Inovações institucionais no financiamento à agricultura familiar: o Sistema Cresol

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Inovações institucionais no financiamento à agricultura familiar: o Sistema Cresol Revista Economia Ensaios – Vol 16, nº 1:no prelo, 2003 Gilson Alceu Bittencourt * e Ricardo Abramovay **

Resumo: O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) permitiu que imensa quantidade de agricultores familiares tivesse, pela primeira vez, acesso a créditos bancários. Apesar disso, tanto o Governo Federal como os movimentos sociais convergem no reconhecimento de que o sistema bancário é hoje um obstáculo para que as metas definidas na política pública sejam atingidas e para que se expanda a base social do Programa. Construído a partir da experiência de crédito rotativo no Sul do País, o Sistema Cresol contribui para mostrar que recursos governamentais podem chegar a populações desprovidas de garantias e contrapartidas em proporção muito maior do que os bancos são capazes de propiciar. O texto discute algumas das questões teóricas envolvidas na montagem da rede de confiança em que o sistema Cresol se apóia. Expõe ainda os principais elementos empíricos que permitem compreender que não se trata de uma experiência simplesmente localizada e sim de uma iniciativa com amplo potencial de universalização. Palavras-chave: Crédito rural; agricultura familiar; instituições; confiança; capital social; cooperativismo de crédito.

Abstract: The Empowerment Family Farming National Program (PRONAF) allowed access to credit for a large quantity of family farmers. In spite of this, Federal Government and social organizations converge in the recognition that the bank system is today an obstacle to the enlargement of the social basis of the Program. Built from the rotary credit experience in the South region of Brazil, the Cresol System contributes to show that government resources can arrive to poor populations that do not have collateral, in a larger proportion than that of banks. The article argues some of the theoretical matters involved in the reliable net montage where the Cresol System supports itself. It exposes still the main empiric elements that permit comprehending it is not a simply located experience, but an initiative with high potential to be widely reproduced. Key words: Rural credit; family farmers; institutions; social capital; credit cooperative.

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Agrônomo, Bolsista FAPESP, mestrando em Desenvolvimento, espaço e meio ambiente pelo IE/UNICAMP – bittenca@eco.unicamp.br Fone: (019) 3271-1991 ** Professor Titular do Departamento de Economia da FEA e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental (PROCAM) da USP – abramov@usp.br. Tel: (11) 30 91 58 80 - Fax: (11) 30 91 60 73


1 Introdução A experiência internacional tem mostrado retração generalizada dos grandes bancos públicos no atendimento às necessidades de agricultores desprovidos da capacidade de oferecer garantias e contrapartidas na busca de financiamentos. Na América Latina, na África e na Ásia, os bancos estatais voltados ao meio rural enfrentaram dois problemas fatais a sua própria continuidade. Ou não atingiam o público a que deveriam voltar-se - repassando a agricultores de alta renda subsídios em tese destinados a combater a pobreza – ou então caíam rapidamente em situação de insolvência e inviabilidade (Wampfler, 1999; De Janvry et al., 1997) O formato predominante do sistema bancário comercial – que ele seja estatal ou privado - é pouco propício a que ele consiga estabelecer uma relação durável com populações vivendo próximo à linha de pobreza. E, no entanto, estas populações possuem uma imensa necessidade de liquidez (Yaron et al., 1997) e são – com freqüência muito maior que seu acesso a financiamentos bancários deixaria supor - capazes de gerar renda num montante suficiente para honrar seus compromissos financeiros. A falência quase generalizada dos grandes sistemas financeiros estatais e o desinteresse dos bancos privados em lidar com populações vivendo próximo à linha da pobreza permitiram que aumentasse o interesse por novas formas institucionais de organização do acesso ao crédito no meio rural. Os casos mais conhecidos e hoje já estudados (Yaron et al, 1997) são os asiáticos: o Grameen Bank de Bangladesh, o Bank for Agriculture and Agricultural Cooperatives da Tailândia e o Village Banks (talvez o único caso de um esquema descentralizado pertencente a uma organização estatal). Mas em todo o mundo acumula-se uma importante experiência de construção de novas modalidades de financiamento às atividades econômicas no meio rural. Estas experiências não atingem apenas os países em desenvolvimento. O colóquio “Estratégias locais para o emprego e a economia social ” (1) mostrou como, nos países desenvolvidos, a padronização dos produtos bancários e a mundialização da economia e dos mercados financeiros, bem como as estratégias de ‘racionalização ’ da oferta financeira centrada em critérios de rentabilidade de curto prazo levam à exclusão da clientela considerada de risco e à eliminação das operações de altos custos de transação. Novas instituições financeiras são vistas pela OCDE (1998:29) como essenciais para a criação de empregos, para a revitalização de bairros ou zonas

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Organizado pela OCDE e o Instituto de Formação em Desenvolvimento Econômico Comunitário do Canadá, em Montreal, em junho de 1997.


rurais em dificuldade e a promoção dos valores da economia social e do desenvolvimento sustentável. No caso brasileiro, é no meio rural que ocorrem as experiências inovadoras mais significativas neste sentido. O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) representou um avanço histórico na política agrícola, já que pela primeira vez foram construídos organizações e procedimentos que respondem pelo fato de o crédito chegar a um número inédito de agricultores familiares. Apesar do sucesso desta política, é inegável a insuficiência do sistema bancário para responder à demanda do público visado pelo Governo: se for verdade que a circulação dos recursos governamentais por meio de organizações de caráter bancário funciona objetivamente como um escudo contra a inadimplência generalizada, o fato é que os bancos só podem operar selecionando sua clientela com base nos critérios econômicos e contábeis que pautam suas operações. Cada gerente é responsável pela lucratividade de sua agência e tende a privilegiar os clientes capazes de oferecer garantias e contrapartidas. O Sistema Cresol de Crédito Solidário tem o objetivo explícito de enfrentar este problema. Ele parte da premissa de que existe um público não contemplado pelo sistema bancário, cuja geração de renda encontra-se inibida pelas restrições sociais a que agricultores desprovidos de patrimônio submetem-se quando solicitam crédito. Formado num ambiente de ampla atividade política e cultural das Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica, e de uma rica experiência de organizações sindicais e populares, o Sistema Cresol pretende ser muito mais do que simplesmente um instrumento para facilitar o repasse de créditos oficiais a agricultores excluídos do sistema bancário. Ele se liga a um conjunto de outras organizações voltadas à promoção de uma agricultura respeitosa do meio ambiente, capaz de gerar renda com base em produtos diferenciados e de contribuir para o fortalecimento das unidades familiares de produção. Qual a possibilidade um sistema local de crédito construir um conjunto de práticas, organizações e procedimentos que permitam atingir esta espécie de quadratura do círculo, que consiste em emprestar recursos a agricultores excluídos dos bancos, promovendo geração de renda e sem cair na inadimplência generalizada? É o que pretende discutir este trabalho, com base na experiência do Sistema Cresol e a partir da hipótese básica que um sistema alternativo de crédito resulta da construção social de uma rede de confiança que supõe – e ao mesmo tempo reforça – um estreito conjunto de relações não só entre agricultores, mas sobretudo que permita a organizações que não pertencem ao círculo localizado em que vivem os beneficiários do Sistema emprestar-lhe recursos e contar com seu pagamento dentro de regras formais estipuladas pelo Governo e pelo próprio sistema bancário. O desafio do Sistema Cresol não consiste apenas em reforçar os


vínculos comunitários entre agricultores e apoiar-se nestes laços de proximidade para garantir seu funcionamento. Esta construção localizada faz-se acompanhar de abertura em direção às administrações públicas que cuidam dos recursos destinados ao crédito e ao próprio sistema bancário pelo qual eles até hoje transitam. A principal virtude do Sistema Cresol é ter conseguido inserir suas operações em redes que estimulam comportamentos cooperativos por parte dos indivíduos e, ao mesmo tempo, oferecer a atores sociais que lhe são externos, a confiança necessária para que o Sistema não somente receba recursos, mas apareça como um interlocutor decisivo na própria política de fortalecimento da agricultura familiar (2). Para tratar destes temas, o texto divide-se em 4 partes, incluindo esta introdução. A segunda parte trata dos limites do setor bancário em relação ao financiamento de agricultores familiares. A terceira discute a importância da construção da confiança como alternativa ao excesso de garantias utilizadas para a concessão de financiamentos. A quarta parte apresenta o Sistema Cresol, com destaque para a sua origem, estrutura e quadro social, além do funcionamento e informações sobre os seus empréstimos, garantias, taxas e custos. Por fim é apresentada uma rápida conclusão.

2 Os limites do setor bancário As avaliações a respeito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) até aqui disponíveis (Abramovay e Veiga, 1999; Belik, 2000; Ministério do Trabalho, 1999; Silva, 1999) são unânimes em reconhecer a natureza efetivamente familiar das unidades produtivas atingidas por suas linhas de crédito. Este resultado só foi possível graças à criação de um conjunto de condições institucionais que abriram os financiamentos bancários a um público que a eles até então não tinha acesso (3). A montagem organizacional destas condições foi conflituosa e resultou – de maneira freqüentemente imprevista – do próprio desenvolvimento do programa. A definição formal de “agricultor familiar ” nas normas do Banco Central, os “certificados de aptidão ” (pelos quais os

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Woolcock (1998) e Moyano (2001) estudam esta dupla dimensão do capital social: a formação de redes localizadas de confiança e, ao mesmo tempo, a capacidade destas redes abrirem-se para relações universalizantes com atores que não fazem parte de seu círculo imediato de relações. 3 50% dos agricultores que tomaram crédito pelo PRONAF nunca tinham anteriormente realizado uma operação de financiamento bancário. Este montante sobe para 57% se forem incluídos os que já se haviam beneficiado do crédito, mas do próprio PRONAF. 88% dos beneficiários pesquisados entre 1998 e 1999 pelo IBASE tinham área até 50 hectares. Quanto à categoria de agricultores familiares que recebeu crédito, diz o IBASE que “aproximadamente 2/3 dos beneficiários podem ser caracterizados como uma agricultura familiar em processo de consolidação e 1/3 correspondem a agricultores mais fragilizados ” (Ministério do Trabalho, 1999).


sindicatos e/ou a extensão garantem que o candidato ao crédito preenche os critérios legais) e os limites de renda dentro dos quais deve situar-se o agricultor a que se destina o financiamento, foram sendo desenhados conforme avançava a implantação do PRONAF. A estas definições legais deve-se acrescentar uma ampla pressão social sobre o sistema bancário, bem como o rápido crescimento de mecanismos de garantias dos financiamentos sob a forma de fundos de aval e crédito solidário. Apesar destes inegáveis avanços institucionais e da ampliação do público atingido pelo Programa, é generalizado o descontentamento com as formas dominantes de intermediação financeira por que passam hoje os recursos creditícios do PRONAF. Governo e movimentos sociais e quase todos os estudos realizados sobre o tema juntam-se numa dupla crítica ao sistema bancário. Existe um contraste – e por vezes uma contradição - entre o público definido pela política governamental e a clientela almejada pelos bancos (4). Os bancos tendem a operar com clientes que já fazem parte de sua carteira de negócios, que apresentem garantias e contrapartidas. Até hoje persistem as denúncias de exigências por parte dos bancos cujo atendimento exclui do âmbito de sua atuação parte significativa dos agricultores visados pelo PRONAF. É importante levar em conta a existência de um real risco bancário nestas operações, contrariamente, por exemplo, ao que acontecia com o Programa Especial de Reforma Agrária, o PROCERA. Operando com recursos vindo do Fundo de Amparo ao Trabalhador, Exigibilidades Bancárias, Recursos Próprios dos Bancos Cooperativos e Fundos Constitucionais, com subsídios cobertos pelo Tesouro Nacional, os bancos são obrigados a se dotar das garantias habituais de um empréstimo bancário, o que tende a excluir de seu círculo de atuação o público que se encontra na base da pirâmide social. Exatamente para contemplar este problema, o Tesouro Nacional paga ao sistema bancário o correspondente ao custo administrativo de cada operação. O Banco do Brasil, principal operador do PRONAF, beneficia-se especialmente deste pagamento. Se for verdade que a base social do crédito do PRONAF tem-se ampliado de maneira considerável (chegando hoje a mais de 900 mil contratos), não é menos certo que o custo orçamentário deste crescimento tem sido mais que proporcional: uma vez que o Banco do Brasil recebe, além do spread destinado a cobrir possíveis inadimplências, um montante fixo e mensal por cada contrato independente de seu valor. Quanto

4 “O sistema bancário – como qualquer empresa mercantil – tem clientes com os quais estabelece relações de interesse; com o PRONAF, ele passa a ter um público ” (Abramovay e Veiga, 1999).


menor for o valor do contrato, maiores serão os custos unitários percentuais da administração bancária. Em 2001 o Tesouro Nacional gastou cerca de R$ 400 milhões com o Pronaf, divididos entre equalização das taxas de juros, pagamentos de taxas administrativas e spread bancário e subsídios diretos aos agricultores. Este valor foi para um total de apenas R$ 2,1 bilhões em empréstimos novos, além do carregamento de custos de empréstimos liberados em anos anteriores (os custos com equalização de juros, subsídios diretos aos agricultores – rebates – e pagamento de spread e taxas bancárias efetuadas pelo Tesouro Nacional, a cada ano, referem-se aos financiamentos realizados no ano em questão e ao carregamento de créditos de anos anteriores, seja de investimento - que podem durar até oito anos - seja de custeio - que podem durar até dois anos em operações normais, ou mais quando de créditos renegociados). Apesar de todos os custos aos cofres públicos, o Governo não consegue fazer chegar a seus destinatários os recursos, mesmo quando “equalizados ”, isto é, mesmo quando o Tesouro garante pagar a diferença entre os juros cobrados do agricultor e os juros cobrados pelo FAT. Nas safras de 1999/00 a 2001/02, pouco mais da metade dos recursos disponibilizados chegaram aos agricultores em virtude basicamente do bloqueio que o sistema bancário opôs ao alargamento da base social do PRONAF. Esta dificuldade é ampliada pelo tipo de fonte dos recursos disponibilizados ao Pronaf. Quanto se trata de recursos cujas fontes são o Tesouro Nacional, o FAT, os recursos próprios dos bancos cooperativos ou as exigibilidades bancárias, mais de 2/3 dos recursos disponibilizados são efetivamente emprestados aos agricultores. Quando se trata de recursos dos Fundos Constitucionais, que representa a segunda maior fonte para o Pronaf, com mais de R$ 1,5 bilhão disponibilizados, o percentual dos recursos aplicados fica abaixo dos 12%. O caráter estatal do Banco do Brasil não atenua em nada os problemas levantados nesta dupla crítica. Hoje fica evidente que a intermediação bancária ergue-se como um dos mais importantes pontos de estrangulamento no avanço do PRONAF. As inovações institucionais que permitiram o crescimento do Programa até aqui vêm revelando um custo e um conjunto de dificuldades com os quais nem o Governo nem os movimentos sociais ligados à agricultura familiar estão dispostos a arcar. É importante assinalar que as inovações institucionais até aqui desenvolvidas referem-se muito mais ao ambiente em que o Programa desenvolveu-se (e que propiciou a pressão social sobre os bancos) que a transformações administrativas e organizacionais no próprio sistema bancário. É


verdade que o Banco do Brasil criou o “Rural Rápido ” (5) e o Banco do Nordeste do Brasil consagrou esforços à formação de monitores de crédito. Mas estas mudanças foram tímidas e pouco contribuíram para uma efetiva redução dos custos de transação bancária. Por outro lado, o trabalho de formação dos monitores do BNB não parece ter sido suficiente para ampliar a participação das regiões por ele atingidas na tomada de empréstimos do PRONAF. Neste contexto, tanto os movimentos sociais como os responsáveis pelo PRONAF convergem no sentido de buscar alternativas. Esta convergência não é trivial, pois representa um movimento de cogestão da política pública entre atores sociais cujas posições partidárias são, em geral, opostas. Apesar de sua posição francamente oposicionista, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) e a Frente Sul da Agricultura Familiar (ligada à Central Única dos Trabalhadores) atuam de maneira integrada aos principais responsáveis pelo PRONAF, tanto quando se trata de denunciar os obstáculos que o sistema bancário impõe ao avanço do Programa, como nas iniciativas de construir alternativas organizacionais que ampliem o acesso ao crédito. E é neste sentido que a experiência do Sistema Cresol ultrapassa o âmbito localizado em que foi inicialmente criada. Antes de examiná-la, entretanto, convém estudar alguns de seus pressupostos gerais de funcionamento.

3 A construção social da confiança O balanço das experiências de financiamento à agricultura nos países em desenvolvimento deu lugar a uma vasta literatura que vem procurando compreender as razões pelas quais os grandes sistemas creditícios estatais levaram, com tanta freqüência, a situações crônicas de insolvência, bem como a uma imensa dificuldade de se atingir o público visado pelos programas governamentais (Lapenu e Wampfler, 1997). A abordagem mais fecunda, a partir de meados dos anos 1980, coloca ênfase no funcionamento imperfeito dos mercados de crédito (Hoff, Braverman e Stiglitz, 1993). Na origem de qualquer atividade de empréstimo existe potencialmente uma assimetria de informação entre devedor e credor que leva necessariamente a instituição financeira a avaliar o risco de cada operação. O caráter assimétrico e a conseqüente imperfeição da informação obtida traduzem-se no custo do próprio empréstimo. O que está em jogo é, de um lado, o que os

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Trata-se de uma espécie de “cheque especial ” destinado ao custeio agropecuário. Mas há indicações (Ministério do Trabalho, 1999, Abramovay e Veiga, 1999) de que seu acesso é restrito aos clientes dos bancos, ou seja, à camada mais abastada entre os agricultores familiares.


economistas chamam de seleção adversa (a incerteza sobre a viabilidade do projeto) e de outro o que vêm denominando como moral hazard (a incerteza a respeito da disposição a pagar – mais até que sobre a capacidade de pagamento – do tomador de empréstimo). Aos importantes avanços na ciência econômica em torno do tema da confiança (6) vêm acrescentar-se, mais recentemente, contribuições sociológicas importantes (7) e que podem ser resumidas em dois conceitos básicos. Por um lado Coleman (1990) contesta o mito de que – para usar a célebre expressão de Margareth Thatcher – “não existe esta coisa chamada sociedade, o que existe são indivíduos ”, construindo a noção de capital social (8): os indivíduos não agem independentemente uns dos outros, seus objetivos não são estabelecidos de maneira isolada e seu comportamento nem sempre é estritamente egoísta. Neste sentido, as estruturas sociais devem ser vistas como recursos, como um ativo de capital de que os indivíduos podem dispor (Abramovay, 2000). O interesse da posição de Coleman é que mesmo o individualismo metodológico mais ortodoxo não pode prescindir do estudo das estruturas sociais para compreender a conduta dos atores. Ao mesmo tempo a sociologia econômica tem contribuído a mostrar que a economia não é uma esfera autônoma da vida social, que ela se encontra, na verdade, incrustada (embedded) num conjunto de relações que compõem redes sociais determinantes da conduta dos indivíduos e das organizações (9). É exatamente esta confluência entre economia e sociologia que permitiu a Michel Ferrary expor dois métodos de avaliação dos empréstimos bancários. Um instrumental, baseado em critérios objetivos e impessoais. O outro privilegia “uma avaliação social em que a percepção subjetiva do tomador de empréstimo pelo avaliador e a detenção de informações específicas adquiridas por meio de redes sociais serão determinantes na decisão de atribuição de empréstimos ” (Ferrary, 1999:560). As redes sociais têm a possibilidade de reduzir o problema básico detectado pelos teóricos da “economia da informação ”: a possibilidade de comportamentos oportunistas por parte

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Ver especialmente os trabalhos de Keneth Arrow (1974). Uma síntese das abordagens sociológicas da institucionalização da confiança é oferecida por Smelser, 1995:22-27. Smelser mostra que confiança não pode ser estudada apenas sob o ângulo psicológico e individual: ela possui qualidade sistêmica que não se reduz a atributos pessoais. 8 Putnam (1993/1996) mostra também como a confiança acumulada sob a forma de capital social é decisiva no sucesso das operações de crédito entre populações rurais desprovidas de condições de oferecer contrapartidas e garantias ao sistema bancário. 9 O mais completo exemplo desta maneira de se estudar a economia está no manual organizado por Smelser e Swedberg (1994). Alguns estudos sobre as redes de funcionamento do sistema creditício podem ser encontrados em Zelizer (1998) e Abolafia (1998). 7


dos agentes (moral hazard) e de má seleção entre os tomadores de crédito (adverse selection). Ferrary (1999:567-568) mostra que a “circulação de informação ligada à densidade das relações sociais permite reduzir o moral hazard quando as trocas econômicas são realizadas entre os membros da comunidade. Existe uma coerção social que se exerce entre os membros da mesma rede que limita os comportamentos oportunistas ”. O caráter localizado e a intencional limitação de tamanho das cooperativas (10) permitem, em princípio, que as redes sociais que a constituem abram o caminho para uma significativa redução dos custos de transação bancária, explicando assim o paradoxo de elas serem economicamente mais viáveis (e, ao que tudo indica, mais rentáveis) que os sistemas convencionais, quando se trata de atingir este tipo de público. As cooperativas não são as únicas – e, internacionalmente, nem mesmo as mais importantes – formas de organização do microcrédito. O levantamento feito por Lapenu e Wampfler (1997:9195) distingue três modelos. a) O modelo mutualista apoia-se em mobilização prévia da poupança, na distribuição dos créditos a partir da poupança coletada, na propriedade dos participantes de cotas do empreendimento em questão, e na organização da estrutura a partir de indivíduos eleitos pelos sócios. Uma variante deste modelo são as “caisses villageoises ” (caixas do povoado) de poupança e crédito autogeridas que têm completa autonomia no plano local. Estas caixas podem ser refinanciadas por instituições nacionais. A este modelo vem-se acrescentar inúmeras formas de aval solidário estudadas pelo CIRAD, sobretudo na África do Oeste (Wampfler, 1999; Nguyen et al. 1999). Alguns sistemas mutualistas são centralizados, o que acaba por drenar a poupança rural para fora de suas regiões de origem. b) A mais conhecida organização de microcrédito hoje é o Grameen Bank. Ele faz pequenos empréstimos a indivíduos organizados em grupos; os tomadores não oferecem garantias nem contrapartidas: o reembolso é garantido pelo aval do grupo e pela possibilidade de obter empréstimos futuros; os empréstimos são reembolsados regularmente em pequenas parcelas no prazo de um ano; os empréstimos são em dinheiro e não visam uma atividade específica; a organização dos grupos é lenta e o montante dos empréstimos cresce também lentamente; os procedimentos de empréstimos são muito simples; entre os funcionários que concedem os empréstimos e os clientes existe uma grande proximidade social (Lapenu e Wamplfer,

10 Em princípio, uma cooperativa do sistema Cresol deve subdividir-se quando atua em mais de um município e atinge cerca de 600 associados (Bittencourt, 2000B).


1997:92). Uma característica importante do Grammeen Bank é a boa remuneração recebida por seu corpo técnico. Segundo Yaron (1997) e Meyer (2000) esta é uma condição decisiva para o sucesso destas iniciativas. c) Existem sistemas bancários estatais que conseguiram reduzir os altos custos de transação bancária e atingir um público desprovido de garantias e contrapartidas. Os Village Banks do Bank Rakyat Indonesia (BRI) são o exemplo mais citado na literatura (Yaron et al., 1997: 117; Lapenu e Wampfler, 1997:92). Sua constituição exigiu a formação de uma unidade voltada ao público rural de baixa renda e em relação direta com a presidência da organização. O Banco formou uma rede nacional de pequenos bancos do povoado (village banks) e atingiu seu público eliminando os subsídios e cobrando juros e taxas administrativas compatíveis com os custos de sua operação (Yaron et al., 1997:119 e 120). Na África do Oeste, os bancos do Burkina Fasso e do Mali também tiveram um bom desempenho graças a sua estreita ligação com os produtores de algodão e a uma boa gestão. Lapenu e Wampfler (1997) citam ainda, na América Latina, a experiência do Bancosol na Bolívia, uma das poucas em que um banco comercial privado visa especificamente microempreendedores. Nasceu de um programa com finalidades não lucrativas. É claro que estas três modalidades não esgotam todo o universo do financiamento às atividades econômicas no meio rural. Tampouco são necessariamente incompatíveis entre si. O que todos parecem ter em comum é a proximidade social entre os atores como base da garantia das operações de crédito. Além disso, se em alguns casos os sistemas creditícios são totalmente informais, em muitos eles são rigorosamente controlados pelas autoridades monetárias. No caso do Sistema Cresol, além de seguir as normas do Banco Central quanto a sua constituição e funcionamento, as cooperativas vinculam-se ao Banco do Brasil, que lhes repassa o crédito do PRONAF e responde pela própria confecção dos cheques utilizados pelos associados, e com o BNDES, o qual repassa ao Sistema Cresol recursos para crédito de investimento, distribuídos em diversas linhas de financiamento. Vejamos o funcionamento do Sistema Cresol com mais detalhes.


4 O Sistema Cresol de Cooperativas de Crédito Rural 4.1 Origem, estrutura e quadro social O Sistema Cresol surgiu como desdobramento dos fundos rotativos, criados a partir de 1988 para atender os agricultores familiares e assentados das regiões Sudoeste e Centro-Oeste do Paraná, administrados por diversas entidades populares e, em geral com recursos oriundos de entidades internacionais de apoio a Organizações Não Governamentais. Estes fundos de crédito rotativos já eram frutos da organização dos agricultores contra os cortes e o intenso processo de seletividade e exclusão do sistema de crédito rural brasileiro, ocorrido na primeira metade da década de oitenta. Mas, na grande maioria dos casos, os fundos não foram propriamente rotativos e o reembolso dos empréstimos era quase inexistente. Apesar disso, a experiência com os fundos rotativos foi importante exatamente para que as lideranças do Sudoeste e do Centro-Oeste do Paraná pudessem propor uma estrutura organizacional mais propícia a um sistema economicamente sustentável (Bittencourt, 2000A). No início dos anos noventa, com o surgimento de programas oficiais de financiamento para a agricultura familiar (Provap em 1994 e Pronaf em 1995), resultantes do movimento “Grito da Terra Brasil ”, as propostas do cooperativismo de crédito tiveram um novo impulso. Apesar da conquista dos programas, os recursos de crédito ainda chegavam com dificuldade até os agricultores, devido aos entraves burocráticos, operacionais e técnicos dos bancos (Bittencourt, 1999). A existência de fundos públicos voltados especificamente à agricultura familiar reforçava a necessidade de organização de um sistema confiável aos olhos de seus participantes, mas que pudesse manter relações estáveis com as próprias agências responsáveis pelas políticas públicas. Em junho de 1995 foi criada a primeira Cresol, sendo criado logo em seguida mais quatro cooperativas. A constituição das cinco primeiras cooperativas garantiu as condições para a criação da Cooperativa Central Base de Serviços Cresol (Cresol-Baser), como forma apoiar o Sistema, sobretudo nas áreas de software, normatização, contabilidade, formação e na interlocução com os bancos, governos e demais entidades dos agricultores. Esta central teve um papel fundamental, pois concentrou os esforços para garantir o funcionamento das cooperativas de crédito, que naquele momento careciam de informações básicas sobre o funcionamento e a gestão das cooperativas. Com isso padroniza-se a informação básica e as técnicas de controle sobre as quais se apóia o funcionamento do Sistema, o que é a condição básica para que ele se universalize (Cresol-Baser/Deser/Apaco, 1998).


De apenas 920 associados em junho de 1996, o Sistema Cresol conta em setembro de 2002 com 27.000 membros, distribuídos em 60 cooperativas de crédito rural singulares, sendo 36 no Paraná (regiões Sudoeste, Centro-Oeste, Oeste, Metropolitana de Curitiba), 13 em Santa Catarina (Oeste, Extremo Oeste e Planalto) e 11 no Rio Grande do Sul (Alto Uruguai), atuando em cerca de 181 municípios da Região Sul. Existem outras 11 cooperativas já constituídas: seis em Santa Catarina, três no Rio Grande do Sul e duas no Paraná, esperando apenas a autorização do Banco Central para iniciar o seu funcionamento. Além das cooperativas singulares, conta com uma Cooperativa Central de Crédito, situada em Francisco Beltrão e seis Bases Regionais de Serviços (Francisco Beltrão, Guarapuava e Cascavel no Paraná, Chapecó e Curitibanos em Santa Catarina e Erechim no Rio Grande do Sul). Existem ainda quatro núcleos microrregionais de serviços no Paraná. Em termos de volume de recursos financiados, para a safra 2001/02 a estimativa é emprestar cerca de R$ 120 milhões em todo o Sistema Cresol. Deste total, deverão ser financiados através de recursos oficiais de crédito um volume de R$ 49,9 milhões, sendo R$ 36 milhões em Pronaf Custeio para os grupos “C ” e “D ” via prestação de serviços para o Banco do Brasil e R$ 19,9 milhões em créditos de investimento, via BNDES (R$ 7,9 milhões), BRDE (R$ 4,1 milhões) e Banco do Brasil (R$ 1,9 milhões), distribuídos no Pronaf Investimento “C ”, “D ” e Agregar, Prosolo e Pro-leite. Os recursos próprios deverão garantir os outros R$ 70,1 milhões em empréstimos, sendo R$ 28 milhões em empréstimos pessoais e R$ 42,1 milhões em empréstimos rurais. Foi considerado que na carteira de recursos próprios, com financiamentos de curto prazo, o mesmo recurso é emprestado mais de uma vez no mesmo ano, garantindo um volume de empréstimos superior ao total de recursos disponíveis em um determinado momento. A carteira de créditos de investimentos “em ser ” (vigentes) dos financiamentos do Pronaf, Proger, Prosolo e Pro-leite liberados em anos anteriores é de R$ 12,1 milhões. As cooperativas de crédito filiadas ao Sistema Cresol possuem uma administração autônoma, composta por uma diretoria eleita em assembléia geral, com mandato de três anos. A fiscalização é realizada por um conselho fiscal da cooperativa eleito anualmente e pela Cresol-Baser, que, além do acompanhamento diário da contabilidade das cooperativas, realiza auditorias semestrais nas suas filiadas. A Cresol-Baser, a partir da análise da contabilidade e das auditorias, apresenta sugestões administrativas e operacionais para as cooperativas filiadas, às quais cabem as decisões sobre sua implementação (Bittencourt, 2000A).


As cooperativas de crédito singulares têm sua área de atuação restrita a um pequeno número de municípios (1 a 5). Aquelas que atuam em mais de um município possuem uma sede situada normalmente no maior município de atuação, e postos de atendimento cooperativo nos demais. As cooperativas singulares têm um ou dois diretores remunerados e mais um ou dois funcionários. Algumas ainda contam com um técnico de campo. Alguns destes funcionários são cedidos pelo estabelecimento de parcerias locais. As cooperativas de crédito participantes do Sistema Cresol têm a intenção explícita de atingir apenas os agricultores em cujos estabelecimentos a propriedade, a gestão e o essencial do trabalho originam-se na família. Trata-se de um sistema com um objetivo social explícito, ligado ao fortalecimento da agricultura familiar. Podem ser associados de uma Cooperativa do Sistema Cresol todos os agricultores familiares acima de 18 anos que explorem, sob qualquer condição, área inferior a quatro módulos rurais, além das pessoas físicas que desempenham funções técnicas voltadas ao meio rural e os funcionários ou colaboradores das cooperativas de crédito. Podem se associar pessoas jurídicas, desde que desenvolvam atividades agropecuárias ou agroindustriais e que sua maior fonte de renda provenha de atividades agropecuárias. Portanto, é permitida a associação de mais de um membro da família, o que ocorre com freqüência, verificando-se a participação do pai, da mãe e do filho no quadro social da cooperativa. A análise do cadastro sócio-econômico (CSE) do Sistema Cresol (Bittencourt, 1999), com base numa amostra de seis de suas cooperativas (2.321 associados) demonstra o perfil de seu quadro social em relação à área disponível e a renda monetária anual da produção agropecuária. Cerca de 75% dos associados possuem área inferior a 20 hectares e apenas 6,6% têm mais de 40 hectares. Tabela 1: Sistema Cresol: Percentual de associados e área média por grupo de área disponível ÁREA DISPONÍVEL Associados Área média por associado (em ha) (%) De 0,0 a 10,0 ha 32,4 7,8 De 10,1 a 20,0 ha 42,3 15,8 De 20,1 a 30,0 ha 12,0 24,7 De 30,1 a 40,0 ha 6,7 35,2 Mais de 40,0 ha 6,6 56,4 TOTAL 100,0 18,3 Fonte: CSE do Sistema Cresol – 1999 apud. Bittencourt, 1999.


A Tabela 2 mostra que quase metade dos associados do Sistema Cresol, tem renda monetária familiar agropecuária líquida pouco superior a um salário mínimo, um forte indicativo de que a base social do cooperativismo atinge um segmento situado num patamar da pirâmide social bem abaixo daquele com que trabalham os bancos. Tabela 2: Sistema Cresol: Percentual de associados por grupo de renda monetária agropecuária anual. ESTRATO DE RENDA ASSOCIADOS MONETÁRIA ANUAL (%) Até R$ 2.000 47,5 De R$ 2.001 a R$ 4.000 18,5 De R$ 4.001 a R$ 6.000 7,4 De R$ 6.001 a R$ 8.000 10,7 De R$ 8.001 a R$ 10.000 5,5 De R$ 10.001 a R$ 12.000 5,3 Mais de R$ 12.000 5,1 Total 100,0 Fonte: CSE – Sistema Cresol – 1999 apud. Bittencourt, 1999. Mesmo atingindo ainda parcela muito minoritária dos agricultores do Sul do Brasil, o Sistema Cresol conseguiu agregar agricultores em torno, ao mesmo tempo, de redes informais e de um conjunto de regras administrativas próprias ao que Max Weber chamaria de racionalidade burocrática e que permitem que o Sistema extrapole o âmbito local em que foi criado e possa aparecer como alternativa real de política pública.

4.2 Empréstimos, garantias, taxas e custos Existe um desejo explícito da direção do Sistema em trabalhar com uma política pautada no controle social do crédito. Quando um agricultor solicita a entrada na cooperativa ele deve ser indicado por algum cooperado de sua comunidade. Depois disso, ele é obrigado a participar de um processo de capacitação, onde são apresentados os seus direitos e deveres de associado, bem como a forma de funcionamento da cooperativa. Tendo cumprido estes requisitos, o próximo passo é a análise da documentação básica – fazendo-se consultas ao SPC, SERASA ou CADIM – e seu encaminhamento ao Conselho Administrativo que, por sua vez, dá o aval final. Tendo a aprovação do Conselho, o agricultor deve depositar, no mínimo, a quantidade de cotas definida estatutariamente equivalente a 10 sacas de milho. Por fim, é feito o cadastro sócio-econômico do agricultor. A partir do momento em que o cliente é aceito na cooperativa, ele está apto a tomar qualquer tipo de empréstimo ofertado pela mesma.


Pelas regras atuais do Sistema Cresol, os associados podem tomar emprestado, considerando a soma de todas as linhas de financiamento disponíveis pelas cooperativas, seja de recursos próprios ou de repasses, até 12 vezes o valor de suas quotas-partes integralizadas. Para um associado que integralizou R$ 150,00, o valor máximo que pode ser financiado, somando todos os tipos de financiamento, é de R$ 1.800,00. Para emprestar R$ 10.000,00 são necessários R$ 833,00 integralizados. Este percentual de endividamento por associado vem caindo nos últimos anos. No princípio era de 25%, caindo posteriormente para 20% e depois para 15%, sendo fixado agora em 12% (Cresol-Baser, 1999). Esta redução do nível de endividamento é fruto da experiência adquirida pelo próprio Sistema ao longo desses cinco anos, demonstrando em termos gerais os limites aceitáveis de endividamento dos agricultores familiares. Existe um verdadeiro aprendizado financeiro que em nada difere dos processos de mudança tecnológica caracterizados pelo aprendizado na prática (learning by doing): o importante é o caráter evolutivo deste aprendizado que não existe antes que se estabeleçam as relações sociais das quais ele emerge (11). As cooperativas possuem mecanismos distintos de garantia de empréstimos. A confiança estabelecida é reconhecida pela idoneidade e pelos costumes de quem está pretendendo tomar o crédito. Este mecanismo é um importante aliado na concessão de alguns tipos de crédito. No caso dos repasses do Pronaf, o aval solidário, em grupos de aproximadamente 5 agricultores, passou a ser um instrumento bastante eficaz. Esta prática iniciou-se como obrigatoriedade para operações com o Pronaf Investimento do grupo “C ” (12). A direção do Sistema vem estimulando a ampliação deste mecanismo com o objetivo de aumentar o controle social sobre o crédito, restabelecendo o processo de capilarização do tecido social. A cooperativa singular com sua estrutura é independente para definir esse processo. Algumas estabelecem o controle social através de entidades parceiras. De uma forma geral, para o Pronaf Custeio “D ” normalmente exige-se o penhor da safra e/ou um avalista. Quando o crédito é grupal, basta o aval solidário do grupo. Para o Pronaf Investimento exige-se o aval solidário no caso do Pronaf “C ”, e o penhor do

11 O tema é central na sociologia econômica e nas correntes evolucionistas da economia. Ver em particular Nelson, 1994 e Sabel, (1994). 12 A segmentação do público atendido pelo PRONAF foi uma das mais importantes conquistas dos movimentos sociais. No início, só se definia o agricultor familiar de uma forma geral e é claro que os bancos tendiam a atender, entre estes, os de maior renda. Exatamente por isso, os movimentos sociais conseguiram introduzir no conjunto da política pública a obrigatoriedade de que todos os agentes do sistema (desde o FAT e o Tesouro, até a agência local do Banco do Brasil) segmentem os agricultores familiares, de tal maneira que os recursos e os subsídios tenham seu alvo melhor definido. “A ” são os assentados – incorporados ao programa desde 1999, “B ” são agricultores com renda agropecuária bruta anual de até R$ 1.500. “C ” são aqueles cuja renda bruta anual vai até R$ 8.000 e “D ” têm renda até R$ 27.500. No caso de integrados, produtores de leite e hortigranjeiros, admite-se o dobro das rendas mencionadas como limite para pertencer ao respectivo grupo.


bem financiado e/ou aval de terceiros para os demais casos. Não é exigido hipoteca de imóveis para os financiamentos. Para o crédito pessoal, os financiamentos de pequeno valor são lastreados pelas próprias quotaspartes do associado. Para empréstimos de valor mais elevado são exigidos avalistas. As cooperativas do Sistema Cresol não cobram taxas extras (além dos juros) de seus associados para o uso de contas correntes, fornecimento de talão de cheques, depósitos cooperativos ou empréstimos pessoais. A única taxa cobrada por estes serviços ocorre quando um associado emite cheque com valor inferior a R$ 20,00, caso em que é cobrado R$ 0,50 por folha. Além deste custo seletivo, os agricultores também pagam CPMF sobre a movimentação de sua conta na cooperativa. Em relação à inadimplência dos financiamentos nas cooperativas do Sistema Cresol, é preciso analisar três aspectos. O primeiro é o nível de inadimplência presente nas cooperativas, separando-a por modalidade de financiamento. O segundo refere-se aos mecanismos de cobrança e o percentual de retorno das provisões realizadas. Por fim, quais são ou foram os motivos da inadimplência e o que o Sistema está fazendo para reduzi-la. As taxas de inadimplências no Sistema Cresol variam de acordo com a modalidade de crédito. Para os recursos próprios das cooperativas, as taxas giram em torno de 6,5% para o cheque especial, 4,2% para o crédito pessoal (CAC) e 2,9% para o Crédito Rural com recursos Próprios, (CRP), considerando os dados de setembro de 2002. Entre os financiamentos originários de recursos oficiais de crédito, a taxa de inadimplência na data de vencimento dos contratos é de 5,0%, mas 4,0 a 4,5% acabam sendo renegociados, o que significa uma inadimplência de apenas 0,5 a 1,0%. As taxas de inadimplência nos créditos pessoais e rurais variam muito entre as cooperativas pertencentes ao Sistema, conforme será detalhado no final deste item. O cooperado que não honra seus compromissos e nem está disposto a honrar, está automaticamente impedido de pleitear outro financiamento. Aqueles que quitam suas dívidas dentro dos prazos estabelecidos poderão pleitear, sem burocracia, financiamentos com recursos próprios da cooperativa e no caso dos recursos oficiais do Pronaf, terão prioridade na liberação dos mesmos na safra seguinte. O princípio básico de cobrança em caso do não pagamento é negociar até onde for possível. A renegociação é uma prática utilizada considerando sobretudo a situação do cooperado. A prática de exigir um avalista para alguns financiamentos também contribui para uma melhor e mais


efetiva cobrança. Existem casos onde o avalista é que salda a dívida, cabendo a ele a cobrança do agricultor que ele avalizou. Os créditos grupais com aval solidário têm surtido efeito altamente positivo e educativo para o quadro social. Nestes casos, quando um membro do grupo não quita sua dívida, ela é assumida pelo restante do grupo. Este processo cria um controle social do grupo sobre o conjunto de seus membros e sobre a própria cooperativa. Na safra 2001/02 houve uma média de 5 casos por cooperativa onde um dos membros do grupo de aval solidário não pagou sua parte no financiamento. A situação mais comum é o grupo criar mecanismos de cobrança do inadimplente (normalmente em produto), eliminando-o do grupo no ano seguinte. Além disso, o grupo controla os seus membros no caso de mudança ou abandono da atividade rural. Quando estes mecanismos não surtem efeito, faz-se necessário acionar a cobrança judicial e, por último, nos casos mais complicados, uma empresa de cobrança particular terceirizada busca reaver pelo menos o valor principal. Vale ressaltar que uma porcentagem pequena de contratos demanda cobranças judiciais. Para que as cooperativas não sejam pegas de surpresa em relação à inadimplência, elas precisam fazer provisões dos créditos vencidos e não liquidados. Seguindo normas do Banco Central, a partir de 15 dias de inadimplência de um contrato, a cooperativa provisiona 0,5% do valor financiado. Depois de 30 dias deve provisionar 3%, e a partir daí o percentual provisionado vai aumentando até os seis meses após o vencimento do contrato, quando 100% do valor do financiamento deverá estar provisionado. Em relação às provisões realizadas para os financiamentos, cerca de 20 a 25% são recuperadas, diminuindo assim a taxa de inadimplência real dos financiamentos. Para o crédito com recursos próprios, as taxas reais de inadimplência caem para cerca de 3% no cheque especial, 2,5% no empréstimo pessoal e 1,5% para o CRP, considerando os dados de setembro de 2002. Para diminuir o impacto das inadimplências nos financiamentos com recursos oficiais de crédito, algumas cooperativas criaram uma espécie de fundo de aval. O fundo é controlado pelas próprias cooperativas, que retém de 0 a 2% do valor financiado, dependendo da situação cooperativa. As cooperativas que apresentam taxas de inadimplência destes financiamentos muito baixas, nada recolhem para o fundo. As cooperativas com taxas mais altas de inadimplência recolhem até 2% dos financiamentos para o fundo. Este recurso vai cobrir parte da inadimplência dos associados junto ao Banco, quando o financiamento foi realizado através de repasse de recursos.


As taxas de inadimplência do Sistema Cresol apresentadas anteriormente são uma média do Sistema. Em algumas cooperativas, em especial as primeiras cooperativas criadas, a inadimplência é muito mais alta, concentrada em um pequeno número de tomadores. O principal motivo das altas taxas de inadimplência dessas cooperativas foi à inexperiência inicial, o que reforça a idéia de que os mercados supõem comportamentos e normas construídas de maneira progressiva. Estas cooperativas ainda carregam alguns problemas econômicos e políticos que resultam destes erros iniciais e que somente agora começam a ser superados. Os principais problemas ocorridos nas primeiras cooperativas foram os desvios provocados pelos “gerentes ” contratados, o empréstimo de valores muito altos para alguns associados ou mesmo para dirigentes e técnicos das cooperativas e/ou entidades parceiras, o financiamento de atividades produtivas de alto risco, falta de critérios para a liberação dos financiamentos, fragilidade do software de gestão, falta de capacitação dos contadores e dos conselhos fiscais para a realização de auditorias, além da maior fragilidade administrativa e política da diretoria e dos técnicos da Cresol-Baser. Segundo avaliação da Cresol-Baser, em função da tentativa de superação dos problemas, as taxas de inadimplência de uma forma gerais vêm caindo, devendo ser reduzidas à metade nos próximos dois anos. As ações desenvolvidas neste sentido são o maior controle sobre os financiamentos (divisão de responsabilidades para a liberação de valores mais elevados), melhoria do software de gestão das cooperativas, redução do valor financiado por associado (de 25 vezes o valor da quota-parte para 12), melhor seleção das atividades financiadas (redução do financiamento a atividades de grande risco – trigo e feijão), ampliação dos mecanismos de conhecimento do quadro social, formação mais qualitativa dos conselhos fiscais e dos dirigentes das cooperativas. A presença de assistência técnica deve ser considerada com atenção em relação às taxas de inadimplência e do sucesso dos investimentos realizados pelos agricultores. Os financiamentos que contam com o acompanhamento efetivo de um técnico, não restrito à elaboração do projeto, têm mostrado maiores índices de sucesso, ampliando a renda do agricultor e garantindo, na maioria dos casos, condições efetivas para o pagamento dos empréstimos. As receitas de uma cooperativa do Sistema Cresol são com operações de crédito (juros pagos pelos empréstimos com recursos próprios e de repasse), aplicações dos recursos excedentes no Banco do Brasil, prestação de serviços, recebimento de financiamentos já provisionados (reversões de provisões), e outras receitas gerais.


As despesas das cooperativas são com captação de recursos (juros pagos aos associados pelas suas aplicações na cooperativa), despesas com repasse e prestação de serviços, despesas administrativas (salários, aluguel de salas, telefones, carros, materiais de consumo, diárias dos dirigentes, depreciação, etc.), despesas com o Banco do Brasil (taxas dos serviços de compensação), provisões para créditos de liquidação duvidosa e outras despesas gerais (Bittencourt, 2000A). Embora cada cooperativa tenha um balanço financeiro próprio, com prejuízos ou sobras, foi feito um cálculo geral das cooperativas que compõem o Sistema Cresol em cada ano. Em 1996 o Sistema Cresol teve uma receita de R$ 189 mil para uma despesa de R$ 185 mil. Em 1997, as receitas subiram para R$ 526 mil contra R$ 488 mil de despesas. Em 1998, as despesas superam as receitas, com uma arrecadação de R$ 1,337 milhão e despesas de R$ 1,363 milhão (Bittencourt, 1999). Em 2000, a arrecadação foi de R$ 3,48 milhões e as despesas de R$ 3,5 milhões, representando um prejuízo total de R$ 20 mil em todo o Sistema. Em 2001, as contas fecharam positivamente, com uma receita de R$ 7,714 milhões e despesas de R$ 7,432 milhões, representando uma sobra de R$ 282 mil. A comparação entre receitas e despesas demonstra que as contas estão bem “apertadas ”, mas reflete a política adotada pelo Sistema, que trabalha com uma margem operacional muito pequena, subsidia a criação de novas cooperativas e assume os riscos dos financiamentos de seus associados. Nas cooperativas onde houve prejuízo, ele normalmente está relacionado aos pagamentos realizados pelas cooperativas ao Banco do Brasil dos financiamentos onde os agricultores não quitaram suas dívidas (13). Este prejuízo deverá ser coberto com recursos do

13

Para operacionalizar o Pronaf Custeio, o Banco do Brasil recebia até 2001 do Tesouro 8,48% ao ano sobre o valor financiado a título de spread, além de uma taxa mensal de R$ 13,01 (já foi de R$ 16,40) por contrato, independente do valor financiado. A partir de julho de 2002, a taxa mensal caiu para R$ 8,99 por contrato/mês, mantendo-se o Spread de 8,48% ao ano. É importante assinalar que a partir de 2002, as cooperativas tem recebido do Banco do Brasil para repassar o Pronaf aos agricultores via Repasse ou Prestação de Serviços até 2,5% do valor dos financiamentos, sendo 1,0% ao ano de spread e mais até 1,5% de índice de performance. Caso os créditos fornecidos aos associados por intermédio da cooperativa não tenham 100% de adimplência junto ao Banco do Brasil, este desconta os valores inadimplentes da taxa (índice de performance) atribuída à cooperativa. Na safra 2001/02 este percentual total foi de até 3% aa, reduzindo na mesma proporção da queda da taxa recebida pelo Banco do Brasil. Nas safras 1999/00 e 2000/01, este percentual foi de 1,5% aa, sendo que na safra 96/97 não receberam nada, na safra 97/98 receberam 0,5% e na safra 98/99 este percentual subiu para 1%. Em relação às taxas mensais pagas pelo Tesouro ao Banco do Brasil a título de custo administrativo, este não repassa nada para as cooperativas, apesar dessas assumirem todo o trabalho e o risco das operações do Pronaf (Bittencourt, 2000B). Esta pequena taxa (até 2,5% aa) recebida pelas cooperativas é insuficiente para cobrir seus custos. Convém sublinhar que as cooperativas estimam que com metade do que o Banco do Brasil recebe a título de custo administrativo, elas poderiam operar o PRONAF e, em muitos casos, ainda pagar com estes recursos algum tipo de assistência técnica aos agricultores, como será visto logo adiante.


fundo de reserva (aval) criado por algumas cooperativas para este fim, o que deverá equilibrar as contas das cooperativas que estão no vermelho. O custo operacional das cooperativas varia muito de acordo com cada cooperativa e com as taxas de inadimplência. Quanto menores são estas taxas, menores são os custos. De uma forma geral, o custo operacional médio das cooperativas, que engloba a máquina administrativa, as despesas com a Central e com o software de gestão, as provisões e as despesas de captação, gira em torno R$ 200,00 ao ano por associado. Este custo varia de R$ 100,00 a R$ 300,00 sócio/ano dependendo da cooperativa. A cooperativa singular considerada como modelo ideal pela CresolBaser tem um custo de R$ 168,00 por associado/ano, ou R$ 14,00 por sócio/mês. Em função dos custos operacionais com talão de cheques, estima-se que sua eliminação diminuiria os custos das cooperativas de R$ 200,00 para R$ 150,00/ano por associado, embora também reduzisse as receitas com esta operação (cheque especial) e, provavelmente, os próprios depósitos. Computando os custos só para repassar o Pronaf, estima-se que este cai para cerca de R$ 10,00 ao mês por contrato. Entretanto, este custo fica em R$ 10,00 em função da cooperativa poder contar com outras formas de captar e prestar serviços. Caso tivesse a necessidade de montar toda uma estrutura específica para repassar o Pronaf, certamente o custo aumentaria. Com um custo para o Sistema Cresol operacionalizar o Pronaf em média R$ 10,00 por contrato ao mês para contratos médios de R$ 1.800,00 por agricultor, recebendo apenas 6,5% a título de spread o Sistema Cresol poderia cobrir os custos administrativos e operacionais para trabalhar com esta linha de financiamento, estando incluso as possíveis inadimplências. Convém lembrar que o Banco do Brasil recebe ao menos o dobro deste montante em sua operação de PRONAF, com resultados insatisfatórios tanto para o Governo como para os movimentos sociais ligados à agricultura familiar. Em suma, pode-se dizer que o caráter localizado e a intencional limitação de tamanho das cooperativas permitem, em princípio, que as redes sociais que a constituem abram o caminho para uma significativa redução dos custos de transação bancária, explicando assim o paradoxo delas serem economicamente mais viáveis que os sistemas convencionais, quando se trata de atingir este tipo de público. Ao mesmo tempo, elas funcionam a partir de um conjunto de controles externos, objeto de administração financeira padronizada que indicam claramente o potencial de expansão e universalização do Sistema.


Conclusões As cooperativas de crédito reduzem os custos de transação bancária graças a seu sistema de controle realizado por meio de redes sociais de interconhecimento. Os métodos de avaliação de risco bancário por parte das cooperativas de crédito são mais baratos e mais eficientes que os do sistema bancário convencional. As cooperativas contam com garantias e contrapartidas na concessão de empréstimos. Mas poucas vezes estas garantias são acionadas, valendo mais, no reembolso dos financiamentos, a pressão social localizada. O estudo do Sistema Cresol corroborou assim a principal hipótese em que se apoiou o desenvolvimento desta pesquisa. Embora tenha nascido de um fundo rotativo, hoje o Sistema Cresol tornou-se não só um importante interlocutor, mas um potencial ator decisivo da política de crédito rural no quadro do PRONAF. Estes recursos são subsidiados para os agricultores, mas o Sistema Cresol depende parcialmente destes subsídios para sua reprodução e desenvolvimento. É um movimento até certo ponto paradoxal: por um lado, a operacionalização do Programa é inviável financeiramente, já que as cooperativas não recebem sequer o suficiente para cobrir seus custos na operação do programa, ainda que estes custos correspondam à metade do que é destinado hoje ao Banco do Brasil para fazê-lo de maneira claramente insatisfatória; por outro, porém, trabalhar com o Pronaf é o "chamariz" para ampliar o quadro social das cooperativas. Desta forma, estabelece-se uma sustentabilidade indireta: o Pronaf por si só não é vantajoso para as cooperativas, mas sem ele, as cooperativas correm sério risco de diminuir drasticamente seu quadro social a ponto de inviabilizar seu funcionamento. As cooperativas atingem um público que não tinha anteriormente acesso ao sistema bancário. Mas elas não chegam a beneficiar com seus empréstimos os segmentos mais pobres da população vivendo no meio rural pelo fato de não terem produtos a oferecer a este público, enquadrado no que é considerado Pronaf "B". Um dos maiores desafios apontados é capilarizar a atuação a ponto de chegar a este público. O Sistema Cresol preocupa-se hoje com um duplo trabalho de formação. Por um lado, os quadros que poderão exercer funções administrativas e dirigentes no interior do Sistema; por outro, e mais importante, o Sistema Cresol identifica como um de seus desafios cruciais, a associação entre o crédito agropecuário e um sistema de assistência técnica capaz de conduzir os agricultores a formas produtivas mais sustentáveis tanto ambientalmente como para a geração de renda. Observa-se que algumas cooperativas que investiram em assistência técnica tiveram menores taxas de inadimplência.


O Sistema Cresol oferece a demonstração prática de que é possível construir uma organização financeira que, sustentada pela coesão de uma rede local de interconhecimentos, possua, ao mesmo tempo, formas de obtenção de recursos, controle de procedimentos e prestação de contas que permita sua universalização. É claro que a história das regiões do Sul do Brasil cujo povoamento apoiou-se em certa democratização do acesso a terra e no ambicioso trabalho social da Igreja Católica contribui para gerar massa crítica, competências, valores, utopias e projetos que abrem o caminho para iniciativas inovadoras. Ali onde estas características não existem, os passos no sentido de um sistema descentralizado de crédito serão certamente mais lentos e mais tímidos. Mas é importante reconhecer que a iniciativa organizada de construir formas associativas para a obtenção de crédito contribuiu para alertar o ambiente institucional dessas regiões, onde muitos agricultores familiares não passavam sequer pela porta do sistema bancário. Por maiores que sejam as particularidades regionais em que se insere o Sistema Cresol, a sua maior lição é que ela aponta para a possibilidade geral de fazer com que o crédito seja um meio à disposição da política de desenvolvimento e não um instrumento para reforçar o poder tradicional do sistema bancário.


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