Revista Biomassa BR Ed 46

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Vol. 06 - Nº 46 - Nov/Dez 2019

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DEZEMBRO

2019

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04 Sistema de automação para digestor anaeróbio em batelada

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Carbonização da madeira de quatro espécies florestais nativas

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Carbonização hidrotérmica de resíduos do café

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A revolução energética e a Inovação

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Artigo

SISTEMA DE AUTOMAÇÃO PARA DIGESTOR ANAERÓBIO EM BATELADA, INTEGRADO AOS 3 NÍVEIS DE AUTOMAÇÃO: SENSORES ATUADORES, CONTROLADORES E SUPERVISÃO Brenno Vinicius de Medeiros Lima1; Astrid Lorena Torres Albarracin2; Sayuri Higo Daniel3; Lucas Monteiro Galotti de Souza4; Bruna de Souza Moraes5 Universidade Estadual de Campinas - Campinas- SP brenno.ufersa@hotmail.com

RESUMO Dentre as problemáticas ambientais encontradas na indústria do etanol, se destaca o descarte da vinhaça, corrente residual da destilação do álcool da cana-de-açúcar. Uma das alternativas para o tratamento deste efluente é a digestão anaeróbia (DA). Diante do número de parâmetros a serem controlados, cada vez mais se faz necessária a incorporação de sistemas automatizados para maximização da eficiência de produção do biogás. Neste contexto foi realizado um estudo de caso em um digestor anaeróbio em batelada hipotético, integrando os três níveis de automação: sensores atuadores, controlador e supervisão, controlando parâmetros: temperatura, potencial hidrogenionico, pressão, vazão de alimentação de vinhaça, inoculo e gás inerte. Para realizar a automação foram utilizados os softwares TIA PORTAL 13, ESCADA BR ELIPSE, DRIVER SIEMENS MPROT. Além disso para a parte de hardware: PLC ET200S e HMI SIEMENS SIMATICA. A linguagem de programação utilizada foi LADDER. Os resultados apresentaram que o sistema automatizado é eficiente para controlar desajustes nestes parâmetros, permitindo o controle do digestor em tempo real através da Human-Machine Interface (HMI) e supervisório. Palavras-chave. Biogás. Digestor anaeróbio. Vinhaça. Automação. PLC.

INTRODUÇÃO

contribuindo dessa forma para diversificação da matriz energética limpa, Dentre as problemáticas ambien- redução do uso de combustíveis fóstais encontradas na indústria do eta- seis e da quantidade de resíduos disnol, se destaca o descarte da vinhaça, postos erroneamente (SALOMÃO et corrente residual da destilação do ál- al., 2017). cool da cana-de-açúcar, caracterizada Para alcançar o rendimento ótipor seu grande volume de geração, alto teor de matéria orgânica e acidez, mo da DA, alguns parâmetros no que se destinada e tratada inadequa- interior do digestor devem ser condamente pode ser nociva ao ecossis- trolados. Como o processo é intermetema. Por conta disso, é necessária a diado pela ação de microrganismos, implantação de métodos para rea- os fatores mais importantes a serem proveitamento deste tipo de resíduo monitorados são o potencial hidrogeniônico (pH), temperatura, pressão e (CHRISTOFOLETTI et al., 2013). condições anaeróbias, assim como a Atualmente uma das tecnolo- alimentação de substrato, inóculo e gias aplicadas para tratamento deste saída de efluentes (BAJPAI, 2017). efluente, é a DA, que realiza a degraSegundo SHUBEITA, 2014 o dação da fração orgânica do resíduo, por meio de microrganismos anaeró- grande número de parâmetros a sebios, produzindo, principalmente, o rem controlados faz com que seja cada biogás e um subproduto com efeitos vez mais necessária a incorporação fertilizantes, o biodigerido (SILVA et de sistemas automatizados para maximização da eficiência de produção al., 2016). do biogás. Uma alternativa para esta A produção do biogás a partir da problemática são sistemas baseados vinhaça tem sido amplamente explo- em Programmable Logic Controller rada, devido as consideráveis concen- (PLC) softwares de supervisão e contrações de metano em sua compo- trole, instrumentação microprocessasição, que se incinerado pode gerar da, HMI e outras tecnologias de coenergia térmica, mecânica ou elétrica, municação em rede, permitindo que a 4

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geração, distribuição e medição de gás possam ser realizadas remotamente, i.e, uma gestão energética otimizada (COSTA, 2016). O monitoramento de biodigestores pode permitir também a recuperação da eficiência do processo quando alguma variável se comportar de maneira inesperada. Com a automação associada à biodigestão será possível abrir e fechar as válvulas que controlam a entrada do inóculo e substrato de acordo com o nível desejado, assim como a administração da temperatura, pressão e alcalinidade (SHUBEITA, 2014). Levando em consideração a complexidade no controle da operação foi realizado um estudo de caso em um digestor anaeróbio hipotético integrando os três níveis de automação: sensores e atuadores, controlador e supervisão. O controle automático do processo garante uma produção eficiente e ajustes no processo de forma específica, promovendo uma otimização operacional do sistema. Nesse contexto o trabalho tem por objetivo realizar a automação de


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um DA em batelada hipotético, integrando os três níveis de automação: sensores atuadores, controlador e supervisão, controlando parâmetros: temperatura, potencial hidrogenionico, pressão, vazão de alimentação da vinhaça, inoculo e gás inerte. Desta forma realizando uma conexão entre PLC, HMI e supervisório. Material e Métodos O processo de produção de biogás simulado foi a partir do tratamento de vinhaça, controlando os seguintes parâmetros: alimentação de substrato e inóculo, pH, temperatura, pressão e de acionamento em cada uma das válcontrole do meio anaeróbio. vulas podendo ser ajustadas pelo operador. Após realizar a programação Para a realização da simulação lógica no PLC, foi necessário realizar foi utilizado recursos disponíveis na a configuração e construção da HMI, Universidade de Campinas – UNI- com variáveis similares às variáveis da CAMP. Onde sendo utilizados os sof- programação lógica do PLC. twares TIA PORTAL 13, ESCADA BR ELIPSE, DRIVER SIEMENS MPROT. A última etapa da automação Além disso para a parte de hardware consiste na construção do supervisófoi utilizado o PLC ET200S e HMI rio integrando as variáveis de forma SIEMENS SIMATIC. A linguagem simultânea à variável da programade programação utilizada tanto para ção lógica do PLC e HMI. O procesa configuração quanto para a progra- so consiste em utilizar a produção de mação dos softwares e hardware foi biogás para alimentação em uma cala programação em LADDER. Pos- deira operando com biomassa sólida teriormente foi utilizado o Driver de e biogás. O software da SIEMENS foi comunicação, DRIVER SIEMENS utilizado para realizar a integração, MPROT concluindo a conexão entre sendo estabelecida a comunicação o PLC, HMI e o supervisório. através do DRIVER MPROT. Por meio da programação em LADDER foi possível realizar a simulação e automação do problema proposto no PLC, construindo etapas de definição de variáveis na entrada e saída, estrutura organizacional, aplicação de blocos, utilizando sensores de níveis, pressão, temperatura, pH, além da aplicação de temporizadores e contatos. A Figura 1 representa uma etapa da programação em ladder definindo as variáveis de sensores de nível, sensor atuador analógico para mensurar a variação de pH, válvulas para alimentação de gás inerte e saída da mistura de gases aplicados a temporizadores, além de alarmes. A programação do sistema foi elaborada existindo acionamento inicial, emergência e chaves seletoras para opção automática e manual, alarmes indicando nível vazio e início de operação, como também alertas que podem ocorrer durante a operação, além 6

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Resultados e Discussão O estudo de caso resultou no desenvolvimento de um biodigestor alimentado com o substrato por uma válvula até atingir o sensor de nível, quando a alimentação de vinhaça é interrompida. Com esta interrupção é iniciada, através da válvula, a adição de inóculo, sendo esta adição cessada após atingir outro sensor de nível. Em seguida é acionada uma válvula com hidróxido de sódio (NaOH) para correção do pH da mistura, por meio de um sensor atuador analógico de pH que é desligado quando o valor requerido (7,0) é atingido. Posteriormente à correção do pH é acionada uma válvula, contendo gás inerte que deve escoar por 30 segundos. Após 20 segundos da contagem do gás inerte é acionada uma válvula para saída da mistura de gases durante 10 segundos, sendo que ambas as válvulas encontram-se simultaneamente atuadas neste período

e desativadas simultaneamente, promovendo a anaerobiose do meio. Sequencialmente é acionado o sensor de temperatura para garantir que o processo fique entre 50ºC a 55°C, sendo acionado e negativado por sensores atuadores durante o processo. O processo sofre variações de pH durante a DA que será mensurado pelo sensor de pH e corrigido até o meio neutro pela adição de NaOH atuado por uma válvula. Uma válvula localizada na extremidade superior deve ser aberta a cada 5 dias para liberar o biogás produzido, e posteriormente desativada até atingir a pressão pré-estabelecida. O processo leva um período de 30 dias compreendendo a liberação do biogás e do efluente biodigerido pela abertura das válvulas, até atingir o sensor de nível vazio e encerrando a batelada para que seja iniciado um novo ciclo. A automação conta com um sistema manual que pode ser realizado ajustes pelo operador, como pular a etapa de inserção de gás inerte, opções de paradas de emergência, acionamento e negação de válvulas, além de alarmes de operação. Após as etapas de programação lógica e construção da HMI teve-se como resposta a interface homem máquina representada na Figura 2. Tal interface foi supervisionada por um microcomputador (PC), que compreendia o sistema supervisório (Figura 3). Após realizada a conexão entre PLC, HMI e supervisório foram conectadas chaves, potenciômetros e botoeiras ao PLC nas entradas digitais e analógicas, variando parâmetros como temperatura, pH, alimentação de inóculo e substrato, e diferentes valores de pH, realizando interações


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Artigo Figura 2 – Programação Lógica integrada a HMI.

interferências de operação manual. As simulações mostraram que o sistema automatizado é eficiente para controlar desajustes nestes parâmetros, permitindo o controle do digestor em tempo real. Tal controle poderia evitar um possível colapso do processo biológico em função do atraso na detecção de problemas a que fica suscetível o sistema com monitoramento manual. Após realizar a simulação completa do sistema podemos perceber que a automação proposta foi realizada. Agradecimentos Este trabalho foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) processo nº2016/16438-3 e pelo Fundo de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e Extensão (FAEPEX) processo nº 2131/18.

Referências Bibliográficas BAJPAI, P. (2017). Process Parameters Affecting An aerobic Digestion. CHRISTOFOLETTI, C. A. et al. (2016). Sugarcane vinasse: Environmental implications of its use. COSTA, C. E OLVIEIRA, T. (2016). Proposta para automação de biodigestores rurais visando maior segurança e eficiência em sua implantação. Congresso Técnico Científico da Encom as válvulas e sensores de nível. eram também informadas no mesmo. genharia e da Agronomia. Durante o ensaio foram definidos em Desta forma consegue-se monitorar a um digestor real, e.g., falhas nos senso- automação obtendo êxito na sua exe- SALOMÓN, A. Cruz et al. (2017). Biogas production from a native beres de níveis, variações bruscas de pH cução. verage vinasse using a modified UASB e temperatura, falhas na alimentação, bioreactor. Conclusões alarmes e botoeiras de emergência. Também foram simuladas situações O estudo teve por finalidade de- SHUBEITA, F. et al. (2014). Um estuno processo manual, onde o operador aciona ou negativa válvulas. A opção senvolver e acompanhar a automação do sobre monitoramento e controle manual é um incremento significa- de um digestor anaeróbio em batelada de biodigestores de pequena escala. tivo, pois através dela pode-se optar para produção de biogás, integrando Programa de Pós-Graduação em Cipelo acionamento ou não da válvula os 3 níveis de automação: sensores ência da Computação. Faculdade de de gás inerte para os demais ciclos em atuadores, controladores e supervisão. Informática. Pontifícia Universidade Por meio da linguagem de programa- Católica do Rio Grande do Sul. que o meio se encontra anaeróbio. ção, os principais parâmetros de conToda a interação realizada pelo trole da DA (pH, temperatura, pres- SILVA, E. A. et al. (2016). Anaerobic operador, via touch screen através do são, vazão de entrada e de saída de gás biodigestion of sugarcane vinasse unHMI. foi repassada para o supervisó- e fase líquida) foram automatizados der mesophilic conditions using mario em tempo real, onde as alterações com sucesso, mas ainda permitindo nure as inoculum. 8

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CARBONIZAÇÃO DA MADEIRA DE QUATRO ESPÉCIES FLORESTAIS NATIVAS Djeison Felipe Voos1, Martha Andreia Brand2, Gustavo Friederichs3, Adriel Furtado de Carvalho3, Aline Lima de Sena5 Programa de Pós-graduação em Engenharia Florestal, Centro de Ciências Agroveterinárias (CAV), Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), 88520-000, Lages –SC, Brasil. e-mail (raamongabriel@gmail.com) 2 Orientadora, Professora do Departamento de Engenharia Florestal do Centro de Ciências Agroveterinárias – a2mab@cav.udesc.br 3 Acadêmico do Curso de Engenharia Florestal – Centro de Ciências Agroveterinárias - UDESC 4 Acadêmico do Curso de Engenharia Florestal – Centro de Ciências Agroveterinárias -UDESC. 5 Mestranda do Programa de Pós Graduação em Engenharia Florestal – Centro de Ciências Agroveterinárias - UDESC. 1

RESUMO Na região de Biguaçu, SC, agricultores familiares utilizam o sistema “roça de toco” para manejar pequenos fragmentos florestais de forma sustentável, cultivando culturas anuais e produzindo carvão vegetal. A madeira destinada a produção de carvão vegetal para uso doméstico deve ser de qualidade para que o produto final da carbonização apresente características desejáveis. O carvão vegetal de boa qualidade deve apresentar alta massa específica aparente, alto teor de carbono fixo e poder calorífico, baixa umidade, baixo teor de materiais voláteis e cinzas. Além das variáveis relacionadas ao carvão vegetal, deseja-se que o processo produtivo apresente bons rendimentos. Dessa forma, o presente estudo tem por objetivo avaliar a massa específica da madeira e carvão vegetal produzido a partir de quatro espécies florestais, bem como avaliar o processo de carbonização. As espécies florestais estudadas foram Bracatinga (Mimosa scabrella), Jacatirão (Miconia cinnamomifolia), Licurana (Hieronyma alchorneoides) e Embaúba (Cecropia glaziovii). A madeira das espécies estudadas apresenta qualidade para a produção de energia, com massa específica aparente média de 0,599 g.cm-3. A rotina de carbonização teve baixa variabilidade quanto ao rendimento gravimétrico do carvão vegetal produzido, sendo adequada para as espécies estudadas. A qualidade da madeira e carvão vegetal decresce de Licurana, Bracatinga, Jacatirão e Embaúba. Palavras-chave. “roça-de-toco”, carvão vegetal, qualidade da madeira.

Introdução A qualidade do carvão vegetal destinado ao uso doméstico tem sido pouco estudada se comparada àquele destinado ao uso industrial, fato esse da sua elevada representatividade econômica na produção de aço e ferro gusa. Não somente a carência de estudos relacionados ao uso doméstico do carvão vegetal, mas a falta de normas padronizadoras também dificulta a consolidação do produto. Ribeiro & Vale (2006) destacam pontos que devem ser considerados quanto a carvão vegetal de qualidade para o uso domésti10 Revista Biomassa BR

co, devendo apresentar: alta densidade relativa aparente, alto teor de carbono fixo, alto poder calorífico, baixa umidade, baixo teor de materiais voláteis e baixo teor de cinzas. Contudo, a qualidade do carvão vegetal para o uso doméstico é muito variável e duvidosa, pois o controle da carbonização é difícil em grande parte dos fornos (COUTINHO & FERRAZ, 1988). Botrel et al. (2007) mencionam que a avaliação do rendimento do processo de carbonização é de suma importância e que apresenta variabilidade até na espécie. Pereira et al. (2012) destacam que o rendimento gravimétrico do

carvão vegetal é influenciado pelas propriedades químicas da madeira, apresentando maiores valores para madeiras com maiores teores de lignina e menores de extrativos. No estado de Santa Catarina, Brand et al. (2013) destacam que existem poucos estudos direcionados à produção e à qualidade do carvão vegetal para uso doméstico (churrasco). Os autores ainda destacam que no estado, um grande número de agricultores familiares produz carvão vegetal para a complementação da renda familiar, sendo a prática do sistema de manejo “roça-de-toco” associada a essa produção.


Assim, este trabalho teve o objetivo de avaliar a carbonização da madeira de quatro espécies florestais nativas da região de Biguaçu, Santa Catarina, bem como a qualidade física da madeira e carvão vegetal produzido. Material e Métodos Área de estudo O presente estudo foi realizado através da coleta da madeira de quatro espécies florestais nativas na comunidade de Três Riachos (latitude 27º 25’ S e longitude 48º 48’ O), interior do município de Biguaçu, litoral de Santa Catarina. O município está inserido na região que compõe a Florestal Ombrófila Densa e segundo Alvares et al. (2013), o clima regional pela classificação de Köppen é Cfa, com altitude média de 140 m, precipitação anual acima de 1690 mm e temperatura média anual de 19,8 ºC. Material de estudo Foram coletados vários indivíduos (árvores) por espécie estudada (Tabela 1). As espécies foram escolhidas em função da superior densidade nos fragmentos florestais da região e, pela qualidade para carvão vegetal citada pelos agricultores, decisões baseadas em questionários aplicados. Alguns indivíduos encontravam-se estocados em pilhas para secagem e outros foram coletados de árvores em pé. Para cada indivíduo foram retirados três discos (30 cm distantes de cada extremidade e da porção central da tora) para a confecção de corpos-de-prova destinados às análises da qualidade física da madeira e para a carbonização em laboratório. Foram confeccionados corpos-de-prova com dimensões de 2 cm x 2 cm x 2,5 cm que foram secos em estufa (103 ºC) até o peso constante, envolvidos em papel alumínio e carbonizados em forno

mufla conforme a rotina de carbonização da Tabela 2. Ao final do processo de carbonização, os corpos-de-prova foram resfriados em dessecador à temperatura ambiente e, novamente pesados e mensurados em todas as arestas. Variáveis analisadas A qualidade física da madeira foi analisada através da massa específica aparente dos corpos-de-prova. A variável foi obtida pela relação peso e volume em teor de umidade de 12% (base úmida), através da norma NBR 7190 da Associação Brasileira de Normas

Técnicas (ABNT, 1997). A qualidade física do carvão vegetal foi analisada em base da massa específica aparente e rendimento gravimétrico do processo de carbonização. A massa específica aparente foi analisada através da norma NBR 7190 (ABNT, 1997) em teor de umidade de 0%, enquanto o rendimento gravimétrico foi obtido pela relação entre o peso antes e após o processo de carbonização, conforme o preconizado pelos autores Brand et al. (2013). As variáveis estudadas foram analisadas estatisticamente atra-

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vés da Análise de Observância da Variância (ANOVA) por meio do programa Sisvar 10.1.1 e R Studio. Antecedendo a ANOVA, aplicou-se o teste de normalidade de Shapiro-Wilk, e homogeneidade de variâncias de Barttlet. Em todas as variáveis analisadas que apresentaram diferenças estatísticas significativas, aplicou-se o teste de Scott-Knott a 95% de probabilidade. Resultados e discussão As propriedades físicas analisadas para a madeira das quatro espécies florestais estudadas são apresentadas na Tabela 3. Observa-se que a amplitude entre as quatro espécies estudadas foi de 0,495 g.cm-3, sendo a média geral de 0,599 g.cm-3. A massa específica aparente (MEA) da madeira apresentou diferença estatística para as espécies estudadas. As espécies Bracatinga, Jacatirão e Licurana apresentaram MEA da madeira superior a Embaúba. Destaca-se ainda que a MEA da madeira da Embaúba foi três vezes inferior às demais espécies estudadas. Segundo o Laboratório de Produtos Florestais do Serviço Florestal Brasileiro (2015), são consideradas madeiras de média massa específica aquelas entre 0,500 g.cm-3 e 0,720 g.cm-3, adequando-se nessa faixa a madeira

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das espécies Bracatinga, Jacatirão e Licurana. Na classe de espécies florestais de baixa MEA (< 0,500 g.cm-3) encontra-se a Embaúba. O elevado coeficiente de variação traduz a variabilidade que as madeiras de espécies florestais nativas apresentam quanto a MEA. No presente estudo observou-se a menor variação da MEA para uma mesma espécie do que entre as espécies avaliadas. vão

Densidade Aparente Do Car-

A massa específica aparente (MEA) do carvão vegetal apresentou amplitude de 0,194 g.cm-3 e média geral de 0,278 g.cm-3. A MEA do carvão vegetal apresentou ainda, elevado coeficiente de variação (30,1%) entre as espécies estudadas, sendo destaque a Embaúba com a maior variação intraespecífica (36,5%). As espécies estudadas apresentaram diferença significativa entre as médias da MEA do carvão vegetal, sendo destaques a Bracatinga, Jacatirão e Licurana. A baixa MEA da madeira de Embaúba resultou por em carvão vegetal de menor MEA (0,110 g.cm-3). De modo geral, a variabilidade da MEA do carvão vegetal é também menor para uma mesma espécie do que entre as espécies estudadas, a exceção da Embaúba.

A Bracatinga apresentou MEA do carvão superior ao encontrado por Klitzke (1998), ao carbonizar madeiras da espécie com 3, 5 e 7 anos, encontrando valores de 0,265 g.cm-3, 0,243 g.cm-3 e 0,261 g.cm-3, respectivamente. Rendimento do Carvão

Gravimétrico

O rendimento gravimétrico (RG) da produção de carvão vegetal das espécies estudadas foi em média de 35,1%. Destaca-se que o coeficiente de variação foi menor para o RG, se comparado a MEA da madeira e do carvão vegetal. Observou-se a diferença estatística para o RG das espécies estudadas, sendo os carvões de Jacatirão e Licurana com os melhores valores, ambas superiores a 36%. Logo abaixo, sem diferença estatística estão a madeira de Bracatinga e Embaúba. A produção de carvão vegetal de Bracatinga proporcionou RG ligeiramente inferior ao carvão vegetal de Embaúba, espécie florestal inferior quanto a MEA da madeira. A Tabela 4 apresenta a matriz de correlação para as variáveis analisadas para todas as espécies estudadas. Através do coeficiente de correlação de Pearson, observou-se a moderada correlação (0,81) entre MEA da madeira e RG do carvão


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AS MADEIRAS DAS ESPÉCIES FLORESTAIS ESTUDADAS APRESENTARAM QUALIDADE PARA A PRODUÇÃO DE CARVÃO para as espécies estudadas. Porém, para Vale et al. (2001), o aumento do rendimento gravimétrico não se mostra relacionado ao incremento da MEA da madeira. O coeficiente de correlação de Pearson demonstra que há uma forte correlação entre a entre MEA da madeira e a MEA do carvão vegetal produzido. Desta forma, supõem-se que madeiras de maior MEA da madeira apresentem maiores valores de MEA do carvão vegetal. Conclusão Com o presente estudo pode-se concluir que as madeiras das espécies florestais estudadas apresentam qualidade para a produção de carvão vegetal, com destaque para as espécies Licurana, Bracatinga e Jacatirão. O carvão vegetal produzido apresenta massa específica aparente diretamente correlacionada pela qualidade da madeira utilizada. O processo de carbonização, avaliado pelo rendimento gravimétrico, é adequado para as espécies estudadas, havendo poucas diferentes interespecíficas. A qualidade da madeira e do carvão vegetal, através das variáveis analisadas, decresce de Licurana, Bracatinga, Jacatirão e Embaúba. Referências Bibliográficas ABNT. Associação Brasileira De Normas Técnicas. NBR 7190: Projeto de estruturas de madeira. Rio de Janeiro, 1997. 107 p. BOTREL, M. C. G.; TRUGILHO, P. F.; ROSADO, S. C. D. S.; SILVA, J. R. M. D. Melhoramento genético

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das propriedades do carvão vegetal de Eucalyptus. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 31, n. 3, p. 391-398, 2007.

da madeira e do carvão vegetal de Eucalyptus pellita F. Muell. Scientia Forestalis, Piracicaba, v. 38, n. 87, p. 431-439, 2010.

BRAND, M. A.; CUNHA, A. B.; CARVALHO, A. F.; BREHMER, D. R.; KÜSTER, L. C. Análise da qualidade da madeira e do carvão vegetal produzido a partir da espécie Miconia cinnamomifolia (De Candolle) Naudin (Jacatirão-açu) na agricultura familiar, em Biguaçu, Santa Catarina. Scientia Forestalis, Piracicaba, SP, v. 41, p. 401 - 410, 2013.

PEREIRA, B. L. C.; OLIVEIRA, A. C.; CARVALHO, A. M. M. L.; CARNEIRO, A. C. O.; SANTOS, L. C.;

COUTINHO, A. R.; FERRAZ, E. S. B. Determinação da friabilidade do carvão vegetal em função do diâmetro das árvores e temperatura de carbonização. Instituto de Pesquisa e Estudos Florestais, Piracicaba, n.38, p.33-37, 1988. KLITZKE, R. J. Avaliação do carvão da bracatinga (Mimosa scabrella Bentham) em função da idade, do teor de umidade da madeira e da temperatura final de carbonização. 1998. 123 p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Florestal) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1998. LABORATÓRIO DE PRODUTOS FLORESTAIS. LPF: Database of Brazilian Wood. IBAMA: Laboratório de Produtos Florestais Brasília. Disponível em <http:// sistemas.florestal.gov.br/madeirasdobrasil/>, 2014, Acesso em 22 de Março de 2019. OLIVEIRA, A. C.; CANEIRO, A. C. O.; VITAL, B. R.; ALMEIDA, W.; PEREIRA, B. L. C.; CARDOSO, M. T. Parâmetros de qualidade

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Artigo

CARBONIZAÇÃO HIDROTÉRMICA DE RESÍDUOS DO CAFÉ Clara Lisseth Mendoza Martinez1, Aleksei Mashlakov2, Marcia Silva de Jesus3, Marcelo Cardoso4, Gustavo Matheus de Almeida4 MSc em Engenharia Química – Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG. e-mail: clara.mendoza.martinez@gmail.com 2 MSc em Engenharia Elétrica - Universidade Lappeenranta-Lathi de Tecnologia, Lappeenranta, Finlândia. 3 MSc em Engenharia Florestal – Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, MG 4 Professor DSc em Chemical Engineering - Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG. 1

RESUMO A carbonização hidrotérmica (HTC) é um método promissório de tratamento termoquímico que melhora as características combustíveis da biomassa sem secagem preliminar. Durante este processo a matéria prima é submetida ao aquecimento a temperaturas entre 180-250 ºC com adição de uma certa quantidade de líquido (geralmente água) em um sistema fechado por um intervalo de tempo (minutos ou horas). Este trabalho investiga o efeito das condições de temperatura do processo HTC de dois tipos de resíduos obtidos na cadeia produtiva de café: galhos de madeira e pergaminho do fruto. Foram realizados quatro tratamentos, baseados em diferentes temperaturas de reação no reator HTC (180, 200, 220 e 240 ºC). Os rendimentos de massa e energia, juntamente com as medidas de análise imediata e poder calorifico, foram utilizadas para a avaliação do processo de carbonização. Foi possível observar que o processo HTC aumenta a hidrofobicidade da biomassa, poder calorifico e fixação do carbono, além de reduzir o conteúdo de umidade de equilíbrio. Dessa forma pode-se concluir que o processo HTC é uma tecnologia atrativa a ser implementada em biomassas residuais in natura com a finalidade de aumentar a eficiência em uma ampla variedade de aplicações, como combustível, adsorvente e catalisadores. Palavras-chave. Análises quimiométricos. Rendimento energético. Novas tecnologias. Resíduos agroflorestais. Biomassa.

Introdução Atualmente, diversas formas de utilização da biomassa são implementadas para suprir a demanda de energia e reduzir a acumulação de resíduos, ainda sem finalidades determinadas. No campo da energia, os métodos mais comuns para transformar a biomassa são tratamentos termoquímicos, bioquímicos e mecânicos. Dentro dos métodos de transformação termoquímica, a carbonização hidrotérmica (HTC) também conhecida como torrefação úmida, é uma tecnologia de conversão relativamente recente, cujos trabalhos ainda são escassos no Brasil (DA SILVA et al., 2018). HTC oferece o benefício de transformar a biomassa em um material homogêneo com maior densidade energética sem secagem preliminar. Três produtos são obtidos a partir do processo HTC: hidro-carvão, líquido com alto conteúdo de compostos orgânicos e gasosos. No entanto, o principal produto é o hidro-carvão (50-80%), que normalmente contém cerca de 55-90% da 16 Revista Biomassa BR

massa inicial e 80-95% do conteúdo inicial de energia da biomassa (SERMYAGINA et al., 2015). Nesse sentido, o hidro-carvão é considerado um atrativo biocombustível sólido, além de ser estudado para aplicações como purificação de água, captura de CO2, fertilizante do solo, entre outras (HOEKMAN et al., 2013).

sitivo na matriz econômica, social e ambiental desse país.

Diante disso, este trabalho tem como objetivo analisar à carbonização hidrotérmica da biomassa gerada na cadeia produtiva do café (pergaminho do fruto e galhos de madeira). Para isso, foi analisada a influência da temperatura do processo nas propriedaA quantidade de biomassa agro- des do produto final. florestal no Brasil é significativamente Material e Métodos diversificada e o potencial de algumas espécies ainda é pouco explorado. Amostragem e preparação da maPara aplicações no campo energético, é indispensável o conhecimento téria-prima: Foram utilizados resídudas propriedades termoquímicas das os do cultivo cafeeiro (coffea arábica biomassas com o fim de entender seu L.) (pergaminho do fruto e galhos de potencial, possíveis formas de uso café) fornecidos pela fazenda rural no e métodos adequados de pré-trata- município de Paula Cândido, Minas mento (MENDOZA MARTINEZ Gerais, Brasil. A madeira coletada tiet al., 2019). Umas das commodities nha 11 anos após o último período de agroflorestais mas importantes no corte e o pergaminho foi coletado na país é o café, cuja cadeia produtiva safra de 2018. gera grande quantidade de resíduos As biomassas foram moídas em e subprodutos, que muitas vezes são descartados sem nenhum tratamento. moinho de facas tipo Wiley® Mill Consequentemente, a implementação Model 4, acoplado a uma abertura de de resíduos e novas tecnologias (como peneira de 1 cm. A moagem foi neHTC) poderia trazer um impacto po- cessária para garantir a distribuição



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uniforme de tamanho da matéria-prima para aumentar a área superficial e alcançar maior eficiência durante a HTC. Para atingir umidade de equilíbrio, as amostras foram condicionadas em sacos plásticos em uma sala com temperatura e umidade relativa controlada (23 ± 1 ° C, 50 ± 2% UR).

pais (ACP): As componentes principais são os eixos de um sistema de coordenadas, a partir de combinações lineares das variáveis originais. As variáveis originais são inicialmente padronizadas (média e variação unitária) para evitar o problema de escala causado pelos desvios padrão discrepantes entre eles.

ratura, à medida que os voláteis são removidos. As amostras de biomassa HTC-240ºC, por exemplo, apresentou aproximadamente três vezes mais teor de carbono fixo do que a matéria-prima.

Verificou-se também que, o PCS da biomassa aumenta com a temperatura de processo (220 - 240 ºC), o Reator HTC e procedimento exque é um importante indicativo do Resultados e discussão perimental: A carbonização hidrotérseu potencial de uso para geração de mica foi realizada em um reator tipo Caracterização das biomassas: Os energia (MENDOZA MARTINEZ et batelada projetado e construído na Lappeenranta-Lahti University of Te- resultados da análise imediata e valo- al., 2019) chnology (Lappeenranta, Finlândia). res do poder calorífico para as biomasRendimento mássico e energético O reator tem capacidade de 1 litro, sas antes e depois dos testes HTC são sendo composto por um tubo de aço apresentados na Tabela 1. O material do hidro-carvão: O rendimento másinoxidável com uma conexão de flan- sem tratamento apresentou frações sico é a razão entre a massa, em base ge na parte superior e fechamento de relativamente altas de voláteis e alto seca, do hidro-carvão gerado e a bioparafuso na parte inferior. Dois ter- teor de cinzas. Sendo valores típicos massa, em base seca, sem tratamento. mopares foram usados para monito- para biomassas lenhosas e resíduos O rendimento energético é a razão rar as temperaturas nas zonas inferior agrícolas (MENDOZA MARTINEZ entre o PCS do hidro-carvão gerado e superior do reator (a 245 mm e a 645 et al., 2019). Foi possível observar e o PCS da biomassa sem tratamento que o teor de umidade das biomassas (SERMYAGINA et al., 2015). A Figumm do topo). diminuiu na maioria dos tratamen- ra 2 apresenta as curvas de rendimenO sensor de pressão e a válvula tos devido a decomposição de com- to mássico e energético para os galhos de alívio de pressão foram colocados ponentes lignocelulósicos durante o de madeira e o pergaminho do fruto na parte superior da unidade. O nível processo hidrotérmico (PARSHETTI; de café. de temperatura necessário dentro do KENT HOEKMAN; BALASUBRAO aumento da temperatura de reator durante o período de tempo de- MANIAN, 2013). Observou-se tamreação gerou uma diminuição signifibém uma diminuição signifi cativa no sejado foi mantido com um controlador proporcional-integral-derivativo teor de cinzas das biomassas, uma vez cativa do rendimento sólido em apro(PID). Foram realizados quatro trata- que parte dos minerais formadores de ximadamente 20%. Assim, a maiores mentos, baseados em diferentes tem- cinzas são dissolvidos na água (ER- temperaturas tende a resultar em meperaturas de reação - 180, 200, 220 e LACH; HARDER; TSATSARONIS, nores rendimentos mássicos (RM) do hidro-carvão. Por isso, como espera240 ºC. Mantendo constante a razão 2012). va-se, a correlação para o rendimento entre a massa de água e biomassa de As reações de decomposição du- energético (RE) se assemelha à RM 8:1(aproximadamente 50 g de resíduo de café e 400 ml de água) e o tempo rante a HTC resultaram na perda de do hidro-carvão, o que implica em de permanência na temperatura final compostos voláteis com um aumento similaridade entre os mecanismos de simultâneo no teor de carbono fixo. A perda de massa da matéria-prima e da (3 horas). biomassa tende a perder mais voláteis densificação da energia do hidrocarCaracterização química: As bio- em temperaturas mais elevadas, no vão durante a HTC e taxas diferentes. massas in natura e carbonizadas fo- caso do HTC-madeira 240 °C foi de A partir de gráficos termograviram caracterizadas a partir das aná- 52% (aproximadamente 65% do valises imediata e de poder calorífico, lor inicial). Por outro lado, o teor de métricos, os rendimentos de massa e conforme procedimentos normati- carbono fixo aumenta com a tempe- energia a temperatura de 150 ºC devos. Para análise do teor de cinzas (A), voláteis (V) e carbono fixo (CF) foram utilizadas as normas SFS EN 14775: 2009, SFS EN 15148: 2009. O valor do poder calorífico superior foi determinado seguindo a norma EN 14918:2010 no calorímetro Parr 6400, e o poder calorifico inferior (PCI) estimado a partir do PCS. O teor de umidade de equilíbrio for determinado mediante o controle da variação do peso das amostras, até atingir peso constante. Análise de Componentes Princi18 Revista Biomassa BR


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Conclusões

monstram o limite inferior de temperatura para reações de degradação de componentes, que ocorrem durante a obtenção do carvão (ROCHA et al., 2015). A partir dessa temperatura os componentes da biomassa se decompõe e com o aumento da taxa de aquecimento, intensificando a perda de massa. Como resultado da ação simultânea desses dois fatores, o RE reduz com a temperatura. Análise de componentes principais (ACP): Os autovalores para PC1 e PC2 representam 92% da variabilidade total dos dados medidos. A Figura 2 mostrou a relação entre as propriedades no plano PC1-PC2 através de um gráfico bi-plot. A partir do PC1 observou-se que o maior autovetor positivo está relacionado ao V, as amostras de madeira de café (MC) e de pergaminho (PC) com tratamento HTC a 180 ºC encontram-se no quadrante positivo, revelando à facilidade com que podem fazer ignição, quando comparados com os outros tratamentos. Caso contrário, materiais como MC240 e PC240 apresentam baixo de teor de V e consequentemente alto teor de CF. Por tanto, pode ser exigido maior tempo de residência nas fornalhas para queima total. O PC2 teve alta carga positiva nos rendimentos mássico e energético do hidro-carvão, o que é um indicativo

de correlação entre essas variáveis. Por essa razão, que amostras que foram tratadas na menor temperatura apresentaram maiores rendimentos. Do autovetor PCS pode-se observar a influência da temperatura nas propriedades. Quanto maior a temperatura de tratamento, maior foram os valores de PCS. Biomassas in natura, encontram-se no quadrante PC1 positivo e PC2 negativo, em que os autovetores que apresentam maior significância, quando comparado com os tratamentos, são as propriedades de umidade de equilíbrio e teor de cinzas. A partir da HTC pode-se concluir que o processo melhora as características energéticas dos materiais lignocelulosicos. Análise de pré-viabilidade: A produção combinada de calor e energia no processo HTC é conhecida como uma tecnologia eficiente e comprovada. DIFS et al., 2010 e FAHLÉN and AHLGREN, 2009, verificaram que seu uso aumenta a geração de eletricidade e, portanto, resulta em uma relação maior poder-calor. A avaliação econômica provou que a biomassa e o processo de HTC de conversão, pode ser lucrativa em certas relações de preço entre a biomassa e os combustíveis fósseis em uma perspectiva de curto prazo.

A melhoria das propriedades combustíveis da biomassa é necessária devido aos problemas associados a qualidade da biomassa não tratada. A carbonização hidrotérmica é uma tecnologia que pode ser implementada para aumentar o potencial energético da biomassa, uma vez que, a matéria prima é convertida em um produto de valor agregado. Pesquisas experimentais sobre carbonização hidrotérmica dos galhos de madeira e pergaminho do fruto de café (resíduos da cadeira produtiva cafeeira em geral) são atualmente limitadas. Os diferencias existentes na composição química e as variações resultantes do comportamento de decomposição térmica é significativa. Referências Bibliográficas DA SILVA, C. M. S. et al. Biomass torrefaction for energy purposes – Definitions and an overview of challenges and opportunities in Brazil. Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 82, n. July 2017, p. 2426–2432, 2018. DIFS, K. et al. Biomass gasification opportunities in a district heating system. Biomass and Bioenergy, 2010. ERLACH, B.; HARDER, B.; TSATSARONIS, G. Combined hydrothermal carbonization and gasification of biomass with carbon capture. Energy, 2012. FAHLÉN, E.; AHLGREN, E. O. Assessment of integration of different biomass gasification alternatives in a district-heating system. Energy, 2009. HOEKMAN, S. K. et al. Hydrothermal carbonization (HTC) of selected woody and herbaceous biomass feedstocks. Biomass Conversion and Biorefinery, 2013. MENDOZA MARTINEZ, C. L. et al. Characterization of residual biomasses from the coffee production chain and assessment the potential for energy purposes. Biomass and Bioenergy, 2019. PARSHETTI, G. K.; KENT HOEKMAN, S.; BALASUBRAMANIAN, R. Chemical, structural and combustion characteristics of carbonaceous products obtained by hydrothermal carbonization of palm empty fruit bunches. Bioresource Technology, 2013. ROCHA, E. P. A. et al. Analysis of Brazilian Biomass Focusing on Thermochemical Conversion for Energy Production. Energy and Fuels, 2015. SERMYAGINA, E. et al. Hydrothermal carbonization of coniferous biomass: Effect of process parameters on mass and energy yields. Journal of Analytical and Applied Pyrolysis, 2015. Revista Biomassa BR

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A revolução energética e a Inovação

Heloisa Prates Pereira e Carlos Evangelista

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geração começaram a ganhar a atenção da sociedade. O aproveitamento de recursos naturais, como a força das águas, o sol, o vento e até mesmo o gás produzido pela decomposição da matéria orgânica, em sistemas de pequeno porte, permitem hoje a geração de energia elétrica com mínimo impacto ambiental. O nome dado a essas iniciativas realizadas por pequenas Desde então, o modelo centrali- empresas, comércios e pelos próprios zado de geração de energia se impôs consumidores que se dedicam a prona maioria dos países do mundo. Edi- duzir a energia que utilizam junto a son e sua equipe criaram a primeira carga é chamado geração distribuída, central de distribuição de energia elé- ou GD. trica do mundo, a Pearl Station, para De fato, estamos falando de um abastecer o distrito de Wall Street, em Nova York, mas conforme a demanda novo modelo de rede. A GD pode ser aumentava, os projetos também fo- comparada, no setor elétrico, ao que ram crescendo e demandavam altíssi- significou a chegada da internet para mos investimentos – até chegarmos às o setor de Comunicação. Um modeusinas de grande porte, com subsídio lo que era centralizado, unidirecional ou controle estatal, e aos sistemas de (dos poucos grandes produtores para transmissão e distribuição que leva- milhares de consumidores), tornou-se vam essa energia até os consumidores descentralizado, distribuído, e todos residenciais, comerciais e industriais. os pontos da rede podem agora receber e enviar energia para o sistema. É Foi apenas no final do século XX, uma revolução, uma mudança de paapós a emergência das questões am- radigma que dificilmente será contida, bientais, que novas modalidades de ainda que as estruturas tradicionais de m 21 de outubro de 1879, uma lâmpada feita com um filamento de algodão carbonizado dentro de um bulbo a vácuo brilhou por 45 horas seguidas, sob o olhar atento de Thomas Edison. Era o início de uma nova era, na qual a eletricidade tornou-se a força motriz da economia.

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regulação e tarifação pressionem seu desenvolvimento. No Brasil, o assunto ganhou relevância há cerca de uma década. Em 2010, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) promoveu a primeira Consulta Pública sobre o tema: a Consulta Pública nº 15/2010, entre setembro e novembro. No ano seguinte, foi realizada a Audiência Pública nº 42/2011, com o objetivo de debater os dispositivos legais para a conexão de geração distribuída de pequeno porte na rede de distribuição. O resultado desse processo materializou-se na Resolução Normativa (REN) nº 482, de 17/4/2012, que estabeleceu as condições gerais para o acesso de micro e minigeração distribuída aos sistemas de distribuição de energia elétrica, e criou o sistema de compensação de energia elétrica correspondente. Ou seja, desde 2012, todos os brasileiros têm direito a gerar, por conta própria, utilizando fontes renováveis, a energia elétrica que consomem – e também podem injetar na rede o que produzem de energia ex-


cedente, beneficiando o sistema como desde que previamente cadastradas e dentro da mesma área de concessão. um todo. São formas de compensação caracteA regulamentação vem passando rizada como autoconsumo remoto, por diversos aprimoramentos. Em geração compartilhada ou integran2015, a Agência Nacional de Energia te de empreendimentos de múltiplas Elétrica (ANEEL) promulgou a Re- unidades consumidoras (condomísolução Normativa nº 687/2015, re- nios). visando a REN 482/2012 e alterando O Brasil conta com mais de 115 a seção 3.7 do Módulo 3 dos Procedimentos de Distribuição de Energia mil sistemas de micro e minigeração Elétrica no Sistema Elétrico Nacional distribuída de energia elétrica conectados à rede, beneficiando mais de 155 – PRODIST. mil unidades consumidoras como reEsses documentos regram, até os sidências, edifícios comerciais e instadias de hoje, a micro e a minigeração lações industriais de pequeno e médio distribuída. A primeira delas refere-se portes. A geração distribuída atingiu a a centrais geradoras de energia elétri- marca de 1,3 GW de potência instalaca com potência instalada menor ou da. Embora o segmento de GD tenha igual a 75 quilowatts (kW), enquan- conquistado importantes avanços, a to a segunda diz respeito às centrais modalidade ainda tem uma particigeradoras com potência instalada su- pação pequena na matriz elétrica naperior a 75 kW e menor ou igual a 3 cional, inferior a 0,25%. Há, portanto, megawatt (MW), para a fonte hídrica, muito trabalho a ser feito e muitos desafios a serem vencidos! ou 5 MW para as demais fontes.

tar o desenvolvimento sustentável. O objetivo do acordo, que conta com 195 países signatários, é conter o aumento da temperatura média global em menos 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Por meio de suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (intended Nationally Determined Contribution – iNDC), o Brasil estabeleceu como meta uma reestruturação de sua matriz energética até 2030: a participação de energias renováveis não hídricas no fornecimento de energia elétrica deve ser expandida para , 23%, pelo menos, e, considerando-se todo o setor de energia (que inclui eletricidade, óleo e gás), 45% da matriz deverá ser obtida a partir de fontes renováveis.

Do ponto de vista sistêmico, a geração distribuída é uma solução “3D”. Atende as necessidades de descarbonização, descentralização e digitalização do sistema elétrico. No Brasil, as características da geração distribuída Vale lembrar que o Brasil, como se revelam ainda mais disruptivas, por A REN nº 687/2015 também permitiu ao consumidor a utilização signatário do Acordo de Paris, está termos um sistema baseado em na gede créditos em unidades diferentes comprometido a reduzir emissões de ração centralizada e sujeito a uma redaquela onde está instalada a usina, gases de efeito estufa (GEE) e fomen- gulação intervencionista, complicada Revista Biomassa BR

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e desatualizada, em que o contribuinte sempre acaba pagando todos os custos do sistema. Para evoluirmos amplamente na geração distribuída, os esforços de expansão da rede deveriam seguir características de livre mercado e precisam de arcabouço regulatório muito mais ágil e flexível. Analisemos de forma sucinta as três vertentes (definições retiradas do site da Cemig).: Digitalização: A digitalização da sociedade vem alterando as visões dos clientes sobre as empresas e as interações que eles esperam de provedores de serviços fundamentais, como transporte, segurança, saúde, energia e administração. A tendência dos consumidores é demandar, cada vez mais, produtos e serviços personalizados de alta qualidade, acessíveis 24 horas por dia, 7 dias por semana, através de dispositivos móveis e mídias sociais. A grande quantidade de dados dos consumidores, combinada com as novas tecnologias de Inteligência Artificial, cria oportunidades para gerar valor a partir dos dados, respeitando as regulações e legislações de proteção de dados pessoais (definição do site da Cemig). Descarbonização: No setor elétrico, o maior impacto desta tendência mundial é a substituição de energia oriunda de combustíveis fósseis por energia elétrica em diversos produtos, cujo exemplo maior são os veículos elétricos. O setor elétrico se tornará muito mais descentralizado com a multiplicação de um grande número de fontes de energia distribuída e consumidores ativos, muitos deles conectados a redes de distribuição. Os consumidores irão tornar-se cada vez mais ativos e irão gerenciar seus próprios sistemas, com uma

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combinação de geração, uso e armazenamento de energia. (definição do site da Cemig). Descentralização: Previsões do setor apontam para a energia solar tornar-se majoritária na matriz energética brasileira entre os anos 2035 e 2040, sendo que desta, 75% será de geração distribuída. Para o setor elétrico essa mudança traz diversos impactos, mas o mais dramático é a descentralização, o que vai implicar em diversas mudanças culturais e operacionais nas empresas operadoras. É chave o desenvolvimento de novos modelos de negócios que busquem novas fontes de receita a partir de novos produtos, novos serviços inovadores de distribuição, e da comercialização de novos serviços adaptados à chamada Quarta Revolução Industrial. Há um quarto D, poucos falam, mas é o da Democratização. Obviamente, o benefício de muitos deve superar o de poucos, e o foco tem que ser o PROSUMIDOR, que agora pode produzir e consumir a própria energia, sem ter que ser onerado de maneira a inviabilizar financeiramente seu direito de produzir a própria energia, após mais de 100 anos no mercado cativo, podendo agora escolher entre produzir a sua energia ou comprar da distribuidora local. Uma liberdade parcial ainda, pois estaremos sendo tolhidos de exercer esse direito de forma plena e equilibrada, com uma supervalorização do fio, como se este pudesse valer quase 70% do serviço de fornecimento de energia elétrica como um todo. São valores desproporcionais, descabidos e que não colaboram para o equilíbrio do mercado e sim para a perpetuação de oligopólio arcaico. Está na hora de realmente nos inserirmos o século 21, onde o benefício de muitos deve superar o de poucos, e o foco tem que ser o PROSUMIDOR, que é quem no final sempre paga a conta.

Carlos Evangelista, formado em Engenharia Elétrica e Direito, tem MBA em Marketing pela USP e especialização em Política e Estratégia pela ADESG. Premiado pela FIESP em 2016 e 2 vezes pela Full Energy (2016 e 2018 - 100 mais influentes do setor elétrico), oficial de Engenharia do Exército brasileiro (2º. colocado da turma); atualmente é presidente da ABGD – Associação Brasileira de Geração Distribuída.


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MANIFESTO GERAÇÃO DISTRIBUÍDA DE ENERGIA PRINCIPAIS ENTRAVES DA GD

Marina Meyer Falcão

Contexto Da Geração Distribuída: Em 17 de abril de 2012 o marco regulatório da Geração Distribuída foi criado, quando entrou em vigor a Resolução Normativa ANEEL nº 482/2012, na qual o consumidor brasileiro passou a gerar a sua própria energia elétrica a partir de fontes renováveis ou cogeração qualificada e inclusive fornecer o excedente para a rede de distribuição de sua localidade.

desejavam então produzir a própria energia e consumi-la.

Nesse cenário, vários atores deste movimento vêm discutindo sobre a cobrança do “uso do fio” (da rede da distribuidora) nos processos de conexão em Geração Distribuída – sobre a revisão da Resolução Normativa nº 482 pela Agência Nacional de Energia Elétrica, para “reajustar” o sistema de compensação de energia elétrica feito hoje da GD. Na verdade o que se pensa em instituir é cobrar dos consumiA ideia central da Geração Distri- dores de GD pela utilização desse fio, buída nasceu na busca pela seguran- o que já é pago atualmente através do ça, equilíbrio e na questão da eficiên- custo de disponibilidade (processos cia energética, uma vez que as perdas até 75KW) e pela demanda contratacom investimentos em transmissão e da (contratos do Grupo A nos procesdistribuição são bastante mitigadas sos acima de 75 KW). com GD. Surgiu então o conceito do Vale lembrar que a ANEEL, na sistema de compensação de energia elétrica (SCEE), com a microgera- Análise de Impacto Regulatório pução distribuída e a minigeração dis- blicada em janeiro de 2019, já havia tribuída, através da energia solar, da analisado todo esse processo, o qual energia hidráulica, eólica, biomassa apresentou um erro em sua metodoe da cogeração qualificada. A figura logia de cálculo – que resultou em do PROSUMIDOR de energia ecoou um tremendo desastre para o setor Brasil afora, como um grito de liber- de GD: a geração remota sofrera uma tação para aqueles consumidores que desvalorização na ordem de 28 (vinte

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e oito por cento) na alternativa 1 proposta pelo órgão fiscalizador, ao invés de 40% (quarenta por cento). E nesse sentido, a argumentação da ANEEL pautava-se na não remuneração dos acessantes em GD pelo “uso do fio” (rede da Distribuidora) e que a compensação total da energia consumida da rede de distribuição pela energia injetada deixaria de remunerar um parcela do setor elétrico. Desde então, as concessionárias e permissionárias de energia elétrica tem divulgado a “falsa ideia que apoiam a GD”, mas na verdade não estão apoiando o setor: pelo contrário – criam cada vez mais empecilhos aos novos acessantes em GD – e prestam um “apoio condicionado”: para que todos os consumidores (optantes por GD) deixem pelo menos 25% ou mais da energia produzida com as distribuidoras, a título de remuneração do fio. Aliado a este movimento das Concessionárias de energia, a ANEEL se manifestou contrária à Geração Distribuída e realmente disposta


É NOTÓRIA A IMPORTÂNCIA DA GD NO BRASIL: SEGUNDO DADOS DE VÁRIOS ÓRGÃOS, O SETOR DE GERAÇÃO DISTRIBUÍDA MOVIMENTA HOJE CERCA DE R$ 6,5 BILHÕES EM INVESTIMENTOS

a instituir a cobrança do fio na energia gerada pelos PROSUMIDORES, desconsiderando qualquer benefício trazido pela geração distribuída no Brasil. É em razão desse lamentável movimento, e em função das recentes manifestações da ANEEL – trazem à tona a MAIOR INCERTEZA REGULATÓRIA vivenciada no Brasil nos últimos 20 anos – que o processo de revisão da REN 482 NÃO pode ser analisado de maneira incoerente e desproporcional por parte do órgão regulador. É notória a importância da GD no Brasil: segundo dados de vários órgãos, o setor de geração distribuída movimenta hoje cerca de R$ 6,5 bilhões em investimentos, gera cerca de 30 empregos diretos para cada MW instalado ao ano em várias áreas, além de trazer diversos benefícios: sociais, econômicos, ambientais, benefícios para o Sistema Elétrico e benefícios tecnológicos, vejamos:

FEED AND BIOFUEL

I M PU L S I O N A N D O S E U N E G Ó C I O D O CA M P O AO CO M B U S TÍ V E L

Benefício Sócio Econômico: •

Geração de emprego, renda e dignidade para os cidadãos brasileiros;

Energia como uma solução energética de geração própria;

Atração de investimentos locais e nacionais para toda cadeia produtiva do setor solar fotovoltaico;

Penetração de novos agentes investidores no mercado solar/ circulação da economia;

Redução de gastos com a energia elétrica para pessoas físicas e pessoas jurídicas.

Benefício Ambiental: •

Geração de energia limpa, renovável e sustentável;

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• Não geração de gases de efeito estufa ou de ruídos; • Processo ambiental simples. Benefício ao Sistema Elétrico Brasileiro: • Redução de perdas técnicas em transmissão e distribuição; • Ampla diversificação das energias renováveis no Brasil; • Diversificação da matriz energética brasileira Benefício Tecnológico: • Smart Grid; • Smart Metering; • Smart Cities, integrando a GD em todos estes conceitos. A Geração Distribuída reforça ainda mais esse quarto pilar, com sua tecnologia de ponta, indústria de semicondutores, softwares de controle, monitoramento remoto, (convertendo energia proveniente de diversas fontes renováveis, como a solar, biomassa, eólica, biogás e etc) com alta eficiência, em energia elétrica disponível, controlada, mais barata e de altíssima qualidade. Fato é que toda a sociedade encontra-se inconformada e se manifesta através de mensagens claras de APOIO A GERAÇÃO DISTRIBUÍDA, como forma de demonstrar a sua participação no Estado Democrático de Direito. Pontos defendidos pelos empreendedores acerca de problemas enfrentados com a Concessionária em geral: • Burocracia na análise da documentação para entrada do processo de conexão em GD; • Falta de transparência nos processos de conexão, remetendo todos os processos para conexão da GD em alta tensão. • Normas posteriores mais prejudiciais ao consumidor/Prosumidor de energia nos projetos de GD. • Descumprimento de prazos em geral. Devemos buscar o equilíbrio e remunerar todos os ativos que são utilizados em GD, mas isso tem que ser feito de maneira razoável e que reflita a realidade do setor de GD hoje no Brasil.

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Marina Meyer Falcão É Diretora Jurídica da ABGD (Associação Brasileira de Geração Distribuída) e Diretora da Marina Meyer Advocacia Empresarial, advogada especialista em Direito de Energia. Membro representante do Estado de Minas Gerais na missão Energias Renováveis na Alemanha (Baviera) em junho de 2018 e representante de Minas Gerais nos Estados Unidos em 2016, Co- Autora de 3 Livros em Direito de Energia, com MBA em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas. Pós-graduada em Gestão Ambiental pelo Instituto de Educação Tecnológica - IETEC. Graduada pela Universidade FUMEC. Membro da Comissão de Energia da OAB-MG; Membro da Câmara de Energia da FIEMG; Ex-Superintendente de Política Energética do Estado de Minas Gerais (2009 a 2014); Ex-Conselheira do Conselho de Política Ambiental – COPAM do Estado de Minas Gerais (2009 a 2014); Ex-Secretária Executiva do Comitê Mineiro de Petróleo e Gás.


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Revisão da REN 482: para onde vamos? Bárbara Rubim

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esde 2012, o consumidor brasileiro pode gerar a própria energia e receber créditos em sua conta de luz, economizando. Essa possibilidade veio por meio da edição da Resolução Normativa 482, da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Em maio de 2018, a ANEEL deu início a processo de revisão desta norma, propondo a revisão da forma como é valorada a energia produzida pelo consumidor a partir de fontes renováveis, por meio de sistemas de geração distribuída (GD).

transportada por grandes distâncias), a redução no fator de carga das redes (reduzindo a necessidade de expansão da rede de distribuição e/ou aliviando a rede em momentos críticos), a redução – no médio e longo prazo – da quantidade de energia a ser contratada em leilões para abastecimento da sociedade, etc..

O grande desafio que se colocou à frente da ANEEL foi, assim, o de calcular o benefício e o impacto de cada um dos lados da balança de modo a se conseguir chegar a um possível caminho ideal – caso, da análise, viessem resultados concretos, isentos e De acordo com a Agência, ao per- embasados capazes de demonstrar o mitir a compensação integral da ener- desequilíbrio e o dano passível de ser gia consumida da rede de distribuição causado pelo caminho atual. pela energia injetada, o prosumidor De maio de 2018 para cá, muitas (como é chamado o consumidor que produz a própria energia) deixa de discussões, debates e análises foram remunerar alguns agentes do setor feitas por todos os agentes do setor. elétrico, que vão ter que buscar sua Essas discussões se fortaleceram em remuneração por outras vias – como, janeiro deste ano, quando foi aberta a por exemplo, por meio de aumento segunda etapa do processo de revisão pela ANEEL e publicada a Análise de tarifário aos demais consumidores. Impacto Regulatório (AIR). Por outro lado, a geração de eletriCom o objetivo de convidar a cidade próxima aos centros de consumo é benéfica ao setor elétrico, auxi- sociedade a entender e analisar a liando no fortalecimento de diversos metodologia proposta pela Agência, atributos importantes, tais como a re- essa etapa se alongou por quatro medução de perdas técnicas (aquelas que ses - dada a complexidade dos dados ocorrem porque a energia precisa ser que careciam de análise. Durante ela, 28 Revista Biomassa BR

diversos agentes da sociedade apresentaram o que consideram ser as premissas mais adequadas a serem consideradas. Igualmente, o setor de geração distribuída submeteu à ANEEL as correções metodológicas julgadas pertinentes. Nesse processo de análise, descobriu-se um erro metodológico em uma das planilhas de cálculo que fez com que o resultado obtido trouxesse um equívoco com relação ao possível impacto causado pela geração remota ao setor elétrico. O tamanho do equívoco? Módicos R$30 bilhões. Reconhecido o erro e corrigida a planilha, a própria metodologia adotada pela Agência levaria à recomendação de alternativa de mudança mais branda para a geração remota do que a trazida na análise anterior e, por consequência, sugerida pela ANEEL como caminho a seguir em sua nota técnica. Ou seja, a geração remota poderia sofrer desvalorização de sua energia na casa de 28% (alternativa 1) ao invés dos cerca de 40% (alternativa 3) propostos inicialmente. Encerrada essa segunda etapa em maio de 2019, a ANEEL pôs-se a analisar as contribuições recebidas. Cinco messes depois, no dia 15 de outubro de 2019, a Diretoria da ANEEL, reunida em colegiado, deliberou pelo iní-


Fonte: Bright Strategies, 2019

Fonte: Bright Strategies, 2019

Na mesma linha, a ANEEL tamcio da terceira e penúltima etapa do bém anunciou, na oportunidade, que processo de revisão. sua intenção era não mais a de manter Durante a reunião, pública, o se- o sistema de compensação atual pelo tor foi surpreendido com a notícia de prazo de 25 anos a todos os consumique a metodologia até então adotada dores que já fossem beneficiados pela era demasiado frágil e que, portanto, geração distribuída. Pela nova proa Agência decidira por alterá-la. Da posta, aqueles que já estiverem sob a nova metodologia utilizada, concluiu- REN 482 antes da publicação de sua -se que a alternativa mais adequada atualização, manterão o sistema atual tanto para a geração junto à carga, até 2030, migrando para a alternativa quanto para a geração remota seria a 05 imediatamente após. de número 05. De forma gráfica, a proposta da Importante lembrar, a alternativa ANEEL pode ser traduzida da seguinnúmero 05 é a mais severa das inicial- te forma: mente apresentadas, na qual somente Em que pese o conteúdo da prouma das seis componentes tarifárias continua sendo compensada. Ou seja, posta trazida pela ANEEL já ser basperde-se, assim, cerca de 60% do valor tante preocupante por si só, dados os do kWh injetado na rede, com gran- impactos que ela pode causar no sedes impactos para o retorno do inves- tor, os procedimentos adotados pela Agência causam estranheza ainda timento feito.

maior. Nesse sentido, destacamos 3 pontos graves: 1) Conforme exposto na reunião de Diretoria supracitada, a ANEEL optou pela alteração da metodologia apresentada anteriormente, com a adoção de uma nova, que traz severos impactos ao setor. Independentemente dos resultados da metodologia nova, o simples fato de ter havido uma mudança nela já exigiria a reabertura da segunda etapa - aquela na qual questões metodológicas são discutidas com a sociedade. Ora, não pode a Agência passar quatro meses coletando contribuições do setor para, depois, decidir por alterar sua metodologia sem reabrir o diálogo; 2) O prazo para contribuições à terceira etapa - que já se resume à miRevista Biomassa BR

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Para garantir que a não haverá dúvida de que existe uma grande parcela da sociedade que apoia a geração distribuída e defende, ao menos por ora, a manutenção das suas regras tais como estão, iniciou-se de forma orgânica um movimento que diz claramente: #TaxarOSOlNão nuta da nova REN 482 - é de meros 45 dias. O prazo apertado gera estranheza quando se tem em mente que os processos mais relevantes trazidos pela Agência ao longo dos últimos 2 anos contaram com, ao menos, 60 a 90 dias de abertura para contribuições. 3) A ANEEL optou por realizar apenas uma audiência pública presencial, em Brasília. Novamente, quando buscamos processos de revisão anteriores, nos deparamos com as boas práticas de realização de 2 a 3 audiências presenciais, espalhadas ao longo do território brasileiro. Esses fatos, aliados a recentes entrevistas e colocações bastante questionáveis por parte de alguns diretores, têm alimentado nos consumidores, nos trabalhadores, nos empresários e na sociedade a preocupação de que o processo de revisão da REN 482 possa falhar em sua missão de realizar uma análise metodologicamente acertada, tecnicamente forte e, acima de tudo, imparcial sobre este importante momento vivido no setor. Essas preocupações têm se manifestado de diversas formas. Uma delas são as quase 200 mil assinaturas que a

#TaxarOSolNão é, como aprenpetição criada pedindo o #CenarioZedemos no colégio, a metáfora sendo ro482 já possui. usada para ajudar a explicar a realidaPara garantir que a não haverá de de forma mais lúdica – chamando dúvida de que existe uma grande par- a atenção para que as pessoas procela da sociedade que apoia a geração curem conhecer o tema e se engajar distribuída e defende, ao menos por mais. Em processos complexos, o lúora, a manutenção das suas regras dico é essencial. No setor elétrico, um tais como estão, iniciou-se de forma bicho extremamente complexo*, essa orgânica um movimento que diz cla- pode ser a única forma de verdadeiramente se envolver mais a sociedade. ramente: #TaxarOSOlNão. Não é exatamente isso que a Agência É bastante claro que o processo de faz ao dizer que “a nossa conta de luz revisão em questão não objetiva esta- tem vilões?”. belecer uma taxação ao uso da irraA sociedade tem enviado uma diação solar. Contudo, é inegável que o efeito prático ao cidadão, consu- mensagem clara à ANEEL de que midor, comerciante e produtor rural há um descontentamento profundo será praticamente esse. O do desestí- com relação à forma como a revisão mulo. Desestímulo à geração própria da REN 482 tem sido conduzida pela num momento em que essa possibi- Agência. À medida em que tais menlidade traz mais de 45 mil empregos sagens ganham mais força e apoio ao país, R$6.5 bilhões em investimen- inclusive de diversos parlamentares tos, e, quem sabe, a economia de 90% - espera-se que a ANEEL reveja sua nos custos com eletricidade do Poder postura. A menos que tenhamos uma Público, se o Executivo for bem suce- transformação profunda no procesdido no desenvolvimento de projeto so de revisão da REN 482, qualquer de geração própria por meio do sol, norma que eventualmente se origine conforme recentemente anunciado deste processo não terá amparo sopelo nosso Presidente (mas somente cial e tampouco refletirá os anseios e se ele conseguir protocolar todas as a busca pelo melhor interesse do consolicitações de acesso antes da revisão sumidor - missão que a Agência tão vocalmente declara ter. da REN 482).

Mini-currículo: Bárbara Rubim é advogada e CEO da Bright Strategies, uma consultoria dedicada a auxiliar empresas e investidores no desenvolvimento de modelos de negócio e projetos em geração distribuída, sob a perspectiva jurídica e regulatória. Bárbara possui um MBA em Finanças e Estratégias Empresarias pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e trabalha no setor de energia há mais de sete anos, já tendo coordenado a área de estratégia e inovação da Alsol Energias Renováveis e estado à frente da campanha de energia do Greenpeace Brasil. Além disso, também atuou como Assessora Parlamentar na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, e desenvolveu projetos para a ONU-Habitat. Atualmente, ocupa também as posições de Vice-Presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR) e é membro da Comissão de Infraestrutura da OAB Nacional.

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