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Amélia Luz
Amélia Luz Pirapetinga/MG
Crônica:Triângulo Doloroso: Guerra Dos Sexos.
— Não, não posso! Saiba que a minha direção corre sempre no sentido da sua, de estar com você o resto da minha vida. Preciso ser feliz, conquistar a minha liberdade, mas não posso! — Como deixar os meus compromissos, os meus clientes, a organização à qual estou profissionalmente ligado? Como deixar meus números, famosos números, ditadores de toda a minha vida? Ah!... Tenha paciência, sem eles eu não sobreviveria... Aqui onde moro está a minha independência, o meu status, a minha situação de relevância na sociedade em que estou inserido. Deixar? Estou batalhando. Estou contornando. Vai dar tudo certo, certinho, você vai ver.
É aqui o meu ponto de apoio comercial, onde posso manter o meu carro novo, a minha casa recém-reformada, a posição privilegiada da minha família. Aliás, por falar nela, como deixar os meus filhos sozinhos, sem a minha cobertura, sem a minha proteção?
Sim, é de você que eu gosto, é só com você que eu converso, com quem eu troco minhas idéias. Você é o meu “papocabeça”. Mas, veja, é complicado! Tudo é muito complicado! Sim, quinze aninhos já se passaram, já estamos com quase sete décadas de vida, mas continuo contornando, continuo batalhando...
Assim, acho melhor você se conformar com esse meu esquema costumeiro. Uma vez por semana, sim, a sabatina, os jornais, as revistas, os deliciosos biscoitos açucarados que eu levo com carinho para adoçá-la um pouco, deixando-a menos amarga com as suas perguntas que me confundem...
Imagine o que faria a Madame X se eu me decidisse e rompesse com tudo? A casa cairia na minha cabeça! Não quero nem pensar, sair de cuecas de um casamento de mais de quatro décadas? E os bens? Conquistados com o suor da minha cara! No fundo penso que tudo, tudo me prende até o ressonar da Madame X. É com ela com quem me deito todas as noites, dividimos a cama, os cobertores, o quarto, a casa, o bom ou o mau humor, os
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filhos, os netos e até os bisnetos e tataranetos que um dia virão. Não tem jeito! A vida nos fez assim, nós somos indivisíveis: eu, ela e os nossos bens!
Sei que você está sozinha, passando uma baita solidão, sem ninguém a seu lado para lhe dar atenção. Isso me dói, tenha certeza, mas, na prática, nada posso fazer. A não ser continuar engabelando os seus sonhos de mulher meio “desantenada”. Repito, a culpa é toda minha eu é tenho que tomar uma posição!
Percebeu que nem mais respondo como no princípio do nosso relacionamento: “Deixo tudo por sua causa. Vamos ficar sempre juntos... Vou lhe trazer para o Vale da Ilusão, lhe dar uma casa com flores nas jardineiras, um rosto, uma definição digna”?!
Sabe, eu nem pensava que você iria acreditar! Pensei numa conquista barata, num contato relâmpago, coisa sem importância e depois cada um para o seu canto, mas que contratempo, a coisa veio para durar!
Olha, time que está ganhando não se mexe e o meu casamento já tem quase meio século. Já planejam até a festa de Bodas de Ouro. Na verdade, vou ser sincero não me amarro muito nos seus problemas, você tem se virado bem até agora, não me incomoda, não me exige nada e comodamente vamos vivendo esse circo que construímos para nós até que a lona pegue fogo. Eu finjo que vou um dia e você finge que acredita que eu irei decidir a seu favor e tudo continua na mesma novela, que nós dois, entre tapas e beijos, vamos vivendo. E mais janeiros vão passando, tudo arrumadinho do meu modo. As regras do jogo estão aqui em minhas mãos... Não se esqueça de que o HOMEM sou EU e as regras do jogo estão sempre em MINHAS mãos. Não, não é machismo, é lidar com a realidade, com os pés no chão, sem pender para sentimentalismos.
Sei que sente falta de mim e tenho até uma ponta de remorso por causa disso. Confesso que sou agarrado, agarrado a muitas amarras... Não quero desapontála... Você é a pessoa ideal para mim..., mas tantas coisas me acorrentam. Se eu acabei com o seu casamento eu sei, você poderia ter levado vida dupla. Preferiu dar uma de Maria Honesta abrindo mão de tantos anos de convivência. Para mim não é tão fácil. Você foi impetuosa, no impulso da paixão. Com os homens é bem diferente, dá para acomodar relações duplas, triplas sem nenhum problema de consciência. Não, não sou canalha não! Sou prático e calculista.
Os homens são muito complicados nessa relação “números x coração”. A vida tem que ser vista de forma real, ou melhor, comercial. O meu mundo, imperdível
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mundo, é o meu trabalho que está em primeiro plano para mim. Sempre digo e repito “quando não se tem solução para a causa é porque ela já foi solucionada”, palavras que não são minhas e que li nas “essências”. E não se esqueça de que para todo problema “o silêncio é sempre o melhor remédio”!
Ir aí, hoje??? Nem pensar!!! Sei que é feriado, dia santo, natal, seu aniversário, sei lá, isso não me importa! O que me importa é que tenho compromisso de trabalho e trabalho para mim está acima de todas as coisas. É o meu mundo comercial que você não alcança. E depois que desculpa teria para dar à Madame X? Ela está lá sempre à Luiz XV me esperando com o chicote da autoridade nas mãos. Casamento é casamento. Literalmente carrego a cruz até o fim.
Ah! ... Agora tenho pressa, já estou na pista e tenho que ir logo. São aqueles contatos com clientes de sábados e domingos, tão importantes para garantirem os meus números. Por favor, entenda! Amante tem de ser amante, se comportar como amante, viver como amante, calar a boca como amante sem direito a reclamar. Afinal, você já sabia que eu era... CASADO!