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Star Trek: Discovery

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Lizzo

Lizzo

Star Trek: Uma Nova Fronteira

por VICS (@wondrvics)

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STAR TREK é, possivelmente, a série de ficção científica mais famosa e cultuada ao redor do mundo. Frases como “Vida longa e próspera” e “Espaço, a última fronteira” são facilmente reconhecíveis entre as pessoas – mas se isso não for o suficiente, tente fazer a Saudação Vulcana (aquele símbolo feito com a mão). As aventuras da tripulação da espaçonave USS Enterprise fizeram história, dando início a uma lucrativa e importante franquia capaz de se reinventar e permanecer atual ao longo das décadas.

Jornada nas Estrelas, em seu título nacional, estreou em 1966 na CBS, apresentado a tripulação liderada pelo Capitão James T. Kirk (William Shatner). A bordo da Enterprise, ele e sua equipe viajam pela Via Láctea explorando a galáxia, lidando com novos planetas e culturas, sempre em missão de paz. Ao lado de Kirk está Spock (Leonard Nimoy), seu Primeiro Oficial Comandante, e Leonard McCoy (DeForest Kelley), o Oficial Médico Chefe.

A JAULA

Renomeada ao longo dos anos como Jornada nas Estrelas: A Série Original (ou apenas TOS, na sigla original), o programa foi originalmente pensado de uma forma ligeriamente diferente. Durante sua produção inicial, em 1964, um piloto foi produzido e gravado para avaliação. Em The Cage (A Jaula, em tradução livre), James T. Kirk não existe, dando lugar ao Capitão Christopher Pike (Jeffrey Hunter), que tem como braço direito Spock (Nimoy) e a Número Um (Majel Barrett). Embora o episódio tenha sido rejeitado por ser “muito cerebral” e “devagar”, o arco é uma importante parte da história de Star Trek e foi exibido integralmente em 1988, 20 anos após o fim do programa. Cenas do capítulo, no entanto, foram adaptadas e exibidas como um episódio duplo da primeira temporada da série original, intitulado The Menagerie (S01E11 e S01E12).

Com 53 anos de historia, Star Trek deu origem a seis séries spin-offs e 13 filmes, além de inúmeros quadrinhos, livros, jogos e revistas oficiais, que servem de combustível para uma legião de fãs conhecida como Trekkers. A produção criada por Gene Roddenberry é conhecida e amada, principalmente, por seu teor crítico e social, além do aspecto fictício e fantasioso. Jornada nas Estrelas conta histórias que, em seu cerne, falam sobre igualdade, inclusão e diversidade, usando o espaço para fazer paralelos com os Estados Unidos dos anos 60, pontuando críticas contra a guerra, nacionalismo, sexismo e racismo.

Com um lacuna de uma década desde o fim da última série Star Trek (Star Trek: Enterprise, exibida entre 2001 em 2005, mostra os momentos iniciais que dão o pontapé para a Federação dos Planetas Unidos, organização cerne da mitologia Trekker) e um bem estabelecido reboot nos cinemas (iniciado em 2009 com Star Trek, dirigido por J.J. Abrams, em uma linha temporal paralela), uma nova série do universo começou a ser produzida pela CBS, contínua detentora dos direitos da franquia. Em 2017, STAR TREK: DISCOVERY (STD) estreou sua primeira temporada no serviço de streaming do canal, o CBS All Access.

DESCOBERTAS NAS ESTRELAS

Estrelado por Sonequa Martin-Green e com o conceito criado por Bryan Fuller (que começou sua carreira como roteirista das séries Star Trek: Deep Space Nine e Star Trek: Voyager), o programa se passa entre a linha cronológica de Enterprise e TOS – aproximadamente 10 anos antes dos eventos da série original. Michael Burnham (Sonequa) é a Primeira Oficial da USS Shenzhou, comandada por Philippa Georgiou (Michelle Yeoh).

Após um conflito, Burnham se vê em uma situação de perigo e decide tomar uma decisão que resulta na morte de sua Capitã e dá início a uma guerra contra a vil raça Klingon. Acusada de Traição pela Federação, Michael é presa, mas eventos a colocam a bordo da tecnológica USS Discovery, formada por antigos amigos de tripulação, como o Kelpiano Saru (Doug Jones), Primeiro Oficial da espaçonave. No meio de um ambiente onde todos conhecem sua história e desconfiam de suas ações, Burnham precisa provar seu valor e reconquistar a confiança da tripulação.

SAUDAÇÕES VULCANAS

A primeira temporada da série tem como panos de fundo a guerra contra os Klingon, com a nave Discovery a frente das pesquisam que buscam uma forma de derrotar o sanguinário império inimigo. O grande trunfo do transporte está no que é conhecimento como Motor de Esporos, capaz de teletransporte e se manter indectável, viajando a velocidades superiores à Dobra – no universo, é a força de propulsão que as USS usam para se locomover no espaço, sendo mais rápida que a luz.

Com 15 episódios em seu primeiro ano, Star Trek: Discovery sofreu com muitas críticas dos fãs, contrariando a boa recepção que recebeu da mídia especializada. A produção muito bem feita (principalmente no setor de efeitos especiais e fotografia) e a atuação sólida não foram suficiente para uma sonora parte dos Trekkers, que criticavam a trama e as grandes disparidades com a série original, como o Motor de Esporos, nunca antes citado na mitologia. Ainda, Michael é introduzida com a irmã adotiva de Spock, também nunca mencionada.

Outros descontestamentos giravam em torno do próprio setor visual, que apresentam uma USS muito avançada tecnologicamente, considerando o que antes era visto na Enterprise. Mesmo com as referências e compartilhando do mesmo universo, a série parecia não atingir o nível esperado pelos fãs, enquanto a recepção da indústria mostrava-se contrária: STD recebeu indicações de importantes premiações, como o Saturn e o Hugo Awards (ambos premiam o melhor da ficção científica), e até mesmo do Emmy de Artes Criativas.

Discovery, mesmo com a resistência inicial dos Trekkers, acabou conseguindo se consolidar e dar o pontapé necessário para dar continuidade à sua história. Com a segunda temporada aprovada, a produção preparou o Star Trek: Short Treks, uma compilação de quatro curtas de 15 minutos cada, que estendem o universo e, de alguma forma, se encaixariam ao futuro do programa. No terceiro capítulo vemos, por exemplo, como Saru adquiriu o conhecimento da Federação e saiu de uma civilização Pré-Dobra (na mitologia, a Primeira Diretriz diz que é contra a lei interferir nestas culturas, e estas sociedades devem seguir seu curso natural até atingirem capacidade de adquirirem por sí mesmos o conhecimento da tecologia de propulsão), tornando-se o primeiro e único Kelpiano parte da Frota Estelar.

Bem produzidos, os curtas mostram um cuidado ainda mais apurado para desenvolver tramas e conexões neste novo mundo. Nas entrelinhas, a produção mostra sua força e avisa, aos fãs mais difíceis, que eles estão prontos para trazerem uma segunda temporada (muito) interessante.

REENCONTRANDO JORNADAS

A USS Discovery retorna para a sua segunda temporada em janeiro de 2019, dando continuidade imediata aos eventos vistos no ano anterior. Nos segundos finais da primeira temporada, a nave recebe uma Saudação de ninguém menos que a USS Enterprise. Mas sem a presença de seu fiél escudeiro Spock (Ethan Peck), o público dá as boas vindas ao Capitão Christopher Pike (Anson Mount) e a seu fiél escudeira Número Um (Rebecca Romijn), em uma referência e homanegm direta ao episódio piloto descartado The Cage, citado anteriormente. Pike recebe da Federação a incubência de desvendar os mistério de misteriosos sinais vermelhos que apareceram ao longo da galáxia, tomando temporariamente a liderança da Discovery.

Fica claro, de cara, que o novo ano da série evoluiu de forma exponencial. Enquanto a fotografia e os efeitos especiais se mantém sólidos e continuam a encher os olhos dos telespectadores, o roteiro e atuação tomam um passo adiante, entregando uma Jornada nas Estrelas carregada de drama e complexidade. Após brincar um pouco com a existência do Universo Espelho (já conhecida pelos fãs) e até mesmo de trazer uma nova versão da Capitã Philippa Georgiou, STD está determinada em entrar de cabeça na mitologia, ao mesmo tempo em que tece o seu próprio caminho.

Com a trama girando em torno dos tais misteriosos sinais, a tripulação da Discovery é levada a diferentes (e conhecidos) locais do universo. É entre essas locações que a série se liga ao Short Treks, indo ao planeta natal de Saru e ao planeta de um velha amiga da cadete Sylvia Tilly (Mary Wiseman), arco que é foco no primeiro curta. Não só isso, os Trekkers tem a oportunidade de reviverem The Cage mais inteiramente, com Pike retornando à Talos para uma missão – e reencontrando, no processo, Vina (interpretada no original por Susan Oliver, e em Discovery por Melissa George). Este, inclusive, é um dos muitos pontos positivos do novo ano: STD faz um excelente trabalho com as referências, que as vezes aparecem de forma escancarada ou singela. De uma forma ou de outra, a produção encaixa-as perfeitamente ao longo de seus 14 episódios para qualquer um que conheça do universo ou gaste alguns minutos indo no Reddit ou na sessão de comentários do TV Time.

PONTOS DE LUZ

Aprofundando ainda mais na carga dramática, no desenvolvimento do roteiro e na expansão da mitologia, os fãs recebem mais camadas de seus personagens enquanto podem conhecem mais de perto outros – até mesmo a rede micelial, que dá carga ao Motor de Esporo, tem a oportunidade de ganhar protagonismo. Michael Burnham cede um pouco de seu papel primário, mas Sonequa ainda entrega uma sólida performance com uma personagem dura e cheia de certeza, mas abalada por seu recente e distante passado, batalhando para tentar manter seu lado humano e emocional ao mesmo tempo que exerce seu lado racional Vulcano. Saru tem a oportunidade de expandir sua história, evoluindo de forma figurativa e literal, em um episódio emocional e cheio de significado. Temos até mesmo a chance de conhecer personagens antes não explorados pela série, como é o caso da ciborgue Airiam (Hannah Cheesman), que tem um arco inteiro para si, fundamental para o quebra-cabeça dos sinais misteriosos.

O grande trunfo da segunda temporada de Star Trek: Discovery fica, no entanto, com Anson Mount e seu Christopher Pike. Sendo um personagem pouco explorado da mitologia, os roteiristas preenchem as lacunas narrativas de uma forma brilhante, carregada pela carga dramática de Mount. Pike torna-se, rapidamente, amado pelo público, graças ao seu carisma, em uma personalidade que contrasta bastante com a de Burnham, por exemplo. Enquanto ela é mais reclusa, com uma barreira emocional em torno de sí, Pike é convidativo, leve e facilmente confiável, mesmo embalado dentro do decoro que seu cargo de Capitão exige. O personagem de Anson é responsável por um arco redondo na temporada, ainda servindo de ponte conectiva com outro mistério: o desaparecimento e fuga de Spock, que eles logo descobrirão estar diretamente ligado à sua missão de entender a origem e significado dos pontos vermelhos. Ethan Peck, inclusive, entrega um Spock capaz de balancear bem o maquineísmo do personagem imortalizado por Nimoy e trazer sua sua própria identidade ao icônico personagem.

Star Trek: Discovery entrega uma temporada de arcos bem amarrados, aventuras instigantes e momentos geniais, com visuais incríveis e uma trama sólida – inclusive respondendo perguntas levantadas pelos fãs que questionavam a discrepância entre esta narrativa e o original. Ainda, o seu completo senso de nostalgia não vem apenas das referências e homenagens, mas também pela construção de seu conceito, iniciada já na primeira temporada.

O exemplo mais fiél disto é a sua tripulação diversa, simulando o conceito de/do mundo real: temos três negros (duas mulheres e um homem), um espécime único de sua cultura, uma ciborgue, seres com aspectos mais “alienígenas”, humanos, humanos com implementações robóticas/tecnológicas e um casal de médicos/cientistas gays. E alguns desses personagens exercem cargos de alto nível, enquanto outros tomam cargos que geralmente são interpretados pelo seu sexo oposto. Só na primeira temporada temos, por exemplo, uma atriz malasiana como a Capitã de uma USS e uma negra como Primeira Oficial, enquanto duas mulheres pilotam a Discovery (uma delas negra) e homens abertamente gays são os chefes dos departamentos Médico (este, negro) e Científico.

Se isso não é Jornada nas Estrelas, só nos resta uma coisa: vida longa, próspera e paciência. //

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