RIVista

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Siderúrgica Nacional: crescimento, economia e política.

EntreVista: Juliano Custódio Sobrinho

Perfil, O cidadão Kane e mais.

CSN Companhia Siderúrgica Nacional: uma decisão política



Opinião Pag.03 Videoteca Pag.05 Perfil Pag.06 EntreVista Pag.07 História Pag.10 A Companhia Siderúrgica Nacional Pag.10 CSN: As Negociações Pag.13 Impactos da CSN em Volta Redonda Pag.17 Os Impactos Sociais Pag.22 Humor á Vista Pag.25

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ma reportagem especial desta edição de RIVISTA reflete a história da Companhia Siderúrgica Nacional, a CSN, dentro de seu contexto histórico, bem como as negociações e barganhas inerentes à sua implementação, além das mudanças no território de Volta Redonda decorrentes da siderurgia e as mudanças sociais que ocorreram na cidade, representantes do grande impulso industrial que ocorreu no Brasil entre as décadas de 1930 e 1950, tendo como percussor o então presidente, Getúlio Vargas, que com uma política nacional, abriu portas para o desenvolvimentismo e a industrialização de base, que viria a ser uma nova força econômica do país, que até então se via na condição de

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Redação: Diretor de Redação: Henrique Viana _____________ Editora Chefe: Iasminy Antunes

agrário-exportadora. A economia do país no momento em que Getúlio Vargas se instalou no governo, após a Revolução de 1930, estava marcada pelo impacto da depressão mundial causada pela crise de 1929. Tornou-se clara a vulnerabilidade da economia brasileira, por sua total dependência em relação ao mercado externo do café. A amplitude do choque alertou para a necessidade de adaptação à nova realidade internacional, mesmo se mantendo a defesa do café. Tudo indicava que o caminho era a industrialização. A vinda da siderurgia propiciou uma grande evolução, tanto industrial quanto urbanística no país, principalmente em Volta Redonda, que se encontrava vinculada à produção agrícola. Ao assinar, em 30 de janeiro de 1941, o

decreto-lei determinando a criação da Companhia Siderúrgica Nacional, Getúlio Vargas encerrou uma longa etapa da história da implantação da siderurgia no Brasil. Conhecida como C i d a d e d o A ç o , Vo l t a Redonda começara a depender da siderurgia para seu desenvolvimento econômico.


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Opinião:

CSN: uma decisão política.

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C S N contribuiu para que houvesse, de fato, uma industrialização no país, através das políticas consolidadas pelo então presidente Getúlio Vargas. A siderúrgica foi o grande marco industrial do Brasil, pois antes este era um mero exportador de matérias primas, o que propiciou uma grande evolução, tanto industrial quanto urbanística no país, principalmente em Volta Redonda. Através de uma negociação com os Estados Unidos, Vargas conseguira com que aquele país norteamericano financiasse a construção de uma siderúrgica, que acabaria servindo para o desenvolvimento do país. Essa negociação deixou Vargas um tanto quanto dividido, pois o mesmo também tinha algumas afinidades com a Alemanha de Hitler, inimigo dos EUA naquela época turbulenta da 2ª Guerra Mundial. Assinado o tratado com os EUA, a CSN fora criada c o m o i n t u i t o desenvolvimentista do Brasil, porém a ação não foi uma

simples ajuda, tendo o Brasil um preço a pagar: o estreitamento dos laços comercias com os EUA. Esta aliança significou uma dependência econômica, industrial e cultural com aquele país, sendo percebida até os dias atuais. Getúlio era um homem de caráter autoritário, porém teve uma incrível aceitação popular por dialogar e se comprometer com todas as classes sociais, fazendo desde acordos com as elites agrárias às classes trabalhadoras. Vargas foi conhecido na época como o “pai dos pobres” por consolidar os direitos reais dos trabalhadores como o 13º salário, a regulamentação das jornadas laborais e o direito a férias. Contudo, a Era Vargas foi o símbolo de um governo que prometia transformar o país, tirando-o da situação de simples país agrárioexportador e introduzindo-o no g r u p o d e p a í s e s industrializados. De certa forma o fez. A cidade de Volta Redonda – antes pertencente ao município de Barra Mansa – foi a maior beneficiada da siderúrgica, passando por um intenso processo de

urbanização, o que propiciou uma migração interna e a sua própria emancipação. Aquela região, antes da construção, encaminhava para uma profunda decadência devido às suas elites ineptas que eram voltadas ao passado e agarradas às reminiscências de uma condição de prosperidade e de riqueza, que se perderam com o fim da lavoura cafeeira, os quais a pecuária não conseguiu trazer de volta. A escolha de Volta Redonda foi uma mera estratégia política utilizada pelo genro de Vargas, o Comandante Ernani Amaral Peixoto, o então interventor do Estado do Rio de Janeiro. Volta Redonda representou um novo modelo de sociedade, onde um passado de decadência foi deixado para trás, construindo assim, um novo e futuro promissor para aquela região. Hoje é uma das mais importantes cidades industriais do país, sendo o principal polo siderúrgico do Brasil.

Por Henrique Maia Viana e Iasminy Antunes Muratori



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Videoteca:

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presente resenha visa comentar sobre o filme “Cidadão Kane”, de 1941, baseado na obra de Orson Welles, que conta a história de vida do jornalista fictício Charles Foster Kane, papel interpretado pelo próprio Orson Welles. Como observação, esta resenha contém um resumo do filme. O filme tem início com a morte do milionário jornalista Charles Kane, que em seu leito de morte pronuncia sua última palavra antes de morrer: “Rosebud”. Um grupo de jornalistas inicia, assim, uma investigação sobre a vida pessoal de Kane a fim de descobrir o significado da palavra. São os relatos dos velhos conhecidos da vida de Kane que levam o espectador a conhecer a história do empresário. O espectador tem conhecimento da vida de Kane através dos fragmentos de momentos de sua história, desde sua infância, quando morava com sua mãe em um humilde pensionato no interior, até seus últimos momentos em sua luxuosa e opulenta mansão. É relatado que a mudança na vida pacata de Foster Kane ocorre subitamente, quando sua mãe recebe como pagamento de um pensionista as escrituras de uma mina supostamente sem valor. Mas o fato era que a mina estava cheia de ouro e isso rende à família uma fortuna incalculável. Kane, então, é

tirado do convívio de seus pais e levado para ser educado por um grupo de empresários, que o moldam para a vida pública dos magnatas do poder. Cedo Kane compra um modesto jornal e passa a se tornar um jornalista implacável e impetuoso. Sua vida se torna recheada de jogos de interesse, luxo e fama. Em sua velhice, Kane manda construir para si uma enorme e esplendorosa mansão, batizada de

“Xanadu”, em homenagem à mítica cidade asiática, conhecida por seus poetas como a capital do prazer. É lá que, isolado de tudo e de todos, morre, deixando para os personagens do filme o enigma de sua última palavra. O filme termina e ninguém revela o mistério de “Rosebud”. Somente ao espectador é revelado o significado da palavra, aos últimos segundos do filme, o que o leva à reflexão não durante, mas após o término do filme. A crítica tomou

esta obra de Welles não só como um marco na história do cinema, quanto ao roteiro, filmagem e cenário, como a consideraram mais tarde como o melhor filme da história do cinema de todos os tempos. Em “Cidadão Kane”, Welles faz com que o espectador seja o grande privilegiado, porque só este descobre o verdadeiro sentido da vida de Kane, enquanto ninguém na trama jamais descobrirá. Isso também significa que é preciso estar fora da história para compreendê-la por completo. A vida só ganha sentido após a morte, mas não para os participantes da história, mas para o espectador, que é também o único a ser totalmente excluído da trama, e é por isso que ele está privilegiado. Aliás, quando o espectador assiste ao filme pela primeira vez ele ainda está participando da trama, em seu papel de espectador. Porém, o mistério só é revelado no final, quando a trama acaba, e o espectador só ganha o conhecimento quando o filme também já está encerrado, junto com o personagem e seu segredo. Desse modo, o próprio filme, assim como o sentido da vida, só é revelado e só pode ser compreendido e refletido quando se está consumado. Henrique Maia Viana e Iasminy Antunes Muratori


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Perfil RIVista:

NOME: VARGAS, GETÚLIO

Cargos políticos: *dep. fed. RS 19231926-; min. Faz. 1926-1927; pres. RS 1928-1930; rev. 1930; pres. Rep. 19301945; const. 1946; sen. RS 1946-1949; pres. Rep. 1951-1954.

G E T Ú L I O D O R N E L L E S VA R G A S Advogado, nascido na cidade de São Borja, estado do Rio de Grande do Sul, em 19 de abril de 1883. Iniciou sua vida política como deputado estadual (1909 - 1912; 1917 - 1921) pelo Partido Republicano Rio Grandense (PRR), e na mesma legenda foi indicado e eleito, em outubro de 1922, à Câmara dos Deputados e, em 1924, reeleito deputado federal (1923 - 1926). Com a posse do presidente Washington Luís, em 15 de novembro de 1926, assumiu a pasta da Fazenda permanecendo no cargo até dezembro de 1927. Eleito presidente do Rio Grande do Sul

tomou posse em 25 de janeiro de 1928. Em agosto de 1929, formou-se a Aliança Liberal, coligação oposicionista de âmbito nacional que lançou as candidaturas de Getúlio Vargas e João Pessoa à presidência e vice-presidência da República, respectivamente. Derrotado nas urnas pelo candidato paulista Júlio Prestes, Vargas reassumiu o governo do Rio Grande do Sul, e articulou o movimento de deposição do presidente Washington Luís, que culminaria com a Revolução de 1930. Após o exército da junta governativa, Getúlio Vargas tomou posse como chefe do governo provisório em 3 de novembro de 1930. Com a promulgação da Constituição de 1934, foi eleito presidente da República pela Assembléia Constituinte. Em 10 de novembro de 1937 anunciou a dissolução do Congresso e outorgou nova Carta, dando início ao Estado Novo. Governou o país até ser deposto, em 29 de outubro de 1945. Elegeu-se senador (1946-1949) na legenda do Partido Social Democrático (PSD) e concorreu às eleições presidenciais de 1950 pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), agremiação que fundara em 1945. Vargas recebeu 48,7% dos votos, vencendo por larga maioria seus opositores, e tomou posse em 31 de janeiro de 1951. Suicidou-se, no Rio de Janeiro, em 24 de agosto de 1954.

Ao fundo, os próceres da República que circulavam nos arranjos políticos com possibilidades de algum sucesso eleitoral. Ao centro deles, o presidente com o seu peculiar charuto, a sorrir e iniciando diálogo com os presentes. Em primeiro plano, observam-se os nomes dos personagens grafados numa suposta descompostura estética. No entanto, na parte central dos nomes, o olhar vê, de forma saliente, a composição vertical de um código que se mostra intencional: Getúlio. E, ao tempo em que o mesmo toma para si todas as atenções, fala e demonstra: "– Sim, haverá 'sucessão', isto é, sucesso grande! O vencedor está entre esses nomes"

A morte de Vargas reverteu, no plano simbólico, a situação política que poderia tê-lo conduzido à renúncia, levando o povo às ruas em defesa do “país dos pobres”. Disponível em : Os P re s i d e n t e s e a R e p ú b l i c a . <http://www.portalbrasil.net/politica_ presidentes_vargas.htm>, Acesso em: 24/10/2010. Disponível em: VARGAS, Getúlio. <http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/ BuscaConsultar.aspx>, Acesso em 3/11/2010. Disponível em: Revista Brasileira de História. Representações cômicas da República no contexto do Getulismo. <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_a r t t e x t & p i d = S 0 1 0 2 01882001000100007#FIG01>, Acesso em: 24/10/2010.


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EntreVista:

Um Salto para a Industrialização.

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ntrevista com Juliano

Custódio SobrinhoBacharel

em História – UFJF

Te l :

(11)

8184-0690

Entrevista concedida dia 30/11/2010 às

19:32

via

telefone

Juliano Custódio Sobrinho é formado em História pela UFJF, com mestrado em “Processos Abolicionistas no Brasil” e, atualmente, doutorando pela USP - Universidade de São Paulo

industrialização e urbanização do país. Foi na Era Vargas que a industrialização ganhou fôlego, por representar um marco na política brasileira, pois deu ao país um salto progressista urbanístico muito significativo. A começar pela cidade de Volta Redonda, que antes, pertencente ao município de Barra Mansa, sofreu uma profunda reestruturação urbana e industrial, onde atraiu novos trabalhadores de todo o país, formando uma moldura de sua população. RIVista - Qual o papel de Getúlio Va r g a s n a i m p l a n t a ç ã o d a siderurgia?

RIVista - Qual a importância da CSN no cenário interno brasileiro? Juliano - A CSN representa um marco no setor da produção de base por ter sido a primeira siderurgia brasileira, além de ter representado um marco na

Juliano - Getúlio teve um grande papel como percebedor político, pois tinha ciência das necessidades em que o Brasil precisava naquele momento, sabendo inclusive, barganhar com os Estados Unidos, em um momento muito instável entre Guerras Mundiais. Getúlio também era uma figura muito carismática e dúbia, pois criou uma condição para que o B r a s i l p u d e s s e c r e s c e r, i m p l e m e n t a n d o u m p ro j e t o progressista sendo um grande articulador político. Não deixando de atender aos interesses das camadas elitizadas da população, Getúlio também consolidou as leis

trabalhistas para a classe trabalhadora, como o direito a férias, décimo terceiro e a escalada laboral. RIVista - O que representou a CSN pra o Brasil, levando em conta seu posicionamento político e o alinhamento com os Estados Unidos em um período em que culminava a II Guerra Mundial? Juliano - Para o Brasil, a CSN representou um avanço nas indústrias de base, pois o país deixara de exportar minério, sendo sua 1ª matéria prima. Naquela época o país não tinha uma indústria pesada, o que tornava o país um mero exportador. Ao criar uma indústria nacional, o país não precisou mais exportar, o que deu um grande avanço à industrialização. E isso, também, fortaleceu o 3º setor - o comercial por ter gerado empregos nas construções, fazendo com que o dinheiro circulasse. Em relação aos Estados Unidos, significou um estreitamento dos laços com o Brasil, o que significou uma dependência econômica, tecnológica, industrial e, de certa forma, uma influência cultural, o que prejudicou um pouco o desenvolvimento da indústria nacional. Os Estados Unidos utilizaram este mesmo


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estreitamento comercial com os outros países da América Latina, por ser um grande exportador e importador de produtos alimentícios/agrário. RIVista - Você considera que a CSN foi uma importante ação na Era Vargas? Por quê? Juliano - Sim, pois impulsionou um setor que antes era inexistente no país, ajudando também no processo de urbanização, gerando fortalecimento político do próprio presidente Vargas. Getúlio ganhou uma grande projeção política pelos seus feitos, atendendo os interesses dos grupos urbanos, pois

transitava entre várias camadas da população, desde os operários às elites agrárias, que representava uma política conservadora naquela época. Getúlio foi uma presidente que buscou consolidar boas políticas com todas as classes, pois sabia que atendendo a todos, manteria uma boa popularidade, embora tivesse um caráter “autoritário”. RIVista - Quais as principais ações que você considera como responsáveis pelos investimentos feitos para a construção da siderurgia no Brasil?

Juliano - A CSN representou para o

Brasil uma política com um projeto de industrialização, um projeto de urbanização dos setores da sociedade brasileira, a criação de um maior processo de capacitação profissional, uma política externa de procura de parceria e o impulsionamento de um setor industrial que criasse bens de consumo interno. Contudo, podemos dizer que a CSN foi o marco do processo de industrialização do país, passando de um período de exportação agrária para o início de uma grande revolução industrial.



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História:

A Companhia Siderúrgica Nacional

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economia do país no momento em que Getúlio Vargas se instalou no governo, após a Revolução de 1930, estava marcada pelo impacto da depressão mundial causada pela crise de 1 9 2 9 . To r n o u - s e c l a r a a vulnerabilidade da economia brasileira, por sua total dependência em relação ao mercado externo do café. A amplitude do choque alertou para a necessidade de adaptação à nova realidade internacional, mesmo se mantendo a defesa do café. Tudo indicava que o caminho era a i n d u s t r i a l i z a ç ã o (www.fgv.br/CPDOC). Analisando o momento político do país na década de 20, podemos entender que ele era benéfico para a intervenção estatal, já que o Governo Vargas era de característica autoritária, composto por uma ditadura e desde sua formação já estudava a ideia de um processo de industrialização para o desenvolvimento nacional. Mesmo o Estado sendo o principal agente e único que poderia tocar pra frente o grande projeto para a industrialização de base, ele necessitava buscar recursos, principalmente técnico e financeiro, no exterior (MOTTA,

2007). O empréstimo vindo do exterior era a única opção possível para o financiamento da grande indústria siderúrgica, pois segundo Draibe (2004), o empresariado em formação no país não se interessava e nem tinha condições de empreender o projeto da grande indústria e o Estado Nacional ainda estava se formando, com a criação de órgãos reguladores, reformas tributárias e legislativas dentre outras modificações empreendidas por Vargas em seu governo, não tendo assim condições de tocar sozinho o projeto de industrialização (MOTTA, 2007). No caso da implantação da Companhia Siderúrgica Nacional, Getúlio Vargas se utilizou do momento da guerra que o mundo atravessava para conseguir esse apoio externo à industrialização. Assim, num primeiro momento, Getúlio ensaiou uma aproximação com a Alemanha nazista. Por ser governo autoritário, ditatorial e nacionalista, assim como a Alemanha de Hitler e a Itália de Mussolini, a aproximação entre os países se mostrou possível e um caminho bem curto para o financiamento (MOTTA, 2007). Nos anos que se seguiram à

crise de 1929, a utopia liberal perdera espaço nos Estados Unidos e na Europa. A crença na autoregulação do mercado cedia lentamente lugar à ideia da intervenção estatal na economia. Além de marcarem presença nos países que compunham o núcleo central do capitalismo, as doutrinas de “planejamento” alimentavam as experiências de “socialismo real”, fazendo crescer o “mundo socialista”. As décadas de 1930 e 1940 são marcadas ainda pela ascensão do fascismo e o seu acaso com a vitória dos aliados sobre o eixo na segunda grande guerra (PEREIRA, 2007). No Brasil, o regime que se instaurou a partir de 1930, representado pela chamada Era Vargas (1930 - 1945), representaria transição econômica de um modelo agroexportador para a produção industrial. Mais do que um mero indutor do desenvolvimento, o estado assumia a partir de então um papel fundamental na organização e regulação da sociedade (PEREIRA, 2007). A Companhia Siderúrgica Nacional foi fundada em 1941 como parte de uma estratégia política e econômica mais ampla que reservava ao Estado o papel de gestor e empreendedor da


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industrialização. A instalação da indústria de base, juntamente com a defesa das riquezas do subsolo e o reaparalhamento militar encontravam justificativa nas “bandeiras” do “nacionalismo” e da “defesa nacional” pelas quais se pautava o Estado ao longo do período Vargas (MOREL, 1989:5). O Ministro Oswaldo Aranha entendia sua missão em termos de mostrar ao governo norte-americano a extensão das necessidades econômicas e de equipamento militar do Brasil, a urgência no estabelecimento de acordos práticos; e ao mesmo tempo desejava sentir até onde a “cooperação americana” poderia ir. Suas dúvidas sobre a disponibilidade americana fundavam-se na insistência daquele governo no laisser-faire no comércio exterior, quando esse liberalismo clássico já tinha sido abolido pelo New Deal dentro dos próprios Estados Unidos, como observou nessa ocasião. Segundo o chanceler brasileiro, a poítica puritana da boa vizinhança precisava dar lugar a uma política mais prática de criar mercados e aliados naturais grandes e fortes na América, visto que, se os Estados Unidos não o quisessem, outros Estados estavam dispostos a fazêlo (MOURA, 1980). Em outras palavras, o chanceler brasileiro agitava a bandeira da competição alemã para

obter a assistência americana, mas ele próprio participava daquela corrente que se opunha ao “industrialismo” no Brasil. E as questões que ele levou à discussão com as autoridades norteamericanas ficavam aquém das proposições de “industrialização limitada” do Brasil no interior do governo Roosevelt. A visão do Ministro Aranha combinava perfeitamente com a abordagem “primário-exportadora” a propósito das relações econômicas entre Brasil e Estados Unidos (MOURA, 1980). A ideia de que o Brasil estaria destinado a ser uma grande potência não nasce do “milagre econômico” dos anos 70. Três décadas antes, mais precisamente em 1943, o então ministro das Relações Exteriores, Oswaldo Aranha, imaginava que o Brasil deveria tornar-se uma das “Maiores potências econômicas e militares do mundo” (MOURA, 1991). É possível distinguir nos anos 40 um movimento pendular na percepção brasileira do sistema internacional: em certos casos os dirigentes hiperdimensionavam as possibilidades da presença brasileira no mundo e os resultados eram o discurso grandioso e a atuação pífia (MOURA, 1991). O Brasil, com suas dimensões continentais e seu gigantismo, sempre almejou, uma posição internacional de destaque. Embora tenha havido muitas vezes

frustrações, o país sempre se manteve na expectativa de se tornar uma potência (MOURA, 1991). A era Vargas foi uma era de desenvolvimentismo em que tirou o rótulo de “nação agrária” e inseriu-a no âmbito de “nação industrial”. Neste período, a nação passou por profundas transformações, tanto sociais quanto econômicas. Podemos dizer que o período mais marcante da Era Vargas foi o alinhamento com os EUA e a criação da CSN. A CSN foi criada durante o Estado Novo, por decreto de Vargas, após um acordo diplomático chamado Acordos de Washington, entre o mandatário brasileiro e o presidente dos EUA, Franklin Roosevelt, que ocorreram após a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial em 1941, que por sua vez, necessitava do apoio estratégico do Brasil e demais países das Américas. Esta conferência, que aconteceu em janeiro de 1942, orientou a ruptura das repúblicas americanas com os países do Eixo. Os acordos selaram em princípio um empréstimo de 100 milhões de dólares para a modernização e implantação do projeto siderúrgico brasileiro, além da aquisição de material bélico no valor de 200 milhões de dólares. Esses acordos foram decisivos para a criação da Companhia Siderúrgica Nacional e da Companhia Vale do Rio Doce. A siderúrgica teve o intuito de fornecer aço às nações aliadas,


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Oswaldo Aranha na III Reunião dos Chanceleres no Rio.

durante a Segunda Guerra e diante os tempos de paz, ajudar no desenvolvimento do Brasil (MOURA, 1991). Embora tenha sido idealizada no governo Vargas, foi somente no governo de Gaspar Dutra, em 1946, que a siderurgia veio definitivamente à operação. A criação da siderurgia foi fundamental para o desenvolvimento da cidade de Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro. Conhecida como Cidade do Aço, Volta Redonda começara a depender da siderurgia para seu desenvolvimento econômico (MOURA, 1991).

D i s p o n í v e l e m : <http://www.geo.ufv.br/docs/mono grafias/2007SegundoSemestre/tiag o C e s a r. p d f > , A c e s s o e m 20/10/2010. Disponível em: <http://teses.ufrj.br/IFCS_D/Sergio EduardoMartinsPereira.pdf>, Acesso em: 20/20/2010. Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/producao/doss ies/FatosImagens/CSN>, Acesso em: 20/10/2010. MOURA, Gerson. Autonomia na Dependência: a política externa brasileira de 1935 a 1942. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. DRAIBE, Sônia. Rumos e Metamorfoses: Estado e industrialização no Brasil 1930 – 1960. 2.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2004. 370p. MOURA, Gerson. Sucessos e

ilusões: relações internacionais do Brasil durante e após a Segunda Guerra Mundial. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1991.


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CSN: as negociações.

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ara os Estados Unidos, em sua relação com o Brasil, a missão Aranha configurou-se como um ponto de apoio para futuras iniciativas no plano político e militar. A guerra europeia desencadeou essas iniciativas, ao mesmo tempo em que provocava um recuo comercial da Alemanha na América Latina. No novo quadro criado pela guerra, o Brasil assumia um papel crucial na estratégia norte-americana e esse fato não passou despercebido ao governo Vargas (MOURA, 1980). Em janeiro de 1940, a United States Steel comunicou ao governo brasileiro sua desistência de participar do empreendimento siderúrgico, apesar da conclusão favorável de seus técnicos (enviados em 1939) quanto à viabilidade do projeto. Em consequência, o governo brasileiro decidiu criar a grande siderurgia através de uma empresa nacional, com a ajuda de capitais estrangeiros, sob a forma de empréstimos. Ainda em janeiro, Vargas promulgou o novo Código de Minas, proibindo a participação de estrangeiros na mineração e na metalurgia (www.fgv.br/CPDOC) A negociação internacional foi feita por meio de relações de

integração, sendo criada, em março, a Comissão Executiva do Plano Siderúrgico Nacional, composta entre outros por, Guilherme Guinle e pelo major Edmundo Macedo Soares, principais responsáveis pelos projetos financeiro e técnico da usina, respectivamente. Foi finalmente escolhida a área de Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro, para a construção da usina siderúrgica (www.fgv.br/CPDOC). E m s e g u i d a , Va r g a s delimitou e autorizou o embaixador Carlos Martins a promover e mediar em Washington os entendimentos necessários para a obtenção de um empréstimo de 15 a 20 milhões de dólares, destinados ao projeto siderúrgico. Paralelamente, Vargas afirmou o seu propósito de colaborar militarmente com os Estados Unidos, na época preocupados com a possibilidade de invasão do Nordeste brasileiro por tropas alemãs oriundas da costa ocidental da África, destacando a atenção ao que ambos viriam a ganhar, visto que para os Estados Unidos seria importante o apoio militar brasileiro e para o Brasil, a proteção do Nordeste contra as tropas alemãs. Em fins de maio, o governo norte-americano dispôs-se a auxiliar na construção da usina de aço, mas ainda relutava em fornecer o total de recursos solicitados por

Vargas, insistindo também na participação de alguma grande empresa siderúrgica norteamericana no empreendimento, por não quererem uma concessão e sim, um equacionamento para o resultado mais justo para as partes (www.fgv.br/CPDOC). O aumento da capacidade de barganha do Estado na fase da equidistância pragmática fez com que o governo dos EUA, premido pela necessidade de constituir o seu sistema de poder, lançasse mão da negociação e é essa circunstância que explica que os maiores ganhos da política externa do governo Vargas tenha ocorrido no período de quebra da equidistância pragmática e não durante sua vigência (www.fgv.br/CPDOC). A negociação tem a ver com a dinâmica política brasileira, assim como com a natureza das questões envolvidas e os grupos nelas interessados. No caso do comércio exterior, a divisão dos interesses e dos grupos entre duas alternativas permitia alguns ganhos, limitados, por se tratar de um comércio desigual. O caso da siderurgia e do reequipamento militar apresenta-se diferente: uma vez definida a sua necessidade, que derivava em grande medida do apoio que os militares prestavam ao


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estado Novo, qualquer solução adotada (alemã ou norteamericana) agradaria e beneficiaria o estabelecimento militar. O respaldo interno fortalecia a posição do governo brasileiro face ao dos EUA, ao mesmo tempo em que tornava premente a necessidade de negociar (www.fgv.br/CPDOC). À ofensiva ideológica e política desencadeada então pelo governo americano, corresponderam reações brasileiras que visavam maximizar os benefícios possíveis na reorientação de sua política externa. Desse modo, começou a quebrar-se a partir de 1939 a equidistância pragmática, referindo-se às relações que o Brasil mantinha simultaneamente com os dois novos eixos de poder em ascensão no mundo, Estados Unidos e Alemanha, que orientara nos anos precedentes a política externa brasileira, visto o próprio esgotamento dos recursos de barganha do governo brasileiro na negociação de seu alinhamento aos E s t a d o s U n i d o s (www.fgv.br/CPDOC). Não por acaso as conferências interamericanas ganharam novo alento no período da disputa EUA versus Alemanha na década de 1930 e início da década de 1940. Inspiradas no clima da Boa Vizinhança, elas repudiaram o intervencionismo como forma de resolver as disputas

entre os Estados americanos e consagraram o princípio da solidariedade hemisférica: era o tempo da vitória do panamericanismo. Um primeiro elemento justificador do panamericanismo era, portanto, a solidariedade entre as nações, fundamentada em uma série de princípios, tais como “a fé nas instituições republicanas, lealdade à democracia como um ideal, reverência pela liberdade, aceitação da dignidade do indivíduo e seus direitos pessoais invioláveis,” entre outros, segundo o Memorando do Departamento de Estado, citado em Haines, 1977, 374 (MOURA, 1980). Entre 1939-1942, enquanto se processava a ofensiva ideológica e política dos EUA na América Latina, o governo do Brasil tratou de tirar o máximo proveito possível dessa reorientação política, em meio à conflagração mundial e à polarização política que ela ocasionava (MOURA, 1980). Em primeiro lugar, a esfera do poder internacional alterou-se drasticamente com a eclosão da guerra na Europa. Imediatamente, a Grã-Bretanha pôs em ação um bloqueio marítimo contra a navegação alemã, o que de um só golpe tirou a América Latina do alcance das linhas comerciais alemãs. No fim do ano, o Ministro da Fazenda, Souza Costa, reconhecia que os interesses brasileiros no comércio com a

Alemanha tinham sido duramente atingidos, especialmente a importação, o que naturalmente repercutia sobre a possibilidade de exportar, pela própria natureza do comércio compensado. Em 1940, o intercâmbio comercial entre Alemanha e Brasil caiu a 1/10 do volume de trocas do ano anterior. Desse modo, a Grã-Bretanha resolveu para os EUA o problema insolúvel do comércio compensado e retirou do Brasil um dos pontos de apoio de sua política equidistante. Mas se é verdade que a Alemanha deixou de estar comercialmente presente no Brasil, nem por isso se poderia concluir que sua influência política declinou. No Brasil, era notória a admiração de altos círculos militares à eficiência da máquina de guerra alemã, segundo Gerson Moura. O passo seguinte foi o fornecimento de equipamento bélico aos aliados, em especial à Grã-Bretanha (MOURA, 1980). Em relação à América Latina, era necessário do ponto de vista estadunidense garantir a unidade hemisférica para a sua liderança e com esse objetivo Washington pôs em ação uma ofensiva diplomática e ideológica para deslocar a presença alemã e impedir surtos nacionalistas. Ao mesmo tempo e com o mesmo objetivo, o governo Roosevelt pôs em andamento uma ampla ação político-militar, escolhendo o Brasil como o principal campo para a ofensiva, pois para o governo


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americano era importante evidenciar os laços com a América Latina com o objetivo de impedir a influência europeia na região, manter a estabilidade política no continente e assegurar a liderança norte-americana no hemisfério ocidental, fazendo com que os resultados em relação ao Brasil fossem levados a primeiro plano. Desta forma, o governo norteamericano utilizou a autopropaganda para evidenciar suas intenções para com o território brasileiro, ao mesmo tempo em que necessitava de apoio bélico (MOURA, 1980). O governo Vargas colocouse em posição de neutralidade em face à guerra. Embora o comércio co m a A leman h a r ef lu ís s e rapidamente enquanto crescia com o intercâmbio com os EUA, o governo brasileiro tratava de manter a equidistância na medida do possível. No trato com o governo americano, Vargas dispunha ainda dos seguintes e l e m e n t o s d e b a rg a n h a : a Alemanha podia fornecer ao Brasil armas já encomendadas e aceitava novas encomendas, enquanto o governo norte-americano não tinha capacidade para fazer o mesmo; as empresas alemãs estavam capacitadas a montar para o Brasil uma usina siderúrgica completa, enquanto as empresas norteamericanas se esquivavam de tomar uma decisão sobre o assunto; o regime alemão poderia constituir-

se em modelos político para o Brasil, já que internamente a luta política apresentava-se empatada (MOURA, 1980). Argumentava-se que a Alemanha não tinha condição de fornecer armas ou uma planta siderúrgica ao Brasil durante a guerra, devido às suas próprias necessidades bélicas e ao bloqueio naval inglês, mas o argumento se enfraquece quando se considera que o período 1940-1941 foi muito difícil para a Grã-Bretanha, cujos recursos se concentravam mais em sua defesa, isolada que estava na luta contra a Alemanha e esperando a invasão a qualquer momento. Além disso, a decisão de fornecer armas ou siderurgia ao Brasil era uma decisão eminentemente política, isto é, poderia ser tomada desde que os estrategistas alemães a considerassem uma medida prioritária na luta contra a influência dos EUA na América Latina. Algumas autoridades norteamericanas estavam, aliás, convencidas do interesse alemão e da viabilidade de suas ofertas ao Brasil. O problema maior era a América do Sul, onde a presença alemã alcançava dimensões respeitadas, mais nesse caso a iniciativa se desdobrou em vários planos: diplomático, ideológico, econômico, político e militar, sendo fortemente utilizada o movimento de ingraciação e bajulação dos EUA para com o Brasil, que revelavam atratividade em relação à siderurgia,

para posterior apoio militar brasileiro na guerra, além da esportividade que foi caracterizada pelo desvio da atenção em relação à própria guerra, pois como citado anteriormente, por trás dos investimentos necessários para a siderurgia viriam o apoio brasileiro para os Estados Unidos na Guerra (MOURA, 1980). As iniciativas norteamericanas de 1940, solicitando a colaboração político militar, encontraram em seu caminho duas sólidas reivindicações brasileiras: auxílio para instalação da grande siderurgia e reequipamento econômico-militar. No ano anterior, o Major Edmundo Macedo Soares e Silva já estivera por algum tempo nos EUA e Europa na qualidade de enviado do governo brasileiro, para sondar as possibilidades de capitais e tecnologia estrangeira para a criação da siderurgia brasileira (MOURA, 1980). As pressões norteamericanas, usadas com esquema de enforcement, para obter uma colaboração militar brasileira mais efetiva tiveram como resposta um apoio discreto em maio de 1940. Nessa ocasião, o governo Vargas afirmou seu desejo de colaborar com os EUA, sem especificar contudo a natureza dessa colaboração e sem assumir claramente um comprometimento com as propostas norteamericanas. Não poderia ser de


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outro modo, se considerarmos que as conversações para a instalação da siderurgia no Brasil mediante associação ao capital privado estrangeiro tinham fracassado no início do ano. Pesaram nessa decisão norte-americana os planos brasileiros para retomar o pagamento da dívida externa e que desagradaram o governo Roosevelt, que os considerou insuficientes (MOURA, 1980). O Embaixador Caffery transmitiu ao seu governo um profundo desapontamento de Va r g a s c o m f r a c a s s o n a s negociações e o propósito brasileiro de levar adiante o projeto, prescindindo, porém, do capital privado estrangeiro. A solução, bem como financiamento, deveria provir de agências governamentais norte-americanas. Em fins de maio, o governo americano dispôs se a ajudar, mas ainda relutava em fornecer o total de recursos solicitados pelo governo brasileiro, insistindo também na participação de alguma grande empresa siderúrgica americana no empreendimento. O assunto caía novamente no terreno das promessas imprecisas (MOURA, 1980). Vargas já tinha feito chegar ao governo americano a notícia de que algumas empresas alemãs estavam dispostas a implantar a siderurgia no Brasil, fazendo com que o discurso assumisse o significado de um último aviso,

como uma ameaça de desistência de escolhas e renúncia às alternativas, tornando o curso de ação americana uma condicional para a ação brasileira, sendo usada desta forma, a estratégia de enforcement, vista como primordial para que houvesse uma resposta americana imediata. O Brasil era pan-americanista em princípio, mais havia problema de solução urgente, pois o governo estava disposto a implementar a

dos EUA com o Brasil, nos termos em que o governo brasileiro entendia a colaboração, mesmo que houvesse atenção ao resultado de ambas as partes. Quando abrandou a polêmica gerada pelos discursos, retomaram-se as negociações sobre a siderurgia, agora em termos de propriedade e controle estatal, mediante financiamento do Exibank e tecnologia de empresas privadas dos EUA. Em setembro

industrialização (siderurgia) e a reaparelhar as forças armadas. Para isso se valeria de todos os recursos disponíveis, inclusive mirar-se na organização política dos “povos vigorosos”, ou seja, a Alemanha (MOURA, 1980). Vargas pressionou, portanto no momento adequado, quando os EUA pediam colaboração hemisférica no plano estratégico. A colaboração fora até então unidirecional, isto é, significava colaboração do Brasil com os EUA, mas não contemplava a colaboração

assinaram-se os acordos de financiamento e nos dois anos seguintes o governo de Roosevelt facilitou a produção e o transporte de equipamento necessário à instalação da planta siderúrgica de Volta Redonda. O discurso de Vargas em junho constitui o momento público mais dramático no processo de criação da grande siderurgia no Brasil, por ter sido caracterizado pela pressão feita como estratégia política (MOURA, 1980). Pela primeira vez a


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pela primeira vez a cooperação econômica do governo americano estimulava uma nova linha de produção na América Latina e não apenas o comércio complementar. A experiência ainda assim foi cercada de cuidados para impedir que esse projeto não fortalecesse os setores que no Brasil pudessem opor-se à influência dos EUA no hemisfério: os recursos seriam liberados gradativamente e para a aquisição de maquinaria somente nos EUA. O elemento mais significativo dessa conjuntura foi o caráter político da decisão do governo norte-americano, até então resistente à ideia de favorecer a instalação de uma planta siderúrgica no Brasil (MOURA, 1980). A decisão do governo norte-americano de financiar a siderurgia, vencendo os receios de que ela pudesse funcionar como um boomerang nacionalista deu-lhe um trunfo precioso na conquista do apoio brasileiro, demonstrando assim, um equacionamento para o maior alcance dos objetivos e resultados favoráveis. MOURA, Gerson. Autonomia na Dependência: a política externa brasileira de 1935 a 1942. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.

D i s p o n í v e l

e m :

<

http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busc a/BuscaConsultar.aspx >, Acesso em 24/10/2010. Getúlio Vargas.

Impactos da CSN em Volta Redonda

A

ntes da vinda da Siderúrgica de Volta Redonda, a vida, econômica da região sul-fluminense e, também do restante do Estado do Rio de Janeiro, encaminhava à p r o f u n d a d e c a d ê n c i a . Tu d o acontecera em razão, sobretudo, da inércia de uma elite inepta, voltada para o passado e ansiosamente agarrada às reminiscências de uma condição de prosperidade e de riqueza, que se perderam com o fim da lavoura cafeeira, os quais a pecuária não conseguiu trazer de volta. Ademais, havia uma resistência, motivada, possivelmente, pelo esgotamento do solo, à busca de alternativas agrícolas ao cultivo do café. Desse modo, as áreas de antigos cafezais transformaram-se em pastos e foram vendidas ou arrendadas a pecuaristas mineiros (BEDÊ, 2004). Graças à poderosa influência política do então interventor do Estado do Rio de Janeiro, Comandante Ernani Amaral Peixoto, genro de Getúlio Vargas, Volta Redonda, o 8º Distrito do Município de Barra Mansa, foi escolhido como o lugar que iria abrigar a Usina de Aço da Companhia Siderúrgica Nacional. Trata-se de uma escolha eminentemente política, visto que

contrariava consideráveis conveniências técnicas, como a desejável proximidade das fontes de matérias primas ou de um porto fluvial marítimo. Mas possuía eletricidade e água em abundância – vital para a produção siderúrgica e era servida por uma estrada de ferro, ainda que em deploráveis condições (BEDÊ, 2004). Até 1941, Volta Redonda era, apenas, um ponto insignificante no mapa do Estado do Rio de Janeiro, e tão importante para a vida econômica, social, política e tecnológica do Brasil, quanto seria qualquer diminuto vilarejo interiorano. Ademais, nem

se poderia incluí-la no circuito das “cidades mortas” do Vale do Paraíba – de que tratara Monteiro Lobato, em livro homônimo – já que nem sequer uma simples cidade o fora Volta Redonda, mesmo nos bons tempos da riqueza do café (BEDÊ, 2004).


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Em 1942 a Companhia Siderúrgica Nacional abriu o recrutamento de mão-de-obra para a construção de sua usina de aço. Dezenas de agentes de recrutamento deslocaram-se para o interior dos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais para o alistamento de trabalhadores, que eram transportados de caminhão até a estação ferroviária mais próxima, onde embarcavam no trem de para Volta Redonda. Em sua maioria, esses milhares de homens procediam das lavouras e da pecuária, acostumados à enxada e ao trabalho “de sol a sol” – como se dizia à época. Analfabetos e sem qualquer qualificação profissional que os habilitasse para o serviço da indústria, muitos deles foram encaminhados ao trabalho braçal da construção civil, no formigueiro humano dos canteiros de obras (MOTTA, 2007). Paralelamente à construção da usina de aço da CSN, a empresa implantou uma “escola profissional”, destinada à formação de mão-de-obra qualificada, que usa a metodologia do SENAI. A “Escola Profissional”, mais tarde denominada “Escola Técnica Pandiá Calógeras”, cumpriria um papel histórico na formação, no aperfeiçoamento e na especialização de mão-de-obra para a Usina da CSN. Vale ressaltar, contudo, que alguns milhares, dos

quase dez mil trabalhadores engajados na construção de Volta Redonda, eram profissionais qualificados, que se habilitaram nas indústrias urbanas, nas ferrovias, nas companhias de energia elétrica e nas próprias escolas industriais que essas empresas mantinham com subsídios governamentais (parte da contribuição compulsória destinada ao SENAI poderia ter sido aplicada pelas próprias empresas, na qualificação do seu pessoal – uma alternativa legalmente admitida) (BEDÊ, 2004). O afluxo de brasileiros, de quase todos os cantos do país para Volta Redonda, transforma-a em centro, em que se mesclam os traços culturais de diferentes regiões brasileiras. Nos primeiros anos de vida da nova cidade que se formou a grande maioria da população voltaredondense obviamente constitui-se de forasteiros. Mas o intercâmbio cultural, propiciado pela

convivência forçada de contingentes humanos de diferentes procedências, promoveu uma mescla de usos, costumes e traços culturais que essas pessoas trouxeram de seus lugares de origem (BEDÊ, 2004). A partir de 1946, com a eleição do general Dutra para presidente da República, a política externa do Brasil se alinha abertamente à orientação dos Estados Unidos, fato que acarretaria diversos desdobramentos na vida interna do país. A despeito de a Constituição de 1946 ter assegurado formalmente, direitos e garantias individuais ao cidadão, inclusive a liberdade de ideias, o Partido Comunista é colocado na ilegalidade, com o que inaugura, então, a temporada de “caça as bruxas”, no caso, os comunistas e os simpatizantes do marxismo; os Estados Unidos tornam-se o maior


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Localização: parceiro comercial do Brasil, com o qual esbanja, em menos de dois anos, quase um bilhão de dólares (em valores da época) na importação de artigos de consumo supérfluos: uísque, artefatos de matéria plástica (uma grande novidade do pós-guerra), calçados, roupas de tecidos sintéticos, automóveis de luxo, cimento para a construção de 45 km de pistas duplas da Rodovia Presidente Dutra; e pagamos a indenização pela desapropriação da Estrada de Ferro Leopoldina, quando faltava apenas um ano para que aquela ferrovia revertesse gratuitamente ao patrimônio da União, por força do término do contrato de concessão (BEDÊ, 2004). A usina de aço, planejada, construída e organizada segundo padrões técnicos norteamericanos, configura o exemplo mais eloquente da cooperação entre os Estados Unidos e o Brasil, à parte a circunstância da presença, em Volta Redonda, de técnicos estadunidenses, por mais de uma década, e do permanente intercâmbio com a United Steel Company, para o treinamento de centenas de técnicos metalúrgicos brasileiros. Esse intercâmbio e o fato de que o Brasil dependia de desenhos, esquemas, manuais e de literatura técnica norte-americana para fazer a usina funcionar, concorrem para que, desde o início da construção da usina, o inglês se

tornasse, depois do português, a língua mais falada em Volta Redonda (BEDÊ, 2004). Ao ingressar na década de cinquenta, o processo de industrialização sistemática do Brasil, deslanchado com a Companhia Siderúrgica Nacional, passa a exigir investimentos cada vez mais amplos, para o que o Brasil não dispunha de poupança interna suficiente. Afinal, o governo Dutra havia esbanjado, em um consumismo quase absurdo, as preciosas reservas em divisas estrangeiras, que foi poupado durante a Segunda Guerra Mundial, em face do fornecimento de matérias primas estratégicas aos Aliados e mercê de imensas privações e sacrifícios da população brasileira, ao longo daquele conflito (MOTTA, 2007). O processo de construção e a instalação da Companhia Siderúrgica Nacional no distrito de Santo Antônio de Volta Redonda, que mais tarde se tornou o município de Volta Redonda, causaram profundas transformações naquele espaço. Em um local que era caracterizado por uma vida pacata, de tempos lentos e economicamente decadente, surgiu uma grande indústria que impulsionou o desenvolvimento local e nacional causando inúmeros impactos no lugar (MOTTA, 2007). Assim, com a instalação da CSN, Volta Redonda passou a ser o

centro das atenções da nação, o símbolo de um governo que prometia transformar o país, tirando-o da situação de simples país agrário-exportador e introduzindo-o no grupo de países industrializados. Neste aspecto, Volta Redonda representou o modelo de uma nova sociedade, onde tudo que representava o passado deveria ser deixado para trás, o que dava suporte ao novo e moderno modelo de sociedade industrial ideologizado pelas novas elites. Essa questão de deixar o passado para trás foi bem demonstrada na escolha do local para a construção da empresa, ou seja, na escolha de um espaço considerado atrasado e agrário para se transformar em um moderno espaço urbano-industrial (MOTTA, 2007).


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parceiro comercial do Brasil, com o qual esbanja, em menos de dois anos, quase um bilhão de dólares (em valores da época) na importação de artigos de consumo supérfluos: uísque, artefatos de matéria plástica (uma grande novidade do pós-guerra), calçados, roupas de tecidos sintéticos, automóveis de luxo, cimento para a construção de 45 km de pistas duplas da Rodovia Presidente Dutra; e pagamos a indenização pela desapropriação da Estrada de Ferro Leopoldina, quando faltava apenas um ano para que aquela ferrovia revertesse gratuitamente ao patrimônio da União, por força do término do contrato de concessão (BEDÊ, 2004). A usina de aço, planejada, construída e organizada segundo padrões técnicos norteamericanos, configura o exemplo mais eloquente da cooperação entre os Estados Unidos e o Brasil, à parte a circunstância da presença, em Volta Redonda, de técnicos estadunidenses, por mais de uma década, e do permanente intercâmbio com a United Steel Company, para o treinamento de centenas de técnicos metalúrgicos brasileiros. Esse intercâmbio e o fato de que o Brasil dependia de desenhos, esquemas, manuais e de literatura técnica norte-americana para fazer a usina funcionar, concorrem para que, desde o início da construção da usina, o inglês se

tornasse, depois do português, a língua mais falada em Volta Redonda (BEDÊ, 2004). Ao ingressar na década de cinquenta, o processo de industrialização sistemática do Brasil, deslanchado com a Companhia Siderúrgica Nacional, passa a exigir investimentos cada vez mais amplos, para o que o Brasil não dispunha de poupança interna suficiente. Afinal, o governo Dutra havia esbanjado, em um consumismo quase absurdo, as preciosas reservas em divisas estrangeiras, que foi poupado durante a Segunda Guerra Mundial, em face do fornecimento de matérias primas estratégicas aos Aliados e mercê de imensas privações e sacrifícios da população brasileira, ao longo daquele conflito (MOTTA, 2007). O processo de construção e a instalação da Companhia Siderúrgica Nacional no distrito de Santo Antônio de Volta Redonda, que mais tarde se tornou o município de Volta Redonda, causaram profundas transformações naquele espaço. Em um local que era caracterizado por uma vida pacata, de tempos lentos e economicamente decadente, surgiu uma grande indústria que impulsionou o desenvolvimento local e nacional causando inúmeros impactos no lugar (MOTTA, 2007). Assim, com a instalação da CSN, Volta Redonda passou a ser o

centro das atenções da nação, o símbolo de um governo que prometia transformar o país, tirando-o da situação de simples país agrário-exportador e introduzindo-o no grupo de países industrializados. Neste aspecto, Volta Redonda representou o modelo de uma nova sociedade, onde tudo que representava o passado deveria ser deixado para trás, o que dava suporte ao novo e moderno modelo de sociedade industrial ideologizado pelas novas elites. Essa questão de deixar o passado para trás foi bem demonstrada na escolha do local para a construção da empresa, ou seja, na escolha de um espaço considerado atrasado e agrário para se transformar em um moderno espaço urbano-industrial (MOTTA, 2007).

BEDÊ, Waldyr Amaral. “Volta Redonda na Era Vargas – 1941-1964 (História Social)”. Disponível em: <http://www.portalvr.com/cultura/museu/ apoio/arquivos/waldyrbede.pdf>, acesso em 22/09/2010. MOTTA, Thiago César Pereira da. A formação da cidade de Volta Redonda a partir da implantação da Companhia Siderúrgica Nacional. disponível em: <http://www.geo.ufv.br/docs/monografia s/2007SegundoSemestre/tiagoCesar.pdf> , acesso em 22/09/2010.


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Projeto da Usina e Cidade Operรกria na Cidade de Volta Redonda.


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Os Impactos Sociais.

V

olta Redonda sofre diretamente as mudanças socioculturais decorrentes do processo de industrialização, não somente por sediar a usina de aço da Companhia Siderúrgica Nacional, como também pela privilegiada circunstância de se localizar a meio caminho entre as duas maiores metrópoles brasileiras e, por isso mesmo, dois dos centros culturais mais expressivos do Brasil: São Paulo e Rio de Janeiro. É exatamente essa dimensão humana que avulta da história social de Volta Redonda: mesclam-se, num mesmo lugar, milhares de pessoas, que deverão viver juntas, fazendo o mesmo trabalho, ainda que em atividades distintas, sofrendo as mesmas privações, dividindo os mesmos anseios, somando as mesmas esperanças. De diferentes origens, culturas e profissões, com suas histórias pessoais, seus dramas e temperamentos únicos, essas pessoas elegem um mesmo objetivo: fazer de Volta Redonda o seu Eldorado (BEDÊ, 2004). Levaria muito tempo, ainda, para que esse novo homem brasileiro, vivendo numa nova sociedade urbano-industrial, de economia de mercado, encontrasse o seu caminho e alcançasse o aceitável grau de consciência

1945 - Os “Ciclopes” num comício do PCB em Volta Redonda

política que, atualmente, demonstra possuir (BEDÊ, 2004). Em meados de 1948, Volta Redonda, já é a "Cidade das bicicletas" - o meio de transporte utilizado pela maioria dos seus habitantes. Naquele ano, a CSN importa da Inglaterra e revende aos seus empregados às famosas bicicletas "Phillips" e "Raleigh", que são o orgulho e um sinal de "status" dos seus proprietários. Na segunda metade dos anos quarenta, no imediato pós-guerra, o rádio e o cinema estabelecem a ligação dessa incipiente sociedade urbanoindustrial com as atrações do mundo moderno, ao mesmo tempo em que, como consequência natural desse contato, definem-se, também, os padrões de consumo possíveis (BEDÊ, 2004). E, como costuma ocorrer em um processo de transculturação- em que traços, padrões e valores de uma dada cultura são absorvidos por outra -, Volta Redonda passou a

receber a transferência desses elementos da cultura norteamericana, que incluem moda, bebidas, cigarros, objetos de uso pessoal, veículos; a absorver expressões idiomáticas e, até, a fazer imitação de comportamentos de artistas de cinema. É um fenômeno típico do pós-guerra, característico da hegemonia militar, política e econômica dos Estados Unidos sobre os vencidos e, também, sobre seus aliados satélites (BEDÊ, 2004). Um simples passeio pelos bairros de Volta Redonda, que dispensaria qualquer preocupação com pesquisa no cadastro de firmas da Prefeitura, seria suficiente para constatar a impressionante quantidade de bares e botequins em funcionamento na Cidade, circunstância que, em pouco tempo, transformou o comércio de distribuição de bebidas numa das mais prósperas atividades econômicas do Município. Grosso modo, o elevado consumo de


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econômicas do Município. Grosso modo, o elevado consumo de bebidas alcoólicas, associado ao uso massivo de tranquilizantes e de outras drogas, já indicava, ao final dos anos cinquenta, a existência de u m a s o c i e d a d e enferma. Não massacrada, mas fortemente pressionada por um novo tipo de vida: essa nova sociedade, de caráter urbanoindustrial, apresentava, ao nosso "homo volta-redondenses", novos valores, típicos de uma sociedade de consumo, a partir, como se sabe, de necessidades artificialmente criadas - como se verifica no sistema capitalista (BEDÊ, 2004). Volta Redonda cumpre um papel fundamental, ao tentar realizar, junto com a produção de aço de seus fornos, o ideal anelado pelos teóricos do Estado Novo, de um novo homem brasileiro, menos que um cidadão, mas um súdito do regime, trabalhador, cordial, ordeiro, hígido, protegido, amparado e policiado pelo Poder Público, soldado da construção do futuro nacional. A respeito, assim comenta Moreira (op.cit.54): novo homem brasileiro, menos que um cidadão, mas um súdito do regime, trabalhador, cordial, ordeiro, hígido, protegido, amparado e policiado pelo Poder Público, soldado da construção do futuro nacional. A respeito, assim comenta Moreira (op.cit.54): “... todo o empreendimento tornou-se espelho da ideologia forjada pelo

Estado Novo de valorização do trabalho e de reabilitação do trabalhador nacional, traduzida em uma política social que incluía não apenas medidas de proteção à saúde física e mental do homem brasileiro, mas também de incentivo à sua capacidade produtiva. Nesse sentido, a satisfação de necessidades básicas como habitação, alimentação, saúde e educação, assim como o amparo à família, acabariam por tornarem-se pontos primordiais da política estado novista de proteção ao trabalhador e ao próprio progresso material do país" (BEDÊ, 2004). Para o Sociólogo Émile Durkheim, os fatos sociais são um modo de pensar, sentir e agir de um grupo social, embora sejam exteriores, eles são introjetados pelo indivíduo e exercem sobre ele um poder coercitivo. Visto nos exemplos anteriores, onde fora mostrado como a sociedade percebia as mulheres que usavam calça comprida como contrárias à moral da sociedade, este exemplo se torna uma clara demonstração do que é um fato social segundo Durkheim. E a explicação é muito simples: nada impediria uma jovem de usar calça comprida, porém, a sociedade a veria com outros olhos devido ao fato de que naquela época mulher não usava calça comprida. Ao passar dos tempos em que não só uma centena de jovens mulheres, mas sim centenas de milhares, começaram a usar esta vestimenta –

antes exclusivo aos homens – a sociedade percebeu que aquilo que antes era visto como errado, indecente e “abominável aos olhos de Deus” passa a ser uma coisa comum, pois não se torna exclusivo de uma pequena minoria. No momento em que uma minoria contamina uma maioria significativa, a sociedade passa a aceitar com a ação com menos resistência (COSTA, 1987). Três são as características que Durkheim distingue nos fatos sociais. A primeira delas é a coerção social, ou seja, a força que os fatos exercem sobre os indivíduos, levando-os a conformarem-se às regras da sociedade em que vivem independentemente de suas vontades e escolhas. Essa força se manifesta, por exemplo, quando as mulheres de Volta Redonda se vêm obrigadas a usar um específico tipo de vestimenta, de acordo com o que a sua sociedade pré-determinou. São tipos de situações como essas, onde o indivíduo não pensa se vai sair vestindo roupas ou não, pois o mesmo tem a ciência de que se não o fizer sofrerá as sanções impostas pela sociedade, seja elas quais forem (COSTA, 1987). A segunda característica dos fatos sócias é que eles existem e atuam sobre os indivíduos independentemente de sua vontade ou adesão consciente, ou seja, eles são exteriores aos indivíduos. Um exemplo é o da população de Volta


Pag.24

Redonda, no qual era de caráter conservadora no início de sua fundação, quando o ato fumar em plena rua, era visto algo ofensivo e desrespeitoso à reputação de uma mulher, sendo o ato então, determinado pela própria sociedade e não pelo desejo que o indivíduo exerce (COSTA, 1987).

1946 - Trabalhadores fazem sua refeição na Ala de Carga da velha Aciaria SM

Acampamentos Rústico e Principal.


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Humor á Vista: cirúrgica, mas no fim foi aquela agüinha...” CHARGES 1930-1952

nas insígnias e vestimenta militar do

A imagem da República está associada à espacialidade do Palácio do

Caricatura de (Alfredo)

Catete, centro de emanação da ordem e

Storni, a seguir, sobre o advento da

visualização do poder. Uma das

"República Nova", publicada na

charges mais difundidas que retrataram

revista Careta em dezembro de

a política getuliana foi traçada por J.

1930. A cena desenrola-se na

Carlos para a revista Careta, em

enfermaria de um hospital: na

janeiro de1937, com um efeito satírico

parede branca, um quadro mostra

devastador: em primeiro plano

um revolucionário em movimento,

aparecem bananeiras com portentosos

o nome de João Pessoa (dimensão

cachos da fruta tropical; mais ao centro,

trágica de 30) e a data evocada dos

no meio da rua, vê-se o "baixinho"

batalhões e clubes revolucionários

Getúlio e seu inconfundível charuto,

(três de outubro); em primeiro

com um cesto cheio de cascas de

velho general de barbas brancas que se

plano, dois "médicos" estabelecem

bananas e outras tantas já espalhadas

apóia, indelevelmente, na espada da

diagnósticos e posologias para a

pela via pública (calçada e rua); ao

ordem e se mostra com o olhar

República doente e desfigurada ,

fundo ergue-se pomposamente o

patético diante da pergunta de um

prostrada no leito de uma cama

Palácio do Catete, onde sobressaem o

político que estava no comando

mais ao fundo; Osvaldo Aranha, de

portão principal, as sacadas e as águias

republicano há mais de duas décadas.

avental branco, demonstra os

no alto da fachada preparando-se para

"Que tal a sua República?", isto é,

artefatos propícios para anestesia e

alçar vôo; no oitão do palácio,

aquela de 1889, tem ares de uma

conseqüente operação cirúrgica;

encostado numa de suas colunas,

pergunta distanciada, como se o autor

porém, mais próximo da paciente,

aparece o Jeca, o homem do povo, de

da mesma já aguardasse pela resposta

vê-se o homeopata Getúlio Vargas

chapéu, com as pernas cruzadas

de um Deodoro fora do tempo, e que

enfatizar o seu método curativo;

fazendo o "quatro", e observando a

somente poderia resmungar um

então, a República que está

cena com um leve sorriso. A frase de

lacônico "irreconhecível..."

representada pela mulher deitada,

Getúlio parece ser dirigida ao quase

queixa-se para o leitor: "– No

invisível personagem e a todos: "– Para

princípio prometeram-me com

que cerca de arame farpado? Bastam as

espalhafato a intervenção

habituais cascas de bananas...”As recorrências cômicas e discursivas entre a República e o espaço/tempo político de Getúlio/getulismo parecem ser elucidativas na charge de Théo (Djalma Pires Ferreira), "Os Sonhos do Proclamador", publicada na revista Careta em novembro de 1952, descreve: as imagens do ato fundador ganham destaque, em primeiro plano,




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