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Thiago Larsen
Thiago Larsen
Balsa Nova/PR
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Mais de um milhão
Eu tenho mais de um milhão parado e não posso usar. Ao menos, não com a finalidade de comprar uma casa, um carro ou um poder político. Porque esse milhão que tenho não é de real, dólar, peso euro ou libra – é mais de um milhão de palavras escritas que formaram livros, poemas, contos, crônicas, cartas para antigos amores ou grandes amigos ou amados familiares; é um milhão de histórias que ouvi das mais variadas pessoas, nos mais inusitados lugares e nas mais surpreendentes condições, e cada uma dessas narrativas tem um preço que nenhuma moeda consegue comprar.
Eu tenho mais de um milhão de memórias vividas entre amigos, familiares e casos amorosos, claro que tenho momentos de tristeza, solidão dolorosa, ressaca, problemas pessoais e financeiros, pois não é somente de lembranças boas que a vida é escrita.
Li mais de um milhão de palavras dos mais variados autores (re)conhecidos ou não, brasileiros ou estrangeiros, fictícios ou biográficos, dramas ou comédias, contudo, cada um desses textos me marcou de alguma forma e ajudou na minha jornada como escritor, me dando nortes ou me fazendo querer ter distância daquele tipo de escrita, porém todas essas palavras são milionárias em sua essência de passarem um aprendizado, e aprender é algo que não tem preço, o dinheiro compra cursos, diplomas, e até vagas de prestígio, mas a sabedoria se conquista, e, geralmente apenas com o tempo – este último também nunca esteve à venda, é democrático, intransferível e único.
Eu tenho mais de um milhão de sorrisos, beijos, abraços, apertos de mãos, acumulados e, dentre eles, muitos foram de despedida, outros tantos de saudades e há a parcela daqueles que permaneceram por mais tempo por perto – o dinheiro pode até comprar uma ilusão de sexo, carinho, parceria, companheirismo, todavia amizades e amores sinceros não são negociáveis, palavras e gestos verdadeiros de afeto curam doenças da mente e da alma. Infeliz deve ser a vida de quem muito tem e vive cercado de “relacionamentos” que se evaporam quando a fortuna se consome.
Eu tenho mais de um milhão de paisagens acompanhadas pelos mais variados sons, tudo isso armazenado em uma lembrança afetiva de cidades que passei, países que visitei, lugares
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que conheci, naturezas que contemplei: pores de sol, ondas quebrando, pássaros voando, cachorros correndo, crianças brincando, são vozes e rostos e cheiros, tudo misturado à saudade, que é como uma mão capaz de massagear e relaxar ou capaz de esbofetear – contudo, acredito que a saudade que esbofeteia é aquela carregada de remorsos e arrependimentos, e a maioria, das minhas saudades, me acalma, me massageia a alma, a consciência fica limpa e sorriso simples e sincero se abre.
Tenho mais de um milhão disso tudo e espero ter muito mais, e se um dia eu chegar a ter um milhão de reais acumulados ou mais, que eu faça bom proveito desse dinheiro – e se um dia chegar a ter um milhão de seguidores e de livros vendidos, que as pessoas sejam de fato engajadas na minha literatura, ou derivação dessa minha arte, e que sejam pessoas críticas, que acompanhem trabalhos de outros autores e que possamos sentar e dialogar durante um café e uma prosa animada.
Antigamente faria questão desse debate se realizar em um bar, agora estou livre dos porres e das drogas, tento levar uma vida mais normal, termino esse texto em junho de 2021, ainda passamos por um grande problema pela pandemia e suas consequências, no entanto, isso tudo vai passar e poderemos fazer lançamentos, saraus, palestras e afins.
Bem, esse é um pouco de mim, do que sou e fui, são pinceladas e pensamentos transformados em parágrafos relatando, brevemente, algumas épocas – muitas novas fases e frases estão por vir (assim espero) enquanto isso: vou levando, na medida do possível, uma vida mais calma, lutando contra os impulsos e tentando ser melhor a cada dia a fim de tentar fazer, em doses homeopáticas de prosa e poesia, um pouco de diferença na vida dos outros, e manter a paz e a ordem na minha.
De milhões em milhões de segundos vamos vivendo e mudando percepções, pois a qualquer segundo a vida pode escorrer e a próxima parada nos é um mistério, por isso temos que deixar as nossas melhores marcas nesse mundão chamado Terra.
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