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Editorial: A vida na história

Por Wladimir Dias

A entrevista é uma experiência que, via de regra, provoca ansiedade. Não apenas aquela que antecede um primeiro encontro entre duas pessoas que não se conhecem. Mas outra, derivada do fato de que, por melhor preparado que esteja o entrevistador, há sempre um mundo diante de seus olhos. Desconhecido. Próprio. Por natureza, particular.

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E, por mais que exista um senso comum em face de vários assuntos, trabalhar com o que revela a perspectiva do outro é sempre um exercício que gera apreensão. É inesperado. Muitas das vezes, é também ótimo.

Diversos motivos poderiam ser elencados para justificar a inquietação da manhã em que Palhinha recebeu Relvado, em sua casa. A diferença geracional entre entrevistado e entrevistador. As distintas experiências e contextos. Mesmo a dúvida quanto à forma como lidaria com assuntos difíceis. No sóbrio conforto de seu apartamento em Belo Horizonte, o craque dos anos 70 e 80 colocou em jogo sua vida. Como atleta e treinador. E, claro, como pessoa de opiniões fortes.

Apesar de transparecer uma inicial desconfiança (ou assim terá parecido), esta logo se transformou em um papo fluído. Que foi e voltou, algumas vezes, sem amarras. E que, acima de tudo, permitiu à estrela desta edição relatar suas memórias e se posicionar diante delas. Terá dito coisas que não diria antes? Ocultado outras? Quem pode saber… Certeira mesmo foi a ênfase dada aos temas trabalhados; por trás da assertividade, estando o ser humano. Simples. É por esses caminhos que anda a história. Se fosse linear, objetiva, não teria graça. Se não fosse própria da existência individual e, ambivalentemente, coletiva,

idem. A história não é única e não é estática. Serve a diversos propósitos. Ela glorifica. Faz rir. Entretém. Diverte e provoca o choro. Dói — assim como a falta dela. A memória é que conecta o hoje ao ontem e, eventualmente, ela pode trair. Pior, alguma hora, fatalmente, deixa de existir. Para evitar que a efemeridade da memória a entregue à insignificância e o esquecimento, nos serve a história.

Nas páginas que se seguem, há muita história. E estórias. Claro: como a história depende do presente, não se fala apenas do tempo passado. Ainda assim, se há uma mensagem importante a ser transmitida, talvez ela seja melhor explicada por meio de uma frase popular, de origem incerta: “Dizem que você morre duas vezes, uma quando para de respirar, e a outra quando alguém menciona o seu nome pela última vez”.

Queremos garantir que as pessoas que marcaram, por um motivo ou outro, a história do futebol vivam longamente, mesmo que seus corações já tenham parado de bater e seus pulmões já não se encham de ar. Relvado 8, portanto, é dedicada a Dirceu Krüger, o entrevistado da edição 6, que, tristemente, viveu, no último 25 de abril, a primeira morte de um homem.

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