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EXISTEM MUITAS COISAS ERRADAS COM A INDUSTRIA DE CARNE FALSA

Olhando para as noticias ao longo dos últimos tempos, algumas até baseadas em estudos científicos ou estatísticas sérias, a realidade e o futuro da humanidade aparentemente apresentam-se-nos com um quadro assustador que poderá, na perspetiva da mensagem, ser contraproducente.

A sociedade de consumo, ou melhor, alimentar os mais de oito mil milhões de pessoas, dos quais mil milhões passam fome, é um facto que tem contribuído, em certa medida, para a frustração e angustia de todos os que se preocupam. E eu me confesso, pois habitualmente costumo escrever e falar de temas cujo teor é fraturante. Tentando mostrar da minha parte uma realidade por vezes esquecida ou, em alguns casos, omitida, mas sempre suportada por análise consubstanciada em informação válida e em métodos que sejam minimamente fiáveis.

Embora querendo ser realista, reconheço o inevitável “alarmismo” da minha escrita. Mas sempre me questionando se esta é a forma mais correta de comunicar. Como fugir ao alarmismo climático, sobre a humanização de animais, produção de animais, dos movimentos anti-carne e mais extremista à “ideia peregrina” de proibir o consumo de carne?

Por vezes leio noticias que me despertam a curiosidade não só como jornalista, mas sobretudo como cidadão, por me parecerem exageradas ou mesmo erradas. O que me leva, com alguma frequência, a fazer a devida análise sobre a essência da noticia em si.

Quando surgiram as primeiras noticias sobre carne cultivada em “laboratórios farmacêuticos”, ou seja, carne falsa, eu, que me considero defensor de uma alimentação saudável, equilibrada e com carne, obviamente, interessei-me pelo tema. Nomes sonantes como Bill Gates, Leonardo DiCaprio, Natalie Portman, Jeff Bezos, o rapper Jay Z, enfim, entre outros, projetaram os movimentos anticarne e investiram muito dinheiro em startups para desenvolvimento de “carne” cultivada, digital ou o que lhe queiram chamar mas, no fundo, falamos de carne falsa, como se fosse o “El Dorado”, para além de "salvar" o planeta. A ideia era atraente: o risco do capital era praticamente nulo, o lucro era fabuloso e levou muito investidores - mesmo aqueles que comem bifes maturados a 500 dólares o quilo nos melhores restaurantes de Nova Iorque - a investirem.

Quando Ben Marlow jornalista do The Telegraph escreveu a 9 de agosto uma peça com o titulo “The Fake meat has finally been exposed as a complete waste of money” (em tradução livre: “A carne falsa foi finalmente denunciada como um completo desperdicio

FORTE PRESSENTIMENTO – OS VEGETARIANOS E VEGANOS NÃO QUEREM COMIDA QUE SANGRA, ASSIM COMO OS OMNÍVOROS

NÃO QUEREM HAMBURGUERES FEITOS EM LABORATÓRIO COM FÉCULA DE BATATA”.

de dinheiro”), imaginei logo os investidores a roerem as unhas à beira de um ataque de nervos, e não era para menos.

Isto a propósito da “Beyond Meat”, a mega empresa norte americana com sede na Califórnia que produz alimentos feitos à base de vegetais e replicam o aspecto da carne a sangrar com uma polpa de beterraba, que viu a sua faturação cair estrondosamente com os investidores a verem as suas ações na Bolsa de Valores de Nova Iorque (Nasdaq) caírem de 234 dólares para 12, 41 dólares. O fabricante de substitutos de carne à base de vegetais anunciou que a receita liquida caiu 40,5% nos últimos três meses (dados de julho), em comparação com o ano anterior. A empresa justifica a quebra com o aumento do custo de vida.

Já no ano passado, anunciou planos para cortar um quinto dos seus trabalhadores para economizar cerca de 40 milhões de dólares em custos.

Após o descalabro na Bolsa de Valores, a empresa referiu que foi afetada pela “diminuição da procura por parte do consumidor de carne vegetal, aumento da inflação, aumento das taxas de juro e preocupações contínuas sobre a probabilidade de uma recessão”.

Acrescentou que agora espera um receita anual perto dos 360 milhões de dólares, abaixo das estimativas anteriores de até 515 milhões. “A procura também foi afetada por um maior escrutínio dos benefícios para a saúde dos produtos veganos”, referiu Ethan Brown, CEO da “Beyond Meat”.

E acrescentou: “Essa mudança de percepção não ocorre sem o incentivo de grupos de interesse que conseguiram semear dúvidas e medo em torno dos ingredientes e processos usados para criar as nossas carnes à base de vegetais”.

No mesmo período de três meses, o prejuízo liquido da “Beyond Meat” caiu para 53,5 milhões de dólares, mesmo assim abaixo dos 97,1 milhões de dólares do ano anterior.

Recorde-se que a “Beyond Meat” - que também produz salsichas, linguiças e nuggets à base de vegetais - fez a sua estreia no mercado de ações na bolsa Nasdaq de Nova Iorque em maio de 1019. As suas ações encerraram o primeiro dia de negociação em mais de 160%, tornando-se uma das ofertas publicas mais bem sucedidas dos últimos anos.

Além disso, a empresa que auto se denominou como pioneira em substitutos de carne, enfrenta agora uma forte concorrência como a “Kellogg” ou a “Tyson Food”. Não está sozinha na corrida de fabrico de produtos alternativos à carne.

Em junho, o fabricante de alimentos veganos “Meatless Farm” parou de comercializar e mandou para casa todos os seus trabalhadores, enquanto que o fabricante de salsichas “Heck” reduziu recentemente a sua linha vegan por falta de procura do consumidor.

A “Vegan Society” referiu que a crise do custo de vida no Reino Unido está a ter “um grande impacto” nas escolhas de compras das pessoas, enquanto a “Meatless Farm” defende que “o mercado de carne alternativa está esgotado”.

DA ERA DO DINHEIRO BARATO DA ÚLTIMA DÉCADA” - BEN MARLOW

Epis Dio Contraproducente

Recentemente, um alto executivo da “Beyond Meat” foi preso por cravar os dentes no nariz de outro cidadão durante um incidente no Estado do Arkansas.

Doug Ramsey (Diretor-geral de Operações da Beyond Meat) declarou-se culpado de esmurrar o motorista e mordê-lo no nariz. O confronto ocorreu num parque de estacionamento após um jogo de futebol americano, depois de Ramsey acusar a vitima de lhe ter batido nas jantes do seu SUV.

A estrutura da “carne” da “Beyond Meat” mega-processada à base de vegetais e metilcelulose (composto químico derivado de celulose), entre outros, convence cada vez menos vegetarianos, vegans e muito menos omnívoros.

Numa América altamente moralista, a critica não se fez esperar : “Para um empresa com a missão de desmamar as pessoas da carne, é difícil pensar numa publicidade mais infeliz do que imaginar um dos seus principais líderes a morder o nariz de um potencial cliente”.

Doug Ramsey foi acusado de tendência para a “tagarelice hispster estúpida”, acompanhado de piadas inspiradas nos slogan da empresa, como “ajudar os humanos a comerem alimentos nutritivos” ou “coma o que você ama”, o que levou a pensar se Ramsey não teria sido tentado a comer carne. Ou talvez depois de ser forçado a consumir nada mais do que carne falsa feita de beterraba e metilcelulose

(composto químico derivado de celulose) por anos a fio, não teria vontade de trincar um osso e cartilagem de verdade.

Outra possibilidade, de que se fala, é que Ramsey ficou com raiva depois de ver o estado do preço das ações da Beyond Meat e concluiu como muita boa gente, que a moda da carne falsa não é nada mais do que outro desperdicio de dinheiro alimentado por capital de risco.

Dificilmente se pode concluir o contrário depois de um conjunto abismal de péssimos resultados financeiros. As vendas caíram mais de um terço, a empresa está em descalabro e as provisões financeiras foram destruídas. A “Beyond Meat” deveria ser a ignição do movimento vegano mas, em vez disso, corre o risco de se tornar um símbolo dos piores excessos da era do dinheiro barato da última década.

Uma lista repleta de estrelas e nada mais, nada menos do que 7 bancos de investimento subscreveram ações por um valor 30 vezes maior do que valiam, apesar do histórico financeiro seriamente questionável da empresa. No ultimo ano (2018) antes de aderir à Bolsa de Valores, a “Beyond Foods” conseguiu acumular 30 milhões de dólares de prejuízo, tendo faturado 88 milhões de dólares.

Depois do estado de graça, as perspetivas parecem ter sido um caso da fé triunfando sobre a realidade. As ações dispararam para 234 dólares nas semanas após a venda, valorizando substancialmente a empresa, mas por muito pouco tempo antes de cair de novo.

No período do “piquenique” humano de Ramsey, as ações estavam a ser negociadas a 15 dólares, cada uma. No momento, que escrevo este texto (22/08) estavam a 11,48 dólares cada uma. Segundo os analistas podem muito bem permanecer por muito tempo, ou mesmo afundarem-se mais se não entrar capital adicional para levantar a empresa. Mas de que maneira?

Existem Muitas Coisas Erradas Com A Industria De Carne Falsa

Começando logo pelo conceito. Uma das principais razões que a maioria dos vegetarianos e veganos deixou de comer carne é que abominam a morte dos animais. Então a pergunta lógica é: porque haviam eles de querer recriar a experiência – sangue e tudo – usando apenas proteína de ervilha?

Suspeito que – e não tenho bases para além de um forte pressentimento – os vegetarianos e veganos não querem comida que sangra, assim como os omnívoros não querem hamburgueres feitos em laboratório com fécula de batata.

Então quem sai? Gen-Z-ers (Geração Z) sinalizadores de virtude entediados em beber os seus lattes feitos com leite de aveia sem gosto? Se, se puderem se dar a esse luxo. Outra coisa estranha na industria de carne falsa é que é bem mais cara que a carne real e, portanto, não pode ser considerada uma alternativa real. Qualquer vegetariano ou vegano rapidamente concluirá que um prato de leguminosas à moda antiga é muito mais acessível e muito mais nutritivo.

Em resposta às percepções de que os seus produtos não são saudáveis e excessivamente processados. A “Beyond Meat” lançou uma campanha publicitária que pretende destacar os supostos benefícios de saúde dos seus produtos. “É uma questão de educação. Os factos estão aí. Os benefícios para a saúde... são muito fortes”, sublinhou o CEO, Ethan

Afinal de contas, apesar de toda a sua tecnologia e centenas de milhões de dólares de investimento, a industria da carne falsa não estava mais preparada para escapar das forças gémeas da inflação e da crise monetária do que qualquer outra empresa.

A campanha da “Beyond Meat” quis chegar ao coração dos consumidores com a promessa “coma o que você ama”, mas a história de amor dos consumidores com os caríssimos substitutos de carne da “Beyond Meat” desvanece diariamente, com percas irreversíveis para a empresa.

A empresa norte americana , cujos produtos à base de vegetais incluem hamburgueres que parecem sangrar e imitações de salsichas e almôndegas, reavaliou a sua previsão de receita anual no mais recente sinal de que a falsa bolha alimentar da carne falsa estás prestes a rebentar...ou já rebentou.

Depois de vários anos de rápida expansão alimentada por um alarde de investimentos de capital privado, os substitutos de carne falsa caíram em muitos cardápios do Reino Unido. Especialistas veganos, incluindo a “Meatless Farm of Leeds” e a “Plant & Bean”, com sede em Lincolnshire que forneciam empresas como a “Quorn” e a “Tesco’s Wicked Kitchen” convocaram, no passado mês de julho, os administradores para avaliar os prejuízos. Enquanto isso, a sueca “Oatly”, empresa alimentar do Grupo Nestlé e a londrina “Innocent Drinks”, propriedade da CocaCola, estão entre as que retiraram, este ano, produtos veganos dos lineares de venda no Reino Unido.

Como a experiência do Reino Unido ecoa no EUA e em outras geografias, a “Beyond Meat” viu o seu valor de mercado descambar 981 milhões de dólares, desde o seu auge em 2019, quando valia mais do que as lojas “Macy’s” da gigante Xerox.

Em Inglaterra teme-se que as vendas de carnes falsa caiam novamente até ao final do ano, de acordo com a empresa de consultoria “Mintel”.

O entusiasmo pela carne falsa foi atenuado por preocupações sobre a natureza altamente processada de algumas carnes falsas, destacadas por investigações recentes sobre os impactos de alimentos ultra processados na saúde, bem como uma mudança para cozinhar a partir do zero usando ingredientes básicos durante os isolamentos imposto pela pandemia de Covid.

A “Beyond Meat” que desenvolveu o hamburguer vegano McDonald´s MacPlant informou que as vendas caíram cerca de 40%, com prejuízos a rondar os 53 milhões de Libras. Entretanto, nos Estados Unidos o teste deste hamburguer foi cancelado.

Ethan Brown, CEO da “Beyond Meat” disse que “a ambiguidade em torno dos benefícios para a saúde de comer carne à base de vegetais atrasou consideravelmente as vendas”.

À medida que o mercado encolhe, marcas como a “Beyond Meat” e “Meatless Farm”, sofrem também com a crescente concorrência de uma infinidade de marcas com ideias inovadoras, que não pretendem imitar a carne mas têm o objetivo de apresentar produtos vegetarianos e vegan com ingredientes mais simples e naturais.

Paul Brown, CEO da empresa de alimentos vegetais “BOL”, que não usa carne falsa, revelou que o seu grupo, fundado em 2016, espera aumentar as vendas em cerca de 50% este ano.

E acrescentou: “Sempre pensei que haveria uma certa reação sobre o nível de processamento e elementos artificiais nas imitações de carne”.

Alice Pilkington, analista de alimentação da “Mintel” referiu que está menos otimista agora sobre o mercado de alternativas à carne do que há um ano.

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