Programa de Mestrado em Direito Empresarial Faculdade de Direito Milton Campos
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade Volume III 2013
Vinícius Jose Marques Gontijo (Org.) Autores Felipe Fernandes Ribeiro Maia & Maysa Marise M. Ramos dos Santos Jason Soares de Albergaria Neto & Tatiane Aparecida Alves Araujo Jean Carlos Fernandes e Sávio Raniere Pereira Pinto Ricardo Adriano Massara Brasileiro
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Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade, III Organização: Vinicius José Marques Gontijo; Felipe Fernandes Ribeiro Maia; Maysa Marise Moreira Ramos dos Santos; Jason Soares de Albergaria Neto; Tatiane Aparecida Alves de Araújo; Jean Carlos Fernandes; Sávio Raniere Pereira Pinto; Ricardo Adriano Massara Brasileiro. /. – Belo Horizonte: RTM, 2013. __p Programa de Mestrado em Direito Empresarial da Faculdade de Direito Milton Campos. Inclui referências ISBN: 978-85-63534-59-0 1. Previdência complementar. 2. Direito empresarial. 3. Domínio econômico. 4.Títulosde crédito. 5. Depósito prévio rescisório trabalhista. Trabalhista. I. Gontijo,Vinicius José Marques. II. Maia, Felipe Fernandes Ribeiro. III. Santos, Maysa Marise Moreira Ramos dos. IV. Albergaria Neto, Jason Soares de. V. Araújo, Tatiane Aparecida Alves de. VI. Fernandes, Jean Carlos. VII. Pinto, Raniere Pereira. VIII. Brasileiro Ricardo Adriano Massara. IX. Título. CDU 347.72
FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada por Emilce Maria Diniz – CRB-6ª - 1206 Editoração Eletrônica e Projeto Gráfico - Leonardo Senhorini Editor Responsável: Mário Gomes da Silva Revisão: Os autores Todos os direitos reservados à Editora RTM. Proibida a reprodução total ou parcial, sem a autorização da Editora. MARIO GOMES DA SILVA – ME Rua João Euflásio, 80 - Bairro Dom Bosco - BH - MG - Brasil. Cep 30.850-050 -Tel: (31) 3417-1628 - (31) 9647-1501 E-mail: rtmeducacional@yahoo.com.br Site: www.editorartm.com.br Loja Virtual: www.rtmeducacional.com.br
Programa de Mestrado em Direito Empresarial Faculdade de Direito Milton Campos
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade Volume III Â 2013
SUMÁRIO
Apresentação ...................................................................................... 05 ARTIGOS Súmula 321 do STJ: Primeiras Reflexões Acerca da (In)aplicabilidade às Entidades Fechadas de Previdência Complementar....................... 08 Felipe Fernandes Ribeiro Maia Maysa Marise Moreira Ramos dos Santos A Intervenção do Estado do Domínio Econômico e no Direito Empresarial ........................................................................................ 28 Jason Soares de Albergaria Neto Tatiane Aparecida Alves Araujo Da necessidade ou não do protesto prévio de títulos de crédito ou documentos de dívida para negativação e fornecimento de informações restritivas de crédito pelos bancos de dados....................................... 57 Jean Carlos Fernandes Sávio Raniere Pereira Pinto Notas sobre o valor e a destinação do depósito prévio rescisório trabalhista ..........................................................................................116 Ricardo Adriano Massara Brasileiro
Apresentação É com enorme prazer que vimos apresentar à comunidade acadêmica o volume III, por mim organizado, dos Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade do Programa de Mestrado em Direito Empresarial da Faculdade de Direito Milton Campos. Este trabalho contempla o fruto das pesquisas entabuladas tanto por Professores quanto por nossos alunos, mestrandos. O Professor Doutor Felipe Fernandes Ribeiro Maia e a mestranda Maysa Marise Moreira Ramos dos Santos apresentam artigo fruto das primeiras reflexões acerca da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à relação havida entre as Entidades Fechadas de Previdência Complementar e seus participantes, à luz da Súmula n. 321 do Superior Tribunal de Justiça. Trata-se de trabalho desenvolvido de maneira a dar ao leitor a exata dimensão da questão tanto no aspecto doutrinário quanto no jurisprudencial, bem como apresentar conclusão. É claro que este relevante segmento da economia não pode ser olvidado, na medida em que as Entidades de Previdência Complementar são fundamentais para aquilo que se nomeia “investidores institucionais” e sua interface com o financiamento a setores estratégicos da economia nacional. O Professor Doutor Jason Soares de Albergaria Neto e a mestranda Tatiane Aparecida Alves Araujo, por sua vez, focam seus estudos na Intervenção do Estado no Domínio Econômico e no Direito Empresarial. Para tanto, os autores investigam a atuação do Estado diretamente na economia e também indiretamente, quando o Ente Público regula, fiscaliza e incentiva o mercado. Eles examinam não apenas o aspecto constitucional que envolve o tema, mas também o infraconstitucional, levantando a hipótese de que a atuação do Estado no campo do Direito Empresarial se opera de maneira equilibrada e em atenção aos interesses da coletividade, fixando-se, com isso, a livre iniciativa e a livre concorrência, que são atributos essenciais para o bom desenvolvimento do País. O Professor Doutor Ricardo Adriano Massara Brasileiro anota
sobre o Valor e a Destinação do Depósito Prévio Rescisório Trabalhista. No artigo o Professor tece críticas e apresenta sugestões sobre o montante e a destinação do depósito prévio rescisório trabalhista, questionando a Instrução Normativa n. 31/2007 do Tribunal Superior do Trabalho e a necessidade de reversão do valor depositado em favor do réu em caso de improcedência do pedido. A fim de demonstrar sua conclusão, são examinados precedentes e orientações jurisprudenciais que são confrontados com as normas e regras que regem o tema. O Professor Doutor Jean Carlos Fernandes e o advogado Sávio Raniere Pereira Pinto ensaiam acerca da necessidade ou não do protesto prévio de títulos de crédito ou documentos de dívida para negativação e fornecimento de informações restritivas de crédito pelos bancos de dados. Eles investigam a atuação e os limites dos bancos de dados de proteção ao crédito no País e as finalidades do protesto a fim de, ao conjugar estas informações, buscar verificar se efetivamente há entrelaço dos institutos. Naturalmente, na pesquisa, os autores se pautaram na doutrina e jurisprudência que envolvem o tema, trazendo suas contribuições pessoais. Este volume, portanto, apresenta trabalhos acadêmicos sérios e profundos, sem, no entanto, perder contato com o mundo prático do Direito, aliando à capacidade de indagação teórica dos autores, seus sólidos conhecimentos práticos e dogmáticos sobre os temas trabalhados. Assim, estamos certos, este livro contribuirá de modo adequado ao mundo jurídico não apenas acadêmico, mas também do dia-a-dia dos operadores do Direito. Vinícius Jose Marques Gontijo Doutor e Mestre em Direito Comercial pela UFMG Professor no Curso de Mestrado, Pós-Graduação Lato Sensu e Graduação em Direito na Faculdade Milton Campos Professor no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu e Graduação em Direito na PUC/MG Ex-Professor na UFMG e UFOP
Conselho Editorial Carlos Alberto Rohrmann Jean Carlos Fernandes Osmar Brina Correa Lima Ricardo Adriano Massara Brasileiro Rodolpho Barreto Sampaio Junior S么nia Diniz Viana Vinicius Jose Marques Gontijo
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Súmula 321 do STJ: Primeiras ReflexõesAcerca da (In)aplicabilidade às Entidades Fechadas de Previdência Complementar
Felipe Fernandes Ribeiro Maia1 Maysa Marise Moreira Ramos dos Santos2
______________ Sumário ______________ 1. Introdução. 2. A Previdência Social no Brasil. 2.1. Enquadramento Constitucional e Legal do Regime de Previdência Complementar no Brasil. 3. A Súmula 321 do STJ. 4. A inaplicabilidade do Código de Defesa de Consumidor às Entidades Fechadas de Previdência Complementar: inexistência de oferta de serviço ao mercado. 5. Conclusão.
Resumo O presente artigo traça as primeiras reflexões sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC), bem como do Enunciado da Súmula 321 do STJ, à relação jurídica existente entre as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC’s) e seus participantes, partindo do pressuposto de que a EFPC não oferta serviço ao mercado 1 Doutor e Mestre em Direito Empresarial pela UFMG. Especialista em Direito de Empresa e da Economia pela FGV. Professor da Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado) da Faculdade de Direito Milton Campos. Professor da Pós-Graduação Lato Senso do IBMEC-MG. Advogado-sócio de Brito & Maia Advogados.
Advogada da Fundação Libertas de Seguridade Social, em Belo Horizonte/MG. Mestranda em Direito Empresarial pelas Faculdades Milton Campos. Graduada em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos – Belo Horizonte/MG. E-mail: maysa. moreira@yahoo.com.br. Áreas de concentração: Direito Empresarial e Previdenciário. 2
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mediante remuneração, portanto, não se qualifica ou pode qualificar como “fornecedora”, nos termos do art. 3º do CDC.A EFPC tem viés associativo, finalidade estritamente previdenciária, com base em gestão participativa e objetivos comuns, que se resume na formação de reservas técnicas, derivada das contribuições vertidas pelos empregadores (quando patrocinadores) e seus empregados (participantes) para os planos de benefícios previdenciais, além da rentabilidade do próprio patrimônio, para garantia do pagamento futuro de complementação de benefícios previdenciários a grupo fechado de participantes. Palavras chaves: Entidades Fechadas de Previdência Complementar – Participantes –Benefícios Previdenciais – Código Defesa do Consumidor – Fornecedor – Serviço – Mercado. 1 - Introdução O presente artigo traça as primeiras reflexões sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC), bem como do Enunciado da Súmula 321 do STJ, à relação jurídica existente entre as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC’s) e seus participantes, partindo do pressuposto de que a EFPC não oferta serviço ao mercado mediante remuneração, portanto, não se qualifica ou pode qualificar como “fornecedora”, nos termos do art. 3º do CDC. O estudo é de extrema relevância, pois atinge às Entidades de Previdência Complementar (EFPC’s)3 que “constituem segmento de investidores institucionais com grande potencial no financiamento de setores econômicos estratégicos”4. 25 (vinte e cinco) são Entidades Abertas vinculadas à SUSEP (disponível em http:// www.susep.gov.br/menu/informacoes-ao-publico/mercado-supervisonado/entidadessupervisionadas, acesso em 20 Fev. 2012) e 334 (trezentas e trinta e quatro) Entidades Fechadas vinculadas ao Ministério da Previdência Social (disponível em http://www. mpas.gov.br/arquivos/office/3_091207-141057-663.pdf, acesso em 20 Fev. 2012, dados referentes a Agosto/2009). 4 BURANELLO, Renato; CERQUEIRA, Bruno. Regulação dos fundos de pensão brasileiros ou entidades fechadas de previdência complementar. In: Revista de Direito Mercantil, industrial, econômico e financeiro. São Paulo: Malheiros, Ano XLVI, n. 147, Jul-Set. 2007, p. 234. 3
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2 - A Previdência Social no Brasil A Previdência Oficial, hoje na figura do Regime Geral de Previdência Social – RGPS e do Regime Próprio de Previdência Social – RPPS, foi criada com o objetivo de ser um dos principais instrumentos de estabilidade social, visando à proteção do trabalhador e de sua família, por meio de sistema público de política previdenciária solidária, inclusiva e sustentável, cujo objetivo É promover o bem-estar social, assegurando direitos básicos ao cidadão, por meio dos pagamentos de benefícios. OSistema Previdenciário Brasileiroestá organizado em três regimes distintos: Regime Geral de Previdência Social, gerido pelo Poder Público, apto a garantir as necessidades básicas dos beneficiários; Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores Públicos vinculados a diversas pessoas políticas e Regime de Previdência Complementar, não revestido da obrigatoriedade dos demais regimes, facultativo e autônomo em relação aos outros, posto sob os cuidados dos particulares. É traço significativo, no modelo contemporâneo de proteção, a combinação entre atuação do Poder Público e das Entidades Privadas de Previdência Complementar no esforço de unificação das políticas sociais para o setor. A Previdência Social, na década de 1980, tornou-se deficitária, devido às profundas modificações do mercado de trabalho, em especial o aumento da informalidade e o envelhecimento da população, cujo efeito resulta da combinação entre a redução dos níveis de fecundidade, mortalidade e aumento da expectativa de vida, consequência do desenvolvimento tecnológico, do acesso à educação, da proteção social, da modernização da indústria alimentícia e principalmente dos avanços da medicina. A necessidade de o cidadão se prevenir financeiramente antes da aposentadoria, se torna cada dia mais importante, sendo relevante o papel desempenhado pelas entidades administradoras de planos de previdência privada, que acabam por contribuir para o desenvolvimento 10
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da economia do país. O capital – componente das reservas técnicas dos planos de benefícios – é destinado, observado a regulamentação, a investimentos5, no âmbito dos mercados financeiro e de capitais. E tais investimentos se tornam, como dito, reservas técnicas dos planos, na medida em que representam a expressão objetiva da massa patrimonial formada pelos recursos dos diversos participantes (e também dos “patrocinadores”, quando e se existentes). É inegável, contudo, que tal massa patrimonial impulsiona a economia e se capitaliza por meio de sua própria rentabilidade, se torna parte significativa e indispensável ao pagamento de benefícios futuros aos seus participantes. A previdência complementar acabou por se tornar importante segmento para a economia, pois, além de serem as EFPC’s “veículos de captação de poupança junto aos seus inúmeros participantes6, contribuem para desenvolver diversas atividades produtivas de nossa economia através de seus investimentos.”. O sistema de previdência privada acumulava, em Junho/2011, R$ 565 bilhões em ativos7 e 1,7 Resolução CMN n° 3.792, de 24 de setembro de 2009, dispõe sobre as diretrizes de aplicação de recursos garantidores dos planosadministrados pelas entidades fechadas de previdência complementar, com redação alterada pelas Resoluções CMN n° 3.846, de 25 de março de 2010, e CMN 4275, de 31 de outubro de 2013. 6 Manoel Sebastião Soares Póvoas, ao criticar a opção do legislador de incumbir o CMN de regular os investimentos das entidades de previdência complementar, salienta que o sistema de previdência complementar é um “polo de atração da poupança popular” (Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2.ed. São Paulo: QuartierLatin, 2007, p. 160). O STJ também reconheceu a atividade de captação de poupança popular pelas Entidades no julgamento do HC 33.674/SP. Marcelo Augusto Lima Vieira de Mello, com base em tal acórdão, afirmou tal característica: “A posição adotada pelo STJ é correta. Não se pode negar que as entidades de previdência complementar têm como atividade a captação e a aplicação de recursos de terceiros.” Apenas o objetivo com que captam e aplicam é diferente das instituições financeiras propriamente ditas (“bancos”): pagamento de benefícios de natureza previdenciária. A intermediação, para as Entidades, é apenas um “meio” e não um fim, como é para os bancos. (A intervenção e a liquidação extrajudicial das entidades de previdência complementar. 2008. 203f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, p. 97-98). 7 “Até junho, o setor acumulava R$ 565 bilhões em ativos.” (MOTA, Marcelo; FOLEGO, Thaís. Fundos de pensão não batem suas metas e ampliam risco. Valor Econômico. Disponível em http://www.valor.com.br/financas/2499284/ 5
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Milhão de participantes8. 2.1 - Enquadramento constitucional e legal do Regime de Previdência Complementar no Brasil O grande marco regulatório da Previdência Complementarno Brasil ocorreu com o advento da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1997, que definiu as regras de constituição, organização e funcionamento das entidades de previdência privada. A modernização da legislação da Previdência Complementar iniciou-se a partir da Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/1998, que deu nova redação ao art. 202 da CF/88. O novo texto passou a disciplinar a previdência complementar dentro do título da Ordem Social, o que exigiu a elaboração de duas leis complementares, que vieram a ser, mais tarde, as Leis Complementares de nºs 108 e 109, ambas de 2001. Neste contexto, a Lei Complementar nº 109/01, intitulada norma geral, foi responsável pela regulamentação do art. 202, caput, da Constituição Federal, que definiu as regras gerais para a Previdência Complementar no Brasil: “Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar”. fundos-de-pensao-nao-batem-suas-metas-e-ampliam-o-risco, acesso em 24 Jan. 2012). Dados relativos apenas às EFPC segundo a ABRAPP. Os dados da FENAPREVI, para as Abertas, indicam ativos em carteira de investimentos à da ordem de R$ 265 bilhões (em Nov/2011) e receita de R$ 46 bilhões de Janeiro a Novembro de 2011 (disponível em http://www.viverseguro.org.br/main.asp?View=%7B24739578%2DE792%2D4916%2DA 16C%2D60C0D39216A7%7D&Team=&params=itemID=%7BB74C7364%2D1AE9%2D4B E3%2D8C21%2DEAB6F7B3723D%7D%3B&UIPartUID=%7B3822DBC5%2D4F58%2D44D 6%2DB54F%2DC0D1C818CFDC%7D, acesso em 24 Jan. 2012). 8 Dado referente às Entidades Fechadas de Previdência Privada vinculadas à ABRAPP, que correspondem a 96% (noventa e seis) por cento desse mercado (Disponível em http://www.abrapp.org.br/ppub/pef.dll?pagina=servscript&QUALS=entidade/entidade. html&idConteudo=18&idMenu=11, acesso em 24 Jan. 2012). 12
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Da mesma forma, a Lei Complementar nº 108/01, ao tratar da relação entre as patrocinadoras de empresas públicas, sociedades de economia mista e o ente federado e suas respectivas Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC’s), regulamentou o parágrafo 4º do citado art. 202: Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar (...) § 4º Lei complementar disciplinará a relação entre a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente, enquanto patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada, e suas respectivas entidades fechadas de previdência privada.
Os novos atos normativos trouxeram para o segmento da previdência privada significativas mudanças, adequando o seu conteúdo às novas realidades do mercado, como por exemplo, a supressão da referência “seguros, previdência e capitalização” no art.1929 da CF/88, por força da Emenda Constitucional nº 40, de 29/05/2003. No mesmo ano, por intermédio da Emenda Constitucional nº 41, de 19/12/2003, nova redação também foi dada ao art. 40 da CF/88, restando disposto em seu parágrafo 1510,a instituição por meio de lei 9 Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram. 10 Art. 40.Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. 13
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ordinária, de previdência complementar para os servidores públicos nas três esferas federativas. É nítido que a Previdência Complementar, desde 2003, vive uma fase de expansão que reverteu a sua tendência de estagnação materializada desde meados de 1990. Esse fato resulta da combinação de alguns fatores, como, as fragilidades da Previdência Oficial, bem como da crescente preocupação da população com relação à capacidade de tal regime de garantir uma aposentadoria mais próxima da renda percebida enquanto na atividade laboral. O fundo previdenciário11, instituído pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS), nos termos do artigo 6812 da Lei Complementar 101, de 04 de maio de 2000, é espécie de seguro coletivo, engendrado em bem lançadas bases atuariais. Os planos de Previdência Complementar possuem inúmeros benefícios, cuja designação pode ser até idêntica.Entretanto, o revestimento, ou seja, a natureza deles é inconfundível, em nada se assemelham aos já existentes no Regime Geral de Previdência Social, já que as contribuições vertidas tanto pelos § 15. O regime de previdência complementar de que trata o § 14 será instituído por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no art. 202 e seus parágrafos, no que couber, por intermédio de entidades fechadas de previdência complementar, de natureza pública, que oferecerão aos respectivos participantes planos de benefícios somente na modalidade de contribuição definida. 11 O art. 68 da Lei Complementar 101/00, dispõe:Na forma do art. 250 da Constituição, é criado o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, vinculado ao Ministério da Previdência e Assistência Social, com a finalidade de prover recursos para o pagamento dos benefícios do regime geral da previdência social. 12 Art. 68.Na forma do art. 250 da Constituição, é criado o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, vinculado ao Ministérioda Previdência e Assistência Social, com a finalidade de prover recursos para o pagamento dos benefícios do regime geral da previdência social. § 1o. O Fundo será constituído de: I - bens móveis e imóveis, valores e rendas do Instituto Nacional do Seguro Social não utilizados na operacionalização deste; II - bens e direitos que, a qualquer título, lhe sejam adjudicados ou que lhe vierem a ser vinculados por força de lei; III - receita das contribuições sociais para a seguridade social, previstas na alínea a do inciso I e no inciso II do art. 195 da Constituição; IV - produto da liquidação de bens e ativos de pessoa física ou jurídica em débito com a Previdência Social; V - resultado da aplicação financeira de seus ativos; VI - recursos provenientes do orçamento da União. § 2º O Fundo será gerido pelo Instituto Nacional do Seguro Social, na forma da lei. 14
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participantes como pelas patrocinadoras das Entidades de Previdência Complementar, são direcionadas estritamente à formação do fundo previdenciário, o qual propiciará, no futuro, a concessão e a manutenção do pagamento de benefícios, conforme disposto no artigo 19 da Lei Complementar 109/0113. Neste sentido, destaca o autor Vladimir Novaes Martinez14: As fontes de custeio do plano de prestações de entidades consistem em contribuições patronais dos patrocinadores e pessoais, dos empregados, bem como no rendimento das aplicações patrimoniais e financeiras. A entidade previdenciária consubstancia-se em pessoa jurídica de direito privado, com personalidade jurídica e patrimônio próprios, inteiramente distinto da mantenedora, geralmente sociedade civil ou fundação, regida pelo Estatuto Social, acompanhada de perto, mas não ficando à mercê da administração da instituidora.
O Regime de Previdência Privada caracteriza-se por complementar, de forma autônoma, o Regime Geral de Previdência Social, mediante a constituição de reservas matemáticas advindas de contribuições de suas patrocinadoras e participantes, que garantam os fluxos de benefícios futuros ofertados pelos planos previdenciais geridos pelas entidades de previdência privada. Na sua dinâmica, a exigência constitucional fundamental, é que o Regime de Previdência Complementar seja mantido, na totalidade, por contribuições devidas pelos participantes, que podem ser tanto ativos como assistidos, por instituidores e patrocinadores, além de outras receitas advindas, por exemplo, de aportes individuais feitas por qualquer participante, nos termos do artigo 6º, § 2° da Lei Complementar 108/0115. Nos termos do caput do art. 19 da LC 109/01, “as contribuições destinadas à contribuição de reservas terão como finalidade prover o pagamento de benefícios de caráter previdenciário, observadas as especificidades previstas nesta Lei Complementar”. 14 MARTINEZ, Vladimir Novaes. Curso de Direito Previdenciário, Tomo IV – Previdência Complementar. São Paulo: LTr, 2002. 2. ed. pg. 137. 15 Art. 6o O custeio dos planos de benefícios será responsabilidade do patrocinador e dos participantes, inclusive assistidos.(...) § 2o Além das contribuições normais, os planos poderão prever o aporte de recursos pelos 13
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Neste contexto, a Previdência Complementar, voluntária e com administração privada, possui arranjos atuariais variados e destina-se a complementar os benefícios concedidos pelos RGPS e RPPS, embora alguns segmentos doRegime Privado não condicionarem a concessão do benefício à concessão dos benefícios pelo Regime de Previdência Oficial. Outro benefício do Regime de Previdência Complementar é que ele também se estende aos trabalhadores do mercado informal, que pretendam garantir suas aposentadorias. 3 - A Súmula 321 do STJ e sua Consequência A Súmula 321 do Superior Tribunal de Justiça, publicada em 05 de dezembro de 2005, estabelece, sem distinção entre Entidades Abertas (EAPC) e Fechadas (EFPC), que “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes”. A aludida Súmula foi editada a partir de cinco precedentes julgados pelo STJ: REsp 591.756/RS, REsp 567.938/RO, REsp 600.744/DF, REsp 306.155/MG e REsp 119.267/SP. Tendo em vista que tal Súmula, como dito, não distingue as entidades fechadas e as entidades abertas de previdência privada, o Poder Judiciário tem aplicado o Código de Defesa do Consumidor indistintamente para todas as entidades de previdência complementar. A aplicação indistinta da Lei n. 8.078/90 nas relações jurídicas entre participantes e entidades fechadas tem repercussão negativa e perigosa para o sistema, como ilustra o aresto proferido no julgamento da Apelação Cível n. 1.0024.11.343131-6/001, pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Confira-se: “EMENTA: AÇÃO DE COBRANÇA COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA - PREVIDÊNCIA PRIVADA - PREVISÃO NO REGULAMENTO DE IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES NO CASO DE MANUTENÇÃO DO VÍNCULO participantes, a título de contribuiçãofacultativa, sem contrapartida do patrocinador. 16
Felipe Fernandes Ribeiro Maia e Maysa Marise Moreira Ramos dos Santos EMPREGATÍCIO- APLICAÇÃO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR- ABUSIVIDADE- DEVOLUÇÃO DEVIDA. - As cláusulas do regulamento do plano de benefícios que impossibilitam o resgate ao associado, que não encerrou seu vínculo empregatício com a patrocinadora são nulas de pleno direito, pois impõem ao consumidor obrigação abusiva e excessivamente onerosa, a teor do disposto no artigo 51, inciso, IV, e § 1º, III, do Código de Defesa do Consumidor. (Des. Rel. Newton Teixeira de Carvalho. D.J. 04/07/2013).
Em seu voto condutor, o eminente Des. Relator consignou categoricamente que “se aplicam ao caso em tela os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista a relação de consumo existente entre as partes.” E, logo adiante, aplicou, efetivamente, os incisos I e IV do art. 51 daquele Código, para, então, considerar nulas as cláusulas contratuais (do contrato de participação no plano de benefícios privados) que “impliquem renúncia ou disposição de direitos ou que estabeleçam obrigações consideradas abusivas [...].”. Ao aplicar o Código de Defesa do Consumidor, permitiu-se o resgate da reserva de poupança pelo participante (ou seja, de sua parcela de contribuição para a massa patrimonial que forma a poupança previdenciária da comunhão de participantes), sem o rompimento do vínculo empregatício com o empregador, mesmo diante da vedação expressa contida nos artigos 14 e 74 da Lei Complementar 109/01. 4 - A inaplicabilidade do Código de Defesa de Consumidor às Entidades Fechadas de Previdência Complementar: inexistência de oferta de serviço ao mercado A princípio, para melhor compreensão da matéria, antes de adentrarmos no mérito da questão, é preciso esclarecer que no Regime de Previdência Complementar, existem entidades abertas e fechadas, com o mesmo objetivo, qual seja, a instituição, administração e execução de planos de benefícios de natureza previdenciária. A partir de um determinado tempo de contribuição dos participantes, recursos financeiros são constituídos e devem ser suficientes para arcar com o 17
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pagamento de suas aposentadorias e pensões futuras. Geralmente estes fluxos de pagamentos são complementares aos pagamentos efetuados pela Previdência Social ea diferença entre estas duas entidades está na forma de organização de cada uma. As Entidades Abertas de Previdência Complementar (EAPC’s), organizadas na forma de sociedades anônimas e seguradoras, em geral, são abertas ao público, mediante a adesão a um plano de benefícios, mantendo pagamento regular de contribuições. Ao contrário das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), organizadas sob a forma de fundações ou sociedades civis, são pessoas jurídicas sem fins lucrativos, acessíveis apenas aos empregados de uma empresa ou de um grupo de empresas, denominadas patrocinadoras, que tem por objeto precípuo a instituição, administração e execução de planos de benefícios de natureza previdenciária16, nas condições previstas em seus regulamentos, nas resoluções editadas pela Secretaria de Previdência Complementar – PREVICe na legislação específica, especialmente Leis Complementares n°s 108 e 109, ambas de 2001. As EFPC’s estão amparadas, nos seus atos de gestão financeira, pelo artigo 202 da CF/88, essencialmente pelo disposto em seus parágrafos 2º e 4º, além de estarem subordinadas à legislação federal, em especial, a Lei Complementar 109/01. Uma questão relevante, atualmente, que nos auxilia nas reflexões aqui tratadas acerca da discussão quanto à aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor na relação jurídica instaurada entre as EFPC’s e seus participantes, e que constitui grave problema para tais entidades, é o resgate antecipado das contribuições, por parte dos participantes que se desligam dos planos previdenciais, sem a perda do vínculo empregatício com a patrocinadora. Esse entendimento se baseia na Súmula 321 do Superior Tribunal de Justiça17que, apesar de não ser Na forma do artigo 2o da Lei Complementar 109/01: O regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei Complementar. 17 Súmula 321 STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes. 16
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aplicável às aludidas entidades, tem conduzido o Poder Judiciário a deferir o pleito dos participantes, do resgate da reserva de poupança sem a perda do vínculo empregatício. Como no Brasil o Regime de Previdência Privada é composto por duas entidades privadas, em regimes distintos, já diferenciadas no presente estudo, a própria Lei Complementar 109/01,nos artigos 31 e 36 ressalta as diferenças legais e os planos de benefícios administrados por ambas as entidades, o que por si só afasta a incidência da Súmula 321 do STJ às EFPC’s: “Art. 31. As entidades fechadas são aquelas acessíveis, na forma regulamentada pelo órgão regulador e fiscalizador, exclusivamente: I - aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas e aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, entes denominados patrocinadores; e II - aos associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, denominadas instituidores. § 1o As entidades fechadas organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos. § 2o As entidades fechadas constituídas por instituidores referidos no inciso II do caput deste artigo deverão, cumulativamente: I - terceirizar a gestão dos recursos garantidores das reservas técnicas e provisões mediante a contratação de instituição especializada autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil ou outro órgão competente; II - ofertar exclusivamente planos de benefícios na modalidade contribuição definida, na forma do parágrafo único do art. 7o desta Lei Complementar. § 3o Os responsáveis pela gestão dos recursos de que trata o inciso I do parágrafo anterior deverão manter segregados e totalmente isolados o seu patrimônio dos patrimônios do instituidor e da entidade fechada. § 4o Na regulamentação de que trata o caput, o órgão regulador e fiscalizador estabelecerá o tempo mínimo de existência do instituidor e o seu número mínimo de associados. Art. 36. As entidades abertas são constituídas unicamente sob a forma de sociedades anônimas e têm por objetivo instituir e operar planos de benefícios de caráter previdenciário 19
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade concedidos em forma de renda continuada ou pagamento único, acessíveis a quaisquer pessoas físicas. Parágrafo único. As sociedades seguradoras autorizadas a operar exclusivamente no ramo vida poderão ser autorizadas a operar os planos de benefícios a que se refere o caput, a elas se aplicando as disposições desta Lei Complementar”.
Nesse contexto, a conceituada Ada Pellegrini Grinover, em Parecer Jurídico, sobre o Código de Defesa do Consumidor e as Entidades Fechadas de Previdência Complementar, elaborado em consulta formulada pela ABRAPP – Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar18 ao citar Paulo Sérgio João, não deixa qualquer dúvida quanto à distinção das referidas entidades: As Entidades Abertas de Previdência Privada estão situadas fora do âmbito do direito previdenciário, tratando-se antes de tudo de uma maneira de poupança individual. Situam-se no campo do Direito Comercial e a legislação prevê controle e subordinação de tais entidades pelo Ministério da Indústria e Comércio, através da Superintendência dos Seguros Privados –SUSEP (art. 11, Lei nº 6.435/77), ao passo que as Entidades Fechadas de Previdência Privada “pertencem ao ramo da Previdência Social, posto que as condições de funcionamento e o campo de atuação relativamente aos benefícios estão limitados à legislação previdenciária. O controle e a subordinação de tais entidades são exercidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social (art. 39, § 3º). E mais: “As entidades fechadas de previdência privada não poderão ter fins lucrativos e serão sempre, neste sentido, constituídas sob a forma de sociedades civis ou fundações.
A diferença básica entre as duas modalidades de entidades de previdência privada é nítida, principalmente quanto ao caráter empresarial das atividades desempenhadas pelas EAPC’s, que atuam em regime de mercado, com estrita finalidade lucrativa, ao contrário GRINOVER, Ada Pellegrini; REIS, Adacir; AVENA, Lygia e ARRUDA, Maria da Glória Chagas. A inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor para as Entidades Fechadas de Previdência Complementar. 1ª Ed. São Paulo: ABRAPP, 2013. Pg.58/59. 18
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das EFPC’s que são desprovidas de tal finalidade. As EFPC’s não atuam no setor com finalidade lucrativa. Não raras vezes, referidas entidades constituídas na modalidade de previdência privada instituída, na busca da proteção de um grupo fechado de participantes, visam unicamente à complementação de benefício futuro, sem qualquer repartição de lucros, não se enquadrando assim no conceito de fornecedor, que na melhor acepção da palavra, trazida por Roberto Senise Lisboa“é indispensável que se forneça alguma atividade em prol de ‘filiados’, que possuem a obrigação de pagar uma manutenção periódica, mas que não têm qualquer poder deliberativo para influir, fazendo prevalecer a sua vontade nas decisões do ente moral”.19 Nessa linha de raciocínio, Ada P. Grinover20 compara as relações estabelecidas entre as EFPC’s e seus participantes às relações entre condômino e condomínio, afirmando que: [...] particularmente nas situações que envolvem interesses de diferentes pessoas enfeixadas por uma relação de condomínio, fica clara a impossibilidade de se qualificar o vínculo como submetido às normas especiais que tutelam o consumo. (Destacamos pela relevância)
Por analogia, conclui-se: “a reunião de pessoas com as características anteriormente indicadas, não autoriza a qualificação da relação daí resultante como de consumo”. (Destacamos pela relevância)
A jurisprudência é excelente fonte de exemplos a ilustrar a descaracterização da relação de consumo entre condômino e condomínio, vez que não há de se entender ser o condomínio prestador de serviços a serem tutelados pelo Código de Defesa do Consumidor: GRINOVER, Ada Pellegrini; REIS, Adacir; AVENA, Lygia e ARRUDA, Maria da Glória Chagas. Op. Cit. Pg. 46. 20 Idem. 19
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Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade EMENTA. TRIBUTÁRIO. TAXA DE ESGOTO. COBRANÇA INDEVIDA. RELAÇÃO DE CONSUMO. CONDOMÍNIO.1. É inaplicável o Código de Defesa de Consumidor às relações entre os condôminos e o condomínio quanto às despesas de manutenção deste. 2. Existe relação de consumo entre o condomínio de quem é cobrado indevidamente taxa de esgoto e a concessionária de serviço público. 3. Aplicação do artigo 42 do Código de Defesa de Consumidor que determina o reembolso em dobro. 4. Recurso especial provido. (...) Considera-se fornecedor à luz da conceituação feita pelo Código de Defesa do Consumidor: ‘toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação ou exportação de produtos ou prestação de serviços’ Consumidor é qualquer indivíduo que frui ou se utiliza de bens e serviços como destinatário final. A Ré, estará obrigada ao cumprimento das normas consumeristas sempre que existir a relação jurídica de consumo, assim considerada aquela que se destina a prestar serviços ao consumidor final. A relação jurídica de meio poderá vir a configurar relação entre fornecedores e neste caso, não se submetem às sanções próprias da relação de consumo, embora sofram os efeitos reflexos irradiados pela nova orientação do Código Consumerista, no sentido de igualar, sempre que possível, as partes, evitando prejuízos, como sejam, a desvantagem exagerada em benefício de uma das partes em detrimento da outra, o locupletamento ou enriquecimento sem causa, entre outras vantagens indevidas costumeiramente adotadas pelas partes, com arrimo do direito clássico e que a partir do advento doCódigo toma novos rumos, com a finalidade de que as relações jurídicas sejam aperfeiçoadas de forma justa, equilibrada e satisfazendo interesses mútuos para atender os fins sociais e legais” (fls. 1509/1510). O Tribunal caracterizou o ora recorrido como fornecedor ante o fato de que ocondomínio realiza sua própria coleta de esgoto que, a posteriori , é encaminhado para o Canal deMarapendi. Diante desse fato, afastou o pagamento em dobro disposto no artigo 42 do Código deDefesa de Consumidor.Data venia, esse não é o melhor entendimento acerca dos fatos.As relações entre 22
Felipe Fernandes Ribeiro Maia e Maysa Marise Moreira Ramos dos Santos condômino e condomínio não são pautadas pelo Código de Defesa doConsumidor, mas na lei 4.591/64, conforme expressou o Ministro Carlos Alberto Menezes Direitono voto-condutor do aresto 203.254/SP:”Não creio que mereça ir adiante o especial por violação ao Código deDefesa do Consumidor. No caso, aplica-se a Lei Especial de Regência que é a Lei nº4.591/64. O Código de Defesa do Consumidor, embora muitos o considerem mesmo um ‘sobredireito’, não pode ultrapassar os limites das relações de consumo. E tais limites não alcançam, a meu sentir, as relações condominiais, que estão subordinadas ao pacto representado pela vontade dos condôminos, manifestada na convenção”.Nesse sentido, colaciono, também, o seguinte precedente:”CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO. FUNDAMENTAÇÃO. INSPIRAÇÃO. DECISÃO. ANTERIOR. POSSIBILIDADE. OMISSÃO.INEXISTÊNCIA. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. INTUITOPROCRASTINATÓRIOS. MULTA. CONDOMÍNIO IRREGULAR. TAXASCONDOMINIAIS. COBRANÇA. LEGITIMAÇÃO ATIVA. MULTAMORATÓRIA. PREVISÃO. CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO. CDC. INAPLICABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIARECÍPROCA. AFERIÇÃO. SÚMULA 07/STJ. INCIDÊNCIA (...). 3. As relações jurídicas existentes entre condomínio e condôminos são regidas por lei específica, sendo inaplicável o Código de Defesa do Consumidor, o que permite a fixação, pela convenção de condomínio, de multa moratória superior ao limite estatuído no parágrafo primeiro do art. 52 da Lei 8.078/90. Precedentes. (...) Nessa mesma trilha, confiram-se, ainda: REsp 753.546/ SC; REsp 679019/SP; Resp655267/SP, todos relatados pelo Min. Jorge Scartezzini; REsp 280.193/SP, Rel. Min. BarrosMonteiro.O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 3º, define fornecedor como sendo”toda pessoa física ou jurídica, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividadesde produção, montagem criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuiçãoou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.O mesmo dispositivo, em seu parágrafo segundo, define serviço: “é qualquer atividadefornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária,financeira, de crédito e securitária, salvo 23
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade as decorrentes de relações trabalhistas”. Portanto, acha-se descaracterizada a relação de consumo entre condômino e condomínio, não há de se entender ser o condomínio prestador de serviços a serem tutelados pelo Código de Defesa do Consumidor, pois a atividade por ele realizada frustra a definição de prestaçãode serviços em dois pontos, quais sejam: remuneração e fornecimento no mercado de consumo. (...). (STJ, REsp 650.791/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira. D.J. 06/04/06)21 (Grifamos pela relevância)
Nesta mesma linha de raciocínio, Wendel de Brito Lemos Teixeira22, apoiado em José Geraldo de Brito Filomeno,pondera que “não é possível configurar como de consumo a relação entre associação e associados, acarretando a impossibilidade de aplicação da Lei 8.078/90, haja vista que sua relação com os associados é estatutária”23. GRINOVER, Ada Pellegrini; REIS, Adacir; AVENA, Lygia e ARRUDA, Maria da Glória Chagas. Op. Cit. Pg. 46. 22 TEIXEIRA, Wendel de Brito Lemos. Associações civis. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. Pg. 131/134. 23 Filomeno afirma que tanto as relações entre condomínio e condôminos, como associações e seus associados, não se classificam como de consumo: “Finalmente, um outro aspecto que deve ser levado em consideração diz repeito a certas universalidades de direito ou mesmo de fato, como, por exemplo, associações desportivas ou condomínios. Ou seja, indaga-se elas poderiam ou não ser consideradas como fornecedores de serviços, como os relativos aos associados ou então serviços em geral de manutenção de áreas comuns. A questão ora reacendeu em decorrência da recente modificação do § 1° do artigo 52 do Código de Defesa do Consumidor, segundo a qual as multas de mora passam a ser de ordem de 2%. Resta evidente que aqueles entes, despersonalizados ou não, não podem ser considerados como fornecedores. E isto porque, quer no que diz respeito às entidades associativas, quer no que concerne aos condomínios em edificações, seu fim ou objetivo social é deliberado pelos próprios interessados, em última análise, sejam representados ou não por intermédio de conselhos deliberativos, ou então mediante participação direta em assembleias gerais que, como se sabe, são os órgãos deliberativos soberanos nas chamadas ‘sociedades contingenciais’. Decorre daí, por conseguinte, que quem delibera sobre seus destinos são os próprios interessados, não se podendo dizer que eventuais serviços prestados pelos seus empregados, funcionários ou diretores, síndico e demais dirigentes comunitários, sejam enquadráveis no rótulo ‘fornecedores’, conforme a nomenclatura do Código de Defesa do Consumidor” (TEIXEIRA, Wendel de Brito Lemos. Associações civis. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. Pg. 131/134). 21
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Nesta concepção, nos ensinamentos de Rachel Sztajn24, à luz da teoria jurídica da empresa sob o cerne da atividade empresarial e dos mercados, para caracterização de empresa se faz necessário o desempenho de atividade econômica que produza riqueza, mediante assunção do risco da organização, a economicidade da atividade e a produtividade voltada para mercados, daí porque haveriam de ser excluídas da noção de empresa as“atividades de mera fruição”. A lei civilista ao disciplinar o Direito de Empresa, define a figura do empresário como aquele que “exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços” (Art. 966 do Código Civil). Para Sztajn, a definição constante do caputdo artigo 966 estaria incompleta. Segundo a autora, o conceito deveria ser acrescido da seguinte frase: “que os bens e serviços são oferecidos em mercados, o que desde logo elimina atividade econômica exercidas para satisfação de necessidades dos agentes e familiares”. Nesse particular, as EFPC’s podem se enquadrar no conceito de empresa apenas pelo desempenho de atividade conduzida com o método de organização econômica, de alta complexidade e sujeita a forte regulação e fiscalização pelo Estado, à medida que são responsáveis pela gestão de recursos de terceiros, visando manutenção constante das condições econômico-financeiras e patrimoniais para atender às obrigações assumidas contratualmente perante os participantes, assistidos e seus respectivos patrocinadores ou instituidores. No aspecto produtividade, entendido como a criação de utilidades para satisfazer as necessidades humanas em sociedade, as EFPC’s são reconhecidas pela administração de planos de benefícios previdenciários de caráter complementar, que compreendem desde as atividades instrumentais de administração do financiamento e dos investimentos de recursos captados junto a patrocinadores e participantes, até o pagamento final de benefícios futuros. Nada obstante, no que tange à destinação da atividade ao mercado SZTAJN, Rachel. Teoria Jurídica da Empresa. Atividade Empresária e Mercados. São Paulo: Atlas, 2010. Pg. 87. 24
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e à busca da finalidade lucrativa, o papel das EFPC’s (administração de planos de benefícios de caráter complementar) é desempenhado sem a efetiva vantagem econômica ou com a finalidade propriamente dita de auferir lucros. Não há, com efeito, a destinação de produtos e serviços no mercado de consumo, mas apenas a administração de recursos de terceiros, através do provimento de planos de previdência destinados a um público restrito, constituído por empregados de patrocinadores ou filiados de entidades instituidoras, que por força de regulamento previdencial podem aderir aos planos de benefícios próprios, considerando, repita-se, a possibilidade de administração pelas EFPC’s de fundos multipatrocinados, ou seja, planos de benefícios destinados a diferentes grupos de participantes vinculados a patrocinadores ou instituidores independentes uns dos outros. Ou seja, o pretenso “serviço de administração” dos recursos de terceiros não é realizado de maneira especulativa, característica intrínseca à atividade empresária (fim lucrativo). Dessa forma, não havendo oferta de planos de benefícios por tais entidades no mercado, não há busca da finalidade lucrativa, pois as referidas entidades apenas se responsabilizam pela capitalização das reservas matemáticas, constituídas pelas contribuições vertidas por empregados e empregadores, seja na condição de patrocinador ou instituidor, cuja única finalidade é a administração dos ativos financeiros, para formação de fundos e reservas previdenciárias que garantam a execução de seus planos de benefícios. 5 - Conclusão De tudo o que se apresentou, restaram bem delimitadas as distinções entre a relação de consumo firmada entre o fornecedor de produtos e serviços e o seu consumidor, daquela relação estabelecida entre as EFPC’s e os seus participantes, na medida em que, nestas, inexiste, no âmbito da administração dos planos de benefícios privados, oferta de serviço ao “mercado”, mediante remuneração. Nas relações previdenciárias estabelecidas pelas EFPC’s e seus 26
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participante, não há o escopo comercial (especulativo), com a busca da finalidade lucrativa (margem líquida na prestação do serviço). Os participantes cotizam com os patrocinadores os custos da administração dos planos de benefícios, diferentemente do que ocorre nas EAPC’s. Não há, então, tecnicamente, nas EFPC’s, prestação de serviços mediante remuneração. Nestas primeiras reflexões, observa-se que a Súmula 321 do STJ, ao conceder o mesmo tratamento e enquadramento a entidades distintas (abertas e fechadas), não assimilou adequadamente a realidade do sistema de previdência privada, na medida em que igualou os desiguais: as EFPC’s não fornecem serviço ao mercado, mediante remuneração, diferentemente do que se dá com as EAPC’s; estritamente comerciais e especulativas. Referências BURANELLO, Renato; CERQUEIRA, Bruno. Regulação dos fundos de pensão brasileiros ou entidades fechadas de previdência complementar. In: Revista de Direito Mercantil, industrial, econômico e financeiro. São Paulo: Malheiros, Ano XLVI, n. 147, Jul-Set. 2007. GRINOVER, Ada Pellegrini; REIS, Adacir; AVENA, Lygia e ARRUDA, Maria da Glória Chagas. A inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor para as Entidades Fechadas de Previdência Complementar. 1ª Ed. São Paulo: ABRAPP, 2013. MARTINEZ, Vladimir Novaes. Curso de Direito Previdenciário, Tomo IV – Previdência Complementar. São Paulo: LTr, 2002. SZTAJN, Rachel. Teoria Jurídica da Empresa. Atividade Empresária e Mercados. São Paulo: Atlas, 2010. TEIXEIRA, Wendel de Brito Lemos. Associações civis. Belo Horizonte: Del Rey, 2010.
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A Intervenção do Estado do Domínio Econômico e no Direito Empresarial
Jason Soares de Albergaria Neto1 Tatiane Aparecida Alves Araujo2
______________ Sumário ______________ 1. Introdução. 2. Direito administrativo econômico. 2.1 Princípios constitucionais da Administração. 3. Princípios da ordem econômica. 4. Intervenção do Estado no domínio econômico. 5. Da atuação direta do Estado na economia. 6. Limites à intervenção do Estado na economia e no direito empresarial. 7. Da livre iniciativa. 8. Conclusão. Referências Resumo Este trabalho aborda a intervenção do Estado economia. O Estado pode atuar diretamente na economia, exercendo atividade econômica; ou atuar de maneira indireta, regulando, fiscalizando e incentivando o mercado. Foi apresentada a análise dos princípios constitucionais da Administração Pública, tais como, o princípio da legalidade, da supremacia do interesse público, princípio da isonomia, entre outros. Abordou-se, também, os princípios que regem a ordem econômica, tais como, o princípio do tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte, da defesa ao consumidor, da livre concorrência, da Doutor em Direito Comercial pelo UFMG, Professor da Faculdade Milton Campos na Graduação e no Mestrado e Advogado. 2 Analista Judiciário da União. Mestranda em Direito Empresarial. Pós-graduada em Direito Constitucional. 1
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busca do pleno emprego, da função social da propriedade, entre outros como uma análise acerca da livre iniciativa.A hipótese defendida foi que a atuação do Estado no domínio econômico e no direito empresarial ocorre de uma maneira equilibrada, sem excessos e tem por fim defender os interesses da coletividade e garantir um meio em que seja possível o exercício da livre iniciativa e livre concorrência. Palavras-chave: Intervenção Estatal. Domínio Econômico. Direito Empresarial. Livre concorrência. Livre iniciativa. 1 - Introdução O presente trabalho tem por escopo analisar a intervenção do Estado no domínio econômico e no direito empresarial. O propósito é apontar algumas questões inerentes à intervenção do Estado na economia, interligando o tema com alguns dispositivos da Constituição da República de 1988, especialmente aqueles que tratam dos princípios da ordem econômica e da Administração Pública. Assim, dentro do conceito de Direito Administrativo Econômico e por uma análise acerca dos princípios constitucionais da Administração Pública se confronta os princípios que estão previstos no art. 37 da Constituição Federal, bem como os seus efeitos sobre o direito empresarial. Em seguida, aprofunda-se acerca dos princípios constitucionais que regem a ordem econômica brasileira e explicita-se as características do Estado Liberal, do Social e do Estado Subsidiário, ondeé feita uma análise da atuação direta do Estado na economia e da atuação indireta do Estado no domínio econômico. Por fim, busca-se os limites à intervenção do Estado na economia e no Direito Empresarial, com algumas observações acerca da livre iniciativa e de como ocorre a intervenção do Estado no domínio econômico e no Direito Empresarial.
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2 - Direito Administrativo Econômico O direito administrativo econômico compõe-se de regras, princípios e instituições de direito administrativo propícias a incentivar o avanço social econômico e o bem-estar social, na constante procura por avanço sustentável, ordem, paz, segurança e igualdade para todos os seres humanos.3 2.1 - Princípios constitucionais da Administração Toda pesquisa que se proponha fazer a respeito de normas constitucionais tem que se iniciar pelo conteúdo de seus princípios, uma vez que eles proporcionam coerência e harmonia para todo o ordenamento jurídico, objetivando suprimir lacunas, além de aparentes contradições- motivo pelo qual toda interpretação deve ocorrer levandose em consideração o conteúdo dos princípios pertinentes ao assunto em análise.4 De uma maneira geral, pode ser dito que os princípios servem como padrão para a interpretação do sentido das demais regras jurídicas, indicando o rumo que deve ser seguido pelos aplicadores do direito.5 Os princípios constitucionais da administração pública estão relacionados no art. 37, caput da Constituição da República Federativa do Brasil6.
CARDOSO, José Eduardo Martins et all. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 26. 4 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 34 5 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 34 6 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível no endereço: <http://www.planalto.com.br> Acesso em 1° de dezembro de 2012. “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte”. 3
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2.1.1 - Princípio da legalidade O princípio da legalidade, em conjunto como controle da Administração pelo poder judiciário, tem sua origem no Estado de Direito e consiste em uma das mais importantes garantias de respeito aos direitos individuais. Isso ocorre devido ao fato de a lei, ao mesmo tempo em que estabelece esses direitos, fixa também os limites da atuação administrativa que tenha o fito de restringir o exercício de tais direitos em benefício da coletividade.7 Esse princípio deve ser observado tanto pela administração pública quanto por particulares, mas será aplicado distintamente aos interesses dos particulares e da administração pública, por serem diferentes. Dessa forma, aos particulares é permitido fazerem tudo aquilo que a lei não proíba. Já à administração pública – que tem o dever de defender os interesses da coletividade- só é permitido fazer aquilo que a lei expressamente autoriza. No direito positivo brasileiro, essa premissa, além de estar disposta no art.37 da Constituição da República, faz-se presente, também, no art. 5°, II, CF: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo se não em virtude de lei”8. A observância do princípio em questão é garantida através de outro direito assegurado, também, pelo art. 5º, em seu inciso XXXV de acordo com o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão” mesmo em casos nos quais essa lesão ou ameaça decorra de ato da Administração.9 No campo tributário temos, ainda, a manifestação do princípio da legalidade manifesto no art. 150 da Constituição Federal: Art. 150 Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 8 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 9 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 7
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Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I. Exigir ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça10
Através desse artigo, constata-se que visando a segurança do contribuinte, que poder público possa vir a criar ou majorar tributos sem o respaldo da lei. É importante ressaltar, por oportuno, que a Constituição municia a fiscalização deste princípio com remédios específicos para combater a ilegalidade administrativa, como, por exemplo: a ação popular, o mandado de injunção; o mandado de segurança; o habeas corpus e o habeas data.11 2.1.2 - Princípio da Impessoalidade O Princípio da Impessoalidade pode ser entendido como a obrigação do poder público de assumir uma posição imparcial em relação aos administrados. A Administração Pública só poderá promover algum tipo de discriminação se esta for justificável tendo em vista o interesse público.12 Para ilustrar esse princípio observa-se o que ocorre na licitação, onde para que a Administração Pública venha a contratar serviços, fazse necessária a abertura de certame com objetivo de escolher a proposta mais vantajosa para o interesse público, obedecidos os termos previstos no edital13 De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro14, o princípio da impessoalidade é passível de diversas interpretações. Afirma que BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível no endereço: <http://www.planalto.com.br> Acesso em 1° de dezembro de 2012.. 11 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° Ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 12 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 49 13 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 50 14 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 10
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tal princípio pode significar tanto que a impessoalidade deve ser observada em relação aos administrados quanto em relação a própria administração. No primeiro caso o princípio estaria vinculado à finalidade pública que deve pautar toda à atividade administrativa. Posto isso, a Administração não pode agir com o fito de prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, visto que seu comportamento deve ser norteado pelo interesse público. Di Pietro observa, ainda, que o art. 100 da Constituição da República, por exemplo, proíbe a escolha de pessoas no que se refere ao pagamento de precatórios judiciários de modo que a ordem de pagamento deve ser respeitada pelo ente público devedor. Quanto ao sentido segundo o qual o princípio da impessoalidade deve ser observado em relação aos administrados, José Afonso da Silva15, que assevera aos atos e provimentos administrativos, ao invés de serem imputados ao agente que os pratica, são atribuídos à entidade ou órgão da Administração Pública. O autor complementa afirmando que, em decorrência disso, os feitos governamentais não são do agente público ou do dirigente, mas sim da entidade pública em nome da qual o ato é praticado.16 O art. 37 da Constituição Federal de 1988, em seu § 1º, expõe um corolário explícito dessa regra visto que proíbe que referência a nome, símbolo ou imagens que configurem promoção de funcionários ou autoridades nas publicidades concernentes à atuação do poder público. A questão da matéria sobre o exercício de fato é outro exemplo de aplicação deste princípio posto que os atos cometidos por funcionários investidos irregularmente no cargo ou função podem vir a ser validados sob o argumento de que os atos são do órgão e não do funcionário.17
PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed.São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 16 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 17 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 15
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2.1.3 - Princípio da Publicidade O princípio da publicidade consiste no dever que a Administração Pública tem de zelar pela transparência de todas as suas atuações, agregando-se, aqui, como regra geral, a obrigação de oferecer todas as informações que estejam reunidas em seu banco de dados desde que essas informações tenham sido pedidas.18 O princípio da publicidade requer ampla divulgação dos atos realizados pelo Poder Público, com exceção dos casos de sigilo previstos em lei. Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma que no art. 5° da Constituição da República há outras disposições que reafirmam ou limitam o princípio da publicidade: 1. O inciso LX dispõe que a publicidade só poderá ser restringida por lei nas hipóteses em que o interesse social ou a defesa da intimidade demandar sigilo. Devido ao fato de a Administração Pública tutelar interesses públicos, seus atos processuais não podem ser sigilosos, ao não ser quando o interesse público o exigir como em casos em que estiver em jogo a segurança pública, por exemplo. É importante ressaltar, por oportuno, que o inciso LX deve ser interpretado e aplicado em consonância com o art. 5°, X que dispõe que a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas são invioláveis e garante o direito à indenização pelos danos decorrentes dessa violação sejam eles materiais ou morais. Pode ocorrer que o direito a intimidade, entre outros, vá de encontro ao interesse público (como, por exemplo, no caso de exercício, por parte do Estado, de seu dever de fiscalização). Nesse caso, de acordo com Di Pietro, deve-se adotar o princípio devese resolver o conflito atentando-se para as regras da necessidade, adequação e proporcionalidade. Dessa forma, o interesse público deve ser atendido através da aplicação da medida menos onerosa ao titular do direito à intimidade. 19 18 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 53 19 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 34
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2. “O inciso XIV assegura a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.”20 3. O inciso XXXIII garante o direito à informação tanto para assuntos de interesses particulares quanto coletivos ou gerais. Dessa forma, a possibilidade de controle popular pela Administração Pública é amplificada.21 4. “O direito à informação relativa a pessoa é garantido pelo habeas data”.22 O habeas data está garantido no art. 5°, LXXII da Constituição Federal/1988: LXXII - conceder-se-á “habeas-data”: a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo;23
2.1.4 - Princípio da Moralidade A Constituição Federal de 1988 é a primeira a incluir a moralidade dentre seus princípios. De acordo com o entendimento jurisprudencial acerca do tema, no direito administrativo, a ideia de moralidade está inserida no conceito de legalidade. Posto isso, pode-se concluir que o Poder Judiciário poderá controlar a moralidade dos atos da Administração Pública.24 Essa concepção se faz clara no art.5°, LXXIII: 2009. p. 72 20 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 72 21 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64 22 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 73 23 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível no endereço: <http://www.planalto.com.br> Acesso em 5 de dezembro de 2012. 24 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 56 35
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;25
Através da leitura do inciso supracitado, nota-se que a probabilidade de anulação de ato lesivo à moralidade administrativa configura-se como um norte adotado pela Constituição Federal no sentido de reafirmar a tese de que a imoralidade é uma forma de ilegalidade.26 Maria Sylvia Zanella Di Pietro observa que a moralidade não se confunde com a legalidade “porque a lei pode ser imoral e a moral pode ultrapassar o plano da lei”27 2.1.5 - Princípio da Eficiência Este princípio passou a estar presente, expressamente, em nossa Constituição por meio da emenda constitucional n° 19 de 1988. Em decorrência deste princípio, o Poder Público deve procurar aperfeiçoar a prestação de seus serviços com o intuito de preservar os interesses que representa.28 Esse princípio está presente em diversos dispositivos constitucionais com, por exemplo, do art.37, § 8° da Constituição Federal/1988 que trata do chamado “contrato de gestão” celebrado entre órgãos e entidades da Administração direta e indireta, com o intuito de proporcionar maior autonomia gerencial, orçamentária e financeiras a essas entidades que, em contrapartida, devem fixar metas desempenho.29 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível no endereço: <http://www.planalto.com.br> Acesso em 5 de dezembro de 2012 26 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 56 27 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 78 28 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 59 29 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 25
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De acordo Maria Sylvia Zanella Di Pietro30, o princípio da eficiência possui dois aspectos: o primeiro deles seria o modo de atuação do agente público, devendo este realizar sua atividade da melhor forma possível com vistas a atingir um resultado satisfatório. O outro aspecto seria o modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Públicavisando o mesmo objetivo, qual seja: atingir um resultado que seja o mais satisfatório possível. A autorachama atenção para o fato de que o princípio da eficiência se junta aos demais princípios estabelecidos para a Administração, de modo que o princípio da eficiência não pode se antepor a nenhum dos demais princípios, mormente ao da legalidade, sob pena de por em risco a segurança jurídica e o Estado de Direito. 2.1.6 - Princípio da Supremacia do interesse público O princípio da supremacia do interesse público – ou princípio da finalidade pública- deve ser adotado tanto na etapa de elaboração quanto na etapa de aplicação da lei pela Administração Pública.31 É interessante observar que as normas de direito público visam resguardar interesses diferentes das normas de direito privado. Essas últimas teriam o escopo de proteger interesses individuais e as primeiras visam defender interesses públicos.32 A supremacia do interesse público sobre o particular possibilita que o Poder Público, devido aos interesses que representa, determine aos particulares, de forma unilateral, que se comportem de determinada maneira.33 2006. p. 59 30 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. 2009. p. 78 31 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. 2009. p. 64 32 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. 2009. p. 64 33 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de 2006. p. 59
Direito Administrativo. 22° ed.São Paulo: Atlas, Direito Administrativo. 22°ed. São Paulo: Atlas, Direito Administrativo. 22° ed.São Paulo: Atlas, Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 37
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Nesse diapasão, seria permitido ao administrador público desprezar existência de direitos, ainda que eles estejam prenunciados na Constituição Federal.34 Tendo em vista a aplicação deste princípio, ocorreram muitas modificações: o rol de funções do Estado foi ampliado com o fito de acolher as necessidades da coletividade havendo, dessa forma, uma amplificação da concepção de serviço público.35 Também, no que concerne ao poder de polícia do Estado que, além de determinar obrigações negativas (não fazer) com o fito de preservar a ordem pública, passou a estabelecer obrigações positivas, além de dilatar a sua área de atuação, que passou a abarcar, além da ordem pública, também a ordem econômica e social. Na esfera constitucional, novos padrões indicam a progressiva ingerência do Estado na vida econômica e no direito de propriedade, como exemplo disso, temos as normas que possibilitam a intervenção do Estado no funcionamento e na propriedade das sociedades empresárias. 2.1.7 - Princípio da Motivação Consiste no dever imputado ao poder público de fundamentar os seus atos para que estes sejam válidos, sendo que esta motivação não se trata apenas de uma alusão ao dispositivo legal no qual se funda o ato editado pelo poder público, mas também, da relação dos fatores que efetivamente colaboraram para configurar a convicção do administrador público que praticou o ato.36 Nesse sentido, “a motivação, em regra, não possui formas específicas, podendo ser ou não concomitante com o ato, além de ser feita, muitas vezes por órgão diverso daquele que proferiu a decisão”37 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de 2006. p. 59 35 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. 2009. p. 65 36 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. 2009. p. 65 37 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. 34
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2.1.8 - Princípio da autotutela O princípio da autotutela consiste no dever que a administração pública tem de monitorar os atos que ela profere, extirpando do ordenamento jurídico aqueles atos que se revelarem ilegítimos ou inoportunos. Posto isso, a Administração Pública possui a obrigação de eliminar os atos nulos e a faculdade de revogar os atos que julgar inconvenientes ou inoportunos.38 Se fala em autotutela para designar o poder que tem a Administração Pública de zelar pelos bens que integram o seu patrimônio sem necessitar de título fornecido pelo poder judiciário. 2.1.9 - Princípio da isonomia Celso Spitzcovisk39 observa que a noção inicial desse princípio foi a de “igualdade substancial”. De acordo com a noção de igualdade substancial, “todos os homens seriam iguais quanto ao gozo e fruição de direitos bem como à sujeição a deveres – noção, esta, que logo se inviabilizou, pelas inúmeras diferenças existentes entre os indivíduos.”40 Posteriormente, essa noção cedeu espaço para a noção de igualdade formal de acordo com qual haveria igualdade de tratamento entre os iguais e os desiguais seriam tratados como desiguais, na proporção dessas desigualdades. 3 - Princípios da Ordem Econômica Os princípios da ordem econômica estão no art. 170 de CF/88, a saber: 2009. p. 65 38 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 59 39 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 59 40 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 59 39
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995) Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.41
É interessante que se faça uma análise dos referidos princípios sem querer, contudo, esgotar o tema. I - Soberania Nacional Alexandre de Moraes observa que trata- se de uma “repetição do princípio geral da soberania (CF, arts.1°, I e 4°), com ênfase na economia”42. Este princípio foi definido por Leonardo Vizeu Figueiredo da seguinte forma: Traduz-se na mais alta autoridade governamental de uma nação, representando a última instância do poder decisório, BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível no endereço: <http://www.planalto.com.br> Acesso em 5 de dezembro de 2012. 42 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19° ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 724. 41
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Jason Soares de Albergaria Neto e Tatiane Aparecida Alves Araujo caracterizada pela supremacia interna e independência externa. Ressalte-se que, a Soberania Política é assegurada na medida em que o Estado goza e desfruta de soberania econômica.43
Já Celso Spitzocovisk afirma que, atualmente, é utópica a idéia de “soberania como prerrogativa do Estado de, no âmbito interno, decidir de maneira incontrastável sobre todas as questões e, no externo, de mater uma relação de coordenação com os demais Estados”44. Completando essa linha de raciocínio o autor observa: Cada vez mais se tornam evidentes a interferência internacional na gestão dos negócios internos dos Estados e a dependência das nações subdesenvolvidas ou em desenvolvimento relativamente àquelas mais ricas e, inclusive, a intervenção armada, os embargos econômicos e o isolacionismo a que são condenados os Estados que se rebelam contra a dominação explícita a que os querem submeter.45
Posto isso, deve-se entender a idéia de princípio da soberania como sendo aquele princípio que estabelece ao Estado a premência de projetar as atividades ecnômicas de forma a assegurar a autonomia da nação no que tange aos setores que são essenciais à sua continuidade46 II – Propriedade privada
Tal princípio “visa assegurar a propriedade privada simultaneamente propiciadora de gozo e fruição pelo seu titular e geradora de uma utilidade coletivamente desfrutável”47 FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Lições de Direito Econômico. 1° ed. Rio: Forense, 2006. p.284 44 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 76 45 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 59 46 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 59 47 GOMES, Renato, Análise do art. 170 da Constituição Federal. Disponível no endereço: 43
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III- Função social da propriedade O Princípio da propriedade privada rege toda atividade econômica. Entretanto, esse princípio não é absoluto visto que o direito à propriedade privada é limitado pela função social desta.48 Em relação à propriedade de empresas, Renato Gomes49 ressalta que tal princípio não afasta e nem inviabiliza a possibilidade de arrecadação de lucro. Todavia, deve-se procurar que o mesmo venha acompanhado de atendimento social, partilhando seu próprio produto. Alexandre Bueno Cateb e Fabrício de Souza Oliveira enfatizam que “ a geração de riquezas advinda da empresa é o mais evidente instrumento de realização da função social.”50 IV- Livre concorrência A observância desse princípio é de suma importância, visto que o art. 170, § 4º da Constituição Federal de 1988 dispõe que as práticas que visem à eliminação do poder econômico serão reprimidas por lei. Eugênio Rocha de Araujo observa que “o princípio da livre concorrência é desdobramento do princípio da livre iniciativa.” 51 Para que o leitor fixe a ideia de livre concorrência e livre iniciativa, o jurista dá como exemplo uma corrida de maratona com muitos competidores. Vejamos: <http://artigos.netsaber.com.br/resumo_artigo_7615/artigo_sobre_analise_do_ artigo_170_da_constituicao_federal> Acesso em 17 de novembro de 2012 48 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 59 49 GOMES, Renato, Análise do art. 170 da Constituição Federal. Disponível no endereço: <http://artigos.netsaber.com.br/resumo_artigo_7615/artigo_sobre_analise_do_ artigo_170_da_constituicao_federal> Acesso em 17 de novembro de 2012 50 CATEB, Alexandre Bueno; OLIVEIRA, Fabrício de Souza. Breves anotações sobre a função social da empresa. Disponível no endereço: <http://www.revista.amde.org.br/ index.php/ramde/article/view/25/23> Acesso em 17 de Novembro de 2012. 51 ARAUJO, Eugênio Rocha de. O princípio da livre concorrência. Disponível no endereço: http://www.juristas.com.br/informacao/artigos/o-principio-da-livre-concorrencia Acesso em: 17 de Novembro de 2012. 42
Jason Soares de Albergaria Neto e Tatiane Aparecida Alves Araujo Quaisquer pessoas podem se inscrever para a corrida: idosos, adolescentes, deficientes físicos e as grandes vedetes internacionais. A livre iniciativa é a possibilidade de todos se inscreverem na corrida, ao passo que as regras estipuladas para as filas, a proibição de atropelo de uma faixa de atletas por outra, a prestação de serviço médico para os que se acidentam, se constituem nas regras limitadoras ou conformadoras da organização do evento, para que a corrida não se transforme em tremenda balbúrdia até com a possibilidade de pisoteamento de participantes.52
O princípio da livre concorrência visa garantir que todos aqueles que possuem a intenção de explorar atividades econômicas tenham chances equitativas. Logo, tem-se a intenção de impedir a constituição de monopólios no mercado, uma vez que isso se configuraria no controle de diversos segmentos por uma única empresa, o que tornaria sem efeito a essência do princípio da livre concorrência. 53 A Constituição da República fortaleceu o princípio da livre concorrência “ao conferir tratamento favorecido às empresas de pequeno porte descritas no inciso IX, de forma a permitir a elas a possibilidade de competir com as demais”54 V- Defesa do Consumidor A respeito do princípio da defesa do consumidor, Eugênio Rosa de Araújo55 afirma que fazendo-se a análise econômica do inciso V do art.170, pode-se inferir que a proteção do consumidor é consequência ARAUJO, Eugênio Rocha de. O princípio da livre concorrência. Disponível no endereço: http://www.juristas.com.br/informacao/artigos/o-principio-da-livre-concorrencia Acesso em: 17 de Novembro de 2012. 53 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 79. 52
SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 79. 55 ARAÚJO, Eugênio Rosa de. Princípio Constitucional da Defesa do Consumidor. Disponível em: http://www.juristas.com.br/informacao/revista-juristas/principioconstitucional-da-defesa-do-consumidor/393/ . Acesso em: 08/12/2012 54
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clara da proteção da livre concorrência (170,V). A livre concorrência tem a finalidade de dar liberdade ao consumidor, uma vez que a proteção da concorrência não seria eficaz se não houvesse mercado, e a existência de um mercado só é possível se houver consumidor. “Novamente usando o raciocínio do Direito Econômico, o consumidor é aquele que utiliza bens e serviços em caráter final para atender a uma necessidade, isto é, não é um intermediário.”56 É interessante destacar que a intenção do constituinte não foi defender as relações de consumo mas, sim, o próprio consumidor.Para tanto, “disciplinando dessa forma o tema, legitimou, claramente, a intervenção do Poder Público na área econômica, em que pese à previsão da livre iniciativa como fundamento deste segmento.”57 Na ordem econômica a intervenção da Administração Pública poderá ocorrer tanto com o objetivo impedir a prática de atividades econômicas realizadas em desvantagem para o consumidor, quanto para assegurar que a prática de serviços públicos esteja de acordo com essa diretriz. Em suma, a defesa do consumidor se destina à pessoa física ou jurídica que obtém ou faz uso de um bem ou de um serviço como consumidor final . Nesse caso, se aplicará o direito Consumerista que regula as relações entre desiguais, quais sejam: consumidor e produtor. VI - Princípio da defesa do meio ambiente A Constituição Federal de 1988 é a primeira constituição a contemplar o princípio da defesa ao meio ambiente. Este princípio advém da necessidade de estabelecer limites ao exercício de atividades econômicas, a despeito de a Carta Magna ter proclamado a livre iniciativa como um de seus fundamentos.58 ARAÚJO, Eugênio Rosa de. Princípio Constitucional da Defesa do Consumidor. Disponível em: http://www.juristas.com.br/informacao/revista-juristas/principioconstitucional-da-defesa-do-consumidor/393/ . Acesso em: 08/12/2012 57 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 79 58 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 56
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De acordo com esse princípio, todos aqueles que exercem atividade econômica não pode praticar atos que possam ensejar a deterioração ambiental.59 VII- Princípio da redução das desigualdades sociais e regionais O princípio da redução dasdesigualdade sociais e regionais é consequência da previsão constitucional de “assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social” contida no art.170, caput. Esta questão abarca a defeituosa distribuição de riquezas no Brasil, majorada pela grande extensão do país, o que leva a uma oferta de emprego desproporcional entre suas regiões. 60 Este princípio impõe um determinado comportamento ao Estado, de modo que esse paradigma de conduta não poderá ser desrespeitado sob pena de inconstitucionalidade. VIII- Princípio do tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte Este princípio se aplica às empresas de pequeno porte “constituídas sob leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país.”61 . Este princípio tem a finalidade de impulsionar a livre iniciativa e a livre concorrência. Ao garantir tratamento favorecido às empresas de pequeno porte, o legislador constituinte deixou evidente o intuito de assegurar a essas empresas, circunstâncias mínimas que proporcionam possibilidade de competir com as empresas de grande porte, de modo a fomentar o desenvolvimento social por meio da geração de novos 2006. p. 79. 59 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 79 60 SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 79 61 BRASIL, Constituição Federal de 1988. Disponível no endereço: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm . Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 45
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empregos62. É interessante ressaltar, por oportuno, que a disposição advinda deste princípio também se aplica às microempresas visto que, estas são ainda menores que as empresas de pequeno porte e, por isso, precisam ainda mais de um tratamento diferenciado para competirem em condições de igualdade com as demais empresas.Os conceitos de microempresa e pequena empresa – ou empresa de pequeno porte- são estabelecidos pela Constituição Federal, nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias. De acordo com o art. 47, § 1° dos ADCT, Microempresas consistem nas pessoas jurídicas ou firmas individuais “com receitas anuais de até dez mil Obrigações do Tesouro Nacional e pequenas empresas as pessoas jurídicas e as firmas individuais com receita anual de até vinte e cinco mil Obrigações do Tesouro Nacional.”63 4 - Intervenção do Estado no Domínio Econômico Edvanil Albuquerque Duarte Júnior salienta que, a respeito da atuação do Estado no domínio econômico, há dois modelos de atuação estatal: O Estado Regulador e o Estado Executor. 64 Já Mauro Pinheiro Alves Felipe Barros, afirma que a atuação estatal pode ser dar de forma direta ou indireta. Atuação direta no domínio econômico trata-se de uma exceção, o Estado se configura como sujeito atuante no mercado por meio de empresas públicas; sociedades de economia mista e suas subsidiárias. Ainda de acordo com o autor, a atuação de forma indireta ocorre por meio da normatização e regulação da economia. No caso da regulação, ele afirma que ocorrem SPITZOCOVISK, Celso. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 79 63 BRASIL, Constituição Federal de 1988. ADCT, art. 47, § 1. Disponível no endereço: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm . Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 64 JUNIOR, Edvanil Albuquerque Duarte. Intervenção direta do Estado no domínio econômico. Disponível no endereço: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2953/ Intervencao-direta-do-Estado-no-dominio-economico-e-discricionariedadeadministrativa . Acesso em 09 de dezembro de 2012. 62
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práticas estatais de fiscalização; incentivo e planejamento. Mauro Barros ressalta, ainda, que a atuação indireta do Estado é a que mais se coaduna com os moldes democráticos65 4.1 - Estado Liberal A teoria do liberalismo econômico tem origem no cenário de fim do mercantilismo, época na qual era imperiosa a instituição de um novo paradigma, visto que, o capitalismo se consolidava a cada dia.66 O liberalismo é uma corrente política que abarca vários valores do passado e, também, valores atuais, que aclama que a garantia da liberdade individual deve ser a única finalidade do Poder Público.67 Acerca do Estado Liberal, Luiz Gonzaga de Sousa faz a seguinte observação: O Estado liberal espera que as coisas se modifiquem sem uma intervenção individual, ou de grupo, e ao mesmo tempo se ajustem de tal forma que as coisas se relacionem de forma natural, sem que o Estado tenha a sua intromissão direta no processo de produção, como também no consumo, visto que as liberdades individuais devem ser respeitadas para que tudo se acomode de forma comum e simples.68
4.2 - Estado Social O Estado Social tem sua origem na década de 1920 e vigora até a BARROS, Mauro Pinheiro Alves Felipe. A intervenção Estatal no domínio econômico. Disponível no endereço: http://jus.com.br/revista/texto/9427/a-intervencao-estatal-nodominio-economico . Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 66 Brasil Escola. Liberalismo Econômico. Disponível no endereço: http://www. brasilescola.com/economia/liberalismo-economico.htm Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 67 Movimento Liberal Social. O que é o liberalismo?Disponível no endereço: http://www. liberal-social.org/liberalismo Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 68 SOUSA, Luiz Gonzaga de. Mercados: da abstração à desigualdade social. Disponível no endereço: http://www.eumed.net/libros-gratis/2006a/lgs-merc/3c.htm Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 65
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década de 1980.69 O Estado Social se configura como uma oposição ao Estado Liberal e à economia de mercado. É caracterizado pelos seguintes elementos: intervenção estatal, defesa da classe trabalhadora, ingerência no mercado e criação de empregos.70 Quando se fala em Estado Social, faz-se referência ao dever que o Estado tem de promover políticas de promoção do bem-estar social, efetivadoras de igualdade concreta entre os indivíduos.71 4.3 - Estado Subsidiário No que tange à intervenção do Estado na economia, é plausível dizer que, com a Constituição de 1988, que adota princípios sociais mesclados com princípios neoliberais, o estado Brasileiro pode ser conceituado como Estado Subsidiário. A respeito do Estado Subsidiário, Shalom Moreira Salazar, afirma: O modelo de Estado Subsidiário que se impõe hodiernamente surgiu a partir da releitura do modelo de Estado Liberal, só que não mais pelo extremo da ausência de intervenção, nem pelo intervencionismo absoluto do Estado Benfeitor, mas segundo uma lógica neoliberal, em que a atividade econômica passa a ser exercida primariamente pelos particulares e apenas em alguns casos pelo Estado, a este restando apenas a função de fiscalização e regulação. 72
A atuação de fiscalizar a atividade econômica passa a ser o MARTINEZ, Vinício Carrilho. Estado de Direito Social. Disponível no endereço: http://jus.com.br/revista/texto/5494/estado-de-direito-social Acesso em 09 de dezembro de 2012. 70 FILHO, Francisco das C. Lima. O Estado Social: modelo espanhol e modelo brasileiro. Disponível no endereço: http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=891 Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 71 SILVA, Antônio Cipriano. Estado Social. Disponível no endereço: http://www. oesteonline.pt/noticias/noticia.asp?nid=14720 Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 72 SALAZAR, Shalom Moreira. O Estado subsidiário. Disponível no endereço:http:// ofogodavontade.wordpress.com/. Acesso em: 09 de dezembro de 2012. 69
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objetivo do Estado, pois restante é feito pelo particular. 5 - Da Atuação Direta do Estado na Economia A atuação direta do Estado na economia se dá através de empresa pública e sociedade de economia mista. O art. 173,§ 1º, II, sujeita as empresas públicas e as sociedades de economia mista ao regime jurídico próprio de empresas privadas, inclusive no que se refere às obrigações civis, comerciais, trabalhistas, e tributárias. Posto isso, pode-se concluir que a exploração da atividade econômica deve se dar em igualdade de condições com os empreendimentos privados. Sociedade de economia mista e empresa pública são caracterizadas pela necessidade de existência de uma lei que autorize tanto a criação quanto a extinção destas sociedades. Ambas possuem personalidade jurídica de direito privado e estão subjugadas ao controle estatal. Apesar de possuírem personalidade jurídica de direito privado há uma supressão parcial do regime de direito privado por normas de direito público. Essas sociedades praticam atividades econômicas e se vinculam aos fins estabelecidos em sua lei instituidora.73 De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro74, há duas distinções entre as empresa pública e a sociedade de economia mista. Estas distinções se referem à forma de organização e à composição do capital. A forma de organização destes tipos societários está prevista no artigo 5° do Decreto-lei n° 200/67. O referido artigo estabelece que a sociedade de economia mista deve ser constituída sob a forma de sociedade anômina. Já a empresa pública pode ser constituída, de acordo com o artigo 5°, sob qualquer das formas admitidas em direito. Posto isso, pode-se concluir que a sociedade de economia mista será sempre PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 445 74 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 22° ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 449 73
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uma sociedade empresária e que a empresa pública pode vir a ser tanto uma sociedade empresária quanto uma sociedade civil. No que concerne à composição do capital, a sociedade de economia mista é formada por capital público e privado. Já a empresa pública é composta, tão somente, por capital público. 6 - Limites À Intervenção do Estado na Economia e no Direito Empresarial Via de regra, não é permitido ao Estado ter sociedade empresária. Só poderá ter sociedade empresária quando necessário aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei – art. 173, CF/88. Ocorre que a lei a que se refere o art. 173 ainda não foi criada. Dessa forma, imperativos da segurança nacional e relevante interesse coletivo, tratam-se de conceitos jurídicos indeterminados. Logo, as situações nas quais é possível a intervenção direta do Estado na economia não estão delimitadas com precisão. Edvanil Albuquerque Duarte Júnior 75 ressalta a necessidade de esses conceitos serem indeterminados na medida em que se trata de uma questão que pode envolver uma gama considerável de situações que invoquem tais preceitos como forma de legitimar a ação em seu favor, tendo em vista o fato de a ordem econômica ser um setor que sofre bastante influência das mudanças ocorridas na sociedade. Nessa linha de pensamento, o autor completa o raciocínio salientando que a utilização de conceitos jurídicos indeterminados confere mais longevidade às normas, e uma maior possibilidade de intervenção direta do Estado quando necessário. Todavia, Duarte Júnior não descarta a necessidade de existência da norma a que se refere o art. 173, CF/88 posto que tal lei poderia ter JUNIOR, Edvanil Albuquerque Duarte. Intervenção direta do Estado no domínio econômico. Disponível no endereço: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2953/ Intervencao-direta-do-Estado-no-dominio-economico-e-discricionariedadeadministrativa . Acesso em 09 de dezembro de 2012. 75
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cunho meramente exemplificativo, estando as hipóteses de incidência abertas a eventuais acréscimos com o escopo de o interesse social sempre seja atendido.76 Assim, a ampla margem de discricionariedade conferida ao gestor público pelo legislador pode resultar em uma certa insegurança jurídica à iniciativa privada no caso de intervenção do poder público. 7 - Da livre iniciativa De acordo com o preâmbulo da constituição federal de 1988, o Estado Democrático destina-se a assegurar, dentre outras coisas, o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, o bem estar e desenvolvimento. O art. 1° da referida constituição consagra os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa como fundamentos da República Federativa do Brasil. A respeito da liberdade de iniciativa, o professor Marcelo Novelino assevera que a trata-se de um princípio básico do liberalismo econômico, que abrange a liberdade de empresa (indústria e comércio) e a liberdade de contrato. Posto isso, de acordo com o professor, o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de qualquer órgão público, salvo exceções previstas em lei, seria um direito conferido constitucionalmente a todos os cidadãos. O autor ressalta, ainda, que, devido ao fato de a ordem econômica ter por finalidade assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social, a liberdade de iniciativa só será legítima na medida em que seja exercida com esse fim. Dessa forma, é conferida legitimidade à liberdade de iniciativa se o exercício dela estiver voltado simplesmente para o lucro ou para a realização da pessoa do empresário.77 JUNIOR, Edvanil Albuquerque Duarte. Intervenção direta do Estado no domínio econômico. Disponível no endereço: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2953/ Intervencao-direta-do-Estado-no-dominio-economico-e-discricionariedadeadministrativa . Acesso em 09 de dezembro de 2012 77 NOVELINO, Marcelo. A constituição. Disponível no endereço: http://pt.scribd.com/ doc/73216092/Texto-Direito-Constitucional-Aulas-Lfg-Marcelo-Novelino-2007. Acesso 76
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Anderson Melo da Silva Bastos78 salienta que o princípio da livre iniciativa impulsiona a economia de um país. De acordo com o autor, o princípio da livre iniciativa está ligado a vários outros princípios e direitos constitucionais tais como, ao direito de propriedade, ao princípio basilar da dignidade da pessoa humana, aos valores do bem estar e da justiça social, à proteção do meio ambiente e à livre concorrência. Ressalta, ainda, que “o princípio, além do direito de exercício de atividades econômica, também cria desdobramentos para manter o equilíbrio comercial do país.” Ainda com relação a este importante princípio, Bastos afirma: A concepção do princípio da livre iniciativa pelo constituinte, sempre, em conjunto com o trabalho humano foi perfeita, para que aí se clarifique a ideia de harmonia a ser empregada entre o livre exercício empresarial, o empreendedorismo e os meios de produção, concretizada através da justiça social e, interligada ao trabalho humano, o qual deverá ser valorizado, garantindo, assim, a dignidade da pessoa humana tanto para trabalhadores quanto para empresários.79
Assim, passa a ser um fundamental princípio na atividade econômica. 8 - Conclusão A intervenção do Estado no domínio econômico e no Direito Empresarial se expressa por diversas normas, tais como os arts. 37 da Constituição da República, que trata dos princípios constitucionais da Administração Pública e o art.170 da nossa Carta Magna, que trata dos em: 08 de Dezembro de 2012. 78 BASTOS, Anderson Melo da Silva. Princípio Constitucional da livre iniciativa. Disponível no endereço: http://por-leitores.jusbrasil.com.br/noticias/2665459/principioconstitucional-da-livre-iniciativa . Acesso em: 10 de Dezembro de 2012. 79 BASTOS, Anderson Melo da Silva. Princípio Constitucional da livre iniciativa. Disponível no endereço: http://por-leitores.jusbrasil.com.br/noticias/2665459/principioconstitucional-da-livre-iniciativa . Acesso em: 10 de Dezembro de 2012. 52
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princípios que regem a ordem econômica, entre outros. O princípio constitucional da legalidade impõe limites ao comportamento do Estado, como em que o Poder Público só poderá intervir na economia nas hipóteses expressamente previstas por lei visto, fazendo que o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, visa atender às necessidades da coletividade que ultrapassou a seara da ordem pública para abarcar, também, a ordem econômica e social. A importância do princípio da livre concorrência decorre da garantia condições igualitárias de oportunidade para todos aqueles que desejam ingressar, destacando-se que todas as medidas econômicas tomadas pelo Poder Público devem ser pautadas pelo princípio da busca do pleno emprego, do tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte tem por escopo fomentar a livre concorrência e a livre iniciativa, visto que visa dar maiores condições de competitividade a essas empresas. A presença de um Estado Liberal onde a intervenção do Estado na esfera privada é a menor possível, se depara com o Estado Social que surge como uma intervenção maciça do Estado na economia. Dentro desta realidade, pode-se dizer que o Estado Brasileiro adota o modelo de Estado Subsidiário, ou seja, não é marcado pelo absentismo de intervenção e nem pela ingerência exacerbada na esfera particular. A atividade econômica é, essencialmente, exercida pelo particular. Em algumas hipóteses ocorre a ingerência do Estado na economia, mas como exceção, por meio empresa pública e sociedade de economia mista. Por outro lado, o Estado intervém indiretamente na economia exercendo a fiscalização, regulação, incentivo e planejamento das atividades econômicas. Desta forma, pode-se concluir que existe uma intervenção do Estado no domínio econômico e no Direito Empresarial, mas é importante ressaltar, que esta ingerência do Estado se dá de maneira moderada sendo pautada, inclusive, pelo princípio da legalidade. A ingerência do Estado no domínio econômico e no direito empresarial se dá com fito de coibir eventuais abusos dos agentes 53
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econômicos, possibilitando a efetividade da livre concorrência e da livre iniciativa além de defender os interesses da coletividade. Referências ARAÚJO, Eugênio Rosa de. Princípio Constitucional da Defesa do Consumidor. Disponível no endereço: < http://www.juristas.com.br/ informacao/revista-juristas/principio-constitucional-da-defesa-doconsumidor/393/> Acesso em: 08/12/2012 BASTOS, Anderson Melo da Silva. Princípio Constitucional da livre iniciativa. Disponível no endereço:http://por-leitores.jusbrasil.com.br/ noticias/2665459/principio-constitucional-da-livre-iniciativa . Acesso em: 10 de Dezembro de 2012. BRASIL, Constituição Federal de 1988. Disponível no endereço: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm Acesso em: 12 de dezembro de 2012. Brasil Escola. Liberalismo Econômico.Disponível no endereço: http:// www.brasilescola.com/economia/liberalismo-economico.htm. Acesso em: 09 de dezembro de 2012. CARDOSO, José Eduardo Martins. Curso de Direito Econômico. 1 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 26. CARVALHO, Marco Antônio Ferreira. O direito econômico e intervenção do Estado no domínio econômico. Disponível no endereço: http://www. artigonal.com/direito-artigos/o-direito-economico-e-a-intervencao-doestado-no-dominio-economico-5353349.html Acesso em: 08 de dezembro de 2012. CATEB, Alexandre Bueno; OLIVEIRA, Fabrício de Souza. Breves anotações sobre a função social da empresa. Disponível no endereço: <http://www.revista.amde.org.br/index.php/ramde/article/view/25/23> Acesso em 17 de Novembro de 2012. FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Lições de Direito Econômico. 1° ed. Rio 54
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Da necessidade ou não do protesto prévio de títulos de crédito ou documentos de dívida para negativação e fornecimento de informações restritivas de crédito pelos bancos de dados Jean Carlos Fernandes1 Sávio Raniere Pereira Pinto2
______________ Sumário ______________ 1. Introdução. 2. Dos bancos de dados de proteção ao crédito: natureza jurídica e atuação no brasil. 2.1 Definição e finalidade dos bancos de dados de proteção ao crédito. 2.2 Surgimento, constituição, atuação e natureza jurídica dos serviços de proteção ao crédito no Brasil. 2.3 A operação entre a Serasa S.A. e a Experian Brasil. 2.4 O Código de Defesa do Consumidor e as limitações aos bancos de dados de proteção ao crédito. 2.5 O caráter público dos bancos de dados. 2.6 Atuação e limitações aos bancos de dados nas legislações estrangeiras: a experiência dos Estados Unidos da América e da União Europeia. 2.7 Ordem econômica, princípio da livre concorrência e as entidades de proteção ao Pós-doutor em Direito Comercial pela Universidade de Coimbra, Portugal. Doutor em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Mestre em Direito Comercial pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor nos Cursos de Mestrado, Pós-Graduação lato sensu e Graduação da Faculdade de Direito Milton Campos. Professor dos Cursos de Pós-Graduação lato sensu e Graduação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Coordenador Pedagógico Adjunto da Faculdade de Direito Milton Campos. Diretor Executivo do Instituto dos Advogados de Minas Gerais. Sócio fundador de Jean Carlos Fernandes & Rocha Sociedade de Advogados. 2 Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Ouro Preto. Pós-graduado em Direito de Empresa pelo Centro de Atualização em Direito – CAD em convênio com a Universidade Fumec. Advogado. 1
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crédito no Brasil. 3. Do protesto títulos de crédito e documentos de dívida. 3.1 O enquadramento jurídico do protesto. 3.2 A funcionalidade do protesto. 3.3 Os efeitos advindos do protesto. 3.4 Das modalidades de protesto: facultativo e necessário. 3.5 Documentos protestáveis. 3.6 O protesto para fins falimentares. 4. Do protesto prévio de títulos de crédito ou documentos de dívida para a negativação e fornecimento de informações restritivas de créditos pelos bancos de dados. 4.1 A posição do Superior Tribunal de Justiça. 4.2 A vigência do artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997. 5. Conclusão. Referências RESUMO Consiste este ensaio no exame dos problemas e indagações de direito material no que diz respeito à exigência ou não de protesto prévio de títulos ou documentos de dívida para a inscrição em bancos de dados restritivos de crédito, e posterior fornecimento dessas informações aos entes interessados, no mercado de crédito. Busca-se analisar a atuação e limites dos bancos de dados de proteção ao crédito no Brasil, bem como as finalidades do protesto e se há entrelaço entre tais institutos jurídicos. Foram destacadas as posições doutrinárias e jurisprudenciais a respeito do debate da imperiosidade ou não necessidade de prévio protesto para inscrição e veiculação de informações restritivas de crédito, questionando-se ainda a vigência do artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997, que define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida. Palavras-chave: Bancos de dados - Protesto - Restrição de crédito.
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1 - Introdução Os bancos de dados de proteção ao crédito são entidades que oferecem seus serviços para instituições financeiras e para agentes econômicos dos mais variados seguimentos do mercado, a fim de fornecer informações para subsidiar e auxiliar as decisões de concessão de crédito, as vendas a prazo e a realização de negócios que, em geral, envolvam crédito, aumentando a segurança e a previsibilidade dessas operações no mercado. Assim, os bancos de dados tornaram-se um imperativo da economia contemporânea na redução da assimetria informacional no mercado de crédito. Nos bancos de dados constam informações de terceiros, principalmente a respeito de não pagamento de determinada dívida. O desenvolvimento da atividade exercida pelas entidades de proteção ao crédito liga-se, todavia, não à defesa de interesses isolados, mas ao resguardo da coletividade de bons pagadores e ao crédito. Entretanto, a atividade desses entes que gerem informações de terceiros possuem limitações legais e constitucionais contra eventuais abusos e irregularidades no registro dos dados dos cidadãos3, uma vez que a privacidade dos consumidores pode ser violada. Por sua vez, o protesto de títulos de crédito ou de outros documentos de dívida, regulado por lei própria e amplamente utilizado no âmbito do Direito Empresarial, principalmente em relação aos títulos de crédito, constitui-se em ato formal e solene pelo qual se prova, dentre outros, a falta de pagamento4. O presente estudo se propõe a examinar indagações de direito material envolvendo a exigência ou não de protesto prévio de títulos ou documentos de dívida para a negativação e fornecimento de informações restritivas de créditos pelos bancos de dados. Os objetivos do trabalho constituem em identificar as atividades BENJAMIN, Antônio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinover et al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 420. 4 BORGES, João Eunápio. Títulos de crédito. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 108. 3
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exercidas por essas entidades de proteção ao crédito e sua natureza jurídica; analisar atividades similares em outros países; estudar a atuação das principais entidades de proteção ao crédito no Brasil; averiguar legalmente o controle de uma das principais dessas entidades no Brasil por uma sociedade empresarial estrangeira; investigar a ocorrência ou não de dominação do mercado de informações sobre crédito no Brasil; estudar uma possível invasão total ou parcial das funções legais dos Tabelionatos de Protesto. A proposta acadêmica de pesquisa exige uma análise da natureza dos serviços prestados pelas empresas administradoras de bancos de dados restritivos de crédito, bem como do próprio protesto de títulos e documentos de dívida regulado pela Lei n. 9.492, de 1997. Justifica-se a pesquisa tendo em vista a averiguação da imprescindibilidade ou não de se efetuar o protesto antes do cadastro e veiculação de informações em bancos de dados restritivos de crédito, identificando-se a natureza das atividades cartorárias e as das entidades protetivas de crédito. O trabalho utilizará da revisão da bibliografia especializada em vários assuntos do Direito, destacando-se o Direito Empresarial (Protesto e Títulos de Crédito), Direito do Consumidor e Direito da Concorrência. 2 - Os Bancos de Dados de Proteção do Crédito: Natureza Jurídica e Atuação no Brasil.
2.1 - Definição e finalidade dos bancos de dados de proteção ao crédito Bancos de dados são registros de informações geridos por pessoas naturais ou jurídicas, privadas ou públicas que, em geral, armazenam informações, obras e outros materiais organizados de forma sistemática conforme critérios e finalidades específicas5·. Na sociedade atual, os CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O consumidor e o direito à autodeterminação informacional. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 356.
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bancos de dados têm alcançado maior relevância, pois: “[...], embora não sejam uma novidade na história da humanidade, adquiriram um novo sentido e uma nova roupagem com o advento da sociedade de consumo e da evolução da informática”6. Os bancos de dados, sistema de proteção ao crédito ou serviços de proteção ao crédito e congêneres compreendem uma relação de gênero e espécie, sendo que a principal categoria de bancos de dados é aquela que tem por finalidade a proteção ao crédito. As entidades que atuam na proteção ao crédito são também denominadas de “Bureau de Crédito” ou“Arquivos de Consumo”. As chamadas entidades ou bancos de dados de proteção ao crédito, a exemplo do SPC, Serasa, Boa Vista/Equifax, são agentes que coletam, armazenam e transferem a terceiros (credores potenciais) informações pessoais daqueles que pretendem obter crédito7·. Esses tipos de bancos de dados são comuns no Brasil e em todo o mundo, pelas frequentes transações envolvendo concessão de crédito, vendas de bens a prazo, financiamentos e empréstimos. Nesse sentido: Bancos de dados de controle do crédito dos consumidores, como o SPC – Serviço de Proteção ao Crédito e a Serasa – Centralização de Serviços dos Bancos S.A. [atualmente Serasa S.A.], tornaram-se comuns no Brasil, aonde são frequentes as transações com outorga de crédito, como as vendas à prazo e os financiamentos, dado o reduzido potencial aquisitivo de grande parte da população8. CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O consumidor e o direito à autodeterminação informacional. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 356. 7 BESSA, Leonardo Roscoe. Abrangência do CDC em relação aos bancos de dados. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 394. 8 CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O consumidor e o direito à autodeterminação informacional. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 357. 6
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A Lei n. 12.414, de 2011, que disciplina o cadastro positivo, isto é, a consulta a bancos de dados com informações de adimplemento para formação de histórico de crédito de pessoas, definiu banco de dados como: “conjunto de dados relativo a pessoa natural ou jurídica armazenados com a finalidade de subsidiar a concessão de crédito, a realização de venda a prazo ou de outras transações comerciais e empresariais que impliquem risco financeiro”9. As entidades que atuam na atividade de proteção ao crédito recebem informações de agentes econômicos ou de outras fontes, sobre pessoas em situação de débito, e registram tais informações em bancos de dados. Posteriormente, as informações relativas a determinado devedor poderão ser repassadas para aqueles que possuam interesse em fornecer crédito. Note-se que os dados armazenados terão a finalidade de subsidiar a concessão de crédito ou não. E é irrelevante a origem das informações coletadas pelos bureaus de crédito para fins de controle legal. Isto é, as entidades de proteção ao crédito podem receber dados de fornecedores, bancos, cartórios, etc.. O que é vedado pelo ordenamento jurídico é a disseminação universal e descontrolada de dados pessoais10. Dessa forma, além dos próprios titulares dos dados, somente aqueles que possam oferecer crédito a determinada pessoa é que podem ter acesso aos bancos de dados. Ressalte-se que o objetivo primordial da atuação das entidades de bancos de dados de proteção ao crédito em todo o mundo é auxiliar a decisão de um fornecedor (bancos, lojas) sobre a concessão ou não de crédito a alguém, consumidor ou não11. Essas entidades são tidas como imprescindíveis nas relações jurídicas que envolvem o crédito, posto que este corresponde a uma das manifestações da vida econômica atual. BRASIL. Lei n. 12.414, de 9 de Junho De 2011.Disponível em http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12414.htm. 10 BENJAMIN, Antonio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinoveret al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 436. 11 BESSA, Leonardo Roscoe. O consumidor e os limites dos bancos de dados de proteção ao crédito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 37. 9
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Jean Carlos Fernandes e Sávio Raniere Pereira Pinto Sem discussões mais aprofundadas, impróprias para os fins que aqui nos orienta, de um lado é bom que se diga que, em todo o mundo, o crédito é incluído entre as manifestações da vida econômica que integram o corpo básico das relações jurídicas de consumo. Não bastasse isso, bem se sabe que os bancos de dados, malgrado imprescindíveis ao comércio creditício, têm vida jurídica própria, manifestando-se sobre e sob todo o sistema financeiro do País. [...] trata-se, a um só tempo, de manifestação e condicionante da sociedade de consumo, pois é provável que sem tais organismos [bancos de dados] não teríamos o crédito facilitado e massificado, um dos pilares dessa forma de organização do mercado12.
O desenvolvimento da atividade exercida pelas entidades de proteção ao crédito liga-se, não à defesa de interesses isolados, mas ao resguardo da coletividade de bons devedores. Entretanto, a atividade desses entes possuem limitações legais contra eventuais abusos e irregularidades no registro dos dados dos cidadãos13. Em síntese, os bancos de dados de proteção ao crédito oferecem seus serviços para instituições financeiras e para agentes econômicos dos mais variados seguimentos do mercado, a fim de fornecer dados para subsidiar e auxiliar as decisões de concessão de crédito, as vendas a prazo e a realização de negócios que, em geral, envolvam crédito, aumentando a segurança e a previsibilidade dessas operações. 2.2 - Surgimento, constituição, atuação e natureza jurídica dos serviços de proteção ao crédito no Brasil. No Brasil, a expressão “Serviço de Proteção ao Crédito” surgiu BENJAMIN, Antonio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinoveret al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 418/424. 13 BENJAMIN, Antonio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinoveret al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 420. 12
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como uma associação sem fins lucrativos em Porto Alegre-RS na década de 1950, em decorrência da fundação do primeiro SPC no país, pela Associação Comercial local14. A instituição do Serviço de Proteção ao Crédito deu-se em razão da necessidade de os empresários em reunir numa só entidade informações de inadimplência a respeito de seus clientes ou credores potenciais. Posteriormente, em São Paulo-SP, pelos mesmos interesses, criou-se o segundo SPC no Brasil, assim como em outras cidades ao longo do tempo. Atualmente, o SPC – Serviço de Proteção ao Crédito está ligado à Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), sendo um dos mais amplos bancos de dados protetores de crédito no Brasil. O nome e a sigla foram registrados pela CNDL – Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas junto ao INPI – Instituto Nacional de Propriedade Intelectual. Portanto, somente as empresas que se tornam associadas às milhares de Câmaras de Dirigentes Lojistas espalhadas pelo Brasil é que podem utilizá-los15. Cumpre mencionar, entretanto, que o SPC – Serviço de Proteção ao Crédito não detém personalidade jurídica. Trata-se, na verdade, de um serviço oferecido pelas CDL’s – Câmara de Dirigentes Lojistas direcionado a seus associados, geralmente as sociedades empresárias de determinadas cidades,16 que buscam conhecer informações relativas a possíveis clientes em vários ramos da atividade econômica. Já a Serasa S.A. ou Serasa Experian, criada em 1968, é um banco de dados de proteção ao crédito, com personalidade jurídica de direito privado, constituída sob a forma de uma sociedade anônima. A Serasa é uma sociedade empresária que se dedica à atividade de prestação de BERTRAM, Antônio Stürmer. Banco de dados e “habeas data” no Código do Consumidor, in Lex, ano 5, n. 49, set. 1993, p. 10-11. 15 SATO, Sara Toshie. Os bancos de dados cadastrais de proteção ao crédito após a sanção da lei 8.078/90 e o cadastro positivo.Dissertação. Faculdade de Direito Milton Campos FDMC. 2010, p. 42. 16 SATO, Sara Toshie. Os bancos de dados cadastrais de proteção ao crédito após a sanção da lei 8.078/90 e o cadastro positivo.Dissertação. Faculdade de Direito Milton Campos FDMC. 2010, p. 42. 14
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serviços a partir de seu banco de dados de informações para o crédito17. A Junta Comercial do Estado de São Paulo traz informações, ainda, que a Serasa S.A. realiza atividades de bancos comerciais, intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral, exceto os imobiliários18. A Serasa Experian, além de ser um bureau de crédito, oferece variados serviços tanto para fornecedores quanto para consumidores. Dentre os serviços oferecidos pela Serasa Experian, destacam-se: a) soluções para apoiar as empresas em todas as etapas do ciclo de crédito – desde a aquisição até a cobrança, passando pelo monitoramento e gestão da carteira de clientes; b) serviços de consultoria, ferramentas de análise e modelagem estatística e softwares para avaliar dados, gerenciar o risco de crédito, prevenir fraudes, direcionar ofertas ao mercado e automatizar o processo de decisão das empresas; c) soluções para a compreensão, prospecção, rentabilização e fidelização de clientes – entre elas, ferramentas para marketing direto, marketing analítico e marketing digital; d) fornece todos os tipos de certificados digitais e soluções customizadas para utilização da tecnologia de certificação digital e de Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e); e) cadastro positivo ou o registro da pontualidade no pagamento de contas dos consumidores19. Além do SPC (CDL’s) e da Serasa Experian, existem outros entes com personalidade jurídica de direito privado que atuam como banco de dados de proteção ao crédito. A Equifax do Brasil Ltda., atualmente junto com a Boa Vista Serviços S.A., prestam atividades de informações cadastrais, cobrança e consultoria em tecnologia da informação20. Criada em 2010, a Boa Vista Serviços S.A. é resultado da união entre a Associação Comercial de São Paulo, TMG Capital, Equifax Inc., Clube de Dirigentes Lojistas do Rio Disponível em http://www.serasaexperian.com.br/servicos/orientacao/servicos_ informacoes.htm. Acesso em 15/01/2013. 18 Disponível em https://www.jucesponline.sp.gov.br/Pre_Visualiza.aspx?nire=35300062 566&idproduto=. Acesso em 11/01/2013. 19 Disponível emhttp://www.serasaexperian.com.br/serasaexperian/ftp/Livreto-SerasaExperian-Web.pdf. Acesso em: 25/01/2013. 20 Disponível em https://www.jucesponline.sp.gov.br/Pre_Visualiza.aspx?nire=35215441 698&idproduto=. Acesso 11/01/2013. 17
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de Janeiro, Associação Comercial do Paraná e da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre21. Saliente-se que a Boa Vista Serviços S.A. é o segundo maior bureau de crédito do Brasil22. Percebe-se que as entidades privadas que detém bancos de dados também oferecem outros serviços, dentre eles, cobranças, traçam o perfil de determinadas pessoas que desejam requerer crédito no mercado, certificação digital, intermediação e agenciamento de serviços e negócios. Tais atividades prestadas pelos bureaus de crédito não contém qualquer vedação legal ou constitucional. Além disso, bancos de dados têm sido utilizados para fins diversos, que vão desde o mero arquivamento de informações simples, como o nome e o endereço do usuário, para facilitar a sua identificação nas relações com fornecedores de bens e serviços, até a combinação de dados mais complexos para se traçar um perfil detalhado do usuário, de seus hábitos, gostos e preferências23.
No âmbito público também se encontram bancos de dados de proteção ao crédito. O Cadastro de Emitente de Cheques sem Fundos (CCF), o Cadastro Informativo dos Créditos de Órgãos e Entidades Federais não Quitados (CADIN) e, em São Paulo, o Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados de Órgãos e Entidades Estaduais (CADIN Estadual) são os maiores exemplos. O banco de dados denominado CADIN, na esfera federal, é regulamentado pela Lei n.10.522/2002 e contém a relação de pessoas físicas e jurídicas que são responsáveis por obrigações pecuniárias vencidas e não pagas para com órgãos e entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta. Além dessas, estão registradas no CADIN as pessoas que estejam com a inscrição nos cadastros indicados Disponível em http://www.boavistaservicos.com.br/quem-somos/. Acesso 11/01/2013. Disponível em http://www.equifax.com.br/. Acesso 11/01/2013. 23 CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O consumidor e o direito à autodeterminação informacional. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 357-358. 21 22
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do Ministério da Fazenda em situações de cancelamento no Cadastro de Pessoas Físicas ou, ainda, aquelas declaradas inaptas perante o Cadastro Geral de Contribuições – CGC (substituído pelo Cadastro Nacional das Pessoas Jurídicas). Em São Paulo, o CADIN Estadual encontra-se regulamentado pela Lei Estadual n. 12.799/2008 e atua, no limite do ente federativo, de modo quase idêntico ao CADIN Federal. Os CADIN’s, tanto o Federal quanto o paulista, são administrados pelo ente federativo correspondente e não detêm personalidade jurídica própria. O Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF) foi regulamentado pela Resolução n. 1.682 do Banco Central (BACEN), conforme permissão contida na Lei do Cheque (art. 69, Lei n. 7.357/1985). O CCF, vinculado ao Banco Central (autarquia federal), é o banco de dados que contém registro de emitentes de cheques sem fundos e abrange todas as praças do país e também não tem personalidade jurídica. 2.3 - A operação entre a Serasa S.A. e a Experian Brasil No ano de 2007, a “Experian Brasil Aquisições Ltda.”, que pertence ao “ExperianGroupLimited”, adquiriu 65% do capital social da Serasa S.A., com prospecção de aumento de até 70% de participação, por meio do “Contrato de Compra e Venda de Ações e Outras Avenças”, celebrado no dia 25 de junho de 2007. A operação consistiu na venda de participação do Grupo Itaú, Grupo Bradesco, Grupo ABN, Banco Santander Banespa S.A., Grupo HSBC e Grupo Unibanco para a Experian Brasil Aquisições Ltda.. Após a transação, os vendedores permaneceram como acionistas minoritários da Serasa S.A.. Tal operação econômica enquadrou-se na hipótese de submissão obrigatória ao CADE – Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência, de acordo com a lei de regência na data do fato (art. 54, parágrafo 3º, Lei n. 8.884/1994)24. Em 2011, a Lei n. 8.884/1994 teve os artigos 1º a 85 e 88 a 93 revogados pela atual lei que regula o CADE e o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, a Lei n. 12.529/2011. 24
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Com efeito, no dia 13 de julho de 2007, o referido contrato foi apresentado ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência para apreciação pelo Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência – CADE (Ato de Concentração n. 08012.009810/2007-89). A operação entre os agentes econômicos foi aprovada sem restrições, embasada, inclusive, em pareceres favoráveis da Procuradoria Federal vinculada à Advocacia Geral da União-ProCADE, da Secretaria de Direito Econômico - SED do Ministério da Justiça e da Secretaria de Acompanhamento Econômico – SEAE ligada ao Ministério da Fazenda25. Segundo os pareceres citados e a decisão do CADE, a operação econômica entre a Serasa S.A. e a Experian Brasil Aquisições Ltda. não resultou em sobreposição horizontal entre as atividades exercidas. A Experian tinha por objeto a administração de riscos e rendimentos associados às estratégias comerciais e financeiras de seus clientes. De outra monta, a Serasa S.A., até 2007, fornecia serviços de certificação digital e informações sobre créditos de pessoas físicas e jurídicas, por meio da análise dos comportamentos dos devedores. Em síntese, a decisão do CADE afirmou que os referidos agentes econômicos não atuavam no mesmo ramo à época da operação. Portanto, conforme o Conselho, não houve concentração de mercado ou prejuízo à concorrência, uma vez que a compra de 65% das ações do Serasa S.A. pela Experian Brasil Aquisições Ltda. consistiu, basicamente, na substituição de um agente por outro, sem sobreposição horizontal26. Esclarece-se que a ExperianBrasil Aquisições Ltda. pertence a um grupo de sociedades empresárias internacionais e sua controladora encontra-se registrada em Jersey, uma ilha pertencente BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE. Ato de Concentração n. 08012.009810/2007-89. Relator Conselheiro Luis Fernando Schuartz. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default. aspx?e142d522e036c85baf53f145. Acesso em 15/01/2013. 26 BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE. Ato de Concentração n. 08012.009810/2007-89. Relator Conselheiro Luis Fernando Schuartz. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default. aspx?e142d522e036c85baf53f145 . Acesso em 15/01/2013. 25
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à República da Irlanda sob dependência do Reinado Britânico27. A ExperianGroupLimitedé uma sociedade de capital aberto cujas ações são negociadas na Bolsa de Valores de Londres (London Stock Exchange) sob o símbolo EXPN. O único acionista que detém mais de 5% de participação no capital social da Experian é a “Legal and General Groupplc” (5,01%)28. Com a operação de compra de 65% do capital da Serasa S.A. aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência CADE, a Experian Brasil Aquisições Ltda. passou a deter o controle daquela sociedade empresarial e a adotar a designação Serasa Experian. Importante destacar que não há vedação legal ou constitucional para que um agente econômico estrangeiro possa atuar no ramo de bancos de dados de proteção ao crédito no Brasil por meio de sociedade brasileira. Tanto a ExperianBrasil quanto a Equifax do Brasil são instituições brasileiras que atuam legalmente no Brasil em vista da livre iniciativa consagrada no artigo 170 da Constituição da República de 1988. A limitação imposta pela lei para o exercício das atividades de sociedade empresária estrangeira no Brasil é a autorização do Poder Executivo, consoante artigo 1.134 do Código Civil. 2.4 - O Código de Defesa do Consumidor e as limitações aos bancos de dados de proteção ao crédito Em todas as hipóteses, sejam públicos ou privados, os bancos de dados são regulamentados, pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990). Desse modo, o Direito do Consumidor aplica-se indistintamente aos bancos de dados privados ou aos administrados por entidades públicas, in verbis: Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas,
Disponível em http://www.experianplc.com/. Acesso em 15/01/2013. Informações extraídas de: BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE. Ato de Concentração n. 08012.009810/2007-89. Relator Conselheiro Luis Fernando Schuartz. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default. aspx?e142d522e036c85baf53f145. Acesso em 15/01/2013. 27 28
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Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes. § 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos. § 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele. § 3° O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas. § 4° Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são considerados entidades de caráter público. § 5° Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores. Art. 44. Os órgãos públicos de defesa do consumidor manterão cadastros atualizados de reclamações fundamentadas contra fornecedores de produtos e serviços, devendo divulgá-lo pública e anualmente. A divulgação indicará se a reclamação foi atendida ou não pelo fornecedor. § 1° É facultado o acesso às informações lá constantes para orientação e consulta por qualquer interessado. § 2° Aplicam-se a este artigo, no que couber, as mesmas regras enunciadas no artigo anterior e as do parágrafo único do art. 22 deste código.
Explica Leonardo Roscoe Bessa o seguinte: O Código de Defesa do Consumidor não faz qualquer indicação expressa quanto à sua incidência em relação a bancos de dados administrados por entidades públicas ou privadas. (...). A conclusão, portanto, é que o Código de Defesa do Consumidor se aplica indiferentemente aos bancos de dados de proteção ao crédito controlados por entes públicos ou 70
Jean Carlos Fernandes e Sávio Raniere Pereira Pinto privados. [...] Não importa a forma como se apresenta a pessoa jurídica que administra o arquivo de proteção ao crédito: a lei não fez qualquer distinção. Todos os bancos de dados de consumidores estão sujeitos à disciplina do Código de Defesa do Consumidor, estejam eles constituídos sob as mais diversas formas: sociedade comercial ou civil, associação civil (sem fins lucrativos) autarquia, fundação, sociedade de economia mista29.
Ademais, o Código de Defesa do Consumidor tem igual aplicabilidade às situações nas quais os dados em questão não são propriamente de consumidores30. Num entendimento mais adequado: “tanto pessoas físicas quanto jurídicas são consumidoras para fins específicos de tutela da atividade dos bancos de dados de proteção ao crédito”31. Trata-se da hipótese do consumidor por equiparação, consoante o artigo 29 do Código de Defesa do Consumidor: “Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas”. Assim, toda pessoa exposta à prática das entidades de bancos de dados é consumidora por equiparação, em vista da determinação legal. Nessa perspectiva, o Código de Defesa do Consumidor estabelece determinados requisitos ou limitações imprescindíveis para que um determinado banco de dados registre informações negativas a respeito de alguém em seu sistema. Uma inscrição ou negativação indevida pode ensejar a responsabilização civil e/ou penal tanto da entidade que BESSA, Leonardo Roscoe. Abrangência do CDC em relação aos bancos de dados. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 414/416. 30 CARVALHO, Luís Gustavo Grandinetti Castanho de. Direito de informação e liberdade de expressão. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 122-124. 31 BESSA, Leonardo Roscoe. Abrangência do CDC em relação aos bancos de dados. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 411. 29
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administra os bancos de dados quanto daquele que forneceu informações inverídicas àquela. Ora, o exercício da atividade que envolve dados pessoais de terceiros deve ser adequado, sob pena de afrontar o direito à privacidade ou os direitos da personalidade. José Alexandre Tavares Guerreiro aduz que “[...] o mau funcionamento dos arquivos de consumo ameaça, primeiramente, o direito à privacidade, por que cada indivíduo pode clamar na esteira da elaboração mais ampla dos direitos da personalidade”.32 Sobre a atuação inadequada dos bancos de dados de proteção ao crédito explica James Martins: [...] tais mecanismos albergam graves distorções, seja por falta de atualização dos dados ou de precisão na forma como a informação está registrada ou é transmitida, causando problemas e danos de diversa ordem aos consumidores, especialmente na sensível área de crédito, quer se trate de pessoas físicas ou mesmo de empresas cuja sobrevivência resta, no mais das vezes, amarrada à obtenção de crédito, para capital de giro ou novos investimentos33.
Destarte, nos termos da legislação pertinente (Código de Defesa do Consumidor), os dados pessoais incluídos em bancos de dados devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão. Ademais, a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor/inadimplente, quando não solicitada por ele. E os bancos de dados de proteção o crédito não podem constar informações negativas referentes a período superior a cinco anos. Dessa maneira, a entidade administradora dos bancos de dados que descumprir quaisquer desses requisitos consagrados no Código de Defesa do Consumidor (artigo 43) GUERREIRO, José Alexandre Tavares et al. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, coordenação de José Cretella Júnior e René Ariel Dotti, Rio de Janeiro, Forense, 1992, p. 143. 33 MARTINS, James, Habeas data, antecipação de tutela e cadastros financeiros à luz do Código de Defesa do Consumido, in Revista de Direito do Consumidor, vol. 26, abr./jun. 1998, p. 106. 32
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poderá ser responsabilizada, tendo que indenizar a vítima de cadastro indevido. A questão da responsabilização por negativação indevida tem sido frequente no Brasil, principalmente nas hipóteses nas quais os bancos de dados armazenam informações inverídicas, por descuido deles mesmos ou do fornecedor dos dados, ensejando dano moral e material àquele que teve seus dados veiculados indevidamente pelas entidades de proteção ao crédito. Diversas decisões dos tribunais brasileiros têm atribuído indenizações para aqueles que tiveram seus dados negativados indevidamente pelos organismos de proteção ao crédito. As decisões também têm tentado coibir as práticas abusivas frente aos consumidores no que tange aos bancos de dados. Além disso, o Código de Defesa do Consumidor elenca alguns direitos para aqueles que têm seus nomes inscritos em banco de dados, como o direito de acesso às informações existentes, bem como sobre as respectivas fontes, e o direito de exigir correção no caso de inexatidão de seus dados, tendo o arquivista prazo de 5 (cinco) dias úteis para comunicar a respectiva alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas. Com se vê, se os bancos de dados de proteção ao crédito não deixam de cumprir os requisitos legais de inscrição cadastral de inadimplentes eles se encontram numa posição de exercício regular de um direito. As referidas entidades têm por fim a proteção da universalidade do crédito na medida em que alertam potenciais credores a respeito da situação de determinada pessoa. [...] o arquivamento, independente da vontade de seu titular, de dados não sensíveis diretamente relacionados às relações de consumo, como é o caso dos serviços de controle de crédito ao consumidor, é excepcionalmente autorizado pela lei como o exercício regular de um direito. Para que o cadastro de restrição ao crédito se situe, no entanto, dentro de uma esfera de legalidade, é necessário que ele seja utilizado com o fim único de proteção da universalidade do crédito, isto é, de alertar credores potenciais sobre os riscos envolvidos ao 73
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade negociarem com um determinado consumidor.34
Entretanto, como já referido, caso haja algum descumprimento legal por parte daqueles que administram os bancos de dados pode surgir a responsabilidade civil ou penal pela inscrição negativa indevida. Ora, as pessoas que são negativadas indevidamente terão seu crédito aniquilado no mercado de consumo, causando-lhes constrangimentos e danos de ordem material e moral. Violada qualquer uma das regras que regem a criação, manutenção e divulgação dos bancos de dados e cadastros de dados de consumo, desconfigura-se a pretensão de exercício regular do direito e adentra-se o campo do abuso do direito e da ilicitude [...]. Trata-se de responsabilidade civil objetiva e solidária, que por ser objeto de norma de ordem pública, é indisponível, não sendo possível a sua exclusão ou atenuação por instrumento contratual. O organizador do banco de dados responde pela irregularidade do arquivo, tenha sido a sua conduta culposa ou não, [...]35.
As regras insculpidas no Código de Defesa do Consumidor correspondem a limitações impostas legalmente ao tratamento nos bancos de dados para que as entidades de proteção ao crédito, por exemplo, não atinjam o direito à privacidade e à honra dos titulares dos dados. Nessa ótica: Os bancos de dados de proteção ao crédito, pela própria natureza da atividade que exercem, disseminam, diariamente, milhares de informações negativas concernentes a dívidas vencidas e não pagas – portanto, teoricamente, ofensiva à CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O consumidor e o direito à autodeterminação informacional. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 367. 35 CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O consumidor e o direito à autodeterminação informacional. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 371. 34
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Jean Carlos Fernandes e Sávio Raniere Pereira Pinto honra dos devedores. Todavia, em virtude da ponderação de valores realizada pelo legislador, o direito à honra sofre, na hipótese, restrição que será legítima apenas se forem atendidos rigorosamente diversos requisitos legais. A honra, portanto, é um dos valores afetados quando não se observa todo o procedimento que legitima as inscrições nos arquivos de consumo36.
O Decreto n. 2.181/1997, que regulamenta o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, no seu artigo 13, incisos X a XV, considera como infrações aos direitos do consumidor no que tange aos bancos de dados: Art. 13. Art. 13. Serão consideradas, ainda, práticas infrativas, na forma dos dispositivos da Lei nº 8.078, de 1990: [...] X - impedir ou dificultar o acesso gratuito do consumidor às informações existentes em cadastros, fichas, registros de dados pessoais e de consumo, arquivados sobre ele, bem como sobre as respectivas fontes; XI - elaborar cadastros de consumo com dados irreais ou imprecisos; XII - manter cadastros e dados de consumidores com informações negativas, divergentes da proteção legal; XIIII - deixar de comunicar, por escrito, ao consumidor a abertura de cadastro, ficha, registro de dados pessoais e de consumo, quando não solicitada por ele; XIV - deixar de corrigir, imediata e gratuitamente, a inexatidão de dados e cadastros, quando solicitado pelo consumidor; XV - deixar de comunicar ao consumidor, no prazo de cinco dias úteis, as correções cadastrais por ele solicitadas;
Note-se que os bancos de dados não podem impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações, nem deixar de corrigir informações a seu respeito, sob pena de crime. Além disso, o Sistema NERY, Ana Luiza B. de Andrade Fernandes. Bancos de dados de proteção ao crédito no Brasil In Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 430/431.
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Nacional de Defesa do Consumidor traz 6 (seis) infrações que os bancos de dados podem incorrer caso não cumpram as determinações legais. Além da responsabilidade civil por negativação indevida, as entidades de proteção ao crédito podem ser responsabilizadas penalmente. A responsabilização penal das entidades que administram bancos de dados encontra-se prevista nos artigos 72 e 73 do Código de Defesa do Consumidor: Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros: Pena Detenção de seis meses a um ano ou multa. Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação sobre consumidor constante de cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber ser inexata: Pena Detenção de um a seis meses ou multa.
Acerca da responsabilização das entidades de bancos de dados, cumpre mencionar que independe de relação contratual prévia para proteção do lesionado por inscrição indevida em bancos de dados de proteção ao crédito. Ora, os bancos de dados trabalham com informações de diversos fornecedores no mercado e sua própria natureza faz prescindir um contrato prévio entre um consumidor, por exemplo, e uma entidade que gere os bancos de dados. Trata-se, portanto, de responsabilidade civil extracontratual. Nessa ótica: Mais uma vez, é desnecessário, para pretender a proteção do Código de Defesa do Consumidor, a existência de relação contratual prévia. Na verdade, até pela natureza de algumas atividades, como a publicidade e a própria manutenção de bancos de dados, seria ilógico exigir-se um prévio vínculo contratual entre os sujeitos37.
Saliente-se, ainda, que as inscrições contidas nos bancos de dados
BESSA, Leonardo Roscoe. Abrangência do CDC em relação aos bancos de dados. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 409. 37
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não são de ampla divulgação, mas restritas ao titular dos dados, às entidades administradoras dos cadastros e a outras pessoas que sejam que potencialmente credoras, geralmente fornecedores, bancos, lojas, prestadoras de serviços. Nesse sentido: No que se refere à forma de divulgação dos dados, o Código de Defesa do Consumidor impõe aos organizadores e administradores de arquivos de consumo negativos o dever de respeitar limites de acessibilidade dos dados, vedando o acesso de forma coletiva e massificada às informações arquivadas. [...], tem-se que o acesso aos bancos de dados e cadastros de consumo não é livre a qualquer pessoa: ele é restrito ao titular dos dados ou a outras pessoas que sejam legitimamente interessadas, como os fornecedores associados ao arquivo de consumo38.
No caso do SPC, por exemplo, poderão ser associados-usuários desse banco de dados vinculado às CDL’s – Câmaras de Dirigentes Lojistas as empresas mercantis, prestadoras de serviços, instituições financeiras, profissionais liberais, empresas de cobrança39. Logo, somente os associados-usuários do SPC e os titulares das informações é que poderão consultar sua base de dados. O Cadastro de emitentes de Cheques sem Fundos (CCF) tem suas informações restritas às instituições financeiras inscritas ou que venham a se inscrever no serviço de compensação de cheques e aos titulares dos dados40. De maneira similar, terá acesso aos dados constantes nos registros da Serasa somente os interessados em fornecer crédito. Enfim, a regulamentação legal das entidades de bancos de dados CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O consumidor e o direito à autodeterminação informacional. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 368. 39 Regulamento Nacional dos SPC’s. Disponível em http://www.cndl.org.br/docs/ Regulamento%20Nacional%20de%20SPC_versao%202009.pdf. Acesso em 15/01/2013. 40 BRASIL. Banco Central. Resolução n. 1682. Disponível em https://www3.bcb. gov.br/normativo/detalharNormativo.do?N=090014679&method=detalharNormativo. Acesso em 07/01/2013. 38
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de proteção ao crédito passa pelos seguintes pontos: a garantia de privacidade ao consumidor; transparência na coleta, armazenamento e gerenciamento de informações; imposição de padrões temporais e de veracidade dos dados coletados; e, o dever de reparação de eventuais danos pela violação de direitos41. 2.5 - O caráter público dos bancos de dados O Código de Defesa do Consumidor considerou que os bancos de dados são entidades de caráter público, consoante parágrafo 4º do artigo 43 do diploma consumeirista, em vista do interesse social que gravita sobre tais entidades, uma vez que circulam informações cadastrais de inúmeros particulares. O caráter público dos bancos de dados não significa, porém, que são entidades de Direito Público. O caráter público atribuído pelo legislador visou simplesmente a possibilidade de acesso aos arquivos pelos interessados, inclusive por meio de habeas data, e que o seu funcionamento e administração devem ser corretos e justos. Assim, o CDC, ao legalmente enxergar caráter público nos arquivos de consumo, quis simplesmente abrir as portas da ação constitucional [habeas data], mostrando ser ela instrumento adequado para seu controle, nos exatos termos do at. 5º, LXXII, da Constituição Federal. Isso porque os arquivos de consumo, como regra, têm natureza jurídica privada, a não ser quando instituídos por entidades oficiais, como os PROCON’s e o próprio Banco Central42. [...] estatais ou privados, os arquivos de consumo são tidos pelo ordenamento, a partir do CDC, como de “caráter público” (o que é bem diferente de vislumbrá-los como sendo intrinsecamente de Direito Público). Com isso quer BENJAMIN, Antonio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinoveret al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 420. 42 BENJAMIN, Antonio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinoveret al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 432. 41
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Jean Carlos Fernandes e Sávio Raniere Pereira Pinto significar que seu funcionamento e administração – corretos e justos, nos termos da Constituição – apresentam particular interesse para a sociedade como um todo (=interesse público), conferindo-se a esta certos direitos especiais (como, por exemplo, direito de acesso aos arquivos da empresa), não necessariamente exercitáveis como outras modalidades de atividade empresarial43.
A ação de habeas data tem fundamento no artigo 5º, inciso LXXII da Constituição da República de 1998: Art. 5º [...] LXXII - conceder-se-á “habeas-data”: a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo;
O Código de Defesa do Consumidor, portanto, atribuiu o caráter público aos bancos de dados para assegurar aos cidadãos o conhecimento de informações contidas naquelas entidades de cadastro. Além dessas hipóteses, os bancos de dados, por serem dotados de caráter público, devem, outrossim, garantir direito de defesa administrativamente aos cidadãos e ter transparência no exercício de suas atividades. São considerados de “caráter público” para permitir a utilização de certos instrumentos processuais que só têm cabimento contra tais tipos de entidades (mandado de segurança e habeas data, por exemplo), espantando, de vez, dúvida que porventura viesse a permanecer. A inclusão dos arquivos de consumo no universo restrito das instituições de caráter público não tem por ratio lhes conferir poder de cadastrar pessoas, manipulando a seu bem querer o nome e BENJAMIN, Antonio Hermann de Vasconcellos.Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinoveret al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 433. 43
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Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade reputação dos cidadãos. É exatamente o oposto: por estarem publicizados, cada indivíduo, solitária ou coletivamente, ganha o direito de questioná-los da maneira mais ampla possível, tanto nos procedimentos que utilizam, como no conteúdo do que mantêm.44
Com efeito, o caráter público dos bancos de dados tem por objetivo a atribuição de obrigações e limitações adicionais às empresas que gerem os bancos de dados, uma vez que elas são, geralmente, entes privados, mas que trabalham com informações preciosas dos cidadãos. 2.6 - Atuação e limitações aos bancos de dados nas legislações estrangeiras: a experiência dos Estados Unidos da América e da União Europeia Em outros países também existem bancos de dados públicos ou privados, principalmente aqueles que visam a proteção do crédito, tal como ocorre no Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, destacam-se os seguintes creditbureaus: TRW Informatin Services, EquifaxCreditInformatione Trans-UnionCreditInformationCompany45. O ExperianGroupLimited também atua nos Estados Unidos, Espanha, França, Portugal, Reino Unido, dentre outros países. A legislação estadunidense que regulamenta e limita o exercício das atividades de bancos de dados de proteção ao crédito é o Fazer CreditReportingAct (FCRA), de 1970, que regula o recolhimento, divulgação e o uso de informações do consumidor, incluindo informações de crédito. Tal lei é, inclusive, uma das influências do legislador brasileiro na elaboração do projeto de Código de Defesa do Consumidor. O Fair CreditReportingActreconhece a importância de informações BENJAMIN, Antonio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinoveret al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 433-434. 45 BENJAMIN, Antonio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinoveret al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 414. 44
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sobre créditos e da atuação dos bureaus de crédito nos Estados Unidos, bem como a necessidade de assegurar que os bancos de dados de proteção ao crédito não excedam certos limites, principalmente no que tange ao direito de privacidade. Todavia, certo é que o setor de informações pessoais para concessão de crédito foi o primeiro a receber proteção legal, com a edição, em 1970, do Fair CreditReportingAct(FCRA), que foi, destaque-se, a principal influência do legislador brasileiro, ao regulamentar, no art. 43 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), os bancos de dados de proteção ao crédito. Em suas considerações iniciais, o FCRA afirma e reconhece que o sistema bancário depende, para o seu bom funcionamento, de informações corretas e adequadas sobre crédito e que, nesse contexto, as agências de proteção ao crédito (consumerreporting agencies) assumiram um papel vital. Reconhece, de outro lado, a necessidade de assegurar que as agências exercitem suas graves responsabilidades com justiça, imparcialidade respeito ao direito à privacidade do consumidor46.
A legislação estadunidense, portanto, impõe limites aos bancos de dados de proteção ao crédito muito próximo dos que foram estabelecidos na lei brasileira (Código de Defesa do Consumidor). Assim, a lei americana impõe que a identificação dos dados cadastrais deve ser adequada, completa e precisa; as entidades de bancos de dados devem ter pessoal treinado para atendimento; ao receberem notificação sobre eventuais erros cadastrais, devem investigar as informações e corrigir os erros de dentro do prazo de 30 (trinta) dias; devem informar sobre registros negativos que foi ou está prestes a ser incluído em relatórios de crédito no prazo de 30 (trinta) dias. Ademais, os descumprimentos dos limites legais de negativação em bancos de dados também podem ensejar a responsabilidade das entidades de proteção ao crédito47. BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Editora RT, 2007, p. 250. 47 Disponível em http://www.ftc.gov/os/statutes/031224fcra.pdf. Acesso 11/01/2013. 46
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Em uma descrição sumária da legislação dos Estados Unidos, as pessoas constantes em bancos de dados de proteção ao crédito têm direito de saber o que está arquivado sobre ela; deve ser informada se seus dados têm sido utilizados; têm direito de pedir uma pontuação de crédito, que representa merecimento de crédito (cadastro positivo); e têm direito de contestar informações incompletas ou imprecisas a seu respeito. E a lei americana impõe, ainda, que o acesso ao arquivo é limitado, uma vez que os bureaus de crédito somente podem fornecer informações para terceiros com interesse em realizar negócios, empregadores ou seguradoras48. Importante ressaltar também que o Fair CreditReportingAct não exclui outros direitos criados por legislações dos estados-membros dos Estados Unidos. No âmbito da União Européia, o Parlamento Europeu e o Conselho editaram a Directiva n. 95/46/CE, datada de 24 de Outubro de 1995. Trata-se de uma norma geral que visa proteger direitos dos cidadãos em face das atividades de bancos de dados e se aplica às atividades dos bureaus de crédito públicos ou privados49. Entre os direitos das pessoas da comunidade européia e as limitações às entidades de proteção ao crédito constantes na Directiva n. 95/49/CE, pode-se ressaltar: os dados pessoais devem ser objeto de um tratamento leal e lícito e serem recolhidos para finalidades determinadas, explícitas e legítimas; devem, além disso, ser exatos e atualizados; as pessoas titulares dos dados têm o direito de acesso aos mesmos; o tratamento de dados pessoais só poderá ser efetuado se a pessoa tiver dado o seu consentimento ou se o tratamento for necessário para, por exemplo, o cumprimento de uma obrigação legal (inadimplemento), execução de uma missão de interesse público ou a persecução de interesses legítimos do responsável pelo tratamento de dados; o responsável pelo tratamento deve fornecer à pessoa em causa 48 Disponível em http://www.yale.edu/hronline/careers/screening/documents/ FairCreditReportingAct.pdf. Acesso em 11/01/2013. 49 BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA ROSCOE, Leonardo. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Editora RT, 2007, p. 250. 82
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um certo número de informações, tais como, identidade do responsável pelo tratamento, finalidades do tratamento e destinatários dos dados; as entidades de proteção ao crédito devem, ainda, proceder à informação do titular dos dados antes deles serem comunicados a terceiros para efeitos de prospecção e ter o direito de se opor a essa comunicação. Além disso, o tratamento ilícito de dados pelas entidades que gerenciam os bancos de dados também pode ensejar a responsabilização civil pelos eventuais prejuízos causados. Em exemplificação, Portugal, por meio da Lei da Protecção de Dados Pessoais (Lei n. 67/98), transpôs para sua ordem jurídica interna a Directiva n. 95/46/CE. A lei portuguesa conceituou como responsável pelo tratamento de dados: [...] a pessoa singular ou colectiva, a autoridade pública, o serviço ou qualquer outro organismo que, individualmente ou em conjunto com outrem, determine as finalidades e os meios de tratamento dos dados pessoais; sempre que as finalidades e os meios do tratamento sejam determinados por disposições legislativas ou regulamentares, o responsável pelo tratamento deve ser indicado na lei de organização e funcionamento ou no estatuto da entidade legal ou estatutariamente competente para tratar os dados pessoais em causa50.
Portanto, tanto os bancos de dados de pessoas físicas e jurídicas quanto os da autoridade pública estão sujeitos à Directiva n. 95/46/CE com suas limitações impostas. A legislação da Comunidade Européia determina, ainda, a instituição de uma ou mais autoridades públicas para fiscalização das leis nacionais que disciplinam os bancos de dados. Em Portugal, a autoridade fiscalizadora é a Comissão Nacional de Protecção de Dados – CNPD. Em síntese, cumpre salientar que a Diretiva 95/46/CE (União Européia), bem como o Fair CreditReportingAct (Estados Unidos) determinam explicitamente que as informações não devem ser Disponível em http://www.cnpd.pt/bin/legis/nacional/lei_6798.htm. Acesso em 11/01/2013.
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excessivas, ainda que estejam diretamente vinculadas aos propósitos dos bancos de dados51. Enfim, não há divergência em outros ordenamentos jurídicos no que tange à necessidade de controle das espécies de bancos de dados de informações pessoais, existindo limites às entidades de proteção ao crédito no tratamento de dados. 2.7 - Ordem econômica, princípio da livre concorrência e as entidades de proteção ao crédito no Brasil Um dos fundamentos da ordem econômica no Brasil, conforme o caput do artigo 170 da Constituição da República de 1988 é a livre iniciativa. E um dos princípios que regem a ordem econômica é a livre concorrência. Ademais, consta na Carta Constitucional que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros, consoante o parágrafo 4º do artigo 173. O princípio da livre concorrência corresponde ao balizamento jurídico para impedir que agentes econômicos desvirtuem as prerrogativas de liberdade de iniciativa, o que pode prejudicar a sociedade e o mercado52. [...] o prestígio que a liberdade de iniciativa recebe da Constituição significa, também, o reconhecimento de um direito titularizado por todos: o de explorarem atividades empresariais. Disso decorre o dever, imposto à generalidade das pessoas, de respeitarem o mesmo direito constitucional, bem como a ilicitude dos atos que impeçam o seu pleno exercício53.
Assim, a livre concorrência, de acordo com os preceitos
BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA ROSCOE, Leonardo. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Editora RT, 2007, p. 261. 52 RAGAZZO, Carlos Emmanuel Joppert. Notas introdutórias sobre o princípio da livre concorrência. Londrina: Scientia Iuris, 2006, v. 10, p. 83-96. 53 ULHOA, Fábio. Curso de direito comercial: direito de empresa. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, v. 1, p. 252. 51
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constitucionais, é a liberdade de exercício de qualquer atividade econômica lícita, devendo a legislação reprimir o abuso de poder econômico. Na atualidade, a Lei que reprime o abuso de poder econômico e dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica brasileira é a Lei n. 12.529/2011. Acerca da infração à ordem econômica, Fábio Ulhôa Coelho explica: Prejudicar a livre concorrência ou iniciativa, por fim, significa incorrer em qualquer prática empresarial lesiva às estruturas do mercado, ainda que não limitativas ou falseadoras dessas estruturas. Trata-se de conduta difícil de se exemplificar em nível conceitual54.
O artigo 36 da Lei n. 12.529/2011, sobre as infrações à ordem econômica, dispõe: Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; II - dominar mercado relevante de bens ou serviços; III - aumentar arbitrariamente os lucros; e IV - exercer de forma abusiva posição dominante.
Nessa dimensão, constituem infração à ordem econômica os atos de agentes econômicos que tentarem limitar, falsear ou prejudicar a livre concorrência, dominar o mercado relevante de bens ou serviços, aumentar os lucros de forma arbitrária e exercer abusivamente posição dominante no mercado. O modelo brasileiro de livre concorrência, contudo, não significa manter vários agentes econômicos no mercado, mas impedir que alguns deles prejudique o mercado por meio de abuso de poder econômico ou ULHOA, Fábio. Curso de direito comercial, v. 1: direito de empresa. 16ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 277. 54
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quaisquer práticas que infrinjam a ordem econômica. Esclarece-se que a conquista lícita e natural de mercado não é reprimida pelo ordenamento jurídico brasileiro. Ao contrário do que se pensa, o modelo de livre concorrência não se preocupa necessariamente em manter um grande número de agentes no mercado, como se pode inferir da situação hipotética de concorrência perfeita – comumente considerada como o ideal de livre concorrência – em que há vários compradores e vendedores, todos eles tomadores de preço (incapazes de influenciar preço). Existem estruturas de mercado que são mais eficientes (ou seja, maximizam o bemestar dos consumidores) com um número menor de agentes econômicos; em casos específicos, a melhor estrutura é o monopólio natural55.
Na economia, portanto, existem agentes que detêm um monopólio natural do mercado. E tal situação é permitida, na medida em que a legislação que rege a defesa da concorrência no Brasil prevê que a conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiência não caracteriza dominação de mercado (artigo 20, parágrafo 1º, Lei n. 8.884/1994 (revogada) e artigo 36, parágrafo 1º, Lei n. 12.529/2011). Sobre o monopólio natural, pode-se defini-lo: Monopólio natural é uma estrutura caracterizada por uma alta escala mínima viável vis-à-vis o tamanho do mercado. Isso se dá em razão dos elevados custos fixos presentes e pelo baixo custo marginal nesse determinado segmento. Em outras palavras, não compensa entrar no mercado porque só há espaço para um agente econômico56.
No âmbito dos bancos de dados de proteção ao crédito há uma tendência à concentração do mercado. Na análise do CADE acerca do RAGAZZO, Carlos Emmanuel Joppert. Notas introdutórias sobre o princípio da livre concorrência. Londrina: Scientia Iuris,2006, v. 10, p. 83-96. 56 RAGAZZO, Carlos Emmanuel Joppert. Notas introdutórias sobre o princípio da livre concorrência. Londrina: Scientia Iuris,2006, v. 10, p. 83-96. 55
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ato de concentração entre Boa Vista e Equifax, o Conselheiro Carlos Emmanuel Joppert Ragazzo fez algumas pontuações importantes no que tange ao mercado de banco de dados de proteção ao crédito, das quais utilizaremos a seguir. A Serasa S.A., o SPC (CDL’s) e a Boa Vista/Equifax são os principais agentes do mercado brasileiro de serviços de proteção ao crédito, mas a construção de seus bancos de dados ocorreu de maneira e origens distintos. Enquanto a Equifax focou-se em dados com informações sobre pessoas jurídicas, a Serasa S.A. detém informações tanto de pessoas físicas quanto jurídicas originariamente colhidas por meio de instituições financeiras. Por outro lado, o SPC e a Boa Vista (antes da união com a Equifax) sempre tiveram foco em informações cadastrais de pessoas físicas. Ora, tais características refletem os interesses de quem buscam informações em cada banco de dados. O SPC e a Boa Vista estão ligados aos lojistas e associações comerciais, por isso detém dados de pessoas físicas, que são pretensos clientes destes. A Serasa S.A., por ter sido constituída por empresas do ramo bancário, formou seu banco de dados com base em informações fornecidas pelas instituições financeiras e abarca tanto pessoas físicas quanto jurídicas, pois os bancos oferecem crédito para ambos os tipos. Logo, pode-se afirmar que, até o presente momento, cada entidade de proteção ao crédito conquistou fatias relevantes do mercado de forma natural, colhendo e prestando informações a agentes econômicos distintos. Com efeito, há uma tendência de concentração lícita nesse tipo de mercado, na medida em que é interesse dos usuários desses serviços de proteção ao crédito (empresas, lojistas, bancos, fornecedores, prestadores de serviços) que as entidades detenham um banco de dados de maior porte possível, que seja capaz de ofertar um serviço amplo, abrangendo o máximo de dados para própria efetividade de proteção ao crédito. Assim, uma grande escala é imprescindível para atuação nesse tipo de mercado. Deste modo, um sistema de proteção ao crédito pulverizado e demasiado amplo aumentaria os custos de transação e os 87
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riscos do crédito57. Percebe-se que se trata de um mercado em que a escala é um elemento crucial para a prestação desse tipo de serviço. Por essa razão, natural e esperado que seja um mercado concentrado, para a redução dos custos de transação que envolveriam um cenário com muitos agentes ofertantes58. (...) todos os serviços oferecidos pelas empresas que atuam no setor de serviços de proteção ao crédito estão alicerçadas sobre um banco de dados construído ao longo do tempo, fruto de informações recebidas e constantemente atualizadas, oriundas de distintos agentes econômicos. A construção desses bancos de dados revela-se custosa e, sobretudo, requer uma escala vultosa para se tornar atrativa aos olhos dos consumidores desse tipo de serviço59.
Note-se, portanto, que a possibilidade de entrada de um novo agente econômico no mercado de banco de dados de proteção ao crédito é remota e improvável. Saliente-se que o ato de concentração n. 08012.006726/2011-9 entre a Boa Vista Serviços S.A. e a Equifax do Brasil Ltda. foi aprovado sem restrições pelo CADE. O órgão de defesa da concorrência considerou que os serviços prestados pelos agentes econômicos eram complementares e, logo, não haveria sobreposição do mercado. Em conclusão da decisão do ato, o Conselheiro Carlos Emmanuel Joppert Ragazo afirmou que “o nível de rivalidade existente no mercado ora analisado seja suficiente para coibir o exercício unilateral de poder de mercado por parte da empresa resultante do BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa da Economia CADE. Ato de Concentração n. 08012.006726/2011-90. f. 171-172. Relator Conselheiro Carlos Emmanuel Joppert Ragazo. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default.aspx? e15cb044c84cdd37c95ea276bc56d673c6. Acesso em 15/01/2013. 58 BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa da Economia CADE. Ato de Concentração n. 08012.006726/2011-90. f. 171-172. Relator Conselheiro Carlos Emmanuel Joppert Ragazo. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default.aspx? e15cb044c84cdd37c95ea276bc56d673c6. Acesso em 15/01/2013. 59 BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa da Economia CADE. Ato de Concentração n. 08012.006726/2011-90. f. 171-172. Relator Conselheiro Carlos Emmanuel Joppert Ragazo. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default.aspx? e15cb044c84cdd37c95ea276bc56d673c6. Acesso em 15/01/2013. 57
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presente ato de concentração”60. Haveria infração à ordem econômica caso os principais agentes econômicos do ramo de banco de dados de proteção ao crédito resolvessem realizar fusão. Nesse caso, haveria ato que visa a dominação de mercado, o que é contrário à livre concorrência. Por exemplo, uma provável fusão entre a Boa Vista Serviços S.A. e a Serasa S.A., poderia ser considerada lesiva aos interesses do mercado e, portanto, rechaçada pelo CADE, uma vez que, atualmente ambas possuem bancos de dados tanto de pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas. Pelo exposto, a atuação dominante das entidades de proteção ao crédito não caracteriza infração à ordem econômica ou ao princípio da livre concorrência, tendo em vista as decisões já proferidas pelo Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência nesse sentido. 3 - Do Protesto de Títulos de Crédito e Documentos de Dívida 3.1 - O enquadramento jurídico do protesto Instituto complementar do direito cambiário, mas não privativo deste, o protesto61 alcançou posição de destaque na atividade empresarial para firmar a impontualidade do devedor frente ao credor, podendo a sua ausência, ainda, quando estritamente necessário, privar o portador do título do direito de regresso contra os endossantes e respectivos avalistas.62 BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa da Economia CADE. Ato de Concentração n. 08012.006726/2011-90. f. 171-172. Relator Conselheiro Carlos Emmanuel Joppert Ragazo. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default.aspx? e15cb044c84cdd37c95ea276bc56d673c6. Acesso em 15/01/2013. 61 Conhecem-se duas espécies de protesto: o protesto judicial, procedimento cautelar específico previsto no art. 867 do Código de Processo Civil; e o protesto cambial, próprio do direito cambiário, de aplicação aos títulos de crédito. A abordagem do tema no presente trabalho se fará em torno do protesto cambial. 62 Dispõe, por exemplo, o § 4º do art. 13 da Lei das Duplicatas (Lei n. 5.474/68) que o portador da duplicata que não tirar o protesto, em forma regular e no do prazo de trinta dias, contado da data de seu vencimento, perderá o direito de regresso contra os 60
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Inúmeros são os conceitos atribuídos ao protesto pela doutrina balizada, sendo desnecessário citar todos, pelo que se permite trazer a lume apenas alguns, de acordo com a conceituação clássica. Eunápio Borges63 assevera que o protesto é “o ato oficial e solene por meio do qual se faz certa e se prova a falta ou recusa, total ou parcial, do aceite ou do pagamento de um título cambial.” Carvalho de Mendonça64 afirma que o protesto “é a formalidade extrajudicial, mas solene, destinada a servir de prova da apresentação da letra de câmbio, no tempo devido, para o aceite ou para o pagamento, não tendo o portador, apesar de sua diligência, obtido este ou aquele. Com o mesmo objetivo, serve ainda de prova da falência do aceitante.” Cunha Peixoto65, a seu turno, define o protesto como o “ato público e solene necessário à prova de apresentação do título cambial ao sacado para aceite e ao aceitante para pagamento e, consequentemente, de recusa de uma e outra.” Grinberg66 assinala que o protesto, “na verdade, é a lavratura, em livro próprio e de maneira formal, de declaração do oficial de protestos de que chamou o devedor de um título de crédito para aceitá-lo ou pagálo, não tendo sido atendido o chamado.” Fundamentalmente, protesto é o ato formal e solene67, destinado a servir de meio probatório na configuração do inadimplemento.68 Tratando-se de protesto cambial, busca-se ainda fazer certa e se provar a falta ou recusa, total ou parcial, de aceite, de devolução ou do pagamento do título. Embora não seja função do legislador ministrar definições, as quais endossantes e respectivos avalistas. 63 BORGES, João Eunápio. Títulos de crédito. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 108. 64 CARVALHO DE MENDONÇA. J. X. Tratado de direito comercial brasileiro. São Paulo: Freitas Bastos, 1963, p. 387, n. 870, v. V, II parte. 65 PEIXOTO, Carlos Fulgêncio da Cunha. Comentários à lei de duplicatas. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, p. 135. 66 GRINBERG, Mauro. Protesto cambial. São Paulo: Saraiva, 1983, p. 2. 67 Segundo o saudoso professor Wille Duarte Costa, o protesto “não é solene, pois nenhum ritual ou cerimônia é necessária para sua existência” (Títulos de crédito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 182). 68 ABRÃO, Carlos Henrique. Do protesto. São Paulo: Universitária de Direito, 1999, p. 18. 90
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devem ser evitadas, porque de nada adiantam num texto e refogem à missão simplesmente normativa deste69, a Lei n. 9.492, de 10/09/1997, em seu art. 1º, definiu o protesto como o “ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.” O protesto, portanto, prova o inadimplemento e o descumprimento de determinada obrigação, exteriorizada em um título ou em documento de dívida.70 Garcia71 destaca dos conceitos apresentados pela doutrina as características do protesto: “ato extrajudicial, oficial, solene, exterior ao título, praticado a pedido do portador, sob forma de instrumento público, e que serve para marcar a falta de devolução, do aceite, ou do pagamento de título cambial ou assemelhado.” 3.2 - A funcionalidade do protesto Em princípio, denota-se do protesto dupla função: a primeira caracteriza ou qualifica o estado de mora do devedor pela falta de pagamento, pela não aceitação do título ou a recusa na sua devolução; a segunda permite o exercício do direito de regresso do portador do título contra os endossantes e respectivos avalistas e o pedido de falência com base na impontualidade. Destaca-se, pois, aspectos probatórios e conservatórios de direitos do protesto.72 Wille Duarte Costa73 registra com propriedade ser o protesto, antes de tudo, prova, ou seja, prova insubstituível da apresentação do título ao devedor, sendo o resto mera consequência. A seu turno, Cláudio MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil.28. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 7, v. 4. 70 PARIZATTO, João Roberto. Nova lei de protesto de títulos de crédito. São Paulo: Led, 1998, p. 09. 71 GARCIA, Rubem. Protesto de títulos (Procedimento – Incidentes). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p. 9. 72 ABRÃO, Carlos Henrique. Do protesto. São Paulo: Universitária de Direito, 1999, p. 18-21. 73 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito.3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 182. 69
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Santos74, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, em artigo específico sobre protesto de títulos de crédito, verifica ser “inequívoca a função testificante do protesto. É ato de natureza probante por excelência.” Segundo Fran Martins, o protesto cambial é meio de prova especialíssimo, próprio dos títulos cambiários, servindo para atestar um fato, a falta ou recusa do aceite ou do pagamento, mas, não criando direitos. É um ato facultativo, que o detentor da letra praticará ou não, de acordo com a sua vontade, apesar de algumas vezes se falar em protesto obrigatório. Se o direito regressivo do portador decai quando o título não é protestado, não foi a falta de protesto, em essência, que operou a perda do direito, mas o decurso do prazo que tinha o portador para haver a importância da letra ou para receber o aceite. Por ato próprio, decorrido esse prazo, nada fez o portador para assegurar seu direito regressivo. É o protesto, assim, um simples meio de prova para o exercício do direito cambiário, como acentua Pontes de Miranda.75
Nas palavras de Mauro Grinberg76, “o protesto tem inegável função psicológica coativa dos devedores, havendo quem fale em constrangimento moral legítimo, sendo que hoje os interessados preocupam-se muito mais com os efeitos comerciais do que com os efeitos legais do protesto.” Exemplificando, no que concerne à duplicata, o protesto do título por falta de aceite exerce função acauteladora, viabilizando a ação de execução em desfavor do sacado, em conjunto com o título e o comprovante da entrega e recebimento da mercadoria, a teor do artigo 15, inciso II, da Lei n. 5.474/68, e desde que não exista recusa forma de aceite. Por fim, o protesto tem como função caracterizar a impontualidade77 SANTOS, Cláudio. Do protesto de títulos de crédito. Revista dos Tribunais, n. 678, p. 16, abr. 1992. 75 MARTINS, Fran. Títulos de crédito. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 199-200. 76 GRINBERG, Mauro. Protesto cambial. São Paulo: Saraiva, 1983, p. 16-17. 77 Nelson Abrão adverte que “a impontualidade, por si só, não caracteriza insolvência, 74
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para o exercício do direito do credor requerer a falência do devedor empresário, como determina o artigo 94, inciso I, da Lei n. 11.101/2005.78 3.3 - Os efeitos advindos do protesto O protesto é gerador de inúmeros efeitos na ordem social, econômica e jurídica, em relação ao título propriamente dito, ao sacado, ao aceitante e aos demais coobrigados.79 Socialmente, o protesto causa transtornos, impondo àquele que tem seu nome vinculado a tal ato um descrédito perante a sociedade, além da inserção do nome nos cadastros de órgãos de proteção ao crédito. Economicamente, o protesto constitui um obstáculo ao exercício pleno pelo empresário de suas atividades, prejudicando o fomento das práticas empresariais, tendo em vista o efeito inibidor que a lavratura do protesto traz àqueles que pretendem negociar com o devedor. Sob a ótica jurídica, identifica-se como efeito importante do protesto a conservação do direito de regresso do portador do título contra o sacador, endossantes e seus avalistas, como se depreende do artigo 53 da Lei Uniforme de Genebra – LUG, do artigo 32 da Lei Cambiária (Decreto n. 2.044, de 1908) e artigo 13, § 4º, da Lei de Duplicatas. Marca ainda o protesto o termo inicial do prazo prescricional de um ano para o exercício de tal direito pelo portador da letra de câmbio80, além de determinar pela data de sua lavratura o vencimento da letra de câmbio com vencimento a certo termo de vista, se o aceite não estiver datado (artigo 35, da LUG). que é um estado denotador da incapacidade de adimplir e que legitima a abertura do procedimento concursal” (Curso de direito falimentar.5. ed. São Paulo: Leud, 1997, p. 73). 78 Art. 94. Será decretada a falência do devedor que: I – sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários mínimos na data do pedido de falência; 79 MARTINS, Fran. Títulos de crédito.13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 202. 80 Dispõe o art. 70 da LUG que “as ações do portador contra os endossantes e contra o sacador prescrevem em um ano, a contar da data do protesto feito em tempo útil, ou da data do vencimento, se se trata de letra que contenha a cláusula ‘sem despesas’.” 93
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Ademais, na letra de câmbio, o protesto por falta de aceite produz o efeito de considerá-la vencida antecipadamente, o mesmo ocorrendo se o título for protestado pela falência do aceitante ou do emitente, o que não constitui requisito para o exercício do direito regressivo do portador contra o sacador, endossantes e avalistas, como se depreende do artigo 43 do mesmo diploma legal.81 Frise-se que “em relação ao sacado que não aceitou o título, nenhum efeito produz o protesto por falta de aceite, pois ele não se obrigou. Sua obrigação no título só ocorre com sua assinatura.”82 No que diz respeito à duplicata, o protesto tem como efeito provar a não devolução do título por parte do sacado, a recusa de aceite e de pagamento, além de viabilizar a ação de execução do título sem aceite em desfavor do sacado, acompanhado do comprovante de entrega e recebimento das mercadorias ou serviços. Além disso, ocorrendo recusa injustificada de aceite, comprovada pelo protesto cambial por falta de aceite da duplicata, dá-se o vencimento extraordinário do título, ou seja, vencimento antecipado. Dessa forma, se o protesto ocorre em junho e o título tem vencimento para dezembro, o vencimento antecipa-se para a data do protesto, podendo ser executados todos os obrigados nele.83
A caracterização da impontualidade do devedor é outro efeito determinante do protesto, o que possibilita o reconhecimento do pressuposto da insolvência para a configuração do estado de falência do empresário84. O protesto fixa ainda o termo legal da falência, conforme se subsume do artigo 99 da Lei n. 11.101/05. Na doutrina, discutia-se ainda se o protesto tinha como efeito A LUG trouxe a possibilidade de o portador da letra poder exercer os seus direitos de ação contra os endossantes, sacador e outros obrigados no vencimento desta, se o seu pagamento não foi efetuado e mesmo antes do seu vencimento. 82 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 223. 83 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 405. 84 Vale ressaltar que o protesto somente não será exigido na hipótese de execução frustrada ou configuração de ato falência propriamente dito, a teor do art. 94, II e III, da Lei n. 11.101/05. 81
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interromper a prescrição, o que ficou sem razão de ser pela edição da Súmula 153 do Supremo Tribunal Federal ao dispor que o “simples protesto cambiário não interrompe a prescrição”, atribuindo tal efeito apenas ao protesto judicial (artigo 453, n. 3, do Código Comercial, revogado pelo Código Civil de 2002). Tal posição, contudo, não mais prevalece com o advento do Código Civil brasileiro, que prevê, em seu artigo 202, inciso III, que a interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, darse-á por protesto cambial. Assim, com a entrada em vigor do Código Civil, o protesto cambial ganhou novo efeito, aliando-se ao protesto judicial no sentido de também interromper a prescrição. Contudo, adverte Vinícius Gontijo, que a interrupção da prescrição pelo protesto cambial “somente poderá se dar no caso de o signatário houver sido intimado do protesto”, pela aplicação do princípio da autonomia das obrigações cambiárias. 85 3.4 - Das modalidades de protesto: facultativo e necessário A doutrina fala em protesto facultativo e protesto necessário. Pelo primeiro, designa-se o protesto com função eminentemente probatória da inadimplência do devedor86. Pelo segundo, o protesto tem função conservatória, para assegurar o direito de regresso contra os obrigados indiretos no título87, além de preencher requisito legal para o pedido de falência com base na impontualidade. O protesto será sempre facultativo, pois fica a cargo do portador GONTIJO, Vinicius Jose Marques. Interrupção da prescrição pelo protesto cambial. In FERNANDES, Jean Carlos. Títulos de crédito: homenagem ao professor Wille Duarte Costa. Belo Horizonte, Del Rey, 2011, pp. 266-275. 86 Segundo Wille Duarte Costa, o protesto cambial não constitui em mora do devedor, pois o “não-cumprimento da obrigação positiva e líquida no vencimento importa, de pleno direito, em mora do devedor. Logo, é a mora ex re, porque o prazo para pagamento já está fixado. Aplica-se, portanto, no caso, o princípio do dies interpellat pro homine, isto é, a partir do vencimento já está em mora o devedor do título, independemente de interpelação.” (Títulos de crédito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 224-225). 87 GARCIA, Rubem. Protestos de títulos (Procedimentos – Incidentes). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p. 4. 85
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do título, que poderá praticá-lo ou não, de acordo com a sua vontade. Pode-se tornar um ato necessário para o exercício de direitos dele dependentes, como o portador do título pode apenas pretender acionar o emitente e seus avalistas, deixando de lado os demais coobrigados. Nesse contexto, o protesto será facultativo necessário quando dele depende o exercício de determinado direito, como o requerimento da falência do devedor empresário com base na impontualidade88 e o acionamento regressivo dos coobrigados no título. Não se fala aqui de protesto obrigatório, o que, a nosso ver, é uma imprecisão técnica, pois o protesto, como dito anteriormente, é um ato facultativo por excelência, cuja lavratura depende da manifestação volitiva do portador do título. De outro lado, o protesto será apenas facultativo quando por ele objetiva-se exclusivamente provar a impontualidade do devedor, documentando a falta de aceite, de devolução ou depagamento do título. 3.5 - Documentos protestáveis A Lei n. 9.492/97 disciplinou, em seu artigo 3º, a competência do Tabelião de Protesto de Títulos para lavrar e registrar o protesto de título e de outros documentos de dívida. Na atual sistemática do protesto, portanto, os documentos necessários à instrumentalização de tal ato são os títulos de crédito e demais documentos de dívida. O protesto dos títulos de crédito não suscita maiores dúvidas, o mesmo não se podendo dizer quanto a “outros documentos de dívida”, expressão imprecisa e obscura. Ermínio Amarildo Darold, abordando o assunto, ressaltou: Importante gizar, desde já, ter o legislador perdido a oportunidade de fazer-se claro e preciso na definição de quais documentos poderão servir de base para o protesto. Dúvida inocorre tocante à parte que se refere aos títulos, obviamente aos títulos de crédito, assim reconhecidos pela lei. Todavia, a expressão outros documentos de dívida é vaga e imprecisa. 89 88 89
Artigo 94, I, da Lei n. 11.101/05. DAROLD, Ermínio Amarildo. Protesto cambial. Curitiba: Juruá, 1999, p. 23.
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O referido autor, procurando demonstrar a imprecisão legislativa, indaga ainda: “Qual o documento de dívida que, em não sendo reconhecido pela lei como título executivo, pode ser protestado?” Segundo Carlos Henrique Abrão90, “todos os contratos que instrumentalizam reciprocidade obrigacional e determinam prazo de cumprimento tornam-se passíveis de protesto, mas é bastante improvável a ocorrência, haja vista a caução que serve de base mapeada por cambial.” Em verdade, para que determinado documento possa servir de sustentáculo ao protesto é mister que se apresente instrumentalizado em um contrato que reúna os elementos denunciadores do aperfeiçoamento do vínculo obrigacional. Com efeito, a presença de contratantes capazes, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei determinarão a regularidade do contrato. Mas não somente tais elementos. É imprescindível que o documento apresentado ao tabelião de protesto revele, sem sombra de dúvida, um acordo de vontades, o consentimento recíproco entre os contratantes, elemento essencial, mais característico dos contratos.91 Monteiro92 esclarece que a existência de um contrato regularmente formalizado pressupõe, necessariamente, a intervenção de duas ou mais pessoas, que se colocam acordes a respeito de determinada coisa. Tal característica, portanto, não pode refugir aos “documentos de dívida” levados ao tabelião de protesto. Se deles não se defluir a existência de um vínculo contratual perfeitamente formalizado com a manifestação volitiva das partes contratantes, principalmente daquele que se obrigou a cumprir determinada obrigação, no caso, o pagamento da dívida a certo tempo, não poderão ser objetos de protesto. É importante relembrar que a lavratura do protesto cria repercussões de toda ordem, mormente quanto ao regular desenvolvimento, a ABRÃO, Carlos Henrique. Do protesto. São Paulo: Universitária de Direito, 1999, p. 25. 91 MONTEIRO, Washington de Barros.Curso de direito civil. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, v. 5, p. 8. 92 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, v. 5, p. 4. 90
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partir dela, das atividades comerciais. Diante disso, deve-se evitar a concretização do protesto com base em documentos falhos, que não revelam a vontade contratual daquele que sofrerá os efeitos do ato, impedindo a ocorrência de abusos e o aviltamento de tão sério instituto. Sílvio de Salvo Venosa esclarece que a intenção do legislador não foi tornar o protesto uma “panacéia ou um placebo jurídico”, impondose uma interpretação restritiva ao artigo 1º da Lei 9294/97: Desse modo, embora haja quem à primeira vista possa sufragar opinião mais extensiva, o dispositivo do artigo 1º deve ser interpretado restritivamente no sentido de que o protesto é utilizável somente para os títulos cambiários e para os demais títulos executivos judiciais e extrajudiciais, que estão elencados nos artigos 584 e 585 do Código de Processo Civil. Desse modo, doravante, devem ser admitidos a protesto todo o rol elencado nesses dispositivos, entre outros, sentença condenatória proferida no processo civil, sentença arbitral; contratos de hipoteca, penhor, anticrese e caução, crédito decorrente de aluguel ou renda de imóvel, bem como encargo de condomínio, desde que comprovado por contrato escrito. Assim, por exemplo, o débito resultante da locação do imóvel, comprovado por contrato escrito, pode ser objeto de protesto, tanto quanto ao inquilino como quanto ao fiador, pois a fiança é modalidade de caução e se insere entre os títulos executivos extrajudiciais. Dessa forma, alarga-se enormemente o campo do protesto, antes resumido quase exclusivamente aos títulos de crédito.93
Por tais razões, os documentos levados a protesto devem ser certos, líquidos e exigíveis, tal como os títulos de crédito. A certeza defluirá daperfeição formal da obrigação, instrumentalizada em um contrato com duplo sujeito, objeto lícito, forma prescrita ou não defesa em lei e o acordo de vontades, sem o que nenhuma relação contratual poderá existir ou sobreviver. A importância da obrigação (quantum) VENOSA, Sílvio de Salvo. O protesto de documentos de dívidas. Jornal Valor Econômico. Caderno Legislação & Tributos. 05/04/2002. Tratou-se dodécimo quinto de uma série de 20 artigos sobre o Código Civil de 2002 publicado pelo Jornal Valor Econômico. 93
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indicará a liquidez, ao passo que a ausência de limitações ao pagamento pelo sujeito obrigado determinará a exigibilidade. 3.6 - O protesto para fins falimentares O pedido de falência com base na impontualidade não prescinde da existência de título ou títulos executivos protestados, cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários mínimos (artigo 94, I, Lei n. 11.101/05). A certeza, liquidez e exigibilidade do título executivo é condição específica para a instauração da lide falimentar, assim como a existência de protesto regular, sem vício em seu instrumento, o qual deverá conter a teor do artigo 22 da Lei n. 9.492/97 os seguintes requisitos: I - data e número de protocolização; II - nome do apresentante e endereço; III reprodução ou transcrição do documento ou das indicações feitas pelo apresentante e declarações nele inseridas; IV - certidão das intimações feitas e das respostas eventualmente oferecidas; V - indicação dos intervenientes voluntários e das firmas por eles honradas; VI - a aquiescência do portador ao aceite por honra; VII - nome, número do documento de identificação do devedor e endereço; VIII - data e assinatura do Tabelião de Protesto, de seus substitutos ou de Escrevente autorizado. Sobre estes requisitos, comenta Waldo Fázzio Júnior que os instrumentos de protesto que não identifiquem a pessoa que recebeu a carta intimatória pretensamente entregue à devedora, ausente qualquer documento positivador da existência de real e efetiva intimação, restam visceralmente maculados de irregularidades, não autorizando o acolhimento da postulação falimentar, em face da ausência de pressuposto essencial à constituição válida e regular da relação processual.94
A existência de protesto regular, portanto, é pressuposto essencial FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falências e concordatas comentadas. São Paulo: Atlas, 1999, p. 113. 94
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de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo falimentar, sem o qual, o pedido de quebra, com base na impontualidade, não persiste. A Lei n. 11.101/05, sem correspondente no revogado DecretoLei n. 7.661/45, inovou expressamente em seu artigo 96, inciso VI, ao dispor que a falência requerida com base no artigo 94, inciso I (impontualidade), não será decretada se o requerido provar “vício em protesto ou em seu instrumento”. Para Adalberto Simão Filho95, a nova lei de insolvência empresarial inovou quanto à argüição do vício no protesto ou em seu instrumento, mas, além disso, comprovou que “na nova lei o pedido de falência não deve ser exercitado como meio de cobrança”, pois “qualquer vício em protesto ou em seu instrumento pode se prestar a afastar a decretação da falência”. Com efeito, o vício no instrumento de protesto resta evidenciado na medida em que não traz em seu contexto, como determina o referido artigo 22 da Lei n. 9.492/97, a identificação de quem o recebeu. Tal circunstância impõe a extinção do feito falimentar, na linha do entendimento consolidado pela Súmula 361 do Superior Tribunal de Justiça: “A notificação do protesto, para requerimento de falência da empresa devedora, exige a identificação da pessoa que a recebeu.” Do instrumento de protesto, portanto, é que deverão constar “as referências necessárias à correta identificação do título, do credor e do devedor, bem como a certidão de intimação deste”.96 Somente assim o ato poderá ser considerado perfeito para embasar o pedido de falência. Nesse sentido o REsp 164759/MG: FALÊNCIA. PLEITO REJEITADO SOB O FUNDAMENTO DE QUE A INTIMAÇÃO DO DEVEDOR QUANDO DA EFETIVAÇÃO DO PROTESTO DEVE SER PESSOAL, LUCCA, Newton de; SIMÃO FILHO, Adalberto. Comentários à nova lei de recuperação de empresas e de falências. Arts. 94 aos 101. São Paulo: QuartierLatin, 2005, p. 415. 96 PARENTONI, Leonardo Netto; GUIMARÃES, Rafael Couto. Arts. 94 a 97. CORRÊLIMA, Osmar Brina; CORRÊA-LIMA, Sérgio Mourão (coord.). Comentários à nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p. 698. 95
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Jean Carlos Fernandes e Sávio Raniere Pereira Pinto AINDA QUE FEITA POR VIA POSTAL. MOTIVAÇÃO NÃO IMPUGNADA. - Inexistência, no caso, de afronta à lei e de alegado dissídio jurisprudencial à falta de impugnação específica ao fundamento expendido pela decisão recorrida. - O pedido de falência deve ser acompanhado da certidão de protesto regular, devendo seu instrumento conter, pelo menos, o nome da pessoa que recebeu a intimação. Precedentes: REsps nºs 172.847-SC e 109.678-SC. Recurso especial não conhecido.
Newton de Lucca e Adalberto Simão Filhose posicionam no mesmo sentido: Todavia, muitos tribunais do país, dado ao desvirtuamento do instituto da falência para simples ações ativas de cobrança em face da lesividade do procedimento e da característica da elisividade, passaram a adotar interpretação formalista acerca da questão do protesto, exigindo que ele não fosse lavrado como protesto especial de fins falimentares e ainda, que as intimações pessoais do devedor efetivamente ocorressem.97
Segundo Carlos Henrique Abrão o protesto falimentar deve ser cercado de cautelas e maiores formalismos que o tornam revestido de pressupostos e condições da própria ação falimentar, donde qualquer defeito terá o condão de infirmar a obrigação. O vício no protesto ou irregularidade no instrumento poderão ser invocados pelo contestante ou apreciados pelo juízo diretamente, por se cuidar de matéria jurídica essencial à formulação do pedido.98
Conclui-se, pois, que o instrumento de protesto ou a certidão de informações são os únicos documentos dotados de fé pública para revelar e identificar a pessoa que recebeu a notificação do ato cartorário para fins de pedido de falência com base na impontualidade, de acordo LUCCA, Newton de; SIMÃO FILHO, Adalberto. Comentários à nova lei de recuperação de empresas e de falências.Arts. 94 ao 101. São Paulo: QuartierLatin, 2005, p. 416. 98 TOLEDO, Paulo F. C. Salles de; ABRÃO, Carlos Henrique. Comentários à lei de recuperação de empresas e falência. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 248. 97
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com as exigências dos artigos 22 e 27, § 1º da Lei n. 9.492/97, sob pena de extinção do feito falimentar por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento regular do processo. 4 - Da Necessidade ou não do Protesto Prévio de Títulos de Crédito ou Documentos de Dívida para Negativação e Fornecimento de Informações Restritivas de Crédito pelos Bancos de Dados E aqui chegamos ao objeto principal do estudo. A questão da necessidade ou desnecessidade de prévio protesto de títulos de crédito ou documentos de dívida para posterior negativação e fornecimento de informações restritivas de crédito pelos bancos de dados, bem como a interpretação e a vigência do artigo 29, parágrafo 2º da Lei n. 9.492, de 1997, com redação dada pela Lei n. 9.841, de 1999. 4.1 - A posição do Superior Tribunal de Justiça O Superior Tribunal de Justiça já se posicionou sobre a necessidade ou não de prévio protesto antes da inscrição de dívidas em bancos de dados, no Recurso Especial 686.203 – AL, de relatoria do Ministro João Otávio de Noronha. De acordo com o entendimento daquele tribunal não é exigência legal o prévio protesto para inscrição de dívidas em bancos de dados de proteção ao crédito, tais como Serasa Experian e SPC99. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535, II, DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. EXAME DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME NA VIA DO RECURSO ESPECIAL. SÚMULA N. 284/STF. OFENSA NÃO-FUNDAMENTADA. LEI N. 9.492/97, ART. 29, § 2º. INSCRIÇÃO DE DÍVIDAS EM Recurso Especial n. 686.203 – AL (2004/0092055-2), Relator Ministro João Otávio de Noronha, acórdão publicado em 15/06/2009; Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 976.896 – RJ (2007/0263697-9), Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, acórdão publicado em 23/06/2008. 99
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Jean Carlos Fernandes e Sávio Raniere Pereira Pinto ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. PRÉVIO PROTESTO. DESNECESSIDADE. ATENÇÃO AO ART. 43 DO CDC. 1. Não há por que falar em violação do art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido, integrado pelo julgado proferido nos embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais. 2. Refoge da competência outorgada ao Superior Tribunal de Justiça apreciar, em sede de recurso especial, a interpretação de normas e princípios de natureza constitucional. 3. “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia” (Súmula n. 284/STF). 4. A limitação contida no art. 29, § 2º da Lei n. 9.492/97 diz respeito à informação prestada pelo Cartório aos órgãos de restrição ao crédito, pois somente pode constar da relação fornecida os protestos regulares e cujos registros não tenham sido cancelados. 5. O título regularmente protestado e cujo registro não tenha sido cancelado pode constar do banco de dados dos órgãos de proteção ao crédito, mas nem toda informação constante desse órgão precisa estar calcada em título protestado, a teor da harmonização dos artigos 29, § 2º, da Lei n. 9.492/97 e 43 do CDC. 6. Recurso especial conhecido em parte e provido.
No caso do Recurso Especial n. 686.203 – AL, a Associação de Notários e Registradores de Alagoas – ANOREG ajuizou ação em face de pessoas jurídicas que administram bancos de dados (CDL, Equifax Brasil e Serasa S.A), para que essas empresas se abstivessem da conduta de inserir em seus bancos de dados informações de dívidas sem que tenha havido prévio protesto. Em primeira instância, a ANOREG conseguiu êxito em sede de antecipação de tutela. Assim, em síntese, o juiz de Alagoas determinou que não constassem nos bancos de dados de proteção ao crédito informações de dívidas não protestadas. Todavia, em grau de recurso, interposto pela Serasa S/A, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que a lei não impõe o protesto como condição para os que as informações constem nos bancos de dados. Interpretou o Superior Tribunal de Justiça que o artigo 29, parágrafo 2º 103
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da Lei n. 9.492/1997 não determina o protesto antes das informações constarem em bancos de dados de proteção ao crédito. Com efeito, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça é pela desnecessidade de prévio protesto, haja vista que o artigo 29, parágrafo 2º da Lei 9.492, de 1997 não exige o protesto de título como requisito necessário para a inscrição em órgãos de restrição ao crédito. O protesto prévio tem o condão apenas de dispensar a comunicação da inscrição do devedor em cadastros de proteção ao crédito, determinada pelo artigo 43, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, pois os dados extraídos de cartório de protesto de títulos constituem informação pública. Nesse sentido, tem-se o AgRg no Recurso Especial n. 1.178.575 – RS, de relatoria do Ministro Vasco Della Giustina: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO EM CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. INFORMAÇÃO EXTRAÍDA DE CARTÓRIO DE PROTESTO DE TÍTULOS. INFORMAÇÃO DE DOMÍNIO PÚBLICO. COMUNICAÇÃO PRÉVIA. PRESCINDIBILIDADE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DESCABIMENTO. 1. A inscrição do nome do devedor em cadastros de proteção ao crédito, sem prévia comunicação, enseja indenização por danos morais. Porém, esta regra comporta exceção, como nas hipóteses em que os dados são extraídos de cartório de protesto de títulos, por se tratar de informação pública. Em tais situações, a comunicação prévia é prescindível e não há danos morais a serem reparados. 2. Agravo regimental provido para permitir a manutenção do nome do agravado no cadastro de inadimplentes da empresa agravante, excluir a indenização por danos morais anteriormente arbitrada e manter a sucumbência fixada pelas instâncias ordinárias.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu ainda que as empresas que gerem os bancos de dados não usurpam a função dos cartórios, na medida em que a atuação dessas entidades é distinta: os cartórios procedem ao protesto de títulos e documentos de dívida, sendo que o protesto tem a finalidade de se constituir em ato probatório ou resguardar ou constituir direitos; as entidades de restrição ao crédito, por sua vez, 104
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registram e fornecem informações sobre inadimplemento de dívidas relacionadas ao crédito e ao consumo, com o fim de apoiar decisões de agentes econômicos acerca da concessão ou não de crédito (REsp. 686.203 – AL). Assim, para o Superior Tribunal de Justiça os títulos protestados são apenas uma das formas de alimentar os bancos de dados de proteção ao crédito e arredar a comunicação prévia ao devedor de sua inscrição nos bancos de dados. Leonardo Roscoe Bessa também afirma que as fontes das informações dos bancos de dados são variadas, podendo ser oriundas do próprio comércio, da permuta de informações entre bancos de dados e das coletadas em cartórios de protesto de títulos. Segundo o referido autor: Embora existam algumas variações entre as fontes – origem dos dados coletados – e espécies de informações tratadas, pode-se afirmar que a principal fonte das informações que circulam nas entidades de proteção ao crédito são os próprios fornecedores (comerciantes), que alimentam, diariamente, com milhares de registros as bases de dados das entidades de proteção ao crédito. Além das informações fornecidas pelo comércio, há intensa permuta de informações entre bancos de dados. Algumas entidades também coletam, por iniciativa, própria, informações de cartórios de distribuição de ações e de protesto de títulos100.
Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a referência expressa no parágrafo 2º do artigo 29 da Lei 9.492, de 1997, diz respeito apenas à limitação da informação prestada pelo oficial da serventia às entidades representativas da indústria e comércio e de proteção do crédito. Nesse passo, os cartórios somente podem prestar informações restritivas de crédito de títulos protestados cujos registros não estiverem cancelados. Com efeito, a interpretação do Superior Tribunal de Justiça sobre o parágrafo 2º do artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997 é no sentido de que BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Editora RT, 2007, p. 242/243. 100
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os registros em bancos de dados de proteção ao crédito não podem ser divulgados se os títulos protestados que lhes deram origem encontraremse cancelados. Assim, por esta exegese, a lei proíbe a divulgação pelas entidades de proteção ao crédito de informações negativas de crédito oriundas de títulos cujo protesto já tenha sido cancelado, mas não obriga que todas as informações constantes em seu banco de dados sejam de títulos previamente protestados. A mesma interpretação é consagrada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS nos seguintes julgados: Apelação Cível nº 70008687444; Apelação Cível nº 70007993017 e Apelação Cível nº 70008004350. Contrariamente a esse posicionamento, Carlos Alberto Etcheverry citado por Alex Sandro Ribeiro afirma: (...) nenhuma, absolutamente nenhuma informação restritiva de crédito pode ser divulgada por entidades vinculadas à proteção do crédito se não estiver baseada em título ou documento de dívida líquida protestada por falta de pagamento. Toda e qualquer infração a essa determinação legal, portanto, configura-se como ato ilícito, podendo o prejudicado demandar o responsável pelo banco de dados para ver cancelado o registro e indenizados os eventuais danos dele resultantes101.
A doutrina de José Geraldo Brito Filomeno adota o entendimento de que “dos cadastros somente poderão sair informações negativas contra consumidores, de modo geral, (...) quando houver efetivo protesto de títulos ou documentos, ou quando houver razões concretas de inadimplemento”102. A posição de Sérgio Jacomino também é a de que as entidades ETCHEVERRY, Carlos Alberto. apud RIBEIRO, Alex Sandro. É ilegal o cadastro do nome na SERASA ou no SPC sem prévio protesto do título. Disponível em http:// jus.com.br/revista/texto/6418/e-ilegal-o-cadastro-do-nome-na-serasa-ou-no-spc-semprevio-protesto-do-titulo#ixzz2PWEnl38U. Acesso em 15/01/2013. 102 FILOMENO, José Geraldo Brito. Limitações Legais à coleta de dados – “Cartórios de Protestos Paralelos?” In Ada Pellegrini Grinover et al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 438/439. 101
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de proteção ao crédito somente poderão lançar inscrição do devedor em seus bancos de dados após o protesto da dívida. Na perspectiva do referido autor: (...) o Serasa (ou qualquer outra entidade de proteção ao crédito) somente poderá lançar o nome do devedor em seus cadastros depois da formalidade legal do protesto. É o que prevê expressamente a Lei 9492/97, em seus artigos 29 e 31, alterados pelo artigo 40 do Estatuto da Microempresa103.
Nesse sentido, os autores que adotam a posição contrária à do Superior Tribunal de Justiça, afirmam que o artigo 29, parágrafo 2º da Lei n. 9.492, de 1997 dispõe sobre a obrigatoriedade do prévio protesto para inscrição em bancos de dados de restrição ao crédito. Para aqueles que interpretam pela necessidade de prévio protesto para negativação de dívidas em bancos de dados, haveria maior segurança jurídica com o protesto, em virtude de procedimento legal, da ampla publicidade do protesto baseado em título formalmente constituído e a prévia intimação do devedor antes da lavratura do ato104. 4.2 - A vigência do artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997. Em que pese às discussões sobre a possibilidade das entidades de bancos de dados de proteção ao crédito negativarem diretamente títulos ou documentos de dívida sem protesto prévio, há que se salientar a questão da vigência ou não do artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997, in verbis: Art. 29. Os cartórios fornecerão às entidades representativas da indústria e do comércio ou àquelas vinculadas à proteção do crédito, quando solicitada, certidão diária, em forma de relação, dos protestos tirados e dos cancelamentos efetuados, JACOMINO, Sérgio. Protesto dos títulos - segurança constitucional do devedor. Disponível em http://www.quinto.com.br/artigos_04.htm. Acesso em 16/01/2012. 104 Disponível em http://www.2prtd.com.br/sub_links/protesto/vantagens.php, acesso em 15.01.2013. 103
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Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade com a nota de se cuidar de informação reservada, da qual não se poderá dar publicidade pela imprensa, nem mesmo parcialmente. (Redação dada pela Lei nº 9.841, de 5.10.1999) § 1o O fornecimento da certidão será suspenso caso se desatenda ao disposto no caput ou se forneçam informações de protestos cancelados. (Redação dada pela Lei nº 9.841, de 5.10.1999) § 2º Dos cadastros ou bancos de dados das entidades referidas no caput somente serão prestadas informações restritivas de crédito oriundas de títulos ou documentos de dívidas regularmente protestados cujos registros não foram cancelados. (Redação dada pela Lei nº 9.841, de 5.10.1999)
O artigo 29 da Lei n. 9.492 de 1997 teve sua última redação dada pela Lei n. 9.841 de 1999, a qual instituiu o Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Especificamente, o artigo 40 da Lei do Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte (Lei n. 9.841 de 1999) modificou a redação do artigo 29 e 31 da Lei n. 9.492 de 1997 (Lei do Protesto). Entretanto, o advento da Lei Complementar n. 123 de 2006, que instituiu o novo Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, revogou completamente a Lei n. 9.841 de 1999105, inclusive o dispositivo que alterou a redação do artigo 29 da Lei de Protesto. De acordo com os ensinamentos de Paulo Nader: “Revogação consiste no ato de desconstituir a lei, retirando-lhe a vigência [...]”.106 Destarte, como não houve qualquer ressalva pelo legislador, o artigo 29 da Lei n. 9.492 de 1997, que tinha sua redação dada pela Lei n. 9.841 de 1999, também ficou expressamente revogado com a entrada em vigor da nova Lei sobre o Estatuto da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte (Lei Complementar n. 123 de 2006). Portanto, o artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997 não se encontra vigente no ordenamento jurídico brasileiro. BRASIL. Lei nº 9.841, de 5 de outubro de 1999.“Art. 89. Ficam revogadas, a partir de 1o de julho de 2007, a Lei nº 9.317, de 5 de dezembro de 1996, e a Lei nº 9.841, de 5 de outubro de 1999”. 106 NADER, Paulo. Curso de direito civil, parte geral – vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 48. 105
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Inclusive, existe o Projeto de Lei n. 450 de 2007, apensado ao Projeto de Lei n. 6.792, de 2006107, que tramita na Câmara dos Deputados, visando o restabelecimento do artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997, o qual busca, ademais, o aperfeiçoamento do dispositivo que fora revogado. Até o presente momento, conforme o texto constante na Câmara dos Deputados, o referido projeto de lei iria manter o fornecimento de certidões diárias, sob forma de relação ou por meio eletrônico, contendo as informações de protesto, e de seus cancelamentos para as referidas entidades proteção ao crédito. Além disso, o projeto prevê a possibilidade de suspensão do fornecimento de certidão diária pelos cartórios em determinadas hipóteses. 5 - Conclusão Sejam públicos ou privados, os bancos de dados são regulamentados, pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990). Desse modo, o Direito do Consumidor aplica-se indistintamente aos bancos de dados privados ou aos administrados por entidades públicas. Os bancos de dados de proteção ao crédito são imprescindíveis para economia contemporânea visto que oferecem serviços para instituições financeiras e agentes econômicos de diversos seguimentos, com vistas a fornecer dados para auxiliar as decisões no que tange à concessão de crédito, vendas a prazo e a realização de negócios que envolvam crédito, reduzindo a assimetria informacional. A veiculação de informações não é pública, mas restrita aos que possam conceder crédito, sendo capaz de aumentar a segurança e a previsibilidade de certas operações no mercado. Há responsabilização das entidades dos bancos de dados nas hipóteses de armazenamento de informações inverídicas ensejando, inclusive, danos morais e materiais àqueles que têm dados veiculados indevidamente. Nessa ótica, o funcionamento inadequado dos arquivos Informações disponíveis no site da Câmara dos Deputados: http://www.camara.gov.br/ proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=318352. Acesso em 15/01/2013. 107
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pode ameaçar o direito à privacidade dos consumidores. Em síntese, há regras explícitas no Código de Defesa do Consumidor que implicam em limitações impostas aos bancos de dados. As restrições das entidades de bancos de dados de proteção ao crédito devem garantir a privacidade do consumidor, transparência na coleta de informações, limitação temporal e de veracidade dos dados que terão a finalidade, como já dito, de contribuir para concessão de crédito no mercado de consumo. Complementar ao direito cambiário, mas também em outros ramos do direito, o protesto alcançou posição de destaque na atividade empresarial para, principalmente, atestar o descumprimento de obrigação representada em título de crédito ou outros documentos de dívida. A carência de protesto pode, quando este for necessário, privar o portador do título de crédito do direito de regresso contra o sacador na letra de câmbio, os endossantes e respectivos avalistas. Ademais, a falta de protesto de título de crédito impede o pedido de falência com base na impontualidade. O posicionamento do Superior Tribunal de Justiça é pela desnecessidade de prévio protesto, haja vista que o artigo 29, parágrafo 2º da Lei 9.492, de 1997 não exige o protesto de título como requisito necessário para a inscrição em órgãos de restrição ao crédito. O protesto prévio tem o condão apenas de dispensar a comunicação da inscrição do devedor em cadastros de proteção ao crédito, determinada pelo artigo 43,§ 2º, do Código de Defesa do Consumidor, pois os dados extraídos de cartório de protesto de títulos constituem informação pública. Em que pese às discussões sobre a possibilidade das entidades de bancos de dados de proteção ao crédito negativarem diretamente títulos ou documentos de dívida sem protesto prévio, há que se salientar a questão de que o artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997 não mais se encontra em vigência. No entanto, independente da vigência do referido dispositivo legal, com sustentáculo no posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, o protesto prévio não é necessário para negativação em entidades de 110
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proteção ao crédito (banco de dados), haja vista que as fontes das informações dos bancos de dados são não são únicas, mas variadas, ou seja, podem advir do próprio comércio, da troca de informações entre bancos de dados e das coletadas em cartórios de protesto de títulos. Ademais, o prévio protesto para negativação não é imprescindível vez que não se enquadra nas hipóteses de protesto necessário. E consoante autorização do Código de Defesa do Consumidor, quanto aos bancos de dados, não existe vedação legal a respeito do assunto até aqui tratado. Acrescente-se o fato de que o artigo 29 da Lei n. 9.492, de 1997, com a redação dada pela Lei n. 9841, de 1999, restou revogado pela Lei Complementar n. 123, de 2006, sendo insustentável a posição defendida a favor do prévio protesto para inscrição em banco de dados com base no parágrafo segundo do referido dispositivo. Referências ABRÃO, Carlos Henrique. Do protesto. São Paulo: Universitária de Direito, 1999. BENJAMIN, Antônio Hermann de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinover et al. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Editora RT, 2007. BESSA, Leonardo Roscoe. O consumidor e os limites dos bancos de dados de proteção ao crédito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. BESSA, Leonardo Roscoe. Abrangência do CDC em relação aos bancos de dados. In. Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery (org.). Doutrinas Essenciais. Responsabilidade Civil. Vol. VIII. Direito fundamental à informação. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. BERTRAM, Antônio Stürmer. Banco de dados e “habeas data” no Código do Consumidor, in Lex, ano 5, n. 49, set. 1993. 111
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Notas sobre o valor e a destinação do depósito prévio rescisório trabalhista
Ricardo Adriano Massara Brasileiro1
______________ Sumário ______________ 1. Introdução. 2. Valor do depósito prévio. 3. Destinação do depósito ao fim do processo – reversão ao réu, como multa, ou restituição ao autor? 4. Conclusão. Referências. Resumo O presente estudo tem o propósito de apresentar algumas reflexões críticas sobre o montante e a destinação do depósito prévio rescisório trabalhista, observados alguns julgados e orientações jurisprudenciais existentes em confronto com as normas legais de regência. Palavras-chave: Ação Rescisória – Depósito Prévio – Valor – Destinação 1 - Introdução 1. Em conformidade com o artigo 836 da CLT, com a redação que lhe foi dada pela Lei. 11.495/2007, para a regência da ação rescisória trabalhista, são aplicáveis as normas regulamentadoras da ação Doutor e mestre em Direito pela UFMG, Professor dos Cursos de Graduação e Mestrado da Faculdade de Direito Milton Campos, Procurador do Estado de Minas Gerais, Advogado. 1
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rescisória previstas no CPC. 2. A disposição consolidada, no entanto, estabelece que o valor do depósito prévio será de 20% sobre o valor da causa, distintamente do que estabelece o CPC, que fixa o montante do depósito prévio em 5% do valor da causa. 3. E essa é a única e justificável diferença normativa legal entre o disciplinamento da ação rescisória trabalhista e o disciplinamento da ação rescisória comum, prevista no CPC. E a justificativa decorre da própria e mesma razão que determina a especialidade do processo do trabalho em relação ao processo civil: a natureza alimentar do crédito trabalhista. Ao que parece, o legislador levou em consideração o dado empírico de a iniciativa da rescisória ser majoritariamente patronal e a necessidade de maior reforço da condenação trabalhista comparativamente à civil. Independentemente de quem a iniciativa processual, contudo, a prova da miserabilidade jurídica do autor torna o depósito inexigível. 4. É, no entanto, curioso observar que, anteriormente à explicitação trazida pela redação legal de 2007, a jurisprudência trabalhista entendia não ser exigível o depósito prévio previsto no CPC. Assim, a orientação da Súmula nº 194 do TST, posta em 1984, que exerceu influência direta sobre uma então nova redação que a Lei 7.351/1985 atribuiu ao artigo 836 da CLT, dispensando expressamente o referido depósito. (Cf: TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Ação rescisória no processo do trabalho. 3 ed. São Paulo: LTR, 1998, p. 380.)2 A história é um pouco mais longa. No plano legislativo, tenham-se as sucessivas redações do dispositivo legal (in: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452. htm , consulta em 6.09.2014) Art. 836. E’ vedado aos órgãos da justiça do Trabalho conhecer de questões já decididas, excetuados os casos expressamente previstos neste título. Art. 836. É vedado aos órgãos da Justiça do Trabalho conhecer de questões já decididas, excetuados os casos expressamente previstos neste Título e a ação rescisória, que será admitida, no prazo de 2 (dois) anos, nos têrmos dos arts. 798 a 800 do Código de Processo Civil. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967) Art. 836 - É vedado aos órgãos de Justiça do Trabalho conhecer de questões já decididas, excetuados os casos expressamente previstos neste Título e a ação rescisória, que será admitida, na forma do disposto no Capítulo IV do Título IX da Lei nº 5.869, de 11 de 2
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5. Também curiosamente, como se verá adiante, a jurisprudência trabalhista, ainda atua no sentido contrário ao reforço da decisão de conteúdo alimentar, com entendimentos discrepantes à lógica comum do CPC, seja no concernente ao entendimento sobre como se alcança o valor do depósito rescisório, seja no concernente ao entendimento sobre a destinação do depósito rescisório nas hipóteses do respectivo recolhimento a menor. 2 - Valor do depósito prévio 6. Para se alcançar o valor do depósito prévio de 20% sobre o valor da causa, primeiramente, por certo, deve-se determinar o próprio valor da causa. E no concernente ao valor da causa na ação rescisória trabalhista, a Instrução Normativa 31/07 do Tribunal Superior do Trabalho assim dispõe: Art. 2° O valor da causa da ação rescisória que visa desconstituir decisão da fase de conhecimento corresponderá: I - no caso de improcedência, ao valor dado à causa do processo originário ou aquele que for fixado pelo Juiz; II - no caso de procedência, total ou parcial, ao respectivo valor arbitrado à condenação. Art. 3° O valor da causa da ação rescisória que visa desconstituir decisão da fase de execução corresponderá ao janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, dispensado o depósito referido nos artigos 488, inciso II, e 494 daquele diploma legal. (Redação dada pela Lei nº 7.351, de 27.8.1985) Art. 836. É vedado aos órgãos da Justiça do Trabalho conhecer de questões já decididas, excetuados os casos expressamente previstos neste Título e a ação rescisória, que será admitida na forma do disposto no Capítulo IV do Título IX da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, sujeita ao depósito prévio de 20% (vinte por cento) do valor da causa, salvo prova de miserabilidade jurídica do autor. (Redação dada pela Lei nº 11.495, de 2007) Parágrafo único. A execução da decisão proferida em ação rescisória far-se-á nos próprios autos da ação que lhe deu origem, e será instruída com o acórdão da rescisória e a respectiva certidão de trânsito em julgado. (Incluído pela Medida provisória nº 2.18035, de 2001) 118
Ricardo Adriano Massara Brasileiro valor apurado em liquidação de sentença. Art. 4° O valor da causa da ação rescisória, quer objetive desconstituir decisão da fase de conhecimento ou decisão da fase de execução, será reajustado pela variação cumulada do INPC do IBGE até a data do seu ajuizamento.
O disciplinamento dado à questão pelo Tribunal parece satisfatório, de um modo geral. 7. Pode ocorrer, no entanto, que, passado em julgado o decisum condenatório, na pendência do prazo de dois anos para se intentar a rescisória, a execução já esteja em curso e a condenação já se encontre devidamente liquidada, com cálculo homologado pelo juiz. Para essa hipótese, parece claro que o valor a ser atribuído à rescisória deve ser o próprio valor da condenação liquidado, e não o valor arbitrado à condenação pelo juiz, tal como disposto no artigo 2o., II, da Instrução Normativa. E, a fim de justificação do reparo enlevado, basta uma simples reflexão. Como se sabe, o valor da causa deve espelhar o conteúdo econômico da demanda. E, em se tratando de litígio que tenha por objeto a existência, validade, cumprimento, modificação ou rescisão (o que o caso) de ato jurídico, o valor da causa deve ser o valor do próprio ato jurídico. Assim o disposto no artigo 259, V, do CPC. É, aliás, bastante certo que o conteúdo econômico da condenação que se quer rescindir está mais bem representado num cálculo de liquidação, elaborado pelo contador, com o fim de apuração precisa do quantum devido, do que numa estimativa arbitral, realizada pelo juiz (que não é experto em contas), para efeito de custas (artigo 899, § 2o.). 8. Nesse sentido, é melhor posto o seguinte aresto do TST, que entende dever ser atribuído à rescisória de decisão de conhecimento o valor da liquidação: IMPUGNAÇÃO AO VALOR DADO A CAUSA. AÇÃO RESCISÓRIA - O valor dado à causa, em ação rescisória, é, em regra, o mesmo da ação principal, porém, atualizado monetariamente. Entretanto, EXISTINDO NA AÇÃO 119
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade PRINCIPAL SENTENÇA CONDENATÓRIA EM LIQUIDAÇÃO, PREVALECE, PARA ATUALIZAÇÃO, A DATA DA CONTA DA LIQUIDAÇÃO, CONFORME PRECONIZADO NO ART. 259, INCISO V DO CPC. Recurso Ordinário em Ação Rescisória nº TST-ROAR-360.860/97.3, em que é Recorrente SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMÉRCIO DE ASSIS e Recorrida DAVEL DISTRIBUIDORA ASSIS DE VEÍCULOS LTDA.
9. É nesse sentido o posicionamento do STJ: Valor da causa – ação rescisória – hipótese em que o montante da condenação imposta pela sentença rescindenda já foi objeto de liquidação – valor que deve corresponder ao benefício patrimonial visado pelo autor. STJ. REsp 164.059/ RJ, 4ª. Turma, rel. Min. Barros Monteiro, j. 23.9.1998, DJ. 8.2.1999, p. 159 – RSTJ 118/319. “Havendo manifesta incompatibilidade entre o valor atribuído à ação originária e o benefício econômico pretendido na rescisória, deve prevalecer este último”. STJ. 2ª. Seção, Pet. 4.553, Min. Gomes de Barros, j. 22.11.06, DJ. 03.05.07. Na ação rescisória de sentença ou acórdão condenatório, o valor da causa deve corresponder à vantagem patrimonial que seria acrescida ou deixaria de ser subtraída no caso de desconstituição do provimento judicial rescindendo. RSTJ. 143/221. Na ação rescisória de feito que está sendo executado, o valor da causa é o da execução, corrigido até a data do ajuizamento. JTAERGS 99/174.
10. Poderia-se pensar que o afastamento de uma observância estrita do disposto na Instrução Normativa significaria uma instabilidade ao jurisdicionado, com possibilidade concreta de inadmissão de demandas rescisórias ajuizadas segundo seus ditames. No entanto, nenhum prejuízo advém ao autor, dado que, para a correção do valor da causa (e, por conseguinte, para a correção do valor do depósito prévio), é necessária a impugnação do valor por parte do réu, com a oitiva do autor, dado que impossível a modificação de ofício, nos termos da Orientação Jurisprudencial TST/SDI2 no. 155, cujos 120
Ricardo Adriano Massara Brasileiro
termos seguem: OJ-SDI2-155. AÇÃO RESCISÓRIA E MANDADO DE SEGURANÇA. VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA NA INICIAL. MAJORAÇÃO DE OFÍCIO. INVIABILIDADE. (DEJT divulgado em 09, 10 e 11.06.2010) Atribuído o valor da casa na inicial da ação rescisória ou do mandado de segurança e não havendo impugnação, nos termos do art. 261 do CPC, é defeso ao Juízo majorá-lo de ofício, ante a ausência de amparo legal. Inaplicável, na hipótese, a Orientação Jurisprudencial da SBDI-2 nº 147 e o art. 2º, II, da Instrução Normativa nº 31 do TST.
11. Assim, corrigido o valor da causa, será facultado ao autor a complementação do depósito prévio, evitando-se-lhe qualquer surpresa e ofensa ao contraditório e ao devido processo. Não atendida a complementação, aí sim o feito deve ser extinto por ausência de pressuposto de regular constituição do processo. 12. A jurisprudência defensiva do TST, no entanto, é contrária à complementação do depósito, sendo, portanto, ela a merecedora das censuras acima cogitadas. Veja-se a ementa de um recente acórdão, a título de exemplificação: RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. DEPÓSITO PRÉVIO. RECOLHIMENTO INSUFICIENTE. NÃO PROVIDO. 1. Trata-se de ação rescisória extinta sem resolução do mérito, sob o fundamento de que o valor recolhido a título de depósito prévio mostra-se insuficiente. 2. De acordo com o artigo 490, II, do CPC, o recolhimento do depósito prévio consiste num pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, razão pela qual o Julgador, ao constatar a sua deficiência, deve extinguir o feito sem resolução do mérito, não cabendo a notificação da parte para que o regularize. 3. Recurso ordinário a que se nega provimento. (RO - 336-92.2010.5.05.0000 , Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 11/02/2014, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de 121
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade Publicação: 14/02/2014)
13. No mesmo sentido, veja-se o decidido nos seguintes processos: RO - 2590-85.2011.5.02.0000, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, Data de Julgamento: 04/02/2014, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 07/02/2014; RO - 137200-95.2009.5.15.0000 , Relator Ministro: Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 04/02/2014, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 07/02/2014; RO - 25-56.2011.5.09.0000 , Relator Ministro: Emmanoel Pereira, Data de Julgamento: 03/12/2013, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 06/12/2013; RO-317433.2011.5.10.0000, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, SBDI-2, DEJT: 01/07/2013; RO - 11400-90.2009.5.03.0000 , Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 26/11/2013, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 29/11/2013. 3 - Destinação do depósito ao fim do processo – reversão ao réu, como multa, ou restituição ao autor? 14. Acerca da destinação do depósito prévio ao cabo do processo, a mesma Instrução Normativa 31/07 do Tribunal Superior do Trabalho dispõe o seguinte: Art. 5° O valor depositado será revertido em favor do réu, a título de multa, caso o pedido deduzido na ação rescisória seja julgado improcedente. 15. Pela redação da disposição normativa pode parecer que, nos casos de procedência da rescisória ou de extinção do feito, sem resolução do mérito, o depósito deveria ser restituído ao autor. No entanto, o cotejo da Instrução com o Código de Processo Civil expõe sua insuficiência para regulamentar todas as possíveis situações. Aliás, em confronto com o CPC, a Instrução é até mesmo insuficiente para regulamentar as próprias hipóteses de improcedência 122
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da rescisória. 16. Mire-se o estatuto processual civil: Art. 494. Julgando [1] procedente a ação, o tribunal rescindirá a sentença, proferirá, se for o caso, novo julgamento e determinará a restituição do depósito; declarando [2] inadmissível ou [3] improcedente a ação, a importância do depósito reverterá a favor do réu, sem prejuízo do disposto no Art. 20. [parêntesis inseridos] Art. 488. A petição inicial será elaborada com observância dos requisitos essenciais do Art. 282, devendo o autor: [...] II - depositar a importância de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, a título de multa, caso a ação seja, por unanimidade de votos, declarada inadmissível, ou improcedente.
17. A observação do diploma legal revela, em primeiro lugar, que não é em qualquer hipótese de improcedência que o depósito prévio será destinado como multa ao réu, mas somente nos casos de unanimidade de votos. Ou seja, se a decisão de improcedência é por maioria de votos, em suma, se um (ou alguns) dos magistrados vencidos acolhe(m) com o pleito rescisório, o depósito rescisório deve ser restituído ao autor. O depósito também deve ser restituído ao autor, no caso de inadmissibilidade da rescisória por maioria. Ou seja, um (ou alguns) dos magistrados vencidos a houve(ram) como admissível ou regular. Pela legislação, ao lado da procedência da rescisória, essas são as únicas hipóteses de restituição do depósito prévio ao autor. 18. Por outro lado, nos casos de improcedência, por unanimidade, ou inadmissibilidade, por unanimidade, da rescisória, o depósito deve ser revertido ao réu, a título de multa. 19. Sem qualquer justificativa, não entende, assim, contudo, a jurisprudência trabalhista, cuja criatividade determina a restituição do depósito prévio ao autor, em casos da sua insuficiência, aparentemente inovando com uma terceira hipótese de extinção do processo. A título de exemplificação, veja-se o excerto de um recentíssimo acórdão do TST, de 12 de agosto de 2014 (Ação Rescisória n° 123
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TST-AR-724-28.2013.5.00.0000, Rel. HUGO CARLOS SCHEUERMANN), que espelha um entendimento encontrável em inúmeros outros acórdãos: Dessa forma, tem-se que a autora não observou o pressuposto processual de válida constituição e desenvolvimento regular do processo, consubstanciado na efetivação do depósito no ato do ajuizamento da ação e no correto reajustamento do seu valor pelo INPC/IBGE, para efeito de depósito prévio, do valor da causa desta ação rescisória até o seu ajuizamento, nos moldes dos artigos 2º, inciso II, e 4º da Instrução Normativa nº 31/2007 deste Tribunal, o que implica a consequência da extinção da relação processual, sem exame do mérito. Por fim, considerando que a regra inscrita no art. 5º da IN 31/ TST, no sentido de que “O valor depositado será revertido em favor do réu, a título de multa, caso o pedido deduzido na ação rescisória seja julgado, por unanimidade de votos, improcedente ou inadmissível” não corresponde à situação dos presentes autos - de extinção do processo, sem resolução do mérito, por insuficiência do depósito prévio, pressuposto processual, e não improcedência ou inadmissibilidade do pedido -, impende, determinar, de ofício, a restituição integral do depósito prévio à parte autora.
Por todo o exposto, acolhendo preliminar erigida em defesa, proponho extinguir o processo, sem resolução do mérito, com amparo no artigo 267, inciso IV, do CPC, determinando a restituição do valor recolhido pela parte autora a título de depósito prévio (IN 31/07, art. 5º). [Negritou-se] 20. O acórdão trazido a exame, fundamenta-se num texto aspeado da IN 31/TST cuja redação não se pode encontrar no sítio eletrônico do TST, com a equivocada conseqüência de não-enquadramento da extinção do feito, sem resolução do mérito, por falta de pressuposto processual, como hipótese de inadmissibilidade do pedido, nos termos da redação que o próprio acórdão atribuiu ao art. 5º da IN 31/TST. 21. Veja-se: na redação apresentada pelo acórdão da IN 31/TST, as hipóteses de improcedência e inadmissibilidade do pedido, são veiculadas como contrapostas à hipótese de procedência da rescisória. 124
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22. Desse modo, se a decisão não é de procedência, somente pode ser de improcedência ou de inadmissibilidade. E, em qualquer uma delas, o depósito prévio deveria ser revertido ao réu. 23. Aliás, as disposições do CPC, acima transcritas, no entanto, ao revés de falarem de julgamento unânime de “inadmissibilidade do pedido” (tal como na redação apresentada pelo acórdão sob comento ao art. 5º. da IN 31/TST) para a reversão ao réu do depósito prévio, falam de julgamento unânime de “inadmissibilidade da ação” para o mesmo efeito de reversão do depósito ao réu. Talvez esteja nessa divergência de linguagem normativa a origem da obscuridade do acórdão. 24. De todo o modo, as hipóteses de “inadmissibilidade do pedido” (art. 5º. da IN 31/TST, com a redação do acórdão sob comento) e de “inadmissibilidade da ação” (art. 488, II, CPC) são convergentes e nada mais significam do que extinção do processo sem resolução do mérito, do mesmo modo que a hipótese de improcedência prevista em ambas as normas para o efeito de reversão, é inequivocamente hipótese de extinção do processo com resolução do mérito. Aliás, nos termos do CPC, não há terceiro gênero: ou o processo se extingue sem resolução do mérito (art. 267) ou o processo se extingue com resolução do mérito (art. 269). Não há nenhuma outra hipótese. 25. Veja-se o que esclarece o processualista FREDIE DIDIER JR em monografia específica sobre o juízo de admissibilidade do processo, cujo título, por si só, já remata a questão (Pressupostos processuais e condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo. São Paulo: Saraiva, 2005, capítulo II, item 6): Dois são os juízos que o magistrado pode fazer e um procedimento: o juízo de admissibilidade (validade do procedimento; aptidão para a prolação do ato final) e o juízo de mérito (juízo sobre o objeto litigioso). [...] ou a questão é de mérito ou é de admissibilidade, tertium non datur (princípio lógico do terceiro excluído). [p. 72] [...] As condições da ação e os pressupostos processuais comporiam, de acordo com a sistematização do legislador brasileiro, uma categoria maior de questões: as questões de 125
Estudos e Pesquisas em Direito Empresarial na Contemporaneidade admissibilidade do processo. São chamados de requisitos de admissibilidade do julgamento do processo. [p. 74]
26. Assim também CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, que trata dos pressupostos processuais e das condições da ação no capítulo LXVI de suas Instituições, que tem o seguinte título:“ Pressupostos da admissibilidade do julgamento de mérito” (Instituições de Direito Processual Civil. v. III. 5 ed. São Paulo: Malheiros, p 126). Veja-se um excerto do autor: Formado o processo de modo regular, ou seja, presentes todos os pressupostos processuais, também em sua caminhada ao longo do procedimento ele precisa ser realizado segundo as exigências da Constituição e da lei, sob pena de não ser admissível o julgamento do mérito. [p. 130, item 833]
27. Sobre a o significado do termo inadmissibilidade para a destinação do depósito rescisório, veja-se o que esclarece CÁSSIO SCARPINELLA BUENO (Comentário ao art. 494 do CPC. In: MARCATO, Antônio Carlos (Coord.). Código de Processo Civil Interpretado. São Paulo: Atlas, 2004, p. 1506): 2 Destinação da multa: Quando não admitida (rectius, não conhecida) a rescisória ou quando ela for julgada improcedente – sempre por unanimidade de votos – o órgão julgador determinará a reversão da multa depositada pelo autor (art. 488, II) ao réu, sem prejuízo do levantamento da multa pelo réu, deverá o autor responder pelas verbas de sucumbência na forma do art. 20 do CPC. [negritou-se]
28. Feitos esses aclaramentos, pode-se demonstrar uma contraditoriedade/obscuridade do acórdão: (1) como a decisão não reconheceu o direito do autor (= a procedência), somente restam as hipóteses de inadmissibilidade e de improcedência para o enquadramento da decisão. No entanto, (2) como o acórdão entende que a extinção do feito, 126
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sem resolução do mérito, por insuficiência do depósito prévio, não é hipótese de inadmissibilidade, (3) a única hipótese restante para a extinção deste feito, sem resolução do mérito, por insuficiência de depósito prévio seria a de... improcedência, o que, absolutamente contraditório/obscuro. 29. De toda sorte, tal contraditoriedade/obscuridade seguramente gera consequências e pode sugerir condutas aos jurisdicionados. Chega mesmo a oferecer, de bandeja, um roteiro ao autor de uma rescisória procrastinatória: efetue um depósito prévio a menor, consiga a suspensão da execução, leve a causa até o TST e, lá, ... tenha restituído seu depósito prévio. 4 - Conclusão 30. Ao contrário do que parece sugerir a Instrução Normativa 31/07 do Tribunal Superior do Trabalho, (1) o valor da causa em ação rescisória trabalhista contra decisão de conhecimento já liquidada deve ser o valor apurado em liquidação. (2) Na hipótese de extinção da ação rescisória por insuficiência do depósito prévio, o valor do depósito deve ser revertido ao réu, a título de multa. Referências CÁSSIO SCARPINELLA BUENO, Cássio Scapinella. Comentários ao art. 494 do CPC. In: MARCATO, Antônio Carlos (Coord.). Código de Processo Civil Interpretado. São Paulo: Atlas, 2004. DIDIER JR, Fredie. Pressupostos processuais e condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo. São Paulo: Saraiva, 2005. DINAMARCO. Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. v. III. 5 ed. São Paulo: Malheiros. MARCATO, Antônio Carlos (Coord.). Código de Processo Civil Interpretado. São Paulo: Atlas, 2004. TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Ação rescisória no processo do trabalho. 3 ed. São Paulo: LTR, 1998. 127