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SERVIÇO DOS MEMBROS
A revelação mais alta que é possível receber de Deus, isto é, a respeito de Cristo e da igreja, traz consigo não só uma visão mais elevada e profunda de Cristo, mas também uma valoração de cada membro do Seu corpo. São muitos os membros, mas um só o corpo; muitos os dons que este tem recebido, e muitas as funções que realiza, mas o corpo segue sendo um só. A unidade do corpo não deixa nenhum membro fora, e nenhum é dispensável. Até mais, os membros menores são os mais honrosos, os que são tratados com mais decoro. A visão plana dos membros de um todo –como os números de votos em uma democracia– deve substituir-se por uma visão enriquecida da multiface expressão, beleza e função dos membros do corpo de Cristo – cada um diferente do outro, e mostrando um vislumbre peculiar da beleza de Cristo. Reconhecer isto requer, sem dúvida, uma mudança de paradigma mental, uma renovação do entendimento. Isto significa transladar a óptica do ministerialismo centrado em uns poucos para a operação de todos os membros do corpo de Cristo. Esperamos que os artigos incluídos neste volume ajudem a esclarecer a compreensão deste assunto. Também nos lançamos aqui na tarefa de biografar a Watchman Nee, tarefa difícil pela riqueza que há em sua personalidade, e pela diversidade de seu ministério. Rogamos ao Senhor que sua graça sustente aos que entregam e aos que receberem estas mensagens. Para a Sua glória.
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INDICE
ÁGUAS VIVAS
águas vivas UMA REVISTA PARA TODO CRISTÃO / ANO 7 · Nº 41 · SETEMBRO - OUTUBRO 2006
TEMA DA CAPA Para a vida do corpo Um olhar para a epístola aos Romanos como o percurso de fé que vai do individual ao corporativo. Gonzalo Sepúlveda ....................................................... 3 Aperfeiçoando aos santos No que consiste a edificação do corpo de Cristo? Rodrigo Abarca ........................... 12 Servos da Igreja Os ministros da Palavra não são 'estrelas' cintilantes, mas sim servos da igreja. Eliseo Apablaza ....................................................................................... 22 LEGADO Sacerdócio e vida O sacerdócio dos crentes é uma reação da vida divina contra a morte espiritual. T. Austin-Sparks ......................................................................... 29 Todos devem servir Um ensino prático sobre o serviço dos membros do corpo de Cristo. Watchman Nee ....................................................................................... 33 ESPIGANDO NA HISTÓRIA DA IGREJA O vigia que veio da China A exemplar e controvertida história de Nee To Sheng, mais conhecido como Watchman Nee ..................................................................... 39 Os Paulicianos A parte da história da Igreja que não foi devidamente contada. Rodrigo Abarca .................................................................... 51 APOLOGETICA Limites da vida humana Uma visão científico-bíblica da longevidade humana. Ricardo Bravo ....................... 57 SEÇÕES FIXAS Cartas dos nossos leitores ................................................................................... 64
Foto da capa: «O castelo do Morro» (Cuba). As imagens desta edição não têm necessariamente relação com pessoas ou lugares mencionados nos textos, salvo que se mostre o contrário.
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TEMA DA CAPA
Um olhar para a epístola aos Romanos como o percurso de fé que vai do individual ao corporativo.
Para a vida do
corpo
Gonzalo Sepúlveda «Pois se pela transgressão de um só reinou a morte, muito mais reinarão em vida por um só, Jesus Cristo, os que recebem a abundância da graça e do dom da justiça» (Rom. 5:17).
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artindo desta palavra, esperamos, mediante a graça do Senhor, fazer um breve recorrido pela mensagem do livro de Romanos, o qual, considerado em forma geral, podemos tomar como se toda a nossa história espiritual fosse nele contada. Por causa da transgressão de Adão, a morte reinou, com muita eficácia, sobre todos os homens. À medida que nosso corpo envelhece e enfraquece, sentimos muito de perto a presença da morte. Além disso, tudo aquilo que nos esmaga, deprime, desalenta e que nos separa do Senhor, não é outra coisa que a mor-
te, a herança da queda de Adão que nos persegue com seus efeitos devastadores. Se nós provamos a eficácia da morte em todo o transcurso de nossa vida, o que agora vem, quer dizer, o reinar com Cristo em vida, tem que ser muitíssimo mais eficaz do que a morte foi. Quem reinarão em vida? «...os que recebem...». Se um cristão está sendo derrotado, é porque de alguma forma não entrou nesta abundância do Senhor. Por isto, vemos muitos sucumbir diante da menor prova ou que vivem em uma permanente e vergonhosa fraqueza.
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Apeles e uma igreja normal Vejamos agora Romanos 16:10 «Saúdem a Apeles, aprovado em Cristo». Que formosura, irmãos! Todos desejamos ser homens e mulheres aprovados em Cristo. Apeles não está no céu, ainda não compareceu diante do tribunal de Cristo. Ele está na terra, é um membro da igreja na cidade de Roma, e chegou a ser um irmão aprovado em Cristo. Será possível, encontrar homens aprovados? Será possível, além disso, achar nas Escrituras uma igreja funcionando normalmente? Parece-nos que é em Romanos capítulo 16 onde podemos ver sua melhor descrição. Note você que neste capítulo ninguém é nominado por seu cargo. Há irmãs que trabalham e outras que trabalham muito no Senhor. Cada um parece ter uma função e ser aprovado nessa função. Há quem se caracteriza só por estar cheios do amor do Senhor, e outros que ajudaram os apóstolos a ponto de expor sua vida por eles. A maioria dos irmãos abrem o seu lar: «Saúdem os da casa de Aristóbulo ... Saúdem os que estão com eles ... à igreja que está em sua casa». As famílias estão convertidas e a casa veio a ser um ambiente onde a igreja se reune; os santos chegam ali com toda confiança para ter comunhão uns com os outros. Que preciosa ver a igreja, cheia da vida do Senhor! A versão Reina-Valera 1960 subtitulou este capítulo como «Saudações pessoais». Pasrece-nos que é muito inadequado, pois se apenas fossem simples saudações pessoais do apóstolo, não o leríamos com muito inte-
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resse. Mas irmãos, aqui temos uma riqueza imensa: vemos como a doutrina dos capítulos anteriores do livro de Romanos se tornou em vida. É precioso ver todos os irmãos cumprindo uma valiosa função no corpo. Cada um parece ter encontrado seu lugar e todos trabalham em harmonia e coordenação com o resto dos irmãos. Este capítulo está cheio da vida de Cristo, da vida prática que a igreja em Roma alcançou ao experimentar naquele tempo histórico. Quão precioso é ver esta igreja onde cada membro parece estar contente em sua função. Dirigentes não se destacam, pastores, apóstolos, ou anciões; não são mencionados por seus cargos. Parece melhor uma igreja amadurecida, onde todos os membros cumprem alegremente a sua função. Ninguém está ocioso, observa-se uma igreja vigorosa em espírito; os irmãos se ajudam, visitam-se; há orações por aqui e por ali; uns cantam, outros adoram, todos se amam, etc. Eles alcançaram tal grau de maturidade que até podem identificar rapidamente quem causa divisão e tal malvada intenção pode ser facilmente julgada. Uma das coisas que mais nos encoraja é que a esta igreja é feita a promessa de que prontamente Satanás será esmagado sob seus pés. Notemos que esta promessa está no plural: «...sob seus pés» (16:20). Não nos atrevamos a atacar sozinhos o inimigo, pois como indivíduos somos muito vulneráveis; a promessa é para o corpo em sua totalidade. Somente vivendo a vida corporativa, todos os membros, em harmonia com o Espírito do Senhor, poderemos avassalar as
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trevas e prevalecer contra elas. Satanás não pode contra uma igreja que está bem edificada e fortalecida no Senhor. Como deseja Deus ver esta classe de igreja, e como nós desejamos ver o corpo funcionando desta maneira! Amados irmãos, o Senhor está trabalhando na edificação de sua casa. Ele disse: «Sobre esta rocha edificarei a minha igreja». Também sabemos que ele «apresentará a si mesmo uma igreja gloriosa». Nós sonhamos com essa igreja gloriosa. Em algum momento de nossas vidas, essa igreja entrou no fundo do coração. No Antigo Testamento, nos dias de Ageu, nos diz que Deus despertou o espírito de seus servos, então eles deixaram de ocupar-se somente com as suas próprias casas adornadas e vieram edificar a casa de Deus. Que o Senhor ilumine os nossos corações, pois a fé que hoje temos não só é para a salvação eterna individual, mas também viemos para ser pedras vivas para a edificação da casa de Deus. Porque o Senhor quer chegar a ter uma igreja gloriosa, e nós temos que trabalhar na mesma direção em que o Senhor está trabalhando. Temos que lutar como dizia Paulo: «…trabalho, lutando segundo a eficácia dele, a qual atua poderosamente em mim» (Col. 1:29). Ele clamava, e muitas vezes chorava, até que Cristo fosse formado nos crentes (Gál. 4:19), pois desejava que o Senhor obtivesse aquela «virgem pura» como diz em 2 Corintios 11:2. A epístola aos Romanos é um dos livros mais ordenados da Bíblia. Começa do mais básico e vai se desenvolvendo até o mais sublime. Cada capítulo é semelhante a um degrau de
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uma escada. Nós, como crentes, poderíamos estar no terceiro degrau, ou no quinto, o Senhor nos permita que logo cheguemos a estar no degrau (capítulo) dezesseis de nossa experiência cristã. Vamos contrastar dois versículos: Romanos 16:10 e Romanos 1:29. Enquanto em Romanos 16:10 aparece Apeles «aprovado em Cristo», em Romanos 1:29 aparece o contraste mais absoluto: «estando cheios de toda injustiça…». Aqui estão os dois extremos da escada. Em algum momento, Apeles esteve cheio de pecados e maldade. Foi um pecador como qualquer um de nós. O que ocorreu com Apeles? O que descobriu este irmão? Como chegou a ser aprovado no Senhor? Irmãos, Apeles nem sempre esteve aprovado. Aprovado é alguém que primeiro conseguiu superar muitas provas. Quantas dificuldades e conflitos terá enfrentado nosso irmão até aparecer finalmente aprovado? Se olharmos o livro de Romanos sob a perspectiva de que é necessário ir galgando etapa após etapa até chegar à maturidade do capítulo 16, é muito provável que possamos identificar em que degrau desta escada nos encontramos hoje em nossa experiência cristã. Estaremos só em Romanos 3, ou já avançamos até Romanos 5? Já são partes de nossa experiência as verdades de Romanos 6 e 7? Estaremos talvez em Romanos 8? Entretanto, não importa que estejamos até no 3. O importante é que estejamos! Mas, queira o Senhor que prontamente estejamos ao menos no capítulo 5!
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As verdades de Romanos Pensando que a maioria dos leitores conhece este livro, desejamos dar algumas chaves que sirvam de ajuda para avançar no ascendente caminho do Senhor. No capítulo 1 aparece uma ampla descrição do homem cansado, culpado – o homem sem Deus e sem Cristo. Assim estivemos todos em algum tempo, até que um dia a graça de Deus se manifestou a nós e viemos a conhecer o Senhor, seu evangelho, seu amor e sua salvação. Quando nos apropriamos da graça, já nos localizamos no capítulo 3 de Romanos, «justificados gratuitamente por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus» (V. 24). O bendito sangue de Jesus Cristo nos lavou de uma vez e para sempre. Bendito seja seu santo nome! É precioso estar consolidados em Romanos 3. A posição é muito vantajosa: podemos levantar todo louvor e adoração a Deus nosso Pai e proclamar a viva voz que fomos lavados de nossos pecados com o sangue do Cordeiro de Deus. Sigamos avançando. Em Romanos 4 nos encontramos desfrutando da bem-aventurança de que nossas iniqüidades foram perdoadas e que o Senhor já não nos culpa de pecado (4:7-8). Em seguida chegamos a Romanos 5, «tendo paz para com Deus» e com o amor de Cristo derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado, e nos gloriamos na esperança que não envergonha. Na segunda metade do capítulo 5, já começamos a conhecer algo de nossa herança adámica, mortal e pecaminosa. Agora começamos a conhecer a
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Se olharmos o livro de Romanos sob a perspectiva de que é necessário ir galgando etapa após etapa até chegar à maturidade do capítulo 16, é muito provável que possamos identificar em que degrau desta escada nos encontramos hoje em nossa experiência cristã. nós mesmos: que estamos associados com o transgressor Adão, e que é necessário que sejamos transladados de Adão para Cristo. E isto ocorreu desde o momento que cremos no Senhor. É um grande descobrimento poder ver que já não estamos em Adão mas sim «em Cristo». Obrigado Senhor! Podemos seguir avançando. Infelizmente, muitos irmãos passam anos repetindo as mesmas verdades básicas. Eles somente ficaram em Romanos 3; seu problema segue sendo «os pecados», e devem recorrer continuamente ao sangue para que volte a limpar-lhes; seus feitos pecaminosos ainda os apanham e sua vida cristã está estancada. Em Romanos 5 descobrimos que há algo mais importante que os pecados (plural). Agora começa a falar do pecado (singular). Romanos 5:19 diz que fomos «constituídos pecadores», e isto necessita uma solução radical, que vai além do sangue. Sendo preci-
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oso e valioso o sangue de Cristo, necessitamos algo mais profundo, que não só nos limpe dos fatos externos, mas também nos livre desta «máquina produtora» de pecados que somos nós mesmos. Os pecados são como as maçãs da macieira, e nos damos conta que a macieira está poluída. Necessita-se, em realidade, cortar a macieira e plantar ali outra vida, que produza verdadeiros frutos. Isso exatamente é o que ensina Romanos 6. Ali lemos: «Porque os que morremos para o pecado…». Irmão, você terá dado um grande passo se compreender a diferença entre «o pecado» e «os pecados». Os pecados foram (e sempre serão) lavados pelo sangue de Cristo. Não aceitemos acusação alguma, pois «...o sangue de Jesus Cristo seu Filho, nos limpa de todo pecado» (1 João 1:7). Agora bem, Romanos 6 nos diz que morremos «para o pecado». Notemos que o pecado não morre – sou eu quem morro. Mortos para o pecado e para a lei Me permitam uma pausa. Muitas vezes entrei em conflito com a Palavra de Deus, pois encontro que as verdades da Bíblia não são realidade em minha vida; são verdades no texto, mas não em minha experiência. Então surge o clamor: «Senhor, me socorra para que isto seja verdade em minha vida prática!». Muitas vezes esta experiência se vive com angústia, com gemidos profundos, com oração e até com jejuns, com consultas a outros irmãos ou a escritos de servos de Deus que possam nos esclarecer verdades fundamentais.
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Quando descobrimos nas Escrituras uma riqueza que não podemos desprezar, devemos nos apropriar delas com diligência. Do contrário, seríamos uns néscios. Se nos é oferecido tudo para sermos vitoriosos em Cristo, por que vamos seguir em torno somente de Romanos 3, se podemos chegar a ser mais que vencedores como em Romanos 8? Mas, para chegar a Romanos 8 necessitamos primeiro experimentar as verdades de Romanos 6 e 7. Olhemos em forma paralela Romanos 6 e 7. Em Romanos 7:4 diz: «Assim também vós, meus irmãos, morrestes para a lei…» Alto!, em Romanos 6:2 diz que morremos para o pecado, e aqui diz que morremos para a lei! Sigamos lendo: «…mediante o corpo de Cristo, para que sejamos de outro, daquele que ressuscitou dos mortos, a fim de que demos fruto para Deus». Como nós gostamos deste versículo! Pois todos desejamos ser frutíferos, ninguém deseja ser estéril; portanto, ponhamos atenção a estas palavras: o pecado e a lei não morrerão, nós morremos para o pecado e para a lei! O que é o pecado? Basicamente, é tudo aquilo que não devemos fazer. Do mesmo modo, a lei representa tudo aquilo que deveríamos fazer para agradar a Deus (pois a lei é justa, santa e boa, 7:12). Deus não nos requer coisas injustas. Entretanto, nos damos conta que nossa natureza é absolutamente impotente para ambas as coisas (você tem descoberto isto?). Não podemos evitar o mal e tampouco podemos fazer o bem que desejamos. À medida que avançamos em nossa ex-
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periência cristã, maior será nossa consciência da incapacidade «da carne», quer dizer, de nossas próprias forças para agradar a Deus. Tornam-se inúteis os esforços piedosos do homem religioso em sua tentativa por agradar a um Deus santo. Entretanto, irmãos, a Escritura diz que já morremos para o pecado e para a lei! (Imagino Apeles passando por esta estreiteza que representa Romanos 6 e 7. Ele não passou de Romanos 3 ao 16 de uma vez. Me imagino rogando: «Senhor, me revele esta palavra! Porque se for possível morrer para o pecado e para a lei, eu quero que isso se cumpra cabalmente em minha vida»). Quando não temos suficiente luz espiritual, imaginamos que isto é um longo e doloroso processo. Entretanto, aquilo já ocorreu! De tal maneira que se um irmão está tratando de morrer para o pecado ou para a lei, está errado. Ainda não entendeu a obra de Deus em Cristo Jesus para conosco, e está ainda fora do poder do evangelho, ou só o entendeu parcialmente, «porque no evangelho a justiça de Deus se revela por fé e para fé», e os que reinam em vida são os que recebem a abundância da graça. Irmão, deixe-me dizer-lo desta maneira: Você e eu necessitávamos do sangue de Cristo (com Romanos 3 estamos já muito claros); mas, além disso, precisávamos morrer e precisávamos ressuscitar. Necessitávamos um sangue que nos limpasse de nossos feitos pecaminosos e necessitávamos de uma morte que terminasse com nós mesmos, e além disso necessitávamos de uma ressurreição que nos levantasse dentre os mortos. Isto parece uma
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loucura, mas a palavra nos diz que fomos «sepultados junto com Cristo ... a fim de que como Cristo ressuscitou dentre os mortos pela glória do Pai, assim também nós andemos em nova vida. Pergunto: Cristo Morreu? Cristo Ressuscitou? Nossa resposta é um terminante: Sim! Agora, cremos no que está escrito? É obvio que sim, cremos! Então, nós também morremos e ressuscitou com Cristo! Convido-o, irmão amado, que da mesma maneira como você creu que o sangue de Cristo lavou todos os seus pecados, creia também que a morte de Cristo é inclusiva: incluiu a você também, e de igual forma sua ressurreição também nos inclui. Concluímos, então, que nós crentes morremos com Cristo e ressuscitamos com ele! Irmãos, isto não é algo para saltar de alegria? Não é esta a ampla provisão de Deus para todos nós? Você e eu precisávamos morrer e ressuscitar, e a menos que tenhamos visto estas coisas – porque isto terá que vê-lo espiritualmente – nosso entendimento deve ser iluminado, e para isto veio o Espírito Santo, enviado do céu, para nos dar a conhecer esta linguagem e esta experiência celestial. Para os homens, esta linguagem é loucura; mas para nós, Cristo é poder de Deus e sabedoria de Deus. De tal maneira, irmão, que em Cristo você acabou, você já não vive! Você escutou alguém falar disto alguma vez? Sim, pois era a experiência do apóstolo Paulo: «Com Cristo estou juntamente crucificado, e já não vivo eu, mas Cristo vive em mim» (Gál. 2:20). Paulo não estava louco (embora alguns
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incrédulos quiseram apelidá-lo de tal). Ele entendeu as coisas de tal maneira que soube que sem esforço algum, sua vida terminou com Cristo e de uma vez recomeçou com Cristo. Irmão, isto não se pode compreender tudo de uma só vez em uma só mensagem. Nossa capacidade de compreensão das coisas mais profundas de Deus deve ir num aumento constante. Isto está enunciado para que você se aprofunde. Agora o assunto fica em suas mãos. Se você se conformar com a experiência de salvação de Romanos 3, você é igualmente um filho de Deus e não irá para a condenação; mas temo que sua recompensa não será a mesma se você subir ao próximo degrau e procurar que se faça vida em você a verdade de que morremos e ressuscitamos com Cristo. Alguns se complicam com Romanos 7, mas o que está ocorrendo de verdade ali, é que o homem espiritual, o homem que deseja viver a vida do Espírito, está-se descobrindo a si mesmo. Seu problema não é só um assunto de certos «feitos» que o complicam em sua carreira cristã. Ele está descobrindo que possui tão somente as «boas intenções»: «O querer o bem está em mim, mas não o fazê-lo ... não faço o bem que quero, mas sim o mal que não quero, isso faço (7: 18-19). E começa a luta do bem e do mal, e estas coisas do «bem e do mal», leva-nos de volta a Gênesis (a famosa árvore da qual Adão comeu). Então, nosso problema vem de muito atrás, de Adão, mas nossa realidade atual não é de Adão, pois estamos em Cristo, e em Cristo morremos. De maneira que agora necessitamos que
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outra pessoa viva em nós: «Cristo em nós, a esperança de glória» (Col. 1:27). A glória de Romanos 8 Como vamos cumprir as demandas de Deus? A vida poderosa de Cristo está agora dentro de mim; é a vida de ressurreição..., e com isto chegamos a Romanos 8:2: «Porque a lei do espírito de vida em Cristo Jesus, livrou-me da lei do pecado e da morte». Bem-aventurado o crente que chega a este ponto. Tem descoberto que existem duas leis, e que ambas estão presentes em sua vida. Tal como em Paulo ou em Pedro, em todos nós estão operando ambas as leis. Até nas pessoas que possamos considerar mais refinadas está operando a lei do pecado e da morte. Entretanto, aquela lei foi vencida pela outra lei, a lei do Espírito de vida em Cristo Jesus. (É difícil muitas vezes que pessoas boas, morais, de sãs costumes, compreendam o evangelho. Freqüentemente, eles parecem não ter do que arrepender-se). Peço-te, irmão meu, ou jovem crente, que não descanse até que esta letra se translade do livro para o seu coração e se faça vida em ti, em sua experiência diária. Porque o mundo inteiro jáz no maligno, o pecado nos assedia, e as tentações estão aumentando à medida que o mundo avança. Hoje temos o pecado a um «click» de distância (linguagem computacional). Portanto, é necessário que nós os crentes desta geração sejamos achados de tal maneira estabelecidos em Cristo, sendo aprovados e avançando em cada um desses degraus até sermos aprovados em Cristo.
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Porque estou unido a Cristo, porque morri com Cristo, porque o Espírito de Cristo está dentro de mim, então, crendo isto, posso viver na abundância dessa graça. Não me derrubará qualquer tentação, não me arrastará qualquer murmuração, porque há uma lei dentro de mim; não porque sejamos melhores que os outros, mas sim porque recebemos a abundância da graça e nos apropriamos dela. Avançando em Romanos 8 nos encontramos com o Espírito Santo dando testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus (8:16), e, ocupados nas coisas do Espírito já não militamos com os pobres recursos da carne. Esta é uma vida maravilhosa, pois já não estamos sozinhos, tratando de agradar a Deus com as nossas próprias forças. Agora, o Espírito do Deus vivo derramado no dia de Pentecostes pela obra consumada de Cristo, habita no coração do crente e dá testemunho ao nosso espírito de que não somos forasteiros, mas sim concidadãos dos santos e membros da família de Deus; que não somos das trevas, mas sim da luz; que não somos mais meros indivíduos, mas sim membros do corpo de Cristo, e mantemos uma comunhão viva com o Deus vivo! Finalmente Romanos 8 nos ensinará que somos mais que vencedores por meio daquele que nos amou. Podemos imaginar Apeles avançando em Cristo, superando etapa atrás de etapa? Depois de ter sido um homem cheio de pecados, encheu-se da palavra, valorou o sangue de Cristo, valorou a justificação, valorou seu trasporte de Adão para Cristo, viu-se
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morto em Cristo, viu-se ressuscitado em Cristo, começou a viver pela lei do Espírito de vida, e chegou a ser um homem mais do que vencedor frente às tribulações da vida... Membros de um corpo Mas isto não termina em Romanos 8. Embora seja mais que vencedor, ainda é um indivíduo. Mas em Romanos 12 se introduz um novo conceito. E ao dizer um novo conceito, digo-o a propósito, para que você enumere em seu coração todos os conceitos já introduzidos. Em Romanos 12 aparece outro conceito: Somos membros de um corpo. Você nunca será aprovado sozinho, como indivíduo, nunca. Você necessita do corpo, necessitamos de outros membros do corpo. Para viver a realidade do corpo de Cristo, é imprescindível uma profunda renovação em nosso entendimento, todo alto conceito de nós mesmos, nosso individualismo, deve ser demolido. Quão conscientes estamos de que somos membros uns dos outros? (Rom.12: 3-5) O que você faz, seja bom ou seja mau afetará (para bem ou para mal) a toda a igreja. Em Romanos 12:11 diz: «No que requer diligência, não sejais preguiçosos; sede fervorosos no espírito, servindo ao Senhor». Como nós gostamos disto! Mas, em troca, é motivo de muita tristeza encontrar-se com cristãos apagados, com uma oração rotineira. Mas, que distinto é quando alguém está fervoroso no espírito, e se derrama em amor!: «...alegrai-vos na esperança; pacientes na tribulação; constantes na oração...». Assim chegamos a Romanos 14:1:
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«Recebam ao fraco na fé, mas não para contender sobre opiniões». Ah, Apeles já está mais maduro! Em Romanos capítulo 3 ou 4, certamente, ele diria: «Eu penso isto, eu penso outra coisa». Agora não. Apeles já morreu. Já não discute sobre pontos doutrinários. Se um irmão pensar diferente, ama-o, recebe-o; não contende sobre opiniões, em troca dirá: «Simplesmente, irmão, se você guardar o dia, para o Senhor o guarda; se não comer carne, para o Senhor não come. Mas, amemos ao Senhor; isso não é essencial; bendigamos ao Rei». Se, mediante a graça de nosso Deus, alcançamos este degrau em nossa experiência em Cristo, o Senhor terá ganho muito conosco. Até há mais. Romanos 15:1: «Assim, os que somos fortes devemos suportar as fraquezas dos fracos, e não agradar a nós mesmos». Eu quero estar em uma igreja assim irmãos, onde há fortes e há fracos, que convivem; se suportam, se amam! Versículo 5: «Mas o Deus de paciência e de consolação lhes dê entre vós um mesmo sentir segundo Cristo Jesus, para que unânimes, a uma voz, glorifiquem a Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo». Reparou que Deus tudo dá, que Deus não vende a vida? Já estamos concluindo. Romanos 15:13: «E o Deus de esperança os encha de todo gozo e paz em crença, para
que abundem em esperança pelo poder do Espírito Santo». Enchamos-nos de esperança; é possível amadurecer em Cristo. Enchamos-nos de gozo e de paz em crença. Creiamos que é possível que experimentemos isto de morrer e ressuscitar em Cristo; creiamos que é possível chegar a ser aprovados em Cristo, e que a gloriosa realidade do capítulo 16 do livro de Romanos a possamos viver também nós, em nossos dias. Irmão, se você não passou pela morte e a ressurreição, como vai viver a vida do corpo? Se a vida de ressurreição não é uma realidade em você, como vai se entender com os irmãos? Por ser tão distintos uns dos outros, todos precisamos morrer e ressuscitar. Quando todos ressuscitamos, congregamo-nos em um e chegamos a ter um mesmo sentir, a mente de Cristo, a mesma vida, a vida de Cristo. Deus está trabalhando persistentemente, ele obterá o que quer: um corpo, não somente indivíduos espetaculares, um corpo onde todos os membros funcionam harmonicamente, sem hierarquias asfixiantes, um corpo onde na verdade, Jesus Cristo, Sua Cabeça, preside mediante o glorioso Espírito Santo que enche poderosamente a cada um de seus membros. Que assim seja. (Síntese de uma mensagem ministrada na Colômbia, em julho de 2006)
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Santidade A santidade em nós é a cópia ou a transcrição da santidade que está em Cristo. Assim como o carimbo imprime a linha e a linha os caracteres, e o filho adquire cada traço do seu pai, assim é a santidade de Deus em nós. Philip Henry
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No que consiste a edificação do corpo de Cristo? Quem são chamados a fazer esta obra? Como?
Aperfeiçoando
aos Santos
Rodrigo Abarca
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O propósito divino omo vocês sabem a carta aos Efésios tem como assunto principal o propósito eterno de Deus, no que consiste esse propósito, quais são os meios que Deus dispôs para levá-lo a cabo, e de que maneira finalmente seu propósito vai se cumprir plenamente. Deus quer que este seja também nosso propósito, e por isso quis revelálo. E isto é algo que não devemos dar por garantido; quer dizer, não porque falemos do propósito eterno de Deus, quer dizer que esse propósito está compreendido e gravado em nossos corações. Tem que ser revelado pelo
Espírito, e converter-se no assunto que governa a totalidade de nossas vidas. Qual é esse propósito, esse mistério, como o chama Paulo? Em Efésios 1:9-10 diz, «reunir todas as coisas em Cristo». Agora, a palavra «reunir» não só significa juntar ao redor de Cristo todas as coisas. A palavra grega significa basicamente elevar Cristo por cabeça, para que, sob sua autoridade, se reúnam todas as coisas. E também significa fazê-lo, o centro de todas as coisas; que todas elas convirjam para ele, e encontrem sua razão, seu destino, sua finalidade, nele. Em suma, que Cristo seja o tudo e em todos. Como Deus vai realizar esse pro-
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TEMA DA CAPA
pósito? Seu plano tem duas etapas. A primeira delas, que é fundamento da segunda, já se cumpriu, e compreendem a encarnação, a morte, a ressurreição, a exaltação e a coroação de seu Filho como Rei e Senhor. (Ef. 1:2022). A segunda é que seu Filho tinha que revelar-se e manifestar-se através de uma criação especial. E essa criação não era a raça dos anjos, mas sim o homem. Por isso O Verbo foi feito carne. Cristo é a Cabeça O Senhor Jesus Cristo é Rei e Senhor de todas as coisas; o Pai submeteu todas as coisas sob seus pés. Mas, sobre todas as coisas, ele o deu por cabeça da igreja (Ef.1:22). Então, a relação que há entre Cristo e todas as coisas é distinta da relação que há entre Cristo e a igreja. Sobre todas as coisas, ele é Rei e Senhor, e ele governa e domina sobre tudo. Mas com relação à igreja, ele não somente é Rei e Senhor, mas também é sua Cabeça. Assim como uma cabeça está vinculada a seu corpo, e é inseparável de seu corpo, assim Cristo se uniu à igreja, para sustentar, para alimentar, e para expressar-se a si mesmo através dela. Há entre Cristo e a igreja uma intimidade e uma relação que não existe entre Cristo e nada mais neste universo criado. A cabeça necessita do corpo para expressar-se. Quando o Pai o faz cabeça da igreja, ao mesmo tempo põe uma ‘limitação’ para o Senhor: Que ele tem que se expressar, revelar e manifestar, e levar adiante seus pro-
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pósitos através de seu corpo que é a igreja. Imagine você, sua cabeça atua separada de seu corpo alguma vez? Se em sua cabeça você tem planos que levar adiante, por exemplo, construir uma casa, planejada desenhada e pensada por completo em sua mente. Na hora de executar seus planos, o que necessita? Não necessita suas mãos, ou seus pés? Agora, suponhamos que sua cabeça tenha sentimentos profundos. Você é jovem, está apaixonado por alguém, e quer lhe dizer que a ama. Não necessita um corpo? Se você não tivesse rosto, olhos, expressões faciais e corporais, como poderia expressar o que sente? Quando Cristo se converte em cabeça da igreja, se auto-limita dessa maneira a si mesmo e fica indissoluvelmente atado à igreja, de maneira que ele agora necessita da igreja para cumprir seus planos, para levar adiante os propósitos eternos de Deus. E essa é a segunda parte do plano de Deus. Que Cristo possa encher tudo de si mesmo por meio da igreja. Cristo é o modelo Agora, vamos a Efésios 4. «Aquele que desceu, é o mesmo que também subiu acima de todos os céus para enchê-lo todo» (v.10). Aí está o propósito – que Cristo encha tudo. Isso quer dizer, irmãos, que ainda nem tudo está cheio de Cristo. No céu, tudo está cheio dele; mas, na terra, nem tudo está cheio dele. Ainda o mundo está sob o príncipe da potestade do ar, e Satanás está movendo-se e manifestando suas
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intenções e intuitos malignos nesta terra. Mas, como Cristo vai encher tudo? Edificando sua igreja, e enchendo a sua igreja dele mesmo. E, uma vez que a igreja estiver cheia dele, então a igreja vai encher tudo dele e já não haverá mais lugar para Satanás na terra. Esse é o plano. Por isso diz o versículo 3:21, falando de Deus o Pai: «...a ele seja a glória na igreja em Cristo Jesus por todas as gerações». Pois a Igreja é o cumprimento eterno de seu propósito em Cristo. Que meios ele vai empregar para edificar a sua igreja? Leiamos Hebreus 3:5: «E Moisés na verdade foi fiel em toda a casa de Deus, como servo, para testemunho do que haviam de dizer». Quando Moisés tirou os israelitas do Egito, que cruzaram o mar Vermelho e chegaram ao monte Sinai, Deus o chamou para que estivesse com ele quarenta dias e quarenta noites. Ali, Deus lhe mostrou detalhadamente o desenho de um tabernáculo ou casa. Deus foi revelando a Moisés essa casa e todos os móveis, utensílios e elementos que deviam estar na casa. E não só isto, mas também o serviço sacerdotal, tudo o que tinha a ver com o funcionamento dessa casa. Enquanto Deus falava com Moisés, dizia-lhe: «Farão um tabernáculo... Farão uma arca ... um altar ... uma mesa ...». Cada vez que ele falava com Moisés e terminava de descrever um aspecto dessa casa, advertia-lhe: «Presta atenção, Moisés: Que faça todas as coisas –não oitenta por cento, não noventa por cento, não noventa e nove por cento, mas sim to-
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das, cem por cento– conforme o modelo que te foi mostrado no monte». Por que Deus fez essa advertência a Moisés? Diz Estevão que Moisés era um homem preparado em toda a sabedoria dos egípcios, poderoso em suas palavras e em suas obras. Pois bem, os egípcios foram os maiores construtores da antigüidade. Até o dia de hoje, as coisas que eles construíram são consideradas maravilhas do mundo antigo: as pirâmides, os templos que edificaram. Inclusive os israelitas construíram cidades inteiras para os egípcios. Assim, se alguém sabia de construções e edificações, esse era Moisés. E se alguém sabia de edificação, eram os israelitas. Mas Deus disse a Moisés: «Eu vou usar o conhecimento que você tem, de construção, de edificação», (porque se ele não soubesse nada de construção, Moisés não teria entendido nada), mas com uma advertência: «Não pode pôr nada de ti mesmo no desenho, nem na obra da minha casa». Era uma grande tentação para Moisés adicionar algo de si mesmo ao desenho. Mas diz que Moisés foi fiel como servo. Sabe o que é um servo? É um escravo. Quando um amo manda a um escravo fazer algo, o escravo tem que simplesmente ir e fazer as coisas como lhe disse. Não tem que receber explicações. Moisés não pediu explicações. Fez tudo como Deus lhe mandou, e porque ele foi fiel, diz a Escritura, tudo o que ele fez pode dar testemunho agora, pode representar tipologicamente a Cristo e à igreja. Por exemplo, a arca
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tinha que ter um côvado e meio de altura, para representar a união do homem com Deus, porque um e meio mais um e meio são três, e três é o número da Divindade. A arca representa a união de Deus e do homem, em Cristo – um e meio para Deus, um e meio para o homem. Se Moisés tivesse posto meio côvado a mais, a arca teria ficado bonita, mas sem nenhum significado em relação com Cristo. Agora, quando Moisés ergueu o tabernáculo, Deus foi severo com respeito a algo que era uma sombra e uma figura, destinada a passar e a desaparecer. Mas agora estamos falando da casa eterna e definitiva de Deus que é a igreja. Então, se Deus foi tão severo e rigoroso com o que era sombra e figura, não tem que ser rigoroso e severo com o original? Será que Deus mudou e agora nos permite improvisar ou pôr nossas próprias idéias na igreja, ou introduzir nossos conceitos, nossas opiniões e as coisas que cremos saber na edificação do corpo de Cristo? Terá mudado Deus? Não; tudo tem que ser feito «conforme o modelo que te foi mostrado no monte» (Ex. 25:40). Você perguntará: «Temos um modelo para a edificação da casa? Sim, e é um modelo muito claro, muito específico, concreto e real. Esse modelo é o Senhor Jesus Cristo! Por isso dissemos que a primeira parte é a revelação do Senhor Jesus Cristo. «Deus foi manifestado em carne» (1 Tim. 3:16). E a Escritura diz literalmente «pôs seu tabernáculo», sua morada, no meio de nós. (João 1:14). Assim, ao vê-lo, nós vemos a
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morada de Deus com os homens. E esse modelo agora tem que ser mostrado e comunicado em nós. A plenitude dele tem que vir a nós e, pelo Espírito, o que é dele tem que ser formado em nós. Não só um aspecto dele, não só uma parte dele. Assim como a plenitude de Deus habitou nele e habita nele, assim a plenitude de Cristo tem que habitar na igreja. Os dons aperfeiçoam Entretanto, como Cristo vai encher tudo em todos? O primeiro, diz a Escritura, é que ele deu dons aos homens. E aqui começa a edificação da casa. Agora, aqui os dons, como já outros irmãos explicaram muito bem, não são dons que ele deu às pessoas. Ele também dá dons individuais aos membros de seu corpo. Mas estes dons que dá aqui não são dons dados a membros do corpo, individualmente, mas sim são pessoas que ele dá como dons a todo o corpo. Ele prepara a um homem, converte-o em um apóstolo, e o dá à igreja. Ele prepara a outros homens, converte-os em profetas, e os dá como presentes a sua igreja. Ele toma ainda a outros, converte-os em evangelistas, e os dá em seguida à igreja; e ele prepara a outros como mestres, e os dá à igreja. Jovens, prestem atenção a isto. O Senhor toma homens e os prepara; trata com eles, trabalha com eles, e não em um período curto de tempo. Vai revelando-se a eles, e uma medida dele, dos planos que estão nele, forma-se neles. Assim os prepara, e em seguida os dá a seu corpo. Essa é a
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Você pode vir a milhares de reuniões e receber e ser exposto ao ministério da palavra por anos e anos, e você não vai crescer um centímetro na edificação de Deus. Porque a edificação de Deus não tem a ver com receber a palavra somente, mas sim com tomar essa palavra e começar a edificação do corpo de Cristo. forma em que ele edifica a casa. Ele não começa organizando nada; nem com esquemas, ou metodologias ou com planos em um papel. Ele começa sempre sua obra com homens formados por ele e enviados por ele. Esse é o método de Deus. Há algum método na Escritura para levantar uma igreja? Será que o Senhor chamou um dia aos apóstolos e lhes disse: «Venham para cá, agora eu vou lhes explicar o que é a igreja, seu organograma e suas funções?» Assim fez o Senhor à igreja? Um método, um plano? Não, irmãos amados, o plano é ele, o método é ele. Homens que o conheçam, que tenham estado tempo com ele, que tenham estado na intimidade com ele, que tenham ouvido a voz dele. (1 João 1:1-2). Ele formou apóstolos, e esses homens foram dados como dons à igre-
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ja. Os apóstolos, para colocar fundamentos. Paulo diz: «...eu como perito arquiteto pus o fundamento» (1 CO. 3:10). Qual é o fundamento? Jesus Cristo é o fundamento. «E perseveravam na doutrina dos apóstolos» (At. 2:42). O que é a doutrina dos apóstolos? Tudo o que eles ouviram, contemplaram e apalparam enquanto estavam com Jesus Cristo, isso se converteu depois na doutrina dos apóstolos. «E todos os dias, no templo e pelas casas, não cessavam de ensinar e pregar a Jesus Cristo» (At. 5:42). A Escritura diz: «...o fundamento dos apóstolos e profetas» (Ef. 2:20). Então, os apóstolos e profetas vão de antemão; os apóstolos, para pôr o fundamento, e os profetas, para regar sobre o fundamento, para ampliá-lo. Ambos, profetas e apóstolos, estão relacionados com a revelação de Jesus Cristo dada à igreja através deles. Mas os primeiros colocam o fundamento de Cristo, e os segundos aprofundam o fundamento, ampliam a visão e o entendimento de Cristo para a igreja. O terceiro que ele deu à igreja são os evangelistas. Também é um aspecto de Cristo que se dá à igreja; porque, recordem, a igreja tem que ser a plenitude de Cristo. A que veio o Filho do Homem? «...o Filho do Homem veio buscar e a salvar o que se havia perdido» (Lc. 19:10). Bendito seja o Senhor Jesus Cristo! Ele foi o primeiro dos evangelistas; ele veio com um coração cheio de amor pelos perdidos. Cristo se dá a nós através dos evangelistas. O que seria de nós sem o amor daqueles que, representando
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ao Senhor Jesus Cristo, pregaram o evangelho! Aqueles que deixaram seus lares em terras longínquas, aqueles missionários de antigamente, que cruzaram meio mundo para trazer o evangelho. O que seria de nós sem eles! Em seguida, pastores e mestres. Eles tomam tudo o que está na doutrina dos apóstolos, a revelação dos profetas, a visão de longo alcance dos evangelistas, e começam a aplicar em todos os aspectos da vida da igreja, até nos mínimos detalhes. Aqui temos a igreja completa? Não, não temos a igreja ainda; aí só temos o princípio da igreja. Então, prestem atenção, por favor. A quem deve vocês apegar-se? Apeguem-se a aqueles homens que Deus deu à igreja, sentem-se aos pés deles, aprendam de Cristo através deles. Busquem-nos, porque vão conhecer Cristo através deles, porque são um presente de Cristo para vocês, e para toda a igreja. Uma coisa mais a respeito. Paulo diz aos Coríntios: «...tudo é vosso: seja Paulo, seja Apolo, seja Cefas ... tudo é vosso, e vós de Cristo, e Cristo de Deus» (1 Co. 3:21:23). Isto significa que Deus deu dons à igreja. Mas, o que é mais importante? Os dons ou a igreja? Se você tiver uma noiva e vai se casar com ela, e lhe dá muitos presentes, o que é mais importante: sua noiva ou os presentes? A noiva! O que é mais importante, os dons –apóstolos e profetas, evangelistas, pastores e mestres– ou a noiva de Cristo? A noiva! Eles são presentes, mas ela é sua noiva. A noiva é mais importante que os presentes. Então, a noiva não deve
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estar dependendo dos presentes, mas sim dependendo do Noivo. Graças a Deus pelos dons; mas nossa vista tem que estar no Senhor dos dons. Aqui não há uma hierarquia. O Senhor não está falando de uma estrutura hierárquica de governo sobre a igreja; ele está falando de dons, de presentes que ele livremente dá à igreja. Vêm dele, são dele. Tampouco que a igreja se juntou e disse: «Vamos nomear apóstolos, profetas, evangelistas, etc...». Os homens não podem ‘fabricar’ apóstolos, profetas, evangelistas, pastores ou mestres. Só Cristo pode, e ele os dá à igreja. Não cometamos um engano; isto não é um método. É a vida de Cristo que vai se desenvolvendo, pelo Espírito, na igreja. «...Tudo é vosso...». Apropriem-se de tudo. Tomem os apóstolos, são seus; os profetas, são seus; os evangelistas, são seus. Irmãos e irmãs todos os dons são de vocês; mas vocês são de Cristo, e Cristo é de Deus. Não desperdice os dons, não os menospreze, não os desprezem. Dêem graças ao Senhor que nos deu dons; recebaos todos, acolha-os a todos. Mas você é de Cristo, a igreja é de Cristo, e Cristo é de Deus. Então, qual é a finalidade desses irmãos? Aqui vamos ter que redefinir algumas palavras, de acordo com a Escritura. A finalidade desses irmãos, é edificar a igreja? Não. Leiamos de novo Efesios 4:12: «...a fim de aperfeiçoar...». Agora, se você segue lendo, um pouco mais adiante, aparece a palavra edificar. Mas, aqui não diz que eles são dados para edificar a igreja, mas sim para aperfeiçoá-la. A palavra
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aperfeiçoar não é fazer perfeitas às pessoas. A palavra grega se traduz melhor por preparar, equipar, e reparar, quando é necessário. Tudo isto é aperfeiçoar. É mais ou menos a idéia que temos quando em uma empresa dizem: «Vai a um curso de aperfeiçoamento». Não é que você vai a esse curso para sair dali perfeito; mas sim para sair mais preparado para fazer seu trabalho. Essa é a idéia aqui: aperfeiçoá-los, prepará-los para fazer seu trabalho, para cumprir sua função no corpo de Cristo. Todo o corpo edifica Os apóstolos, os profetas, os evangelistas, os pastores e mestres estão no corpo para preparar os santos, para que os santos cumpram sua função no corpo de Cristo. Eles não estão para edificar os santos. Preste atenção a isto; é muito importante a distinção que faz a Escritura. Por quê? Porque o ministério da palavra, por si mesmo, não edifica. Você pode vir a milhares de reuniões e receber e ser exposto ao ministério da palavra por anos e anos, e você não vai crescer um centímetro na edificação de Deus. Você pode ter milhares de horas acumuladas de ministério da palavra, e nem por isso foi edificado. Porque a edificação de Deus não tem a ver com receber a palavra somente, mas sim com tomar essa palavra e começar a edificação do corpo de Cristo. E isto não o fazem os ministros da palavra, mas quem? Veja comigo. «...a fim de preparar os santos para a obra do ministério». Ah, agora sim, todos
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nós, os santos, fazemos a obra do ministério! E, qual é o propósito da obra do ministério? A edificação do corpo de Cristo! Aqui, sim, está a palavra edificação. Quando os santos começam a trabalhar e a fazer sua parte, então logo começa a edificação do corpo de Cristo. Quando você vem a uma reunião e diz: «O irmão pregou uma palavra tão bonita, tão do Senhor! Saí tão edificado!». Saiu edificado? Não! Saiu preparado, saiu animado, saiu treinado. Mas agora tem que ir edificar; agora, pouco depois, tem que ir edificar. Tivemos recentemente o Mundial de Futebol. Ali os treinadores preparam os seus jogadores, ensinam-lhes estratégias, e fazem esquemas, quer dizer, os treinam (-os). Mas, imaginemos que esses jogadores nunca jogaram uma partida? Que frustrante seria para eles! Às vezes nós somos como uma equipe de futebol destreinada, que nunca joga uma partida de verdade. Por quantos anos você foi treinado? Quantas pregações, quantas ministrações da palavra você recebeu em sua vida? Eu diria que você está destreinado, irmão amado. O que você acha? Está utilizando tudo o que recebeu para edificar o corpo de Cristo, ou não está fazendo nada e segue preparando-se? É a capacitação, o treinamento desses irmãos que permite que logo esses irmãos, tendo as ferramentas, os elementos necessários, levem a cabo a obra do ministério. E qual é a obra do ministério? A edificação do corpo de Cristo. Assim, o que Deus tem em mente,
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não é a edificação pessoal somente. Deus quer que o corpo cresça, que a igreja se edifique. Ele quer que todo o corpo comece a tomar forma; a forma de Cristo. Isto significa que o corpo tem que começar a ajustar-se, a relacionar-se. As juntas têm que começar a ligar-se entre si; os membros têm que começar a unir uns com os outros e a trabalhar uns com os outros. E então, o corpo começa a funcionar, quando todos os membros estão ligados, entrelaçados e amalgamados uns com os outros. Nisto consiste a edificação. As pedras se juntam umas com as outras para elevarem-se juntas como casa de Deus. Então, todos os membros, por meio da palavra que tem recebido dos apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres, alimentam uns aos outros, e (se) nutrem-se uns com os outros da cabeça que é Cristo. Vou dar um exemplo: A igreja em Jerusalém. Ela começou com doze apóstolos e mais ou menos uns quinze mil irmãos, contando as mulheres e as crianças. «E todos os dias, no templo e pelas casas, não cessavam de ensinar e pregar a Jesus Cristo» (At. 5:42). E assim, (pelos) 50 anos consecutivos, esses irmãos estiveram escutando os apóstolos e deleitando-se com o que os irmãos ensinavam? Não, não foi assim, irmãos. Porque o que Deus tinha em mente não era que essa igreja estivesse toda a vida recebendo e escutando palavra após palavra. Ele queria que o corpo começasse a funcionar, a encher toda a terra do conhecimento de seu Filho Jesus Cristo. Então, aquilo foi uma escola. Je-
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rusalém foi a primeira escola de Deus, de treinamento e de capacitação na terra. E não durou muito tempo, não mais que sete a dez anos. Quando o Pai considerou que estavam preparados, ele deteve tudo isso e disse: «Muito bem, agora estão preparados, vão!». Quem foi... os apóstolos? Não. Quando começou a perseguição por motivo de Estevão, diz a Escritura que, em uma noite, toda Jerusalém ficou vazia de irmãos, pois todos foram dispersos, exceto... os apóstolos! Os apóstolos ficaram em Jerusalém, para voltar a formar outra geração. Já seu trabalho tinha sido feito. Agora, aqueles irmãos que tinham o fundamento dos apóstolos com eles, e a revelação dos profetas, a visão dos evangelistas ardendo em seu coração, o ensino dos pastores e mestres, estavam preparados para ir. E Deus os enviou a todos eles. E por onde eles foram? O que ocorreu? Por toda a região da Judéia, e por toda Samaria, e até bem distante como Antioquia, a igreja de Jesus Cristo se multiplicou. Não foram os apóstolos que fundaram as Igrejas na Judéia. Não foram os apóstolos que fundaram a igreja em Antioquia. Foram os irmãos e irmãs. Dirás: «Mas eu pensava que os obreiros são os que levantam as igrejas». Pois, observe que não. Sim e não. Eles levantam algumas. Mas se você tiver o fundamento, então, você pode ir e pôr esse fundamento em outros, você pode ser um obreiro do Senhor em qualquer lugar que (vá). Quantos de vocês têm a revelação de Cristo recebida dos profetas?
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Quantos viram ao Senhor? Você pode ir falar com outros a respeito de Cristo, de sua glória, de sua grandeza, de sua profundidade, de sua autoridade. Você pode! Para isso foi preparado por Deus. Agora, quantos ouviram a Cristo dos evangelistas? Então, você pode levar essa palavra a qualquer parte do mundo. Você também é um evangelista, porque tem o evangelho de Jesus Cristo ardendo em seu coração. E quantos foram pastoreados por anos? Quantos ensinos para edificar a sua família, seu matrimônio, sua situação de trabalho, toda a sua vida inteira? Quanto tem recebido de Cristo por meio dos pastores e mestres? Muito, verdade? Agora você pode ir e aconselhar a outros, pode ir e ensinar a outros. Você também é um mestre e é um pastor para outros. Esse é o propósito do Senhor! Ele quer que todos nós vamos fazer a sua obra, a edificar a sua casa, a levantar a sua igreja em toda parte. Uma história mais, para que você veja que isto não só ocorreu em Jerusalém. Também quando Paulo e Barnabé realizaram sua obra apostólica. Você recorda que Paulo, na metade de sua carreira, escreve uma carta à igreja em Roma – a carta aos Romanos? Você sabe que Paulo nunca havia estado em Roma? Não conhecia a igreja em Roma de vista, pois nunca tinha pisado nas ruas de Roma. Entretanto, quando escreve sua carta aos Romanos, no capítulo 16 da mesma, começa a saudar irmãos e irmãs como se os conhecessem por toda a vida. Agora, como podia Paulo, que nunca havia estado em Roma, conhe-
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cer aqueles irmãos? É que em Roma tinha ocorrido o mesmo que na Judéia, em Samaria e em Antioquia. Os irmãos das igrejas na Ásia Menor e da Acaia (Grécia) tinham ido a Roma. Eles tinham ido, não Paulo. Esses irmãos começaram a igreja em Roma. Irmãos que se formaram com Paulo, mas que logo foram e fundaram outras igrejas. E muitos anos depois, Paulo chegou a Roma também, preso e em cadeias. Talvez você, irmã, se considera sem importância. Leia os nomes que menciona Paulo. Quantas irmãs há nessa lista? A metade pelo menos. Irmãs que trabalharam muito no Senhor, diz Paulo, que foram colaboradoras em Cristo Jesus, que ajudaram a levantar a igreja de Jesus Cristo em Roma e em muitas outras cidades. «Priscila e Áquila, meus colaboradores». E menciona a Priscila antes de Áquila, seu marido. Irmã, você acredita que pode? Está disposta? Ou queremos seguir anos e anos, todos sentados, escutando mensagens e mais mensagens, e treinando-nos e treinando-nos, sem nunca fazer o trabalho que o Senhor espera de nós? Vocês crêem que os obreiros devem fazer todo o trabalho? Não, irmãos, não é trabalho deles; eles preparam os santos para que vão e façam a obra do ministério. Não diz isto a Escritura? E sua tarefa continua «...até que todos cheguemos à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, a um varão perfeito, à medida da estatura da plenitude de Cristo» (Ef. 4:13). Jovens, para que vocês estão sendo preparados? Não é para tomar seu
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lugar nesta grande obra do ministério que é a edificação do corpo de Cristo? Não tenham uma visão estreita. Não digam: «Eu sou pouca coisa, eu nasci em sei lá que esquecido povoado». Isto não importa. Não importa de onde é ou de que família procede. Se tiver a Cristo, se o fundamento está em seu coração, se tiver visto o Senhor, se o evangelho arder em seu coração, você pode ir também. O Senhor necessita que vá, que amplie a sua visão e que alargues o seu coração. Alguém diz: «Eu sou muito velho, já passou meu tempo». Não, nunca passa seu tempo, irmão; se você for
velho, o Espírito de Deus vai te renovar e sustentar até o final. Mas você anda e faz o que o Senhor quer que faça. Na mesma igreja local tem que fazer tudo o que o Senhor quer que faça. Você tem que ser um obreiro aí, um profeta, um mestre, um evangelista, na medida em que o Senhor tem te dado ser essas coisas onde você está. Desta maneira, todos podemos e devemos colaborar na obra de edificação que o Senhor encomendou a seu corpo que é a Igreja. Até que tudo seja cheio do conhecimento da glória do Senhor. Amém. Bendito seja o nome de Senhor!
*** Quando Davi foi rei Quando os filisteus souberam que Davi tinha sido feito rei de Israel, então foram "em busca de Davi". Agora era um personagem de suficiente importância para ser alvo de seu ataque; e é quando nos rendemos a Deus, nos consagrando aos propósitos da salvação, quando todos os poderes da maldade se reúnem para causar a nossa queda e nos desonrar com derrota e fracasso. A. B. Simpson, Mateus Os salmos de Lutero Diz-se que um dia perguntaram a Lutero qual dos Salmos era o melhor, e respondeu: «Psalmi paulini»; e quando seus amigos insistiram em saber quais eram, acrescentou: «O 32, o 51, o 130 e o 143, porque todos eles ensinam que o perdão de nossos pecados vem sem a lei e sem as obras do homem que crê, e portanto os chamo de Salmos Paulinos». Lutero, Conversações de sobremesa
Como trapo Enrique Suso (1300-1365), o místico alemão, conta em uma de suas cartas que um dia quando teve que sofrer muito por penas interiores e por desprezos e humilhações, viu da janela de sua cela um cão que brincava no pátio com um trapo. Ele o mordia, babava nele, arrastava-o, rasgava-o. "Assim deve você fazer", disse-se. "Arrasto-te para o alto ou te atiro para baixo. Ainda que te cuspa, você deve aceitá-lo tudo alegremente, sem protestar, como o trapo, se ele tivesse consciência".
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Os ministros da Palavra não são 'estrelas' cintilantes, mas sim servos da igreja .
Servos
da Igreja Eliseo Apablaza
Texto: Efésios 4:7-16.
N
esta passagem de Efésios 4 encontramos três temas principais: Os dons, os ministérios e as operações. Os dons aparecem no começo e são outorgados pelo Senhor à Igreja para constituir ministérios. Sem os dons não existem ministérios. Os ministérios são detalhados no versículo 11 – são cinco, embora alguns dizem que são somente quatro, porque os pastores e mestres formariam um só ministério. Finalmente, nos versículos 15 e 16 aparecem as operações, isto é, o funcionamento de cada membro do corpo. Nos últimos tempos, no cristianismo, os dons e os ministérios têm sido
fortemente enfatizados. Pouco é tratado sobre as operações. Mas cremos que a ênfase final de Deus antes da vinda de Cristo não estará nos dons nem nos ministérios, mas nas operações. No começo do século XX em todo o mundo foi dada uma grande ênfase aos dons. Os dons do Espírito Santo foram manifestados em todo o mundo. Foi um grande avivamento pentecostal. Mas essa não era a meta de Deus. Nas últimas décadas tem ocorrido uma ênfase nos ministérios. No entanto, por muitos anos parece que havia somente um desses ministérios, os evangelistas e os pastores.
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Um problema semântico No versículo 12 trata da função destes quatro ministérios, que são segundo algumas versões bíblicas, «o aperfeiçoamento dos santos». Por muitos anos não tivemos uma correta compreensão da palavra «aperfeiçoar». Pensávamos que o objetivo dos ministérios era levar a perfeição, na culminação da vida cristã, aos santos. Mas neste último tempo temos tido melhor compreensão. A palavra grega que é traduzida como «aperfeiçoar» aqui, tem uma variada forma de significados. E, aparentemente, o mais importante deles, não é precisamente «aperfeiçoar», mas, «equipar» ou «capacitar». William Barclay diz que a palavra grega «katartismós» (que traduzido é: aperfeiçoamento») tem dois grandes significados: o primeiro é «ajustar e por em ordem», o segundo: «equipar ou habilitar algo para um propósito determinado». E coloca o seguinte exemplo: «é usado em relação a habilitação de um navio ou de um exercito, quando são totalmente equipados, armados e formados em posição de batalha». Assim, podemos ver que o ministério dos apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres é posicionar o exército, o qual é a igreja, em posição de batalha. Assim, se entendemos «equipar» em vez de «aperfeiçoar» aqui em Efésios 4:12, o assunto muda radicalmente. Portanto a função dos ministérios não é final, mas sim, medial e transitória. A tarefa dos ministros não chega até a edificação da igreja. Anteriormente dávamos grande
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ênfase à função dos ministérios, que pensávamos que era «aperfeiçoar os santos». Mas a ênfase do Espírito Santo esta mais abaixo no texto aqui citado. O raciocínio do Espírito não termina no versículo 12, onde se encontra o serviço dos ministros, mas no versículo 16, onde está o serviço de todos os membros do corpo. No versículo 13 diz: «até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, ao estado de homem feito, à medida da estatura da plenitude de Cristo». Aqui está o objetivo de Deus. Agora, como alcançaremos este objetivo? Isso esta nos versículos 15 e 16: «antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, isto é, Cristo, do qual o corpo bem ajustado, e ligado entre si por todas as conjunturas, que se ajudam mutuamente, segundo a atividade (a palavra atividade aqui também pode ser traduzida por «operação») própria de cada membro, efetua o seu crescimento para edificação de si mesmo em amor.» Os ministros foram dados para capacitar os santos, não para que realizem o trabalho dos santos. Vejamos atentamente o versículo 12: «tendo em vista o aperfeiçoamento dos santos para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo». Existe uma vírgula após a palavra «santos» neste versículo? Se houvesse em alguma outra versão, essa vírgula não estaria correta. Por que? Se colocarmos a vírgula depois de «santos», então entendemos que os ministros aperfeiçoam os santos e realizam a obra do ministério. Mas, se esta vír-
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gula não está ali, então devemos entender que os santos são aperfeiçoados para que estes façam a obra do ministério. O que vocês crêem que aconteceria numa igreja se ao invés de dois ou três exista cem ou duzentos que fazem a obra de Deus? Sem dúvida, haveria uma mudança muito grande. Para alguns isto pode parecer estranho, porque temos uma grande distorção disto. Mas devemos ir um pouco mais adiante. Se estes ministérios foram dados para capacitar os santos, significa então, que de alguma forma, os apóstolos têm que reproduzir apóstolos na igreja, e os profetas têm que reproduzir profetas. Dito de outra for-
Mas, qual é a vontade de Deus? Que a igreja seja semelhante a Cristo e não a um homem. Se existe um só homem acima, todos olham para ele e termina por assemelhar-se a ele. Mas, se estão os apóstolos, estão os profetas, os evangelistas, os pastores e os mestres, todos mostrando um aspecto diferente de Cristo, não se assemelharão a nenhum, mas a Cristo que se expressa através deles.
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ma, os apóstolos capacitam os santos, para que destes surjam novos apóstolos; os profetas capacitam os santos para surgirem novos profetas; e os evangelistas capacitam os santos para que surjam muitos evangelistas. Qual é, então, a função dos evangelistas? Evangelizar os perdidos? Não só isso, mas capacitar os santos para que todos sejam evangelistas. A ênfase muda dos ministros para os santos. Como dizer que os evangelistas são dados para capacitar a igreja e não para evangelizar os incrédulos? Quando necessitamos evangelizar convidamos um evangelista. Mas, a vontade de Deus é que toda a igreja evangelize, e que o evangelista capacite a igreja para isto. Segundo entendemos, a primeira vez que isto começou a ser pregado, foi pelo irmão Watchman Nee, na China, numa conferência no final dos anos 40¹. Se você ler essas mensagens perceberá uma carga de Deus muito grande sobre este homem, uma carga muito grande. Ele volta uma e outra vez a reiterar o mesmo, porque percebe que pode ser que diga pela última vez. Ele já sabia que lhe restava pouco tempo. Então dizia: «Temos que passar a carga a todos os santos. Temos que capacitar os santos e que os santos se levantem para servir». Ele dizia «Como vamos alcançar toda a China com o evangelho? Somos tão poucos, e este pais é tão grande. Só pode ser feito se todos os santos se levantarem para servir». 1
Ver um resumo desse ensino nas págs. 33-38.
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O que acontece hoje na China? Acontece exatamente isto, o cumprimento do desejo de Nee. Sua palavra foi profética. Provavelmente seja na China onde hoje existem as igrejas mais neotestementárias de toda a terra. O que acontece ali? Os pregadores itinerantes visitam as igrejas, capacitam os santos, e logo os santos fazem a obra do ministério. Por causa das perseguições, ali não há um ministério pastoral visível como no Ocidente. São todos os santos, sem distinção, os que realizam a obra do ministério. Como pode sobreviver a igreja debaixo da perseguição? Só desta forma. Hoje as igrejas na China estão mais vivas do que nunca. A porcentagem de cristãos na China tem crescido de forma geométrica. Isto tem sido maravilhoso. Agora, por que está vindo esta palavra a nós neste tempo? Embora tenha sido pregada nos anos 40 na China, hoje sentimos que o Senhor a tem enviado até nós para que a realizemos nas nossas igrejas, porque dias de perseguição estão aproximando-se em todo o mundo. Como a igreja sobreviverá nessas condições? Só se a igreja recuperar a visão do corpo. E não somente a visão, mas também a experiência de viver a vida do corpo com tudo o que isto significa.
Isto não é a perfeita vontade de Deus. Isto faz parte de uma distorção histórica. Mas o Senhor tem nos mostrado o que verdadeiramente é a igreja, o corpo de Cristo. Esta distorção levou pouco a pouco a uma exaltação dos ministros. Visto que os ministros têm a palavra, então os irmãos reconhecem que eles são uma classe especial de pessoas, e dependem deles para quase tudo. Isto trouxe muitos problemas. O principal destes é a desvalorização do corpo. Nestes dias tem-se falado aqui de como uma congregação pode chegar a se parecer com o pastor. Tal como é o pastor, assim é a congregação. Por que isto acontece? Porque ele está só. Ele é a única referência que os irmãos têm. Assim a igreja se assemelha com o homem que está na frente. Mas, qual é a vontade de Deus? Que a igreja seja semelhante a Cristo e não a um homem. Se existe um só homem acima, todos olham para ele e termina por assemelhar-se a ele. Mas, se estão os apóstolos, estão os profetas, os evangelistas, os pastores e os mestres, todos mostrando um aspecto diferente de Cristo, não se assemelharão a nenhum, mas a Cristo que se expressa através deles. Eles, num conjunto, mostrarão a multiformidade de Cristo, toda a riqueza de Cristo!
Uma distorção histórica Historicamente, todo o peso da obra de Deus tem recaído sobre os ministérios. Na atualidade, há pastores estressados pelo peso da obra. Como um só homem pode fazer tudo?
Um duplo testemunho Aqui em Efésios 4 a ordem é dons, ministérios e operações. Em alguma outra parte da Bíblia são mencionadas estas três coisas juntas? Os estudiosos da Bíblia dizem que se só en-
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contramos num só lugar da Bíblia uma certa verdade, isto não é muito confiável. Temos que ter ao menos dois, porque é dois o número do testemunho. Vejamos, então, 1ª Corinthios 12:4-6 «Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. E há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. E há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos.» Aqui temos de novo, na mesma ordem, os dons, os ministérios e as operações. Existe uma coisa muito interessante aqui. Os dons são associados com o Espírito; os ministérios com o Senhor, e as operações com Deus Pai. Portanto, vemos uma graduação. Segundo a ordem da deidade, o Pai é maior, logo o Filho e depois o Espírito. Aqui a ordem é inversa. O que significa isto? Que vamos do menos importante ao mais importante. Destas três coisas, o menos importante são os dons; logo vêm os ministérios; mas o mais importante de tudo são as operações, porque são associadas ao Pai, o qual «opera todas as coisas em todos». Vocês sabem, os dons da Palavra não vem sobre todos. Neste texto diz que uns recebem uma classe de dons, outros, outra, mas nem todos têm o dom da palavra. Por isto os ministérios tampouco pertencem a todos o santos. Mas quando fala das operações, diz «que opera todas as coisas em todos». Isto quer dizer, as operações são de todos. De todo o corpo. O Senhor tem nos mostrado que os dons não são um fim em si mesmo;
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e que os ministérios também não são. O fim, o objetivo é a igreja em sua multiface variedade de operações. No Novo Testamento aparecem dezenas de vezes a expressão: «uns aos outros», e isto nos fala da mutualidade. Quando recebemos a revelação para ver o que é o corpo de Cristo, nossa visão do Novo Testamento muda completamente. Onde antes víamos o indivíduo, agora vemos a igreja. Só na igreja pode ser vivida toda a vida de Cristo. Tão somente na igreja pode ser experimentada toda a revelação do Novo Testamento. Como crente não estou sendo chamado para fazer tudo. Não sou chamado a ter todas as respostas. Não tenho necessidade de projetar toda a luz. Para isso existe a igreja. Existe um problema na igreja? Vejamos a quem Deus capacitou para resolver esse problema. Quem vai atuar num determinado assunto? Ali está o irmão adequado. Deus o capacitou para isso. Não existe ninguém que tenha todos os dons em si mesmo, porque Deus repartiu seus dons entre todos os membros do corpo. Reconhecendo nosso tempo Amados servos de Deus, este é o dia das operações de todos os membros do corpo de Cristo. E nós, os ministros somos servos da igreja. Lógicamente que primeiro de Cristo, logo depois da igreja. Por isto os anciãos, os obreiros, os ministros da palavra têm que descer e a igreja têm que subir. Por que existem tantos filhos de Deus frustrados, insatisfeitos, amargu-
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rados? Porque não estão servindo ao Senhor. Parece que eles não têm nada para fazer. Toda ênfase tem sido colocada nos ministros, nos pastores. Eles fazem tudo. E os pequenos são meros coadjuvantes? Não; são mais do que isso, muito mais do que isso! É a igreja, a amada do Senhor. Quando o amado diz para a Sulamita: «faze-me ouvir a tua voz; porque a tua voz é doce» (Cânt. 2:14), é o Senhor falando para a igreja. À igreja, não aos pregadores. É doce a voz da igreja. O Senhor deu-se por ela, deu sua vida por ela. Não por grandes pregadores somente, mas por ela. Ali se incluem todos, inclusive os mais pequeninos. Oh, que o Senhor abra nossos olhos para enxergar o que a igreja representa para Ele! A responsabilidade dos ministros A maior responsabilidade recai sobre nós. Por que? Porque nós, os ministros, temos que descer para que a igreja cresça. João Batista foi enviado para baixar os montes e subir os vales. O ministério de João Batista não somente foi para preparar a primeira vinda do Senhor, mas também a segunda. Hoje também Deus está levantando profetas com o espírito de João, que diz: «É necessário que ele cresça e que eu diminua». Se não fazemos parte dessa equipe, não estaremos preparando devidamente a vinda do Senhor. O João Batista da primeira vinda do Senhor foi um homem; hoje o «João Batista» da segunda vinda do Senhor são muitos homens, muitos profetas com a mesma atitude de João
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que dizem: «Olhem para Ele, eis o Cordeiro de Deus; Ele é o esposo, nós somos amigos do esposo, a noiva o vê, a igreja olha para Ele». Um dos grandes objetivos de Paulo no seu ministério foi apresentar a igreja como uma virgem pura a Cristo (2ª Cor. 11:2). Quem faz esse trabalho de preparar uma noiva para o noivo? Um casamenteiro. Os ministros de Jesus Cristo são casamenteiros. Paulo era. De certo modo, nos somos parte da igreja. Sim, somos, mas em certos aspectos não somos. Somos os que preparamos a noiva para ela receber o Noivo. Amados irmãos, os principais e maiores problemas no meio da igreja não são criados pelos irmãos, mas pelos ministros, os apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres. Eles são os mais capacitados, tem dons. A palavra deles tem forte influência. É muito difícil dessa forma que um homem diminua. Deus deseja nos ensinar algo: Os ministros da Palavra não são líderes no restrito sentido da palavra. A palavra líder é uma palavra de origem inglesa que se refere a uma pessoa destacada, proeminente. Um líder é um chefe. O Senhor nunca usou uma palavra que significasse isso para se referir a seus seguidores. Ele usou a palavra «servo». No grego «doulos» significa escravo. Derek Prince disse certa vez: «Por que nas Bíblias não se traduz «escravo» se no grego diz «escravo»? Porque existe uma cultura obscura, tenebrosa sobre escravidão. Mas em termos bíblicos a escravidão não tem essa
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conotação». E acrescenta: «O Espírito Santo é um escravo de Cristo». Em que sentido? É que ele veio para servir, para exaltar a Outro. O Espírito Santo veio para exaltar a Cristo. O Espírito Santo tem uma atitude de escravo. Assim, nós também somos escravos de Cristo e da igreja. Que o Senhor nos socorra. Porque um dos grandes perigos que existe para um ministro de Jesus Cristo, é a vaidade. Por este motivo o Senhor tem que nos tocar fortemente. Tem que nos quebrantar totalmente, para que vejamos que não somos nada, absolutamente nada sem Ele. Se recebermos o amor dos irmãos é tão somente porque somos como um jumentinho que leva o Senhor sobre seus ombros. Só por isso.
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O que os irmãos têm visto em nós? Por que nos amam? Porque eles têm visto algo de Cristo. Seu amor para conosco não é para nós, é para Cristo, que pela sua graça nos utiliza. Fora de Cristo somos desprezíveis, somos torpes, somos imundos. Somos comuns como qualquer outra pessoa. Amados irmãos, que o Senhor nos ajude a ver o que o Senhor está nos mostrando, para nos dar força e coragem para minguar, isto é o mais difícil. Que o Senhor nos dê a força para calar e para que outros falem; para deixar de fazer tantas coisas e deixar que outros também sirvam. Amém. Sínteses de uma mensagem compartilhada a obreiros e colaboradores em Curitiba, Brasil, em abril de 2006.
*** Algo errado em sua vida Quando Robert Chapman começou a servir ao Senhor, sua audiência aumentava progressivamente. Logo levantou um grande templo. D. L. Moody ouviu falar de sua fama e um dia tomou um trem para ouvi-lo pregar. Sentou-se em silêncio e ouviu. Quando terminou a reunião, Chapman reconheceu a Moody e foi até ele para pedir-lhe que, se tivesse algo para dizer-lhe, que o dissesse francamente. "Irmão", disse-lhe Moody, "o que você fez foi um fracasso e não um êxito, porque há algo errado em sua vida". Ao ouvir isto, Chapman se entristeceu bastante e sentiu que Moody não deveria tê-lo criticado como o fez, pois com que autoridade podia falar dessa maneira? Entretanto, Moody se sentiu obrigado a dizer-lhe, e o próprio Chapman sabia que existia, na verdade, uma imperfeição em seu ser: ele sabia que não conseguia desistir de amar mais a sua esposa e filhos (que ao Senhor) e, com esse assunto, lutou dolorosamente durante as várias semanas que se seguiram. Ao fim, ele disse ao Senhor: "Deus, não posso deixar de amar a minha esposa e meus filhos, mas te peço que opere em mim até que possa desprendê-los". A partir desse dia, ele descobriu como realmente amar a sua esposa e filhos no Senhor, e então Robert Chapman se tornou poderoso na obra de Deus. Watchman Nee, Vida cristã equilibrada
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O sacerdócio dos crentes é uma reação da vida divina contra a morte espiritual.
Sacerdócio e vida T. Austin-Sparks
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que é um sacerdote? Ele não é um oficial ou um membro de uma casta religiosa, mas um homem que resiste à morte e ministra vida. O objetivo único e mais abrangente de todos os tempos –o grande propósito de Deus de eternidade a eternidade– pode ser descrito na linguagem do Novo Testamento como vida eterna. Assim que o pecado entrou no mundo surgiu a morte e, então, os homens precisaram de um altar e do derramar de sangue a fim de que o pecado pudesse ser coberto pela justiça e a morte ser vencida pela vida divina. Juntamente com o altar surgiu ali a atividade pessoal de um homem cha-
mado de sacerdote, e assim, com o passar do tempo, tal serviço cresceu e cresceu até se transformar em um elaborado ministério sacerdotal. Como um poder ativo, a morte somente podia ser detida, anulada e removida ao ter devidamente confrontada sua base no pecado. Daí a necessidade do ministério sacerdotal de justiça, a justiça perfeita da vida incorruptível expressa pelo sangue da oferta. Israel devia ser uma nação de sacerdotes, um povo baseado e fundamentado na própria justiça de Deus e, por isso, capaz de encarar a morte e derrotá-la. A Igreja foi chamada para exercer este ministério. O próprio Senhor Jesus previu isto ao dizer: «Portanto, vos
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digo que o reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que lhe produza os respectivos frutos» (Mt 21:43). Mais tarde Pedro explicou que os pecadores redimidos se tornaram participantes da vocação espiritual, sendo a «nação escolhida», o «sacerdócio real», devendo assumir a grande vocação de serem, da parte de Deus, ministros da vida na terra. Assim nós descobrimos que, como membros do Corpo de Cristo, nós temos um relacionamento com Ele, o grande Sumo Sacerdote, que é análogo àquele entre Arão e seus filhos, que participavam de seu trabalho sacerdotal. Na carta aos hebreus, a qual trata deste assunto, nós temos uma espécie de Levítico neotestamentário. Nesta epístola, os crentes são denominados tanto de filhos como de «santos irmãos», como se Cristo nos considerasse Seus filhos – «Eis aqui estou eu e os filhos que Deus me deu» (Hb. 2:13). Por meio de nós, portanto, como membros de Cristo, o grande trabalho sumo sacerdotal no céu deve encontrar expressão aqui na terra. Se nós perguntarmos qual é o significado do contínuo trabalho do Senhor como Sumo Sacerdote, a resposta é: trazer vida sobre a morte, anular a operação e reinado da morte espiritual. O maior conflito da Igreja é com a morte espiritual. Quanto mais espiritual um homem se torna, mais consciente ele está da horrível realidade desta batalha contra o maligno poder da morte. Nenhum sacerdote ou levita do Antigo Testamento jamais tentou se tornar lírico sobre este assunto ou fa-
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lar em linguagem poética como se a morte fosse algum tipo de amigo. Ah não, eles sabiam ser a morte a grande inimiga de Deus e de todos os Seus interesses. Quando as Escrituras falam da morte como o último inimigo, isto não somente significa que é a última na lista, mas que é o inimigo derradeiro, a expressão completa de toda inimizade. O efeito do sacerdócio é ilustrado repetidas vezes na Palavra de Deus. Nós observamos a morte adentrando por causa do pecado e, então, Deus intervindo com Sua resposta de vida por meio do sacrifício de sangue. O sangue fala de uma justiça aceita e, por meio disto, o sacerdote estava habilitado a enfrentar a morte, vencê-la e ministrar vida.
Que ministério nós queremos? Correr de um lado para o outro assistindo conferências, dando palestras, apoiando o trabalho cristão? Tudo isso pode fazer parte, mas é de pequeno valor se não se encaixar no contexto da batalha sacerdotal contra a morte: trazer o impacto poderoso da vida vitoriosa de Cristo para enfrentar o desafio da morte.
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Finalmente ouvimos falar do Senhor Jesus, que encontrou a morte na concentração de toda sua inimizade, derrotou-a por meio do perfeito sacrifício de sangue da Sua própria vida e, então, deu início à Sua obra sacerdotal de ministrar vida aos crentes. O sacerdote é um homem que tem autoridade, embora esta seja espiritual e não eclesiástica. Ele tem poder com Deus. O apóstolo João fala do caso de alguém que cometeu um pecado que não leva à morte, e ele diz: «pedirá, e Deus lhe dará vida...» (1Jo. 5:16). Esta referência revela que um crente que permanece na base da justiça pela fé por meio do sangue de Jesus pode exercer o poder do sacerdócio em benefício de um irmão que errou e, assim, ministrar vida a ele. Certamente não há ministério mais necessário na terra hoje do que este ministério tão vitalizante. Se nós ministrarmos verdades que não emanam vida, estamos desperdiçando nosso tempo. Deus não nos comissionou para sermos meros transmissores de informação sobre coisas divinas ou professores de moralidade. Ele nos libertou de nossos pecados para que pudéssemos ministrar vida a outros em virtude da autoridade sacerdotal. Vivemos em um mundo onde a morte reina. Diariamente multidões são arrastadas por uma maré de morte espiritual. Por quê? Por causa da injustiça. Precisa-se da atividade daqueles que aceitarão suas responsabilidades sacerdotais, tanto pedindo vida para outros quanto oferecendo vida a eles por meio do evangelho. Nós devemos ministrar Cristo. Não meras
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doutrinas sobre Ele; não meras palavras ou manda-mentos, mas o impacto vital de Cristo em termos de vida. Assim, todo crente é chamado para se posicionar entre os mortos e os vivos dando a resposta de Cristo para as atividades de Satanás. Não é de se admirar que o reino de Satanás esteve em guerra com Israel, pois a presença desta nação em um relacionamento correto com Deus proclamava efetivamente que o pecado e a morte não reinam universalmente no mundo de Deus, mas foram enfrentados e superados pelo poder de uma vida justa e incorruptível. No fim, Israel perdeu este testemunho e, por conseqüência, o ministério sacerdotal. Então surgiu a Igreja, para dar continuidade a este ministério, sendo não mais um povo localizado em uma terra, mas uma comunidade espiritual espalhada por toda a terra, um povo cuja vocação suprema é manter a vitória de Deus sobre a morte, conforme o testemunho de Jesus. E qual é o testemunho de Jesus? É o testemunho do triunfo da vida sobre a morte. Ele mesmo assim o descreveu a João: «[Eu sou] aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e do inferno» (Ap. 1:18). Este testemunho foi depositado na Igreja e imediatamente os discípulos o apresentaram poderosamente entre as nações. Infelizmente, sob vários aspectos, a Igreja agora está falhando em sua vocação sacerdotal. Esse elemento vital da vida vitoriosa parece estar faltando. As cartas no início do livro de Apocalipse mostram que Cristo não
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estava satisfeito com as muitas boas atividades, trabalhos zelosos, ensinamentos corretos e persistência na ortodoxia das igrejas. Ele tentou chamá-las de volta à sua verdadeira tarefa de demonstrar o poder de Sua vida vitoriosa em face de qualquer desafio. Que ministério nós queremos? Correr de um lado para o outro assistindo conferências, dando palestras, apoiando o trabalho cristão? Tudo isso pode fazer parte, mas é de pequeno valor se não se encaixar no contexto da batalha sacerdotal contra a morte: trazer o impacto poderoso da vida vitoriosa de Cristo para enfrentar o desafio da morte. O livro de Apocalipse deixa claro que tal testemunho provoca a animosidade de Satanás, mas tal inimizade deveria ser um elogio para nós, pois significa que nossa vida está realmente fazendo diferença para Deus. O dia em que você ou eu não mais estiver-
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mos envolvidos na batalha espiritual será um dia ruim, pois significará que perdemos nossa verdadeira vocação e não estamos mais provendo um desafio real para a morte espiritual, mas estamos fracassando no que tange ao ministério sacerdotal. Por outro lado, o antagonismo doloroso das forças do mal pode ser uma prova clara de que nós estamos verdadeiramente servindo como sacerdotes. Examinemos todas as coisas pela vida, a vida que é vitoriosa sobre o pecado, a vida que liberta das cadeias, especialmente da cadeia do medo, a vida que se expressa por meio do amor por pecadores necessitados. João não apenas nos encoraja a orar por vida, mas nos assegura que Deus a dará em resposta a tal oração: «e Deus lhe dará vida, aos que não pecam para morte». Nós não devemos fracassar em nosso ministério sacerdotal!
*** Veneno com etiqueta Certa vez um oficial da igreja foi para o ministro para lhe dizer: "Pastor, a nós, os que são da congregação gostaríamos que não falasse tanto, nem com palavras tão precisas, sobre o pecado. Pensamos que se as nossas crianças ao ouvirem pregar com tanta freqüência sobre o assunto, mais rapidamente chegarão a ser pecadores. Por que não chamá-lo um "erro"? Ou dizer, simplesmente, que muitas vezes os jovens são culpados de mau juízo? Mas, por favor, não fale tão abertamente do pecado." O ministro atravessou o quarto, e de uma alta prateleira tomou uma garrafa de veneno e a mostrou ao visitante. A garrafa tinha uma etiqueta com estas palavras em grandes letras vermelhas: "Veneno, não toque!". "O que você quer que eu faça?", perguntou o ministro. "Pensa que seria melhor que tirasse esta etiqueta clara, e pusesse outra que dissesse: "Essência de hortelã"? Você não vê que quanto mais se suaviza o nome da etiqueta, mais perigoso se torna o veneno?" "O pecado, o mesmo pecado de sempre, que causou a queda de Adão, é o que padecemos hoje em dia, e nos fará mais dano que bem se tratarmos de disfarçá-lo com uma etiqueta atrativa e elegante". Billy Graham, em Paz com Deus.
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Um ensino prático sobre o serviço dos membros, dirigida aos irmãos que têm responsabilidade na obra e nas Igrejas.
Todos devem servir
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ocês têm que trabalhar até que chegue o dia em que todos os irmãos e irmãs se apresentem para servir, o dia em que todos os santos participem, todos sirvam a Deus, e cada um seja um sacerdote. Então verdadeiramente vocês verão o que é a igreja. Eu não sei se vocês viram este caminho ou não. Vocês têm que entendêlo. Tudo depende de vocês. Vocês mesmos devem dar-se a um certo número de pessoas, e eles por sua vez devem dar-se a todos os irmãos e irmãs. Se vocês não podem fazer que todos os irmãos e irmãs se levantem para servir a Deus e para tomar a res-
ponsabilidade nos assuntos da igreja, vocês terão fracassado totalmente, em virtude disso não seria a igreja. Vocês precisam mostrar aos anciões que não importa quanto se esforcem, eles são muito poucos para poder dirigir os assuntos da igreja adequadamente. Eles somente são cuidadores e não devem tratar de fazer tudo sozinhos. Eles não devem substituir à igreja fazendo tudo; pois bem, devem fiscalizar à igreja para que tudo seja feito. Não é uma questão de que eles mesmo façam, mas sim de fiscalizar, observar, encorajar, e lhes ensinar a fazê-lo, e fazer que todos na igreja participem. A partir desse momento
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vocês terão a realidade da igreja. Permitam-me dizer algo que tenho dito por muitos anos. Hoje em dia tenho um sentimento particularmente profundo a respeito. O número de pessoas que servem determina o número de pessoas na igreja. Daí que não deve haver mil ou cinco mil irmãos em uma localidade e somente uns tantos servindo. Em um lugar, a quantidade de pessoas que prestam serviço é a quantidade de pessoas na igreja. O número de sacerdotes determina o povo de Deus. Não devemos tolerar que nenhum membro careça de função. Por favor, recorde que você, como membro do corpo de Cristo, tem uma função. Se não entender este princípio básico, não fará um bom trabalho. Irmãos e irmãs, falando com franqueza, vocês como obreiros e colaboradores, não podem fazer a obra. Isso não é o Novo Testamento, mas sim um sistema de sacerdotes. Nós não temos um sistema de sacerdotes, e sim, um corpo de sacerdotes. Cada um é um sacerdote. Os de um talento devem servir Vocês têm o hábito natural de usar somente os que têm dois talentos. A história da igreja sempre foi assim. Os que têm cinco talentos podem avançar por si só; não há necessidade de cuidá-los. Mas os de um só talento é muito difícil lhes ajudar. Uma palavra ou duas, e eles enterram seu talento de novo. Os de dois talentos, são os mais disponíveis. Têm certa habilidade, eles podem fazer bem as coisas, e não enterram seus talentos. Mas se vocês somente podem usar os de dois
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talentos, e não podem usar os de um talento, fracassaram totalmente. Tenho dito isto no Foochow, tenho-o dito também em Shangai, e o direi de novo hoje. O que é a igreja? A igreja é todos os de um talento que devem participar no serviço da igreja, na parte prática e na parte espiritual. Você não pode menear a cabeça e dizer: «Este é inútil», e «Aquele é inútil». Se você disser que este é inútil e que aquele é inútil, a igreja está acabada e você fracassou totalmente. Se você pensar que ele é inútil, ele verdadeiramente será inútil. Você pode dizer-lhe que de acordo a si mesmo, ele presupõe ser inútil, mas que o Senhor lhe deu um talento e deseja que todos os de um talento saiam e negociem. O Senhor pode usálos. Se você não pode usar os de um talento, isso prova que diante do Senhor você não pode ser um irmão com responsabilidade. Você tem que usar a todos os irmãos e irmãs que são «inúteis». Este é o trabalho dos irmãos que estão na obra. Não devem usar somente os irmãos e irmãs úteis, mas sim também devem fazer que todos os irmãos e irmãs inúteis sejam úteis. O princípio básico é que o Senhor não deu a ninguém menos de um talento. Na casa do Senhor, não há nem um só servo que não tenha um dom; cada um tem ao menos um talento e não pode ter menos de um talento. Ninguém pode desculpar-se dizendo que o Senhor não lhe deu um talento. Queria que vocês se dessem conta de que todos os filhos de Deus são servos diante dele. Se são filhos, são ser-
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Não admiro aqueles que se sobressaem. Eu gosto dos de um talento. O Senhor poderia nos dar, em sua graça, mais Paulos e mais Pedros, mas não o tem feito. O mundo inteiro está cheio de irmãos e irmãs de um talento. O que faremos com esta gente? Onde vamos pô-los? vos. Em outras palavras, se são membros, têm um dom; se são membros, são ministros. Se pensarmos que há alguém a quem o Senhor não pode usar, não conhecemos nada da graça de Deus absolutamente. Devemos conhecer a graça de Deus tão profundamente que quando Deus chama a alguém seu servo, nunca nos levantemos para dizer que não o é. Hoje, se você pudesse escolher, talvez selecionaria três ou quatro de toda a igreja. Mas Deus diz que todos são servos. Já que Deus diz isto, devemos deixálos que sirvam. Irmãos e irmãs, de agora em diante, se prosseguimos em nossa obra ou não, e se esta obra tem êxito ou não, depende do que podemos dizer hoje de nossa obra diante do Senhor. Há somente alguns trabalhando? Há só alguns especialmente dotados fazendo a obra? Ou todos os servos do Senhor participam do serviço e toda a
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igreja está servindo? Este é todo o problema. Se este problema não pode ser resolvido, não temos nada. O corpo de Cristo não é uma doutrina, mas sim algo vivo. Todos devemos aprender isto: somente quando todos os membros funcionam, temos o corpo de Cristo. Só quando todos os membros funcionam, tem-se a igreja. Pregar somente sobre o corpo de Cristo é inútil; devemos deixar que o corpo trabalhe e expresse suas funções. Já que é o corpo de Cristo, não devemos temer que lhe faltem funções. O Senhor deseja que cada membro em cada localidade se levante e sirva. Se tenho razão, de acordo com o meu discernimento, é possível que a hora tenha chegado. As cartas que recebi de diferentes lugares e as notícias que ouvi de toda parte indicam que hoje em toda parte todos os santos estão preparados para apresentar-se para servir. Deus tem ido adiante de nós; nós devemos seguí-lo. É meu desejo que nenhum irmão entre nós saia e em vez de guiar os irmãos e irmãs a servir, substitua-os, sendo assim um fracasso. Espero que quando você for a um lugar, no começo guie a oito ou dez para que sirvam, e depois de certo tempo eles guiarão a sessenta, a oitenta, ou a cem para que sirvam ali. Então na próxima visita que você fizer, talvez veja mil ou duas mil pessoas servindo. Isto é o correto. Se você tiver que usar os de cinco talentos reprimindo aos de um talento, você não é servo do Senhor. Você deve fazer que todos os de cinco talentos se levantem e sirvam, e que todos os de
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dois talentos se levantem e sirvam, e também devem fazer que todos os de um talento se levantem e sirvam. Deve fazer que se levantem e sirvam também aqueles que você pensa que não são úteis. Assim aparecerá a igreja gloriosa. Em Foochow preferiria ver todos os camponeses simples servindo, do que três ou cinco irmãos destacáveis pregando. Não admiro aqueles que se sobressaem. Eu gosto dos de um talento. O Senhor poderia nos dar, em sua graça, mais Paulos e mais Pedros, mas não o tem feito. O mundo inteiro está cheio de irmãos e irmãs de um talento. O que faremos com esta gente? Onde vamos pô-los? Neste treinamento aqui na montanha, se Deus tratar verdadeiramente com nosso eu e com nosso trabalho a tal ponto que saiamos a prover uma maneira para que todos os de um talento sirvam, pela primeira vez a igreja começará a ver o que é o amor fraternal, e Filadélfia aparecerá. O serviço sacerdotal Primeiro, devemos estabelecer o princípio de que todos os filhos de Deus são sacerdotes que devem servir a Deus. Tendo em conta este princípio, vejamos como podemos guiar a todos os irmãos e irmãs a ser sacerdotes em uma igreja local. Em outras palavras, vejamos que classe de reparos devemos fazer no trabalho espiritual a fim de que todos os crentes possam participar das coisas espirituais, tanto os novos crentes como os que conheceram ao Senhor por muitos anos. Precisamos ver quais
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coisas espirituais em uma igreja local podem ser atendidas pelos irmãos e irmãs. O primeiro, é a pregação do evangelho. O segundo, visitar os novos crentes trazendo-os pelo caminho reto e lhes mostrando como ser cristãos. O terceiro, na igreja há muitas outras necessidades. Alguns crentes têm dificuldades em suas famílias; alguns têm enfermidades; outros sofrem pobreza; outros têm mortes ou outros acontecimentos em suas famílias. Esta gente também necessita do serviço e da ajuda da igreja. Podemos qualificar tais serviços como visitas aos que estão em situações especiais. Esta é outra coisa que podem fazer todos os irmãos e irmãs. O quarto assunto é o cuidado dos irmãos que se mudaram para longe, e dos que chegaram de outro lugar. Na Bíblia, a igreja é uma igreja que prega o evangelho, uma igreja que visita às pessoas, e uma igreja que cuida de outros. É o corpo de Cristo em uma localidade. No corpo de Cristo não há membros inativos. Se algum dia pudesse haver um grupo de irmãos ou inclusive uma igreja inteira, em que todos servem, todos cuidam das coisas espirituais adequadamente, todos tomam responsabilidade, e todos estão ocupados, então isso seria o verdadeiro corpo de Cristo. Se houver uma igreja local com dois mil irmãos e irmãs, e somente quinhentos servem, enquanto mil e quinhentos não o fazem, deveria nos parecer algo estranho. Se houver quinhentos irmãos e irmãs, devem ser, então, quinhentos os que servem; de
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outra maneira, os irmãos mais responsáveis não poderão agüentar a carga. O serviço levítico Há também outra área de serviço, o serviço levítico, que se refere ao serviço dos assuntos práticos. No Antigo Testamento, os levitas lavavam os bezerros, derramavam o sangue, levavam para fora o esterco, ajudavam a esfolar as ofertas e também transportavam o equipamento do tabernáculo. Todas estas coisas são o serviço levítico. Sem importar que classe de assunto seja, todos devem pôr as mãos nisso. Há muitas coisas que podemos considerar diante do Senhor: o trabalho da limpeza; o acerto do salão e o trabalho de acomodar; a necessidade de encarregar-se do partir do pão e dos batismos; dar aos pobres entre os incrédulos; cuidar dos pobres que há na igreja; a recepção e envio de irmãos; a contabilidade; o serviço da cozinha; a oficina de serviço; o serviço de transporte; o trabalho do escritório; a ajuda aos irmãos pobres em seus afazeres domésticos. Eu sempre espero que cada irmão e irmã tome encargo pelos assuntos práticos. Nunca permita que exista uma situação onde alguns tenham o que fazer enquanto que outros não estejam fazendo nada. O serviço da igreja sempre é para todos. Terá que tratar com a carne dos de um talento sem prescindir deles Se o Senhor puder realmente abrir passagem em nosso meio, o caminho que tomamos nos últimos dez, vinte ou trinta anos será completamente
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mudado. O ponto de vista de vocês não pode ser o mesmo de antes; tem que ser quebrantado e esmagado. Primeiramente, vocês não devem usar a um irmão somente porque é útil nem deixá-lo fora se não o for. Na igreja nenhum membro deveria ser deixado fora. Esta não é a maneira que procede o Senhor. Hoje em dia, se o Senhor tiver que recuperar seu testemunho, ele deve fazer que todos os membros de um talento se levantem. Todos os que pertencem ao Senhor são os membros do corpo. Cada um deve levantar-se e deve estar em sua função. Se isto ocorrer, vocês verão a igreja. Hoje em dia, enquanto vocês estão aqui na montanha, considerem cada lugar. Vocês quase têm que dizer: Onde está a igreja? Onde está Cristo? Parece que nem a igreja nem o Senhor estão por aí. Quando saírem para trabalhar, nunca desprezem os membros de um talento, nunca os substituam, nunca os reprimam. Têm que confiar neles de todo coração. Vocês devem fazer que eles trabalhem. Se Deus tem a segurança de chamá-los a ser servos, vocês também devem ter a segurança de chamá-los a ser servos. Em segundo lugar, na igreja não tememos às atividades carnais. Duas linhas têm que ser estabelecidas na igreja: alguém é a autoridade e a outra é o dom. Todos os de um talento tem que vir e servir, trabalhar e dar fruto. Vocês talvez perguntem: «Se todos os de um talento aparecem com a sua carne e tudo, o que faremos?». Deixem-me dizer-lhes que a carne deve ser tratada, e a maneira de tratá-la é usar a autoridade que representa a Deus.
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O dom e a autoridade são duas coisas completamente distintas; o dom é o dom e a autoridade é a autoridade. Os de um talento devem usar seu dom. E com os que são carnais, vocês devem fazer uso da autoridade. Se um irmão permitir que sua carne interfira enquanto está trabalhando, deve dizerlhe: «Irmão, isso não está bem. Você não deve deixar que sua carne interfira». Digam-lhe: «essa atitude é incorreta. Não permitimos que tenha essa atitude». Quando lhe falarem dessa maneira, no dia seguinte provavelmente ele irá para a sua casa e desde então não fará mais nada. Então vocês têm que buscá-lo e dizer-lhe: «Não, você ainda tem que fazer o trabalho». É possível que a carne surja de novo, mas mesmo assim vocês devem deixar que faça o trabalho. Devem lhe dizer de novo: «Você deve fazer isto, mas não lhe permitimos que faça aquilo». Sempre faça uso da autoridade para tratar com ele. Esta é a maior prova. Uma vez que o Senhor use aos de um talento, a carne deles imediatamente se misturará. A carne e «um talento» estão unidos. Devemos resistir a carne, mas temos que usar aos de um talento. A situação de hoje em dia é que nós enterramos a
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carne, eles enterram o talento, e a igreja fica sem nada. Isto não pode acontecer! Temos que fazer uso da autoridade para tratar com a carne, mas também temos que pedir-lhes que manifestem seu talento. Talvez digam: «Se trabalho, não está bem, e se não o faço, tampouco está bem. Então o que farei?». Vocês devem lhes dizer: «É obvio, que se trabalhar e introduzir a carne prejudica; mas se não trabalhar, também prejudica porque enterra o talento. O talento deve entrar, mas não a carne». Na igreja, pode manter-se a autoridade e pode incluir-se funções de todos os membros, você verá uma igreja gloriosa na terra e o caminho da restauração será fácil. Não sei quantos dias mais o Senhor pôs diante de nós. Creio que nosso caminho será mais e mais claro. Temos que usar todo nosso entendimento e todas as nossas forças para que todos os irmãos e irmãs se levantem para servir. Quando esse tempo chegar, a igreja será manifestada, e o Senhor retornará. Que o Senhor seja misericordioso e tenha graça para conosco, para que façamos o melhor. Extraido de uma mensagem que o autor deu a obreiros e colaboradores na China, em 1948.
*** Morrer e viver Santificação, que é um dos temas dominantes da Bíblia, é explicada de várias formas pelos que a ensinam. A definição mais correta, entretanto, é aquela que Paulo gostava tanto de usar, que é a santificação como um processo de morrer e viver, ou da mortificação e vivificação. A verdadeira vida vitoriosa é aquela em que Cristo cresce, e o eu decresce. Herbert Lockyer, no À Maturidade, Nº 28, 1996.
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A exemplar e controvertida história de Nee To Sheng, mais conhecido como Watchman Nee.
O
vigia
que veio da
China
W
atchman Nee, cujo nome em chinês é Nee To-sheng, nasceu na cidade do Fuchou, em 4 de novembro de 1903. Era filho do Nee Weng-hsiu, um homem de caráter aprazível e Lin Huo-ping, uma mulher de vontade firme 1. Por motivo de anteriormente não terem tido um homem, sua mãe prometeu a Deus que, se fosse homem, o ofereceria. No princípio, segundo as tradições familiares, foi chamado Nee Shu-tsu, que significa: «Aquele que proclama os méritos de seus antepassados». 1
Em chinês o sobrenome se coloca em primeiro lugar e depois os nomes de batismo.
Mais tarde, consciente de sua nova missão na vida, decidiu chamar-se Nee Ching-fu («Aquele que adverte ou exorta»), mas lhe pareceu muito contundente. Finalmente, sua mãe lhe propôs To-Sheng, que significa «nota de gongo (ou matraca) que escutada de longe», que era usada pelos sentinelas. Ele se sentia chamado pelo Senhor como um sentinela, para fazer soar seu gongo às pessoas na noite escura. Entre os crentes de fala inglesa o chamaram Watchman Nee, que significa ‘vigia’. Nee To-Sheng pertencia a uma família de uma rica história cristã, pois seu avô, Nee Ou-cheng foi o primeiro
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pastor chinês nessa grande região, e um grande expositor da Bíblia. Seu pai, Nee Weng-hsiu foi o quarto de nove filhos homens. Por ser um estudante avantajado, obteve o posto de oficial menor de alfândegas. Primeiros anos A infância de To-Sheng transcorreu em um lar de severos princípios. Huo-ping levava as rédeas da casa com mão firme. Inculcava em seus filhos a ordem, a limpeza, e sobre tudo, instruía-lhes na fé. A música era um grande passatempo para os meninos, onde aprenderam muitos hinos e cânticos cristãos. Na idade de treze anos, To-Sheng ingressou no Ensino médio, na Escola Trindade de Fuchou, de orientação ocidental. Este Colégio era a porta para obter emprego na Missão ou do Estado, e dali os jovens subiam para posições de influência. Nee era muito bom aluno, e bastante vaidoso. Inclusive sua estatura ultrapassava a da maioria. Por esse tempo, o ‘mandarim’ começou a mudar para o chinês literário clássico nos textos escolares, o que tornou mais fácil o acesso à literatura. Nee se converteu em um ávido leitor. Começou a escrever artigos para os periódicos, e com o dinheiro obtido comprava bilhetes de loteria. Também gostava muito de cinema. Quando os ventos da revolução envolveram o país, o lar dos Nee se viu envolvido. Huo-ping participou ativamente da política e dos eventos sociais, afastando-se pouco a pouco do Senhor. Sua casa passou a ser um cen-
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tro político-social, onde se reuniam as mulheres para jogar cartas. Chega o dia da fé Por este tempo ocorreu um fato muito significativo na casa dos Nee. Um dia de janeiro de 1920, Huo-ping encontrou quebrado um caro adorno da casa. Depois de investigar rapidamente, achou que To-Sheng era o culpado. Como este não o admitiu, foi castigado severamente. Mais tarde ela soube que ele era inocente, mas não o fez saber. To-Sheng se encheu de dor e ressentimento para com sua mãe. As relações ficaram quebradas por algum tempo. Esse mesmo mês chegou à cidade Yu Tsi-tu (Dora Yu), uma missionária muito conhecida, para dirigir duas semanas de reuniões evangelisticas em uma congregação metodista. Nessas reuniões Hou-Ping se reencontrou com o Senhor, e seu lar recebeu imediatamente o impacto desta experiência. Um dia, enquanto ela tocava e cantava hinos em uma reunião familiar, foi impulsionada pelo Senhor a pedir perdão a seu filho pela injustiça cometida. Este fato, insólito em uma cultura como a China que ensina que os pais nunca se equivocam, tocou o coração de To-Sheng, e o sensibilizou para a fé. Antes que finalizassem as reuniões, este também se entregou ao Senhor. Tinha 17 anos de idade. Preparação para o ministério Receber ao Senhor e consagrar-se por completo, foram para ele uma só coisa. Anteriormente tinha considerado algo indigno ser um pregador –
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devido ao triste exemplo dos pregadores chineses contratados pelos estrangeiros. Mas agora não concebia dedicar sua vida a outra coisa que não seja servir a Deus. De modo que começou imediatamente a fazer os acertos necessários. De todas as disciplinas do colégio, a mais descuidada tinha sido a da Bíblia, tanto que estava acostumado a usar «colas» nos exames. Agora abandonou essa prática e confessou sua falta ao diretor do colégio –com risco de ser expulso e perder o direito a uma bolsa de estudo–. A falta foi-lhe perdoada. Nos meses seguintes, aproveitando os distúrbios sociais que tornava muito irregular o ano escolar, foi, com a permissão de seus pais, a Shangai para estudar na Escola Bíblica da senhorita Yu. Por um ano se dedicou aos seus estudos, onde aprendeu a receber em seu coração a mensagem da palavra de Deus (e não só no intelecto), e o segredo de confiar somente em Deus para as suas necessidades materiais. Entretanto, ele mesmo, reconhece que aquilo foi um fracasso: «Não passou muito tempo para que ela (Dora Yu), cortesmente, desvinculasse-me do Instituto, com a desculpa de que erame inconveniente permanecer ali mais tempo. Por causa do meu «bom apetite», de minhas roupas inadequadas e do meu costume de me levantar tarde, a irmã Yu pensou que seria melhor me mandar para casa. Meu desejo de servir ao Senhor sofreu um forte reverso. Embora pensasse que minha vida tinha sido transformada, na verdade ainda restavam muitas outras coisas que deviam ser mudadas».
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De retorno a Fuchou, retomou seus estudos regulares, mas com uma nova visão. Por sugestão de uma missionária, elaborou uma lista com os nomes de 70 moços do Colégio e começou a orar sistematicamente por cada um deles, testemunhando-lhes em cada oportunidade que se apresentava. No princípio riam dele, pois sempre levava a Bíblia consigo, e a lia em todo momento. Mas pouco a pouco começaram a converter aqueles companheiros, com exceção de um só. Formou-se assim um grupo de entusiastas evangelistas que testemunhavam na escola e pelas ruas, repartindo tratados, levando cartazes e acompanhados de um sonoro gongo. Por este tempo, Nee conheceu a M. S. Barber, uma ex-missionária anglicana que agora trabalhava de forma independente, e que vivia nos subúrbios de Fuchou. A srta. Barber, acompanhada de seu compatriota, M. L. S. Ballord, compartilhavam o evangelho entre as mulheres da localidade, e oravam intensamente por um mover de Deus na China. M. S. Barber estava acostumada a ajudar os jovens que procuravam ser guiados pelo Senhor; por algum tempo houve até sessenta jovens recebendo ajuda dela. Ela chegou a ser um verdadeiro conselheiro na vida de To-Sheng, a influência viva maior para ele, comparável só a de T. AustinSparks, alguns anos mais tarde. Um progresso dessa influência se verificou pouco tempo depois, no dia que To-Sheng e sua mãe desceram às águas do batismo para ser batizados por ela. Nee estava acostumado a dizer que foi por meio de uma irmã que
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ele foi salvo e também foi por meio de uma irmã que ele foi edificado. Mais ainda, ele recebeu muita ajuda de outras duas irmãs mais velhas: Ruth Lee e Peace Wang. Avivamento entre os jovens No princípio de 1921 chegou a Fuchou um jovem de nome Wang Tsai (conhecido também como Leland Wang), que aos 23 anos de idade tinha renunciado a seu posto na Marinha para servir ao Senhor totalmente. Brevemente entrou em contato com To-Sheng e seus amigos. Como era um pouco mais velho que eles, e de maior experiência, converteu-se em seu líder. A amizade entre Wang Tsai e To Sheng chegou a ser muito estreita, pois compartilhavam o mesmo zelo evangelistico. No ano 1922, no lar de Wang Tsai celebraram pela primeira vez A Ceia do Senhor, sem sacerdote nem pastor, com a assistência só de três pessoas: Wang Tsai, sua esposa e To-Sheng. Sentiram tal gozo e liberdade, que começaram a fazê-lo com freqüência. Semanas depois uniram-se a eles a mãe de Nee e outros irmãos. No final desse mesmo ano começou um verdadeiro avivamento entre os jovens, logo depois da visita à cidade da evangelista Li Yuen-ju. Quando ela se foi, os jovens ministros se encarregaram das pregações. Uns saíam para convidar pelas ruas, e o Espírito Santo atraía a um número cada vez maior de pessoas. A cidade de Fuchou, de 100.000 habitantes, foi grandemente comovida por este movimento espiritual.
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Por causa da necessidade, tiveram que alugar uma casa maior. To-Sheng e outro irmão passaram a viver ali, para estar disponíveis para os jovens a toda hora. Em seguida começaram a sair 60 a 80 jovens para outros povos, para pregar, aproveitando os feriados e férias. Sua mensagem era ouvida e respeitada pelos rústicos camponeses, pois eles eram jovens cultos. As primeiras lições espirituais Nos dias de sábado, Nee ia ver a Srta. Barber para estudar a Bíblia e ser repreendido. Quando não havia nada nele que merecesse uma repreensão, ela fazia pergunta até encontrar alguma falha, e então o repreendia. Assim, ele recebeu suas mais importantes lições espirituais. Nee era muito zeloso a respeito de fazer sempre o correto e o justo. Ele fazia parte de um grupo de sete obreiros, que se reuniam tadas as sextasfeiras. Muitas dessas reuniões se tornaram envolvidas por discussões entre Nee e Wang Tsai, quem, segundo Nee, insistia em impor a sua vontade só por ser o mais velho. Outros obreiros, geralmente tomavam partido por Wang Tsai. Nee se sentiu muitas vezes ofendido e procurou luz na irmã Barber. Ela, contrariamente ao que ele esperava, disse-lhe que devia sujeitarse aos mais velhos, sem lhe dar maiores explicações. Esta dolorosa experiência se repetiu durante 18 meses, e concluiu quando ele se rendeu e aceitou ocupar o segundo lugar. Nee o explica assim: «Eu era sempre o primeiro aluno tanto em minha classe como da escola. Também que-
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ria ser o primeiro no serviço ao Senhor. Por essa razão, quando me tornei o segundo, eu desobedeci. Disse repetidamente a Deus que aquilo era muito para mim. Eu estava recebendo muito pouca honra e autoridade, e todos se alinhavam com meu cooperador de mais idade. Mas eu adoro a Deus e lhe agradeço do profundo do meu coração por tudo isso. Foi o melhor treinamento. Deus desejava que eu aprendesse a obediência, por isso ele dispôs que eu encontrasse muitas dificuldades. Assim, com o tempo, fui enchido de alegria e paz em meu caminho espiritual». Outra importante lição espiritual que Nee recebeu da srta. Barber foi enfatizar a vida antes que a obra, pois a Deus importa mais o que somos do que o que fazemos para ele. Também lhe advertiu sobre o perigo da popula-
Receber ao Senhor e consagrar-se por completo, foram para ele uma só coisa. Anteriormente tinha considerado algo indigno ser um pregador – devido ao triste exemplo dos pregadores chineses contratados pelos estrangeiros. Mas agora não concebia dedicar sua vida a outra coisa que não seja servir a Deus.
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ridade, que se constitui em um instrumento de sedução para os jovens pregadores. Um episódio familiar ocorrido neste tempo deixou um profundo ensino em Nee. Deus lhe mostrou que durante as férias deveria ir pregar numa ilha infestada de piratas. Aceitou o chamado, e fez os preparativos. Quando tudo estava preparado, e muitos irmãos se comprometeram, seus pais lhe opuseram. O que fazer? Consultou a Deus e sentiu que devia obedecer a seus pais. Embora era o desejo de Deus que fosse pregar na ilha, esse propósito ficava em Suas mãos para seu cumprimento. Como To-Sheng não se sentiu com a liberdade de dar a conhecer as razões de sua deserção, ganhou uma generalizada repulsa por parte dos irmãos. Mais tarde, pôde interpretar essa experiência objetivamente à luz da crucificação. A revelação da vontade de Deus pode ser clara, mas o cumprimento dessa vontade para nós pode ser em forma indireta. «Nossa estima de nós mesmos se alimenta e nutre porque dizemos: Eu estou fazendo a vontade de Deus! e nos leva a pensar que nada deve interferir em nosso caminho. Mas certo dia Deus permite que algo cruze em nosso caminho para rebater essa atitude. Do mesmo modo a cruz de Cristo, atravessa, não na nossa vontade egoísta, mas sim, embora pareça estranho, no nosso zelo e amor pelo Senhor! Isto é muito difícil de aceitar». De fato, naquele momento, não foi capaz de fazê-lo. Quando Nee concluiu seus estudos
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no Colégio Trindade, aos 21 anos de idade, teve a satisfação de ser um dos dois melhores alunos –junto a Wang Tse–, e sobre tudo, de ter ganho um grande número de convertidos, tanto no colégio, como na cidade e seus arredores. A criação de uma pequena revista mimeografada, O Presente Testemunho, cuja primeira tiragem foi de 1400 exemplares, tinha contribuído para o crescimento espiritual dos convertidos e dos obreiros jovens. Uma desilusão amorosa Na mesma cidade de Fuchou vivia uma família de sobrenome Chang. O pai, Chang Chuenkuan era um querido amigo cristão, que chegou a ser pastor da Aliança Cristã e Missionária, e parente longínquo do pai de ToSheng. Seus filhos eram da mesma idade e as duas famílias caminhavam muito bem. A pequena Pin-huei (conhecida também como Charity) andava sempre correndo atrás de To-Sheng. Em suas travessuras e entretenimentos todos os consideravam como o «irmão mais velho». Quando os jovens cresceram, ToSheng começou a interessar-se por Pinhuei, sua ex-companheira, que era bonita e inteligente. Entretanto, seus interesses diferiam muito. Enquanto Nee fazia a firme decisão de dedicar-se plenamente a pregação do evangelho, Pinhuei se converteu em uma jovem mundana. Quando Nee lhe compartilhava o evangelho, ela zombava de Deus e dele. Um dia que To-Sheng lia o Salmo 73:25: «Fora de ti nada desejo na terra», o Espírito de Deus o compungiu
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porque ele não podia dizer o mesmo. «Sei que tem um desejo consumidor na terra. Deve renunciar ao que sente pela senhorita Chang. Que qualidades tem ela para ser a esposa de um pregador?». Sua resposta foi uma tentativa de fazer um pacto com o Senhor. «Senhor, farei algo por ti. Se quiser que leve suas boas novas às tribos que ainda não foram alcançadas, inclusive no Tibete, estou disposto a ir; mas não posso fazer isto que me pede». Com este sentimento atado ao seu coração, lançou-se a pregar o evangelho com maior afinco. Por outro lado, Pin-huei se entregou a uma vida de estudo e compromissos sociais. Pouco tempo depois, ao comprovar que ela não se interessava pelas coisas do Senhor, mas sim persistia em seguir o mundo, decidiu esquecê-la. Foi a sua casa, ajoelhou-se e confiou o assunto de forma firme e definitivamente a Deus, e escreveu sua poesia «Amor sem limites». Era 13 de fevereiro de 1922. Seu amor, amplo, alto, profundo, eterno, É na verdade imensurável, Pois só assim pôde abençoar tanto A um pecador como eu. Meu Senhor pagou um preço cruel Para me comprar e fazer-me dele. Não posso senão levar a sua cruz com gozo E lhe seguir firmemente até o fim. A tudo eu renuncio Pois Cristo é agora a minha meta. Vida, morte, o que podem me importar? Por que tenho que lamentar o passado? Satanás, o mundo, a carne Procuram me apartar. Oh, Senhor, fortalece a sua frágil criatura, Não aconteça que traga desonra ao seu nome! (tradução livre)
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Entretanto, Deus não havia dito a última palavra. Passariam ainda dez anos antes que este capítulo se fechasse. Outras lições espirituais Muitas lições espirituais foram aprendidas por Nee neste tempo. Por exemplo, recebeu um golpe no seu ego ao comprovar que muitas mulheres cristãs analfabetas, conheciam mais ao Senhor do que ele, apesar de todo o seu conhecimento bíblico. «Eu conhecia o livro que elas quase não podiam ler, enquanto que elas conheciam Aquele de quem fala o Livro». Quanto ao seu sustento, também recebeu um ensino definitivo. Como já tinha deixado o Colégio, deveria pensar em como confiar em Deus para suprir suas necessidades materiais. As missionárias lhe tinham emprestado livros sobre as vidas de fé de Jorge Müller e Hudson Taylor, quem tinha crido inteiramente em Deus. A mesma Margaret Barber era um vivo exemplo disso. Assim, To-Sheng decidiu tomar o mesmo caminho. Por este tempo teve também uma experiência especialmente dolorosa: por razões que não estão claras, foi excluído da comunhão com os irmãos. A decisão foi comunicada por carta quando ele estava longe. Como é natural, sua primeira reação foi de irritação, mas o Senhor falou em seu coração. Ao chegar à cidade, muitos irmãos lhe esperavam para solidarizar com ele, mas ele lhes disse que o Senhor não lhe permitia defender-se, que abandonaria a cidade para não provocar uma divisão, e que eles deveriam ficar quietos. Nesta situação ele apren-
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deu a quedar-se de maneira prática a tomar a cruz e seguir ao Senhor. De um testemunho dado por Nee em outubro de 1936, pode-se deduzir que o motivo pôde ser a diferente ênfase em fazer a obra de Deus, o deles, era evangelístico, e o de Nee era a edificação das igrejas que iam nascendo. Um autor diz que a causa foi que Nee se opunha à ordenação de um deles por um missionário denominacional. Seja como for, o certo é que, em pouco tempo, muitos deles se arrependeram de tê-lo excluído. Um deles disse: «Agimos muito nesciamente, mas possivelmente estávamos muito influenciados por ciúmes, pois o irmão Nee era muito mais dotado que nós». Quando Nee era ofendido por alguém, não guardava rancor. Ao contrário, estava acostumado a dizer: «Os irmãos que pecam são como meninos que caem em um atoleiro com barro. Seus vestidos e cabelos se sujam. Mas dêem um banho neles e estarão novamente limpos. No futuro, todos os irmãos e irmãs serão pedras preciosas transparentes na Nova Jerusalém». Outro forte golpe recebeu Nee em janeiro de 1925, quando foi sugerido por seu amigo Wang Tsai que não assistisse à convenção de Fuchou, porque as críticas à obra se centravam nele. Este pedido abalou sua paz em Cristo e o abateu numa profunda desilusão. Entretanto, recebeu do Senhor as seguintes palavras: «Deixa seus problemas comigo. Vai e prega as boas novas!». Em uma dessas saídas para pregar, teve uma maravilhosa experiência
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com o povo de Mei-fuja, que Nee relata em seu livro «Sentem-se, Andem, Estejam firmes». Foi a esse povo com um pequeno grupo de seis jovens. Os vizinhos ali tinham anualmente uma celebração em honra ao seu deus Lhawang. Eles confiavam tanto em seu deus, desta maneira não precisavam crer em Cristo. Um dos jovens cristãos desafiou ao deus Lha-wang, e Deus lhes deu uma maravilhosa vitória, humilhando ao ídolo e abrindo o caminho para a fé. Um ministro preparado Watchman Nee nunca freqüentou uma escola teológica ou Instituto bíblico. Mas estava consciente de que Deus queria servos preparados, por isso se dedicou a estudar e meditar na Palavra de Deus, e a ler extensamente tanto comentários bíblicos como biografias de destacados servos de Deus. Sua capacidade era tal, que podia compreender, e memorizar muito material de leitura em muito pouco tempo. Ele facilmente podia detectar os temas de um livro com uma rápida olhada. Nee encontrou muita ajuda pessoal nos escritos de Andrew Murray e F. B. Meyer, sobre a vida prática de santidade e libertação do pecado. Também leu sobre Charles Finney, Evan Roberts e o avivamiento de Gales; pesquisou nos livros de Otto Stockmayer e Jessie Penn-Lewis sobre a alma e o espírito, e a vitória sobre o poder satânico. Seguindo o exemplo de Govett, Panton e Darby, Nee viu a necessidade de procurar uma forma mais primitiva de adoração que a oferecida pelas denominações, as que
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nesse tempo ofereciam já um triste espetáculo de frouxidão e religiosidade morta. Por meio de M. Barber, Nee se familiarizou com os livros de Madame Guyon, D. M. Panton, Robert Govett, G. H. Pember, William Kelly, C. H. Mackintosh, entre outros. No começo de seu ministério, ele investia um terço de seus ganhos em suas necessidades pessoais, um terço para ajudar a outros, e o terço restante para comprar livros. Ele fez um acordo com algumas livrarias de livros usados de Londres de que sempre que eles recebessem algum livro dos autores que lhe interessavam, que os remetessem imediatamente. Ele chegou a ter uma coleção de mais de 3.000 volumes dos melhores livros cristãos. Quando ainda era um jovem, o quarto de Nee estava quase cheio de livros. Havia livro no chão, e uma pilha em cada lado da cama, deixando apenas espaço para deitar-se. Muitos comentavam que ele estava enterrado em livros. Entretanto, sua principal leitura sempre foi a Bíblia, que lia sistematicamente cada dia, até completar ao menos uma leitura do Novo Testamento ao mês. Apesar de sua saúde ser precária, repartia seu tempo entre seus estudos, a obra, e a edição de sua pequena Revista cristã. A revista era publicada em forma irregular à medida que Deus lhe enviava dinheiro por meio de pequenas ofertas, e era distribuída sem peso. Seu nome começou a ser conhecido, e já recebia convites para dar seu testemunho e pregar. Sua mensagem era muito nova
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para a sua época, pois expunha de forma singela e clara que o único caminho para Deus é por meio da obra consumada de Cristo. Muitos cristãos se esforçavam por obter a salvação com base nas suas próprias obras, o que, a princípio, não se diferenciava muito do budismo. Pregava também que para os crentes não era suficiente receber o perdão dos pecados e a segurança da salvação, pois só representava o ponto de partida. Era um evangelho para os crentes. Nos próximos anos, o peregrinar espiritual de Nee o levou a ministrar a estudantes de Colégios e Seminários, a colaborar com a revista Luz Espiritual, dirigida por Li Yuen-ju, a trocar o nome de sua própria revista Avivamento, por o de O Cristão, e a estabelecer em Shangai a sua base de operações. Enfrentando uma grande prova Entretanto, o que abalou profundamente sua vida neste tempo foi um problema de saúde. Os problemas tinham começado em 1924 com apenas uma leve dor no peito. O médico que o examinou lhe disse que era uma tuberculose, por isso seria necessário um prolongado descanso. Passados alguns meses de cuidados especiais, a enfermidade não cedia. Um novo exame indicou que a enfermidade tinha avançado. O prognóstico do médico foi muito desalentador: «Tem tuberculose avançada em seus pulmões. Volte para sua casa, descanse e coma mantimentos nutritivos. É tudo o que pode fazer. Pode ser que melhore.» Todas as tardes tinha febre e pelas
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noites transpirava e não conseguia dormir. Para pregar tinha que realizar um imenso esforço, que o deixava exausto. Tinha tido tantos planos, tantas esperanças de grandes coisas. Agora Deus lhe dizia que não. Começou a examinar-se. Surgiu nele um desejo de ser puro diante de Deus, confessando pecados, procurando assim uma explicação do que ele pensava ser o aborrecimento de Deus. Quando retornou a Fuchou por causa de assuntos familiares, Nee teve uma experiência inesquecível. Por esses dias andava muito debilitado e doente; seu aspecto era bastante deplorável para um jovem como ele. Encontrou-se na rua com um antigo professor do Colégio Trindade. Por tradição, os estudantes chineses têm em alta estima os seus professores, voltando para eles para lhes agradecer cada vez que obtinham algum êxito. O professor o convidou para tomar chá, e censurou o seu fracasso: «Tínhamos um alto conceito de você na escola e tínhamos esperanças de que conseguiria algo importante. Não andou nem um centímetro para frente? Não progrediste? Não tem carreira, nada? Nee, por um momento, sentiuse muito envergonhado. Mas de repente, segundo conta, «soube o que era ter o Espírito de glória sobre mim. Podia levantar os olhos e dizer: Senhor, te louvo porque tenho escolhido o melhor caminho. Para meu professor era um desperdício total servir ao Senhor Jesus; mas essa é a finalidade do evangelho: entregar tudo a Deus». Mas sua enfermidade não cedia, e
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sua mãe, Fujo-ping teve a impressão, ao lhe ver, que lhe faltava muito pouco tempo. Nesses dias recebeu nova luz em 2 Corintios, a carta autobiográfica de Paulo, sobre o vaso de barro, que lhe animou e consolou em sua própria fraqueza. Dentro das forças que escassamente possuía, se dedicou a tarefa de terminar um livro que tinha começado pouco tempo antes, sobre o homem de Deus, que descrevia em forma conscienciosa o espírito, alma e corpo. Logo depois de escrever alguns capítulos, o abandonou por considerálo muito teórico; mas, em vista do pouco tempo que restava, decidiu tentar terminá-lo. Parecia-lhe que seria uma perda não compartilhar a respeito das suas experiências espirituais antes de morrer. Graças à oração persistente e o apoio de numerosos irmãos e irmãs, conseguiu concluir em quatro meses o primeiro volume do Homem Espiritual. Para escrever, sentava-se em uma cadeira de encosto alto e apertava seu peito contra a escrivaninha para aliviar a dor. Da irmã Ruth Lee recebeu ajuda para a revisão literária do livro, e o publicou em Shangai. Alguns anos depois, em junho de 1928, Nee conseguiu terminar o restante. Foi o primeiro livro que escreveu e o último, pois todos os seus outros livros são recopilações de mensagens orais. Mais tarde, Nee não aceitou fazer novas reimpressões do Homem Espiritual, porque lhe parecia muito perfeito e sistemático. Pensava que os leitores corriam o perigo de um entendimento intelectual das verdades,
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sem sentir a necessidade do Espírito Santo. Além disso, a parte sobre a luta espiritual enfatizava só o aspecto individual, mas mais tarde teve mais luz para ver que era um assunto do Corpo de Cristo e não do indivíduo. Depois de concluído o livro, Nee orou a Deus: «Agora permite a seu servo partir em paz». Nesses dias, sua enfermidade piorou a tal ponto que pelas noites suava copiosamente, e não conseguia dormir. Era apenas pele e ossos. Sua voz estava rouca. Algumas irmãs se alternavam para atendê-lo. Uma enfermeira que o visitou disse: «Nunca vi um doente com uma condição tão lamentável». Um irmão telegrafou às igrejas de diferentes lugares, avisando que já não havia esperança, que não precisavam orar mais por ele. Enquanto orava ao Senhor em seu leito de enfermidade, Nee recebeu três palavras do Senhor: «O justo viverá pela fé» (Rom. 1:17); «Porque pela fé estão firmes» (2 Co. 1:24); e «Porque por fé andamos» (2 Co. 5:17). Nee creu que essas palavras significavam sua saúde. Assim, lutando contra sua incredulidade, e contra os sussurros de Satanás, levantou-se com grande dificuldade, pôs sua roupa que fazia quase seis meses que não usava, e se pôs em pé, repetindo as palavras recebidas. Sentiu que o Senhor lhe dizia que fosse à casa da irmã Ruth Lee. Ali, a vários dias, havia um grupo de irmãos e irmãs orando e jejuando por sua saúde. Quando abriu a porta e viu a escada lhe pareceu a mais alta que tinha visto em sua vida (pois estava em um
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segundo piso). «Disse a Deus: – conta Nee – «Ainda que me disse que ande, farei-o, ainda que a conseqüência seja a morte. Senhor, não posso andar; por favor, sustente-me com a sua mão». Apoiando-me no corrimão desci degrau por degrau, novamente suando frio. À medida que descia seguia clamando «andar por fé», e a cada degrau orava: «OH Senhor, você é quem me faz caminhar». À medida que descia os 25 degraus, era como se estivesse, pela fé, com minhas mãos nas mãos do Senhor. Ao chegar ao final, senti-me fortalecido e caminhei com rapidez para a porta do fundo. Ao chegar à casa da irmã Lee, golpeei a porta como fez Pedro (At. 12:12-17), e ao entrar, sete dos oito irmãos e irmãs puseram seus olhos em mim, sem fazer nem dizer nada, e a seguir, todos se sentaram ali quietos por quase uma hora, como se Deus tivesse aparecido entre os homens. Ao mesmo tempo, eu me senti cheio de ações de graças e de louvores ao Senhor. Então lhes relatei tudo o aconteceu no transcurso de minha cura. Cheios de alegria até o júbilo no espírito, louvamos em alta voz a maravilhosa obra de Deus... No domingo seguinte, falei três horas de uma plataforma». Mais tarde confessaria que durante aqueles longos dias de prostração, ele recebeu luz para ver as diretrizes que deveria ter a obra que Deus lhe tinha chamado para realizar: obra de literatura, reuniões para «vencedores», edificação das igrejas e treinamento de jovens. Entretanto, mesmo quando foi curado milagrosamente da tuberculose,
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padeceu de uma angina de peito por quarenta e cinco anos, da qual não foi curado. Freqüentemente, ele sofria de fortes dores, até no meio das pregações, que lhe obrigavam a apoiar-se no púlpito. Deus permitiu dessa maneira que ele vivesse em contínua dependência de Deus para desenvolver o seu ministério. Crescimento e influências No princípio de 1928 Nee arrendou uma casa na rua Wen Teh Li, em Shangai, que foi a sede da obra a partir de então. Ali teve lugar nesse mesmo ano a primeira Conferência de Shangai, em um pequeno salão para 100 pessoas. Em maio de 1930 teve a tristeza de saber que Margaret Barber tinha partido com o Senhor. Muitas vezes depois, Nee teria que reconhecer que dela aprendeu as mais valiosas lições espirituais em sua vida. Na Bíblia que lhe legou estava a seguinte inscrição: «OH Deus, me dê uma completa revelação de ti mesmo», e em outro lugar: «Não quero nada para mim mesma, quero tudo para o meu Senhor». Ela morreu tal como sempre viveu: sem um centavo em sua bolsa, mas rica em Deus. «Como pobre, mas enriquecendo a muitos ...» Outros homens de Deus, estrangeiros, iriam ser um grato alento e edificação para Nee. Pimeiramente foi C. H. Judd, e depois Thornton Stearns. Mais tarde também o seria Elizabet Fischbacher. T. Stearns era catedrático da Universidade de Chefú, que tinha um grupo de oração e estudo bíblico compos-
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to por professores e alunos dessa universidade. Nee foi convidado em 1931 a dirigir uma série de reuniões para eles, com grande êxito. Muitos jovens se agregaram à fé. Comunhão com os irmãos Em novembro de 1930, Nee e os irmãos conheceram Carlos R. Barlow, e através dele, os principais expoentes do grupo dos Irmãos de Londres (da facção «exclusivista»). Entre eles surgiu uma entusiasta comunhão, que originou em uma viagem de Nee a Londres e aos Estados Unidos. Na Inglaterra foi muito bem recebido, e com estranheza, por tratar-se de um jovem chinês que mostrava grande maturidade espiritual. Nee teve grande admiração por sua erudição bíblica, mas se impacientou ao ver sua arrogância e sua inclinação pelos longos debates teológicos. A comunhão ficou impedida rapidamente pelo excessivo zelo dos Irmãos, que se incomodaram porque Nee participou em Londres da Mesa do Senhor com outros irmãos. Isto trouxe consigo uma longa e triste sé-
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rie de conversações, que derivaram, posteriormente, na ruptura dos Irmãos. O dia do gozo Em 1934 concluiu a longa espera de Nee por uma esposa. Para sua surpresa, Chan Pin-huei voltou-se para o Senhor em Wen Teh Li, depois de acabar seus estudos de inglês na Universidade de Yenching. Era uma jovem muito culta, formosa, e agora, muito humilde e temente a Deus. Depois de longas considerações e muita oração, decidiu pedi-la em matrimônio. A oposição não foi pequena, tanto de alguns familiares dela –por casar-se com um «pregador desprezado»–; como dos irmãos, que quase o idolatravam, ao julgar que um homem de oração como ele não deveria preocupar-se com coisas tais como sexo e a procriação. Em 19 de outubro desse ano, depois de concluir a quarta Conferência de Vencedores em Hangchou, casaram-se, no mesmo dia do aniversário matrimonial dos pais de Nee. Deram graças a Deus rodeados de irmãos, e cantando o hino que escreveu a sua amada dez anos antes. (Continua...)
*** Chesed A palavra misericórdia na língua hebréia é “Chesed”. Não há uma só palavra em espanhol para traduzi-la. Ainda que não tenhamos uma palavra para ela, nossa cultura gentílica não tem idéia do que ela representa. Há muitas palavras diferentes que são usadas quando tentamos traduzila: misericórdia, amor, bondade, fidelidade, lealdade, e a lista segue. “Chesed” é o amor e a fidelidade de Deus para ser, ou prover, o que seja necessário para nos fazer entrar na terra de suas promessas. Charles Simpson, em Conquista cristã.
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A parte da história da Igreja que não foi devidamente contada.
Os
paulicianos
Fiéis à fé original
Rodrigo Abarca
A
história das igrejas que se separaram da corrente principal do cristianismo organizado, tem na Armênia e na Ásia Menor os seus mais valentes representantes nos assim chamados «Paulicianos». Perseguidos durante séculos até seu quase completo extermínio, o pouco que sabemos deles nos chegou através do testemunho prejulgado e inclusive mal intencionado de seus perseguidores, e um livro descrito por eles, recentemente encontrado. Como vimos anteriormente, a solitária existência de alguma classe de cristianismo verdadeiro resultou sempre intolerável para a cristandade organizada, pois o contraste entre esta
e a pureza espiritual daqueles grupos de crentes perseguidos, manifestava a sua ruína espiritual e moral. E também colocava em interdição suas pretensões de ser a «única igreja verdadeira». Por isso, não só se dedicou a perseguir e matar todos os crentes que discordavam de suas práticas e não se submetiam ao seu domínio, mas também a deturpar, envilecer e destruir sua memória com perversas e absurdas acusações de heresia e maldade. Por certo, detrás de tanta hostilidade não descobrimos outra coisa senão o mesmo dragão de Apocalipse 12, cuja ira contra os santos que retêm o testemunho de Jesus Cris-
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to manifesta as mais cruéis perseguições contra eles. Este é o contexto em que se desenvolve a história dos assim chamados «Paulicianos», que floresceu com maior intensidade entre os séculos VII e IX D.C., nas regiões orientais da Armênia, no monte Ararat e ainda mais à frente do rio Eufrates, embora a sua origem, de acordo com alguns historiadores, pode ser esboçado inclusive até o período apostólico. Eles mesmos afirmavam ser parte da «santa igreja apostólica e universal de Jesus Cristo», e só se chamavam a si mesmos «cristãos» ou «irmãos» e diziam descender das antigas igrejas apostólicas. Se isto é ou não verdade em um sentido temporário, tem menos importância que sua veracidade espiritual. Pois estes irmãos procuraram manterse fielmente dentro do ensino apostólico do Novo Testamento. De fato, devido a seu grande amor e respeito pelas Escrituras, e em especial pelos escritos do apóstolo Paulo, foram provavelmente chamados «Paulicianos» por seus perseguidores. E por esta causa, encontraram-se em conflito com a maior parte da cristandade oficial de seu tempo. A partir da Escritura, resistiam firmemente a união da igreja e o estado, e viam nela a fonte de muitos dos males da cristandade. Igualmente, opunham-se também à adoração de imagens, o culto a Maria, o batismo de crianças, e a autoridade eclesiástica centralizada e hierarquizada do sistema episcopal. Suas igrejas eram dirigidas por anciões de provado ca-
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ráter espiritual, e não possuíam nenhuma hierarquia de controle centralizado. Existiam também mestres itinerantes que viajavam extensamente entre as igrejas para instruí-las e fortalecê-las. Homens de caráter apostólico cujos nomes ainda é lembrado devido à grande influência que exerceram nos seus dias. A comunhão destas igrejas era de caráter eminentemente espiritual e não estava apoiada em um credo doutrinal bem definido e admitido por todas. Não estavam tão interessadas no rigor doutrinal, mas sim no amor, na comunhão e na experiência cristã genuína e prática. Bem se poderia dizer que eram cristãos «predogmáticos», no sentido de que se desenvolveram alheios a todas as controvérsias doutrinais que agitaram amargamente as águas da cristandade organizada. Por isso, não cabe esperar deles definições dogmáticas precisas e acabadas1, a não ser 1
As controvérsias doutrinarias levaram a cristandade a desenvolver uma linguagem precisa para definir os dogmas centrais da fé. Esta linguagem, freqüentemente técnica, especializada e erudita, é o fruto de séculos de discussões e controvérsias teológicas. Embora não podemos negar o seu valor e alcance ao esclarecer questões de difícil exposição, não se pode esquecer que a fé bíblica não tem essa linguagem e é muito mais singela e espiritual. De fato, podemos nos perguntar se na realidade alguma vez foi possível para todos os crentes, de qualquer época, idade e condição, entender e expor sem falhas todas as formulas dogmáticas contidas nos credos da cristandade (com a possível exceção do «símbolo dos apóstolos»). Por isso, embora possamos subscrever os credos mais antigos, não podemos fazer deles o fundamento da vida e da fé das Igrejas. Este fundamento deve ser sempre vivo e espiritual, embora careça às vezes de um preciso rigor exterior e dogmático quando se expressa ou escreve, pois, contudo, retém e comunica os fatos essenciais da revelação de Deus em Cristo segundo as Escrituras, iluminadas pelo Espírito Santo nos santos. Tal é, o nosso entendendimento, no caso dos Paulicianos.
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um inconfundível sabor evangélico e bíblico nos poucos escritos que sobreviveram deles. Entretanto, isto se encontra a anos luz das acusações de heresia que receberam de seus perseguidores. De fato, debaixo dessa óptica dogmática e intransigente, também os grandes pais da igreja antiga, que tanto trabalharam pelo «desenvolvimento do dogma», podem ser suspeitos de heresia ao ser confrontados extemporaneamente com os credos de uma cristandade posterior a seu tempo. Se os credos tiverem algum valor, derivam de sua fidelidade à Escritura, e igualmente, não têm a autoridade final desta última. São como sinais no caminho que nos indicam os caminhos que não devemos tomar. Algo muito distinto é fazer deles lanças e espadas afiadas para perseguir, acusar e condenar a outros crentes, tal como tragicamente ocorreu na história da cristandade. Por certo, como já se viu em outros casos, a acusação principal contra eles foi a de maniqueísmo, pois esta acusação, uma vez provada, sofria a pena de morte na lei romana desse tempo. Não obstante, conforme consta nos mesmos testemunhos de seus executores, eles sempre resistiram essa acusação como uma calúnia, e se declararam fiéis discípulos de Cristo. Além disso, isto é muito mais coerente com o grande amor e fidelidade que professavam fazer da Escritura a única fonte de autoridade, o qual resulta totalmente incompatível com sua suposta adesão ao maniqueísmo. Finalmente, um de seus poucos escritos que
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sobreviveram à destruição, chamado «A Chave da Verdade» não mostra nenhum vestígio de maniqueísmo em seu conteúdo, mas sim uma fé essencialmente bíblica. Embora não conhecemos o nome do autor do referido livro, sabemos sim que houve entre eles alguns proeminentes ministros da Palavra, como já mencionamos, que derramaram suas vidas por causa do Senhor Jesus Cristo, cuja vida e testemunho merecem ser recordados. Constantino Silvano Como temos dito, a história deste grupo de irmãos começa a ser conhecida a partir do século VII. Nesse tempo, perto do ano 653 D.C., um homem chamado Constantino recebeu em sua casa um viajante armênio, que por gratidão lhe deixou um valioso presente: os manuscritos dos quatro evangelhos e as epístolas paulinas. De fato, muitos quiseram ver em Constantino o fundador dos Paulicianos, mas eles sempre alegaram uma origem muito mais antiga. Enquanto lia aqueles escritos, a luz entrou em seu coração e se converteu em uma valente testemunha de Cristo. Muito em breve, um grupo de crentes se reunia com ele para estudar as Escrituras fora da tutela da igreja organizada. Constantino foi logo recebido entre os irmãos como um dotado mestre e viajou extensamente pregando o evangelho e ensinando nas igrejas. Trocou seu nome pelo de Silvano, devido a sua admiração pelo apóstolo Paulo; estabeleceu seu lar na Kibossa e dali viajou para o leste seguindo o curso do rio Eufrates e para
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o oeste, através da Ásia Menor. Seu ministério se estendeu por mais de 30 anos. Finalmente, devido a seu extenso trabalho e influência, o imperador romano do oriente (Bizancio) emitiu um decreto contra ele. No ano 684 foi capturado por um oficial do império chamado Simeón, e foi apedrejado até morrer. Entretanto, Simeón ficou tão impressionado com o que viu e escutou durante a detenção e a execução de Constantino Silvano, que, depois de sua volta a corte de Bizancio, não pôde encontrar paz nem tranqüilidade para a sua alma. Finalmente, depois de dois anos de luta interior, decidiu abandonar tudo e retornar ao lugar onde tinha morrido Constantino. Ali se entregou ao Senhor, foi batizado, e continuou a obra que Constantino tinha realizado. Rapidamente se uniu ao exército dos mártires, pois também foi capturado e queimado publicamente junto a muitos outros irmãos. Não obstante, isto não deteve o resto dos crentes, e sua obra continuou expandindo-se. Sergio Depois de Constantino Silvano, outro homem de considerável influencia entre os irmãos foi Sergio, quem exerceu seu ministério entre os anos 800 aos 834. Também se converteu ao Senhor após ler atentamente a Escritura, particularmente os evangelhos. A partir dali, começou um extenso ministério por cartas, além de suas viagens. Ricas cartas circularam com grande autoridade entre as igrejas e ajudaram a curar as divisões que esta-
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vam surgindo entre elas. Viajou extensamente do leste ao oeste, até que, conforme nos diz: «meus joelhos estiveram fatigados». Embora sempre trabalhou como carpinteiro, serviu a inumeráveis irmãos no ministério da palavra por 34 anos, visitando praticamente todas as regiões das terras altas da Ásia Central. Sua vida acabou sob o machado do verdugo imperial no ano 834 D.C. A luta contra a idolatria Uma das maiores batalha entre os irmãos e a igreja organizada foi travada em torno do assunto das imagens. Diferentes imperadores bizantinos se declararam sucessivamente a favor ou contrários ao uso de imagens. Como os irmãos resistiam abertamente o uso e a veneração destas, sua situação também flutuava de acordo com a posição que tomava o imperador da vez. Sob o reinado de Leão III (660-740 D.C.), quem publicou um decreto imperial contra as imagens, foram protegidos pelo imperador, e lhes permitiu exercer sua fé sem perseguições. Inclusive, alguns deles foram deslocados pelo mesmo filho do imperador até os Bálcãs, onde iniciaram uma extensa e frutífera obra. Não obstante, esta política foi variando com os seguintes imperadores. A morte de Teófilo (842 d. do C.), que se opunha às imagens, subiu ao trono a imperatriz Teodora, ardente defensora destas, e quem iniciou a mais terrível e sangrenta de todas as perseguições contra os paulicianos. Sob suas ordens foram decapitados, afogados e queimados milhares de homens, mu-
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lheres e meninos. Calcula-se que durante esse tempo (842-867 d. do C.) perto de 100.000 irmãos perderam a vida. As terríveis perseguições e torturas que tiveram que suportar inclinaram, infelizmente, alguns irmãos a tomar as armas e unir-se aos muçulmanos para lutar contra o império que cruelmente os perseguia. Este fato marcou o começo da decadência espiritual entre eles. Pois toda vez que, na história, os crentes tomaram a espada para defender-se, colheram ruína e destruição. A advertência do Senhor a Pedro é determinante: «Torna sua espada em seu lugar; porque todos os que tomam a espada, pela espada também perecerão». Apesar de tudo, devemos recomendar a fidelidade desses irmãos, conhecidos como paulicianos, quem perto de 300 anos mantiveram no alto o estandarte da fé e a pureza evangélica, no meio das mais cruéis difamações e perseguições. Resistiram valentemente e pacificamente todos os esforços que, ao longo desses anos, foi feito para destruí-los. Embora nos séculos posteriores, quando sua condição espiritual tinha declinado, alguns tomaram o caminho da luta armada contra o império, muitos deles continuaram fiéis e se espalharam para o oeste, levando consigo sua mensagem de simplicidade e pureza evangélica, como fiéis seguidores de Cristo. Ali, no ocidente, retornamos a encontrar com o nome de Bogomiles, ou amigos de Deus, dispostos a escrever um novo capítulo de heroísmo e fé.
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A chave da verdade Uma última palavra deve ser dita sobre o único livro importante que sobreviveu dos paulicianos, chamado «A Chave da Verdade». Foi descoberto no final do século 19. Trata-se de uma série de conselhos, escritos para as igrejas por um autor desconhecido. Embora seus ensinos não devem ser tomadas como um credo dogmático, são, em geral, uma clara exposição de sua fé e prática. Nelas há um inconfundível sabor evangélico. Resistem ao batismo de crianças e declara que estes devem ser criados por seus pais na fé e na piedade segundo o conselho dos anciões da igreja. Isto deve ser acompanhado por orações e a leitura da Escritura. Também, ao falar sobre a ordenação de anciões, declara que estes devem ser de perfeita sabedoria, amor, prudência, gentileza, humildade, coragem e eloqüência. Devia perguntarlhes se estavam dispostos a beber do cálice do Senhor e ser batizados com o seu batismo, e sua resposta devia ser uma clara demonstração dos perigos que estes homens deviam enfrentar por causa do Senhor e do seu rebanho: «Tomo sobre mim os açoites, prisões, torturas, opróbrios, cruzes, aflições e tribulações, e toda tentação do mundo, que nosso Senhor e Intercessor da igreja apostólica e universal tomou sobre si mesmo, aceitando-os com amor. Também eu, um indigno servo do Jesus Cristo, com grande amor e imediata vontade, tomo sobre mim tudo isto, até a hora de minha morte». Estas palavras demonstram o valente espírito de fé com que estes homens
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e mulheres se entregavam ao Senhor Jesus Cristo, conscientes de que podiam selar seu testemunho com a coroa do martírio, tal como na verdade ocorreu com centenas de milhares deles. Este livro retira também qualquer dúvida sobre seu suposto gnosticismo ou maniqueísmo. Nenhum sinal dessas heresias aparece nele. Possivelmente a única passagem controvertida é o que descreve o batismo do Senhor, onde diz que nesse ato, aos 30 anos de idade, «Nosso Senhor recebeu o senhorio, o sumo sacerdócio, e o reino... e foi cheio da divindade». Estas afirmações não parecem negar a divindade do Senhor antes de seu batismo2, mas sim melhor enfatizar que a partir de então, começou a manifestar esses atributos divinos, que até então permaneceram escondidos. No restante, a passagem não afirma nada mais a respeito, já que sua intenção não é teológica mas sim prática. Seu propósito parece ser a fundamentação do batismo em pessoas
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conscientes de seus atos, em oposição ao batismo de crianças. Os assim chamados paulicianos representavam uma fé mais prática que especulativa, mais bíblica que dogmática, que se desenvolveu fora das definições e controvérsias dogmáticas da cristandade organizada de seu tempo. Por isso, seu testemunho nos fala ao contrário de um cristianismo mais antigo e original que procurou manter-se ardentemente fiel aos ensinos apostólicos sobre Cristo e sua igreja, contra tudo e apesar de tudo, até tingir-se por completo com o sangue de suas mártires. 2
Alguns pensam que os Paulicianos sustentavam uma posição adocionista, vale dizer, que Jesus foi um mero homem até que foi invadido pela divindade em seu batismo. Entretanto, isto pertence sim ao âmbito da especulação teológica da escola de Antioquia, inclinada a negar a divindade do Senhor a favor de sua humanidade, muito afastada do evidente espírito singelo e evangélico dos irmãos. Na verdade, estes parecem não haver sustentado nenhum credo dogmático em particular além da autoridade da Bíblia.
*** Uma obra de arte Na ventosa costa britânica da França, o abade Adolph Juelienne Foure passou quase dez horas todos os dias durante 25 anos, esculpindo mais de 300 figuras em um enorme segmento de rochas sobre o mar. As estátuas contam a história fantástica da família Rotheneuf, uma numerosa família de contrabandistas, piratas e pescadores fora da lei do século XVI. Por que o sacerdote francês dedicou o último terço de sua vida à escultura dessas criações no penhasco, ninguém sabe. Entretanto, sabemos algo melhor que acontece diariamente em nossas vidas, motivado pelo Espírito Santo que habita em nós. Devemos ser moldados por ele mediante a obra da cruz e esculpidos como pedras no templo vivo de Deus, a Igreja. Essa tarefa exige todo nosso tempo e energia, não como operários, mas sim como servos dispostos a nos submeter nas mãos amorosas de nosso bendito Mestre. Á Maturidade
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Uma visão científico-bíblica da longevidade humana.
Límites
da vida humana
Ricardo Bravo
A
longevidade dos seres humanos tem variado grandemente nos últimos 400 anos. Se olharmos para a Europa nos arredores de 1600, a média de vida não superava os 30 anos, enquanto que no século vinte, o ciclo de vida do homem aumentou para mais do dobro, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Por exemplo no EE.UU., passou-se de uma expectativa média de vida de 50 anos nos inícios do século XX, a uma média de 77 anos no começo do século XXI, esperando-se que esta média aumente até os 85 anos em 2125 (Roberts & Rosenberg. 2006). A OMS predice que se agora houver no mundo 380.000 pessoas que ultrapassaram a fronteira dos 100 anos, dentro de cinqüenta anos serão mais de 3 milhões os que alcançarão uma longevidade igual. Este tema da longevidade tem atu-
almente uma relevância crucial na ciência, sendo abordado com múltiplas linhas de investigação. Teorias sobre a longevidade Os cientistas levam anos debatendo sobre a longevidade humana e o processo do envelhecimento. Enormes cifras de dinheiro são gastos em investigação em laboratórios de países desenvolvidos sobre este tema. Os fatores que envolvem são variados, destacando os genéticos, ambientais e a qualidade de vida (alimentação e exercício físico). Desde a metade do século passado surgiram teorias a respeito de como chegamos a envelhecer. Uma das primeiras foi a teoria nervosa, a qual assinala que este processo ocorre no nascimento, devido à morte de células nervosas que em sua maioria não se reproduzem. Uma segun-
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da teoria é a das mutações; esta se apóia nas alterações que experimenta o DNA de nossas células ao longo da vida, e que dependendo do ambiente mais ou menos poluído em que nos vemos obrigados a viver, ou do tempo que temos sido expostos a algum tipo de radiação ionizante, haverá mais ou menos mutações em nossas moléculas de DNA. O DNA é o que tem a informação chave do ser vivo, seja para regenerar células e tecidos que se vão danificando, ou para produzir moléculas importantes para a célula. Recentemente surgiram teorias um pouco mais complexas, como a dos radicais livres; moléculas que se geram continuamente em nosso organismo como resultado do metabolismo celular. Estas moléculas tendem a reagir com outras moléculas e as danificar. Entre as vítimas destes radicais livres estão o DNA, as proteínas e os lipídios, quer dizer, as estruturas vitais das células. Como resultado, produzem enfermidades associadas com a idade como o Alzheimer, a arteriosclerose, ou com desordens no funcionamento celular como o câncer. Alguns estudos indicam que uma dieta rica em substâncias antioxidantes (vitaminas E, C), presentes em frutas e verduras, poderiam retardar o envelhecimento e de algumas enfermidades que lhe associam. Comprovou-se além que as dietas pobres em calorias diminuem a geração de radicais livres com os conseguintes benefícios sobre a longevidade. Os anos e os telômeros Mas sem dúvida, a teoria que tem despertado a maior atenção dos biólogos moleculares, com uma profusa investigação de excelente qualidade, é aquela referida a umas importantes estruturas localizadas bem no interior das células, as que se denominam telômeros (Zakian
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1995, Chong et ao. 1995, Do Lange 1998, Vogel 2000, Sinclair & Guarente 2006). Os telômeros protegem as extremidades dos 46 cromossomos que estão no núcleo de nossas células, onde se encontram os genes com seu valioso DNA. Para entender melhor a forma e função desta tão pequena estrutura, foi feito uma analogia muito prática entre um cromossomo com seus telômeros nas extremidades e um cordão de sapato com as suas partes plásticas nas pontas. Em ambos os casos as proteções das pontas evitam que se desintegre o cromossomo ou que se desfie o cordão. Os telômeros ao manter íntegro o cromossomo, permitem que este possibilite uma divisão celular adequada. Se não houver divisão celular, não será reposto os milhões de células que se perdem constantemente em nosso tubo digestivo ou em nosso sistema sangüíneo, por exemplo. A alguns anos foi descoberto que a cada nova divisão celular, perdia-se uma pequena fração destas seqüências protetoras ou telômeros. Assim os telômeros se vão encurtando a cada divisão das células até que chega um momento em que já não podem manter a estabilidade dos cromossomos e a célula morre. Por isso as células de uma pessoa adulta têm menor capacidade para dividir-se do que as células de uma pessoa jovem. Deste modo os telômeros controlam o envelhecimento, funcionando como um relógio da divisão celular, lançando um rol fisiológico fundamental na manutenção de diferentes processos malignos. Por isso, alguns cientistas acreditam que durante a velhice, aumenta a vulnerabilidade às enfermidades e à morte, devido às mesmas células se encontrarem já no limite de suas possibilidades, com seus telômeros muito reduzidos. Mas curiosamente, este mecanismo não funciona
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assim em algumas células como as embrionárias ou as cancerosas, as quais se dividem sem limites, convertendo-se em células virtualmente «imortais» (King et ao. 1994, Shay 1998, Pérez et ao. 2002). Isso nos faz pensar que as outras células do corpo puderam ter ou ter tido uma capacidade similar de reprodução e com isso, permitir uma longevidade ao ser humano muito maior. O envelhecimento humano atual é notado muito claramente na pele, na debilitação da musculatura corporal e na atrofia de cartilagens e ossos, mas os numerosos estudos realizados apontam que os últimos responsáveis por estes processos de deterioração são os telômeros cromossômicos. Este último tem aberto uma importante linha de investigação científica por meio da qual se espera dentro de poucos anos utilizar medicamentos que controlem a duração e integridade dos telômeros e com isso, tratar distintas enfermidades. Por exemplo, a artrose poderia ser controlada por meio de substâncias potenciadoras da enzima telomerasa, restituindo a atividade reprodutora das células, como também para frear o câncer, cujas células se reproduzem incontrolávelmente, utilizariam-se inibidores da telomerasa para que deixassem de reproduzir-se e deste modo, já não formem tumores. Caso chegassem a controlar de forma adequada algumas das variáveis que atuam na longevidade (fatores genéticos, radicais livres, telômeros), a esperança máxima de vida a que poderia aspirar um ser humano, aumentaria grandemente. De acordo com o registro Guinness, a pessoa mais idosa que viveu até esta data, e da qual se tem seu registro oficial de nascimento, foi a francesa Jeanne-Louise Calment, que chegou a viver 122 anos e 164 dias (1875-1997).
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Curiosamente, esta idade coincide com o registro bíblico, o qual assinala que são 120 anos a idade máxima a que poderia chegar uma pessoa (Gênesis 6:3), embora em média, o Salmo 90 declara que a vida do homem é de 70 anos. Por certo que a idade máxima de Gênesis, Deus a estabelece depois de concluir que o aumento da população humana trazia consigo um aumento também da maldade. Antes desta época, nos primordios da humanidade, as pessoas podiam viver até 8 vezes mais do que viveu a francesa Jeanne-Louise Calment, a que tem o recorde de longevidade. Soa irracional viver 900 anos? Idade literal ou simbólica? Com certa freqüência a Bíblia é afrontada porque certas passagens se referem a temas que parecem inverossímeis ou que não se ajustam ao conhecimento científico vigente, embora muitas vezes não se faz o esforço por relacionar certos achados da ciência com relatos bíblicos que foram estigmatizados em outro tempo, e portanto, ficaram marcados com uma etiqueta de absurdos. Em Gênesis assinala que antes do dilúvio, as idades com que podiam chegar as pessoas eram várias vezes maiores das que podemos alcançar na atualidade. Ali se registra que Adão morreu aos 930 anos (Gênesis 5:5), que Sete viveu até os 912 anos (5:8) e Matusalém (o mais idoso dessa época) alcançou até os 969 anos de idade (Gênesis 5:27). É certo que a primeira vista, e com nossa experiência do ciclo de vida atual, fica difícil de aceitar estas enormes idades para o ser humano: é como viver em média 8 vidas em relação ao que vivemos hoje. Tem sido escrito bastante a respeito, entretanto todos os esforços que se tem feito para explicar esta grande
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Se os biólogos moleculares dentro em pouco poderão regular a longevidade humana através do controle da reprodução celular, terá podido o Autor da vida na terra, condicionar uma longa vida no início a suas criaturas e em seguida deixá-la limitada por meio destes fatores que vimos? longevidade de maneira distinta a forma literal em que se assinala na Bíblia, fracassaram. Têm-se dito, por exemplo, que um ano equivaleria a um mês ou a três meses (Siculus 1985), porque teriam usado o ciclo lunar para estabelecer as idades. Este argumento é desmontado por várias razões, mas só duas delas bastam para descartá-lo. Em primeiro lugar, ao rebaixar a idade deste modo, várias pessoas dessa época terminam sendo pais com idades infantis; por exemplo se dividirmos por 12 (1 ano = 1mês), Enoque, teria gerado a Matusalém entre os 5 e 6 anos de idade (Gênesis 5:21), Sete, teria sido pai de Enos com cerca de 9 anos de idade (Gênesis 5:6). Em segundo lugar, o termo «ano» nunca é usado em função do ciclo lunar no Antigo Testamento. Outro argumento contra uma interpretação literal dos anos em Gênesis 5, foi que o registro bíblico não representaria idades pessoais, mas sim dinastias ou linhas familiares (Borland 1990). Mas esta teoria é derrubada quando descobrimos relatos bíblicos de encontros e rela-
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tos pessoais entre pais e filhos como é o caso de Gênesis 5:32; «e sendo Noé da idade de 500 anos, gerou a Sem, a Cão, e a Jafé», e posteriormente aparecem coexistindo dentro do arca em Gênesis 7:13; «neste mesmo dia entraram Noé, e Sem, Cão e Jafé, filhos de Noé.....». Tampouco concorda esta postura com outras passagens tais como Hebreus 11:5,7, aonde se faz referência às pessoas (Enoque e Noé neste caso) e não a seus clãs ou famílias. Têm-se dito também que a visão de tempo hebréia no período que foram gerados os fatos assinalados em Gênesis (mais de 2000 anos A.C.), apoiava-se no sistema de numeração sexagesimal sumério ou babilônico (de onde provêm as unidades do tempo, por exemplo), e não no sistema com base decimal, que teriam adotado depois, quando Abraão, logo depois de abandonar a Mesopotâmia, habitou na Palestina, onde ele e seus descendentes entraram em contato com os egípcios, que usava o sistema decimal (Hill 2003). O resultado da larga idade dos patriarcas, segundo esta proposta, seria simbólica e não literal, onde se tem que fazer uma rebuscada multiplicação e soma da idade cronológica da pessoa com números considerados preferidos (o 3 e 7 por exemplo). Esta labiríntica e subjetiva proposta foi questionada ao ser feito cálculos com algumas idades. Por exemplo, a idade de Lameque (Gênesis 5:31), sobe de 777 anos de acordo com o registro bíblico, a 3333 anos, ao convertê-lo para a notação numérica com base 6 (Godfrey 2005). Além disso, têm-se que ter em conta que o escritor de Gênesis foi Moisés, formado com os mais altos padrões da cultura egípcia, tendo portanto o sistema decimal como base numérica. Outras críticas apontam geralmente
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porque não existem evidências científicas para corroborá-lo. Entretanto, a enorme quantidade de estudos realizados sobre genética e reprodução celular, alguns dos quais foram citados a propósito neste artigo, contribuem com evidências mais que suficientes para reafirmar a veracidade literal do relato bíblico. Por exemplo, o rol que cumprem os telômeros na divisão celular, o qual está estreitamente ligado com a longevidade do ser humano, e corroborado pelas células embrionárias e cancerosas que se dividem quase sem limitações. Esta capacidade enorme de reprodução celular bem pôde ter ocorrido não só a algumas, mas também às demais células do organismo no início. Sobra-nos DNA Outros interessantes trabalhos realizados na Universidade de Glasgow, no Reino Unido (Monaghan and Metcalfe, 2000, 2001), têm descoberto uma relação significativa entre a longevidade de um organismo e o tamanho do genoma (conjunto de DNA que guarda a informação para «construir» o organismo inteiro). São estudos complexos que têm que esclarecer ainda várias dúvidas, mas que já alcançaram importantes resultados. Esses trabalhos analisaram a variação entre o tamanho do genoma e a longevidade em 67 espécies de aves e encontraram que as aves com genomas mais longos vivem mais tempo que aquelas aves em que seu genoma é mais curto. Que relação tem isto com o nosso genoma? Tem uma importante relação à luz dos resultados de um enorme e extenso estudo conhecido como «Projeto Genoma Humano». Este estudo mostrou que os humanos têm um genoma muito extenso, entretanto o DNA ativo ou útil de nossas células é só de 3% (Glad 2006).
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Quer dizer, existem uns 97 % de nosso DNA que esta inativo ou que não codifica (falando em linguagem genética), o qual engloba diversos tipos de seqüências, tanto únicas como repetidas. Para que serve esta grande quantidade de genoma inativo? A ciência não o deixa claro. O certo é que o relatório científico sobre a decifração do genoma humano, em particular sobre este DNA inativo, está repleto de termos como «misterioso», «função desconhecida», «enigma não resolvido» (Murphy et ao., 2001). Este DNA de função desconhecida foi chamado a principio DNA selfish (egoísta) e em seguida, com o avanço das investigações, e talvez o aumento da frustração por não chegar a compreender sua função, foi chamado DNA «junk» (desperdício ou sucata). Tem sentido biológico que a maior parte de nosso DNA seja desperdício? Talvez terei que formular a pergunta de outra forma. Este enorme DNA que está hoje inativo em nossas células, pôde alguma vez ser funcional, em certa etapa da história humana em que as células pudessem tê-lo ocupado, por exemplo para codificar proteínas e prolongar a vida do homem por muito mais tempo do que vive agora? Alguns biólogos evolutivos poderão expor diversas hipóteses a respeito, mas creio que também é perfeitamente válido expor a hipótese que essa grande quantidade de DNA pôde utilizarse em uma percentagem muito maior alguma vez na história biológica humana, para possibilitar uma longevidade várias vezes superior a atual; atendo-se estritamente à evidência científica. Se os biólogos moleculares dentro em pouco poderão regular a longevidade humana através do controle da reprodução celular, terá podido o Autor da vida na terra, condicionar uma longa vida no
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início a suas criaturas e em seguida deixála limitada por meio destes fatores que vimos? (telômeros e longitude do genoma), porque estas não responderam a seu plano originário de habitar com o homem em uma longa comunhão. O Senhor nos recorda em Isaías qual é o propósito pelo qual Ele criou aos que deviam ser seu povo, «....Para minha glória os criei, formei-os e os fiz» (43:7). Contrariamente, suas criaturas só desejavam separar-se de seu Criador e praticar o mal, por isso Deus antes do dilúvio mostra seu desencanto por elas, e pensou eliminar da terra o gênero humano (Gênesis 6:7), mas Noé acha graça diante dos olhos do Senhor, que decide dar ao homem uma nova oportunidade (Gênesis 6:8). O Senhor deu mostras, na Bíblia, de regular a quantidade de anos de seus filhos em função de se estes são ou não obedientes a seus mandatos. Uma importante proposição de prolongação da vida humana na terra, está estabelecida como mandamento do início da relação entre Deus e aquele que será seu povo. Tratase de uma poderosa promessa nos momentos em que se estabelece o pacto de Deus com o povo hebreu, logo depois de sua libertação do Egito. Lemos em Êxodo 20: 12: «Honra a seu pai e a sua mãe para que seus dias se prolonguem na terra que o Senhor, seu Deus, te deu». Com isto o Senhor nos assinala de forma categórica, que a longitude da vida humana está sob seu controle, acima de fatores tais como a genética ou outros, que ficam relegados a segundo plano. O freio da vida O Senhor anuncia em Gênesis 6:3, 5 que o ser humano continuamente mostrava inclinação para o mal, por conseguinte perdia sentido que vivesse tanto tempo, e por isto modifica o seu plano original, di-
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minuindo a idade do homem até no máximo de 120 anos. Além das prováveis modificações biológicas a nível celular e molecular (DNA) que teriam encurtado a vida, algumas mudanças ambientais importantes ocorridas depois do dilúvio puderam ter afetado também a longevidade humana. As condições atmosféricas prédiluvianas teriam sido muito diferentes das atuais, devido a atmosfera ter uma grande quantidade incorporada de água, certamente em forma de vapor (Gên. 1:6-8), a qual atuava como um filtro natural ante certas radiações cósmicas e solares daninhas que limitam fortemente a vida. Esta capa de água atmosférica teria precipitado durante o dilúvio (Gên. 7:11-12), deixando os organismos vivos sobre a superfície terrestre mais expostos a mutações e ao dano celular por radiação. O fato de que esteja tão marcadamente exposta a data de morte em várias partes do capítulo 5 de Gênesis, sugere que Moisés ao escrevê-lo, foi especialmente dirigido assim por Deus, para que pudéssemos fazer a diferença entre as duas etapas da história humana na terra. Uma no princípio, com o primeiro plano de Deus, em que o homem viveria por muitos anos, inclusive depois da queda de Adão e Eva em desobediência; e outra, em uma segunda etapa, a que foi produto da enorme multiplicação da maldade humana, onde o Senhor decide diminuir os anos de vida do homem a cerca de 10% da idade considerada originalmente, trocando inclusive seus hábitos alimentares de vegetariano, para incluir na dieta alimento animal (Gên. 9:3). Este último também trouxe uma série de conseqüências nefastas para a sua saúde, como o aumento de radicais livres daninhos, diminuindo com isto sua vida e conduzindo outras importantes altera-
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ções na natureza criada inicialmente perfeita por Deus, mas desvirtuada pelo homem, as quais se expressam claramente na ecologia e zoologia atuais (Bravo 2005). Idade milenar restaurada As importantes evidências provenientes da biologia molecular, no sentido de que pode existir uma biologia distinta com respeito ao funcionamento celular e a longevidade humana, apontam para lhe outorgar credibilidade literal às largas idades vividas por pessoas antes do dilúvio, relatadas na Bíblia. Entretanto, tão
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ou mais importante ainda, é o fato que ao enfatizar-se vez após vez em Gênesis 5 os longos anos de vida do homem no princípio, permite relacionar o propósito inicial do Senhor de viver em harmonia na terra com sua criatura especial por longo tempo, com sua promessa apocalíptica de retomar este propósito originário de reinar com o homem, agora restaurado pelo sacrifício de Cristo, na era milenar descrita em Apocalipse 20. Se recordarmos que Matusalém viveu perto de um milênio, tem muito sentido o paralelo destes parágrafos bíblicos do início e final da Escritura.
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PAGINA DO LEITOR
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CARTAS Alimento sólido Dou graças a Deus por sua página, é de enorme bênção para a minha vida. Quando tenho oportunidade, recomendo-a a outros irmãos. Dou graças a meu Pai Celestial por essa nova revelação que nos dá de sua Palavra, fazendo que gozemos de um alimento sólido, como ele mesmo o menciona em sua Palavra. Cesar Solís Ruiz, Monterrey, México.
Refrigério Para mim, Água Vivas representa um refrigério, crescimento e ajuda em meu ministério pastoral. Sou chileno, faz 23 anos que vivo no Brasil, e trabalho como pastor em um lugar longínquo de todo centrourbano. A revista e outros materiais são de ajuda para mim e para aqueles a quem compartilho oque tenho recebido. José Davinson, Apiai, São Paulo, Brasil.
Maná Somos um grupo pequeno de irmãos, que há 20 anos estamos nos reunindo como igreja. Já vai para mais de um ano que estamos nos nutrindo da página
Web. Estamos muito agradecidos ao Senhor por nos haver aberto esta porta para receber o precioso Maná que nos brinda «Águas Vivas», sobretudo em um momento em que fomos muito atacados pelo inimigo e ficávamos à deriva. A Ele seja a Glória! Alberto Oliva Mancilla La Línea de la Concepción, Cádiz, Espanha.
De Cuba Estive lendo a sua revista, testemunho que me familiarizei com o enfoque que dão. Alegra-me a sólida condição de fé de vocês e quão proveitoso é para a obra de Deus homens dispostos e postos em função de dar um alimento espiritual sólido e vitalizante. Angel, Cuba.
Temas de ensino Estou muito agradecida pelas revistas dedicadas ao tema do corpo, alma e espírito. Estão me ajudando a compreender e a sair de dúvidas. Estou-as compartilhando com meus irmãos da igreja, porque dali estou tirando temas para ensino. Yolanda Trujillo Baltazar Ambo, Huanuco, Perú.
Por razões de espaço, as cartas são resumidas. Toda bênção procede de Deus; portanto, toda a glória é para Deus.
águas vivas UMA REVISTA PARA TODO CRISTÃO / ANO 7 · Nº 41 · SETEMBRO - OUTUBRO 2006 Equipe Redatora: Eliseo Apablaza, Roberto Sáez, Gonzalo Sepúlveda. Nesta edição também: Ricardo Bravo, Rodrigo Abarca. Desenho gráfico: Mario Contreras. Traduções: Edward Burke Junior. E-Mail: aguasvivas.cl@gmail.com
Contato Brasil: Edward Burke Junior. Rua Escócia N. 620, Apto. 304. Jardim Adriana II, 86046-230 Londrina, PR. (0XX43) 30272539. E-Mail: vidadecristo@pop.com.br