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PEDRO CHINELO | DETALHES
PEDRO CHINELO | Porto Alegre, RS.
DETALHES
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Às 12 horas, 37 minutos e 57 segundos do dia 15 de março de 1998, um pássaro macho da espécie Cardinalis cardinalis morria após ter caído 20 metros até o chão. Havia caído na calçada de uma rua lateral vazia após ter batido – e quebrado a asa esquerda – em uma espécie de parede invisível, era na verdade o vidro de uma janela que
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havia se deslocado 15 centímetros antes de cair e atingir uma massa de 25 quilos instantes antes de esmagar o animal acelerando-o ao chão. Teve uma vida feliz, o pássaro. Foi feliz, digo, feliz dentro dos limites de felicidade de um pássaro macho que teve 9 anos e meio de vida. Se não por sua vida, foi feliz por morrer na liberdade de seu voo.
Mal sabia ele, e de fato, uma ave não pensa, logo não sabe, que momentos antes acontecia uma cobertura de imprensa no andar térreo de um prédio próximo. Uma grande janela dava para a rua onde ele havia caído. Era uma pintura antiga que havia sido redescoberta após 250 anos de procura. O escavador-chefe e o arqueólogo responsáveis pelo grande achado discursavam. Um sobre a importância de tal pintura enquanto o outro, ao mesmo tempo, cuspia descrições detalhadas do local onde ela foi achada intercalando-as com piadas sem graça sobre o assunto. Crack! Todos se viram.
Poucos sabem, mas, com os materiais e inclinações corretas (e aquele milagre básico), o som pode se estender muito mais que o normal, fazendo um estardalhaço maior. É basicamente o mesmo efeito que ocorre quando estamos tentando caminhar em silêncio pela casa à noite. E foi o que aconteceu com Fred. Este foi o apelido que um garoto de 8 anos deu ao pássaro atualmente falecido, quando o ganhou de presente de sua tia Helena, que voltava de viagem e estava tão ressentida por ter faltado ao aniversário do garoto que o fuzilou de presentes. Tais presentes foram, em ordem de compra, uma bola colorida, um carrinho de controle remoto, uma bicicleta irada, alguns livros que provavelmente seu sobrinho não iria ler, um pássaro vermelho e uma raquete com uma bolinha menor. Este último curiosamente foi o presente mais caro e o mais importante para nossa história. Acontece que Igor, o sobrinho que-não-lê, fica a maior parte de sua estadia em casa vendo tevê. Mas não como qualquer pessoa, e mais como qualquer criança de oito anos: Não a vê parado; por esses tempos, em 33
uma troca rápida de canal, Igor se deparou com um jogo de tênis. Animado com os gritos e agitos dos jogadores, Igor movia sua cara raquete para lá e para cá, os imitando. Num desses movimentos exagerados de criança, o garoto perdeu o equilíbrio e bateu com a raquete na gaiola de seu pássaro vermelho, que estava na janela, fazendo-a cair.
Os segundos que prosseguiram a queda inicial da gaiola foram surpreendentes. Em um piscar de olhos, a gaiola estava presa em um galho, com a portinhola aberta – esta tinha um sistema de trava bem simples e foi parcialmente aberta pela raquete do menino, a queda fez o resto. – E Fred já voava em batidas de asas desengonçadas, ainda se acostumando a brisa e à mudança brusca de cenário. Pena foi ele ter batido, 5 minutos depois, em um vidro mal colocado que caiu e seu dono nem ter notado sua ausência. Bem, ao menos as 29 pessoas que estavam presentes na exposição notaram sua presença e pensaram, ao menos por um segundo, sobre a grande improbabilidade das coisas ordinárias e extraordinárias que formam nossa vida cotidiana e sua influência em nossa própria personalidade, ou não.
PEDRO CHINELO é porto-alegrense, cursa o segundo ano do ensino médio e é a primeira vez que publica um texto. Tem 16 anos e, motivado por sua namorada, espera que leiam e apreciem seu trabalho, ao mesmo tempo em que aprende e se inspira com esta experiência. |