Impressões | Marcas da Terra

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IMPRESSÕES | MARCAS DAS TERRAS

BORDAEMIA

Portifólio 2021


Impressões | Marcas das Terras



IMPRESSÕES | MARCAS DAS TERRAS Colher as folhas, secar, fazer uma composição, colar no papelão, entintar e estampar. Na busca por um chão comum, vem também o desejo de celebrar os povos originários desse território tão vasto. Cada bordadeira buscou, na sua memória, nos seus afetos e referências, palavras de diferentes povos indígenas que vão bordadas nas estampas das folhas, junto com uma intervenção livre. (Aqui alguns detalhes do processo, que vamos compartilhar aos poucos com mais profundidade.) tirar isso O grupo é formado por jovens mulheres de meia idade e idosas, com e sem filhos, donas de casa e especialistas em suas áreas de trabalho, artistas, filhas, irmãs, mães, avós e amigas. É um grupo rotativo. Entre as participantes do grupo há aquelas com um longo histórico geracional de fios nas suas vidas e outras que nunca bordaram. Esse trabalho foi resultado da Oficina de Bordado 2021 da EMIA Texturas Sonoras, conduzida pela artista professora Joana Salles e colaboração da designer têxtil Ci Teixeira. A EMIA é uma escola pública e gratuita, fundada em 1980. A escola funciona em três casas dentro do parque Lina e Paulo Raia, no Jabaquara, zona sul de São Paulo.




AMÁLIA BORATINO Trazer a natureza e a ancestralidade ao tecido foi incrível. O resultado de tão lindo me deixou intervir na figura que surgiu na busca de uma composição com as folhas que me fizessem sentido. Testes e testes buscando essa disposição até que surgiu um rosto, vi nas folhas olhos profundos, boca encorpada, nariz. Pronto, nasceu uma máscara meio indígena, meio africana, brasileira? A serpente, não vinha no tecido até que inspirada pela palavra principal surgiu um ouroboros - o início e o fim unidos - em nomes de cobras em tupi guarani, etnia numerosa e oriunda sobretudo do Sudeste - meu lar e terra de origem - língua que nomeia muito de nossa cidade. AWETÉ! A palavra tupi guarani dita ao final de quase toda enunciação quando se está em roda: AGRADEÇO, obrigado, gratidão. É assim que dedico a este grupo de mulheres maravilhosas e a esses povos, sobretudo os tupi guaranis, um agradecimento por existirem e resistirem, pela cultura do encontro, da escuta e do acolhimento enquanto trançam linhas, palhas, ervas. Aweté.


ANA GALLUZI Minha palavra é AYSÚ: amor em tupi guarani. Amor é palavra de cura, é necessário para a origem, o princípio, é presente no fim, é necessário na perda. A serpente é origem. O tupi guarani é uma junção de várias línguas de várias etnias dos povos da América do Sul.


CECÍLIA TEIXEIRA Eu busquei palavras indígenas do antigo tupi, que sistematiza um pouco as línguas mais antigas dos povos indígenas, como os Tupinambás, que eram os habitantes originais de Salvador-Bahia. Pensei em palavras que transmitissem uma espécie de “voto”: • kuara-cy - mãe de todos, sol / energia, calor, matriz criativa • kaa - mato, folha / simbolizando cura, saber ancestral que passa de geração em geração • çay - água dos olhos / movimentar as águas internas.


DALVACI PORTO “Macunaíma, índio tapanhuma, era o filho mais novo de uma família (a mãe e os irmãos Maanape e Jiguê) que vivia nas margens do rio Uraricoera, na Amazônia.” (trecho de Macunaíma, Mario de Andrade) O trabalho de bordar a folha impressa no tecido, e uma cobra, junto com a pesquisa da palavra, me trouxe um sentimento de reconexão com as plantas, com a floresta e a mitologia da Amazônia. Escolhi esse mito em homenagem à Mário de Andrade, que se inspirou nele para escrever uma obra clássica que tanto representa nossa cultura brasileira, cujas raízes estão na nossa matriz ancestral dos povos originários. Foi gratificante.



DÉBORA PRATES Tupã é o Deus Tupi do trovão. O senhor de todas as coisas. Segundo o folclorista Ermanno Stradelli (1852-1926), Tupã na realidade é Tupana, mãe do trovão.


DENISE MOLINA Ibitinga: Terra Branca/ Nevoeiro. Homenagem à cidade do interior de São Paulo, maior produtora de bordados do país e onde estive bordando nos últimos dias na beira do rio.


EUNICE DE PAULA Buriti do Tupi-Guarani: mbur = alimento; iti = árvore alta; => árvore alta de alimento ou de vida. Fontes e referências: Dicionário de Palavras Brasileiras de Origem Indígena – Clóvis Chiaradia Árvore, capaz de fornecer todos os elementos necessários para se viver desde a matéria prima para construção de casas até servir de alimento. Ref:Frutas nativas do cerrado


INDHIRA DIAS YEPORÎ Na Língua Macuxi, essa palavra indígena é um verbo, que significa ENCONTRAR. Na Língua Portuguesa, ENCONTRAR significa ACHAR, DEPARAR, mas também CONHECER, DESCOBRIR e ATINAR. Em tempos pandêmicos, talvez esse tenha sido o verbo que mais conjugamos e menos praticamos... ficamos no desejo e na vontade de ENCONTRAR as pessoas, os afetos, os amores. Para quem teve o privilégio de poder ficar em casa, com seu sustento e segurança garantidos, restou ATINAR para novas DESCOBERTAS, CONHECER melhor a si próprio e RECONHECER a importância de cada um nas nossas vidas.


JOANA SALLES WAIÌMA - Terra na língua Tikuna. Cantar uma canção de ninar na lingua Tikuna foi uma aproximação mágica à cultura desse povo, de forma ritualística e coletiva o grupo de bordado da EMIA se conectou através de uma canção de ninar com a sintaxe e fonética dos Tikunas. Esse carimbo é feito com folhas de oliveira, sobre ele corre a serpente, peixes e árvores. Um bordado que reverencia a terra e as crias que vivem e brincam nela.


JULIANA SANTOLIA Quando recebi o pano estampado, logo pensei na serpente que esteve presente em vários momentos do meu ano. Ela representa pra mim, o renascimento e a mãe natureza que deixa pra trás aquilo que não lhe cabe mais, construindo uma nova história de vida. Busquei referências indígenas no bordado e fiz uma escolha de palavras que representam a figura materna. Em Tupi Guarani, usei a palavra Iara.


LIVIA GABRIEL Escolhi a palavra tupi Guarani Fulô que significa flor. Quando meu filho, Valentin, era bem pequeno ouvíamos muito a música: “Tá caindo fulô, ê, ta caindo fulô Tá caindo fulô, ê, ta caindo fulô Lá do céu cá na terra, ê ta caindo fulo” Me deu saudades desta época e escolhi bordar essa palavra.


NAIGE NAARA Vendo os trabalhos que foram compartilhados pelo grupo, fui lembrando do vídeo “A serpente canoa”, que assistimos juntas em um dos nossos encontros (https://youtu.be/Cfroy5JTcy4), fui virando e observando a impressão de folhas que recebi e, em dado momento, vi a serpente nele e escolhi a palavra “Watu”, da etnia Krenak, que significa “Rio Doce” ou “o grande deus criador”.


NÍVIA GONÇALVES Minha palavra foi Aysú, amor em tupi guarani. Foi muito difícil pra mim intervir na estampa de folha que já me parecia perfeita e acabada, como se bordar em cima fosse estragar a beleza daquele pano e a beleza do encontro que o construiu. Procurei uma palavra que representasse o meu sentimento de pertencimento nesse nosso grupo. E foi olhando a beleza dos bordados de minhas parceiras q fui me libertando do medo e o amor pôde encontar seu lugar de existência para além do meu sentir. Aysú!


RENATA AUGUSTO Nhaehi da etnia kariri dialeto kipea = resgatar. Samyá dos Kariri -xocó = memória. Inspirada pelo vídeo A Serpente e a Canoa e as conversas sobre ancestralidade nos nossos encontros do BordaEmia, fui em busca de saber mais sobre comunidades indigenas no Piauí, já que a minha família paterna vem de lá. Descobri que o Piauí tem um movimento de resgatar essas comunidades e por isso pensei em bordar as palavras RESGATAR e MEMÓRIA.


VERA AUGUSTO Cajueiro dos papagaios= Aracajú, Tupi Guarani. A palavra é composta por dois elementos “ara”, que significa ‘papagaio’, e “acayu”, que significa ‘fruto do cajueiro’. Também pode significar “tempo”. Pesquisa: Dicionário Tupi Guarani.




IMPRESSÕES | MARCAS DA TERRAS - BORDAEMIA Técnica: Bordado livre sobre impressão de folhas em tecido 20 X 20 cm ARTISTA-PROFESSORA: Joana Salles ORIENTAÇÃO DE ESTAMPARIA: Ci Teixeira ARTISTAS BORDADEIRAS: Ana Galluzi Amalia Boratino Caroline Fukumoto Cecília Teixeira Dalvaci Porto Debora Prates Denise Molina Eunice de Paula Gisela Bueno Indhira Dias Joana Salles Juliana Santolia Livia Gabriel Marcella Schiavon Naige Naara Nivia Gonçalves Renata Augusto Vera Silva Augusto Marques


JOANA SALLES Artista têxtil e arte-educadora. Transita entre as artes manuais, o figurino teatral e cultura popular brasileira. Formada em Letras é mestra em Moda, Cultura e Arte. Dedica-se a projetos de arte e cultura em comunidades integrando pessoas e construindo trabalhos colaborativos através do bordado e a mistura de linguagens artísticas. Desde 2016, é artista professora de Artes Visuais na EMIA – Escola Municipal de Iniciação Artistica | SP onde ministra as oficinas de bordado para comunidade. Idealizadora do grupo BordaEMIA. Contatos salles.joana@gmail.com Instagram @la_buena_juanita @bordaemia Facebook Joana Salles Som a Fio


Editado em dezembro de 2021.

PROJETO GRÁFICO Alessandra Passarim www.passarim.weebly.com



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