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um S茅culo de Solidariedade Beneficente P贸voa de Varzim
ficha técnica
TÍTULO A Beneficente - um Século de Solidariedade EDIÇÃO A Beneficente - Póvoa de Varzim - Associação de Solidariedade Social, no âmbito das comemorações do 1º centenário COORDENAÇÃO José Ângelo Lima COLABORAÇÃO Maria do Céu Padrão, Rute Faria e Sara Sá REVISÃO Roger Amorim (CMPV) DIGITALIZAÇÃO Hélder Sá (CMPV), excepto págs. 30-31, 33-39, 41 e 58 - imagens cedidas pelo MMEHPV CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS (reconhecidos) Rui Sousa (capa, pág. 66), José M. Flores Gomes (págs. 06-07, 78-81) Roger Amorim (págs. 47, 60-61, 72) DESIGN GRÁFICO Roger Amorim IMPRESSÃO Tadinense Artes Gráficas TIRAGEM 5.000 DEPÓSITO LEGAL XXXXX
APOIO
PATROCÍNIO
índice
FUNDADORES 07 COMISSÃO DE HONRA, COMISSÃO EXECUTIVA E CORPOS SOCIAIS PARA O TRIÉNIO 2004-2006 08-9 Mensagem do PRESIDENTE DA REPÚBLICA 10 ARCEBISPO PRIMAZ DE BRAGA 11 MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE SOCIAL 12 PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL 14 VEREADOR DA ACÇÃO SOCIAL 16 PRESIDENTE DA UDIPSS-PORTO 17 ASSOCIADO N.º 1 19 PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA GERAL 20 PRESIDENTE DA DIRECÇÃO 22 VICE-PRESIDENTE DA DIRECÇÃO 23 ASSOCIADO J.J. SILVA GARCIA 28 BREVE RESENHA HISTÓRICA 30 HOMENAGEM AO MONSENHOR PIRES QUESADO 50 ÁREA SOCIAL 53 “SOPA DOS POBRES” - O REFEITÓRIO 57 ÁREA EDUCACIONAL JARDIM-ESCOLA SANTO ANTÓNIO 63 JARDIM DE INFÂNCIA MONSENHOR PIRES QUESADO 67 ATL SEDE 71 CRECHE N. SENHORA DA CONCEIÇÃO 73 A IMAGEM DA CARIDADE 74 EXPOSIÇÃO COMEMORATIVA NO MUSEU MUNICIPAL 76
1906-
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Francisco Gonçalves Amorim, o “Miroma” e esposa. LINO DA COSTA NILO, 1900. Retratos pintados a óleo sobre tela. Colecção A Beneficente
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Fundadores
· Francisco Gonçalves Amorim e esposa · Cândido Augusto Landolt · Adolfo Batista Gomes Ferreira · Valdomiro Baldomero de Figueiredo · Cândido Truco Guimarães · Adelino Ferreira Batista · Belmiro Batista Gomes Ferreira · António Batista Gomes Ferreira · Manuel Pereira Dias · Padre Afonso dos Santos Soares · Laurindo Marques de Oliveira · Padre José Almeida Amorim · Padre Manuel da Silva Ferreira · José da Costa Novo · Manuel Batista Carneiro · Padre Alexandre Almeida Rainha · António da Silva Marques António dos Santos Graça · José Martins de Faria · Álvaro Ribeiro Pontes · José Eduardo Pinheiro · Abade Manuel Ribeiro de Castro Adelino de Oliveira Costa · João Henrique Alves da Costa Reis · José Pereira Sampaio · António Gonçalves Casanova · Afonso Henriques de Melo · António Fernandes Ribeiro · António da Silva Montenegro · Alfredo da Silva Montenegro · Prudêncio Gonçalves · Amândio Luís Monteiro · José Francisco Gomes · Joaquim Martins da Costa
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Comissão de Honra · Dr. Jorge Sampaio, Presidente da República · Dr. José António Fonseca Vieira da Silva, Ministro do Trabalho e Solidariedade Social · Dra. Maria de Lurdes Reis Rodrigues, Ministra da Educação · D. Jorge Ferreira da Costa Ortiga, Arcebispo Primaz de Braga · Dr. José Macedo Vieira, Presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim · Pe. Lino Maia, Presidente da Direcção da UDIPSS - Porto · Dr. Manuel Alves de Aguiar Quintas, Presidente da Assembleia Geral de A Beneficente
Comissão Executiva · António de Aguiar Quintas (Presidente da Direcção) · José Ângelo Lima (Vice-presidente) · Dr. Rui Quintas (Tesoureiro da Direcção) · Maria Rosália Silva (Chefe de Secção)
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Corpos Sociais do triénio 2004-2006 ASSEMBLEIA GERAL Presidente - Dr. Manuel Alves de Aguiar Quintas 1º Secretário - Dr. Nuno Manuel Gomes de Sá Maia 2º Secretário - Dr. José Alberto Linhares Vieira DIRECÇÃO Presidente - António de Aguiar Quintas Vice-Presidente - José Ângelo Barbosa Gonçalves Lima Secretário - Dr. António Dourado Sousa Ferreira Tesoureiro - Dr. Rui António Lima Quintas Vogal - António Manuel Gomes de Sá Ferreira Suplentes - Eng. António Manuel Correia Martins - Dr. Jorge Manuel Vasconcelos Tavares Moreira CONSELHO FISCAL Presidente - Dr. Valdemiro Laiete Maia Secretário - Dr. Manuel José Rodrigues Secretário - Dr. Francisco Manuel Marques dos Santos Suplentes - Dr. Manuel Oliveira Seabra - Dr. Ângelo Miguel Pinto Almeida Lima - Leopoldino Fernandes Novo
DIRECÇÃO: (da esq. para a dir.) Vogal, Vice-Presidente, Presidente, Secretário e Tesoureiro
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mensagem do Presidente da República Dr. Jorge Sampaio Nas comemorações do primeiro século de “A Beneficente” - Associação de Solidariedade Social da Póvoa de Varzim impõe-se homenagear todas as personalidades que a criaram e desenvolveram. Não faltaram perturbações graves durante este longo período, mas surgiu sempre a capacidade associativa para as superar. Assinalo, com redobrado motivo de apreço, o facto de “A Beneficente” se ter caracterizado pela atenção esclarecida aos problemas sociais de maior gravidade, tendo sabido adaptar-se a novas exigências trazidas pela evolução social. As próprias alterações do nome da Instituição deixam bem patente o seu esforço de actualização permanente, com preservação da sua identidade e objectivos originários. Sublinho, a este propósito, o facto de “A Beneficente” haver mantido a valência “refeitório” para além das outras, consideradas mais estimulantes. Naturalmente, a concepção e o funcionamento do refeitório evoluíram significativamente ao longo do século e passaram a integrar a perspectiva assistencial no quadro mais amplo da acção promocional. Infelizmente, a história do último século e o agravamento actual do desemprego e de outros problemas sociais mostra como foi correcta a orientação adoptada pela “Beneficente” desde o início. Na verdade, todo o edifício social deve basear-se na satisfação das necessidades básicas, e progredir a partir daí. Com a minha confiança nos Órgãos Sociais e nos demais Associados, faço votos de que a Instituição, fiel ao seu passado, continue a saber adaptar-se aos imperativos do desenvolvimento humano. Em Cooperação com as diferentes entidades locais e nacionais.
Palácio de Belém, 7 de Dezembro de 2005
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Arcebispo Primaz de Braga D. Jorge Ferreira da Costa Ortiga 100 Anos de “A Beneficente” A história da humanidade, perante os problemas que vão surgindo, testemunha que, com maior ou menor ousadia, a Igreja e a Sociedade foram capazes de criar instituições vocacionadas para responder. Sempre os problemas se multiplicaram e sempre a sensibilidade, humana, cristã, procurou colmatar as deficiências. Sabemos, por outro lado, que o estatuto da dignidade de todo e qualquer ser humano sem sempre ofereceu as condições mínimas para determinado número de pessoas. Para muitos, em qualquer idade, faltava o essencial. “A Beneficente”, na Póvoa de Varzim, significa uma força aglutinadora de pessoas para, num regime de voluntariado e gratuidade, discernir respostas de bem fazer aos mais necessitados. Torna-se impossível elencar os gestos de generosidade. Também o espírito que moveu as pessoas impede que o façamos. O bem multiplicou-se e ninguém pretendeu os aplausos e elogios. Para os intérpretes era suficiente a alegria de dar sabendo que estavam a oferecer vida. Os cem anos não significam uma meta. Tornam-se uma etapa para consciencializar-se da importância do “ideário” norteador de tantas iniciativas e recuperar um entusiasmo novo. Os problemas e carências não estão resolvidos e continuas a ser imperioso reconhecer que a dignidade ainda não tocou a existência de todos. Os males tornam-se mais evidentes e as franjas de necessidades convidam a investir com novas energias. Poderá parecer que a sociedade se alterou. Só que, na evolução económica que permite uma melhor qualidade de vida para os portugueses, encontramos nuances novas a exigir uma intervenção criativa. Daí que um centenário de vida merece as congratulações em nome de todos os beneficiados com uma agradecimento a tantos que despenderam as suas energias no trabalho da Direcção e noutros serviços. Aquele que conhece a verdadeira dimensão da generosidade saberá escrever o nome no livro dos que apostaram em tornar o mundo mais irmão e mais igual. Com as congratulações vai, também, o convite para um investimento na fantasia da caridade para que a Instituição continue a manifestar a sua vitalidade num funcionamento modelar em todas as valências, continuando aberta, com serenidade e coragem, aos novos problemas e suas causas. Neste mundo de indiferenças e egoísmo vale a arte de bem-fazer. São estas obras que fazem história e não envelhecem. Parabéns e coragem para os desafios que vos esperam e que uma plêiade de homens e mulheres de boa vontade queiram continuar a obra edificada com tanta dedicação.
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mensagem do Ministro do Trabalho e Solidariedade Social Dr. José António Vieira da Silva Cem anos em prol da solidariedade “A Beneficente” comemora, no ano que agora principia, cem anos de existência. Um século. É muito tempo na vida das pessoas. Mas muito tempo também na vida de uma instituição que começou quase do zero com o objectivo de ajudar os mais desfavorecidos e que, graças aos esforços de gerações sucessivas de dirigentes e associados, soube sempre crescer e dar passos novos face aos imensos desafios sociais que, à nossa volta e no meio de nós, tantas vezes ficam sem resposta. Só por isso, há, pois, muito a comemorar e a minha primeira mensagem vai precisamente no sentido de expressar um desejo: que esta efeméride seja comemorada com a dignidade que merece, ao longo de todo o ano de 2006. Mas, olhando para o longo caminho percorrido neste século de existência, a “Beneficente” é antes de mais um exemplo vivo da própria História de Portugal no que toca à solidariedade para com os mais necessitados. Tal como sucedeu à escala nacional, esta associação soube evoluir, soube crescer, soube sempre desenvolver novas respostas. E, ao fazê-lo, acompanhou devidamente as exigências dos novos tempos e a crescente necessidade de respostas sociais. O que começou por ser um impulso de “fazer o bem”, com uma intervenção durante décadas concentrada sobretudo nas questões alimentares, hospitalares e de higiene, foi-se alargando e mudou muito o perfil da instituição e do seu trabalho, sobretudo nas últimas décadas. Partindo desta vertente mais assistencial, decisiva para garantir patamares básicos de bemestar, a “Beneficente” expandiu progressivamente as suas actividades para o apoio à infância (seja na ocupação de tempos livres, seja na área do pré-escolar e das creches) e para o apoio aos idosos, como bem demonstram o centro de dia e o apoio domiciliário aos que dele mais precisam. E fê-lo, aliás, com uma dimensão assinalável no contexto geográfico em que se insere, dando um contributo muito significativo para a melhoria das condições sociais dos mais desfavorecidos. O Estado não tem deixado de apoiar significativamente este esforço. Não podia ser de outro modo. Por um lado, porque reconhece, como aliás se impõe, a valia do trabalho da instituição. E, por outro lado, porque reconhece também que as necessidades sociais existentes na Póvoa do Varzim justificam plenamente o envolvimento do Estado neste trabalho que não é de índole lucrativa e que tanto faz “lucrar” quem dele beneficia. São razões bastantes para que o apoio público ao meritório trabalho da instituição não cesse e, pelo contrário, encontre novas formas de actualização e aprofundamento. A Póvoa do Varzim tem, estou certo, muito orgulho nesta instituição. E é justo que o tenha. Porque nem sempre temos a sorte de ter aqui tão importante apoio para a melhoria da qualidade de vida de muitas famílias povoenses. A verdade é que em questões como o apoio às crianças, aos idosos, aos mais pobres, todos os esforços são poucos e a “Beneficente” - pela sua experiência, pela sua tradição, pela relevância da sua presença na vida desta comunidade - é uma mão bem visível em prol da solidariedade social.
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Assim sendo, com a garantia de um apoio empenhado por parte dos poderes públicos, e a convicção de que o longo caminho já percorrido ainda tem muita estrada pela frente, não podia deixar de me associar pessoalmente a esta comemoração. A “Beneficente” e os seus cem anos de rica história honram aqueles que estiveram, há exactamente cem anos, na sua génese. Porque aqueles que hoje prosseguem esse impulso pioneiro continuam a ser, como há um século, “companheiros do bem” - à semelhança do que se intitulavam, na altura, os fundadores da associação. É dessa companhia activa e solidária que espero que a Póvoa do Varzim e as suas gentes, em particular os mais carenciados, possam continuar a usufruir.
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mensagem do Presidente da Câmara Municipal Dr. José Macedo Vieira SAUDAÇÃO Com um programa que, na sua diversidade, vai do passado ao futuro, A BENEFICENTE assinala o 1º Centenário da sua existência, marcado por vicissitudes que transportam sinais indeléveis dos tempos que atravessou - difíceis na sua maioria, penosos, até, alguns deles. Criada para fazer o bem (como o próprio nome, assumidamente, proclama), A BENEFICENTE soube, ao longo deste século, actualizar conceitos, metodologias e práticas ao serviço de uma Acção Social cada vez mais exigente, mais interventiva e mais proactiva. Identificada com os problemas sociais da cidade, A BENEFICENTE conheceu, nas últimas décadas, uma evolução estrutural (ao nível dos suportes físicos e humanos) que acompanha as dinâmicas sociais de uma comunidade urbana em rápida mutação. A Póvoa de Varzim, tradicionalmente pacata no seu velho cosmopolitismo sazonal, acolheu, de súbito, uns quantos milhares de novos residentes, vindos dos mais distantes interiores de um vasto norte que, desde há muito, aqui almejava construir novas oportunidades de vida, finalmente possíveis pela dinamização da economia num país aberto à democracia e ao mundo. A galopante urbanização da população - fenómeno universal que, em Portugal, se iniciou com significativo atraso e que, por isso, se operou com a sofreguidão que evidencia a nossa atávica incapacidade de previsão (e de prevenção) - gerou, em camadas significativas dos novos residentes, sentimentos de desenraizamento, de frustração e de marginalização, que determinaram situações (impreparação para o mercado de trabalho, desestruturação familiar, etc.) que costumam ser a antecâmara da pobreza e da delinquência. Os novos pobres, filhos de um tempo que proclamou o direito universal ao bem-estar, suportado na opulência de um estado social que a economia do pós-guerra pensava poder eternizar, sofrem hoje, nos meios urbanos, a agressividade de um ambiente fratricida, que marginaliza e considera fracos e desprezíveis todos aqueles que não vencem na competição (desenfreada, selvagem) que caracteriza os grandes meios. A nossa cidade sofre alguns desses problemas, cuja identificação, localização e quantificação carecem de actualização permanente e de uma visão prospectiva ao nível das políticas sociais de resposta. E se estas são (e só assim podem ser eficazes) missão de toda a sociedade (administrações central e local, sociedade civil, agentes económicos, naturalmente com responsabilidades diferenciadas ao nível dos vários patamares de resposta), o que se constata - e com muita satisfação o digo aqui - é que não é ao nível da sociedade civil que a Póvoa de Varzim apresenta carências no domínio das políticas sociais. Nesta área, bem pelo contrário, a cidade e o concelho estão dotados de um vasto conjunto de instituições que, na sua diversidade, respondem à amplitude dos problemas sociais mais prementes, sejam eles de carácter educativo ou de âmbito assistencial. O que não temos - e provavelmente nunca teremos, porque as dinâmicas sociais são muito mais rápidas do que a construção de respostas eficazes a alguns desafios que elas colocam - é capacidade para actuar, ao nível estrutural, na prevenção, até níveis considerados satisfatórios. Aqui, sim, impõe-se mais cooperação entre parceiros, ou seja, a construção de uma verdadeira rede social - que no papel (e no terreno) já existe, mas necessita ser mais proactiva, actuando ao nível das causas e não apenas minimizando as consequências. A BENEFICENTE conserva, ainda hoje, um balneário público, e serve, ainda hoje, a sopa dos pobres, que reúne, todos os natais, numa ceia. Ou seja: a Póvoa de Varzim tem, ainda hoje, pobres muito pobres, deserdados do mais elementar (o pão, o tecto, a família). Esta realidade, para muitos chocante e por muitos ignorada, é bem o espelho da sociedade bipolar em que
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vivemos: o luxo e o lixo, lado a lado, ignorando o luxo que o lixo é seu irmão para já surdo e pacífico, mas, entretanto, reivindicativo e desafiador. A forma de, nos nossos meios urbanos, evitarmos a Paris recente (e, sobretudo, a incontrolável Paris futura, seja qual for o seu nome ou a sua localização), é concretizarmos, todos, melhores políticas sociais, mais integradoras e mais consentâneas com a fraternidade que é matriz da nossa condição humana. Nesta hora jubilar, quero aqui deixar, na pessoa do Presidente da Direcção de A BENEFICENTE e seu persistente timoneiro, Senhor António de Aguiar Quintas, o preito de homenagem (do município, e minha) a todos quantos, ao longo deste século, puseram de pé, e mantêm jovem, uma Instituição que enche de orgulho a Póvoa de Varzim e é um dos mais sólidos garantes do futuro solidário que desejamos.
Póvoa de Varzim, Dezembro de 2005
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mensagem do Vereador da Educação e Acção Social Dr. Luís Diamantino Batista A nossa casa Era uma vez uma terra onde as pessoas viviam em casas mais ou menos confortáveis e quase todas as pessoas viviam em família. Mas quase todas não são todas e a felicidade não podia existir nessa comunidade, enquanto a felicidade não fosse de todos. Há muito tempo, era assim a nossa terra. Então, algumas pessoas, alguns grupos de cidadãos, algumas famílias construíram uma casa, onde os que tinham fome podiam alimentar-se os que não tinham roupa podiam vestir-se, os que estavam tristes podiam encontrar o conforto do carinho e a doçura da palavra. Era uma casa feita com o cimento do amor, um amor que foi crescendo com a comunidade e, 100 anos depois, essa casa existe em cada um de nós e entra em cada lar onde habita a solidão, a fome e o frio. Pela mão de excelentes profissionais e de voluntários com um coração do tamanho do mundo abrem-se enormes janelas de esperança e o sorriso quente inunda de luz os recantos mais sombrios. Nos corredores desta nossa casa, ouvem-se os gritos coloridos das crianças, que se cruzam com a voz pausada e experiente dos mais velhos. Os projectos avançam para todos, num intercâmbio de gerações, que deixam descortinar um futuro sempre melhor. Com a persistência que só a tranquilidade do dever cumprido e do bem-fazer pode dar, a Direcção actual da Beneficente, como reflexo de todos os que passaram por essa função, vai fazendo crescer esta Obra, tão importante para todos nós. As obras desta dimensão são fruto de um querer comunitário e cada um de nós deve sentir-se responsabilizado por cada um dos dias que marcaram os 100 anos da Beneficente. Ninguém está dispensado de dar o seu contributo a instituições que fazem do outro um nosso irmão! Que a Beneficente continue a ser um dos faróis de solidariedade da Póvoa de Varzim, como reflexo de uma sociedade que queremos mais justa! Obrigado a todos pelo contributo único.
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Presidente da UDIPSS -Porto Pe. Lino Maia A Beneficente: UM MODO DE ESTAR NA VIDA A rica história de A Beneficente - Associação de Solidariedade Social, fundada em 1 de Janeiro de 1906, é um manancial em que sobressai a entrega voluntária a sensibilidades, a capacidades de intuir necessidades e projectar respostas, a sonhos, a propósitos e a ideias. Sobressai, ainda, um manancial de entrega e dádiva de tempo de vida, que tem sido feita na base de uma dinâmica própria, que tem levado à concretização de múltiplas acções, na sua grande maioria com resultados concretos e palpáveis na melhoria das condições de vida de muitos cidadãos da Póvoa de Varzim e das comunidades envolventes. Da história de A Beneficente, sobressaem também os tons de um tempo e de uma prática de inegável virtude: de saber crer, saber querer, saber fazer. Essa ciência de saber crer, saber querer e saber fazer tem assentado numa cultura, ou numa forma de estar na vida, em que se foram desenvolvendo valores como os da fé, de vontade, da justiça, da verdade, da persistência, da teimosia... São estes valores e estes saberes - valores e saberes de natureza e virtude - que moldam ao que é hoje a realidade de A Beneficente, particularmente, dos seus voluntários e voluntariosos dirigentes. É uma realidade que assenta numa prática que tem sido desenvolvida ao longo de décadas, com postura perante a vida e perante os problemas e os dramas sociais, solidificando-se e adaptando-se às realidades, às necessidades e às vicissitudes de cada época. A realidade de A Beneficente individualiza-a das demais instituições congéneres. A sua vida foi caldeada de acordo com os padrões culturais da terra que a quis como sua. A sua vida precisou, criou e fomentou graus de liberdade que estimularam a capacidade imaginativa e criadora que permitiram o florescimento permanente de A Beneficente. A Beneficente ajudou a reconstruir à escala da rua, do bairro, do aglomerado ainda maior da cidade, aquela rede social em que o homem para satisfazer as necessidades da sua personalidade sai do isolamento. Deu claro contributo para construir a cidade, lugar de existência dos homens e das suas comunidades ampliadas, citar novos modelos de vizinhança e de relações, descortinar uma aplicação original de justiça social como uma tarefa de todos. A centenária Beneficente é uma associada da União Distrital do Porto das Instituições Particulares de Solidariedade Social (UDIPSS-Porto) que muito honra...
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União Distrital das Instituições Particulares de Solidariedade Social
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mensagem do Associado n. 1 Alberto Brandão de Campos Matos Solicitou-me a Direcção de “A Beneficente” que, na qualidade de sócio mais antigo desta Instituição, desse sucintamente o meu testemunho, referente aos anos que na mesma servi, e que foram de 1944 a 1965 como membro da Direcção e de 1966 a 1982 como Presidente da Assembleia Geral. Durante a minha permanência nos quadros directivos foi edificada a Sede actual, bem como bairros sociais, nomeadamente o da Mariadeira e o das Moninhas. A partir de 1953 a Associação teve um grande incremento no serviço das refeições gratuitas, que passaram a contemplar cerca de 400 utentes diários. Os bairros sociais construídos na década de 60, que eram constituídos por 26 habitações no da Mariadeira e 5 no das Moninhas, acolheram bastantes famílias - muito necessitadas - que lá se mantiveram até 1999. Com a maior satisfação tenho vindo a notar o grande desenvolvimento que esta Instituição tem tido, principalmente a partir de 1983, com a construção do edifício “Monsenhor Pires Quesado”, a aquisição do edifício “Santo António” e a remodelação do mesmo. Do mesmo modo, verificou-se uma considerável melhoria nas instalações do edifício-sede com o aumento do espaço coberto, onde se encontra instalado o Salão Nobre que era uma grande lacuna da Instituição. Após o que acima refiro, é de assinalar um notável aumento nos serviços que “A Beneficente” vem prestando, fruto de um trabalho - que nunca é demais realçar - da Direcção que se encontra à frente dos seus destinos. Que assim continue são os meus votos e que a Instituição se possa no futuro manter como até aqui, prestando a melhor ajuda aos mais carenciados.
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mensagem do Presidente da Assembleia Geral Dr. Manuel Quintas CENTENÁRIO DE “A BENEFICENTE” Estamos a celebrar os 100 anos de “A Beneficente”, Instituição de Solidariedade Social Poveira. Cumpre em primeiro lugar recordar o Grupo Beneficente - Companheiros do Bem que criaram esta Associação: Francisco Gomes Amorim, Cândido Landot, Adolfo Baptista Gomes Ferreira, Cândido Tinoco Guimarães, Valdemiro Figueiredo, Belarmino Gomes Ferreira, António Gomes Ferreira, Adelino Pereira Baptista, António Baptista Gomes Ferreira e Manuel Pereira Dias. Isto vem provar que quem serve esta Instituição de Solidariedade Social fica para sempre ligado à história destas instituições, à história da própria Póvoa de Varzim. É também uma prova de que nas Instituições de Solidariedade Social, como diz o grande escritor Correia Pinto, existe realmente uma solidariedade profunda entre os vivos e os mortos. “De idade em idade, de geração em geração, a fé, a dedicação e a solidariedade de uns como que revive na fé, na dedicação e na solidariedade de outros. Por ser de todos é que a obra perdura florescente e bendita. Felizes os vivos que têm essa compreensão, este sentido de vida. Felizes os mortos que na terra não deixam apenas cinzas.” 100 anos se passaram e aqui estamos a recordar os benfeitores que fundaram “A Beneficente”. Poucos serão aqueles que passado um século vêem o seu nome lembrado e as suas vidas e pessoas recordadas. Bem hajam pelo que fizeram a bem do próximo para lhes matar, então, a fome que grassava na nossa terra. Mas se fossem vivos, como estariam orgulhosos de ver “A Beneficente”, pois hoje são muitas as valências que “A Beneficente” desenvolve a favor das Gentes Poveiras. Cada uma preenchendo uma lacuna da nossa terra no campo da solidariedade social, desde a infância à velhice.
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Desde o sector educacional, onde encontramos os infantários, os jardins-escola e os centros de ATL, podendo-nos alegrar com a alegria e o amor dos bebés e das crianças. Que dizer da manutenção da chamada “sopa dos pobres” onde diariamente se atende tantos necessitados que, aqui, encontram o prazer de uma boa refeição. Quanta valia não tem a assistência e apoio domiciliário onde se presta serviço e apoio a tantos doentes e idosos, dando-lhes, para além de serviços de alimentação e higiene, o conforto da palavra amiga. O centro de dia, ponto de encontro dos mais velhos que lhes serve para matar a solidão da vida e encontrar o calor dos amigos e apoio da instituição. Muitos serviços presta “A Beneficente” à gente que vive na Póvoa de Varzim. Servi-la é, pois, não só ter orgulho, como obrigação social de todo o cidadão. Acreditemos ou não, nos tempos modernos, onde se pensava que o estado social tudo resolvia, começa-se por verificar e constatar que o Estado não pode fazer tudo e, por isso, mais do que nunca estas instituições de carácter religioso, como a nossa, vêm colmatar a ajuda à infância, à juventude, à velhice, na certeza que, por serem iluminadas por Deus e pela nossa Senhora da Caridade, perdurarão florescentes. Aqui pratica-se a Verdade do Evangelho. Tratar o próximo como nós gostaríamos de ser tratados. “A Beneficente” está identificada com a Póvoa de Varzim e é resultado de grandes e obscuras dedicações. Em cada pedra dos seus edifícios poderia gravar-se o nome dos seus Benfeitores que possibilitam a sua vivência. Por tudo, apenas um agradecimento: que Deus lhes pague.
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mensagem do Presidente da Direcção António Quintas É com incontida emoção que o Presidente da Direcção, ciente de interpretar o sentimento de todos os membros dos Corpos Sociais, vê aproximar-se a consumação, já no próximo ano de 2006, de um SÉCULO na vida desta Instituição. E, no pórtico desta mensagem, as primeiras palavras são, por imperativo de gratidão e justiça, para EVOCAR a MEMÓRIA daqueles HOMENS desta Póvoa do MAR que, após um prévio trabalho de estudo in loco da calamitosa situação social então verificada e de despertar corações, talentos e vontades, decidiram enfrentar a realidade molesta e, com admirável e activa dedicação deliberaram, em reunião de 1 de Janeiro de 1906, constituir esta Associação de Solidariedade contra a “grande miséria” (sic) que assolava muitos dos habitantes “n'esta terra” (sic) - (extraído da acta da predita reunião). Aprovados por alvará do Governo Civil do Porto de 1 de Agosto desse ano os Estatutos elaborados em 28 de Abril desse mesmo ano, realizou-se a primeira Assembleia Geral em 2 de Setembro seguinte, então se iniciando a respectiva actividade social, sintetizada no binómio “LUZ e CARIDADE”, ou seja, contra a fome e contra a ignorância. Para esse grupo de fundadores que, embora de posições ideológicas diversas, se achavam irmanados no AMOR ao próximo, auto-denominados COMPANHEIROS DO BEM, para tantos colaboradores, já falecidos, que alheios a desgostos e canseiras, serviram esta instituição com a plena consciência de que o verdadeiro caminho da vida é o da solidariedade que faz dos homens irmãos, o preito da nossa respeitosa HOMENAGEM e uma prece pela PAZ das suas almas. O seu exemplo vem iluminar a celebração do primeiro centenário da BENEFICENTE, que pretendemos comemorar de forma singela mas com grande júbilo, já que 100 anos de existência constituem, sem dúvida, um marco indelével na vida de qualquer instituição particular, de fim não lucrativo, designadamente de solidariedade no âmbito do voluntariado social. E, após um século, é-nos grato constatar que a BENEFICENTE, que nasceu para serviço dos mais débeis economicamente, fazendo “convergir essa caridade” (sic - in actis) no socorro aos famintos e “desgraçados” (ibidem), tem prosseguido e concretizado esses objectivos, com uma acção e papel cada vez mais preponderantes na acção social que, sem desânimo, desenvolvem no seio da comunidade poveira. É, pois, legítimo comemorar um século de vida de altruísmo ao serviço dos mais pobres, dando tantas vezes “o peixe” a quem já (ou ainda) não pode utilizar a “cana”.
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Vice-Presidente da Direcção José Ângelo Lima O meu testemunho para a história de “A Beneficente”. Nasci na Póvoa de Varzim e os meus ascendentes, família Ferreira Barbosa, estiveram ligados às actividades culturais, políticas e religiosas na Vila da Póvoa de Varzim. Em 1908 aparece o registo da senhora D. Rosa da Conceição Ferreira Barbosa, mulher que garantiu, com a sua actividade, o serviço de refeições gratuitas a cerca de 100 pobres, e com a sua influência conseguiu a entrada avultada de valores, durante alguns meses, que se contabilizaram em perto dos mil reis, nos cofres da “A Beneficente”. O meu avô, Ângelo Ferreira Barbosa, participou com muito empenho no Orfeão Poveiro, na banda de música “Os Passarinhos” e foi um activista político no início da República, passando grandes tormentos com a implantação do Estado Novo. Em 1942 foi designado como Prior da Paróquia da Matriz, pelo Arcebispo Primaz de Braga, o padre António Cândido Pires Quesado, que era natural da freguesia de Perre, concelho de Viana do Castelo. Quando tomou posse não existia residência paroquial, pelo que a convite do meu avô foi residir na sua casa acabada de construir na Rua Cidade do Porto, mais conhecido na altura pelo “lugar do monte”, onde já existia a Capela das Dores, o Hospital da Misericórdia e o palacete da D. Cândida Frota. O padre Pires Quesado celebrou o casamento dos meus queridos e saudosos pais, tendo eu nascido quatro anos depois. Em 1944 é eleito Presidente da Direcção de “A Beneficente”, tendo tomado posse como 1.º Secretário da Assembleia Geral o meu avô Ângelo Ferreira Barbosa. Durante muitos anos a cozinha de “A Beneficente” era fornecida rotativamente pelos marchantes com establecimento no mercado da Vila da Póvoa de Varzim, sendo de destacar José Ferreira Barbosa, João Giesteira (Entrecampos), Jacinto Ribeiro e Ângelo Ferreira Barbosa. Surgiram posteriormente outros, tais como Manuel Pereira, o Rosmaninho e o Januário Brito. Estes grandes homens garantiram durante muitos anos o fornecimento de carne nas refeições de festa da Associação de Caridade. Os comerciantes da Vila da Póvoa de Varzim foram sempre o grande apoio das direcções que estiveram à frente dos destinos de “A Beneficente”. Em 25 de Janeiro de 1953, dia da inauguração do actual edifício-sede, cujas cerimónias foram presididas pelo Governador Civil do Porto e benzidas pelo Arcebispo Primaz de Braga com a presença do Presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, Capitão António José da Mota, a refeição servida foi oferecida pelo comerciante Ângelo Ferreira Barbosa, que pessoalmente dirigiu a cozinha e partiu a carne para que todos os pobres presentes tivessem direito a comer um pouco dessa “jóia” (como na época era considerada a carne). O meu querido e saudoso pai Orlando Gonçalves Lima, membro da Confraria do Santíssimo Sacramento da Póvoa de Varzim, pessoa muito ligada à paróquia e em especial ao Prior Pires Quesado (meu padrinho de baptismo), também passou a pertencer aos corpos sociais de “A Beneficente”. Passei a frequentar desde pequeno as instalações da Associação, principalmente a cave onde estavam montadas duas mesas de ping-pong e onde as crianças, aos sábados e domingos, tinham a catequese (onde se aprendia a doutrina da Igreja) - por falta de espaços na Igreja Matriz. Também os escuteiros e outros organismos da Igreja como a JOC e a LOC
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tinham reuniões e preparavam as festas que realizavam no salão paroquial. É nesta altura que aparece a Laurinda Poças, ainda costureira da modista D. Felicidade, e que nas horas disponíveis se dedicava às actividades culturais da Igreja Matriz. Orientou muitos jovens e com o seu entusiasmo e dedicação levava todas estas crianças a gostar de participar nos teatros e nas festas religiosas. “A Beneficente” era o local de apoio para muitas actividades com jovens, tendo estes sempre a ajuda das irmãs da Divina Providência e Sagrada Família, comunidade residente no edifício da Associação. Passei a minha adolescência no bairro da Matriz e participei em muitas destas actividades pelo que “ A Beneficente” era ponto de passagem e de convívio. Em 1968, numa das mais graves crises por que passou a confraria do Santíssimo Sacramento da Póvoa de Varzim, fui chamado pelo meu saudoso padrinho Monsenhor Pires Quesado para integrar a mesma. Como juíz ficou o Sr. Américo Lopes, como secretário Manuel Furtado, como tesoureiro Armando Sousa e vogais Manuel Pessoa e José Ângelo Lima. Todos estes homens estiveram ou estão ligados aos corpos sociais de “A Beneficente”, uns no tempo do Monsenhor Pires Quesado e outros depois de 1983 com António Quintas. Os graves problemas que a Associação atravessou entre os anos de 1975 e 1982 levaram ao desaparecimento de muita documentação, o que tem dificultado seriamente o estudo da história da Associação até 1983. Os dados existentes na Associação resumem-se ao Livro de Actas da Assembleia Geral, cuja primeira narração é de 1905, onde encontramos a pouca história existente e contendo folhas em que nada foi escrito. A minha formação humanista e religiosa advêm da família onde nasci, cuja dedicação pelo bem-estar dos pobres era uma preocupação constante. A minha saudosa avó Elvira Gomes - pessoa muito estimada na classe piscatória pela ajuda que dava quando o mar não permitia saída para a faina da pesca - “fiava” (agora diz-se conceder crédito) a carne que fornecia até que as famílias tivessem possibilidades de pagar. Dizia muitas vezes “o que uma mão dá a outra não deve saber para fazer melhor”, perdoando quando sentia a miséria em que a família vivia. As “Freirinhas d’ A Beneficente” - como ela dizia - levaram muita coisa aos pobres que frequentavam o refeitório da Associação, para que nada lhes faltasse. Tudo isto me era transmitido durante o jantar, pois ficámos a viver com os meus avós a partir de 2 de Setembro de 1957, data do falecimento dos meus pais. Sentia neles uma grande preocupação para que nada nos faltasse, mas sempre com a recomendação de não estragar o que quer que fosse, pois fazia falta a muitas crianças que nada tinham para comer. Em finais de 1976 fui convidado por José Edgar Vilaça para integrar os Corpos Sociais da Santa Casa da Misericórdia da Póvoa de Varzim. Esta secular Instituição da Igreja tinha passado por tempos muito difíceis e era necessário encontrar pessoas disponíveis para governar a Irmandade, pois o Hospital tinha sido ocupado pelo Estado. A Mesa Administrativa teve como Provedor o Dr. José Trovão, como Vice-Provedor Manuel Carvalho da Silva Pereira, como Secretário o Eng. Joaquim Lima Pereira e como Tesoureiro António de Aguiar Quintas, havendo ainda mais cinco Mesários, sendo eu um deles. Passamos um triénio muito difícil (1977-1979), pois não tínhamos acesso à documentação, e estávamos confinados à sala de “Despiolhamento” do hospital por nos terem recusado outro espaço, apesar de sermos os representantes dos donos do Hospital.
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A “A Beneficente” desde 1974 que não tinha uma direcção na plenitude das suas funções, em virtude da intromissão das autoridades políticas surgidas após o 25 de Abril. Tudo era feito e controlado por António Arnaud, que era o escriturário nos tempos-livres e que apoiava o Monsenhor Pires Quesado como Presidente da Direcção. As funcionárias do Jardim-escola Santo António aguardavam muitas vezes pela presença do escriturário para manterem em funcionamento aquela valência, e as Irmãs da Caridade viviam e governavam a casa à custa dos benfeitores, mantendo assim o fornecimento de refeições diárias gratuitas aos pobres. Em Maio de 1982 ocorre o óbito do Monsenhor Pires Quesado numa clínica de Viana do Castelo, onde dias antes a Confraria do Santíssimo Sacramento o tinha visitado na companhia do Bispo Resignatário de Portalegre e Castelo Branco D. Agostinho de Moura e do Padre Gusmão, tendo transmitido ao doente votos de uma rápida recuperação. No Verão de 1982, dois elementos do Conselho Directivo do Centro Distrital da Segurança Social do Porto solicitaram à Mesa Administrativa da Santa Casa da Misericórdia da Póvoa de Varzim uma reunião urgente. Foram recebidos pelo Vice-Provedor Eng. Joaquim Lima Pereira e por um Mesário, tendo apresentado a situação por que passava “A Beneficente”. Disseram que tinham feito todos os esforços para arranjar uma lista de sócios para os Corpos Sociais, mas as diligências efectuadas não surtiram efeitos práticos, pelo que tomaram a decisão de encerrar a Associação e integrar o espólio na Santa Casa. Ambos ficámos muito surpreendidos mas de imediato reagimos e manifestámos o nosso desacordo perante tal proposta. “ A Beneficente” - para ambos - era uma Associação fundamental para a Póvoa de Varzim, com um rico historial e prestava serviços de relevo à população carenciada do concelho. Como sabíamos que António de Aguiar Quintas fazia parte dos Corpos Sociais de “A Beneficente”, informámos os representantes da Segurança Social que iríamos diligenciar junto deste membro da Mesa Administrativa e oportunamente daríamos conhecimento da nossa posição. António Quintas, ao tomar conhecimento do que se tinha passado, ficou muito preocupado, dizendo que a sua vida de industrial não lhe permitia estar nas duas IPSS, mas que não queria participar directa ou indirectamente no encerrar da Associação. No seguimento da conversa, foi proposto que deveria ser eu a tomar a iniciativa de encontrar sócios para constituir os Corpos Sociais. Respondi que a Instituição era merecedora do meu esforço e empenhamento mas teria de contar com a colaboração de três pessoas, que seriam o Eng. Lima Pereira, António Quintas e Joaquim Figueiredo, sendo que António Quintas teria que ser o Presidente da Direcção. Tendo sido aceite a minha proposta foi comunicado à Segurança Social que tínhamos encontrado pessoas que estavam disponíveis para reorganizar a Associação e preparar eleições. Com a colaboração de Joaquim Figueiredo, tomámos conhecimento da real situação da Associação que nos foi transmitida pelo escriturário António Arnaud (que na altura se encontrava doente). Ficámos admirados quando nos foi dito que só existia o livro da Assembleia Geral e poucos mais documentos, pois tudo tinha sido destruído por incúria de alguém que solicitou às “Freirinhas” uma limpeza à sala da Direcção. Foi-nos entregue um livro que registava o “Deve e o Haver” com folhas rasgadas e sem saldo de tesouraria, informando
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também que a conta bancária estava encerrada. Sem documentos e sem dinheiro, tivemos um trabalho difícil e árduo para encontrar sócios, obter dinheiro para pagar aos funcionários e manter os serviços a funcionar. Em Janeiro de 1983 tomaram posse os Corpos Sociais para o triénio 1983-1985, voltando a Associação à normalidade estatutária. Não posso deixar de enaltecer a colaboração, o empenho e a dedicação de Alfredo Aranda Monteiro, tesoureiro da Direcção, pois sem a sua cumplicidade não era possível o meu empenhamento num trabalho tão desgastante e que obrigava a muitas horas diárias. Sempre me apoiou no local de trabalho e autorizou a minha ausência para tratar de assuntos da Associação. Também só foi possível o trabalho realizado porque a minha esposa e o meu filho assim o permitiram, ficando muitas vezes sozinhos para eu me dedicar à “A Beneficente”. A estes se deve um pouco da história da Associação, pois esta poderia ter encerrado aos 76 anos de existência por falta de sócios e de alguém que tomasse as rédeas da gestão. Caro amigo Presidente António Quintas: a sua passagem por esta Associação nos quarenta anos que a serve são uma parte da sua história assim como o seu antecessor Monsenhor Pires Quesado. Ambos representam 60 anos de Direcção desta Associação e um e outro, individualmente, estiveram nos períodos mais marcantes da sua história. Foram dignos sucessores dos fundadores e a ambos se devem as comemorações do CENTENÁRIO.
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um compromisso de SOLIDARIEDADE *
Arq. J. J. Silva Garcia
1. “Pobres sempre existiram e sempre hão-de existir”. Esta é uma frase que me indigna pela hipocrisia e pelo desprezo que traz na algibeira, tingida, umas vezes pelo pessimismo, outras vezes de vadia justificação. Frase que esconde os braços caídos de uma atitude derrotista e gesto que capitulou perante o que lhe parece ser uma inevitabilidade. Mas, também, frase onde se esconde o oportunismo que a alimenta, o cinismo que sabe que a pobreza tem causas concretas, e que elas se encontram na forma como se estrutura e organiza a sociedade nas suas diversas vertentes, com destaque para o modelo económico. 2. Há cem anos atrás, o inconformismo de algumas pessoas fê-las juntarem-se na mesma vontade de contrariar essa frase e o preconceito que a sustenta. A Beneficente terá nascido assim, diante de uma pobreza mais dura que a de hoje, porque era necessária e urgente. Não resolveu nem resolve o problema estrutural, é certo. Mas, enquanto os desprotegidos aprendem a pescar, usando a cana de pesca que vai sendo possível, é preciso alimentar-lhes o corpo e a alma. Os cidadãos que, durante um século, têm emprestado o rosto e as mãos A Beneficente têm ajudado a que a vida dos desprotegidos seja menos cinzenta e se aproxime do calor colorido da felicidade. Se surgiu há cem anos com o intuito de minorar o sofrimento dos mais carenciados, vemos, igualmente inconformados, que a sua missão original continua a estar na ordem do dia. A Comissão Nacional de Justiça e Paz, da Igreja Católica, considera inaceitável que não tenha havido uma redução substancial da pobreza, apesar do progresso económico dos últimos 30 anos e das ajudas comunitárias; cerca de dois milhões de portugueses são pobres e uma parte deles nunca teve situação diferente, porque a pobreza se tornou hereditária. Esta intolerável chaga social acentuou-se nos últimos anos, em grande parte devido a salários e pensões muito baixos e, agora, devido a um dramático aumento do desemprego, consequência de uma lógica monetarista que não reconhece humanidade aos seres humanos. 3. É bom existir A Beneficente, mas estou convencido que, no íntimo das mulheres e dos homens que a corporizam, o desejo projecta o dia que tornará esta instituição num outro espaço, com outra missão. Nesse dia, a frase que nos repugna apagar-se-á envergonhada, porque apenas serviu para atrasar a História. Nesse dia todos terão, de facto, as mesmas oportunidades e o direito à felicidade. 4. A pobreza combate-se também no campo do imaterial. Do passado anterior ao 25 de Abril herdámos uma baixa formação escolar e cultural da população. Como refere José Paulo Serralheiro, “o ciclo da pobreza escolar é semelhante ao ciclo da pobreza em geral. As famílias pobres têm dificuldade em não produzir filhos pobres. As famílias de baixa ou nula escolarização tendem a reproduzir tal situação nos seus descendentes. O sistema de ensino, formação escolar e educação social, são chamados a contrariar estas tendências”. Desde a sua fundação, a Beneficente evoluiu para novas vocações, desempenhando hoje um papel inestimável na formação, ao nível do pré-escolar. Este primeiro nível pedagógico é indispensável como alicerce do crescimento intelectual e cívico dos cidadãos.
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Espaço que importa estimular, deve abrir-se renovadamente à missão de assegurar um elevado nível pedagógico a quem tem meios de acesso, mas, sobretudo, a quem, tendo dificuldades económicas, aí pode encontrar o fermento de novas competências e os instrumentos da sua autonomia. 5. No tempo centenário da sua fundação, com optimismo, o desafio para todos nós e para A Beneficente continuará a ser ir rasgando a frase com que iniciei este texto. Isso passa por travar uma luta implacável e sem tréguas para que cada pessoa possa encontrar, na sociedade a que pertence, condições para uma vida digna, nomeadamente o direito ao trabalho com garantias e justa remuneração, mas também o acesso a uma habitação condigna, à saúde, à educação e à segurança. Para isso é urgente fazer o elogio da solidariedade e assumir um compromisso efectivamente transformador com vista ao Bem Comum.
* (Associado) Arquitecto autor do projecto de remodelação e ampliação do edifício-sede (concluído em 2000).
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breve resenha
Hist贸rica
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A Beneficente - Póvoa de Varzim, fundada em 01 de Janeiro de 1906, é uma Associação de Solidariedade Social sem fins lucrativos que tem contemplado, na sua actividade assistencial o apoio aos mais carenciados e, na vertente educacional, actividades e serviços para crianças e jovens, cumprindo os ideais dos seus fundadores. Em 20 de Dezembro de 1905, a convite de Francisco Gonçalves Amorim, reuniram-se num prédio sito na Rua da Junqueira nº 49 da Vila da Póvoa de Varzim um grupo de homens que eram os componentes do “grupo beneficente” Companheiros do Bem. A reunião tinha por finalidade formalizar e legalizar uma Associação de beneficência para “apoio aos pobres, entravados, cegos, tuberculosos, velhos, e para toda e qualquer calamidade que ocorra dentro desta Vila.” A 01 de Janeiro de 1906 realizaram nova reunião - num prédio na Rua Conselheiro Abel Andrade nº 122, propriedade de Francisco Gonçalves Amorim, pelas 10 horas da manhã - diversos cavalheiros que representavam associações, confrarias, irmandades, bem como autoridades locais a convite do proprietário da casa. Foi deliberado elaborar os estatutos e constituída a comissão provisória que teria de funcionar até a aprovação dos estatutos. Foram nomeados para esta comissão os P.e Afonso dos Santos Soares, na qualidade de Vice-Presidente da Real Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários, Laurindo Marques de Oliveira, na qualidade de representante do Jornal Estrela Povoense e o P.e José Almeida da Costa, como representante da Confraria de Nossa Senhora de Lourdes, assumindo os cargos de Presidente, Secretário e Tesoureiro, respectivamente Foram nomeados para a comissão incumbida de elaborar os estatutos Cândido Landolt (na qualidade de
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representante da Associação Mariterna e do Jornal “O Propaganda”), António dos Santos Graça (na qualidade de representante do Clube Naval) e Francisco Gonçalves Amorim (na qualidade de promotor da reunião). Os estatutos foram apresentados no Governo Civil do Porto, sendo aprovados em 01 de Agosto de 1906, ficando com a denominação de Associação de Caridade “A Beneficente”. A 02 de Setembro de 1906, no Salão Nobre da Associação dos Empregados do Comércio, reuniu-se a Assembleia Geral, a convite do Presidente provisório P.e Afonso dos Santos Soares, para se tratar da eleição dos Corpos Sociais, que teriam de gerir a Associação até 30 de Junho de 1907, bem como tratar-se de diversos assuntos. Foram eleitos os primeiros Corpos Sociais entre os sócios presentes: Assembleia Geral Presidente: Dr. João Alfredo de Carvalho Braga 1º Secretário: Dr. Arnaldo Gomes Pereira Baptista 2º Secretário: Dr. Paulino Pinto Coelho Direcção Presidente: Abade de Navais Pe. Manuel Ribeiro Castro 1º Secretário: Bernardino José Faria 2º Secretário: José Martins de Faria Tesoureiro: Severino António Rodrigues Nunes Vogais: Dr. Belarmino Gomes da Costa Pereira Pe. José Martins Gonçalves Silva Plácido de Campos Marques Foi deliberado que a Direcção eleita ficasse com todos os poderes para tal fim, bem como todos os actos que julgar convenientes para a inauguração desta Associação e respectivo Hospital.
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A Associação tem vindo, desde então, a desenvolver e a incrementar respostas sociais para a população poveira, no sentido de se diluírem os problemas sociais que emergem na comunidade, especialmente na classe piscatória. Enquanto não teve um edifício-sede, a Associação realizou as actividades num imóvel situado na Rua Conselheiro Abel Andrade nº 122, nesta cidade da Póvoa de Varzim (em frente à Escola dos Sininhos), passando depois para a Rua do Visconde (foto p. 41), antiga residência paroquial, que depois foi demolida para ser construído o actual edifício-sede (na forma inicial). A Direcção eleita em 1944 presidida pelo Pároco da Matriz, Reverendo P.e António Cândido Pires Quesado, teve como colaboradores o Tenente Luís Novais Rodrigues, Manuel Afonso Esteves, Alberto Brandão Campos Matos, Manuel Gomes Moreira Amorim, Modesto Rodrigues Maio e José Santos Ribeiro, que levaram por diante a construção do actual edifício-sede na Rua Fernando Barbosa (p. 42-43), o qual foi inaugurado em 25 de Janeiro de 1953 pelo ViceGovernador Civil do Porto Dr. Domingos Braga da Cruz, e benzido pelo Arcebispo Primaz de Braga D. António Bento Martins Júnior. Um dos momentos áureos desta Associação de Caridade situou-se na década de 50, depois da inauguração do novo edifício, que passou a servir no Refeitório, conhecido por “sopa dos pobres”, cerca de 400 refeições diárias gratuitas. Esta valência foi até Junho de 2000 orientada pela comunidade religiosa da Congregação da Divina Providência e Sagrada Família, mas por falta de vocações não foi possível manter as religiosas nesta Associação de Caridade.
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[ Homenagem às Irmãs Laurinda, Conceição e Felismina, que durante 13 anos trabalharam ao serviço dos pobres ]
A Beneficente, até aos finais dos anos sessenta, por obrigação estatuária, prestava serviços na área social com as valências “sopa dos pobres” e Balneário.
Em Outubro de 1970 é inaugurado o Jardim-Escola Santo António (p. 44-45), instalado num edifício alugado na Rua da Conceição nº 11, com a valência Pré-Primário, destinada a 75 crianças carenciadas do concelho, com idades compreendidas entre os três e os seis anos. No período de 1976 a 1985, o edifício-sede teve uma ocupação forçada, fruto da imposição das autoridades civis de então, que veio a paralisar A Beneficente na prestação de serviços na área social. O falecimento do Monsenhor António Cândido Pires Quesado em 1982 deixou a Associação sem Direcção, problema que se arrastou até à eleição dos Corpos Sociais para o triénio de 1983-1985. A Direcção eleita nesse ano foi presidida por António de Aguiar Quintas, tinha como
[“Póvoa de Varzim. Antiga Rua do Visconde (parte que hoje se denomina Fernando Barbosa). Antiga Residência paroquial. Armas Papais esculpidas em granito (tiara sobre duas chaves cruzadas) encimadas por uma cruz, conjunto escultórico que estava colocado sobre o dintel do Portão de acesso ao quintal.” BARBOSA, Jorge (1979) Reprodução fotográfica Col. MMEHPV.]
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membros efectivos o P.e Doutor António Torres, José Ângelo Lima, Alfredo Aranda Monteiro e Dr. Valdimiro Layete Maia.
Na Assembleia Geral Extraordinária de 27 de Outubro de 1984 foram aprovados os novos Estatutos, passando a denominar-se A Beneficente - Póvoa de Varzim, Associação de Solidariedade Social. A partir da década de oitenta, a Associação entrou numa nova fase da sua actividade assistencial, aumentando os serviços que prestava à comunidade poveira. No que concerne ao funcionamento e gestão, a Associação encontra-se dividida em três áreas: a social, a educativa e de apoio à família e a administrativa. É com a conjugação destas áreas que se tenta diariamente fazer cumprir os objectivos estatutários da Associação. A área educacional teve um crescimento significativo com a inauguração em 1989 do Edifício Monsenhor Pires Quesado, na Rua José Régio, onde funcionam as valências Creche, Jardim de Infância e ATL (Actividades de Tempos Livres), acolhendo cerca de duzentas e cinquenta crianças, diariamente.
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Em 1991, depois de efectuada a remodelação e ampliação do edifício-sede, foi criada a valência ATL, reconvertendo um serviço social já existente e que se encontrava a ser prestado - Refeitório - sendo um apoio para algumas crianças “recolhidas na rua” onde passavam os dias e muitas vezes noites, em virtude da situação de pobreza do agregado familiar. Hoje recebe crianças de todas as condições sociais.
A Direcção de então, reconhecendo as carências da valência Creche, mandou construir um edifício na Rua 1º de Maio, que foi inaugurado no ano de 1998, denominado Creche N. Sra. da Conceição, com capacidade para acolher quarenta crianças.
Para corresponder ao crescimento da população poveira e responder às carências dos serviços, a Direcção está a estudar a construção de um novo edifício na zona da Mariadeira, o qual terá maior e melhor capacidade para acolher as diversas valências das áreas educacional e social.
A crescente falta de espaço para acolher as crianças em lista de espera levou a Direcção a construir de raiz um edifício destinado a aumentar a capacidade de acolhimento de crianças denominado Edifício António Quintas, destinado à valência Creche.
A área social, razão principal da fundação da Associação de Caridade, tem quatro valências em funcionamento no edifício-sede: Refeitório, Centro de Dia, Balneário e Apoio Domiciliário. Presta serviço diário a cerca de duzentos utentes, mitigando a fome e atenuando o sofrimento de pessoas muito carenciadas, independentemente da condição social de cada um. A Beneficente tem uma obra social muito alargada para que as famílias tenham condições para poderem trabalhar e assim contribuírem para o bem-estar pessoal e o desenvolvimento do país. A Associação dispõe de cinco edifícios na cidade da Póvoa de Varzim onde desenvolve as várias actividade. O quadro pessoal é composto por 100 trabalhadores, sendo 29 técnicos, 34 administrativos e de apoio e 37 auxiliares. As valências no ano de 2004 prestaram serviços e apoios sociais a um número significativo de utentes: Área Social (em média/dia) Refeitório 100 utentes Centro de Dia 42 utentes Apoio Domiciliário 59 utentes Balneário 10 utentes Área Educacional ATL (actividades tempos livres) 99 jovens Creches 117 bebés (p/ dia) Pré-Primário (Jardim-Escola) 254 crianças (p/ dia)
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design ROGER AMORIM [fotografia NIFOTO]
Vamos comemorar o CENTENÁRIO da Associação, e a publicação destes elementos serão motivo para reflexão dos poveiros e das autoridades oficiais sobre a importância de A Beneficente no enquadramento e desenvolvimento da Póvoa de Varzim. A participação do cidadão em actividades sociais enquadradas no voluntariado é um dever de cada cidadão, contribuindo para a felicidade dos jovens e adultos, de modo que encontrem na sociedade os apoios de que possam infelizmente vir a precisar. Um século de vida que a Associação comemora é a prova de que os poveiros sempre dedicaram algum tempo da sua vida ao bem-estar do semelhante.
A mensagem que deixamos, nesta data festiva, é para que os poveiros se lembrem que a solidariedade social é fruto da dedicação, amor e desprendimento de todos aqueles que no voluntariado se dedicam às causas nobres. A longevidade d’ A Beneficente está dependente dos poveiros, e os nossos descendentes só poderão beneficiar daquilo que nós temos se todos trabalharem para o bem comum, e em especial desta Associação, para que possa ser festejado o segundo centenário.
O Vice-Presidente
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homenagem ao MONSENHOR PIRES QUESADO Pe. Doutor Manuel Silva Gonçalves da Fonte (O Homem, o Padre, o Cidadão - o Senhor Prior) Nascido na freguesia de S. Miguel de Pêrre, concelho e distrito de Viana do Castelo, em 11 de Maio de 1910, era filho de José Luís Quesado e de Joana Pires Gil. Ordenado sacerdote em 18 de Setembro de 1932, foi, em 30 de Junho de 1933, nomeado Vigário Cooperador de Nossa Senhora da Oliveira, em Guimarães. Em 14 de Maio de 1937, foi nomeado Arcipreste substituto, de Guimarães. Em 28 de Julho de 1942, foi nomeado Pároco de Nossa Senhora da Conceição (Matriz) da Póvoa de Varzim e, em 30 de Agosto de 1956, foi nomeado Arcipreste de Vila do Conde e Póvoa de Varzim. Em 8 de Janeiro de 1961 foi elevado à dignidade de Monsenhor. Ao fim de quase 40 anos à frente da Matriz, após 3 meses de grande sofrimento, faleceu na manhã de 3 de Maio de 1982, numa Clínica de Viana do Castelo. O seu corpo foi trasladado, na tarde do dia 3 de Maio, para a Matriz da Póvoa de Varzim. Na tarde do dia 4, celebraram-se as exéquias fúnebres na “sua” Matriz. No final destas, seu corpo foi trasladado para o cemitério da sua terra natal, onde jaz, em jazigo da família. O seu funeral foi a expressão da grande dedicação e amor daquele que era o seu povo, o povo da Póvoa de Varzim. No dia em que, a seu pedido, recebeu a Santa Unção, disse: «Quase 50 anos a administrar este sacramento aos outros… Chegou agora a minha vez de o receber também. Hoje é um dia de festa, uma festa muito grande, não esqueçais. Como Deus é bom!» Noutra ocasião, falando a custo, disse: «Muito deve sofrer na hora da morte, quem não tem fé! Quero partir com todos no coração. Mas todos. Sem ressentimentos com ninguém. Mas para a minha Igreja Matriz, onde trabalhei até tombar, para a Beneficente, os pobres da Conferência Vicentina, o Seminário, um olhar especial. A vontade de Deus seja feita». É também interessante sabermos que em 15 de Dezembro de 1935 foi nomeado Assistente do Agrupamento nº 116, do Corpo Nacional de Escutas, de Nª Sª da Oliveira, Guimarães. De 1935 a 1943, recebeu um Louvor Nacional e um Regional, participou em 11 acampamentos e na inauguração do Monumento da Independência (de Guimarães), em 1940, semelhante ao existente na Póvoa de Varzim, em frente aos Torreões. Foi Assistente do Agrupamento da Matriz e Assistente do Núcleo Cego do Maio, sucedendo ao Pe. Aurélio Faria. Foi também professor de Moral no Liceu, hoje Escola Secundária Eça de Queirós. Foi assim que marcou muitas gerações, como padre, como homem, como autoridade, como escuteiro e como professor. Foi uma figura distinta de sacerdote exemplar, muito dedicado à sua paróquia e à sua Matriz, sempre em obras de beneficiação. Construiu a Residência Paroquial e o Salão Paroquial, ao lado da igreja Matriz. Merecem actualização da memória as celebrações dos 200 anos da igreja Matriz, em 1957, com a presença do então Cardeal Patriarca de Lisboa, D. Manuel Gonçalves Cerejeira, era eu pequeno, no 4º ano da Escola Primária, mas estou bem lembrado de receber Sua Eminência na Praça do Almada, em frente à Câmara Municipal. Em 2007 celebraremos os 250 anos da nossa igreja paroquial. A Paróquia da Matriz, no reconhecimento pela sua dedicação de Pastor desta parcela do Povo de Deus que lhe fora confiada, baptizou o Centro Paroquial com o seu nome: Centro Social Monsenhor Pires Quesado da Paróquia de Nª Sª da Conceição (Matriz) da Póvoa de Varzim. Foi Presidente da Direcção de “A Beneficente”, de 1944 a 1982, deixando bem vincada a sua passagem com a
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construção da nova sede e de Bairros de Casas para Pobres, nas Moninhas e na Mariadeira (hoje desactivados, sendo as famílias lá residentes transferidas para os novos Bairros Sociais). Foi também Fundador do Jardim-Escola de S. António, à Rua da Conceição, no “casco velho” da Matriz, Póvoa de Varzim. «A Beneficente», que tantos anos dirigiram como Presidente da Direcção, perpetua a sua memória e gratidão dando o seu nome a uma das suas valências, o Jardim-Escola Monsenhor Pires Quesado, na Rua José Régio, desta nossa cidade. Foi um grande impulsionador das Conferências Vicentinas e do Escutismo Católico. Aparecia em todos os actos oficiais da nossa terra. Estava presente em todas as actividades religiosas, culturais, desportivas, recreativas e sociais. A sua presença e o seu discurso eram sempre estimados. Iniciou as peregrinações ao santuário de Nossa Senhora da Saúde, em Laúndos. Ainda hoje, com grande afluência e devoção de todo o povo da Póvoa e Caxinas, estas
peregrinações vão marcando a nossa vida religiosa, de há 53 anos a esta parte. Aquela freguesia do nosso concelho, Laúndos, em homenagem e gratidão, deu também o seu nome a uma das ruas, próxima do dito santuário. Foi o fundador do jornal paroquial, mensal, «A Voz da Matriz» que nos dá conta da vida paroquial e que, ainda hoje, se publica, mas trimestralmente. Verdadeiro amigo dos paroquianos, protector dos pobres e desprotegidos, deixou em todos os que o conheceram e com ele conviveram uma profunda saudade. Foi exemplo de desinteresse pessoal e de isenção durante os cerca de 40 anos que viveu entre nós. Às suas funções religiosas soube sempre aliar a preocupação pelos mais desfavorecidos. Com grande entusiasmo viveu na Póvoa e para a Póvoa, sempre preocupado com todos os problemas desta nossa terra que também foi sua, por adopção. Só de quando em vez ia visitar Perre, a sua terra natal, particularmente após as vindimas, donde trazia o vinho usado na celebração das missas ao longo de todo o ano. Em sua memória, a Câmara Municipal, depois de ouvida a Comissão de Toponímia, deu o seu nome a uma das ruas da nossa cidade, a 4 de Novembro de 1982. Não posso deixar de referir também que, pelo amor revelado aos mais carenciados, o MAPADI teve como sede social provisória, durante 15 anos (de 6 de Novembro de 1976 - data da sua fundação - até 1991), o salão da Residência Paroquial da Matriz, então no Largo das Dores. Também era bem conhecida de todos a sua paixão desportiva pelo Varzim Sport Club. Mal acabava a celebração da missa queria logo saber o resultado, e quando o jogo era mais importante, mandava o acólito à sacristia para saber como estava o resultado. Em períodos menos bons, futebolisticamente falando, mandava as crianças da Catequese paroquial fazer claque no estádio, durante o jogo, para o Varzim ganhar. Como em muitas outras coisas, era um homem apaixonado. Foi ele quem me baptizou e me deu a Primeira Comunhão. Foi pela sua mão que dei entrada no Seminário de Braga. Durante as férias, os seminaristas tinham que vir à missa todos os dias da semana. Se alguma vez faltassem, procurava logo saber o porquê. A casa do meu pai, na Giesteira, era por ele visitado todos os anos, na altura em que as “senhoras da Senhora da Conceição” iam fazer o peditório da Imaculada Conceição para “aqueles lados” e lá almoçavam, em pic-nic. Esteve presente na minha Missa Nova, celebrada em Beiriz a 9 de Abril de 1972, onde eu, desde o falecimento do meu pai, em 1964, residia com minha mãe e irmãos. Na companhia do Monsenhor Manuel Amorim, pároco de Beiriz e meu pároco, estando eu a trabalhar na Diocese de Aveiro, fui visitá-lo à Clínica de Viana do Castelo. Foi a nossa despedida. Mas lembrome da sua satisfação ao contemplar alguém que ele tinha também ajudado a ser padre e que dele não se tinha esquecido. O Senhor Prior era a simplicidade, a delicadeza e a bondade no mais alto grau. Foi Pastor atento e pai bondoso. O seu lema foi «Servir» e a sua paixão obedecer. A muitos baptizou, uniu pelo matrimónio, ungiu com o Santo Óleo e acompanhou à morada dos mortos. Na proclamação da Palavra, nas «Missões», falava com calor e entusiasmo; era curto e conciso na mensagem; contagiava quando se referia à Mãe do Céu; era eficaz no ralhete ou no dobrar da orelha (nos tempos da catequese) tantas vezes merecido. No centenário de “A Beneficente”, com muita alegria me associo a este evento e é com muito prazer que vos falo do também “meu” Prior. Honra ao mérito e Paz à sua alma. Foi um Grande Homem dentro dum homem grande! Grande Padre, o Senhor Prior! Grande Amigo! Grande Pastor! Grande Servo do Senhor e do Seu Povo!
ÁREA SOCIAL *
Aida Maria Campos Ferraz
De um Refeitório para Pobres desde 1906 para a abrangência à 3ª idade a partir da década de 90 Caminhamos, seguramente, para uma sociedade diferente da que conhecemos até agora e onde os padrões institucionais de actuação terão que se adequar às mudanças proporcionadas pela Revolução Silenciosa das estruturas demográficas. O fenómeno do envelhecimento demográfico, uma questão de estudo actual, merece uma reflexão aprofundada em várias vertentes. A esperança de vida aumentou, devido ao avanço científico e tecnológico com grande expressão no campo da Saúde e da Economia. Embora o cenário não seja o melhor, o envelhecimento é um fenómeno positivo e um desafio que as sociedades enfrentam. Portugal e mais propriamente, o concelho da Póvoa de Varzim, não foge à regra, o problema da longevidade em que as pessoas vivem mais mas que têm dificuldades de sozinhas gerir o seu quotidiano e que com a alteração do modelo familiar e a integração quase plena da mulher no mercado de trabalho e uma vez que eram as mulheres as principais cuidadoras dos seus familiares dependentes, faz com que este modelo, tenda a entrar em crise. Assim, há que planear e incrementar a criação de serviços de apoio à população dependente. A Beneficente, como instituição de utilidade pública, tem estado atenta a esta problemática tendo, desde 1991, em funcionamento um serviço de Centro de Dia e de Apoio Domiciliário de apoio à população poveira. Houve necessidade de avaliar o que era pedido criar, apoios aos idosos, confrontando-nos com o estigma de uma Instituição criada com o fim de “receber pobres” e operacioná-la para estas problemáticas sociais actuais - 3ª Idade e 4ª Idade. Houve necessidade de desenvolver numa estrutura física, com cerca de 80 anos, serviços, tendo em conta as necessidades das pessoas dependentes, adaptando-se as infra-estruturas com equipamentos e meios técnicos personalizados. Presentemente, apoiamos cerca de 50 utentes idosos em regime de Centro de Dia, onde usufruem de transporte, higiene pessoal e tratamento de roupa, apoio à medicação, pequeno-almoço, almoço, lanche e pequena refeição para levarem para o jantar nos seus domicílios. Ao longo dos dias são estruturadas actividades ocupacionais em que a informação, o movimento, a ocupação estão sempre presentes. Consegue-se assim que esta população esteja inserida no seu ambiente familiar mas sempre acompanhadas de estímulo às suas necessidades. Nas dependências, que já dificultam a saída ao exterior de suas casas, temos um grupo de cerca de 60 utentes idosos que permanecem nos seus domicílios, mas onde diariamente lhes são fornecidos pelas nossas equipas de ajudantes familiares, o apoio às suas higienes pessoais e de conforto, tratamento de roupas, alimentação, informação e quando necessário o acompanhamento ao exterior a necessidades que surjam para resolver tentando-se assim que estas pessoas quebrem o seu isolamento com o exterior ou então esse apoio surge em parceria com os familiares para que estes possam continuar na sua vida activa sem sentirem o seu familiar dependente como um elemento perturbador e limitador às suas vidas.
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Foi necessário ao longo destes anos não sermos demasiado optimistas, nem demasiado pessimistas, mas tentamos estar vigilantes e activos de forma a criarmos e adaptarmos as estruturas de apoio e vocacioná-las a servir da melhor forma as necessidades que se nos impuseram. Para enfrentar o futuro há necessidade de mais apoios logísticos. Não necessariamente grandes estruturas, mas pequenas estruturas capazes de resolver os problemas. E investir, numa forma mais personalizada dos recursos humanos de modo a continuarmos atentos e vigilantes a um tipo de sociedade, que exige cada vez mais e melhor na sua forma de estar na longevidade. * Técnica Superior de Serviço Social
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1-2. serviço de Apoio Domiciliário 3. festa de Carnaval (pavilhão municipal), Fev 2001 4. Dia Mundial do Idoso, Out 2000 5. passeio a Fátima, Jul 2000 6. Festa Sénior (Passeio Alegre), Ago 2001 7. passeio à Maia, Jun 2001 8. Festa da Solidariedade Social (Guimarães, 2002)
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mensagem da “SOPA DOS POBRES” O Refeitório A população poveira no início do século XX tinha como classe dominante o pescador, homens que lutavam para, na faina da pesca, ganhar o sustento para manter a família que normalmente era numerosa. Em 1905 a população da Vila da Póvoa de Varzim atravessava uma grande crise económica, deixando muitas famílias com fome e sem meios para tratar da saúde. Um grupo de homens de bom coração, entre os quais se encontravam sacerdotes e juízes de confrarias decidiram criar a “A Beneficente”, associação de caridade com a finalidade de prestar ajuda a “pobres, entrevados, cegos, tuberculosos, velhos e para toda e qualquer calamidade que ocorra dentro d'esta villa”. Assim foi dado início ao serviço de refeições gratuitas denominado”sopa dos pobres” (foto 30-31), que se manteve ao longo destes cem anos de existência da Associação. Muitas famílias poveiras reconhecem que o apoio social recebido de “A Beneficente”foi primordial para que hoje ainda façam parte da população activa e afirmam que estão reconhecidos por encontrarem apoio na Associação nos tempos difíceis que passaram. O refeitório serve muitas refeições mas a maior frequência foi no período de 1939 a 1945 (à esq.) e nos anos cinquenta, já nas instalações da actual sede com o apoio das Irmãs (p. 40) da Comunidade da Divina Providência e Sagrada Família. No século XXI a função do refeitório é mais complexa, pois além das refeições diárias que disponibiliza, também tem que prestar assistência ao agregado familiar. Mitigar a fome é um dever da Associação conforme determina o Estatuto mas os “pobres” de hoje obrigam a maior caridade social pelo que A Beneficente está preparada para acompanhar estas novas problemáticas. O refeitório (p. 60-61) presta serviço a famílias carenciadas, abrangendo todo um conjunto de respostas que vão ao encontro das dificuldades actuais dos carenciados. Esta valência social mantém a importância que lhe foi dada pelos fundadores e é fundamental para muitas famílias poveiras.
Susana Teixeira, Técnica Superior de Serviço Social
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Área Educacional JARDIM-ESCOLA Sto. ANTÓNIO Rua da Conceição, 11 «Todas as pessoas grandes começaram por ser crianças 1 (embora poucas se lembrem disso).»
se deparariam, consequência natural do recrudescimento sustentado de uma nobre Instituição que se confunde com a história recente da cidade.
Os cravos ainda não tinham sido colocados nos canos das espingardas e a Liberdade ainda não tinha sido gritada e festejada no País quando, em Outubro de 1970, foi inaugurado o Jardim-Escola Santo António (p. 44-45), pertencente à Associação “A Beneficente”, o primeiro a funcionar no concelho da Póvoa de Varzim e um dos primeiros no distrito do Porto. No número 11 da rua da Conceição, na parte mais antiga da cidade, e divinamente vigiada pela torre da Igreja da Matriz, abriam-se as portas às crianças que haveriam de se tornar grandes e não mais se esqueceriam que um dia tinham sido pequenas e crianças, beneficiando do superior cuidado e superior atenção que lhes foi, é e continuará a ser, concedido por todos quantos passaram, passam e passarão pela Instituição, cumprindo com desvelo normas, códigos e deveres propostos e defendidos desde o dia em que as chaves foram colocadas pela primeira vez na fechadura, permitindo o acesso a um admirável mundo novo. Casa antiga, no começo, singular e originalmente conhecida e reconhecida como a casa Santo António, a adaptação e remodelação impuseram-se, para funcionamento exemplar de um jardim-escola destinado, inicialmente, a 75 crianças carenciadas do concelho, com idades compreendidas entre os três e os seis anos. As folhas do calendário foram sucessiva e naturalmente arrancadas, a um ritmo voraz, vertiginoso e inexorável, sem que, porém, os ideais primários consignados no livro de estilo da Instituição sofressem qualquer abalo, alteração ou reformulação, prova real e cabal de uma integração e aceitação totais na/pela sociedade poveira. Até que a 13 de Junho de 1996 se celebraria o 25º Aniversário, momento exaltante e marcante, também indiciador das novidades que
[ Celebração do 25º Aniversário ]
Em 2000, em plena viragem do século, a casa antiga, a casa Santo António, seria, então, demolida. Ficaria somente a fachada e, claramente, uma história de sucesso que pó algum de tijolo e pedra demolidos conseguiriam apagar. Melhor de tudo: a história conheceria a partir dessa data novos e intensos episódios, depois de reconstruído todo o interior e de reaberto o Jardim-Escola a 26 de Dezembro de 2002.
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De cara lavada e extremamente cativante, com espaço arejado e amplo, estavam reunidas todas as condições necessárias para a realização e prossecução de actividades pedagógicas. «O processo de ensino-aprendizagem é predominantemente orientado pelos princípios de igualdade de oportunidades educativas e sociais a que todos os alunos sem excepção 2 têm direito.» Com a valência única de Jardim, um total de 100 crianças gozam e desfrutam de condições singulares, devidamente sublinhadas pelas quatro salas pedagógicas. Constituída por 15 funcionárias (com idades entre os 22 e os 55 anos), a equipa pedagógica é formada por uma Educadora Coordenadora, quatro Educadoras, cinco Auxiliares da Acção Educativa e cinco Auxiliares de Limpeza. Herança, testemunho ou simplesmente ilustração perfeita do ambiente salutar e saudável e da atmosfera também entusiasmante que aqui se vive, parte significativa das funcionárias já estão ao serviço desta valência há bastantes anos - mérito e curiosidade extrema: há quem chegue a atingir os 22 anos de serviço. Encarado como alguém que arranca de dentro da criança e potencializa essas qualidades descobertas, ajudando-a a expressar-se conveniente e eficazmente, o Educador do Jardim-Escola Santo António não orienta, não diz como ser, como fazer, não conduz, não diz por onde e como seguir. O Educador não transmite saberes - antes incentiva a criança à descoberta, facilita a experiência, questiona e harmoniza as situações, em suma, transmite mais e melhor. O saber ser, saber estar e saber agir emergem inevitavelmente como características essenciais do Educador. Traços gerais sumariamente esboçados, história necessariamente resumida, o “Era uma vez...” múltipla e
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encantadoramente escutado entre as quatro paredes da casa Santo António intromete-se quase involuntariamente num relato que adquire cor e alegria suplementares concedidas pelas crianças, obviamente protagonistas nesta narração, desde a hora a que se nos entram pelo Jardim adentro até à hora a que ternamente se despedem, preparados para nova etapa de uma vida que ficará indelevelmente marcada pela passagem e convivência certamente inolvidáveis no número 11 da rua da Conceição. Privilégio inerente a uma rotina que jamais se repete, cansa ou fastidia, que jamais se torna... rotineira.
Do mero acolhimento às actividades pedagógicas propostas, das brincadeiras aos necessários hábitos de higiene e de alimentação, das visitas e actividades extracurriculares (ballet, natação, educação física, funk, música...) às festas de época, sem olvidar o indispensável intercâmbio jardim/família/comunidade, é todo um cenário luminoso e encantatório aquele que se ergue, envolve e acompanha o crescimento das crianças. Para que estas quando forem grandes nunca se esqueçam de que um dia começaram por ser crianças! 1 2
O Principezinho, de Saint-Exupéry Documento de trabalho nº.1, do Dep. da Educação Básica, M. E.
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Área Educacional JARDIM de INFÂNCIA Mons. PIRES QUESADO Rua José Régio, 197 Iniciou a sua actividade no lectivo 1988/1989, com 3 salas de creche, 4 salas de jardim de infância e 1 sala de ATL. O nome dado ao edifício pretendeu homenagear o Monsenhor Pires Quesado, Prior da Paróquia da Matriz que presidiu aos destinos da Associação cerca de 40 anos. Actualmente é constituído por 12 salas pedagógicas e por amplos e diversificados espaços comuns, como dois salões polivalentes, um pavilhão, um recreio exterior e um pequeno campo de jogos.
[ Lançamento da primeira pedra, 15 Mar 1986 ]
O Jardim de Infância Monsenhor Pires Quesado é uma ampla estrutura educacional constituída pelas valências de creche, jardim-de-infância e ATL, que procura sustentar toda a sua actividade em princípios que potenciem a prestação de um serviço de cariz educativo de qualidade, na prossecução dos objectivos definidos para este nível educativo e o necessário e imprescindível apoio social à família.
O edifício foi inaugurado em Março de 1989 pelo Min. do Emprego e Segurança Social, Dr. Silva Peneda e benzido pelo Arcebispo Primaz de Braga D. Eurico Dias Nogueira.
Desenvolve várias actividades e serviços, abrangendo uma população total de 240 crianças de diferentes faixas etárias na prossecução dos seus objectivos. Encontra-se dividido por três valências, de forma a responder adequadamente às necessidades e interesses dos diferentes grupos de crianças e jovens.
A creche é uma valência constituída por três salas de actividades, que procura garantir um atendimento individualizado e as condições essenciais a um desenvolvimento físico e mental saudável, num período de vida das crianças (dos 0 aos 3 anos), em que um clima familiar afectivo e emocionalmente estável, calmo e seguro é decisivo no seu desenvolvimento.
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A valência de jardim de infância é constituída por seis salas pedagógicas e destina-se a crianças entre os 3 e os 6 anos. Constitui um espaço estruturado em função dos interesses e necessidades das crianças, onde se privilegia a actividade lúdica e através dela se constrói o conhecimento, se desenvolvem competências e destrezas, se aprendem normas e valores e se promovem atitudes úteis à construção de relações positivas entre pares e ao desenvolvimento integral da criança. O ATL (centro de actividades de tempos livres) destinado a crianças entre os 6 e os 10 anos é um espaço que pretende dar continuidade ao trabalho realizado na valência de jardim, no que se refere às oportunidades, agora mais complexas, de desenvolvimento global, para crianças cuja maior parte do tempo é absorvido pela escola de Ensino Básico. Pretende-se apoiar a família no que diz respeito às obrigações escolares e fomentar a construção de pequenas comunidades infantis no interior das quais se criem e negoceiem regras de relação, de respeito mútuo e atitudes de compreensão e inter- ajuda.
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No presente ano lectivo, 2005/2006, decorre o processo de estruturação do novo projecto pedagógico denominado “Cidadania e Multiculturalidade”, com o qual se pretende promover uma perspectiva de educação multicultural, na aceitação da diferença social, étnica, cultural e sexual como meio de promoção da igualdade de oportunidades num processo educativo que respeita diferentes formas de ser e de saber, para dar sentido à aquisição de novos saberes e culturas. Pretende-se, ainda, investir na promoção da educação para a cidadania, baseada na aquisição de um espírito crítico e da interiorização de valores de formação pessoal e social essenciais à vida em democracia.
Carla Sofia Machado (Educadora/Coordenadora)
Área Educacional ATL SEDE Rua Fernando Barbosa, 89 Ao longo dos anos, “A Beneficente” sempre foi dando apoio à comunidade Poveira de modo a combater as carências nela existentes. No âmbito do serviço prestado na Associação, surge, no ano de 1988, um espaço que tem como principal objectivo ocupar as crianças e jovens oriundos das famílias desfavorecidas que tinham já o apoio da Associação, assim como as crianças “recolhidas da rua”. O espaço escolhido para o efeito foi o actual Centro de Dia. Tendo a denominação de ATL, era neste local que durante o dia as crianças eram formadas e educadas, recebiam apoio escolar, faziam trabalhos manuais, brincavam, etc. No ano de 1991, depois de efectuada a remodelação e ampliação do edifício-sede (foto p. 46), foi criada a valência ATL SEDE, reconvertendo um serviço social já existente que se encontrava a ser prestado pela valência Refeitório. Assim sendo, o ATL Sede surge para ocupar os tempos livres da população juvenil e promover hábitos de vida física e moralmente saudáveis. Esta resposta dimanou da necessidade, cada vez mais permanente, das famílias que frequentavam o nosso Refeitório e que depois não tinham como ocupar os filhos no período deixado em aberto pelas Escolas Primárias.
Nos dias de hoje, no centro de Actividades de Tempos Livres, intervimos tendo em conta a seguinte metodologia de trabalho: ·Planificações pedagógicas apoiadas por pessoal qualificado; ·Desenvolvimento de actividades que contribuam para um maior interesse na formação integral da criança como cidadão; ·Uma organização do dia-a-dia, promovendo a permanente participação de todos os intervenientes, incluindo as próprias crianças; ·Elaboração de programas de actividades equilibradas em equipa pluridisciplinar; ·Realização de trabalhos com moldes de gestão inovadora, flexível e transparente. O ATL tem uma função complementar e não de substituição da família e da escola. Neste ATL, temos como objectivos: ·Proporcionar um atendimento à criança num clima de segurança afectiva e física; ·Colaborar estritamente com a família, numa partilha de cuidados e responsabilidades, em todo o processo evolutivo da criança; ·Colaborar no despiste precoce de qualquer inadaptação ou incapacidade, encaminhando adequadamente as situações detectadas. Brincar e aprender a aprender é a profissão da criança. Façamos então que seja uma passagem alicerçada em conhecimentos sólidos e afectivos para que esta se torne num adulto com sentido humanista e cívico.
Maria do Céu Padrão(Técnica de Serviço Social/Coordenadora ATL Sede)
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A abertura desta valência deu-se a 01 de Setembro de 1991 na Rua Fernando Barbosa, satisfazendo-se assim um apelo às necessidades dos pais desta comunidade poveira. Esta foi inaugurada oficialmente após um ano, pelo Secretário de Estado Dr. José Luís Vieira de Castro.
O recreio tem piso anti-queda e equipamentos no exterior adaptados a este grupo etário. A capacidade das duas valências é de 70 crianças. A sua equipa de trabalho é composta por 4 Educadoras de Infância, 6 Ajudantes de Acção Educativa e 4 Auxiliares.
As novas instalações na Rua Primeiro de Maio, nº 27, foram inauguradas a 30 de Outubro de 1998, pelo Secretário de Estado da Inserção Social, Dr. Rui Cunha, e benzida pelo Arcebispo Primaz de Braga D. Eurico Dias Nogueira (foto 1).
Além de todo um trabalho projectado pelas educadoras na sua sala, com diferentes actividades pedagógicas dirigidas a esse grupo etário, temos várias actividades comuns às duas Creches: Festa de Natal, Festa de Carnaval e Festa Final de Ano/Finalistas.
No início esta valência tinha capacidade para 40 crianças com idades compreendidas entre os três meses e os três anos. Nas novas instalações, a Creche passou a ter capacidade para 60 crianças do mesmo grupo etário. Em 2005 a Creche sofreu obras de ampliação e beneficiação, com o alargamento do espaço do refeitório (foto 2) e a criação de 3 novas salas para a Creche Sto. António (foto 3).
Estas duas valências estão instaladas no edifício António Quintas, assim denominado em homenagem ao actual Presidente da Direcção.
CRECHE Lugar, espaço de brincar. Brincar, também, como sinónimo de trabalho criativo. Brincar é de uma importância crucial, porque enquanto estimula o desenvolvimento intelectual da criança, também lhe ensina sem que disso ela se aperceba, quais os hábitos mais necessários ao seu crescimento, tais como a perseverança, primeira condição para o êxito escolar. Fornece uma oportunidade ideal para a observação prolongada e sistemática de uma criança, a fim de determinar as suas presentes e futuras necessidades educacionais. Representa igualmente uma valiosa fonte de apoio, orientação e colaboração aos pais, e é lugar privilegiado para que a criança encontre tudo aquilo que em casa já não é possível, a partir de uma determinada altura: material, estímulo orientado, despontar de competências e oportunidade de experiências. O espaço, a oportunidade de brincadeiras e “brinquedos imaginativos”, adequados, as facilidades de movimentação e de estímulo, não são meramente desejáveis na idade de Creche: são essenciais. A ampliação do seu campo de experiências, de que mostra ter necessidade e proporcionar-lhe o contacto com os outros, dando-lhe a oportunidade de viver entre iguais, as experiências mais variadas. Tem também importância como pólo intermédio, permitindo à criança uma mediação adequada entre ela e o mundo. Há aprendizagem, mas sob outra forma que não a formal, o que está ligado à transmissão de conhecimentos. São “outros” conhecimentos os que aqui se adquirem. Este é o tempo de aquisição de bases de conhecimento de uma forma geral. Para além da perseverança, há também a confiança na capacidade de conseguir o que pretende fazer. Desta maneira a criança trabalha o raciocínio, a manipulação sem se aborrecer, adquire os tais hábitos de perseverança e aplicação, tira ensinamentos indispensáveis ás aprendizagens escolares futuras. As situações do dia-a-dia, servem de estímulo à aprendizagem da criança. Expor os seus trabalhos, estimula-as, valoriza-as. Tudo isto só é possível com a maior das qualidades que toda a equipe de trabalho desta creche possui: o amor à criança.
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Arminda Félix da Costa Educadora/Coordenadora
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mensagem da A IMAGEM DA CARIDADE *
Dr. Delfim Sousa
Caridade, António Teixeira Lopes (1866-1942) Caridade, trabalho encomendado a Teixeira Lopes, em 1896, por António Caetano Carvalho par o túmulo da sua família, no Cemitério de Agramonte (Porto), onde foi colocada em 1902. Caridade, pelas mãos de Teixeira Lopes, aparece-nos num registo distante da abordagem estética e iconográfica com que foi sendo tratada, até ali, por outros escultores. O Mestre retratou uma senhora de idade, com o peso do tempo espelhado nas mãos, na postura do corpo e num olhar amarrado ao infinito. Os contrastes que Teixeira Lopes executou neste grupo escultórico são notáveis. Reparemos na leveza do rosto e, simultaneamente, na força e determinação com que as suas mãos agarram as duas crianças. A nudez das mesmas, reveladora de abandono e de falta de protecção, contrasta com o peso das vestes da Velha. Por outro lado, é muito interessante a forma como o escultor conseguiu transmitir movimento à obra através da criança que, com seus braços carentes, se ergue para os ombros da sua protectora em busca de afecto. A palavra “caridade” é proveniente do vocábulo latino “caritas” que significa amor, ternura e afeição. Parece que foi nesta significação que Teixeira Lopes se baseou para representar esta figura, mais do que noutras significações que hoje estão associadas à palavra como compaixão, a benevolência, a piedade e a esmola. Teixeira Lopes aproxima-se da Caridade enquanto virtude teologal que conduz ao amor a Deus e ao nosso semelhante. Nas suas Memórias, documento de extrema importância para a compreensão da vida, da obra e do pensamento do artista, o Escultor confidencia a sua predilecção por este trabalho revelando ter consciência de que com ela operou um rompimento com convencionalismos estabelecidos: “Para que havia eu de bater o terreno já tão batido por tantos intérpretes da segunda virtude teologal? Sempre a mesma matrona de grossos seios, a dar de mamar a dois ou mais meninos? Porque não havia de ser uma velha essa caridade? Para que se sentisse bem que não tinha leite para dar, mas que podia ter afectos e carinhos para as crianças desprotegidas que, abrigando-se nos seus braços de mulher gasta, deixam ver logo que são os filhos de outra mulher. A fim de acentuar mais ainda esta impressão, resolvi vestir-lhe o hábito das irmãzinhas dos pobres; assim afastava todo o parentesco”. Com este exemplar de escultura tumular, revelador da extrema sensibilidade do artista bem como das suas preocupações sociais, o autor ganhou um Grand Prix na Exposição Universal de Paris, em 1900 evento de grande prestígio no domínio das Artes e que contribuiu para a protecção internacional de um dos melhores escultores portugueses de sempre.
* Director da Casa-Museu Teixeira Lopes
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a exposição comemorativa no MUSEU MUNICIPAL *
Deolinda Carneiro
Exposição “bene facere A Beneficente: 1906-2006 – um Século de Solidariedade” Museu Municipal de Etnografia e História da Póvoa de Varzim (26 de Novembro de 2005 a Maio de 2006) Em Outubro de 2005, o Município da Póvoa de Varzim foi convidado a associar-se às comemorações do centenário de vida de «A Beneficente» pelos corpos dirigentes desta Associação de Solidariedade Social (Presidente - António Quintas e Vice-Presidente - Ângelo Lima). A Câmara Municipal, que desde sempre apoiou esta associação (como podemos constatar pela documentação conservada no Arquivo Municipal), anuiu em colaborar nas celebrações. Sendo o dia 1 de Janeiro de 1906 a data da fundação desta Associação era desejo geral encetar as actividades quanto antes, para que, no dia da comemoração já existissem diversas acções a decorrer. Um dos projectos a realizar, entre outros, seria a organização de uma exposição em que se destacasse, particularmente, a grande diversidade de valências e apoios prestados à sociedade actual. Optou-se por realizar uma mostra alusiva à instituição de «A Beneficente», sendo o museu a organizar e montar a exposição a partir dos elementos recolhidos e seleccionados pelos responsáveis das várias secções da associação. Realizaram-se diversas reuniões em que o trabalho de pesquisa de documentos, peças antigas e selecção de fotografias foram divididos pelos responsáveis das diferentes valências. O grupo era constituído por: - José Ângelo Barbosa Gonçalves Lima (Vice-presidente); - Maria Rosália Lopes da Silva (Chefe de Secção). Coordenadoras da Área de Infância e Juventude: - Carla Sofia Oliveira Machado (Educadora); - Maria Natália de Castro Oliveira (Educadora); - Maria Arminda Marques Félix da Costa Morais (Educadora); - Maria do Céu Padrão (Técnica de Serviço Social) Coordenadoras daÁrea Social: - Aida Maria Campos Ferraz (Técnica de Serviço Social); - Sílvia Teixeira (Técnica de Serviço Social). Colaboraram ainda a Educadora aposentada: Maria dos Santos Cruz Lima de Carvalho e o Eng.º António Manuel Correia Martins. O design gráfico – com a realização de tarjas, cartazes, convites, revistas, etc. - ficou a cargo de Roger Araújo Amorim da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim (CMPV) e as fotografias complementares realizadas por José M. Flores Gomes (CMPV). A recolha de fotografias e elementos decorativos actuais foi um sucesso tão absoluto que tornou difícil a selecção das imagens a reproduzir para documentar as diversas valências. O mesmo não aconteceu para o período inicial, em que quase 1 não se encontravam objectos e fotografias originários da primeira fase da instituição .
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Existindo já publicações relativas à história de “A Beneficente”2, e apesar do Director da Biblioteca, Manuel José Ferreira Lopes, nos ter disponibilizado toda a sua valiosa recolha documental, não dispunhamos de tempo para realizar um 3 cuidadoso trabalho de pesquisa, organizando todos os dados para completar aquelas informações . Tendo sido seleccionada a sala polivalente do Museu Municipal para se realizar este projecto optou-se, então, por dividir a exposição (e a sala) em dois 4 espaços distintos: um que recordava a época da fundação e se representava um simulacro simbólico da “Sopa dos pobres” , enquanto outra, mais positiva, alegre e colorida, apresentava o tema fundamental desta mostra: documentar – com imagens (fotografias e vídeo) – as várias actividades, ou valências, desenvolvidas na actualidade (muitas das quais desconhecidas para o público em geral). Área social - Refeitório – “sopa dos pobres” - Centro de Dia - Apoio domiciliário - Balneário. Área Educacional (acolhendo centenas de crianças em vários edifícios) - ATL (Actividades Tempos Livres) - Creches - Ensino Pré-Primário Na primeira secção da exposição tentamos recordar a situação de pobreza do início do século XX que motivou a criação desta organização caritativa. Em destaque colocaram-se duas mesas e bancos corridos, com as tijelas e colheres de metal em que se servia a “sopa dos pobres” (peças originais pertencentes e conservadas na sede da «Beneficente»), grandes panelas, 5 antigas, sobre um fogão de lenha, uma balança decimal com um fardo de bacalhau e sacos para produtos hortícolas, enquadrados por fotografias e trajes deste período, em que se apercebe as difíceis condições de vida e “fome” da época. Alguns textos, nomeadamente uma Resenha Histórica da instituição e reprodução de alguns manuscritos, documentam aspectos históricos essenciais. Neste sector são de particular interesse algumas páginas dos primitivos estatutos redigidos em 10 de Abril de 1906 - em que se transcrevem, nos Art.º 2.º e 3.º, as intenções que justificam a formação desta organização: “Esta associação tem por fim socorrer os indigentes, obstando quanto possível à mendicidade pública. Para a realização dos seus fins esta associação fundará um hospital para entrevados, de ambos os sexos; e logo que as suas finanças o permitam instituirá uma sopa económica para distribuir pelos domicílios, além de outros socorros que possa fornecer a pessoas necessitadas”. Na capa dos Estatutos impressos em 1907 volta-se a lembrar como principais funções o 6 “Hospital dos entrevados e distribuição de sopa aos indigentes”. No livro de Receitas e Despesas registam-se os produtos adquiridos para a realização da “sopa dos pobres”, designadamente grandes quantidades de batata, arroz, farinha, vinho e bacalhau (em Dezembro). No início da exposição encontra-se o retrato de uma das figuras emblemáticas desta colectividade, o grande 7 impulsionador e um dos fundadores da Associação: “O Miroma” – Francisco Gomes de Amorim . Como no museu se
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conservam algumas pedras decoradas, em granito, que rematavam o dintel do portão de acesso ao quintal da antiga Casa paroquial (que se tornou na sede da Beneficente, provavelmente8 a partir da segunda década do século XX), bem como uma fotografia do edifício, reproduziram-se graficamente estes elementos que se encontram na zona da porta de entrada da exposição. Na porta, propriamente dita, aplicou-se o cartaz da exposição com a imagem de “A Caridade” – que imita uma estátua 9 de Teixeira Lopes – que simboliza a intenção, de ontem e de hoje, desta instituição dar apoio e caridade aos mais carenciados. * Directora do Museu Municipal 1
Aproveitamos o ensejo para solicitar a quem disponha de fotografias, documentos ou objectos desta primeira fase da história da instituição que os facultem para que se realize a sua reprodução, enriquecendo o conhecimento sobre as origens desta associação, 2 - A Beneficente. História da sua História, de José Linhares, 2002 e várias outras publicações a ela se referem, nomeadamente na “Toponímia” do «Boletim Cultural. Póvoa de Varzim», de Jorge Barbosa, uma Resenha Histórica, redigida pela Direcção, etc. 3 A pesquisa documental teria que ser realizada mediante a leitura metódica dos periódicos locais e documentos conservados no arquivo municipal - dado que, na sede da instituição - à excepção dos estatutos e alguns livros tardios de contas - não dispõem de um extenso arquivo documental, o que é compreensível atendendo às mudanças de sedes e às obras a que os edifícios foram sendo sujeitos. 4 Um dos primeiros objectivos da associação visava dar de comer aos famintos, o que faziam servindo um caldo (do tipo “sopa à lavrador”) acompanhado com pão e, por vezes, um pouco de vinho. 5 O fogão de lenha foi reconstituído, mediante o uso de alguns elementos originais e recriando a estrutura de base que faltava. 6 O Livro de Despesa e Receita mais antigo conservado no Beneficente é datado de 1947 e, aqui, reproduzem-se algumas páginas para documentar algumas das despesas mais frequentes. 7 O “Miroma” fazia parte do grupo “Companheiros do Bem” que, desde 1894, tentavam organizar uma Associação Instrutiva e Beneficente, que se denominaria “Luz e Caridade”, com o intuito de empreender acções de benemerência, em particular para auxiliar os famintos e os entrevados. 8 BARBOSA, Jorge - Toponímia da Póvoa de Varzim, in «Póvoa de Varzim. Boletim Cultural», vol. XVIII, Póvoa de Varzim, Câmara Municipal da P. de Varzim,1979, p. 298. 9 Numa vitrina expõe-se uma reprodução desta escultura (em poliester, com 50 cm. de altura), adquirida na Casa Museu Teixeira Lopes.
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