O argumento de
EZEQUIEL Questões introdutórias TÍTULO O livro toma seu título do nome de seu personagem principal, um levita chamado ( יְ ֶחזְ ֵקאלyeḥezqēʾl) Ezequiel (1.3). O nome do autor significa Yahweh fortalece, que vem a calhar com a espinhosa missão para a qual o profeta fora comissionado; a garantia de que a nação no exílio se oporia amargamente ao seu ministério exigia o constante fortalecimento de Yahweh.
AUTORIA E DATA Ezequiel não escapou ao escrutínio crítico que se tornou característico da erudição na era moderna. Das sugestões radicais de G. Hoelscher, que creditou Ezequiel, filho de Buzi, com meros 170 versículos em métrica qinah, e C. C. Torrey, que viu o livro como um produto do século 3 a.C. (Gleason L. Archer, Merece Confiança o Antigo Testamento?, p. 420), estudiosos modernos vieram a atribuir uma parte maior do livro ao suposto escritor; não obstante, o consenso nos anos recentes tem sido ver a profecia como “uma coleção cuidadosamente arranjada de materiais que representam o produto final de uma longa tradição que começou com as palavras escritas pelo profeta” (J. W. Wevers, Ezekiel, NCB, p. 22). Motivos para tais posições são as seguintes: (a) a ênfase no juízo sobre Israel não podia ser seguida por visões tão desvairadas de grandeza e glória quanto as que são encontradas na parte posterior do livro; (b) parece que o autor estava situado na Palestina e não vivendo entre os exilados na Babilônia, pois suas maiores preocupações parecem estar relacionadas a Jerusalém e aos moradores de Judá; (c) passagens como o capítulo 8 e 12.3-12 sugerem familiaridade de uma testemunha ocular com o cenário religioso e político em Judá. Tais argumentos são perfeitamente respondíveis. A origem pactual dos temas duplos de juízo sobre o pecado e restauração depois do arrependimento é bem documentada e explorada a fio por praticamente todos os profetas. Não há motivo por que tal privilégio seja negado a Ezequiel. Segundo, essa informação poderia ter sido obtida por outros meios além da residência na Palestina. Jeremias 29 descreve um fluxo de comunicação entre os dois lugares, e Ezequiel 33.21 indica que deslocamento era possível (seria aquele homem um sobrevivente do cerco?) e a transmissão oral dos fatos, uma característica comum. Terceiro, Ezequiel expressamente afirma que o próprio Deus o “arrebatara” para Jerusalém, se não fisicamente, pelo menos espiritualmente, para que ele pudesse testemunhar as abominações de Jerusalém (Ez 8.1-4). A menos que pressuposições excluam a intervenção sobrenatural, não há razão para um profeta situado na Babilônia não poder escrever como Ezequiel escreveu. No que diz respeito às datas, Ezequiel forneceu um calendário coerente para suas profecias. A primeira visão lhe foi dada em 593 a.C., no quinto ano do exílio do rei Jeoiaquim (1.1). A última visão veio a ele “no ano vinte e cinco do nosso cativeiro” (40.1). É notável que, tanto na visão de abertura quanto no capítulo 40, Ezequiel tenha empregado um sistema duplo de calendário. No início do livro ele mencionou o “trigésimo ano” (1.1), e no capítulo 40 ele define a data com a notação “no ano 14 depois que a cidade foi conquistada” (40.1). Isso sugere que tentativas de atribuir o capítulo 1 a outra pessoa com base na datação dupla (como Wevers, p. 41) são inúteis, para dizer o mínimo.
LUGAR DE ORIGEM Existem três teorias quanto ao local onde o livro de Ezequiel foi escrito, todas fundamentadas principalmente em diferentes pontos de vista sobre os capítulos 8 a 11. Teoria das três residências Esse ponto de vista sugere que Ezequiel começou sua carreira profética em Jerusalém, depois se mudou para uma aldeia perto de Jericó (ver, por exemplo, William Brownlee, Ezekiel, WBC). Depois, o profeta
teria se mudado para a Babilônia, onde ele recebeu um segundo chamado (isso só pode ser postulado alterando-se o texto de 1.1 de “trigésimo” para “décimo terceiro” sem qualquer apoio textual). Teoria das duas residências Fontes judaicas sugerem que Ezequiel começou sua carreira profética em Judá, mudando-se depois para a Babilônia e ministrando aos exilados. A única razão para isso é a idéia judaica de que Deus não poderia (ou quereria) chamar um profeta em solo estrangeiro. O próprio fato de seu chamado em solo no exterior era parte integrante da mensagem de Ezequiel para o Israel cativo. Teoria de uma residência O testemunho maciço do próprio livro sugere que Babilônia foi o lugar de origem de sua profecia. Descobertas arqueológicas que datam do século 5 a.C. indicam a presença de exilados perto de um canal importante a sudeste da Babilônia. Esse é muito provavelmente o “rio Quebar” da profecia. Quanto ao autor, tudo que se sabe sobre ele vem do próprio livro. Seu ministério começou aos 30 anos de idade, portanto ele fora exilado com 25 anos. Ele, com Jeremias e Zacarias, foi convocado do sacerdócio para o ministério profético por meio de uma visão (1–3); como Isaías ele foi assombrado pela visão da glória de Yahweh, e como Jeremias ele conheceu a dor em primeira mão, especialmente visto que o meio concreto de comunicar sua mensagem muitas vezes lhe trouxe desconforto, vergonha e dor. Ezequiel era casado e perdeu sua esposa quando tinha mais ou menos 35 anos (24.15-18). Como Isaías e Jeremias, Ezequiel encontrou-se envolvido com política internacional à medida que suas visões e oráculos esboçavam o destino dos vizinhos de Israel para os futuros próximo e distante. Apesar do fato de que sua prosa não se iguala à eloqüência de Isaías, Ezequiel demonstra amplo conhecimento de seu mundo e seu livro tem grande carga de emoção, à proporção que a esperança da restauração de Israel toma forma em sua descrição do retorno da glória de Yahweh a Sua terra.
FUNDO HISTÓRICO Ezequiel nasceu por volta de 622 a.C. durante o reinado de Josias, e sua vida se desenvolveu durante essas décadas decisivas quando o Império Assírio estava se desmantelando sob seu próprio peso e pelo crescente poder de Babilônia. Em 612 a.C. a grande Nínive caiu sob as forças conjuntas de Babilônia e Média, e Judá pôde saborear uma breve liberdade sob a liderança piedosa de Josias. A política da Palestina foi mais uma vez desestruturada quando Neco II, do Egito (609-593 a.C.), decidiu retomar o controle da região. A fim de fazê-lo, precisava que a Assíria fosse preservada como um Estado-tampão contra a expansão babilônica. Sua tentativa de ajudar o atribulado rei assírio, Assurubalite, foi contestada por Josias (que poderia estar agindo como aliado da Babilônia) em Megido. O rei piedoso foi derrotado e morto na batalha, assim lançando a nação em uma crise da qual ela não se recuperaria. Com o tempo, Neco retornou de seu confronto com Nabopalassar e instalou, em Jerusalém, seu próprio vassalo, Jeoaquim, que se estabeleceu como rei no lugar de Jeoacaz, o primogênito de Josias. A suserania do Egito sobre a Palestina teve vida curta, pois em 605 a.C. Nabucodonozor afugentou as tropas egípcias em Carquêmis e depois em Hamate, no Orontes. Judá se tornou Estado vassalo e a primeira onda de exilados foi levada à Babilônia com o príncipe caldeu. A natureza volúvel de Jeoaquim o levou a rebelar-se quando tropas caldéias e egípcias lutaram chegando a um impasse perto do Egito em 601 a.C. Mudando sua lealdade para o Egito, ele provocou a ira de Nabucodonozor contra Judá, que foi invadida e conquistada em 597 a.C. Jeoiaquim foi morto, e Jerusalém, conquistada; naquele mesmo ano, o rei Joaquim e os cidadãos poderosos foram levados à Babilônia em exílio. O jovem levita certamente ouvira as ácidas denúncias de Jeremias sobre o pecado de Judá e agora se encontrava longe de sua terra, seu lugar e adoração e serviço. A comunidade judia na Babilônia desfrutou liberdade relativa e nutria uma convicção profunda de que seu exílio seria breve e que logo eles estariam novamente em Jerusalém. Ezequiel foi o instrumento de Deus no exílio para demonstrar quão profundo era o pecado de Israel e quão doloroso o tratamento divino precisaria ser. Nada menos do que a destruição da paródia religiosa de Israel satisfaria a justiça divina e livraria a nação de sua tendência idólatra. Ezequiel testemunhou aos exilados a melancólica separação entre Israel e a glória divina.
A última data do livro precede a restauração de Joaquim por uns doze anos (cf. Jr 52.31). Portanto, o livro não relata o evento, possivelmente porque sua ênfase jaz mais na restauração escatológica a ser conduzida pelo próprio Yahweh quando Sua habitação for novamente estabelecida em Jerusalém. A tabela a seguir (adaptada de Handbook of Bible Chronology [Manual de Cronologia Bíblica] de Jack Finegan) fornece um quadro cronológico para o desenvolvimento da mensagem do livro. A cronologia de Ezequiel
Passagem 1.1 1.2 3.16
Ano Mês Dia 5 30 (de idade) 4 4 5 5 (de exílio) depois de 7 12 dias
8.1 20.1,2 24.1
6 7 9
6 5 10
26.1
11
?
29.1 29.17 30.20 31.1 32.1
10 27 11 11 12
10 1 1 3 12
32.12
12
?
33.21 40.1
12 25
10 1
Equivalente moderno 31 de julho, 593 a.C. 31 de julho, 593 a.C. 7 de agosto, 593 a.C.
17 de setembro, 592 a.C. 14 de agosto, 591 a.C. 7 de janeiro, 587 a.C. 23/04/587 a 13/04/586 1 a.C. 12 7 de janeiro, 587 a. C 1 26 de abril, 571 a.C. 7 29 de abril, 587 a.C. 1 21 de junho, 587 a.C. 1 3 de março, 585 a.C. 13/04.586 a 01/04/585 15 a.C. 5 8 de janeiro, 585 a.C. 10 28 de abril, 573 a.C. 14º ano depois da queda da cidade. 5 10 10
Evento Primeira visão de Ezequiel Primeira visão Indicação como atalaia Levado à Jerusalém Mensagens contra Judá Começa o cerco a Jerusalém Oráculo contra Tiro Oráculo contra o Egito Oráculo: saque do Egito Oráculo contra o Egito Oráculo contra Faraó Lamentação sobre Faraó Destruição do Egito Chegada do primeiro fugitivo Visão escatológica
PROPÓSITO E DESENVOLVIMENTO O propósito do livro é demonstrar à nação exilada que a glória de Yahweh não fora de nenhuma maneira ameaçada pela captura e destruição de Jerusalém e do Templo, mas que tais eventos eram parte do plano de Yahweh para revelar Sua glória não só ao Seu povo, mas para todas as nações, enquanto Ele julgava o pecado em Israel e além. Para esse fim, o profeta faz repetida menção à glória de Deus (doze vezes no livro todo) e do compromisso de Deus de fazer Seu nome (i.e., Ele próprio em Seu caráter, Seu plano e Seu poder) notório (mais de sessenta ocorrências em Ezequiel) a todos. Ezequiel realiza seu propósito a princípio ao demonstrar como a glória de Deus será revelada na humilhação, na destruição e no cativeiro de Jerusalém em razão de sua rebelião idólatra contra o Soberano Senhor (1.1–24.27). A primeira divisão aqui descreve a preparação de Ezequiel para ser o mensageiro de Yahweh a uma nação rebelde (1.4–3.27). Sua visão da glória de Yahweh incluía querubins (1.4-14), que são um tipo de guarda de honra para a presença santa de Yahweh, as rodas (1.15-21), que falam de maneira material da onipresença de Yahweh, o firmamento e o próprio trono (1.22-25, 26-28) que retratam o resplendor e a glória de Yahweh. Essa presença assombrosa será sentida ao longo do livro, por sua manifestação, sua partida (caps. 8–11), sua ausência e seu retorno (cap. 43). Depois da visão, Ezequiel é comissionado (2.1–3.27) para proclamar destemidamente a mensagem do juízo de Yahweh a uma nação rebelde. A comissão vem quando Deus manda que o profeta coma um rolo de livro, uma figura freqüente da revelação de Deus de Seu plano. Ao levita-profeta são prometidas proteção e força de Yahweh (3.4-9). Ele deverá ser atalaia com uma mensagem de juízo (3.16-27). O versículo 3.26 indica que Ezequiel foi emudecido exceto pelos tempos em que ele atuava em sua capacidade oficial como mensageiro de Yahweh à casa rebelde.
A segunda visão (4.1–24.27) contém mensagens de reprovação e juízo. Essas contêm algumas ações simbólicas indicando a punição de Israel (cerco, profanação, fome e dispersão; 4.1–5.17). Essas ações são seguidas por dois discursos proféticos que apresentam as causas para o juízo divino, os ídolos de Israel, altos e altares (6.1-14), e a natureza do juízo – total desalento, a chegada do dia, um tempo de caos social e econômico, de fome, doença e correntes das quais as riquezas de Israel não o poderão livrar (7.1-27). Seguindo com sua mensagem de juízo, Ezequiel descreve alguns dos grandes pecados que haviam provocado a disciplina de Yahweh contra Israel e a partida da Sua glória divina de sua habitação no templo (8.1–11.25). A visão das abominações no templo mostra quão profundamente o pecado penetrara na vida de Israel (8.1-18), ao passo que a visão do escriba e dos destruidores iguala tal profundidade de pecado com a intensidade do juízo resultante (9.1-11). Os capítulos 10 e 11 revelam a maneira em que Israel será julgado, com a partida da glória e a remoção dos líderes. Contudo, no meio do juízo, a promessa de restauração para um remanescente humilde brilha como uma pequena luz em meio a uma crescente escuridão. A esmagadora mensagem de juízo é depois retratada por meio de dramatização (12.1-28) e mensagem (13.1–19.14). Dois incidentes do cotidiano do profeta lidam com as circunstâncias do cerco vindouro: o carregar sua bagagem por um buraco na parede (12.1-16) retratava a futilidade da tentativa do rei de fugir de Jerusalém, enquanto a dramatização de Ezequiel no momento da refeição revelou os sentimentos de medo e ansiedade que os israelitas certamente provariam em breve (12.17-28). Algumas das causas do juízo vindouro são esboçadas nas sete mensagens que se seguem. Os falsos profetas que negavam juízo iminente e diluíam os pecados da nação pereceriam com ela (13.1-23). A liderança idólatra seria indubitavelmente julgada com uma nação pela qual a intercessão era fútil (14.123). Ezequiel, por intermédio de três parábolas, demonstra outros pecados pelos quais Israel se fez culpado. A parábola da vinha acentua a infidelidade e a inutilidade de Israel para Yahweh (15.1-8); a parábola da adolescente desviada (16.1-63) revela a ingratidão e a prostituição espiritual de Israel. A parábola das duas águias, mais uma vez, menciona a volubilidade política de Israel misturada com restauração, pois há a promessa da saída de um remanescente dentre os exilados na Babilônia (17.1-24). As duas últimas mensagens nessa seção apontam para o cinismo histórico de Israel (18.1-32) com base no qual desejava culpar as gerações passadas e, em última análise, Yahweh por sua situação futura. Em 19.1-14, um canto fúnebre para os últimos e ineptos reis expõe a falta de liderança espiritualmente qualificada de Israel que poderia ter evitado a punição agora inevitável (19.1-14). A seção de juízo do livro termina com o contraste entre o implacável juízo vindouro (20.1-32) e a indestrutível esperança de uma restauração pactual futura (20.33-44), seguido por um retrato do papel da Babilônia como instrumento de vingança de Deus, uma espada para punir nações de toda espécie (20.45– 21.32). A isso se segue uma recapitulação do desrespeito histórico de Judá pelas estipulações da aliança e do expurgo nacional que ele finalmente ocasionará (22.1-31). A infidelidade de Israel é destacada na parábola das duas irmãs, em que a ingratidão e as alianças idólatras determinam o destino de Aolá – Samária (já selado em 722 a.C.) – e de Aolibá – Jerusalém (que viria em breve), a destruição nas mãos daqueles cuja proteção e provisão elas haviam preferido à de Yahweh (23.1-49). Enquanto o profeta ilustra o cerco e a destruição da cidade por meio da comparação com a panela (24.1-14), ele recebe a notícia de que a sua esposa morrerá, mas que ele não poderá fazer luto por ela. Isso retrata a destruição do templo, o orgulho e a alegria de Israel e centro da vida na aliança. O mensageiro de juízo cumpriu sua obra de acusação, e uma mensagem mais doce se encontrará em seus lábios daqui em diante. Seguindo o padrão também encontrado em Isaías e Jeremias, Ezequiel dedica a segunda parte de sua profecia a oráculos de destruição contra as nações vizinhas. A maioria destes está ligada à política babilônica do século 6 a.C., mas Ezequiel faz questão de que todo o cenário seja visto: Yahweh é o verdadeiro instigador e ator no drama. Assim, Amom será julgado por sua insolência (25.1-7), Moabe por seu orgulho e desprezo por Yahweh (25.8-11). O oportunismo egoísta de Edom é aqui assinalado para juízo (25.12-14), enquanto os filisteus serão destruídos por sua maliciosa vingança contra Israel (25.15-17). Ezequiel dedica uma quantidade incomum do texto a Tiro. Muito possivelmente, a autoconfiança arrogante da cidade retratava alguém cujo espírito energizava o rei de Tiro (caps. 26 e 28). O rei da
Babilônia será o instrumento de Yahweh para afundar o poderoso navio do estado tiriano (27), disseminando luto e dor entre aqueles que comerciavam com Tiro e partilhavam na sua adoração idólatra. Sidom (28.20-26) também será submersa pela maré caldéia, e o Egito, apesar de sua história, não será capaz de evitar pesados ataques projetados contra ele por Nabucodonozor. O Egito, fonte indigna da confiança para Israel, finalmente é julgado por meio de acusação divina (v. 29), da proclamação do juízo (v. 30), da demonstração de quão inúteis se provariam suas tentativas de fuga, como tinham sido para a Assíria (v. 31), e de um canto fúnebre para o Egito (v. 32). A terceira e última parte da profecia (33.1–48.35) diz respeito à restauração final de Israel (caps. 33–39) e ao glorioso estabelecimento do reino de Yahweh entre os homens, centrado em uma nova Jerusalém na qual Ele habita (caps. 40– 48). Ezequiel mais uma vez é comissionado como atalaia, compartilhando as boas novas da restauração, mas novamente indicando a necessidade de uma reação individual ao alerta divino contra o pecado (cap. 33). A mensagem de esperança, ilustrada pela cura da mudez de Ezequiel, coincide com a confirmação de sua mensagem de destruição (33.21-33). A fonte de esperança para Israel não seriam mais os pastores indignos de confiança que a nação tivera durante as últimas gerações, mas seu genuíno Pastor, que realmente guiará e alimentará Seu povo (cap. 34). Edom, sempre o arquétipo dos inimigos de Israel, será destruído (cap. 35), e os montes de Israel, outrora amaldiçoados (cap. 6) agora partilharão a bênção de uma nação renovada (cap. 36), não mais usados como centros de idolatria, mas fornecendo eloqüente testemunho da fidelidade de Yahweh à aliança e o Seu zelo pelo próprio nome. Israel passará por uma renovação espiritual de acordo com a restauração física da sua terra (36.24-38). O capítulo 37 descreve a renovação espiritual e a reunificação política que compõem a restauração escatológica de Israel, um evento sobrenatural que acontecerá no contexto de uma conflagração mundial na qual os adversários escatológicos de Israel serão afugentados pela intervenção direta de Yahweh (caps. 38 e 39), um evento que será seguido pelo derramar do Espírito de Deus sobre toda a nação arrependida. Essa renovação espiritual será expressa em uma religião renovada, em que não se permitirá nenhuma impureza, com um novo e glorioso templo ao qual a glória de Yahweh retornará para nunca mais partir (43.1-12) e onde sacerdotes justos ministrarão segundo a instrução de Yahweh (43.13–46.24). A abundância de detalhes tanto no templo quanto em seu culto se iguala às mesmas características de revelação divina, quando Israel recebeu o tabernáculo, que era a visível manifestação da presença de Yahweh com Seu povo durante a Antiga Aliança.1 As características físicas da Palestina serão alteradas 1
As dificuldades interpretativas causadas por esse templo são significativas. Três pontos de vista principais se apresentam: (a) Ezequiel está descrevendo um templo a ser reconstruído quando os israelitas retornarem à Palestina; (b) Ezequiel está descrevendo em linguagem simbólica os rela-cionamentos entre Cristo e a Igreja; (c) Ezequiel está descrevendo um templo literal, ainda futuro, a ser reconstruído no eschaton, quando a restauração final de Israel ocorrer. O primeiro ponto de vista é adotado por alguns comentaristas liberais, que vêem a tentativa de Israel para reconstruir como uma indicação de que as predições de Ezequiel eram parte de um movimento apocalíptico marginal contra o qual o tradicionalismo do século 6 a.C. reagiu; esse ponto de vista é inaceitável em virtude de seu baixo conceito de inspiração. O segundo ponto de vista, mantido pela maioria dos amilenistas e pré-milenistas históricos cai por sua inconsistência, visto que defende o cumprimento literal das profecias anteriores, mas recorre ao expediente da alegorização nos capítulos 40 a 48. O terceiro ponto de vista, que mantém um conceito elevado de inspiração e hermenêutica literal consistente, precisa lidar com a presença de sacrifícios animais depois da obra consumada de Cristo. Este escritor não vê problema algum com o ponto de vista memorial, embora possa haver bastante a dizer sobre os sacrifícios com significado pactual, isto é, servindo como expressões de lealdade à Nova Aliança como parte da sociedade milenar de Israel, sem valor redentor per se. Assim, eles seriam paralelos às duas funções dos sacrifícios do Antigo Testamento sem violar a suficiência da obra de Cristo. Outro possível aspecto seria a de uma necessidade especial de purificação em vista da presença imediata de Deus na pessoa do Messias Jesus Cristo. Nesse caso, haveria papel purificador (i.e., mais que memorial), mas não redentivo.
de modo a manifestar a natureza vivificadora do relacionamento entre Yahweh e Seu povo, com um rio fluindo do templo (47.1-12), uma nova divisão entre as tribos (47.13–48.29), a grandeza da cidade e suas portas (48.30-34) e a majestoso esplendor da Jerusalém renovada, onde Yahweh habita em glória (48.35).
ESBOÇO SINTÉTICO Mensagem A manifestação universal da glória de Yahweh virá quando Jerusalém for humilhada com destruição e cativeiro, e depois restaurada como habitação da glória de Yahweh quando Ele obtiver a vitória máxima contra Seus inimigos e julgar o pecado de todas as nações. I. A manifestação universal da glória de Yahweh virá quando Jerusalém for humilhada com destruição e cativeiro em virtude de seus pecados e rebelião contra seu Soberano Senhor (1.1–24.27). A. A primeira visão de Ezequiel o prepara para ser o mensageiro da glória de Yahweh para o Israel rebelde (1.1–3.27). 1. O assombroso encontro de Ezequiel com o Soberano Senhor está situado no tempo e no espaço (1.1-3). 2. O assombroso encontro de Ezequiel com o Soberano Senhor realça a Sua glória, onipresença e onisciência (1.4-28). 3. O chamado de Ezequiel é para fielmente anunciar uma amarga mensagem de juízo e dor contra o Israel rebelde (2.1– 3.3). 4. O encargo de Ezequiel é anunciar o juízo iminente de Yahweh por intermédio de comunicação divinamente restringida em um contexto de indiferença e oposição (3.4-27). B. A mensagem em multimídia de Ezequiel sobre Jerusalém era que seus pecados a alcançariam com humilhação, destruição e exílio (4.1–12.28). 1. Cinco símbolos comunicam a iminência de um terceiro cerco contra Jerusalém (4.1–5.4). • A realidade do cerco é retratada por meio do alto-relevo de Jerusalém em um tijolo (4.1,2). • A natureza implacável do cerco é retratada pela sertã de ferro (4.3). • A culpabilidade das nações (!) é retratada pela imobilidade do profeta (4.4-8). • As privações traumáticas durante o cerco são retratadas pelo pão impuro (4.9-17). • O destino de Jerusalém é retratado pelo raspar e descartar do cabelo de Ezequiel (5.1-17). 2. Dois sermões explicam a causa e a natureza do juízo iminente de Deus (6.1–7.27). • A causa do juízo é a idolatria (6.1-14). • A natureza do juízo é total e impiedosa devastação (7.1-27). 3. Quatro visões descrevem a profanação e a destruição de Jerusalém e a partida da glória Shekinah (8.1–11.25). • A visão das abominações no templo mostra a profundidade da impureza de Judá (8.1-18). • A visão do escriba e os destruidores revelam a intensidade da punição contra Jerusalém (9.1-11). • A visão dos querubins e fogo revela o modo da destruição de Jerusalém (10.1-22). • A visão dos líderes arrogantes de Judá revela que o juízo é rápido e começa com a remoção da glória Shekinah (11.1-25). 4. Duas ilustrações do cotidiano de Ezequiel retratam as agonias do exílio (12.1-28). • A bagagem de Ezequiel e o buraco na parede retratam a tentativa fútil de Zedequias de fugir do cerco, pois Deus dispersará Israel (12.1-16). • A dramatização de Ezequiel no momento da refeição retrata a certeza e a iminência das tribulações de Israel (12.17-28). C. Sete mensagens explicam as causas do juízo que Yahweh enviará contra Jerusalém (13.1–19.14). 1. Falsos profetas e profetisas que haviam diluído os pecados da nação eram uma causa de sua queda e partilhariam da sua punição (13.1-23). 2. A idolatria dos anciãos e sua busca hipócrita pela palavra de Deus tornam seu juízo certo e a intercessão por Judá inútil (14.1-23). 3. A parábola da videira – A infidelidade de Jerusalém faz dela não só culpada, mas tão inútil para o Senhor quanto um pau de videira (15.1-8).
4. A parábola da adolescente desviada – A profunda ingratidão de Israel para com Yahweh e Seu amoroso zelo, mostrada em seu adultério espiritual, lhe trará o juízo necessário e uma graciosa restauração do seu Soberano Senhor (16.1-63). 5. A parábola das duas águias – A volubilidade de Israel na política contribuirá para sua queda nacional, que será revertida pela restauração divina de um remanescente (17.1-24). 6. O cínico descaso de Israel quanto à sua atual culpa torna o seu juízo necessário, embora Yahweh ofereça arrependimento e livramento para os indivíduos (18.1-32). 7. O lamento emblemático de Ezequiel – Os príncipes de Judá são tomados como prisioneiros devido a sua fama entre as nações, e Judá é deixada sem um líder (19.1-14). D. Juízo implacável é a única expectativa de Israel para sua infidelidade, embora o futuro guarde a promessa de Yahweh de restauração segundo a aliança (20.1– 24.27). 1. A história de Israel e a atual infidelidade exigem o juízo que Yahweh não pode mais adiar (20.132). 2. Yahweh, soberanamente, restaurará Israel no futuro, segundo a disciplina da aliança, assim mostrando a Israel quem seu verdadeiro Deus é, apesar do atual ceticismo (20.33-44). 3. A massiva matança de Israel é descrita como uma forte espada que punirá desde os líderes ao povo comum na justa ira de Deus (20.45–21.32). 4. O desrespeito generalizado de Judá pelas estipulações da aliança trará um expurgo nacional pelo fogo da justa ira de Yahweh (22.1-31). 5. A parábola das duas irmãs – A história pecaminosa dos dois reinos de Israel e o exemplo gritante do juízo contra a Samária garantem a punição divina de Jerusalém (23.1-49). 6. A parábola da panela em fervura – Jerusalém será julgada de maneira explosiva por seu adultério espiritual e derramamento de sangue (24.1-14). 7. O juízo de Yahweh sobre Jerusalém será confirmado pela morte da esposa de Ezequiel e a remoção de seu silêncio imposto divinamente (24.15-27). II. A manifestação universal da glória de Yahweh virá quando as nações vizinhas forem julgadas pelo Soberano Senhor devido a seu arrogante pecado (25.1–32.32). A. Juízo contra Amom (25.1-7). B. Juízo contra Moabe (25.8-11). C. Juízo contra Edom (25.12-14). D. Juízo contra a Filístia (25.15-17). E. Juízo contra Tiro (26.1–28.19). 1. Nabucodonozor invadirá e destruirá a cidade (26.1-21). 2. O navio viajante será afundado e seus parceiros lamentarão suas perdas (27.1-36). 3. O líder de Tiro será derrubado em virtude de sua ambição e seu orgulho (28.1-19). F. Juízo contra Sidom (28.20-26). G. Juízo contra o Egito (29.1–32.32). 1. O Egito será saqueado e ficará tão desolado que Israel nunca mais porá sua confiança nele (29.1– 21). 2. A força militar e comercial do Egito será quebrada no dia do Senhor (30.1-26). 3. O recente destino da Assíria garante que o juízo do Egito virá (31.1-18). 4. O arrogante orgulho do Egito não o salvará da punição e companhia das outras nações que se ergueram no caminho de Yahweh, o Deus Soberano (32.1-31). III. A manifestação universal da glória de Yahweh virá quando Israel for restaurado com privilégios renovados como a habitação de seu Soberano Senhor (33.1–48.35). A. A geração de Ezequiel é confrontada com a necessidade de assumir a responsabilidade por suas escolhas espirituais, em vez de culpar Yahweh por seus sofrimentos (33.1-33). B. A restauração de Israel significará uma liderança renovada sob a proteção do próprio Yahweh (34.1-31). C. A restauração de Israel significará a eliminação de inimigos históricos [Edom] (35.1-15). D. A restauração de Israel significará o estabelecimento de uma nova aliança (36.1-38). E. A restauração de Israel significará a renovação espiritual de reunificação política do povo de Deus (37.1-28).
F. A restauração de Israel significará a derrota final daqueles que buscam a posse da Terra Prometida (38.1–39.29). G. A restauração de Israel significará um relacionamento renovado com Yahweh expressado por religião renovada (40.1–46.24) 1. A restauração de Israel significará um Templo renovado onde a glória de Yahweh habitará permanentemente (40.1–43.27). • A visão do novo Templo é introduzida por um anjo com uma cana de medir (40.1-4). • Os átrios do novo Templo são descritos em detalhe (40.5-47). • O novo Templo e seus edifícios anexos são descritos (40.48–41.26). • As câmaras sacerdotais são descritas (42.1-14). • A área ao redor do Templo é descrita (42.15-20). • A glória de Yahweh, que Ezequiel vira em Quebar e Jerusalém, retorna ao Templo escatológico, santificando toda a área (43.1-12). • O altar e as cerimônias associadas a ele são descritos (43.13-27). 2. A restauração de Israel significará uma religião renovada na qual a pureza e a fidelidade serão a norma (44.1–46.24). • Os ministros no Templo escatológico serão fiéis em todos os seus deveres (44.1–45.8). • Parênteses – A justiça do futuro motiva honestidade no presente (45.9-12). • As ofertas e o calendário do Templo escatológico são descritos (45.13–46.24). H. A restauração de Israel significará segurança em uma terra renovada, a qual será abençoada com a gloriosa presença de Yahweh (47.1–48.35). 1. Um rio recém-formado tornará a terra frutífera e agradável (47.1-12). 2. Fronteiras seguras e novas localizações tribais darão a terra para os israelitas restaurados (47.13– 48.29). 3. Jerusalém será restaurada a um status magnífico e coroada pela presença de Yahweh (48.30-35). 1
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Pinto, Carlos Osvaldo Cardoso: Foco E Desenvolvimento No Antigo Testamento. Editora Hagnos; São Paulo, 2006; 2010, S. 651