Renata Portelada - Sistema de Transporte no Morro da Providência - Metodologias e Processos

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Sistema de Transporte no Morro da Providência Metodologias e Processos Trabalho final de graduação para obtenção do diploma de arquiteta e urbanista Renata Carolina Ribeiro Portelada sob orientação do Profº Dr. Charles De Casttro Vincent Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade Presbiteriana Mackenzie São Paulo 2015

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Data de aprovação:

Banca Examinadora:

____________________________ Charles De Casttro Vincent Universidade Presbiteriana Mackenzie

____________________________ Paulo Emilio Buarque Ferreira Universidade Presbiteriana Mackenzie

____________________________ Anne Save De Beaurecueil Architectural Association School of Architecture

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Agradecimentos Aos meus pais Giane e Adilson pelo exemplo de esforço e dedicação, ao meu irmão Rafael pela amizade, aos meus tios Carlos e Antônio pelo ensino de amor à profissão, a minha avó Conceição pelos muitos colos dados ao longo da vida, a Thomas Takeuchi e Andressa de Rosso pelas conversas sobre arquitetura e as boas noites de bar, a Franklin Lee e Anne Save pelos ensinamentos obtidos ao longo do último ano, a Josei Nagayassu pelos sábios conselhos, a Ana Buim pela crença e incentivo, a Caio Mussi pelo amor e companheirismo, a Cristiano Magalhães e Maurício Hora pelas visitas de campo e informações sobre o território, a Charles Vincent pelas longas conversas regadas a café, e a Carlos Heck e Angelo Cecco pela orientação. Agradeço a todos que direta ou indiretamentente possibilitaram a feitura deste trabalho.

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Resumo Este trabalho trata metodologias e processos para intervenções em favelas de áreas de morro, acreditando que são territórios com altos potenciais de desenvolvimento. Através de análises dos programas de intervenções anteriormente aplicados e as visitas de campo é diagnosticado o vínculo direto do isolamento social para com a barreira física da declividade. A partir do uso de ferramentas de modelagem e análise computacional, junto ao contato direto com os moradores e estudo de programas de sucesso, são feitos três ensaios de projeto. Ao final é proposto um plano urbano junto a um sistema de transporte que faz uso das potencialidades locais para se auto desenvolver, vinculado a um edifício munido de conexões múltiplas.

Palavras chave: Providência - Morro - Assentamentos informais Elevador Urbano - Rio de Janeiro - Zona Portuária - Design Computacional - Processos Projetuais

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Abstract This thesis project deals with methodologies and processes for intervention in slums located in hill areas, believing these are territories with high potential of development. Through analyzes of previously applied intervention programs and field visiting, the social isolation towards the physical barrier of the slope could be diagnosed. By the use of modeling tools and computational analysis with the direct contact with the locals and ssuccess programs studies are made three design trials. At the end is proposed a urban plan beside a transportation system usign local potential for self development linked to a building equipped with multiple connections.

Keywords: ProvidĂŞncia - Hill - Slums - Urban Elevator - Rio de Janeiro - Port Area - Computional Design - Design Processes

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Sumário 1. Introdução 13 2. Sobre o Morro da Providência e a Zona Portuária do Rio de Janeiro 18 3. Porto Maravilha? 32 4.1. Botton up e as observações da primeira visita 45 4.2. A laje da Jura e os Fragmentos de Paola 56 5. Primeiros experimentos de projeto 73 6.1. Segunda visita e novas perspectivas 85 6.2. A conversa com Maurício Hora 92 7. Entendendo a urbanização de morro na cidade formal 99 8.1. O ENANPARQ 2014- Cristovão Duarte e o Porto Olímpico 109 8.2. O ENANPARQ 2014 - Aprendendo com Medellín 111 9. Nudibranch e a análise de escoamento da água 121 10. A ideia do sistema 125 11. A implantação no terreno da São Silvestre 131 12. O SESC Pompéia e as decisões programáticas do edifício 137 13.1. Nova estética- Biomimética e as formas da natureza 145 13.2. Parasita 148 13.3. O recuo da laje 150 14. Expandir e conectar 153 15. O primeiro estudo de layout do edifício 157 16. Mezaninos e o espaço mais fluído 161 17.1. Galápagos e a conexão da área dos 60 173 17.2. Opções 184 18.1. O fechamento do edifício- Primeiros experimentos 189 18.2. O elemento vazado 193 19. Resultados Projetuais 205 20. Considerações Finais 225 21. Bibliografia 227

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1. Introdução Com os dois mega eventos mundiais, a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, a cidade do Rio de Janeiro passa por modificações de caráter urbanas em uma escala superior às outras cidades do país, tendo a oportunidade de utilizá-los para alavancar o desenvolvimento urbano e social. O principal projeto de revitalização e preparação para os eventos está acontecendo na zona portuária, entitulando-se Porto Maravilha, mas maravilha pra quem? A zona portuária possui inestimável valor cultural não só para a cidade, mas para o Brasil como um todo e é ali que se localiza a primeira favela do país, o Morro da Providência, resultado de processos diversos de gentrificação e exclusão social. Aqui, os termos favelado e favela são utilizados sem nenhuma conotação negativa, sendo esses locais únicos cheios de particularidades e riqueza cultural, não sendo classificados de acordo com parâmetros de origem social, mas em virtude de seu desenvolvimento enquanto elemento urbano, sendo que sua organização está diretamente ligada à auto-construção. Tratase da cidade construída pelo próprio usuário, definição muito parecida com o urbanismo situacionista pregado pelo TEAM X na década de 1960. Esta vertente do urbanismo que era contra a funcionalidade excessiva praticada pela Bauhaus acreditava que a cidade contemporânea se tratava da cidade nômade, em frequente mudança, feita de habitações temporárias, como um labirinto. Os situacionistas admitiam que a flexibilidade dos espaços e a mobilidade do ambiente deveriam ter relação direta com a arquitetura. Esse movimento, contrário ao movimento moderno, assentia na participação ativa dos cidadãos no que diz respeito à construção da cidade. Tendo como fundador Guy-Ernest Debord (1931-1994), a Internacional Situacionista convergiu na abertura da Internacional Letrista, resultando na união de Debord com alguns amigos que publicaram 29 volumes da revista Potlatch. Se as questões dos situacionistas inicialmente englobavam a arte, influenciados pelo dadaismo e surrealismo, e que as ideias deveriam ir além

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da arte, fazendo parte da construção da realidade e tratando a vida cotidiana em geral como contra cultura ligada ao movimento moderno, logo passou a fazer parte da arquitetura e urbanismo. Sua teoria da deriva, especificada já na primeira edição da revista Potlatch, era uma proposta de psicogeografia: “Em função do que você procura, escolha uma região, uma cidade de razoável densidade demográfica, uma rua com certa animação. Construa uma casa. Arrume a mobília. Capriche na decoração e em tudo que a completa. Escolha a estação e a hora. Reúna as pessoas mais aptas, os discos e a bebida convenientes. A iluminação e a conversa devem ser apropriadas, assim como o que está em torno ou suas recordações. Se não houver falhas no que você preparou, o resultado será satisfatório.”¹

1- KEHL, Luisp11-12 1- JACQUES, Paola Berenstein. Breve histórico da Internacional Situacionista – IS (1). 2003. Revista Vitruvius. Disponível em: <http://www. vitruvius.com. br/revistas/read/

Quanto mais era estudado o urbanismo por parte dos situacionistas, mais eram a favor de uma construção coletiva das cidades contra o monopólio dos urbanistas e planejadores. “O urbanismo não existe: não passa de uma “ideologia”, no sentido de Marx. A arquitetura existe realmente tanto quanto a Coca-Cola: é uma produção envolta em ideologia, mas real, satisfazendo falsamente uma necessidade forjada; ao passo que o urbanismo é comparável ao alarido publicitário em torno da Coca-Cola, pura ideologia espetacular. O capitalismo moderno, organizado de modo a reduzir toda a vida social a espetáculo, é incapaz de oferecer um espetáculo que não seja o de nossa própria alienação. Seu sonho de urbanismo é sua obra-prima.” ²

2- KEHL, Luis.p12 2- JACQUES, 2003- Acesso em 15 out 2014.

A crítica feita pelo pensamento urbano situacionista atualmente é vista como um convite a reflexão em torno da espetacularização dos centros urbanos e seus agentes participativos sobre a construção da cidade contemporânea. A cidade moderna está dentro do sistema rua-quadra-lote mas não considera a história do lugar ou as relações humanas, está diretamente vinculada ao capital e a eficiência urbana. Foi na era da Revolução Industrial, nos séculos XVIII e XIX, quando a massa proletária é produzida em maior escala que surge um modelo de urbanização diferente desse sistema: as primeiras favelas documentadas na história.³ Nesses locais o agrupamento de habitações está disposto de acordo com as relações e os vínculos existentes da população. Kehl cita um relato de Charles Booth, um liberal que trabalhou nos bairros pobres de Londres,conhecendo a miséria ali concentrada:

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3- KEHL, Luis Augusto Bicalho. Breve história das favelas. São Paulo: Claridade, 2010. 112 p.- p1112

“As crianças das classes D e E, quando pequenas,tem menos chances de sobrevivência que os filhos dos ricos, mas eu certamente as considero mais felizes,livres de parafernálias de servos, babás e governantas. Eles sofrem mais com mimos do que com severidade, porque normalmente são o orgulho da mamãe, que sacrificará tudo para vê-los bem vestidos, e a alegria do coração do papai. É isto que faz seu lar, e a felicidade dos seus pais; mas não é só isto, como também a constante ocupação, que faz estas crianças felizes. Na classe E, ela têm o quarteirão todo como parquinho, e na classe D a rua é toda delas (...) Talvez eu esteja sendo exagerado na minha pouca experiência, mas não creio que improvavel que, de modo geral, a vida natural e simples das classes trabalhadoras possibilite mais felicidade a pais e filhos do que a existência complicada e artificial dos ricos.” ¹

Segundo Kehl os administradores da cidade por muitas vezes tentam regularizar essas manchas urbanas desordenadas, para que aos poucos elas possam ser integradas ao sistema formal da cidade, enquadrando-as nos parâmetros legais mínimos. Porém infelizmente, devido ao sistema econômico existente esta parcela da população é a que mais cresce no planeta, expulsa da possibilidade de acesso aos benefícios da cidade devido a má distribuição gerada pelas contradições do sistema.² Assim, as ações desenvolvidas no território devem ser pensadas de baixo para cima (botton-up) ou seja, envolvendo diretamente as pessoas nesse processo já que esse urbanismo é pensado conforme a necessidade dos seus usuários, se libertando de teorias ou regras pré estabelecidas. Seguindo a lógica situacionista, é necessário dar à festa os objetos básicos para que ela aconteça, livre de gostos particulares de quem as promove, essas intervenções não devem trazer à “festa” músicos de jazz num local onde as pessoas só dançam samba. Acredita-se que em 2050 cerca de 75% da população mundial viverá nas cidades, em especial em regiões de conurbação entre países e continentes, e nas megacidades com vários milhões de pessoas. Se em 1950 apenas 186 milhões de pessoas viviam em cidades de mais de 1 milhão de habitantes, em 2000 esse dado alcançou 1 bilhão e estima-se que até 2050 essa marca atinja 1,8 bilhões. No caso das megacidades de mais de 10 milhões de habitantes o crescimento é duas vezes maior - com 23 milhões em 1950, 229 milhões em

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2000 e uma expectativa de 447 milhões em 2050.¹ Isto ocorre em regiões onde existe pobreza em abundância, países em desenvolvimento no hemisfério sul com alto índice de êxodo rural e uma população que busca oportunidades nas grandes cidades. Então a favela é como uma mãe, que sempre aceita seu filho.² Esse é o caso de Xangai por exemplo, onde se construiu 300 edifícios com mais de dez andares num intervalo de 10 anos, ou de Lagos e Kinshasa na Nigéria, que segundo Burdett, receberiam em 2015 cerca de 67 e 34 habitantes por hora, respectivamente.³ Assim, dá-se início à análise, considerando que os territórios informais quando bem articulados podem apresentar características diversas, ambicionadas para a cidade formal como a independência de automóveis ou a mistura de usos. É importante saber que tanto o formal quanto o informal possuem caracteristicas passíveis de mudanças e aprendizado mútuo e ainda que o encaixe entre eles não se trata de algo delineado e formalmente existente, mas que deve ser desenvolvido de forma gradual, se adapatando às condicionantes de ambos.

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1- BURDETT, Ricky. Pensar a cidade para construir a cidade. In: ROSA, Marcos L. (Org.). Micro planejamento: Práticas urbanas criativas. São Paulo: Editora de Cultura, 2013. p. 114121- p118 2- LUIS Kehl: Uma breve história das favelas. Realização de Luis Augusto Bicalho Kehl. São Paulo: Escola da Cidade, 2013. (68 min.), son., color. Legendado. Palestra. Disponível em: <https://www. youtube.com/ watch?v=prbwi6V4m4>. Acesso em: 13 maio 2015. 3- BURDETT, 2013- p.118 Imagem: Projeção do crescimento por hora nas megacidades em 2015 Fonte: Urban Age 17


2. Sobre o Morro da Providência e a zona portuária do Rio de Janeiro Localizado na zona portuária do Rio de Janeiro, mais precisamente no bairro da Gamboa, o Morro da Providência, ocupado a partir do século XVII, é conhecido como a mais antiga favela do Brasil. Possuindo como limites o Cemitério dos Ingleses ao norte, a Pedra Lisa ao sul, a Vila Portuária a oeste e as ladeiras do Barroso e do Faria a leste, sua ocupação se iniciou quando a cidade do Rio de Janeiro encontrava-se em expansão. Conhecido por vários nomes, tem como primeira edificação, construída em 1670, quando ainda fazia parte da chácara de João Caieiro, a Capela Nossa Senhora do Livramento que posteriormente viria a dar nome ao morro, também já chamado de Morro do Livramento.¹ A região do porto sempre abrigou ofícios considerados pouco nobres na cidade e sua proximidade com o centro tornava conveniente a localização de atividades avaliadas como um mal necessário para o município. Em 1779 a região servia de base para armadores, traficantes de escravos, pescadores e embarcadiços. O mercado de escravos, antes localizado na antiga rua Direita (atual rua 1º de Março) foi transferido para o cais do Valongo, hoje Praça Mauá, transformando o local em polo central deste tipo de atividade e, junto a ele, também instalou-se o cemitério de escravos, destino dos negros que não resistiam às viagens, chamado Cemitério dos Pretos Novos. Atualmente o local abriga escavações arqueológicas, visto que durante as obras do programa de revitalização vigente, chamado Porto Maravilha, um dos projetos da Prefeitura do Rio de Janeiro em função das Olimpíadas de 2016, foram encontrados vestígios de ossos. Também foi construída na região a cadeia do Aljube, para onde iam padres revoltosos e bandidos, sendo localizada na antiga Rua do Aljube, atual Rua do Acre, tendo funcionado entre 1731 e 1856.²

1- PASSOS, Instituto Pereira. Complexo Providência. Rio de Janeiro, 2003. 6 p.- p.1

2- CARLOS, Claudio Antonio S. Lima. Um olhar crítico à zona portuária do Rio de Janeiro: Porto Maravilha para quem?. Rio de Janeiro: Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro UFRRJ, 2012. 26 p.- p.8

Imagens: Localização da zona portuária no município do Rio de Janeiro e localização do Morro da Providência e entorno. Fonte: Studio X

Até 1840 não há registros de habitações visíveis no morro, mas a partir de 1850 inicia-se ali a exploração de pedreiras para a expansão da cidade, que se intensifica ao longo do século XX. Isso permite que sejam abertos dois caminhos no morro, o da Formiga, atual Rua

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Ebroíno Uruguai e a Rua da Providência (posteriormente Rua Rego Barros). Em 1858, foi implantada pelo Barão de Mauá a Estação Central e um trecho da Estrada de Ferro D. Pedro II, mais tarde denominada Central do Brasil. Posteriormente foi inaugurada a Estação Marítima por volta de 1879, próxima ao terminal ferroviário e para interligar as duas estações foram abertos dois túneis cortando o Morro da Providência, pois o terminal marítimo ferroviário estava entre o morro e o mar. Quando foi proclamada a República - em 1889, o Rio de Janeiro passou a ser a capital do Brasil, tornando-se o grande polo econômico do país e, dessa forma, as atividades portuárias contribuíram para o povoamento do morro. Foram construídos armazéns e depósitos destinados a armazenar produtos provenientes das importações.¹

1- PASSOS, Instituto Pereira. Complexo Providência. Rio de Janeiro, 2003. 6 p.- p.1

2- CARLOS, 2012.- p.8

Imagem: Cortiço Cabeça de Porco. Fonte: Arquivo Geral da cidade do Rio de Janeiro.

Em 1893 para a construção do túnel que liga a zona portuária ao centro, foi demolido o maior cortiço da cidade, chamado Cabeça de Porco, que se estendia da pedreira dos Cajueiros à Rua Barão de São Félix .² É no ano de 1897 que surge a favela, originalmente formada por excombatentes da guerra de Canudos, vindos ao Rio de Janeiro com a promessa de serem indenizados pela participação no combate e ali se instalando sob concessão das autoridades municipais, a título de benefício relacionado à serviços prestados à pátria. Ao encontrarem ali uma planta parecida com um arbusto da região de Canudos, conhecido como favela, passaram a chamar o morro de morro da favela. Subsequentemente, o termo tornou-se geral e o morro assume outros nomes.³ No século XX o Rio de Janeiro passou por diversas intervenções urbanas para a modernização da cidade, notoriamente durante a gestão do prefeito Pereira Passos (1903-1906) e do presidente Rodrigues Alves, já que o Brasil começa a se industrializar de forma mais contundente. O Rio de Janeiro já abrigava mais de 600 mil habitantes e, sendo assim, houveram intervenções especialmente no centro, principal local de trabalho de classe operária, com objetivo de tornar a cidade competitiva economicamente. O transporte coletivo era incipiente e de alto custo. Com isso, a população proletária buscava moradia em seu local de trabalho - a área central. Porém, com as intervenções nessa região, ela se hipervalorizou e a população de 20

3- SIQUEIRA, Sergio Floriano. A dissociação de risco sob olhar da prefeitura do Rio de Janeiro e pelo olhar dos moradores envolvidos no processo de remoção da comunidade Pedra Lisa no morro da Providência - Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: ?, 2013?. 10 p -p.3

Imagem: Obra do túnel João Ricardo. Fonte: Arquivo Geral da cidade do Rio de Janeiro.

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1- CARLOS, 2012.- p.9

baixa renda foi expulsa para a zona portuária, ficando perto mas fora do centro. Este é considerado como o primeiro caso de gentrificação carioca.¹ O plano de remodelação do Rio de Janeiro, do político Pereira Passos, visava a higienização e a modernização da cidade, razão pela qual foram construídos novos eixos viários, com a abertura das avenidas Central, Rodrigues Alves e Beira Mar. Também foram criadas novas ferrovias e implantados novos bondes. A então conhecida como política bota abaixo

2- CARLOS, 2012.- p.9 Imagem: Sobreviventes da guerra de canudos. Fonte: Arquivo Geral da cidade do Rio de Janeiro

Imagem: Escadaria do Morro da Providência Fonte: Arquivo Geral da cidade do Rio de Janeiro

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assombrava moradores dos cortiços, que eram demolidos, obrigando-os a habitarem as áreas de encosta. Sendo assim, a política higienista de Pereira Passos, que visava o embelezamento e a higienização da maior cidade produtora de café do país, acabou por aumentar a população das favelas, que com o abandono do poder público, se tornou um problema na cidade do século XX.² As favelas eram vistas como locais de proliferação de doenças e abrigo de criminosos. Nessa época, o prefeito já apresentava certa preocupação em relação às mesmas, que sofriam frequente ameaça de remoção. Vê-se através de uma matéria de Everaldo Backheuse da revista Renascença, datada de 1905, essa preocupação em relação ao morro da Favela, onde ele afirma que providências seriam tomadas em relação aos casebres presentes no morro:

3- XIII SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA URBANA, 2013, Rio de Janeiro. Reformas urbanas, reurbanizações e o morro da providência: Os diferentes discursos ao logo da história. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro - Ufrj, 2013. 17 p.-p.16

“O ilustre Dr. Passos, ativo e inteligente Prefeito da Cidade, já tem as suas vistas de arguto administrador voltadas para a Favela e em breve providências serão dadas de acordo com as leis municipais, para acabar com esses casebres.”³ As ameaças de remoção não foram concretizadas, contudo até os dias de hoje elas não cessaram, como poderá ser visto ao longo deste estudo. Levando-se em conta a recém criada república e o Rio de Janeiro como sua capital, tornou-se fundamental a criação de um porto moderno. A escolha da área deveu-se à sua localização litorânea, sua proximidade com o centro e, ainda, à sua geografia caracterizada por enseadas que gozavam de bons ancoradouros, mais abrigados que os dos arredores do Castelo. A construção desse moderno porto causou o aterramento no litoral, a partir de parte do

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desmonte do Morro do Castelo, para a ancoragem dos navios, extinguindo aspectos característicos da região, resultando numa área plana de 175.000 m².¹ Assim, em 1920 a presença operária já estava consolidada na região. No final dessa década começam as discussões em torno do plano Agache, destacando-se a preocupação do mesmo em relação ao zoneamento das atividades, tendo em vista o aproveitamento do espaço em prol dos interesses burgueses. Sendo um plano baseado no conceito de cidade jardim tipicamente francesa, incluía obras de saneamento e de engenharia urbana e de tráfico. Este idealizava a remoção dos moradores dos morros e a construção de vilas operárias, retirando a população considerada nômade e com hábitos de higiene defasados, porém a remoção foi apenas uma ameaça.² Em 1937, surge o primeiro código de obras da cidade, onde consta o inicial reconhecimento das favelas. Ali elas são consideradas como feição indesejada e o código visa a melhoria nas habitações, proibindo a construção de novas moradias.³ Nesse contexto, e sob inspiração do plano Agache, no início da década de 1940 irrompe, na prática, a ideia dos parques proletários. O plano era atingir cerca de 300 mil pessoas e inicia-se a construção dos parques proletários do Caju, Gávea e Leblon. No entanto nenhum desses parques chegou a abrigar a população do Morro da Providência. Apenas em 1958 foi que, devido a um grande deslizamento provocado por uma explosão na região do Livramento alguns moradores do Morro da Providência foram transferidos para a vila operária do Caju. Estes parques acabaram por abrigar cerca de 4 mil pessoas e findaram devido à pressão advinda da especulação imobiliária.4 Foi também em 1940 que as atividades do porto entraram em seu apogeu, sendo responsáveis pela construção do Píer Mauá e da expansão do cais de Gamboa, aumentado o contingente de população ligada às atividades portuárias nos bairros de Gamboa, Saúde e Santo Cristo. Uma população carente, basicamente formada por estivadores, marinheiros, prostitutas e demais pessoas, em sua maioria negros, todos ligados direta ou indiretamente às atividades portuárias. Essa população se alojava em cortiços, estalagens 24

1- XIII SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA URBANA, 2013.p.8

1- CARLOS, 2012.- p.9

No ano de 1942 foi construída a avenida Presidente Vargas, formandose assim uma barreira física entre o centro e a região do Porto. Tal barreira contava com 80 metros de largura, um grande vazio desestimulador da presença do pedestre na travessia do centro em direção à zona portuária. Este fato aumentou a ocupação no Morro da Providência e na região portuária

2- KEHL, Luis,2010

2- CARLOS, 2012.- p.10

3- BORGES, Marília Vicente. O zoneamento na cidade do Rio de Janeiro: Gênese, evolução e aplicação. 2007. 223 p. Dissertação (Mestrado) - Curso de Planejamento Urbano e Regional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007.p.81 4- XIII SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA URBANA, 2013.p.9

e casas de cômodos no Morro da Providência, contribuindo para a paisagem social inaceitável para os padrões conservadores da elite da época.¹

em geral, já que foram demolidos cerca de 525 prédios para que a abertura da avenida fosse possível, agravando ainda mais a situação social na região.² Através dos fatos acima descritos, pode-se perceber a construção não só de um panorama histórico-social de descaso com as populações menos abastadas junto a frequente preocupação com a satisfação dos interesses da burguesia, como a construção de uma barreira social atrelada às barreiras físicas dos morros. A barreira física que implica na dificuldade de acesso aos morros foi aos poucos consolidando a barreira social, de tal forma que a população carente via-se obrigada a ocupar as áreas de morro, pouco valorizadas devido à essa dificuldade de acesso e à falta de urbanização. Além disso, o quadro de miséria presente nos morros do Rio de Janeiro muito incomodava as gestões e a elite que com suas políticas urbanas sempre buscavam uma maneira de remover essa população dos morros e expulsá-la para a periferia da cidade, livrando-se da vista da miséria. Também percebe-se a constante ameaça de remoção da população favelada, tratando-a como o problema e não a consequência das políticas urbanas da época. Em 1950 os moradores das favelas começam e se mobilizar e os movimentos sociais principiam a ganhar força. Diante disso, o Estado e a Igreja Católica começam a atuar mais fortemente dentro dessas comunidades, já que as correntes comunistas se encontravam em ascensão. É nesta década que pode-se perceber uma luta política contra as remoções, chegada de melhorias e a prestação de serviço social por parte da Igreja. Aparentemente, neste momento a favela começava a ganhar força política e vida comunitária.

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1- KEHL, 2010 -p.49

Imagem: Vista aérea do Rio com seus casarões antes da demolição para construção da Avenida Presidente Vargas Fonte: Arquivo Geral da cidade do Rio de Janeiro

2- XIII SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA URBANA, 2013, p.9

3- XIII SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA URBANA, 2013, p.9

4- XIII SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA URBANA, 2013.p.10 Imagem: Avenida Presidente Vagasfotografia de Claudio Lara

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Foi também na década de 1950 que foi criada a SERPHA (Serviço Especial de Recuperação das Favelas e Habitações Anti-higiênicas), instituição do governo municipal do Rio de Janeiro e ainda a Cruzada de São Sebastião, organização da Igreja Católica que servia como interlocutora entre poder público e favelados. Junto a isso, os moradores da favela criam a Coligação dos Trabalhadores Favelados do Distrito Federal, que negociava seus interesses junto ao Estado.¹ Posteriormente, em 1960, instaura-se a ditadura militar no Brasil e com isso todo o avanço social e comunitário conquistado pelos favelados começa a enfraquecer sendo os moradores obrigados a se submeter às ordens do Estado. Novamente, o poder público reprime novas moradias e os favelados passam a viver sobre frequente ameaça de remoções. No entanto, neste período não se limitaram apenas a ameaças, foram construídos conjuntos habitacionais, principalmente na zona oeste, para abrigar os habitantes removidos, se destacando a Vila Kennedy e a Vila da Aliança.² Com maiores facilidades na oferta de moradias, muitos inquilinos foram atraídos, todavia com a falta de controle urbanístico e social esses conjuntos habitacionais acabaram por se transformar em favelas. Mais uma vez a solução se tornou um novo problema e, ainda assim, continuavam a surgir novas favelas nas encostas.³ Neste período o Morro da Providência sofreu grandes deslizamentos. Em 1964 o fato se repete e moradores já ameaçados pelas políticas do governo militar são removidos dali. Porém, o maior desabamento veio a acontecer em 1968, quando 50 pessoas foram soterradas. Na época o laudo geotécnico apontava a necessidade da remoção de todos os barracos na região da Central do Brasil, até mesmo a capela do Cruzeiro (Nossa Senhora do Livramento) foi condenada, entretanto não foi removida na prática. Assim, após o desastre diversos moradores foram transferidos para conjuntos habitacionais na Cidade de Deus e na Fazenda do Coqueiro, localizada em Senador Camará.4 A partir de 1970 o Porto do Rio de Janeiro começa a apresentar sinais de obsolência, em especial o Cais da Gamboa. Suas atividades entram

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em decadência e, a partir disso, começam a surgir propostas de revitalização da área. Isso ocorre devido a transferência da capital federal para Brasília e dessa forma, não apenas a região portuária mas toda a cidade começa a sentir os reflexos econômicos e urbanísticos da mudança. Dentro desse contexto, a zona portuária adquire dois outros problemas: a obsolência e a subutilização.¹

Imagem - Vila Kennedy - Fonte: KEHL, Luís.

A qualidade de vida dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo havia sido comprometida pela falta de investimentos públicos e pela legislação de utilização e ocupação do solo permissiva à práticas incompatíveis com o uso residencial. Isso tornou a área vulnerável a processos de requalificação e gentrificação. Perante tal situação, a população tradicional do porto deixa a área e é substituída por uma população de menor poder aquisitivo.

1- CARLOS, 2012.- p.10

Consequentemente surgem diversas propostas de revitalização. Uma delas, merecedora de destaque, trata-se do projeto denominado RIOAPART, elaborado pela Associação Comercial do Rio de Janeiro, em 1980. O projeto propunha a verticalização brutal das tipologias de edifícios, visando uma renovação urbana plena dos 3 bairros da zona portuária. Ocorre que, tanto o contexto histórico social e econômico da região, quanto o conjunto arquitetônico existente era desconsiderado. O projeto visava atrair novos habitantes para o local, assim como novos investimentos, através do elevado gabarito das tipologias propostas e da substituição das atividades portuárias por outras mais rentáveis. A partir disso, ficou evidente a discordância entre os interesses do poder público, do capital imobiliário e da população residente.² A discussão sobre os problemas existentes na área é materializada através do evento denominado 1ª Quinzena de Debates Sobre o Bairro da Saúde, organizado pela AMAS (Associação de Moradores da Saúde), ocorrido em 1983, no centro cultural José Bonifácio. Este episódio discutiu a importância cultural da área, o transporte coletivo, a segurança, a educação, 28

as deficiências de estrutura urbana, a deterioração do bairro, entre outros temas abordados. Ficou claro para a opinião pública neste momento que a área possuía indiscutível valor cultural e ainda uma grande complexidade social, o que faria com que a recuperação fosse uma difícil tarefa para o poder público. A zona portuária chega ao século XXI com indiscutível potencial de valorização devido à proximidade com o centro da cidade, apesar do descaso público e da falta de articulação com os proprietários de imóveis da região junto a população residente e a prefeitura. A população de baixa e média renda faz parte do contexto histórico da região. Por isso, devido a esse período conturbado, sem medidas definidas, sempre pairou na área o risco de gentrificação.

1- CARLOS, 2012.- p.11

2- CARLOS, 2012.- p.11

2- CARLOS, 2012.- p.12

Em consequência do alarde criado pelas propostas do projeto RIOAPART, forças comunitárias se mobilizaram junto à AMAS, lutando em prol da conservação do patrimônio histórico da região, sendo uma das principais conquistas o projeto SAGAS, que inventariou o conjunto arquitetônico dos três bairros, expandindo o número de bens tombados na localidade. Isso desencadeou a proteção da região e também parte do centro, denominando este conjunto como área de proteção do ambiente cultural (APAC). Mesmo assim, a região continuou a se degradar, aumentando a área ocupada por favelas, a criminalidade e o arruinamento de edificações preservadas.¹ Em 1990, finalmente a prefeitura tomou uma atitude acerca da região, criando dois grupos de trabalho e uma câmara técnica. Diante de diversos debates ocorridos entre as partes interessadas, estabeleceram a criação da área de interesse especial urbanístico (AIEU), bem como uma lista de 15 bens protegidos pelos órgãos de tombamento e a assinatura de um protocolo de intenções entre a Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro e a Companhia das Docas (CDRJ).² Esta área, denominada área de interesse especial urbanístico, foi definida diante do interesse demonstrado por parte de segmentos representados nas discussões antes ocorridas, que viam na mesma um grande potencial econômico-financeiro perante à sua proximidade com o centro. Mas, o restante dessa região fica à mercê das leis turvas do 29


mercado imobiliário, possuindo um futuro duvidoso. Posteriormente, a Companhia das Docas e o Ministério de Transportes assinam um acordo, atribuindo à Prefeitura a escolha de um projeto, a ser executado dentre as propostas do Programa de Revitalização de Áreas Portuárias. O primeiro projeto selecionado foi o do Píer Mauá, em 1994, elaborado pela Companhia das Docas. Contudo nada disso teve continuidade, e sendo assim, a zona portuária novamente foi colocada em espera.¹ 1- CARLOS, 2012.- p.12

Imagem: Área de interesse especial urbanístico 1992. Fonte: CARLOS 2012

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A área atualmente passa por obras do plano de revitalização vigente, Porto Maravilha, que visa desenvolvê-la através de um mega evento esportivo, as Olimpíadas de 2016. No âmbito do projeto de preparação da cidade do Rio de Janeiro como cidade sede das Olimpíadas, o Morro da Providência passou por obras de dois programas municipais de reurbanização de favelas, o Favela Bairro - em 2000 e o Morar Carioca - em 2005, também inclusos na operação urbana Porto Maravilha.

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(MAR), ao lado da nova via Binário do Porto; o projeto de ampliação do antigo palacete Dom João VI do escritório carioca Bernardes e Jacobsen, este já concluído e aberto para uso; o Museu Olímpico; o Museu Portinari, projeto de Oscar Niemeyer e o AcquaRio, aquário da cidade

3. Porto Maravilha? Em 2009 o governo municipal do Rio de Janeiro, em uma parceria público-privada com o consórcio Novo Porto – que inclui em sua composição empresas como a Carioca Engenharia, OAS Construtora (Olivieri, Araújo e Suarez – Sócios da empresa) e Odebrecht Construtora, lançou uma operação urbana denominada Porto Maravilha, apoiada na lei municipal Nº 101/2009, que especifica sua criação. Tal lei tem como finalidade promover a articulação e requalificação dos espaços públicos da região, abrangendo uma área de 5 milhões de metros quadrados, tendo como áreas limítrofes as Avenidas Presidente Vargas, Rodrigues Alves, Rio Branco e Francisco Bicalho. A operação foi planejada avaliando-se a necessidade de reestruturação da área de interesse especial urbanístico na Região do Porto no Rio de Janeiro, visto que, devido à sua proximidade com o centro, passa a ser um atrativo para a expansão do turismo e dos negócios, junto a seus espaços vazios.¹ A proposta divide-se em duas fases, sendo que na primeira, para obras de infraestrutura urbana e conservação de espaços públicos, serão utilizados recursos municipais nas partes da área de interesse especial urbanístico que possuem maior potencial de valorização; na segunda fase, que engloba o restante da região portuária, o projeto não dispõe de recursos, esperando-se uma parceria da prefeitura com a iniciativa privada. Contudo, é justamente essa região sem recursos públicos a mais problemática do porto, visto que é aí que situam-se os Morros do Pinto e da Providência, assim como o Canal do Mangue, responsável pelo escoamento de águas pluviais da cidade.²

1- CDURP – Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro. Porto Maravilha. Disponível em: <http://www. portomaravilha. com.br/>. Acesso em: 10 set 2014.

2- CARLOS, 2012.- p.12

Dentre os projetos propostos para a fase um, destaca-se a tendência estratégica da prefeitura em criar um polo de entretenimento e de lazer em torno da Praça Mauá, com edifícios de uso cultural e similares, formando a partir da avenida Rio Branco, um corredor cultural, que finalmente ligará o porto à área central.³ Entre as obras propostas destacam-se o Museu do Amanhã - do arquiteto Santiago Calatrava, localizado no Píer Mauá, cuja construção já encontra-se em andamento e quase concretizada; o Museu de Arte do Rio 32

3- CARLOS, 2012.- p.13

Imagens de cima para baixo: 1- Perímetro da operação Porto Maravilha. 2- Setorização dos usos Porto Maravilha. 3- Porto Maravilha- Obras da fase 1. Fonte:www.portomaravilha.com.br

do Rio de Janeiro. Objetivando um crescimento econômico expressivo para a região, essa operação urbana conta, dentre suas principais obras, com a criação de 4,8 quilômetros de túneis, reurbanização de 70 quilômetros de vias e 650.000 metros de calçadas, reconstrução de 700 quilômetros de redes de infra estrutura urbana, implantação de 17 quilômetros de ciclovias, plantio de 15 mil árvores e a demolição do elevado da perimetral. Como principais serviços, encarregar-se-à da conservação e manutenção do sistema viário, áreas verdes e praças; manutenção e reparo da iluminação pública e calçadas; execução de serviços de limpeza urbana; implantação da coleta seletiva de lixo; manutenção e implantação de redes de drenagem e galerias universais; manutenção da sinalização de trânsito; instalação e conservação de bicicletários; manutenção e 33


1- CDURP – Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro. Porto Maravilha. Disponível em: <http://www. portomaravilha. com.br/>. Acesso em: 10 set 2014.

2- CARLOS, 2012.- p.13 3- TORRES, Bolivar. Museu a céu aberto. 2007. Revista Viva Favela. Disponível em: <httap://acervo. vivafavela.com. br/publique/ cgi/cgilua. exe/sys/start. htm?from_info_

Imagens da página ao lado, de cima para baixo: 1- Conversão da Perimetral em Via Binário do Porto. 2- Mapa de Mobilidade Porto Mavavilha. Fonte:www. portomaravilha. com.br 34

tocante a mobilidade urbana, serão construídas linhas de vlt, com estações de distância média de 400 metros, sendo 32 trens, cada um com capacidade média de 415 passageiros e o teleférico da Providência (já pronto), que liga a praça Américo Brum à Estação Central do Brasil e à Cidade do Samba.¹ O Poder Público prevê ainda a triplicação da população nessa região dentro dos próximos 10 anos, com a conclusão da operação urbana. Tal adensamento virá principalmente da ocupação e verticalização da avenida Rodrigues Alves, que será assim rapidamente ocupada por edifícios de gabaritos de mais de 30 pavimentos. As ações que poderiam ser benéficas à cidade são seguidas por outras extremamente sem lógica urbana, por exemplo, a demolição do elevado perimetral livra a cidade do bloqueio visual, porém existe a possibilidade de uma drástica verticalização da via através de um leilão público promovido pelos proprietários dos terrenos na região. Ocorre que estes edifícios bloqueariam a vista novamente, além do aumento do número de carros, gerando na malha viária local um grande impacto com consequências ambientais graves.² A obra do teleférico da Providência faz parte de um dos projetos do programa Morar Carioca, posterior ao programa Favela Bairro, ambos possuindo como escopo a urbanização de favelas. Essas iniciativas visavam trazer infraestrutura, criando espaços públicos, que através da interação cultural, tecnológica e econômica com o entorno urbano gerariam processos auto sustentáveis para o desenvolvimento da área. Inicialmente, com o Favela Bairro, houveram diversas iniciativas por parte da Secretaria Municipal de Habitação, como a criação do Museu a Céu Aberto, objetivando a requalificação do eixo histórico da favela para atrair visitantes. Para dar vasão à criação do museu, ocorreram ainda a restauração da Igreja Nossa Senhora da Penha (Capela do Cruzeiro); a pavimentação da rota turística, com eixo metálico guia; a reforma da escadaria de acesso ao morro, que possui 115 degraus, antes construída pelos escravos, possibilitando acesso ao morro, através da praça Américo Brum; tal rota inclui a passagem pela casa de Dodô Portela, em frente à citada praça; o Reservatório das Lembranças e o Oratório dos Republicanos.³ 35


1- CANEDO, Juliana. Intervenções urbanas em favelas: O arquiteto no processo coletivo de construção de transformação das cidades. 2012. 158 p. Dissertação (Mestrado) - Curso de Urbanismo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.p.64

Cinco anos depois, em 2005, a prefeitura volta ao Morro da Providência com o Programa Morar Carioca. Dentre as propostas da Secretaria de Habitação estavam previstas a melhoria e construção de novas habitações, reassentamento daquelas que se encontravam em áreas de risco para locais próximos à favela, reforma e ligamento das redes de infraestrutura, abertura de novas vias, construção do plano inclinado, do teleférico e de um centro esportivo e de desenvolvimento infantil próximo ao centro de assistência social e um centro de emprego, trabalho e renda.¹ O curioso, quando se trata dos programas de reurbanização vigentes na zona portuária e no Morro da Providência, são as contradições entre programas atuais, programas anteriores e a maneira como as coisas acontecem no local. Segundo Canedo, as redes de infraestrutura instaladas na favela nunca foram ligadas de fato, sendo que atualmente, necessitam ser reformadas em consequência da falta de uso. Canedo também destaca que, durante o programa Favela Bairro, a verba destinada à habitação foi muito baixa e que o programa previa a remoção de quase metade das habitações do morro, além do que muitos projetos não foram realizados por falta de verba.²

Imagem: Acima Perímetro da Favela da Providência. Fonte: Instituto Pereira Passos Ao Lado: Percurso Museu a céu aberto Favela Bairro. Fonte: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro 2- CANEDO, 2012.- p.66

3- CANEDO, 2012.- p.67 36

O projeto ainda instalou redes de água e esgoto, construindo também, na parte baixa da favela, uma creche e um centro de assistência social e ainda, na praça Américo Brum, uma quadra, que foi muito utilizada pelos moradores. Havia ainda inúmeras outras obras previstas, porém não realizadas, devido a ausência de verba.

Quando a prefeitura retorna com um novo programa, várias obras feitas anteriormente são jogadas fora para a realização de outras. A quadra da praça Américo Brum, por exemplo, foi demolida para se transformar na estação do teleférico, gerando grande revolta por parte dos moradores.Canedo afirma que segundo funcionários da Secretaria de Habitação não existe conservação das obras feitas no local por parte dos moradores, mas que por outro lado grande parte deles são despejados em função das mesmas, sem qualquer garantia de recebimento de novas moradias e que, além disso, a especulação imobiliária tira proveito, em função das promessas de melhorias, fazendo com que os alugueis e os valores dos imóveis subam.3Tal fato gera um sentimento de 37


Imagem: Antiga quadra da Praça Américo Brum. Fonte: CANEDO, Juliana.

Gráficos: Dados obtidos pelo relatório das favelas do instituto Pereira Passos.

Imagem Intervenções previstas no programa Morar Carioca. Fonte: CANEDO, Juliana. Serviços públicos: 1- Espaço de desenvolvimento infantil. 2-Centro de trabalho, emprego e renda. 3-Centro Esportivo e Eventos Melhoria e acessibilidade: 5- Plano Inclinado 6- Via da Grota 7- Via Dolores Pires 8- Teleférico Infraestrutura: 9- Área dos 60 10- Complementações diversas 11- Áreas de lazer Habitações: 12- 20 unidades 13- 58 unidades 14-131 unidades 15- 77 unidades 16-349 unidades

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Mapa: Unidades escolares do Porto. Fonte: Mapa digital da cidade do Rio de Janeiro- Instituto Pereira Passos Observação: Escola Municipal refere-se apenas a escolas de 1ª a 4ª série (ensino fundamental)

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Imagem: Divulgação do plano inclinado ao lado do teleférico. Fonte: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro.

Imagem: Protesto na antiga quadra da Praça Américo Brum. Fonte: CANEDO, Juliana.

Imagem: Teleférico da Providência em funcionamento. Fonte: CANEDO, Juliana.

Imagem: Protesto na Providência. Fonte: CANEDO, Juliana.

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Imagem: Mapa de remoções segundo as obras olímpicas. Fonte: FAUHABER, Lucas.

1- CANEDO, 2012.- p.67

descrença por parte dos habitantes do morro em relação às medidas tomadas pela prefeitura, contribuindo para a falta de apropriação dos espaços e ainda a conservação dos mesmos.¹Isso ocorre porque as decisões são tomadas de baixo para cima, ou seja, os moradores muitas vezes não são consultados a respeito das obras e medidas tomadas para a urbanização do território em que vivem, fazendo com que as soluções passem a ser ineficientes em seu dia-a-dia além de não haver apropriação por parte dos mesmos. Se for observado o caso do teleférico por exemplo, pode-se notar que a barreira física é um importante fator segregador nas favelas do Rio de Janeiro, mas essa obra implicou na retirada de um importante equipamento urbano do dia-a-dia dos habitantes da Providência - a quadra - sendo que a implantação do mesmo não foi tão eficiente quanto deveria, já que a maior barreira física existente - a escadaria, não foi vencida. O morador ainda necessita vencer os 115 degraus, independente da situação, esteja ele carregando compras de supermercado ou materiais de construção.

Mapa áreas de risco - Fonte: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro

Logo, sua rotina não mudou, pois este trajeto já era antes feito por meio de vans – iniciativa dos próprios moradores, as quais são muito mais eficientes que o teleférico, visto que essas são espaçosas e permitem o tráfego de mercadorias, coisas que a minúscula cabine do teleférico torna inviável. Ou seja, aparentemente o teleférico que liga a estação Central do Brasil ao morro,destina-se ao turista e não cidadão. Sem contar que não houve nenhum diálogo com a população durante as intervenções. Além disso, o projeto Porto Maravilha como um todo não é tão maravilhoso assim, aliás pode-se dizer que de maravilha não tem nada, já que é passível a ocorrência de graves transformações com relação ao quadro social e urbanístico da cidade. Excluindo completamente a possibilidade de debate com a população local, todas as ações parecem ser justificadas diretamente pelos mega eventos mundiais.

Alto Risco Médio Risco

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4.1. Botton up e as observações da primeira visita Para intervir nessas áreas complexas, o essencial é que as ações sejam tomadas de baixo para cima, tática conhecida como botton up, consistindo em um sistema de colcha de retalhos, para dar rumo a sistemas mais complexos, inserindo cada passo dado dentro de um sistema maior, observando, através dos relatos dos moradores, as potencialidades locais. Para calcular tais potencialidades e as necessidades da comunidade, tornase essencial vivenciar o dia-a-dia da favela e a maneira de viver e de ir e vir do morador. Assim foi realizada uma pesquisa de campo, cujo trajeto foi feito junto ao fotógrafo Cristiano Magalhães, colaborador da ONG Favela Arte, fundada pelo morador e também fotógrafo Mauricio Hora. Inicialmente embarca-se na van em frente ao supermercado da rua Sacadura Cabral, esquina com a rua Pedro Ernesto. Aqui, é válido observar que o morador sai do supermercado com suas compras e adentra a van, paga pela sua passagem e pelo espaço ocupado pelas suas mercadorias, somando assim duas passagens. Este não é único ponto de onde partem as vans, algumas saem de outros locais, como da estação Central do Brasil. A van só sai quando está totalmente cheia e, a partir dai ela começa a subir o morro, enquanto os passageiros conversam entre si, demonstrando grande intimidade: “Morreu a mãe do Betinho, você soube?”, “Ela já vinha doente a algum tempo né?”. A van passa pela Ladeira do Livramento, parando em frente à casa das pessoas. Ela não possui pontos de parada exatos e o motorista parece saber onde mora cada passageiro, por isso o trajeto depende muito de quem está presente. Ao chegar, o condutor desliga o motor, desce, abre a porta e ajuda o passageiro a descarregar suas mercadorias. As ruas são extremamente íngremes e estreitas e se algum carro vem no sentido contrário é necessário parar o veículo para manobrar. Apesar das habitações ao longo do trajeto possuírem um estado de conservação ruim, ainda não é considerado favela, ela acontece a partir da escadaria da praça 44

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Imagens: Ao lado, motorista da van ajuda moradora a descarregar. Abaixo, à esqueda: Comércios da Praça Américo Brum. Abaixo, à direita: Escadaria da Praça Américo Brum. Fonte: Acervo Pessoal.

Américo Brum,no final da Ladeira do Barroso, ponto final da van e estação do teleférico. O trajeto é possível apenas a pé a partir dali. No entorno da praça observam-se pequenos comércios locais, como bares e mercearias. Há grande movimentação no local e, em frente a estação do teleférico, existe um playground totalmente abandonado, contudo as crianças preferem correr em volta da estação ou brincarem sentadas no chão. A partir dali, outro morador acompanha também a visita - Diego Deus, que 1- JACQUES, Paola Berenstein. Estética da ginga: A arquitetura das favelas através da obra de Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2011. 136 p.- p.70

está aprendendo a fotografar junto a Cristiano e Maurício. Subir a escadaria é uma tarefa exaustiva e Diego ensina uma tática que caracteriza a maneira de fazê-lo do morador do morro: ao invés de fazer uma subida em linha reta, ele dá os passos na diagonal, fazendo uma espécie de zigue-zague na escada. Jacques descreve essa maneira de caminhar como ginga, o ritmo do caminhar diferente, imposto pelo percurso das favelas¹. Segundo Jacques: “a experiência de subir ou de descer uma favela reveste-se de uma percepção única, à medida que se passa pelas primeiras quebradas, descobre-se um ritmo de caminhar diferente, pois nunca se anda em linha reta por conta da forma em que se dão os becos e as viela e por sempre se tratar de um plano inclinado.”¹

No topo da escadaria está a Capela do Cruzeiro, com uma praça em frente e uma grande cruz de madeira. Reformada pelo programa Favela Bairro, a praça e a capela estão elevadas cerca de um degrau em relação ao percurso. Cristiano relata que antes desse degrau ser feito, era um hábito das crianças jogar futebol no terreno inclinado, mas agora a praça se encontra vazia, as crianças se aglomeram em frente à casa amarela, uma pequena edificação usada para reuniões e eventos após a modificação da praça. Nesse local também existe um pequeno mercadinho, torna-se perceptível que ali é uma centralidade do Morro da Providência. Na Capela do Cruzeiro dá-se o inicio do percurso turístico do Museu a Céu Aberto e olhando para o chão, percebe-se algo bem curioso: um eixo metálico guia feito pela Secretaria de Habitação ao longo de todo o eixo. Ele é exatamente o que Jacques descreve como fio de Ariadne, do 46

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Imagens: Ao lado, Playground da Praça Américo Brum. Abaixo, Capela do Cruzeiro. Fonte: Acervo pessoal.

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Imagens: Ao lado, Casa Amarela Abaixo, Comércio próximo a capela do Cruzeiro. Fonte: Acervo pessoal.

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labirinto mítico de Cnossos¹. O eixo metálico existe para que quem vem de fora não se perca dentre o emaranhado de becos e ruelas da favela, que formam um labirinto. Ali nada é planejado e os caminhos se dão ao acaso, o eixo existe para que o turista caso se perca, encontre a saída.

1- JACQUES, 2011- p.69

Como Jacques cita, numa favela de morro é mais fácil sair que entrar, já que a saída está sempre na parte baixa, portanto basta descer e, sendo assim, ao seguir o eixo metálico guia, basta o turista acompanhá-lo na descida

Imagens: Ao lado, Casa no Morro da Providência. Abaixo, à esquerda: Eixo Metálico guia. Abaixo, à direita: Espaço vazio próximo ao oratório. Fonte: Acervo pessoal.

para encontrar o fim.² Ao longo do percurso turístico observam-se diversos outros becos e vielas que o cruzam, e ao final de cada um, os pequenos espaços abertos ou novos becos são sempre uma surpresa. Ao contornar uma casa nunca se sabe o que haverá depois. As casas são, quase que em sua totalidade de alvenaria, sendo perceptível que as habitações estão consolidadas no local, porém em condições muito precárias.

2- JACQUES, 2011- p.69

A falta de infraestrutura e a precariedade das construções fazem com que as unidades adquiram a característica de fragmento, e em muitas é ainda perceptível a temporalidade de seus espaços, que vão crescendo conforme as possibilidades financeiras do morador, algumas possuem reboco parcial, sendo que o andar térreo é mais bem acabado que os andares acima. Outras possuem uma laje coberta sem fechamento. Após a Capela do Cruzeiro, passa-se pelo Reservatório das Lembranças, chegando em um dos mirantes construídos pelo Favela Bairro. Encontra-se ali uma grande quantidade de turistas fotografando a vista panorâmica da cidade, mas não há nenhum morador. Lá de cima vêem-se dois grandes terrenos, estacionamentos da empresa de ônibus São Silvestre, bem em frente à Estação Central do Brasil. É espantoso observar uma área imensamente vazia em meio à outra extremamente densa. Observa-se neste mirante muitos varais com roupas secando. Na favela, o espaço público serve não só para lazer, mas para atividades do dia-a-dia como consertar objetos, secar roupas etc. Após o reservatório, chega-se ao Oratório, onde existe um recuo um 50

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Imagens: Ao lado, Grafite no muro da Praça do Oratório Abaixo à direita, Espaço livre na Praça do Oratório. Abaixo à esquerda, Vista do terreno da São Silvestre da Praça do Oratório. Fonte: Acervo Pessoal.

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Imagens: Ao lado à esquerda, Escadaria que desce em direção ao centro de emprego e renda na praça do oratório. Ao lado à direita, Mesas de dama na praça do oratório. Abaixo, Mesas de dama na praça do oratório. Fonte: Acervo pessoal.

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pouco maior, formando uma viela mais larga em frente ao edifício. Ali também é possível encontrar alguns varais com roupas estendidas.

as moradias mais precárias, feitas em geral, de papelão e madeira. Segundo Cristiano, o acesso àquela parte da favela é bem complicado por conta do tráfico, não é muito seguro circular por lá. Da praça, avista-se outra imensa escadaria que acaba na cidade formal, próxima a alguns

Na parte posterior foi construída uma praça, com mesinhas de xadrez, relativamente extensa em relação aos demais espaços públicos existentes na Providência, encontrando-se bem em frente ao maior vazio existente na parte de baixo, onde estão dispostos os ônibus e um pequeno edifício administrativo da empresa São Silvestre. Apesar do espaço livre, não é perceptível o uso frequente da praça, nenhum varal e nenhum morador está por lá. Algum tempo depois, dois meninos passam por ali, porém sem permanecer, observam o movimento dos visitantes e saem. Ao lado do estacionamento, separada por um muro de arrimo, está a Favela da Pedra Lisa. Cristiano explica que ali é a área mais degradada da favela e que antes também era Providência, mas a Secretaria de Habitação registrou com um outro nome, para facilitar a identificação. Ele também relata que a área é alvo frequente de desmoronamentos e que ali estão 54

conjuntos habitacionais, a creche e o centro de emprego e renda.

Imagens:Acima: Deck construído pela SEHAB na face voltada para o Porto. Abaixo: Porto Olímpico. Fonte: Acervo pessoal

Dali, segue-se ainda no eixo turístico, rumo a um outro deck, este virado para o porto, de onde se avista boa parte da ponte Rio - Niterói. Nas proximidades existe um boteco, que possui um espaço interno maior e uma pequena estrutura de restaurante, com algumas mesinhas de plástico e uma mesa de bilhar dispostas no seu interior. Aos fundos do “boteco”, avista-se uma das obras do projeto Porto Maravilha - o Porto Olímpico. Diego conta que antes, a molecada do morro costumava andar de skate na área aberta existente, mas que agora a área é destino da estação de manutenção do VLT e, sendo assim, está fechada e o rolê de skate não é mais permitido.

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4.2. A laje da Jura e os fragmentos de Paola Já era metade do dia e horário de almoço. No Morro existe uma moradora muito famosa por seus quitutes e em especial, por seu nhoque de camarão: a dona Juracir. Dona Jura, como é mais conhecida, é moradora do morro desde pequena e relata que sua família veio de uma outra favela em Natal - RN, chamada de Brasília dos Teimosos: “Sou favelada desde que nasci”, diz com um sorriso tímido. A espera pelo almoço é acompanhada de uma conversa bem longa, Cristiano aproveita para grava-la para um dos vídeos da Favela Arte.

1- JACQUES, 2011. p.51

2- JACQUES, 2011. p.53

Entre o vai e vem de conversas, Cristiano pergunta sobre o teleférico, dona Jura diz que para ela o teleférico foi bom, pois assim pôde expandir seus negócios, já que o acesso para turistas foi facilitado, porém, por outro lado lamenta as remoções. Quando fala sobre seu restaurante, uma nova laje construída em cima de sua casa, percebe-se o processo de crescimento fragmentário da habitação na favela: Juracir conta que inicialmente, construiu o local onde hoje é a cozinha e, aos poucos expandiu para o cômodo da frente, onde hoje é a sala de TV. Depois, fez um puxadinho na frente, onde fica a varanda. Posteriormente, fez a laje de cima, onde existe uma pequena sala e dois quartos. Quando começou a ter mais demanda de quentinhas, passou a participar de projetos do SENAI, cozinhando em feiras e festivais de comida e ganhando diversos prêmios. Porém suas habilidades faziam inveja em outras cozinheiras e, cansada de tal rivalidade, resolveu juntar algum dinheiro para bater uma nova laje na parte de cima de sua casa. Quando conseguiu uma quantia significativa, construiu sua laje nova, um grande salão com vista para o mar, local este que recebe diversos visitantes. De início, a ideia do primeiro cômodo era de abrigo, não constituía uma habitação já formada. A moradora necessitava de um lugar para se abrigar, enquanto conseguia maiores recursos para expandir sua moradia. Segundo 56

Jacques, “o fragmento proclama o silêncio e uma verdade sempre interna, dentro de si mesmo. Seu espaço é o do não lugar, o lugar do meio, o local deslocado, em suspensão, transitório, em construção.”¹. É esse o caso da casa de Juracir, desde o início e até hoje, a cozinha não era cozinha quando foi construída, ela era o abrigo inicial, depois veio o cômodo da sala, que também não assumia essa função quando foi levantada. Jacques afirma que: “temporalizar a arquitetura não é necessariamente uma atitude formal - uma arquitetura fragmentária não é forçosamente uma arquitetura fragmentada em sua forma, ao contrário, a forma continua a ser uma figura espacial, quer dizer, ainda uma maneira de espacializar o tempo.” ²

Observa-se que essa característica transitória da casa de Juracir não está hoje presente nos espaços. Ao adentrar a residência não se percebe que o espaço foi sendo modificado, a não ser pela parte do restaurante, onde é necessário passar pelos quartos para acessar a escada. Os espaços sala, quarto, cozinha são como de qualquer casa da cidade formal.

3- JACQUES, 2011. p.59

No entanto, o crescimento da casa está diretamente ligado ao tempo, cada espaço muda conforme o tempo passa e as possibilidades e necessidades do morador se expandem. É isso que diferencia a ideia do habitar e do abrigar. Uma habitação possui um planejamento de antemão, uma planta preestabelecida, um projeto e ainda um terreno com limites. De acordo com Jacques, os arquitetos têm como hábito espacializarem o tempo, dando função ao espaço de acordo com aquilo que acontece ali, já os favelados temporalizam o espaço, através da bricolagem.³ A bricolagem é a ideia do incidente, de ir reunindo partes uma a uma ao acaso para formar o todo. Nunca se sabe o que vai ser encontrado, como vão se dar os acontecimentos, por isso a ideia formal de projeto é impossível. A laje da Jura foi feita num processo de bricolagem, sendo construída na ocasião em que sua dona necessitou de um espaço para abrigar sua atividade comercial. Contudo, quando começou a levantar seus primeiros tijolos, ela não planejava ter um restaurante no local, o que explica a circulação por dentro de sua residência. 57


Imagens:Acima, Escada de acesso Ă laje da Jura. Abaixo, Laje da Jura. Fonte: Acervo pessoal

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Imagens:Acima, Diagrama de crescimento das casas na favela. Fonte: JACQUES, Paola.Abaixo, Vista da laje da Jura. Fonte: Acervo pessoal

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Assim, este acaso trata-se de um acaso objetivo, para solucionar um problema que chega. Portanto, pode-se concluir que, se a demanda do restaurante na laje de Dona Jura aumentar, sua casa fragmento irá crescer, havendo a possibilidade dela acrescentar mais uma laje ou de que essa cresça na forma de puxadinho, para dar lugar a um outro salão e assim resolver seu problema.

Imagem: Rapazes sobem a escadaria carregando compras. Fonte: Acervo Pessoal.

Contando das necessidades do morro, Juracir relata ainda que a obra do plano inclinado havia sido cancelada, porém não soube explicar o motivo. Nesse contexto, conta que necessita fazer uma pequena reforma em seu domicílio, pois o reboco está caindo, mas que é preciso economizar um pouco mais, visto que, além da compra dos materiais, é preciso pagar alguém para subi-los. Ela também fala sobre a coleta de lixo. Aliás, durante todo o percurso é possível notar uma grande quantidade deste espalhada pelo chão, sendo muito comum o uso de placas em frente as casas com a frase “não jogue seu lixo aqui”. A moradora conta que por diversas vezes entrou em conflito com os vizinhos, porque depositaram resíduos na porta de sua casa. Para fazer o descarte do lixo é necessário descê-lo até os limites da cidade formal. Saindo da residência de dona Jura, entre o emaranhado de becos da favela, observa-se uma casa cuja situação de crescimento é bastante interessante. Tal casa forma uma espécie de cômodo-ponte por cima da ruela: aparentemente, aquela parte cresceu depois e, por algum motivo, mantiveram o caminho existente. Assim, a casa cresce por cima e continua do outro lado. Desta forma é perceptível o caráter fragmentário no desenvolvimento da habitação no local. Na descida, vem subindo dois rapazes com grandes caixas nos ombros, a expressão de cansaço muito presente no rosto dos mesmos, que param no meio do percurso para descansar. A escadaria é a barreira maior, porém até chegar à praça posterior ao oratório, ainda podem-se encontrar algumas escadas, pois a cota maior é a +115 , um pouco acima da cota do oratório, 112 metros.

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Durante a volta, passa-se pela praça Coronel Assunção, onde durante os finais de semana acontece uma feira de artesanato e alimentos. Passando rapidamente por ali, percebe-se a venda de alguns produtos de madeira e tapeçaria. Sobre o entorno no entanto, é notável tanto no percurso de ida quanto de volta, que estão presentes muitos vazios, ruínas e edificações num estado bem ruim de conservação, sendo também abrigos de entroncamentos de viadutos muito próximos à favela, as calçadas em geral são estreitas, consequentemente não existe um incentivo no que diz respeito à circulação de pedestres mesmo na cidade formal apesar de se tratar de uma grande capital dominante no país.

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5. Considerações sobre a visita e a captação de demanda do território A visita de campo é essencial para a conclusão de que a maior necessidade da população do morro é um sistema de transportes eficiente no dia-a-dia, não apenas para transporte de passageiros, como também para possibilitar a execução de tarefas rotineiras. Existe ainda, como em todo território informal, uma grande demanda de espaço público,visto que a proximidade das casas não deixa espaço residual para áreas de convivência em geral. Devido a riqueza cultural da região, também há potencialidade turística e cultural no Morro da Providência: produtos alimentícios e artesanais são um ponto forte de produção por parte dos moradores, sem contar o grande potencial desenvolvido por Maurício Hora no que diz respeito a fotografia. Este artista, nascido e criado na Providência, ganhou uma câmera fotográfica ainda pequeno, e hoje já fotografa para grandes jornais e revistas, como o The New York Times. Maurício promove diversos workshops de fotografia pelo morro e possui uma bibliografia em quadrinhos, ilustrada pelo cartunista André Diniz, onde conta sua história e a da favela. A ONG Favela Arte vai além das fotos, ali são reunidos diversos tipo de arte, como pintura, grafite, artes cênicas, música. A cooperativa promove também discussões acerca das intervenções no morro, além de lutar contra processos de gentrificação, potencializados pelo incentivo do turismo na região e participam de uma cooperativa junto a outros incentivadores da educação e cultura do porto, a Zona Imaginária- Cooperativa de Artes Visuais.

Imagem: História da vida de Maurício Hora em quadrinhos pelo cartunista André Diniz.

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A quadra removida para a construção do teleférico, como já antes relatado, sempre foi muito usada pelos moradores. As necessidades no morro são muitas, no entanto, como panorama geral da visita, pode-se concluir primeiramente, que a demanda social não se trata apenas do morro, mas da zona portuária em geral: região pobre e historicamente abandonada pelo poder público, abriga em toda sua região uma população de baixa renda que necessita de espaços de lazer, cultura e desenvolvimento social. 63


É impossível deixar de notar que o Morro da Providência possui uma localização privilegiada em relação à questão da mobilidade urbana, localizando-se próximo ao polo central do transporte sobre trilhos, a estação Central do Brasil, existindo uma grande potencialidade de conexão entre essa estação e o morro. Contudo, esta conexão necessita ser realizada de maneira eficiente, tanto no quesito transporte de passageiros como de mercadorias de pequeno e médio porte, facilitando a rotina do morador do morro, além das questões de saneamento. Faz-se necessário desenvolver um meio de transporte onde a descarga de lixo seja facilitada.

Imagens: Divulgação de cursos no Morro da Providência. Fonte: Facebook da Ong Favela Arte.

Com o projeto Porto Maravilha e as estações VLT, que são construídas não só ao lado do morro, voltado para o centro da cidade, mas também do lado do porto, o potencial para o desenvolvimento de um sistema de transporte aumenta. Apesar da Secretaria Municipal de Habitação ter criado alguns decks e praças na Providência, não existe qualquer apropriação desses espaços por parte dos moradores. Uma conexão de subida e descida do morro com embarque e desembarque nos mesmos, pode ser um fator potencializador.

Imagem: Traçado vo VLT. Fonte: www.portomaravilha.com

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Não existem meios concretos de pensar em uma organização e um entroncamento rígido desses espaços, a melhor tática é deixar esses locais de embarque livres para que neles ocorram relações diversas, uma vez que as relações na cidade acontecem de forma espontânea, de acordo com Alexander, em forma de semi-treliça, formando mais ligações do que o arquiteto é capaz de prever.¹ Os sistemas de transporte desembocando em espaços públicos apenas é capaz de garantir que aquele espaço terá um grande fluxo de passagem de pessoas, porém os meios de apropriação do local só poderão ser definidos pelos próprios usuários, sendo que quem os projeta não é capaz de descrever as relações que o usuário terá com o mesmo. Cabe então escolher espaços seguindo critérios construtivos e espaciais, além do que diz respeito a relações sociais específicas que poderão ocorrer ali e, sendo assim, observa-se atividades que já acontecem, dando meios para que relações diversas ocorram. A escolha do primeiro ponto captador do fluxo de subida e descida do favelado fica clara quando se 66

chega praticamente ao cume do morro, e se observa lá de cima os dois imensos vazios deixados pelos estacionamentos da empresa São Silvestre, em meio aos emaranhados de becos e domicílios da favela. É evidente que qualquer um daqueles terrenos ocupados por ônibus possuem um grande potencial para uma área de lazer que atenda a população carente não só do morro, mas da região portuária no geral, sendo que ambos localizam-se bem próximos ao grande polo de mobilidade, a estação central. A opção por utilizar o terreno mais próximo à praça do Oratório se dá porque ali se consegue um maior número de relações com diversas áreas do morro devido ao perfil da rocha.

1- ALEXANDER, Christopher. A city is not a tree. Design: Council of Industrial Design, Londres, n. 206, 1966. 17 p.- p.3

Com relação ao sistema utilizado como transportador, ele deve ser criterioso e é um ponto a ser estudado com calma. É complicado eleger, dentre os diversos meios de transporte, aquele que é o mais eficiente quando se trata de um território com uma riqueza de relações tão complexas como as existentes na favela. A questão é que o cérebro humano é incapaz de pensar em uma 67


1- ALEXANDER, Christopher.- p.8

estrutura como a que Alexander chama de semi-treliça.¹ A cabeça humana só é capaz de espacializar relações num sistema de árvore, ou seja, quando se pensa em um sistema, ele se trata de uma série de relações pertencentes umas às outras pelo fato de trabalharem juntas. Ao cooperarem entre si, essas relações formam ligações umas com as outras. A estrutura de árvore parte do pressuposto de que essas relações ocorrem uma única vez, entre um elemento A e um elemento B, que por sua vez fará a próxima relação com o elemento C e assim sucessivamente.

2- ALEXANDER, 1966. - p.13

3- JACQUES, 2011. p.80

Imagens: Ao lado: Semitreliça vs Árvore. Abaixo: Estrutura de semitreliça. ALEXANDER, Chistopher.

Porém, Alexander acredita que as cidades naturais, ou seja, aquelas não planejadas, tem vida própria e são capazes de formar um número de combinações muito vasto de ligações entre diversos elementos, em grande ou pequena escala, sem condições restritivas. Este sistema é nomeado semi-treliça. O autor defende que “em cada cidade há milhares, até mesmo milhões de vezes mais sistemas em funcionamento, cujos resíduos físicos não aparecem como unidades nesses esquemas em árvore.”² Isto porque, nas relações socias das sociedades abertas não existem grupos totalmente fechados, a realidade da sociedade contemporânea é virtualmente composta por uma infinidade de sobreposições de relações sociais. Pois bem, o que é uma favela, se não o exemplo mais puro de uma cidade totalmente natural e espontânea? Ela é cheia de sobreposições de relações físicas, espaciais e ainda sociais. A proximidade das casas devido ao tecido rizomático - definição de Jacques para a maneira de crescimento da favela³ - faz com que as relações entre vizinhos sejam muito mais próximas e complexas que na cidade formal. Elas são mais complexas que as cidades naturais, por conta deste constante processo de transformação, que nunca cessa. O diagrama de relações da favela é mais denso que o sistema de semi-treliça, porque seu espaço está sempre em movimento, sem nenhuma matemática ou planejamento. O tecido da favela é um labirinto sem um autor definido, de forma que esse tecido possui diversos autores e assim, o sistema de bricolagem vai formando e modificando o esquema de organização desses locais.

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Imagens:Ao lado à esquerda, Beco na Favela da Providência. Ao lado à esquerda, Escada na Favela da Providêcia. Abaixo, Emaranhado de casas da Favela da Providência. Fonte: Acervo Pessoal

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O espaço da favela é o espaço-tempo. O rizoma, diferente da árvore, não se trata de um sistema e sim de um processo, por isso a tática usada na construção de uma área destinada a lazer, cultura e esporte obviamente tem espaços e programas definidos, porém algumas áreas devem ser destinadas à apropriação da população de forma que os usuários sejam capazes de desenvolver suas próprias atividades. A instalação resultante deve atrair a comunidade, visando o bem estar físico e a cultura, criando um denso centro social. 1- BRILLEMBOURG, Alfredo; KLUMPNER, Hubert. SLUM lifting: ferramenta informal para uma nova arquitetura. In: ROSA, Marcos L. (Org.). Micro planejamento: Práticas urbanas criativas. São Paulo: Editora de Cultura, 2013. p. 198-211.p.204

Espaços estes abertos e livres, oportunos para que a cultura coletiva aconteça sem empecilhos programáticos. Onde o único programa existente é a sombra da árvore para proteger o usuário do sol quente do Rio de Janeiro. Neste caso, como o princípio principal do projeto a ser desenvolvido é a conexão, o essencial é eleger um sistema de transporte e, através do edifício, propiciar o máximo de conexões possíveis entre as partes do morro e ainda, trazer a infraestrutura básica para este espaço, fornecendo meios para que o território se desenvolva. Em Santa Cruz Del Este por exemplo, em Caracas, a instalação do primeiro vertical reduziu o crime na área em 30%.¹

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1- BRILLEMBOURG, 2013- p.206

2- TOWNSEND, Alastair. On the Spline: A Brief History of the Computational Curve. Disponível em: <http://www. alatown.com/ spline-historyarchitecture/>. Acesso em: 3 abr. 2015.

3- TOWNSEND, Acesso em: 3 abr. 2015.

5. Primeiros experimentos de projeto Considerando a análise da situação atual do Morro da Providência , é constatado que se faz extremamente necessário trabalhar em três dimensões para compreender a topografia e espacializar qualquer tipo de edifício no local. Segundo Brillenbourg e Klumpner, a densa planta de uma favela segue uma lógica baseada na topografia, onde suas morfologias exigem meios totalmente novos para entender a lógica subjacente. O declive é crucial para projetos de assentamentos informais.¹ Com isso utiliza-se a modelagem paramétrica atráves de Rhinoceros e grasshopper para desenhar todo o terreno do morro. Rhinoceros é um software de modelagem 3d desenvolvido pela empresa McNeel onde se trabalha com o sistema NURBS de modelagem (Non Uniform Rational Basis Splines). Esse sistema se diferencia das ferramentas CAD pois as curvas são desenhadas por pontos de controle fora delas, assim como nas superfícies, sendo que esses pontos de controle influem na orientação das mesmas.² Superfícies NURBS são funções de dois parâmetros mapeados para uma superfície tridimensional e a superfície é determinada pelos pontos de controle. Isso possibilita uma representação de formas geométricas de maneira compacta sendo eficientemente moldadas por programas de computador permitindo uma fácil interação com o utilizador, pois quando se liga esses pontos de controle o usuário vai, em tempo real, esculpindo a superfície através deles. O sistema NURBS foi desenvolvido pela indústria automotiva na década de 50, pois era necessário forma mais livre para o desenho de chasis de automóveis, porém só tornou-se um software em 1993. De maneira geral, é possível ser dito que editar curvas e superfícies nesse sistema é altamente previsível e intuitivo, pois os pontos de controle estão sempre conectados diretamente ou agem como se estivessem. A divisão de uma superfície se dá em partes chamadas patches,e essas, para uso dos pontos de controle, devem estar todas juntas, de forma que suas fronteiras sejam visíveis.³ Sendo assim, as superfícies são entendidas como pontos num espaço

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que pussui três eixos, podendo ser representadas por funções, e também alteradas por derivadas, o que as torna paramétricas. Considerando esse sistema de representação, é possivel entender como o Grasshopper funciona. A partir desse tipo de representação matemática de linhas e superfícies, o plugin do Rhinoceros trabalha tanto com ferramentas de modelagem quanto com parâmetros de construção matemática como função, matriz etc.

Obviamente, não é possível saber cada ponto da superfície terreste, o que se sabe é a localização de alguns pontos. A partir do levantamento dos níveis em autocad, obtido através da Prefeitura Municipal, é possivel capturar os pontos do terreno em três dimensões no Rhinoceros. Quando se abre o Grasshopper dentro do Rhinoceros, a área de trabalho passar a ter duas janelas, a de modelagem no Rhino e a de desenvolvimento do algorítmo no Grasshopper, chamado canvas. Assim, ao se iniciar a modelagem paramétrica, os pontos presentes no Rhinoceros são trazidos para dentro do canvas.

Dessa maneira, é possível manipular uma geometria a partir de sua localização espacial, utilizando suas coordenadas espaciais (x,y,z) como base. No Rhinoceros não necessáriamente trabalha-se apenas com superfícies. É possível também trabalhar com modelagem em formato de redes mesh. A mesh é outra forma de construção da superfície no plano, sendo que seus polígonos são criados um por vez para compor o todo, formando uma rede.

Uma vez que esses pontos passam a existir dentro do canvas space, foi utilizada a ferramenta delaunay mesh. Delaunay é um sistema matemático de triangulação, desenvolvida pelo matemático Bóris Delanay, e é exatamente essa função que assume dentro da modelagem. Para cada ponto existente no espaço é traçado uma circunferência, que é considerada como uma esfera, em outras palavras, existe um triângulo inscrito dentro de um círculo na três dimensões, qualquer que seja a orientação no eixo z, esses pontos do triângulo se ligam formando uma malha.

Um terreno trata-se de uma superfície em duas dimensões (X,Y) que possui uma propriedade especial em relação à terceira dimensão (eixo z), todas as linhas verticais estão encontradas com outra no espaço, formando uma malha toda cruzada. A partir delas é possível que os pontos de construção das curvas no espaço sejam extraídos.

Imagem: triangulação Delaunay. Fonte: UTRECHT UNIVERSITY.

Imagem: Triangulação Delaunay. Fonte: PETERSON, Samuel.

A linha formada pelos pontos A e B são uma parede deste triângulo, e existe um círculo que passa por eles, portanto, existe um ponto C, diferente de A e diferente de B, por onde o círculo também passa, sendo um dos vértices do triângulo. O ponto C também estará inserido em outros círculos, formando triângulos com outros pontos. A partir do componente de inserção dos pontos (point), que traz os dados dos pontos obtidos através das curvas do levantamento da prefeitura

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Imagem: Triangulação Delaunay. Fonte: PETERSON, Samuel.

para dentro do grasshopper, faz-se uso do componente Delaunay Mesh e assim triangula-se os pontos obtendo então uma malha que forma o terreno em três dimensões.

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Imagem: Terreno Modelado em Rhinoceros

Uma vez modelado o terreno, foi possível fazer uma maquete em corte a laser com cortiça, extraindo as linhas de contorno do modelo no eixo z.

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O ensaio inicial do projeto visa a inserção de um centro comunitário convecional atrelado ao sistema de plano inclinado ou funicular, muito utilizado em favelas do Rio de Janeiro - como em Santa Marta, e em Salvador - o plano inclinado do Gonçalves. Um funicular é um sistema formado por cabos circulando sobre trilhos. São dois carros puxados por cabos de aço, em geral uma linha única subdividida em duas ou mais, movida por tração elétrica. No Brasil existem diversas cidades que aplicam esse sistema de transporte, assim como em outros lugares do mundo. As estações costumam variar de 50 a 300 metros,com o carro circulando em geral a uma velocidade de 1,5 m/s, seguindo uma inclinação uniforme. Uma cabine é capaz de transportar cerca de 8 pessoas por viagem, algumas sentandas e outras de pé totalizando uma média de 200 pessoas por hora. A porta do carro corre para o lado, o sistema engloba uma estação de embarque com cerca de 30m², possuindo espaço para trânsito, sala do operador e do painel de comando e bilheteria.

Imagens: Detalhamento de plano inclinado. Fonte:COLIN, Silvio

Imagem: Estudo da força do plano inclinado.

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O sistema motriz é composto por uma polia V de grande diâmetro (1200mm no geral), feita de aço estrutural de grande resistência, puxada por cabos de tração, o movimento acontece devido a um contra peso.

Diagrama de funcionamento e implantação de plano inclinado. Estudo desenvolvido.

Em virtude da habitação consolidada no Morro da Providência, em que predominam casas de alvenaria, imagina-se que a força e impacto comunitário possa ser um fator impulsionador do programa que atenderia às demandas mínimas, resgatando a quadra retirada para a colocação do teleférico, abrindo certo espaço para o desenvolvimento das atividades culturais existentes e ainda dando impulso para a integração social. Com o desembarque de passageiros junto ao centro, imaginase uma captação da demanda através do sistema de transportes. Dentro deste contexto, seria necessário retirar as pessoas da área de risco, redistribuindo as famílias no mesmo terreno do funicular. Para o desenvolvimento deste centro comunitário foi realizado um estudo volumétrico, com intuito de espacializar o diagrama de bolhas e pensando-se ainda em uma maneira

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de adequar o programa à topografia. Modela-se caixas vinculadas a cada uso do programa, com comprimento, largura e altura adequada. Feito isso,são espacializadas algumas opções do diagrama de bolhas junto à inserção no terreno eleito visando o mínimo de corte e aterro. Dentre tais opções uma é escolhida para que seja espacializada com lajes. Posteriormente, é analisado o fluxo gerado por esse estudo. A ideia foi abandonada devido a tais fatores: em primeiro lugar quando nota-se que o mesmo acaba ficando estrangulado no terreno pequeno e se a ideia é de estender o espaço público, esse edifício faz exatamente o contrário, consumindo uma das maiores área abertas da favela e ainda aumentando sua densidade. Em segundo lugar, considerando a área de 25 mil m² na parte baixa, seria viável ou justo manter as densidades dessa maneira, entregando o terreno enorme para algumas famílias e estrangulando o projeto na parte de cima? Esse questionamento muda completamente o direcionamento dos experimentos. A observação da enorme parede que nunca será ocupada faz surgirem novos desafios para o edifício a ser proposto. Com relação a ideia do funicular, é abandonada depois de uma conversa com os fabricantes e um estudo da implantação. As inclinações da topografia dificultavam a chegada do mesmo na pracinha do Oratório, implicando na remoção de diversas casas. Observando a implantação, com foco no exemplo de Santa Marta, foi constatado que os trilhos são inseridos entre as casas, que passam a margear o trajeto. Assim como a inserção de metrôs na cidade formal,o problema desse tipo de implantação é que constróise uma barreira por onde passa o trilho. O Morro da Providência já é cercado 82

Fluxos existentes Áreas Verdes Ônibus

Fluxos gerados Habitação Comércio Edifício Funicular

de barreiras em seu entorno, como viadutos e os trilhos da estação Central do Brasil. Além disso, seria necessário construir uma estrutura para a chegada do funicular no local desejado, elevando-o ao longo do terreno da São Silvestre. Considerando tais fatores, conclui-se que esta mesma estrutura pode ser melhor aproveitada de outra maneira, criando percursos mais interessantes. Foi cogitada a possibilidade de inserção de um VLT, sendo abandonada quando se descobriu sua inclinação máxima - 8%. Sobre o programa,cogita-se o desenvolvimento de um planejamento que atenda todo o entorno e não apenas a Providência Para um estudo mais detalhado foi feita uma nova visita ao local.

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6.1. Segunda visita e novas perspectivas A segunda visita traz um panorama geral da área mais abrangente, pois durou cerca de dois dias, O percurso começa na rodoviária Novo Rio, seguindo de transporte público até a rua Pedro Ernesto para encontrar Cristiano Magalhães. A partir dali, segue-se para o MAR - Museu de Arte do Rio, para uma percurso guiado pelos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo. Durante a visita vê-se uma região originalmente ocupada por escravos e trabalhadores, percorrendo locais como o antigo cais do Valongo, por onde ocorria a entrada dos escravos e, a posteriori, de imigrantes. Lugar esse que foi, mais tarde, substituído pelo cais da Imperatriz, numa tentativa de apagar a história do antigo porto, que recebeu mais de um milhão de africanos. Fica óbvio que a região forma um grande cinturão de pobreza em torno do centro do Rio de Janeiro e se, ao mesmo tempo esse fator agrava a situação, pode ser visto como uma grande potencialidade no que diz respeito ao uso do equipamento a ser projetado. É nesse momento que surge a necessidade do desenvolvimento de um equipamento em uma escala maior, capaz de atender não só a população da favela, mas que esteja aberta para escala macro. Outra questão importante aparece enquanto se visita a Pedra do Sal: ali nota-se uma escadaria esculpida em pedra bruta, denominada gnaisse facoidal ou Augen gnaisse, sendo ela muito dura, de onde se origina o granito, utilizada na cidade do Rio de Janeiro para o desenvolvimento de fachadas, pisos, entre outras coisas. A escada esculpida na Pedra do Sal explicita indiretamente a potencialidade da grande parede da antiga pedreira São Diogo (terreno da São Silvestre), parede esta que nunca seria ocupada. Vem neste momento o primeiro vislumbre de um edifício abrigando grandes equipamentos esportivos, culturais e de integração social ao longo da mesma, sendo este o abrigo não só de usos propícios para a região mas dono de possível ponto turístico devido à arquitetura do edifício.

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Imagem: Pedra do Sal. Fonte: Acervo Pessoal

Imagem: Cobertura Museu de Arte do Rio. Fonte: Acervo Pessoal

Imagem: Morro da ProvidĂŞncia visto do Morro da SaĂşde. Fonte: Acervo Pessoal

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Após a visita guiada, foi percorrido o trecho do entorno da Estação Central do Brasil: a miséria ali é explicita. As edificações encontram-se num péssimo estado de conservação e a sensação de segurança na parte baixa é muito menor que dentro da própria comunidade. Na entrada do terreno e da favela da Pedra Lisa defronta-se com a parte mais degradada, a situação ali é bastante delicada e o muro que separa o estacionamento da comunidade passa uma impressão terrível de segregação. A dimensão do terreno é impressionante, e a reflexão em torno da importância de um estacionamento naquele local fica ainda mais intensa. De lá segue-se para a parte do morro voltada para o porto, área tradicionalmente ocupada por estivadores e trabalhadores , que de suas casas observavam a chegada e saída dos navios para ver quando teriam que por a “mão na massa”. Fica nítida a importância daquela face do morro, e supõe-se a necessidade não só de um único meio de transporte mas de um sistema que, como na cidade formal, atenda diversos pontos.

Imagens:Acima à direita,: Demolição do Elevado Perímetral. Acima à esquerda, Túnel da Via Binário do Porto. Abaixo à direita, Entrada do terreno da São Silvestre. Abaixo à esquerda, Rua Senador Pompeu. Fonte: Acervo pessoal

Depara-se no meio do caminho com uma moça grávida na companhia de um menino pequeno, ela fala um pouco sobre a luta da população em torno do projeto Porto Maravilha, o qual ela intitula Porco Maravilha – “isso aqui alaga tudo quando chove muito, e eles tão fazendo túnel, chegam aqui descendo porrada no povo da favela, e sai nos jornais e revistas que tão aqui pra melhorar as coisa pra gente, nóis coloca fogo em tudo, entra em conflito com a polícia. Eu num tô nem ai, eu sou anarquista sabe? Não vou sair da minha casa.” Chega-se à Via Binário do Porto, de onde vêem-se algumas partes da Perimetral, ainda em estágio de demolição. A obra milionária, com intuito de criar um polo de entretenimento naquela região, ainda que às custas da população pobre se torna mais lamentável com a presença de uma joalheria de luxo ao lado do futuro Museu do Amanhã, no Pier Mauá. A necessidade de reflexão em torno do tipo de turismo e de como escreve-se essa nova história do Rio de Janeiro fica agora enraizada no

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Imagens: Acima,Comércio na Rua Senador Pompeu. Abaixo, Rua Senador Pompeu. Fonte: Acervo Pessoal.

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Imagens:Acima à direita, Barreira entre a rua Senador Pompeu e os trilhos da estação central do Brasil. Abaixo, Obra do Museu do Amanhã no Píer Mauá. Fonte: Acervo pessoal.

desenvolvimento deste projeto, pensando em uma arquitetura que não sozinha, mas junto a potenciais existentes na área possa escrever a história de uma cidade democrática, garantindo não só o acesso à cidade, mas que ao menos em seu desenvolvimento, esteja atrelada na luta contra os processos de gentrificação e que use destas questões que em geral seriam consideradas inoportunas ao desenvolvimento da cidade como fator potencializador da implantação.

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6.2. A conversa com Maurício Hora No dia seguinte à visita a região na zona portuária, segue-se novamente ao Morro da Providência para encontrar o fotógrafo e morador, Maurício Hora. Sentado na praça Américo Brum, cuidando de seu filho que brinca com outras crianças, ao lado de um policial que carrega um enorme fuzil nas mãos, Maurício fala das obras de reurbanização feitas pela Secretaria de Habitação e sobre em torno das necessidades do território e da população favelada. Segundo Hora, o projeto do funicular, ou plano inclinado, não ocorreu devido mesmo motivo pelo qual foi abandonado durante esse estudo. Ele englobava muitas remoções, sendo que no geral também visava a retirada das unidades construídas em área de risco, isso somado representava quase metade da população local. Sendo assim, a população entra com um processo na justiça para barrar as obras. Hora disse: “A gente contratou outro profissional para avaliar as casas condenadas por risco geotécnico e eu não me lembro agora do número exato mas era muito menor do que o número estipulado pela prefeitura. Além dessas, o plano inclinado retirava mais gente da favela e quando mostramos tudo para a juíza que já acompanhava outros casos parecidos, ela deu risada e suspendeu as obras. Não dá pra chegar na casa do trabalhador marcando a casa dele e falando que é pra ele sair sem dar explicação direito, tem muita gente que mora aqui desde que nasceu.”

Quando questionado a respeito de qual o melhor sistema de transporte no que diz respeito à favela Hora diz: “Eu acho que se tivessem uns dois ou três elevadores seria o melhor, um pra cada lado do morro, do lado da Central e do lado do porto.” - Ele também explica que ali no morro toda grande obra envolve a presença de grandes gruas pra erguer tudo, então que qualquer obra tem dificuldade de execução, a questão ali é mais social, a maneira como é feito.

As questões discutidas com o fotógrafo refletem melhor que qualquer estudo as necessidades da população local, a vivência dele em torno do espaço ao longo de sua vida é mais valiosa que qualquer perspectiva advinda de um grande estudioso. Pessoas como ele e Dona Jura é que vivem as dificuldades diárias do local. Percebe-se na justificativa da prefeitura em torno da urbanização possui uma incoerência ainda maior que as anteriormente citadas, a impressão passada é a de que na verdade todas as obras visavam explorar o potencial urbano da área, que possui uma já consolidada estrutura no âmbito da proximidade com o centro e à abundância de transporte público. Porém isso implica não só em processos gentrificatórios, mas também no apagamento da memória urbana daquele local, que em muito colabora para a formação cultural não só da cidade do Rio de Janeiro, mas do Brasil como um todo. É sim interessante a exploração do potencial turístico da zona portuária, porém de forma benéfica não só para as grandes construtoras envolvidas. Não existe uma forma de simplesmente apagar a pobreza da região, empacotando-a e transferindo-a para um local cada vez mais distante dos olhos do turista. Ou ainda vender-la como cenário, é por isso que os moradores muitas vezes não utilizam os espaços construídos nas obras de reurbanização, eles são diariamente constrangidos com visitas à favela. A intenção deste trabalho é conseguir explorar o potencial turístico do Morro da Providência, mas trazendo benefícios a essa população, de forma que ela sintam-se parte da cidade. Após essa conversa, seguiu-se para a praça do Oratório. O curioso é que neste dia fazia sol, já passava do horário de almoço e foi possível encontrar diversas pessoas fazendo churrasco em suas lajes. As crianças brincam entre as vielas: “Vocês são turistas?”- Pergunta uma delas, refletindo a nítida diferença em torno do morador e do visitante.

Hora também fala sobre outra questão observada anteriormente pelo levantamento, não existem escolas de segundo grau ou técnicas na região, que fazem muita falta e que muitos deixam de estudar por conta dessa dificuldade. 92

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Imagens:Ao lado, Varal na Praça em frente ao oratório. Abaixo, Limite do Morro na praça do Oratório. Fonte: Acervo pessoal.

Imagem: Crianças brincam na parte posterior do oratório. Fonte: Acervo pessoal

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Atrás da praça do Oratório, havia uma piscina de bolinhas e uma cama elástica instaladas, onde diversas crianças se espremiam com suas mães, esperando sua vez de brincar. Obviamente, a praça construída pela Secretaria de Habitação possui um espaço maior do que o existente entre o emaranhado de casas localizado na parte posterior ao Oratório, porém mais uma vez ela se encontra deserta. Por outro lado, se confirma a ausência de área para um edifício que cause o impacto necessário capaz de impulsionar a transformação desejada. Contudo, vê-se que o desenho ao longo da pedra aproxima alguns espaços da favela, como a área dos 60, a praça do oratório e um dos decks do favela bairro.

Imagem: Vista do terreno da São Silvestre da Praça do Oratório. Fonte: Acervo pessoal

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7. Entendendo a urbanização de morros na cidade formal

1- SIMÕES JÚNIOR, José Geraldo. Salvador: Antecedentes urbanísticos e o processo de ocupação. In: LOBO, Manuel Leal Costa; SIMÕES JÚNIOR, José Geraldo (Org.). Urbanismo de colina: Uma tradição luso-brasileira. São Paulo: Universidade Presbiteriana Mackenzie e Ist Press, 2012. Cap. 2. p. 89-122- p.95 2- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89-122 -p.96 apud Filho, 1998

Para compreender o que deve ser feito no que diz respeito a urbanização e instalação de um sistema de transportes no Morro da Providência, foi feito um estudo de caso de dois locais formalmente urbanizados, localizados em colinas no Brasil. Dessa forma, foi possível captar táticas e técnicas para adaptação das edificações à topografia, assim como sistemas de arruamento e estrutura urbana. Salvador foi o primeiro alvo de estudo, objetivando entender os antecedentes urbanísticos e os processo de ocupação na colina. A cidade está localizada na Baía de Todos os Santos e, segundo Simões¹, a ocupação desse local se deu pela segurança propiciada através entrada da baía, pela baixa exposição às marés acentuadas da área costeira e ainda pela abundância de recursos hídricos visando a implantação de engenhos de açúcar. A colina é uma grande planície elevada ao mar, que fica à oeste. Além disso, o local possuía condições para abrigar um bom porto. No início da ocupação a cidade baixa era destinada ao comércio, onde ficavam os armazéns e pescadores. Era a região mais densa, sendo que na cidade alta estavam apenas as funções administrativas vinculadas às residências. No primeiro período de ocupação existiam apenas duas ligações entre elas, a Ladeira da Conceição construída em 1540, se tratando de um percurso mais íngreme - com dois lances de acesso à praia, e um segundo acesso cuja construção é datada de 1550, sendo mais suave, para a passagem de carros de boi, saindo da praça Castro Alves, passando pelas ladeiras da Gameleira e da Preguiça . O desnível abrupto de 60 metros entre as duas partes da cidade era um problema no que diz respeito ao transporte de mercadorias, o que fazia com que os jesuítas se utilizasse de guindastes para tal.² Em um segundo momento, entre 1650 e 1801, a cidade cresce de maneira expressiva, porém em função das invasões holandesas e da necessidade de proteção do território, continua apenas com dois acessos. É passível de

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observação uma preocupação no que diz respeito à setorização dos usos na cidade, visto que o comércio na cidade alta começa a se desenvolver em ruas específicas, para que o setor residencial continuasse tranquilo.¹ Num terceiro período de ocupação o crescimento, populacional é bem significativo, sendo que em 1800 a cidade possuía 50 mil habitantes e em 1900 passa a ter quatro vezes mais pessoas. Com isso acontecem alterações físicas profundas, a economia é modificada em função da abolição da escravidão e a produção industrial torna-se a principal atividade, que passa a ter o maior parque industrial do país. Com isso tem iniciasse a politica de intervenção urbana.² É neste momento que são construídos os elevadores Lacerda e Taboão, objetivando substituir os guindastes de transporte de mercadorias.³ A parte baixa serve para abrigar as atividades portuárias, sendo que na parte alta reside a população mais abastada. Se antes o Pelourinho era abrigo de casarões e sobrados de muitos pavimentos por conta das atividades econômicas voltadas à produção de açúcar principalmente, mas ainda de tabaco, café, ouro e diamantes, é neste momento em que perde seu prestígio devido a expansão da cidade na direção sul, fazendo com que as elites em busca de um novo estilo de vida urbano migrassem para esta área.4

1- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89-122p.103

Imagens:Processo de ocupação de Salvador. Fonte: SIMÕES JÚNIOR,2012.

2- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89-122p.103

3- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89-122 p.104 apud Centro Historico de Salvador, 2000 4- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89122- p.106 apud Pinheiro, 2002

Imagens:Processo de ocupação de Salvador. Fonte: SIMÕES JÚNIOR,2012.

Imagem: Ocupação em encostas. Fonte: SIMÕES JÚNIOR, 2012

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1- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89-122p.107

Com a ocupação da área da baía por casas ao longo da ladeira, são construídos para a melhoria da circulação o elevador hidráulico Lacerda e a Ladeira da Montanha, na década de 1870. Os planos inclinados do Gonçalves e do Pilar são posteriores, datando de 1890.¹ Uma questão válida de observação no que diz respeito ao estilo de ocupação e de desenho urbano conhecido como urbanismo de colina, tradicionalmente luso, é o padrão de ocupação da encosta. Na foto ao lado e

Imagem: Ao lado: Ladeira curva. Abaixo: Ladeira da Gamboa. Fonte: SIMÕES JÚNIOR,2012

2- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89-122p.108-109

na seguinte são mostradas duas ladeiras numa mesma encosta, com ligação da parte baixa à Igreja dos Aflitos. Na primeira foto o acesso é feito por meio de uma ladeira curva, ocupada por pequenas casas, enquanto que na seguinte que mostra a Ladeira da Gamboa, o desenho é feito diagonalmente à curva de nível vencendo-as de forma suave e diminuindo a inclinação, sendo que as casas se alinham a ladeira.²

3- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89-122p.108-109

Isso porque a Ladeira da Gamboa possuia conexão direta com o centro, sendo ela o acesso principal. No outro é utilizado o traçado tradicional da ladeira em curva, porém o acesso principal faz uso do traçado reto com objetivo de criar uma linha de perspectiva, para valorizar a vista do monumento presente ao seu final, neste caso, a Igreja dos Aflitos.³

4- SIMÕES JÚNIOR, 2012. Cap. 2. p. 89-122p.109

Posteriormente, entre os anos de 1912 e 1992 existe um quarto período no de ocupação, a economia brasileira se encontrava mais articulada com o mercado internacional e sendo assim criou-se uma necessidade no âmbito de saneamento e infraestrutura da cidade. São feitas diversas obras nesses dois aspectos, incluído instalação de iluminação urbana, transporte, redes de água e gás encanados. Porém no século XX, com a descoberta de petróleo no recôncavo baiano, a população de Salvador cresce rapidamente, triplicando num período de 30 anos. Consequentemente, a cidade se degrada e o centro da cidade alta se torna local de muitos cortiços.4 No período seguinte a área do Pelourinho tem seu valor histórico reconhecido e foi alvo de uma grande obra de restauração, que por sinal foi bastante criticada nos âmbitos de modificações em edificações e lotes, materiais utilizados na recuperação e restauro, que enfatizaram os interesses

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das empresas patrocinadoras, modificando os originais e ainda no que diz respeito ao desalojamento da população pobre residente na área, sem programa de reinserção habitacional. Como é perceptível, existe uma enorme relação entre as medidas de inserção de infraestrutura de circulação e os acontecimentos econômicos nas cidades. Independente do setor da economia, o traçado se dá a partir de interesses do capital urbano, desde os primórdios da ocupação no Brasil. Com Santa Teresa,bairro da zona central da cidade do Rio de Janeiro, não foi diferente. O urbanismo do bairro, segundo Fernanda Magalhães, tem influência direta dos donos das chácaras existentes naquele local, que utilizavam ruas no sentido diagonal às curvas de nível, como no caso da Igreja dos Aflitos em Salvador, para criar frestas urbanas e visuais. As formas de largos entre os casarios também denuncia a presença da prática do urbanismo de colina. A ocupação no bairro tem início em virtude da construção de uma ermita, chamada de Ermita do Desterro e em seguida, em suas proximidades, é erguido o convento de Santa Teresa, por ordem do governador Gomes Freire de Andrade. Objetivando a canalização da água, são abertos os primeiros caminhos ao longo a floresta. A consolidação dessas aberturas é responsável pela ocupação da região através da construção do Aqueduto Carioca em 1974, demonstrando a presença do poder público na região.¹ Santa Teresa possui cinco momentos de ocupação sendo o primeiro classificado como de exploração das potencialidades, o segundo se dá pela construção do convento e do aqueduto sendo que em sequência vem a integração com as áreas seguintes, e finalmente vem o domínio da especulação imobiliária. Na última fase o local já era alvo de interesse do prefeito Pereira Passos, visto que os antigos casarões estavam agora sendo transformados em hotéis. O desenvolvimento do transporte público na região se deu pelo sistema de bondes sobre trilhos visando a demanda turística que se desenvolvia, assim Pereira Passos cria a primeira rota turística na região através da estrada de ferro Cosme Corcovado, que penetrava a floresta densa,

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1- MAGALHÃES, Fernanda. O bairro de Santa Tereza no Rio de Janeiro. In: LOBO, Manuel Leal Costa; SIMÕES JÚNIOR, José Geraldo (Org.). Urbanismo de colina: Uma tradição luso-brasileira. São Paulo: Universidade Presbiteriana Mackenzie e Ist Press, 2012. Cap. 4. p. 175-200 p.177

Imagem: Acessos Morro da Santa Teresa. Fonte: MAGALHÂES, Fernanda,

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Imagem: Ao lado, Padrões de ocupação e curvas de níves em Santa Teresa. Abaixo,Entroncamentos em Santa Teresa. Fonte: MAGALHÃES, Fernanda.

1- MAGALHÃES, 2012- p.181-182

possuindo paradas estratégicas em pontos turísticos. A partir daí o processo de construção é acelerado, consolidando um modo de vida no que no tocante à integração da cidade à natureza. Abrigo de edifícios com estilos diversos, Santa Teresa começa a se tornar um bairro eclético e singular.¹ Com relação a acessos e entorno, na base do morro o sistema viário existente é contínuo, com ruas de pouquissima declividade, formando uma espécie de cinta no perímetro do bairro. Das ruas planas, com encaixe principal no vales, saem os acesso dominantes, que permitem a chegada à crista do morro, localizada na rua Almirante Alexandrino. Segundo Magalhães, o sistema viário se compõe através de um circuito coletor, disposto em sua maioria transversalmente ou ao longo da encosta, sendo apoiado quase inteiramente na Rua Almirante Alexandrino através da conexão com um sistema complementar de vias para a redistribuição do fluxo, de onde as auxiliares saem com objetivo de subir a encosta por meio de atalhos, conectando-a com as ruas perimetrais existentes na base do morro. O mais interessante no acessos do morro de Santa Teresa está nesse esquema de ruas semelhante à organização de uma espinha de peixe, a entrada principal da rua Almirante Alexandrino é um anel perimetral desenhado ao longo da curva de nível, com inclinações baixas, que variam de 2 a 8%. As vias de ligação possuem uma declividade maior e são acompanhadas de escadas que as complementam, pois suas inclinações podem variar de 8 a 35%.²

2- MAGALHÃES, 2012- p.193

A estruturação urbana acontece configurada em função da topografia, objetivando vencê-la. Com uma estrutura linear, a morfologia urbana possui eixos articulados ao relevo e aos elementos morfológicos como vales, portelas e topografia. As edificações são perpendiculares à estrutura linear das ruas. Os nós e largos são locais de abrigo de centralidade no âmbito do transporte público , uso do solo e vida coletiva.³

3- MAGALHÃES, 2012- p.195

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8. O ENANPARQ 2014 8.1. Cristovão Duarte e o Porto Olímpico O ENANPARQ é um Encontro Nacional bianual realizado pela ANPARQAssociação Nacional de pesquisa e pós graduação em Arquitetura e Urbanismo. Em 2014 ele foi realizado nas dependências da Universidade Presbiteriana Mackenzie com a temática arquitetura, cidade e projeto: uma construção coletiva, com a intenção de discutir a dimensão estratégica do projeto e seus desdobramentos articulados com teoria e prática, de forma inovadora. O congresso foi de 21 a 23 de Outubro, englobando vários temas,tais como: ambiente e sustentabilidade; crítica e documentação e reflexão; espaço público e cidadania; habitação e direito à cidade; infraestrutura e mobilidade; novos processos e novas tecnologias; patrimônio, cultura e identidade. Dentro dessas temáticas foi eleito como tema de interesse a questão da habitação e direito à cidade assistidas duas discussões nessa área. A primeira tinha como temática Habitando a cidade contemporânea, ou a (re)construção coletiva da cidade a partir dos seus vazios urbanos, trazendo como coordenadora Andréa de Lacerda Pessôa Borde, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Dentre os palestrantes estava o professor doutor Cristovão Fernandes Duarte, pesquisador do PROURB (Programa de Pós Graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro) e professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro que, dentre suas diversas linhas de pesquisa já abordou temas sobre o projeto Porto Maravilha e a favela da Providência. Duarte tinha como tema de palestra Requalificação das áreas pericentrais no Rio de Janeiro: ameaça ou campo aberto de possibilidades?, por isso dentro de seu eixo temático abordou questões de origem e crescimento da cidade do Rio de Janeiro, bem como as reformas urbanas ocorridas. O que 108

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é cabivel de citação em torno desta discussão são considerações a respeito do projeto de requalificação da zona portuária do Rio de Janeiro. Duarte inicia mostrando o processo de ocupação da cidade do Rio de Janeiro, com a expansão contida até o século XIX pelas barreiras geográficas. Após o vencimento de resistências iniciais e com a chegada da família real em 1808, a cidade tem um grande surto de crescimento em direção ao porto. Através da pintura de Émeric Essesx Vidal, o palestrante destaca a existência de um conjunto consideravelmente denso de edificações baixas circundando o Morro de Santo Antônio e estendendo-se desde o passeio público até o Campo de Santana. O acesso à Lapa se fazia contornando o Morro de Santo Antoôio, que separava-o do centro da cidade. Quando foi proclamada a república e o Rio de Janeiro se tornou capital federal, como já dito anteriormente, nasce uma necessidade de modernização da cidade. A reforma implementada pelo prefeito Pereira Passos,cujas medidas rasgaram o centro histórico de avenidas, demolindo cortiços em nome da higiene pública e agravando a crise de moradia, segundo Duarte, foi responsável pelo verdadeiro início da favelização da cidade, consolidando a favela do Morro da Providência e do Morro de Santo Antônio. Outra conseqüência importante deste período, citada durante a discussão, se trata do cinturão de pobreza circundando o centro da cidade, já que esta não oferecia transporte público abundante e os pobres necessitavam estar perto do trabalho para se poupar do custo adicional de deslocamento, sendo expulsos do centro, se deslocarando primeiramente para a zona portuária, nos bairros da Saúde e da Gamboa, área já tradicionalmente ocupada pelas classes trabalhadoras. Bairros esses presentes numa estreita faixa litorânea que é isolada geograficamente em relação ao centro devido ao enfileiramento dos morros da Conceição, Livramento, Providência e Morro do Pinto. Quando fala sobre Porto Maravilha, a opinião de Duarte é bem clara. Trata-se de um exemplo vivo da falta de participação da sociedade nas decisões tomadas sobre o do mesmo, que repete modelos já testados no

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passado e que não obtiveram resultados satisfatórios, evidenciando o caráter comercial do projeto. Para o palestrante, a questão dos investimentos maciços em torno da área determinada em um curto período de tempo evidencia a possibilidade de uma drástica transformação urbanística, desenhando um futuro preocupante para a cidade, onde o grau de responsabilidade com o planejamento é muito pequeno. Além disso, como no plano de embelezamento do Rio de Janeiro,existe uma questão de apagamento da memória urbana pois o Estado assume uma evidente postura de entendimento da cidade como mercadoria de compra e venda, onde priorizando os interesses do capital privado a cidade é demolida e reconstruida pelas grandes construtoras e incorporadoras, assumindo um caráter especulativo, baseado em soluções rodoviáristas como a Via Binário do Porto, sem grandes alterações significativas no âmbito da mobilidade urbana,mais uma vez, os automóveis são privilegiados em detrimento das pessoas. Em uma crítica irônica,é falado também da construção das Trump Towers, empreendimento idealizado pelo empresário e milionário americano Donald Trump, que conta com 5 torres corporativas de padrão AAA com 150 metros de gabarito sendo 38 andares com vista para o mar, bloqueando o resto da cidade. O palestrante conclui sua apresentação com a reflexão sobre o da cidade pensada aos pedaços. É necessário que o planejamento urbano seja feito evitando prejuízos urbano, ambientais e sociais, distribuindo de forma justa o ônus e o bônus da urbanização, evitando processos especulativos tão tradicionais e projetos urbanos como pedaços de cidade.

8.2. Aprendendo com Medellín No terceiro e último dia de ENANPARQ, opta-se por participar, ainda no segmento de habitação e direito à cidade, de uma discussão intitulada Intervenções contemporâneas em cidades da América do Sul: estudo das transformações territoriais em assentamentos precários. Brasil - Colômbia, cuja coordenadora foi Maria de Lourdes Zuquim, professora doutora nos

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cursos de graduação e pós-graduação da FAUUSP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo). É orientadora de doutorado nas áreas de Concentração Planejamento Urbano e Regional e Habitat. Dentre os convidados estavam dois arquitetos e urbanistas, também professores e pesquisadores da Universidade de Antioquia em Medellín - Colômbia, Alberto León de Guitiérrez Tamayo e Liliana Maria Sánchez Mazo. Mazo fala sobre A cidade construída por várias mãos: a experiência de Medellín. Inicia explicando o contexto político nos anos antecessores à implantação dos projetos, devido à alternância no poder público entre 1992 e 2003, que era revesado entre liberal e conservador, causando uma descontinuidade em relação às intervenções urbanas em assentamentos precários. Em 2004 as ações são retomandas de maneira a enfrentar de forma abrangente os problemas, através do Programa Urbano Integral (PUI), projeto que objetiva romper as diferenças e o isolamento entre a cidade formal desenvolvida, e a segregada, marginal e pobre.

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um histórico de precariedade, com uma população constituída por migrantes provenientes do êxodo rural, registrando o índice mais alto de violência e os mais baixos índices de desenvolvimento humano. Dentre as premissas de projeto, Mazo destaca que foram definidos limites físicos para o controle do crescimento sem planejamento, baseado em áreas de proteção ambiental nas encostas da cidade e planos de realocação de moradias no local. Isto porque existe uma intenção de melhorar as condições a respeito da qualidade de vida nos assentamentos precários. Para garantir essa eficiência foi preciso trabalhar nas dimensões física, social e institucional. A participação comunitária é utilizada como fator estruturador das modificações, que englobam componentes de espaço público, infraestrutura e equipamento, atendendo a questões de mobilidade, moradia e entorno, abrangendo também segurança e convivência.

Sendo assim, as interveções são feitas com novos focos e metodologias, além novos instrumentos urbanísticos,a visão nova e ambiciosa do futuro veio a partir de lições apreendidas nas interveções anteriores, sendo que as de urgência são abandonadas e diversos atores são envolvidos no processo de desenvolvimento que, apesar de suas contradições amplia e fortalece as possibilidades de entender à problemática urbana.

A importância da participação social recebe destaque, pois o espaço público é compreendido em Medellín como espaço formador de cidadãos, implantado como ferramenta de inclusão social no processo de desenvolvimento urbano. Os equipamentos de mobilidade são responsáveis pela conexão das malhas dos assentamentos informais com a cidade, articulando-se com a escala do pedestre, sendo capazes de construir a cidade na área afetada e ao longo de seu eixo, sendo o espaço público junto à habitação sendo suporte ao indivíduo nas questões de qualidade de vida

Mazo destaca que o sistema de transporte público Metrocable é anterior ao PUI, e proporcionou melhorias pontuais no entorno no que diz respeito a moradia, mobilidade, saúde e cultura. No entanto, a partir dos grandes projetos, como as bibliotecas, parques, centros de desenvolvimento econômico e escolas foram desenvolvidos simultaneamente o Plano de Ordenamento territorial em conjunto com o PUI, trazendo uma evidente transformação na cidade informal, devido aos esforços vinculados a múltiplas escalas e instituições com focos num mesmo território.

A desconfiança da população local vinculada a experiências mal sucedidas anteriores, que utilizavam métodos autoritários de intervenção ,junto ao problema de violência, segundo Mazo, foram fatores complicantes das mesmas. Porém através da metodologia que se fundamentou na participação popular junto a concetração de recursos e investimentos para construir uma cidade melhor para todos, ajudaram a superar os desafios. Desta forma houve um desenvolvimento de uma nova metodologia, que era aprendida diariamente atráves das diferentes vozes ouvidas durante o processo.

As zonas de interveção foram divididas em cinco, sendo que existe uma mais critica que abrange as comunas 1 e 2. Essas comunas possuíam

Para que esse diálogo com a população fosse possível foram organizados comitês, assembleias e oficinas no bairros. Isso foi eficiente

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e promoveu a apropriação e conservação dos espaços construídos. Pela primeira vez na história de Medellin se dá uma interveção que une tanto investimentos governamentais como privados e ainda participação de atores da sociedade cívil. Assim, as densidades foram diminuidas e houve um aumento na qualidade de vida e na infraestrutura urbana. Cabe destacar que o PUI é um método que pode ser implantado em locais semelhantes no que diz respeito a reconstrução dos processos social e político da intervenção, a emergência das estratégias de permanência da intervenção durante o processo é considerada positiva, mas é importante que uma estrutura prévia seja pensada de forma que permita a sua ativação desde o início, no seu percurso e pós obra. Mazo conta que existe uma dependência no que diz respeito à gestão política, sendo que o modelo de gestão pública possibilitou a participação de diversos atores. Sendo assim, este tipo de intervenção democrática deve ser adotada como política pública para garantir eficiência atemporal. Os urbanistas presentes durante a apresentação fizeram questionamento sobre processos gentrificatórios gerados pelas melhorias nas comunas, seguindo o raciocínio de que com a valorização do território junto a regularização fundiária exista o risco que os usuários queiram vender suas habitações, se mudando para locais de menor valor. Mazo destaca um fato real a esse respeito, não cabe ao arquiteto intervir nesse tipo de problema. Isso diz respeito a vontade de quem tem a posse do objeto em questão e que a única coisa que pode ser feita, através do poder público, é garantir que a especulação imobiliária não se aproprie do local. A palestrante ainda reforça que Medellín não tem para onde crescer, visto que a cidade está circundada por morros e a urbanização dos mesmos é a única alternativa, visto que a cidade cresce cada vez mais. A segunda apresentação, de Alberto León de Guitiérrez Tamayo tem como assunto Parque Explora: Intervenção urbana geradora de transformações sócio-territoriais no bairro Moravia, Medellín. Moravia é um tipico assentamento precário que se localiza em El Bosque, uma das centralidades da cidade, o objetivo da intervenção era fechar o aterro sanitário e regularizar a situação 114

fundiária dos habitantes e ainda reconstituir a centralidade através da paisagem e dos equipamentos públicos e recuperar o meio ambiente . Sendo uma das intervenções mais importantes feitas em Medellín, não só pela questão programática ou de implantação e estética, o Parque Explora também gerou transformações no âmbito de cultura, sociedade e território, sendo capaz de incluir os moradores de Moravia na cidade, tendo sua importância reconhecida pela população de Medellín e ganhando visibilidade. O projeto promove e expõe a ciência e a tecnologia, gerando encontro, ações comunitárias possibilitando ainda que as pessoas recebam formação profissional. Projetado pelo arquiteto Alejandro Echeverri, construido entre 20052007, o Parque Explora é um centro interativo para apropriação e divulgação da ciência e da tecnologia, possuindo 22 mil m² de área interna e 15 mil de entorno com locais públicos. Tamáyo relata que no âmbito de infraestrutura recebeu prêmios diversos na Colômbia, como o de arquitetura e design Lápiz. Assim é reconhecida a importância desses espaços criados pra públicos diversos gerando sua mais cativante expressão: a diversidade. Com a finalidade de criar vínculos com o entorno, as atividades do Parque Explora promovem programas com as comunidades vizinhas e com a universidade próxima. A cidade já carecia de um parque, então o projeto atua tanto na escala do assentamento informal quanto da própria cidade, mudando totalmente o lugar. Tamayo conta ainda que antes da abertura do mesmo, houve uma preparação da população local que recebeu cursos de alfabetização digital articulados com a divulgação do projeto. Portanto no que diz respeito à estética, modernidade, acessos e conexões com outros edifícios do entorno (universidade, jardim botânico, metrô, etc) o projeto transformou urbanisticamente o setor, que se tratava de uma zona urbana deteriorada, perigosa e esquecida, tornando-a um local de encontro e turismo tecnológico, recuperando a centralidade, trazendo orgulho à comunidade local. Cabe destacar que segundo o palestrante, também houveram transformações de âmbito cultural e social para com os moradores do entorno, sendo inclusos na cidade passarando a ter a opção de se capacitarem e obterem trabalhos dignos. 115


Concluindo, Tamayo evidencia a importância da produção coletiva, com a influência direta da população em processos de reconstrução da cidade e que, no tocante à a esses processos, deve-se respoder duas perguntas: “Para quem são essas transformações territoriais nos assentamentos precários?” Pergunta esta respondida por ele mesmo: “São, na verdade, contribuições para construção e produção da cidade contemporânea sonhada, uma cidade do cidadão.” E completa: “Continuaremos gerando a cidade do capital através das ações próprias do projeto neoliberal?”

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Imagem: Esta página: Acima, detalhe construtivo Parque explora, abaixo corte Parque Explora .Página ao lado: Acima vista aérea Parque, Abaixo,planta nível térreo Parque Explora. Fonte: PORTAL VITRUVIUS. Parque explora. Museo Interactivo de Ciencia y Tecnología. Projetos, São Paulo, año 12, n. 134.05, Vitruvius, feb. 2012 <http://www.vitruvius. com.br/revistas/read/ projetos/12.134/4263>

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Imagem: à direita: Foto da praça em frente ao parque, à esquerda, foto de uma das fachadas. Fonte: PORTAL VITRUVIUS

Imagem: Planta no nível da praça Fonte: PORTAL VITRUVIUS

Imagem: Acima, Elevações Parque Explora.Lado esquedo,Vista área do centro de tecnologia Fonte: PORTAL VITRUVIUS.

Imagem: Planta Cobertura. Fonte: PORTAL VITRUVIUS 118

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9. Nudibranch e a análise de escoamento da água Assim é foi realizada uma análise paramétrica em função do escoamento da água no morro. Para isso é utilizado o plugin do grasshopper chamado NudiBranch. Nudibranch é um conjunto de componentes que facilitam e automatizam a capacidade do Grasshopper em gerar conjuntos de dados de valor com base na distância.

Em primeiro lugar a mesh é trazida para o grasshopper.

Depois é criada uma série de 80 números iniciados em 20 120

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Assim é feito o cruzamento da lista de números para criar duas listas. As duas listas são transformadas em pontos no plano xy.

Em seguida esses pontos são todos movidos no eixo z à uma distancia superior à altura da mesh.

Isso porque os pontos serão projetados na mesh através do componente Mesh Ray

Assim com o componente mesh climber, são criadas curvas através das interações entre os pontos com determinada força, de forma que essas curvas simulam o escoamento da àgua no morro. Se a força e as interações forem diminuídas as curvas ficarão mais segmentadas e menores, pois menos pontos se juntarão para compó-las.

Água

A partir dai os pontos do grid que não se encontram com a mesh são removidos da lista, para que nela estejam apenas aqueles que são válidos. 122

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10. A idéia do sistema A partir do estudo das formas de pensar a urbanização de morros da cidade formal e dos aprendizados do ENANPARQ, começa-se a pensar nas possíveis formas de desenvolvimento de um sistema de transportes no Morro da Providência. O estudo se inicia comparando a ocupação de 1975 à atual e é claro que devido às características rizomáticas da favela, não existe nenhuma lógica de ocupação que não seja relacionada à topografia existente. Sendo assim, inicia-se um estudo das posições dos becos e vielas da favela e suas relações com as curvas de nível. Essas são classificadas como perpendiculares à curva de nível, ao longo, diagonais e escadas. A principio percebe-se uma lógica semelhante à da cidade formal, o hábito de vencer o desnível por meio de vielas diagonais às curvas, em seguida predominam as vielas ao longo da curva de nível seguidas pelas relações perpendiculares e das escadas.

Mancha Urbana e Desenvolvimento 1975 Atual

Vias e Organização em relação às curvas de nível Diagonais Perpendiculares Ao longo Escadas

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O que fica claro é que na favela a prioridade não é o acesso, primeiro encontra-se um terreno onde seja possivel implantar o abrigo, posteriormente se dá a chegada. Se não é possível fazê-lo por vielas, o próprio morador constrói uma escada para acessar sua habitação.

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Conexões com percursos existentes Extensão deck Implantação

A partir disso elege-se um eixo por onde passa um grande volume de água, buscando através das intervenções junto a áreas verdes, diminuir o impacto da água que desce pelo morro. A avaliação da organização das vielas serve como pré requisito para pensar em sistemas eficientes para vencer cada trecho do desnível. Quando existe uma grande presença de escadas, significa que nas proximidades o desnível é maior e portanto utiliza-se elevadores, atrelados a programas habitacionais, realocando a população retirada para esses edifícios extremamente próximos de suas antigas moradias.

Implantação Zoom

1- BRILLEMBOURG, Alfredo; KLUMPN, 2013. p. 204.

Escadas Rolantes Medellín- Fonte: PORTAL VITRUVIUS 126

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Eixo

Porém ao sobrepor o levantamento de vielas ao caminho de escoamento das águas, percebe-se uma tendência instintiva da presença de entroncamentos nos locais de junção dos pontos de escoamento.

Desenvolve-se um sistema de escadas rolantes e elevadores, vencendo módulos de 15 metros por sistema. Brillembourg e Klumpner afirmam que telhados e superfícies verticais são subutilizados nas favelas, podendo ser usados como espaço verde, circulação de pedestres e até ciclovias,além de telhados interconectados limitando o crescimento vertical para além de alturas estruturalmente seguras.¹

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Os módulos foram pensados para integrar a malha local e variam de acordo com as possíveis adaptações. O morador acessa a favela pela rua Barão da Gamboa, ali existe um sistema de escadas e rampas desenvolvido pela prefeitura, a partir de lá segue por um eixo pavimentado também pela Secretaria de Habitação no contexto do Programa Morar Carioca. Então chega ao primeiro sistema de escadas rolantes (2 lances) e escadas convencionais proposto na cota +20,00, em seguida propõe-se, na cota +35,00, uma lâmina habitacional de 4 pavimentos escalonados de acordo com as curvas de nível, munidos de 2 elevadores, sendo utilizados tanto pela população do edifício quanto para o percurso, vencendo os 15 metros de desnível. Em torno do edifício também é proposta uma pequena área verde e um telhado verde na cobertura, que servirá de passagem para os pedestres, sendo que assim é criado, além de transporte e moradia, um espaço público no local. Em seguida existe um outro sistema de escadas rolantes (também 2 lances) e escadas convencionais, se iniciando no nível +50,00, que se findam em um eixo pavimentado pela SEHAB com conexão direta junto a praça 127


Américo Brum,cota +65,00. +50,00

+35,00 +27,50

Corte Esquemático Sistema 1

+20,00

+65,00 +57,50

Corte Esquemático Sistema 2 +110,00

Dessa forma, toda população removida para implantação do sistema é realocada para esses novos edifícios, conecta-se a face do morro voltada para o porto com a parte mais alta e ainda com o teleférico, possibilitando uma travessia mais amena deste desnível de forma que pequenos respiros passem a existir, trazendo além de transporte, habitação e espaço público. Para desenvolver esta etapa do plano urbano foi necessário trabalhar em 3 dimensões e modelar caso a caso, para avaliar as possibilidades .

+95,00 +87,50 +80,00

Por último é proposto mais um edifício habitacional com cobertura verde, utilizando o elevador para conectar um dos decks construídos pelo programa Favela Bairro, que necessitará de uma pequena expansão para que tenha continuidade na cobertura do edifício habitacional, que possui 4 pavimentos e acaba na cota +110,00.

+80,00

+50,00

Esse sistema acaba em um outro elevador, independente de edifício, ligado a uma escada convencional, ambos propostos para vencer mais 15 metros de altura(cota +80,00), seguindo para um outro grupo de escadas rolantes, que tem início em um eixo pavimentado com conexão direta com teleférico (cota +95,00).

Corte Esquemático Sistema 3

É passível de observação que este ensaio foi extremamente válido para o aprendizado no tocante ao trabalho em áreas de morro com grandes desníveis e que o estudo deste modelo de deslocamento em Medellín mostra que entre as escadas em geral e as habitações não existem grandes barreiras, apenas muretas que as separam.

Imagens: Esquerda: Desenvolvimento. Direita: Perspectiva 128

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11. A implantação no terreno da São Silvestre No terreno da parte baixa a dificuldade era o preenchimento dos 25 mil m², então, além de fazer uso dos levantamentos obtidos na primeira fase de projeto, a conversa com os habitantes locais foi extremamente importante. Para preencher aquele vazio levou-se em consideração, além das necessidades básicas vinculadas à falta de espaço público, as conversas com Mauricio Hora e outras pessoas da Providência. Em primeiro lugar, um sistema de elevador junto a um programa comunitário e esportivo é pensado, já que a remoção da quadra foi uma dos fatos mais questionadas pelos moradores, que faziam um bom uso da mesma. Posteriormente, pensa-se em novos usos para o terreno. Considerando o aterramento do litoral desta área para a construção do porto, existe a intenção de inserção de um programa que possa resgatar essa área de lazer da população local. A partir daí começa a ser desenvolvido um programa de parque vinculado a usos que a área carece. Consulta-se o levantamento de escolas no perímetro, é possível observar que não existem escolas de segundo grau ou técnicas, passando este a ser um dos usos a serem implantados. Outra decisão, mantida desde o início é a de remover as casas da Pedra Lisa e desenhar um novo edifício para essa população, fora da área de risco, tratando essa parte do terreno com vegetação. Dessa forma tem-se 3 grandes usos dentro do terreno da São Silvestre: 1- Centro comunitário e esportivo vinculado a elevador urbano; 2- Escola de segundo grau e técnica seguindo as característica de dimensão e implantação do padrão MEC; 3- Edifício habitacional com número de unidades superior a 60. Dentre os usos atrelados ao parque foram listados como atratores: uma pista de skate, um mini campo de futebol, um espaço de lazer com quadra aberta e playground próximo à habitação e decks de permanência.

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Através dessas decisões programáticas era necessário setorizar cada uso em um dado local do projeto criando um sistema de caminhos e conexões entre eles e a rua, visto que o terreno possuía apenas um acesso à externa. Primeiramente setoriza-se o edifício do elevador urbano bem próximo à encosta, visando uma conexão junto a praça do Oratório, logo, decide-se pela colocação da escola na parte do antigo terreno da Pedra Lisa, pelo fato de que este irá servir a toda comunidade, sendo assim evita-se uma nova ocupação,

1- BRILLEMBOURG,2013 p.204

dando um uso sólido àquele local. O que restar da Pedra Lisa poderá ser tratado com vegetação, para criação de lugares de permanência tanto para usuários da escola, quanto para usuários do parque. O edifício habitacional é setorizado próximo a rua, pois assim ele se integra à cidade, onde existem outras habitações. Billembourf e Klumpner afirmam que parques públicos são capazes de preencher antigas áreas de risco, impedindo futuras construções, oferecendo espaço público tão necessário nessas áreas.¹ A partir da setorização vem a preocupação com o design do parque, seus caminhos e conexões. Uma vez setorizado os usos, foram desenhadas linhas com as conexões principais - do edifício para a rua, da habitação para a rua, da escola para a rua e conexões entre eles. A partir daí é gerado no Rhinoceros uma série de linhas irmãs dessas conexões, paralelas e iguais, através do comando tween curve. Sendo assim, essas linhas são exportadas para o software Maya, com o objetivo de criar intersecções diversas entre elas e as mais interessantes.

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Terreno da São Silvestre

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Maya é um software de animação 3D, modelagem, simulação e renderização. O hair system é uma das ferramentas que fazem parte do plugin Fullyball. Ele representa, para designers e animadores 3D uma nova forma de representar cabelos e pelos de personagens animados. Aqui, ele será utilizado para movimentar as curvas base de conexões dentro do terreno, assim como cabelos de personagens 3D, elas serão capazes de interagir umas com as outras. Foram feitos alguns testes e algumas curvas foram eleitas para compor

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a implantação através de três critérios: - As conexões geradas; - As relações com as linhas de escoamento da água; - A plasticidade das curvas. A partir dai, a implantação toma forma e fica decidido que parte das curvas de nível da Pedra Lisa sofreriam corte para facilitar o acesso e implantação da escola, porém algumas são mantidas para que seja parcialmente isolado o uso escolar. Foi projetado um estacionamento para que funcionários possam estacionar seus carros, porém são apenas algumas vagas, levando-se em conta a proximidade do parque com um rico sistema de transporte. Assim, faz-se necessário projetar conexões sólidas entre as curvas de nível existentes na Pedra Lisa. Para que o acesso à escola aconteça, foi projetado um sistema de rampas com paradas nos dois decks desenhados na parte superior da área, e diretamente conectado ao eixo da rua e ao estacionamento, uma escadaria. No Rio de Janeiro, por se tratar de uma cidade litorânea e com muitas ladeiras é comum o uso de grandes escadas para acessar partes da cidade. Aqui pensa-se em escadas não somente como circulação mas também como permanência. É comum se deparar com pessoas possuem o hábito de sentarem-se nos degraus da escada para conversar, ler ou fazer qualquer outro tipo de atividade, porém no Brasil os arquitetos tem se limitado a projetar escadas apenas como objeto de circulação, mesmo diariamente convivendo com essa realidade. Neste projeto, as escadas podem e devem ser usadas como permanência.

Opções geradas

Hair System Interações

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Fazendo uso de algumas curvas do hair

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12. O SESC Pompéia e as decisões programáticas do edifício O único uso certo do edifício neste momento era o elevador urbano, não se possuía aqui nenhum programa estruturado. O estudo a ser feito, em primeiro lugar, era de como vencer os 82 metros que separam a parte baixa da parte alta da favela. Sendo assim, foram pensados usos atrelados e grandes pés direitos junto a programas que possam atender às demandas territoriais. Então foi utilizado como modelo de estudo o SESC Pompéia, de Lina Bo Bardi. Neste caso não como modelo estético, mas como implantação e programa. O interessante do SESC Pompéia é a maneira como a arquiteta pensa na distribuição de infraestrutura e seu percurso. Segundo Lina, na 1- PRIMEIRO década de 70, quando a fábrica foi revitalizada, São Paulo não tinha áreas de Tempo - SESC lazer afastadas da realidade da cidade, o SESC vem com objetivo de resgatar Pompéia 30 anos. 2013. (13 min.), a ideia de um lugar para criar um ponto de reunião que proporcione encontros son., color. Legenhumanos.¹ dado. Disponível em: <https://www. youtube.com/ watch?v=TzgEzMClH4E>. Acesso em: 02 abr. 2015.

A implantação do projeto de Lina está muito vinculada a rua interna da fábrica, antigo córrego das Águas Pretas, criada para transformar-se em um palco de manifestações espontâneas ou apresentações agendadas. Essa rua passa pelos usos culturais e de serviços, levando o usuário à uma área reservada,abrigo o programa esportivo, se encontrando com outra via 2- BO BARDI, Lina. Lina Bo de circulação de pedestres.² Assim a cidade adentra o edifício, da mesma Bardi. Instituto Lina Bo e P.M.Bar- maneira desejada para o desenho de projeto do Morro da Providência. Trazer di. Organizador: a cidade para dentro do programa, integrá-lo diretamente à mesma. Marcelo Carvalho Ferraz. 1993. São Paulo.- p.11

3- BO BARDI, 1993 - p.15

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Lina também desconstrói os espaços, deixando-os de certa maneira inacabados, para que os usuários se apropriem e ultizem-nos de maneira livre. Isso ocorre em diversos projetos da arquiteta, como o MASP e seu grande vão, por exemplo. O SESC Pompéia tem como premissa de projeto a função catalisadora das demandas locais, já que antiga a fábrica era povoada por famílias que já utilizavam aquele espaço como área de lazer.³

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1- FRANCO, 2013.- p.140

2- FRANCO, 2013.- p.140

Parte-se dessa premissa do encontro e diversidade programática, com objetivo de atrair pessoas de todos os tipos. Considerando o local onde estará inserido o projeto, será criada uma nova centralidade, porém sendo uma imposição cultural, objetivando atender diversas escalas, conectando a favela à cidade formal através escala gradual de usos, para que o percurso vá fazendo esse degrade de ocupação. Cada nível é visto como uma nova implantação, conforme o desnível é vencido pelo edifício, se conectando com a cidade formal ou com níveis do morro. Aqui, a ideia do percurso é importante. Franco diz que a praia urbana, espaços conformados por uma sucessão de faixas programáticas, recebem ações corriqueiras como paquerar, correr, passar, contemplar, ocorrendo sobre sistemas de fluxo em paralelo, cujo sentido do percurso é compartilhado por todos os tipos de praticantes da cidade.¹ Segundo Franco: “A ambiguidade da infraestrutura se reorganiza em um ponto de convergência à capacidade de uma mesma estrutura física poder compartilhar distintos programas, de forma alternada ou concomitante. Esse pode ser o seu real valor e sua potência. Se aliarmos a latência da infraestruturas enquanto persistência engendrada na macroesfera com a latência de sua disponibilidade de reprogramação de usos, realizada na microesfera, atribuiremos138

lhe um papel ativo na qualificação da cidade”. ¹

Num primeiro momento ocorre a ideia de térreo livre, uma área sombreada onde seja possível formar filas para adentrar o transporte, para que as pessoas fiquem livres e tenham espaço suficiente enquanto esperam com mercadorias e afins. Além disso, o espaço livre incentiva a prática de esportes no local, ali pode ser praticado patinação, skate dentre outras modalidades. Franco diz que obras de infraestrutura em geral costumam deixar rastros e espaços residuais em seu entorno, por não serem compatíveis com a escala do pedestre, mas a dupla condição de disponibilidade e indeterminação abre possibilidades para inúmeras formas de apropriação formais e transgressões, previstas ou imprevistas². Claro que aqui não existe intenção em deixar um espaço residual, mas sim a apropriação desse espaço por parte da população local, deixando seus usuários livres para ocupar o espaço da maneira que preferirem.

1- FRANCO, Fernando de Mello. Contrários e Complementares. In: ROSA, Marcos L. (Org.). Micro planejamento: Práticas urbanas criativas. São Paulo: Editora de Cultura, 2013. p. 134-147- p.144

Próximo ao térreo foi colocado um ponto de ônibus. O primeiro pavimento irá abrigar um teatro atendendo a escala da cidade, dali por diante haverá 4 pavimentos com usos esportivos vinculados a quadras e os dois últimos pavimentos são de uso cultural e comunitário. O fechamento é pensado como algo flexível, sendo sólido apenas onde há necessidade. Em locais como as quadras poliesportivas, por exemplo, não existe necessidade de fechamento. Como no SESC, uma torre de circulação separada do edifício é pensada, para ser conectada por passarelas aos programas existentes. Nesta etapa de projeto a volumetria não é pensada, apenas distribuição do uso ao longo da encosta. É eleito também um material para que se desenvolva a estrutura, a escolha pela estrutura metálica deve-se à sua habilidade em vencer grandes vãos. Recua-se o edifício da pedra e no último pavimento cria-se uma extensão da praça do Oratório, objetivando de conectar o edifício à favela. Distribui-se a malha de pilares e aloca-se os usos. Aqui nasce o primeiro estudo propriamente dito do edifício ao longo da 139


encosta, com usos distribuídos e estrutura. Porém com fachada inexistente, vislumbra-se algo que seja capaz de ser aberto e fechado ao mesmo tempo, mas nada concreto. Porém, neste modelo existe uma insatisfação e questões mal resolvidas.É criada apenas uma conexão entre parte baixa e parte alta, não atendendo ao plano inicial de um sistema. Além disso, por conta de sua circulação em uma torre separada do edifício, junto ao primeiro problema

Análise Radiação: Ecotec+ Gueco for Grasshopper

exposto, o projeto fecha-se quase completamente para a favela e cidade. As duas conexões criadas estão muito distantes entre sí. O morro, cheio de níveis, pode ser melhor conectado ao edifício, captando as demandas em geral de todo o entorno, o projeto pode se abrir de forma mais espontânea para a cidade e em diversos níveis do morro. Diferente do SESC Pompéia, onde a torre de circulação destina-se apenas ao uso esportivo, aqui a circulação vertical deve assumir a mesma função que a rua interna do projeto de referência. São as vínculos com o entorno, no que diz respeito a verticalidade, que serão capazes de trazer a favela para dentro do edifício e sua maneira de se relacionar com o térreo é extremamente importante para fazer o entreposto cidade-favela. Sua forma monolítica também nada tem a dizer sobre o contexto em que está inserido e não expõe os desafios que o projeto objetiva vencer, é apenas uma reprodução sistemática de qualquer edifício da cidade formal. Um novo design faz-se necessário para atender à essas questões.

Ao lado: Imagens do desenvolvimento- Estudo espacial das lajes e da estrutura.

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Implantação

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13.1. Nova estética- Biomimética e as formas da natureza

1- FRANCO, José Tomas. Arquitetura Biomimética: O que podemos aprender da natureza? 2013. Disponível em: <http://www. archdaily.com. br/br/01-157662/ arquiteturabiomimetica-oque-podemosaprender-danatureza>. Acesso em: 17 fev 2015

2- CABI Database. Pycnoporus sanguineus. Disponível em: < http://www. speciesfungorum. org/ >. Acesso em: 14 março 2015

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Refletindo sobre o design aplicado ao projeto é quebrada totalmente a relação entre forma e função, deixando que os parâmetros volumétricos fossem muito além do seu uso, a partir deste momento sua relação com o programa é totalmente quebrada e sua volumetria é resultado de critério de implantação e conexões. Tendo em vista a relação direta do edifício com a pedra, segue-se então a biomimética que trata-se de uma vertente da arquitetura contenporânea que busca inspiração na natureza para maior eficiência em algum aspecto de projeto. ¹ Após realizar um estudo de insolação na superfície da rocha, cunclui-se que naquela parte do terreno, por conta do desenho da pedra e por se tratar de uma face norte, o local recebe pouca luz, neste caso, uma das estratégias para que o ambiente tenha maior superfície de contato com a parte externa, recebendo assim mais sol, é pensar em uma forma curva, capaz de aumentar a superfície da fachada e se aproximar das partes do morro desejadas. Existe ainda uma busca por uma estrutura inteligente que se integrasse a rocha existente,dentro deste contexto, em conjunto com uma inspiração das formas da natureza chega-se no fungo chamado Pycnoporus sanguineus, popularmente conhecido como Orelha de Pau. O nome popular faz alusão a seu formato, parecido com a de uma orelha crescendo sobre a madeira. A parte que é possivel ser vista é apenas o corpo de frutificação do fungo, sendo que o restante de sua estrutura está dentro do tronco da árvore parasitada.² O estudo desenvolvido em torno dessa forma foi todo em 3 dimensões, considerando primeiramente como e onde os elevadores e conexões deveriam estar, começou com formas retangulares e aos poucos as lajes foram sendo desenhadas. Introduzindo questões estruturais no desenho, por tentativa e erro chega-se a uma forma concreta. As lajes se deslocam de dois em dois metros,

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hora para a esquerda, hora para a direita, pensando nas conexões a serem geradas pelo edifício, aproximando-as ou recuando-as do morro. Do projeto anterior, mantém-se a ideia de um sistema estrutural feito em aço e para dar forma às lajes é considerado os usos e suas dimensões e ainda a modificação gradual dos mesmo conforme a proximidade com as camadas de implantação. Dentro desse contexto, é fixada uma malha de pilares de 1x1 metro com vão de 37,5x24,5 metros. Pensando no dimensionamento das vigas, que seriam enormes se tratando de um sistema viga pilar convencional, opta-se pelo sistema de vigas vierendeel metálicas, também conhecido como vierendeel truss, funcionando como um sistema de treliça, porém sendo capaz de ter um balanço maior. Pensando nessa questão da altura da viga, a vierendeel passa a ser útil quando leva-se em conta sua utilização como pavimento. Aqui a implantação também sofre algumas pequenas alterações no âmbito de design, o edifício habitacional se torna uma lâmina curva para

Ao lado: Imagem do desenvolvimentoPensando nas conexões desejadas e na localização do elevador.

Ao lado: Imagem do desenvolvimento - Primeiras lajes curvas- começo do pensamento estrutural.

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que possa fazer sombra nele mesmo e a pavimentação é também alterada.

Ao lado: Imagem do desenvolvimento - forma definida baseada em questões estruturais- Início do desenvolvimento da estrutura

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13.2. Parasita Resolvida a questão principal do sistema viga pilar, vem então a necessidade de pensar na interação dos mesmo com a rocha existente. O interessante aqui é que a estrutura do edifício terá que passar a funcionar exatamente como a estrutura de uma ponte, o que passa a fazer muito sentido quando se observa que o próprio é práticamente uma ponte vertical. Desenha-se então um engaste para as vigas que estão crescendo a partir dos pilares em direção a essas pedras. Esse engaste conta com chumbadores inseridos no interior da rocha, presos a um insert metálico parafusado nas vigas, que estão apoiadas em um console metálico com 50 centímetros de altura para evitar fissuras, este console também é parafusado em um insert engastado na pedra por chumbadores. O sistema viga junto ao console engastado na rocha, faz com que a última se comporte como um grande pilar, descarregando as forças no solo.

Isométrica estrutural.

Lajes Viga de borda

Vigas

Imagem: Cogumelo orelha de pau. Fonte Lela Orca.

Vigas Vierendeel

Console Pilares

Explodida Estutural

Detalhe do engaste 0

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1

3

6 149


13.3. O recuo da laje As brisas marítimas junto à costa começam frequentemente no final da manhã, cujo vento vindo do mar atinge o máximo no inicio da tarde e cessa ao anoitecer, sendo mais forte nos dias quentes e mais fraco quando o céu está nublado. A diferença de temperatura entre as superfícies terrestre e marítima é a causa fundamental da movimentação do ar, o que faz com que no princípio da tarde, quando é mais acentuada, o gradiente de pressão local entre o mar e a terra se torne mais intenso,e que o efeito da brisa marítima seja sentido seguindo uma direção mais próxima à paralela à costa. Durante a noite a brisa marítima sopra da terra para o mar nas camadas inferiores, resultado do resfriamento das superfícies por irradiação,assim sua intensidade é maior na terra que no oceano. Considerando os fatos acima descritos, foi feito um estudo para analisar o comportamento dos mesmo em relação ao edifício no Flow Design, software de simulação de túnel de vento desenvolvido pela Autodesk. A partir disso, foi observado que ao chegar na rocha o vento em sua maioria sobe, percorrendo toda a parede ou fazendo curvas delineando o morro. Consequentemente foram feitas aberturas em todas as lajes, deixando um espaçamento entre rocha e edifício, sendo que apenas as vigas e consoles metálicos ficam colados na rocha Isso porque assim existirá circulação de vento no vazio, garantindo a ventilação na parte do projeto voltada para o morro. Também foi observado que parte do vento contorna a superfície frontal do projeto, devido as curvas, fazendo com que a mesma seja resfriada.

Imagens: Flowl design - edifício sem recúo

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Corte perspectivado com a laje recuada

Imagem: Flowl design - edifício com recúo

Imagem: Flowl design - edifício com recúo 151


14. Expandir e conectar Resolvida a questão formal da volumetria do edifício parte-se para as questões de conexões com níveis diferente. O primeiro nível em que se aspira conectar é o de cota +84,33, relativo à área dos 60. Local pobre e muito carente de infraestrutura, estava dentro da área de atuação do programa Morar Carioca, porém não havia um projeto pré estabelecido e as obras foram paralisadas por falta de recursos. Uma conexão direta com a nova centralidade faz-se necessária. Aqui a questão do pé direito é muito importante, pois a partir dai é que se tem os níveis possiveis de se conectar. Nesse quesito o térreo tem um pé direito de 9 metros, o teatro de 10 metros. Na viga do teatro se aloca um pavimento com serviços como recepção, área de matrícula, restaurante, vestiários e setor de funcionários e ainda um grande hall de convivência, possuindo um pé direito de 3 metros. No pavimento seguinte está a primeira quadra poliesportiva, com o pé direito de 12 metros, visto que terão jogos de vôlei e, sendo assim a quadra seguinte também possui a mesma altura. No quinto pavimento aloca-se uma quadra e, por conta do recuo da laje superior, que é menor que as de baixo, visto que os usos nos pavimentos superiores requerem uma área menos extensa, junto a quadra existe um grande terraço com mesas para permanência e contemplação da vista da cidade, espaço esse descoberto para recebimento de sol. O pé direito é de 12 metros também, sendo que em sua viga é alocado um pavimento com usos educacionais com ateliers capazes de captar demandas já existentes no território, especialmente fotográfica, que já é bem forte, e marcenaria e tapeçaria. Além destes existem ainda mais 3 ateliers, o de cerâmica, de pintura e o de serigrafia. Junto a estes usos está a administração do edifício, tal pavimento viga possui 3 metros de pé direito. O pavimento superior, já na cota +88,78 é uma grande laje livre para lazer que possui um bar e um palco, aberto para qualquer tipo de evento ,podendo ser utilizado também como espaço público pela população local. É este o eleito para ser conectado com a área dos 60. Aqui é válido observar que o projeto foi expandido em relação ao estudo anterior, englobando mais usos 152

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culturais e educacionais e eliminando uma quadra poliesportiva, porém ainda mantendo a modificação da escala dos equipamento conforme se aproxima da favela. Os dois últimos pavimentos do edifício são utilizados para captar as demandas especiais do Morro da Providência, visto que primeiramente têm-se o pavimento da biblioteca, com um café e duas salas multiuso que fazem parte do programa de centro comunitário e no último pavimento estão alocados dois pequenos auditórios para palestras e simpósios, que poderão também ser utilizados como cinema, uma casa lotérica de grande porte, onde é possível que os moradores façam serviços bancários sem se deslocar até a cidade formal, uma sala de informática, uma brinquedoteca, uma sala para orientação jurídica e a sala da associação dos moradores.

PRAÇA ORATÓRIO ÁREA DOS 60 +110,8 +105,03

+84,33

+98,59

A cobertura é pensada como extensão da praça do Oratório e por conta do formato da laje é possível que sejam criadas sem dificuldade, duas rampas. A primeira rampa desce 50 centímetros até o deck próximo à capela do Cruzeiro, e a segunda sobe 1,5 metros até a praça do oratório. Aqui, ainda não existe um programa propriamente dito para esta laje, a ideia seria o embarque e o desembarque de passageiros porém, sua extensão permitiria algo além de uma praça, pois na favela o espaço público é mais que um local para sentar e bater papo, como colocado anteriormente, as pessoas tem o hábito de utilizar esses locais para o desenvolvimento de tarefas rotineiras. O térreo é elevado 2 metros e a área alagável é eliminada, para conectar a cota inicial do terreno (+23,00), novamente será feito uso de escada como circulação e permanência, contando com algumas rampas para garantir acessibilidade.

+112,0

+88,78

+85,00 +73,48 +60,89 +48,14

+44,36 +34,23 +25,00 +23,00

Neste momento é escolhida uma área vazia para a colocação de um deck na área dos 60 que receberá a conexão. Elege-se uma área livre na cota +85,00. Porém a dificuldade está na inclinação de 8,33% de uma rampa que chegue ali conectada ao edifício por conta da distância existente entre ambos, que é menor que a necessária contando extensão e patamar.

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15. O primeiro estudo de layout do edifício Ainda se tratando de um edifício baseado no programa oferecido pelo SESC Pompéia, é iniciado um estudo de layout das lajes desenvolvidas. Primeiramente existe uma preocupação com o que diz respeito a circulação dentro e fora do edifício e os usos que utilizam os grandes vãos,fazendo-se necessário estudar a localização do elevador em relação às quadras e ao teatro.

Primeiro Pavimento

A localização da circulação vertical foi considerada desde o estudo volumétrico inicial, em relação a vista frontal da fachada foi pensada para estar a direita, próximo ao fluxo que vem da estação Central do Brasil. Sendo assim,volta-se a entrada dos 4 elevadores principais para o lado direito, com uma escada de incêndio posterior e inicia-se o desenho do layout. Do lado esquerdo é colocado uma segunda circulação que conta com dois elevadores para menor escala.

Segundo Pavimento

O estudo se inicia pelos pavimentos de quadra poliesportiva, visto que seu dimensionamento é menos flexível. Esta é colocada no meio do vão formado entre os pilares, junto a arquibancadas dos dois lados. Aqui, as arquibancadas são desenhadas de forma a se adequar a própria estética das lajes com objetivo de obter um espaço fluido. Terceiro Pavimento

Quinto Pavimento

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Em seguida dá-se continuidade no primeiro pavimento, a intenção é de criar um espaço de foyer aberto, integrado com o restante dos demais usos que são colocados recuados da fachada. O foyer deve ter conexão direta com a circulação principal, se iniciando do lado direito e se estendendo até a circulação secundária. A partir deste ponto são alocados áreas destinadas a depósito de objetos de uso geral no teatro, como cenário e fantasias e em frente a entrada destes, onde são permitidos somente funcionários, é colocado um snakbar. Existe ainda a intenção de conectar diretamente o primeiro pavimento ao térreo, para que os elevadores em geral fiquem em segundo plano, por isso é desenhada uma escada aberta.

Quarto Pavimento

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Inspirado no SESC Pompéia, o teatro assume a forma de arena com um palco central e os camarins ficam na parte posterior contando com um 157


pequeno espaço de convivência para o elenco. Os sanitários públicos ficam numa área mais reservada próximo ao local onde estão os depósitos. Feito isso, segue-se para o desenho dos pavimentos utilizados para usos menores. O segundo pavimento, localizado no interior da viga do teatro abriga usos públicos em geral. Este conta com um restaurante, área de convivência, setor de funcionários, vestiários para as quadras, setor de matrículas, almoxarifado e espaço de manutenção, recepção e enfermaria. Aqui também o espaço de convivência deve ser conectado à circulação principal e os espaços fechados são recuados da fachada para criar uma circulação frontal. Terceiro, quarto e quinto pavimentos são quadras poliesportivas. As oficinas e ateliers relacionados a artesanatos potenciais desenvolvidos pela população da área são colocados no sexto pavimento, junto a outro grande vestiário para abastecer as quadras abaixo, este pavimento também está dentro de uma viga e aqui existe, como foi feito no segundo pavimento, um recuo da fachada com objetivo de criar uma circulação na mesma. Também é colocado o setor administrativo próximo a circulação principal com uma recepção com o objetivo de controlar o acesso. É projetada uma grande laje livre no sétimo pavimento, que abriga um bar e como todos os pavimentos, conta com sanitários públicos. A biblioteca é desenvolvida no pavimento de número oito, encostada na fachada para receber luz e junto a ela está o café, próximo à circulação, 3 salas de múltiplo uso e a sala do técnico em informática. No pavimento acima, o nono, estão usos diretamente destinados a população do Morro da Providência, sendo eles dois auditórios para pequenas palestras e simpósios dispostos próximos um do outro, conversíveis em cinemas se necessário, por isso é colocada uma bilheteria junto a circulação principal e a um pequeno hall de convivência, uma brinquedoteca colocada em frente a escada aberta para fazer conexão direta com a parte superior, uma sala de informática, uma casa lotérica também próxima à circulação, a sala da associação de moradores e de orientação jurídica. Escadas abertas são colocadas em todos os pavimentos com o objetivo de incentivar sua utilização.

Sexto Pavimento

Sétimo Pavimento

Oitavo Pavimento 10

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Nono Pavimento 50

na fachada se deu por acreditar no aproveitamento das curvas, porém é analisado o resultado final deste layout e conclui-se que não foi atingido o resultado esperado, tudo parece extremamente engessado, apesar das curvas existentes na laje, em planta o edifício continua monolítico. A circulação também fica comprometida, pois existem mais usos próximos à circulação secundária que à circulação principal e a ideia do percurso é perdida para um projeto que utiliza os elevadores como transporte expresso. A intenção de utilizar as escadas deixa o estudo tão preso que o edifício em si, de certa, forma perde o propósito de estar junto aos elevadores e, portanto algumas modificações se fazem necessárias neste momento.

Aqui, assim como no oitavo pavimento, a colocação de usos encostados 158

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16. Mezaninos e o espaço mais fluído 1- WOLFRUM, Sophie. Urbanismo performativo. O potencial performativo da arquitetura. In: ROSA, Marcos L. (Org.). Micro planejamento: Práticas urbanas criativas. São Paulo: Editora de Cultura, 2013. p. 212-223.- p.216

Em um primeiro momento, no estudo de layout do edifício, as arquibancadas voltadas para a fachada, junto a salas de dança e de ginástica, encontravam-se no mesmo nível das quadras poliesportivas. Visando uma flexibilidade neutra, já que segundo Wolfrum os espaços devem ter a capacidade de abrigar funções e hábitos sociais que ocorrem ao longo do tempo e ainda são pontos de intersecção de comportamento individual e uma expressão de atitude coletiva.¹ Para que o espaço fosse mais fluído cria-se então em todos os pavimentos de quadra um mezanino na fachada que passa a abrigar tanto os espaços para exercícios quanto as arquibancadas. Isso não só pela fluidez mas também considerando a demanda de circulação. Existem no projeto 4 elevadores principais e 2 outros pensados no uso exclusivo do edifício na parte onde existe mais demanda (até o sexto pavimento). Sendo assim, quando os ambientes se encontravam todos no mesmo nível os dois elevadores secundários acabavam por ficar sobrecarregados, visto que os elevadores principais antes davam as costas para a quadra, estando completamente separados dos demais usos. Sendo feitas essas considerações, modifica-se a orientação dos elevadores, virando-os 180 graus em relação a sua antiga localização, mudando também a escada de incêndio, encaixando ambos para que abastecessem os usos presentes nos mezaninos. Feito isso obtém-se uma distribuição mais equilibrada no que diz respeito a circulação vertical nos pavimentos de esportes. A mudança da localização do elevador implicou numa posterior modificação no layout de todo o edifício e a partir disso o fechamento começa a ser pensado de forma mais sólida. A fachada de todos os pavimentos é em sua maioria liberada, deixando presentes espaços de maior densidade e permanência, tirando dela pequenas salas e barreiras que possam impedir a entrada de iluminação.

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O oitavo e nono pavimentos são completamente modificados pensando na fluidez dos espaços e no fechamento e entrada de luz, assim como o primeiro pavimento que, por conta da mudança na circulação necessita ser totalmente redesenhado. No nono pavimento os dois auditórios passam a ser dispostos lado a lado, levando a sala de informática mais a esquerda. A brinquedoteca é fechada em uma sala para garantir a segurança das crianças que irão utilizá-la, eliminando para este ambiente a necessidade da proximidade com a escada aberta, assim como a bilheteria dos auditórios, visto que o uso é comunitário e ela não faz sentido ali. O espaço de convivência é trazido para a fachada e tanto a sala de orientação jurídica como a sala da associação de moradores são recuadas para o fundo do pavimento. As duas últimas ficam próximas a circulação principal bem como a casa lotérica. Ao lado da escada de incêndio é colocada uma sala multiuso, e visto o recuo das lajes em consequência do recuo da rocha, que ao longo de sua extensão recua 22 metros em direção à favela, é necessário que a escada de incêndio, tanto no nono como no oitavo pavimento estejam na fachada. Devido a isso sua forma é fluída, porém seu dimensionamento superior à norma por conta das curvas, garante sua eficiência. No oitavo pavimento a biblioteca é recuada da fachada, seu fechamento passa a ser curvo e em vidro para receber luz os sanitários são deslocados para a direita e o café passa a estar voltado para a fachada com mesas espalhadas próximo a circulação. A sala do técnico em informática é alocada para o sexto pavimento junto a usos educacionais, as três salas multiuso passam a ser duas com áreas maiores, sendo que uma, como anteriormente citado está no pavimento de cima e a outra se localiza neste pavimento também na parte posterior da escada de incêndio.

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O sétimo pavimento ganha uma cozinha exclusiva para o bar junto, a escada de incêndio a esquerda, sendo que o bar é deslocado para a extensão da cozinha com um balcão de atendimento voltado para o grande balcão do público. Este balcão de uso comunitário é pensado de forma que esteja coberto pela laje do pavimento superior e para que seja utilizado de forma coletiva, sendo que diferentes grupos podem se reunir em sua extensão e que a laje descoberta possa ser ocupada de diversas formas, dando um caráter menos privado ao local, que assume duas funções pois a conexão com a área dos 60 aloca-se neste pavimento por se tratar de um espaço mais livre,portanto além da função de bar ele passa a ser utilizado como circulação e ainda uma espécie de espaço público ou praça. No sexto pavimento as circulação entre os ateliers são alargadas tendo as quinas das paredes arredondadas para dar uma impressão contínua. Libera-se mais espaço a esquerda para circulação entre este uso educacional e o uso de lazer na laje superior, sendo que uma escada aberta é posicionada neste local para garantir uma conexão direta sem necessidade da utilização de elevadores. Nesta mesma área são colocados bancos para permanência dos alunos durante intervalos de aulas e afins, assim como para os funcionários da administração que está localizada do lado direito próximo a circulação principal, possuindo uma recepção que restringe a entrada de funcionários e convidados.

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O segundo pavimento também é modificado para que a área de conviência passe a ser mais fluida e que a impressão de esmagamento por conta dos usos próximos a fachada seja modificada. Diminui-se a área da sala de matrícula, pensando num esquema de senhas e, caso seja necessário esperar por um grande intervalo de tempo, é possível que as pessoas aguardem no espaço de convivência. Como já foi dito o pavimento do teatro (primeiro pavimento) é completamente modificado por conta da mudança da circulação, porém pensando na acústica a forma da arena é reconfigurada para um teatro circular onde o palco é central e o teatro possui 3 entradas radiais. O foyer está posicionado em volta de toda a borda sendo que a bilheteria fica no canto esquerdo. Neste pavimento também existe do lado direito uma escada aberta garantindo sua conexão direta com o térreo diminuindo a dependência do elevador. O snakbar é modificado, assumindo a forma de quiosque com algumas mesas a sua volta, próximas a escada. Na parte próxima a fachada deste pavimento recorre-se a mobiliário urbano, utilizando bancos de madeira ferro como os de uma praça, pensando também em um fechamento vazado na fachada. Do lado esquerdo é colocado usos privados do teatro como camarins, um hall de permanência para o elenco e um grande depósito. Aqui os elevadores secundários não farão parada e a fachada será fechada com vidro. Os sanitários públicos em geral são dispostos ao lado da escada de incêndio da circulação principal, sendo que apenas nos três últimos pavimentos eles serão alocados mais próximos a pedra, levando em consideração a intenção de não coloca-los na fachada. Com uma distribuição equilibrada em relação aos elevadores as escadas abertas são abolidas, considerando a altura do pé direito seria uma tarefa extremamente exaustiva fazer uso das mesmas. E ainda elas não supriam a necessidade de uma outra escada de incêndio em todos os pavimentos, perante isso foi mais conveniente não utiliza-las.

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Na cobertura é utilizada uma estratégia que junto ao transporte, é ser capaz de atrair usuários, uma horta comunitária. Billembourg e Klumpner acreditam na agricultura social e urbana, local, diversa e em pequena escala, como promotora de vida saudável, atividades sustentáveis vinculadas a novas atividades econômicas. Elas são capazes de encorajar a sociabilidade e o orgulho da propriedade, atenuando a tendência do individualizado.¹

1-BRILLEMBOURG; KLUMPNER,2013p.208

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17.1. Galápagos e a conexão da área dos 60 A conexão com a área dos 60 foi um desafio, visto que a distância existente entre a laje do edifício e o morro não permitia a inclinação correta para o desenvolvimento de uma rampa. Sendo assim para aumentar o perímetro da rampa é necessário que ela faça curvas. Seria mais fácil fazer essas curvas se elas fossem periódicas, porém o cálculo das mesmas em relação a inclinação. Visto o intervalo de tempo que este trabalho permite, calcular isto manualmente seria inviável, portanto é feito um estudo paramétrico para resolver essa questão. Os dados existentes são o ponto de saída da rampa e o ponto de chegada, que serão chamados respectivamente de PA (ponto alto) para o ponto que parte do edifício e PB para o ponto que chega na área dos 60.

Deseja-se descobrir uma curva periódica capaz de atender a inclinação desejada a partir do perímetro. Inicialmente é necessário achar o vetor perpendicular da linha formada por PA e PB. 172

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Por isso é extraído o plano do PB e PA é projetado no mesmo, ponto que será chamado de PA’. Sendo assim a linha PBPA’ é construída.

Agora é possível encontrar o plano perpendicular a linha PBPA’. Na sequência a linha PBPA é construída.

Sendo assim é extraído o plano formado pelas linhas PBPA e P0P0’.

Aqui a orientação Y é determinante no que se trata da orientação da senóide a ser construída, mas é necessário criá-la. Cria-se um determinado número de valores aleatórios que será reconstruído de acordo com a forma, ou seja, se tornará um outro valor. O componente remap pega cada um dos 129 valores (0-128) em sequência (séries) e transforma em números adaptados ao gráfico. Assim a forma é matematicamente obtida.

Para encontrar o vetor perpendicular a PBPA é necessário descobrir seu plano, por isso o ponto de origem do plano de PBPA’, chamado P0 é movido para a lateral levando-se em conta que para construir um plano é preciso duas orientações. E é construída a linha P0P0’.

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Se for necessário aumentar o número de repetições da senóide e aumentar ou diminuir o comprimento, basta modificar o gráfico. Logo, a curva PBPA é divida pelo mesmo número de valores utilizado para a construção do gráfico da senóide. 175


São combinadas todas as informações obtidas para construir a senóide inclinada. Recapitulando, foram obtidas as seguintes informações: A linha PAPB que foi divida por um número de pontos, o eixo perpendicular a PAPB e a forma da senóide com o mesmo número de pontos que PAPB. Objetivando transformar PAPB na senóide, é desconstruído o plano de PAPB e obtido o vetor y, sua orientação é combinada com os números do gráfico senoidal multiplicados por um determinado número variável (que será útil no futuro). Assim é extraído o comprimento da senóide na orientação Y do plano de PAPB.

Essa informação é utilizada para adaptar os pontos em que PAPB foi dividida, assim eles são movidos de acordo com a orientação da senoidal e uma curva é construída a partir deles.

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O procedimento foi todo para criar uma curva senoidal no mesmo eixo da linha PAPB. O próximo passo é adaptar esta forma a inclinação desejada,sendo ela uma relação entre distancia e altura, pensando matematicamente:

Assim, a partir do teorema de Pitágoras, uma equação com uma única incógnita é descoberta, visto que H (altura), é um valor conhecido. A partir do componente evaluate dentro do menu maths> script, as variáveis passam a ser flexíveis. Considerando que no Grasshopper a nomeclatura utilizada foi H= X e I= Y, decompondo o plano de PA e de PB e subtraíndo seus valores, é obtido o valor real de X. O Y será um valor menor ou igual a 0,0833 (8,33% de inclinação 8,33/100).

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Agora a maneira mais fácil de encontrar o comprimento desta senóide, a partir dos dados obtidos com simples relações trigonométricas é utilizar o plugin evolutivo do Grasshopper chamado Galápagos. Galápagos é um plugin derivado da computação evolutiva. Em geral a computação evolutiva é feita por programadores para programadores, porém este plugin foi desenvolvido para não programadores.¹ Mas o que é computação evolutiva? Trata-se de uma área da programação que tem evoluído cada vez mais dada sua capacidade em desenvolver algoritmos capazes de encontrar soluções adequadas para problemas mais complexos, também possui métodos simples baseados na teoria da evolução e na genética podendo ser produzidos por poucas linhas de código e sendo adaptáveis a diversos problemas.² O princípio é basicamente: dada uma população de indivíduos (um conjunto de soluções), parâmetros do ambiente desatam um processo de seleção natural, privilegiando as melhores soluções encontradas, causando um incremento na adequação dos resultados. A partir da função a ser otimizada (para mais ou para menos), é gerado de forma aleatória um conjunto de soluções, elementos que pertencem ao domínio da função, sendo ela aplicada para testar a qualidade dos resultados candidatos. Sua adequação é medida por um valor chamado Fitness. Assim as melhores soluções são utilizadas para gerarem uma nova população pela aplicação de operadores de recombinação e/ou mutação.² A recombinação envolve um operador que é aplicado em duas ou mais soluções novas (chamadas de filhos ou descendentes). A mutação é utilizada para alimentar uma candidata e gerar outra. No fim os filhos competem com as candidatas da geração anterior, se baseando no Fitness, a fim de assumir um lugar dentro da nova população. Esse processo é repetido até que seja encontrada uma solução adequada ou até um número máximo de iterações, também chamadas de gerações. A seleção vai favorecer os indivíduos mais bem adaptados, ou seja, com melhor fitness. A recombinação, assim como nas mutações genéticas, são aleatórias.³

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1- RUTTEN, David. Galápagos. Disponível em: <http://www. grasshopper3d.com/ group/galapagos>. Acesso em: 30 mar. 2015.

2- DELBEM, Alexandre Cláudio Botazzo; GABRIEL, Paulo Henrique Ribeiro. Fundamentos de Algoritmos Evolutivos. Disponível em: <http://www.icmc. usp.br/CMS/Arquivos/ arquivos_enviados/ BIBLIOTECA_113_ ND_75.pdf>. Acesso em: 20 maio 2015.

2- DELBEM, 2015.

Para solucionar a questão do comprimento da senóide este processo é utilizado visto que, como dito anteriormente, é uma forma de encontrar a solução adequada para problemas complexos através de algoritmos mais simples. O número que foi utilizado para multiplicar os valores da localização dos pontos do gráfico da senóide para gerar seu comprimento se trata na verdade da população do Galápagos, este parâmetro variável deve ser o mais adaptado possível para o comprimento buscado, por isso ele é conectado no input genetic do Galápagos.

O fitness aqui será o comprimento a partir da inclinação, dado que é por conta dela que o problema teve início. Então a partir do resultado obtido através do teorema de Pitágoras, o comprimento é extraído e subtraído ao comprimento da senóide e ligado em um componente o qual não importa o resultado, o número será positivo e este é o fitness.

3- DELBEM, 2015.

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O que vai acontecer é que, ao utilizar uma linha reta existe um dado comprimento para atender a inclinação desejada, a diferença entre ele e o comprimento da construção da senóide deve ser o menor possível para que a inclinação seja a mesma. Para isso serão feitas 50 combinações sendo que o número escolhido deve ser o mais próximo possível de 0. Como neste caso foi utilizada uma inclinação de 7,33%, já pensando em um algoritmo evolutivo, a variação decimal de zero para mais (0,01, 0,002 etc) não faz diferença aqui. Ao iniciar o Galápagos, ele começa a combinar os números para obter os resultados, que vão aparecendo no canto inferior direito da tela. Conforme os cálculos são feitos a curva vai sendo modificada. Assim, a partir do resultado obtido no Galápagos, os pontos da curva são realocados com a inclinação correta.

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É importante dizer que, caso o ponto de partida ou de chegada desta rampa mude, é só processar a definição novamente para obter uma nova curva e ainda caso o número de períodos da senóide não seja satisfatório também é possível que ele seja alterado pelo gráfico. Uma vez desenvolvida a definição é possível gerar um número infinito de opções.

Após o desenho da curva é necessário desenhar os patamares. Levando em conta que esses patamares devem estar presentes de um em um metro, inicia-se o processo extraindo o ponto final e inicial da senoide. Para saber a localização dos patamares são extraídos, no eixo z, os pontos de um em um metro de altura, localização onde devem estar os patamares.

Em seguida são extraídos o ponto final e inicial da curva (PB e PA).

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Descontruindo o plano do ponto final (ponto mais baixo = PB), é possível encontrar a projeção do ponto inicial (PA) na mesma altura (eixo z) de PB. Através dos 3 pontos, PA, PB e PA’ (projeção de PA no eixo z de PB) é possivel encontrar o plano da curva. Assim é construído um plano em cada ponto onde deve estar presente cada patamar, utilizando a orientação Y e Z do plano da curva. A geometria do plano é movida no eixo Y 70 centímetros para frente e para trás, sendo que o patamar terá no total 1 metro e 40 centímetros de largura.

É feita a intersecção dos planos com a curva, de forma a obter o comprimento exato dos segmentos, é obtido uma lista com 12 números relativos a dimensão dos mesmos, assim sabendo que os maiores números são comprimentos da rampa e as menores são os patamares, porém existe um elemento da lista nulo, relativo ao segmento de chegada no ponto mais baixo. Isso porque quando o plano é movido para frente a curva não existe.

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Não é necessário patamar neste ponto visto que é a chegada. Então com pumetree é removido o menor valor da lista, relativo a chegada e com o shatter, divide-se a curva original em segmentos. A média entre os comprimentos é um número menor que o das rampas e maior que dos patamares, usa-se o componente average para extrair-la. Assim a lista é dividida em duas contendo números menores ou que a média. As curvas relativas as rampas são reconstruidas com um número menor de pontos, para simplificar sua geometria e simplificar a extração de seus pontos finais.

São extraídos os pontos finais dos patamares, sendo projetados em um mesmo plano, formando um segmento plano.

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Na lista está contido o ponto mais alto, então pelo split list são removidos e unidos na mesma lista os pontos finais e iniciais de todas as curvas, tanto da rampa quanto do patamares, com o componente merge.

02- Teste 2 - Localização inadequada

Assim, com o interpolate, a lista de pontos é transformada na curva do perfil da rampa.

03- Teste 3 - Localização inadequada

17.2. Opções Parametria está diretamente ligada à opções, um ponto positivo considerando a volatividade da posição de partida e chegada da rampa. Como um algoritmo atua como uma receita de bolo, que segue passo a passo o que foi escrito em seu script, o trabalho é do próprio software em processar a nova localização dos pontos. Na conexão do edifício com a área dos 60,foram experimentados diversas posições, algumas descartadas por se chocarem com a rocha e outras pela inviabilidade estrutural.

01- Teste 1- Inviabilidade estrutural.

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04- Teste no pavimento abaixo.

05- Teste no pavimento acima

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Com isso, mudando a localização e a forma diversas vezes, uma curva base é eleita por sua amplitude menor e períodos mais longos, pensando prioritariamente na estrutura. A partir da curva rampa é modelada, com laje, viga e guarda corpo no Rhinoceros, com parte das vigas, em áreas mais distantes da sua normal, engastadas na pedra que desempenha a função de pilar. As demais conexões puderam ser feitas de forma simples, utilizando o cálculo convencional. Foi feito o uso de estrutura metálica.

Conexão pronta.

Conexão Modelagem

Conexão pronta. 186

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18. O fechamento do edifício 18.1. Primeiros experimentos No âmbito fachada existiam duas grandes preocupações e condicionantes: o local em que está inserido e a conexão com a cidade. Existiam algumas questões, no que diz respeito ao uso do edifício que deveriam ser respondidas antes de dar uma “cara” oficial para este edifício. Primeiramente elas foram enumeradas: 1- Quais as dinâmicas geradas pelo projeto? 2- Qual questão rizomática subsequente? 3- Como o objeto se representa? A performace no que diz respeito a implatanção é de edifício alimentador de aglomerações e fluxo. O objeto é elemento atrator, um polo e ao mesmo tempo em que cumpre sua função como sistema condutor também se trata de um projeto fixo e com limites, constituindo novas dinâmicas O projeto gera fluxos novos diversos dentro de uma única região, e como se trata de um objeto fixo e que sobreviverá por um grande intervalo de tempo será ator direto nas modificações territoriais subsequentes. Um dos fatores mantenedores de parte da infraestrutura implantanda destinada aos habitantes locais está na transferência direta de moradores da Pedra Lisa para o terreno, porém o fluxo gerado advindo da estação Central do Brasil é capaz de alimentar um ponto de luz no território trazendo melhorias na cidade no eixo conector entre edifício e estação de trem, a megaestrutura se bem representada na escala do pedestre pode ser captadora de demandas esportivas e culturais locais integrando e expandindo o cluster da praça Mauá, gerado pelas obras do Porto Maravilha, pela rua Senador Pompeu, a qual antes de chegar até o metrô abriga comércios, sendo durante a noite vazia e abandonada. Se o polo atrator for capaz de ter seu uso alimentado ao longo do tempo por grandes fluxos a rua terá consequências subjacentes e, pela proximidade com o metrô e com as novas estações de VLT, junto ao sistema de ciclovias implantado existe uma grande expectativa em torno disso, visto 188

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que a região necessita de locais de lazer no que diz respeito a espaços abertos e sombreados,que substituirão o seu antigo litoral hoje aterrado. As conexões diretas com o eixo histórico da favela também serão capazes de captar demandas turísticas de maior porte mas cumprirá sua função de facilitar a rotina do morador do morro, sem intervir diretamente no tecido. Assim a favela se adaptará à sua maneira, não existe uma forma de prever como um espaço sempre em movimento se adaptará à aquele polo a longo prazo, pois o tecido urbano da favela é rizomático e está sempre em modificação, porém espera-se que no encontro entre conexão e favela exista um desenvolvimento de pequeno porte, gerando novas formas de integração entre morador e visitante. É dessa forma que o objeto que se apresentar, conexões pouco agressivas e discretas com o morro, possuindo o mínimo de intervenção direta no tecido para que ele possa à sua maneira criar suas próprias dinâmicas, que serão trabalhadas e desenvolvidas gradualmente, porém sem negar seu uso performativo. Como abrigo de diversos tipos de pessoas se espera é que o usuário tenha interação direta com a favela, em um edifício abraçado pelo moro. Todavia faz-se necessário ressaltar que tudo aquilo também faz parte da cidade. Por isso de dentro do edifício sua relação com o exterior deve ser o mais aberta possível, o tornando quase que integrado visualmente com todo o entorno. É importante destacar que como os projetos de Medellín, este edifício não pretende abrir mão de sua sofisticação por estar inserido na favela, não é a fachada que define seu relacionamento com o morador do morro. Isso está diretamente relacionado às politicas públicas e ao diálogo criado durante a implantação do projeto entre morador usuário com prefeitura e arquitetos.

São criados painéis de fechamentos sólidos para o edifício, para que se possa avaliar o quanto de luz e calor a fachada irá receber durante o ano. Através do componente DIVA Daylight é possível realizar análises diversas A primeira análise feita é a de radiação solar anual, sendo o output uma imagem. Então o DIVA precisa de algumas informações, a primeira é o nome do projeto para que ele possa criar uma pasta onde vai colocar todos os arquivos de análise do mesmo. São feitos dois estudos, o primeiro sobre às superfícies de fechamento e o segundo às lajes. A superfície é vinculada a um componente de superfície e transformada em mesh para que possam ser extraídos os vértices e as normais, logo é necessário decompo-la para obter essas informações. Depois é preciso utilizar o componente de materiais do DIVA, é escolhido um material genérico de fachada para as superfícies externas. Através do componente merge toda a geometria é colocada em uma única lista e ligada ao input de geometria do DIVA e os vértices a seus repectivos inputs.

Então o primeiro estudo de fechada se dá avaliando a situação do edifício desprovido de fechamento em relação a quantidade de luz que ele recebe anualmente, assim é utilizado o DIVA, plugin para grasshopper capaz de fazer análises térmicas, de luz,radiação solar e de feixes de luz.

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É colocado também o componente boolean toggle, quando estiver em true a análise vai começar a processar, se estiver em false a análise está parada. Contudo são feitas as duas análises, tanto para lajes quando para o fechamento externo. Conclui-se que com excessão a face voltada para o leste, todo o edifício e em especial os andares mais baixos recebem pouca radiação durante o ano. Assim a fachada toda vazada é eficiente para a entrada de luz.

18.2. O elemento vazado Como todos os usos presentes na fachada não precisavam de iluminação direta, por isso opta-se por uma subdivisão das superfícies em forma de pirâmide, tendo 4 faces. A luz entra por cima refletindo nas demais, contribuindo para a reflexão, criando feixes de luz indireta. Logo de início a fachada é pensada toda em branco para que a cor seja capaz de refletir o máximo de raios de luz possível e esquentar o mínimo possível. Decidida a forma, foi necessário eleger um parâmeto capaz controlála, visto tempo de desenvolvimento do projeto. Como quantidade de luz é medido em lux, o número de aberturas desse elemento será controlado pelos número obtidos através de uma análise de iluminância do DIVA, a ideia inicial era de utilizar esses números para controlar a distância do e o número de subdivisões. Aqui não são tratadas questões de eficiência energética, pois é um assunto muito abrangente, o controle está ligado a forma porém estudos e parâmetros mais detalhados como a angulação solar, ângulos formados pela superfície do elemento e sol e suas respectivas projeções, temperatura e umidade do ar etc. Serão utilizados os números obtidos através da análise de iluminância como parâmetro de construção da geometria do elemento. Assim as superfícies de fachada são isoladas em um único arquivo. A geometria é trazida para o grasshopper para a análise de iluminância possa ser feita. Este passo apesar de simples é decisivo para que a geometria funcione construtivamente. O plano é que as subdivisões de todas as superfícies estejam alinhadas, possuindo um mesmo número de colunas e módulos de dimensões parecidas, uniformizando a aparência e facilitando a construção. Isso porque esses módulos podem ser enumerados por andar, fiada e coluna para que possam ser organizados quando forem construídos.

Análise de Radiação DIVA

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Então ao vincular as superfícies ao componente surface elas são separadas em 4 grupos de acordo com os pés direitos.

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O grupo 1 é formado pelo térreo, primeiro terceiro e quarto pavimentos.

O segundo grupo diz respeito ao fechamento dos pavimentos dentro das vigas.

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Cada superfície foi transformada em mesh, seguindo um determinado número de subdivisões. Para o grupo 1, com um pé direito médio de 11 metros, as superfícies são subdivididas em 6 partes na altura e em 120 no comprimento. As superfícies do grupo 2, com uma média de pé direito de 4 metros foram subdivididas em duas partes na altura e 120 no comprimento.

O terceiro grupo compreende às fachadas dos dois últimos pavimentos.

As superfícies do grupo 3, com 12 metros de altura juntas foram transformadas em uma única mesh com 8 subdivisões na altura e 120 no comprimento.

E o quarto grupo é formado pela superfície do oitavo pavimento.

Já a superfície do grupo 4 foi subdividida em 10 partes na altura e 120 no comprimento.

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As meshes foram separadas em dois grupos, sendo um para a mesh da parte de cima e um outro para parte de baixo que se transformará em uma única através do componente join

Os vértices das meshes foram unificados com os os componentes mesh weldvertices e weld mesh.

As normais foram unificadas com o mesh unify normals.

Para fazer uma a análise do DIVA foi necessário vincular a geometria existente ao componente de material e em seguida desconstruir a mesh para obter seus vértices e normais. 196

Vinculando os vértices e nomais da geometria, foi dado um nome aos estudos e com do weather data do Rio de Janeiro feita uma análise de iluminância no dia 22/12 (solstício de verão), com céu limpo com sol. Colocando um boolean toggle e ativando o true a análise foi processada, o que sai do output serão os números relativos aos níveis de illuminância. Aqui a definição foi dividida em dois arquivos, para facilitar o processamento de dados. Então para construir a forma em primeiro lugar é feita uma subdivisão das superfícies da fachada exatamente igual ao número de subdivisões das meshes da análise do DIVA. Isso porque para trabalhar com as listas em paralelo, dos números da análise e das subdivisões da superfície, é necessário que existam o mesmo número de elementos. O primeiro grupo de painés relativo a divisão das superfícies inferiores foram vinculados ao componente de superfície que recebeu flaten, e todas as listas se tornaram uma única. Isso porque era preciso obter as normais de cada ponto, então com evaluate surface obteve-se como output as nomais, o ponto desejado é o centro dos painéis, assim fez-se uso do MD Slider, colocando as coordenadas no centro. 197


Como não é conhecida a direção das normais, que são formadas por três pontos,a parir da desconstrução das faces foi encontrado o valor de Z, que é um número absoluto.

Então foi desenhado um vetor no eixo z do ponto central de cada painel com os respectivos valores remapeados, em seguida os pontos centrais originais do eixo são movidos por esses vetores de acordo com as distancias.

Foi neste momento que se fez uso dos números obtidos pelo do DIVA,assim eles são vinculados ao componente number, e com internalise data o number se torna independente do seu input.

Com list item cada ponto

A relação desejada é quanto maior a quantidade de luz recebida, menor sua altura e o número de aberturas do painel, assim dividiu-se um pelos números encontrados, determinando a proporção inversa. E como o resultado é muito pequeno foi multiplicado por 5000. Logo pegando as pontas da lista (maior e menor), foram remapeadas as variações dos números num intervalo de 0,25 a 1,00, com a intenção de utilizar um intervalo conhecido.

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foi isolado, sendo que o centro foi substituído pelo novo ponto e ligado a um input de 4 point surface, dando origem a cada face da pirâmide. Com merge as 4 faces os triângulos foram unidos em uma única lista, para fazer aberturas

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independentes em cada um porém de uma única vez. Para fazer a abertura foi feito uso da mesma relação inversamente proporcional em relação aos números obtidos na análise multiplicados por cinco mil, os números obtidos são modificados em inteiros, relativos a quantidade de pontos para que geometrias sejam populadas em cada face. Ou seja, o componente populate populará uma geometria dado um número de pontos, diretamente vinculado aos números da análise.

superfície superior. Com a variação do número de painéis foi possível ainda criar segunda opção, com peças que possuindo o dobro do tamanho, porém optou-se por fazer uso do modelo menor, pensado que as aberturas poderiam ser cortadas por laser e possuírem dobras e ainda, enumerando-as por fiada e coluna, estas poderiam ser montadas facilmente mas deveriam ter dimensões viáveis. Quando desenhadas, as superfícies dos painéis foram construídas a partir de curvas afastadas 20 centímetros das arestas das lajes, pois já era considerada a estrutura tubular metálica treliçada, com junções horizontais conectadas às vigas do edifício.

Os pontos são transformados em mesh, porém apenas com os pontos do populate não é possível fazê-las fechadas por isso utilizou-se do componente merge para incluir os pontos dos vértices. E assim as pirâmides se tornaram meshes com números de subdivisões diferentes. Para transformar os vértices das meshes em aberturas é utilizado um componente do plugin Weaverbrid, que é um modelador topológico que contém muitos dos operadores de compartimentação e de transformação. O componente utilizado é o weaverbird picture frame, que deu espessura para essas linhas formando uma espécie de quadro, aqui optou-se 8 milímetros de largura. Como tudo veio explodido foi necessário utilizar join para unificar as partes das pirâmides.

Coluna da esquerda: Opção escolhida Coluna da direita: Opção abandonada.

O mesmo processo foi repetido com a mesma proporção para a 200

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Fabricação com marcação- Cada peça é marcada de acordo com o andar, fiada e coluna.

Elemento vazado na escala global.

0,25

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0,75

1,75 Detalhe do fechamento 203


19 . Resultados Projetuais

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CORTE CC

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20. Considerações Finais É necessário concluir, apesar da imensa vontade de continuar. Ainda que a Providência deixe saudades este trabalho necessita ser encerrado. Diferente da canção de Cartola, que diz “Partiu e não me disse mais nada. Já ia distanciada quando ela parou e acenou com a mão e desapareceu.”, este encerramento tem muito a dizer. A experiência projetual no morro mostra que a arquitetura é produto de ensaios diversos, que por tentativa e erro, busca eleger o melhor modelo desenvolvido. É necessário experimentar e os tecidos rizomáticos das favelas trazem um cenário projetual muito rico para o desenvolvimento de possibilidades diversas de intervenção. O espaço que está sempre em movimento traz uma infinidade de possibilidades, já que o futuro destes é emergir com o passar do tempo. Não existe um modelo previamente estabelecido ou uma verdade imutável sobre estas áreas, pelo fato de que modificações diversas ocorrem diariamente e se dão ao acaso. Essa complexidade faz com que não existam meios de consolidar uma forma de interferência,para o desenvolvimento de qualquer modelo nestes territórios faz-se necessário experimentos diversos munidos de diversas ferramentas para a compreensão da topografia. A implantação em layers possibilita variáveis números de conexões, mas também necessita inúmeros estudos para compreensão técnica e posterior elaboração de táticas projetuais eficientes que façam ligações diversas entre diferentes níveis. Por isso, técnicas de modelagem em três dimensões se fazem extremamente úteis e presentes neste caso, é impossível fazer uso de ferramentas uni dimensionais de forma eficaz. A eficiência programática nesses territórios está diretamente ligada ao contato com os habitantes. Ainda que o asfalto se faça presente para realização de tarefas rotineiras pela falta de infraestrutura, é ali que os moradores se sentem em casa, o sentimento de coletividade se faz mais presente nas favelas que na cidade formal, pois estes moradores possuem habitações cingidas por pessoas queridas. 224

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O reflexo dessa ligação entre os nativos está na intensidade do engajamento da luta social. Vendo que não existe a possibilidade de sobrevivência no mundo feroz, regido pela lógica do capital, os moradores do morro se unem para lutar contra o tratores da cruel politica urbana atual. A falta de espaço público reflete a maneira como a sociedade contemporânea é construída, afinal é instrumento da prática da democracia desde a Grécia Antiga. Essa emergência por locais coletivos nas favelas mostra a existência da deficiência no âmbito de políticas públicas, que por diversas vezes prioriza o capital em detrimento das pessoas. Assim, a cidade é construída fundamentada na lógica do espetáculo, sendo especialmente o Rio de Janeiro a cidade do entretenimento tropical, onde o turismo atropela o cidadão das classes D e E. Cabe ao arquiteto, no desenvolvimento desses espaços, desenhá-los de maneira que ergam-se de forma espontânea as dinâmicas diárias, fazendo parte da rotina dos usuários. Entretanto é essencial que quem desenhe esses locais esteja consciente de que os mesmos devem possuir deveras um grande potencial adaptativo, por isso faz-se necessário vivenciar essas áreas, conhecer suas dinâmicas e rotinas, pensando que a cidade não é um locus solus e sim um locus communis.

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