de que atrasado mental é o que não é capaz de se adaptar às exigências que a sociedade lhe impõe para levar a bom termo uma vida autónoma e independente. Ora, definir atraso mental em função da padronização do social é não só desconhecer ou negligenciar as variadas potencialidades de um indivíduo, os seus diferentes processos de adaptação, as suas diferentes características intelectuais, os seus variados processos cognitivos e suas possíveis e variadas estratégias utilizáveis para consecução de sua própria autonomia e independência, significando isto que, provavelmente, ao contrário do que se pretendeu demonstrar até ao presente, as crianças com atraso mental são seres humanos com processos, estratégias e mecanismos psico-comportamentais, cognitivos, emocionais e afectivos diferentes das crianças ditas normais, tornando-se, então, imperioso, não só conhecê-los, mas, também, aceitá-los e desenvolvê-los, não só através das pedagogias de aceitação, mas, também, de compensação e de motivação para que os objectivos do desenvolvimento total e de adaptação social sejam permanentemente prosseguidos, e, isto, tanto a nível de motricidade como de comunicação, de autonomia como de independência, de socialização como de integração sócioprofissional. De facto, crianças, adolescentes e jovens com necessidades educativas especiais são os que, de alguma forma e maneira, se diferenciam dos da média da sua idade cronológica e do seu meio social, diferenças efectuadas tanto à esquerda como à direita, tanto por cima como por baixo da média dos indivíduos do mesmo grupo etário. Um tal grupo é um grupo de diferenças mais acentuadas que as diferenças existentes entre os indivíduos que constituem a média do grupo. Estas diferenças podem emergir de dificuldades de aprendizagem ou de problemas comportamentais; de talentos especiais, de formas de pensar, de maneiras de percepcionar, de se inter-relacionar, movimentar, falar, ver, ouvir, etc.. No entanto, não raras vezes, os indivíduos com necessidades educativas especiais apresentam uma combinação hipercomplexa de dificuldades ou de habilidades especiais que, só por exagero ou defeito, se integram, objectivamente, nas tradicionais categorias e nomenclaturas de deficiente mental. E isto porque, sendo um facto que todo o ser humano é diferente um do outro, os deficientes são diferentes de forma muito mais acentuada, o que dificulta não só conscientes elaborações de prognósticos, mas, também, a aplicação e concretização de técnicas e de métodos tanto adaptativos como recuperativos. Por isso, embora os conhecimentos científicos sejam de capital importância, tanto a recuperação como a adaptação dos indivíduos com necessidades educativas especiais assenta na acção concreta e operativa, tanto facilitadora como orientadora de suas potencialidades, capacidades, destrezas e habilidades. O conjunto de técnicas e de métodos, de meios e de situações colocados à disposição do desenvolvimento e integração desses complexos conjuntos de crianças, acentuadamente diferentes, receberam, consoante a evolução sócio-histórica e a consciencialização psicopedagógica, vários epítetos como, por exemplo, educação da criança diferente, da criança inadaptada, da criança especial ou, após a declaração de Salamanca, educação da criança com “necessidades educativas especiais”.
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Baseando-se uma tal declaração no Warnock Report (1978), um tal relatório teve por objectivo a busca de respostas educativas às necessidades dos alunos e não a sua caracterização, deixando, assim, em aberto, a análise da multi-diversidade de necessidades, os níveis e aspectos das necessidades educativas, bem como a existência das modalidades, métodos e técnicas de resposta tanto a nível de desenvolvimento como de recuperação, de socialização como de integração. Socialização e integração são, no entanto, as características funcionais dominantes do espírito da legislação do Ministério da Educação Português. O decreto lei 319/91 afirma que “o ensino especial” tem por objectivos: fomentar a igualdade das oportunidades educativas a todas as crianças e jovens deficientes e permitir que as necessidades educativas especiais correspondam no âmbito das escolas regulares em intervenções adequadas. Por sua vez, o despacho n.º 105/97 determina a forma como se devem processar os apoios educativos em relação às crianças com necessidades educativas especiais, colocando professores nas escolas com o objectivo de “centrar nelas as intervenções diversificadas necessárias para o sucesso educativo de todas e crianças e jovens; assegurar de modo articulado e flexível os apoios indispensáveis ao desenvolvimento de uma escola de qualidade para todos; perspectivar uma solução simultaneamente adequada às condições e possibilidades actuais, mas orientar também para uma evolução gradual para novas e mais amplas respostas. O espírito subjacente e orientador de um tal despacho pretende introduzir mudanças significativas no âmbito de apoios a crianças com necessidades educativas especiais e criar condições para facilitação da diversificação das práticas pedagógicas, visando as melhorias das intervenções educativas. Tanto os apoios como as práticas educativas visam fundamentalmente: − Contribuir para a igualdade de oportunidades de sucesso educativo para todas as crianças e jovens, promovendo a existência de respostas diversificadas adequadas às suas necessidades específicas e ao seu desenvolvimento global; − Promover a existência de condições nas escolas para a integração sócioeducativa das crianças e jovens com necessidades educativas especiais; − Colaborar na promoção da qualidade educativa, nomeadamente nos domínios relativos à orientação educativa, à intercultaralidade, à saúde escolar e à melhoria do ambiente educativo; − Articular a resposta a necessidades educativas com os recursos existentes noutras estruturas e serviços, nomeadamente na área da saúde, da segurança social, da qualificação profissional e do emprego, das autarquias e das entidades particulares e não governamentais (despacho n.º 105/97).
IV – DIMENSÕES PSICOPEDAGÓGICAS DA INCLUSÃO NAS ESCOLAS REGULARES
Sendo pressupostos globais das actuais orientações pedagógico-educativas incluir crianças, adolescentes ou jovens com necessidades educativas especiais nos sistemas sócio-educativos regulares, esses sistemas deveriam possuir meios, métodos e técnicas especiais para dar respostas às necessidades especiais de tais educandos, ou seja, existência e utilização de materiais especiais, técnicas e estratégias de ensino específicas, apoios, ajudas, serviços e equipamentos diferenciados; aconselhamentos e orien89
tações especiais, avaliações multi-diferenciadas, tratamentos médicos, terapias físicas, ocupacionais, profissionais, etc., etc.. Constituindo o anterior conjunto de apoios e de técnicas alicerces fundamentais da funcionalidade de uma escola inclusiva, esta poderá encontrar sua dinâmica funcional desde que sedimentada numa antropologia pedagógica educativa emanada de uma filosofia de valores pragmáticos e sociais, desenvolvimentistas e integrativos, hominizantes e profissionais. Movida por uma tal força evolucionista, tanto os sistemas educativos em geral como a organização e gestão escolares em particular deverão adaptar-se aos educandos, independentemente, como foi adoptado no Congresso Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais da Unesco (Salamanca, 10 de Junho de 1994) das “suas condições físicas, sociais linguísticas ou outras”. De facto, um dos princípios fundamentais das escolas inclusivas impõe que todos os alunos devem aprender juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentem. Incluem-se, em tal princípio, as crianças com deficiências ou sobredotados, crianças da rua e crianças que trabalham, crianças de populações remotas ou nómadas; crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças ou grupos de crianças desfavorecidos ou marginais. Um tal objectivo de inclusão escolar e sócio-educativa desafia os sistemas escolares e orienta-os na existência e dinamização de uma pedagogia centrada no educando, capaz de estimular, motivar, desenvolver e educar, com sucesso, todas as crianças, adolescentes e jovens, incluindo os que apresentam graves incapacidades, pois todo e qualquer ser humano possui necessidades, capacidades, interesses e características que lhe são próprias. E é função essencial da escola e dos sistemas educativos em geral dar respostas às necessidades de seus educandos, desenvolver suas capacidades, estimular seus positivos centros de interesses e ajudá-los a afirmarem-se e a realizarem-se através de suas positivas características individuais. As respostas e os estímulos dão às necessidades e às características de tais educandos novas dimensões que não se encontram, fundamentalmente, só nas acções, tarefas ou desempenhos dos tradicionais processos de ensino-aprendizagem, mas, também, nas dimensões totalizantes do educando, envolvedoras de suas acções e desenvolvimentos biossociopsíquicos, alicerces de maximização de seu potencial. O objectivo de desenvolvimento maximal do biossociopsíquico do educando implica a imersão deste na acção participada e cooperativa de uma psicopedagogia valorizadora das diferenças individuais e centrada sobre os interesses, necessidades, características, aptidões e capacidades dos educandos. A concretização de tais objectivos psico-educacionais implica, primeiramente, mudança de mentalidades dos agentes educativos: pais, educadores, professores, gestores escolares, sistemas, filosofias organizativas, etc., visto urgir a criação e o desenvolvimento de diferentes culturas das aprendizagens, existência de inter-solidariedades e espírito de equipas e de convivialidade para que os educandos sejam ajudados em seus próprios processos de descoberta de sua identidade, de aptidões e de capacidades, emanando, daí, os equilíbrios, a segurança e os bem-estares individuais e sociais, integrativos e profissionais, o que nem sempre acontece com educandos que obtiveram elevadas performances a nível do tradicional rendimento escolar. De facto, integrar não pode ser efectuado contra a preservação da integridade do educando. Por tal razão, a filosofia da escola inclusiva deverá ser um meio e não um fim em si mesmo. Por isso, a integração educativa deverá alicerçar-se num processo de diferenciação da escola com o objectivo de dar resposta às necessidades individuais de todos os seus alunos, para que educandos com deficiências ou dificuldades especiais se aproximem dos padrões de “normalização” escolar, se integrem, o mais possível, no 90
padrão escolar normal e no meio social vigente, visto, a nível orgânico-institucional, integração escolar significar, fundamentalmente, o direito que possuem todos os educandos de frequentar uma escola regular, e, aí, beneficiarem das adaptações organizacionais e curriculares exigidas pelas suas dificuldades ou necessidades educativas especiais. A consciencialização das necessidades de tais viragens educativas implica a existência de novos pensares e de novos actuares, de novos percepcionares e de novos agires sobre o fenómeno educacional, o qual impõe o desenvolvimento e a expansão do novo paradigma sócio-educativo, visto, em sua raiz, encontrar-se a intrínseca necessidade de capacitar as escolas para atender todas as crianças, aceitar as suas diferenças, apoiar as aprendizagens e dar respostas às necessidades individuais de cada uma, pois, como afirma a declaração de Salamanca: “cada criança tem o direito fundamental à educação e deve ter a oportunidade de conseguir e manter um nível aceitável de aprendizagem. ... Os sistemas de educação devem ser planeados e os programas educativos implementados tendo em vista a vasta diversidade destas características e necessidades”. Para tal torna-se necessário que uma tal filosofia educativa assuma, visceralmente, que as diferenças humanas são normais e que as aprendizagens devem ser adaptadas às necessidades dos apreendentes. Por isso, o mérito das escolas inclusivas “não consiste somente no facto de serem capazes de proporcionar uma educação de qualidade a todas as crianças; a sua existência constitui um passo crucial na ajuda da modificação das atitudes discriminatórias e na criação de sociedades acolhedoras e inclusivas”. Efectuar a inclusão escolar e promover a integração dos indivíduos na escola, família, trabalho e sociedade constituem princípios fundamentais dos direitos humanos, essenciais não só à concretização da igualdade de oportunidades, mas, também, ao princípio da valorização da dignidade pessoal. Para que uma tal dinâmica integrativa se processe, porém, torna-se necessário a existência de uma genuína participação de todos os agentes sociais, comunitários, psicopedagógicos, educativos e profissionais, visto a integração resultar das interacções dos sistemas envolventes do ser humano, visto mobilidade permanente e mudança constante serem os imperativos mais evidentes das sociedades actuais e futuras. Os anteriores imperativos das actuais sociedades modernas opõem-se à tradicional rigidez das organizações escolares e põem em causa não só os conteúdos, mas, também, os métodos da escola formal, visto esta, apesar da utilização de condensados mecanismos de resistências, ter deixado de ser não só a torre dos saberes, mas, também, o alfobre exclusivo de implementação e de desenvolvimento dos instrumentos e meios de capacidades e destrezas, habilidades e valores, adaptações e socializações. Na realidade, a multi-diferenciação operacional, tanto a nível de cognição como de comportamentos, de percepções como de emoções, de sentimentos como de objectivos, exige a existência de uma escola centrada no educando, em suas diferenciadas capacidades e aptidões e alicerçada em métodos de aprendizagem cooperativa, aberta e disponível ao desenvolvimento harmonioso e integrado de todos os educandos e educáveis existentes em seus meios sócio-geográficos. No entanto, integrar educandos na escola regular com vários tipos de necessidades educativas especiais, vários graus de dificuldades de aprendizagem e diferentes níveis de adaptabilidade sócio-escolar exige a existência de garantias de uma múltipla variedade de recursos e de disponibilidades, de modalidades psico-educativas e didácticas adaptadas às necessidades e dificuldades de cada educando, factos que têm como objectivos essenciais a diminuição ou, se for possível, a eliminação do fosso 91
existente entre crianças deficientes e não-deficientes ou entre crianças com necessidades educativas especiais e sem elas, para que, a partir daí, tanto as crianças como as pessoas deficientes sejam parte integrante das comunidades com pessoas não-deficientes, tendo mesmo acesso aos recursos sociais e profissionais que têm os restantes membros da comunidade, tornando-se membros activos e participativos da comunidade social e profissional, familiar e lúdica; de produção e consumo, visto toda e qualquer criança, adolescente, jovem ou adulto ter direito à educação, à igualdade de oportunidades e à participação sócio-económica, direitos inalienáveis que obrigam a escola a estar atenta à diversidade de seus alunos. Porém, os alunos que, quer por suas capacidades e aptidões, atitudes ou comportamentos, não se integram na média estatística do grupo-turma, classe, grupo-etário, escola ou sistema educativo em geral, levantam problemas que põem em causa não só os funcionais dinamismos das massificações pedagógico-educativas, mas, também, as estruturas das organizações escolares, os conteúdos dos currículos, os tradicionais sistemas de avaliação, bem como as hierarquias de atitudes e de comportamentos de educadores e professores. É que, de facto, integrar educandos ou alunos com necessidades educativas especiais na escola regular implica sistematizadas mudanças nos tradicionais processos de ensino-aprendizagem, não só a nível de organização e de funcionalidade pedagógica, mas, fundamentalmente, a nível de mudanças de metodologias, de acções e de comportamentos, não só a nível de educadores e professores, mas, também, a nível de seus sistemas de formação inicial, continua ou em serviço, visto a eficiência da acção e do desenvolvimento da escola inclusiva alicerçarem-se, fundamentalmente, nos pragmatismos intencionais e nos comportamentos reais dos agentes de educação, de desenvolvimento e por razão. E isto porque a dinâmica da escola inclusiva apresenta-se como um sistema de interacções de crianças, adolescentes ou jovens sem perturbações, deficiências ou atrasos com educandos com maiores ou menores perturbações, deficiências ou patologias, devendo, para sua funcionalidade, dar respostas às necessidades gerais de todos e às necessidades específicas de cada um, com intuito da concretização do desenvolvimento maximal possível de cada educando, obtenção de sua integração sócio-escolar e profissional, ajudando cada indivíduo a ser aquilo que, positivamente, ele pode vir a ser. A concretização de um tal objectivo parece estar subentendida na declaração de Salamanca (1994), quando afirma: “todos os alunos devem aprender juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentam. Estas escolas devem reconhecer e satisfazer as necessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos através de currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de utilização de recursos e duma cooperação com as respectivas comunidades”. Os anteriores desideratos incidem na aceitação das diferenças de todos, nas diferenciações pedagógico-educativas, nas flexibilidades comportamentais, nas pedagogias centradas sobre o educando e na adequação dos currículos às suas necessidades, o que implica que o educador-professor utilize métodos de ensino e estratégias de aprendizagem apropriados à obtenção do sucesso para todos. O sucesso, no entanto, não deverá ser avaliado em conformidade com a “norma” mas sim em função do caminho percorrido e do desenvolvimento efectuado relativamente ao ponto de partida e às circunstâncias, características e factores particulares de cada aluno.
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É que, sendo todos os alunos dotados de capacidades, uns são mais capazes que outros, e, a acção dos princípios de não-segregação, de integração e de inclusão não só estimulam, mas, também, activam suas capacidades e aptidões, desde que não se efectuem rupturas nos desenvolvimentos individuais, se dêem respostas, se induzam estímulos e criem motivações em funções das necessidades específicas de cada indivíduo. As dinâmicas educativas nas escolas regulares poderão mover-se na base de tais princípios, desde que se orientem por uma perspectiva holística da educação, sejam abrangentes e interdimensionais, sócio-educativamente interactivas e geradoras de autoestima, autonomia e independência dos educandos, visto a sociedade, mais tarde, exigir deles, iniciativa e afirmação, inserção e autonomia, flexibilidade e adaptação. Embora tais necessidades, a nível de exigência do social, sejam evidentes, a verdade é que a concretização do conceito “escola inclusiva para todos” permanece algo de puramente teórico e com receio de jamais ser concretizável a todos os níveis, visto tal concretização implicar conjugação de esforços multivariados, profunda consciência das suas vantagens em relação às desvantagens e eliminação de egoísmos e interesses particulares instalados nas escolas ou centros de educação especial, bem como irradicação dos mecanismos de resistências dos educadores e professores das escolas regulares e de certos profissionais que trabalham com crianças com problemas graves de aprendizagem. De facto, sendo evidente que todos indivíduos são diferentes, os portadores de necessidades educativas especiais, tanto por factores de ordem física como cognitiva, linguística como social, emocional como afectiva, são, acentuadamente, muito mais evidentes. As diferenças evidenciam-se a nível de processamento e de retenção da informação, a nível de linguagens, perceptivo-motor, visão, audição, a nível sócio-emocional e comportamental, etc.. Os dinamismos da escola regular proporcionam a tais tipos de alunos possibilidades de interacção e de aceitação social, de conhecimento dos outros, dos meios e de si mesmo, de enfrentamento da realidade social e dos dinamismos que regem a coesão da sociedade. Daí a capital importância de se centrar os objectivos educacionais das escolas não só nos conteúdos dos currículos, mas, fundamentalmente, nas perspectivas do social e do individual, do cognitivo e do profissional, através de aprendizagens participadas e activas, demonstrações práticas, orientações pedagógico-educativas e avaliações contínuas. Por outro lado, é necessário disponibilidade dos educadores e professores para efectuarem formações contínuas e, os pais para se interessarem pelo progresso escolar dos seus filhos, e, existam recíprocas interacções entre comunidade e escola para o desenvolvimento de projectos concretos, estímulos da escola e serviços à comunidade. As mútuas e recíprocas interacções entre todos os agentes educativos e respectivos meios, organizações e instituições, constituem o eixo fulcral da escola inclusiva, pois, sendo as diferenças humanas normais, a aprendizagem deve ser adaptada às necessidades da criança, em vez de ser esta a ter de se adaptar a concepções pré-determinadas relativamente ao ritmo e à natureza do processo educativo. Por isso, os processos integrativos a efectuar na escola inclusiva deverão ser efectuados desde a mais tenra idade da criança: creche, infantários, pré-escola, escola, formação profissional, e, promover os seus desenvolvimentos físico, psicomotor, cognitivo, intelectual, emocional, afectivo e social, orientando e preparando os indivíduos não só para a escola, mas, também, para um desenvolvimento harmonioso, integrado e uma futura existência sócio-profissionalmente realizada. A nível de aquisição de conhecimentos escolares, porém, a sua evolução passa, a maioria das vezes, pelo acompanha-
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mento dos alunos em trabalhos de grupos, por trabalhos individualizados com os alunos, ensino programado, audiovisual, e, também, por aprendizagens colectivas. Embora ainda não existam avaliações objectivas acerca dos efeitos positivos das escolas inclusivas, em comparação às escolas de ensino especial, as vantagens das primeiras parecem ser superiores em relação às segundas, fundamentalmente, a nível de crianças com ligeiro e médio atraso mental. No caso de crianças com grave ou profundo atraso mental parece justificar-se a existência de escolas especiais, desde que estas tentem eliminar a segregação e a discriminação, o conservadorismo e o ocupacionismo.
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CAPÍTULO V
SISTEMAS ESCOLARES NOS PROCESSOS DE INCLUSÃO DOS APRENDENTES
Apesar dos enormes avanços nos domínios tecnológicos, das descobertas nas áreas científicas e das perspectivas inovadoras nos domínios da Neuropsicologia, as inovações nos domínios da psicopedagogia, da didáctica pedagógico-educacional e das eficiências do ensino-aprendizagem têm sido, comparativamente aos avanços das Ciências, relativamente lentas. Crianças com deficiências e crianças sobredotadas, crianças de populações nómadas e crianças da rua, crianças de etnias linguísticas e culturais e crianças de grupos desfavorecidos ou marginais continuam à procura de seus lugares e de seus respectivos enquadramentos nas escolas regulares. No entanto, é vasta a literatura filosófico-pedagógica, bem como as legislações acerca das inclusões nas escolas regulares de crianças com deficiências ou dificuldades escolares. A sua operacionalização, porém, é hipercomplexa e de enormes exigências, tanto para as organizações da escola como para a formação, adaptação e disponibilidades dos professores. A nível de organizações escolares é imperativo que estas se adaptem a todas as crianças independentemente das suas condições físicas, sociais, linguísticas ou outras. A nível psicopedagógico urge que os serviços educativos ponham em prática uma variedade de alternativas de ensino adequadas ao nível de cada aluno para que este fruía do máximo de possibilidade de integração escolar e social efectuada entre crianças, adolescentes ou jovens deficientes e não deficientes, reciprocidades interactivas que implicam a aplicação de pedagogias centradas sobre os educandos, sobre suas necessidades, sobre os planos educativos e os objectivos educacionais. A elaboração dos planos educativos, no entanto, deverá emanar do diagnóstico das capacidades ou incapacidades que este ou aquele educando possui para desempenhar determinadas actividades de forma específica. Ora, sendo um facto indiscutível que nenhuma criança é ineducável, torna-se, também, evidente que toda a criança pode aprender. As suas dificuldades de aprendizagem emergem, a maioria, de factos e circunstâncias sociais envolventes da criança, de patologias neuropsíquicas ou de lesões cerebrais. As áreas cerebrais, porém, nas crianças, são diferentes das dos adultos e têm características próprias de plasticidade, que fazem com que, quando adequada e devidamente estimuladas, passem a substituir ou a compensar outras áreas lesionadas, desenvolvendo funções idênticas às das áreas lesionadas. Pelo menos a nível teórico, na legislação Portuguesa encontram-se orientações adaptáveis ao desenvolvimento das necessárias compensações de crianças com deficiên95
cias e, para as estimulações e motivações de crianças, jovens e adolescentes, com reduzidas capacidades de aprendizagem, suportes legislativos que deverão, não só facilitar, mas, também, ajudar o desenvolvimento de todas as potencialidades dos alunos, oferecer-lhes igualdades de oportunidades e favorecer a coesão social e cultural. A lei de bases do sistema educativo (lei n.º 46/86) salienta como objectivos do sistema educativo: − Contribuir para o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos, incentivando a formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários. − Promover o desenvolvimento do espírito democrático e pluralista, respeitador dos outros e das suas ideias, aberto ao diálogo e à livre troca de opiniões, formando cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e se empenham na sua transformação progressiva. − Preparar para uma reflexão consciente sobre os valores espirituais, estéticos, morais e cívicos, proporcionando-lhe um equilibrado desenvolvimento físico. − Promover a democratização do ensino, garantindo o direito a uma justa e efectiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolar. No intuito de completar os objectivos educativos da lei de bases do ensino, o despacho n.º 105/97, no seu ponto n.º 2, referindo-se à prestação dos apoios educativos afirma que estes devem visar: − Contribuir para a igualdade de oportunidades de sucesso educativo de todas as crianças e jovens, promovendo a existência de respostas pedagógicas diversificadas adequadas às suas necessidades específicas e ao seu desenvolvimento global; − Promover a existência de condições nas escolas para a integração sócioeducativa das crianças e jovens com necessidades educativas especiais; − Colaborar na promoção da qualidade educativa, nomeadamente nos domínios relativos à orientação educativa, à interculturalidade, à saúde escolar e à melhoria do ambiente educativo; − Articular as respostas às necessidades educativas com os recursos existentes noutras estruturas e serviços, nomeadamente nas áreas da saúde, da segurança social, da qualificação profissional e do emprego, das autarquias e das identidades particulares e não governamentais. Na base de um tal despacho encontra-se o artigo 2 do decreto lei n.º 319/91, o qual, pretendendo proporcionar condições ideais para que o ensino-aprendizagem da criança e do jovem com necessidades educativas especiais se processe num ambiente normalizador, corrobore a existência de: − equipamentos especiais de compensação; − adaptações materiais; − adaptações curriculares; − condições especiais de matrícula; − condições especiais de frequência; − condições especiais de avaliação; − adequação na organização de classes ou turmas; − apoio pedagógico acrescido. Os anteriores princípios orientadores valorizam a cooperação, a solidariedade e o respeito; a adaptação, a integração e a inclusão dos alunos com necessidades educativas especiais nas escolas regulares.
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I – ACÇÕES PSICO-EDUCACIONAIS NOS DINAMISMOS DAS INCLUSÕES DO ENSINO REGULAR A concretização dos enunciados objectivos passa pela criação e desenvolvimento de hábitos de trabalho e de acção, de envolvimento e de participação dos alunos com necessidades educativas especiais. Não raras vezes, porém, os maiores obstáculos a tais concretizações emergem dos meios e ambientes familiares, comunitários ou sociais, grupais ou étnicos. A necessária mudança passa, fundamentalmente, pelo desenvolvimento educativo da responsabilidade individual, de sua necessária afirmação pessoal, inserção social, desenvolvimento de habilidades e destrezas profissionais; pelo amor e envolvimento no trabalho, auto-estima pessoal, bem como por hierarquias de atitudes e de comportamentos interrelacionais, o que deverá gerar, nos indivíduos, potencialidades de maximização de sua autonomia e de sua qualidade de vida, princípios e fundamentos essenciais à activação do desenvolvimento cognitivo, aos comportamentos afirmativos e às actividades integrativas. Embora a concretização de tais processos-objectivos seja de primordial e capital importância para o devir, a integração e a realização de cada indivíduo, os códigos padronizadores existentes nas estruturas neuropsíquicas dos indivíduos dificultam as necessárias maleabilidades e flexibilidades, necessárias à necessária obtenção de resultados e sucessos. Impõe-se, para tal, reinterpretações e reavaliações dos passados individuais, das causas dos comportamentos limitadores, das causas das dificuldades de mudanças, dos factores de rigidez neuropsíquica, das ausências de maleabilidades psicoemocionais, etc.. A nível dos relacionamentos, as reciprocidades e as intervenções com crianças, adolescentes e jovens com necessidades educativas especiais, educadores, professores e formadores sabem que todo o sujeito humano é receptor e gerador de comunicações, e, que toda a associação, entre indivíduos, implica intercomunicações. Estas intercomunicações, efectuadas através de signos, de sinais, de intercâmbios, de trocas, etc., são geradoras de socializações, de aprendizagens e mudanças. Socialização, mudança e identificação impõem-se como imperativos fundamentais da existência social de todo o ser humano. Embora a identificação leve o indivíduo ao reconhecimento de suas diferenças face ao outro, ele não permanece, continuamente, totalmente estranho a este e, por isso, os dois comunicam através das semelhanças e das diferenças, fenómeno intercomunicacional que faz com que parte do outro passe para o “em si mesmo” do ser-sujeito e, parte deste, passe para o ser do sujeito estranho. Tudo isto encontra-se de tal maneira enraizado na natureza humana que o Eu pessoal e o Eu dos outros são complementares, tanto nos processos socializadores como comunicadores, nos processos educativos como nos processos formativos, o que faz com que o princípio da inclusão humana apareça como algo natural e o princípio da exclusão como algo de anormal. Ora, alicerçando-se tanto os organismos como as sociedades em seus princípios de inclusão, e, sendo o ser humano um ser em relação com os outros, ele é, simultanea-
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mente, um ser que depende dos outros, tanto para amadurecer como para se realizar, e, é também dos outros que ele sofre pressões. Face a uma tal situação de dependência dos outros e de condicionamento pelos outros, o ser humano é um ser que, desde o nascimento, está mergulhado no meio social, e, é através da acção deste que ele, pouco a pouco, através das reciprocidades das trocas, se vai socializando. Esta socialização é parte integrante do processo educativo, e, é, através deste, que pais, adultos, educadores, professores e formadores intervêm de uma forma decisiva, visto os agentes de educação operarem sobre os educandos, atitudes e comportamentos que, interiorizados, geram homogeneidades comportamentais, socializações, adaptações e integrações orientadoras de toda a existência dos indivíduos. As variáveis essenciais de um tal processo de socialização (família, escola, grupos de colegas, meios de comunicação, etc.), geram, por um lado, no educando, uma identidade social e, por outro lado, entregam à sociedade o dever de fornecer aos educandos meios e instrumentos que lhes permitam efectuar escolhas e tomar opções consoante suas capacidades, aptidões e centros de interesses.
II – MULTIDIFERENCIAÇÃO COGNITIVA E COMPORTAMENTAL NAS ESCOLAS REGULARES
Nas crianças ditas normais os seus processos efectuam-se e interiorizam-se de forma rápida e eficaz. No caso de crianças com deficiências já os processos e seus respectivos efeitos são muito lentos e requerem cuidados especiais. No entanto, crianças, adolescentes e jovens com deficiências, e, a frequentarem locais públicos, aprenderão a interagir e a respeitar as regras indispensáveis para viver em sociedade. Por sua vez, os cidadãos ditos normais compreenderão que eles fazem parte integrante da comunidade e, como tal, deverão ser aceites, mesmo que os seus comportamentos não sejam os mais usuais. Por isso, devendo o ser humano viver em sociedade, é necessário que esta o aceite como ele é, com as suas capacidades e as suas limitações, os seus centros de interesses e os seus níveis de aprendizagem. No entanto, o processo de educação, tanto de crianças ou de alunos deficientes como com necessidades educativas especiais, requerem a cooperação das famílias, a mobilização das comunidades, a acção e o envolvimento de profissionais e uma elevada abertura e disponibilidades das organizações escolares. A complementaridade escola-família é de intrínseca e de capital necessidade e importância, não só para os necessários desenvolvimentos dos educandos, mas, também, para prevenção dos perigos e riscos a que os educandos, nos actuais contextos socioculturais, educativos, integrativos e profissionais, estão sujeitos. Estas perspectivas de integrabilidade partem da aceitação da multidiferenciação mental, psíquica, cognitiva e comportamental dos sujeitos educandos e das multidimensões funcionais, cognitivas e comportamentais que, mutua e reciprocamente, influenciam os educandos, estimulam-os e motivam-os, tanto a nível de cooperações comportamentais como de envolvimentos sociais, cognitivos e intelectuais. De facto, as estratégias de aprendizagem cooperativa fazem interagir alunos sem necessidades educativas especiais com alunos com necessidades educativas especiais e, 98
de tais interacções, resultam melhorias significativas de atitudes, de comportamentos e de conhecimentos para com os de necessidades educativas especiais, e, para os que não possuem necessidades educativas especiais, maiores desenvolvimentos de suas potencialidades de intersolidariedade humana, mais auto-estima individual e melhores e mais positivas inter-relações pessoais. Uma tal interactividade participada e dinâmica insere os indivíduos em seus meios e contextos e, estes, devido a seus próprios dinamismos de transformação e de mudança estimulam os sujeitos-educandos em seus processos e dinamismos de adaptação, de mobilidade e de integração. O sucesso de uma tal dinâmica resultará, por um lado, das percepções, conhecimentos e imagens que os agentes e factores dos meios possuem dos educandos, e, por outro das percepções que os educandos têm acerca dos agentes dos meios. É que meios e indivíduos interactuam mútua e reciprocamente, e, de tais interactuações, resultam não só modificações recíprocas, mas, também, mudanças de atitudes e de comportamentos, os quais, por sua vez, estimulam desabrochamentos de novos níveis de cognição e de relacionamentos com os conteúdos das aprendizagens e os agentes do ensino. As anteriores implicações emanam, com evidência, dos intrincados processos indivíduo-social, cujas interacções e suas respectivas variáveis influenciam directamente o indivíduo, como se demostra, de forma acentuada, através dos processos de integração de crianças, adolescentes ou jovens com necessidades educativas especiais nas classes regulares. No entanto, em tais processos a integração não é um fim mas sim um meio de desenvolvimento e de socialização, de aprendizagem e de educação dos indivíduos. Estes processos, no entanto, deverão conter em seu cerne, as indeléveis marcas da dinâmica e da evolução, da mobilidade e da mudança, da progressão e da exteriorização. Os anteriores efeitos das interacções de crianças, adolescentes ou jovens com necessidades educativas especiais nas escolas regulares, e com educandos ditos normais, emergem da força da acção dos princípios de reciprocidade, de cooperação e mutualidade, os quais deverão encontrar-se na essência dos actos e comportamentos psicopedagógicos orientadores de uma escola inclusiva. A aprendizagem cooperativa, processo de aprendizagem, que deverá dominar a escola inclusiva, consiste em colocar os alunos em grupos de trabalho, organizando-os na base da heterogeneidade de suas habilidades cognitivas, mentais, psíquicas, emocionais e afectivas para que, das reciprocidades de tais interacções, emanem significativas melhorias das atitudes e dos comportamentos dos alunos não-deficientes face a seus colegas com dificuldades especiais e, dos alunos com dificuldades, perturbações ou deficiências, desabrochem significativos desenvolvimentos de auto-estima, de autoconfiança, de participação e de envolvimento nos processos de aquisição de novos conhecimentos e nos desenvolvimentos de novas atitudes e comportamentos, visto elevadas percentagens, tanto de aprendizagens como de comportamentos, emergirem das recíprocas interacções das heterogeneidades cognitivas e comportamentais dos alunos. Uma tal dinâmica pedagógico-organizacional, tanto das escolas como das salas de aulas, assenta num dos fundamentais deveres e direitos de um Estado Democrático, o qual, apregoando, “a escola para todos” assume, simultaneamente, o facto de que compete à escola regular a principal responsabilidade da educação de todas as crianças e jovens, quaisquer que seja as suas dificuldades, deficiências, características específicas, dons ou talentos especiais. As existências das inequívocas constatações de que, tanto a nível sóciopedagógico como cognitivo, social, como psico-comportamental, existem crianças, adolescentes e jovens com necessidades educativas especiais, e, tanto em seus meios 99
sócio-familiares como sócio-escolares, integrativos como sociais, caracterizados uns, por realizações de padrões comportamentais abaixo da média, e, outros, acima, geram necessidades de alterações dos paradigmas tanto escolares como sócio-educativos. No entanto, as alterações, mudanças, inovações ou criação de novos paradigmas encontram-se, por um lado, nas estruturas mentais e nos respectivos dinamismos, interactivos, dos agentes participantes e, por outro lado, nas estruturas dos dinamismos perceptivo-cognitivos dos institucionalizados líderes das mudanças sócio-administrativas, legitimadores das existências grupais ou colectivas de novos paradigmas. Porém, tanto os primeiros como os segundos encontram-se interconectados por um denominador comum: crença ou não-crença nas mudanças. Com efeito, sendo as mudanças efeitos de contínuos desenvolvimentos, participações e envolvimentos dos indivíduos, a não participação destes ou a sua inactividade fará com que eles não só se sintam asfixiados pelas novidades das mudanças, mas, também, marginalizados dos caminhos ou vias que têm necessidade de percorrer. No entanto, enveredar pelos caminhos das mudanças implica reformulação do antigo, aceitação do novo e selecção de características inovadoras, o que conduz o indivíduo a desactivar crenças antigas, a desancorar-se de cristalizados padrões comportamentais e a adoptar atitudes e comportamentos emanados de novas situações, circunstâncias ou meios, os quais, graças às interactivações dos subsistemas neurocognitivos geram novas hierarquias de atitudes e novos padrões de comportamentos. Porém, a efectivação dos anteriores dinamismos impõe-se como necessidade emergente da criação e do desenvolvimento de um espírito da escola inclusiva. É que esta, ao contrário das dos sistemas escolares vigentes, é anti-exclusão, anti-insucesso e anti-abandono escolar. Por isso, tanto as suas estruturas como os seus dinamismos motivacionais deverão centralizar-se sobre as especificidades de seus educandos e não sobre a mediania escolar, a qual não passa de uma abstracção mental emanada de um inconsciente colectivo. Efeitos de tais abstracções, porém, têm excluído ou marginalizado das escolas regulares crianças com dificuldades de aprendizagem, portadoras de deficiências sensoriais, cognitivas e mentais. E isto pelo facto dos processos educacionais não terem sido centrados na criança, objectivando a garantia de uma escolarização bem sucedida para todos. Uma tal escolarização implica a adopção de sistemas mais flexíveis e adaptativos, capazes de, mais largamente, levarem em consideração as diferentes neces-sidades dos educandos, alicerçadas, essencialmente, nas intrínsecas necessidades de concretização dos princípios de inclusão e de integração, de participação e de envolvência, em consonância com os diferentes níveis de potenciais, de aptidões de capacidades, destrezas e habilidades de cada conjunto de características individuais e de diferenças implicadoras de relações e de comportamentos diferentes para alunos diferentes, de currículos individuais para educandos especiais e de pedagogias e de actividades extra escolares específicas para responder a necessidades específicas dos alunos, os quais não só têm capacidades, mas, também, necessidades de obtenção de padrões de desenvolvimentos superiores e de participações e de envolvimentos cada vez mais participados, mais activos e mais dinâmicos. Porém, para que tais desenvol-vimentos se efectuem com eficiência torna-se necessário que as acções pedagógico-educativas partam das experiências, vivências, preocupações e patamares de desenvolvimentos dos educandos, de forma flexível e maleável, adaptativa e socializante. A obtenção e o desenvolvimento de tais características no seio das escolas regulares impõem esforço, rentabilização e dinamização de todos os recursos existentes, não só no seio das escolas, mas, também, participação de agentes e de instituições, existen100
tes na comunidade envolvente, como de facto se evidencia na declaração de Salamanca (n.º 48) ao afirmar: “os alunos com necessidades especiais precisam de oportunidades de interagir com alunos com deficiência que obtiveram sucesso, de modo a que possam modelar o seu próprio estilo de vida e as suas aspirações por expectativas realistas. Para além disto, devem ser dados aos alunos com deficiência exemplos de liderança e capacidade de decisão, de forma a que venham a colaborar na orientação da política que os virá afectar na sua vida futura. Os sistemas educativos terão, assim, de procurar recrutar professores qualificados e outro pessoal educativo com deficiência, e procurar envolver pessoas com deficiência que obtiveram sucesso na sua região na educação das crianças com necessidades especiais”. Ainda concernentes apoios a educandos com necessidades educativas especiais a declaração de Salamanca afirma: “..., devem garantir-se diferentes formas de apoio, desde uma ajuda mínima na classe regular até programas na compensação educativa do âmbito da escola, estendendo-se, sempre que necessário, ao apoio prestado por professores especializados e por pessoal externo”. “Devem utilizar-se os recursos técnicos adequados se forem acessíveis, sempre que se justificar o seu uso para promover o sucesso educativo no contexto do currículo escolar e para ajudar a comunicação, a mobilidade e a aprendizagem. As ajudas técnicas poderão ser conseguidas de forma mais eficaz e económica se forem distribuídas a partir de um serviço central, em cada localidade que disponha dos conhecimentos necessários para fazer corresponder as ajudas às necessidades individuais e para efectuar a respectiva manutenção”. “Devem promover-se os conhecimentos e efectuar-se a investigação a nível regional e nacional, tendo em vista o desenvolvimento de sistemas de suporte tecnológico apropriado às necessidades educativas especiais”. Concernente a adaptabilidade dos currículos escolares, os apoios pedagógicos e as aquisições de conhecimentos dos alunos com necessidades educativas especiais, a mesma declaração afirma: “Os currículos devem adaptar-se às necessidades da criança e não vice-versa. As escolas, portanto, terão de fornecer oportunidades curriculares que correspondam às crianças com necessidades e interesses distintos”. “As crianças com necessidades especiais devem receber apoio pedagógico suplementar do contexto do currículo regular e não de um currículo diferente. O princípio orientador será o de fornecer a todos a mesma educação, proporcionando assistência e apoios suplementares aos que deles necessitam”. “A aquisição de conhecimentos não é uma simples questão de ensino formal e teórico. Os conteúdos da educação devem apontar para níveis elevados, de modo a permitir aos indivíduos uma plena participação no desenvolvimento, e, o ensino relacionar-se com a experiência dos próprios alunos e com assuntos práticos, de modo a suscitar-lhes a motivação para aprender”. “Para acompanhar a evolução de cada criança, é preciso rever os processos de avaliação. A avaliação formativa deve integrar-se no processo educativo regular, de modo a permitir que alunos e professores se mantenham informados sobre o nível de conhecimentos atingidos e que sejam identificadas as dificuldades e se ajudem os alunos a ultrapassá-las”. As variáveis disfuncionalidades da anterior problemática implicam não só reorganizações a nível de dinâmicas escolares, mas, também, novos e diferentes investimentos a nível de recursos humanos. É que as escolas inclusivas são exigentes a nível de formação do seu pessoal, da organização dos serviços e das necessárias interacções com os ambientes e os meios sociais envolventes, de maneira particular, com as 101
instituições, técnicos e pais, bem como com outro variado público envolvido na educação de crianças com necessidades educativas especiais. A acção do público em geral poderia ser, por exemplo, a de promover uma atitude positiva perante a integração de pessoas deficientes na sociedade, contribuindo para que elas superem os preconceitos negativos, a desinformação e promovam atitudes positivas face ao emprego de pessoas com deficiência. III – DIMENSÕES EDUCATIVAS DA ESCOLA INCLUSIVA
O verdadeiro espírito da escola inclusiva, aberto à diversidade comportamental, cognitiva, emocional e afectiva, espera, de seus educandos, desenvolvimentos, eficiências e sucessos em seus processos de cognição, educação e integração tanto escolar como social. Os anteriores objectivos sócio-educacionais dificilmente serão atingidos sem a implementação das interactivas funcionalidades de equipas interdisciplinares nas escolas inclusivas, as quais deverão ser constituídas por psicólogos-educacionais, professores, monitores, terapeutas, auxiliares de educação com formação específica para intervenção, acção e desenvolvimento dos educandos com deficiências sensoriais, dificuldades de aprendizagens e multideficiências em geral. É que, de facto, o necessário apoio, com as respectivas técnicas de intervenção, de desenvolvimento e acção nas escolas inclusivas exigem de seus intervenientes formação científica e técnica, psicopedagógica e escolar para que uma tal idealizada educação seja concretizável e não permaneça como mais um meio de exclusão ou marginalidade dos educandos com necessidades educativas especiais. Urge, por isso, além das formações específicas de um tal pessoal que este permaneça restrito a um tal tipo de escolas e não esteja sujeito às sucessivas mudanças ou constantes mobilidades, pois a concretização de projectos e de acções exige investimentos dos recursos humanos, persistências e continuações. São necessárias as organizações de estruturas de apoio, coordenações das acções pedagógico-educativas, análise dos efeitos, prospectivações das saídas escolares e integrações sócio-profissionais dos alunos-sujeitos das escolas inclusivas. De facto, nas escolas inclusivas, muito mais que nas escolas simplesmente ditas regulares, proliferam heterogeneidades comportamentais, diferenças cognitivas e diversidades de necessidades. Tanto umas como outras exigem respostas adequadas aos necessários e possíveis desenvolvimentos, êxitos, educações e integrações dos educandos. E, para tal, é necessário que os serviços de apoio escolar possuam meios para que os profissionais possam aplicar técnicas, métodos e estratégias que dêem respostas às necessidades dos educandos, pois, como o escreveu York (1992, p. 101): “nem a disciplina ou a matéria por si só, nem a experiência de um só sujeito são suficientes para responder às diversidades das necessidades que os alunos podem apresentar numa aula aberta à diversidade”. Uma tal multidiversidade é tanto comportamental como cognitiva, emocional como afectiva, relacional como escolar, social como profissional. Esta multidiversidade de heterogeneidades psico-comportamentais exige não só formação académica adequada, mas, também, características especiais do pessoal envolvido nos processos de ensino-aprendizagem e educação-formação dos educandos portadores de necessidades educativas especiais ou de multi-deficiências. É que, tais educandos, caracterizados, a maioria das vezes, por suas inseguranças e faltas de autoconfiança, de instabilidade e 102
complexos de inferioridade, ausências de auto-estima e faltas de auto-conhecimento de suas potencialidades, aspiram encontrar modelos, referenciais e orientações, não só para seus imediatos comportamentos, mas, também, para seus futuros sócio-profissionais. Por isso, o pessoal envolvido em tais processos deverá não só possuir sólida formação académica em tais áreas do conhecimento, mas, também, acentuada bioenergia psíquica, forte estabilidade emocional, optimismo comportamental e perspectivas de orientação sócio-profissional, para que possa não só diagnosticar as necessidades especiais de cada educando, mas, também, adaptar àquelas os conteúdos das aprendizagens, e, fazer com que os conteúdos curriculares possuam, por objectivos, não só o desenvolvimento das potencialidades e das habilidades de cada um, mas, também, que estas sejam, de modo flexível, orientadas para as futuras práticas e vivências sócioprofissionais. Para tal é necessário que, tanto professores como tutores dos sistemas das escolas inclusivas e da educação especial estejam não só treinados, mas, também, sensibilizados e vocacionados para trabalharem em ambientes diferentes e assumirem funções de protagonismo nas elaborações e adaptações de programas de educação e ensino especial. Elaborar tais propostas e concretizar as respectivas decisões implica, em interdependências das múltiplas inter-modalidades sócio-pedagógicas, escolares e funcionais, disponibilidades e aberturas a interdisciplinares saberes e conhecimentos, ultrapassagens de ignorâncias e de desconhecimentos, o que, em seu pragmatismo individual, exige auto-reflexão pessoal, poder de criatividade, inventividade e adaptabilidade, confiança em si mesmo e congruência psico-comportamental. As anteriores necessidades de desenvolvimentos de pragmatismos indutivos conduzem o indivíduo a patamares de auto-estima, de autoconsciência e de auto-valorização individual, características essenciais de auto-orientação do indivíduo verso sua auto-aceitação pessoal e congruência individual. A interiorizada vivenciação de tais desenvolvimentos psico-comportamentais, estruturantes e reorganizativos, não só orienta, mas, também, disponibiliza o indivíduo à criação de cada vez mais nobres e transcendentes valores e objectivos, ancorados não só no real e no cognitivo, mas, também, no emocional e no afectivo, no pessoal e no interrelacional. Identificado com uma tal maneira de ser, o percepcionar e o conviver do sujeito humano não só se vivencia, mas, também, exterioriza e investe em suas atitudes e comportamentos, de modo pragmático, com eficiência na acção, no envolvimento e coerência com suas atitudes e comportamentos. A coerência pessoal de um indivíduo faz com que este liberte suas energias e capacidades, desbloqueie suas emoções e afectos e vivencie sua existência num compromisso auto-desafiante, atingindo níveis de eficiência e de eficácia até então jamais conseguidos. E isto porque o indivíduo, em tal processo, auto-direcciona a sua bioenergia, liberta-se de enormes factores causadores do stress individual, envolve-se nas necessárias respostas às suas necessidades de auto-realização e, tais comportamentos, de níveis superiores, não só estimulam, mas, também, reorganizam e dinamizam seus comportamentos de níveis inferiores. Na realidade, o indivíduo incoerente, sem objectivos e sem necessidades conscientes de realização, não só permanece em baixos níveis de eficiência e de rentabilidade, mas, também, distorce, recalca ou inibe seus mecanismos e processos de saúde e de equilíbrio biopsíquico, gera debilidades em seu sistema imunitário e fragilidades nas acções e nos comportamentos de sua indissociável unidade: mente-corpo, a qual age e interage, organiza-se e reorganiza-se, vitaliza-se e dinamiza-se de forma indutiva e dedutiva, inconsciente e consciente, emocional e racional. 103
Mais que em nenhumas outras pessoas, as anteriores características comportamentais deveriam encontrar-se nos agentes de educação, nomeadamente naqueles que, por vocação, formação ou estatuto, desempenham funções de responsabilidade junto de crianças com necessidades educativas especiais. Em relação à formação de agentes de educação especial, a declaração de Salamanca, n.º 45, diz: “a formação especializada em educação de alunos com necessidades educativas especiais, que conduz a qualificações adicionais, deverá, normalmente, ser integrada ou seguir-se ao treino e experiência no ensino regular, de forma a permitir complementaridade e mobilidade”. Em seu n.º 46 concretiza: “é preciso repensar a formação de professores especializados, afim de que estes sejam capazes de trabalhar em diferentes situações e possam assumir um papel-chave nas necessidades educativas especiais. Deve ser adoptada uma formação inicial não categorizada, abarcando todos os tipos de deficiências, antes de se enveredar por uma formação especializada numa ou em mais áreas relativas a deficiências específicas”. Os anteriores desafios colocados à escola inclusiva não só orientam, mas, também, impõem a formação contínua de educadores, professores e restantes agentes de educação, para que estes, eliminando a confusão entre necessidades educativas especiais e deficiência, enfatizem práticas pedagógicas diversificadas, que tenham em conta os contextos e os conteúdos em que os alunos com necessidades educativas especiais estão inseridos. No que concerne a formação de pessoal especializado para as escolas inclusivas, o Conselho Nacional de educação, em seu parecer n.º 1/99 recomenda: − Intensificar as acções de formação em serviço dos professores de apoio educativo por forma a elevar significativamente a sua preparação e a contribuir decisivamente para os empenhos competentes das suas funções. − Incentivar uma maior expressão da formação especializada, através da criação de cursos de pós-graduação e mestrados em necessidades educativas especiais. − Dotar o sistema com técnicos especializados, designadamente psicólogos educacionais, terapeutas, monitores e interpretes de linguagem gestual, por forma a assegurar às escolas o apoio técnico indispensável para a construção da escola inclusiva. − Criar unidades de intervenção especializada nas escolas do ensino regular designadamente para apoio a alunos com deficiência auditiva profunda e multideficiência. − Criar as condições necessárias para que as acções de formação deixem de ser realizadas apenas por docentes, para passarem a serem executadas por equipas multidisciplinares que incluam especialistas não-docentes. Para concretização de tais objectivos, o mesmo Conselho, na sua décima recomendação, fala da necessidade de preparar e de executar um programa “que preveja o acesso às acções de formação em serviço de todos os educadores e professores do ensino regular. Estas deverão dirigir-se, em primeiro lugar, aos profissionais que trabalham com crianças com NEE e incidir, prioritariamente, nas temáticas necessárias para suportar a escola inclusiva e na adopção generalizada de estratégias de ensino diferenciado. Estas acções deverão ser, preferencialmente, organizadas a partir da identificação de situações problemáticas decorrentes de contextos de trabalho, numa perspectiva ecológica de mudança, abrangendo escolas ou agrupamentos de escolas”. “Nesta perspectiva, a formação contínua de professores, elemento base de toda a acção com vista a uma escola inclusiva, tem, pois, de ser equacionada numa relação estreita com a organização escolar e visar a criação de redes de formação nos contextos escolares, aproveitando estabelecimentos de protocolos com instituições do ensino superior, no quadro de uma vantajosa cooperação”. 104
No entanto, considerando a organização do sistema educativo e seus processos de ensino-aprendizagem daí decorrentes, constata-se que não é fácil organizar formação em serviço para todos os professores, pois, apesar de ser verdade, como se afirma na declaração de Salamanca “a preparação adequada de todo o pessoal educativo é o factor-chave na promoção de escolas-inclusivas”, as condições em que muitos professores trabalham tornam-se, não raras vezes, adversas a tais formações. Apesar da existência de tais adversidades, não há dúvida que, tanto as mudanças tecnológicas como as sócio-profissionais, geram necessidades de níveis de novas competências a adaptações, integrações e acções. Daí a intrínseca necessidade dos agente de educação, de ensino e profissionalização interligarem formação inicial, experiência no terreno e formação contínua em seu projecto de realização pessoal nas inter-relações com os outros, sobretudo educandos, os quais são singulares e, como tal, devem ser compreendidos e aceites em suas atitudes e comportamentos, emoções e afectos, gestos e comunicações, linguagens e interacções, quer se trate de educandos com deficiências ou com necessidades educativas especiais.
IV – ESCOLAS E AGENTES DE EDUCAÇÃO NAS NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS
Sendo evidente que as actuais formações académicos dos agentes de educação não são suficientes para positivamente interactuarem com as permanentes e sucessivas necessidades de adaptação dos sistemas educativos, com muita mais razão se tornam insuficientes para os agentes de educação envolvidos nas problemáticas dos educandos com deficiências ou necessidades educativas especiais. Na realidade, tais educadores-professores, além de possuírem as competências próprias de qualquer professor do ensino regular, devem estar visceralmente convencidos de que todas as crianças podem aprender e ter sucesso, e, para tal, deverão saber gerir problemas comportamentais, prevê-los, saná-los ou ultrapassá-los; saber utilizar estratégias, adaptar ou criar conteúdos curriculares adaptados às competências e aos desenvolvimentos dos educandos; aplicar as novas tecnologias às deficiências cognitivas; fomentar estratégias de aprendizagem cooperativa e garantir diferentes oportunidades para todos; fornecer aos alunos estratégias eficazes para interagirem uns com os outros; permitir que os alunos aprendam dentro do seu próprio ritmo e estilo de aprendizagem; encorajar os pais a terem esperança e objectivos em relação a seus filhos, etc., etc.. Com efeito, as acções psicopedagógicas das escolas inclusivas deverão possuir como objectivos essenciais o desenvolvimento integral e completo de cada educando, com sua personalidade singular, através de processos de educação personalizada. As próprias adaptações curriculares deverão emergir da necessidade de planificar estratégias de actuação para que os alunos com necessidades educativas especiais desenvolvam e, simultânea, ou, posteriormente, dêem respostas às suas necessidades de aprendizagem, interdinamizem e organizem seus conhecimentos, solidifiquem suas aprendizagens e se estimulem em seus processos de acção e de desenvolvimento, de modificação e de complexidade.
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Por isso, adaptar currículos deverá ser para dar respostas às necessidades particulares dos alunos, para facilitar a sua integração no grupo-classe, para prevenir a existência de dificuldades de aprendizagem e comportamentos especiais e para evitar a inadaptação escolar, o insucesso e o abandono da escola. A concretização de tais objectivos, porém, não resulta apenas deste ou daquele agente de educação, mas, sim, da participação, colaboração e acção de todos os agentes escolares, os quais deverão efectuar um seguimento global dos processos de aprendizagem dos alunos e detectarem as dificuldades e necessidades especiais; reforçar a sua auto-estima através de orientações psicológicas, escolares e de programas de reforço individual, de forma contínua e sistematizada, visto a educação ter por objectivo essencial a formação do indivíduo, integrada e desenvolvida em sua diversidade comportamental e em diferenciamentos cognitivos. Por isso, mais que nenhum outro agente de educação, tanto o educador como o professor ou monitor de alunos ou profissionalizandos com necessidades educativas especiais deverão interligar o seu saber ser com o seu saber fazer, com empatia, maturidade intelectual e afectiva, sociabilidade, responsabilidade, compreensão e aceitação. Os anteriores predicados de um docente do ensino especializado emergem não só do saber psicológico e psicopedagógico, didáctico e educacional, mas, também, fundamentalmente, do desenvolvimento de um conjunto de competências, atitudes e comportamentos emanados das dimensões emocionais e afectivas, cognitivas e interpessoais da própria natureza e potencialidades dos sujeitos-educadores. Por outro lado, para que tais predicados e competências do professor de educação especial se tornem concretamente eficientes, é necessário que a boa e positiva gestão escolar, que depende do envolvimento activo e criativo dos professores e auxiliares, das recíprocas cooperações e dos trabalhos de equipa, desenvolva uma gestão colectiva, redimensione cursos pedagógicos, diversifique ofertas educativas, fomente a inter-ajuda entre educandos, garanta o apoio aos alunos com dificuldades e desenvolva estreitas relações com os pais e com as comunidades. A existência de tais variáveis e condições nas escolas inclusivas torna-se não só facilitadora de indução de novas atitudes e comportamentos nos educandos, mas, também, flexibilizadora de operacionalizações cognitivas e, por conseguinte, mediatizadora de novas aprendizagens e conhecimentos. E isto porque, apesar do conceito de mediatizador ser polissémico, a nível de educação e de desenvolvimentos cognitivos, ele implica conciliação, acompanhamento e negociação. Estas componentes, caracterizadoras do conceito de mediatização, a nível de indução cognitiva e de desenvolvimento escolar, implicam acção impregnante do sócio-cognitivo, do escolar, do cultural e do profissional. Através de representações, estratégias e práticas diferenciadas, mas não opostas, os seus objectivos são mediatizar facilitações dos conhecimentos, encontrar soluções adaptadas às resoluções dos conflitos e fazer com que os indivíduos envolvidos tomem consciência das suas capacidades e aptidões e maximizem o desenvolvimento de suas próprias potencialidades. A nível psicopedagógico, a mediatização escolar, e, principalmente em relação aos educandos com necessidades educativas especiais, deverá centralizar-se, fundamentalmente, nos processos de investigação-acção e sobre suas variáveis intermodalidades, pois o comportamento do educando, com necessidades educativas especiais, questiona permanentemente, a inteligência do educador, a sua formação psicopedagógica, os meios e os instrumentos, a linguagem e as atitudes que ele utiliza ou toma. Por isso, educadores, professores, monitores e tutores de educandos com necessidades educativas especiais deverão identificar, correcta e eficazmente, as necessidades dos educandos, diagnosticar e conhecer as suas aptidões e interesses para os orientar em 106
seus processos de aprendizagem, potenciar-lhes a aquisição de hábitos de convivência, de investimento, esforço, tolerância, trabalho e aprendizagem e favorecer-lhes um clima de respeito mútuo, de cooperação e de comunicação tanto na sala de aulas como fora dela. De facto, sendo complexas as integrações de alunos com necessidades educativas especiais ou dificuldades específicas na escola regular, tanto a escola em si mesmo como seus agentes educativos em especial deverão assumir funções e tarefas caracterizadoras de um tal processo, visto integrar crianças, adolescentes e jovens deficientes ou com necessidades educativas especiais nas escolas regulares dever assumir-se como um dos objectivos essenciais do futuro sócio-profissional de cada um. Por isso, preocuparse apenas com os processos de ensino-aprendizagem escolar, com a mera instrução pedagógica, os desenvolvimentos cognitivos, as incapacidades ou défices sensoriais, físicos ou psicológicos são tarefas e objectivos insuficientes, visto a maior dificuldade de integração de tais indivíduos não ser, necessariamente, a dos processos da escola formal, mas, sim da futura integração profissional. No entanto, uma das principais exigências da acção comportamental de uma escola inclusiva deverá ser a de orientar e coordenar os processos de desenvolvimento, de formação e de ensino-aprendizagem em função das possíveis saídas profissionais de tais indivíduos. Por tais razões, professores, monitores e auxiliares de educação, em interacção com as famílias, agentes sociais, instituições de formação profissional e de emprego deverão não só participar, mas, também, sentirem-se responsabilizados pela eficiência de tais processos. A eficiente concretização de tais objectivos exige competência e dinâmica na coordenação, bem como supervisão das tarefas e das funções, das adaptações e concretizações, dos desenvolvimentos e das avaliações; dos projectos, acções, aplicações e concretizações interdisciplinares. É que, na realidade, sendo uma escola inclusiva caracterizada pela diversidade comportamental e cognitiva de seus alunos, esta exige atenção individualizada, diagnósticos das características individuais e valorização das potencialidades de cada um. As anteriores características, essenciais ao desenvolvimento de um processo de educação de qualidade, exigem aceitação e respeito pelas aptidões, capacidades, habilidades e destrezas de cada um, para que, através de tais aceitações e desenvolvimentos, os indivíduos possam prosseguir, desenvolver e concretizar suas necessidades de integração, de harmonia e de expansão. A concretização destas necessidades e objectivos, inerentes, de uma forma geral, à natureza pessoal de cada um, evidencia-se, mais acentuadamente, nos projectos da vida dos indivíduos com necessidades educativas. No entanto, tanto os horizontes como as expectativas, as ambições como as perspectivas deles são mais reduzidos e limitados que os indivíduos que não possuem necessidades educativas especiais. Por tais razões, o pessoal envolvido com educandos, formandos ou profissionalizandos com necessidades educativas especiais deverá, fundamentalmente, ser dotado de atributos, características e comportamentos pessoais, pedagógicos, didácticos e comportamentos diferenciados, como sejam, por exemplo, maturidade emocional, estabilidade afectiva, capacidades empáticas, autenticidade pessoal, intuição, inteligência prática, rapidez mental, inquietação técnica e profissional, conhecimento dos meios e dos ambientes, espírito de liderança, experiência de vida, conhecimento do mundo do trabalho e de suas condições; das condições económicas, dos meios e das circunstâncias profissionais, etc., etc., visto tornarem-se funções essenciais de todo o pessoal, que trabalha com indivíduos com necessidades educativas especiais potencializar o desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras, pessoais, emocionais, afectivas e interpessoais dos indivíduos, 107
facilitar a sua integração na escola, na sociedade e no mundo do trabalho, orientá-los e formá-los em suas futuras actividades profissionais, tendo em consideração as suas capacidades, características, e, também, limitações.
V – EDUCANDO COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS NAS ESCOLAS REGULARES
Sendo constatação factual que todos os educandos e humanos, em geral, são diferentes, de modo idêntico é diferente o seu tipo de inteligência, a sua maneira de actuar, de captar as informações e transformar as mensagens; de efectuar raciocínios e de esquematizar as associações mentais, visto as suas estruturas genéticas e os seus mecanismos de processamentos neurocerebrais, de activação de seus estímulos e de filtração de suas motivações, não só são diferentes, mas, também, se encontram organizados de maneira diferente. Estas múltiplas e hipercomplexas variabilidades comportamentais de todo e qualquer ser humano fazem com que cada um possua seu modo próprio de aprender, suas prioritárias hierarquias de apetências para este ou aquele objecto de aprendizagem e não para outro, os seus ritmos bio-cognitivos pessoais, etc., conjuntos de características e de diferenciações que fazem com que as diferenças individuais sejam verdadeiramente reais. Apesar da existência de tão elevados níveis de diferenças neurofisiológicas e cerebrais, emocionais e afectivas, cognitivas e psíquicas, todas as crianças podem aprender. No entanto, como tanto as capacidades dos indivíduos como os estímulos e os factores dos meios que os circunscrevem são diferentes, também as suas capacidades de aprendizagem, de maneira particular a nível de aprendizagem institucionalizada, são diferentes. No seio de tais múltiplas diferenças, de nível, grau, conteúdo, processamento e forma, as diferenças de uns são mais acentuadas que a de outros, como sucede, por exemplo, no caso dos educandos portadores de anatomopatologias, existência de lesões cerebrais nesta ou naquela área, disfunções cognitivas, perturbações da personalidade ou crianças oriundas de meios desfavorecidos, de famílias multi-problemáticas ou de situações de alto risco. Apesar da existência da complexidade de tais variáveis multifactoriais nada faz antever que tais educandos não possam aprender, nem desenvolver ou completar o seu potencial, desde que se lhes apliquem estratégias adequadas que lhes forneçam técnicas, instrumentos e meios maximizadores dos desenvolvimentos de suas aptidões, capacidades, destrezas e habilidades. Os anteriores níveis e formas de categorização de educandos, elaboradores dos vários níveis de deficiências, de atraso intelectual e da existência de educandos com hierarquias de necessidades educativas especiais ou específicas, duradouras ou transitórias, colocam, tanto ao ensino formal como à escola institucionalizada, problemas de organização e de reorganização, de dinâmica e de funcionalidade, visto, tanto a inclusão como a integração de tais educandos na escola regular, exigir desta não só mudanças e adaptações, mas, também, inovações e reorganizações psico-comportamentais tanto a nível do institucional como do organizacional, do pessoal como do humano. 108
É que, na realidade, uma tão vasta e multifacetada categoria de educandos, por um lado, possuí um conjunto de necessidades idênticas às de todos os seus pares da mesma idade e, por outro, apresenta um leque único de necessidades educativas especiais, de défices especiais e de comportamentos ou reacções pessoais não constatados, na generalidade, nos educandos com padrões de desenvolvimento livre de qualquer problema comportamental ou necessidade especial. Por isso, se o primeiro grupo de educandos se encontra bem integrado nos ambientes educativos da escola regular, já o segundo grupo, o de necessidades ou défices especiais, implica, necessariamente, o desenvolvimento e a implementação de medidas curriculares e programáticas individualizadas, isto é, desenvolvimento de programas e de conteúdos educativos adaptados aos níveis e às necessidades pedagógico-educativas, emocionais e afectivas, cognitivas e intelectuais de tais tipologias de educandos. A nível pedagógico-educativo, cognitivo e intelectual, as adaptações dos currículos regulares ou a existência de currículos alternativos tem-se revelado metodologia eficiente. As adaptações ou as alternativas curriculares, porém, deverão ser efectuadas em função das necessidades dos educandos, serem coerentes com as necessárias respostas às suas carências e adaptadas às suas potencialidades, aptidões e capacidades, e, constitutivas de unidades temáticas, facilitadoras de associações e de integrações do adquirido no anteriormente aprendido, para que as aprendizagens sejam qualitativas e o educando desenvolva o seu pensamento, aprenda a aprender e se sinta motivado não só face às aprendizagens, mas, também, às convivências, às participações e partilhas com os outros; às decisões pessoais, aos comportamentos essenciais, ao desenvolvimento de positivo autoconceito, à autoconfiança e auto-estima, bem como à global imagem positiva de si mesmo e ao desenvolvimento de suas conaturais potencialidades e aptidões, capacidades e atitudes. Tendo em consideração não só as visíveis necessidades diagnosticadas: carências, dificuldades ou deficiências dos educandos, mas, também, as invisíveis, torna-se necessário que, em tais adaptações ou alternativas curriculares, tanto as aprendizagens invisíveis como as aprendizagens horizontais sejam, acentuadamente, valorizadas. É que, não raramente, música, canto, actividades de manualização, expressão corporal, ginástica neuronal, ateliers de trabalho manual, de representação, de teatro e de comunicação constituem processos de desinibição e de activação, de desenvolvimento e de reforço, de autoconsciência e de autoconfiança não só em suas próprias potencialidades, mas, também, nas orientações e investimentos de seus devires cognitivos, interpessoais e relacionais. Na realidade, toda e qualquer acção pedagógico-educativa deverá ter como objectivos essenciais: orientar os educandos para a participação activa e para o envolvimento em seus processos de ensino-aprendizagem, com vistas ao desenvolvimento integral de suas individualidade e personalidade; aquisição de hábitos intelectuais e técnicas de trabalho, preparação para participarem activamente na vida social, cultural e profissional; na solidariedade e na cooperação, no respeito pelos seus direitos e deveres; diferenças linguísticas, culturais e sociais; participação activa na vida social e integração nas actividades familiares, escolares e sócio-profissionais conducentes às necessárias e sucessivas integrações na futura existência de adulto, a qual requere não só maturidade individual, mas, também, formação profissional, desenvolvimento afectivo e pessoal, social e inter-relacional. Daí a imperiosa necessidade da existência de programas psicopedagógicos e de formação sócio-profissional orientados para concretização de tais objectivos.
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No entanto, preparar o futuro passa por envolver-se no presente e, neste, o indivíduo deverá envolver-se por metas, esperanças e ideais; valores e concretizações pois, é a partir de tais dinâmicas que ele, progressivamente, se desenvolve, reforça, autentifica, expande, e, vai delineando seu próprio futuro. Em relação à preparação para a vida adulta de educandos com necessidades educativas especiais, a declaração de Salamanca, em seu n.º 56 afirma: “os jovens com necessidades educativas especiais precisam de ser apoiados para fazer uma transição eficaz da escola para a vida activa, quando adultos. As escolas devem ajudá-los... e proporcionar-lhes as competências necessárias na vida diária, oferecendo-lhes uma forma de formação nas áreas que correspondem às expectativas e às exigências sociais... da vida adulta, o que exige técnicas de formação adequada, incluindo a experiência directa em situações reais fora da escola. O currículo dos alunos com necessidades educativas especiais, que se encontram nas classes terminais, devem incluir programas específicos de transição, apoio à entrada no ensino superior sempre que possível e treino vocacional subsequente que os prepare para funcionar, depois de sair da escola, como membros independentes e activos das respectivas comunidades. Estas actividades terão de efectuar-se com a participação empenhada de consultores vocacionais, agentes de colocação, sindicatos, autoridades locais e dos vários serviços e organizações competentes”. No n.º 57, analisando a necessidade de educação de adultos e de sua educação permanente, a mesma declaração diz: “deve ser dada atenção especial à programação e desenvolvimento da educação de adultos e da educação permanente das pessoas com deficiência, as quais terão prioridade no acesso a estes programas. Devem elaborar-se também cursos especiais para satisfazer as necessidades dos diferentes grupos de adultos com deficiência”. A orientação e formação profissional de tais educandos-formandos deverá alicerçar-se sobre as capacidades, aptidões e possibilidades dos próprios formandos, e, os processos de ensino-aprendizagem deverão ser efectuados através de módulos e de projectos multi-profissionais, dependentes e orientados pelos serviços de orientação vocacional e escolar, os quais deverão inter-relacionar orientação, currículo e formação profissional, o que exige a existência de pessoas profissionalmente qualificadas, com maturidade psicológica, estabilidade emocional, sólida formação e experiências profissionais. A acção de uma tal psicopedagogia diferenciada, capaz de responder a diferentes formas e ritmos de aprendizagem tanto dos educandos como dos formandos, capaz de conduzir à autonomia e responsabilização de jovens, deverá prepará-los não apenas para um embate inicial bem sucedido no mercado do trabalho, mas, torná-los, também, capazes de gerirem um itinerário profissional ao longo de toda a sua existência. As escolas ou instituições de formação profissional, no entanto, necessitam de maleabilidades adaptativas, de flexibilidades psico-comportamentais, de conteúdos curriculares e de organizações funcionais que as mantenham continuadamente adaptadas aos meios, às culturas e às exigências ou necessidades profissionais dos meios. Em consonância com tais necessidades de orientações, as escolas de formação profissional deverão ter como objectivos a criação e a realização de projectos educativos dotados de autonomias tanto a nível de formação geral como a nível de qualificação profissional dos jovens. No entanto, considerando as estruturas e os conteúdos das motivações das escolas profissionais, parece que, no seio das escolas de formação profissional, os objectivos destas foram e, são, de recuperar, desenvolver, educar e integrar na dinâmica do sócio-profissional, da produção e da eficiência, os indivíduos com necessidades educativas profissionais especiais, o que não deixa de ser utópico, irreal e alienante, 110
visto todo e qualquer aprendiz, qualquer que seja o seu futuro, tanto em suas reais e verdadeiras aprendizagens como em suas inserções e integrações sócio-profissionais, seus equilíbrios, flexibilidades e adaptações, passam, necessariamente, pelo conjunto de aprendizagens que dependem do sensorial e do emocional, do corporal e do psíquico, do mental e do social. No cerne vitalizador de tais processos de activação encontra-se, primeiramente, a auto-aceitação para que desta emirja autoconsciência das próprias potencialidades individuais, capacidades e destrezas. De facto, não se pode estimular nem reforçar o que não se conhece e, muito menos, o que não se possui. Por isso, aceitar-se, adaptar-se, integrar-se e mudar-se são etapas necessárias não só do próprio crescimento, mas, também, da aquisição e do desenvolvimento da própria maturidade. Os efeitos comportamentais dos anteriores predicados de um indivíduo conduzem-o ao desenvolvimento de sua autoconfiança, o que o levará a desenvolver suas reflexões individuais, a estimular a elaboração de associações e a formular seus próprios juízos e raciocínios, o que conduzirá, cada vez mais, o educando a possuir confiança em suas próprias capacidades, a se adaptar a situações e a controlar, quando necessário. Resignar-se à carência de capacidades é orientar-se para a entrada na via da impotência e sua respectiva adequação, o que se opõe, radicalmente, a todo e qualquer processo de verdadeira e autêntica educação. Com efeito, não existe processo mais humano e mais seguro para educar que o de ajudar o educando a encontrar, a desenvolver e a estimular suas motivações profundas para viver em consonância com elas e, através da acção e dos efeitos daquelas, não só expandir-se, mas, também, realizar-se em suas dimensões neurocerebrais, psíquicas, emocionais e afectivas, bem como em suas hierarquias de valor, de identidade, de individualidade e espiritualidade. É que tanto os subdesenvolvimentos como as asfixias, as distorções como as perturbações das anteriores dimensões humanas estão, não raras vezes, nas bases causais dos atrasos mentais, das deficiências cognitivas, das perturbações comportamentais e dos desvios sociais. E tudo isto porque emoções e cognições, inteligência e pensamento emergem da mesma indivisível unidade do ser humano, isto é, de sua natureza bioneurossociopsíquica, o que orienta a investigação a afirmar que elevadíssima percentagem das dificuldades de aprendizagem, dos insucessos escolares e dos atrasos intelectuais ou mentais tem suas causas tanto nas asfixias como nos subdesenvolvimentos, nas distorções como nas perturbações das emoções, dos sentimentos, das percepções e dos afectos dos indivíduos. Por isso, ensinar a sentir e a vivenciar, a pensar e a cooperar parecem ser os métodos mais adequados de desenvolvimento dos educandos com atraso intelectual. As anteriores metodologias são eficientíssimas para todo o tipo de educandos, isto é, tanto para os ditos normais como para os portadores de necessidades educativas especiais ou de deficiências médias ou profundas. No caso dos portadores de deficiências médias e profundas, a acção envolvida do seu Eu psico-corporal é de primordial e imprescindível importância. As estratégias a aplicar deverão ter por objectivos: treinar, estimular, reforçar e esperar. Isto, de uma forma geral, efectua-se através de terapias ocupacionais e de actividades lúdicas programadas. As terapias ocupacionais são sistematizadas ocupações do tempo, com trabalhos que visam preparar os educandos para a inserção na vida quotidiana e reabilitá-los para funções e tarefas de trabalhos produtivos, úteis e económicos, as quais, geram nos próprios educandos o sentido da sua utilidade, estimulam os seus desenvolvimentos e facilitam as suas integrações, de maneira particular através de seus trabalhos em ateliers, miniaturas de empresas, como acontece, por exemplo, nos ateliers de 111
carpintaria, de têxteis, sapatarias, cerâmica, informática, etc., etc.. Estas terapias deverão ser coadjuvadas por terapias mais específicas, consoante as necessidades dos indivíduos, como por exemplo, com terapia da fala, do relacionamento, do comportamento, etc., terapias cujos objectivos, são estimular, reforçar e condicionar desenvolvimentos e comportamentos positivos e anular ou desestimular negativos. No seio do vasto conjunto de terapias de activações e de reforços positivos são dignos de menção, pelas avaliações já efectuadas e os efeitos positivos comprovados, as terapias efectuadas pela pintura a dedo, a terapia pelo jogo e a terapia pela dança. A terapia efectuada pela pintura a dedo é estimuladora e desenvolvedora dos próprios sentidos do indivíduo, essenciais à descoberta e à vivência do próprio corpo, à procura de si mesmo e da sua identidade, ao desenvolvimento da sua individualidade psicomotora, à desinibição comportamental e à elaboração do esquema psico-corporal, dimensões essenciais à descoberta do princípio do prazer, das experiências e dos desenvolvimentos quinestésicos. Por sua vez, a terapia pelo jogo tem por objectivo orientar o educando no desenvolvimento das capacidades de lidar consigo mesmo, desenvolver relações interpessoais, assumir-se construtivamente, desenvolver-se e autogovernar-se, o que o levará a prosseguir sua via de auto-afirmação, de libertação de seus negativos mecanismos de defesa e a expressar suas energias e seus sentimentos, suas emoções e seus afectos, modificando, assim, sua auto-imagem e melhorando seus resultados a nível de aprendizagens. A terapia pela dança coloca o corpo no centro da expressão e, esta, emanada do interior do indivíduo, estimula e motiva os sentidos, exterioriza as angústias, liberta as agressividades e faz com que consciente e inconsciente interajam mútua e reciprocamente, estimulando-se cargas positivas e descargas negativas, proporcionando-se desenvolvimentos físicos e psíquicos, contentamentos e alegrias, adaptabilidades e flexibilidades tanto psico-corporais como cognitivo-mentais. A eficiência das anteriores terapias e de outras de natureza similar depende do facto de possuírem seu centro de acção na activação do próprio corpo do indivíduo, pois a percepção correcta e objectiva do corpo é alicerce do desenvolvimento de uma personalidade equilibrada da qual dependerão as capacidades do indivíduo a adquirir, a organizar e a utilizar não só os conhecimentos de si mesmo, mas, também, seus conhecimentos em relação aos outros. Do conhecimento dos outros interdepende o conhecimento de si mesmo, e, percepções negativas ou distorcidas, em relação a si mesmo, serão percepções que não favorecem em nada tanto o autocontrolo como o conhecimento dos outros, a relação consigo mesmo como a relação com os outros. No entanto, de um modo geral, os défices oriundos das necessidades educativas especiais encontram-se nas componentes essenciais dos dinamismos da cognição da criança, isto é, em seus dinamismos de motricidade e de percepção, de estímulos e de motivações, de comunicações e de inter-relações tanto interpessoais como sociais, conjunto de metacomponentes bloqueadoras das activações dos processos bioneuropsíquicos do indivíduo, limitadoras das suas expansões, asfixiadoras dos desenvolvimentos das conaturais intencionalidades dos subsistemas e sistemas do indivíduo e distorcedoras dos desenvolvimentos das naturais aptidões, capacidades e competências. No seio de uma tal metaproblemática de natureza bioneurossociopsíquica, em que o portador de necessidades educativas especiais se encontra, a aplicação, o desenvolvimento e a concretização de estratégias e métodos de desenvolvimento e de promoção, de socialização e de integração, de reorganização e de activação, de reestruturação e de dinamização são essenciais. Tanto os métodos como as técnicas de quinesiologia de Dennison (1988) como as de ginástica neuronal (Hannaford, 1998), as de 112
promoção cognitiva e as de enriquecimento instrumental, as de promoção do anti-stress e promoção do relaxamento, as de criação e de desenvolvimento do entusiasmo e de libertação do desânimo aprendido, as de incrementação, de desenvolvimento e reforço, da autoconfiança e auto-estima, as de desenvolvimento das percepções e da discriminação visual; as desenvolvimento da atenção, da compreensão e da memória; de estimulação e de desenvolvimento do Eu psico-corporal, de desenvolvimento das sensações e das emoções, das sensibilidades e das imagens, dos símbolos e das referências, das linguagens corporais, gestuais, psico-emocionais e verbais, que são métodos e técnicas não só recuperadores, mas, também, desenvolvedores das multi-potencialidades do educando, pois, qualquer problema, obstáculo ou dificuldade existente no corpo, nas emoções, nos sentimentos ou nos afectos de um indivíduo, interfere, de forma mais ou menos acentuada, tanto nas componentes dos mecanismos de cognição como nos processos de aprendizagem.
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CAPÍTULO VI
DINAMISMOS COGNITIVO-EDUCACIONAIS DAS PEDAGOGIAS ESCOLARES
Sendo um facto que os processos mentais de um indivíduo emergem, desenvolvem-se e organizam-se a partir de suas múltiplas e recíprocas interacções organismo-cérebro, tanto suas funções como seus comportamentos interdependem da totalidade do indivíduo e, não exclusivamente, de alguma ou algumas dimensões do ser humano. E isto porque o ser humano é constituído por uma totalidade, constituinte de um Hipersistema oriundo de vários sistemas e subsistemas, elaboradores de estruturas, de dinâmicas e de mobilidades. Estas estruturas, dinâmicas e mobilidades, originadoras de movimentos, de desenvolvimentos e de organizações geram activações neurocerebrais e funções mentais interfuncionais que, progressivamente, organizam e reorganizam o córtice cerebral. Esta interfuncionalidade entre todas as funções constitui o alicerce e o denominador comum da homeostasia funcional de todo o ser humano. E, sistemas superiores e sistemas inferiores colaboram, reciprocamente, nas atitudes e nos comportamentos, nos conhecimentos e nas aptidões, nas aprendizagens e nos desenvolvimentos. Por isso, o córtice cerebral jamais funciona sozinho, mas sempre associado a outros sistemas, ditos inferiores, mais ou menos eficientes colaboradores, e, activadores tanto de dados existentes como de dados novos. É o que sucede, por exemplo, com o sistema límbico do cérebro, o qual, sendo responsável por actividades orgânicas e emocionais do indivíduo, tanto inconscientes como subconscientes, gera reacções e movimenta energias essenciais às acções do neocórtice cerebral. Nenhum dos processos mentais, por conseguinte, como, por exemplo, a percepção e a memorização, a leitura e a escrita, etc., podem ser encarados como representando faculdades isoladas ou mesmo divisíveis, pois qualquer uma das formas fundamentais da actividade consciente do ser humano resulta de sistemas funcionais complexos tanto na sua estrutura como nas suas implicações e hierarquias. Envolvendo tais hierarquias cerebrais: cérebro reptilico, cérebro mamífero e cérebro racional multifuncionalidades, estas conjugadas com o corpo, geram aptidões, as capacidades desenvolvem-se e as atitudes e os comportamentos manifestam-se. Ora, sendo intencionalidade de uma tal multipluralidade cerebral desenvolver-se e funcionar harmoniosamente, urge, mais que nunca, investir em desenvolvimentos e equilíbrios, pois as eras das cibernéticas e das informáticas, denominadores dos pódios industriais, conduziram as evoluções psico-neurológicas para hipercomplexas fases mentais, nas quais o aparelho bioneuropsíquico do ser humano tanto se pode tornar escravo das situações como dono e senhor de seus próprios destinos. Para ser dono e senhor de seus próprios destinos, os sistemas bio-orgânicos, neurocerebrais, psíquicos e mentais deverão emergir, organizar-se e reorganizar-se em 114
função da intersistémica e indivisível unidade do ser humano. O cérebro racional deverá respeitar e valorizar o cérebro emocional, visto ser a partir deste que o racional emergiu, tornando-se, então, evidente, que percepcionar, sentir, pensar e raciocinar são características fundamentais da evolução da mente humana, a qual, graças às suas interacções com suas estruturas biológicas e dinamismos energéticos, psíquicos e mentais, activa, dinamiza e orienta as funções do cérebro para novos desenvolvimentos e novas interacções, tanto com os contextos sociais como com os meios cognitivo-culturais ou a acção dos meios, e, isto, tanto no organismo como no cérebro do indivíduo, através de contactos, odores, luzes, vibrações, pressões, movimentos e interacções das células, das fibras nervosas e dos neurónios. Através de tais interacções organizam-se informações e geram-se ordens emanadas da natureza psico-corporal e da estrutura dos saberes corporais e cognitivos do indivíduo, originando-se, então, níveis de intensidade dos estilos interiores do indivíduo e formando-se padrões comportamentais, que, através de tais interacções, não só elaboram as mensagens e as informações interiorizadas, mas, também, reorganizam os canais de informação através dos quais se comunica com o exterior. A anterior interactividade da interacção interior-exterior do indivíduo origina a funcional dinâmica de sua estrutura cognitivo-comportamental e sócio-individual, propiciadora de envolvência e de concretização de projectos, os quais, concretizados, orientam o indivíduo para novos objectivos e novos desafios e, por conseguinte, para a concretização de novos projectos da natureza humana e da força das motivações psicoemocionais e afectivo-comportamentais. Apesar disso, as funções emocionais, psicológicas e mentais do sujeito humano produzem muito mais que o simples interpretar, racionalizar ou sujeitar-se às necessidades fisiológicas do corpo. E isto porque muitas das emoções, sensações, expectativas e desejos humanos não encontram explicações, quer através do aumento ou da diminuição dos estímulos dos centros nervosos especializados, quer através de estímulos psico-biológicos, quer sociais. Os efeitos dos estímulos sociais agem e interagem com a unidade bio-sociopsicológica do indivíduo, e, dessas interacções, emerge uma vasta gama de estilos e de motivações, de pulsões e de apetências, de intencionalidade e de necessidades, de propósitos e de decisões que levam o indivíduo a agir e a comportar-se em novas dimensões e com novas hierarquias de atitudes e de comportamentos. A partir daí a dinâmica acção dos neurotransmissores poderão encontrar sua libertação, o biopsíquico funcionar integrada e harmoniosamente, as emoções, os sentimentos e os afectos tornarem-se nevrálgicos epicentros das actividades e das funções cognitivas e o psíquico tornar-se superior regulador não só do sistema nervoso, mas, também, do sistema imunológico.
I – ACÇÃO DOS DINAMISMOS BIOPSÍQUICOS NO DESENVOLVIMENTO DOS MECANISMOS COGNITIVOS
Resultando a actividade bio-corporal do ser humano das múltiplas e hipercomplexas interacções organismo-cérebro, de tais interacções, progressivamente, emerge a mente do indivíduo. 115
A mente humana emerge, por isso, não só da acção dos tecidos biológicos e das funções orgânicas do corpo, mas, também, dos efeitos e dos comportamentos cognitivos, sociais e culturais resultantes de uma tal dinâmica. Os efeitos constitutivos de uma tal entidade mental fazem com que tal realidade não ocupe espaço nem possua volume, seja indivisível e não possua dimensões tangíveis. No entanto, a entidade mental emerge de um corpo e, com ele, constitui uma indissociável unidade. Por isso, corpo, mente, emoções, sentimentos, afectos e razão integram essa indissociável unidade denominada de “ser humano”. Por isso, como o refere António Damásio (1994): “a alma respira através do corpo, e o sofrimento, quer comece no corpo ou numa imagem mental, acontece na cave”. A presente interfuncionalidade organizativa das funções psico-corporais, emocionais, sentimentais, afectivas e intelectuais emana das dinâmicas integrativas das partes ou zonas individuais do cérebro, de suas conecções com o organismo e da respectiva emanação do psíquico, as quais, interconectivamente, não só originam, mas, também, organizam extra e intra-corticalmente as funções mentais, as quais, por sua vez, de forma sistémica, unificam o comportamento do indivíduo. Estes comportamentos, desenvolvimentos e organizações são delineados durante a ontogénese individual e, progressivamente, através dos movimentos e das acções, que, tornando-se cada vez mais expansivos e condensados, adquirem estruturas e dinamismos de acções mentais interiores. Estas, por sua vez, auxiliadas por agentes e factores externos, como a linguagem, os contextos sociais, os conteúdos das aprendizagens, os factos e os fenómenos sócio-históricos, etc., originam funções mentais e organizam sistemas psicointelectuais de hipercomplexas funcionalidades. No entanto, resultando o sistema psico-comportamental do ser humano das interacções de seus subsistemas, todos eles agem e pró-agem, mútua e reciprocamente, sobre os comportamentos individuais, interpessoais e sociais; sensoriais, perceptivos e psíquicos; celulares, biológicos e físicos, ou seja, sobre o aparelho respiratório, cardiovascular e digestivo; sobre o sistema endócrino, o sistema imunitário e o sistema nervoso central e periférico. Face ao anterior torna-se evidente que, tanto os mecanismos de cognição como de aprendizagem humana, não emergem, única e exclusivamente, de uma ou de várias zonas cerebrais, mas, sim, da totalidade cérebro-orgânica, com destaque especial para o sistema límbico do indivíduo, área dos fundamentos das emoções, e, para a área do neocórtice, zona dos raciocínios. Emoções e raciocínios inter-influenciam-se reciprocamente, activam-se, enriquecem-se e reforçam-se, facilitando as aprendizagens sociais, os comportamentos adaptativos e os envolvimentos psico-motivacionais. A presente análise, a nível educacional, postula que emoção e razão devem harmonizar-se nos desenvolvimentos e organizações da personalidade de cada um, pois, sem tais harmonias, não existem equilíbrios sócio-psicocomportamentais. E isto porque, como o afirmou Goleman: “a inteligência pode não ter o mínimo valor quando as emoções faltam”. Por outro lado, o mesmo autor, em complemento do anterior, afirma que “uma visão da natureza humana que ignore o poder das emoções é tristemente míope”. Por isso, razão, inteligência, raciocínios, emoções, sentimentos e afectos não são antagónicos, mas, completam-se. O racional sem o emocional não funciona equilibradamente, de maneira particular quando se trata de formular decisões ou de acção, pois, tanto as emoções como os sentimentos contam tanto, e, às vezes mais, que o pensamento e a razão. O anteriormente descrito e, penso, sobejamente evidenciado, apresenta efeitos das interactivantes elaborações biocerebrais e das multidimensões organo-psicoemocionais, não restando dúvidas que, tanto a organização como o desenvolvimento do 116
psicoemocional equilibrado assentará, fundamentalmente, em processos de educação integrada. Um tal processo, essencialmente respeitador das necessidades bioemocionais, psicofísicas e cognitivo-ambientais dos aprendentes, centraliza-se, prioritariamente, nas intrínsecas necessidades de movimento e de desenvolvimento do indivíduo, na necessidade de acção e de experienciação sobre o real e o concreto, sobre a necessidade de autonomia e de independência e sobre a necessidade de se ser apreciado e valorizado, o que efectua valorização das destrezas e desenvolvimento das capacidades, aperfeiçoamento de comportamentos e desenvolvimentos de novas atitudes, iniciativas e decisões individuais. Para satisfação de tais necessidades básicas do ser humano, tanto as atitudes e os comportamentos super-proteccionistas como abandonistas dos educadores ou professores são ineficientes e antiprodutivos. É que, se por um lado, todo e qualquer aprendente possui necessidade de um guia-orientador humano, por outro lado, também necessita de tempo e de espaço não só para estar consigo, mas, também, para ser ele mesmo. Por isso, crianças ou educandos sujeitos a orientações rígidas tornam-se incapazes de tomar decisões, de fazer valer os seus pontos de vistas, de captarem a sua interioridade e de criarem outros envolvimentos a partir de sua autenticidade. Daí a capital importância de serem criadas, nos espaços pedagógico-educativos, condições e meios para que os educandos, seguros e em situações de bem-estar, possam efectuar actividades calmas, de reflexão pessoal e de interactividades relacionais nas quais sobressaia a acção do Eu pessoal em sua intersolidariedade social. Torna-se, por isso, imprescindível, aprender a organizar a educação integrada no seio e dinâmica dos processos de ensino-aprendizagem institucionalizados. Para tal é necessário recordar-se que o educando é um todo, e, não apenas, os seus talentos ou as suas capacidades, as suas dificuldades ou os seus problemas. É necessário, portanto, constatar-se, observar-se e valorizar-se o que o educando é capaz de fazer e de aprender para, através de uma tal metodologia, se diagnosticar o que ainda não faz, não aprendeu ou não consegue aprender. Uma tal relação educador-educando, professor-aluno centrada na positividade do aprendente, é uma relação respeitadora da totalidade do indivíduo, de seus dons e talentos, de suas características e atitudes, carências e necessidades. A nível de aprendizagens respeita os centros de interesses dos aprendentes, os seus ritmos, as suas solicitudes e as suas necessidades, gerando-se, emocional e afectivamente, equilíbrios entre os comportamentos espontâneos dos indivíduos e as necessárias estruturações das aprendizagens, visto estas, representações de permanentes desafios individuais, emanarem de situações ou de aprendizagens já interiorizadas. Um tal processo de aquisição, de desenvolvimento e de solidificação dos conhecimentos emana da dinamização pessoal do indivíduo, a qual activa-se por meio de encorajamentos e de valorizações dos pequenos progressos, cuja tomada de consciência não só orienta o educando verso o desenvolvimento de sua autoconfiança e auto-estima, mas, também, verso autovalorização face a si mesmo, ao grupo de colegas e aos restantes agentes de educação. A obtenção de tais plataformas educativas fará com que estas se transformem em alicerces activadores dos desenvolvimentos e integrações de todas as potencialidades, capacidades, maleabilidades e destrezas dos educandos. A função essencial do professor-educador será, então, facilitar, ao máximo, o desenvolvimento de todas as potencialidades dos educandos, usando, para tal, todos os meios e recursos disponíveis ao seu alcance, de maneira particular através de atitudes e
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comportamentos personalizados, reveladores de auto-segurança e incentivadores de auto-estima, de participação e de envolvimento dos educandos. As anteriores orientações de desenvolvimento educativo, harmonioso e integrado, assentam, essencialmente, sobre o paradigma bio-sócio-psico-emocional do ser humano, no qual a actividade psíquica aparece como resultado de longa e prolongada síntese psicofisiológica, efectuada através das múltiplas e hipercomplexas estruturações biológicas e sociais, cujos agentes de acção e de dinamismos foram os genéticos e os hereditários, os ambientais e os sociais, os individuais e os motivacionais, os psíquicos e os culturais, os interiores e os exteriores, súmula de cujas interactividades emerge a dialéctica individual, caracterizadora de idoneidade biopsíquica e social do indivíduo, afirmada ou não através de seus comportamentos sociais, de suas activações cognitivas, dos patamares intelectuais, das interacções sócio-emocionais, afectivas e de elevações racionais. Na base das organizações e reorganizações da elevação de um tal piramidal desenvolvimento encontram-se os efeitos das interacções bio-hereditárias (genótipos) com os factores ambientais e culturais do desenvolvimento específico de cada indivíduo (fenótipos), ou seja, os efeitos das interacções da natureza dada e da natureza adquirida, a influencia da natureza do meio e dos meios da natureza, e, de cujas súmulas de interacções, resulta o facto de cada ser humano ser distinto de todos os outros. Por conseguinte, torna-se evidente que, também, tanto os desenvolvimentos como as aprendizagens de cada ser humano são diferentes de uns para outros. Estas diferenças acompanham o indivíduo desde suas mais primárias bases de organização e desenvolvimento de sua própria personalidade e, por isso mesmo, um tal patamar de desenvolvimento define suas orientações de necessidades e de respostas, de estímulos e de motivações do indivíduo. Iniciada uma tal hierarquia, tanto de motivações como de realizações, como um dos factores das funções iniciais, por um lado, e, como factor de direccionamento comportamental, por outro, tanto os seus redimensionamentos como as suas amplitudes, reorganizações como reforços emergem, assentam e revitalizam-se de nutrientes e factores biopsíquicos, sócio-ambientais, psicoemocionais e cognitivo-intelectuais, padrões de necessidades cujo desenvolvimento e satisfação interdepende do nível de consciência de dignificação individual e da autoconsciência da interioridade de cada um. O alcance e o desenvolvimento de um tal patamar pessoal, dominado por características individuais, tende a auto-orientar o indivíduo verso a expansão e o desenvolvimento, a concretização e o envolvimento de todas as suas potencialidades, maximizando suas tarefas, funções e desempenhos, e, fazendo com que ele tenda para “ser tudo o que pode vir a ser”, em consonância com suas estruturas, programações e dinamismos neuropsíquicos, emocionais, afectivos, cognitivos e intelectuais. Absorvida por um tal desenvolvimento, a unidade biopsíquica de um indivíduo activa não só as suas dimensões orgânicas e bioneurocerebrais, mas, também, bioquímicas e celulares; viscerais e emocionais, perceptivas e afectivas, as quais, por sua vez, separadamente ou em conjunto, transformam-se em estímulos desencadeadores de mudanças interiores e exteriores, corporais e psíquicas, emocionais e afectivas, cognitivas e mentais. Encontrando-se, por isso, os incentivos, os estímulos e as motivações no cerne da dinâmica das transformações e das mudanças biopsíquicas e comportamentais de um indivíduo, será de uma tal simbiose que emergem, a partir de seu interior, tanto suas acções físicas como mentais, emocionais como afectivas, psicológicas como cognitivas. O ser humano, sujeito principal da criação, do desenvolvimento e do investimento de suas próprias motivações, em consonância com os efeitos de tais interacti118
vações, auto-afirma-se individualmente e inter-relaciona-se com o mundo e com os outros através de suas mais variadas dimensões de interfuncionalidades. No entanto, constituindo as acções de tais interfuncionalidades conjuntos orientadores de relações sujeito-mundo, tais conjuntos originam, activam e reforçam esquemas comportamentais, mapas mentais e estados psicológicos, caracterizadores não só do comportamento existencial de cada indivíduo em si, mas, também, motivadores e reorganizadores de seu próprio carácter e temperamento, personalidade e individualidade, características simultaneamente definidoras da radical insaciabilidade do indivíduo e criadoras de permanentes necessidades de mais e melhores aperfeiçoamentos, projectos e concretizações. As forças e as energias emanadas de tais processuais fenómenos não só contêm, em si, potenciais de mudança dos factores secundários do indivíduo, mas, também, de mudança, de alteração ou perturbação das próprias constituições de base do indivíduo, como sejam, por exemplo, seu temperamento e seu carácter, estrutura identificável mais com a de um concerto musical que com a de uma arquitectura genotípica, visto a anormalidade, o desvio ou a patologia comportamental emanarem, essencialmente, de comportamentos ou de acontecimentos efectuados em desacordo ou em dissonância com a natureza natural, sendo geradores, por isso, de ausências de estímulos socializantes na infância, de privações de natureza física e emocional, afectiva e cognitiva; de aversões dos meios familiares e sociais, de ausências de emoções e de afectos, de imagens e de representações positivas. O conjunto dos variados factos e fenómenos, efectuados contra a natureza natural do indivíduo, bem como as ausências de fenómenos positivos, de maneira particular a nível de factos e de fenómenos emocionais, sentimentais e afectivos, constituem elementos de percepção, tanto da realidade exterior como de sua interiorização, emergindo, daí, tanto a positividade do indivíduo como a negatividade das relações efectuadas entre indivíduo-organismo-cérebro-meios. Daí a capital importância do indivíduo, com toda a sua totalidade biopsíquica e sociocultural, interactuar positivamente com os meios e com a acção positiva dos meios, a qual, interdepende, fundamentalmente, das acções exercidas e desenvolvidas, consciente e inconscientemente pelo adulto sobre a criança-educando em seus processos de aprendizagem, de preparação e de inserção na futura vida de adultos, características definidoras de suas futuras formas de agir, de ser e de estar, tanto a nível de sua própria individualidade como a nível de comportamentos sociais, a nível de consciência moral como de actuação psicoemocional.
II – DINAMISMOS DOS SENTIDOS NOS PROCESSOS DE COGNIÇÃO
Sendo o organismo e o cérebro essências vitais da estrutura bio-orgânica do ser humano, esta move-se através de estímulos interiores e de incentivos exteriores ao próprio organismo. Os efeitos dos estímulos, tanto interiores como exteriores, são de aproximação ou de evitamento dos objectos, das coisas ou das pessoas, das circunstâncias ou dos meios. A nível orgânico, tanto os princípios de aproximação como de evitamento, encontram seus incentivos fundamentais nos órgãos dos sentidos, isto é: olhos, ouvidos, 119
boca, nariz e pele, que tanto orientam a acção corporal como a expandem e investigam, gerando estímulos ao corpo, informações ao cérebro, elasticidade aos comportamentos e capacidades de adaptação tanto aos meios como às circunstâncias, fazendo com que o indivíduo se aproxime ou evite certos objectos, animais, pessoas ou coisas. Graças à audição, o ser humano é capaz de converter ondas sonoras em sinais nervosos e, estes, conduzidos às áreas auditivas do córtice cerebral, serão descodificados em sons. Através do paladar e do olfacto, o ser humano, graças às estimulações de seus quimio-receptores, interliga-se aos meios exteriores. Através do tacto, localizado difusamente por toda a pele do indivíduo, vivencia sua comunicação interior-exterior. Os órgãos dos sentidos, porém, apenas trabalham quando são estimulados. E, tanto os meios biofísicos como ambientais, sociais como humanos são suas fontes de estímulos. Por sua vez, são os sentidos dos órgãos que mantêm o indivíduo em interacção com o ambiente, e, através de tal acção, eles fornecem informações aos sentidos, as quais, percepcionadas pelo córtice, são por este discriminadas ou seleccionadas e, após terem sido trabalhadas por todos os subsistemas do próprio cérebro, convertem-se em energias de acção, de produção e de desenvolvimento, originando novas respostas e estímulos, atitudes e comportamentos, activações e desenvolvimentos, tanto em relação ao universo individual como em relação ao universo físico e social, ao emocional e ao afectivo. Por isso, órgãos internos e estímulos oriundos do exterior constituem a base e a dinâmica estrutural das próprias estimulações, visto estímulos produzirem respostas e respostas gerarem estímulos numa sequencial e auto-organizativa dinâmica de autoprodução de estímulos orgânicos e cerebrais, sensoriais e perceptivos, indutores não só de novas actividades interiores, mas, também, de inferências e atitudes exteriores. As anteriores interactivações interior-exterior, consoante seus níveis de factualidade interactiva, processam a informação e descodificam as mensagens, activam as energias e geram ou unificam padrões de intencionalidades comportamentais interiores. As orientações de tais intencionalidades enraízam suas vias de orientação dos órgãos dos sentidos e dos sentidos, das experiências adquiridas e das emoções vividas, bem como dos efeitos de tais interacções, e, daí, emergem dinamizadores dos desenvolvimentos, das activações, dos interesses, dos envolvimentos e das expansões reais, bem como concretos factores dinamizadores dos processos biopsíquicos, cognitivos, emocionais e afectivos, de cujas equilibradas e interactivas reciprocidades emanam não só as eficiências dos processos de aprendizagem, mas, também, as dinâmicas equilibradoras do indivíduo em seus processos de auto-realização, visto tanto os conhecimentos como os comportamentos do ser humano decorrerem de sua actividade neurocerebral, a qual é hipercomplexa, e, envolve, em maior ou menor intensidade, todas as áreas do cérebro e todas as dimensões do organismo individual. E isto porque, tanto o cérebro como o organismo são, em seus básicos fundamentos, interactivados pelos sentidos, ou seja, por esses nobres e delicados agentes encarregados de captarem e de transmitirem ao cérebro as informações procedentes do mundo exterior. A constituição e o desenvolvimento de tais agentes, isto é, dos sentidos, inicia-se muito antes do nascimento, no decorrer da vida intra-uterina. É aí que, seguindo uma ordem cronológica, inicia-se o seu desenvolvimento: tacto, olfacto, paladar, audição e visão. São, por conseguinte, os órgãos dos sentidos, cujo inicio de seus despertares emerge de desenvolvimentos intra-uterinos, que geram no bebé capacidades sensoriais de reagir a toda a espécie de estímulos e de comunicar com os outros, de adaptar-se ao meio e de começar a desenvolver e a auto-construir o conhecimento de si mesmo e do seu mundo envolvente. 120
Assim, o desenvolvimento e a acção dos sentidos originam as primeiras hierarquias de estímulos e de sua respectiva acção funcional. A natureza e dinâmica de uma tal funcionalidade interdependerá da qualidade dos estímulos, dos contactos afectivos, das percepções relacionais, da adaptação das estimulações às necessidades psicoemocionais da criança e das inter-relações dos meios-ambientes, visto todo o posterior equilíbrio do indivíduo interdepender, fundamentalmente, dos processos de diferenciação e de interpretação da realidade, bem como dos respectivos mecanismos individuais adquiridos para enfrentamento das mais sofisticadas realidades que o indivíduo encontrará. As realidades deverão, por isso, serem experienciadas e vividas concretamente para que os sentidos dos órgãos se expandam e reforcem, e, as posteriores imagens mentais, conceitos, raciocínios e abstracções emirjam de realidades concretas, e, isto, para que as necessárias orientações dos movimentos interiores, dinamismos essenciais da obtenção dos conhecimentos, se orientem, também, para conhecimento do real, visto toda a aprendizagem dever ser efectuada na base da acção, do movimento e das interrelações com os objectos, com os seres vivos, os acontecimentos, os espaços e os tempos, características essenciais de desenvolvimento, de activação e de reforços das memórias sensoriais, isto é, de memórias visuais, auditivas, tácteis, gustativas, olfactivas, etc.. Ora, sendo evidente que as informações entram nos sistemas de memória pelos sentidos, a memória sensorial influencia a percepção, é fundamento da cognição e exige objectos, realidades e estímulos. É através dos sentidos que o indivíduo é posto em contacto com os estímulos provenientes da realidade exterior. Estímulos oriundos do exterior e sensações emanadas do interior desenvolvem padrões de reacções e de comportamentos, geradores de percepções que, por sua vez, geram mecanismos de interpretação das mensagens sensoriais e processos de codificação ou de descodificação de significados como sucede, por exemplo, quando se escuta música clássica ou se contempla um quadro de Picasso, etc., em que o objecto-realidade é percepcionado de forma diferente pelos indivíduos. Apesar das mais variadas e diferentes interpretações, os estímulos estiveram lá e dinamizaram o aprendente em seus mais variados níveis, fundamentalmente, a nível neurofisiológico, perceptivo-emocional e cognitivo-intelectual, e, de suas formas, intensidades e interactividades, resultam estruturas mais ou menos abertas e disponíveis às captações dos estímulos oriundos dos contextos socioculturais e das vivências das experiências ambientais, as quais, quando positivamente vivenciadas, dinamizam as anteriores estruturas, codificam positividades e seleccionam orientações tanto cognitivas como comportamentais. E, isto, porque sendo as aprendizagens efeitos das acções da interioridade do aprendente este selecciona os objectos, os dados e as situações em função de suas intencionalidades, de seus desejos e expectativas, selecções que emergem mais da receptividade intuitiva do aprendente que de seus comportamentos cognitivos, embora o reforço positivo deva apresentar-se como uma constante e como um denominador comum de todos os processos de ensino-aprendizagem, visto a positividade dos reforços não só estimular, cognitivamente, as aprendizagens, mas, também, facilitar as sucessivas reorganizações positivas do educando. De facto, a positividade estimular através de recompensa, do elogio, do encorajamento e da comprovação do êxito operacional orienta o aprendente para o sucesso, porque tais atitudes constituem constelações de estímulos emocionais e afectivos, não só desencadeadores de novas energias e vitalidades, mas, também, de orientações verso objectivos concretos, simultaneamente estimuladores de reorganizações de novos patamares de sentimentos e de afectos, de desejos e de expectativas, e, não só dinami121
zadores, mas, também, reforçadores, qualitativa e quantitativamente, da própria identidade pessoal, a qual, não permanecendo ensimesmada, não só se intersolidariza, mas, também, intercoopera com os demais indivíduos. Esta intersolidariedade e intercooperatividade, emanadas da pessoalidade de cada aprendente, tornam-se alavanca e denominador comum dos desenvolvimentos das emoções e dos afectos, pois, tanto umas como outros, manifestam-se através do desencadeamento de energias, as quais, emergindo do interior do indivíduo, orientam-se para o exterior e facilitam não só o desenvolvimento e a organização da estabilidade afectiva, mas, também, estimulam tanto o cognitivo como o psicológico do aprendente, facilitando-lhe, por sua vez, o desenvolvimento e a organização de constelações de estímulos cognitivos, psicológicos, afectivos, emocionais, sociais e comportamentais de cujos reciprocidades interactivas emergirá o indivíduo-sujeito equilibrado. A anterior organização do aprendente orientá-lo-á para sucessivas aberturas e disponibilidades a captações de novas informações e a elaboração de novas mensagens, a sucessivas adaptações e a constantes reorganizações através de seus múltiplos processos de permanentes intercâmbios com os objectos, as pessoas, as normas e as regras do exterior. Hoje em dia, porém, não só as crianças, mas, também, os adolescentes e os adultos estão submetidos a constelações de estimulações, oriundas do exterior, muito diversificadas, e, estas, não só pela sua quantidade, mas, também, pela sua diversidade, e, sobretudo, origem, a maioria das vezes não deixam espaço de liberdade interior ao próprio aprendente para as seleccionar, assimilar e interiorizar através das necessárias e respectivas vivências. Estes défices obstaculizam a dinamização e a mobilidade dos esquemas mentais do indivíduo, privam-o de suas necessárias actividades associativas e asfixiam tanto os sentimentos como as emoções em suas necessidades de abertura e de disponibilidades, de acções e de interactivações consigo mesmo e com os outros, com a realidade e com o prazer psicoemocional, sensorial e afectivo. Estes nefastos efeitos, de negativas e caóticas consequências a nível de reorganização da individualidade do aprendente e de seu dever ser “si mesmo” são efeito de deformada forma de transmissão das informações, a qual parece apostar em evitar toda a possibilidade de análise original, todo o trabalho de descoberta de significações e toda a possibilidade de reflexão individual sobre as próprias mensagens, bem como da negatividade que tais comportamentos exercem sobre o desenvolvimento da individualidade e da identidade do próprio aprendente. É o que sucede, por exemplo, não raras vezes, com a força das informações acompanhadas de imagens, que, no fundo, evitam a escolha de outras acções, que também poderiam ser importantes, mais profundas e mais fecundantes para a própria individualidade do aprendente. De facto, a superabundância descontrolada de informações limita a capacidade de interpretação e de análise do aprendente, estereotipa as suas percepções, asfixia as potencialidades de mobilidades das emoções, que orientam os sentimentos verso os objectos da cultura e da civilização, tornando-se estes criadores de vazios interiores e de atitudes e comportamentos desregulados. E, no entanto, apesar da existência de múltiplos e novos técnico-processos de ensino, a essencial lacuna dos processos de aprendizagem continua cada vez mais acentuada: o aprendente continua incapaz de saber seleccionar a informação útil e ninguém é capaz de lhe ensinar porque não se sabe como o fazer. No entanto, motivar o aprendente a seleccionar a informação útil passa não só por sua auto-movimentação interior, mas, também, pela existência de factores exteriores propiciadores de estímulos e de vivências adaptáveis à sua interioridade.
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Motivar o aprendente para eficiências de operacionalizações e de operatividades cognitivas implica envolvências de sua espontaneidade e criatividade em tais processos. Estes processos, fundamentalmente, emergem dos movimentos e das acções interiores do indivíduo e de sua respectiva orientação para os objectos e para as situações, para os factos e para os fenómenos com que os indivíduos se inter-relacionam. Porém, certas formas de relação e de inter-relação são preferidas a outras. A forma que tende à optimização é a que faz com que o todo do indivíduo se oriente activamente e de forma preferencial em direcção a certas formas de interacção, de forma tal que certas categorias de relação, eficientes, positivas e rentáveis, se tornem indispensáveis ao funcionamento e à dinâmica da própria totalidade do indivíduo, gerando nele hierarquias de necessidades de acções positivas e de evitação das acções negativas, tanto em relação em si mesmo como em relação aos outros, às realidades como aos valores, às subjectividades como às objectividades. Os anteriores processos de orientações dos movimentos interiores verso as realidades exteriores contêm, em si mesmo, o segredo do sucesso individual do aprendente, pois são os indivíduos que estudam ou trabalham com alegria, satisfação e auto-contentamento que conseguem o sucesso escolar. Um tal sucesso, por parte do aluno, assenta no seu prazer em aprender, na sua afirmação pessoal, no seu desenvolvimento da criatividade, na capacidade de adaptação a novas situações e na sua cooperação com os outros. Por parte do professor, este deverá sentir-se impregnado dos anteriores atributos necessários aos aprendentes, ter consciência de que todos alunos são diferentes e, por isso, precisam de ser motivados de maneira diferente; deverá fomentar a troca de ideias e o intercâmbio de opiniões, elogiar os positivos desempenhos dos alunos, incentivar a sua participação tanto na sala de aulas como fora dela e jamais subestimá-los.
III – EMOÇÕES E AFECTOS NAS EFICIÊNCIAS DAS APRENDIZAGENS
Sendo um facto psico-corporal que sensações, emoções, sentimentos e afectos não só activam, mas, também, dinamizam a natureza somato-psíquica dos seres humanos, tais processos activam as percepções, dinamizam as cognições e rentabilizam as aprendizagens. De facto, sendo as anteriores dimensões agentes constitutivos de uma afectividade individual integrada, esta não só desenvolve e hierarquiza atitudes, mas, também, modifica comportamentos. Com efeito, sendo a afectividade a base essencial da vida psíquica, ela não só origina os mais diversificados estados de alma, mas, também, agrupa-os, organiza-os e orienta-os em função do desenvolvimento da concentração, dos interesses, da curiosidade, da criatividade e das expectativas; das situações agradáveis e dos evitamentos das desagradáveis; das relações consigo mesmo, com os outros, com os conteúdos, com os contextos existenciais e com os próprios meios ambientais. No entanto, encontrando-se a génese da afectividade mergulhada nas profundezas do inconsciente individual, este deverá abrir-se ao consciente e, o consciente, deverá consciencializar-se de que uma das suas funções essenciais é a de activar, hierarquizar e organizar os afectos, as emoções, as reacções e as manifestações afectivas, visto estas 123
encontrarem-se subordinadas ao princípio do prazer e do desprazer. Durante muito tempo a afectividade é a única forma de comunicação que a criança possui com o mundo. Ela gosta ou não gosta, tem medo ou não; ri, chora ou grita em conformidade com seus estímulos interiores e exteriores. Porém, progressivamente, a realidade do exterior e de seus respectivos condicionalismos impõem-se, e, a criança, é obrigada a renunciar às situações imediatas. Os afectos deixam, então, de aparecerem de forma natural, espontânea e autêntica, e, tais energias passam a ser condicionadas pelas ditas normas dos meios, dos comportamentos alheios e das circunstâncias que a criança não desenvolveu. Esses complexos conjuntos de condicionalismos, porém, não raras vezes, não só distorcem as naturais vias de comunicação, as interacções e as retroacções das emoções, dos sentimentos e dos afectos, mas, também, as recalcam, asfixiam ou anulam. Porém, emoções, sentimentos e afectos constituem dinâmicas constelações de energias, de vibrações e de percepções da própria interioridade, cujo desenvolvimento e interactivação condensada constituem marco referencial da estabilidade emocional e afectiva. E, a maior ou menor organização e dinâmica da interioridade de um indivíduo, interdepende das interacções e das sucessivas interactividades de suas dimensões biológicas, emocionais, afectivas, sociais e cognitivas, constituintes, ou não, do desenvolvimento equilibrado e próximo do normal do ser humano. É a partir do equilíbrio e da dinâmica de uma tal organização que o indivíduo desenvolve marcos referenciais, capta ou recolhe informações, que trata e organiza, dando-lhes sentido, e, a partir de tal sentido, transmite mensagens. Efectuando tais processos, o indivíduo, graças à acção de tais adaptações, ele próprio se transforma, o que lhe permite não só obter mais complexidade, mas, também, organizá-la e, quanto mais complexidade e melhor organização mais se multiplicam, tanto horizontal como verticalmente, suas trocas e suas inter-relações com os objectos, com as pessoas, com as regras e as normas, sentindo-se, cada vez mais, impelido a adaptar-se e, consequentemente, a equilibrar-se de forma mais complexa. Pelo contrário, desorganizações emocionais e carências afectivas, deteriorações, asfixias, recalcamentos e imagens negativas geram instabilidades psicoemocionais e perturbações comportamentais, o que afecta não só a formação e o desenvolvimento do Eu psíquico do indivíduo, mas, também, as suas atitudes e os seus comportamentos tanto em relação às aprendizagens como em relação aos outros, em relação a si mesmo como em relação a seus posteriores equilíbrios pessoais. Por isso, regra geral, uma criança que não se sente amada, que não sente carinho nem afecto por parte dos que a rodeiam, geralmente, apresenta grandes dificuldades em seus processos de aprendizagem, de maneira particular a nível de concentração e de memória, de disciplina e de persistência, de captações das informações e de associações das imagens, visto o processo da maior ou menor eficiência interdepender dos interrelacionamentos e das interactivações de todas as estruturas do indivíduo, nomeadamente das estruturas e dos dinamismos emocionais e afectivos, cognitivos e psíquicos. As dinâmicas das interactivações de tais estruturas constituem o fundamento essencial da lei do efeito, isto é, comportamento que provoca a aparição de algo agradável tende a repetir-se (reforço positivo) e comportamento que desencadeia algo de desagradável tende a ser eliminado (reforço negativo). Por isso, agindo-se positivamente sobre o desenvolvimento e os comportamentos emocionais e afectivos do aprendente modificam-se não só suas atitudes e seus processos cognitivos, mas, também, seus comportamentos pessoais, sociais e escolares, visto todo e qualquer aprendente não só estimular-se e desenvolver-se com aquilo que faz, mas, também, com aquilo que deve fazer. 124
Porém, no epicentro do desenvolvimento das dinâmicas globais e específicas, operacionais e concretizáveis encontram-se os estímulos bio-energizantes das emoções e das motivações desencadeadas pelos afectos. Os afectos e sua dinâmica de activação estruturante são fundamentais não só para desenvolvimento de uma personalidade equilibrada, mas, também, para eficiência qualitativa e rentabilidade quantitativa das aprendizagens, visto distorções dos processos e subdesenvolvimentos afectivos de um indivíduo afectarem não só toda a estrutura de desenvolvimento e de acção do ser humano, mas, também, põem em causa o seu futuro de realização e de equilíbrios psico-comportamentais. E isto porque a afectividade é a essência da realidade humana e a alavanca essencial do próprio do indivíduo e, a sua acção mobilizadora assenta sobre uma psicopedagogia do encorajamento e da valorização. A eficiência da autenticidade de tais processos, no entanto, emerge, acentuadamente, dos sistemas emocionais do indivíduo, os quais, originando sentimentos, por sua vez, estes emanam, fundamentalmente, das estruturas e dinâmicas do sistema límbico, e, actuam não só como sensores, mas, também, como guias internos e marcos referenciais dos encontros com a realidade e as circunstâncias, com os estímulos exteriores e os sinais de comunicação tanto corporais como extra-corporais, gerando estados de prazer ou de dor, de felicidade ou de sofrimento, de acção ou de frustração do todo do indivíduo. É que, na realidade, o que se sente influencia o que se pensa, e, o que se pensa influencia o que se sente, sequência natural da extensa interligação entre o sistema límbico e o resto do cérebro, nomeadamente das áreas frontais, áreas que, mútua e reciprocamente, deverão interagir e cooperar, e, em tais situações, sendo o hipotálamo influenciado positivamente, tanto o sistema endócrino como o sistema imunitário colhem imensas vantagens de tais comportamentos, não só a nível de libertação ou de anulação das angústias e das depressões, mas, também, dos stresses e dos constrangimentos, anomalias cujas causas essenciais encontram-se na existência de emoções desorganizadas, distorcidas ou asfixiadas e cujos efeitos orientam o indivíduo para a perda do sentido da realidade e para a impossibilidade de agir, de forma normal e eficaz, na sua relação consigo mesmo, com os outros, com a realidade e as circunstâncias ambientais. Daí a intrínseca necessidade da emoção e da cognição constituírem dimensões essenciais dos processos educativos, essenciais não só aos desenvolvimentos de indivíduos harmoniosos e equilibrados, mas, também, facilmente adaptáveis à realidade, aos meios e às circunstâncias. E isto porque é na inteligência emocional que residem as capacidades de reconhecermos os nossos sentimentos e os dos outros, de nos motivarmos e gerirmos bem e, positivamente, as nossas emoções e as nossas relações com os outros, visto ser das emoções que emerge a forma das escalas dos valores morais e do intelecto, da lógica e da cognição. É da inteligência emocional que emerge autoconfiança ou insegurança, adaptação ou ausência de auto-estima, energia ou frustração das necessidades individuais, e, tais predicados, influenciam, positiva ou negativamente, os desenvolvimentos das aptidões sociais, das motivações, das empatias relacionais, das auto-regulações comportamentais e a autoconsciência individual, competências que influenciam não só os processos de cognição, mas, também, as eficiências nas aprendizagens. Com efeito, emergindo as capacidades de adaptação de um indivíduo, fundamentalmente, de sua inteligência emocional, não só o próprio cérebro como também o organismo servem-se de tais capacidades não só para se protegerem de danos físicos, emocionais ou psíquicos, mas, também, para activarem suas estruturas e dinamismos neurofisiológicos e biopsíquicos, e, interagindo, por sua vez, com as emoções, fazem 125
com que estas não só se desenvolvam, mas, também, se auto-seleccionem e hierarquizem, gerando códigos de comportamentos psico-emocionais. O prazer opõe-se, então, ao desprazer; a acção à inacção e o envolvimento ao vazio. A sequência de tais comportamentos desenvolve, estrutura e activa o emocional. O desenvolvimento emocional efectua, então, o desenvolvimento coerente, natural e autêntico da personalidade. As anomalias intrapsíquicas e sociais dos comportamentos individuais não encontrarão razões para se desenvolverem, como, de facto, se diagnostica quando se acompanha, por exemplo, o desenvolvimento de uma criança desenvolvida e educada através de amor verdadeiro e de afeição real. Este amor verdadeiro e afeição real é interiorizado pela própria criança a partir do contacto com o corpo da mãe, de seus embalamentos, sorrisos, voz quente e meiga. A partir de uma tal interiorização, emocional e inconscientemente, o bebé desenvolverá suas funções motoras e perceptivas nas esferas da afectividade, a qual estender-se-á a outras pessoas, situações e objectos, aprendendo e desenvolvendo a necessidade de sentir, de percepcionar e de amar. Os anteriores e positivos desenvolvimentos impelem a criança para novos patamares emocionais e, a partir daí, inicia seus processos de reorganização de novos estados. Estes conduzi-la-ão e orientá-la-ão, progressivamente, para conquistas de suas independências e obtenção de satisfações pessoais, passando a aceitar a responsabilidade de adquirir, por ela mesma, a experiência de satisfações novas e inovadoras, apercebendo-se, mais tarde, e, através de seus desenvolvimentos psicofisiológicos, que a satisfação imediata de seus desejos já não é possível e, por isso, terá de privar-se dela para obter outros, em que a sua satisfação, embora mais demorada, será maior, desenvolvendo a capacidade de expressar, de forma controlada, um desejo ou um sentimento. Uma tal orientação do desenvolvimento da inteligência emocional de uma criança fará com que esta confie em si mesma, em seus valores e em suas capacidades, e, se torne apta para proceder à descoberta do mundo e enriquecer sua individualidade com novos factos e acontecimentos, experiências e vivências biopsíquicas, emocionais e afectivas, cognitivas e intelectuais. Possuído de uma tal harmonia, confiança e dinâmica, o emocional e o racional do indivíduo agem e interagem mútua e reciprocamente e, a partir dos efeitos de tais interacções, a inteligência emocional desenvolve-se e reorganiza-se, as capacidades intelectuais aumentam e, por sua vez, tanto a primeira com as segundas, agirão sobre o sistema imunológico, sobre o sistema vegetativo e endócrino, sobre os sentidos e as sensações, as imagens e a memória. De facto, quanto mais e melhores sentidos se implicarem nos processos de captações dos sentimentos e das emoções, dos afectos e das imagens, melhores e mais eficientes serão os processos e os dinamismos de cognição, visto tanto os registos emocionais como as impressões sensoriais serem essenciais ao preenchimento dos armazéns das memórias, pois é da qualidade dos conteúdos de tais armazenamentos que a vida dos sentimentos e dos afectos se organiza e se desenvolve, que o corpo sente e percepciona, que a mente ou razão se moldam e as vivências anunciadoras das profundas necessidades, psicofisiologicamente, harmonizam organismo e cérebro, cabeça e coração, emoção e razão, pois, assim, como o psíquico não pode dar o melhor de si sem o físico, também o intelecto não o pode efectuar sem o emocional, visto ser através das capacidades da inteligência emocional que o indivíduo se motiva a si mesmo e se liberta das frustrações, controla os impulsos e vivencia as recompensas, regula o seu estado de espírito e impede que o desânimo subjugue suas faculdades de pensar, de sentir empatias e de ter esperanças ou expectativas.
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No entanto, as bases estruturais do ser humano, isto é, os sentidos, (visão, audição, paladar, olfacto e tacto), desenvolvem-se a partir da actividade ou da acção de seus respectivos órgãos. Estes, no entanto, apenas funcionam quando são estimulados. A fonte energética de tais estímulos, por um lado, é o meio onde o indivíduo se encontra e, por outro lado, são os órgãos dos sentidos que mantêm o indivíduo em interacção com os seus meios. É através das anteriores interacções que os sentidos recebem informações, as quais, percepcionadas pelo córtice, são por este discriminadas ou seleccionadas e, após terem sido trabalhadas por todos os subsistemas do próprio cérebro, convertem-se em energias de acção, de produção e de desenvolvimento, originando novas respostas e novos estímulos, novas atitudes e novos comportamentos, activações e desenvolvimentos, tanto em relação ao universo psíquico e individual como em relação ao meio físico e social, ao afectivo e emocional. A partir daí os estímulos podem efectuarem-se por auto-produções, e, as relações causa-efeito são as de resposta aos estímulos, isto é, os estímulos produzem respostas e as respostas geram estímulos. Os estímulos, de natureza biopsíquica, estimulam os órgãos dos sentidos dos indivíduos e desencadeiam nestes acções e reacções, modificações e adaptações, emoções e sentimentos, assimilações e associações cujas dimensões tanto podem ser de natureza positiva como negativa. No entanto, sendo a aprendizagem, genericamente, uma sucessiva adaptação aos meios, sem interacções do indivíduo com os meios não existem aprendizagens. Porém, para que tal aconteça, de forma positiva, é necessário que o meio seja favorável, isto é, estimulante e ofereça ao aprendente um grande número de possibilidades de acção, desencadeadoras de estímulos e de motivações tanto interiores como exteriores, orientadoras do indivíduo verso si mesmo e verso a realidade exterior. O encontro do indivíduo com as realidades exteriores a si mesmo não só constrói, mas, também, desenvolve e organiza as suas estruturas e os seus dinamismos de funcionamento psico-emocional e cognitivo-intelectual. O seu correcto desenvolvimento, bem como suas sucessivas adaptações pressupõem a existência de integridade dos aparelhos motores e sensoriais. Porém, apesar da integridade dos aparelhos motores e sensoriais, do desenvolvimento de suas respectivas funções e dos processos de progressivas adaptações, o indivíduo deverá atingir o domínio do meio que o rodeia. E, isto, porque é de uma tal relação com o meio que o indivíduo impulsiona a energia construtora e desenvolvedora de sua própria inteligência, a qual, iniciando sua construção a partir do conhecimento dos objectos exteriores a si mesmo, é através do conhecimento de tais objectos que o indivíduo se auto-constrói e se auto-desenvolve como ser e como pessoa distinta do seu meio ambiente, mas, consciente de suas sucessivas inter-relações, desenvolvidas mútua e reciprocamente em função das exigências dos meios e do desenvolvimento das capacidades de adaptação do indivíduo. Estas capacidades de adaptação interdependem não só de factores biológicos, que possuem mecanismos adaptativos mas, essencialmente, de factores e agentes de natureza e ordem sociopsicológica. É que, sendo o indivíduo isolado uma mera abstracção especulativa, a realidade concreta do seu ser é que ele, a nível de operacionalizações, é um efeito de suas interacções com o social, de onde emerge o psicológico, o qual tem origens nos sistemas familiares de sua infância. A natureza e dinâmica das inter-relações familiares constituem, então, o marco referencial de acentuada tónica adaptativa ou inadaptativa, como, de facto, tem sido 127
comprovado através de numerosos estudos que concluem que, quanto mais desfavorecidos forem os meios sócio-familiares maiores serão os números de inadaptáveis, pois as dinâmicas interactivas dos meios constituem não só a alavanca essencial dos equilíbrios, mas, também, as dinâmicas dos desenvolvimentos e das aprendizagens, pois, tanto uns como outros, emergem, fundamentalmente, das acções e das experiências; dos desafios, das dissonâncias e das confrontações; das adaptações, das integrações e das reflexões. No entanto, todo e qualquer cognoscente possui seus próprios dinamismos e processos de adquirir os saberes e de interiorizar os conhecimentos emanados de suas percepções e emoções, estímulos e motivações, de cujas interacções resultam conflitos e equilibrações, desorganizações e reorganizações, fontes de energia e de acção, de desenvolvimentos e de resoluções tanto de problemas como de integrações, factores fundamentais aos posteriores desenvolvimentos de autoconfiança e de auto-estima, de desenvolvimento das capacidades e das competências individuais, graças às quais o aprendente, progressivamente, irá tomando consciência de seu próprio valor social e cognitivo, individual e pessoal, condições essenciais de desenvolvimentos de seus autoreforços, de dinamismos de cognição e de prazeres nas aprendizagens, o que gera, por um lado, coerentes expectativas em relação ao sucesso nas aprendizagens, e por outro, desenvolvimentos nas atitudes e nos comportamentos. Constituindo, porém, o desenvolvimento das anteriores características individuais factores essenciais de novas vivências, estas constituem não só vias, mas, também, patamares de novos processos cognitivos, situados tanto nas esferas de novos armazenamentos de informações como de integrações, de vivências e de acções, o que gera padrões de aquisições de aprendizagens e desenvolvem ou reforçam tanto seus padrões como estilos. Estes deveriam, porém, prosseguir suas vias de harmonização, não só por razões de eficiências das aprendizagens, mas, também, por razões de desenvolvimentos e de reforços dos equilíbrios do indivíduo. No entanto, tanto os meios sociais como os meios escolares, os métodos de ensinagem como as estratégias cognitivas raramente manifestam tais preocupações, isto é, coerência entre a natureza individual do aprendente e a comunicação dos ensinamentos. Apesar do anterior, porém, sendo factos reais que as capacidades de aprendizagem de um indivíduo emergem de processos e de mecanismos biopsicológicos, que não estão isolados do resto do organismo, também o organismo é uma realidade concreta situada em meios e circunstâncias estimuladores ou condicionadores dos desenvolvimentos e das capacidades do indivíduo aprendente. As suas reacções ao ensino, por isso, são exclusivamente individuais e não são transferíveis de pessoa para pessoa, mas, apenas, interdependentes de suas estruturas e de seus dinamismos biopsíquicos, das acções dos meios sociais, culturais e económicos; dos centros de interesses dos indivíduos e de seus estímulos e motivações. Porém, tanto os meios como suas respectivas dinâmicas socioculturais não só estimulam ou condicionam as capacidades de aprendizagem, mas, também, as emoções, os sentimentos e os afectos são essenciais, não só às eficiências das aprendizagens, mas, também, aos equilíbrios psico-comportamentais. Por seu lado, meios sócio-emocionais e mecanismos psico-corporais frágeis debilitam o indivíduo, geram nele ausência de hierarquias de valores, de expectativas e de ambições; baixo autoconceito e baixa auto-estima de si mesmo, transações pobres e representações menos positivas, visto o indivíduo não conseguir aplicar o seu potencial físico, emocional, psíquico ou intelectual. Por isso, interagindo as condições e as circunstâncias dos meios sobre o organismo e sobre o potencial genético, emocional, afectivo e psíquico, as crianças dos meios 128
familiares, sociais, culturais e economicamente desfavorecidos, iniciam a escola em situação de desfavorecimento em relação às crianças dos outros meios, concluindo-se, então, que o insucesso escolar está longe de constituir uma variável exclusivamente dependente das capacidades intelectuais do aprendente. A anterior conclusão tornou-se evidente através dos estudos de vários pedagogos e investigadores como, por exemplo, Wall, o qual, quando dirigiu um centro educativo para alunos sem sucesso nos estudos, chegou à conclusão que uma maioria dos alunos possuía uma inteligência normal ou até sobredotada. Porém, o seu deficiente rendimento era causado por conflitos familiares ou escolares, factores que em nada estavam relacionados com a inteligência. Por sua vez, Stratton conclui que “quanto menos um indivíduo é propenso à cólera e ao medo tanto mais o seu sucesso escolar é grande”. G. Mauco, num relatório para a Unesco, concluiu que cerca de metade dos alunos entre os onze e os doze anos não se conseguem adaptar ao ensino, independentemente de serem medianamente inteligentes ou sobredotados e que uma tal inadaptação é frequente nos filhos de operários ou camponeses para quem o factor sócio-económico tem muito peso. De facto, os alunos oriundos de tais famílias são vítimas de um conjunto de condições, cujo efeito é cumulativo: deficiente alojamento, má alimentação, alcoolismo familiar e mesmo infantil, falta de atenção aos problemas de saúde e às perturbações psicológicas, etc.. Apesar disso, no entanto, um dos factores não menos importante é a pobreza da linguagem, fenómeno que faz com que a criança não encontre facilmente condições favoráveis ao seu desenvolvimento, de maneira particular quando, em tais famílias, a linguagem é, fundamentalmente, utilizada para ordens, proibições, censuras e até manifestações de cólera, o que gera agressividades, angústias, ansiedades, medos, instabilidades e receios. Na realidade, não são só as desvantagens socioculturais e económicas dos meios que se constituem como factores de insucessos escolares, mas, também, os problemas emocionais e afectivos, sensoriais e perceptivos dos alunos, pois pouco ou nada são tidos em consideração pelas instituições escolares, por suas organizações ou dinâmicas psicopedagógicas. E, tanto as técnicas de ensinagem como as estratégias educativas, os instrumentos utilizados como os manuais seguidos insistem, persistentemente, na homogeneização das heterogeneidades dos alunos. Por isso, falar de igualdades de oportunidades é desconhecer que uma tal igualdade não é, unicamente, igualdade perante a lei, mas implica, sobretudo, igualdade social, e, esta, jamais foi efectuada em toda a evolução da história humana, visto o próprio sexo do indivíduo, a raça, os meios e mesmo a religião dos próprios pais imporem restrições logo desde o nascimento do indivíduo, e, mesmo antes, e, isto, apesar dos mais recentes desenvolvimentos e tentativas de diminuição das desigualdades sócioescolares, de maneira particular a partir da educação pré-escolar, do ensino obrigatório e da abertura ao ensino secundário. Minimizar os negativos efeitos das desvantagens socioculturais dos alunos passa, porém, necessariamente, pelo respeito da individualidade do educando e pela facilitação de oportunidades de igualdades, o que implica não só reorganizações psicopedagógicas a nível de processos de aprendizagens e de métodos cognitivos, mas, também, a existência de complexas e dinâmicas intervenções a nível de educandos, das famílias e da sociedade, nomeadamente a nível de desenvolvimentos perceptivos e emocionais, de dinâmicas afectivas e de relações interpessoais, de instrumentos de cognição e de mediatizações dos conhecimentos, visto, em seu real pragmatismo, o insucesso escolar dos alunos caracterizar-se pela desarticulação, por vezes abismal, entre as competências do aluno e o que o sistema escolar espera dele, fenómeno que, se 129
por um lado, impõe aproximações do sistema às capacidades e competências do aluno, por outro lado, não se pode, de forma alguma, negligenciar o facto de que as estruturas cognitivas dos alunos são modificáveis.
IV- COMPORTAMENTOS PSICO-CORPORAIS NOS DESENVOLVIMENTOS DAS INTELIGÊNCIAS
Sendo todo e qualquer educando uma realidade diferente dos outros, numa sala de aulas, ele não é só uma realidade em si mesmo, mas, também uma realidade em interacção com os outros. Apesar disso, tanto as suas atitudes como os seus comportamentos, seus reflexos como seus automatismos, seus mecanismos como seus processos cognitivos são diferentes de indivíduo para indivíduo, evidencias neuropsíquicas e sociopsicológicas que impõem, à priore, a existência de pedagogias centradas no aluno como factor essencial de libertação e de orientação de todas as suas potencialidades. E, isto, não só sobre o aluno considerado pouco dotado, mas, também, sobre o considerado, normalmente, dotado e sobredotado. Todos têm as suas inteligências específicas e, sendo uns mais empíricos que reflexivos, e, outros, mais intuitivos que racionais, apenas o ideologicamente institucionalizado decidiu categorizar os tipos de inteligências em mais nobres ou menos nobres, em mais ricas ou menos ricas, sem jamais se ter questionado, realmente, se tanto os conteúdos escolares como os métodos de ensino eram os mais adaptados e os mais eficientes à natureza e dinâmica interior deste ou daquele aluno. Não há dúvida, no entanto, que tanto as dinâmicas institucionalizadas da organização escolar como as tradicionais formações pedagógicas dos professores-educadores impõem condicionalismos às pedagogias de libertação das potencialidades dos educandos. Porém, sendo o próprio de todo o ser humano sua liberdade interior, todo o indivíduo consegue libertar, desenvolver e orientar aptidões e capacidades, competências e potencialidades de relacionamentos harmoniosos com diferentes personalidades, consideração e respeito pelos outros numa perspectiva de positivos inter-relacionamentos, envolvências na realidade e reforços de si mesmo, promovendo a acção do educando e do aprendente, a descoberta e a expressão de conhecimentos integradores e dinamizadores do Eu individual, sendo este levado à consciencialização das diferenças e à visualização de alterações de comportamentos, favorecendo, então, não só a capacidade de auto-aquisição de conhecimentos e a necessidade de fazer perguntas, mas, também, a curiosidade intelectual, encorajando alunos e aprendentes a tomar parte nas decisões e a desenvolver liberdade interior, autonomia, realismo e prazer no próprio trabalho. A concretização e o desenvolvimento de tais holísticos objectivos cognitivoeducacionais implica confiança mútua e recíproca entre educadores-ensinadores e alunos-aprendentes, equilibrada harmonização entre desenvolvimento de aptidões inatas e adquiridas, bem como constelações de estímulos e hierarquias de motivações, características essenciais do desenvolvimento de aptidões e da consolidação de hierarquias de valores individuais, sociais e profissionais, os quais, por sua vez, tornam-se alavancas fulcrais e, simultaneamente, dinamizadoras de eliminações ou diminuições de comportamentos inadequados ou indesejáveis, aumentando-se, então, os comportamentos ade130
quados não só a nível de individualidade, mas, também, de aceitação social, cujos efeitos, a nível de positividade, não só se deverão reforçar, mas, também, tornarem-se cada vez mais positivos, reorganizados e organizados; flexíveis e maleáveis, adaptáveis às diversas situações e, mantidos ao longo da vida, pois, assim como os comportamentos negativos de um indivíduo são efeitos de negatividades anteriores, de idêntica forma, os comportamentos positivos são consequências de atitudes e comportamentos precedentes. A nível da própria individualidade do ser humano, porém, a sua positividade comportamental emerge, fundamentalmente, das estruturas e dinâmicas da organização de sua pessoalidade ao longo de seus ciclos vitais, iniciados a nível de desenvolvimentos de seus estruturantes alicerces biopsíquicos e do desenvolvimento de sua consciência nuclear. A embrionária consciência nuclear e os desenvolvimentos biopsíquicos activam as células nervosas do tronco cerebral, do tálamo e do hipotálamo e, activando as interactivações do sistema do despertar, tal bioenergia é assumida pelo córtice cerebral do indivíduo que, por sua vez, não só activa, mas, também, condiciona o nível das percepções dos processos e das funções psico-corporais do sujeito-educando. De uma tal interactiva complexidade emerge a consciência central do indivíduo, a qual, tanto em suas dimensões perceptivo-corporais como psico-organizacionais, não só reforça o seu Eu psico-corporal, mas, também, suas experiências resultantes das interacções do corpo com a realidade que o circunda. É a partir do desenvolvimento e da organização de uma tal construção que a consciência permite ao ser humano recordar, agir e reagir face à auto-avaliação de suas próprias atitudes e comportamentos, processos que lhe permitem, progressivamente, ir construindo sua própria individualidade, encontrando-se o processo de desenvolvimento da identidade de cada indivíduo sobre a orientação do desenvolvimento de sua autoconsciência. Esta, por sua vez, é formada de diversos patamares ou instâncias, particularmente as denominadas de inconsciente, pré-consciente, consciente e actividade mental, que são não só desenvolvedoras, mas, também, construtoras e organizadoras dos comportamentos individuais. Assim, a instância do inconsciente individual não só favorece a realização dos desejos do indivíduo, mas, também, facilita as descargas de seus instintos e pulsões, através das acções de seus processos primários, do princípio do prazer e do desprazer. O pré-consciente, instância intermédia entre o inconsciente e o consciente, tanto mantém como ajuda a libertar os recalcamentos, as repressões e os interditos como facilita o desenvolvimento da acção da vontade e dos processos volitivos. Age como fonte de comunicação entre o consciente e o inconsciente, e, desenvolvendo-se através de processos secundários, opera em interactivação com o consciente e, tanto pode facilitar o desenvolvimento da concentração como obstaculizá-lo, visto a concentração, essencialmente nos efeitos das captações das interacções dos estímulos interiores com os oriundos do mundo exterior, gerar efeitos positivos ou negativos dos quais resultam comportamentos emocionais e afectivos, psico-comportamentais e psico-mentais. Os positivos alargamentos e expansões dos anteriores comportamentos conduzem os aprendentes a vastas gamas de centros de interesses, os quais constituirão as bases dos patamares de desenvolvimentos de sua própria consciência individual e social. No entanto, a estreita selecção ou diminuição de estímulos origina restrito campo de consciência individual, com propensões a bloqueamentos, encerramentos e patologias, pois, os amplos centros de interesses, estão na base de amplo campo de consciência, consciência libertadora, positiva, expansiva e optimista, voltada para a 131
apreensão do mundo exterior e interior. Um tal campo de consciência redimensiona os interesses e vitaliza-os, dinamiza percepções e emoções, afectos e envolvimentos. Apesar disso, sendo a consciência uma dinâmica instância da individualidade do aprendente, ela faz com que este, apesar de todas as mudanças e evoluções próprias de seus ciclos vitais, não só permaneça igual a si mesmo, mas, também, em todo o momento, integre, em si, simultaneamente, grande número de informações e de mensagens oriundas de diversas fontes e origens, imediatamente perceptíveis ou não, e, tanto do passado como do presente, e, de cujos efeitos de tais interacções, progressivamente, o indivíduo vai prospectivando seu próprio devir, coerente e, harmoniosamente, em função das experiências tanto espaciais como temporais. No entanto, no dealbar da infância existe apenas a consciência espontânea, emanada do imediatismo das percepções, e, só mais tarde, emerge, de seus processos interiores, a consciência reflectida, efeito tanto da tomada de consciência como dos sucessivos patamares da organização da própria individualidade. É, além do mais, através da consciência reflectida, que o ser humano toma consciência de seus contactos com o mundo exterior, reforça-os, activa-os, e, através de seus neuropsíquicos mecanismos, introjecta-os, emergindo, de tais processos, uma consciência introspectiva, entidade que orienta o indivíduo para a percepção de seus estados mentais e de suas actividades psico-cognitivas. Envolvendo, globalmente, tal percepção, a consciência do ser “em si mesmo”, uma consciência dos outros, da realidade, e, uma consciência da consciência, ela é, simultaneamente, subjectiva e objectiva; e, é sistémica, psicológica e metafísica, visto o indivíduo tomar consciência da origem do seu ser, do seu presente e do seu passado, de sua subjectividade e objectividade; de seus sentimentos e percepções, emoções e afectos; de seus pensamentos e conhecimentos, de suas expectativas e ambições, valores e intencionalidades. No entanto, integrando a consciência do indivíduo subjectividade e objectividade, ela é, simultaneamente, consciência do Eu individual, distinto das demais realidades e consciências dos objectos. Porém, a evolução organizativa do Eu individual efectua-se, progressivamente, a partir da fase de ultrapassagem da simbiose da criança com a mãe e, mais acentuadamente, tanto em intensidade como em qualidade, após uma sadia e equilibrada ultrapassagem das fases do complexo de Édipo. É a partir de tais fases que a criança, reconhecendo sua própria imagem no espelho, se diferencia da mãe e, posteriormente, ultrapassando a fase Edipiana, entra em progressivos processos de dialéctica Eu-Outros. A partir de um tal momento, a criança não compreende o significado de crescer, mas, deseja-o efectuar ardentemente. Procura ser como o pai ou como a mãe e, graças a tais necessidades de buscas, inicia seu processo de identificações com o mundo dos adultos, das normas e das leis, iniciando, assim, o seu processo de formação e de desenvolvimento do seu super-Eu, o que faz com que, não raramente, confunda seu Eu individual com o Eu dos outros. No entanto, o Eu dos outros, apesar de complemento essencial da dimensão social da natureza individual, não deixa de ser um fantasma que cada indivíduo traz consigo mesmo e, por isso, algo de diferente do próprio indivíduo. É através da intervenção do outro, porém, que o indivíduo vai tomando consciência do seu próprio Eu, o qual não só é único, mas, também, unificado e emanado de processos de interacções efectuadas entre identificações e oposições, resultantes das interacções comportamentais da criança efectuadas na família, com os amigos e na própria escola.
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No seio de sua família, a criança inicia-se em seus processos de socialização e, graças às suas maleabilidades, adapta-se biologicamente a determinadas práticas culturais, comportamentais, linguísticas e alimentares do grupo familiar a que pertence, emanando, daí, conhecimentos, atitudes e valores, que geram, na criança, capacidades de resposta a diferentes situações. Por sua vez, as creches, os jardins de infância, a pré-escola e a escola em geral orientam tanto a criança como os adolescentes no exercício de novos comportamentos de aquisição de hábitos de trabalho e no desenvolvimento das relações interpessoais. No grupo de seus pares, tanto de crianças como de adolescentes ou jovens, progressivamente, desenvolvem-se relações de solidariedade e de cooperação, e, adquiremse sentimentos de reciprocidade, de autonomia, de independência e de identidade social. O desenvolvimento de um tal conjunto de virtualidades, de capacidades e de competências, quer em qualidade como em intensidade, interdependerá da auto-imagem que o indivíduo possuirá de si mesmo e dos outros. Estas imagens, elaboradas por sua própria consciência, emergem do sensorial e do perceptivo, do experiencial e do vivencial, elementos essenciais da matriz da própria consciência individual. A consciência ou consciente, em termos de Psicanálise clássica, é uma consciência do “em si mesmo” do indivíduo e envolve não só a imagem que este tem, mas, também, a representação da mesma, manifestada através da percepção e da linguagem, do pensamento e de suas próprias memórias, tanto das emoções como dos sentimentos, dos afectos como dos conhecimentos. Uma tal imagem, bem como as manifestações de suas representações, implicam dinâmicas e inter-relações entre o corpo e o cérebro, o motórico e o psíquico, o biológico e o social, visto, até ao presente, desconhecer-se se os programas genéticos e hereditários de um indivíduo são mais influentes na acção e na formação do indivíduo que os factores do meio-ambiente, ou, se os factores sócio-ambientais são mais influentes que os genético-hereditários do indivíduo. Apesar disso, é evidente que, as imagens que um indivíduo elabora de si e sobre si mesmo, emergem dos efeitos das interacções de suas funcionalidades interiores com as exteriores, resultando, de suas flexibilidades, as capacidades de adaptação do indivíduo às circunstâncias e aos meios e, é da interdependência dos níveis de adaptação e da acção de mentalização que a consciência efectua sobre o corpo que emergem as flexibilidades, as adaptações e os desenvolvimentos. As anteriores características sócio-psico-comportamentais do indivíduo são geradoras de percepções e de linguagem, de memória e de pensamento. Por sua vez, a autoconsciência do sujeito focaliza-se tanto em sua realidade exterior como interior, e, voluntária ou espontaneamente, privilegia ou inibe determinados conteúdos, centralizando-se ou desconcentrando-se de certos estímulos, sensações, emoções, percepções, representações, afectos e desejos com o intuito de elaborar conceitos e raciocínios, emergindo, daí, um campo de consciência mais alargado que o anterior e, cujos efeitos, repercutem-se sobre as positividades das percepções, das evocações, das memórias e da própria consciência. A unificada activação dos anteriores predicados, atributos e instâncias do ser humano gera nele a necessária motivação, não só para ser o que tem necessidade de ser, mas, também, para harmoniosas relações com o social e o interpessoal e das quais emergem eficientes processos. De facto, tanto o ser activante como o dever ser motivador dos processos cognitivos do aprendente não só expandem suas dimensões de sociabilidade, mas, também, alargam tanto suas atitudes como seus comportamentos de socialização.
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A socialização emanada da realidade comportamental do indivíduo, não só se torna alavanca essencial de relações interpessoais e ambientais, mas, também, epicentro magnetizador dos dinamismos emocionais e das estruturas sentimentais e afectivas dos indivíduos nos processos de novas aquisições, mudanças e comportamentos, visto, tais dinâmicas, da interioridade do próprio indivíduo, orientarem-se, em sua totalidade, verso as eficiências das aprendizagens, as descobertas do novo e as maturidades psicocognitivas, pois estes positivos efeitos emergem das riquezas das associações de idêntica natureza, das informações e mensagens absorvidas e elaboradas, dos evitamentos de imagens e de ideias parasitas, bem como das respostas geradoras de estímulos positivos que, por sua vez, geram mais e melhores respostas, como sucede, por exemplo, quando o aprendente toma consciência de entrar em patamares de sucesso, o qual, por sua vez, gera e desenvolve, em si, necessidades de mais e melhores aprendizagens. Uma tal necessidade de mais e melhores aprendizagens, por sua vez, interactiva as constelações neurocerebrais do aprendente, gera fluidez e prazer em seus auto-treinos de cognição e, tanto as intencionalidades das estruturas cerebrais do indivíduo como as necessidades do cérebro vão, progressiva e eficientemente, encontrando respostas tanto às suas necessidades de acção como de desenvolvimento, de reforço como de activação, comportamentos evitadores de negatividades e estimuladores de desenvolvimentos e de expansões da autoconfiança individual. Esta, por sua vez, possui, como seu alicerce principal, a modificação das percepções do real, as quais, actuam não só sobre os comportamentos do próprio indivíduo, mas, também, sobre os factores dos meios ambientes, de tal modo que, se por um lado, o meio ambiente influencia o comportamento do indivíduo também o comportamento do indivíduo influencia a acção e o comportamento do meio ambiente. Por isso, interdependendo as operacionalizações das estruturas e dos dinamismos cognitivos de um indivíduo das reciprocas interacções de suas potencialidades com os factores dos meios, as influências destes podem ser de vários níveis e natureza, mas, a acção do meio, percepcionada positiva por um, não o é, necessariamente, por outro. A anterior variabilidade de valorações advém, fundamentalmente, não só do tipo de inteligência do aprendente, mas, sobretudo, da natureza positiva ou negativa de suas estruturas e dinamismos emocionais, sentimentais e afectivos. Com efeito, encontrando-se a aprendizagem dos múltiplos e interactivos factores, geradores das capacidades de aquisição e de desenvolvimento de conhecimentos, na base da pirâmide de tais factores, aí encontra-se a inteligência do indivíduo, a qual, possuindo múltiplas e variadas dimensões, e, sendo essencialmente maleável e flexível, ela não só se adapta aos meios e aos ambientes, mas, também, a situações novas e, de tal adaptação, emergem suas capacidades não só de interagir com os ambientes, mas, também, de lidar e raciocinar sobre eles. E isto porque as capacidades ou características essenciais da inteligência são de adaptação e de realização, de desempenho e de aquisição de conhecimentos num ou em vários domínios da actividade prática, teórica, social, inter-relacional, etc. e, desenvolve-se, não só através da acção e do treino do próprio indivíduo, mas, também, através de suas interacções com os outros, com os meios e com os ambientes. Não deixa de ser absurdo, porém, o facto de eminentes investigadores, nomeadamente da área psicológica, terem consagrado grande parte de sua existência à Inteligência Raciocinante, emanada do neocórtice do ser humano, derradeiro estado de sua evolução, negligenciando ou desconhecendo, na sua totalidade, que uma tal evolução foi efectuada através de estratos, camadas ou patamares evolutivos, com seus modos próprios de sobrevivência, de capacidades e de adaptações, nomeadamente a 134
nível biológico, corporal, sensorial, pictórico, existencial, espacial, corporal, linguistico, musical, emocional, sentimental, afectivo, inter-relacional, etc.. Por isso, constatando que uma equilibrada existência não interdepende apenas da Razão, Daniel Goleman, debruçando-se sobre outras capacidades humanas, que dependerem não só do neocórtice do indivíduo, mas, essencialmente, de seu sistema límbico, vem consagrando-se à Inteligência Emocional. A inteligência emocional, segundo o autor, contém, em si mesma, um conjunto de características e de capacidades essenciais à inteligência raciocinante, como sejam, a manutenção do optimismo, o aumento da empatia e da capacidade de ler as emoções dos outros; a capacidade de se motivar a si mesmo, a cooperação e o envolvimento, a perseverança apesar das frustrações, etc., e, como dinâmico alicerce de todas essas capacidades, a autoconsciência do indivíduo. Ora, sendo a autoconsciência geradora de impulsos e de vitalidades, das intencionalidades e das orientações, é ela que, no fundo, orienta os comportamentos do indivíduo e, simultaneamente, activa os circuitos neurocerebrais, sobretudo em suas dimensões de cooperação e de autocontrolo; de arte, de escuta e de empatia, de envolvência e de aproximações às resoluções de problemas. Por isso, emoção e razão não só deverão ser desenvolvidas simultânea e equilibradamente, mas, também, orientadas e investidas em suas dimensões qualitativas e quantitativas, visto uma operacionalizar ou bloquear a outra. No entanto, sendo os sentidos, as sensações e as percepções alimento activador das emoções, os processos educativos, em suas dimensões de desenvolvimentos dos equilíbrios individuais e de eficiências cognitivas, deverão não só desenvolver, mas, também, orientar e educar os sentidos e os órgãos dos sentidos, as sensações e as percepções. É que, de facto, sendo o ser humano uma realidade biopsico-sociocultural, a sua constituição primária é de natureza bio-corporal. E, assim como o corpo suporta o cérebro, também os sentidos estimulam o corpo, pois, estes, são os primeiros receptores das informações dos meios que circundam o indivíduo. Por isso, como a emoção estimula a cognição também os sentidos, através do corpo, não só estimulam, mas, também, desenvolvem, activam e reorganizam as emoções. Por conseguinte, quociente intelectual, emocional e sensorial, em suas mútuas e recíprocas interactivações, são essenciais às eficiências dos potenciais de interactivação e de cognição, de adaptabidade e de socialização, características essenciais que, consequentemente, concorrem para desenvolvimentos dos equilíbrios individuais e para harmoniosa e dinâmica integração do indivíduo. E isto não só porque os sentidos e as emoções são marcadores essenciais dos processos cognitivos, mas, também, porque podem gerar, e, geram, cognições independentes do neocórtice ou da razão.
V – MECANISMOS BIO-GENÉTICOS E PROCESSOS PSICO-EMOCIONAIS NAS EFICIÊNCIAS DAS APRENDIZAGENS
Sendo um dos objectivos essenciais de todo o processo educacional não só activar, mas, também, fundamentalmente, dinamizar o património genético-hereditário do educando, é, em seus traços gerais e padrões genéticos, que se encontram os fundamentos de seu caracter. Este, por sua vez, desde o nascimento, diferencia um indivíduo 135
de outros indivíduos, não só por sua biotipologia e caracteriologia, geradoras de traços e de orientações psíquicas e individuais, de estímulos e de motivações pessoais, que agem e interagem, de maneira específica e individual com os outros e com os meios, com o orgânico e com o cerebral, mas, também, com o social e com o cognitivo, fazendo com que todo o indivíduo, essencialmente, o educando, seja um ser em si, e, por si, e não um outro, tanto em suas dimensões sociais como culturais, psicológicas como cognitivas. No entanto, o hipercomplexo conjunto de disposições e de predisposições genéticas e hereditárias do ser humano são tanto alteráveis como modificáveis através das experiências e das situações, das vivências e das introjecções, das emoções e dos afectos, das acções da exterioridade e da força da própria interioridade do indivíduo. São, por isso, os efeitos de tais equilíbrios ou desequilíbrios, que emergem de indivíduos, como o carácter e a personalidade, harmoniosamente desenvolvidos e integrados, ou, com alterações de carácter e perturbações de comportamento, sobretudo perturbações na relação consigo mesmo, e, com os outros, de maneira particular a nível de antissociabilidade, instabilidade, impulsividade, indiferença, desinteresse, desmotivação, irrealismo, vazios interiores, permanentes males-estares, revoltas, comportamentos agressivos, irresponsabilidades, faltas de autonomia, etc., que diferenciam as orientações sócio-comportamentais e psico-cognitivas dos indivíduos. Na base de tais variabilidades comportamentais encontram-se suas sensibilidades e respectivas manifestações aos factos e aos acontecimentos, e, isto, em função das suas necessidades de movimento e de acção, de cognição e de reflexão, de emoções e afectos, de estímulos e motivações. Apesar das anteriores características serem diferentes de indivíduo para indivíduo, e, se manifestarem mais nuns que noutros, a realidade é que todas elas integram-se na indissolúvel unicidade de cada ser humano, único e individual, irrepetível e cheio de potencialidades. O desenvolvimento de suas potencialidades, porém, não emerge, única e exclusivamente, de seus potenciais genéticos e hereditários, nem das acções de seus meios familiares, sociais ou culturais, mas, também, e, fundamentalmente, das atitudes psicoemocionais, sentimentais e afectivas que o indivíduo desenvolve, estrutura, organiza e dinamiza face ao princípio das realidades envolventes. Aceitar-se a si mesmo, e, aceitar as realidades, torna-se a alavanca essencial da sua própria transcendência. Aceitar-se a si mesmo é condição essencial para aquisição e desenvolvimento de sua paz interior, relaxamento psicológico, dinamização e investimento das próprias emoções, o que faz com que os saberes, conhecimentos e imagens do próprio corpo sejam aceites e, positivamente, não só elaborados, mas, também, dinamizados pelas estruturas e funções do córtice cerebral, mecanismos e processos neurocerebrais que não só facilitam e abrem as vias das intuições e dos conhecimentos, mas, também, reforçam e activam as funções neurocognitivas do indivíduo, alicerçadas nas intencionalidades do cérebro, em suas constelações neuronais, em seus marcos de referências e pólos de magnetização, surgindo, daí, o reforço da autoconsciência pessoal, a activação de dinamismos de cognição e a consciência de mais e melhores capacidades tanto individuais como sociais, o que permite ao indivíduo enfrentar os contratempos que, eventualmente, surjam no quotidiano reforçar sua vontade e abrir portas e janelas, positivas, para novos conhecimentos, novas associações mentais e novos mapas psico-comportamentais. A envolvência e elaboração estruturada do indivíduo, em tais constelações psicocomportamentais, emocionais, afectivas e intelectuais, orientam-o para o encontro com sua própria interioridade, para relaxamentos interiores, libertação de parasitismos, ultrapassagem de medos e de ansiedades, para activações dos circuitos bio-eléctricos
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das interdinamizações organismo-cérebro e efectuação dos respectivos intercâmbios do sistema nervoso central, periférico e imunológico. O indivíduo ou educando, com tais estruturantes disponibilidades, sente-se capaz de atingir metas superiores, consciencializa-se de suas próprias capacidades, cria expectativas e aspirações de realização, projecta-se para o futuro, dinamiza suas energias de optimismo, envolve-se intensamente no presente, reinterpreta o passado, antecipa seu futuro individual e envolve-se em suas circulares dinâmicas de auto-estima. A auto-estima individual, emanada da auto-imagem pessoal, isto é, do modo como o educando se vê e se percepciona a si mesmo, é o centro não só de polarização, mas, também, de projecção e interiorização de seus comportamentos e saberes, de seus envolvimentos e relacionamentos, visto ser a partir da consciência de suas próprias percepções e imagens que o educando se relaciona consigo mesmo, comunica com os outros, com os meios e os ambientes, e, utiliza-os em função de suas necessidades, percepções e emoções; sentimentos e afectos, visto as realidades serem vivenciadas sobre os pilares dos mecanismos de introjecção e projecção. Os anteriores mecanismos, geradores de uma maioria dos comportamentos individuais, não são inatos, mas, sim, adquiridos ao longo da existência e em conformidade com os comportamentos emocionais e afectivos dos meios. Por isso, um educando, a quem ninguém dá importância e que não consegue que os adultos dêem resposta às suas necessidades de desenvolvimento e de expansão, de acção e de criatividade, de pessoalidade e de afirmação, será um educando, tendencialmente, que forma uma imagem negativa de si mesmo. A esta imagem negativa, mais tarde, juntar-se-ão outras componentes, como a quantidade e a qualidade de afecto que desperta, as tarefas que consegue ou não resolver por si só, a cooperação ou não que atrai dos adultos, as iniciativas, e, seus efeitos positivos ou negativos que consegue levar a cabo etc., constituem comportamentos desenvolvedores tanto de uma imagem positiva como negativa de si mesmo. O desenvolvimento de uma tal imagem é um processo sem fim, que se inicia com o próprio nascimento do indivíduo. Tanto as suas emoções como os seus afectos, os seus sentimentos como as suas potencialidades influenciam não só a criação e o desenvolvimento de um tal autoconceito, mas, também, a organização e reorganização, tanto do conhecimento de si como das suas realidades, das suas potencialidades como de seus comportamentos face ao devir, o que não só orienta posteriores atitudes, mas, também, condiciona, positiva ou negativamente, os seus comportamentos face aos processos de ensinagem, às suas captações e respectivas organizações interiores. Daí o facto de se tornarem evidentes as constatações de que indivíduos com auto-imagem positiva investem sua própria individualidade em comportamentos e resultados positivos, enquanto que os indivíduos com baixa auto-estima utilizam múltiplas variáveis ligadas ao lado negativo das causas, das situações e das circunstâncias. E isto porque, tanto as percepções como as avaliações pessoais negativas, acerca de si mesmo, das suas aptidões e capacidades, condicionam, de forma decisiva, o comportamento do aluno, fazendo com que este não só diminua em suas hierarquias de estímulos e de motivações, mas, também, de esforços e de persistências nas tarefas, condicionando e, mesmo limitando, seus potenciais níveis ou patamares de desenvolvimento e de expansão, de realização e de concretização de si mesmo, o que, não raramente, empurra tais aprendentes para as dificuldades de aprendizagem e para os níveis de alunos-educandos com necessidades educativas especiais. A auto-imagem pessoal e escolar, porém, emergem de vários construtos e de várias evoluções e são influenciados, em suas modificações e mudanças, pelas avaliações dos outros, pelas informações que o aluno recebe dos professores, pelos comporta137
mentos dos pais e dos irmãos e pelas relações que mantêm com seus colegas e companheiros escolares, as quais, de uma maneira geral, tanto para o positivo como para o negativo, influenciarão não só as futuras relações sociais, mas, também, as profissionais, visto, sendo a auto-estima a permanente disposição que nos leva a confrontarmo-nos, ela gera nossa maneira de sentir e de nos comportarmos, de pensarmos e de amarmos, o que influencia, de forma mais ou menos acentuada, a nível cognitivo, nossas percepções e nossas ideias, nossas opiniões e nossas informações, nossas crenças e nossas coerências, nossas realidades e nossas aberturas, nossas potencialidades e nossas disponibilidades. Por isso, viver com baixa ou negativa auto-estima é caminhar nas vias de contínuas decepções, dos auto-desprezos e auto-anulações e, entrar nesses pandemoníacos círculos de destruição, nos quais as adversidades fecundam adversidades e os insucessos criam insucessos. Pelo contrário, alunos com elevada auto-estima são capazes de enfrentar, facilmente, os fracassos e os problemas propostos, pois possuem, dentro de si, a necessária força e energia para reagirem e superarem os obstáculos, superações que orientam os aprendentes para mais e melhor crescimento e expansão, reforço e activação não só da própria autoconfiança, mas, também, do enriquecimento dos seus efeitos, ou seja, desenvolvimento e valorização da auto-estima, do autoconceito e da auto-valorização, exercitados e desenvolvidos através da autonomia pessoal, da responsabilidade e da criatividade. Educando autónomo, por isso, é aquele que é seguro de si mesmo, possuidor de autoconfiança e de auto-suficiência, capaz de tomar decisões, de se aceitar a si mesmo, de se sentir bem consigo, de se auto-orientar no seio dos mais variados contextos e conteúdos de uma sociedade em permanente mudança, e, de prosseguir nas vias do desenvolvimento de sua própria identidade, assumindo as responsabilidades de sua auto-condução sem dependência dos outros nem apoios dos meios. Por sua vez, o indivíduo com auto-estima negativa, além de não se valorizar, considera-se insignificante, permanentemente indeciso, com constantes necessidades de apoios dos outros, incapaz de tomar iniciativas, e, não raras vezes, com atitudes e comportamentos de servilismo. A nível individual e social, o indivíduo com auto-estima positiva é um indivíduo comprometido com suas potencialidades e desenvolvimentos, com suas aptidões e capacidades e, normalmente, encontra, no seu interior, tanto os meios como as capacidades de superar as dificuldades inerentes a seus próprios compromissos, as quais, jazem, geralmente, na força e energia de sua própria naturalidade e originalidade, identidade e autenticidade, dinamismos activadores de potencialidades e de capacidades, de esforços e de envolvimentos, de auto-treinos e de reforços, propiciadores de sentimentos e de afectos, de ideias e de pensamentos, reorganizadores não só da autoconfiança, mas, também, desenvolvedores de mais e melhores guias psicológicos e mapas mentais, atributos essenciais dos factores de activações quantitativos e qualitativos das eficiências das aprendizagens e das positividades dos comportamentos. No seio de tais qualitativos e quantitativos dinamismos das cognições e das eficiências das aprendizagens encontra-se a dinâmica das emoções, dos afectos e das imagens mentais. Por isso, tanto o desenvolvimento como a educação do emocional é de capital necessidade no desenvolvimento do ser humano a partir da primeira infância. E isto porque, sendo o racional precedido pelo emocional, não há dúvida que o primeiro alicerça-se sobre o segundo, o que faz com que desenvolvimentos cognitivos e mentais sem imersão em estruturadas e harmoniosas dinâmicas emocionais conduzam os indivíduos a permanentes vivências de situações stressantes, a desenvolvimentos de mecanismos de morbidez comportamental, de fragilidade psíquica, de dependências comporta138
mentais; a impotências perante as situações de ultrapassagem de situações difíceis e a desgastantes conflitos intrapsíquicos, geradores de ciúmes, de rivalidades e invejas; de insegurança, temores e raivas, e, a comportamentos não só de frustrações individuais, mas, também, geradores de uma consciência menos lúcida e menos esclarecida. E, isto, porque uma equilibrada e harmoniosa educação emocional, positivamente orientada e investida, está, fundamentalmente, na base do desenvolvimento de imagens positivas, tanto de si mesmo como em relação aos pais, aos irmãos, aos colegas, aos professores, aos meios e às circunstâncias; à existência, à vida e ao futuro de si mesmo. Não há dúvida, portanto, que um educando, que obteve respostas satisfatórias às suas necessidades emocionais e afectivas, até à fase de sua adolescência e puberdade será, futuramente, um indivíduo com autoconfiança e autodeterminação, com optimismo e horizontes pessoais. Ao contrário, aquele que não obteve respostas satisfatórias a tais hierarquias de necessidades, tenderá a ser um indivíduo derrotista, desconfiado e pessimista, sem uma construída e positiva imagem de si mesmo, com mecanismos de fuga à sua própria individualidade, e, quase permanentemente, retraído, face às suas necessidades de crescimento e de expansão, de mudança e de reorganização. De facto, o educando, ou, o indivíduo em geral, com negativo autoconceito não só subvaloriza, mas, também, distorce suas emoções e suas percepções, seus sentimentos e seus afectos. A partir daí suas interacções com os outros, com os meios e as realidades seguem idênticos processos, o que origina categorias, esquemas e mapas mentais de idêntica natureza. Pelo contrário, o indivíduo com um autoconceito positivo é emocional e cognitivamente activo, selecciona, interpreta e organiza positivamente as experiências e as acções, as vivências e os comportamentos, tornando-se, tanto umas como outros, agentes essenciais de hierarquizáveis novas energias de estímulos e de motivações, de planos e de projectos, de mudanças e de adaptações, graças aos positivos efeitos de suas auto-avaliações e à autoconsciência de suas próprias potencialidades e aptidões, capacidades e desempenhos. No entanto, embora o autoconceito de um indivíduo seja, exteriormente, avaliado mais pelos efeitos e pelas dinâmicas de suas organizações cognitivas que pelas estruturas que o suportam, não há dúvida que um autoconceito positivo emerge da percepção que o indivíduo tem de si mesmo, de sua auto-imagem e auto-aceitação, características que emanam do desenvolvimentos das pulsões e das emoções, dos sentimentos e dos afectos. Por isso, tanto o emocional como o cognitivo, o afectivo como o intelectual, agem e interagem mútua e reciprocamente, e, é com os efeitos de tais reciprocidades e o seu “em si mesmo” que ele se apresenta e se descobre, se auto-avalia e se investe, se orienta e realiza. Ora, sendo a auto-estima individual um dos constituintes essenciais do autoconceito pessoal, tanto a primeira como o segundo, forjam-se, desenvolvem-se, reforçam-se ou anulam-se pelas acções de suas reciprocidades e interdependências. A auto-estima gera formas positivas de pensar, de percepcionar, de sentir e de comportar-se não só consigo mesmo, mas, também, com os outros, visto ela resultar da auto-avaliação que o indivíduo faz de suas qualidades, potencialidades, virtudes, valores, sucessos ou insucessos. O autoconceito de um indivíduo, por sua vez, pode ser descrito como resultado da imagem física, social, cognitiva, intelectual, espiritual e moral que faz de si mesmo. Com efeito, auto-estima e autoconfiança, auto-reconhecimento e imagem positiva de si mesmo são constituintes fundamentais de um autoconceito positivo, facto que evidencia a existência de paralelismo entre auto-estima e autoconceito, visto maior auto-
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estima gerar maior autoconceito e, níveis baixos de auto-estima originam baixos graus de autoconceito. Por conseguinte, reforçar, activar ou dinamizar a auto-imagem não só cria, mas, também, desenvolve hierarquias de necessidades de auto-estima e de auto-valorização, não só a nível de individualidade, mas, também, a nível de interpessoalidades e de sociabilidades comunicacionais. Por isso, tanto nos processos educacionais em geral como nos sistemas de ensino-aprendizagem, deverão não só ser reforçados a auto-estima e o autoconceito dos educandos e aprendentes, mas, também, estes, deverão ser aceites e valorizados nas suas manifestações, visto estas tornarem-se meio de diagnóstico das percepções e das emoções, dos sentimentos e das sensibilidades, das capacidades e das auto-avaliações que os educandos possuem em relação às suas disponibilidades e capacidades de concretização e de desenvolvimento de suas tarefas e desempenhos escolares. Importa, por isso, realçar o facto da existência das imperiosas necessidades de tanto professores como educadores, orientarem e desenvolverem elevadas percentagens de suas energias e investimentos psicoemocionais nos desenvolvimentos, construções e reorganizações das auto-imagens de seus alunos, através de suas disponibilidade e aberturas a seus educandos e aprendentes, ajudando, tanto uns como outros, a reconhecerem e identificarem suas potencialidades, aptidões, capacidades e destrezas, a identificarem seus talentos e habilidades, a reconhecerem seus centros de interesses e seus dinamismos psicoemocionais para que, a partir daí, eles se centralizem mais nos seus esforços e investimentos, nos seus envolvimentos e nos seus processos que em seus resultados finais. A partir de tais comportamentos o professor encontrará em seus alunos manifestações de acção e de envolvimento suficientes para criar positivas expectativas em relação a eles e, manifestando-as, permanentemente deverá encorajar os alunos a seguir as vias de resolução dos problemas que encontram em suas tarefas e desempenhos escolares, demonstrando-lhes, pragmática e positivamente, que existem positivas relações entre o seu esforço, o seu investimento e a melhoria da execução de suas tarefas e desempenhos. Um tal estratégico procedimento conduzirá o professor a desenvolver actividades motivadoras, que envolvam os alunos em seus processos de encontro e reencontro não só com seus centros de interesses a nível de aprendizagens, mas, também, com as necessárias respostas às suas necessidades de desenvolvimentos psicoemocionais, alicerçados, fundamentalmente, nos desenvolvimentos do respeito por si e pelos outros, nos sentimentos de cooperação e de solidariedade, nos comportamentos de interajuda e na aceitação dos direitos à diferença. A anterior sequência de atitudes, por parte do professor, constitui epicentro fundamental de suas atitudes e comportamentos motivacionais, o qual, tendo em elevado apreço a existência de diferentes personalidades, manifestará suas imagens e atitudes positivas face a todos, e, desenvolverá estratégias, orientará actividades, planeará trabalhos, fornecerá documentação de apoio e orientará a execução de tarefas em simultâneo com o desenvolvimento da autonomia, do domínio de si próprio, das capacidades de auto-aquisição de conhecimento, de auto-avaliação de seus desenvolvimentos e de auto-reorganizações e integrações de suas próprias aprendizagens e descobertas. As anteriores integrações, porém, deverão efectuar-se a partir dos interactivos efeitos dos desenvolvimentos das várias e múltiplas dimensões do indivíduo, visto o desenvolvimento equilibrado do ser humano implicar desenvolvimento integrado e harmonioso, sem acentuados desfasamentos entre o emocional e o racional, entre o real e o cognitivo. 140
Com efeito, interagindo os sistemas emocionais do ser humano com seus sistemas cognitivos e respectivas dinâmicas, tanto as dinâmicas relacionais dos professores como os significativos conteúdos de aprendizagens deverão não só estimular e motivar, mas, também, orientar, educacionalmente, os dinamismos psicoemocionais dos aprendentes. Nos processos de tais ensinagens deverão emergir mutações evolutivas, orientadoras da estabilidade emocional e afectiva dos educandos, visto esta ser o melhor e o mais eficiente viático de enfrentamentos das instabilidades sociais. Inteligência emocional e inteligência cognitiva e mental deverão, por conseguinte, sintonizarem-se em seus processos de desenvolvimento e de acção, pois, se a inteligência mental orienta o indivíduo para os objectos ou conteúdos cognoscíveis, e, por seu lado, a inteligência emocional orienta-o para o conhecimento de si mesmo, para o conhecimento de suas próprias emoções, sentimentos e afectos; motiva-o e faz com que o indivíduo oriente suas próprias energias e reconheça as emoções, os afectos e os sentimentos dos outros e, com estes, estabeleça relações positivas. Um tal conjunto de pressupostos educacionais orienta o educando na via do desenvolvimento de uma personalidade integrada, com estabilidade emocional e maturidade psico-afectiva, preparando-se, flexivelmente, para a vida e para a aceitação e enfrentamento das sucessivas e, não raras vezes, incontroláveis mutações técnicoeconómicas e sócio-profissionais, o que impõe a necessidade da escola-instituição abandonar sua inflexibilidade e sua rigidez, os seus comportamentos constrangedores e os seus artificialismos. De facto, sendo objectivo central de todo o processo ensino-aprendizagem o desenvolvimento integral e harmonioso dos aprendentes e, não apenas a transmissão de conhecimentos técnicos, científicos, sociais ou humanos, não há dúvida que a maioria dos professores estão mais e melhores preparados que a maioria dos pais para intervirem e agirem em tais domínios. Por isso, os sistemas escolares, no seu todo, deverão colmatar as lacunas, as deficiências e as incapacidades não só dos meios familiares, mas, também, dos meios sociais em geral, o que implica não só continuada recorrência a sucessivas e activas medidas de prevenção, mas, também, de orientação e de envolvência em dinamismos de educação integrada. No entanto, a anterior envolvência deverá ser efectuada através da unidade corpo-mente, originadora do Eu psico-corporal do aprendente, o qual, através de seus enfrentamentos com o real cognoscível, facilitará não só o individual desenvolvimento da identidade do próprio aprendente, mas, também, estimulará e organizará suas próprias estruturas e dinamismos cognitivos, graças às eficiências das captações dos objectos do conhecimento e dos conteúdos dos saberes, às suas auto-aceitações, estímulos e motivações, emoções e sentimentos, factores essenciais não só aos desenvolvimentos das comunicações, mas, também das recepções das mensagens das pessoas, dos objectos, dos conteúdos, dos meios e das circunstâncias, visto colocarem-se e disponibilizarem-se aberturas face às realidades, e, estas serem a forma mais eficiente de desenvolvimento do Eu total, isto é, do aprendente se consolidar como indivíduo, de se afirmar e de gerir, conscientemente, suas próprias atitudes e comportamentos, tanto de confiança como de auto-estima, de acção como de autonomia. Na realidade, interdependendo o sucesso de um indivíduo, por um lado, de suas capacidades cognitivo-intelectuais e, por outro, dos resultados de suas interacções com os outros, tanto as primeiras como os segundos, permanecem sempre inacabados e, por conseguinte, são treináveis, desenvolvíveis e modificáveis, com efeitos tanto a nível de aumento de capacidades do organismo como das potencialidades do cérebro, dos estí141
mulos e das motivações, das organizações e das reestruturações, das adaptações e das concretizações, das realizações e das expansões. Por tais razões, quer a nível de processos educacionais, quer de técnicas de ensinagem, deverá valorizar-se tanto as estruturas como os dinamismos neuropsíquicos do aprendente, visto ser aí que residem suas “misteriosas” potencialidades de acção e de desenvolvimento, de contextualização e de realização, de flexibilidade e de adaptação, graças à existência de indetermináveis capacidades de desenvolvimentos das interacções das vastas e hipercomplexas áreas do cérebro individual, de suas inter-relações com o organismo, com a inteligência e as emoções, com os sentimentos e os afectos, a mente e o corpo, a individualidade e a personalidade. Porém, as interactivas harmonizações de tais dimensões dos indivíduos-educandos ou aprendentes requerem, da parte dos educadores e ensinadores, que estes não só aceitem, mas, também, estimulem o desenvolvimento do pensamento divergente de seus educandos ou ensinandos e os coloquem em situações de aprendizagem assentes no real, auxiliando-os nos desenvolvimentos de seus pensamentos e reflexões, facilitando-lhes as entradas em novas práticas e experiências e em suas tomadas de decisões educativas, de nível cognitivo, emocional e afectivo.
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