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O HOMEM DO ARIZONA The Master Fiddler Janet Dailey

Bianca Extra nº 2.1 O que adiantava Jacqueline ter fugido de casa, se no seu caminho estava Choya, rude e forte como o cacto do deserto que lhe dera o nome? O sonho dela era a felicidade, não o desespero de uma paixão que a levaria ao fundo do abismo nos braços desse sensual homem do Arizona! Digitalização e revisão: Nell

O HOMEM DO ARIZONA Título original: “THE MASTER FIDDLER” Publicado originalmente em 1977 pela Mills & Boon Ltd., Londres, Inglaterra

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Copyright: JANET DAILEY Tradução: LUZIA ROXO PIMENTEL A LUZ DO LUAR Título original: “HOSPITAL IN THE MOUNTAINS" Publicado originalmente em 1981 pela Mills & Boon Ltd., Londres, Inglaterra Copyright: JEAN EVANS Tradução: SYOMARA CAJADO Copyright dos dois títulos para a língua portuguesa: 1982 ABRIL S.A. CULTURAL E INDUSTRIAL — São Paulo Composto na LINOART e impresso em oficinas próprias Ilustração da capa: MIRIAM R. C. ARAÚJO

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CAPÍTULO I Há dois dias, Jacqueline Grey viajava em direção ao oeste de Dallas, a movimentada e agressiva cidade texana. Logo que pegou a estrada, experimentou uma revigorante sensação de alegria. Estava deixando a casa dos pais, decidida a cuidar sozinha de sua vida. Mas agora, o cansaço começava a chegar. Não aguentava mais aquela paisagem monótona. Estava farta de ver as planícies sem-fim, com suas moitas de arbustos secos e suas pedras formadas de terras arenosas. Mas bem pior que a monotonia era aquele calor insuportável... Distraída, olhou o relógio e verificou que era quase meio-dia. Tinha saído de Bisbee, no Arizona, não muito cedo. Mas, considerando a hora em que havia ido dormir na noite anterior... merecia parabéns por ainda ter forças para dirigir. Apesar do cansaço, Jacquie sorriu ao considerar que ninguém de bom senso faria uma viagem de Dallas até Los Angeles, passando por Bisbee. Mas ela queria visitar Tammy, que se casara recentemente e estava morando em Tucson. Fora só para ver a amiga que ela havia escolhido aquele caminho. O sol refletiu na estrada, lá adiante, e Jacquie, sem parar de dirigir, colocou seus óculos. Depois, esticou o pescoço para ver seu rosto no espelhinho retrovisor. Nada mal, pensou, satisfeita. Era uma moça bonita e não tinha nenhuma dúvida sobre isso. Bonita, rica, inteligente... “tinha tudo para ser feliz”, conforme sempre lhe lembrava seu pai. Ao pensar no pai, a cena da discussão que tivera com ele, antes de sair de casa, voltou à sua cabeça. — Quer dizer que você vai deixar a faculdade, quando faltam apenas dois anos para se formar? — o pai lhe perguntara, deixando claro que se recusava a acreditar que ela tivesse coragem para abandonar sua boa vida. — É exatamente isso o que vou fazer — Jacquie respondera, categórica, embora não deixasse de sentir uma certa pena do velho. — Não entendo como uma pessoa, como você, tendo uma vida de fazer inveja, possa sentir-se insatisfeita. A velha ladainha, Jacquie havia pensado, irritada. Não aguentava mais ouvir o pai lembrando-lhe, a todo instante, “a sorte” que tinha... — Já sei que qualquer pessoa adoraria ter tudo o que eu tenho. E como eu não quero este tudo, vou deixá-lo para quem queira. — Como é generosa! — O pai tinha dito, irônico. — E o que pretende fazer, já que não quer voltar à Universidade? — A mesma coisa que faria se tivesse tirado o diploma. Vou arranjar um emprego! — Mas, sem o preparo adequado, que tipo de emprego você pensa conseguir? — Não sei. Nem sei que tipo de emprego eu quero. E a faculdade não vai resolver isso. — Um diploma lhe dará mais possibilidade de escolha — ele respondera. — Sem um diploma, você não será mais que uma datilografa ou uma balconista. — E o que há de errado com estes empregos? — Jacqueline perguntara, em tom de desafio. —

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São trabalhos honestos, não são? — Eu não disse o contrário — respondera o pai, já desanimado, ao perceber que não ia conseguir fazer com que sua teimosa filha mudasse de idéia. O resultado final da discussão tinha sido a decisão de partir para Los Angeles, onde Jacquie começaria vida nova. O mais engraçado da história é que ela jamais tinha pensado em morar em Los Angeles. O nome surgiu-lhe na cabeça quando percebeu que o pai estava insinuando que ela escolheria uma cidade bem próxima, “para poder voltar correndo, quando a situação apertasse”. Só para provar que ele estava errado, havia falado em Los Angeles. E agora, estava ali, sozinha na estrada, enfrentando o sol e o calor. Olhou o velocímetro do carro que dirigia e diminuiu a velocidade: a gasolina estava no fim. Deu uma risada. Há dois dias estava por conta própria. Tinha conseguido uma multa por excesso de velocidade no Texas e outra no Novo México, uma ressaca em Bisbee. Não era um bom começo. Mas era um começo... Viu os telhados de uma cidadezinha aparecerem. Estava nos limites de Tombstone, no Arizona. Entrou com o carro num posto de gasolina e pensou que, depois do almoço, poderia dar um passeio pelas calçadas de madeira daquela cidade histórica do oeste. O homem do posto gentilmente lhe indicou os restaurantes localizados na rua principal, a dois quarteirões dali. Mais preocupada com o local para onde ia do que com o trânsito da cidade, ela acelerou o carro em direção à rua. Ouviu uma buzinada e viu um jipe se aproximando. No minuto seguinte, o tal jipe batia na lateral do seu carro. Nenhum dos dois veículos ia em alta velocidade, mas a batida foi séria. Assustada, Jacquie tentou abrir a porta. Dentro do jipe, viu um garotinho loiro, sentado na frente. Ficou apavorada, pensando se o menino tinha se machucado. Quis sair, mas a porta do seu carro tinha sido amassada e não abria. Alguns segundos depois, a porta era aberta pelo lado de fora. Apesar de usar óculos escuros, dava para ver que Jacquie estava de olhos arregalados, diante do rosto que se curvava para ela. O homem impressionou-a. Tinha os traços muito fortes e bem-feitos. E o chapéu empoeirado, que usava enterrado na cabeça, tocava os óculos de lentes espelhadas e lhe dava um certo ar de mistério. — Você está bem? — ele indagou com voz inexpressiva. O acidente a tinha deixado com o coração na garganta e Jacquie só conseguiu enrolar algumas palavras, para explicar que não havia se machucado. Com as pernas trêmulas, desceu do carro. Seu coração estava batendo descontrolado e sua cabeça doía ainda mais. Apertando as têmporas, ela ergueu os olhos para examinar o desconhecido que estava à sua frente. Ele era tão grande, que Jacquie, apesar de ser uma moça bastante alta, dava em seus ombros. A transpiração tinha molhado sua camiseta, grudando-a no peito e na cintura. Não havia um pingo de gordura em seu corpo. Mas, antes que ela pudesse concluir alguma coisa a partir daquela imagem, o homem falou: — Você nem olhou quando entrou na rua. Só uma desmiolada pode dirigir assim...

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Ele interrompeu o sermão para olhar o garotinho que se aproximava, caminhando apoiado em muletas. Era uma simpática e loira criança, de enormes olhos castanho-claros, que estavam fixos em Jacquie. — Você está bem? — o menino perguntou, ansioso. — Morrendo de medo, mas não estou machucada. — Eu lhe disse que ficasse no jipe, Robbie. O garoto baixou timidamente os olhos, murmurou: — Sim, papai. Fora uma sincera e infantil preocupação com Jacquie que fizera o garoto desobedecer ao pai. Ela sentiu-se grata a ele. — E você, está bem? — perguntou gentilmente, empurrando os óculos escuros para o topo da cabeça. O garoto olhou fascinado para os cabelos dela. — Sim, senhora... — Ainda bem. — Jacquie sorriu. — Seu cabelo é muito bonito! — ele exclamou, sem esconder a admiração. Ela olhou para as pontas dos próprios cabelos. — É quase da mesma cor do seu — disse, apontando para ele. O garotinho esticou a mão, como se quisesse tocar aquela cabeleira loira, mas a voz do pai fez com que ficasse imóvel. — Espere por mim no posto, Robbie. O menininho baixou novamente a cabeça. — Está bem, papai — ele murmurou, depois apertou com força as muletas e saiu andando. Mas, após alguns passos, virou-se para Jacquie, sorrindo. — Estou contente em ver que você está bem. — Eu também. — Ficou olhando o garotinho dirigir-se ao posto de gasolina, até que os ombros do homem bloqueassem sua visão. Ele parecia aborrecido. Mesmo assim, Jacquie sorriu-lhe, amigável, e falou: — Sei que um pedido de desculpas não é suficiente, mas sinceramente, peço desculpas pelo que aconteceu. Geralmente, não sou tão descuidada. Os óculos espelhados não a deixavam ver os olhos dele. Mas tinha a sensação de que a observava com exagerada atenção. Jacquie estava usando um bustiê de crochê bem justo, cor-de-rosa, e jeans no mesmo tom. Entretanto, não viu nenhum sinal de admiração aparecer no rosto do desconhecido. — Pelo menos reconhece que foi descuidada — ele murmurou, irônico. — Já é alguma coisa... Jacquie contou até dez e afastou-se dele. Não é bom perder o controle quando se está errada. — Causei muitos danos ao jipe? — Um pára-choque amassado, só isso — o homem respondeu, num tom de pouco-caso. — O pára-choque é forte, aguentou bem. O mesmo não se pode dizer do seu carro. Ela olhou o jipe e, imediatamente, virou-se para ver o carro. Sentiu-se desanimada quando viu

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que a parte lateral, do meio até a frente, estava amassada. — Você teve sorte. Podia ter sido muito pior. Daqui a pouco a polícia chegará, para fazer a ocorrência. — Ele fez um gesto em direção ao posto de gasolina. — E Bob examinará os danos do carro. — A polícia... — Jacquie repetiu, em voz fraca, pensando nas multas que já levara e na citação que, sem dúvida, ia conseguir com aquele acidente. — Sim, a polícia — ele confirmou, com voz firme e um tanto ameaçadora. — Há... há mesmo necessidade de envolver a polícia nisso? — ela começou, com um tom esperançoso, piscando os olhos azuis, mas sem receber nenhuma reação. — Se os danos maiores foram no meu carro! Se ninguém ficou ferido, por que incomodar a polícia? — Houve um acidente envolvendo duas propriedades. Tem de ser feito um relatório — ele respondeu, num tom que não dava margem a discussões. — Entendo — Jacquie disse, fingindo que seu comentário só havia sido feito por que não conhecia a lei o suficiente. Jacquie viu o carro da polícia estacionar e compreendeu que não adiantava mais falar sobre aquilo. O policial cumprimentou o dono do jipe com calma e amizade. As perguntas foram rápidas e respondidas, em sua maioria, pelo homem. Enquanto o policial fazia seu trabalho, Jacquie pensou que nada era perfeito no mundo. Se o acidente tivesse envolvido outra pessoa, ela talvez já estivesse com os problemas resolvidos. Mas aquele homem, não era difícil perceber, a colocaria na cadeia, se pudesse! Segundos depois, ele lhe estendia um papel. Antes que ela tivesse oportunidade de ler, o homem a informou de que era o nome e endereço da sua companhia de seguros e que precisava do dela. Jacquie pegou na bolsa um papel e caneta e escreveu o nome pedido. Ele colocou no bolso depois de ler o que ela havia escrito. Até logo disse, mais para o policial do que para Jacquie. Sem olhar para trás, caminhou para o jipe. Ela o viu parar perto do posto de gasolina e pegar Robbie. Sentiu, então, uma vontade infantil de dizer-lhe que tinha tido muito prazer em lhe dar aquela trombada. O garotinho virou-se no assentou e lhe acenou. Jacquie acenou também, imaginando como um menino tão simpático podia ter um pai tão insensível. O policial e o empregado do posto empurraram o carro para o setor de mecânica e ela suspirou, pensando em quanto iria custar aquilo tudo. — Quanto tempo acha que vai demorar para arrumar o carro? — perguntou, alisando os cabelos para trás das orelhas. — Não demorará muito, se eu conseguir as peças de que preciso. Seu carro é importado e o acidente danificou parte do motor. Jacquie suspirou, esperando o pior. — Quer que eu lhe dê um orçamento, antes de começar o conserto, não é? — ele indagou, limpando as mãos num trapo. — Claro — ela respondeu, mas sabia que aquilo era apenas uma formalidade. Não tinha outra

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escolha, a não ser deixar que ele arrumasse o carro. Olhou as mãos e viu que, numa delas, estava o papel que o homem lhe havia dado. Leu em voz alta: — Choya Barnett... Choya! — ela repetiu. — Que nome é esse?! — O quê? — O mecânico a olhou, confuso. — Choya — Jacquie repetiu e a expressão do mecânico continuou a mesma. — O homem do jipe... o nome dele. O mecânico começou a rir. — Pronuncia-se Cho-iá. Choya Barnett. — Eu nunca ouvi este nome antes. — É de um tipo de cacto — o homem explicou, sorrindo. — Como? — Ela inclinou a cabeça, interessada. — O cacto cholla, escreve-se c-h-o-l-l-a, mas a pronúncia é cho-iá — o mecânico repetiu. — Choya Barnett recebeu este nome por causa do cacto. O velho Barnett o encontrou perto de um pé de cholla, quando era um bebê. E Barnett colocou o nome do jeito que é falado. Jacquie sentiu uma enorme vontade de rir, mas mordeu os lábios. Era o nome de um cacto! Quanto mais pensava naquele nome, mais achava que combinava com o dono. — Se quiser almoçar, senhorita, enquanto eu faço o orçamento, pode ir. Vou ter de dar alguns telefonemas e saber os preços das peças. — Sim, acho que vou almoçar — Jacquie concordou, ainda com vontade de rir. Colocou os óculos, pegou a bolsa e saiu do posto de gasolina. Pelo menos, estava havendo algo de engraçado naquela situação. Caminhou em direção à rua Allen, à procura de um restaurante com ar-condicionado. Encontrouo, mas estava cheio e ela só viu uma mesa vaga e um banco. Sentou-se no banco e aceitou o cardápio que a garçonete trouxe. Não prestou atenção na porta do restaurante, até que ouviu o som das muletas. Olhou para a entrada e viu Robbie Barnett. Ele caminhou em direção a ela, ou melhor, para a mesa vaga, bem à sua frente. — Alô! — o garoto disse, alegre. — Alô! — Jacquie respondeu sorrindo, e os olhos castanhos dele brilharam de prazer. Ela olhou para a porta e viu que Choya Barnett conversava com uma pessoa. — Você vai almoçar também? — Sim, senhora — Robbie disse educadamente, olhando para o banco que tinha ficado vago, ao lado dela. Jacquie sentiu vontade de convidá-lo, mas sabia que o pai dele não ia gostar daquilo. Continuou olhando para o garotinho e sentiu uma imensa ternura. Era como se ele tivesse despertado um instinto maternal que ela nem sabia que possuía. O garoto se equilibrou nas muletas e sentou-se numa das cadeiras que estava perto da mesa. Mas só conseguiu sentar-se na beirada e ficou com a perna engessada balançando no ar. Jacquie levantou-se e foi até ele. Pegou outra cadeira e colocou a perna engessada sobre ela. — Acho que você ficará melhor assim — falou, ajudando-o a sentar-se mais confortavelmente.

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— Que tal? — Ótimo. — Ele sorriu. — Meu nome é Jacquie. — Ela lhe estendeu a mão. — É um nome de menino — ele disse, sacudindo a mão dela, com ar sério. — É o apelido de Jacqueline. — Como eu me chamo Robbie, meu apelido seria Rob, se eu tivesse. — Ele sacudiu a cabeça com ar de quem tinha entendido. — Tenho quase sete anos. — Eu sou bem mais velha. Tenho quase vinte e um. — Meu pai é muito mais velho do que isso — Robbie respondeu, como que explicando que ela não precisava pedir desculpas por ser tão velha. — Desculpe, Srta. Grey — disse uma voz fria, atrás de Jacquie. — Não acha que o meu filho é muito jovem, para ficar flertando com ele? Jacquie virou-se, furiosa. Choya Barnett tinha tirado o chapéu e os óculos. Seus cabelos castanhos caíam sobre a testa bronzeada. Mas seus olhos foram uma surpresa. Eram de um tom estranho de castanho-dourado. Tinham partículas douradas também. Eram olhos muito semelhantes aos de um animal destruidor: o tigre! Agora a observavam alerta, como que contendo um aviso. Jacquie sentiu uma espécie de desafio e levantou o queixo. — Será que prefere que eu escolha alguém da sua idade, Sr. Barnett? — ela perguntou, num tom gelado. O homem sorriu, mas seus olhos se voltaram para o bustiê dela e se fixaram na curva dos seios. — Tenho certeza de que você pode ser muito divertida — ele respondeu. — Mas não tente divertir-se comigo, moça! Ele a estava insultando deliberadamente. O sangue dela estava prestes a ferver. Jacquie percebeu que ele se ressentia de ela ter entrado em sua vida e queria que soubesse disso. — Que ótimo descobrir um homem fiel, nos dias de hoje! — murmurou, tentando parecer calma. — Sua mulher deve ser feliz. — Isso mesmo! — ele concordou e se afastou. Parecia que a tinha dispensado como se lhe dissesse: “Vá para o inferno”. Ela ficou ali, sozinha e espantada. Não tinha outra escolha a não ser voltar para o seu banco. Choya, um cacto ela pensou, ainda procurando se acalmar. Espinhudo por fora, para evitar que as pessoas se aproximem. Mas, como será por dentro? Como sabia que não teria resposta para sua indagação, achou melhor concentrar-se no cardápio.

CAPÍTULO II Choya Barnett não era um homem fácil de ser ignorado. Mesmo quando não o estava olhando,

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Jacquie sentia a força de sua personalidade. Era fascinante, bonito e dono de um perigoso encanto, vindo, principalmente, dos seus traços marcados. Ou talvez o encanto maior estivesse nos olhos castanhodourados, que pareciam nunca revelar o que ele pensava. Robbie certamente havia puxado à mãe. Os olhos castanho-dourados do menino eram a única coisa que lembravam o pai. Jacquie começou a pensar que tipo de pessoa seria a mulher dele. Sensível como o garoto? Se fosse, coitada dela! Choya Barnett era um sujeito capaz de aniquilar qualquer mulher... Quando Jacquie voltou à garagem, depois do almoço, o mecânico lhe deu um conselho: que desse uma volta pela cidade e visse as paisagens. O carro não ficaria pronto antes das cinco da tarde. Como era sábado, ele avisou que havia ainda o risco de não conseguir as peças necessárias. Jacquie nem queria pensar naquilo. Significaria passar o fim de semana naquela cidade. Quem diria que sua esticada até Bisbee ia dar naquela confusão? Devia ter ido diretamente a Los Angeles, sem paradas para visitas sociais. Por sorte havia bastante coisa para ver. A cidade, cheia de relíquias históricas, tinha vários museus do tempo da conquista do Oeste. Tinha também muitas lojas de presentes. Ela pensou em reservar um quarto num dos hotéis, mas tratou logo de afastar essa idéia. Pensou em ligar para Tammy, em Bisbee, para o caso de ter de ficar até segunda-feira. Mas logo resolveu que não faria isso. Queria passar alguns dias sozinha, antes de visitar a amiga. Precisava fazer planos para quando chegasse a Los Angeles. Às quatro horas, caminhou para o posto de gasolina. Numa das ruas, viu as árvores de um pequeno parque, que ofereciam uma sombra convidativa. Jacquie não resistiu e resolveu sentar-se num dos bancos. Não percebeu o garotinho loiro, no fundo do parque. Só o viu quando ele se aproximou do seu banco. — Robbie! — ela exclamou, surpresa. — Não esperava ver você de novo. Pensei que tivesse ido para casa. — Ainda não. — Ele sacudiu a cabeça, sorrindo. — Meu pai vem me buscar daqui a pouco. Vendo o menino, a imagem de Choya Barnett voltou à sua cabeça. Procurou afastá-la, concentrando-se na criança. — Onde você mora? Aqui em Tombstone? — Não. Num rancho, nas Montanhas Dragão. — Ele enrolou a língua para falar a palavra “dragão”. — Entendo. E seu pai tinha negócios a resolver na cidade, hoje. Você gosta de morar na fazenda? — Era gostoso. Mas agora que eu quebrei a perna, não posso fazer muitas coisas. — Você tem irmãos? — Não. Só vovô e papai. — E a sua mãe, naturalmente — disse Jacquie, de repente, percebendo que era importante obter aquela informação. — Não — ele disse, com ar distante.

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— Não? — repetiu ela, pensando nas diversas possibilidades que aquela resposta suscitava. A mãe dele estaria morta ou teria abandonado o marido? O garotinho tinha baixado o rosto e os cabelos loiros lhe caíam sobre a testa. Como se sentisse o olhar dela, Robbie Barnett lentamente levantou os olhos, pensativo. — Mamãe morreu quando eu era pequeno — disse, terminando com as dúvidas de Jacquie. — Eu nem me lembro dela... Apesar de a voz dele ser calma, havia um brilho esperançoso no olhar. Jacquie sentiu uma leve tristeza. Não era bem a morte da mãe que o menino lamentava, mas o fato de não se lembrar dela. Jacquie acariciou-lhe o rosto. — Lamento muito, Robbie — ela disse, com sinceridade. Imóvel, ele a olhou por um longo momento. Jacquie queria falar alguma coisa, Robbie quebrou o silêncio, dizendo: — Meu pai me deixa ter um retrato dela no quarto. Mamãe era muito bonita. — Tenho certeza que sim, Robbie. — Você parece muito com a mamãe. Seu cabelo é da mesma cor. Sorrindo, Jacquie entendeu por que o garoto tinha se sentido atraído por ela desde o primeiro momento. Eram os cabelos loiro-acinzentados. Certamente, aquela tonalidade de loiro não era comum. — Este é um grande elogio, Robbie, principalmente porque você já me disse que sua mãe era muito bonita. Obrigada. Agora ela se sentia numa posição estranha. Se lembrava a mãe do menino, por que Choya Barnett a tinha tratado de modo tão ríspido? Teria visto nela o fantasma da esposa, que voltara para assombrá-lo? Certamente, só isso poderia explicar sua agressividade em relação a ela. — Você é casada, Jacquie? — Não. — Ela sorriu passando as mãos pelos cabelos do menino. — Ainda não estou pronta para me enforcar. — Não vai ficar em Tombstone? — ele disse, inclinando a cabeça para o lado, confuso. — Só o tempo de consertarem o carro. Estou só de passagem. E isso me lembra — olhou o relógio — que devo estar de volta ao posto de gasolina às cinco. Já está quase na hora. — Gostaria que você não precisasse ir embora -— Robbie murmurou, com ar triste. De certa forma, agora Jacquie também desejava não ter de ir. Mas censurou-se por ser tão sentimental. Robbie era apenas um garotinho, igual a tantos outros. Era bobagem sentir-se ligada a ele. Depois que saísse da cidade, nunca mais o veria de novo. Levantou-se depressa, e Robbie a olhou em silêncio, observando todos os movimentos dela, mas sem a olhar no rosto. Jacquie estendeu a mão com solenidade, numa despedida. — Adeus, Robbie. Seu pai provavelmente vai chegar daqui a pouco, para levar você para casa. — Adeus — respondeu ele, mal tocando a mão dela, virando-se em seguida e caminhando com as

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muletas. Jacquie observou aquela figurinha se afastando. Sentiu um impulso de esquecer o carro e ficar com aquele garoto até que o pai viesse buscá-lo. Resoluta, caminhou para a calçada. Ali estava o pai dele! — Alô — Jacquie falou, apressada, tentando evitar a sensação de que tinha sido apanhada fazendo algo que não devia. Ele só sacudiu levemente a cabeça. Estava usando novamente o chapéu de cowboy e óculos espelhados. Mas Jacquie sentia seu olhar frio, estudando-a demoradamente. O homem passou por ela caminhando com passos largos. Jacquie virou-se na direção em que Robbie tinha ido, mas não conseguia tirar os olhos de Choya Barnett. — Robbie — chamou suavemente, mas todos os nervos do seu corpo estavam alertas. — O seu pai chegou. Eu disse que ele não ia demorar. — Ela afastou uma mecha de cabelo que dançava na frente do rosto e, por algum motivo desconhecido, achou que devia explicar por que estivera com o garoto. — Eu estava a caminho da garagem, para ver se o meu carro já estava pronto, e parei aqui para sair um pouquinho do sol. Então encontrei Robbie. — Seu carro ainda não ficou pronto? — Choya Barnett agora estava ao lado dela. Parecia que tinha resolvido esperar que seu filho se aproximasse lentamente. — Talvez a esta hora já esteja — Jacquie respondeu, procurando ignorar que não estava se sentindo à vontade com a presença dele ali tão próxima. — O mecânico me avisou que pode ter alguma dificuldade em conseguir as peças porque o carro é importado. O rosto dele só dava a entender que estava entediado com aquela explicação. Logo que ela terminou, ele olhou para o menino, que tinha parado mais perto de Jacquie do que do pai. — Vamos embora, filho? — Embora estivesse perguntando, deixava claro que nem pensava na possibilidade de uma negativa. — Vamos, papai — Robbie disse, sem entusiasmo. Os olhos castanhos dele estavam fixos em Jacquie. — Adeus outra vez, Robbie. — Ela queria parecer alegre, mas sentia-se desajeitada e triste. — Srta. Grey a garagem é no caminho do meu rancho. Posso lhe dar uma carona. Jacquie teria só de caminhar dois quarteirões. Mas o tom de ordem dele, como sempre, não admitia recusas. Robbie sorriu com adoração e gratidão para o pai. Então, o coração do homem não é totalmente feito de pedra!, ela pensou. Senão não iria aguentar a companhia dela por dois quarteirões só para agradar ao filho. — Muita gentileza sua, Sr. Barnett — disse, com ar curioso, querendo saber por que ele ria, irônico. — Meu jipe está estacionado logo ali. Robbie e Jacquie o seguiram.

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Havia certa impaciência no andar dele, como se estivesse arrependido de ter oferecido aquela carona. Parou ao lado do jipe e avisou: — A parte de trás está suja de poeira. Vocês dois terão de se acomodar no banco da frente. Acho que não há problema, pois é só até a garagem. — Claro que não! — Jacquie concordou, olhando para o garoto, que hesitava ao seu lado. — Dê-me as muletas, Robbie. — O homem estendeu a mão bronzeada e ajudou Robbie a se equilibrar, enquanto colocava as muletas na parte de trás do jipe. Depois ajudou o menino a sentar-se. Jacquie se acomodou ao lado dele. — Obrigada — disse. Mas Choya não pôde ouvir. Quando ela pronunciou a última sílaba, ele já estava dando partida no carro. Jacquie observou o perfil másculo dele, depois voltou sua atenção para o garotinho, que tinha pousado a cabeça em seu ombro. A expressão da criança era de uma alegria imensa por se sentir querido. — Você não me contou como quebrou a perna, Robbie — disse ela, abraçando com mais força o menino. — Eu caí de um touro. — Ele sorriu, depois olhou preocupado para o pai. — Um touro! — Jacquie repetiu, incrédula. — Vou montar no rodeio quando crescer — ele informou, com ar de importância. — Você disse que é bom aprender enquanto ainda se é pequeno. Incrédula, Jacquie continuava observando o rosto dele. — Quer dizer que você tentou montar num touro? — Robbie! — A voz extremamente grave do homem tinha um tom de aviso. Falava baixo e sem desviar a atenção da rua. Houve um instante de silêncio. Então o menino deu de ombros. — Bem, na verdade, era só um bezerro — Robbie admitiu. — Ainda não sou bastante grande para montar num touro de verdade. — Ainda bem! — Jacquie riu. Depois olhou curiosamente para o motorista. — Monta nos rodeios, Sr. Barnett? — Não — ele respondeu, seco, sem encorajar aquela conversa. — Entendo — ela disse, recusando-se a se entregar —, perguntei porque achei que talvez Robbie o estivesse imitando... “tal pai, tal filho”. — Aquilo foi idéia só dele. Não foi Robbie? Novamente, Choya Barnett falara num tom autoritário e o menino enrubesceu violentamente. — Sim, papai — Robbie murmurou, com ar de culpa —, e não vou tentar outra vez, a não ser que o senhor ou o vovô estejam lá. Aquela frase completava a descrição do acidente dele, para Jacquie. Ela agora sabia por que Choya Barnett não queria deixar o garoto se vangloriar de sua queda. Robbie era muito novo para perceber o perigo de montar num bezerro. Aquela perna quebrada devia parecer um insulto ao senso de precaução do pai dele.

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O jipe parou diante da garagem. O mecânico aproximou-se. — Lamento, senhorita ;— falou, antes que Jacquie descesse —, mas não consegui as peças, que precisam vir de Tucson. Só vou poder consertar seu carro na segunda-feira. Não ficará pronto antes de segunda à tarde. — Oh, não! — protestou ela, apesar de ele já lhe ter avisado que existia aquela possibilidade. — Lamento... — o mecânico repetiu, com um sorriso filosófico. — Já que é assim... — Jacquie olhou em direção ao anúncio de um hotel. — Tudo bem. Só terei que encontrar um lugar para passar a noite. — Há alguns lugares muito bons. No hotel do fim da rua ainda há vagas — sugeriu o homem. — Obrigada pela carona, Sr. Barnett — ela disse, pensando que qualquer lugar serviria, e começou a sair do jipe. — Jacquie! — Robbie gritou, ansioso. — Jacquie, espere! Eu... Mas o pai o interrompeu. — Fique quieto, Robbie. — Olhou para a moça. — Se quiser, vá pegar as coisas que estão no seu carro, Srta. Grey; posso levá-la até o hotel. Aquela oferta a surpreendeu mais do que a carona. Levantou as sobrancelhas, antes de agradecer, com um ar intrigado. — Obrigada. Agradeço muito. Seu carro estava estacionado dentro da garagem. Jacqueline entrou e pegou uma maleta e a frasqueira. De dentro do carro, observou que estava tendo lugar uma discussão intensa entre pai e filho. A julgar pelo ar desanimado de Robbie, a decisão não tinha sido a seu favor. — Pegou tudo de que precisa? — Choya Barnett indagou, com um ar de indiferença. — Sim, obrigada. — Jacquie sentia que não devia ter aceitado aquela oferta. O homem era realmente um quebra-cabeças. Tinha oferecido carona, quando era óbvio que queria se ver livre dela. E ela não tinha dúvidas de que havia sido o motivo da discussão dele com o filho, embora não adivinhasse a razão. Se Choya Barnett queria separá-la do garoto, então por que prolongar o tempo com caronas? Ou será que tinha interrompido Robbie antes que ele falasse algo que o pai não aprovava? Talvez fosse isso. Jacquie acomodou-se novamente no assento. Choya Barnett deu a partida, com um ar impassível. Encare a realidade, Jacquie pensou, está fascinada por este homem. Ele não parece com ninguém que você conhece. E você também gostaria de saber o que o deixa entusiasmado. O fato de ele não parecer entusiasmado com a sua beleza, ela tinha de admitir, o transformara numa espécie de desafio. Ao parar o jipe diante do hotel, Choya desceu, aproximando-se dela. Jacquie o olhou, surpresa. Nada na expressão dele dizia-lhe alguma coisa. Era impossível saber se ele estava fazendo aquilo por educação ou apenas para ter certeza de que estava se livrando dela definitivamente. Segurou a maleta, dizendo: — Eu levo isto para você. Jacquie caminhou ao lado dele.

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— Por que está fazendo isso, Sr. Barnett? — Fazendo o quê? — Ele levantou ainda mais a cabeça, num jeito arrogante, como se suas atitudes não devessem ser questionadas. — Estou simplesmente tentando ser gentil com uma estranha que se encontra impedida de sair da nossa cidade. — É mesmo? — Jacquie indagou, dando à voz um tom de dúvida. — O que mais acha que possa ser, Srta. Grey? — Ele afastou-se indicando que ela devia entrar no hotel. — Não sei... — disse ela, caminhando para a porta. Lá dentro, Choya apresentou-a à proprietária, explicando os motivos pelos quais ficaria hospedada ali. A mulher pareceu não se surpreender com nada do que ele dizia e garantiu que Jacquie ficaria muito bem acomodada. Jacqueline assinou o livro de registro e seguiu atrás de Choya, que caminhava para o interior do hotel, com sua maleta. Não se atrevia a perguntar-lhe mais nada. Choya havia retirado os óculos, mas os olhos dele pareciam tão protegidos como quando usava os vidros espelhados. Ele abriu a porta de um quarto e entrou, acendendo a luz. Jacquie seguiu-o, sorrindo, pensando em como ele reagiria se oferecesse algum pagamento pela ajuda. Sabia que o homem não acharia a idéia divertida. A sandália dela enroscou no tapete, perto da porta, e Jacquie deixou escapar a frasqueira, procurando se apoiar em alguma coisa. Mas não caiu. Choya Barnett aproximou-se depressa e a segurou firme. Num minuto estava caindo e, no outro, sentiu o braço dele ao redor de sua cintura, puxando-a para cima novamente. Seu peso parecia não significar nada para ele. Surpresa, Jacquie sentiu seu coração batendo com mais força. Pôde notar a rigidez da pele dele, já que ele estava com a camisa desabotoada até a cintura. Tremeu ao tomar consciência dos braços que a apertavam com força. Jogou, então, a cabeça para trás e encarou-o profundamente. O brilho daqueles olhos parecia deixá-la sem fôlego. Sentiu um impulso instintivo de beijá-lo, um impulso irresistível, um desejo que ela nem conhecia. Sem conseguir se controlar, deixou que os lábios se aproximassem dos dele. Percebeu que o homem baixava a cabeça, aceitando o seu convite. Logo suas bocas se aproximavam mais e mais... Só que, antes que o beijo acontecesse, ele a empurrou. Os lábios dela ainda estavam separados, na antecipação do beijo que tinha morrido antes de começar. Jacquie piscou, sem acreditar naquilo, e percebeu que o olhar de Choya agora era completamente frio. — Então, não é tão indiferente a mim, como estava fingindo, Sr. Barnett? — ela acusou, em voz baixa e ofegante. — Sou um homem — ele respondeu friamente e naquele momento ela não tinha a menor dúvida daquilo. — Reagi sem pensar. Prometo que não cometerei este erro outra vez.

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Ela sentiu-se incapaz de entender o que tinha ouvido. — Por que... por que o senhor não gosta de mim? O que eu fiz? — Passou a mão trêmula na testa. — Não é só por causa do acidente. Ele riu, com ar irônico. — Não só. Mas você significa problemas... e com letras maiúsculas... E, definitivamente, não é disso que eu preciso. — Então, por que resolveu gastar seu tempo comigo e me trazer até o hotel? — indagou, sentindo que sua raiva crescia e que não devia ter sido catalogada por ele de um modo tão rápido e injusto. — Quando pressinto problemas, gosto de saber onde estão. Isso responde à sua pergunta? — Sim, respondeu muito bem. Espero que entenda se não lhe agradecer por tudo o que fez — ela disse, sarcástica. Jacquie sentiu que estava perdendo o controle rapidamente. Queria que Choya Barnett saísse dali, antes que começasse a chorar. — Entendo muito bem — disse ele, com um sorriso cínico. Quando saiu e fechou a porta, ela esmurrou a parede. Depois pegou a frasqueira e atirou na porta, desejando tê-la atirado na cabeça dele!

CAPÍTULO III As pedras pareciam perfurar as solas das sandálias de Jacquie, enquanto ela caminhava com cuidado ao longo da estrada. Apesar de não ser ainda meio-dia, o sol já estava terrivelmente quente. Tinha resolvido ir a pé até o famoso Cemitério Boothill, mas como não se atrevia a caminhar pelo asfalto, era obrigada a pisar sobre o pedregulho do acostamento. Depois de algum tempo caminhando, ela sentiu uma pedrinha dentro da sandália, mas não a tirou porque ouviu, então, uma buzinada forte. O veículo que buzinara não passou como os outros. Estacionou ao lado dela e Jacquie reconheceu o motorista. — Está dando uma volta? Ou pretende ir embora, Srta. Grey? — Choya Barnett perguntou, em tom brincalhão, para surpresa de Jacquie. — Não a pé! — ela respondeu, zangada. Não tinha dormido bem e achava que a culpa só podia ser daquele homem. — O que está fazendo na cidade, esta manhã? Veio identificar outro problema? — indagou, sarcástica. Ele ignorou a pergunta. — Se vai longe, não está usando os sapatos adequados. — Obrigada pelo aviso. Já tinha desconfiado disso — Jacquie começou a caminhar novamente, resolvida a não deixar que aquele homem a perturbasse. Esperou que ela se afastasse um pouco, depois movimentou o jipe, até parar ao lado dela, novamente.

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— Entre! — ordenou, com voz impaciente. — Não, obrigada. — Eu falei: entre! — Choya Barnett repetiu, irritado. — Deve entrar, senão vai terminar com um corte no pé ou com o tornozelo torcido e terá de aceitar a carona do mesmo jeito. Entre e evite a dor. Além do mais, estamos indo na mesma direção. — Você nem sabe para onde estou indo! — Só há um lugar, nesta direção. Ela colocou as mãos na cintura, com ar de desafio. — E o que é, pode me dizer? — O cemitério. Todos os turistas vão lá. — Ele parecia tão certo daquilo que Jacquie nem retrucou. O problema não parecia ser o seu destino, mas a estrada que tinha de percorrer. — Não espera que eu pense que está caminhando para fazer exercício, não é? — Choya brincou. — Só porque acertou, não precisa se vangloriar. — Então, pare de discutir e entre. — Ele nem procurou disfarçar a impaciência. Se não fosse aquele montão de pedregulho, Jacquie teria recusado. Não conseguia imaginar quais os motivos dele para fazer aquela oferta. — Onde está Robbie? — perguntou, logo que entrou no jipe. — Deixou-o em casa, para que eu não tente corrompê-lo? Ele mergulhou os olhos nos dela, por um instante; depois colocou o jipe em movimento. — Não. Acontece que meu filho está na escola dominical. Jacquie resolveu calar-se e ficou observando Choya Barnett. Não havia dúvida: de todos os homens que havia conhecido, aquele era o mais viril. Seu físico demonstrava isso — as pernas longas e musculosas, os ombros largos, o peito sólido. E, além de tudo, aquele irresistível olhar primitivo. — E você? Por que não foi à igreja também? — Eu tinha outras coisas a fazer — disse Choya. — Não pude ficar na igreja com o garoto. Jacquie o olhou, confusa. Perdida em seus pensamentos, esquecera-se da frase anterior. Ele retribuiu, tirando os olhos da estrada para encará-la com interesse e ironia. — O que você disse? — Engoliu em seco, sentindo um arrepio. — Eu disse — ele repetiu secamente — que tinha outras coisas a fazer, em vez de ir à igreja. — Coisas muito importantes, como saber por onde eu ando? Ignorando o ar petulante dela, Choya diminuiu a velocidade do jipe e parou diante da entrada do velho cemitério. Dali já dava para ver os túmulos estragados pelo tempo. No horizonte viam-se as montanhas e, ali perto, estendiam-se as planícies sem fim, arenosas, cheias de pedras e cactos. Sem agradecer nem se despedir, Jacquie saiu do jipe e pisou novamente nos pedregulhos. Depois caminhou para a lojinha que ficava na entrada do cemitério. Não olhou para trás. — Uma das coisas que eu queria fazer — ouviu Choya Barnett falando baixinho lá atrás — era conversar com você. Jacquie virou-se e o olhou zangada.

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— Não imagino nada que você precise discutir comigo. Sei que não pretende pedir desculpas pela sua grosseria de ontem. — A última frase foi dita com um leve tom interrogativo. — Não. Não vou pedir desculpas — disse ele suavemente. — Então, não temos nada para conversar. Ainda bem!, ela pensou. Sabia que, se ele se desculpasse, ela sucumbiria completamente à sua perigosa atração. Abriu a porta da loja, e logo percebeu que alguém impedia que se fechasse. Talvez não desejasse ouvir o que Choya Barnett tinha a dizer, mas ele estava resolvido a segui-la. Dentro da loja, Jacquie parou, procurando a porta de saída para o cemitério. Sentiu a mão firme dele em seu braço, guiando-a para a direita. — Por aqui — disse ele. Percebendo o olhar curioso do vendedor e dos outros turistas, ela procurou não parecer tão aborrecida. Lá fora, ainda deram vários passos, antes que ele largasse seu braço. Jacquie respirou fundo, procurando se acalmar e anular o problema que a indiferença dele estava lhe causando. Passearam entre as sepulturas e ela observou que em alguns túmulos havia pés de cactos. O vazio daquela paisagem se estendia até as montanhas distantes que marcavam as fronteiras do Oeste. A terra parecia completamente nua, como que não tivesse sido marcada pela passagem do tempo nem da civilização. Os fantasmas dos guerreiros apaches deviam caminhar até as montanhas distantes e, através dela, subir para os céus. Protegendo os olhos com as mãos, Jacquie estudou a linha montanhosa do horizonte. Choya Barnett estava à sua direita. Ela sabia exatamente a localização dele, sem precisar olhá-lo. — As Montanhas Dragão — ele informou, vendo para onde ela olhava. — É lá que fica o seu rancho? — Estava interessada, apesar de não querer reconhecer isso. — Robbie contou a você? — Sim — Encarou-o, mas viu que era difícil sustentar o olhar dele. Desviou os olhos e observou as planícies pedregosas. — Sim. ele me contou. — É sobre Robbie que eu queria conversar com você. — O que você teria a me dizer sobre Robbie? — Ele vai ter de passar o dia na cidade outra vez e Tombstone é muito pequena para que vocês não se encontrem. — E? — Jacquie sentia sua raiva crescendo. — E eu gostaria que você não o encorajasse a se tornar mais seu amigo. — Então, devo dizer a ele que desapareça? — Tenho certeza de que uma pessoa como você pode afastá-lo sem problemas. — Havia uma leve ironia no tom de voz dele. — Uma pessoa como eu? O que significa isso? — Srta. Grey, tenho certeza de que suas inegáveis qualidades físicas já lhe trouxeram muitos admiradores. Alguns desejados, outros não... Sem dúvida já adquiriu experiência em fazer com que os

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não desejados se afastassem. Será fácil lidar com um garotinho... — E por que devo fazer isso? — Ela caminhou para um túmulo próximo. — Só porque você não gosta de mim? — Meu filho tem o hábito doloroso de se ligar às pessoas, principalmente a estranhos — ele disse, tenso. — Sempre espera que os outros sintam a mesma coisa que ele. Quando essas pessoas partem, descobre que é impossível entender por que foi rejeitado. — Acho que não acredito em você, Choya Barnett. Pelo menos, não completamente. Robbie não me parece o tipo de criança que fica se apaixonando por qualquer estranho. — Ele escolhe — disse Choya, num tom vago — um tipo especial... Durante um momento, Jacquie só conseguiu olhá-lo com curiosidade, tentando encontrar uma resposta. Depois percebeu seus motivos. Já devia ter percebido antes, mas ele a tinha apanhado de surpresa. — Robbie só escolhe as mulheres loiras. — Jacquie falava com suavidade, esperando que algo mudasse no rosto dele. — Eu lembro muito a mãe dele? — indagou, vendo que a fisionomia de Choya ficava mais tensa. Os olhos dela brilhavam intensamente quando o encarou. A princípio, ele ficou surpreso. Entretanto, seu rosto não demonstrava tanto sua perturbação. — Parece óbvio que Robbie lhe falou sobre Rosemary — disse, em tom baixo. — Robbie não me disse o nome da mãe. — Jacquie sentia uma vontade enorme de descobrir tudo sobre a falecida esposa de Choya Barnett. — Sou muito parecida com ela? Novamente ele a encarou e Jacquie percebeu que estava prendendo a respiração. — Não — ele negou, observando os cabelos que caíam sobre os ombros da moça. — O seu cabelo também tem a cor do luar refletido num lago de montanha — falava como se estivesse sozinho —, mas a semelhança termina aí. Minha mulher tinha olhos castanhos e sardas no nariz. Era pequena, delicada e suave. Esta descrição não combina com você. — Concordo. — Jacquie respirou fundo. Sempre sentira orgulho de sua altura e de seu corpo. Ninguém nunca a fizera sentir essas características como defeitos. — Infelizmente, Robbie era muito novo quando Rosemary morreu. Não se lembra dela. Para ele, ela é uma linda loira numa fotografia — Choya disse, em voz baixa. — Como sua mulher morreu? — Jacquie indagou, antes de pensar que não tinha nada a ver com a vida pessoal dele. — Num acidente de automóvel... mas não creio que isso interesse a você. Ela sacudiu ligeiramente a cabeça, como que se desculpando. — Lamento. — Por ser curiosa ou por minha esposa estar morta? Jacquie ficou tensa. Ele estava querendo que ela perdesse o controle. Mas provaria que não era tão maleável quanto ele pensava. — Por nada — disse, levantando o queixo num gesto característico. — Eu não perguntei por mal e só poderia lamentar a morte de sua esposa de um modo vago, pois não a conheci.

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— Então, por que se desculpar? — Choya sorriu friamente. Na verdade, Jacquie não sabia por que estava dando explicações. — Não estou me desculpando nem lamento nada — disse pensando bem nas palavras. — Só lamento que Robbie esteja querendo transferir seu afeto para alguém e que este alguém seja eu. Acho que não pode me culpar por isso. — Não, não a culpo. — Choya Barnett agora tinha parado diante dela. — Estou pedindo que não o encoraje. — Será que você ainda não se cansou de ficar correndo por aí, atrás de todas as loiras, pedindo que fiquem longe do seu filho? — Procurou rir, mas o riso saiu forçado. — O que Robbie está procurando é apenas o carinho de uma mulher. Tendo apenas você e o avô como família, ele está sempre rodeado de homens. A solução é simples: case-se de novo! Então, não precisará tornar a viver essa situação estranha e ridícula. Ele deu uma gargalhada. — Está querendo dizer que eu devo me casar, só para dar uma companhia feminina ao meu filho? Jacquie não percebera que tinha preparado uma armadilha para si mesma. — Tenho certeza de que você conseguiria tirar suas vantagens do arranjo, tanto quanto Robbie. — Você parece ver o casamento de um modo muito frio e calculado. É assim mesmo que o vê? — Choya encarou-a. — Não. — Jacquie lembrou-se do casamento dos seus pais, uma combinação de amor e amizade, bom humor e dedicação... — Não, esta não é a minha idéia de casamento. Mas, pensei que fosse a sua. — Pensou? — Ele enfiou o dedo no cinto e a olhou com arrogância. — E qual é a sua idéia de casamento? Os olhos dela faiscaram de raiva. — Isso ficará entre mim e o homem com quem vou me casar, quando ele aparecer... — E enquanto ele não aparece? Vai amar todos os homens? — Fixou o olhar nos seios de Jacquie e prosseguiu, maldoso: — Até quando vai continuar atacando todos os homens que cruzam seu caminho? Nesse momento Jacquie percebeu que suas roupas e seu jeito eram próprios de uma moça de cidade grande. Teve vontade de explicar que andar sem sutiã era moda. Mas, em vez disso, resolveu assumir uma pose vulgar para dizer: — Não havia notado isso... Jacquie preocupou-se ao perceber um certo aborrecimento no rosto dele. Mas apressou-se em dizer a si mesma que não tinha importância. Desde o primeiro momento em que se encontraram, Choya Barnett já a tinha classificado como uma vagabunda. Portanto, não adiantava tentar convencê-lo do contrário. Além do mais, não havia nenhuma diversão naquela cidadezinha isolada e ele devia estar espantado com ela. Ainda bem que partiria no dia seguinte. Exagerando o rebolado, ela caminhou entre as pedras que formavam a base das sepulturas. Em algumas havia nomes chineses, em outras, apenas nomes e datas e uma frase simples: “morto pelos índios”. Só uma fez com que Jacquie se arrepiasse. Era o túmulo de um homem que fora enforcado pela

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justiça da fronteira do Oeste. Na lápide, estava escrito: “enforcado por engano”. Nos túmulos dos Clanton e dos McLaury, Jacquie leu inscrições que não entendeu e, instintivamente, procurou esclarecimentos com Choya, que não cansava de segui-la. — Aqui diz que foram assassinados. Mas, na verdade, não morreram num tiroteio em Ok Corral? — ela indagou. — Sim. — Ele acendeu um cigarro. — Mas, os Clanton eram muito populares em Tombstone. O mesmo não pode ser dito de Wyatt Earp e seus irmãos. Durante muito tempo houve dúvidas de que o tiroteio tenha sido uma briga limpa. — E foi? — Ela inclinou a cabeça para o lado, curiosa. — Depende de com quem você está falando. Se com um dos admiradores dos Clanton ou com um dos Earp. — Choya soprou uma baforada de fumaça. — Parece que a média da população acha que foi. Ela caminhou para a entrada da loja de souvenirs. Um longo cacto chamou sua atenção. Parecia uma almofada de alfinetes. — Que cacto é aquele? — Um ocotillo — Choya respondeu, pronunciando os dois “1” como se fossem um “i”. — Antigamente usava-se fazer cercas com este tipo de cacto porque aqui no deserto não havia arame farpado. Jacqueline caminhou mais um pouco e, depois de algum tempo em silêncio, ele indagou: — Ainda não me deu a sua resposta, moça! Durante um momento o rosto dele se aproximou do dela e Jacquie sentiu seu coração disparar. Novamente, sentiu vontade de ter os lábios dele de encontro aos seus. Mas, desta vez, manteve o autocontrole. — Que resposta? — disse lentamente, procurando ordenar seus pensamentos. O vendedor da loja os olhou quando entraram. Choya deu um sorriso. Não havia mais ninguém ali e Jacquie percebeu que ele não queria continuar a conversa na loja. Sentiu a mão dele em seu braço, conduzindo-a para a porta e para o estacionamento, onde logo a largou. — Eu pedi que você não encorajasse meu filho. Quero a sua palavra de que não vai fazer isso. — Choya fez sua exigência encostando-se no jipe. Ela custou a responder. A raiva por estar recebendo ordens de um desconhecido a deixava quase sem voz. — E o que vai fazer, se eu não der a resposta que você quer? — conseguiu dizer, finalmente. Ele respirou fundo, mas não demonstrou qualquer emoção. — Qual é a sua resposta? — insistiu, deixando claro que não estava interessado em tomar conhecimento da pergunta dela. A tentação era de não dizer nada. Ignorá-lo, como ele a estava ignorando. Talvez, se ele ficasse com raiva... Jacquie olhou ao longe, procurando escapar do fascínio daquele homem. — Se eu vir Robbie, serei educada e amigável — declarou, irritada por se sentir tão vulnerável

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perto dele. — Vou deixar bem claro para seu filho que estou partindo amanhã... Claro, não a ponto de até parecer rude. Isso o satisfaz? — Sim. Quer uma carona até o seu hotel? Jacquie ficou séria. Não queria aceitar, mas a lembrança da dor nos pés era terrível. Portanto, aceitou. — Se eu não estiver atrapalhando você — disse, sorrindo, como se estivesse diante de uma amiga. Depois de conseguir o que queria, Choya Barnett pareceu achar que não era mais necessário manter a conversa. A pequena viagem foi feita em silêncio, o que permitiu a Jacquie admirar dissimuladamente o corpo excitante e musculoso do homem que insistia em demonstrar que ela nada significava para ele. Jacquie chegou ao hotel nervosa e impaciente. Sentiu que não aguentaria ficar ali por muito tempo. Que Choya se danasse! Ela iria dar uma volta pela cidade! Colocou os óculos, pegou a bolsa e saiu. Carregando um mapa dos edifícios históricos, caminhou pelas ruas, parando diante de alguns lugares que estavam abertos. Quando viu Robbie caminhando pela outra calçada, entrou logo num edifício, antes que ele a visse. Mas, na verdade, teria gostado da companhia do garotinho... Simpatizava e, de certa forma, se identificava com ele. Sabia muito bem o que era a solidão de filho único. No fim da tarde, Jacquie sentiu fome e procurou o restaurante da rua Allen. Seu coração bateu mais forte quando ouviu as muletas batendo no chão, às suas costas. — Jacquie! — ela ouviu Robbie dizendo, ansioso. — Espere! Mordeu os lábios e resolveu ignorá-lo, mas viu que não ia adiantar. Ele estava perto demais. Ela virou-se, sorrindo. — Olá, Robbie — cumprimentou, procurando não parecer muito entusiasmada. — Como vai? — Bem. Eu estava imaginando se não iria ver você hoje. Por onde andou? — Fiquei no hotel, a maior parte do tempo — mentiu. — Fazendo o quê? — Descansando. Vou dirigir muito amanhã. — Tinha que manter a promessa, por isso falava na viagem. — Tem mesmo de ir embora? — Robbie perguntou, com ar triste. — Claro! — Jacquie riu, procurando ignorar o desânimo que surgira no rosto dele. — Eu nem estaria aqui, se não fosse o problema do meu carro. Preciso ir para Los Angeles. — Por quê? Era uma boa pergunta. Jacquie deu de ombros, indiferente. — Porque sim. Só isso. — Precisava mudar de assunto. — Onde está o seu pai? — Na reunião. Acho que ele vai vir logo. — Bem, é melhor você esperar aqui, por ele — disse ela, virando-se. — Aonde você vai? — Jacquie ouviu que as muletas a seguiam.

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— Comer alguma coisa. — Posso ir junto? — Acho que não é uma boa idéia. Como seu pai vai saber onde você está? — Ele sempre me encontra! — Robbie respondeu, cheio de certeza. Depois, olhou-a, hesitante. — Estou incomodando você? Papai diz que incomodo as pessoas que não me querem por perto. Jacquie já estava vendo Robbie se proteger contra a rejeição. De repente, ele estava procurando nela sinais de que não era apreciado. Olhando com ternura para o menino, disse: — Claro que não está me incomodando! — Ela sorriu. — Gosto de você, Robbie. Só que não quero que tenha problemas com seu pai, por ter vindo à lanchonete comigo. Se você acha que ele não se importa, então venha e tome um milk shake. Está bem? — Jacquie pensou que Choya podia ficar tão zangado quanto quisesse por ela ter quebrado a promessa. — Um milk shake de banana! — Robbie falou, quase gritando. E os dois entraram juntos na lanchonete.

CAPÍTULO IV Robbie tomou o milk shake fazendo um barulhão com o canudo. A porta da lanchonete se abriu. Robbie continuou com o canudo na boca, mas a expressão de seu rosto mudou, ao ver quem entrava. Jacquie ficou tensa, levantou levemente o queixo e ouviu passos se aproximando. — Alô, como vai? — ela disse, fingindo surpresa. — Srta. Grey... — Choya respondeu friamente. — Alô, papai — Robbie falou, alegre —, eu estava só fazendo companhia a Jacquie. — Entendo — ele continuou de pé e Robbie se mexeu, nervoso. A força de vontade de Jacquie estava desaparecendo. Choya pegou as muletas e estendeu para o filho. — Pode ir para o jipe. Estarei lá daqui a pouco. — Sim, senhor... — Robbie nem olhou para Jacquie. Pegou as muletas e saiu. Ela ficou ressentida, mas procurou não demonstrar nada. Disfarçou, pegando a bolsa. Depois, procurou o dinheiro, levantou-se e ia passar por Choya como se ele nem estivesse ali. — Você sempre quebra suas promessas, moça? — ele a acusou, em voz baixa. — Sim! — ela disse, sabendo que receberia troco. Caminhando para porta, continuou, no mesmo tom insolente: — Principalmente quando um garotinho me pergunta se está me incomodando porque se sente solitário. E, para a sua informação, eu só o encontrei quando vinha para a lanchonete. Não estive com ele a tarde toda. — Algumas vezes é melhor ser cruel. Eu pensei que já lhe tivesse explicado isso! — Para você deve ser muito fácil. — Ela falava cada vez com mais raiva. — Nota-se que a

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crueldade faz parte de sua personalidade. Ele a segurou com força pelo pulso e puxou-a para si. Jacquie estava para descobrir se tinha sido correta a sua afirmação, mas não tinha fechado a bolsa e, quando ele a puxou, suas coisas se espalharam sobre a calçada. — Olhe o que você fez! — exclamou, aproveitando a oportunidade do acidente para expressar sua raiva. — Você é um bruto, um selvagem, um... — É melhor pegar suas coisas, moça! — Você bem que podia ajudar! — ela disse, ainda com raiva. Depois desejou não ter dito nada. Choya se curvou ao lado dela e começou a jogar tudo dentro da bolsa, sem a menor cerimônia e sem se importar em arrumar nada. Ao vê-lo a seu lado, o coração dela começou a bater. Jacquie reuniu todas as suas forças para disfarçar a atração violenta que sentia por aquele homem. — Quer uma carona para o hotel? — Robbie perguntou, para agradá-la. Jacquie sacudiu a cabeça, recusando-se a olhar para o pai dele. — Não, obrigada. Não vou voltar agora. Ela não queria ir com Choya. Naquele horário, só tinha o saloon para ir, mas não se sentia com coragem de entrar num bar estranho, sozinha. Caminharia, sem pressa, para o hotel. — Até logo, Robbie. — Ela estendeu a mão para o garoto. — Cuide-se, hein... Ele a apertou solenemente e em seus olhos castanhos surgiu um brilho de preocupação, mas não de lágrimas. — Até logo, Jacquie. Ela levantou o olhar e encarou o pai dele. — Até logo, Sr. Barnett. — Não ofereceu a mão a ele. — Foi uma boa experiência ter lhe dado uma trombada. Ele sorriu, mas não respondeu à brincadeira dela. — Até logo, Jacqueline. Choya ajudou Robbie a entrar no jipe e Jacquie caminhou pela calçada, na direção oposta ao seu hotel. Ia fingir que estava interessada na vitrine da esquina, até que ele fosse embora. Quando o jipe desapareceu, ela se sentiu estranhamente solitária. O sol estava batendo nos telhados do outro lado e, suspirando sem saber o motivo, começou a caminhar para o hotel. No dia seguinte ia embora e tudo aquilo se transformaria apenas numa história que ela poderia contar em alguma festa. Naquela noite, Jacquie dormiu pesadamente e só acordou às oito da manhã. Tomou um banho rápido, vestiu-se, fechou a maleta e a deixou ao lado da porta, para poder pegá-la quando voltasse com o carro. Colocou a bolsa e foi para o posto de gasolina. O jeans justo modelava muito bem o seu corpo. O bustiê de crochê azul-marinho realçava as formas de seu busto.

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No curto caminho até o mecânico, dois carros pararam para lhe oferecer carona, mas Jacquie recusou. Não gostava de caronas, não se sentia segura. Ao atravessar a estrada em direção à garagem, viu o mecânico ao lado das bombas de gasolina. — Oi! Meu carro está pronto? — Sim. Prontinho. Parece até um carro novo. — Espero que não custe tanto quanto um novo. — Jacquie riu, seguindo-o até o escritório. — Eu não poderia pagar. O homem pegou uma conta sobre a mesa. — Vou tentar ser o mais justo possível — respondeu. O boné do homem estava puxado para baixo, escondendo seus olhos. Apesar disso, Jacquie podia sentir o olhar dele sobre o seu corpo, enquanto ela estava analisando a conta. Já se acostumara com aquele tipo de olhar e não se sentia insultada. Não havia perigo algum nos olhares e pensamentos e ela sabia como lidar com os que não se contentavam com isso... — Parece que está certo. — Respirou fundo, olhando o papel. Na verdade, o total não estava tão alto quanto o orçamento que ele apresentara. — Eu pensei que o trabalho fosse ficar mais caro — o mecânico explicou, sorrindo. — Nunca trabalhei naquele modelo antes e não sabia quanto tempo ia levar. — Agradeço sua honestidade. Ela tirou a bolsa do ombro e abriu-a. Não tinha se importado em arrumar o conteúdo, depois que tudo caíra na calçada, na tarde anterior. Começou a procurar a carteira com o dinheiro. — Este é o problema com estas bolsas grandes. — Ela sorriu. — A gente guarda tanta coisa, que nunca acha o que precisa... O mecânico a olhou, compreensivo, parecendo disposto a esperar o dia todo. Jacquie sentiu um arrepio de medo, quando, depois de revirar tudo, não encontrou a carteira. Sorriu, nervosa, e começou a tirar as coisas. Ao revistar o fundo da bolsa, não encontrou o dinheiro. — Não pode ser! — disse, num tom de pânico,e começou a revirar as coisas que tinha colocado sobre a mesa. Não encontrou a carteira. Passou as mãos pelos cabelos e olhou para o mecânico. — Minha carteira desapareceu! Todos os meus cartões de crédito, minha identidade, tudo! — Vai ver, esqueceu em algum lugar... — Não esqueci. — Sacudiu a cabeça, hesitante. — Posso usar o seu telefone? — Naturalmente. Fique à vontade. Jacquie telefonou para a lanchonete onde tinha ido à tarde e perguntou se haviam encontrado a carteira. Diante da resposta negativa, explicou que tinha deixado cair o conteúdo da bolsa na calçada e pediu que alguém fosse dar uma olhada, para ver se a carteira ainda estava lá. Depois de esperar alguns segundos, recebeu outra resposta negativa. Telefonou para a polícia e lhe disseram que ninguém havia devolvido nenhuma carteira. Quando desligou, procurava desesperadamente uma solução. O que poderia fazer, sem dinheiro? — Talvez, tenha esquecido no hotel... — disse o mecânico, pensativo.

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— Não. — Jacquie suspirou. — Arrumei tudo, antes de sair. Se estivesse lá, eu a teria encontrado. — Gostaria de poder fazer alguma coisa — o mecânico disse, num tom de simpatia. — Talvez, você possa. Preciso do meu carro. — Bem... — Ele olhou a conta sobre a mesa. — Eu pago tudo. Prometo — Jacquie afirmou. — Assim que eu encontrar um emprego, pago até o último centavo. O homem não estava querendo concordar. — Sou honesta. — Ela sorriu. — Preciso do meu carro e você tem de confiar e acreditar que pagarei a minha conta. — Srta. Grey, eu... não sei se posso. Esta garagem é pequena e não posso me responsabilizar pelo seu pagamento. — Eu sei. — Aproximou-se e colocou a mão no braço dele. — Mas preciso mesmo do carro. Apertou levemente o braço dele, procurando fazê-lo entender que era o único no mundo a quem podia pedir ajuda. Ele engoliu em seco, observando os lábios dela. Jacquie sentiu que o homem enfraquecia. — Farei qualquer coisa — disse ela, colocando uma certa ênfase na última palavra. O homem começou a enrubescer. Depois desviou os olhos dela, em seguida olhou para os seios da moça, depois para a conta. Pigarreou, nervoso, e Jacquie soube que tinha vencido a batalha. Até que uma voz baixa a fez voltar à realidade. — Ouvi uma frase muito sugestiva. Qual é o problema, Srta. Grey? Ao identificar a voz de Choya Barnett, Jacquie fechou os olhos, mas não se virou. O mecânico se afastou dela, encabulado. — Bem, Choya — o homem disse, nervoso —, eu não pensei que você viesse à cidade hoje. — Tive de trazer Robbie ao médico e depois levá-lo à escola — explicou, mas Jacquie sentia que o olhar dele estava em suas costas. — Qual é o problema, aqui? — A Srta. Grey perdeu a carteira, ou foi roubada. Ela não tem dinheiro... Jacquie respirou fundo. Como conseguia estar sempre na pior situação, diante de Choya? Sacudiu a cabeça e o encarou. — Eu estava com a carteira na lanchonete — disse, procurando parecer calma —, mas, se você se lembra, tudo o que estava na bolsa caiu na calçada, quando eu saí. Acho que a carteira ficou lá e alguém que a encontrou preferiu não devolver. — Já telefonou para a lanchonete? — perguntou ele, em tom de quem não acreditava em nada daquilo. — Telefonei. E também para a polícia — Jacquie respondeu depressa. — Não esqueceu a carteira no hotel? — Ele parecia acreditar que ela havia esquecido a carteira de propósito, só para arranjar um jeito de não pagar o conserto do carro. — Não, não esqueci.

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— Talvez seja melhor voltar lá e verificar — Choya Barnett sugeriu, num tom arrogante. — Então, vamos ver — disse, furiosa, guardando as coisas dentro da bolsa. Como ele se atrevia a acusá-la de mentirosa? Jacquie sorriu docemente para o mecânico. Ficou satisfeita ao ver o olhar aborrecido de Choya. Se ele ia classificá-la de vagabunda, poderia muito bem começar a agir como uma. Não iria desapontar o autoritário Choya Barnett. — Minha carteira não está no hotel — ela declarou, sentando-se ao lado dele, no jipe. — Não? Então você a escondeu em algum lugar, a caminho daqui? — Não! — Ela estava furiosa. — Eu a perdi mesmo! O olhar do homem continuou inalterado. Ele não acreditava nela. Começou a chorar, tão intensas eram as suas emoções. Choya entrou na estrada. — Não precisa se debulhar em lágrimas — disse ele —, não acredito nestas cenas de mulheres. — Eu sempre choro quando estou zangada! — Jacquie respondeu, engasgada. — Não ia desperdiçar minhas lágrimas tentando impressionar você. — Pelo menos, estamos nos entendendo... — Eu entendo você muito bem. É teimoso como uma mula! Espero estar por perto no dia em que você descobrir o quanto é idiota. — Pode ser que tenha mesmo perdido a carteira — ele disse secamente. — Isso não mudará minha opinião sobre você! Jacquie pensou numa centena de insultos, mas achou que nenhum penetraria na casca dele. O nome de cacto e o jeito de cacto! Ia ser uma boba, se deixasse que ele a espetasse. Ficou de boca fechada e, ao sair do jipe, entregou a chave do quarto para ele. Vou procurar me controlar e não chorar, pensava enquanto o seguia. Ele colocou a chave na fechadura e abriu a porta, dominando o ambiente com sua máscula presença. A cama, ainda desfeita, parecia sugerir uma intimidade que perturbou Jacquie. Ela parou na porta e cruzou os braços. — Procure bem, Sr. Barnett. Eu ajudaria, mas não quero que mais tarde me acuse de ter escondido a carteira. Choya fingiu não ouvi-la e começou a busca, enquanto ela apenas observava. O quarto quase não tinha mobília o trabalho dele terminou rápido. — Talvez queira olhar minha bagagem — Jacquie sugeriu, num tom gelado. — Eu posso ter escondido a carteira entre as minhas roupas. — Começo a achar que perdeu mesmo a carteira. — Só me restaram as três moedas que estavam no fundo da bolsa, as roupas e o carro... com uma conta da garagem. — Apertou os olhos para impedir as lágrimas. — Não tenho documentos, cartões de crédito, talão de cheques, nada, nada... — O acidente foi culpa sua. — Ele parou no meio do quarto, parecendo assumir o comando da

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situação. — Não pode me culpar pelos danos do seu carro. — Não estou fazendo isso. — Jacquie respirou fundo e se encostou na parede. — Tem família ou amigos, a quem você possa chamar? — Sim, tenho. — Mas ela preferia morrer de fome a voltar correndo para os pais, pedindo ajuda, depois de não conseguir se manter nem durante uma semana. — Então, sugiro que telefone para eles — Choya Barnett falou como se estivesse dando uma ordem. Jacquie passou a mão nos cabelos, sacudindo a cabeça. Não tinha gostado da sugestão e não queria dar aquele telefonema. Mas parecia a única solução. Sem dinheiro, como ia encontrar um lugar para dormir ou comprar comida? Suspirou e caminhou até o telefone, ao lado da cama. Sentiu-se uma estúpida e rezou para que a mãe atendesse. — Uma chamada a cobrar de onde? — A voz do pai soou do outro lado da linha. — Papai, sou eu, Jacquie — ela falou, mas a telefonista interrompeu, perguntando se ele aceitava o chamado a cobrar. — Não, não aceito de jeito nenhum! Ela não queria ir embora? Pois, se agora quer falar comigo, que, pelo menos, pague a chamada! — E o velho desligou, irritado. Jacquie agradeceu à telefonista e ficou olhando o aparelho, mordendo os lábios. Não podia reclamar. Afinal, tinha declarado sua independência e o pai estava zangado. Orgulhosamente, ergueu a cabeça e olhou para Choya. — Eles não aceitaram a chamada — informou, procurando adotar um ar despreocupado. A verdade era que estava magoada. Provavelmente tão magoada quanto os pais. — Não tem mais ninguém para quem ligar? Jacquie pensou na amiga Tammy, em Bisbee, mas Tammy era recém-casada e ela sabia que as finanças do casal não estavam boas. — Não. Não tem importância, eu dou um jeito. — Como? Que jeito? — Vou dar um jeito! — Como hoje, quando estava tentando um truque com Bob, para que ele a deixasse levar o carro sem pagar a conta. — Eu ia pagar! — Jacquie gritou, os olhos fuzilando de raiva. — Sim. — Ele sorriu, irônico. — Eu tinha me esquecido de que você prometeu qualquer coisa a ele. O que teria feito, se ele tivesse cobrado a promessa? — Eu saberia lidar com ele — Jacquie respondeu, confiante. — Já sabia lidar com estes tipos quando tinha doze anos. Sei tudo sobre os homens. Posso obrigá-los a agir da maneira que quiser... Ainda não confia em mim, não é? Continua achando que vou enganá-lo. Não devia, porque sempre pago minhas dívidas... Rapidamente, ela se aproximou dele. Colocou as mãos em seu peito, depois subiu para os

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ombros. Então abraçou-o pelo pescoço e encostou suas pernas suaves nas dele. Choya segurou-a pelos quadris, como se fosse empurrá-la, mas depois hesitou. Jacquie sorriu lentamente, sabendo que não tinha cometido um erro. Sabia o que se passava na mente dele. Mas desconfiava que estava caindo numa armadilha. Homens, ela pensou, se ao menos soubessem como é fácil manejá-los! — Está vendo como seria divertido, Choya? — Falou o nome dele num tom sedutor. Ouviu que ele respirava fundo. Jacquie acariciou-lhe o pescoço e, ficando nas pontas dos pés, beijou-lhe levemente os lábios. Depois, continuou beijando, até que sentiu os lábios dele se suavizarem. O perfume da colônia dele, aquela pele bronzeada, a masculinidade daquele corpo... o coração dela se acelerou, num ritmo primitivo. Apertou seu corpo contra o dele, descansando todo o seu peso sobre ele, e o sentiu tremer. Finalmente surgia a prova de que Choya não poderia resistir indefinidamente. O beijo dele se tornou mais profundo, mas a iniciativa ainda continuava sendo dela. Depois, quase arrependida, Jacquie afastou seus lábios dos dele, acariciando-lhe as costas. Com os olhos semifechados, ela via que ele continuava impassível, com um ar de indiferença no rosto. — Que tal, agradou-lhe a amostra? — Afastou-se dele, com os olhos brilhando de raiva. — Mas eu nunca vou procurar você, Choya Barnett! Ficou feliz ao notar a surpresa nos olhos dele. — Eu nunca vou pedir seu dinheiro, nem que você possua todas as riquezas do mundo! A sua opinião sobre mim, não é nada comparada à opinião que eu tenho de você! Acha que me conhece, não é? Mas, se me conhecesse, saberia que eu jamais aceitaria qualquer coisa de você! Choya limitou-se a olhá-la, sem dizer uma palavra. E Jacquie não pôde esconder sua surpresa. Tinha esperado uma resposta violenta aos seus insultos, até uma agressão física, mas nunca aquele silêncio. Não havia dúvida de que ele a considerava uma mulher qualquer e a cena de sedução que ela havia fingido, evidentemente, tinha ratificado sua opinião sobre ela. Por isso, Jacquie não se surpreenderia se ele a pegasse pelos cabelos e a atirasse na cama, no momento em que menos esperasse por isso...

CAPÍTULO V Mas Choya Barnett não foi para a cama, e sim para o telefone. Sem olhar para Jacquie, pegou o aparelho e discou um número. Ela ainda o olhava, assustada, quando ele se virou e a encarou. — Bob? Aqui é Choya. Quanto a Srta. Grey deve pelo conserto? Mande a conta para mim. Mais tarde irei pegar o carro dela. Jacquie abriu a boca para protestar, mas não conseguiu dizer nada. Viu-o desligando o telefone e

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sentiu-se trêmula, como se seus ossos estivessem virando geléia. — Você é cara, Jacquie — ele disse, em voz baixa, falando o nome dela num tom de insulto. — Vou precisar de tempo para que valha o meu dinheiro. Ela o olhou, furiosa, sentindo que havia caído numa armadilha. Choya sorriu, diante do ar apavorado dela. — Não pode estar falando sério... — Você mesma fez a proposta... — Não fiz proposta nenhuma! — Jacquie protestou, assustada. — Qual é o nome que você dá a isso? Suborno? — Choya perguntou. — Eu... eu disse... eu falei que nunca ia pedir nada a você. — Bem, eu só posso lhe dizer que este é o único meio de ter seu carro de volta. — Não pode ficar com ele! — Se eu ficar com ele, estarei agindo dentro da lei. — Ele sorriu. — O carro é meu até que você tenha pago a dívida. Caso não pague... ficarei com o carro. — Eu lhe mando o dinheiro. Juro que mando! — Jacquie engoliu em seco. Indiferente, ele continuou sorrindo. — Como eu já lhe disse, não confio em você. Só aceito pagamento adiantado. Quando pagar a conta, o carro voltará a ser seu. Não adiantava apelar mais. Jacquie procurou encontrar coragem. Enfiou as mãos nos bolsos e o encarou. — Está bem. Eu pago. Vou arranjar um emprego e pago tudo. A afirmativa dela pareceu não alterar a desconfiança dele. — Vai fazer o quê, aqui em Tombstone? A temporada de férias já terminou. Não há empregos... E onde vai dormir e comer, enquanto não recebe? Estou lhe oferecendo as duas coisas pelo mesmo preço que você teria de pagar a qualquer outro homem. — Há outras pessoas além dos homens, neste mundo! — Jacquie respondeu, quase sem fôlego. — Entretanto, os seus encantos femininos não vão funcionar com uma mulher — Choya lembrou. — O que pretende fazer com a conta do hotel? A gerente é mulher e acho que não vai tratá-la bem, se tentar escapar sem pagar. Aos olhos da lei, você é uma vadia, sem emprego, sem dinheiro, sem nada... — Tenho o meu carro. — Não. Eu tenho o seu carro — ele corrigiu, com frieza. — Não pode esperar que eu concorde. — Jacquie nem conseguia encontrar as palavras certas. Apenas sacudiu a cabeça, desolada. — Você sabe como me sinto a seu respeito. Como o odeio... — Odeia? Mas uma garota como você não pode dar-se ao luxo de odiar os homens! — Pare com isso! — Agora ela estava tremendo. — Você está simplesmente tentando me amedrontar. Não vai se atrever a me tocar. Os olhos castanho-dourados dele continuaram fixos no rosto de Jacquie. O impulso dela era se afastar, mas era isso que ele queria que fizesse. Queria intimidá-la, queria que se acovardasse, que

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humildemente implorasse piedade. Então, Jacquie ficou firme, recusando-se a acreditar que ele tivesse coragem de cumprir suas ameaças. Choya aproximou-se e parou diante dela. Levantou a mão e pegou seus cabelos. Jacqueline não se mexeu. Ela não ia lutar como o rato sob a pata do gato. Com os olhos quase fechados, ele a estudou calmamente. Depois agarrou firmemente os cabelos dela, fazendo com que curvasse a cabeça para trás. A necessidade de aliviar a dor fez com que Jacquie, instintivamente, se aproximasse dele. Com a outra mão, Choya segurou-lhe um dos seios. Jacquie ficou tensa, mas o orgulho impediu-a de lutar no último minuto. Não! Não iria lutar como um animal apavorado! Ele só podia estar brincando! Mas seu coração disparou, apavorado. Viu que os lábios dele se aproximavam e sentiu vontade de gritar. Não conseguiu. O beijo foi violento, quase uma mordida. Jacquie procurou ignorar o gosto de sangue na boca. A dor na cabeça tinha parado e ele agora a segurava pelo braço, com toda a força. Mais um pouco de pressão e, sem dúvida, poderia lhe quebrar os ossos. Jacquie sentiu que chamas dominavam seu corpo, parecendo que os músculos das coxas dele estavam queimando sua pele. Aquele beijo sufocante e o abraço estavam tirando suas forças. Levantou as mãos e procurou empurrar os braços dele. Não queria perder o controle. Choya deixou que respirasse e começou a beijá-la no pescoço e na garganta. Ela sentiu arrepios sensuais e percebeu que seus seios aumentavam dentro do bustiê justo. Ele pareceu ter percebido aquela resposta, pois voltou a beijá-la na boca, com tal exigência que ela, sem perceber, separou os lábios. De repente, a virilidade dele e a atração sexual dela se transformaram em algo superior às forças de Jacquie. Com um gemido, ela se entregou ao prazer daquelas carícias fortes e agressivas. Ele a levantou nos braços e ela o abraçou pelo pescoço. Perdida num mundo de abandono, Jacquie sentiu que flutuava numa nuvem em horizontes desconhecidos. Então, sentiu o colchão e os lençóis. Depois, os lábios de Choya. Sentiu o corpo másculo dele próximo ao seu. Depois seus olhos encontraram-se com os dele. Sua cabeça girava, seu corpo tremia e todas as suas preocupações perderam o sentido. O único sentido da vida era aquele corpo sobre o seu... — Era isso que você queria, não era? — Ele sorriu, demonstrando sua satisfação por ter destruído tão facilmente a resistência dela. De repente, a realidade surgiu. Jacquie sentiu o calor se espalhando em seu rosto. A mão dele pousou de modo familiar em sua coxa, quando saiu da cama. Não podia negar, e muito menos ignorar, as sensações provocadas pelo homem que ela queria odiar. Saindo, sem jeito, da cama, Jacquie procurou manter o orgulho. — Eu só estava vendo até onde você ia — ela disse, num tom sarcástico, mas sentindo a voz trêmula. — Estou surpresa que tenha parado tão depressa. — O melhor da festa é esperar por ela — Choya respondeu calmamente, observando seus

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movimentos desajeitados. Ela sentiu uma sensação de vazio no estômago. Sua pele ainda ansiava pelas carícias dele. — É aí que você se engana! Eu não tenho a intenção de concordar com suas propostas insultuosas. — Tem outra alternativa? — Oh, não se preocupe. — Respirou fundo. — Vou pagar a conta do meu carro. Vou para Tucson, procurar emprego lá. — Se sair de Tombstone sem mim — ele falou, divertido —, avisarei as autoridades que você tem o costume de fugir sem pagar as contas. — Isto é uma ameaça? — Não. É apenas um aviso. A tática que estava usando não tinha dado resultado, portanto, ela resolveu tentar outra. — Você deve ser um membro respeitável da comunidade. Como vai explicar a minha presença? — Meu pai está velho e é difícil para ele andar. Todos sabem que estive pensando em arranjar uma empregada. Ninguém ficará surpreso com a sua presença em minha casa — Choya respondeu, sem hesitar. — Na verdade, é só uma questão de tempo, antes que a história da perda da sua carteira comece a circular. Muita gente vai achar que estou fazendo uma boa ação em contratar você. Ela riu, amargurada. — Pensa mesmo que as pessoas vão acreditar que sou sua empregada? — Não me interessa o que os outros pensam. De qualquer forma, nada abalará minha reputação. Não se esqueça de que as pessoas admiram os homens malandros. — E o que acha que vão pensar de mim? — Vão achar que você é uma jovem que aceitou um emprego na minha casa para ganhar algum dinheiro. Se suspeitarem de algo além disso, não dirão nada. Jacquie não tinha mais argumentos. Ele a colocara numa armadilha e aceitar isso parecia ser sua única saída. Ela entrou em pânico. Nunca imaginara-se dentro de uma confusão tão grande. — Não posso... — Sacudiu a cabeça, desesperada. — Mas não tem outra escolha — ele respondeu, com firmeza. — Pense que isso não durará para sempre e tudo ficará mais fácil para você. Jacquie virou-se, com as mãos na cintura. Queria pensar em alguma coisa. — E Robbie? — indagou. — Lembre-se de que não queria que seu filho ficasse ligado a mim. Considere o que vai acontecer, se eu for morar na mesma casa que ele. — Talvez até faça bem ao garoto — Choya respondeu, como se já tivesse pensado em todos os aspectos da situação. — Se ele descobrir o que você é na verdade, talvez acabe com aquelas criancices. Estou pronto para correr o risco. Jacquie o encarava, tentando controlar o desespero. Será que não havia mais nada a fazer? Será que ele não ia mesmo mudar de idéia? Se ao menos pudesse retirar as palavras que dissera... que era capaz de lidar com qualquer homem. Certamente nunca tinha conhecido ninguém como Choya Barnett,

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senão jamais faria aquele comentário idiota. — Espere aqui — ele ordenou —, voltarei dentro de poucos minutos. Ela ainda estava procurando uma solução para o seu problema e nem percebeu que ele havia saído. Quando olhou a porta, não entendeu. O que ele ia fazer? O que estaria fazendo? Por que a tinha deixado ali? Correu para a janela e olhou. O jipe estava estacionado lá fora, mas Choya não estava por perto. Depois de alguns segundos, percebeu que ele caminhava no vestíbulo do hotel. Ele devia ter interpretado o silêncio dela como um consentimento à proposta. Então, fora pagar a conta do hotel. Jacquie olhou para o jipe, sentindo que um plano perigoso se formava em sua mente. Impetuosamente, pegou a maleta, a bolsa e olhou novamente para a janela. Choya tinha desaparecido. Ela pegou todas as suas coisas, saiu correndo do quarto e pulou dentro do jipe. Parecia uma troca justa... seu carro pelo jipe dele. Procurou a chave. Não estava lá. Mordendo os lábios, rezou, procurando lembrar-se do que um dos namorados lhe havia dito sobre ligação direta. Afundou a cabeça na direção. — Tentativa de roubo — Choya disse, num tom debochado. Jacquie bateu com a cabeça na direção. Depois olhou, furiosa, para ele, esfregando o local da batida. Ele enfiou a mão no bolso e pegou as chaves. — Passe para o outro banco — ordenou. Jacquie ficou onde estava. A expressão dele pareceu mais dura, impaciente. Choya empurrou-a para o banco do lado. Ela teria saído correndo pela outra porta, mas ele a segurou com força pelo pulso, mantendo-a dentro do jipe. — Isto é um rapto — ela acusou, em voz baixa. — É mesmo? — ele perguntou friamente, sorrindo cinicamente. — Você sabe que é! — respondeu, lutando para controlar as lágrimas de raiva. — Eu não quero ir. Você está me levando contra a minha vontade! Posso mandar você para a cadeia, pelo resto da vida, por causa disso! — Pode? Tente! — Se você não largar o meu pulso,vou gritar. Vou gritar tão alto que a cidade inteira virá aqui! Então, eu direi a todo mundo o que você está fazendo! — Ninguém vai acreditar em você. Não depois que eu paguei a conta do seu carro e a conta do hotel, porque teve a má sorte de perder a carteira. Eles ficarão espantados por você ser tão ingrata, depois de tudo o que eu fiz. — Vão acreditar em mim quando eu contar sobre o modo como você quer que eu pague. — São só palavras. Sem nenhuma prova. Você não pode dizer que a violentei porque eu não toquei em você. Pode dizer que planejei fazer isso, mas será a sua palavra contra a minha. E em quem você acha que eles vão acreditar? Jacquie sacudiu a cabeça, afastando os cabelos do rosto. Claro que ele tinha razão! Ela era uma estranha, e ele, um membro da comunidade, conhecido e respeitado... Estava perdida!

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Choya continuou segurando o pulso dela e deu a partida no jipe, dirigindo com a mão esquerda e saindo do estacionamento. Só quando o carro entrou na estrada de terra que conduzia às montanhas, ele a largou. Esfregando o pulso dolorido, Jacquie observou a paisagem desolada, que dava para ser vista através da nuvem de poeira levantada pelo jipe. Não... aquilo não podia estar acontecendo com ela! Era um pesadelo, tinha que ser! A estrada era cheia de curvas e contornava o pé da montanha. Aqui e ali, ao longo da subida, havia restos de minas abandonadas. De Vez em quando, Jacquie via as ruínas de algumas construções e estradinhas que saíam da estrada principal. Às vezes surgia uma porteira ou uma placa num poste, com o nome de alguma fazenda. Mas, a maior parte do tempo, a paisagem era desértica, com cactos e pedras queimando ao sol. E poeira. A poeira entrava no jipe, jogando uma camada amarela sobre tudo. Ela sentia a poeira no rosto e nas roupas. Teve vontade de perguntar quanto tempo ainda faltava para chegar, mas não queria ser a primeira a quebrar o silêncio. Quando vira as Montanhas Dragão, lá do cemitério, não imaginara que a distância fosse tão grande. Agora, percebia que a fazenda de Choya ficava a quilômetros da civilização. Não havia esperanças de escapar de lá a pé. Aquela região montanhosa faria com que qualquer um se perdesse em poucos de minutos. O jipe sacudiu mais um pouco, saiu da estrada e entrou num atalho. Jacquie sabia que Choya a estava levando para uma prisão que não precisava de grades. Pela primeira vez, na vida, praguejou contra a sua impetuosidade. Quando parecia não haver mais nada no horizonte, a não ser pedras do deserto, uma grande construção apareceu. Era uma casa, baixa e ampla, com um enorme telhado e paredes brancas. Duas árvores bem grandes faziam sombra no lado oeste da casa. Vários cactos e sempre-vivas decoravam a entrada. Mas, não havia nenhum gramado ali, apenas a areia do deserto. Por estranho que parecesse, Jacquie descobriu que gostava daquela paisagem. A grama não ia combinar com o resto do cenário. Estava gostando daquele lugar, que ia ser sua prisão até Choya resolver que a dívida tinha sido paga. O jipe parou diante da casa e a poeira se espalhou por todos os lados. Jacquie começou a tossir. O pó ajudou sua voz a se tornar ainda mais amarga. — Como você pode viver neste buraco? — exclamou, rouca. Choya não tomou conhecimento do comentário. Saiu do jipe, pegou a maleta e a mala. Depois, jogou a maleta para ela, que mal teve tempo de pegar, antes que o conteúdo se espalhasse. — Entre! — ele ordenou, ríspido. — Não! — Jacquie não ia entrar naquela casa como um humilde carneirinho. Ele a olhou, com desprezo. — Espera que eu a carregue no colo, como uma noiva virgem? — Não. Eu pensei que você fosse me arrastar pelos cabelos como um bárbaro selvagem, que é o

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que você é! — Agarrou com força a bolsa, que parecia ser a única arma que tinha, além das palavras venenosas. — Se fizer questão... Posso muito bem agir assim. Mas, eu iria danificar o produto antes de usálo. Ela sentiu um calor infernal subindo por seu corpo. — Você é revoltante! — gritou, afastando-se do jipe. — Sou revoltante, não é? — ele perguntou, rindo, e depois beijou seu pescoço. Antes que Jacquie fizesse a tentativa de empurrá-lo, ele já a tinha largado. Furiosa, ela passou a mão no local em que os lábios dele haviam tocado e lançou-lhe um olhar cheio de ódio. Choya observou aquelas reações e sorriu, satisfeito. A porta da frente da casa se abriu e Jacquie viu um homem alto, de pé nas sombras. Seu rosto angular não parecia demonstrar a passagem dos anos, mas estava com os ombros um pouco curvados. Ao redor dos olhos azuis bem claros, ele tinha uma porção de rugas. Choya virou-se, ao ouvir o barulho da porta. Estava agora segurando Jacquie pelo cotovelo e empurrando-a para a frente. O homem da porta a olhou demoradamente. — Sam, esta é Jacqueline Grey — disse Choya calmamente, ao parar diante do outro. — Ela vai cuidar da casa para nós, durante algum tempo. Jacquie, este é o meu pai, Sam Barnett. A não ser pelo tipo de pele bronzeada, não havia nada no velho que fosse parecido com o filho autoritário. Ela lembrou do mecânico dizendo que Sam Barnett tinha encontrado Choya com um dia de vida, abandonado perto de um pé de cacto, e mais tarde o adotara legalmente. Havia um certo ar de honestidade no velho, que trouxe um pouco de esperança a Jacquie. Ela procurou sorrir, enquanto o observava. — Isso não é verdade, Sr. Barnett. O seu filho me quer aqui por outros motivos. Sam Barnett a olhou de cima a baixo, com malícia. — Ele não seria um homem, se não quisesse! — Sorriu. — Se eu fosse quarenta anos mais jovem... diabos, se eu fosse vinte anos mais jovem, estaria correndo atrás de você. — Ficou sério, diante do olhar de Jacquie. — Desculpe a minha linguagem, moça. Estou acostumado a conversar só com homens. Tento controlar as palavras enquanto estou perto do menino. — Olhou-a mais atentamente. — Você não é daqui, é? — Não. — Ela sacudiu a cabeça, sentindo-se completamente abandonada. — Jacquie é do Texas — Choya informou. — Ela estava em Tombstone, consertando o carro, quando perdeu todo o seu dinheiro. Vai trabalhar aqui temporariamente, até ganhar o suficiente para pagar a conta do mecânico e continuar viagem. Aquilo parecia simples, fácil de ser acreditado. Se ela quisesse denunciar Choya, todos iam acreditar na história dele. — Bem. — Sam Barnett respirou fundo. — Acho que é melhor começar a varrer o quarto atrás da cozinha. Temos lençóis limpos no armário. Travesseiro no quarto de Robbie. As últimas palavras foram ditas em voz baixa, como se as dissesse para si mesmo. Depois, ele

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virou-se com dificuldade, caminhando apoiado numa bengala. Choya empurrou Jacquie para dentro da casa. Ela entrou na sala de visitas decorada com austeridade. Havia uma lareira enorme numa das paredes. O sofá estava coberto com um tapete navajo, que dava o único colorido à sala. Havia duas poltronas grandes, um banquinho e um abajur. Junto à outra parede, uma escrivaninha e várias estantes de livros, que iam do chão ao teto. O piso de carvalho brilhava suavemente. Para uma casa só de homens, parecia muito limpa e arrumada. Um corredor largo e branco saía do lado esquerdo da sala de visitas e Choya indicou a Jacquie que seguisse o seu pai por ali. O corredor conduzia à cozinha. Ali havia uma mesa grande, coberta com uma toalha xadrez vermelha e branca. Dois guardalouças e uma pia de porcelana ocupavam uma das paredes. A geladeira era moderna, mas o fogão a gás era dos mais antigos. O chão tinha sido coberto com um tapete de borracha. Entre a cozinha e a porta dos fundos, havia outra porta. Diante dela, Sam Barnett parou, apoiouse na bengala e a abriu, esperando Jacquie. — Seu quarto não é grande, mas é independente do resto da casa. Essa informação fez Jacquie olhar de lado, para Choya, pensando no fracasso dos planos dele. Mas nada, no rosto dele demonstrou que estava aborrecido com a localização do quarto dela. Com o coração diminuído, ela admitiu que ele poderia ver isso como uma vantagem. Ninguém ouviria nenhum barulho. O quarto era pequeno. A cama de casal ficava num canto. Havia uma cômoda com várias gavetas, um armário de metal e uma cadeira. Um tapete simples, amarelo, no chão diante da cama. Choya entrou e colocou a mala dela na cama. — Pode desfazer a mala — ele disse —, eu trarei o resto das suas coisas, esta tarde, quando pegar o seu carro. — Depois virou-se para o velho: — Não estarei em casa para o almoço, Sam. O outro entendeu e caminhou até a porta. Jacquie ficou tensa. Estava preocupada porque parecia que Choya ia ficar a sós com ela. Resolveu que era melhor atacar antes dele. — Está esperando que eu faça todo o trabalho da casa? — Há alguma coisa de errado nisso? — Você é nojento! — Nojento, revoltante... Será que não consegue pensar em palavras mais originais? — Ele sorriu friamente. — Agora, vou para a cidade. Se estiver pensando em fugir enquanto eu estou fora, já vou lhe avisar para esquecer isso. Eu a encontro facilmente, quando voltar. — Eu desprezo você — Jacquie murmurou, imaginando que só podia estar louca, quando achara alguma coisa atraente naquele selvagem. — Por quê? Porque durante todos estes anos mandou nas pessoas e, agora, terá que aprender a obedecer? Com aquela pergunta, ele saiu, deixando Jacquie sozinha e trêmula de ódio.

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CAPÍTULO VI Jacquie olhou para a mala, desesperada. Se tentasse fugir, ele iria atrás dela. Precisava tentar, mas como? Sam Barnett chegou mancando, na porta do quarto. Agora, ao invés da bengala, ele estava se apoiando numa vassoura. Apesar da raiva, incomodou-a ver o velho varrendo desajeitadamente o quarto. — Deixe. Eu faço isso — disse ela, com simpatia na voz. O velho hesitou, depois estendeu a vassoura para ela. — Sempre varri a casa. Vai parecer estranho ver outra pessoa varrendo... Na verdade, a esposa de Choya... ela morreu há muitos anos... deixava a maior parte do trabalho caseiro para mim. E minha Gladys já morreu há mais de trinta e seis anos. Esta casa não teve nenhuma mulher que cuidasse dela, depois disso. E eu não posso cuidar como gostaria. — É uma casa muito bonita! — Jacquie queria mesmo era dizer que estava sendo mantida ali como prisioneira, mas de que ia adiantar? — Vou pegar os lençóis. — Sam Barnett saiu mancando, equilibrando-se com as mãos nas paredes. Jacquie ficou em silêncio alguns segundos, depois começou a varrer. Já tinha acabado e estava começando a desfazer as malas quando Sam voltou com os lençóis. Ficou ali, contando sobre seu primeiro ano no rancho. E quanto mais ele falava, mais Jacquie se convencia de que Sam recebera ordens para não deixá-la sozinha. Quando terminou de arrumar a cama, ele lhe mostrou o resto da casa. Os quartos eram práticos e simples. Depois, voltaram à cozinha. Ele sugeriu um almoço frio, explicando que não costumava ter tanto apetite quanto antes. Jacquie sentiu-se aliviada. Estava com fome, mas duvidava que seu nervosismo aguentasse uma refeição pesada. Após o almoço, Sam se ofereceu para lavar a louça, mas, Jacquie recusou... não porque achasse que os homens não deviam fazer aquilo, mas porque esperava que o velho saísse da cozinha e ela pudesse pensar em silêncio. Mas ele ficou. Ela continuou a acreditar que ele estava executando ordens de Choya. Como poderia fugir, se o pai de Choya agia como um cão de guarda? Depois de terem terminado de lavar os pratos, Sam explicou os horários e tarefas da casa. Jacquie não prestou atenção, mas fingiu estar atenta. Estava com os nervos à flor da pele. Ouviu um veículo parando diante da casa e sentiu seu coração pular. Olhou para o relógio em cima da geladeira. Não podia ser tão tarde! — Deve ser Choya. — O velho virou-se e foi para a sala. Jacquie só queria sair voando dali, sem saber quem tinha chegado. Ouviu o barulho das muletas na sala e logo Robbie entrou na cozinha, sorrindo, maravilhado. — Jacquie! — Aproximou-se com a maior rapidez que as muletas possibilitavam. — Papai falou que você estava aqui, mas nem acreditei. Estou contente porque você não foi embora!

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Certa de que Robbie ia cair, ela levantou-se e o tomou nos braços. Ele atirou-se a ela, jogando as muletas para o lado e lhe dando um abraço apertado. Era um abraço tão sincero que Jacquie teve de corresponder. Sentiu, então, que o medo ia aos poucos diminuindo. — Papai disse que você vai ficar, é verdade? Ela parou de sorrir colocou-o no chão e agachou-se junto dele. Como podia dizer àquele garotinho que estava ansiosa para sair da casa dele? — Só... só um pouquinho — ela respondeu, abraçada a ele. O menino percebeu a relutância de Jacquie, porque a abraçou mais forte e com um gesto de desespero, afundou o rosto no ombro dela. — Espero que fique para sempre — disse, quase chorando. Jacquie acariciou-lhe a cabeça e beijou-o. Ela se sentia atraída por aquele menino, do mesmo modo que se sentia atraída pelo pai dele. Sentiu um nó na garganta. Pelo canto do olho, percebeu um vulto perto da porta da sala. Era Choya. Nada no rosto dele revelava seus pensamentos. Nada indicava há quanto tempo ele estava ali, nem o que havia escutado da conversa dos dois. Perturbada ao descobrir a presença dele, Jacquie lentamente tirou os braços de Robbie do seu pescoço. Depois segurou-o pela cintura, enquanto pegava as muletas. Procurou ignorar Choya, mesmo percebendo que era difícil, e sorriu para o menino. — Você já viu o meu quarto? — Robbie perguntou, ansioso. — Tenho uma porção de flechas de índios. Vovô e eu colecionamos flechas. Venha comigo. — Claro — Jacquie concordou, com voz fraca. — E eu quero mostrar o meu cavalo também. Tenho um cavalo só meu — disse, orgulhoso e animado. — Ninguém mais pode montar nele. Só eu. Mas, deixo você montar, se quiser... Você sabe andar a cavalo, Jacquie? — Não muito bem. — Ela lembrou-se de que só tinha montado poucas vezes, quando passara férias na fazenda de um amigo. — Eu ensino você. — Ele se afirmou nas muletas. — Venha, vou mostrar o cavalo. O nome dele é Apache. Tudo isso aqui era terra dos apaches, você sabia? — Sim, sabia, Robbie. — Deixe o passeio para depois, filho. Precisa trocar a roupa da escola e fazer as lições. Robbie olhou rapidamente para o pai e virou-se para Jacquie. — Vamos nos divertir muito! Depois que eu tirar o gesso, vamos andar a cavalo juntos. Há um lugar perto da nascente, onde deve ter havido uma batalha... foi lá que vovô e eu encontramos as flechas. Podemos nadar e fazer um piquenique e... — Robbie! — A voz forte de Choya interrompeu o filho. — Jacquie não veio aqui para brincar com você. Jacquie ficou furiosa, endireitou-se e, com os olhos brilhando de raiva, encarou-o. — Você se esqueceu de contar a Robbie que me trouxe aqui para brincar com você? — ela

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perguntou, em tom de desafio. Choya ficou ainda mais carrancudo. Confuso com a repentina amargura de Jacquie, Robbie olhou espantado para o pai. O silêncio foi quebrado pela risada de Sam Barnett. — Eu pensei que a garota não tivesse nenhum senso de humor. — Os olhos dele brilharam, quando sorriu para Choya. — Sabe que ela mal conversou comigo, desde que você saiu? O rosto de Choya agora parecia mais relaxado e um brilho divertido surgira em seus olhos. Observou Jacquie, antes de falar com o filho. — Vá trocar de roupa, Robbie. — O que Jacquie quis dizer? — Robbie perguntou, hesitante. — Nada que seja da sua conta — foi a resposta calma. — Depois Jacquie conversa com você, filho. O garoto pareceu ficar satisfeito. Com um sorriso, saiu da cozinha e foi para o quarto. Sam Barnett pegou a bengala e levantou-se da cadeira. — Eu não cochilei à tarde. Acho que vou me deitar por uma hora, antes do jantar. Jacquie ficou, ostentando aquele ar de desafio. Não queria deixar cair nem um centímetro da barreira que tinha levantado diante de Choya. — Não disse ao seu pai o modo pelo qual pretende me obrigar a pagar a dívida? — Não! — Ele caminhou calmamente pela cozinha. — Quer que eu conte? — Claro que não! — Jacquie cruzou os braços. — Então, por que perguntou? — Porque ele não me deixou sozinha nem um segundo. — Se ele tivesse deixado, o que você teria feito? — Teria fugido! — Mesmo sabendo que eu iria atrás de você? — Isso me faria fugir ainda mais depressa. — Jacquie sacudiu a cabeça, olhando para uma das paredes, mas notando que ele estava atrás dela. Sentiu a respiração dele e a sua própria acelerar. Choya segurou-a pelo braço e puxou-a para si. Jacquie virou-se, obediente, mas sua outra mão ergueu-se na direção do rosto dele. Não atingiu o alvo. Os reflexos dele foram mais rápidos e ele seguroulhe a mão no ar. Brutalmente, virou-lhe o braço para trás, fazendo com que o corpo dela se aproximasse mais do seu. Vendo o brilho de medo nos olhos azuis, disse baixinho: — Está com medo de que eu resolva fazer amor com você? — Ele sorriu. — Esperar pela festa, lembra-se? Eu vou gostar de esperar e ver você imaginando se será esta noite, ou amanhã, ou depois de amanhã, ou se vai demorar mais. Jacquie respirou fundo e ele a soltou tão rápido quanto a tinha segurado. A punição ia ser psicológica e física e ela não podia fazer nada. Antes que Choya mudasse de idéia, Jacquie saiu correndo da cozinha. Ele não a fez parar. Devia estar certo de que ela não tinha como fugir.

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Arrasada demais para ir longe, foi parar no quartinho atrás da cozinha. Não havia chave na porta. Colocou a cadeira atrás, debaixo do trinco. Ao se afastar, ouviu que batiam à porta. — Vou fazer algumas coisas — Choya disse, sem mesmo tentar o trinco para ver se estava aberto. — Apronte o jantar dentro de uma hora. Ouviu os passos dele se afastando e a porta da frente batendo. Parou no meio do quarto, desesperada. Então, percebeu que o que ele queria era apavorá-la, para transformá-la numa pessoa nervosa e trêmula. Jacquie jurou para si mesma que ganharia aquela batalha. Nunca tinha curvado a cabeça para homem nenhum. Não seria Choya Barnett que iria conseguir isso dela. Diante de seu quarto ficava a lavanderia e um banheiro pequeno. Jacquie jogou água fria no rosto. Era daquilo que precisava para se acalmar. Foi depois para a cozinha. Afastou os pensamentos tristes e se concentrou no cardápio do jantar. Não era boa cozinheira e resolveu preparar coisas simples... costeletas assadas, batatas, verduras e uma salada. O fogão parecia estar contra ela, recusando-se a acender e não permitindo que ela controlasse o calor adequadamente. Finalmente, as batatas ficaram cozidas, as costeletas já estavam na travessa e as verduras prontas. Jacquie resolveu temperar a salada. Quando terminou de temperar, ouviu um ruído no fogão. Deu uma olhada rápida e viu a panela das batatas inclinada, enquanto a água fervendo escorria por um dos lados. No mesmo instante, viu fumaça saindo do forno. Pegou um pano e caminhou hesitante para o fogão, sem saber o que salvava primeiro. Resolveu salvar as batatas e inclinou-se para pegar a panela com um pano. Mas seus cabelos caíram para a frente. Uma porta bateu e ela ouviu passos. — O que está fazendo? — Choya Barnett, perguntou. Jacquie não desviou sua atenção da panela. — A água está escorrendo, não vê? — ela falou, irritada. Sentiu a mão forte segurá-la pela cintura, afastando-a do fogão. Choya soltou-a e pegou o pano da sua mão. Depois colocou a panela de lado. — Não sabe que pode incendiar o cabelo, curvando-se assim sobre o fogão? — Não pensei nisso. — Jacquie olhou para o forno. A fumaça ainda estava saindo de lá. — A carne! — exclamou. Choya virou-se, enrolou o pano na mão e retirou a travessa do forno. Apagou o fogo e depois usou um garfo para virar as costeletas, deixando para cima os lados queimados. O olhar que ele deu para Jacquie dizia tudo. — Eu nunca disse que sabia cozinhar. — Ela se defendeu daquela condenação silenciosa. Ele levantou a tampa da panela de batatas e um cheiro esquisito se espalhou pela cozinha. Jacquie passou a mão na testa. — Tudo o que você tinha a fazer era baixar o fogo — Choya disse secamente. — É fácil falar — disse ela, odiando as críticas dele —, mas, este fogão é muito antigo. Só minha

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avó sabe como funciona. — Sam nunca teve problemas com ele. — Isso prova que ele é tão velho quanto a minha avó — Jacquie respondeu. Um leve sorriso passou pelos lábios dele. — Venha aqui. Deixe mostrar como funciona. Ignorando o arrepio que lhe passava pela espinha ao parar perto dele, Jacquie escutou, atenta, às instruções. Ele falava com muita clareza e sorriu para ela quando terminou. — Veja o que pode salvar, enquanto lavo as mãos. — Vou tentar — ela disse, enfiando um garfo nas costeletas para ver se estavam muito torradas. Quando Choya saiu, sorrindo, Robbie entrou na cozinha. Ele parou e cheirou o ar, fazendo uma careta. — O que é isso? — perguntou, preocupado. — O jantar — Choya respondeu, dando uma olhada para Jacquie. — Ou talvez seja um jantar incendiado. — Viu-a enrubescer e deu uma gargalhada. — Vamos, filho, venha lavar as mãos. Definitivamente, aquela não era a melhor refeição que Jacquie tinha preparado, apesar de reconhecer que havia preparado poucas. Choya e Robbie não fizeram mais nenhum comentário, mas Sam olhou desanimado para as costeletas queimadas. O pior daquilo tudo foi que Jacquie teve de passar mais tempo limpando os pratos e o fogão. Quando Robbie entrou na cozinha, ela já tinha terminado. Ele trazia um tabuleiro de xadrez e a desafiou para um jogo. — Sou muito bom — afirmou e provou, começando logo a ganhar dela. Propôs um segundo jogo, mas Jacquie sugeriu que era hora de ele ir dormir. — Está bem — Robbie concordou, sem discutir. — Podemos jogar amanhã à noite. Não fique aborrecida se eu ganhar. Jogo xadrez desde os três anos. Papai me ensina... A pedido de Robbie, ela o colocou na cama. Depois, quando ia saindo do quarto, Choya chegou para dar boa-noite ao filho. Jacquie não saiu apressadamente. Estava resolvida a não correr dele. Ao entrar no próprio quarto, deu a si mesma os parabéns por ter conseguido dizer um boa-noite tão calmo a ele. Tinha sentido o olhar de Choya e sabia que, sem dúvida, ele estava avaliando sua autoconfiança. Despiu-se e entrou debaixo das cobertas, resolvida a dormir um pouquinho e sair da casa no meio da noite. No momento em que sua cabeça tocou no travesseiro, adormeceu. O cansaço não permitiu que acordasse horas depois, para fugir. Sentiu que uma mão a sacudia pelo ombro. — Levante e sorria... — Vá embora — murmurou, sem abrir os olhos. Depois, lembrou-se de onde estava e quem era que lhe falava naquele tom. Virou de costas, puxando as cobertas. A luz que entrava suavemente pela janela acentuava ainda mais os traços de Choya.

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Jacquie controlou o impulso de mandá-lo para fora do seu quarto e perguntou: — O que você quer? — Era uma pergunta boba e ela, na verdade, não queria saber a resposta. Ainda tonta de sono, mas procurando ficar alerta, percebeu que ele já tinha tomado banho e parecia muito bem-disposto. — Você tem vinte minutos para se levantar. Vista-se, se quiser, e coloque o meu café na mesa. Jacquie respirou fundo. Ele continuava a insistir no jogo de transformá-la em sua criada. Mas ele podia bancar o senhor quanto quisesse. Ela, porém, recusava o papel de escrava. — Faça o seu próprio café! — disse, afundando a cabeça no travesseiro. Sentiu que as cobertas eram arrancadas com força e percebeu que estava sendo erguida da cama. Ficou com o rosto bem próximo ao de Choya e os pés enroscados nos lençóis. A alça da camisola curta e azul tinha caído do ombro, revelando um dos seios. Só a mão de Choya, segurando firme em seu braço, impedia que a alça caísse mais. Calmamente, ele estudou o que a camisola revelava, analisou o pescoço e os lábios, abertos numa expressão de surpresa. Depois, olhou os cabelos despenteados e encarou-a profundamente. As mãos de Jacquie continuaram na cintura dele. Com os pés presos nos lençóis não tinha como se equilibrar. Estava com as mãos nele mais para se apoiar do que para empurrá-lo. Sentiu os lábios de Choya se aproximando, tocando levemente os seus. Aquela era uma tortura estranha, para Jacquie. Ela tinha medo de se entregar ao beijo, mas era incapaz de evitá-lo. — Se não se levantar para fazer o meu café... — ele falou, perto dos lábios dela —, eu o tomo na sua cama. — Não posso — ela disse, perto dos lábios dele. Choya ficou imóvel por um instante; depois indagou: — Por quê? — Porque você está me prendendo. Calmamente, ele jogou a cabeça para trás. Mas seus olhos não se desviaram do rosto dela. Era quase como se a tocasse fisicamente, acariciando cada traço com uma luz sedutora. Com uma lentidão deliberada, ele a deitou novamente. Depois curvou-se sobre ela, com as mãos pousadas no colchão. Ela engoliu em seco, tentando não revelar seu temor e nervosismo. — Está livre — disse, brincalhão. — Agora, pode se levantar e se vestir. Jacquie hesitou, sem saber o que ele queria dizer com aquilo. Levantar-se, como? Se tentasse, encostaria no corpo dele, correndo o risco de que ele interpretasse isso como um convite. Ela levantou a cabeça do travesseiro. Os olhos de Choya brilharam. Sentiu raiva de si mesma por ter se metido naquela situação, mas não demonstrou nada. Escorregou para a beirada da cama, correndo, apressada, para a cadeira com as roupas. Quando olhou sobre o ombro, Choya estava encostado na porta, com os braços cruzados. Parecia disposto a ficar ali. — Quer sair do quarto, para que eu possa me vestir? — Não se incomode comigo. Fique à vontade, garota!

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Jacquie queria berrar para que ele saísse, mas algo no olhar dele dizia que estava desejando aquilo. Então, com um ar à vontade, que ela estava longe de sentir, deu de ombros e virou-se de costas para ele. Sem tirar a camisola, colocou os jeans desbotados, deixando-o entrever parte de suas coxas. Mas, só depois de fechar a calça, tirou a camisola. Os cabelos se espalharam pelos ombros e ele não viu mais nada de seu corpo. Depressa, Jacquie vestiu o bustiê vermelho e virou-se.

CAPÍTULO VII Uma tênue esperança tomou conta de Jacquie, ao ver seu carro. Esperança que morreu ao verificar que as chaves não estavam ali. O emaranhado de fios não dava nenhuma pista para a ligação direta. Desanimada, saiu do carro e fechou a porta. A brisa quente soprou do sul, espalhando a poeira entre os cactos. O sol da tarde queimava seus braços nus e não havia nenhum sinal de movimento na casa. Jacquie fez figa, sentindo estar com sorte porque Sam Barnett ainda dormia. Aquele era o seu terceiro dia como prisioneira de Choya e a primeira oportunidade que tinha de testar a prisão. No dia anterior, havia feito com que Sam Barnett falasse sobre os arredores da fazenda. Depois, olhando ao redor, percebeu que ele tinha falado bem pouco, pois a maior parte das informações tinha sido de natureza histórica. Ao norte, ficava a terra impenetrável dos Cochises. Além dela, o Passo dos Apaches. A sudoeste, Tombstone. Não havia vizinhos próximos. Para qualquer lado que Jacquie olhasse, só via a beleza selvagem do deserto de Sonora. Ouviu um cavalo relinchando e caminhou na direção deste som. No curral, descansou o braço na cerca mais alta e o pé na mais baixa. Havia três cavalos presos ali. Ao verem Jacquie, relincharam, nervosos. Eliminando o carro e a fuga a pé, só restavam os cavalos. Ela sorriu. O primeiro problema era pegar o animal. O segundo, selá-lo. Não tinha a menor noção de como fazer nenhuma dessas duas coisas. Portanto, não parecia haver jeito de fugir. Mas, em algum lugar devia existir um ponto fraco. Jacquie só queria descobrir isso logo, para não perder mais tempo. Até o momento, Choya não parecia disposto a executar sua ameaça, mas isso não queria dizer que tinha se esquecido dela. Os cavalos levantaram as orelhas e olharam para o atalho que vinha das terras da fazenda. Jacquie virou-se e viu o ônibus que trazia Robbie para casa. Aproximou-se, então, para encontrá-lo. Quando a porta se abriu, Robbie cumprimentou-a em silêncio, com um sorriso. Depois, parou nos degraus, olhou para trás e disse às outras crianças: — Viram? Eu disse a vocês. — Falava com ar misterioso. Aquelas palavras aguçaram a curiosidade de Jacquie.

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— Deixe que eu levo suas coisas — ela disse, com voz terna. Ele entregou-lhe alguns cadernos e ela viu que o motorista a olhava, curioso. As portas se fecharam e o ônibus partiu. — O que foi que aconteceu no colégio, Robbie? — Ninguém acreditou quando eu contei que você estava morando conosco — ele respondeu, caminhando para casa —, mas quando viram você, souberam que eu estava dizendo a verdade. Oh, que maravilha!, Jacquie pensou, com ironia e medo. A cidade inteira agora sabia que ela estava ali e ia acreditar que fosse de livre e espontânea vontade. As barras da sua prisão estavam se fechando cada vez mais. — O que você contou a eles, sobre mim? — indagou. Ele hesitou durante alguns minutos. — Que você estava aqui; mais nada... Ela notou que havia um papel enfiado entre as folhas de um caderno. Curiosa, pegou o papel e viu que era a fotografia de uma jovem sorridente, de cabelos loiros bem claros, a mãe de Robbie. Tinha visto a fotografia, numa moldura, ao lado da cama dele. — Por que levou isso à escola, Robbie? — Jacquie o olhou, com ar de suspeita. — Eu levei para poder mostrar a eles que você é mais bonita do que todas as outras mães — respondeu, ansioso. — Você disse a eles que eu era a sua mãe? — Não — Robbie respondeu, pouco à vontade. Era fácil perceber que a resposta estava incompleta. — Eles pensam que sou sua mãe? — Bem, talvez alguns pensem. — E você não explicou que não sou? — indagou ela, suspirando. — Robbie, não sou a sua mãe. Não sou nem sua madrasta. Não está certo deixar que seus coleguinhas pensem isso. — Eu sei — ele murmurou. — Amanhã, terá de contar a verdade a eles. Os olhos grandes e luminosos dele se fixaram no rosto de Jacquie. — É que eu queria que você fosse minha mãe... Era uma afirmação tão sincera que Jacquie esqueceu a irritação. Ajoelhou-se ao lado dele e o abraçou. — Você sabe que isso não é possível — disse gentilmente. — Por quê? — Robbie perguntou, com ar solene. — Por que não posso fingir que você é minha mãe? Não há nada de errado nisso. — Oh, Robbie! — Jacquie suspirou, desejando ser poupada da responsabilidade de fazer uma criança sofrer. — Vamos fingir, só entre você e eu. Não conto a mais ninguém — ele insistiu, quando viu que

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ela enfraquecia. Jacquie sacudiu a cabeça, desanimada. — Está bem. Mas isso ficará só entre nós. Ninguém mais deve saber. Está bem? — Prometo. — Ele apoiou-se nas muletas e a abraçou. Jacquie lhe deu a mão e Robbie a apertou, confiante. — Posso chamar você de mamãe? Quando estivermos sozinhos — ele explicou depressa. — Só quando estivermos sozinhos — ela concordou. — Mas lembre-se de que é de mentirinha... Quando criança, Jacquie tinha brincado de fingir muitas vezes. Aquilo não lhe causara nenhum problema. Robbie também não teria problemas. Os olhos dele brilharam, sorridentes. — Estou com fome, mamãe — declarou, alegre. Jacquie sorriu e colocou a mão nos ombros dele. — Então, vamos para casa, ver se encontramos alguma coisa para comer. Aquela brincadeira secreta dos dois fez com que Robbie passasse a tarde e a noite rindo. Todas as vezes que o olhava, quando Choya ou Sam estavam por perto, Jacquie parecia, ler a palavra “mamãe” nos olhos dele. O menino estava tão feliz que a moça se sentiu culpada por deixar que ele se ligasse ainda mais a ela. O jantar não poderia ser classificado como um sucesso. Apesar de Choya tê-la ensinado a lidar com o fogão, Jacquie ainda não tinha noção de como controlar o calor. Desta vez, o milho havia se queimado. Sam, provavelmente porque não queria passar fome, tinha se oferecido para ajudar a preparar as refeições. Jacquie recusara. Teimosa, insistira em fazer tudo sozinha. Seus fracassos, no fundo, eram um jeito de agredir Choya, deixando bem claro que não se adaptava ao papel de empregada. Ela quase desejava nunca ter aprendido a manobrar aquele fogão, assim ele teria de comer sempre comida queimada. Nesta noite, Choya estava mais quieto do que nunca. Mas seu olhar por várias vezes parou em Jacquie. Ela o ignorou. Depois de lavar a louça e colocar Robbie na cama, evitou a sala de visitas, onde Choya conversava com Sam, e foi para o quarto. Ia fazer uma outra tentativa de chamar os pais. Precisava enviar-lhes uma carta bem planejada. Assim, eles perceberiam a seriedade da situação, mas não ficariam alarmados. Quando ela se sentou para escrever o primeiro rascunho, viu que ia ser mais difícil do que havia pensado. Se lhes contasse sobre as ameaças de Choya e eles viessem buscá-la, teriam de ouvir a história dele. E Jacquie não tinha jeito de provar que isso não era verdade. Amassou várias folhas de papel e jogou na cesta de lixo, depois de inúmeras tentativas fracassadas. A carta não ia resolver. No dia seguinte, enquanto Sam estivesse cochilando, ela telefonaria novamente para eles. Desta vez não seria a cobrar. A casa estava em silêncio, quando ela saiu do quarto. Parou no corredor e olhou para o relógio.

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Parecia impossível, mas passava das dez horas. O silêncio indicava que todos estavam na cama. Jacquie foi até o banheiro, prendendo os cabelos no topo da cabeça. Tomou um banho rápido, para tirar a tensão e as frustrações, que tinham se acumulado desde que tentara escrever a carta. Não tinha idéia do que ia dizer no telefonema para os pais. Mas estava confiante de que pensaria em alguma coisa, quando chegasse a hora. Ainda molhada, enrolou-se numa toalha que só chegava até o meio das coxas. A bolsa com seus produtos de beleza estava numa estante sobre a pia. Ela ficou nas pontas dos pés e pegou o creme umedecedor. Enquanto o passava na testa, a porta se abriu e Choya entrou. Depois de olhá-lo, assustada, Jacquie deu um passo para pegar as roupas. Então parou. — Você devia ter batido na porta — disse, com indiferença fingida, passando mais creme no rosto. — Devia... — ele concordou, caminhando em direção a ela. Jacquie observou sua imagem no espelho. Os traços dele não se alteraram debaixo do olhar intenso dela. — O que você quer? — perguntou ela, mantendo o ar de indiferença. — Faz muito tempo que não vejo uma mulher se preparando para dormir — Choya comentou, com jeito surpreendentemente sonhador. Ela sentiu que seu estômago se revirava e espalhou o creme com força no rosto. Não acreditava, nem por um minuto, que aquele fosse o motivo da visita dele. — Mesmo? — perguntou, irônica e em tom de dúvida. Faria tudo para que ele não soubesse o quanto a estava perturbando. Sentia que aquele corpo longo e forte a intimidava. Choya continuou a olhá-la, com o mesmo jeito sonhador, que a deixava ainda mais nervosa. — Alguém me perguntou hoje se devia dar-me os parabéns. Parece que está circulando um boato de que eu me casei. — Pode ter certeza de que não fui eu quem criei este boato. — Se não foi você, quem acha que possa ter sido? — Como posso saber? — ela disse, em tom amargurado. — Eu só converso com seu pai e com Robbie. — E acha que um deles possa ter comentado sobre você? Ela lembrou-se depressa do incidente com Robbie. Aquela lembrança deve ter refletido em seus olhos, porque os traços dele se endureceram. — Talvez... — Você quer dizer que é possível que o meu filho tenha contado aos colegas e à professora que nos casamos, é isso? — Eu não sei — ela mentiu, dando de ombros, — Se souber, certamente não vai condenar nem encorajar Robbie, não é? — Choya agora estava mais sério do que nunca.

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Nervosa, Jacquie mordeu os lábios, imaginando o que ele já sabia. — Esta é uma pergunta boba. — Ela sorriu, como se ele não merecesse uma resposta. — Então, responda — ele desafiou. — Robbie não é do tipo de menino que conta mentiras. Ele nunca iria dizer que sou sua nova mãe, sabendo que não sou. — Robbie disse que você concordou em fingir que é mãe dele. — Ele disse? — Não queria, mas disse. Insistiu em várias negativas, mas acabou confessando. — Foi só uma brincadeira — comentou ela, tampando o creme. — Sem consequência no que diz respeito a você — ele falou, num tom cortante. — Robbie é um menino sensível. Você provavelmente achou que era interessante fingir-se de mãe dele. E não se envergonha de magoar uma criança? — Era só uma brincadeira, nada mais — Jacquie explicou, nervosa. — Robbie sabe que não sou mãe dele e nunca vou ser! — Ele pode dizer isso. Pode até acreditar nisso agora, mas, se vocês continuarem com esta “brincadeira” — enfatizou, num tom sarcástico —, logo passará a crer que isso é verdade. Jacquie colocou o vidro de creme no lugar e virou-se para Choya, com ar confiante. — Em outras palavras, ele vai ficar muito ligado a mim. Este foi o risco que você aceitou quando me trouxe para cá, lembra? Ele a olhou durante um longo tempo e depois falou: — Eu subestimei você, ao acreditar que não teria coragem de magoar meu filho. Jacquie nunca tinha tido a intenção de usar Robbie para punir Choya. Mas negar aquilo seria um desperdício de energia. Choya não ia acreditar que ela gostava sinceramente do menino. Se não podia lutar contra ele, ia passar para o seu lado. Obviamente, Robbie era o ponto fraco do pai. Essa poderia ser a sua chance. — Robbie não precisa se magoar, você sabe. — Manteve os olhos vazios e sem expressão. — A brincadeira só começou hoje. Pode acabar antes que ele comece a acreditar nela. — Como? — Choya perguntou, num tom cínico. — Basta permitir que eu vá embora. Robbie ficará em paz. Mas, se você continuar a me forçar a ficar aqui, eu vou continuar com a brincadeira. Não pode me vigiar o dia inteiro. E Robbie vai começar a odiar você, se tentar ficar entre nós dois. Você me dá o carro e eu lhe devolvo seu filho. Ela sorriu, satisfeita, vendo a fúria se estampar no rosto dele. Pela primeira vez, sentia o gosto de uma vitória. — Pense no assunto — ela disse, massageando o rosto com as pontas dos dedos. Sentiu que ele segurava a mão com força mas não tentou se libertar. Encarou-o com coragem. — Você está tentando novamente mandar nas pessoas, não é? — Ele estava furioso. — Pois eu lhe digo que está na hora de exigir o pagamento. No momento seguinte, Jacquie foi erguida do chão.

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— Ponha-me no chão! — disse, com a voz trêmula de medo. Choya riu e chutou a porta, que se abriu completamente. Jacquie tentava resistir, mesmo sentindo que não ia adiantar nada, enquanto ele a carregava para o quarto. Viu a colcha azul e depois apenas a escuridão. O colchão afundou com o peso dele. Jacquie abriu a boca para gritar, mas seu grito foi sufocado por um beijo. Estava presa sob o corpo dele. Ondas de medo passaram por seu corpo, mas ela lutou para manter a coragem. Quando afundou as unhas compridas no ombro de Choya, ele segurou-lhe o braço e o empurrou para cima da cabeça. O calor do corpo dele e seu cheiro másculo a estavam deixando tonta. Ela tentou suavizar a pressão dos lábios dele e virou o rosto. Mas, Choya também se moveu, segurando os pulsos dela com uma das mãos e usando a outra para lhe segurar o queixo. — Não! — Jacquie conseguiu dizer, antes que ele a beijasse furiosamente. Com brutalidade, Choya forçou os lábios dela a se abrirem. A resistência de Jacquie diminuiu. Aquele modo selvagem de amar estava despertando uma resposta instintiva nela. Forçou-se a lutar contra si mesma, ao mesmo tempo que contra ele. Mas viu que enfraquecia. Num momento resistia a um beijo, no outro, correspondia com paixão. A mão dele desceu do seu queixo para o pescoço e para o ombro bronzeado. Jacquie sentiu arrepios na espinha. Percebendo isso, Choya começou a beijá-la na orelha e no pescoço. Um suspiro descontrolado escapou dos lábios dela. Ele continuou a beijá-la, descobrindo seus pontos de prazer. Moveu a mão mais para baixo e encontrou a toalha, que arrancou, num gesto impaciente. Aquele movimento despertou a força de vontade de Jacquie. — Não! — protestou. — Por favor, não! Em resposta, Choya levantou a cabeça, olhando-a com expressão divertida. Jacquie percebeu que o luar que entrava pela janela deixava belos reflexos no rosto dele. Nunca ele parecera tão perturbadoramente másculo nem tão atraente como naquele momento. Ele a soltou e acariciou os cabelos dela. — Não mesmo? — Novamente os lábios dele estavam próximos aos dela. Quando as bocas se encontraram, Jacquie segurou-o pelos braços musculosos. Depois, abraçou Choya pelo pescoço. Sentiu que um fogo invadia suas veias, quebrando a última barreira de inibição. As roupas dele pareciam ásperas, de encontro à sua pele, mas até isso estimulava seus nervos. Sentiu que o coração dele batia na mesma velocidade que o seu. Quando ele se afastou, Jacquie ainda estava encantada. Parecia incapaz de qualquer movimento. Cada parte de seu corpo pulsava, precisando da proximidade dele. Fraca, abriu os olhos. — Choya... — murmurou, como que implorando a volta dele. Sentiu que um braço era passado debaixo do seu corpo, e foi erguida de encontro a ele. Depois, foi devolvida aos lençóis gelados. Com medo de que ele a deixasse de novo, procurou abraçá-lo, tirar a camisa e deixar os ombros

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dele nus, puxá-lo para ela. E Choya atendeu àquele pedido mudo. A emoção do beijo dele fez com que o medo desaparecesse. Jacquie sentiu que sua cabeça girava e seu coração disparava. Extasiada, ouviu sininhos tocarem. Os lábios dele se abriram para ela. O ritmo se suavizou. Agora, Jacquie sentia que flutuava lentamente de volta à terra. A tontura começava a desaparecer. Fechou os olhos, querendo esquecer de que, na verdade, o estava convidando a fazer amor. Estremeceu de encontro a ele, ao perceber isso. Choya puxou-a para mais perto de si, beijando-lhe os cabelos e a orelha. As mãos dela o empurraram com violência. — Vá embora, deixe-me sozinha! — A voz dela estava amargurada e triste com a perda do amorpróprio. Choya ficou tenso, como se pretendesse empregar sua força física e Jacquie prendeu a respiração. Depois ele saiu da cama. Ela sentiu que seu coração chorava, que queria tomá-lo nos braços. Tensa, viu-o saindo do quarto. Uma lágrima caiu. Depois outra. Finalmente, uma porção de lágrimas escorreu pelo rosto de Jacquie, mergulhado no travesseiro.

CAPÍTULO VIII Jacqueline abriu os olhos lentamente. Durante um momento não soube onde estava. Sentia-se magoada e triste. Atirou longe as cobertas e saiu da cama. Suas pernas tremiam e ela olhou pela janela, vendo um cacto cholla, Choya. A lembrança aumentou sua tristeza. Sentia vergonha. Queria afundar debaixo das cobertas e ficar escondida. Apesar de sempre ter negado que Choya a atraía, havia sucumbido a todos os seus ataques e até desejado que ele a possuísse. Como um robô, vestiu-se, sem nenhuma preocupação especial com a aparência. Estava indiferente ao fato de ser bem tarde. Não queria saber por que lhe haviam permitido dormir tanto, nem quem tinha feito o café e nem quem havia colocado Robbie no ônibus. Sentia-se vazia e insensível. Caminhou de volta para a cama e começou a tirar o lençol. Ouviu passos que se aproximavam e paravam na porta. O trinco girou e Choya surgiu. Alto, dominando o ambiente com sua aparência máscula. Havia um brilho nos olhos dele, brilho que ela nunca tinha visto antes. — Pensei ter ouvido você — ele disse baixinho. — Achei... que gostaria de dormir até mais tarde. — Vou fazer o café depressa — ela disse, indiferente. — Não precisa. Sam já fez. Jacquie procurou lutar contra a falta de interesse e enfiou a blusa dentro da calça. Sabia que ele ainda estava ali, observando-a, e sua presença e perturbava. Encarou Choya. Havia um ferimento mortal

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em seu coração e ela não queria sentir a dor. Choya se aproximou. Quando parou atrás dela, ela não se virou. Ele segurou-a pela cintura, mas ela ficou imóvel por um momento. Porém não resistiu quando ele a puxou para si, nem quando aqueles braços se cruzaram na frente do seu corpo. Pelo canto dos olhos, viu o brilho dos cabelos castanho-escuros, depois sentiu que ele a beijava no pescoço. — Jacqueline... — Ele disse o seu nome como se fosse uma carícia. Durante um instante, ela descansou contra o corpo dele, sentindo que compensava desta forma o vazio da noite anterior. Mas, de repente, odiou aquela ternura. Odiou Choya. Na noite anterior ele quase a tinha seduzido. Não podia chegar de manhã e esperar que ela o perdoasse. Nem por uma vez lhe ocorreu que ela participara da cena de sedução de livre e espontânea vontade. Sentindo apenas um ódio frio, virou-se para ele, colocou a mão em seu peito e o empurrou. A ternura do olhar dele foi substituída pela surpresa. — Se você tivesse avisado que viria esta manhã, eu teria usado minha armadura — disse, fria e distante. Ele levantou a cabeça, furioso, e a encarou com intensidade. O brilho dos olhos de Choya não deixava nenhuma dúvida quanto ao que ele estava sentindo. — De agora em diante, devo esperar os seus avanços pela manhã também? — Jacquie desafiou e ele permaneceu em silêncio. Depois de algum tempo veio a resposta. — Droga, Jacquie, eu... — ele começou, zangado. — O que vai dizer? — interrompeu ela, soltando-se da mão com que ele tinha lhe segurado o pulso e olhando-o, indignada. — É uma pena que não tenha conseguido cobrar a sua dívida, na noite passada, mas certamente tentou. — Pare com isso! — Choya agarrou-a pelos ombros, sacudindo-a com força. Aquilo pareceu acabar com a raiva dela e deixou-a calma. — Não vou ficar histérica, fique sossegado. Ele respirou fundo, procurando controlar a raiva que ela havia despertado. — Acha que eu gostei do que aconteceu na noite passada? Ela levantou as sobrancelhas, com ar de surpresa. — Espero que não pense que vou pedir desculpas por não tê-lo encorajado. — Sabe muito bem o que eu quero dizer. — Ele sorriu, amargurado, e isto acentuou ainda mais os traços marcados. — Está tentando negar que tinha a intenção de me seduzir? De me fazer pagar a dívida? — Não vim aqui para pedir desculpas pelo que não fiz. — Se não veio aqui para isso, então, deve ter outro motivo. — Ela começou a arrumar a blusa de novo. — Você é insuportável — Choya declarou, zangado. Ele a sacudiu novamente, sem tirar os olhos do decote dela. Jacquie deu um suspiro exagerado e sacudiu os cabelos.

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— Eu gostaria que você explicasse por que veio aqui. — Por que insiste em tornar isso ainda mais difícil para mim, Jacquie? — Difícil para você? Qual é o problema, Choya? Está sentindo remorsos por ter me raptado? Espera que eu diga que está tudo bem e que não precisa se preocupar? Bem, não posso e não quero! — Não espero isso — Choya respondeu, tenso. Jacquie sorria, vendo a raiva dele aumentar. — Não? Esperava o quê, então? Que eu deixasse que me possuísse à força? Não era assim que ia considerar paga a dívida pelo conserto do meu carro? — Quer parar? — A voz dele agora estava trêmula e rouca. — Por quê? Está planejando me deixar ir embora? Espero que não. Eu gostaria que Robbie soubesse que tipo de pai ele tem, antes de partir. — Deixe Robbie fora disso! — Ele segurou com força o braço dela, puxando-a para perto do seu rosto. — Por quê? — Jacquie não estava com medo da fúria que via nos olhos dele e nem tentou fugir de suas mãos. — Seu filho foi a causa de tudo isso, desde o começo. Ele foi o motivo de termos nos encontrado após o acidente. Porque “eu tenho o cabelo da cor do luar refletido no lago da montanha”. Pensou na sua esposa, na noite passada? — Não! — Certa vez você disse que ela significava problemas. Mas ainda não desconfiou de quantos problemas eu posso significar — ela ameaçou. — Estou avisando para que deixe meu filho fora disso — Choya disse, sério. — Eu vou lhe dizer uma coisa — murmurou Jacquie, confiante. — Se você me deixar ir embora, eu deixo Robbie em paz. — Acha que não estou tentando? — respondeu ele, apertando o braço dela com mais força. Jacquie jogou a cabeça para trás e seus cabelos caíram sobre a mão dele. — Não sei. Choya largou-a de repente. Um brilho de raiva passou pelos olhos dele, que virou-se e saiu apressadamente do quarto. Jacquie jogou-se na cama. Suas palavras amargas tinham sido sua única vingança, mas haviam deixado um gosto de fel em sua boca! A dor que sentia no coração não tinha diminuído. Não conseguira nenhuma satisfação em deixá-lo zangado. Só estava mais ferida... Anteriormente, Jacquie tinha evitado Choya. Mas, nos dias que se seguiram, foi ele quem a evitou. Cada vez que estavam no mesmo aposento ou se sentavam à mesa para as refeições, ela podia sentir que ele achava sua presença irritante. Quando as circunstâncias os forçavam a ficarem juntos, o olhar dele estava sempre indecifrável e nunca deixava transparecer o que Choya pensava. Ele não se aproximou mais dela nem mostrou desejo de tocá-la novamente.

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O alívio de Jacquie era sincero. Entretanto, havia momentos em que olhava para ele e se lembrava das carícias excitantes e dos beijos. Então, sentia uma emoção gostosa e pedia licença, afastando-se do olhar intenso que a perturbava. No sábado, Robbie saiu com Jacquie num passeio pela fazenda. Queria que ela conhecesse seus lugares favoritos. O último ponto foi o estábulo. — Eu venho sempre aqui! Há muitos lugares gostosos para brincar. Tenho até um esconderijo secreto. — Ele olhou de lado, por um instante e disse baixinho: — Gostaria de mostrar a você, mas... — Mas... se você me mostrar, o lugar não será mais secreto... — Então, você não se importa? — Robbie suspirou, aliviado. — Claro que não! — Ela sorriu e deu um beijo no garoto. — Venha, vou lhe mostrar o meu cavalo, o Apache. Um cavalo de olhos expressivos baixou a cabeça na manjedoura, relinchando quando o garotinho se aproximou. Era um animal pequeno, perfeito para Robbie. — Você pode andar nele, se quiser — Robbie disse, enquanto acariciava o focinho do animal. — Ele não vai jogá-la ao chão, nem nada destas coisas. Papai disse que ele é muito educado. — Obrigada, Robbie, mas não sei selar um cavalo. Talvez, um outro dia. — Eu posso lhe mostrar como se faz — ele disse, esperançoso. — É fácil. — Por que não espera até que você também possa montar? — Vai demorar muito. — Sabe montar a cavalo, Jacqueline? Ouvindo a voz de Choya, Jacquie virou-se depressa. Seu movimento brusco assustou o cavalo, que galopou para longe da manjedoura. Com os mesmos movimentos silenciosos, parecendo um gato, como tinha entrado no estábulo, Choya se aproximou deles. — Eu consigo andar mais ou menos bem — ela respondeu. Parecia distraída, mas estava espantada com o jeito formal dele. — Eu disse a ela que pode andar em Apache — Robbie interrompeu. Choya olhou para o menino. — Por que você não deixa que ela monte em Johnnycake? — Quem é esse? O pior cavalo do estábulo? — ela acusou, sentindo que a raiva lhe subia ao rosto novamente. — Johnny? — Robbie riu, não percebendo o tom venenoso dela. — Ele é um cavalo muito bonzinho, Jacquie. — Depois olhou para o pai. — Ela não sabe como se sela um cavalo, papai. Eu ia mostrar como se faz. — Quer mesmo aprender? — o homem perguntou, indiferente. Jacquie hesitou. Não queria fazer nada que provocasse um contato prolongado com Choya. Mas de repente, pensou que um cavalo seria o único meio de transporte que poderia usar para sair dali. — Sim, quero — respondeu, decidida.

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— Vou tirar Johnny do curral. — Choya olhou para o filho. — Enquanto isso, você mostra a ela onde estão as selas. Carregando as selas e os arreios, Jacquie e Robbie encontraram Choya na porteira da estrebaria. Segurando as rédeas do cavalo, ele explicou, com voz paciente, todas as etapas da tarefa. Jacquie não pôde esconder a surpresa quando viu que, em poucos minutos, havia selado o cavalo. Então, a coisa não é tão difícil quanto parecia, pensou, com um brilho de satisfação nos olhos, embora seu rosto mantivesse a expressão de seriedade que achava necessário manter diante de Choya. Com uma alegria infantil, Jacquie montou e cavalgou, devagar pelo quintal. De fato, Johnny era um cavalo dócil e ela estava sorrindo quando o trouxe de volta ao estábulo. Seu sorriso desapareceu quando seus olhos encontraram-se com os de Choya. Com as mãos estendidas, ele demonstrava que a ajudaria a desmontar. Mas ela não queria a ajuda dele. Colocou o peso do corpo no pé direito, levantou a perna esquerda, passando-a por cima do cavalo e perdeu o equilíbrio, caindo nos braços de Choya. Furiosa, ela se criticava pelo fracasso, enquanto ele, rindo, a apertava em seus braços. — Papai, papai, venha ver que bicho engraçado eu encontrei aqui. Choya largou-a para atender ao filho e Jacquie correu em direção à casa. Estava quente e, naturalmente, seu nervosismo fazia aumentar a temperatura. Resolveu tomar um banho e, depois, preparar um refresco. Quando Choya entrou na cozinha, Jacqueline estava com um penhoar de algodão e os cabelos molhados, presos no alto da cabeça. — Estou terminando de preparar um refresco. Quer um pouco? — Seu jeito de falar era frio e educado. Achava que, assim, poderia manter aquele homem afastado dela. — Sim, quero — respondeu ele, pegando o copo no armário. Por alguns minutos ficou sentado diante dela, tomando o refresco e olhando-a, intensamente, até resolver perguntar, com voz impaciente: — Você nunca usa nada debaixo das roupas? Jacquie enrubesceu, sentindo que seu rosto queimava de vergonha. — Eu... acabei de tomar banho — ela disse, na defensiva. Lembrou do último encontro que tivera com ele, após o banho. Choya empurrou, zangado, uma cadeira para longe de si. — Está bem Jacquie. Vista-se como quiser. Na verdade, não tenho nada com sua vida. — Não mesmo? — ela disse, num tom de pouco-caso. — Tive um dia difícil e estou cansado. — Está com dor de cabeça? Pensei que esta fosse uma desculpa só de mulheres... Terminou de tomar seu refresco e levou os copos para a pia. Agora estava de pé, atrás dela. Respirava fundo e depressa. — Você anda meio nua só para me provocar... — Choya acusou, em voz baixa. — Não! — ela falou bem alto, erguendo a cabeça, arrogantemente.

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Mas, apesar da negativa violenta, não resistiu quando ele a puxou para si. Jogou a cabeça para trás e seu corpo, automaticamente, se aproximou do dele. O calor daquele corpo másculo fez sua pele queimar de encontro à dele. Durante muitos dias, Jacquie tinha se sentido vazia por dentro. Agora, aquele vazio estava sendo preenchido pela presença de Choya, pelo abraço dele. Ela se virou e entreabriu a boca para receber o beijo, que se tornava cada vez mais profundo, como que satisfazendo a paixão. Ele empurrou o penhoar para baixo, desnudando-lhe o ombro. Começou a beijar-lhe o pescoço e ela sentiu que as batidas do seu coração se aceleravam. Lembrou-se também de que isso já tinha acontecido antes e o empurrou, virando o corpo para se afastar das carícias. — Solte-me, por favor... — pediu, com voz débil. Ele afastou-a um pouco de si, mas não a largou inteiramente. Olhou-a com uma expressão estranha. O coração de Jacquie voltou a bater de modo acelerado. Sua cabeça estava cheia de idéias contraditórias e seu corpo tremia. Tudo aquilo lhe parecia uma loucura. — Você não consegue decidir-se, não é? Pois eu vou ajudá-la a tomar a decisão mais acertada — disse, pegando-a no colo e carregando-a para o quarto. Cada vez mais assustada, Jacquie gritou, quando percebeu que ele se aproximava da cama. — Ponha-me no chão, seu bruto! Você é um monstro insensível e eu o detesto! Choya riu e colocou-a na cama. Por alguns minutos ficou observando aquele corpo jovem, estendido indefeso sobre os lençóis. — Você não pode estar falando sério... — falou, com jeito debochado, deixando clara a intenção de irritar Jacquie ainda mais. — Você me quer e já demonstrou isso de várias maneiras... — Não, não o quero e você sabe muito bem disso! — ela falou aos berros, tentando soltar-se. — Não suporto que me toque! E acho tudo isso nojento! — É estranho que não consiga agir de acordo com seus sentimentos — Choya brincou. — O que espera que eu faça? — gritou, desesperada. — Quero ir embora! Quero sair daqui... e você não deixa! Fica insistindo que precisa ser pago. E o único jeito com que vai me fazer pagar é... assim! Eu tento fazer o que você quer, mas não posso. Não posso! Ele a olhou irônica e intensamente. Parecia hesitar, como se pensasse nas palavras dela e as analisasse, para ver o quanto continham de verdade. Raiva e orgulho se misturavam dentro dela e as lágrimas começaram a escorrer de seus belos olhos azuis. — Há outro modo com que eu possa pagar minha dívida? — ela perguntou, engasgada. — Será que você precisa me degradar ainda mais? Choya franziu as sobrancelhas. Soltou o pulso dela e estendeu a mão, na tentativa de alisar seus cabelos. Jacquie, porém, respirou fundo e se afastou. — Não foi minha intenção degradar você — ele disse baixinho, descendo a mão. — Não? — ela indagou, num tom de quem não acreditava. — Não, mesmo?

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— Acredite em mim, Jacquie. Nunca pretendi magoar você. Pensei que você fosse um outro tipo de mulher. Nunca imaginei que só usasse uma máscara de sofisticação que lhe dava aquela aparência. Se eu soubesse, nunca teria feito aquela proposta de pagamento. — Agora que sabe, pensa que os danos já estão feitos e nem preciso reagir, não é? — ela disse, sarcástica. — Não! Não penso assim. Esta noite, acreditei em você... — Ele parou de falar por um instante, depois disse calmamente: — Não vou incomodá-la mais. — Então, deixe-me ir embora. Choya encarou-a por um longo tempo. Depois, virou-se e saiu do quarto, sem dizer mais nada. Na manhã seguinte, Jacquie pulou da cama, logo que acordou. Achava que Choya ia devolver-lhe a chave do carro e deixá-la ir embora. Mas não havia sinal dele na cozinha. Hesitou, parando no corredor que dava para a sala. Talvez, devesse procurá-lo, para ver se ele tinha tomado uma decisão. Pensando melhor, achou que preferia que ele viesse procurá-la. Não precisava implorar sua liberdade. Dentro de poucos minutos, Robbie chegaria para o café. Começou a prepará-lo e pensou tristemente na reação do menino, quando soubesse que ela ia embora. Mas não pretendia lhe dizer nada naquela manhã. Jacquie não sabia se iria partir imediatamente. Entretanto, depois do que Choya tinha dito na noite anterior, ela não conseguia imaginar um motivo sequer para que ele a forçasse a ficar. A comida estava na mesa. Jacquie, Robbie e Sam Barnett estavam comendo quando Choya entrou. Ele lhe deu um bom-dia que não revelava nada. Jacquie tentou acalmar sua própria ansiedade, dizendo a si mesma que, provavelmente, ele ia preferir conversar a sós, antes de avisar aos outros sobre a sua partida. — Papai... podemos ir a Fort Bowie no sábado? — perguntou Robbie, olhando esperançoso para Choya. — Acho que não, filho. O menino ficou triste. — Mas você prometeu levar vovô e eu, neste verão, e já estamos quase em setembro. O verão já acabou. — Eu fiz a promessa antes de você quebrar a perna — foi a resposta firme. — E daí? — Os olhos do menino encararam Choya, confusos. — E daí, acho que você não vai se divertir, se for lá com a perna engessada — ele explicou, paciente. — Posso ir a qualquer lugar de muletas, papai! Subo escadas e faço tudo! O pai sacudiu a cabeça, com ar de dúvida. — Temos de andar mais de um quilômetro a pé, até o forte, e o caminho é difícil. — Podemos ir, não é, vovô. — Robbie virou-se para Sam, pedindo uma confirmação. — Talvez — o velho concordou, sorrindo. — Mas vamos levar o dia todo para chegar lá.

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— Podemos levar o dia todo! Jacquie pode preparar-nos um lanche e vir junto. Podemos fazer um piquenique. Por favor, papai! — Bem, vamos ver. — Choya tomou o café, evitando uma resposta direta. — Onde é este Fort Bowie? — Jacquie quis saber. — No Passo dos Apaches — Robbie respondeu, esquecendo a discussão com o pai. — São as ruínas de um forte construído no tempo em que os índios atacavam — Sam Barnett explicou. — Servia para proteger os fazendeiros e mercadores que atravessavam o Passo dos Apaches. Mais tarde, ele serviu de base principal, durante a guerra contra Jerônimo, o chefe dos índios. Quando ele se entregou, o forte foi abandonado. Agora é um local histórico. — Aposto que há muitas flechas por lá — Robbie declarou. — Podemos ir, papai? — Não fique atormentando o seu pai — Sam Barnett avisou. — Ele é capaz de dizer que você não pode ir porque está pedindo muito. — Mas Jacquie quer ir, não é, Jacquie? — Ele agora estava triste. — Ela nunca esteve lá antes e nem eu... há anos e anos. — Você não é tão velho assim — Choya respondeu secamente. — Até domingo, vou pensar no passeio. Mas não fique me perguntando se vamos, senão, faço o que vovô falou. — Ah! — Robbie mergulhou a torrada na xícara de café com leite. — Eu fico quieto... — Como estava o touro, esta manhã? — Sam perguntou. — Melhor. Acho bom você ir vê-lo algumas vezes durante minha ausência — Choya sugeriu. — Aonde você vai, filho? — Sam perguntou, surpreso. O olhar de Choya passou depressa por Jacquie. Ela respirou fundo, imaginando se ele iria levá-la até a cidade, para lhe mostrar o caminho de volta. — Verificar a cerca ao norte — ele respondeu, e colocou a xícara vazia sobre a mesa. As esperanças dela acabaram quando Choya levantou-se da mesa. Por que ele ia fazê-la ficar mais? O que esperava ganhar com aquilo? Claro que não pensava que ela queria ficar ali! Sentiu-se confusa, enquanto o observava caminhar para o corredor que dava na porta dos fundos. Resolveu fazer alguma coisa. Empurrou a cadeira depressa e o seguiu. Ele já estava quase perto da porta, quando ela entrou no corredor. — Choya! Espere! Ele parou, com a mão no trinco da porta. Quando viu Jacquie bem perto dele, com aquela expressão interrogativa no rosto, respondeu apenas: — Não vou voltar para o lanche, se é isso que você quer saber. Jacquie ainda tentou abrir a boca para dizer que não merecia aquela tortura, mas não conseguiu. Ficou olhando para o vazio, enquanto ele se afastava.

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CAPÍTULO IX Montada na cerca do curral, Jacquie comia uma maçã. Alguns cavalos a olhavam como se estivessem pedindo para ela dividir a fruta com eles. Distraída, ela atirou para os animais os caroços que havia juntado na mão. Depois de dois dias, ainda não tinha descoberto quais os planos de Choya. Sentia que, se continuasse ali, seria um desastre. Quanto mais tentava ignorar as sensações que ele lhe despertava, mais forte elas ficavam. Impaciente e pouco à vontade, ela desceu da cerca, limpando as mãos nas calças. Depois, pegou as rédeas de um cavalo e o puxou até a porta do estábulo. Em seguida, selou e arreou o animal, que era bastante dócil. Não podia esperar mais. Já havia tomado sua decisão. Não ia continuar como prisioneira naquele rancho, nem mais um minuto. Deixou o cavalo amarrado numa pilastra e correu até a casa. Fez tudo em silêncio, evitando acordar Sam Barnett. Enfiou algumas roupas e objetos de que precisava numa fronha e viu que não tinha outra escolha. Teria de deixar a maior parte de seus pertences para trás. Era impossível levar a maleta no cavalo. Tinha de se arriscar a mandar pedir tudo depois... Certamente, Choya não iria querer ficar com suas roupas. Hesitando, na cozinha, Jacquie pensou em preparar um lanche. A tarde já ia pelo meio e achou que à noite já teria conseguido chegar a algum lugar. Quanto mais tempo demorasse ali, mais riscos havia de que seu plano fosse descoberto. Ou por Sam Barnett ou por Choya, que poderia voltar inesperadamente. Tirando o cavalo do estábulo, Jacquie resolveu partir em ângulo reto com a estrada. Depois que estivesse longe da casa, poderia seguir em direção paralela ao atalho que dava na estrada principal. Era um plano malfeito, mas que poderia funcionar. Por causa da ilusão a respeito das distâncias no deserto, Jacquie andou mais de duas horas em trote, antes de perder completamente a casa de vista. Seu ângulo de partida a havia levado aos pés das Montanhas Dragão. Uma trilha de animais saía da direita, em linha paralela com o atalho do rancho. Ela decidiu segui-la, mas, se fosse para o lado das montanhas, ia abandoná-la. Apesar de a trilha dar muitas voltas, subir e descer, parecia manter a direção que Jacquie desejava. O problema era o tempo passando. O terreno pedregoso limitava as forças do cavalo e ela não podia galopar. Preocupada com o sol, que começava a se pôr, ela culpava o cavalo pela lentidão. Quando chegaram a uma faixa de areia, ele não alterou o passo, mas Jacquie olhou para baixo e viu que agora o animal estava mancando da perna direita. Desceu e praguejou contra a sua má sorte. Com as mãos na cintura, estudou os arredores. Tinha conseguido atingir uma das metas que havia se proposto. Estava longe do rancho, evitando o atalho. Não havia ninguém à vista e nem sinal da casa. Mas ela estava a pé, com um cavalo manco.

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— Vamos, Johnny — falou, quase chorando e segurando as rédeas. — Não podemos ficar aqui. Puxando o cavalo manco, ela continuou pela trilha. Sentia a garganta seca e um vazio no estômago. Estava começando a perceber o quanto tinha sido tola. Devia ter preparado um lanche e trazido um pouco de água. Quando chegara ao rancho, percebera logo os perigos do deserto montanhoso, para quem não conhece o lugar. Durante os últimos dez dias, familiarizara-se com a paisagem, mas sabia que o perigo continuava existindo. Qual será a forma que o deserto escolherá para punir minha ousadia?, pensou, assustada, enquanto olhava a trilha que se dividia à sua frente. Uma para a direita, indo na direção de um dos vales da montanha, e outra para a esquerda, na direção em que pretendia ir. Mas, quando escolheu a última, o cavalo empacou. Jacquie segurou firme a rédea e puxou. — Vamos, amigo... — Mas o animal continuou empacado. No instante em que ela parou, o cavalo escolheu a outra trilha. Jacquie o empurrou, tentando convencê-lo a mudar de idéia, mas não teve sucesso. Olhando para trás, ela murmurou: — Será que você sabe de alguma coisa que eu não sei? — Tentou empurrá-lo para a trilha novamente e outra vez ele recusou. Jacquie desistiu e entrou com o cavalo na trilha da direita, que fazia curvas e mais curvas, subindo pelas beiradas da montanha. Raramente conseguia ver além da curva seguinte. Não tinha a menor idéia de para onde estava indo. Só esperava que o cavalo soubesse. Um enorme barranco fazia a estrada se dobrar de vários lados e, depois de contorná-lo, Jacquie parou, surpresa. No meio da montanha estava um lindo lago, rodeado de pedras. O cavalo a empurrou para a frente. Havia pegadas de vários animais ao redor do lago. Jacquie observou o cavalo beber, sedento. Depois, ela própria mergulhou as mãos e levou-a aos lábios. A água era doce e refrescante. Quando matou a sede, sentou-se em uma das rochas e o cavalo ficou pastando. Pelo menos, agora tinham água. O céu do oeste parecia um incêndio. Ao redor do sol se espalhavam nuvens vermelhas e alaranjadas. O frio da noite que se aproximava começou a invadir a terra. O sol se escondia no horizonte e a escuridão baixava devagar. Seria uma bobagem sair do lago da montanha quando a noite já estava começando. Ali havia água para ela e o cavalo podia também se alimentar, comendo a vegetação rasteira. Concentrou-se na beleza do pôr-do-sol e tentou não pensar no vazio que sentia no estômago. Olhou o relógio e percebeu que Choya já deveria estar à sua procura. Possivelmente, teriam dado falta dela há duas horas. Desejou que ele a encontrasse, mas não havia muitas chances de que isto acontecesse. Pelo menos, não antes que a noite caísse completamente. Primeiramente, ele verificaria o atalho. Não ia suspeitar que ela havia seguido na direção do lago. Agora as nuvens adquiriam um tom acinzentado. Apareceu uma estrelinha no céu. E logo, outra

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brilhou ao longe. A lua surgiu iluminando a noite. Jacquie estremeceu e cruzou os braços. Ia ser uma noite fria. A blusa fina que usava não oferecia grande proteção. O cavalo levantou a cabeça e as orelhas. Jacquie olhou e não viu nada, mas ouviu um ruído. Ficou tensa. Aquele lago provavelmente era frequentado por muitos animais. Talvez fosse um bicho selvagem, que vinha beber água. O cavalo relinchou. Foi respondido pelo relinchar de outro cavalo e então Jacquie ouviu o barulho de ferraduras. Tinha de ser Choya! Ela levantou-se com o coração aos pulos. Há cinco minutos queria que ele a encontrasse, agora desejava loucamente encontrar um lugar para se esconder. Mas, antes que fizesse qualquer gesto, Choya saiu das sombras e ficou olhando para ela ainda montado. Depois de alguns segundos, olhou para o cavalo. — Não diga nada — Jacquie murmurou, zangada quando ele voltou a encará-la. — Sei que isso é chamado de roubo de cavalo. — Está tentando se suicidar? — A voz dele parecia um trovão. — Sem comida, sem água e, obviamente sem fósforos, para acender uma fogueira! Mesmo reconhecendo que merecia ser repreendida, ela o encarou com altivez. — Eu estava tentando fugir de você. Não planejei passar a noite no deserto. Como você me encontrou? Choya desceu da sela sem parecer fazer nenhum esforço. — Um cavalo deixa rastros, você devia saber disso. — Você não teria me encontrado — Jacquie declarou, furiosa. — Eu estaria muito longe daqui, se Johnny não ficasse manco. Largando as rédeas, Choya aproximou-se de Johnny e abaixou-se para verificar a pata dianteira dele. Levantou a pata, depois tirou do bolso algo que parecia uma faca. Ela ouviu-o raspando alguma coisa, e, logo em seguida, o cavalo estava perfeito. — Era só uma pedra na ferradura. — Só isso? — Olhou-o sem acreditar. — Era por causa da pedra que ele mancava? Não está machucado? — Acho que a pata dele está um pouco dolorida agora. Mas nada muito sério. Se ao menos ela soubesse que era aquilo! Poderia estar a quilômetros de distância! Sua ignorância fez com que sentisse pena de si mesma, misturada com um pouco de raiva. Olhou para Choya, alto e moreno, que se aproximava. O homem passou por ela, indo até o cavalo e tirando um rifle da sela. — O que vai fazer? — Jacquie arregalou os olhos. Choya apontou o rifle para o ar e deu dois tiros seguidos. Depois, fez uma pausa e deu o terceiro tiro. Em seguida, guardou o rifle e virou-se para Jacquie. — Eu estava dando a Sam o sinal de que encontrei você — explicou, indiferente. — Seu pai pode ouvir os tiros daqui? — Ela franziu as sobrancelhas, imaginando se estaria mais perto da casa do que tinha pensado.

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— O som, principalmente o de tiros de rifle, se propaga muito neste tipo de terreno. — Ele se aproximou da sela do seu cavalo e Jacquie sentiu todo o seu corpo tremer. — Vai me fazer voltar com você? Choya tirou as sacolas que estavam amarradas na sela. — Não agora. Esta trilha é muito difícil de seguir no escuro. — Quer dizer que vamos passar a noite aqui? — Ela respirou fundo, assustada. — Exatamente. — Ele tirou um pacote de sanduíches de uma das bolsas e atirou para Jacquie. — Pode comer, enquanto acendo uma fogueira. Começou a juntar gravetos por ali, em silêncio e com modos tão bruscos, que Jacquie achou difícil ignorar. Cada minuto que passava parecia aumentar a tensão ao redor de Jacquie. Apesar da fome, só conseguiu comer um sanduíche. Deixou os outros de lado, para Choya. Logo uma fogueira estava crepitando, aquecendo e clareando o lugar onde estavam. O silêncio do fazendeiro era irritante. Jacquie teria combatido o pouco-caso e as ameaças, mas aquilo a estava deixando com os nervos em frangalhos. Quando ele colocou a sela no chão, perto da dela, seu controle acabou. — Deixe-me ir embora, Choya. — A voz dela tremia e estava rouca, parecia o tom de um pedido humilde. — Não pode mais me manter prisioneira. O que vai ganhar com isso? Eu sei que você me odeia... O rosto dele ficou ainda mais tenso, mas não a olhou. As sacolas estavam sobre seus ombros. Ele as atirou ao chão e abriu uma delas. Tirou de dentro um objeto de couro e estendeu para Jacquie. — Isso é seu! — falou, ainda evitando encará-la. Lutando contra as lágrimas, achando que ele não ia atender seu pedido, Jacquie levantou-se e segurou o objeto. Arregalou os olhos, espantada. — Minha... carteira! — disse, quase sem acreditar. — Sim, isso mesmo, sua carteira! Apressada, ela a abriu. Estava tudo ali. Intacto. — Meu dinheiro... está aqui... — Jacquie procurou ver o rosto dele contra a luz da fogueira. — Onde você a achou? — Então, um pensamento lhe veio. — Estava com você esse tempo todo, não é? Como pôde ter a coragem de fazer uma coisa dessas? — Não... não estava comigo. A moça duvidou. — Então, onde estava, onde você a encontrou? — Com Robbie. — Robbie? — Ela repetiu o nome do menino, assustada. — Como ele a pegou? — No dia em que você deixou cair as coisas da bolsa, na calçada. Ele enfiou a carteira dentro da camisa — explicou, aborrecido. — Ele não queria que você fosse embora, lembra? — Jacquie lembrava muito bem. — Ele achou que se escondesse sua carteira você não teria dinheiro para comprar gasolina para o carro.

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— E nem para pagar o conserto — ela disse, sorrindo ante aquela ironia amarga. — E ela estava com Robbie o tempo todo! — Ele a escondeu no seu lugar secreto, no estábulo. Ela afastou do rosto os cabelos, que agora brilhavam ao luar. — Não era de admirar que Robbie não quisesse me mostrar o esconderijo secreto — murmurou, com lágrimas nos olhos. — O que fez com que ele decidisse entregar a carteira a você? — Quando voltei à tarde, para o rancho, e descobri que você tinha partido, Robbie ficou louco de medo de que você se machucasse ou se perdesse. Na lógica infantil dele, achou que, se devolvesse a carteira, eu poderia encontrá-la sã e salva; caso contrário, algo terrível aconteceria a você. As lágrimas agora desciam pelo rosto da moça. Tudo aquilo tinha acontecido porque o menininho não queria que ela fosse embora. Ao pegar, inocentemente, a carteira, tinha precipitado uma cadeia de acontecimentos que a levaram até o rancho e, finalmente, ao lago da montanha. Baixando o rosto, ela fechou os olhos, procurando não sofrer. Depois, levantou-o e viu o rosto dele ali perto. — Tenho o dinheiro. Posso pagar o conserto do carro. Agora, vai me deixar ir embora? — perguntou, soluçando. — Você tem todo o direito de estar zangada — Choya disse baixinho. — Não estou chorando porque estou zangada — Jacquie corrigiu, soluçando. — Estou chorando... porque... não sei! As palavras trouxeram novas lágrimas, que lhe escorreram pelo rosto. Seus ombros se sacudiam com os soluços e Choya parou na frente dela. — Sim, eu sei. — Deu um passo hesitante na direção de Jacquie. Suas mãos pousaram levemente nos ombros dela e a puxou para si. Jacquie tentou empurrá-lo, mas os soluços não deixaram. Choya abraçou-a com força, balançando-a suavemente. Os soluços foram abafados pela camisa dele. Indiferente, ela sentiu que ele lhe acariciava os cabelos. Era estranho, mas percebia que estava sendo consolada pelo mesmo homem que a tinha magoado tanto. Agarrou-se a ele, sentindo-se perdida. Choya beijou-a nos olhos e no rosto molhado. Quando seus lábios se encontraram, Jacquie sentiu o gosto das próprias lágrimas. O beijo foi quente, porém doce e suave. Jacquie correspondeu, emocionada e surpresa. Jamais tinha imaginado receber um beijo assim de Choya. Feliz, ela passou os braços em volta de seu pescoço. Mas ele os retirou carinhosamente e, pegando-a no colo como se fosse uma criança, colocou-a sobre o cobertor, dizendo: — Agora durma... Os cavalos pareceram impacientes, quando ele caminhou para o outro lado da fogueira. Jacquie fechou os olhos e sorriu. Sem perceber, tinha pago a sua dívida dando a ele seu coração. A claridade da manhã despertou-a. Sentiu que alguma coisa estava errada. Não havia nenhum

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colchão, nem travesseiro... Só a dureza do chão frio ao amanhecer. Então, lembrou-se de sua tola tentativa de fuga. Abriu os olhos e procurou Choya. Ele estava perto dos cavalos, terminando de arreá-los. A expressão amedrontada dela se suavizou com o amor que agora admitia sentir por ele. Seus músculos estavam doloridos e ela se levantou espreguiçando. Ao ouvi-la se mexendo, Choya olhou-a. Seu olhar foi como um jato de água fria. Os olhos, que na noite anterior a olharam com comovente ternura, pareciam agora ter menos calor do que as cinzas molhadas da fogueira. — Bom dia — ele disse, num tom indiferente, que estraçalhou o coração de Jacquie. — Bom dia — ela respondeu, tensa. Com as rédeas dos dois cavalos nas mãos, ele se aproximou. Seu rosto apresentava uma expressão distante e desligada. Estendeu-lhe as rédeas de Johnny. — É um longo caminho de volta. É melhor partirmos agora. — Sim — ela concordou depressa, montando antes que ele visse a dor refletida em seu rosto. Quando ela entrou na trilha, Choya chamou-a. Jacquie parou e esperou. Estava rígida e ansiosa. — Tome. — Estendeu-lhe as chaves do carro. — Sei que você vai querer partir logo que chegar ao rancho. Ela colocou as chaves no bolso da calça e saiu com o cavalo adiante de Choya, sem nada dizer. A viagem de volta foi feita em silêncio, um silêncio que magoava o coração de Jacquie. Finalmente chegaram ao rancho. O queixo dela tremia quando desceu do cavalo, ao lado do curral. Incapaz de olhar para Choya, largou as rédeas e caminhou para casa, deixando que ele cuidasse dos animais. Robbie se aproximou, correndo, usando as muletas para se atirar para a frente, num movimento desastroso. Seu sorriso quase ia de uma orelha à outra. Sam Barnett também se aproximava com sua bengala. Imóvel, Jacquie esperou que Robbie chegasse. Ele parou, com ar triste, sabendo que sua fantasia tinha durado pouco. Choya estava se aproximando. — Jacquie! Jacquie! — Robbie gritou, maravilhado. — Você voltou! — Ele ia se atirar para ela, mas Choya o interceptou, segurando-o pela cintura e o menino transferiu toda a sua emoção para o pai. — Onde você a encontrou, papai? Eu sabia que você ia encontrar! Eu sabia! — Por que você não foi à escola, filho? — Choya olhou de lado para Sam. — Eu estava esperando Jacquie. Sam apoiou-se pesadamente em sua bengala. — Ele se recusou a ir para a escola até que visse Jacquie pessoalmente. Estava quase ficando doente. Bem, não pude fazer mais nada, a não ser deixá-lo ficar aqui, esperando a moça. — Eu tinha medo de que algo acontecesse com Jacquie e vocês não voltassem — Robbie disse, depois da explicação do avô. De repente, assumiu um ar de culpa. — Desculpe por causa da sua carteira, Jacquie. Eu não ia ficar com ela. Ia devolver. Só peguei porque queria que você ficasse aqui.

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— Eu sei. — Ela suspirou, dando uma olhada para Choya. — Vá para casa, Jacquie — ele ordenou, segurando o filho pela cintura. — Eu cuido do resto. Jacquie abriu a boca para dizer alguma coisa, mas não saiu nada. Saiu correndo para a casa. Do seu quarto, podia ouvir os protestos de Robbie, diante da notícia de sua partida. Depois ouviu os soluços dele. Se ao menos Robbie tivesse ido para a escola, ela poderia ter evitado aquela cena! Sem se importar em arrumar nada, jogou as roupas e objetos na mala. Por dentro, estava chorando tanto quanto Robbie. Tirou da carteira o dinheiro suficiente para pagar o conserto do carro e a conta do hotel. Colocou-o debaixo do despertador, na mesinha de cabeceira. Quando terminou de arrumar a mala, Choya apareceu na porta. — Está pronta? — ele perguntou, com voz seca. Jacquie fez que sim e passou a mão no rosto, como que para ter certeza de que não havia lágrimas em seus olhos. Choya pegou suas coisas e caminharam para a porta. Ela não parou para dar uma última olhada. Não precisava olhar nada para saber que ia ser capaz de lembrar daquele quarto e do rancho durante muitos meses, no futuro. Quando saíram, Robbie estava encolhido em um canto. Jacquie olhou-o, sentindo a mesma mágoa dele. Enquanto Choya arrumava a bagagem no porta-malas, Sam se aproximou. — Eu já estava começando a me acostumar com você, moça. — Ele sorriu, triste, e estendeu a mão. — Talvez, se ficasse mais um pouco, tivesse aprendido a cozinhar. Jacquie sorriu para ele. — Obrigada por tudo, Sam. O velho sacudiu a cabeça e se afastou. Depois caminhou para onde Robbie estava, encolhido, curtindo a sua infelicidade. — Não vai dizer adeus a Jacquie? — A pergunta ficou sem resposta. — Você não quer que ela vá embora sem se despedir, não é, Robbie? — Sam voltou a insistir, sem sucesso. Olhou para Jacquie com ar de quem pede desculpas. — Lamento; não sei o que há de errado com a educação deste menino. Vou dar um jeito nele. — Não. — Ela colocou a mão no braço do velho. — Eu... eu entendo como Robbie se sente. Não tem problema. Tudo já tinha sido colocado no carro. Choya afastou-se da porta e ela sentiu um nó na garganta, ao olhar para ele. Estava com as chaves do carro e a porta tinha sido aberta. Mas, se Choya dissesse as palavras certas, Jacquie sabia que jamais iria embora. Ele não falou nada. Ela entrou no carro. — Jacquie! — Era Robbie que se aproximava, apressado. — Jacquie, eu não quero que você vá embora! — Parou diante dela, com o rosto cheio de lágrimas. — Quero que fique! Ela desceu e ajoelhou-se a seu lado. — Tenho de ir — disse, com um sorriso triste. Ele se atirou nos braços dela, afundando o rosto em seu pescoço, desesperado. Jacquie abraçou-o com força, fechando os olhos, sentindo que a dor em seu coração era quase insuportável.

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— Por favor, não vá! — Ele soluçou no peito dela. — Por favor, Jacquie! — Lamento — ela murmurou beijando os cabelos dele, que eram quase da cor dos seus. — Por favor, gosto tanto de você! Por favor! Uma lágrima apareceu nos olhos dela, seguida de outra e mais outra. — Gosto muito de você também, Robbie — Jacquie murmurou —, mas tenho de partir. — Por quê? — Ele não conseguia entender e a apertava com mais força. — Por quê? Jacquie sabia que, ainda que tivesse cem anos, não conseguiria explicar de um modo que ele entendesse. Abriu os olhos e observou Choya, como se fizesse a ele um apelo mudo. Ele parecia prestes a dizer algo, mas depois ficou sério, aproximou-se e segurou o filho pelos ombros, separando-o dela. — Adeus — ela murmurou, mas a despedida era mais para Choya do que para Robbie. Entrou no carro antes que perdesse completamente o controle. — Você não pode ir! — Robbie se aproximou. — Nós vamos a Fort Bowie no domingo, Jacquie. Você só pode ir embora depois disso. — Não posso ficar até domingo — ela disse, procurando sorrir. — Acho que eu terei de ver o forte uma outra vez. — Você nunca vai encontrar aquilo sozinha — Robbie disse. — É preciso olhar por um cano, para achar. — Ela fechou a porta do carro e deu a partida. — Não vá, Jacquie. Por favor, não vá... Olhando só para a frente, ela saiu com o carro. Os gritos de Robbie eram tristes demais, para que ela não se rendesse. Não queria olhar para trás até atingir a estrada. Então, olhou pelo espelho retrovisor. Robbie vinha atrás do carro, com suas muletas. Ela sabia que ele a estava chamando.

CAPÍTULO X Jacquie desceu do carro cansada. Caminhou indiferente para o sobrado branco, movimentando os ombros com a intensão de relaxar a tensão causada pela longa viagem. A porta estava trancada, mas Jacquie sentiu cheiro de bacon frito. Bateu e esperou. Uma mulher de cabelos castanhos olhou pela janelinha da porta. Seus olhos azuis se arregalaram, numa mistura de surpresa e satisfação. Logo a porta se abriu para Jacquie. — Olá, mamãe! — Jacquie conseguiu dizer, antes de ser abraçada. — Jacquie, querida! — a outra exclamou, procurando conter um soluço e dando um passo para trás, a fim de observar melhor a filha. — Estivemos tão preocupados com você! — Abraçou-a de novo. — Por que não telefonou, nem escreveu? Eu quase não conseguia mais viver com o seu pai. Ele está tão aborrecido. — Desculpe, eu... — Olhe para mim — a mãe pediu, rindo. — Você mal acabou de entrar e eu já a estou tratando

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como se fosse uma menininha. Estou tão contente que tenha voltado! — Eu também. — Naquele momento, Jacquie se sentia feliz de estar de volta aos braços da mãe. Lembrou-se de Choya, mas ia ter de se acostumar sem ele. — Você parece exausta. Por que não vem sentar? Eu estava acabando de fazer o café para o seu pai. Tome uma xícara. Dirigiu a noite inteira? — Dirigi. — Jacquie riu diante das perguntas da mãe. — O que está acontecendo. Maureen? — O pai apareceu na porta, arrumando a gravata, os cabelos brancos brilhando. Jacquie o olhou, sorrindo, imaginando como podia ter se esquecido de quanto ele era bonito. Ele a viu e parou. — Jacquie... — murmurou baixinho, emocionado. Ela lembrou de toda a discussão que tinham tido antes da sua partida. — Posso voltar para casa, papai? — perguntou humildemente. Ele sorriu e abriu os braços para ela. — Seja bem-vinda, minha filha. Jacquie correu para ele com o mesmo abandono com que Robbie havia corrido para ela. — Oh, papai, lamento tanto! — declarou, soluçando. — Eu também. — Ele lhe deu um beijo no rosto. — Vamos esquecer tudo. Ele sorriu e afastou-a um pouquinho, para olhá-la. — Você ficaria surpreso em saber o quanto eu aprendi, em três semanas — ela disse. — Será que a minha menininha teimosa cresceu tão rápido assim? — Cresci, sim, papai. Cresci muito... — Sentem-se, vocês dois — a mãe pediu. — O café está na mesa. — Ela começou a servir o suco de laranja. — Gostou de Los Angeles? — Não cheguei até lá. — Jacquie tomou o suco, evitando os olhares curiosos deles. — Onde esteve então? — o pai perguntou, curioso. — Cheguei a Tombstone, no Arizona... mas tive um problema com o carro... nada sério. — Viu a mãe suspirar. — Tive de mandar consertar para poder continuar a viagem. Então, perdi a carteira com todo o meu dinheiro e documentos e não podia tirar o carro do mecânico. — Foi quando telefonou para mim? — Cameron Grey perguntou, sacudindo a cabeça. Jacquie fez que sim e ele suspirou. — Eu estava zangado, quando você ligou. Sua mãe e eu tínhamos discutido sobre o modo como eu perdera a paciência, antes de você partir. Depois, fiquei furioso comigo mesmo, porque não consegui descobrir onde você estava. — Eu estava um pouco nervosa. — Jacquie sorriu, sem jeito. — E tinha motivos — a mãe declarou. — Sem dinheiro e sem carro. O que você fez? — Eu... arranjei um emprego. — De quê? — O pai a olhou, curioso. Passando manteiga na torrada lentamente, Jacquie respondeu, sem levantar os olhos. — Cuidei da casa e cozinhei para um fazendeiro.

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— Minha menininha trabalhando de verdade! Devíamos estar lá, Maureen. Devia ser algo digno de ser visto! — Papai está certo. — Jacquie queria manter aquele assunto num tom alegre, evitando que eles fizessem perguntas indiscretas. — Era um lugar lindo. Choya... o Sr. Barnett tinha um fogão monstruoso e antigo. Ele chamava minha comida de jantar incendiado. — E a esposa dele? Era casado? — Maureen perguntou. — Não. Era viúvo e tinha um filho chamado Robbie. Eu gostaria que você o conhecesse, mamãe. Ia se apaixonar pelo menininho. — Parece que você se apaixonou — o pai comentou, feliz. — Sim — Jacquie admitiu. Adorava Robbie tanto quanto amava o pai dele. Deu uma mordida na torrada. — Deve ter sido um emprego bem pago, porque você ganhou o suficiente para pagar o carro e a viagem — o pai comentou. Haveria mesmo um tom de suspeita na voz dele? Ou seria a voz da sua consciência culpada? Jacquie não sabia. — Na verdade, minha carteira foi encontrada com todo o dinheiro. Eu resolvi que queria voltar para casa e aqui estou! — ela explicou. — E o que vai fazer agora? — Cameron Grey olhou-a atentamente. — Pensa em arranjar um emprego e trabalhar? — Eu estava pensando em fazer o último ano da faculdade — Jacquie respondeu. — Pensei que a faculdade fosse uma perda de tempo — o pai disse, brincalhão. — Era, quando eu não sabia se queria aprender aquelas coisas e como iria usá-las. — Ela sorriu, sem estar ofendida nem zangada com a lembrança dele. — Acho que agora, já sei o que quero. Vou dar aulas para crianças. Talvez primeiro e segundo graus, crianças da idade de Robbie. — Minha menininha saiu como uma rebelde e volta como uma mulher. E eu não sei quem é o fazendeiro, mas tenho de agradecer a ele por essa mudança. Espero que um dia possa lhe apertar a mão. Jacquie sentiu que enrubescia. Aquele comentário era verdadeiro. Agora ela era uma mulher apaixonada e não mais uma colegial revoltada. — Eu não estava assim tão ruim, quando parti. — Ela riu, esperando que os pais não descobrissem o motivo do seu embaraço... O pai saiu para o escritório logo depois do café. Jacquie ajudou a mãe a limpar a mesa, conversando muito. Depois, tiraram as coisas do carro e levaram a bagagem para o quarto. — Alguma coisa está errada? — Mauren Grey perguntou, inclinando a cabeça. — Errada? — Jacquie ficou tensa. — O que quer dizer? — Você parece um pouco preocupada... eu acho. — Acho que estou um pouco cansada de dirigir muito e dormir pouco. — Naturalmente, você precisa dormir. Vamos terminar de desfazer as malas mais tarde, filha. Enquanto isso, durma um pouco. Temos muito tempo para conversar.

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— Esta é uma idéia maravilhosa — Jacquie concordou de repente, sentindo que estava mesmo muito cansada. Abraçou rapidamente a mãe. — É bom estar em casa, mamãe! Lágrimas apareceram nos olhos da mulher. — Você não sabe o quanto seu pai e eu a queríamos de volta. Agora durma. — É isso mesmo que vou fazer. O ar de novembro estava frio. Jacquie pegou os livros e desceu do carro. Ia passar outra noite estudando, tentando recuperar o tempo perdido. Sabia que só assim conseguiria afastar as lembranças de Choya. Cada dia que passava, as recordações ficavam mais vivas. Até o momento, ainda não tinha falado aos pais sobre ele, entretanto achava que a mãe suspeitava de que havia algo mais, além da história que contara. Entrou em casa pela porta da cozinha, gritando: — Mamãe, cheguei! Colocou os livros na mesa de jantar e foi até o armário, onde pegou um copo. Depois abriu a geladeira e tirou o leite. A mãe apareceu na porta, sorrindo. — Há alguém aqui que quer ver você, filha. — Quem? — Jacquie perguntou, desinteressada, levando o copo aos lábios. — Um tal de Sr. Barnett, do Arizona. Ele disse que conheceu você lá. Não entendi o primeiro nome dele... é meio esquisito. Jacquie quase engasgou com o leite. — Choya! — Isso mesmo — a mãe confirmou. — O que ele faz aqui? Como sabia onde eu morava? — Sentiu que seu coração batia mais forte, só de pensar que ele estava na sala ao lado. Depois, entrou em pânico. Sabia que não ia se atrever a vê-lo outra vez. — Acho que você deu a ele o nosso endereço — disse-lhe a mãe. — Ele falou que veio vê-la. — Diga a esse homem... — Passou a mão na testa, como se não estivesse conseguindo pensar. — Diga a ele que lamento muito, mas tenho de sair. Estou indo para a biblioteca, para fazer uma pesquisa. Agora, preciso ir. — Colocou o copo na mesa e pegou os livros. — Bobagem. — A mãe segurou-a pelo braço. — Se ele fez esta viagem só para ver você, venha ao menos dizer um alô. — Não, mamãe, por favor! — Jacquie protestou, ansiosa. Maureen Grey parou e franziu as sobrancelhas. — Por que, diabos, está com tanto medo de ver este homem? — Não estou com medo. — A negativa não convencia ninguém. — É que... — Ela respirou fundo e viu que não ia adiantar. Não podia fazer a mãe entender, sem explicar nos mínimos detalhes. — Está bem, acho que dá tempo — disse, cansada. Choya estava de pé, diante do sofá, quando Jacquie entrou na sala com a mãe. Usava a roupa

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tradicional do Oeste, um paletó de camurça marrom com detalhes em camurça bege, e Jacquie achou-o ainda mais bonito do que antes. Ao aproximar-se, com passos trêmulos, sentiu uma onda elétrica percorrendo sua espinha e esforçou-se por enfrentar aquele olhar que parecia hipnotizá-la. Não era a primeira vez que tinha a sensação de estar olhando para um animal perigoso. Ele parecia completamente alerta e Jacquie notou que seus joelhos ficavam fracos. — Como vai, Jacquie? — O tom profundo da voz dele atingiu seu coração. — Bem... — Riu, nervosa. — E você? — Bem... — Ele fez uma longa pausa. — Prometi a Robbie que viria vê-la, quando estivesse aqui. Então, é por causa do filho que ele veio, Jacquie pensou, com tristeza. A leve esperança de que tinha vindo porque a amava logo teve de ser posta de lado. — Oh! — Os olhos da mãe dela brilharam. — Você é o Sr. Barnett, para quem Jacquie trabalhou, enquanto esteve no Arizona? — Sim, eu sou o Sr. Barnett — ele respondeu, sem tirar os olhos de Jacquie. — Agradeço que tenha vindo aqui — Jacquie disse, tensa. — Lamento, mas não posso ficar muito tempo. Tenho muitas coisas a fazer. Eu ia para a biblioteca, quando mamãe me contou que você estava aqui. — Entendo. — Choya suspirou e ficou sério. — Se você conhecesse Jacquie antes de ela ir para o Arizona, nem ia acreditar no quanto ela mudou, desde que voltou — comentou a mãe. — Vivia indo a festas e jogos. Agora só fica estudando. Quase não se diverte. — Mamãe, por favor! — Jacquie murmurou, zangada, virando-se, para fugir do olhar de Choya. — Importa-se, Sra. Grey, se eu falar a sós com sua filha, durante alguns minutos? — Claro que não! — Ela sorriu e fingiu que não via o olhar com que Jacquie lhe pedia que ficasse. — Eu tenho de começar o jantar. Um silêncio pesado invadiu a sala quando a mulher saiu. Jacquie empalideceu e sentiu que seu sangue batia nas têmporas. Caminhou, trêmula, até a janela. — Como você sabia onde eu estava? — perguntou, tentando quebrar o silêncio. — Eu entrei em contato com a sua companhia de seguros e eles me deram o endereço dos seus pais aqui em Dallas — Choya respondeu. Jacquie tinha se esquecido de que havia dado a ele o nome da sua companhia de seguros, para que cobrasse os estragos causados ao jipe. — Telefonei para descobrir se eles sabiam onde você morava e me informaram que era aqui. — Infelizmente, eu não sabia que você viria, senão teria dado um jeito de não aparecer aqui — ela disse. — Foi o que eu pensei — Choya falou, ríspido. Ao ouvi-lo se aproximando, ela virou-se e encarou-o. — Você esqueceu isso. Jacquie olhou para o dinheiro na mão dele. Achou que eram as notas que havia deixado na

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mesinha-de-cabeceira. — É seu. Eu sempre pago minhas dívidas! — ela respondeu. — Eu mereço isto. — Choya respirou fundo, olhando o dinheiro que estava em sua mão. — Você já explicou como conseguiu meu endereço. Só falta explicar qual o motivo que o trouxe à minha casa. — Jacquie desafiou, procurando se afastar, apesar de sentir as pernas trêmulas. — Eu vim para levar você de volta comigo — disse ele, como se aquela fosse a mais corriqueira das frases. Ela levantou a cabeça bem alto. — Por que eu iria com você? — Robbie está sentindo a sua falta. Jacquie sentiu vontade de rir. Mas, no momento seguinte, já estava virando a cabeça para a janela, tentando impedir que ele visse seus olhos cheios de lágrimas. — Quero que volte como minha esposa — Choya disse firmemente, não deixando nenhuma dúvida quanto ao que queria. — Gosto muito de Robbie — ela murmurou, com a voz trêmula —, mas quero mais da vida do que um casamento e ser a madrasta de um menininho. Ele pousou as mãos nos ombros dela e Jacquie não teve forças para se afastar. Fechou os olhos, sentindo um estranho sofrimento com aquele toque. — Eu estava errado quando disse que você significava problemas — ele falou baixinho, perto dos cabelos dela. — O problema é viver sem você, Jacqueline. Ela virou-se para ele, observando sua boca bem desenhada. E, pela primeira vez, Jacquie percebeu o muito de menino teimoso que havia naquele homenzarrão, acostumado a dar ordens e a ser obedecido. Qualquer coisa nos olhos dele lembrava a expressão assustada do filho, quando fora obrigado a se despedir de Jacquie, no rancho. Choya curvou o corpo e abraçou Jacquie, acariciando ternamente seus cabelos. Depois, beijou com delicadeza seus olhos, sua testa, até encostar os lábios nos lábios de Jacquie. De início, o beijo foi terno, doce, quase infantil. Mas, aos poucos, o sentimento forte que os unia incendiou aquele apaixonado contato, transformando-o num beijo louco, incandescente, maravilhoso... Jacquie estremeceu, apertada àquele corpo forte e musculoso. Uma alegria enorme tomou conta dela inteira, que se afastou um pouco, antes que desmaiasse de tanta felicidade. — Deus sabe que eu não pretendia me apaixonar por você — Choya disse, com voz rouca e emocionada. — Mas o pior de tudo foi pensar que você não me perdoaria... — Você disse que Robbie está sentindo a minha falta, não disse? — A cena da despedida, com toda a angústia do menino, voltou à cabeça de Jacquie. Mas aquele não era o momento de ficar triste. — Ele sente falta de você, mas não com a intensidade que eu sinto. Em mim, esta falta vira desespero. Não consigo mais dormir, nem comer, nem nada... sem lembrar de você — ele murmurou, no ouvido de Jacquie. — Eu havia dito para mim mesmo que só estava vindo aqui para ver como você

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estava. Mas... no minuto em que a vi, sabia que tinha de levá-la comigo. Usei Robbie como um pretexto, porque sei que gosta dele. E porque não sabia como começar a conversa. — Eu... eu o adoro e também não posso viver longe de você! — Isso me deixa feliz, mas também envergonhado. Eu a fiz sofrer muito. — Eu o amo, Choya. — A voz dela tremia. — Acho que o amei desde o começo. Era só uma espécie de atração, mas depois virou amor. Este sentimento afastará todas as lembranças tristes. — Você devia ter dito que me amava. — Por que você me deixou partir? Por que não me fez ficar? — Jacquie estremeceu, naquele abraço apaixonado. — Eu me senti o pior dos homens. Não tinha o direito de pedir que você ficasse, nem de forçá-la a ficar. Entretanto, queria que ficasse, mas não conseguia dizer-lhe isso. Mesmo assim, pretendia segurála na última hora. Estou avisando, Jacqueline: nós, os Barnett, sempre conseguimos o que queremos. — Já tive provas disso, meu senhor... — disse ela, sorrindo. — Você aceitaria casar-se com um Barnett? — Apesar de a frase ser uma pergunta, Jacquie percebeu o tom autoritário que caracterizava Choya e não pôde deixar de rir. Estava rindo ainda, quando ele a puxou novamente e recomeçou a beijá-la. Neste momento, a porta da sala foi aberta e surgiu o pai de Jacquie. Por vários minutos o casal demonstrou estar ocupado demais para lhe dar atenção. E o velho Cameron Grey ficou ali, olhando a cena, com crescente espanto. Por fim, resolveu chamar a atenção dos dois. — O que é isso? Estão ensaiando alguma cena de filme? Choya interrompeu um de seus beijos, mas não largou a cintura de Jacqueline. Virou-se para o velho. — Não, senhor. Esta cena é muito real para ser de filme. Eu amo sua filha e vim buscá-la. Ela vai para o Arizona comigo. Cameron piscou o olho, procurando disfarçar o espanto. Sem saber o que pensar direito, concluiu que estava diante de um sujeito tão teimoso quanto sua teimosa filha. Por isso o espanto foi de Jacquie e Choya, quando o ouviram dizer, como se falasse consigo mesmo: — Vocês vão se dar muito bem... Jacquie correu para o pai e falou, brincando: — E se eu lhe disser que este homem é um monstro, que me torturou e me maltratou durante todo o tempo em que estive em sua casa? — Eu vou responder que você gostou da tortura, porque nunca vi seus olhos tão brilhantes, nem seu sorriso tão alegre... Choya puxou Jacqueline, dizendo-lhe: — Não adianta, meu amor, já conquistei seus pais. Você está perdida. Só resta casar-se rapidamente comigo. — As primeiras palavras foram ditas em tom de brincadeira, mas a voz de Choya foi ficando séria, à medida que falava. — Prometo que vou amá-la para o resto da minha vida!

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FIM

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