Relatorio tratamento fonte rossio

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RELATÓRIO DE TRATAMENTO DE CONSERVAÇÃO E RESTAURO

FONTE DO ROSSIO

Tratamento de Conservação e Restauro executado por: Fundação Robinson – Laura Portugal Romão (Conservadora-Restauradora) Com a colaboração da

Câmara Municipal de Portalegre

Abril/Maio 2015


CONSERVAÇÃO E RESTAURO

RELATÓRIO DE TRATAMENTO FONTE DO ROSSIO Largo do Rossio – entre Rua 1º de Maio e Rua 31 de Janeiro

Data de tratamento: Abril/Maio 2015 Data do relatório: 14 de Maio 2015 Técnico responsável: Laura P. Romão

DESCRIÇÃO: Data: 1865 Autor: Oficina de Germano José Salles1 Matéria: mármore amarelo com veios rosa2

Fonte em estilo Neoclássico. O tanque e passe encontram-se endossados à fachada do edifício, sobre uma escadaria de seis degraus circulares em granito. A imagem está afastada cerca de 50 centímetros da parede do edifício. Tem um tanque bilobulado e espaldar com dois painéis com moldura simples e carrancas centrais, também em pedra (onde estão colocadas as duas bicas), separados por uma pilastra de secção rectangular. Sobre estes elementos tem um friso onde assenta um frontão abatido com volutas, peanha central, onde se encontra gravado “CM 1865”. No topo desta pilastra encontra-se uma escultura da Leda e do Cisne (Zeus). (Foto 1) Tem na parte superior da face esquerda a inscrição “Fez Germano. Rua do Arsenal nº 136. LX” (foto 2)

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Germano José de Salles (séc.XIX) foi um escultor português, dono das oficinas Germano José de Salles & Filhos (que se situavam na Rua do Arsenal, 136). Esculpiu várias obras em Portugal e no estrangeiro, tais como a estátua de D. Pedro IV no Rossio, o pedestal da estátua do Marquês Sá da Bandeira na Praça D. Luís em Lisboa, o Escudo Nacional da Gare da Estação Central dos Caminhos de Ferro de Maputo em Moçambique, a estátua do Bocage em Setúbal, e a Estátua de Leda e o Cisne no Mercado Municipal D. Pedro V - Camara Municipal do Funchal (muito semelhante à escultura da fonte do Rossio). 2 Aparentemente Crema Valência (Espanha) 2


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DOCUMENTAÇÃO FOTOGRÁFICA:

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DADOS HISTÓRICOS:

A sua localização original foi o Largo de Santiago e foi transferida para o Rossio em 1889. Nesta data foram colocados dois bebedouros para animais, um de cada lado da fonte, cujos espaldares em mármore branco, ainda permanecem no local e tem gravado “CMP 1889”. Entre 1954 e 1960 estes bebedouros foram substituídos por bancos, permanecendo os espaldares dos tanques, que t. Será provavelmente também desta altura a redução do caudal do tanque. A fonte era abastecida com água da nascente que brotava em frente ao Hospital da Misericórdia (segundo informação do Sr. José Garção). Actualmente está ligada à rede pública. Apesar das diversas obras a que o edifício foi sujeito, a fonte permaneceu sempre no local. Em 2013, aquando de mais uma intervenção no edifício, a parte superior da fonte foi retirada, tendo sido reposicionada agora. Esta situação levou à intervenção de todo o conjunto que se encontrava em relativo mau estado de conservação

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DOCUMENTAÇÃO FOTOGRÁFICA:

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1888

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1954

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Anos 60

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2012

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2013

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2015

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ESTADO DE CONSERVAÇÃO:

Estado geral

A fonte encontrava-se num estado de conservação razoável, atendendo ao seu historial. (foto 10) Verificava-se um escurecimento acentuado na área sob as bicas devido à corrosão acentuada da pedra nesta área, que permitiu o desenvolvimento de líquenes e musgos. Devido a este mesmo desgaste, toda a zona foi preenchida com uma grande quantidade de massas e cimentos, alterando de forma desastrosa o aspecto da superfície. (fotos 10 a 12) De uma maneira geral a pedra apresentava um elevado índice de desgaste/corrosão geral, apresentava concreções calcárias, tendo perdido completamente o seu polimento e até a sua cor original. (foto 13 e 14) As juntas de união dos diferentes elementos foram fechadas com uma massa de preenchimento castanha, que transpunha muito a área a preencher e se estava bastante escurecida. (foto 15) A argamassa branca utilizada nas juntas do tanque, encontrava-se bastante envelhecida com algumas fendas e lacunas, tendo perdido o poder vedante, o que permitia a perda de água e o desenvolvimento de matéria viva nas paredes do tanque. (foto 16) Toda a superfície apresentava sujidade depositada e aderente negra, com maior incidência na escultura. (fotos 17 e 18) Falta parte inferior do bico do cisne e dois dedos da Leda. (foto 19) Apresentava lacunas nalguns cantos e arestas (foto e 20). Na área de colocação das bicas verificava-se a aplicação de cimento (bica da esquerda) e argamassa branca (bida da direita). (fotos 21 e 22)

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A grade de protecção de saída de águas, em ferro, era desproporcionada para a o respectivo orifício de escoamento, foi cimentada grosseiramente à pedra original e apresentava um estado avançado de corrosão. (foto 23) Originalmente a fonte teria uma grade metálica de apoio sob as bicas, que foi removida tendo ficado os orifícios abertos, com restos de metal (oxidado) no interior. (fotos 24 e 25) Os elementos metálicos de reforço de união das partes do tanque encontravam-se bastante oxidados. (foto 26) As juntas dos degraus e a junção do tanque à base apresentavam-se sem material de preenchimento. (foto 27)

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REGISTO FOTOGRÁFICO: aspecto geral antes do tratamento

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REGISTO FOTOGRÁFICO: alguns pormenores relativos ao estado de conservação

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TRATAMENTO REALIZADO: Transporte dos A escultura da Leda e do Cisne, os dois elementos do frontão abatido com elementos volutas e a peanha central foram retirados do local durante as obras do retirados edifício de forma a salvaguarda-los. Ficaram em reserva nas Oficinas Municipais e foram devolvidas ao seu local de origem quando se verificaram existir as condições de segurança necessárias para a sua recolocação.

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Remoção do cimento e argamassas antigas

Os elementos referidos apresentavam ainda os materiais de colagem antigos, (essencialmente cimento) pelo que houve a necessidade de os remover. Tratou-se de uma operação mecânica, recorrendo a escopo e maço, executada com o máximo cuidado de forma a não “ferir” a pedra original.

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Limpeza de sujidade aderente

Por uma questão de facilidade de acesso, os quatro elementos foram limpos apenas com jacto de água, antes de serem recolocados, de forma a remover a sujidade maior.

Reposicionamento

Depois da primeira limpeza, os elementos foram colocados no seu lugar com auxílio de uma grua. Os espigões metálicos existentes foram reaproveitados e as juntas foram fechadas com cimento branco.

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Limpeza

Numa primeira faze, toda a superfície foi limpa com jacto de água, seguindo-se a limpeza de toda a superfície, utilizando produtos químicos, com maior incidência na zona sob as bicas, que se encontrava bastante escurecidas. Todas as concreções calcárias, argamassas e cimentos foram removidos de forma mecânica. Esta limpeza restituiu a cor original do mármore.

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Remoção do barramento em cimento

Devido ao acentuado desgaste da pedra, toda a zona inferior foi cimentada numa intervenção anterior. Uma vez que este barramento era excessivo, ocultava completamente a pedra e não apresentava qualquer vantagem funcional, foi removido.

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CONSERVAÇÃO E RESTAURO

Nivelamento da área mais degradada.

Após a remoção do cimento verificou-se, tal como esperado, que a área se encontrava muito irregular. De forma a evitar no futuro o acumular de sujidade e desenvolvimento de microorganismos optou-se por polir esta área, restabelecendo assim o aspecto original.

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Tratamento das juntas do tanque

Uma vez que as massas de preenchimento das juntas do tanque se apresentavam bastante envelhecidas, com perdas de material, fendas e fissuras, não cumprindo convenientemente a sua função, deixando sair a água, foram substituídas. As juntas foram preenchidas internamente com cimento e à superfície levaram uma camada de resina epóxida com pó de mármore, que foi posteriormente polida. Desta forma obteve-se uma união de juntas resistente e mais integrada cromaticamente.

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Substituição da grelha de escoamento de águas

A grelha de ferro que se encontrava sobre o orifício de saída das águas apresentava diversos problemas. Por outro lado o cimento utilizado para a sua fixação, além de desadequado e inestético, excedia muito a área de fixação. Tal como os restantes cimentos, também este foi removido. Uma vez que a grelha em questão já não era original, era sobredimensionada para o orifício de escoamento (5 cm de diâmetro) e se encontrava em mau estado, optou-se por substitui-la por uma nova grelha, pelo que foi retirada. Verificou-se então que o orifício de saída das águas se encontrava muito recuado e elevado, tendo sido por isso acrescentado, e a área envolvente nivelada com uma camada interna de cimento e resina époxida à superfície. Colocou-se então uma nova grelha, também em ferro, mais pequena.

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Reestruturação As lacunas de menor dimensão e as fendas foram colmatadas com resina formal de áreas epóxida, e nos casos de maiores dimensões utilizou-se pó de pedra como de lacunas carga. Todos os preenchimentos foram realizados sem ultrapassar os limites das áreas a preencher, foram polidos e são perfeitamente discerníveis.

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Preenchimento da zona envolvente das bicas

Na área de colocação das bicas verificava-se a aplicação de cimento na bica do lado esquerdo e argamassa branca na bida do lado direito. O primeiro apresentava-se pouco estético e excedia o limite de preenchimento necessário e o segundo apresentava-se em mau estado de conservação, pelo que se optou por preencher também estas áreas com resina epóxida.

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Rectificação A inscrição na base da escultura “CM 1865” apresentava falhas de tinta e quando da inscrição observada de perto verificou-se que a coloração a negro transpunha muito a incisão feita na pedra, pelo que se procedeu à sua pintura e rectificação.

Tratamento Sobre toda a superfície de pedra foi aplicada uma camada de óleo de linho final incolor, de forma a uniformizar a superfície, minimizar o efeito do desgaste da pedra e aumentar a sua impermeabilização.

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ESPALDAR DOS BANCOS

Os espaldares dos bancos, que em 1889 faziam parte dos dois bebedouros para animais, um de cada lado da fonte, foram também limpos. O da esquerda apresentava um grafitti, que foi retirado. Foi também aplicado o óleo de linho nos dois.

Instalação eléctrica

O sistema de alimentação eléctrica do foco que ilumina a fonte foi alterado, de forma a reduzir a instalação junto à fonte. Desta forma transferiu-se a caixa eléctrica e toda a tubagem para a parte superior, ficando “invisível”.

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Pormenores antes, durante e depois dos trabalhos:

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Aspectos gerais durante os trabalhos:

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Aspectos gerais durante os trabalhos:

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CONCLUSÕES:

Todas as obras de arte possuem identidade e vida próprias, depois de executadas pelos artistas vão testemunhando e absorvendo um conjunto de experiências e de vivências, que se reflectem em alterações. Este facto acentua-se mais ainda quando se trata de uma obra utilitária, como é o caso de uma fonte que durante 150 anos forneceu água à população.

Quanto estas alterações se reflectem em problemas de funcionalidade e perda de leitura do conjunto há a necessidade de intervir sobre o objecto. Um tratamento de conservação e restauro não tem como objectivo restituir a aparência original da obra, uma vez que uma intervenção de restauro a esse nível apagaria a sua história, contrariando a actual ética profissional. Assim, qualquer intervenção deve ser essencialmente conservativa, regida por critérios de intervenção mínima, compatibilidade e reversibilidade dos materiais e discernibilidade das técnicas a utilizar, de forma a retardar o processo de envelhecimento e restituindo à obra a sua estabilidade química/física e a harmonia estética estritamente necessária para uma correcta interpretação e leitura da composição artística.

Foi com base nestes critérios que se procedeu à intervenção na Fonte do Rossio. O presente trabalho foi realizado numa parceria entre a Fundação Robinson e a Câmara Municipal de Portalegre. A empresa MJR (que fez a obra do Hotel José Régio) colaborou na remontagem das peças que foram retiradas. Verificou-se ser uma mais valia trabalhar em cooperação, pois desta forma rentabilizam-se meios técnicos, materiais e humanos.

Embora a fonte se encontrasse num estado de conservação razoável atendendo ao seu historial, apresentava várias patologias destacando-se o desgaste com significativa alteração cromática – todo o conjunto estava completamente branco, tratando-se no entanto de mármore “Crema Valência”. Constatou-se também que os espaldares dos bancos, esses sim, são de mármore branco.

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Bastante significativa era também a alteração na zona inferior, com desgaste acentuado da pedra, alteração cromática e adição de cimentos e argamassas, que perturbavam de forma significativa a leitura do todo. O envelhecimento das juntas de união, principalmente no tanque reflectiam-se em perda de funcionalidade, deixando verter a água. A intervenção actual vai permitir que a fonte volte a funcional com toda a sua plenitude, voltando a ser um símbolo emblemático daquela zona da Cidade.

Portalegre, 14 Maio 2015 Técnica Superior de Conservação e Restauro

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