Cronicando na Faculdade de Línguas - UNC - 2012

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Camping

Alejandra Britos

Todo mundo sabe que não há nada melhor depois de um longo ano de trabalho, que tirar umas férias gostosas para aproveitar o verão. Os argentinos não são a exceção, muito menos os cordobeses, que fazem de tudo para poder desfrutar das férias, pelo menos uma vez por ano. Mas sonhar com umas férias na praia, de preferência brasileira ou caribenha, deitado na rede embaixo de um coqueiro, olhando para um mar azul infinito e conseguir realizar esse sonho são duas coisas bem diferentes. Com certeza há muitos cordobeses que conseguem poupar o ano inteiro com grande esforço a quantia necessária para atingir esse objetivo, e chegada a tão desejada temporada estival, partem felizes em direção à praia.

Porém, não é nesses felizardos que vou me concentrar, e sim naqueles que não conseguem atingir o mágico objetivo. Os motivos podem ser diversos: família numerosa, prestações acumuladas, salário magro, e assim por diante. Mas as

dificuldades econômicas não conseguem deter quem está verdadeiramente decidido a tomar um descanso, e nesse sentido, a geografia da província oferece lindos campings à beira dos rios para quem topa tirar umas férias mais econômicas. Assim, com a decisão tomada é só começar a preparar a aventura (e bota aventura nisso).

Vamos supor que o turista em potência tem uma família padrão: casal e dois meninos entre os sete e onze anos (se forem maiores a recomendação é desistir da vida em natureza, pois eles vão estragar as férias dos pais reclamando pela falta de internet, de redes sociais, de camaradas, de danceterias, etc.) O que é necessário levar? Bom, para começo de conversa, vou dizer que barraca é fundamental, o ideal seriam duas, uma para o casal e outra para as crianças, mas enfim, com uma já se pode pensar em acampar.

Nesse momento começam aparecer as primeiras dificuldades: a velha barraca da família costuma estar na pior, com falta de ferragens e cordas, etc, etc. A solução é obvia, tem que comprar uma nova e também

aproveitar e comprar uns colchonetes, só quem dormiu duas noites seguidas numa barraca, sabe como ficam as costas. Também é preciso comprar caixa de isopor, cadeiras de camping, um fogareiro (pode chover e molhar a lenha, além do mais, acender fogo às nove da manhã para fazer um cafezinho, ninguém merece), sem esquecer, obviamente, a revisão do carro. Tanta compra e preparativos costumam mandar o orçamento e humor do pai de família para a estratosfera e fazer com que os preparativos da viagem se transformem num pequeno inferno familiar.

Tudo pronto e arrumado, destino escolhido após visitar inúmeras páginas na internet, chega o grande dia, o dia da partida. O figurino manda sair cedo para pegar estrada mais tranquila e aproveitar ao máximo os dias de férias. É o momento de outro grande desafio: carregar o carro. Depois de arrumá-lo umas vinte vezes dá para conseguir o espaço mínimo indispensável para acomodar quatro pessoas. Finalmente está na hora de partir.

Para os pais o alívio é momentâneo, pois se o local escolhido ficar a mais de meia

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hora de viagem, logo virá o tormento dos filhos: ou eles começam a brigar, ou começam com a pergunta habitual nesta situação “Quando é que a gente chega?” Coisa de criança. Nem vale a pena ficar se irritando com isso, melhor se concentrar em preparar um bom chimarrão e tocar para frente. Finalmente as crianças adormecem, para alegria dos pais. A estrada está calma e aparentemente o carro não vai deixar ninguém a pé. A felicidade parece estar garantida pelo menos durante uma hora. O casal vai admirando a paisagem e tentando, finalmente, relaxar um pouco. Mas é por pouco tempo: a estrada que no começo estava boa, se transforma em um caminho sinuoso e meio esburacado que ameaça com quebrar as molas do carro, o pai deve manobrar feito um doido para não cair em nenhuma cratera. Depois disso- pensa o pai - posso até competir no rally.

Mas, com paciência e coragem, a família consegue chegar ao camping escolhido. O local é lindo, e o rio está realmente perto, porém parece que toda Córdoba escolheu precisamente esse lugar

para passar as férias. Fazer o quê? O jeito é armar logo a barraca e começar a desfrutar da natureza. Os meninos descem do carro e a mãe tem que ficar muito atenta para que eles não se percam no mato. Ao mesmo tempo tem que ajudar o marido que está enrolado tentando montar a barraca. Cordas vão, cordas vêm, até que enfim a barraca fica em pé. Não é nem de longe tão grande quanto parecia na publicidade da loja, mas dá para quebrar o galho. Até por que, eles só vão ficar nela na hora de dormir. Terminada a tarefa e logo quando o casal vai tomar uma geladinha para comemorar a chegada, começa a tocar uma música ensurdecedora. Os vizinhos da barraca do lado colocaram no maior volume, a coletânea inteirinha da Mona, e não há maneira de pedir que eles abaixem o som. Enquanto isso os meninos que estão com fome reclamam comida, rio e atenção. Mal chegaram e já espetaram o pé com espinhos, foram picados pelas formigas e brigaram com alguma outra criança do camping, tudo isso em menos de uma hora.

O pai e a mãe, nessa altura, já estão querendo voltar para a cidade. Aturdidos,

cansados e famintos mal atinam a acender o fogo para fazer o churrasco previsto para esse grande momento. Lá pelas quatro da tarde conseguem almoçar, e meia hora depois são arrastados pelos filhos em direção ao rio para tomar banho. Ainda bem que vão!! Duas horas depois chega o alerta à praia. Choveu muito na nascente e está crescendo o rio. E pior, o serviço meteorológico anuncia temporais por vários dias. A família volta para a barraca, no momento em que os primeiros pingos começam a cair, os vizinhos não se incomodam com isso e continuam escutando “cuarteto” e bebendo “fernet com coca” dentro da sua barraca. A tarde fica escura e o lampião é aceso dentro da barraca familiar, a mãe tira da mochila o jogo de baralho e algumas bolachas. A família se prepara para encerrar esse dia tão agitado, todo mundo torcendo para que o “senhor do tempo” esteja enganado e no dia seguinte brilhe o sol e volte a ser verão.

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O diálogo no táxi por Cláudio Francisco da Silva

Quem tem o costume de pegar táxi durante a semana na cidade de Córdoba já pôde comprovar que alguns motoristas de táxi são, além de motoristas, um bons entrevistadores, principalmente se eles perceberem que você não é local. Conversando sobre este assunto com alguns amigos meus de outras nacionalidades, que estiveram de passagem por Córdoba, acabaram me contando que passaram pela mesma experiência.

Quando eu entro em um táxi na cidade de Córdoba, basta com abrir a boca para dizer para onde vamos e [que] o motorista me olha, faz uma leitura dos meus traços físicos para ter a certeza de que não sou daqui e percebe que possivelmente eu seja brasileiro e aí, nesse caso, o motorista, na maioria das vezes, inicie uma sequência de perguntas. Alguns deles o fazem com algumas variantes (clima, política, cultura, religião, futebol, etc.) mas, no geral, seguindo a mesma ordem.

Em uma manhã de verão cordobês, faço sinal para parar um táxi em uma esquina qualquer do bairro General Paz,

entro no veículo, me sento e percebo a diferença do clima, um impacto. O ar condicionado do carro estava ligado no máximo. Digo ao motorista:

-Bom dia.

Um senhor que aparenta uns 60 anos de idade com ar simpático e conversador me responde:

-Bom dia.

-Vamos para Nueva Córdoba pelo Nudo Vial( anel viário), por favor.

O carro arranca e vai tomando velocidade quando o motorista, olhando indiscretamente pelo retrovisor interno do carro pergunta:

-De onde você é?

-Do Brasil.

Muitos cordobeses sentem grande admiração pelo Brasil no que se refere a lugar para ir em férias, sozinho ou com a família. E aqueles que nunca veranearam nos estados do Sul do Brasil, têm algumas ideias estereotipadas sobre os brasileiros e sua forma de ser.

-Ah... então você está acostumado com o calor, então!

-Não com esse tipo de calor.

-De que lugar você é?

-De Fortaleza.

-Onde Fica?

-No Nordeste do Brasil

-Que lindo! Tem mar?

-Sim tem mar.

-Faz muito tempo que você está aqui?

-Sim, faz uns 10 anos.

-Ah! Já é cordobes!

-Não.

-E você gosta da Argentina?

-Eu gosto de Córdoba.

- A qual rua vamos?

-Vamos a Ambrosio Olmos e Ituzaingó.

-E o que você faz aqui em Córdoba?

-Trabalho e estudo.

- E você está só ou com a família?

-Só.

-Mas você volta sempre ao Brasil?

-Sim volto pelo menos duas vezes por ano.

-Eu conheço o Brasil.

-Ah sim? Que lugar você conhece?

-Fui a Camboriu, Florianópolis, Canasvieiras, Torres e Bombas e Bombinhas.

-Ah que bem! E você foi muitas vezes?

-Sim, quatro anos seguidos, mas depois veio a crise econômica e não fui

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mais. Antes na época do um a um, a gente ia com 100 dólares e era Gardel no Brasil. Agora que tudo anda mal não podemos ir nem a Carlos Paz e aqui te tratam muito mal.

-E você gostou da comida no Brasil?

-Mais ou menos, em Camboriú conhecemos um lugar que vendia comida argentina. Mas quando tinha que comer só comida brasileira era complicado. Tudo se come com arroz, o arroz substitui o pão. Mas quando fui no último ano choveu uma semana dos 12 dias que estive. Mas igualmente a gente ia à praia, só um dia que estava muito nublado e fomos conhecer Blumenau.

-Bom, fico aqui na esquina.

Pago, cumprimento o motorista e saio do carro.

Vou fazer minhas atividades do dia sem nem pensar no diálogo mantido com o taxista naquela manhã. Termino o meu dia de trabalho e na esquina que o taxista me deixou 8 horas antes, pego outro táxi, entro, me sento e digo para onde vamos. O taxista me olha e diz:

-Você é brasileiro?

-Sim.

-De onde?

...E todo o diálogo começa outra vez, com outro motorista, outro táxi, outro horário, mas com a mesma temática. É só apertar a tecla play e reproduzir a minha história de vida.

Os taxistas cordobeses são entrevistadores nato. E segundo o ditado popular de Córdoba: “ o cordobês não te pergunta, ele te entrevista. E basta com dizer mais que um bom dia ou boa tarde para ver-me submerso em um descontrolado mar de assuntos que passam pelo clima, política mundial e local, adolescentes na piscina, churrasco, futebol, trânsito, vizinhos etc. É incrível como muita gente tem conversa e opinião para tudo.

Às vezes, você pode não está com muita vontade de conversar e começa a dar respostas mono-silábicas até que o motorista te faz uma pergunta do tipo: (Pelé ou Maradona? Você gosta mais do Brasil ou da Argentina?) e aí, você como bom brasileiro morando na Argentina, não pode responder como uma só palavra.

Muitas vezes também você pode inventar outras respostas...ou seja mentir nas respostas que dá.

Confesso: Muitas vezes tive o atrevimento de inventar minhas próprias ficções de vida.

Certa vez comecei a responder coisas diferentes para um taxista, cansado de responder sempre a mesma coisa, e decidi inventar que era de São Paulo que estava a passeio em Córdoba e nem fiz comentário com relação ao clima, mas o taxista não me deixou continuar muito e fez o comentário:

-Há muitos brasileiros aqui em Córdoba, outro dia levei um rapaz muito parecido com você que era de Fortaleza mas que mora aqui em Córdoba...

E aí, tive que inventar uma mentira sobre a mentira que tinha dito para justificar aquela história toda e ele ficou meio confuso me olhando pelo pequeno retrovisor interno do carro como se eu estivesse descido de uma nave espacial que acabou de aterrissar no Cerro Uritorco como se eu tivesse um problema de dupla personalidade.

Bom, vai o meu conselho aos estrangeiros que tomam táxi em Córdoba, falem o menos possível, dêem o menos de informação possível, assim poderão evitar alguns inconvenientes e terem uma boa e tranquila viagem. Tchau.....

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Uma maravilha Eugenia Pérez

Tchasss, trashhh….

-Meu Deus, quanta bagunça! Já nem consigo fechar este porta-malas! Parece que estas mulheres vão passar um mês de férias!!! Que mania!!!

-Ah, Alberto, são todas coisas dos meninos e alguns cremes meus, só isso!dizia a Tia Elisa, mulher muito delicada e caprichosa.

-Cala a boca Beto! O senhor leva: o jornal, os óculos, a cadeira, o ventilador elétrico, o almofadão, o repelente de insetos, o rádio... porque senão Seu Betinho ele não consegui pode desfrutar da natureza... Que coisa absurda!!recriminava Clara, a mulher do Alberto e a irmã da Elisa, enumerando cada um dos elementos com os dedos das mãos.

Finalmente o porta-malas fechou, com tanto, tanto esforço que o Alberto nem queria abri-lo nunca mais, nem mesmo quando a família chegasse ao camping.

Levavam de tudo: cadeiras; baldes e pás; raquetes e bolinhas de frescobol; toalhas, e tudo demais, sempre pelas dúvidas; geladeira; comida; refrigerantes; roupas de verão, de primavera, até de

inverno, pelas dúvidas, caso o clima mudasse .... tantas coisas que, como pensava o Alberto, poderiam sobreviver uma semana. Mas iam só por umas horas!

A família ia à procura do seu destino escolhido para esse dia: “Las Maravillas”, nome sugestivo, né? Pelo menos ele pressagiava ser um lugar fantástico, quase de sonhos. E foi por isso que estes turistas decidiram conhecê-lo. Além do mais, o resto dos pontos turísticos perto de Mina Clavero ficavam cada dia mais superlotados. Coisa incrível! Com tantos lugares para escolher, era necessário ir todos ao mesmo lugar?!

Pi, pippp -Pessoal, vamos lá! Temos que aproveitar o sol, o ar puro, essas águas claras. Mmmm que delícia! Olha só, que dia, uma be-le-za! - dizia a Tia Elisa, muito ansiosa porque seu único objetivo era tomar banho de sol (com bloqueador solar até nas orelhas, para evitar as detestáveis rugas!) e curtir essas das férias com a família, é claro.

Beto já estava sentado na sua posição de piloto dando os comandos ao GPS, nem que fossem correr rali. Mas desta vez a tecnologia não ia poder ajudar a chegar a “Las Maravillas”. A voz do

aparelho indicava: “Destino inexistente. Ingrese novo destino”.

-Não Senhora! A gente decidiu ir até lá e vamos chegar. - Respondia Beto à voz eletrônica, enquanto desligava furioso o aparelho.

Agora não podiam fazer outra coisa que confiar nas diretivas que Clara, muito precavida, tinha perguntado.

Percorreram alguns quarteirões e os filhos começaram com as perguntas de filhos. Perguntavam se faltava muito para chegar, se já estavam a por chegar, tudo misturado entre as brigas típicas de entre irmãos.

-Fica lá. Viu aquelas lomba? Bom, exatamente ali não, mas perto dela, justo atrás... Mmm É passando Cura Brochero, ali, ali seguindo para a frente. Uns quilômetros e a gente chega! - Dizia Clara tentando acalmar os meninos.

Poucos metros depois tiveram que se deter e perguntar a uma pessoa se iam na direção correta. E em troca da resposta o jovem vendeu para eles uns biscoitos doces chamados de “pastelitos”, que os meninos devoraram sem deixar nem um farelo para o Beto.

Já os 40 e tantos graus irritavam qualquer pessoa. faziam irritar qualquer um

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Era um calor de rachar mamona e nem o ar condicionado estabilizava o humor. Isso somado aos buracos na estrada de terra que faziam atordoar ao pai.

-Manhêeeeee, quando é que a gente vai chegar? Não vejo nem os rastos do mar!

-Meu bem! Eu já expliquei que aqui não tem mar, só rios de águas cristalinas perfeitos para vocês nadarem.

-E agora? Já chegamos? Perguntava ansioso o caçula da família.

Foram exatamente 10 quilômetros a mais de perguntas e respostas sem sentido, de chimarrão quente, de bate-papos de mulheres, de muita agua mineral fresca (para combater a celulite, quer dizer, para não se desidratar, obvio!), de comentários na rádio que anunciavam o monotema do verão: Que calor insuportável!

E assim, desafiando a distância, a família chegou. Mas a surpresa foi grande. Sim, parecia que todo o mundo tinha se deslocado para “Las Maravillas”: os turistas, os vendedores ambulantes, nem os cachorros vira-latas faltavam. Todos, todos como Alice no seu próprio país!

Pagaram o um custoso ingresso do ao tão desejado mundo e ficaram mais uns dez minutinhos tentando conseguir um

mínimo lugar para poder estacionar o carro.

Depois, e antes de se instalar, a primeira coisa que a Tia Elisa procurou foi precisamente aquilo que geralmente foge da harmonia desse entorno natural.

-Cadê o banheiro? Eu estou precisando de um, urgentíssimo! - dizia a tia cada vez em um tom mais alto enquanto tentava encontrá-lo.

-Moça, pode me dizer onde é o banheiro? Insistia a Tia que mal conseguia aguentar a natural vontade de fazer xixi.

-Acho que vai ser impossível... tem um monte de pessoas fazendo fila para entrar. Por que a senhora não tenta diretamente no rio?

-Você acha? Mmmm, mas a contaminação? Bom, a natureza chama e eu não posso ignorá-la... Nossa! Que dilema!

-Senão você tem TOOODA a serra a sua disposição! - disse a moça com um sorriso cúmplice.

A vontade era maior do que sua moral. Então, resolvido esse conflito ético, escolheu a primeira opção e saiu em disparada em direção ao rio. E ali a surpresa, o rio, como era de esperar em um dia de tanto calor, estava mais do que

cheio, estava REPLETO de seres, até de animais, que procuravam seu espaço em tão insignificante fio d’água. Na verdade um riacho, estreitíssimo.

-Nooossa! É só isto? Que desilusão!

- disse a tia Elisa apertando os lábios em sinal de contenção para não perder o controle do seu corpo.

Convencida, decidiu dar um jeito na sua necessidade, divisou um lugarzinho longe, onde passava uma turma de jovens, depois de umas pedras e foi cegamente até lá. Mal podia caminhar, estava toda curvada e tinha que ter muita habilidade para não pisar em ninguém. Porém, aos poucos, estava chegando à meta quando num passo errado, PLASH! Tia Elisa caiu na água. Que cena! Para sua sorte só tinha um cachorro que, com o movimento da queda, saiu correndo, mais assustado do que barata na cozinha.

Enquanto ia caindo, a tia soltou tal gargalhada, daquelas que fazem perder o controle de tudo. E foi isso exatamente o que aconteceu: Tia Elisa se abandonou à natureza e soltou tudo. E tudo quer dizer tudo!!!!

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Semana improvisada nas serras

Jaquelina Carnero

Era sexta e eu estava contente porque era meu último dia de trabalho. Por outro lado estava pouco contente porque não tinha planos para minhas férias. A verdade é que eu os tinha, mas caíram com esta questão do “dólar blue”. Perdi as minhas férias no Rio. E é por isso que ficaria uma semana em casa com meus pais aposentados, um cachorro, um perico e um gato. Não inclui a minha irmã caçula porque ela sempre está fora de casa

No sábado pela manhã recebi a notícia! Maria, minha irmã casada, convidou-me para passar uns dias com sua família em Mina Clavero. Sua família está formada pelo João, o marido dela, pelo Marcos e pela Ana, os filhos. Alegrou-me a ideia de curtir uns dias nas serras embora ninguém falasse quantos dias. Automáticamente, como toda mulher, comecei a imaginar: um bom bronzeado, uma praia tranquila, a moça (esta parte é bem imaginativa) presente em todos os circuitos e atividades turísticas. Adorei a ideia. Passei a manhã fazendo o mais importante nesta situação, a depilação. O

passo seguinte era arrumar algumas roupas e alguns acessórios e pronta pra a aventura. prontos. Descobri que o protetor solar estava vencido e os óculos prediletos estavam na casa de uma amiga. Embora não quisesse queria gastar, fui à farmácia, onde [e alí] me invadiu a indecisão: o que levar, um protetor grande ou um protetor pequeno? Comprei o pequeno, e comprei uns óculos plásticos que eram mais parecidos com os óculos de brinquedos dos meus sobrinhos. Lavei algumas roupas do verão passado. O melhor da moda atual é que tudo, qualquer cor, qualquer textura está na moda. Completavam a bagagem alguns biquíinis, uns chinelos e a maquiagem.

João, o meu cunhado, dirigiu conduziu toda a viagem. Coitado, a minha irmã tem vertigem nessas regiões. Eu viajava atrás, no meio das crianças. Tentei disfarçar a incomodidade cantando com eles. A minha irmã aproveitou a barulho para discutir com o marido, argumentando que chegaríamos tarde e não aproveitaríamos do sol. Mas o meu cunhado disse que ela tinha escolhido o dia e o horário. Explicou-lhe que era fim de semana de intercâmbio turístico e que a viagem se atrasaria. (iria estar atrasada)

Depois, para distanciar um pouco a resignação, mudamos de tema e começamos com o clássico colega de viagens, o chimarrão. As crianças assistiam a um filme, nesses aparelhos portáteis. Um tempo depois comecei a sentir uma dor no pescoço, acho que era porque o barulho do filme fazia que eu me adiantasse para poder participar da conversa com os maiores. Não lembro quanto tempo passou nem o que aconteceu depois. Acordei com o aviso do meu cunhado, que estávamos perto da “Hosteria”.

Portal das Serras é o melhor para concluir a viagem. É o nome do conforto. Acho que depois de nos hospedarmos o ritmo mudou. O casal ficou em um quarto (numa habitação) enquanto eu e as crianças ficamos em outro.Todos estávamos muito cansados e ( O cansaço se fez sentir em todos e) partimos para a cama depois do jantar.

Acordei cedo e queria aproveitar, sem companhia barulhenta, da natureza do lugar. Decidi dar uma volta enquanto a famílía dormia. Caminhei pela calçada (peatonal) onde as primeiras lojas abriam suas portas. Tentei comprar alguns presentes, mas não tinha o dinheiro. Aqui, todos se cumprimentam. As pessoas nessas

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regiões são muito agradáveis. Continuei olhando até chegar a um balneário onde tinha umas poucas pessoas tirando o lixo do lugar. Aproximei-me ao rio. Fiquei olhando-me refletida nas águas e deixei que a brisa me acariciasse. Achei tão especial e romântico aquele momento. Comecei a perceber que estava em certa harmonia com a natureza.

Pensei que deveria fazer atividades que fossem típicas do lugar. Resolvi então, passar pelo posto de informação turística. A viagem foi improvisada para mim e nem perguntei o que se podia fazer naquele lugar. Mas, imediatamente umas buzinadas interromperam meu planejamento. Virei (Dei-me volta) e, para minha surpresa, vi uma multidão invadindo a praia. Acho que pareciam caranguejos saindo da areia ou sei lá de onde.

Decidi voltar com urgência e durante o caminho à “hosteria” continuaram me surpreendendo as filas de pessoas que iam em direção à praia. Os carros circulavam lotados de pessoas com idades, cores, tamanhos variados. Levavam animais, cadeiras, etc. Parecia que todos se mudavam para a praia, mas para viver para sempre. Nossa! Que movimentada é aquela praia. “Tomara que a minha irmã tenha

planejado passar o dia em outra cidade”, pensei. Mas não, a praia escolhida era aquela mesma. Meu cunhado nos informou que o carro não estava em condições de ser usado. A família estava pronta e esperando por mim. Peguei o que encontrei e saímos caminhando até o principal balneário da cidade, segundo informava o folheto que a minha irmã me deu.

Eram às 11 da manhã e estávamos instalados num lugar estratégico segundo a minha irmã e eu. O meu cunhado foi preparar o fogo para o clássico churrasco do domingo de muitos cordobeses. A minha irmã preparou o chimarrão. As crianças brincavam e corriam pela areia. Eu decidi aproveitar um pouco do sol. Tive que usar o protetor para crianças porque nas pressas tinha esquecido o meu! Estava toda branca quando percebi que as pessoas que passavam me olhavam. Olhavam o fantasma. E acho que os óculos ridículos que usava ajudavam o (ao) espetáculo. Nossa! Tinha que (compartir) compartilhar aquela tragédia com minha melhor amiga. Percebi um novo esquecimento, o meu celular! Quem seria meu aliado nesta odisseia? A minha irmã que estava falando e ordenando os talheres trocando a louça para o almoço? Meu cunhado que estava

perdido numa fumaça e discutindo de futebol com outros homens perto dele? As crianças... As crianças tinham desaparecido! Tínhamos combinado com minha irmã, aquela manhã, que só eu cuidaria delas, já que não teria que pagar nada nas minhas férias. Meu Deus, não as via por perto. Entrei na água para disfarçar a vergonha da minha cor e do desespero, mas algumas pedras frearam a minha fugida. Escutei algumas gargalhadas, as que atribuí ao meu comportamento, mas vinham do outro lado. Umas crianças brigando, eu me aproximei como pude. Descobri o ( ao) meu sobrinho com a barriga vermelha abraçando o pescoço de outro menino que chorava como louco. Tentei correr. Caí ... me levantei e gritei: Altooo lá! Todos viraram para mim e eu pedi a Deus que me tornasse invisível naquele momento. Cheguei até os meninos e os separei, além de receber alguma pancada também. ( recebendo algum golpe por alí.) O pai do menino me chamou de tudo, achando que era a mãe do suposto agressor. Meu sobrinho me abraçou e depois nos afastamos e no caminho encontramos a minha sobrinha que estava assustada.

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Os dois agradeceram a minha intervenção naquela briga, da qual nem perguntei o motivo, mas que tinha acabado. Nós três combinados [Pactamos os três] não comentar para ninguém o que tinha acontecido. A adrenalina que tinha reservada para outras atividades como parapente ou descida na parede se esgotou naquele primeiro dia na praia.

O meu cunhado avisou que estava pronto o almoço e então todos ficamos juntos de novo. Além do barulho do lugar, da fumaça e de tudo o que tinha acontecido, senti que desta vez a família estava compartilhando o almoço. O almoço nas férias.

A tarde foi tranquila. Fiquei deitada na sombra para poder ter uma melhor visão do lugar e das crianças. Depois me mudei para o sol. Os meninos brincavam com a areia. Eles tinham a energia que me faltava. A minha irmã e o seu marido estavam deitados dormindo na sombra. Para isso minha irmã queria aproveitar o dia? (Para isso queria minha irmã aproveitar o dia?) Para dormir? Na verdade eu também tinha vontade de fazer o mesmo, mas em casa, na minha cama!

Aproveitei para registrar o que acontecia ao meu redor. Comecei a escutar

uma mistura de músicas. O ritmo que predominava era o “dance” e o “reggaeton” proveniente do posto principal dos “DJs” (parador.) Um pouco de “quarteto” proveniente de turistas da capital que estavam talvez, só pelo fim de semana. Tinha outros cordobeses do interior que estavam no lugar vieram por mais dias. Havia visitantes de outras províncias, pelo sotaque poderiam ser alguns santafesinos, correntinos, puntanos e os infaltáveis rosarinos e “porteños”. Outros visitantes eram estrangeiros, alguns mochileiros, como brasileiros, chilenos e europeus.

Percebi que havia vários homens sozinhos. Depois descobri que um deles me olhava. Então comecei a fazer o mesmo.

Nossa! Ele tinha um físico quase atlético. Talvez fosse um esportista. Ruborizei-me. Ele estava usando uma sunga amarela... Ah! Tinha uns olhos verdes que pareciam faróis no seu rostro dourado. Aparentemente simpático. Ele me observava e isso me incomodou um pouco até que uma mulher escultural o chamou de “meu bem...” As minhas ilusões foram ao chão [caíram] mais uma vez. Por que será que a mulher prefere pensar que o homem ideal a está esperando em qualquer lugar?

Decidi materializar castelos de areia com meus sobrinhos e tirá-los (Na verdade que tentava tirar os castelos de areia da minha mente) do meu pensamento. Desfrutei muito quando eles me enterraram na areia e quando entramos no rio. ( esquisito: aqui não lembro a idéia ) enquanto depois entramos no rio. Minha irmã tinha comprado “pastelitos” e “tortillas” para a merenda das crianças e o nosso chimarrão.

Concluímos o dia cansados. As crianças e eu brancos, o casal vermelho. Comentei a minha irmã o episódio com o “verde e amarelo” e voltamos às risadas à hosteria. Jantamos, naquela noite, em Costa Norte. O meu cunhado iria depois ao cassino com um colega do trabalho que tinha encontrado na praia. E minha irmã disse que nós iríamos a um espetáculo infantil na calçada (peatonal). Que divertido, que promação para mis sobrinhos e eu? Isso me aconteceu por ir como tia solteira! E sem celular. Nem lembro a que horas caí na cama e nem como meus sobrinhos terminaram ao meu lado.

Falei com minha irmã, no dia seguinte e lhe expliquei que aquilo não era o que tinha planejado para meus dias nas

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serras. Eu queria sair e fazer atividades como uma “cavalgata” e que até levaria as crianças, mas não volveria ao balneário do dia anterior. Eu procurava certa tranquilidade. Parti com as crianças com o consentimento dos pais.

Tinhamos uma hora para passear em carrete ( “sulqui”) e voltar com tempo para o almoço. Aquele sol se fazia sentir. Eu não (me coloquei) protetor solar naquela manhã para recuperar o dia anterior. A mulher sempre quer tudo no momento. Eu queria voltar para casa com uma cor que fosse a inveja entre minhas colegas do trabalho. Decidi continuar com o título de heroína e por isso foi que pedi ir só com as crianças, embora gostassem da cortesia dos nativos (ou mais conhecidos como “lugareños”). Tínhamos também a companhia de outras pessoas que viajavam em outros carretes “sulquis”. Gostamos da paisagem e da flora. Que beleza. A paisagem começou a mudar. Apareceram formas de montanhas que nos permitiu jogar e fazer adivinhar com as crianças. Pensei que estávamos na parte final do trecho quando descobri que tínhamos saído do trajeto. Tentei aplicar meus conhecimentos de persuasão com o animal, mas não deu certo. O cavalo continuou

como se soubesse aonde ir. O sol estava alto e nós continuávamos de passeio. A verdade foi que o animal nos levou de novo ao ponto de partida. Fomos até a hosteria e lemos um bilhete da minha irmã: estamos no balneário de ontem. Nossa, para quê? Pensei.

O postal era o mesmo. Aquela extensão de praia, de pouca profundidade e de areia fina ficava perdida entre a multidão, a fumaça, os vendedores, alguns cachorros. Tinha bandeiras de “Belgrano” e outras de “Talleres” como também as de sempre: “River” e “Boca”. Era o que apresentava mais uma vez aquele balneário serrano.

Demoramos pouco para encontrar a família. Fomos diretamente ao lugar “estratégico” e lá estavam. Novamente o almoço foi churrasco. Durante a comida as crianças contaram a experiência com a tia. Minha irmã continuava confiando em mim e por isso deixou as crianças sob meus cuidados mais uma vez. Ela nem me perguntou. Achei que estava se aproveitando de mim. Eles sairiam ao teatro Eles tinham uma saída ao teatro àquela noite.

Se o dia anterior o protetor das crianças tinha me deixado branca o sol do passeio

me deixou vermelha. É por isso que estive na água com as crianças a tarde toda. A verdade que desfrutei da sua companhia, mas as nossas energias não eram compatíveis. “Os “pastelitos”, as “tortillas”, e outras delícias serranas estiveram presentes na tarde”. Eu senti que tinha uns centímetros a mais na barriga pelo excesso de massa e carne. Voltei para a hosteria, tomei banho e fiquei deitada sem jantar. Não tinha vontade de continuar naquele lugar. A família foi ao centro para continuar contaminando suas retinas e seus ouvidos.

Eu liguei da hostería para minha amiga. Ela nem me deixou falar com as perguntas. Você visitou o “Museu dos Cáctus”? O “Rocsen”? Você foi ao Nono? Você conheceu alguém em “Natura” ah... Em “Q Disco”? Você ficou bêbada, jajaja. Conta! Fiquei sem palavras e cheia de lágrimas. Só lhe disse que voltaria para casa. Tentei sintetizar o que tinha acontecido. Aquilo levou vários minutos.

Estava decidida. Cuidaria das crianças naquela noite e pegaria um “Sarmiento” para a cidade de Córdoba. A verdade foi que brinquei com meus sobrinhos como pude porque as dores das

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queimaduras me limitavam bastante até para rir.

Nunca pensei que aquele convite me trouxesse ( trouxera )uma odisseia como aquela. De noite meditei sobre [respeito] tudo o que tinha acontecido e comecei a rir, às gargalhadas. Refleti sobre meu comportamento, embora voltasse para casa no dia seguinte. Durante a viagem de ônibus pensei que devia ter me organizado de outra maneira e ter feito as minhas próprias escolhas para desfrutar das merecidas férias.

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Um dia no campo

Laura Crespo

Essa sexta-feira não era uma sexta qualquer. O senhor Juan Gutiérrez, de 50 anos, a mulher dele, Rosa, e seus dois filhos, tinham pensado sair às sete da manhã para as montanhas, para aproveitar o dia ensolarado, e escolheram como destino Carlos Paz.

A viagem foi o averno mesmo! O calor no carro era terrível, pleno janeiro e sem ar condicionado no veículo, a estrada cheia de carros, todos na mesma direção. Piiiiiiiiiiiiiiiii, paaaaaaaaaaaaaaaaaaaa, poooooooooooo!! - as buzinas ressoavam entre as árvores e os enormes cartazes. Uma viagem de 2 horas acabou sendo de 4!

A família chegou no rio por volta das 10 horas da manhã. Não havia muita gente ainda. Estavam quase a sós na praia. Eles conseguiram um lugar embaixo de uma árvore que com certeza seria muito útil na hora de tirar uma soneca.

O senhor Gutiérrez colocou (estendeu) sua cadeira de praia no solo, tirou o jornal da sacola e aceitou o chimarrão que sua esposa Rosa lhe ofereceu. Assim passou a manhã toda, feliz

por (de) ter tomado a decisão de sair um pouco de casa. Mas o relaxamento não durou muito. Por volta do meio-dia já começaram a se escutar as vozes dos filhos dele:

- E o almoço? O que a gente vai comer? Paiêeeee, estou com fomeeeeeee....sanduíches??? Mas a gente quer é churrasco!!! Como aquela família!!!

Juan mostrou a sua melhor cara de paciência, e deu o gostosíssimo (riquíssimo) sanduíche para seus filhos que, diante da falta de outra coisa aliado à abundância de fome, tiveram que comer isso mesmo.

Já para as três da tarde a praia estava lotada de gente. O bonito espaço solitário embaixo da árvore, já não era tão solitário. Gente por todos os lados, até no topo das árvores e embaixo das pedras, e poucos lugares com sombra. E o calor era cada vez mais terrível. Quase 40º!!!!

Juan decidiu tomar banho. Caminhou até o rio e quando chegou....

- Meu Deus!!! O que é isto???

Onde está o rio? as águas cristalinas? Eu que tinha trazido o snorkel para mergulhar! A seca prolongada, de vários meses tinha afetado

o volume dos rios. A água lhe chegava até o tornozelo! Puxa!!!

Abatido pelo calor, o senhor Gutiérrez pensou em tirar uma soneca. Aah, como ele precisava de uma boa soneca!!! Mas no preciso momento em que colocava a cabeça dele no solo, começou a escutar um barulho, primeiro leeeve, e depois cada vez mais e mais perto.

Juan sabia perfeitamente o QUÊ provocava esse barulho, começou a ter arrepios, a suar...e de repente, um carro entrou na praia, cheio de jovens e estacionou a metros dele. Não tinha se enganado, suas suspeitas eram corretas: o barulho era o cano de descarga do carro.

A paz do senhor Gutiérrez tinha acabado. Com as janelas e portas abertas os rapazes colocaram a música a todo volume. TUNGA TUNGA TUNGA, CHA CHA CHA, PRRR, PRRR. Eles falavam alto, berrando uns aos outros. Além disso, eles estavam com o “fernet” e o refrigerante na areia ou no rio e todos os copos eles jogavam no chão. Uma sujeira!

Mas não era somente o barulho da música e a sujeira o que zangava Juan Gutiérrez. Ele era amante do rock, ele odiava esses ritmos!! Então ele olhava para os rapazes, falava shhhhhhhhhhhh

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cada vez que eles subiam o volume da música. Além disso, eles tinham só um CD, então as canções eram sempre SEMPRE as mesmas. Juan havia pensado em um dia de descanso e até agora, não tinha podido se relaxar. Estava super zangado.

Rosa via as cores da face do seu esposo mudar de branco a vermelho da raiva que ele tinha. Até fumaça parecia sair da suas orelhas! E ela já conhecia como estas situações acabavam.

-Tranquilo Juan, não se esqueça da pressão!!! não quero acabar no hospital!alertou a esposa

Já às 6 da tarde, o senhor Gutiérrez não suportava mais a situação e também preferia voltar cedo para evitar o trânsito na estrada.

Graças a Deus o regresso foi tranquilo e acalmou as águas agitadas. Finalmente Juan chegou em casa, deixou as sacolas no chão da sala, foi para o banheiro tomar banho e, de repente, distraído, começou a cantar:

- TUNGA TUNGA TUNGA, CHA CHA CHA, PRRR, PRRR

Sua esposa, na sala, chorava de tanto rir!

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Uma viagem “culturizada”

Eu queria escrever sobre diferentes questões representativas dos argentinos... -mas de que jeito?- pensei - então me lembrei de uma história que aconteceu com o meu avô e o filho dele -ou seja, com meu pai- numa viagem de trem...

O jovem, com tão só 16 anos de idade, tinha inquietação sobre o lugar onde morava. Queria aprender sobre o seu país; por isto, durante uma longa viajem de trem ia lendo um livro chamado “La cultura argentina”. Ao seu lado, encontrava-se o pai, um homem idoso que, após ter visto a capa do livro, curioso, perguntou ao filho...

- O que você está lendo, filho?

- É um livro sobre a cultura argentina–respondeu o rapaz

- Você acha que a cultura toda de um lugar pode ser colocada num pedaço de papel?perguntou ansioso o velho

- Eu acho que neste livro estão presentes os principais costumes que caracterizam os argentinos, como o tango, o mate, etc...

-me controlei, para não dizer – “tá brincando comigo rapaz?”, mas continuei:

- Filho, a cultura argentina não se limita somente a esses negócios, abrange mais do que você pensa - retrucou o velho

- Ah, sim? Poderia-me falar um pouco disso? – perguntou intrigado o jovem

- Eu vou falar- respondeu o velho- mas tem que entrar com o pé direito...em primeiro lugar tem que saber que não existe cultura única, existem culturas argentinas.

- (Pausa) ... O quê?

- Olhe: você já pode ter ouvido que o tempo todo relacionamos os argentinos com alguns costumes como o tango, o mate, o “asado”, o futebol, etc. Mas, na verdade, estamos deixando de lado questões mais importantes que fazem parte da construção da identidade argentina. -Sério?- disse o jovem.

- Pois é - assentiu o velho- essas questões são inúmeras manifestações que estão presentes no cotidiano das pessoas, mas é provável que eles também não as percebam.

- Como assim?

- Por exemplo, eu gosto do tango, e de como os dançarinos se deslizam por toda a rua “Caminito”, transmitindo uma magia

incomparável... mas ninguém pensou nas expressões típicas argentinas? Veja, volta e meia, quando os argentinos falam, ouço o “che”. Nessa simples expressão, já se podem encontrar traços linguísticos argentinos.

O “Che”, é uma marca inconfundível de argentinidade. Mas temos que esclarecer uma coisa, nós, os argentinos, geralmente não dizemos “che” a qualquer pessoa, só a aquelas com as quais temos confiança.

Continou o velho:

Do mesmo modo, acontece com outras expressões, como “Joder”, por exemplo, se um jovem rapaz diz para uma menina:

“Te estaba jodiendo!” faz referência a uma situação, alguma coisa divertida, mas “OJO” também pode-se referir a uma situação incômoda. Entendeu, meu garotão?

- Mais o menos...-respondeu o moço com um tom baixo

- Que cultura! Não entendo patavinas! Mas, não seria mais correto usar o verbo “bromear” em lugar de “joder”?

- Acontece que não se trata de que seja mais “correto”, mas sim de escolhas linguísticas de uma determinada esfera social, a qual vai mudando ou se adaptando

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e com o tempo. Por isso mesmo, não se espante, quando você ouvir palavras que parecem estranhas nesse contexto!- disse o velho homem

- Então, se eu digo “Posta” ou “boludo”, estou usando expressões que caracterizam os argentinos?

- É exatamente isso! Mas, onde foi que ouviu isso, filho?

- É a coisa que eu mais ouço. Quando meus amigos começam a falar, ou contar alguma história, sempre entra o “posta” ou “boludo”...

Por exemplo, se alguem diz: “- Ayer vi una vaca voladora

- Me estás cargando!

- Posta que no!”

- O “posta” funciona tanto para afirmar o que uma pessoa diz, quanto para segurar que tem razão.

- Entendeu, pai?

- Entendi…

- “posta?”

- “posta que si”

- O “boludo” é uma expressão muito usada. É comúm ouvir “che, boludo!” para referir-se alguém, funcionando como um simples vocativo – sugeriu o moço- Mas significa na verdade tipo bobo, tonto, mas

de uma forma mais amena.

O moço continuou:

- Agora estou entendendo tudo... mas então o mate não é importante? – insistiu o jovem

-Não misture alhos com bugalhos!respondeu o velho - não esqueça que antes falamos que o mate é um costume muito significativo... mas tem outros costumes com os quais podemos refletir. Use o artefato que tem sobre os ombros e pense... imagino q ali tem um monte de coisas das quais falar- diz o velho com um tom risonho

- o quê?

- a cabeça filho, use a cabeça!

- ahn... mas não me ajuda?- pediu o moço com uma expressão de dúvida no rosto.

- Pois não...- afirmou o velho

- O que você pensaria se eu dissesse que o jeito como as pessoas se cumprimentam é uma parte muito importante de nós?

- Eu pensaria que é uma brincadeira! O jeito de cumprimentar? – perguntou o garoto com um sorriso no rosto. -É, olhe, preste atenção- esclareceu o idoso- o cumprimento argentino é na

maioria dos casos um só beijo no rosto (embora seja, na verdade, um choque face a face mais do que um beijo), inclusive entre os homens, mesmo que dependa do grau de confiança. Mas tem que levar em conta que é uma questão regional, porque em alguns lugares os homens se cumprimentam com um aperto de mão... É parte do caráter acolhedor do argentino. Além das típicas expressões de cumprimento: ¡Buenos dias!, ¡buenas tardes!, e ¡chau!, ¡hasta luego!, que são expressões habituais de despedida. O mesmo acontece com a maneira como as pessoas brincam com os seus próprios defeitos (físicos ou pessoais)

- Mas velho, isso está presente em muitas culturas - disse o jovem

- É, mas na Argentina é uma questão muito delicada, já que todas as pessoas brincam desse jeito, e às vezes, isso pode incomodar as pessoas que não entendem o tipo de humor... é muito comum por exemplo ouvir que uma pessoa com um nariz muito grande, diga: “Yo no tengo la nariz grande, sino que tengo la cara muy atrás”… e assim por diante, outro exemplo pode ser uma pessoa com a cabeça muito grande que diga: -“Mi cabeza no es grande,

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sino que mi cuerpo es muy pequeño”.

- Papai.

- Que é?

- você tem o queixo para frente... eu poderia chamá-lo de “cara de balcón” ou “alfajor mal pegado”?

- não

- (silêncio)...

- me desculpe.

- está desculpado. Continuemos... Eu acho que essas e muitas outras questões poderiam caracterizar um pouco os argentinos... você tem que levar em conta também, que estas coisas variam de acordo com as pessoas e as situações nas quais se encontram...

Assim, continuou a conversa por muito tempo, até que se ouviu o barulho do trem que anunciava a chegada. Desse modo, os dois homens descenderam do trem e o velho ficou sorrindo já que sentiu que tinha podido ensinar sobre a “cultura argentina”. Mas, na verdade, ele sabia que ninguém pode ensinar tudo o que representa a cultura argentina, já que ela vai mudando com o passar dos anos. Será que em algum momento a cultura poderá ser reconhecida e valorizada em todos os aspectos que a conformam?

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O estresse e a nossa rotina

María Eugenia Sarrafian

Difícil não parar e pensar em qual é a receita perfeita para evitar o estresse na rotina do dia a dia. Será justamente essa a palavra em conflito? Rotina? O que fazer pra não cair nela?

Tentei pensar em algumas dicas para evitá-la.

Ligue a TV e com certeza vai achar um desses shows que para você “entender” tem que parar de pensar.

Pegue um livro desses famosos Best-seller de auto-ajuda escrito por algum jornalista reconhecido por ter participado na última maratona da sua cidade após vencer algum câncer. Descubra como ele venceu a doença mortal e você não consegue nem tirar essa tosse que ficou da ultima gripe.

Comece a planejar alguma coisa futura no seu matrimônio. Isso fará com que você crie ilusões e recrie a sua mente com planos e vontade de crescer. Vá ao banco e peça algum empréstimo, desses que acabarão sendo pagos pelos seus netos, a final de contas, são eles que usarão a casa

de fim de semana porque você trabalha até aos sábados.

Saia de casa, pare para conversar com o seu vizinho e com certeza acabará achando que os seus problemas não eram problemas, e regressará para casa feliz pela vida que tem.

Vá para a academia, pratique algum esporte, jogue futebol com os amigos, faça natação, dirá o médico, e no final do mês você até aprenderá a fazer malabarismos na hora de pagar o clube.

Nada melhor para sair da realidade do que comprar uma revista CARAS ou qualquer uma onde aparecem fotos de famosos passeando num fim de semana em Miami e gastando em média aquilo que você ganha em dois ou três anos de trabalho.

Estes são apenas alguns conselhos práticos para se afastar da sua realidade, mas você também pode tentar com qualquer atividade que implique pessoas fora do seu contexto e como sempre tem sido e será a melhor aliada, a televisão.

Ou, no meu caso, nadar uma hora e re-hidratar os meus neurônios...

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Trem das serras

por Stela Telvikas

Este fato está relacionado com a minha realidade, pois havendo deixado no Brasil minha família, que às vezes vem me visitar, e morando em Córdoba, uma cidade turística por excelência, sempre tem alguma coisa nova para conhecer. Tenho a felicidade de passar momentos inesquecíveis com ela, seja para matar as saudades ou pela oportunidade de conhecer novos lugares e paisagens que me oferecem o engenho do homem ou a mesma natureza. Fica sempre em minha memória algum momento especial de quando saímos para uma nova experiência, nova porque, sempre estou conhecendo diferentes lugares das belíssimas serras cordobesas, até contagio a minha família com essa curiosidade (à minha família).

Um dia o espírito aventureiro me invadiu e decidi, com minha prima, desfrutar o fim de semana que se aproximava. Considerando que em casa tenho muitos hábitos brasileiros, entrelaçados uns e outros, para mim também é normal descobrir frequentes novidades.

Não tendo vontade de dirigir nas estradas perigosas das serras e decidida a desfrutar ao máximo o passeio, resolvi fazer uma curta viagem e chegar ao destino proposto no “trem das serras”. Sai cedinho caminho ao Terminal de trem de Alta

Córdoba, “começando a larga romaria”, na fila, para comprar a passagem. Foi uma surpresa cumprir com a longa espera para a chegada do trem, maior ainda quando avisaram que havia poucas possibilidades de lugares disponíveis para viajar.

Esperei. O apito próximo avisou que o trem estava chegando. Grande foi minha surpresa quando estacionado o trem e abertas as portas de acesso ao público, a correria foi grande, e a fila? Sumiu. Deixando a imagem conhecida, de quando os animais agitados (alvorotados) se desesperam procurando a liberdade, como os bois bravos na fazenda. Para a nossa felicidade (nossa) muitos nos empurraram e caímos dentro de um espaço minúsculo, abafado, com pessoas, mães e crianças sentadas no chão e empilhadas umas ao lado das outras. Que felicidade! O trem nos recebera. Conseguimos o primeiro objetivo: um assento! Olhando em volta veio a minha mente a lembrança da frase “apertados com sardinhas na lata”.

Começou a aventura, longe estava o panorama desejado e esperado. Vi pela janela uma saída da cidade desolada e triste.Esperava que o conforto e a beleza serrana estivessem em meu caminho.

Meus companheiros de viagem, alguns turistas, outros do lugar estavam tão surpresos como minha prima e eu. Um aroma desagradável invadia o ar. O barulho ensurdecedor me confundia, a paisagem não aparecia. Ainda bem que uns portenhos muito amáveis, longe da imagem que tínhamos da soberbia dos capitalinos, aproximaram-se para manter um diálogo, compartilhando suas penas com as minhas. Na conversa deram indicações de lugares interessantes para ser conhecidos em Buenos Aires, como: o Cabildo, a Praça de Maio, a Catedral, o Café Tortoni, La Boca e o Caminito, motivos para uma próxima viagem.

Com novos amigos e uma conversa agradável a viagem transcorria mais amena. A lentidão do trem não impedia que vagarosamente chegasse a destino. Oh! Que alegria! Tudo é silêncio, o trem parou (o trem). Uma voz transmitia um amável convite para descer e admirar a paisagem tão esperada, transformando o dia triste numa grandiosa paz que envolvia a todos.

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O curso d’água que corria tranquilamente, lá embaixo, fazia esquecer os dissabores que vinha vivendo até aqui. Seguimos nosso caminho, novo ânimo me invadia e deu forças para seguir cumprindo com a missão da viagem. Renovados, permitimos que a contagiante alegria começasse a reinar no ambiente, interrompida pelas crianças que impacientes e cansadas começaram a choramingar pedindo alimento, água e ir ao banheiro. Umas gritavam, outras estavam emburradas. Que beleza! O inferno dentro do paraíso. As sensações variadas eram vertiginosas, queria que tudo acabasse o mais rápido possível. Deus ouviu minhas súplicas: estava chegando.

Nova correria me esperava: as portas do trem se abriram e “pernas pra quem te quer” , toda velocidade era pouca par fugir deste suplício. Quando livres, pude respirar o ar puro e admirar a beleza de Cosquin, fiquei absorta contemplando o Edem depois do Inferno. Valera a pena tantas penúrias de uma viagem curta e desagradável. Primeira experiência realizada.

Disposta a explorar e conhecer o que fui procurar comecei o passeio na praça central desfrutando de um gostoso

sorvete artesanal. Que paz! Contínuamos procurando as águas recuperadoras do rio, quando aparece a Praça Próspero Molina, sede do Festival Nacional de Folclore de Cosquín, acompanhada da igreja localizada na calçada enfrente passeios destacados do roteiro que havíamos traçado.

Conhecendo lojas de artesanato, continuei a descida lembrando que “na descida todo santo ajuda”. Andei sem medir a distância até que uma ponte avisou que aí estava o rio . Dada a hora, a fome chegou. Qual não foi meu espanto ao ver que minha bolsa que trazia nossos recursos não estava. Entre que sim e que não, pensei que a mesma tinha ficado na sorveteria. Voltar correndo penosamente na subida, sob um sol abrasador, foi a única reação. Chegando, com muita sede, suor e “lágrimas” fomos recebidas pela vendedora que tinha guardado a bolsa.

O que fazer? O desalento me invadiu, não queria mais nada. Minha casa era a única meta que queria alcançar. Minha prima implorou: “voltemos para casa”. Como? Claro... de ônibus, por favor! Foi a melhor parte do passeio.

A VOLTA. Fiquei encantada com a vista do Dique São Roque, localizado no Vale de Punilla, obra majestosa do homem,

combinada com a beleza natural das águas que alcançam alturas incríveis. Voltar às serras? Sim, nunca no verão e de trem. Foi um dia inesquecível com muitos tropeços, mas passado o tempo ainda estamos rindo dos imprevistos vividos.

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Só Maradona?

Não, só desconhecimento cultural.

Lourdes Zanotti

Se há uma questão mundial que eu nem compreendo nem aceito é o fato de que o nosso país e a nossa cultura sejam reconhecidas só pelas mesmas questões turísticas de sempre; o tango, a carne assada na grelha chamada de “asado” , as deslumbrantes mulheres e o “venerado e histórico” Maradona; porque a nossa cultura é um mundo amplo e maravilhoso, com muitas questões para oferecer e ainda para conhecer.

Para a minha decepção, no verão passado eu acabei de compreender que o único ícone pelo qual somos conhecidos em outros países é por esse personagem de futebol e ainda mais, há pessoas que nem sabem onde fica o nosso país.

O verão começava e com pais decidimos ficar uns dias na casa da minha tia, aqui em Córdoba. Dois dias depois chegou a minha prima da Canadá com seu namorado. O canadense chegou de férias na manhã do sábado sem ter ideia do lugar onde estava. Era a primeira vez que o loiro colocava um pé na Argentina e nem sabia

dizer “Dónde está el baño?”Estrangeiro sem saber se comunicar é o inocente alvo de brincadeiras, imagina?

Depois de dois ou três dias começamos a nos compreender, se podemos falar de uma compreensão alcançada com gestos e sinais e, da maneira em que eu conseguia, explicava para ele quais eram os nossos costumes. Do mesmo jeito ele tentava me explicar quais eram os seus; enfim, parecia um bate papo de um surdo e um mudo. A primeira coisa que eu perguntei para ele quando consegui que me compreendesse foi:

- Você já conhece alguma coisa do nosso país?

- Sim, conheço o Diego Armando Maradona, o melhor jogador de futebol do mundo, - respondeu ele orgulhoso de seus “amplos” conhecimentos.

- Eu sei que a sua bolha social é maneira, mas, vocês sabem que fora de sua atmosfera de primeiro mundo existem outras pessoas, outros costumes, outras histórias? - não sabe que o nosso país e a nossa cultura é muito mais do que só Maradona? - rerguntei nervosa.

- Não!Respondeu-me com cara de compreender pouco e nada o meu sarcasmo

- Lá, em nossa bolha social, como você diz, nem sabemos em que lugar do hemisfério fica a Argentina. O único motivo pelo qual a gente pode conhecer é pelo jogador de futebol e pelo tango.

Nesse momento, compreendi que era hora de fazer algo pela nossa cultura; como falam aqui, toda mudança começa por cada um de nós. Comecei então a explicar para ele muito devagar algumas crenças do povo argentino e os rituais que são feitos no país, levando em conta as origens dessas crenças e a região à qual se faça referência; uma questão para mim muito interessante para ele aprender e obviamente para espalhar pela sua “bolha social”.

A pesar das dificuldades linguísticas e de observar uma realidade totalmente diferente da sua, o canadense mostrou curiosidade para conhecer um pouquinho mais da nossa Argentina, de maneira que eu continuei ensinando-lhe com entusiasmo. Entre mates e os nossos bolinhos chamados de “criollitos” eu estive a tarde inteira contando, entre outras coisas, sobre a “Pachamama” e “Kuyen”. Enquanto isso, ele escutava com atenção, às vezes sem compreender; depois de tudo, os nossos costumes vêm com palavras e

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nomes que até a gente fica perdendo o fio, não acha?

- Você escutou alguma vez sobre alguma Deusa da terra? - perguntei para ele.

- Não! - respondeu rindo, achando que era uma brincadeira, - de que Deusa você tá falando? Para nós Deus é Deus e pronto.

Viu como é o estrangeiro de um país mais avançado? Sai um minutinho de sua atmosfera de primeiro mundo e fica mais perdido que cebola em salada de fruta.

- Invenções? Você está achando que a Pachamama é uma invenção nossa? Não senhor, - expliquei com paciência, - a Pachamama aqui e, sobretudo no norte do país, é uma crença à qual o povo esta muito aferrada. A Pachamama é a deusa fêmea da terra e da fertilidade; uma divindade agrícola benigna, concebida como a mãe que nutre, protege e sustenta os seres humanos. É uma Deusa muito respeitada, você tem que saber isso.

- Então têm deuses para escolher? Que legal! - Perguntou ele simulando ingenuidade.

- Algo assim, - respondi e expliquei de um jeito mais claro para que ele não se

enganasse- cada cultura, dependendo de suas origens, tem seus deuses e deusas, as pessoas dessas culturas não as escolhe, simplesmente dá continuidade a sua herança cultural. Por exemplo: assim como no norte eu falei que a “Pachamama” é a deusa da terra e da fertilidade, no sul encontramos a “Kuyen”. Ela é a Deusa da lua para os “mapuches”, considerada mãe controladora das águas e do feminino, protetora dos sonhos e testemunha da luta que os “mapuches” têm permanentemente com as forças do mal. Esta Deusa tem uma relação muito estreita com as mulheres “mapuches”, já que é a deusa da fertilidade. Assim, cada cultura aborígem deixou seu legado, - Entende?

- Sim! agora sim!- respondeu ele com mais entusiasmo.

Depois de conversar toda a semana, tentando que o lourinho aprenda sobre a nossa cultura e sociedade, eu consegui o meu objetivo, dar a conhecer um pouquinho de nós; e o estrangeiro voltou para a sua bolha de sempre, mas agora, totalmente apaixonado pela Argentina. Nesse momento, eu senti que tinha feito algo tanto por ele quanto pelo nosso país. No dia da sua partida, ele falou para mim que as pessoas argentinas que

moravam lá tinham muito pouco conhecimento da sua própria cultura, já que quando ele pedia para elas contarem algo da cultura argentina falavam sempre das mesmas questões: do tango e do futebol; parece que falar do Maradona dá muito orgulho fora do país. Mas, percebi que não era uma questão de emigrante, que aqui acontece a mesma coisa, que as pessoas só se orgulham da sua argentinidade no momento do futebol e fazendo referência sempre à “abençoada mão de Deus de 1978”.

Acho que o fato de refletir sobre a nossa cultura e a tarefa de desenvolvê-la um pouquinho mais é uma questão que nos envolve a todos; depois de tudo, gente, somos um país com quase dois milhões e oitocentos mil metros de superfície, quarenta milhões de habitantes, vinte e seis províncias e mais de vinte povos originários, vocês acham que os únicos assuntos que temos são o tango e o Maradona?

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O Verão nas serras cordobesas

O verão sempre tem aquele saborzinho/gostinho regional, temos as praias do litoral de Buenos Aires, as paisagens do nordeste (Salta e Jujuy), as montanhas em San Luis, e, particularmente, as serras de Córdoba. É lá que encontramos essas paisagens de cartão postal, a serra, os rios, riachos e cachoeiras... Mas por que será que apesar de toda essa beleza natural insiste-se em mudar a paisagem e os lugares passam a se chamar “praias” ou “paradores”, como uma réplica dos pontos marítimos? As paisagens naturais são modificadas até o ponto da sofisticação, em um jogo de simulação, o fundamental é parecer ou semelhar o litoral ,que é mais chique, né?

E o pessoal que visita esses “paradores”?

Tem que estar à altura do lugar; as mulheres vestindo roupas de grifes sofisticadas e com um super bronzeado. E os homens? Só podem ser aqueles rapazes bombados, surfistas (e as ondas, onde é que estão?) e também aqueles que estão ligados 24 horas com as netbooks.

Mas esse é só um dos retratos do verão nas serras. Temos outros, o dos turistas classe econômica, aqueles que vão à “praia” ou “parador” como se estivessem fazendo uma mudança de casa. Levam de tudo, até a escova de dentes...São aqueles que aproveitam o dia como se fosse o último de suas vidas, comem, jantam, dormem, ficam tão à vontade que parece que estivessem em casa. Só abandonam o lugar quando acabam definitivamente os provimentos ou o pessoal fica tão assado, que acaba sofrendo queimaduras de 3º grau... Ainda podemos reconhecer um terceiro grupo ou estereótipo de turista, o “magrão”, o hippie mesmo, ele monta a barraca em qualquer lugar, numa boa, e curte a vida sem incomodar ninguém. Só que ele fica tão à vontade, no seu próprio mundo , que às vezes esquece do resto dos mortais que não têm porque ficar suportando determinados hábitos (precisa ficar fumando maconha o dia inteiro?)

E por último há as crianças em época de verão... Que gracinhas!!! As crianças são o empecilho natural para que os adultos desfrutem do merecido descanso nas serras...É que os cuidados para com as crianças são redobrados, é protetor, é repelente, é chapeuzinho. Deus nos livre! E

a garotada? Eles também contribuem para tornar as férias dos adultos (tanto dos pais quanto dos adultos que os rodeiam) uma verdadeira roda viva, eles não querem descansar coisa nenhuma , só querem agito.

Mas o verão é assim mesmo, cada um o celebra do jeito que quer ou ... do jeito que pode.

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