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História Real

Autor: Rogério Rosa

História real

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Titulo: “Vida de Sal e Açúcar”

Antologia “Ei-los que Partem”

Pequena Biografia:

Rogério Rosa. Nascido em Alcântara em 1964

Frequência no Centro Infantil Hellen Keller e no Instituto António Feliciano de Castilho em Campo de Ourique. Sendo portador de deficiência visual, não cego.

Frequência na Escola Preparatória Manuel da Maia. Instituto Superior de Ciências Educativas em Licenciatura de Educação Social e Universidade Lusófona na Licenciatura emn Serviço Social.

Actor de cinema, teatro e televisão. Repórter da Escrita e colaborador da Olhares tv, Cmtv e do site magazine: Repórter da escrita e do blog: informativo, O Pivot de informação.

Autor do conto ”Não há Sonhos Traídos”, cujo meu pseudónimo Paulo Mickey, for a publicado na Antologia: “A minha Vida dava Um Filme” da Arroz de Papel Editora.

Vida de Sal e Açúcar

Há muitos anos atrás, um rapaz de seu primeiro nome Carlos, nasceu de uma sem amor, sem princípios. Aos 3 meses, for a deixado no Hospital da Santa Casa, e que depois seria usado como pretexto para adopção. A mãe não o queria, o pai estava fora e como não se dava com a sogra e a sua mãe, já tinha a sua primeira filha, decidiu livrar-se deste.

Quando os avós paternos souberam, nem queriam acreditar no que tinham acabado de saber. Foram ao encontro do neto e trouxeram-no para casa. Ainda sem nome, a avó quis baptizar e colocou o nome do pai dele. A Igreja de S. Francisco de Paula á Pampulha, nesse dia, já estava com outro baptizado, mas o Padre Vicente, não quis de deixar que aquela criança sem baptismo. Mas, quando os avós maternos tiveram conhecimento, foram obrigar os compadres a desmanchar esse mesmo baptismo. Armando um tremendo escândalo na Paróquia, ameaçando o Padre, sacristão e afins, para anular, apenas pelo belo prazer de porem o nome que quisessem. Tiveram hipótese de colocar 2 nomes, António, que seria o mais provável ou o da igreja, Francisco. Pois a cegueira era tanta, que meteram o nome do avô materno, que não gostava do neto. Um casal que estavam como hóspede dos avós paternos, assistiram aquele filme todo. Muitos anos depois, acabaram por confirmar aquilo tudo. O pior de tudo, foi que nem padrinhos de baptismo tiveram, foi o próprio sacristão e uma senhora de nome Maria Helena, de Algés ali presente, que tinha acabado de ser madrinha de uma criança, que estava a morrer, é que ficou para ser de novo madrinha do Carlos, já com outro nome. Francisco Relvas, outro nome que assinou como testemunha em nome do Registo Civil.

A casa era pobre, como pobres eram a suas vidas. O avô era engraxador e a sua avó, era vendedeira de fruta na Praça da Ribeira ao Cais do Sodré. Uma vida de sacrifício o deles e para que não bastasse, iam criar aquele neto que nunca deveria ter nascido assim de um casal, que não se amava e que, nem queriam sequer trabalhar.

As brincadeiras eram o seu passatempo. Carlos, gostava da irmã, mas era sacudido pelos avós maternos. Estes detestam-no e nem sequer evitavam!

A Vida de Sal do Carlos era aquela. Brincava com um dos miúdos lá na rua, chamado Paulo e pouco mais. Um dia o avô materno, foi buscá-lo para o levar para a Colónia Balnear Infantil do Século. Pensou que finalmente se ia encontrar com a irmã, mas foi um pensamento que se desfez, quando percebeu e só ele, que a sua irmã, estivera lá o ano anterior. Durante aqueles 3 meses de Verão, não teve visitas, a não ser, uma da avó e da tia. Fez lá amigos. Encontrou até um amigo que morava na mesma rua, e nem sequer se tinham encontrado no bairro, o João Luís. Este, partilhava bolachas que a mãe dele lhe trazia, antevendo que ele, Carlos, não recebia ninguém.

No final da época balnear, todos se deslocavam para o Cais do Sodré, onde os familiares estariam á esperas das crianças e curiosamente, a avó do Carlos e a sua tia, estavam á sua espera. Foram para casa. Estava quase a chegar o dia de escola.

Era um colégio que se situava em Campo de Ourique, chamado Instituto António Feliciano de Castilho. Este colégio já foi asilo de cegos, de velhos, e mais tarde, de meninas. Só a partir da década de 70, passou a ser misto.

Foram cerca de 6 anos, de internamento, mas que tinha como todas as crianças, as devidas férias de Natal, Páscoa e Verão. Carlos tinha 2 casas para partilhar. A casa dos avós que o detestavam, mas era onde a mãe dele estava com a irmã e a casa dos avós paternos, que o amavam.

Os avós paternos eram o porto de abrigo. o Carlos, era o seu Ai Jesus!, Amor incondicional. Não havia para eles, miséria, pobreza, na presença do netinho. Acometido no entanto do Sarampo que á época, seria muito perigoso e como as condições habitacionais não eram as melhores, a avó, pediu a seu Santo protector, que lhe disse ter chegado a conhecer ou pelo menos a conhecer os seus milagres ainda em vida, o Santo Padre Cruz. Pediu para que o seu neto não cegasse, lhe conservasse a vista. Assim aconteceu. Foi ao que contou anos mais tarde, no Hospital D. Estefânia, que o Sarampo lhe tivera saltado á vista.

Os serões eram passados em casa. O avô mais bêbado que o costume, falava com Carlos, como se ele fosse um adolescente. Carinhoso, risonho, e de luz apagada na sala de jantar, os 2 sentados á mesa iam falando até que o avô, acabava por dormir ali na mesa e o Carlos, acordava-o para que ele se fosse deitar. A avó, já dormia e acordava em constantes sobressaltos pois, Carlos não havia maneira de ir para a cama devido ao avô.

Os tios que vieram de Angola, queria a casa da avó, já que o avô tinha morrido. A avó, sempre vivera ali há mais de 50 anos. Outros filhos dela, vieram de Moçambique e depressa arranjaram casa, mas aqueles, eram renitentes. Assim de uma hora para a outra, levaram-na ao engano, a passear, etc, enquanto o genro e a filha, iam tratar de lhe tirar a casa. Na sequência disso, deu-lhe uma trombose, que teve de ir para um lar,

Carlos, acompanhava tudo aquilo com tanta perplexidade, que por ser novo, não tinha opinião ou não lhe davam esse direito.

Mais tarde, melhorou, mas piorou a sua maneira de lidar com a situação. Andou de casa em casa, um mês em casa de cada filho, sendo 5 filhos. Depois de uma vida de sacrifícios, de vendas, de criar os filhos, de aturar o marido, bêbado praticamente todos os dias, era altura de estar em sua casa, a descansar, a VIVER! Mas, os seus pensamentos, levaram-na a repetir as tromboses e o Carlos, a ver tudo aquilo a desmoronar. Abeirou-se da avó, um dia na casa de seu pai, e disse, que gostaria de morrer com ela. Ela ao olhar para ela respondeu: -Nunca!. Ele tinha de viver, de crescer, de ser homem.

Hoje, em 2018, o Carlos, cresceu, fez-se homem, tornou-se actor, frequentou faculdades, onde continua. Tirou cursos de jornalismo, tendo um site Repórter da Escrita- https://reporterdaescrita.pt e https://opivotdeinformacao.blogspot.com

A avó partiu em 1882, foi o Carlos, que recebeu o telefonema do Hospital Egas Moniz, a notícia da morte da avó em casa do pai.

Com a moldura dos avós em sua casa, olha e continua a amá-los sempre. Esse Carlos, era eu, Rogério! Uma vida de facto de sal, mas também de açúcar!

Aqui fica uma justíssima homenagem, á minha avó Carolina e ao meu avô Manuel!

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