Arruda Arte & Conhecimento

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Arruda/2013 Ano1 Nยบ0


Editorial

Quando me ofereceram a missão de ajudar a criar um espaço destinado unicamente às manifestações artísticas dos estudantes da Universidade Federal do pampa, aceitei no ato, talvez levado, primeiramente, pelo meu ego e, depois, pelo fato de que essa ideia vai de encontro a um desejo que tenho desde os tempos mais joviais, que é possibilitar um contato real entre as pessoas e o fazer artístico. Aceitei, e aceitando não pensei nas consequências dessa atitude, afinal como fazer uma revista que reverberasse em todos os campi da universidade, fazendo assim com que a distância que nos separa diminua e o silêncio do pampa sul-rio-grandense dê lugar as mais variadas formas de expressar-se. A resposta já havia sido dada, a própria revista é o meio (veículo) e o laço que nos aproxima é a arte, a mais forte e libertadora das comunicações desenvolvidas pelo ser humano, capaz de transpor todas as fronteiras que o próprio homem delimita. Resolvidas essas questões, era preciso encontrar outros peregrinos que aceitassem parar e cultivar a ideia a tal ponto, que as raízes dela se solidificassem junto às deles, unindo-os em um só, da mesma maneira que almejamos nos aproximar. Os encontramos, cada um em uma estrada, mas com ideias desaguadas da mesma fonte. Composto o corpo-editorial, já podíamos almejar a concretização da nossa ideia, que só poderia ser realizada com a adesão de todos os estudantes da Unipampa, pois nos propomos a abrir um espaço de todos, construído por uns, mas que todos devem apropriar-se... E assim esperamos que a próxima edição da revista Arruda tenha uma adesão maior dos cursos e campis que formam essa universidade. Nesta edição, então, o leitor encontrará manifestações das mais diversificadas de autoria de nossos colegas, desde poesia (o gênero predominantemente escolhido pelos acadêmicos em geral) até ensaios fotográficos. Ver-se-á também uma sessão oriunda de uma fazine, no mais esquizofrênico dos elos que fizemos com os colegas do campus São Borja. Não poderíamos deixar de comentar também sobre a entrevista concedida pelo quadrinista Odyr Bernardi, que muito gentilmente destinou seu tempo para responder as mais diversas perguntas, além de ser o autor da arte da capa dessa primeira edição. Feitas essas considerações, resta-nos somente agradecer a todos que direta e indiretamente colaboraram com a primeira edição da revista Arruda.

Boa Leitura! Ézio Sauco Socca.

Arruda (ISSN xxxx), é uma publicação da Universida Federal do Pampa - UNIPAMPA 2  ►  Arruda - Arte & Conhecimento

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“O Intelectual é a empregada doméstica dos poderosos” - Millor Fernandes -

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Revista Arruda. Como foi seu percurso profissional até esse momento? Odyr Bernardi. Acidentado. Longo. Feito de uma série de sortes e azares, como todo mundo. Mais sorte, eu diria. E muito trabalho duro. Mais objetivamente, como costuma ser: você começa fazendo seus fanzines, depois colaborando em revistas, um convite aqui, um ali, até ter a chance de fazer um livro, que não muda muito na sua vida; é só mais uma etapa. Uma carreira é uma maratona, não são 100 metros. Leva uma vida. Revista Arruda. Como foi trabalhar com o personagem Rolo do Maurício de Sousa? Como surgiu o convite? Odyr. Foi divertido trabalhar, em outro registro, outro tom, com um personagem de outro criador. Convidaram a mim e ao [Sandro] Lobo, meu parceiro de Copacabana, com a possibilidade de escolher qualquer personagem. Escolhemos o Rolo por ficar mais próximo dos temas do Lobo, que ia escrever o roteiro. E também por ser o personagem menos infantil, já que meu traço não se presta muito para coisas fofinhas. No final, fiquei contente com o resultado, foi um exercício interessante. Revista Arruda. Um fato muito comum na indústria de quadrinhos mundial é que artistas mantém estúdios com outros artistas que trabalham para ele, representando seu traço, muitas vezes sem serem creditados. Vimos isso em Will Eisner, Walt Disney, Bob Kane e Maurício de Sousa. No caso do último, os artistas são citados no expediente da revista como “colaboradores”, sem especificar suas funções. O que pensas a respeito dessa política da Maurício de Sousa Produções? Odyr; Acho que é honesto. Ele tem uma fábrica, onde os artistas trabalham dentro de um registro muito exato, sem margem para expressão pessoal, então acho que faz sentido. Revista Arruda. Artistas como Alan Moore e Will Eisner sempre tiveram preocupação no estudo das narrativas gráficas e produziram, inclusive, textos de análise desse gênero/linguagem. É importante para o artista estudar o quadrinho dessa maneira?

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Odyr. Acho que é uma questão de temperamento. Fazer se aprende fazendo e tem artistas maravilhosos que não tem necessariamente um pensamento articulado sobre o fazer. No meu caso, me interessa bastante pensar e escrever sobre o processo e estudar possibilidades. Agora, claro, tudo que você vê te informa, então é interessante você ter a formação mais ampla possível. Revista Arruda. Em uma postagem do seu blog, você diz que não é ilustrador, mas um quadrinista. No entanto, sabe-se que é difícil manter-se somente produzindo quadrinhos, no Brasil. Como você avalia essa necessidade de ter uma segunda profissão? Odyr. Tenho um texto longo no blog sobre isso - http://odyr.wordpress. com/2011/09/21/sobre-viver-de-arte/ Mas, resumindo muito: são dois caminhos – tentar viver direto da sua arte vai lhe fazer produzir muito mais, vai lhe transformar num profissional mais cedo, mas também vai colocar uma pressão sobre seu trabalho – você vai ter que ter uma resposta financeira para ele. Ter uma segunda profissão pode ser bom, pode lhe permitir desenvolver seu estilo e seus temas de forma mais tranquila. Também pode fazer com que você nunca leve a arte totalmente a sério. Os dois caminhos tem vantagens e desvantagens. Revista Arruda. Recentemente, um colecionador de quadrinhos postou no seu facebook uma arte original do Mike Deodato no personagem Conan, de uma série de capas que ele havia feito para editora Abril. Espantado, o próprio Deodato comentou que esses originais nunca foram devolvidos, mesmo tendo cobrado muito a editora. O rapaz respondeu que ele comprou de um amigo, dono de um sebo, que adquiriu junto com um material de descarte da editora Abril. Esse tipo de tratamento de uma editora grande com os artistas brasileiros te influenciou a não ter vínculos diretos com esse meio? Odyr. Eu vi a história e achei triste, mas acho que ela pertence a um outro momento, mais duro, que espero tenha ficado no passado. Existe agora um outro respeito, uma outra atitude. Com a ocasional exceção. Revista Arruda. Fale sobre seu processo criativo. Odyr. Eu até fiz uma pausa aqui e fui fazer piada no Twitter sobre isso,

porque é a pergunta de cinco palavras cuja resposta podia ser um livro inteiro, mas deixa eu ver o que posso te dizer - eu diria que eu tento fazer hoje em dia que seja o mais direto, imediato e nãoplanejado possível. Tenho uma simpatia pelo Zen e acredito muito na primeira resposta, na maneira como seu cérebro responde espontaneamente a um problema. Então, não sou muito de ficar cozinhando as coisas. Gosto de (tento) estar no momento presente. Então, fui abolindo etapas intermediárias, ensaios, preparações. Vou para a página com o mínimo de premeditação possível. Revista Arruda. Como você vê o uso internet como ferramenta para quem produz quadrinhos hoje? Odyr. Pessoas que já tem uma carreira, que começaram há algum tempo, podem se dar ao luxo de não usar a internet, mas, para quem começa, acho que é fundamental. Como informação, como feedback, como ferramenta de multiplicação, publicação, etc. Revista Arruda. Quais os incentivos do governo para a produção de quadrinho (um “gênero” ainda considerado marginal)? Odyr. Nenhum, em geral. A maior parte dos editais se dividem entre Literatura, Artes Visuais, Música, etc. E quadrinhos entra onde? Você tenta inserir, diagonalmente, com dificuldade, em alguma categoria. Algumas raras exceções: São Paulo tem um edital só para quadrinhos. E tem o Programa de Biblioteca nas Escolas, que vem comprando quadrinhos, o que é bacana. Mas, em geral, o poder público está uns 20 anos atrasado em percepção das possibilidades da narrativa gráfica. Revista Arruda. Você tem contato com outros quadrinistas? Como se dá esse contato?

Odyr. Bastante. Uma particularidade bonita do meio é que somos quase todos amigos. Tão pouca glória ou dinheiro para competir que não chega a gerar estresse entre nós. Quadrinista, em geral, vive trancado em casa, então nos falamos pela internet, mas hoje em dia tem muito festival e eles acabam sendo um momento de confraternização, um encontro feliz. Revista Arruda. Fale sobre a Editora Secreta. O que levou você a criá-la? - e, a propósito, o site da editora está fora do ar, houve alguma coisa? Odyr. Ela está fora do ar agora porque sou relapso, esqueci de pagar, algo assim. A ideia por trás é como a coisa da música – os meios de produção se democratizaram, criaram possibilidades de criar e executar tudo em casa. Mas é uma coisa pequeníssima, muito modesta, que uso para produzir coisinhas no intervalo entre projetos mais ambiciosos. Revista Arruda. “Viagem ao centro dos 2.000 eus” parece repleta de nostalgia. Como é retornar a esses personagens, que em algum momento tiveram muita presença no seu imaginário? Odyr. Nós somos feitos de tudo que vimos, ouvimos, lemos, passamos, experienciamos. Então, rever/reler esses ícones é uma forma de entender sua formação, faz parte de um projeto autoral que olhou pro passado antes de olhar pro futuro. Espero também que tenha sido um exorcismo de referências, para poder criar no futuro sem tanta coisa nas costas. Revista Arruda. Quais são seus desenhistas favoritos? E roteiristas?

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“Nós somos feitos de tudo que vimos, ouvimos, lemos, passamos, experienciamos.”

Leitor de Verne, Qorpo Santo e Joyce. Ilustrador, quadrinista e criador da editora Secreta. Nosso entrevistado parece possuir muito fôlego para debruçar-se em vários projetos. Já trabalhou ilustrando livros de Millôr Fernandes e desenhou o personagem Rolo, de Maurício de Sousa. Já publicou a graphic novel Copacabana, com roteiro de Sandro Lobo, pela editora Desiderata. Nesta entrevista, Odyr Bernardi nos fala sobre seu trajeto como quadrinista e sua formação como indivíduo-artista.


Odyr. Essa lista vai mudando com o tempo, pessoas que eram importantes pra mim não são agora, é uma coisa em transformação. No momento, ando encantado com esses franceses que trabalham de forma muito rápida e espontânea, como o Blutch e outros. Alguns poucos permanecem: Jaime Hernandez, [Alberto] Breccia, Alex Toth... Minha relação é mais visual com os quadrinhos, não tenho muitos roteiristas que me impactem. Revista Arruda. Que quadrinhos você costuma comprar atualmente? Acompanha algum título? Odyr. Quase nada. Fazer quadrinhos me estragou ler quadrinhos. Pessoas me mandam coisas, dou uma olhada, algo me encanta aqui e ali, mas minha relação é mais de produção que de consumo. Revista Arruda. O que é a Máquina Narrativa? Conte-nos desse projeto. Odyr. Nasceu de um artigo que li onde o autor se perguntava se ainda precisamos de histórias. Me fez pensar o papel que elas desempenham em nossa vida, em como entendemos o mundo através dela, em como construímos isso que chamamos de Eu através de uma série de narrativas. Depois o conceito foi crescendo

Revista Arruda. Vê-se claramente a literatura na sua obra. Hemingway, Júlio Verne, Cortázar, Camus, Joyce, entre outros. Fale um pouco sobre isso. Odyr. É minha formação. Cresci numa casa com livros, sempre li muito, até hoje; na verdade, a literatura é mais importante pra mim do que quadrinhos. Revista Arruda. Da mesma maneira que há diálogo com a literatura em sua obra, há um dialogo com outras manifestações artísticas como a música e o cinema? Odyr. Sim. Cinema e quadrinhos tem uma relação mútua de influências, roubos, empréstimos. Às vezes, prefiro ver filmes ruins no final do dia. Se o filme for muito bom, sinto que estou trabalhando, fico dando pause para desenhar um personagem, um enquadramento... Música parece que não, mas o Chris Ware, por exemplo, vê uma relação direta, no que acho que ele tem razão – ritmo, pontuação... Revista Arruda. Quais são as HQ’s que você considera indispensáveis na formação de um leitor? Odyr. Não apontaria nada. A formação de cada um é uma série de acidentes, felizes e infelizes, das coisas que caem nas suas mãos ou que lhe atraem e formam seu gosto e personalidade. O que foi fundamental pra mim, pode ser completamente desimportante para outros. Revista Arruda. Como você visualiza o mercado editorial de quadrinhos atualmente no Brasil?

Em estudos iniciais sobre artes plásticas, sinto aquela euforia, é uma sensação indescritível de aprendizagem nesse momento, cores formas, estilos, a história de vida dos pintores, muitas descobertas. Para abrir novos horizontes na pintura, você precisa estudar os pintores do passado e tentar encontrar o seu estilo. "Quem somos nós, quem é cada um de nós senão uma combinatória de experiências, de informações, de leituras, de imaginações? Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos, onde tudo pode ser completamente remexido e reordenado de todas as maneiras possíveis."(Calvino; 1990, p.138) A produção artística, o ato de criar é uma aventura, é um Não pertenço a estilo nenhum “você pode ir de um mestre processo de tentativas. Compilando ideias, acertos e erros, a outro e aprender outros truques e segredos”- Josef Albers. esse processo é continuo, pois para o artista a obra está sempre Quero apenas pintar, é algo pessoal. Vou inventando, fazendo inacabada. Talvez o processo mais difícil do trabalho criativo e inventando o modo de fazer. Sempre me baseio nos valores ocorra praticamente todos os dias, não conseguir expressar aquilo tradicionais da pintura, não tenho interesse na desconstrução, as que sentimos, e respeitando as suas limitações, sendo necessário minhas primeiras telas foram copiando o mestre Picasso, logo, em utilizar a mesma técnica de um atleta; exercícios e experimentos seguida, fiz uma releitura de Portinari, e alguns trabalhos próprios. em “treinamento”. Uma tela em especial que pintei foi a pedido de um amigo, pintar Cada artista faz de sua pintura suas experiências, momentos de essa tela foi uma afirmação que a pintura precisa ser espontânea, estranhas experiências, de presença intensa, dando-se inteiramente não há lugar para metas estabelecidas, “Você se perde assim que com humildade, para evocar uma realidade aparentemente inútil, sabe qual será o resultado”- Juan Gris. obsoleta, negligenciada por nossa sociedade. Esse talvez seja um dos sentimentos dos artistas. Mas este coração a tremer nesta vulnerabilidade preciosa, ocorre sempre que algo único, que ninguém percebe, como fundamental. Seja pintor, poeta, escultor ou músico não altera a experiência criativa em seu fundo. É por isso que o pintor pode passar a escrever, filosofar ou decidir a qualquer momento de sua carreira, ferramentas adequadas para que o inspire.

É necessário dar condições para a inspiração chegar, comigo não funciona se não estiver tudo organizado: os materiais de pintura e limpeza do local, por esse motivo eu mantenho tudo sempre em ordem. É sou assim, pois a inspiração pode chegar a qualquer momento; um filme, livro, imagem, em conversas, em várias situações e a música? Ah, essa é necessária. Tenho procurado aprender as diversas técnicas, a mais adequada ao meu gosto, preciso sentir que sou livre. Heidegger estabelece que a salvação e a saída para angústia se encontram na arte. A arte é de acordo com Heidegger mais verdadeira e de maior valor que o saber e as “verdades” contidas nele, são a forma do Ser se revelar, é a própria revelação do Ser, é o caminho do indivíduo na busca de si mesmo. Para o artista, o seu expressar não termina em uma obra, é isso que estou procurando; uma obra que tenha uma linguagem, uma obra para falar, um falar sem palavras.

Odyr. É o melhor momento de toda a história da linguagem. Já houve uma bolha de entusiasmo aqui e ali, mas nada como agora. Praticamente todas as editoras do Brasil publicam quadrinhos hoje em dia, em formato de livro, estamos nas livrarias, bibliotecas, temos festivais, temos uma tremenda diversidade de estilos... é um momento lindo.

por conta própria e se tornou toda uma mitologia, que ainda deve render mais. Revista Arruda. Você prefere trabalhar sozinho na elaboração de uma HQ (como roteirista e desenhista) ou prefere assumir só um dos papéis? Quais as vantagens e desvantagens dessas relações? Odyr. Acho que é interessante passar pelas duas experiências. Com um roteiro na mão, você pode se concentrar mais no maquinário dos quadrinhos, pensar mais em enquadramentos, ritmo, etc. O que acaba te dando uma base bacana para quando você cria tudo.

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Copacabana, o submundo de Copacabana nos quadrinhos de Odyr e Lobo. (Editora Desiderata)

A arte é um aumento de vida, um tipo de emulação nas surpresas que excitam nossa consciência e previnem esta de cochilar. Frequentemente, o quadro poético é a injustiça, desconcertada com a metáfora simples. Fruto da imaginação atual, sua produção de quadros está como um poder principal da natureza humana. Em suas ações rápidas, ela / isto nos separa cada vez do passado e a realidade. Ela / isto abre no futuro. (Bachelard. G)

- Carlos Heckler Acadêmico do curso de Lic. Letras - Unipampa Bagé

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A

Cah

Preso em dois mundos

ico olhando a sua foto Mas percebo que aquilo não é você Vejo que aquilo é somente um monte de pixels Que quando agrupados, e de várias cores diferentes Formam uma lembrança vaga de você E é apenas essa lembrança Que alimenta minha admiração por ti Não posso nem ao menos imaginar como me sentirei Ao encontrar você na minha frente Só sei de uma coisa Se me permitires, de todos os momentos que estiveres [comigo Farei com que sejam os melhores, Os mais perfeitos e agradáveis que você já tenha tido Quero poder ver seu sorriso enquanto falo bobagens sem [sentido Sentir os batimentos de seu coração, enquanto te abraço Assistir você me chamar de bobo, quando falo o quanto és [linda Viajar no aroma do teu perfume... Mas, nunca a vi Portanto, tudo isso é impossível Por que afinal de contas Eu só tenho a tua foto...

prisionado com certos sentimentos, sufocado pela pressão cotidiana, vivendo duas dimensões distintas, uma da outra sem ligação alguma.

F

- João Paulo Paz Acadêmico do curso de Lic. Matemática - Unipampa Bagé

A

Pessoas vem e vão, pessoas vem em vão, pessoas mentem demais, se tratam como irmãos. É estranho para mim! Preso em dois mundos, sem poder fugir de nenhum, não querer fingir em nenhum, onde não é opção ser de verdade. Talvez por meus erros passados ou talvez pelo fato de tentar concertar, não podendo concretizar meus sonhos, quase desistindo de sonhar. É horrível para mim! Não me importa o tempo nem o espaço, me refiro ao caminho e a intensidade do traço. - Marlon Médici Acadêmico do curso de Lic. Letras - Unipampa Bagé

Atesto que as escadas ringem passos presos ao passado cristalizado em prata. “Quero viver o presente, e até os cem anos!”, dizia uma senhora octogenária que vivia na Rua Borges de Medeiros, desde.... Ela não sabia colher as uvas de sua quinta, quando vivia, aos vinte anos, numa casa de pensão em... O tempo faz esquecer a própria história. Esta senhora faleceu, ontem, às vinte e três horas e cinquenta minutos, no Hospital Mãe de Deus, dia... de junho de...., durante uma tempestade fria e cavernosa, em que suas costas já desconheciam a profundidade do leito. De: Pablo Silveira Para: ... - Pablo Silveira Unipampa Bagé

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Chão Imagine que a dor fosse mais suave Um pouco menos aguda E que pautasse em silêncios Aquilo que constantemente toca em nossas cabeças Que queimasse nosso corpo numa só chama do teu isqueiro Que não torturasse a gente assim... Como navalhas de gelo constante entre os pés - Olívia Colombo Acadêmica do curso de Eng. de Energias Renovávis e Ambiente Unipampa Bagé

gente, às vezes, faz coisas sabendo que vai dar errado. Eu, por exemplo, sempre soube que quando se coloca café no micro-ondas não dá certo. Por quê? Não dá, simples. Esfria rápido, não solta fumaça por mais quente que esteja e a xícara queima quando tocada. Tudo bem, já tinha prometido a mim mesma nunca mais tomar café de micro-ondas, nunca. Quantas coisas prometi jamais voltar a fazer? Então, hoje, a praticidade falou mais alto, ou então o esquecimento, porque eu sabia que não gostava de café de micro-ondas, mas não lembrava mais o porquê. Pego a caneca com aquele líquido escuro e gelado, coloco naquele eletrodoméstico desgraçado que, segundo a maioria, facilita a vida, mas eu discordo totalmente, e ligo o botão. Um minuto, um minuto e meio. Um alarme curto, agudo e infeliz. Acrescento açúcar, claro. Bebo. Droga. Acabo de recordar por que não gosto de café no micro-ondas, afinal como esquecer? Onde se aciona o nosso dispositivo de sobrevivência nessas horas? Pois você já passou por aquela situação milhões de vezes, já deu um basta, e em um dia qualquer esquece tudo e nem sabe o motivo de tanto ódio e repulsa. Minha revolta não se resume apenas a cafés de micro-ondas, mas a todas aquelas coisas que você sabe que não têm solução, não têm jeito, mas que do nada se esquece de tudo e põe fé, para não se dizer conservador e radical, para dar uma nova chance, por simplesmente estar disposto a renovar os velhos conceitos. Como eu poderia esquecer? Café de micro-ondas queima a língua, e não simplesmente queima de leve, queima mesmo, de verdade. No primeiro gole já percebo: existem coisas que simplesmente não mudam.

Depois do Expediente Eu preciso de palavras novas inventá-las se necessário. Tenho que expressar essa acidez que me dissolve o equilíbrio que come toda a parede interna do meu estômago Magnetismo que envolve cruelmente e me deixa perdido no meio de perfumes e odores que se chocam no meu peito para escorregarem até o meu nariz e me ofuscar. Quando o que eu quero é o seu olhar engatado no meu. Vamos viajar. Ultrapassar limites. Mentais, físicos, morais. Vamos brisar no céu. Porque o amanhâ, baby Vai começar só amanhã! - Sofia Silva http://apartamento8b.blogspot.com.br/

- Cássia Rodrigues Acadêmica da especialização em Leitura e Escrita - Unipampa Bagé

Excesso de verniz

S

e pudesse pedir silêncio, pediria o silêncio de uma [música bem alta de Janes Joplin, que quanto mais alto, menos se ouve as interferências do [mundo... Se pudesse pintar os muros, como no tempo que não se [podia, faria caretas, pintaria todo o ódio em vermelho, lascivo e cravejado, destas coisas todas que sinto e que me transfiguram... Mas se eu pudesse algo, algo que realmente ficasse pra [sempre, calaria... o silêncio também grita, também vocifera, e faz-se ouvir de mais longe, ao menor ruído... - Patrícia Barbosa Acadêmica do curso de Lic. Letras - Unipampa Bagé

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Pensamentos desse dia turbulento...

Permanente

Q

uando retornei a casa pela primeira vez após a tua partida, a vida, que se antes abundava, inexistia. Tua breve passagem deixounos – eu e a casa – fora do eixo. Quase nada restou. Só resistiu a tua ausência, a mesma ausência que trouxeste contigo, sob os olhos frios com os quais me olhavas sem mover os lábios. Recusaste-me à permanência das tuas pernas entrelaçadas as minhas e aos lençóis que cobriam nosso pudor, recusaste-me a extensão dos teus cabelos, recusaste-me a suavidade do toque das tuas mãos em meu corpo sedento, recusaste-me o tato das minhas mãos no teu corpo. E, agora, recusas à casa a vida que a enchia quando tu estavas. Na primeira vez que retornei à casa, ela se queixou, pelos silêncios nos vazios cobertos do pó da tua ausência, do teu egoísmo em deixá-la assim, a esmo, ao sabor dos ismos que ficaram a preencher os espaços onde, antes, tu vivias. Melancolias expressas nos retratos de tua estada, tua suposta alegria emoldurada nas paredes nostálgicas contrariando a aparente frieza do teu sorriso. Até mesmo a rua, onde sobrevive a casa, está mais triste, mais cinza. Tua partida coincidiu com a transição entre o outono e o inverno, como que colaborando com a monotonia das manhãs geladas em que o sol repousa sobre as nuvens de uma chuva que não cai. Entrei e fechei a porta. Era tarde. Ouvia-se, apenas, o som dos galhos secos chocando-se uns contra os outros no quintal coberto de folhas e lembranças. A penumbra na sala permitia ver a silhueta dos móveis que levaste embora. No canto, uma única cadeira permanecia, solitária, fazendo lembrar os jantares cheios de vozes, músicas, vinho. A estante ainda abrigava alguns livros rejeitados por ti, por motivos que desconheço. Dentre eles, um me chamou a atenção: Perto do Coração Selvagem. Clarice figurava solitária entre obras que talvez jamais tivesse lido se não pela tua indicação. Notei que a cortina na porta da varanda ocultava um recado escrito no vidro. Era o teu batom a desenhar as letras que formavam as palavras que jamais esquecerei: “Fui feliz aqui”. Sem assinatura, apenas um ponto final. - Ânderlo Strwsk http://anderlostrwsk.blogspot.com.br/

H

á muito tempo estou nesse mundo, e pouco nele vivi. Sei que não posso me fechar pra tudo, porém algumas coisas me deixam sem ação. Em minha época, aqueles que conhecem os clássicos são reverenciados como sábios. Dedicam horas e horas estudando livros para em grupos seletos largarem suas frases. Alguns até são criativos, mas muitos não saem das páginas do passado. Chego à conclusão que a leitura e o estudo direcionado ao pensamento de recompensa são inúteis. Deve-se ler e estudar da forma mais libertadora possível! Assim como não desejo que esses textos sejam lidos por pessoas que digamos... fazem críticas e introduções em livros. Como é horrível ler a introdução de um livro antes de tê-lo lido. As introduções feitas por leitores de clássicos são indecifráveis! Às vezes sou muito arrogante comigo mesmo... Espero que alguém entenda que digo isto porque amanhã serei eu que estarei lendo estes textos e sou um grande leitor de clássicos. Aqui deposito minha loucura e a liberdade que não tenho. E os minutos desta vida passam. Acredito que os poucos como eu que não se encaixam em nenhuma dessas brilhantes carreiras que existem por aí deveriam ter diários. Aqui é o único lugar no mundo que não sou um inútil. Tenho um milhão de pensamentos que não servem para serem falados para pessoas interessantes e úteis... - Igor Lima http://sabiosabao.blogspot.com

É

tarde e não tenho sonhos Lá fora os homens gritam uivam e relincham desesperados com laços de sangue sob trapos encardidos pelo tempo Tempo que não tiveram Tempo que eles não têm Tempo que jamais terão.

na bota que comete abuso em respeito ao discurso.

E o Tempo que os traz é o mesmo que os trai com seu discurso sem curso na história.

Relincho de muito tempo.

Tem pó no discurso recluso na história. Ecoa o discurso no vale do saber onde se ouve relinchos guinchos da ignorância.

Agora o homem só enxerga a imagem na bota e nada mais aprende com o discurso Não há nada nada que se entenda porque nele só há relincho.

- Ézio Sauco Acadêmico do curso de Lic. Letras - Unipampa Bagé

É tarde

o orvalho da noite molha a terra que gruda na bota como enferruja o discurso.

A bota pisa na pedra a pedra que era terra não suja mais a bota (i)lustrada no discurso.

T

enho poucos amigos, provavelmente dê pra colocar todos dentro de um elevador e nem fiquem apertados. Almas preenchem mais espaços que móveis.

- Cássia Rodrigues -

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Pela bota o homem se enxerga e não enxerga mais a terra que virou muita pedra atirada em que esta fora fora do curso do homem que se enxerga

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Lua

Parecia uma menina igual a todas as outras, mas era aí que ela se diferenciava, tinha os modos estranhos, sentava sempre toda reta e se dizia especial, de fato era, se olhar pela ótica de que não se parecia com ninguém, nem da família, nem da rua... A tia que a criara já havia deixado pra lá, tentar lhe ensinar modos de boa moça já era impossível. Sempre dizia _ com dezessete anos já não sei mais o que fazer dessa menina..., mas também era verdade que de certa maneira admirava a sobrinha, que nunca dependia de nada, afinal mal dava ouvidos ao que lhe diziam, e quando a incomodavam muito, ela fugia pra dentro de um livro, e lá ficava o dia todo... Todos da rua já sabiam que Lua era assim mesmo, vivia com o perdão do trocadilho sem criatividade, mas que caía como uma luva, aluada. A tia Jujú como todos chamavam, tinha mania de dizer que se a mãe não a tivesse dado este nome tão atípico antes de abandonar a pobre menina, talvez ela não fosse assim. Mas sabia que no fundo ela era exatamente como a mãe... Lua descia a rua, quieta, numa manhã ensolarada, quando viu pela primeira vez o novo vizinho, um homem de cara enferrujada e dentes estranhos, olhou e riu, ele olhou e não esboçou nenhuma reação. Logo atrás vinha um menino com uma mochila grande e um skate, menino franzino e de certa forma, feio. Olhou atentamente para onde eles iam e viu que ocupavam a casa que estava à venda no fim da rua, o menino olhou pra trás e acenou com a cabeça, mas Lua já estava voltando aos gritos da tia, que avisava que ela havia esquecido um livro... pensou “que vergonha”, titia gritando meu nome no meio da rua e as pessoas todas vendo, fossem esses mesmos de sempre, tudo bem, mas há vizinhos novos... Uma semana depois de ver seus novos vizinhos na rua, Lua ouve sua tia comentar que o Sr. que alugara a casa estava procurando empregadas, a tia muito fofoqueira comentava que achava muito estranho um senhor com filho não ter uma esposa, como acontece nessas ruas em que todo mundo se conhece, todos sabem de todo mundo e alguém novo sempre faz todos se interessarem, exceto Lua que achava isso mais do que uma indelicadeza, achava ridículo, ao que a tia confirmava que nem os hábitos das outras mulheres da rua sua sobrinha era semelhante. As coisas aconteceram mesmo depressa, logo a rua inteira sabia que o Sr. Rocco e seu filho vinham do norte, após uma onda de febre amarela em que sua esposa havia falecido, vendera tudo e viera ao sul com o filho. Logo também já se sabia que era um homem rico, vivera dois anos na construção de uma usina, mas a mulher contraíra a doença dos índios e não sobrevivera, temendo acontecer o mesmo ao filho, mudou-se. Mas o que Lua mais gostou nos novos vizinhos foi o dia em que a mudança que ainda faltava, chegou, nunca na vida ela tinha visto tantas caixas escritas “livros”, pensou que talvez não fosse mal ficar amiga deles e ter acesso a tantos títulos, embora nem soubesse de que livros estas caixas estavam cheias, já pensou serem aventuras, romances... Lua estudava pela manhã, e certo dia ao descer a rua viu seu vizinho caminhando em direção a parada de ônibus. Curiosa como só ela podia ser, apressou-se e alcançou o menino, que logo vira, nem era tão feio assim. __Vai estudar no Antunes Jorge? __Oi pra você também, sim vou __ Me desculpe, sou Lua, e você? __Lua? Entendi...Henrique __ Entendeu, o quê? 14  ►  Arruda - Arte & Conhecimento

__Nada, fiz uma piada com o seu nome só isso, se não gostou, desculpe! __Capaz, se eu contasse todas as vezes que ouvi piadas com o meu nome eu não faria outra coisa... Eu estudo no Antunes Jorge, te apresento o colégio se quiser. __ Claro, ia gostar... Subiram no ônibus e seguiram. O Antunes Jorge era o colégio mais conceituado da cidade, ali estudaram muitos governadores e juízes. Lua, que era de família humilde, estudava lá por que sua tia era amiga de longa data de uma das supervisoras e conseguiu uma bolsa para a menina, mas deste modo era cobrada mais que todos... Logo Lua e Henrique se tornaram amigos, estudavam na mesma turma, sempre andavam juntos e quanto mais se conheciam, mais Lua percebia que existia algo naquele garoto que parecia estranho, era um menino magrinho, mas de olhos azuis e tristes, embora risse de tudo...

> Cap 2 Quando chegou a primavera, a rua inteira ficou colorida, muitas árvores ao longo do passeio público, e o chafariz da rua parecia deixar tudo mais bonito. Lua adorava sentar-se na praça e ler durante as tardes mais quentes, logo conseguira um companheiro para as tardes, mas Henrique não lia, ao contrário, ficava andando em seu skate e perturbando a paz de Lua, ela ria de tudo e não reclamava... A tia de Lua logo pensou que aquele menino podia não ser boa companhia pra sua sobrinha, ficava preocupada com as notas na escola, e se perdesse a bolsa, era melhor nem pensar, ao menor sumiço da sobrinha, ela saía pela rua chamando por ela, mas sem parecer rude, inventava algo dentro de casa para trazê-la, passou até a comprar-lhe livros, CDs, filmes novos, mas parecia mesmo que a menina havia feito um amigo. Logo a tia deu-se por vencida e deixou pra lá. Porém Sr. Rocco começava a notar a pequena amiga de seu filho e achar tudo muito estranho, toda vez que via aquela menina, ele sentia algo como se ela tivesse algo estranho no olhar, mas não sabia o quê, passou a vigiar de perto a amizade do filho. O que ninguém sabia, é que por um golpe do destino, ou talvez coincidência mesmo, Sr. Rocco não estava errado em ver algo de familiar na menina, de fato ela o lembrava de alguém e logo ele teve um estalo, lembrou-se. Assustado, não sabendo bem se estava maluco, ou apenas era uma coincidência, mas Lua era a cara de uma namorada da sua adolescência, mas não lembrava direito seu nome. No dia seguinte bem cedo, Jujú estranhou uma batida à porta, abriu e viu Sr Rocco. __Bom dia, em que posso ajudá-lo?(já pensando, o quê diabos a Lua aprontou?) __ Bom dia, senhora, desculpa incomodá-la, mas poderíamos conversar? __ Sim, mas sobre o quê? Entrou e sentou-se no sofá, olhou em volta e já não mais precisava perguntar nada que viera saber, ao lado do sofá havia uma porta retrato com a foto de uma moça muito bonita. __É a mãe de sua sobrinha? Perguntou ele. __ Sim, Matilde, mas não mora mais aqui, se foi há muitos anos.

__ Desculpe, faleceu? __Não, antes fosse, abandonou a pobre menina e caiu no mundo, nunca mais a vimos. Então ele cria coragem e pergunta: __ A senhora não se lembra de mim? Ela olha, e responde: __Não. __ Acho que fui amigo de sua irmã, Matilde e eu namoramos, quase casamos, pelo menos era o que queríamos, mas meus pais se mudaram e nunca mais a vi. Jujú então olha firmemente para o senhor e mal pode acreditar, ele é o namoradinho que um dia sumiu e deixou sua irmã grávida. __ Sim, diz ele._ Sou Carlos, namorado de Matilde. Ele diz isso sem saber que ao ir embora com seus pais tinha também deixado para trás a namorada grávida. Jujú engole em seco e decide não falar nada do que acaba de concluir, melhor ter certeza, mas isso ela já tem. __ Então a senhora era a loirinha magricela que andava sempre com Matilde, que bom que oi destino junta as pessoas novamente, não acha? __ É, sou eu sim, não tão magricela. Com toda a conversa, Lua entra na sala e vê Sr Rocco, passa por eles cumprimentando e sai. Nos dias que se seguem, Jujú atormenta-se com a ideia da sobrinha ser irmã daquele menino, e pensa, se eles inventam algo, essas coisas que essa garotada inventa, melhor nem pensar e ter certeza antes... Num início de noite, Lua entra na sala de casa e sua tia a chama. __ Senta aqui que precisamos conversar. __ Não fiz nada, tia! __ Não estou te acusando de nada, menina. Preciso te contar uma coisa sobre sua mãe, você sempre pergunta, acho que ta na hora de saber. Alguns minutos depois, Lua sai correndo pela rua, entra na casa de Henrique e o olha firmemente, ele sem entender, se aproxima. __O que foi aluadinha? Tá inventando alguma aventura e quer me levar? __ Não. Ela responde, e começa a chorar. A tia sem saber onde a menina se meteu, começa a procurála pela rua, liga para Sr Rocco, que logo chega sem entender. Então ela lhe conta que ele é o pai de Lua, os dois correm para a casa dele. Lua olha Henrique e como numa cumplicidade estranha, se ajoelham, se beijam. __Você prefere assim? Pergunta ela. __Não, preferia que não fosse, mas se fosse diferente talvez não fosse melhor. __ Você é mesmo um doido, fala um monte de palavras repetidas, nem serve pra irmão, é burro, aposto que nunca leu um livro destes do teu pai! __ Que importa isso agora? __ Não importa, não devíamos ter sido tão apressados, isso sim! __ Mas como íamos saber, ah meu deus!!! __Seu Deus? Ele não vai fazer nada por você agora, sabia? __Então? Vamos? __Vamos, vamos sim!! Ouve-se um barulho enorme vindo de dentro da casa,

Sr. Rocco e Jujú entram e mal podem acreditar no que vem. O vidro da mesa de centro quebrado, Lua caída sobre o sofá, sorrindo. Próximo a ela, está Henrique, ainda piscando os olhos, os dois com cortes profundos no pulso esquerdo. Todos correm para tentar fazer algo, os empregados gritam. Já não há o que se fazer Lua e Henrique estão mortos. A tia de Lua olha atentamente para a menina, o sorriso que lua tem nos lábios parece provocador, ela abraça a sobrinha... Todos choram... os olhos de Henrique miram a janela, de onde se vê uma lua cheia... - Patrícia Barbosa Acadêmica do curso de Lic. Letras - Unipampa Bagé

15  ►  Arruda - Arte & Conhecimento


O

JAZZ EM MANGUEIRAS

stentando um cabelo estilo blackpower, aquele cidadão avançava suave em direção ao centro da cidade, chegava na praça, espanava a poeira e as defecações de pássaros do banco com as mãos e sentava-se desconfortavelmente com suas roupas velhas, óculos escuros dos grandes e o casaco colorido. Os raios solares da manhã avançavam acolhendo a alma daquele jazzista criado na lama com uma vida já apavorada. Aquele homem eu conheço. Pode não parecer, mas ele é um jazzista dos furiosos. Coloco-o entre Coltrane e Miles Davis. Ele poderia ser qualquer um dos dois, o pupilo que virou um nobre mestre ou o seu mestre que jamais perdeu a majestade suprema da arte. Poderia ser, caso tivesse vivido nos Estados Unidos na época de ouro do jazz. Está certo que ele não toca um instrumento de sopro dos mais coloquiais. Quer saber? Ele toca mangueira. Isso, em mangueiras. Hoje em dia, aquele gênio é falado pela população como um louco, que senta no banco da praça para escutar um rádio miúdo mal sintonizado por horas e horas, e costuma sair pelas lojas admirando as mangueiras expostas. Se ao menos as pessoas soubessem das dificuldades que o homem passou para comprar o radinho de pilha! Ai, se soubessem da sua história! Ou se soubessem, seriam rudes, babacas, ou não entenderiam? Será que o veriam como ele merece? Não... Nunca o olharam com os olhos que ele merece. Aquele homem me fez chorar várias vezes e quando lembro choro mais, quando o vejo nessas condições choro mais. E o pior! O pior é que quando me enxergo como alguém incapaz de ajudá-lo, choro muito mais ainda. As pessoas o chamam de “nego louco das mangueiras”, eu o chamo de o maior jazzista de todos os tempos, o maior músico de todos os tempos, maior compositor de todos os tempos. GÊNIO! O cara que consegue fuxicar nas almas das pessoas! Há trinta anos, consegui um emprego de faxineiro num restaurante metido a reduto de intelectuais da cidade. Pessoas que mal haviam lido os guardanapos de “amar é” gostavam de emitir axiomas básicos como se fossem estudos filosóficos e sociais entre um café e outro na parte da tarde e entre um cigarrinho e outro com alguma cerveja na parte da noite. Enfim, o dono desse restaurante resolveu transformá-lo em um clube de jazz para todo sábado e sexta-feira à noite. Por causa de uma euforia dos clientes metidos a intelectuais que precisavam exacerbar-se inspirados nos intelectuais lá de fora. Fui o encarregado de selecionar os músicos. Percorri estúdios de gravação e nenhum deles conseguia me dizer se existia algum músico de jazz de verdade. No máximo indicavam pessoas que talvez pudessem, quem sabe, se prontificar a tocar um jazzinho numa noite em troca de uns bons “pilas”. Mas não era desses que eu precisava. Se tinham me convocado para conseguir jazzistas, então eu conseguiria jazzistas de verdade. A semana acabou e a inauguração do clube de jazz foi passada para outra semana. Dessa vez eu precisava encontrar um músico até terçafeira, quando seria por fim feita a publicidade. Fiquei apavorado. Naquela mesma segunda comentei com um amigo sobre o meu desespero. Ele deu uma risadinha de comicidade, disse-me que havia um cara que tocava jazz muito bem e depois riu mais. Logo após o descanso dos dentes e dos lábios falou-me sobre o que estava rindo. Acontece que o cara tocava em mangueiras. Fiquei zangado com ele. Então sua expressão ficou séria e disse:“Falando sério, ele toca mesmo. Tu sabes que eu sou músico, não estou te mentindo. Ele toca umas coisas muito loucas. Mas inventa tudo e ainda por cima toca em mangueiras. Sabe, é como se fosse um Charlie Parker tocando um pedaço de mangueira ao invés de um saxofone. E digo mais! É como se fosse ao mesmo tempo um Benny Carter, ou Louis Armstrong, ou Miles Davis. A diversidade de sons que ele consegue tirar das mangueiras é fenomenal. Mas como eu disse, o problema é que ele fica inventando as músicas e toca em mangueiras”. Fiquei conturbado. Ora, o homem se tornaria então um músico ruim por compor as próprias músicas? Esse meu amigo ainda me disse que o tocador de mangueiras nunca havia estudado música e não conhecia as teorias mais simples e isso era um ponto negativo. Também comentou sobre não ter boas influências. Não conhecia nenhum dos músicos importantes. Para esse meu amigo, e seus amigos músicos, não tinha cabimento um músico como ele. Sabe o que ele escuta? – me indagou – Ele escuta rádio fora de sintonia! Acredita nisso? Fica escutando por horas e horas aquele rádio fora do ar. Um chuvisqueiro bravo! Aí entendi qual era a questão. O tocador de mangueiras era mesmo um gênio, único! Perguntei onde ele morava e fui até sua casa. Depareime com uma casa na periferia. O músico das mangueiras era um jovem com cabelo exuberante e olhar gentil. Fiz a proposta de tocar jazz no clube novo e ele não entendeu. Não sabia o que significava jazz. Expliquei que me disseram que ele tocava umas músicas com mangueiras e pedi-lhe para tocar uma. Ele tocou. Que músico majestoso! Que músico bárbaro! Perdi os sentidos na hora. Minha espinha dorsal congelou, meus pelos se eriçaram, fiquei tonto, flutuei, meu coração bateu numa velocidade absurda! Chorei. Ele estava soprando num pedaço velho e sujo de mangueira de jardim e eu emocionado. Preparei o show, seria incrível! Chamei a mídia, dizendo que teriam uma surpresa. No dia da apresentação, eu estava nervoso, mas o músico estava calmo. No seu olhar parecia haver a esperança de uma humilhação. Então ele começou o show e todos vaiaram. As alegações eram muitas: mangueira não é instrumento, ele não toca nenhuma conhecida, ele não sabe nem quem é Miles Davis, etc. A única coisa que ninguém ousava declarar era que nenhum deles entendia a música ou qualquer outra expressão artística, apenas entendiam como se critica uma música ou qualquer outra expressão artística. No outro dia a imprensa fez piada, os intelectuais da cidade fizeram piadas e o meu chefe me encheu de piada, me despedindo logo após minhas falsas risadas.

Infortúnio

Segunda-feira, 29 de outubro de 2012 13:23:23

O mundo acordara off-line naquela manhã. Não se tratava de um blackout ou de outro evento que indisponibilizasse o sinal para a população. Se estava, era por livre e espontânea vontade. Talvez as pessoas estivessem cansadas daquela fatídica vida de conversas virtuais sem emoção, desprovidas de sentimentos. Talvez tivessem chegado ao cúmulo de não terem tempo para os demais, sequer por uma mensagem instantânea. Não conseguia entender como de repente todos haviam optado por não abrir suas redes sociais no mesmo dia e no mesmo instante. Precisava de um café, não que a situação dobrasse minha indiferença habitual, mas confesso que estava curioso e por um mísero instante senti-me excluído. Será que havia deixado de ler um twitter, algum e-mail teria ido por acidente aos spams e de lá... Idéias e maquinações pipocavam na mente. Elaboradas teorias de conspiração não tardaram a vir, frutos de uma vida ociosa na frente da televisão em meio a filmes de ficção e noticiários sensacionalistas. Será? O café não estava bom, estava frio e torrado. Isso me impediria de compor uma linha de pensamento racional. Continuariam a ser apenas ideias de soltas. Algo precisava ser feito. Comecei a voltar no tempo, a TV não ligara logo que levantei, tinha faltado energia na madrugada e seu relógio perdera a programação. Não teria ligado o rádio, pois as segundas-feiras carecem de paz e tranquilidade. No trajeto do serviço não notara pessoas nos seus telefones, pois as pessoas não estavam lá. O final de semana fora agitado. Estava vivendo um daqueles dias que você vê tudo em câmera lenta, uma série interminável de dejavús, o ônibus que vira a rua à direita, o homem que acende o cigarro, a mulher que atende ao telefone. Interessante, a mulher particularmente hoje, não atendia ao telefone, estava jogando no dispositivo. Jogava ou redigia um SMS? Se estivesse escrevendo uma mensagem anularia a possibilidade de conspiração, se estivesse... Algo ainda mais preocupante me ocorria, o porteiro não havia me cumprimentado. Talvez não me tivesse visto, lógico. Mas o porteiro não ver? Sempre pensei que fosse onisciente! Havia me tornado invisível, de fato já era há muito tempo, mas agora era mais real. Ou ainda, havia morrido na noite passada, fazia sentido, mas espere, e o café? Poderia tê-lo sentido? Sim. Por isso, seu gosto frio e torrado, era o sabor do café dos mortos. O pânico se instaurara, não tinha forças para levantar de minha poltrona e conversar com alguém, e dessa forma constatar minha desgraça. E se a pessoa com quem estivesse falando também estivesse morta e desconhecesse o fato, as proporções deste infortúnio poderiam ser globais. Começava a passar mal e ter tontura, imaginava-me chegando a casa e encontrando meu corpo desfalecido sobre a cama ou no box do banheiro com a ducha ainda aberta. Pus a cabeça entre as pernas numa tentativa frustrada de recuperar o fôlego e a razão. Notei que havia posto minha pasta logo que chegara, sobre um fio de internet e desconectado o plugue do desktop. Inseri-o na placa. Estava vivo, novamente. - Altinier dos Santos Frees -

- Bruno Vargas 16  ►  Arruda - Arte & Conhecimento

17  ►  Arruda - Arte & Conhecimento


Corria

um vento suave por entre o bosque que se mostrava para o senhor Correia, um homem aparentemente jovem, mas que caminhava com as costas curvas, como se estivesse andando há muitas horas. O seu olhar assustado e de contemplação para com o ambiente que desconhecia e fascinava deu lugar a um olhar de alívio que veio seguido de um grande e alegre sorriso que resplandeceu como o sol que brilhava bem no alto do céu azul. Correia suspirou quando avistou em um clarão no meio do bosque, onde findava a estrada que seguiu durante toda a tarde, uma casa com arquitetura moderna, com grandes janelas de vidros que iam do teto até o chão e encontravam-se com as portas também de vidro daquela residência, pintada em um tom de branco muito claro, que provavelmente jamais havia visto. Em frente à casa, um homem ficou a observá-lo até Correia atingir o ponto em que ele se encontrava. Os homens se entre olharam durante alguns segundos e logo explodiu um novo sorriso de Correia, que começou a falar com a voracidade de um náufrago que passou parte da vida em silêncio em uma ilha. - Graças a Deus! Encontrei alguém para me ajudar, estou caminhando nessa floresta há horas e... - É um bosque – Interrompeu o homem. - Sim, sim... Não sei como vim parar aqui, não sei nem ao menos onde estou. Não lembro de avistar algum bosque ou ter planejado visitar algum – Enquanto falava Correia tentou secar o suor da testa com as costas da sua mão, no entanto estava com o rosto limpo. - Não se preocupe – Exclamou o homem. – Aqui as pessoas não suam, assim como não sujam seus trajes. Aliás, aqui não importa mais o que você veste ou aparenta ser, só interessa o que você deixou de ser e o que você é agora – Falou o desconhecido com um sorriso bonachão que contrastava com seus trajes negros e formais. O recém chegado começou a fechar o sorriso e o olhar assustado retornou a fazer parte de seu semblante. - Não entendo... - É! Ninguém quer entender. Passam a vida fugindo das perguntas – retrucou o homem. - Que perguntas, senhor? – indagou Correia. - As mais importantes. Por exemplo, neste instante você quer me perguntar se está morto, porém não fará porque sabe a resposta – Disse o homem enquanto tirava do bolso de seu paletó um maço de cigarros. Logo depois ofereceu para Correia, que recusou quase que de imediato. - Não fumo, obrigado. Apesar que... NÃO – gritou Correia. – O senhor não devia fumar! - Exclamou em um tom mais baixo. - E eu não fumo. - Então por quê me “tentou” com essa coisa? - Não “tentei” você, Correia. O vício é seu, eu só lhe ofereci. Você que ficou tentado a pegar. - Como sabe meu nome? Quem é você? – Perguntou ao homem, que nesse momento voltou a guardar o maço de cigarros no paletó e seguiu gesticulando com a cabeça negativamente enquanto seguia repetindo as palavras de Correia em um tom de voz mais baixo. - Isso é um sonho? Você é o demônio? Blá,blá,blá... – O homem seguiu com seu o tom de voz natural. Sempre a mesma história. Ao menos você deixou de lado o medo das perguntas, não é? Contudo sempre se esquece das relevantes. Tentam esquecer. As evitam, fogem do assunto. As chamam de “coisas” para atribuírem outro significado. - Entendi – Disse o homem com um novo sorriso no rosto. – 18  ►  Arruda - Arte & Conhecimento

Você está testando minha fé para saber se posso ou não entrar no no paraíso. É o porteiro? Então você é uma espécie de São Pedro? E ali é o paraíso! O homem voltou a oferecer o maço de cigarros para Correia, que recusou novamente. Naquele instante, pássaros deixaram uma árvore em que repousavam e seguiram seu percurso até desaparecerem na imensidão daquele céu azul sem nuvens. - Resposta errada. E novamente perguntas mal formuladas. Todos vocês são iguais, fogem das perguntas pensando que encontraram alguma justificativa para elas, na verdade só encontraram uma forma de atribuí-las a outra pessoa – A cada pausa o homem olhava o seu relógio de pulso, Correia tentou ver as horas, mas percebeu que no relógio do homem não havia ponteiros. - Por que um relógio sem ponteiros? – Indagou Correia. - E por quê sua fé? Aqui ela é tão útil quanto um relógio sem ponteiros. - Por que não responde as minhas perguntas? – Esbravejou Correia. - Porque você as faz com fé, Correia. Aqui não há como justificar as perguntas e respostas em nome de algo. Aqui se está só. – Respondeu o homem gritando. Atordoado após o grito do homem, Correia caiu de joelho no chão e pôs-se a chorar com as mãos escondendo os olhos. – Isso é o inferno. Só pode ser! Deus me ajude, por favor! -. Uma nuvem pareceu no céu e gaivotas começaram a sobrevoar o local onde os dois homens estavam, o sol já não era radiante e o vento que refrescava o bosque havia parado. O silêncio percorria o lugar. O homem então oferece o maço de cigarros para Correia, que os recusa entre soluços. - Aqui não é o inferno, Correia. O inferno que vocês criaram é muito cômodo e aconchegante, repleto de certezas oriundas de respostas que vocês nunca pensaram em responder. Não se constrói nada, absolutamente nada, sem antes resolver as questões referentes àquilo que sustenta uma criação. - Cadê sua compaixão? Não me assombre mais, suas palavras me rasgam como uma navalha. – Atordoado Correia mal conseguia se levantar, após uma tentativa retorna a cair de joelho diante do homem desconhecido, retornando ao seu choro desesperado. As gaivotas continuavam a sobrevoar o local e desaparecer na imensidão do céu. Onde os homens encontravam-se não era possível ouvir nada, nem as gaivotas, nem o vento que continuou a refrescar aquele clarão em meio ao bosque. Ao longe um som de ondas batendo em pedras quebrava o silêncio que reinava entre os homens. - Compaixão? Aqui não possuímos esse tipo de sentimento. – salientou o homem, enquanto parecia limpar as unhas com uma chave. - Nós? Há mais alguém aqui? - Refiro-me a nós dois, Correia. Nenhum de nós possui tempo para esses sentimentos bobos. Você, ao se deparar com sua situação esqueceu-se de tudo que deixou para trás, esqueceu o sofrimento da família ou dos amigos para só pensar no seu sofrimento. E voltou a fazer perguntas tolas. Vocês nunca aprenderão, continuam a apegar-se a tudo isso e pensam superar suas dificuldades usando como bengala uma divindade. Triste, triste...! – Disse o homem, enquanto repetia o gesto de negação com a cabeça. Jogou a chave fora, retirou do bolso o maço de cigarros e retornou a oferecer a Correia, que ficou a observá-lo por alguns instantes até recusar a oferta. - Se não é deus, quem é você?

- Enfim, resolveu encarar os fatos sem bengalas. Sozinho. Não sou deus, nem diabo e esse lugar está muito longe de ser o paraíso... - Onde está deus? – Interrompeu Correia. - Já procurou na Capela Sistina? – Disse o homem sorrindo. – Aqui nada acontece como em vida, Correia. Não há deus, nem diabo. Você está sozinho para enfrentar todas as perguntas que lhe foram colocadas e não respondeu. Tudo aqui fará questionamentos, o colocará em crise e você não poderá fugir, terá que enfrentar tudo sozinho. - Qual seu nome? – Indagou. - Você tem nome, todo mundo precisa ouvir o próprio nome para existir. - Não tenho nome, mas sempre me atribuem um quando aqui chegam. Tarde demais, é claro! Como sempre fogem das perguntas durante a vida, formulam aquilo que querem e esperam que a concretização daquilo que imaginam se dê tal como sonhos. Não! Aqui não é o paraíso porque você nunca pensou de fato como ele poderia ser, nunca construiu nada em cima das dúvidas que tinha após os primeiros domingos que se rendeu a esses sonhos. Talvez se pensasse no paraíso, você estaria lá! – Disse o estranho enquanto olhava fixamente Correia. - VOCÊ NÃO EXISTE. – Gritou Correia, tapando os olhos. - Existo, Correia. E continuarei existindo enquanto vocês não enxergarem as coisas, enquanto as perguntas estiverem sem respostas e enquanto as respostas forem justificadas por algo que não se faz, não se vê ou realiza. Você me criou Correia, junto com todos os outros. Sou fruto do inconsciente coletivo, tão poderoso ao ponto de criar tudo isso aqui, que de fato existe. Vocês poderiam ter criado o paraíso, mas não conseguiram. Podiam ter criado um deus, mas só conseguiram me criar. Só que cada vez que pensaram no paraíso e não pensaram no funcionamento dele, na constituição dele, vocês criaram isso aqui, aonde tudo é incompleto e todas as perguntas vão de encontro a você, ao mesmo tempo, e agora não há mais bengala. Aqui você enfrentará as perguntas que surgirem, não há como escapar. Não há mais nada depois daqui. Vocês condenam uns aos outros, todos os domingos, todo momento, há um mundo incompleto e cheio de dúvidas esperando a todos. – O homem retirou o maço de cigarros do bolso, o ofereceu para Correia, que o pegou lentamente, acendeu um cigarro e ficou fumando enquanto, de joelhos, limpava do seu rosto o produto do seu pranto. - Ézio Sauco Acadêmico do curso de Lic. Letras - Unipampa Bagé

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Sobre outros olhares... Por Júlia Cougo.

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“Fotografarsurgiu

como uma alternativa para a necessidade de gravar cenas que para mim tinham uma personalidade gritante, algo que eu não podia deixar de perceber, porque de alguma maneira aquilo mexia com minha percepção...”

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24  ►  Arruda - Arte & Conhecimento

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“Algo

como tentar capturar minha compreensão do mundo e, mais do que simplesmente fotografar uma cena, tentar transmitir o que eu via para a imagem.A dmito que nem sempre consigo essa transposição do que eu vejo para o que é capturado, tanto que são poucas as fotos que eu realmente considero boas.”

- Júlia Cougo Acadêmica do curso de Biotecnologia da Universidade Federal de Pelotas

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PÂNDEGOS POR SI SÓ

N

ão no sentido literal. O dicionário do pai do Chico Buarque classifica pândego como um sujeito alegre. Pode-se dizer, a grosso modo, um fanfarrão. Somos também, mas primamos por outros detalhes. Somos audazes, irônicos, visionários. Pouco modestos? Alguns diriam que sim, mas estes não entenderam a essência. A princípio, tínhamos a vontade de fazer um fanzine. Muito antes de propriamente um fanzine, era pra ser: “um panfleto/ jornalzinho literário, com desenhos pra animar um pouco, que englobasse também cinema&música”. Isso tudo sem essa história de almejar nosso lugar ao sol. Queríamos um meio de divulgar nossas produções que não fossem acadêmicas. A partir disso, fomos moldando nosso corpo gráfico. Textualmente já nos conhecíamos e fomos atrás de colaboradores. Estamos e estaremos sempre atrás deles: co-la-bo-radores (???). De original temos muito pouco. Tudo foi concebido por uma união de percepções que cada um adquiriu. Trazíamos a ideia à tona e colocávamos novamente na gaveta com frequência. Depois de muito regurgitar conceitos, linhas editoriais, segmentos e definições de gênero mais, decidimos ser livres. Entenda-se aqui “livres” como “não se prender a formatos”. Por vezes nem mesmo quem escreve sabe definir seu texto. Ou o que representa seu desenho. Escolhemos pela cara, pelo faz sentir que a coisa vai proporcionar. Somos irônicos quando queremos. Sarcásticos, se desejar (sarcasmo ≠ escárnio, não somos pessoas más). Piegas quando devemos ser piegas. Preferimos eufemismos, mas não negamos uma palavra de baixo calão quando bem empregada. Usamos, amamos e sabotamos clichês. Despretensiosos com algumas pretensões há que se admitir. Em resumo: somos pândegos.

vida de azar

cama

P

A

André Schmidt

erdeu um dedo porque o médico não pode atendê-lo a tempo. Horário de almoço. Não pegou o ônibus pra casa no feriado de natal porque não viu a hora passar. Repetiu o ano na escola porque a professora não foi “fiel” na hora de lançar as notas. Falavam-lhe: “Não deixa a bicicleta aí na frente que vão te roubar” e acabou por acontecer. Sempre teve amigos, só os perdia quando aparecia a conta pra pagar. Perdeu o cachorro porque ele não foi esperto o suficiente para olhar os dois lados antes de atravessar a rua. Quando ganhou a lambreta caiu no primeiro dia, porque não conseguiu se equilibrar. O gato que tinha caiu de costas do telhado e morreu. Devia ser sua última vida. Comprou um carro pela internet. “Lataria impecável”, só faltava pintar. Não foi pra praia porque o chefe não pode liberar. Alguém tinha de ficar no escritório. No dia do casamento, desmaio no altar. Teve o rádio do carro roubado no estacionamento do mercado, mas ninguém pode ressarci-lo. Perdeu a mulher porque ela tinha que viajar pra Amazônia, sem previsão de voltar. Não pode beber porque se beber cai. Mesmo assim, sempre cai. Perdeu um pneu com o carro em movimento porque o mecânico esqueceu de apertar. Quase morreu quando tinha 6 anos, engasgado com uma bala soft. Foi atropelado por um ônibus porque não o viu chegar. Não podia ficar em lugares com mofo que não parava de espirrar. Acabou expulso da igreja. Caiu de boca e quebrou os dois dentes da frente logo que aprendeu a caminhar. Chegou à piscina e foi logo mergulhando, com o celular no bolso. Não fica um dia sem sair com um corte ao se barbear. Foi bem no vestibular, mas perdeu a vaga por causa das cotas. Dificilmente sai de uma vaga de estacionamento rotativo sem uma multa pra pagar. Acertou os seis números da Megasena, mas a Caixa disse que acumulou. Que maldita vida de azar! ☻

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Sofia Silva cordei de rímel borrado, com o gosto amargo dos cigarros baratos de ontem à noite e totalmente sem vontade de ter alguma graça pra alguém. Precisei dos rifes introspectivos da Scout Niblett para me mostrar que já era hora do almoço e eu ainda estava na cama de calcinha, camiseta e despenteada. Enquanto famílias de sorrisos Colgate estariam diante de uma linda mesa do almoço de domingo: macarrão, frango assado e refrigerante sabor maçã, lá estava eu - sozinha, no meu quarto, ouvindo uma música sem vontade de sorrir e com uma mesa de almoço vazia, em uma cozinha com toda a comida crua na geladeira e armário. Sabe quando você acorda só porque o organismo despertou e a velocidade do ânimo é quase zero? Quando a mente mergulha no vácuo da tristeza e da felicidade ficando em nenhum dos dois lugares? E aí você fica ali no meio - sem fazer nada, sendo um nada no seu quarto que entra vento pelo buraco mal tapado do ar condicionado. Pego o smartphone e mando mensagens que a Tim vendeu como ilimitadas, mas que não vão; ligo o notebook que não funciona a internet. Sinalzinho de exclamação amarelo pra ela também. Não consigo me conectar com ninguém. Por isso continuo sentada, olhando para lugar nenhum, absorvendo e sentindo o frio que entra pelo vão do buraco mal tapado do ar condicionado que eu não tenho, entretendo-me com o que é conveniente. Que má hora essa minha de estar sem o menor dos sonos. Acordada só porque tem que estar assim. Discordo do meu organismo. E das conveniências do mundo. ☻

meio amargo

curto e grosso

Q

S

André Schmidt

uinze anos dela. Uma nublada sexta-feira de fevereiro pós-carnaval. São quase 5 da tarde e um mormaço dá jeito de ocupar o lugar. O lugar é ao ar livre, com mesas dispostas em forma de um losango, cada uma comportando oito cadeiras. Panos, toalhas e adereços da decoração, todos tinham um papel: combinar com os detalhes em dourado, que também era a cor do vestido da debutante. Ao centro de cada mesa um vaso cônico de vidro com bolinhas de gel verde de suporte a buquês de crisântemos que iam de branco ao tom champagne em degradê. Mais tarde, ao apagar das luzes, esses vasos serviriam de copos. Eu: um terno risca de giz cor azul marinho, sorriso ensaiado e um cartão no bolso. Pensei antes em flores. Só que flores é um presente pra se enviar quando não temos a oportunidade de olhar nos olhos da pessoa que se quer bem. É a tentativa de atrasar por 1 ou 2 dias os parabéns, cumprimentos e desejos de felicidade. Se misturar uma tampa de água sanitária à água do vaso pode durar mais. É um trunfo. O importante é aparecer antes que murchem as flores. Murchas perdem qualquer valor e despetalam no esquecimento. Minha partida ficou pra domingo. Ela iria mais tarde, meses depois, pra outros lados. Não encaramos como uma tragédia. Também não aplaudimos, esperávamos por isso. Nunca houve ilusão de ‘lado a lado, pra todo sempre’. Ela parecia ter cabeça de mais de quinze anos. Eu, um náufrago em meus dezessete. Não tínhamos um acordo, tínhamos outras coisas: ansiedades, receios, intimidades e uma cumplicidade natural. Bastante por culpa disso (ou disto), sou seu companheiro de valsa hoje à noite. Os convidados estavam dispersos. Passando pelos grupos de conversa, um a um, decidi buscar um pouco de silêncio. Sentei na murada de uma floreira, perto da entrada/ saída dos garçons e copeiros. Dois minutos depois, a mãe dela adentra a cozinha e volta com uma imensa bandeja de doces em minha direção. Vem exibindo seus dentes de porcelana e toda a simpatia de uma mãe no debut da filha. Vestido longo vermelho com um véu que enlaça o busto e um braço, maquiagem carregada e cabelo estático por conta do laquê. Contou-me como e com o quê cada doce foi feito. Provei alguns e para o final ela apontou uma novidade: uma trufa de chocolate meio amargo. Lembro do dia que perguntei: “ - Tu preferes chocolate branco, preto ou meio a meio? É bom saber.. – Gosto de todos, mas prefiro chocolate preto meio amargo. E tu? Se é bom saber, também quero. – Vai pensar que é cópia, mas também fico com o meio amargo.” Concordamos que quando é muito doce enjoa. Ao fim da valsa, minhas mãos e olhos ainda com ela, sem nenhum intervalo de tempo, começa a tocar twist and shout e todos quiseram mostrar que sabiam os passos vistos em “curtindo a vida adoidado” na sessão de filmes da tarde na tv. Aproveitei a hora pra deixar meu cartão na mesa de presentes. NÓS DOIS é plural A GENTE são dois, ou mais EU mais TU também é NÓS Mas é diferente... SINGULAR felizes 15 anos! Beijos e fica por perto. ☻

Pedro Lago

entada ao lado dele estava alguém que parecia já ter desbravado o mundo. Ambos descansados em uma cama não tão boa, meio dura até. Ambos certos que “aquilo” que um dia eles chamaram de “alguma coisa” já se transformara em outra coisa, outra ilusão tão palpável quanto a primeira. Ele procurou no Google: era amor. Os abraços já não tinham a mesma medida, estavam mais para um cordial “aperto de corpos’’. Os beijos eram meras trocas de saliva cada vez mais esporádicas. Os olhares e toques eram de impaciência. Ela não tolerava mais aquela verdade conveniente dele. No leito nupcial, um córrego separava os dois sem piedade. O tempo nele corria e esvaíasse em uma queda de pensamentos inseguros que oxidava ambos, que por sua vez assistiam ao fim eminente na primeira fila, com direito a pipoca e auto-piedade. Astolfo era o único pré-adolescente do vilarejo que não tinha a “tábua’’. A tábua era um dispositivo ultramoderno feito completamente de madeira. Esse aparato permitia a dois interlocutores conversar por ela escrevendo suas falas nesta, que por sua vez era lida pelo outro e assim vice e versa. E claro, estava na crista da onda da galera (ao contrário da expressão que acabei de usar). Pois então, Astolfo não estava na moda, isso era fato. Porque do bardo ao rei todos possuíam ou cobiçavam um dia possuir esse aparato de modelos variados e preços hipertensivos. Astolfo não queria seguir a moda. ☻ - Chato. - Mala. - Relaxado. - Neurótica. - Pinto pequeno! Pausa dramática... - Mentirosa...tá blefando, sempre disseste que ele era colossal, um “obelisco do prazer’’. Sim, essas foram as palavras que tu usaste.... Segunda pausa dramática... - Menti...pronto falei, menti! Teu pinto deve ser no máximo normalzinho... - Normalzinho? Nossa! quem te nomeou a urologista do pedaço?! O que mais eu não sei?! Teu nome é esse mesmo?, a tua idade é verdadeira...teus olhos são azuis? - Ai, quanto drama! O que importa é a performance... - Aha, viu! Pelo menos admite... - ... que digamos de passagem, não é o bixo. Terceira pausa dramática - Por que começamos a discutir mesmo? ☻

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give me a Liber!

cinema?

meu amor

P

A

V

Otaviano Caldas

or algum motivo que eu desconheço alguém achou que seria uma boa idéia criar a tal da cerveja sem álcool. Que falta de conhecimento humanístico! Cerveja sem álcool é o primeiro lugar no top 10 das coisas mais inúteis. Possui maior índice de “share of mind” quando se trata de inutilidade. Mas mesmo assim existe gente que compra. Pior ainda, tem gente que até bebe isso! Mostre-me uma pessoa que beba cerveja sem álcool e não tenha algum tipo de transtorno emocional, mental, ou semelhante. Eu te desafio! Religiosos? Um cara que grita chorando o nome de Deus durante uma missa na igreja pentecostal do sei lá o que não possui um transtorno? Qualquer religioso fervoroso é transtornado. Qualquer espécie de pessoa extremista é transtornada. E com certeza, beber cerveja sem álcool é algo extremo. Tem gente que gosta de cerveja sem álcool. Mas é um daqueles paradoxos que ninguém consegue entender. É tipo, gostar de sexo sem penetração. Sexo sem gozar. Tipo, “tá, mas qual a graça disso?”. E essas pessoas nunca vão conseguir te explicar. Podem até conseguir, mas nunca vão te convencer. Nem conseguem convencer a si mesmas. Vou explicar minha visão de um consumidor desse tipo de cerveja. Imaginem a cena num bar: “Por favor, me vê uma cerveja sem álcool e um pastel sem carne. Sim, de vento mesmo.” E depois disso o cara olha a mulher mais linda do bar, vai lá e conversa com ela, mas não tenta nada. Então vai pra casa, bate uma punheta, mas não goza, e dorme com aquele ar de satisfação. Isto é completamente doentio. É um psicopata, um personagem de filme de terror. Chamem do que quiser, se essa pessoa é real, ela é um cavalheiro do apocalipse. E não duvidem, É POSSÍVEL que existam pessoas assim. Não é à toa que o mundo acaba em 2012. A cerveja sem álcool se enquadra naquelas coisas que deveriam trazer diversão para adultos, mas na verdade são para crianças. Cerveja sem álcool, espingardas de pressão e filme erótico (aqueles que têm 2 horas de filme, 20 minutos de sexo que ninguém vê nada entrando ou saindo). Tudo isso foi feito pra adulto, mas só criança acha graça. Os homens querem saber apenas do que eu chamo de “the real deal”. A verdadeira sensação. Se a gente quer atirar, a gente quer dar tiro de verdade. Abrir um rombo em algo. Se a gente quer ver um pornô de verdade, a gente quer saber de ação. Tem que ver uma vulva sendo castigada. Nada violento. Alguém já viu na TV alguma propaganda de cerveja sem álcool? Difícil, né? Mas todo mundo sabe porque não passa. Primeiro (e o mais óbvio): por que é algo inútil. O único jeito de aumentar as vendas é lançando a versão com álcool. Segundo: ninguém cederá sua imagem pra um produto tão escroto. É suicídio moral. Já pensou o Romário fazendo uma propaganda dessas? Só o Kaká faria. Mas o Kaká só fez sexo aos 20 anos e então sofreu uma lesão no púbis, por questões que podem ou não ser relacionadas a isso. Eu disse, ninguém escapa. Isso prova minha teoria a respeito dos transtornos. Chamem o psicanalista: “O consumidor de cerveja sem álcool, no conceito de Freud, é alguém que possui uma pulsão de morte ainda maior que o consumidor da cerveja normal, devido à falta de respeito a si próprio e à vontade de submeter-se a uma tortura psicológica tremenda, iludindo-se que está a beber uma ceva normal. Ele tende a estimular a psicopatia em si, fingindo que está se embriagando, podendo levá-lo a “esquizofrenia total e surtos psicóticos”. É plausível. Vimos que é obvio que as pessoas que bebem cerveja sem álcool, porque não podem beber uma cerveja normal tem algum problema. Mas já que a cerveja sem álcool não é o tratamento adequado para curar essas pessoas, qual seria o tratamento correto? Ããã... (???) ... Não sei. Se você sabe, mande um e-mail para: ministeriodasaude@ brasil.gov. Quem sabe o Nobel pode estar muito perto de você! ☻

Pedro Lago s primeiras impressões que Juventude Revoltada (Youth In Revolt, 2009.) mostra são as de que estamos diante de mais um filme indie nos moldes de Juno, ou seja, trilha sonora saudosista e piadas sarcásticas. Mas como eu disse antes, são apenas impressões. Juventude só não é perfeito como também extrai o máximo do elenco composto por Steve Buscemi (Cães de Aluguel, 1992.), Zach Galifianakis, perfeito nopapel de padastro relapso (do engraçadíssimo Se beber não case), Michael Cera (Superbad) mais do que fantástico no papel principal e Portia Doubleday, revelada e reveladora em cena. Cera provou que sabe interpretar um jovem nerd em sua curta filmografia, mas em Juventude ele está no ápice de sua atuação. A história é básica: um adolescente de nome engraçado, Nick Twisp (Cera), vive uma vida “invisível’’, gosta de Fellini e Nouvelle Vague. Seus pais são divorciados, a mãe omissa e o pai (Steve Buscemi) totalmente indiferente contribuem para a atmosfera melancólica que envolve a trama. Mas os fatos conspiram e transformam o simples roteiro sobre “lamúrias da adolescência’’ em comédia cult instantânea. Em uma paixão de verão Sheeni Saunders (Portia Doubleday) arrebata Nick. O amor (hormônios) desperta no protagonista um alter ego malandro e sem escrúpulos autodenominado François Dillinger (já vale o filme, com a atuação ímpar de Cera com bigodinho) que cadencia os acontecimentos ao instaurar caos na vida pacata de Twisp. Ao contrário de suas obras anteriores, o diretor Miguel Arteta (Por um Sentido na Vida, 2002.) não exibe tanto pessimismo, mas preserva um tom mais sarcástico, ácido, vívido. Juventude Revoltada é mais um prodígio desse gênero. Mesmo sendo uma adaptação do romance homônimo de C.D.Payne, não macula em nenhum momento a obra original, conseguindo em muitos pontos até aprimorar certos trechos. O tema “adolescência/problemas existenciais” é um filão atemporal tão explorado no cinema quanto a II Guerra Mundial. Mas assim mesmo, às vezes, com inteligência, pode surgir algo novo que trate sobre algo antigo, porque o que importa é ser original, mesmo usando all star. ☻

Dhouglas Castro ocê me faz feliz. Me dá alento. Aconchego. Tranquilidade. Você foi responsável por muitos dos meus momentos mais felizes e, em algumas das horas mais difíceis, você foi meu consolo. Ao mesmo tempo, é estranho e extasiante saber que você se tornou, pra mim, tão importante quanto minha família ou meus amigos. Depois que você entrou no meu mundo, mudou meu jeito de ver, pensar e sentir. Você me consome. E isso é recíproco. Eu já disse que te odiava. Que não queria mais te ver na minha frente e que alguns dos meus problemas eram culpa sua. Mas foram apenas lapsos, meramente momentâneos. A verdade é que sem você, não vivo. Não sou nada. Não sou ninguém. Me desculpe se demorei para admitir isso. Às vezes até me pego pensando que, talvez, você é tudo o que eu preciso. Afinal, te tenho presente nos meus sonhos desde sempre. Poder te ter em minhas mãos de verdade foi e é uma das melhores coisas que me aconteceu. Quanto mais eu te tenho, mais te quero ter. E aproveitar essa intensidade fugaz da nossa relação é tudo o que eu quero agora. Pois é. Parece que estou apaixonado. Eu te amo, dinheiro. ☻

Para ter um lugarzinho neste compilado envie sua obra para opandego@hotmail.com; As curtidas de nossa página no Facebook são nosso termômetro. Se achar que vale a pena ou só para ver no que vai dar, curte lá! Ademais, jogue o lixo no lixo e vá ao dentista regularmente.

trinta de outubro Neandro Catto

C

ara voltando pra casa na madrugada, recebe uma ligação e atende – fica parado, na esquina. Decide mijar enquanto espera uma carona. Um carro para, ele ouve risos, um barulho estranho - um estalo. Sente como se tivesse levado uma pedrada na cabeça, passa a mão e vê sangue. Não se apavora na hora, o álcool da noite ainda fazia efeito. Tanto que se esquece de anotar a placa (erro de principiante). Só se liga nos riscos quando chega à sala de raio-X do hospital. Diagnóstico: tiro na cabeça. Sorte ou azar, “nem Stephen King seria tão ocasional assim” – lhe disseram. Ele riu, do mesmo jeito que riu quando o médico fuçava em sua cabeça tentando tirar a bala, “Nunca esquecerá este trinta de outubro”. Não conseguiu, a bala continua aqui, ainda sinto ela na superfície. ☻

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Equipe: Direção Editorial Ézio Sauco Socca Conselho Editorial Patricia Barreto Mendonça Jael Scoto Meirelles Diagramação e Produção Gráfica Luciano Micelli Garcia Revisão e Edição de Textos Ana Paula Seixa Lucas Freitas Rosa

“A arte nasce de constrangimento, vive de luta e morre de liberdade” - André Gide -

Orientação Rodrigo Borges de Faveri Pró-Reitora de Extensão Vera Lucia Cardoso Medeiros. Reitora Ulrika Arns

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