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PROBLEMAS BRASILEIROS: 60 ANOS
from PB #474
Em 1963, quando a Revista PB foi fundada, os cenários político, econômico, social e cultural do Brasil eram, em uma palavra, complexo... E continuam sendo.
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Desde então, em mais de 450 edições publicadas, analisamos este País, ao mesmo tempo, muito rico e muito pobre, culturalmente diverso e único. Somos muitos. Uma nação com problemas e soluções inventadas pelo próprio brasileiro.
Em seis décadas, nossas páginas se tornaram espaço para um debate democrático com foco em um país mais justo. Neste período, ao crescermos e nos transformarmos, percebemos que enquanto problemas seculares marcarem o Brasil, nada será mais importante do que discuti-los e enfrentá-los com o vigor dos brasileiros e das brasileiras protagonistas da nossa história de todos os dias.
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MERCADO DE CARBONO: REGULAR SEM INIBIR
entrevista
Imprescindível para o equilíbrio entre desenvolvimento e preservação ambiental, a regulação do mercado de carbono segue em suspenso no Congresso por falta de acordo sobre o texto. O crédito de carbono comprova quando uma empresa ou um país conseguiu reduzir as emissões de gases de efeito estufa. O sistema regula a compra e a venda desses créditos. Referência em compliance ambiental e mercado de carbono, Natascha Trennepohl afirma que, em paralelo, estamos passando por um boom no mercado voluntário, do qual as empresas podem participar sem obrigações legais. Em seu recente livro, Mercado de carbono e sustentabilidade: desafios regulatórios e oportunidades (Editora Saraiva), ela apresenta possibilidades regulatórias a partir do comércio de emissões europeu (EU ETS). Segundo a advogada, as complexidades de um marco que crie oportunidades, ao invés de entraves, precisam ser consideradas para garantir segurança jurídica e eficácia do sistema.
Como funciona, atualmente, o comércio de emissões europeu (EU ETs)? Os demais continentes estão mais ou menos avançados?
O mercado de carbono europeu é um dos maiores e mais antigos. A fase do projeto-piloto começou em 2005, antes mesmo dos compromissos do Protocolo de Kioto. O sistema já passou por diversos momentos e reestruturações, e, por isso, considerei um passo importante estudá-lo para entender, por exemplo, quais foram os principais desafios, os erros e os acertos durante a sua implementação e operacionalização. Claro que é indispensável considerar as diferenças entre os países e que não é possível transpor 100% de um sistema para outra realidade, sendo necessário fazer ajustes e avaliar se aquela realmente é a melhor alternativa. Ao longo dos anos, muitos países partiram do modelo europeu e fizeram adaptações para desenvolver os próprios mercados regulados. Atualmente, em termos de emissões, a China dispõe do maior mercado, porém em termos de valor negociado, o europeu continua sendo o maior.
Em que medida os elementos do sistema europeu podem servir como referência para o mercado de carbono no Brasil?
O primeiro passo é ter um inventário de emissões bem elaborado e confiável. A partir daí, podem ser definidos o escopo, a cobertura e o limite de emissões. Outro ponto importante na estruturação e que reflete na aceitação inicial do sistema é a definição das regras de alocação das permissões, ou seja, se estas serão distribuídas de forma gratuita ou leiloadas. Outros elementos de design estão ligados aos desenvolvimentos de um sistema robusto de monitoramento, reporte e verificação e de regras de compliance e penalidades claras para os casos de descumprimento, bem como de regras de flexibilidade, como o porcentual e os tipos de créditos que poderão ser usados para a compensação de emissões.
Entidades como a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) defendem a regulação do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE) dos gases que provocam o efeito estufa. Você tem expectativas positivas sobre as propostas em andamento?
Desde a Lei 12.187, em 2009, pouco foi feito de forma concreta para operacionalizar o MBRE ou instituir os elementos necessários para o estabelecimento de um mercado regulado. No passado, muito se discutiu a natureza jurídica do crédito de carbono, destacando-se que este não teria as características de valores mobiliários e as operações não estariam submetidas à regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Posteriormente, o Código Florestal (Lei 12.651 de 2012) trouxe a classificação do crédito de carbono nas operações florestais como um direito sobre um bem intangível e incorpóreo transacionável. Mais recentemente, o Decreto 11.075, de 2022, conceituou o crédito de carbono como um ativo financeiro. Percebe-se que ainda não há uma harmonização quanto ao tratamento deste ativo, e a definição da natureza jurídica do crédito repercute, por exemplo, na forma como será tributado e negociado. Um marco jurídico claro e bem definido é essencial para trazer segurança jurídica e clareza aos investimentos, principalmente quando estamos falando de projetos que são desenvolvidos por 10, 20 ou 30 anos. O substitutivo do atual PL 412/2022, dentre outros aspectos, tenta estruturar um sistema geral de gestão em que algumas atividades teriam metas de redução, estipuladas no Plano Nacional de Alocação de Direitos de Emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) – e outras estariam de fora, como a agropecuária, a exploração florestal e o uso alternativo do solo, as quais poderiam ter o papel de geradoras de créditos para a compensação de emissões. Assim, teríamos demanda e oferta internas. No entanto, a previsão de tributação em 15% das operações e o fato de que o PL prevê um prazo de até dois anos para que haja a regulamentação da forma como o relato de emissões das instalações deve acontecer são alguns dos pontos preocupantes.
INSTALAÇÕES DEVE ACONTECER [NO BRASIL] SÃO PONTOS PREOCUPANTES.
Mesmo sem uma regulação definida, já é possível para as empresas, de qualquer porte, obterem benefícios concretos no âmbito dos negócios?
Certamente. Ainda que o mercado regulado não esteja implementado no Brasil, o mercado voluntário está se desenvolvendo e crescendo cada vez mais. O primeiro passo para cada empresa é identificar as emissões de cada escopo – por exemplo, do desenvolvimento da atividade em si, do uso de energia e da cadeia de fornecimento. A partir daí, existem diferentes oportunidades de participação, mediante a redução das emissões diretas da atividade, do financiamento de projetos de compensação e compra de créditos, da adaptação da matriz energética das lojas físicas com mais eficiência energética e utilização de iluminação LED, da instalação de equipamentos de energia solar etc.
Existem iniciativas no varejo digital que possibilitem ao consumidor fazer a compensação da pegada de carbono de determinado produto no momento da compra? A inclusão do consumidor no processo compensatório é um desafio?
Sim, várias iniciativas do varejo digital já permitem que os consumidores compensem a pegada de carbono de um determinado produto ou serviço. Algoritmos calculam as emissões de carbono relacionadas à produção e ao transporte de um determinado produto. Além disso, os preços de compensação podem variar de acordo com a natureza do produto, a distância e o tipo de frete escolhido. A empresa tanto pode arcar com a compensação e comunicar isso ao consumidor, como disponibilizar a ele a opção de contribuir para a compensação. Esta segunda situação traz o desafio de engajar os clientes a partir da consciência ambiental e do seu papel no mercado.
No mercado voluntário, como funciona o controle de qualidade do trabalho feito pelas agências reguladoras?
As próprias certificadoras estabelecem as regras e as metodologias que serão aceitas nos processos de certificação. Os selos e os cobenefícios sociais dos projetos também podem variar. Algumas certificadoras se destacam por contarem com processos e critérios mais rigorosos – e, com isso, mais credibilidade no mer- cado internacional, influenciando, inclusive, o valor do crédito que vai ser gerado e negociado.
Além de focar o potencial de redução interna, é importante também para as empresas investirem, ao mesmo tempo, na compra de créditos, seja individualmente, seja por meio do apoio e da participação no desenvolvimento de um projeto de redução de carbono?
As duas formas são complementares e vão depender da estratégia. Para muitas empresas, o custo da adoção de medidas internas para reduzir as emissões de GEE acaba sendo muito alto, e faz mais sentido compensar emissões pela compra de créditos de carbono.
Não existe uma fórmula mágica, ou uma estratégia que possa ser usada por todas as empresas ou os países, para lidar com os desafios ocasionados pelas mudanças climáticas. É essencial a combinação de ações, políticas e instrumentos para mover empresários, governos e sociedade em direção a uma economia de baixo carbono e sustentável.
Independentemente de regulação, as novas exigências relacionadas à pegada de carbono já funcionam como barreiras para produtos exportados?
A pegada de carbono será cada vez mais importante para os mercados nacionais e internacionais. A União Europeia discute um método, chamado Carbon Border Adjustment Mechanism, que, como o próprio nome indica, deve servir como um ajuste de fronteira que considere a pegada de carbono um produto. Assim, os importadores na União Europeia terão de declarar as emissões dos bens importados e comprar certificados para cobrir essas emissões. Os exportadores, por sua vez, vão precisar fornecer as informações sobre a pegada de carbono dos seus produtos. Inicialmente, o impacto se dará nas importações de aço, ferro, alumínio, eletricidade, fertilizantes e cimento, mas é possível que outros setores e produtos sejam incluídos nos próximos anos, com a revisão do procedimento.
A utilização das fontes de energia que produzem baixos níveis de emissão de GEE é o tema do e-book Economia de baixo carbono para empresas de comércio e serviços, elaborado pela FecomercioSP. acesse o conteúdo na área exclusiva para associados por meio deste código qr:
MERCADO DE CARBONO
E SUSTENTABILIDADE:
DESAFIOS REGULATÓRIOS
E OPORTUNIDADES
(Saraiva, 230 págs.), de Natascha Trennepohl