O JORNALISMO NO RÁDIO CURITIBANO Luiz Witiuk1
Universidade Positivo
Resumo O Paraná figura entre os estados pioneiros no surgimento da radiodifusão brasileira e Curitiba é uma cidade que se destaca nesse pioneirismo. Valorizando o rádio e sua história, pretende-se analisar o radiojornalismo praticado em Curitiba no período recente. Para tanto, a pesquisa de campo aponta as emissoras com programas jornalísticos, identifica a qualidade da inserção do jornalismo no rádio curitibano, sua estrutura, formatos de programas informativos, formas de produção, linguagem e seus conteúdos.A base bibliográfica para discutir as teorias do jornalismo, suas estratégias enunciativas e significados, tem como referência Traquina, Pena, Motta, White e outros. O referencial relativo ao radiojornalismo tem como autores principais Balsebre, Meditsch, Brecht, Salomão e Barbosa Filho. Palavras-chave: Rádio; Jornalismo; Linguagem; Curitiba
Abstract Paraná is among the pioneering Brazilian states in broadcasting. Its capital, Curitiba, is the prominence city in this history. This article analyzes the most recent years of radio-journalism in Curitiba. The field research aims the broadcasting stations with journalistic programs, identifies the quality of the journalism practiced in the local stations, its structure, formats, means of production, language and its contents. The article appoints the profile of Curitiba´s radio journalism. To help the analysis of the data collected, the bibliographical survey covered the works of Traquina, Pena, Motta, White and others. Specifically, the radio-journalism referential uses Balsebre, Meditsch, Brecht, Salomão, Barbosa Filho and others. Key words: Radio; Journalism; Language; Curitiba
1 Mestre na área de Comunicação e professor de Radiojornalismo no curso de Jornalismo da Universidade Positivo
O JORNALISMO NO RÁDIO CURITIBANO
A revolução tecnológica que resultou nas novas tecnologias colocou o ser humano no centro de um sistema complexo de comunicação e informação, a ponto de ditar uma nova ordem mundial. Essa era da digitalização que envolve a sociedade como um todo nesse turbilhão da informação tem preocupado alguns pensadores quanto às conseqüências possíveis nos processos que podem afetar os modos de pensar, de ensinar e tratar a informação. Felipe Pena observa muito bem essa dependência das tecnologias que envolvem diariamente as pessoas fascinadas pelo mundo da informação e do consumo. Trata-se de um mundo novo e envolvente de comunicação e informação. Mercados financeiros estão conectados em tempo real. Fluxos de capital mudam de pátria em frações de segundo e mesmo um simples acesso à internet já nos coloca como ativos integrantes do estratégico banco de dados do mercado global. Não é exagero, é fato. Seu perfil de consumidor é mapeado diariamente por meio das indicações de seus gostos e preferências registrados pelo clique do seu mouse na web. (PENA, 2005, p. 11).
O jornalismo é, portanto, uma das tantas maneiras de se reportar ao mundo da informação que afeta e orienta a vida social como um todo. O jornalismo é a realidade, com acontecimentos e personagens por ela afetados; e a teoria do jornalismo, de certa maneira, com seus múltiplos olhares interpretativos, busca compreender as razões pelas quais a notícia – o relato da realidade – possui um determinado enfoque enquanto produção e quais os efeitos, enquanto notícia, no destinatário final. Na discussão acadêmica sobre a função do jornalismo como produtor de conhecimento existem várias interpretações muito bem resumidas por Meditsch (2002) e que vão desde a visão de que o jornalismo não produz conhecimento válido por não ser ciência e nem possuir o rigor do método científico; passa por Robert Park, que admite no jornalismo aquilo que ele tem de diferente como forma de conhecimento da realidade; e, finalmente, reforça um aspecto seu e que não bate de frente com a ciência: o jornalismo simplesmente revela a realidade de forma diferente e todas as formas em disponibilidade para conhecer e “re-conhecer” o mundo têm o seu valor e, portanto, o jornalismo fica perfeitamente enquadrado nesse novo olhar como modo de conhecimento. O jornalismo é muito peculiar no seu método de produzir conhecimento: não lida com hipótese e nem com sistema teórico como ponto de partida, utiliza apenas a observação da realidade como forma de produção. Não se quer afirmar que o jornalismo seja ciência, pois o seu objetivo não é revelar a essência das coisas. Por outro lado não se pode afirmar definitivamente que o jornalismo não seja uma forma de conhecimento enquanto é capaz de revelar aspectos da realidade que escapam à metodologia das ciências. Esse revelar determinados aspectos da realidade, ou esse dar a conhecer a realidade como função também do jornalismo, envolve uma ampla discussão em torno da notícia e suas formas de produção, ou os critérios que decidem o que é e o que não é notícia. Eles são a chave para se compreender o significado da notícia e o tipo de contribuição para se entender a sociedade.
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Há uma série de variáveis na produção da notícia, teorizadas nas obras de autores, como Mauro Wolf (1987, p.168)2, Nelson Traquina (1993, p. 173)3, Stuart Hall (1993, p. 226)4. Admitem uma intencionalidade por parte do profissional que detém o poder de seleção da notícia, cujo acontecimento, para fazer sentido, precisa ser reconhecido socialmente e culturalmente. Nesse processo é preciso considerar que na construção da notícia os profissionais nem sempre são autônomos e, na busca pelas fontes, incorrem na reprodução da ideologia dominante, considerando também como fator a coerção e o constrangimento, presentes nas instituições que lidam com a informação. Para que o destinatário da notícia possa entender o seu real significado, precisa também conhecer o modo como ela é produzida. É interessante observar também como o fator tempo expõe a transitoriedade e a efemeridade da notícia. Tal observação está diretamente ligada ao seu imediatismo. E aqui, o radiojornalismo, com sua característica primordial de acompanhar os fatos no momento em que estão acontecendo, mostra claramente como o fator tempo age implacavelmente na notícia radiofônica. Schlesinger (1993) lembra que quanto mais imediatas, mais quentes são as notícias, e que para o radiojornalista interessam os acontecimentos do aqui e agora. Amanhã, ou à tarde do mesmo dia, a notícia não mais interessa, torna-se velha. É a efemeridade do rádio presente no momento do fato, para lhe dar significado àquele específico momento. Para explicar os modos de produção da notícia, os autores construíram diversas teorias do jornalismo. Algumas delas serão destacadas no presente artigo e porque se fazem presentes no jornalismo de rádio em Curitiba, embora as teorias como um todo tenham algum reflexo na produção jornalística. A concepção da notícia jornalística como um espelho da realidade está presente enquanto há um grande empenho de se reproduzir o fato com a preocupação da imparcialidade, apesar de contestada, por exemplo, por Felipe Pena (2005, p. 127), que refuta tal teoria por ela não se sustentar na fórmula do absolutamente objetivo. Para ele não há como transmitir o significado direto dos acontecimentos, sem mediação. Traquina afirma que “a teoria do Espelho é uma explicação pobre e insuficiente” (2005, p. 149). Essa teoria está de alguma maneira presente em emissoras como a Rádio Clube Paranaense, Rádio CBN-Curitiba, Rádio Paraná Educativa FM/AM e 2 A noticiabilidade é constituída pelo conjunto de requisitos que se exigem dos acontecimentos (...) para adquirirem a existência pública de notícias. Tudo o que não corresponde a esses requisitos é ‘excluído’, por não ser adequado às rotinas produtivas e aos cânones da cultura profissional (WOLF, 1987, p. 168). 3 A conclusão é que as pessoas com maior autoridade, essas que têm contactos regulares com os profissionais do campo jornalístico, permitindo assim provar a sua credibilidade, são favorecidas no processo de produção de notícias. (TRAQUINA, 1993, p. 173). 4 Este trazer de acontecimentos ao campo dos significados quer dizer, na essência, reportar acontecimentos invulgares e inesperados para os “mapas de significado” que já constituem a base do nosso conhecimento cultural, no qual o mundo social já está “traçado”. (...) Este processo de “tornar um acontecimento inteligível” é um processo social – constituído por um número de práticas jornalísticas específicas, que compreendem suposições cruciais sobre o que é a sociedade e como ela funciona. (HALL et al., 1993, p. 226)..
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Rádio Band News5 – enquanto há também uma preocupação com a imparcialidade e a objetividade. Não é algo absolutamente determinante. Identifica-se também a presença da teoria do gatekeeper na Rádio Clube Paranaense e Rádio Paraná Educativa FM/AM. Esta teoria enfatiza a ação pessoal na seleção de notícias que vão para o ar, examina e disponibiliza as notícias apenas do ponto de vista de quem as produz, com um processo de seleção bastante subjetivo. É uma seleção muito pessoal cujo juízo de valor tem como base a experiência. Na avaliação de White (1993, p. 145), com a teoria do Gatekeeper “começamos a compreender como a comunicação de “notícias” é extremamente subjectiva e dependente de juízos de valor baseados na experiência, atitudes e expectativas do gatekeeper”. A teoria interacionista, presente na Rádio CBN-Curitiba e Band News, está também nas considerações do modo de produção enquanto se constata o fator tempo que pressiona o profissional e obriga a organizar o espaço e o tempo na elaboração do trabalho jornalístico em função das características imprevisíveis dos acontecimentos e a exigência do imediatismo no rádio. Há nessa teoria a interferência predominante dos “definidores primários” na construção da notícia, embora admita a participação, ainda que em desigualdade de oportunidade, de outros agentes sociais, que têm a oportunidade de contestar a situação política vigente e os valores dominantes. Nelson Traquina (2005: 198) deixa claro tal mecanismo do poder e das fontes oficiais (definidores primários) e expõe a dificuldade, por exemplo, dos movimentos sociais em terem acesso aos meios de comunicação quando fala que “os movimentos sociais com poucos recursos têm dificuldades em ver os seus acontecimentos transformados em notícia. Se pretendem jogar no tabuleiro do xadrez jornalístico, precisam ajustar o seu modo de interação organizacional aos modos das organizações estabelecidas”. A produção da notícia quando subordinada a um planejamento tira do jornalista a sua autonomia na busca da notícia, mas o torna participante ativo na construção da notícia. É a teoria construtivista, identificada na Rádio CBN-Curitiba e Band News. Teoria que se ocupa das práticas unificadas de produção. Ela não tem a preocupação primeira de refletir a realidade e, sim, de ajudar a construí-la. Portanto, o jornalismo não é o espelho do real. Como afirma Pena, “é, antes, a construção social de uma suposta realidade. Dessa forma, é no trabalho da enunciação que os jornalistas produzem os discursos, que, submetidos a uma série de operações e pressões sociais, constituem o que o senso comum das redações chama de notícia” (PENA, 2005, p. 128). Nas emissoras analisadas, observa-se que o radiojornalismo em Curitiba não tem, ao menos explicitamente, elementos que liguem a sua produção com a teoria da ação política, ou seja, as notícias a serviço dos interesses políticos. Há o cuidado de se estabelecer o debate político, mas sem a conotação explícita da proteção a interesses nessa área. A exceção fica para a rádio Paraná Educativa FM/AM que, 5 Nesse estudo, fizeram parte do critério de seleção das emissoras citadas, a história da emissora na sua relação com o jornalismo, no caso da rádio Clube Paranaense e CBN Curitiba a tradição jornalística de ambas. A rádio Band News como a novidade recém-instalada, considerada a sua proposta de inovação jornalística. A rádio Paraná Educativa FM pela sua estrutura e seu jornalismo diferenciado com aparente discurso de governo. Ainda foram utilizados os critérios da constatação da existência de departamento de jornalismo, a participação da reportagem ao vivo, o formato jornalístico do programa e sua forma de apresentação, o conteúdo informativo, a linguagem radiojornalística, as formas de produção.
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apesar do esforço em se fazer um jornalismo objetivo e que responda à demanda dos seus ouvintes, contudo não há como deixar de identificar o interesse político governamental, uma certa subordinação na produção da notícia às fontes primárias ligadas ao poder. Admite-se que não há como não divulgar as ações do governo e que seriam do interesse da população, ao mesmo tempo que se busca um jornalismo isento. Se para que o destinatário possa compreender o real significado da notícia é necessário que conheça o modo como ela é produzida, não menos importante se torna o ato de informar que não apenas se submete ao rigor objetivo da descrição dos fatos, ou seja, um jornalismo que apenas transmite. Há que se considerar também a capacidade intelectiva de interpretação dos significados por parte do destinatário da informação. E assim pode-se afirmar que o jornalismo é também uma atividade simbólica, como produtor de sentidos e que implica linguagem que produz significados. Na essência do comunicar-se, o efeito de sentido dos conteúdos noticiosos sugere interpretações e desdobramentos no destinatário. Motta (2004, p. 119) é muito preciso quando examina o ato de informar no meio radiofônico nessa comunicação dinâmica entre o repórter no seu ato de noticiar e o receptor na construção dos significados daquilo que ouve: “Todo ato comunicativo é um processo dinâmico, um jogo dialético de co-criação de sentidos entre um sujeito emissor e um sujeito destinatário”. Portanto, não se trata apenas do ato de informar jornalisticamente; no rádio é fundamental o fato de se estabelecer um ato comunicativo com o destinatário que vai dar significação à informação recebida. Há, portanto, um jogo entre as intenções (do enunciador) e as interpretações do relato informativo por parte do enunciatário. Essa reflexão sobre a produção de sentido do relato jornalístico é significativa por tratar-se aqui do meio rádio, pois mexe com o imaginário e a dimensão dos símbolos que proporcionam ao ouvinte interpretações mais profundas que aquelas da lingüística e da conversação. O rádio, portanto, não é apenas um meio que se presta à transmissão da informação jornalística pura e simples. Ele vai além na sua relação com o público ouvinte. Como queria Brecht (2005, p. 37), o rádio é principalmente um meio de comunicação: “Na minha opinião, vocês deveriam tentar fazer do Rádio uma coisa realmente democrática. (...) Opino, pois, que vocês deveriam aproximar-se mais dos acontecimentos reais com os aparelhos e não se limitar à reprodução ou à informação”. O rádio como meio de comunicação de mão dupla, que fala e que também ouve, ainda não se revelou totalmente democrático como expressão da vida das pessoas, de compartilhar pensamentos e experiências e que permita interferir diretamente naquilo que precisa ser transmitido. Numa análise mais atenta, percebe-se que o rádio em Curitiba e, mais especificamente, o seu radiojornalismo está ainda muito longe da possibilidade de os ouvintes interagirem com o meio como forma de participação direta no rádio informativo. O que se permite é uma interatividade “jornalística” do ouvinte por via indireta, no uso da telefonia e correio eletrônico, como forma de manifestação das suas necessidades de informação.
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Se Brecht lamentava a unidirecionalidade na transmissão radiofônica num prejuízo direto à interatividade do ouvinte, mais recentemente Armand Balsebre, que admite o conceito de rádio como informação e serviço, lamenta o esquecimento e a marginalização a que foi colocado o rádio na sua função cultural e expressiva. Balsebre (2000, p. 13) enfatiza que o uso do rádio com objetivos comerciais desvalorizou a sua função expressiva e estética. Mesmo na sua função de informar, o rádio deveria valorizar uma de suas fortes características que é a sensorialidade, cujo suporte está na voz humana, e que não é apenas a verbalização, mas o conjunto dos diversos sons que compõe a transmissão informativa e que tem a capacidade de realizar o diálogo mental entre o enunciador e enunciatário. Balsebre entra na questão da linguagem radiofônica, reafirmando que ela não se constitui como unicamente verbal, criticando, assim, a importância que se dá ao monólogo verbal no rádio informativo, em detrimento de outras formas expressivas da linguagem radiofônica, como, por exemplo, a música e os efeitos sonoros. Porém, Balsebre reconhece que o imediatismo do rádio informativo ao vivo dificulta a utilização de outros meios expressivos da linguagem radiofônica. O interessante é que Meditsch (1999, p. 121), ao trazer toda essa força expressiva do rádio em Balsebre para o jornalismo, faz uma distinção entre discurso radiofônico e discurso fonográfico. Para Meditsch, no radiojornalismo, a linguagem que se apresenta como uma composição de palavra falada, música, efeitos sonoros e silêncios é um discurso fonográfico. Por sua vez, o discurso radiofônico implica enunciado em tempo real, ou seja, o “ao vivo” que produz um marcante efeito de realidade. Essa característica “ao vivo” do discurso radiofônico no jornalismo, sua simultaneidade com a realidade do fato, para Meditsch não contém elementos da simulação (músicas, efeitos) e nem pode conter. O que se pode buscar, mesmo no radiojornalismo, é um equilíbrio entre os sons verbais (a palavra) e os não-verbais (música e efeitos sonoros) como garantia de um rádio à sua sensorialidade e busca de maior expressividade do meio. Mozahir Salomão (2005) é um dos que defendem essa expressividade dos recursos acústicos também no jornalismo, mantendo o rádio como meio de comunicação e também expressão. “A idéia é que, a partir de um fato noticioso, o jornalista se valeria de distintos recursos sonoros para poder retratar a experiência completa que acompanha a informação. Música, som ambiente e silêncios permitiriam fazer do fato mesmo toda uma experiência para o ouvinte” (SALOMÃO, 2005: 357). Outro autor que defende a utilização de formas expressivas (dramatização, por exemplo) no radiojornalismo sem que se comprometa a verdade do relato é Luiz Alberto Sanz6. Meditsch (2001) mantém sua posição ao dizer que o artista e o jornalista fazem uso diferente do meio rádio. Para o autor, o aspecto expressivo artístico do rádio não se coaduna com um jornalismo que lida com a realidade dos fatos. 6 Luiz Alberto Sanz é jornalista, cineasta e educador. É professor da Universidade Federal Fluminense, membro da Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-graduação em Artes Cênicas; autor de livros, dirigiu a Rádio MEC, chefiou a reportagem da Rádio Jornal do Brasil e a redação do Jornal de Brasília. (http://sucuri.cpd.ufsm.br – Acesso em: 03.maio.2007)
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O radiojornalismo e o rádio-arte estão, portanto, para Meditsch em esferas de diferentes atividades, com objetivos específicos e representam diferentes gêneros do discurso radiofônico. Para André Barbosa Filho (2003, p. 89) os diferentes gêneros radiofônicos seriam o jornalístico, de entretenimento, publicitário, de serviço, entre outros. Enquanto no rádio-arte, por exemplo, cabem os gêneros de entretenimento e publicitário em função de uma determinada expressividade sonora, para Meditsch no gênero jornalístico radiofônico, em função do seu compromisso com a realidade tem como possibilidade apenas o som oralizado, ou seja, a palavra, “os outros sons reais utilizados numa transmissão jornalística terão que ter o seu significado semântico claramente sinalizado, sob pena de serem desconsiderados como meros ‘ruídos na comunicação’” (2001, p. 179). Para os diversos formatos que compõem o gênero jornalístico no rádio, certamente se encontra dificuldade na utilização da força expressiva do rádio combinando com a credibilidade informativa. As rádios jornalísticas de Curitiba manifestam certa preocupação no uso da sonoplastia em seus programas informativos, tanto no que diz respeito à plástica do programa no ar, quanto nas reportagens que são editadas. Se bem que, em alguns formatos do radiojornalismo, o uso da expressividade sonora (sonoplastia, efeitos) possa auxiliar na apreensão do significado daquilo que se comunica. Certamente, por exemplo, em nada comprometeria a credibilidade o uso de efeitos e música num documentário ou numa crônica. Ao contrário, o conteúdo seria reforçado no seu significado. O fato é que o rádio, que é comunicação pela sua expressão sonora e informação enquanto a ele são aplicados os processos jornalísticos de noticiar, não vem sendo explorado criativamente naquilo que ele tem de mais forte que é o som, a sua sensorialidade criativa que seduz e prende o ouvinte envolvido pela sua magia sonora. Ao longo de sua história de mais de 80 anos, o rádio curitibano de uma maneira geral sempre acompanhou a evolução do rádio brasileiro como um todo, em nada devendo aos maiores centros de radiodifusão. Esta constatação é muito evidente para aqueles que conhecem a história da radiofonia. Quando se abre a página da história da época de ouro do rádio – nas décadas de 1940 e 1950 – verifica-se que os curitibanos mantinham os mesmos padrões de programação do eixo Rio-São Paulo, com os programas de auditório, radionovelas, humorísticos, esportivos e também jornalísticos. Portanto, Curitiba possuía radiodifusores com ampla visão das potencialidades desse meio de comunicação, incentivando e oferecendo possibilidades para que se formassem profissionais competentes a ponto de se projetarem nacionalmente. Mesmo quando toda aquela estrutura do rádio como espetáculo se desmontou com a chegada da televisão – em Curitiba isso ocorreu mais para o final da década de 1960 – aqueles que entendiam a força do rádio perceberam também que ele poderia se manter como meio informativo, e o radiojornalismo se sustentou mesmo com dificuldades nas duas décadas seguintes, para aos poucos ir se firmando e se profissionalizando, num processo que ainda perdura com avanços significativos.
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Numa breve reflexão sobre o fazer jornalístico e o radiojornalismo praticado nas emissoras de Curitiba alguns aspectos merecem destaque por serem significativos. O primeiro deles diz respeito à produção jornalística. Uma primeira afirmação é quanto ao exíguo número de emissoras de rádio em Curitiba que trabalham efetivamente com o jornalismo informativo. De 17 emissoras7 abordadas em Curitiba, somente nove realizam transmissões voltadas para o jornalismo, considerando-se que possuem algum tipo de produção nessa área. As demais tratam a informação radiofônica apenas como obrigação ligada ao aspecto legal. Esse pequeno número de emissoras com trabalho jornalístico também mostra a pouca oportunidade de trabalho aos profissionais no radiojornalismo e que vai ter seus reflexos no processo de produção da notícia. Fica extremamente difícil um jornalismo radiofônico, como quer Meditsch (2001), ou seja, a cobertura ao vivo dos fatos. Das emissoras abordadas, apenas quatro (Clube, CBN, Band News e Paraná Educativa) possuem um número razoável de profissionais para cobrir as funções de reportagem, produção e apresentação dos programas. Além disso, por questões financeiras, a estrutura dos departamentos de jornalismo está cada vez mais enxuta e com isso sobrecarregando o profissional com diversas funções jornalísticas (pauteiro, repórter, editor, apresentador...). Há, portanto, em função da demanda e expectativa do ouvinte, uma razoável (em função da estrutura), mas também boa (em função do empenho profissional) produção radiojornalística, nas poucas emissoras que trabalham com a informação em Curitiba. Além de identificar as diversas teorias jornalísticas (espelho, gatekeeper, construtivista, interacionista, de ação política) presente nas formas de produção, há algo que se destaca nesse processo de forma positiva. Apesar da razoável estrutura de trabalho nas poucas emissoras de rádio, há uma compreensão muito forte nos seus profissionais do valor do imediatismo do rádio, característica importantíssima quando se trata do jornalismo. Porém, é preciso frisar que esse imediatismo do rádio na reportagem ao vivo fica aquém, se comparada – na extensão do tempo do programa informativo – com o número de reportagens gravadas e editadas, que Meditsch (2001) chama de jornalismo fonográfico, além das notas de agências de notícias. Vale ressaltar o esforço dinâmico e a prioridade que se dá para a cobertura ao vivo dentro do possível. O que se pode afirmar com relação ao radiojornalismo em Curitiba, no que se refere aos protagonistas da área jornalística, é que há uma seriedade ética e profissional muito presente quando se discute o que vai ser notícia em determinado programa e a quem cabe a decisão. O que se constata nessas emissoras jornalísticas é um espírito de equipe que se traduz até num espírito de superação, diante das limitações quanto ao número de profissionais e a necessidade de demanda. Há seriedade jornalística no processo produtivo nessas rádios informativas. Outro aspecto significativo no radiojornalismo é quanto aos formatos adotados pelas emissoras. Uma primeira observação é quanto a certa semelhança nos formatos 7 Quando do estudo realizado existiam 29 emissoras de rádio em Curitiba, segundo a Associação das Emissoras de Radiodifusão do Paraná – AERP. Dessas, participaram do estudo 17 emissoras. Constatou-se que, entre as dezessete, nove possuíam departamento de jornalismo.
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com programas específicos de jornalismo (jornal falado, boletins, entrevistas, reportagem, informativo especial...). Um diferencial, novidade no radiojornalismo de Curitiba, é a proposta da Band News com uma programação em fluxo e totalmente voltada para o jornalismo, com 72 jornais diários de 20 minutos cada. Tal formato se presta muito para a proposta jornalística da Band News em atender à demanda urbana, dando uma atenção especial ao jornalismo de utilidade pública numa espécie de boletim de aproximadamente cinco minutos de produção local inseridos nos módulos dos 20 minutos do jornal. Contudo, nas emissoras de Curitiba, o formato jornalístico da reportagem ao vivo, embora priorizada por elas, carece de maior dinamismo pelo reduzido número de profissionais. Em todos os formatos acima citados e que são utilizados nos programas jornalísticos das rádios, há uma preocupação muito grande no sentido de que, ao formatá-los no ar, a linguagem tenha expressividade tal que a clareza da comunicação facilite o entendimento do ouvinte, principalmente pelo uso de uma verbalização mais coloquial e que cria proximidade com o ouvinte. Nos diversos formatos de programas jornalísticos, a tão decantada interatividade defendida por Brecht como oportunidade de democratizar a comunicação radiofônica, pouco, ou quase nada, é permitido. O ouvinte não cabe nos formatos adotados, com a possibilidade de se expressar durante a transmissão. Há um receio ético que não permite a ousadia de abrir o microfone para o destinatário da notícia. O radiojornalismo de Curitiba perde muito quando age timidamente (ou não age) neste sentido. Paradoxalmente, programas jornalísticos na televisão8 já estão abrindo esse espaço para os telespectadores, via telefone, se manifestarem ao vivo. A justificativa muitas vezes apresentada é a de que o formato do programa (somente notícias) não permite a quebra do ritmo. Mas o programa não é produzido em função das necessidades de informação e compreensão dessa informação por parte do ouvinte? Há muito Murray Schafer (1997, p. 31), que defende um rádio mais radical, contesta a ditadura do relógio para o ritmo do rádio ocidental e diz que essa “limitação não é técnica, mas cultural, já que tecnicamente o sinal de rádio é contínuo e pode ser modulado na forma desejada”. Para não quebrar o ritmo do programa, as manifestações dos ouvintes são anotadas pela produção e repassadas ao apresentador que as lê, ou quando muito gravadas e editadas para serem posteriormente colocadas no ar. Por outro lado, é discutível a afirmação de que se promove a interatividade com o ouvinte pelo fato de abrir canal de comunicação dentro da produção para sugestão de pauta, ou oportunidade para fazer reclamações. Isso não é específico do rádio e serve para o sistema de produção jornalística para qualquer tipo de veículo. Interatividade no rádio somente é tal quando o ouvinte pode se manifestar no ar, como ouvinte e participante daquele ato informativo e de comunicação. Na linguagem radiofônica, a expressividade sonora representa um papel 8 O Jornal do SBT abre espaço em blocos definidos durante o programa, para que os telespectadores comentem um assunto importante, colocado pela produção. O interessante é que a interatividade é direta com o âncora, ou seja, há diálogo entre emissor e receptor.
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preponderante também no radiojornalismo. No entanto, o recurso da sonoplastia é muito mais utilizado como elemento de plasticidade estética do programa de jornalismo no ar. Isto significa que há certa restrição na utilização dos recursos sonoros (música, efeitos sonoros) especificamente como elementos da linguagem jornalística de rádio. A objeção colocada na pesquisa é que o jornalismo trabalha com a realidade e que, portanto, ela deve ser “refletida” no relato objetivo e sem “ruídos” que eventualmente possam interferir, principalmente pela garantia de credibilidade. Há, nesse particular, algo que pode ser acrescentado: os diversos autores mencionados nesse trabalho afirmaram que a sensorialidade do rádio é sua característica peculiar. Por essa razão, o som radiofônico produz no receptor sentimentos, antes de qualquer espécie de raciocínio. Aliás, rádio é essencialmente emoção, porque desperta no receptor o imaginário, provocando assim um diálogo mental entre enunciador e enunciatário. É mediante esse diálogo mental que o ouvinte constrói os seus significados para os enunciados e que, num segundo momento, podem levá-lo à reflexão, à compreensão racional dos significantes. Por que o radiojornalismo não pode servir-se da riqueza que é a expressividade sonora, como fator ilustrativo da notícia e de suporte que facilita e torna prazerosa a narrativa dos fatos? Em que ficaria a credibilidade prejudicada? Por que o radiojornalismo não pode ser pensado também esteticamente? Finalmente é interessante ressaltar o uso e a compreensão que se tem no radiojornalismo de Curitiba para os formatos da reportagem e da entrevista. Curiosamente, apesar de se priorizar a reportagem com a cobertura dos fatos em tempo real, nas emissoras pesquisadas, há também a utilização acentuada das reportagens gravadas, como forma de repercutir determinados fatos e também preencher os espaços dos programas. A causa é mais uma vez a falta de número suficiente de profissionais em campo e os grandes espaços destinados na programação à informação e que, por sua vez, de certa maneira, “obrigam” a utilização da entrevista. Não se quer afirmar que a entrevista não tenha valor jornalístico. Os profissionais a valorizam como tal, tanto que a interpretam como importante na complementação e esclarecimento na narrativa do fato. O grande problema que se observa é que ainda a entrevista é utilizada e por telefone, como forma de suprir a falta de profissionais repórteres e conter custos de produção e não deixa de ser uma forma também de se fazer a reportagem a distância, ou seja, artifício quando não se tem a reportagem presente no local do fato. Após essas considerações a respeito de alguns itens significativos constatados no radiojornalismo de Curitiba, e depois de conhecer o panorama geral do jornalismo existente nas emissoras pode-se afirmar que há um bom radiojornalismo que se percebe em processo de crescimento e consciência de sua importância para o universo dos ouvintes que buscam informação. Há um bom radiojornalismo protagonizado por pouquíssimas emissoras, e isso é lamentável num universo de quase três dezenas delas existentes em Curitiba com sinal AM e FM. Cabe aqui uma reflexão propositiva com o objetivo de contribuir para um jornalismo de rádio ainda mais eficiente para a demanda curitibana.
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Na última década o radiojornalismo apresentou um grande avanço em Curitiba, se comparado com décadas anteriores. Há ainda muita preocupação em cobrir espaços com a quantidade. Do ponto de vista qualitativo é preciso evoluir mais para um amadurecimento no tratamento da notícia, com o objetivo de contribuir para a vida da sociedade, ajudando-a na compreensão dos fatos que a cercam. Nos meios radiofônicos que lidam com o jornalismo aposta-se nesse amadurecimento, pelo processo de reprofissionalização que está acontecendo nos últimos anos. O radiojornalismo de Curitiba necessita, por exemplo, de maiores investimentos, principalmente no preparo de profissionais, para atender às necessidades de uma cobertura local dos fatos. Aquele batido conceito de que notícia é o fato inusitado, o impactante, o extraordinário... precisa também admitir que pode ser notícia aquilo que é o dia-a-dia do ouvinte, no local onde ele mora, trabalha e vive em sociedade. Neste sentido o jornalismo radiofônico não atende à demanda das necessidades locais de informação. Portanto, apesar do grande número de emissoras, ainda há espaço para aquelas que queiram se dedicar a um jornalismo que fale das coisas locais. Curitiba precisa e tem espaço para um radiojornalismo mais comunitário, com um foco maior nos fatos que afetam diretamente o ouvinte local. O que existe são tentativas que podem ser mais implementadas. Neste particular a própria história tem pontuado avanços e retrocessos, experiências que não prosperam principalmente pelo peso financeiro, pois o jornalismo está calcado essencialmente no fator humano, no preparo e contingente profissional, e isso tem um custo. É preciso um trabalho junto aos empresários para que percebam que as pessoas buscam informação e querem ouvir boa informação. O dinamismo da reportagem cobrindo os setores institucionais do poder, os acontecimentos das diversas áreas da vida em sociedade, ainda é muito tímido no jornalismo de rádio em Curitiba. O ouvinte tem necessidade e grande interesse nos fatos que acontecem à sua volta e isto precisa ser priorizado. Portanto, uma emissora de rádio que quisesse inovar jornalisticamente em Curitiba, deveria ousar numa programação – e não apenas um ou outro programa – voltada para a comunidade. Curitiba é uma metrópole e o sinal do rádio cobre praticamente toda a Região Metropolitana. Trata-se de um ambiente de proximidade com muitos acontecimentos afetando mais de dois milhões de habitantes. Um outro aspecto a considerar seria a possibilidade de maior ousadia na utilização dos recursos não-verbais na notícia radiojornalística. Uma das preocupações constatadas na rádio Band News é o risco de o radiojornalismo ficar muito calcado no discurso verbal. Por que não utilizar os recursos não-verbais, como a música e os sons ambientes? Apesar dos riscos de incorrer em simulacros que afetariam a credibilidade jornalística, contudo a ética profissional que sempre deve orientar o trabalho profissional confere o devido equilíbrio nessa forma de reportagem e edição jornalística para o rádio. Há ainda a defesa de pesquisadores como Schafer, Prado, Kaplún, o próprio Balsebre entre outros, que acreditam no uso dos recursos expressivos do som radiofônico como elementos de informação. Aliás, o rádio não é só palavra na reportagem informativa. Há outros sons que ajudam o ouvinte a compor a narrativa e
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que, portanto, também podem ser considerados informação. Prado (1989, p. 89), ao incentivar um radiojornalismo sonoramente mais ousado, fala que se “deve procurar incluir ao máximo o som ambiente, que favorece a compreensibilidade, provoca a intervenção da imaginação no ouvinte e, sobretudo, dá credibilidade à informação. Por outro lado, estes elementos dão dinamismo e ritmo à reportagem”. O radiojornalismo curitibano precisa ousar mais, valorizar mais os aspectos sensoriais do rádio e praticar um radiojornalismo que contemple também a estética do som. Afinal a reportagem também é um produto estético, pois passa pelo filtro da sonoridade. Para o ouvinte o som também é uma fonte jornalística. Por que, no rádio, o argumento da credibilidade da notícia tem que passar pelo parâmetro da voz neutra, insípida e com aquele tom sisudo da objetividade narrativa? Nunca é demais lembrar: no rádio, por mais séria e autêntica que seja, a informação chega até o ouvinte por um meio sonoro, que por sua vez vai colocar em ação toda a construção de um cenário mental para apreensão daquilo que ouve, justamente provocado isso tudo pelo primeiro estímulo do som radiofônico que é a emoção. Trata-se de um radiojornalismo mais elaborado, que leva em conta não apenas o aspecto da verbalização e que pode tornar monótona a audiência. A estética também pode ser um elemento favorável à variação rítmica importante num programa jornalístico. Outro elemento a ser valorizado é o fato de o jornalismo no rádio ser também comunicação e que, portanto, não pode desperdiçar a força expressiva do som radiofônico apenas com a comunicação verbal. Em nome da agilidade jornalística e do tempo de produção para fechar os grandes espaços de um programa informativo, perdeu-se no radiojornalismo de Curitiba o formato do documentário jornalístico. Existem fatos significativos, inclusive ligados à história, e assuntos importantes que poderiam ser tratados com maior profundidade e que oferecesse maiores elementos na formação de opinião dos ouvintes. É bem verdade que existe o formato da mesa-redonda que também é uma maneira de agregar valores jornalísticos a um fato ou assunto relevante. Mas é preciso valorizar mais o rádio como um dos grandes meios de se contar história. No documentário é possível utilizar todos os recursos do rádio sonoro de forma a tornar a informação estimuladora da imaginação do ouvinte. Mais uma vez: o rádio é emoção sem deixar de ser um meio de se estimular a formação de opinião. Ao estimular a produção de documentário no rádio, Helmut Kopetzky fala que a subjetividade é uma virtude quando ela se manifesta na defesa de uma idéia de maneira pessoal; e ela vem acompanhada das informações que são fundamentais para que então o ouvinte construa a sua. “É óbvio que devemos dar ao ouvinte todas as informações fundamentais relacionadas com o assunto, de maneira a capacitá-lo a formar a sua própria opinião e compará-la com o nosso ponto de vista” (KOPETZKY, 1997, p. 79) Há espaços na programação das emissoras para que, por meio do documentário, se possa resgatar na linguagem jornalística fatos relevantes da cidade, personalidades, a vida social, como meio de valorizar e perenizar a memória de uma comunidade urbana. Não se trata apenas de memória. O radiodocumentário é também um meio
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informativo que oferece oportunidade reflexiva que auxilia na formação de opinião. O radiojornalismo, portanto, possui uma dupla riqueza que é, primeiro, ter a capacidade de colocar o ouvinte diante do fato, pela agilidade da reportagem, no momento em que está acontecendo; segundo, valorizando os recursos sonoros, reconstruir os fatos para aprofundá-los, contextualizá-los e provocar uma reflexão no ouvinte por meio do documentário. Finalmente, poder-se-ia criar um radiojornalismo tipicamente curitibano, com seu sotaque e jeito de ser. O jornalismo está muito recolhido nos estúdios das emissoras de rádio, apesar das equipes de reportagem circularem pela cidade na cobertura dos fatos. Para inovar é preciso ousar e a ousadia, num primeiro momento, encontra a resistência do status quo do modelo radiofônico vigente. Nesse particular, é muito interessante o radicalismo proposto por Schafer (1997, p. 36) ao defender que os ouvintes possam ter participação direta na escolha dos assuntos a serem discutidos: “Eles não devem ser intimidados e manipulados por locutores escorregadios. Na Holanda, por exemplo, Wilem de Ridder opera um programa de rádio no qual qualquer ouvinte pode trazer uma fita cassete sobre um assunto de sua escolha que ela irá ao ar. A variedade é estonteante e estimulante”. Nesse seu radicalismo de resgate sempre maior da função comunicativa do rádio que deve permitir a participação direta do ouvinte, Schafer desafia os programadores ao provocar: Sempre pensei em colocar microfones em restaurantes, clubes ou qualquer outro lugar onde as pessoas se reúnam para trocar idéias. Os resultados poderiam ser revigorantes. (...) Isto sem um locutor que fique direcionando os pensamentos das pessoas. Estas e outras milhões de situações produziriam um material muito mais interessante do que as opiniões solicitadas aos ouvintes sobre assuntos do dia. Isto também é tecnicamente possível. O único empecilho é a arrogância dos programadores. (SCHAFER, 1997, p. 36)
Sair das quatro paredes do estúdio9 e ganhar as ruas, praças, bairros, Ruas da Cidadania, terminais do transporte coletivo, transformaria o radiojornalismo de Curitiba, tornando-o mais cidadão e comprometido no seu aspecto social e transformador da realidade. Pode ser um programa semanal em que o estúdio com seus profissionais jornalistas abriria espaço para as vozes da comunidade nos seus anseios de vida, de progresso, de cidadania e nas suas expressões de agentes sociais que trabalham e lutam por uma vida melhor. É a oportunidade que a tecnologia e a mobilidade do rádio oferecem para ser um meio de comunicação democratizante que fala, mas que também ouve. Um radiojornalismo assim, participativo e atuante, comprometido e transformador reafirmaria a sua credibilidade junto ao público ouvinte que ainda vê no rádio o meio democrático de fazer valer os seus direitos. Se o radiojornalismo de Curitiba fizer tudo igual a vida inteira, os resultados serão 9 Experiências de estúdio aberto à participação popular já existiram em Curitiba. O exemplo clássico foi a Casa do Povo, em plena Praça Rui Barbosa, na região central. Não havia conotação jornalística e democratizante da informação. A sua função era eminentemente política e que tinha à frente políticos com cargo público.
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iguais a vida inteira. Por isso, é preciso coragem para ousar e apostar na qualidade para sair da mesmice da massificação repetitiva: notícia de política, policial, futebol, economia... No radiojornalismo informar é importante, mas ouvir o som das ruas, das praças, dos terminais de transporte... do público ouvinte, é fundamental.
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