Arte na espreita e na espera... Poéticas na Quarentena!

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Bené Fonteles con v ida

Realização

Arte na espreita e na espera...

Poéticas na Quarentena!


V Bené Fonteles con v ida

Arte na espreita e na espera...

Poéticas na Quarentena! DEDICADO À HOMENAGENS À Rubem

André Baroni (Capa) Adenor Gondim Andre Santangelo André Vallias e Hilton Raw Augusto de Campos Ayrson Heráclito Bené Fonteles Caró Brandão Chico César Christian Cravo Cláudio Vinícius Dani Fonseca Déa Trancoso Diô Viana Dulce Schunck Eduardo Ver

Felipe Barros Félix Caetanno Gisel Carriconde Azevedo Gringo Cardia Gustavo Caboco Hamilton Leitão Helena Lopes Joésia Ramos Josafá Neves KboCo Lourival Cuquinha Manu Romeiro Márcio Almeida Mário Azevedo Marli Wunder Maxim Malhado

Lucina

Valentim e Emanoel Araújo

Mônica Nador Nádia Campos e Guilherme Melo Orlando Maneschy Renato da Silveira Renato Rios Rodrigo Braga Rômulo Andrade Silvana Leal Silvana Sarti Solymar Lacerda Cunha Susana Oliveira Dias Tércio Araripe Wagner Barja Xico Chaves Zuarte Júnior

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Lucina 70anos

pintura digital de Marli Wunder

sobre foto de Marlene Bergamo/Folhapress

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Sete motivos para amar Lucina Bené Fonteles 1. Tem pessoas que são criaturas da Deusa e nascem com a alma apontada não só para lua, mas para o sol de Oxalá e Cristo, ao mesmo tempo. Abençoadas e luminosas! Assim nasceu Lucina, justamente faceira e bela no dia do Natal, em que Jesus veio ao mundo não só para nos salvar, mas para ser a Luz do Mundo. Lucina veio não para ter esse mundo, mas para ser esse Mundo, com seus talentos e dons ilimitados; 2. Seus talentos de cantora e compositora todo mundo já sabe, mas acrescento que ela é uma melodista−cachoeira, a verter água de forma Oxum, mesmo sendo filha forte de Iansã, que traz chuvas, ventos e tempestades musicais, infinitas e formosas. Não conheci ninguém que tivesse uma facilidade “horrorosa”, como ela diz, de pegar um poema e ele já ser música logo e maravilhosa. Centenas e centenas de centelhas musicais como estrelas no céu infinito por aí, gravitando no imaginário brasileiro e universal; 3. Seus dons vão além dos musicais, de fazer alianças e cumplicidades com seus parceiros não só de canções, mas de atitudes na vida, cheias de ética a serviço de uma estética renovadora e vasta; 4. Lucina tocou tambor e cantou décadas, como uma Ogã de terreiros de Umbanda, prestando um belo serviço à sua comunidade espiritual, fazendo um trabalho

de cura por meio da arte e iluminando de ritmos e sonoridades o corpo/alma de muitas Vidas. Fez também isso nos terreiros e palcos da vida, com sua parceira de décadas, a Luli, vertendo música e amor com ela por todos os cantos e poros. Por isso também os Orixás tanto a abençoam e amam; 5. Ela tem um sorriso de bom humor solar que ilumina almas e ambientes obscuros, custe o que custar, tudo junto da sua costumeira sinceridade, que não é pra todo mundo gostar, mas pra se identificar, caso curta uma pessoa de verdade e da Verdade; 6. Lucina é uma instrumentista de mão não só cheia de notas essenciais para cordas e toques mágicos de tambor e violão, mas para tudo o que for o instrumental da vida. Jamais separa da arte uma natureza que seja ao mesmo tempo cultura e transcendência; 7. Ela é uma mãe, amiga, irmã, parceira, companheira precisa e preciosa numa bela pérola, que pode nascer a cada dia do sofrimento da ostra pelo atrito de um grão de areia no mar de tantas ilusões. Lucina transforma e transmuta tudo nas mais belas canções para pescar e amar almas. Ela já tem a sabedoria de saber-se imortal aos 70 anos, mas é bem mais antiga e milenar, pelas muitas encadernações vividas, do que pode supor nossa farta imaginação.

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Bené Fonteles e Lucina na gravação do CD “Cancões para Pescar Almas” Campinas/SP, 2018 Pintura digital de Marli Wunder sobre foto de Patrícia Ferraz

Por tudo isso e mais, celebramos com amor e gratidão sua presença entre nós há muitas décadas e esperamos honrá-la e merecer sua Vida entre nós por muito mais...

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civi l colh end o o Gan dhi em ato de des obe diên cia ao pov o ind ian o. sal pro ibid o pelo dom ínio ing lês Pra ia de Dân di, 193 0

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HOMENAGEM À

RUBEM VALENTIM 1922 - 1991

EMANOEL ARAÚJO 8 0 anos

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por

D

Bené Fonteles

ois são os meus heróis artísticos e culturais do Brasil em nossa jornada de arte e cultura: Rubem Valentim e Emanoel Araújo.

Conheci Rubem em 1977, na Bienal de São Paulo, da qual eu também participava. Ele estava ali, herético, contundente, “porreta e arrretado” − como se diz na Bahia, sua terra −, em frente ao seu majestoso e mágico Templo de Oxalá. O templo era um grande painel de relevos brancos sobre intenso fundo azul e, à sua frente, dezessete esculturas brancas articuláveis para manipulação pelo público. Nossa empatia foi imediata e, desde então, não nos separamos mais, até sua passagem em 1991. Depois de sua morte, fiz a curadoria de 17 mostras de Valentim, pois, atendendo a um pedido seu antes de ir-se, prometi que cuidaria de sua obra, como um Ogã do seu terreiro imaginário, para mostrar o que havia de mais sagrado nele.

Recomendo que assistam à live que fiz com Max Perlingeiro sobre o livro “Sagrada Geometria”. Para acessar, use o link:

https://www.youtube.com/watch?v=NlnpvElQStg&t=1366s

Emanoel Araújo me convidou para fazer a curadoria da mostra “O Artista da Luz”, de Valentim, na Pinacoteca de São Paulo em 2001, além da organização e edição do catálogo-livro da exposição que, com o seu aval, foi até o Museu de Arte da Bahia, em Salvador, e ao Museu de Arte da Pampulha, Belo Horizonte. A mostra foi montada também no ECCO (Espaço de Arte Contemporânea), Brasília, e no Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro. Tenho muito para contar sobre Rubem Valentim, e que vocês poderão saber no livro “Sagrada Geometria”, que organizo agora e que sairá pelas Edições Pinakotheke no início de 2021, já comemorando os 100 de nascimento do mestre.

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Como ganhei de seus herdeiros quase 200 telas que ele deixou em branco, sonhando pintá-las, montei várias instalações em exposições individuais na Estação Pinacoteca, em São Paulo, em 2004 −, além de vários trabalhos com essas telas em outras mostras. Fiz uma homenagem a Valentim na minha obra OcaTaperaTerreiro na 32ª Bienal de São Paulo. Ambos os trabalhos, o da Pina e o da Bienal, estão aqui ilustrados.

Bené Fonteles, OcaTaperaTerreiro, 32ª Bienal de São Paulo (detalhe) Foto Cláudio Filus

Exposição “Palavras e Obras” de Bené Fonteles na Estação Pinacoteca, 2004 Fotos Isabela Matheus

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Manifestação pelas “Diretas Já”, em 1984

Escultura de Rubem Valentim na Praça da Sé, São Paulo Fotos Silvestre Silva

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Esculturas da Sala Especial Rubem Valentim Museu de Arte Moderna da Bahia Curadoria Bené Fonteles, 1998

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Rubem Valentim no seu Templo de Oxalá na Bienal de São Paulo de 1977. As Esculturas e Relevos aqui reproduzidas, foram doadas pelos herdeiros a família Bicca ao Museu de Arte Moderna da Bahia para a Sala Rubem Valentim no Parque de Esculturas, por iniciativa de Bené Fonteles, em 1997.

youtu.be/3DrifdxPqJo Reportagem sobre a Sala Rubem Valentim no MAM. Programa Soterópolis, TVE Bahia, 2013.

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Emanoel Araújo

Mostra “A ancestralidade dos Símbolos: Africa - Brasil” Museu de Arte de São Paulo, 2018

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E

manoel Araújo é quem considero o que mais se aproxima daquele que é minha grande inspiração como ser humano de visão cultural brasileira inclusiva, imensa e extraordinária: Mário de Andrade. Emanoel é uma personalidade tão importante e essencial na arte e na cultura brasileira universal quanto foi Mário – além de muitas outras personalidades culturais e artísticas – para que o Brasil não ruísse. Sua permanência na Pinacoteca do Estado de São Paulo por 10 anos possibilitou a esplêndida reforma com projeto de Paulo Mendes da Rocha. Fez curadorias exemplares para colocar a cultura da Diáspora Negra e afro-brasileira em pauta, como a mostra “Os Herdeiros da Noite” e outras, que deram origem ao mais importante museu da América Latina e um dos mais importantes das Américas, que é o Museu AfroBrasil. O brasileiro que não o conhece não sabe o que é o Brasil, não só o país mestiço, mas o multicultural. Emanoel doou seu imenso e seminal acervo a esse museu, que funciona no Parque Ibirapuera, São Paulo. As curadorias que fez e faz estabelecem pontes primordiais entre artistas da África e do Brasil. Ele também foi o responsável pela recente mostra de arte indígena brasileira, uma das mais importantes já organizadas. Edita os catálogos do Museu AfroBrasil, tão relevantes e necessários – os projetos gráficos primorosos são de sua autoria – que a arte brasileira e internacional ganham a cada nova mostra e edição. Essas mostras e edições são a nossa cara, nossa verdadeira, generosa, criativa e amorosa face, que não podemos ignorar no meio dessa crise política, econômica e religiosa que nos aterroriza, mas não nos vence. Como diz o hino do Esporte Clube Bahia, “ninguém nos vence em vibração!”, e que Caetano e Gil cantaram com imensa euforia no teatro Castro Alves, em Salvador, no show de despedida Barra 69, antes de partirem para o exílio em Londres.

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Emanoel, além de tudo, é um grande artista, autor de expressivas xilogravuras da década de 1960, que vão ganhando outras dimensões de colagens com as próprias matérias gravadas, e de relevos e esculturas monumentais, como a que faz parte do acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo e está em seu jardim no Parque Ibirapuera. Ilustramos este catálogo da quarentena com dois dos livros que vocês podem encontrar sobre a obra do artista Emanoel, cuja última retrospectiva aconteceu no Museu de Arte de São Paulo e está aqui ilustrada. Por fim, é uma alegria imensa editar este catálogo homenageando dois artistas vindos da força cultural do Recôncavo Baiano. Emanoel nasceu em Santo Amaro da Purificação, de onde veio também o samba de roda − que deu origem ao samba carioca −, o maculelê e a capoeira original, que se espalhou pelo mundo. De Santo Amaro também vieram Dona Canô, Caetano e Bethânia Veloso, e muitos mais. Salve a Bahia e tudo o que ela nos deu de mais vasto e extraordinário para invadir o imaginário do povo brasileiro, como fizeram e fazem tão bem Valentim e Emanoel − salve seus 80 anos!

Nota: O painel “Templo de Oxalá”, de Rubem Valentim, está ao lado do painel “Esculturas, Relevos”, de Emanoel Araújo, no Salão Cerimonial do Palácio Itamaraty, em Brasília. Diante das duas obras, os presidentes empossados recebem os cumprimentos dos Chefes de Estado e das delegações estrangeiras que vêm ao país assistir à posse presidencial.

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Jardim de Esculturas do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Parque Ibirapuera

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Estação Metrô Barra Funda / São Paulo

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Bené Fonteles CONVERSA DE OGUM COM EXUS Brasília, Brasília, 2020 2012

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OG

UM

Ogum é um orixá que rege os Exus e são os mensageiros entre os humanos e os deuses. A mesa foi encontrada no ponto de táxi da SQN 210 Norte quadra que morei em Brasília durante 12 anos. Os motoristas jogaram sobre ela dama e outros jogos durante 18 anos. Troquei com eles a mesa usada pelo tempo por uma nova para a suas alegrias. As cadeiras foram encontradas numa oficina em João Pessoa/PB presente de Marlene Almeida e Jose Rufino; outra no final da rampa do Museu Nacional vendida pelo vendedor de pipoca em Brasília; a outra numa RPPN em Cristalina/GO e a outra nas margens do Velho Chico em Barra/BA comprada de um barraqueiro. 38


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Chico César youtu.be/cHM2iM589nc para Emanoel Araújo

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Andre Santangelo paisagemdesgarrada.blogspot.com

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Ateliê Rubem Valentim, Brasília, década de 1980

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Andre Santangelo Estudo de geometria

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Adenor Gondim www.facebook.com/ adenor.gondim

SANTOS

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Menino Deus - São Benedito

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Zé Diabo Ferramenta de Exu Giramundo

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Eduardo Ver

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Gringo Cardia

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As capas dos livros são ilustradas com obras de Rubem Valentim como também as três edições. Em um dos livros um ensaio de Bené Fonteles sobre o artista e 70 de suas obras escolhidas por Bené e Gringo.

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Helena Lopes VALENTIM

Releitura de uma obra de Rubem Valentim

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Josafá Neves josafaneves.com.br/wpcontent/uploads/2020/09/ Catalogo-Orixas_Digital´.pdf

ORIXÁS

Exú

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KboCo Cavalcanti, Chapada dos Veadeiros, GO

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Maxim Malhado

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Renato da Silveira

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Exu Tribufu, o Senhor do Movimento

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Iansã-de-esteira, Senhora da Tempestade

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Rômulo Andrade homenagem a Rubem Valentim

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Wagner Barja youtu.be/ZstUz1vQ1j8

O Banco utilizado no vídeo pertenceu ao ateliê de Rubem Valentim em Brasília. Doado ao Barja por Bené Fonteles

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Xico Chaves para Rubem Valentim

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Zuarte Júnior SIMETRIA DA PAZ a um totem de Valentim

meu ser se apruma ao mirar-te

que remontam no tempo

tudo em mim move para se equilibrar

interpenetra a quem te olha

tenta se corrigir

calmo oxalá e indelével exu

só por te ad mirar

transcendente

move-se o de cima com de baixo

intercessor intergalático

o de um lado com o de outro

todo meu ser se orienta

buscando prumo

só por estar diante de ti

impõe-se a quem te olha

átomos em dança de equilíbrio

à postura de ser

simetria da paz

e a tudo impele ao eixo

algo muito grande se pacifica

espelho

equilibra-se céus e terras

revelando nossas Áfricas

em quem te mira

o lodo e a luz

e no tempo 83


Silvana Sarti PELOURINHO Pintura de Carlos

Kahan

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Susana Oliveira Dias climacom. mudancasclimaticas.net.br/ aguacura

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Ayrson Heráclito Homenagem a Mestre Didi

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André Vallias e Hilton Raw https://vimeo.com/484124121

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Vídeoanimação de André Vallias criada para a revista Errática em 2005 – recriada em 2020 – sobre música composta por Hilton Raw para a trilha do filme “16060” (1995) de Vinicius Mainardi. Voz: Agnaldo Rayol e Hilton Raw Programação: Fernando Forni - Guitarra: Guto Marialva. Faixa do CD “Música para ver”.

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Augusto de Campos CONTRAPOEMA – POESIA E O QUE

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MANTER AFASTADO DO FOGO 2018

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Caró Brandão FÓSSEIS DO ANTROPOCENO

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O

s debates levantados em torno do conceitos de Antropoceno, Capitaloceno ou Cthuluceno como um marco temporal que reestrutura geologicamente e ecologicamente a integridade do planeta Terra, cria uma série de tensões em alguns limites epistemológicos entre o que é a cultura moderna e a natureza. Fazendo-nos se perguntar: em um futuro distante qual será o limiar entre as materialidades, detritos e marcas criados pelo humano moderno no planeta Terra, como o concreto e o plástico, em relação às materialidades que já estavam aqui antes desse processo de modernização global, como as pedras e o petróleo? Quais serão os fósseis gravados nas camadas entrópicas de uma possível futura escavação paleontológica onde hoje há uma das milhares cidades modernas? O petróleo que virou plástico voltará a ser petróleo? Serão encontrados fósseis da modernidade em formas de geodos de plástico que conservarão os ossos de alguma espécie extinta? As marcas da cultura moderna e da produção industrial serão, ou já são, inerentes à natureza? A inerência de uma resposta afirmativa a algumas estas questões levaram o artista Caró a produção da série “Fósseis do Cthuluceno’’, que busca propor um hipotético início de uma grande descoberta paleontológica, um processo de descoberta de um amplo conjunto de materialidades que desmancham um limiar entre a cultura capitalista a inerência da natureza no presente e no futuro, evidenciando a marca do Antropoceno como parte da natureza, do ecossistema e da geologia de um mundo por vir.

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Cláudio Vinícius PINDORAMA EU

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soundcloud.com/ user-947098771/ pindorama-eu

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Dani Fonseca m.youtube.com/watch?v=wz11DL7LeWs Vídeo A Dama do mar não sente ciúmes narrado por Cida Moreira

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A Dama do mar não sente ciúmes” O vídeo da artista visual, Danielle Fonseca faz parte de um conjunto de obras, entre fotografias e esculturas do Prêmio de Produção e Difusão Artística de 2019 da Fundação Cultural do Pará. O vídeo foi finalizado em Julho de 2020. O texto do vídeo foi escrito pela artista em 2016, baseado em um texto do dramaturgo Henrik Ibsen “The Lady from the Sea” que teve adaptação de Susan Sontag. O “A Dama do mar não sente ciúmes” de Danielle passou de uma linguagem escrita para ser representado, na mostra, por meio de esculturas, fotografias e de uma instalação sonora, e agora o vídeo que inclui uma leitura na voz da cantora e atriz Cida Moreira. Sobre isto, Danielle comenta: “A voz de Cida Moreira veio como uma luva, um brinde a este texto, ela fez uma leitura brilhante, como tudo que faz. O canto mágico da sereia”, e a artista ainda explicou : “Neste trabalho falo um pouco de memórias, minha relação com a água, o mar e o teatro”.

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Todo abismo é navegável a barquinhos de papel Fiquei planejando durante todo esse tempo como lidar com essa guerra que não trouxe bombas, não trouxe granadas voadoras, gases lacrimogêneos. Trouxe o invisível . Precisa de algo leve com papel. Algo que pudesse desviar, deslizar, feito um surfista que se encaixa perfeitamente na dobra da onda. Precisava lembrar de um corpo que precisa ser dobra. E, novamente, lembro que a dobra somos nós. Sejamos barquinhos de papel. O farol que nos guiará por hora, também é de papel. Nada de barcos de pau vinhático, alumínio ou caballitos de totora. No abismo é preciso planar.

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Dani Fonseca museu.io/sapf/obra/sabe-eu-ja-estive-no-mar-antes

BASE MÁGICA PARA ORIXÁS

Base mágica para uma filha de Iemanjá com Iansã

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Base mágica para uma filha de Iemanjá com Ogum Bei

Base mágica para uma filha de Iemanjá com Oxóssi

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Déa Trancoso https://deatrancoso.wordpress.com/2020/11/15/atada-vigesima-milesima-conferencia-extraordinaria-dosamigos-de-gaia-instaurando-a-era-de-aquario/

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Diô Viana Pinturas e gravuras em metal

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Dulce Schunck LUNA

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Felipe Barros “PLANTUMANA” Moda-manifesto feita com elementos da natureza nativa e urbana.

O participante é convidado a vestir/ser a obra/roupa

Materiais vegetais em estrutura de plástico

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“DIGITÁLIA369.BR” Planta com placa eletrônica

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“BIO” Quadro vivo de plantas O participante é convidado a interagir olhando, regando e tocando a Bio

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Félix Caetanno

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Hacúmulo II Tapeçaria bordada com material orgânico polimérico sintético e fio de polietileno tereftalato, em suporte acrílico. 16x46x12cm. 2020

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Hacúmulo III Tapeçaria bordada com fio de polietileno tereftalato e organismo polimérico sintético, em suporte acrílico 06x60x04cm. 2020

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Cápsula

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Núvem

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Pano da Costa

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Pindorama

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Gisel Carriconde Azevedo giselcarricondeazevedo.com

CASA-COR, RITUAL PARA O FIM DO MUNDO, 2020 Mesinha de cabeceira, Coleção Dark

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Microondas, Coleção Baroque

Poltrona, Coleção Neon Cozinha, Coleção Baroque

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Quarto de casal, Coleções Clássica e Neon

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Escritório, Coleção Clássica

CASA-COR, RITUAL PARA O FIM DO MUNDO Inspirada numa campanha publicitária criada para o período da quarentena, estimulando o público a realizar pequenas alterações no ambiente doméstico de forma a criar novos espaços para relaxar das tensões criadas pela reclusão forçada, realizei uma série de instalações em alguns ambientes da casa com fios de plástico colorido, restos de uma intervenção que realizei na Funarte -DF, em 2007, e que estavam guardados no ateliê desde então. À maneira do design de interiores, os ambientes criados se desdobram em várias coleções, criadas através de alterações nas cores dos registros fotográficos das instalações.

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Gustavo Caboco https://caboco.tv/

SOBRE A ARTE INDÍGENA CONTEMPORÂNEA EM TEMPOS DE VÍRUS

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Fala do artista Gustavo Caboco Wapichana em LIVE para o projeto webnário da UFPR exibida no dia 29/04/2020.

Boca boca boca boca caboco caboca boca boca boca caboco Gustavo caboco caboco caboco Gustavo caboco boca boca bocabocacaboco

Num primeiro olhar, surgem questões básicas: de onde vem? quem é? quem faz? o que faz o artista indígena contemporâneo? os artistas, as artistas? por quê? o que difere? por onde anda a arte indígena contemporânea? é arte? é arte indígena? é arte indígena contemporânea? é arte contemporânea indígena? Onde é o próximo encontro? O próximo eu não sei, provavelmente em mais uma live, nestes tempos de pandemia. O que temos pra hoje são conversas com o artista Wapichana, Gustavo caboco, neste encontro proposto pela agência escola, da UFPR, no “Movimento Conexão: Culturas Compartilhadas”. Para começo de conversa, precisamos pontuar que esta ideia da AIC, este conceito-sistema, é proposto e nomeado pelo artista do povo Macuxi, Jaider Esbell. Pelo menos é de onde ouvi a primeira vez (me corrijam pesquisadores, por favor!). Depois, ouvi a boca de muitos outros, o Baniwa, a Terena, a Tukano, a Pataxó, o Huni Kuin, e minha boca começou a falar também, arte-indígena-contemporânea-arte-indígenacontemporânea-arte-indígena-contemporânea. A boca já falava. Entendo esta ideia como um lugar, um ponto de encontro entre nós, parentes de vários povos, a ciência acadêmica, os museus, o sistema da arte contemporânea, os centros culturais, galerias de arte indígena, museus nativos, a literatura, o cinema, a roça, a casa da tia, da vovó, e tantos outros campos.

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Mais que isso, um ponto de articulação e caminhos da autonomia: a nossa sobrevivência. Na minha visão, crio a arte-ponte ParanáRoraima que conecta nossas histórias, cruzamentos, deslocamentos. Roraima-Roraimã. Se em dado momento (1975), inauguraram a ponte dos Macuxi, que atravessa o rio Branco e liga a cidade de Boa Vista com outros municípios (Cantá, Bonfin, Normandia) onde há diversas terras indígenas e vai até a Guiana, foi em outro tempo, antes desta ponte, em 1968 que um projeto de ponte dos Wapichana se iniciou com a doação de uma criança indígena.

Encontros Makuchana, povos Makuxi e Wapixana trabalhando juntos, re-atualizando todo o histórico de conflitos entre estes povos de Roraima. Plantando sementes da Grande árvore.

É nesta travessia que eu trabalho, interagindo com os meus parentes, a comunidade onde está nossa família, os artistas indígenas destes dois estados e também os que eu encontro no meio desse caminho, e muito temos a colaborar.

Acredito que há espaço para todos nós, e muitos outros parentes, nessa história. Cabem todos os netos e primos no abraço do vovô e da vovó, e as responsabilidades que o abraço implica.

A ponte Wapichana foi construída pela nossa nossa família. Nessa ponte, na Macuxi e na Wapichana, já fui parado muitas vezes e questionado sobre ser índio de verdade? Veracidade, legitimidade. Apontação de dedos: “Sua história é de mentira”. “Você não é índio não, você come macarrão”. Na ponte dos Macuxi, em 2019, a polícia me interceptou enquanto eu dirigia um carro, fez bafômetro, eu e meus parentes Wapichana demos risada, estava tudo bem. Na ocasião, estávamos indo para um Parichara, na formatura de uma turma de estudantes indígenas. Brincamos com a situação para não nos sentirmos constrangidos com a abordagem. Na ponte Wapichana, atravesso o marco de 33 anos de história para a sua inauguração (2001), quando re-encontramos nossos parentes. Leia-se: quando minha mãe re-encontrou minha avó, depois de três décadas. O fato é, que a arte indígena contemporânea, possibilita o trânsito nesta ponte, na ponte Wapichana. Foi por essa via também que eu e Jaider Esbell botamos de pé uma exposição no MUSA-UFPR, chamada Netos de Makunaimî.

A ideia Makuchana já havia sido anunciada pela avó da minha mãe, antes mesmo de iniciar o tal projeto da ponte Wapichana. Não foi profecia, foi observação e consciência do seu lugar, nossa história, entendimento do contexto político nos anos 60 e das relações daquele tempo. No tempo de hoje, muitos netos Makuchana estão por aí representando nossas cosmologias e o vovô Makunaimî.

Os choques de realidade são necessários neste trânsito ParanáRoraima. Entender a história desta ponte é importante para observar os campos que ela conecta. Entender, por exemplo, que ela atravessa também a BR174 para conectar Boa Vista à Manaus. BR cheia de memória, quando percebemos o cruzamento com o caminho dos Waimiri-Atroari, aqueles que são sobreviventes de um extremo massacre e genocídio nos anos 70. Mesmo olhando da janelinha do ônibus, da janelinha do celular na live, ou plantando bananeira nessa via, essa história está ali marcada. O trânsito da ponte Wapichana nesta via, também. Aprender sobre a ponte Wapichana é entender que ela é gente, ponte-gente, que minha mãe construiu com sua história de vida, no deslocamento do seu corpo Wapichana. Um deslocamento colonial-afetuoso. Entender que esta nossa história e minha mãe são sobreviventes. Sobreviventes de um povo e um lugar. Muita gente já morreu na construção de estradas, perdeu sua memória, muita gente indígena morre em BRs, com ataques, atropelamentos. As rodovias e pontes são estratégicas nos projetos de genocídio e apagamento da história.

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Em nosso caso, a história vive. perdura. Por isso falo para os meus parentes que só o fato de conversarmos, já estamos fazendo arte, criando. Criando mundos, possibilidades de existência indígena Wapichana e a troca de saberes com outros povos e isto não é ficção, metáfora. É realidade e Arte Indígena Contemporânea. Do mesmo modo que nossos parentes criaram marcos na história da academia: seja com Coudreau, Farage, Sirino, Grunberg e tantos outros. Pouco nos devolvem, presencialmente. São sábios, mas não sabiás, que cantam livremente. Por isso fazemos arte, por quê atravessamos a ponte da ciência acadêmica, nos alimentamos dela também. Colaboramos, mas temos, felizmente, a ponte dos Wapichana, a ponte com o povo Macuxi, e a possibilidade de nos encontrarmos dentro do sistema da arte indígena contemporânea e suas particularidades. As nossas particularidades. Estamos na década da arte indígena contemporânea, que será celebrada, festejada, ritualizada em 2028, com o marco do centenário da obra de Mário de Andrade. Jaider Macuxi iniciou essa série

de lançamentos em Roraima, depois veio até Curitiba e fizemos o lançamento juntos, com Lucilene Wapichana, Ana Elisa, Paula Berbert, e continuou os anúncios na Rádio Yandê, juntamente com Denilson Baniwa, Naine Terena e Daiara Tukano. O pássaro do bico preto e todo o público que estava interagindo neste bom papofogueira-virtual durante as ações do abril indígena 2020, sabe. A nossa quarentena lembra. Aproveito esta ocasião pra dizer: vamos trabalhar parente Wapichana. São muitas as pontes, muito trabalho a ser feito, trabalho de formiguinha. Seguimos nessa picada, entendendo quando mato é mato, gente é gente, respeitando o tempo e o espaço de cada um. Nos unamos e vamos trabalhar coletivamente, fazendo ajuri, caminhando, cantando, desenhando, conversando, falando. Boca boca boca boca boca boca do antepassado, antepresente, do presente, boca boca boca boca. Continuemos falando, não apagarão nossa memória.

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Hamilton Leitão ANGICO Obra em processo Cuiabá, 2020

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Joésia Ramos https://youtu.be/edAYERZ4AK4

A ALMA ILUMINADA Bené Fonteles e Joésia Ramos

Nada engana o que pensa a mente iluminada o tudo que ilude o todo que muda o luto que passa nada manipula o que sente a fonte iluminada. O tempo que afaga o corpo que arde a arte que falta a mente que alarga a fonte que vaza nada engana o que ama a alma iluminada.

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Lourival Cuquinha https://youtu.be/r4OpRNUXavo

ORDEM E PROGRESSO

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Manu Romeiro manutchuga.wixsite.com/ manuromeiro

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Márcio Almeida issuu.com/ateliermarcioalmeida/docs/nosso_ descanso_e__carregar_pedras_-_projeto_colabo PROJETO COLABORATIVO NOSSO DESCANSO É CARREGAR PEDRAS

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Mário Azevedo

M

antenho uma área estável em meu ateliê para a movimentação de uma criação diária, em torno uma pequena mesa em que estão constantemente dispostos meus materiais de trabalho essenciais: lápis, canetas de nanquim, tubos ou pastilhas de aquarelas e potes de guache, além de pilhas de papéis cortados ou montados previamente, de 20 x 30 cm aproximadamente. Sempre há por ali um projeto aberto, em pleno curso e assim, quase cotidianamente – antes ou depois de dar atenção às demandas do mundo – é no tempo que passo aí absorto

que recarrego as minhas baterias e me dedico à atividade vital de fazer coisas e imagens, que se multiplicam e se transformam indefinidamente, ganhando vida própria ao forjar um universo. Ultimamente, com a pandemia, esse hábito se intensificou, pois a minha dedicação a essa saborosa faina se ampliou. Passei a permanecer ali – absorto no trabalho enovelado em si mesmo – muito mais que as poucas horas de antes, sempre insuficientes. Sem os múltiplos contatos e atropelos da vida contemporânea (normal?), pude permanecer

nessa labuta mágica por dias (ou noites) quase inteiros. Esse esforço, repleto de prazer, me poupou de muito sofrimento com as situações que todos nós (ainda) vivemos nesse período doente e me alimentou com uma energia incomum. Ainda mais forte nas trocas – em uma espécie de moto-perpétuo cada vez mais ativo – com a(s) minha(s) obra(s) e suas reverberações, me sinto grato na produção do produção do inexplicável engenho que resiste nesse espaço, mesmo em meio a qualquer caos. Novembro/2020

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Marli Wunder UMA COISA 150


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Mônica Nador 153


Nádia Campos e Guilherme Melo www.youtube.com/watch?v=w3z6bCCDMdk

AFLORAR

Música de Nádia Campos e Guilherme Melo Voz, captação e edição de imagens: Nádia Campos Violão, captação e edição de imagens e som: Guilherme Melo Mixagem: Poli Brandani (Estúdio Bordão da Mata)

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Orlando Maneschy SONHO BOM

Sonho com pessoas, Proximidade social, de um mundo dito Normal. Conversas, risadas, toques. Pessoas bem Juntinhas

Sorrio feliz E, de repente, não mais que de repente Estremeço Não é possível. Lembro do CV e do medo. Algo está errado Impossível estar ali!

Visito casas, amiges ainda mesmo os que não conheci.

Acordo solidão Ainda que feliz pelo vivido pelo sonho

Risadas, Família, Afagos TudoJuntoMisturado.

Lágrima cai saudade do mundo E penso: Vai passar

Ando pelas ruas Sinto Felicidade o vento -

?

Quero gente, Minha gente, Toda a gente.

sonho bom (23 jun. 2020)

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Renato Rios

As estrelas escuras - Espelho noturno, 2020, pigmento e resina acrílica sobre linho, 40cm x 60cm

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As estrelas azuis e brancas - Canções de um novo dia, 2020, têmpera sobre linho, 40cm x 60cm

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A setas - Entroncamento, 2020, óleo sobre linho, 40cm x 30cm

A estrela verde - Estrela Verde, 2020, óleo sobre linho, 40cm x 30cm

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A Cabocla vermelha Flecha Branca, 2020, óleo sobre linho, 40cm x 30cm

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Rodrigo Braga www.rodrigobraga.com.br

De olhos atentos

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A materializar novas ideias

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Silvana Leal Ateliê Casa das Ideias

O FOTÓGRAFO

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Rito de Nascimento - Performance

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Solymar Lacerda Cunha Só . Sussurre ao mundo sossegue o coração . Tempos ruins vieram virão mas vão nada em vão . no peito um vão a vida agulha ponto a ponto costura.

fecha a ferida cauteriza cicatriza . solidão sós somos nós atamos desatamos nós isso é viver . pés nus sobre a cabeça o céu o sol seu . só

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Tércio Araripe para Ailton Krenak

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À espera do vento nem a espera do vento... Bené Fonteles

Foto André Barone

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Agradecimentos a Sandra Fonteles e Bárbara T. Santos Bené tocando pro sol a maraca que ganhou do cacique Pawanã no Mirante da Floresta Cultural / Sorocaba

Organizado e produzido durante a quarentena por

Bené Fonteles Projeto gráfico:

Licurgo S. Botelho

Foto:

Lucas Darobertis

Sítio Rosa dos Ventos, MG

dezembro de 2020

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