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PRÁTICAS CRIATIVAS NO DESIGN GRÁFICO CONTEMPORÂNEO
SIMONE PEREIRA DE ASSIS
PRÁTICAS CRIATIVAS NO DESIGN GRÁFICO CONTEMPORÂNEO Copyright© 2017, Yellow Editora. 1 edição, 2017 Nesta edição respeitou-se o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa PROJETO GRÁFICO
Izabel Mendes Paulo Lopes Samara Amorim COORDENAÇÃO
Tadeu Costa
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) A867p Assis, Simone Pereira de Práticas criativas no design gráfico contemporâneo / Simone Pereira de Assis - 1° ed. - São Paulo, 2017. 124f.: il. ISBN 978-85-7232-8432 Orientador: Tadeu Costa. Coorietador: Gisela Belluzzo. Dissertação (Mestrado - Design Gráfico) -- Universidade Anhembi Morumbi, 2011. Bibliografia: f.100-106. 1. Design gráfico. 2. Criatividade - Conceito. 3. Autoria - Design. 4. Design autoral. Título. 12-01290
Este livro foi escrito por Simone Pereira de Assis para sua dissertação de mestrado apresentada em 2011 ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi
YELLOW EDITORA Av. Roque Petroni Júnior, 676 – Cidade Monções CEP 04707-000 – São Paulo – SP Tel.: 1234-5678 contato@yelloweditora.com.br www.yelloweditora.com.br
CDD-869.93
CRIATIVIDADE
16 Conceitos de criatividade 22 Potencial criativo 26 Processos criativos 30 Técnicas para ampliar a criatividade
MÉTODO
36 Caminhos de sistematização 42 Designers e suas trajetórias
AUTORIA
54 Concepções de autor e autoria 58 Concepções de design gráfico 60 Autoria no design 82 Design autoral e os novos designers 93 CONSIDERAÇÕES FINAIS 97 BIBLIOGRAFIA
ANEXO
S U M Á R I O
08 INTRODUÇÃO
104 Lauro Machado 108 Felipe Guga 112 Bruno Dellani 114 Marco Cherfêm 118 Juliana de Campos Silva 122 Colletivo
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IN TRO DU ÇÃO 9
O foco desta dissertação é a produção de design gráfico autoral e esta como um meio de exercício do processo criativo e da elaboração de metodologias de trabalho. Entende-se como design autoral o desenvolvimento autônomo e independente de trabalhos de design. O designer, enquanto cria seu produto, segue e/ou estabelece parâmetros que o conduzem a decidir por este ou aquele caminho. Julga continuamente seus resultados durante esse processo de construção, através de diálogos com sua produção e/ou com a produção de outros designers. Acreditamos que a construção desses caminhos pode envolver preocupações com a funcionalidade e com o público alvo, ou mesmo outras questões solicitadas pelo briefing de cada projeto. Por meio de depoimentos e trabalhos de designers gráficos escolhidos e outros já estabelecidos e reconhecidos como referência nesta área, buscamos identificar, reconhecer, relatar e demonstrar a importância do fenômeno do design autoral para o desenvolvimento da reflexão na criação e nas práticas da área. Usamos como critérios de escolha designers gráficos cuja produção é autoral. Procuramos também, abranger três diferentes configurações de trabalho:
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E STÚDIO FRE E L ANCE R
são grupos, muitas vezes multidisciplinares, onde os projetos são desenvolvidos partindo da interação entre os profissionais. O desenvolvimento dos projetos é feito conjuntamente, buscando uma visão do grupo e não de um individuo.
COLE TIVO
espaço destinado à criação onde existe uma interação com outros designers, no entanto, o desenvolvimento de projetos acontece de maneira isolada. Muitas vezes por possuir grandes clientes comerciais, desenvolve vários trabalhos paralelos, conduzidos por um diretor de arte.
do inglês Freelance, profissional que trabalha por conta própria, prestando serviços de caráter temporário ou ocasional, sem estar vinculado a uma entidade patronal; trabalhador independente.
Pretendemos elucidar como o designer pode exercitar a criatividade e resolver problemas apoiado na produção autoral. Para realizar essas análises escolhemos critérios que julgamos pertinentes à área do design. Esta dissertação não tem o intuito de criar regras teóricas para o design, mas sim considerar e avaliar como o fenômeno do design autoral pode alargar as possibilidades de composição do pensamento criativo. Visto que o designer é concomitantemente criador e primeiro interpretante de seu produto, toda a bagagem de trabalhos realizados por ele, bem como as diretrizes sociais e culturais do meio onde está inserido, são elementos importantes que serão usados em suas experimentações em busca da construção de linguagem. É no processo autoral que o designer terá oportunidade de refletir sobre esses fatores de forma mais clara. Esta prática vem de encontro às teorias sobre criação e criatividade. 11
No primeiro capítulo buscamos discutir questões relacionadas à criatividade, já que acreditamos que esta é diretamente ligada às questões de autoria no processo. Iniciamos este capítulo conceituando o termo e buscando suas origens. Discutimos também conceitos pré-estabelecidos, muitas vezes até enraizados de maneira equivocada no que diz respeito à personalidade criativa, seu estímulo e desenvolvimento. Para a elucidação do processo criativo buscamos autores, artistas e designers que discutem sobre o desenvolvimento de suas próprias práticas e de outros designers relevantes ao trabalho. O trabalho do designer tem como algumas de suas premissas a versatilidade, a eficiência e a criatividade no desenvolvimento de projetos. O design autoral se mostra como um fenômeno que explora as possibilidades, pois não possui limites criativos. O desenvolvimento de trabalhos de forma autônoma pode incentivar o uso consciente de procedimentos muitas vezes aprendidos e utilizados de forma mecânica. Não obstante, prática do design autoral faz com que o designer explore seus próprios métodos, desenvolvendo e elaborando novas técnicas de trabalho. O design é uma atividade interdisciplinar, que pode agregar ao seu processo de trabalho, diversas áreas do conhecimento. Por este motivo, a aplicação de um método sistemático para a área do design, apresenta-se como uma tarefa complexa. O método, em sua aplicação prática é diretamente influenciado pelo objeto e pelo designer, assim, variáveis como cultura e fatores tecnológicos podem alterar os procedimentos do designer na busca de resultado de seu método. O segundo capítulo, Métodos, inicia-se tratando da etimologia do termo e dos fatores que levam à sistematização do trabalho. Fazemos também uma breve explanação de alguns métodos utilizados e estudados por designers e pesquisadores. No terceiro capítulo, partimos de análises pertinentes ao universo da palavra escrita para iniciar discussões referentes ao autor e à autoria dentro do design. Após sua criação, a peça de design espalha-se por um âmbito sem limites. Assim como na literatura, o objeto de design, seja este gráfico ou de produto, é influenciado pelo meio no qual se origina. O designer como parte da sociedade e da cultura em que está inserido, tem sua visão das possibilidades e do destino do objeto diretamente influenciadas pelo meio em que vive. Devido à maior concentração de nossas pesquisas na área do design gráfico, consideramos pertinente a delimi12
tação do termo. Com os termos delimitados, partimos às considerações quanto à autoria especificamente na área do design. Na busca de trazer esta prática a uma realidade palpável, apoiamos nossas questões em exemplos reais e atuais da prática do design. Percebendo uma afinidade dos trabalhos desenvolvidos pelos novos designers com as técnicas pós-modernistas, buscamos na história uma aproximação do pós-modernismo com design autoral. Depoimentos de designers brasileiros já reconhecidos também são relevantes para a conceituação do tema dentro do contexto social e econômico em que estamos inseridos. Ao final fazemos nossas considerações quanto à pesquisa e entrevistas realizadas. Acreditamos que o estudo sobre a relevância da prática do design autoral para o desenvolvimento de projetos ainda é um tema pouco explorado. Pretendemos contribuir com a elucidação desta importante questão.
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CRI
A TI VI DA DE 15
1.1
CONCEITOS DE CRIATIVIDADE
Existem diversos conceitos para o termo criatividade. Segundo Solange Wechsler (1993), autora de numerosos estudos sobre o tema, a criatividade “tem sido estudada e definida de diversas maneiras, o que sugere a existência de um fenômeno complexo, com múltiplas facetas” (p. 01). Eunice Alencar (1993) concorda com Wechsler e defende que algumas dessas definições são até mesmo antagônicas. Entretanto, um ponto comum entre as diversas definições está na afirmação de que a criatividade estabelece uma nova coerência entre os elementos, ou novas formas de relacionar os fenômenos, bem como compreender os termos, os produtos e as ideias decorrentes de uma dada situação que até então não haviam sido relacionados (OSTROWER, 1987; ALENCAR 1993; WECHSLER 1993). A discussão sobre as definições do termo criatividade apresentam algumas ideias preconcebidas e enraizadas culturalmente, quanto às características do indivíduo e do processo criativo. Entre elas estão: a crença na criatividade ligada a um dom divino; qualidade com a qual o indivíduo nasce e não pode ser ensinada ou exercitada; momento sobrenatural de inspiração inexplicável. Alguns autores como Witty e Lehman (apud ALENCAR, 1993, p.16), chegam até a associá-la à loucura, sugerindo uma relação entre criatividade e doença mental. Pesquisas que se dedicaram à investigação de aspectos relacionados à criatividade demonstram que ela é algo inerente ao ser humano e pode ser desenvolvida e aprimorada atra16
vés de prática e de treino. O desenvolvimento do potencial criativo é diretamente influenciado pelas condições socioculturais em que o indivíduo está inserido. As capacidades de associação, organização e análise também são influenciadas pelo meio e estão diretamente ligadas à criatividade. Podemos perceber a ligação do designer com seu entorno no relato do designer Lauro Machado (2010), do Estúdio Insólito, um dos designers entrevistados, que tem como espaço de trabalho o estúdio. Formado pela UFRJ, durante a faculdade participou de projetos de orientação e sinalização do hospital universitário Clementino Fraga Filho. Trabalhou na 20/01, escritório dirigido por Jair de Souza, desenvolvendo trabalhos para o Comitê Olímpico Brasileiro, Companhia Vale do Rio Doce e outros clientes da área cultural; trabalhou também na Ana Couto Branding & Design, onde participou do desenvolvimento de uma nova identidade visual para o Unibanco. Com mais dois sócios, Jamil li Causi e Rafael Saraiva, trabalhou na Necas, empresa que surgiu informalmente, como um grupo de produção multidisciplinar que envolvia poesia, literatura e artes visuais. No início de 2005 nasceu a vertente comercial da Necas, após a saída de Rafael Saraiva, cria junto com Jamil o Estúdio Insólito. O novo escritório, assim como o antigo, tem como base a diversidade na elaboração dos projetos, tanto formal quanto conceitual. Atualmente desenvolve projetos diversos para clientes institucionais como também para o mercado editorial. Segundo Machado, a vida cotidiana, os elementos da contemporaneidade, as pessoas e experiências de vida são o que o inspiram. Quando questionado sobre influências no processo de criação, afirma que a percepção dos fatores sociais, culturais e até mesmo linguísticos faz parte do processo. Estar imerso em uma cultura ou paisagem e não ser influenciado por ela é, segundo ele, muito difícil. Fayga Ostrower assinala que é também de igual importância para o potencial criativo a preparação do indivíduo, seu conhecimento e dedicação a uma determinada área do saber, além da necessidade de conhecer os meios de criação.
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A autora exemplifica com a atividade artística, porém este exemplo se aplica a qualquer indivíduo e a qualquer situação:
“É evidente que, além de saber o que faz, o artista tem que ‘saber fazer’. Ele tem que conhecer sua linguagem [...] Portanto, só vai poder fazer uma poesia em chinês quem souber o chinês; só vai dar um concerto de violino quem souber tocar violino; só vai fazer gravura, quem dominar o artesanato da gravura; só vai poder criar em pintura quem souber pintar.” (OSTROWER,1990, p.228)
O designer Rafic Farah (YONAMINE, s/d), acredita que a criação depende muito do repertório do designer, e de seu conhecimento histórico do contexto onde está inserido. O designer deve conhecer seu contexto histórico para o melhor desenvolvimento de seu trabalho. Ele acredita ainda que o trabalho do designer seja equiparado ao seu discurso, portanto, reflexo de seu conhecimento. Outros autores como Maslow (apud ALENCAR, 1993) salientam que “a criatividade necessita não apenas de iluminação e de inspiração; ela necessita também de muito trabalho, treino prolongado, atitude criativa, padrões perfeccionistas” (p. 17). Segundo o designer Lauro Machado (2010) a busca por aprendizado e aperfeiçoamento deve ser constante, e o amadurecimento do trabalho é fruto de exercício contínuo, de estudo, esforço e dedicação. Juliana de Campos Silva, arquiteta e urbanista graduada pela FAU/USP em 2007, entrevistada para esta pesquisa, já trabalhou com design de mobiliário e objetos na loja-atelier ,Ovo e com design editorial na Editora 34. Atualmente trabalha com a também arquiteta e artista plástica Carla Caffé em seus projetos gráficos, com elaboração de composições, tratamento de imagens, preparação de arquivos para impressão e desenho de caligrafias em originais, também desenvolve trabalhos com a TC Urbes, escritório de planejamento e projetos urbanos, onde é 18
responsável pela identidade visual e produtos de comunicação, como o website, os folders e outras publicações impressas. Juliana de Campos Silva (2011) afirma que o design autoral é um exercício para a criatividade e que a criação não é sempre algo prazeroso. Segundo Juliana, o caminho percorrido pelo designer, das primeiras ideias ao produto final, pode ser bastante penoso. Essa visão reforça a ideia de que a prática e o trabalho constante sobre o que está sendo produzido são intrínsecos ao processo de criação. O designer trabalha diariamente com o conhecimento técnico atrelado à prática e à criatividade para desenvolver processos criativos. O designer Rico Lins (YONAMINE, s/d), acredita que tanto o conhecimento técnico quanto o teórico são muito importantes. Para ele o design tem uma “natureza transversal” já que transpassa e dialoga com outras áreas, funcionando como fio condutor para o processo de criação. Sendo assim, é importante que o designer tenha capacidade de contextualizar a informação da maneira mais ampla possível. Alguns estudos buscam pelo viés do processo criativo discutir o ensino da criatividade. Donis A. Dondis (2003) acredita que através do alfabetismo visual, – desenvolvimento das habilidades necessárias para o uso e compreensão da linguagem visual – pode desenvolver a inteligência humana, aumentando o potencial criativo. Segundo a autora “a inspiração súbita e irracional não é uma força aceitável no design” (DONDIS, 2003, p.136). Ilustração de Rico Lins. 2017
Através da inteligência visual controlam-se os meios visuais. Conhecendo as ferramentas de trabalho alcançamos o domínio de como devemos proceder na solução de problemas. A criatividade estaria, dessa maneira, em nossa capacidade de manipular este conhecimento no processo criativo e propor novas conexões. Um exemplo desta prática pode ser dado pelo trabalho do designer Bruno Dellani (2010), que em seu portfólio retrabalha projetos comerciais, fazendo sua própria versão do material. Utiliza texturas que havia desenvolvido para briefings comerciais misturando as ideias em que estava trabalhando para diversas peças e criando algo novo. Dellani acredita que o desenvolvimento de trabalho autoral é um exercício para a criatividade e um auxílio para o exercício da pesquisa, ajuda a misturar ideias e a criar conexões entre diferentes temas, tendo sempre em vista, é claro, o cuidado com as prerrogativas em atender às necessidades comerciais do projeto. Existem também autores que tratam a criatividade como parte da personalidade do ser humano. Segundo Harold Anderson H., no livro “Creativity And Its Cultivation” (1959), quando pensamos em criatividade, acabamos na maioria das vezes por associá-la a produtos criativos, a objetos palpáveis que possam ser estudados e apreciados, no entanto, existe outro tipo de criatividade que não necessariamente está contida em um objeto. A criatividade pode também estar nas relações humanas, sociais ou psicológicas, para tanto, Anderson (1959) afirma que é necessário, entre outros fatores, a capacidade de se relacionar com o outro. Ele trata de uma criatividade onde o sujeito admite a individualidade e ao mesmo tempo respeita a singularidade do outro. O autor também trabalha com o conceito de “confrontamento” que significa um processo de relacionamento em que o comportamento ou a presença de um organismo faz diferença no comportamento do outro. É um processo de duas vias de comunicação entre os indivíduos, onde a interação das diferenças gera um crescimento. Para exemplificar seu pensamento, o autor aponta a relação biológica entre o óvulo e espermatozoide. Durante a fecundação o espermatozoide torna-se um com o óvulo e vice-versa. O autor fala de uma integração de diferenças que originam o surgimento de um original. Ilustração de Bruno Dellani. 2017
A integração das diferenças é por definição, segundo o autor, o surgimento de um original, a criação de algo diferente. Nesse sentido o crescimento é um processo de criatividade. Se transpusermos o exemplo biológico dado pelo autor para o campo social, podemos pensar em indivíduos diferentes, que em interação podem aprender um com o outro e dar origem às novas ideias. Esse pensamento pode nos levar à discussão sobre a criatividade em grupos de design coletivo. Podemos pensar em cada indivíduo do coletivo como uma célula que em interação umas com as outras dão origem a novas ideias. Para que essa interação aconteça é necessário que cada um admita e respeite não apenas a individualidade do outro, não obstante a sua própria singularidade. Outrossim, criatividade e autoria tornam-se totalmente interdependentes também dentro de coletivos de design.
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1.2
POTENCIAL CRIATIVO
Todas as pessoas nascem com potencial criativo, em diferentes níveis de desenvolvimento, que variam de acordo com fatores sociais, culturais e cognitivos. Fayga Ostrower (1987) afirma que a natureza criativa está profundamente relacionada ao contexto cultural do indivíduo. A autora defende que o criar e o viver estão intimamente ligados. Algumas pessoas têm profundos conhecimentos em determinas áreas e conseguem dentro deste contexto ter ideias criativas; no entanto, existem também indivíduos que são capazes de ser criativos transitando por áreas de conhecimento com as quais não tinham uma afinidade prévia. Pesquisas buscam desvendar o que torna esses indivíduos diferentes, o que define a personalidade criativa. Alencar (1993) cita um programa de pesquisa na área criativa desenvolvido por MacKinnon e Barron, através de investigações sobre traços de personalidade, fatores ambientais e intelectuais de diversos grupos de pessoas consideradas mais criativas. Traços semelhantes foram observados por Barron e MacKinnon, alguns deles são:
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AUTOCONFIANÇA E INDEPENDÊNCIA
PERCEPÇÃO DE SI MESMO
ESPONTANEIDADE
SENSO DE HUMOR INTUIÇÃO
Segundo os autores as experiências de vida e as características de personalidade mostraram-se intrínsecas, gerando assim uma riqueza na capacidade de percepção. Cecília Salles (1998) define percepção como a capacidade de sentir e compreender; são ordenações das sensações que atingem o nível consciente e permitem que aprendamos sobre o mundo, o homem e nós mesmos, abrangendo o ser intelectual. A sensibilidade atua no decorrer de todo esse processo. Segundo Salles (1998) “a criação parte de e caminha para as sensações e, nesse trajeto, alimenta-se delas” (p.53). O processo cognitivo, mais especificadamente a percepção, está diretamente relacionado com o modo como o indivíduo vê, percebe e registra a informação. Também a forma como irá articular seus conhecimentos na geração de novas ideias atrelada a isso. Designer freelancer, formado em Design de Produto pela PUC-Rio em 2004, Felipe Guga já criou estampas para marcas como Aüslander, Redley, Isabela Capeto e Farm; têm trabalhos espalhados por revistas, como por exemplo, Capricho e Super Interessante, além de toy arts e pôsteres, não gosta de definir ou segundo ele rotular seu trabalho. Segundo o designer, a área em que consegue maior liberdade de criação é na estamparia, por isso, grande parte de seu trabalho é na área de moda, desenhando estampas para várias marcas de roupa do Brasil e uma do exterior. Seus desenhos contemporâneos, coloridos e muitas vezes engraçados, são feitos com nanquim e recursos de Photoshop. Seus desenhos já foram vendidos na Galeria Lafayette, em Paris. Era proprietário de uma marca de camisetas, chamada Limonada, vendida em algumas multimarcas do Brasil. O designer Felipe Guga (2010) fala a respeito da percepção como via que possibilita a descoberta de coisas novas que serão usadas no processo criativo. Ele afirma não conseguir fazer apenas uma ilustração bonita, pois está sempre pensando em um conceito, em uma mensagem, que de preferência seja positiva, de uma maneira bem humorada. 23
Estas descrições a respeito da personalidade criativa ressaltam a importância da capacidade de relacionar ideias, bem como da fantasia e do humor. Dondis (2003) também ressalta em seu trabalho a importância do estado mental e do humor no ato criativo. Outros traços como a curiosidade e habilidade de questionar, também são lembrados
1. A GESTALT é uma Escola de Psicologia Experimental. Considera-se que Von Ehrenfels, filósofo vienense de fins do século XIX, foi precursor da psicologia da Gestalt. Mais tarde, por volta de 1910, teve seu início mais efetivo por meio de três nomes principais: Max Wertheimer (1880/1943), Wolfgang Kohler (1887/1967) e Kurt Koffka (1886/1941), da Universidade de Frankfurt. O movimento gestaltista atuou principalmente no campo da teoria da forma, com contribuições relevantes aos estudos da percepção, linguagem, inteligência, aprendizagem, memória, motivação, conduta exploratória e dinâmica de grupos sociais. Através de numerosos estudos e pesquisas experimentais, os gestaltistas formularam suas teorias acerca dos campos mencionados (GOMES, pág.18, 2003).
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Wertheimer, (apud ALENCAR, 1993) um dos teóricos que propuseram os fundamentos da psicologia da Gestalt¹, tem pesquisas relacionadas ao pensamento produtivo, que apresenta alguns aspectos que podem ser considerados como pensamento criativo. Para a Gestalt, um problema existe quando existe tensão, que é resultado da interação de fatores perceptuais e da memória, e para resolvê-lo é necessária uma reestruturação do campo perceptual, que é a relação entre percepção e pensamento. Os gestaltistas relacionam ainda a criatividade com insight (o momento de iluminação quando surge a solução). Pesquisadores como Guilford (apud ALENCAR, 1993) e Torrance (1974), investigaram os traços intelectuais e estilos cognitivos presentes em indivíduos ditos altamente criativos. Guilford desenvolveu inúmeros estudos relacionados à criatividade e sua relação com outras habilidades cognitivas que contribuem para o pensamento criativo. Ele chama a atenção para a mudança de categoria de pensamento, que nada mais é que uma mudança de algum tipo, como por exemplo, de significado, interpretação ou uso. Também são lembradas por ele a suscetibilidade, a fluência, a flexibilidade, a originalidade e a elaboração, como fatores relativos às operações intelectuais que contribuem para o pensamento criativo (ALENCAR, 1993). Torrance (1974) concentrou seus estudos da criatividade em crianças, buscando procedimentos que pudessem favorecer o desenvolvimento e expressão da criatividade. O autor define criatividade como a capacidade de identificar deficiências
e formular hipóteses de resolução; testar e modificar estas hipóteses quando necessário também faz parte do processo. Entre as amostras das pesquisas realizadas por Torrance algumas das características mais recorrentes foram humor, fantasia e aprendizagem independente. Percebemos que a personalidade criativa vai sendo construída com o acúmulo de diversas situações que foram “experimentadas” pelo indivíduo. Designers, como Bruno Dellani (2010), procuram estar sempre estudando e experimentando a todo o momento. O designer acredita que a experiência ensina a melhor forma de contornar certos problemas e que a criatividade está também bastante ligada à experiência. No entanto, a afirma também que podemos acabar confiando demais no próprio conhecimento e tomar decisões não tão adequadas. Segundo Dellani (2010), a inexperiência pode ajudar na necessidade de mudança, pois se entra no assunto com a mente aberta para encontrar soluções novas. Para equilibrar-se entre estes extremos, o designer afirma que devemos estar sempre com a mente aberta, atentos ao mundo e nunca pensar que “já sabemos tudo”. Traços de personalidade como, por exemplo, a independência, leva o indivíduo à busca constante de informação e da prática do pensamento. Esse exercício constante mantém a mente aberta para o conhecimento. Em 2003, Marcelo Roncatti, Fábio Couto, Vanessa Queiroz e David Bergamasco, fundaram estúdio Colletivo, um grupo multidisciplinar, de profissionais da área do design. O grupo tem como objetivo o desenvolvimento de trabalhos que se situem no campo experimental, segundo o Colletivo (2011), a relevância e possível influência que a prática de trabalhos autorais pode trazer para as práticas do design, está diretamente ligada ao exercício da criatividade. Experiências e opiniões diferentes podem tornar o indivíduo mais criativo. As condições sociais e culturais em interação com as potencialidades individuais originam os comportamentos criativos.
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1.3
PROCESSOS CRIATIVOS
São inúmeras as pesquisas que descrevem o processo criativo. Para uma melhor compreensão dos mecanismos desse processo, os autores o dividem em “momentos chave”, que passam a ser uma fase ou etapa do processo. Assim como a criatividade, o processo criativo não se desenvolve em um simples “estalo”. Na verdade, ele é resultado de experimentação e esforço do indivíduo que o realiza. Entre os que se dedicaram ao estudo e pesquisa do processo criativo está Fayga Ostrower (1987). Para ela o processo criativo engloba o pensar e o sentir, consciente e inconsciente, intuição e acaso. A autora mostra o processo intimamente ligado às características cognitivas, intelectuais e culturais do indivíduo, porém não deixa de considerar alguns “momentos” da criação. São estes: o insight, a elaboração e a inspiração. O insight é o momento de captação e estruturação de possibilidades. No segundo momento, o da elaboração, ocorre o questionamento. O indivíduo levanta e testa várias ideias, quantas vezes entender necessário. É um momento em que o indivíduo pode ir e voltar em suas indagações. No terceiro momento – a inspiração – o indivíduo considera ter achado a solução, mas isso não significa que é o final, pois o trabalho pode ainda não ter suprido todas as questões do indivíduo.
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Estes “momentos” do processo criativo são totalmente flexíveis, cada indivíduo pode estabelecer uma sequência das etapas e mudá-la sempre que achar necessário. Torrance (1974) também estabeleceu fases para o processo criativo, baseado nos trabalhos de Wallas (1926) e Patrick (1955). São quatro as fases estabelecidas pelo autor:
PREPARAÇÃO
momento em que é identificado o problema e realizada a pesquisa para possíveis soluções.
REVISÃO
momento em que as soluções são testadas, validadas ou não.
INCUBAÇÃO
momento de maturação das ideias.
ILUMINAÇÃO
quando surge a solução.
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O pesquisador Wilferd A. Peterson (1991), acredita no trabalho para o desenvolvimento do processo criativo e assim como Torrance divide o processo em quatro etapas:
SATURAÇÃO aglomeração de informações.
VERIFICAÇÃO
quando se identifica e trabalha as ideias consideradas em potencial.
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INCUBAÇÃO
momento de relacionar os dados, que nem sempre ocorre de forma consciente.
ILUMINAÇÃO
momento em que as ideias começam a surgir, sendo relevantes ou não.
Passando pela leitura de todos esses autores, podemos perceber que o processo criativo pode ser mais ou menos facetado, mas basicamente é composto pelos mesmos elementos. A divisão entre as etapas nem sempre se apresenta de maneira clara, pois, apesar de a lógica de etapas no processo ser evidente, todavia não é linear. Podemos perceber uma estrutura única em que o indivíduo pode avançar ou retroceder dentro do processo quantas vezes julgar necessário. As ideias são testadas e reelaboradas até que o indivíduo considere o trabalho concluído. Verificamos através destes estudos que dificilmente uma ideia surgiria de forma inesperada. Mesmo que isto ocorra de modo inconsciente, o indivíduo passa por ao menos uma das fases descritas. Quando percebemos conscientemente uma ideia, que chamamos de insight, o cérebro, de forma inconsciente, já passou pelas outras etapas do processo, tais como a preparação e a iluminação.
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1.4
TÉCNICAS PARA AMPLIAR A CRIATIVIDADE
Diariamente em sua prática o designer vê-se envolvido em situações que exigem o exercício de seu poder criativo. Estudiosos do tema desenvolveram algumas técnicas visando o desenvolvimento e o estímulo de características relacionadas à criatividade. Estas técnicas têm o intuito de incentivar o uso consciente de procedimentos que acabam sendo utilizados de forma mecânica, sem a compreensão do indivíduo a respeito da complexidade do processo e dos resultados obtidos. Algumas dessas técnicas são: o brainstorming (tempestade de ideias), sinética e listagem de atributos. O brainstorming é uma técnica elaborada por Osborn (1963). Também conhecida como tempestade de ideias, é a mais conhecida entre as técnicas que se propõem ao exercício da criatividade. Nesta técnica, os participantes trabalham juntos na procura de soluções. Todos que participaram desta dinâmica recebem previamente um briefing do projeto. Escolhe-se um líder que incentivará todos os participantes a comunicar suas idéias, estas devem ser anotadas. Neste momento as ideias loucas ou engraçadas são importantes, visto que, podem demonstrar um ponto de vista diferente do habitual (STONE, 1992, p.459-460). A avaliação das ideias ocorre posteriormente, somente quando um grande número de ideias tiver sido levantado. Osborn acredita que a busca por solucionar problemas específicos é a maneira mais direta de desenvolver a criatividade. Ainda segundo o autor, jogos 30
como descobrir imagens em nuvens, mímicas, charadas, associações e até mesmo o jogo de xadrez podem contribuir no desenvolvimento da imaginação criadora. A teoria sinética é semelhante ao brainstorming, no entanto, ao invés de quantidade de ideias priorizasse a qualidade. Apenas o líder conhece o briefing, os demais participantes têm apenas uma ideia mais ampla do tema. Os participantes devem ser conhecedores do problema (técnicos, graduados e etc.). São explorados todos os aspectos possíveis e amplos do problema. Tem como objetivo ampliar a consciência, aumentando assim o controle dos mecanismos que geram novas soluções (transformação do estranho em familiar e do familiar em estranho). A teoria sinética aponta contribuições importantes do subconsciente e do inconsciente no processo criativo. A listagem de atributos, também desenvolvida por Osborn, demonstra a importância de se modificar os atributos de um problema, visualizando-o sob um novo ângulo, forçando novas associações e combinações de ideias. O autor desenvolveu uma lista de questões que torna mais fácil ao indivíduo visualizar e rearranjar aspectos de um problema. Técnicas como as apresentadas acima são utilizadas em várias situações, não ficando restritas ao campo da comunicação visual, e são baseadas no comportamento da percepção humana. Existem aqueles que consideram o raciocínio lógico um dos responsáveis pelo bloqueio da criatividade. No entanto, um dos grandes pensadores, o filósofo René Descartes (1596-1650), foi um dos primeiros a ressaltar a importância do poder criativo. Segundo Descartes a criatividade está diretamente ligada às experiências do indivíduo. Estas experiências podem ser os contatos que o indivíduo estabelece com um meio diferente do que está inserido, podendo ocorrer através de livros, viagens ou pesquisas. O filósofo acreditava que essas experiências poderiam facilitar a aceitação de conceitos e valores diferentes dos padrões em que o indivíduo estaria inserido e contribuiriam para o desenvolvimento do pensamento. O filósofo francês acreditava que a pesquisa e a busca de informações fora do contexto social eram muito importantes, mas considerava também imprescindível à atenção do indivíduo aos acontecimentos de seu meio social, para que pudesse desenvolver soluções criativas. Muitos caminhos diferentes são propostos para conduzir o indivíduo ao pensamento criativo, não existindo entre eles divisões de certo ou errado, já que cada 31
indivíduo acaba por ter peculiaridades próprias em cada processo. Qualquer que seja a técnica adotada, o indivíduo que anseia pelo desenvolvimento criativo, pode acabar impondo barreiras a si mesmo, pois, “a mente humana resiste a uma nova ideia, da mesma forma que o nosso organismo enfrenta um elemento estranho, rejeitando-a com igual intensidade” (BEVERIDG apud ALENCAR, 1993). No entanto, essas barreiras podem ser superadas. É necessário que a mente esteja sempre aberta, pois quanto mais numerosas as experiências e informações maior serão as possibilidades de solução que o indivíduo poderá encontrar. O designer Felipe Guga (2010) acredita que o fato de um briefing propor temas definidos não impede o exercício da criatividade, ao contrário, pode até estimulá-la, pois é preciso ser criativo dentro de algo específico. Segundo o designer, temas livres permitem colocar estudos e experiências mais pessoais no trabalho, o que também é algo interessante, pois acabamos sempre optando pelo tema ou assunto que temos mais conhecimento. Para Guga a criatividade é uma manifestação que ocorre no transcorrer da prática do processo de criação, não podemos esquecer que o desenvolvimento do potencial criativo acontece por meio do exercício diário, da experimentação, de perguntas, testes, etc.
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Ilustração de Felipe Guga. 2017
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MÉ TO DO
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2.1
CAMINHOS DE SISTEMATIZAÇÃO
A criação humana revela critérios. O designer, enquanto cria seu produto, segue e/ou estabelece parâmetros que o conduzem a decidir por este ou aquele caminho. Para o desenvolvimento e sistematização desses caminhos o designer utiliza-se de métodos e técnicas de projeto. Luis Antonio Coelho (2008) em seu artigo Adjetivando o Método traz algumas referências quanto à origem etimológica das palavras técnica e método. Segundo Coelho, técnica do grego tekhnikos provém de techne que se relaciona com as habilidades ou artes aplicadas. A utilização de procedimentos já conhecidos e pré-estabelecidos voltados para a tarefa com o objeto, e cujos resultados são previstos dá-se o nome de técnica. Já a palavra método, ainda segundo Coelho (2008), deriva de methodos, do grego meta que significa após e hodos que significa caminho. Um “caminho para se chegar a um fim”, o autor considera o método, como algo mais amplo se comparado ao conceito de técnica. O design como uma atividade interdisciplinar, agrega nas suas dinâmicas de desenvolvimento diversas áreas do conhecimento. Por este motivo, a aplicação de um método sistemático para área do design apresenta-se como uma tarefa com36
plexa. Encontramos estudos sobre a diversidade da metodologia em design em textos de Luis Antonio Coelho (2006) que defende uma metodologia de ideias, onde a pluralidade deve ser estimulada. Segundo o autor “[...] o chamado método projetual deve ser mais um exercício de pensamento sobre a maneira de trabalhar, um espaço para refletir em torno do fazer” (p. 39-40). Se tomarmos método pelo sentido de caminho como proposto por Coelho (2008), podemos considerá-lo algo vivo, que tem sua aplicação através da prática, em uma relação de influência com o designer e as experiências por ele vividas. Um dos designers entrevistados, Marco Cherfêm é formado em Design Gráfico e pós-graduando em Design de Interiores. Sempre realizou trabalhos relacionados a catálogos de moda e comunicação interna, entretanto, em seu portfólio se destacam os projetos livres. O designer Marcos Cherfêm (2010) acredita que uma metodologia especifica é um termo muito forte se pensada a partir das mais variadas possibilidades que existem para desenvolver algum projeto. Marcos se refere às varias possibilidades de suportes e materiais e também a questão do tempo a ser cobrado para elaboração. Todavia, o designer afirma também acreditar que uma metodologia sequencial do processo criativo pode ser definida. Variáveis como cultura e fatores tecnológicos podem alterar os procedimentos do designer na busca de resultado, portanto seu método. O designer Rico Lins (YONAMINE, s/d), afi rma em entrevista que o trabalho de criação exige um método, uma linha de conduta, mas é necessário que o designer seja “camaleônico”. O designer deve estar preparado para adequar-se ao que acontece no decorrer do processo, esta é maneira que segundo ele o Rico Lins + Studio desenvolve seus projetos. O também designer Rafic Farah (YONAMINE, s/d), afirma que todo o trabalho apresenta um briefing, mas nem sempre o resultado fi nal do trabalho é condizente com a proposta inicial. Muitas vezes, o designer afirma que no decorrer do projeto descobre novas soluções de forma inesperada, em situações cotidianas. Para a designer Juliana de Campos Silva (2011) o desenvolvimento de metodologias próprias de trabalho, baseadas na prática de trabalho do designer, fazem com que projeto transcorra da melhor maneira possível até o resultado final. O projeto se estende desde o momento da apresentação do problema pelo cliente até o objeto (solução) já acabado. Neste percurso passamos por questões que vão desde a conceituação do produto até decisões técnicas, como cores a serem utilizadas e tipo de impressão, por exemplo. O método é um conjunto de procedimen37
tos, e porque não dizer técnicas, com vistas a induzir e facilitar o desenvolvimento e a resolução de um projeto. Uma referência na busca de soluções dentro do projeto.
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Alexandre Wollner, Cartaz para 4° Bienal. 1957
Alexandre Wollner (YONAMINE, s/d), designer brasileiro já reconhecido, quando questionado sobre seus métodos de criação, relata que briefings podem acabar levando a respostas já existentes. Wollner acredita que é nas pesquisas sobre a linguagem, materiais, função e no próprio ato de fazer que o método se desenvolva. A adoção de métodos científicos na área do design surge aproximadamente na década de 1950, momento em que o design rompe algumas de suas ligações com a tradição artística na produção de artefatos. A crescente demanda científica na atividade do designer se deu por fatores como o crescimento e complexidade dos problemas, o aumento das informações disponíveis, a precisão e automação dos processos, o desenvolvimento de novos materiais, entre outras coisas (COELHO, 2006). O designer passou a sentir a necessidade de adquirir autonomia e delimitar seu campo de atuação profissional, diferenciando-o de atividades similares e profi ssionais correlatos, como por exemplo, o artesanato e a prática artística. Ainda neste período podemos observar a introdução de disciplinas teóricas no plano de ensino de instituições voltadas para o design. A Hochcule für Gestaltung – Ulm, Alemanha, que inspirou o modelo de ensino de design no Brasil, teve incluídas em seu currículo (1966/67) disciplinas como teoria do design e ergonomia. Palestras e seminários com expoentes em áreas do design tornaram-se mais frequentes (COELHO, 2006) Esta ênfase em dar ao design uma aparência de caráter científico acabou gerando problemas ainda não reparados. Marcos Cherfêm (2010) questiona os métodos dados nas escolas de design, acredita que questões, como por exemplo briefing, poderiam ser mais bem desenvolvidas em laboratórios experimentais. Segundo os pesquisadores Alberto Cipiniuk e Denise B. Portinari (apud COELHO, 2006) a intuição e a criatividade foram substituídas por métodos e a habilidade por instrumentos tecnológicos. Esse período, após a década de 50, ficou caracterizado pela tentativa de sistematizar tarefas implícitas à atividade do designer, ficando conhecida como era da “metodolatria”, pois se acreditava que seria possível explicar, quantificar e avaliar matematicamente toda operação de um projeto. O arquiteto e designer belga, Henri van de Velde, citado pelos pesquisadores Alberto Cipiniuk e Denise B. Portinari (2006), defendia a independência do artista, mas defendia claramente a utilização de método no processo criativo ou produtivo. 39
Van de Velde é sempre lembrado entre os pioneiros do design por aplicar o conceito de “projeto integrado”, que não se ocupava da criação de um objeto isolado e sim de um sistema previamente planejado. A natureza interdisciplinar do design permite que métodos de origem diferenciada acabem sendo utilizados dependendo do problema tratado e do corpo teórico com que se relaciona. Os autores Cipiniuk e Portinari (apud COELHO, 2006) falam a respeito de dois grandes grupos de métodos que costumam ser usados nessas atividades. O primeiro é chamado de “caixa preta”. Neste, o importante é conhecer e controlar determinados inputs para se obter outputs esperados. De origem behaviorista², esses métodos estão presentes em tarefas que exigem criatividade e originalidade para solucionar problemas complexos. Na caixa preta acredita-se que o designer tem uma capacidade inata de criar soluções novas a partir de conhecimentos e percepções adquiridas, embora o processo de criação em si permaneça obscuro.
2. O behaviorismo é o sistema da psicologia objetiva fundado por John B. Watson. Segundo esta teoria, todo o comportamento pode ser analisado em termo de conexões estimulo-reação. Sua finalidade teórica é a previsão e o controle do comportamento humano. (HILLIX e MARX, 1995)
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O segundo grupo, métodos de “caixa transparente”, baseia-se em ideias e conhecimentos racionais. Os objetivos e possíveis variáveis são definidos para que seja traçada uma estratégia para a externalização do processo criativo. Além do domínio da relação input – output, o estudo se estende muito mais além, procurando compreender os processos da mente (representação, aprendizado, memória, etc.). Essas classes de métodos não se excluem, elas se alternam ao longo do processo. Enquanto desenvolve o projeto o designer transita entre métodos de caixa preta, (O insight: flashes de criatividade) e de caixa transparente (ideias e conhecimentos racionais). Algumas etapas podem ser plenamente explicitadas e justificadas com o auxílio das ciências, e outras permanecem ainda obscuras, sujeitas aos procedimentos considerados até o momento como intuitivos. Em qualquer que seja caso, os métodos são modelos de algo mais complexo, pois estão no lugar de alguma outra coisa, tornando-a mais
simples e operacional. Christopher Jones, professor de design na Universidade de Manchester e da Open University da Inglaterra foi pioneiro na utilização e análise de métodos no design. Jones (apud COELHO, 2006) afirma em seus estudos sobre o desenvolvimento histórico do design que é crescente a sistematização de tarefas no processo de criação em design. Na atualidade, existem uma infinidade de métodos, técnicas e ferramentas para o desenvolvimento de projetos de design. O Instituto Battelle de Frankfurt mantém cientistas, de diferentes campos do conhecimento, desenvolvendo e testando novos métodos e técnicas permanentemente. Métodos são trabalhados constantemente, pois não existe garantia de sucesso em trabalhos diferentes. Projetos e designers pedem soluções específicas, que levem em consideração características peculiares de ambos. Para que isso aconteça o método sofre constantes adaptações a partir de uma estrutura básica. Essa estrutura se desenvolve, a partir de situações concretas e bem definidas, portanto, ajustes são necessários sempre que a mesma é transferida de contexto. Por meio da vivência prática das dinâmicas do design, os métodos podem se reconfigurar. A cada processo, um novo caminho é adicionado ao repertório de técnicas e conhecimentos metodológicos que foram desenvolvidos pelo próprio designer e o embasarão em outros caminhos.
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2.1
DESIGNERS E SUAS TRAGETÓRIAS
Trabalhos autorais exigem do designer iniciativas mais autônomas, já que o mesmo tem como características uma maior abertura a intuição e a experimentação. Como tal, acreditamos que o desenvolvimento de projetos dessa natureza seja um solo fértil pra que o designer trabalhe seus próprios métodos e referências, passando a ter domínio sobre o conhecimento teórico e o desenvolvimento do processo. Bruno Munari em seu livro Das coisas nascem coisas (1998), afirma que um profissional de design não depende de uma ideia “genial”, de uma visão romântica do método processual. Segundo o autor quando um profissional tem um método em que realiza seu trabalho com precisão e segurança, ele não será absoluto e verdadeiro, pode ser modificado, caso o designer descubra algo para melhorá-lo. O designer Felipe Guga (2010) acredita que produções autorais levam a uma metodologia própria de trabalho. Desconstruir o método conduz a novas ideias e gera novas soluções. Felipe afirma que quando se sentir vazio de ideias irá fatalmente desenvolver um novo método para abrir novos caminhos. Para Munari essas mudanças têm a ver com a criatividade do designer que, ao aplicar o método, descobre novas possibilidades. Munari sintetiza seu método da seguinte maneira: 42
P
DP
CP
CD
Problema
Definição do problema
Componentes do problema
Coleta de dados
E
MT
C
AD
Experimentação
Materiais e tecnologia
Criatividade
Análise de dados
M
V
DC
S
Modelo
Verificação
Desenho de construção
Solução
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O mesmo afirma ainda que o esquema e seu método, não são necessariamente fixos e completos, únicos e definitivos, e sim definidos a partir da experiência. Este esquema linear é um referencial, pois na prática, ir e vir dentro do processo são atitudes naturais que não invalidam o esquema proposto. Também no livro Design e Comunicação Visual (1997), Munari novamente traz questões sobre sua posição em relação à utilização de métodos de projeto e como os mesmos favorecem a orientação na busca da solução final. Neste livro o método é apresentado de uma forma mais resumida com os seguintes itens:
ENUNCIAÇÃO DO PROBLEMA o problema deve ser delimitado com exatidão
DISPONIBILIDADE TECNOLÓGICA
avaliação de materiais e tecnologia
CRIATIVIDADE
orientada pelo método integra da melhor forma possível todas as partes do projeto
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IDENTIFICAÇÃO DOS ASPECTOS E DAS FUNÇÕES análise de aspectos físicos (formais, técnicos e econômicos) e psicológicos (relação objeto x usuário)
LIMITES
vida útil do produto, regulamentações, exigências do mercado, etc.
MODELOS
são construídos com as soluções da etapa criatividade, entre estes, os melhores são previamente selecionados para que o design escolha apenas uma solução para a confecção do protótipo
Assim como o outro método proposto por ele, este também é linear e busca a organização do pensamento para diminuir as possibilidades de problemas graves a serem constatados apenas na solução final. Através da explanação acerca do método projectual de Munari, podemos perceber que o autor enfatiza a importância da criatividade aliada ao processo e a importância da mesma para busca e ordenação das soluções. A exploração das possibilidades e potencialidades do projeto também é muito lembrada por ele para alcançar resultados satisfatórios. Segundo Joaquim Redig (2008), um dos fundamentos do design de Aloísio Magalhães, importante designer brasileiro, era sua metodologia de trabalho, intrínseca e sistemática. Foi através de uma metodologia própria que abrangia as preferências conceituais e de trabalho que Aloísio Magalhães desenvolveu seus projetos de design. Redig (2008) afirma em seu artigo que independente do projeto, o método aplicado por Aloísio de Magalhães e sua equipe, abrangia os seguintes princípios:
1. ÂMBITO CONCEITUAL
Este reunia os conceitos que Aloísio Magalhães adotou em sua trajetória como sendo delimitadores para a definição de seu trabalho como designer. O Design é uma forma contemporânea de arte a serviço da coletividade, arte de massa, industrial, que valoriza a responsabilidade social do artista. A capacidade de síntese é condição indispensável para a percepção visual das formas no contexto urbano moderno, geralmente conturbado. O Design se propõe a produzir formas novas (capazes de surpreender) usando um repertório existente (capazes de ser compreendidas). O projeto de Design parte da compreensão e da valorização da identidade própria do contexto sobre o qual se está trabalhando. A reiteração pelo uso é que dá às formas visuais seu verdadeiro significado. O Design se baseia numa visão de conjunto dos objetos e dos fenômenos. O trabalho do Design se processa através de uma relação dialética entre intuição e razão. 45
A tecnologia industrial, meio de existência do Design, é um valor cultural.
2. ÂMBITO OPERACIONAL
Percebemos nas delimitações do “âmbito conceitual” elaboradas por Aloísio Magalhães, que seus critérios fazem parte de uma metodologia que foi desenvolvida por meio da prática do processo criativo. O autor inicia sua teorização com uma definição do design na qual percebemos uma aproximação e uma influência do universo das artes, admite a intuição e a razão como partes indissociáveis do trabalho. Quando considera a intuição para o processo de criação, Aloísio Magalhães se distancia da esfera do consciente e vem de encontro às ideias de Cecília Salles e Fayga Ostrower a respeito da esfera do inconsciente no processo criativo. Na realização de um projeto, as diversas decisões tomadas pelo designer representam um ponto de transformação e durante esse processo estas não se reduzem apenas às operações conscientes e racionais, mas incluem também os mecanismos intuitivos. Neste ponto o processo se abre para o inesperado, tornando o método mais maleável, já que as diversas possibilidades do processo podem ser consideradas. Os atos intuitivos vão se tornando conscientes na medida em que o designer começa a dar forma a eles. A partir deste pensamento podemos falar da “intencionalidade” no ato criativo, isto é, de uma ação consciente, pois fora deste não haveria condições para se analisar as situações ou buscar coerência.
Programa de trabalho composto de 4 etapas: Levantamento de Dados Estudo Preliminar Desenvolvimento do Projeto Implantação
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3. ÂMBITO VISUAL
A diagramação era um elemento importante para Aloísio Magalhães, era através dela que se definia o caráter do objeto gráfico. A diagramação envolve a estruturação dos elementos gráficos e tipográficos, visando aperfeiçoar a transmissão da mensagem e valorizar o espaço visual. Entre os conceitos utilizados por Aloísio Magalhães e sua equipe estão os seguintes: Uso de espaços “vazios”. Economia de elementos. Busca do equilíbrio Figura/Fundo. Sistematização tipográfica (variação mínima de fontes) Predomínio do uso de tipos sem serifa (entre as quais Helvética, Univers, Gill, Futura, e Franklin Gothic). Alinhamento tipográfico pela margem esquerda. A metodologia de Aloísio Magalhães (REDIG, 2008) foi construída com base em sua prática no processo de criação para diversos projetos de design. Por meio da prática e da experimentação, Magalhães delimitou seus conceitos para a criação, porém, sua metodologia continuou aberta às mudanças que o mesmo ou sua equipe acreditassem trazer benefícios para o projeto em questão. Outro importante designer brasileiro, Chico Homem de Melo, no livro O valor do design (2003), fala a respeito do processo do projeto que, segundo ele não é linear, pois as etapas se misturam e ações imprevistas podem ocorrer, mas isto não significa uma ausência de preceitos. No decorrer da prática, percebem-se ações que se desenvolvem com certa constância nos diversos projetos realizados pelo designer. Refletir sobre essas ações é, segundo o autor, o que traz a compreensão do design. Como primeiro passo é necessário conhecer o design (história, cultura, ferramentas, etc.) e estar ciente das necessidades ou deficiências sociais. Estes são conhecimentos que devem fazer parte do repertório do designer, antes de qualquer possível projeto a ser desenvolvido. De posse desse conhecimento, Melo (2003) desenvolve o projeto começando pelo briefing, que acontece quando o problema é apresentado pelo cliente, que segundo ele é o ponto de vista a ser atingido. Pode haver a necessidade de o problema ser redefinido pelo designer, com questões que ajudem a delimitá-lo com mais exatidão, contendo custos e prazos. A segunda etapa é o levantamento de dados, o designer deve tomar ciência de todos os componentes envolvidos no 47
projeto e a duração desta etapa pode variar de acordo com o projeto. Compreendido o problema através do briefing e seu universo através do levantamento de dados, o designer passa para a conceituação do projeto. Nesta etapa estabelece-se um norte conceitual e um visual. Para tanto, o designer irá utilizar-se de sua criatividade e análise objetiva do problema. Com a conceituação, o designer passa para a elaboração da proposta preliminar do projeto, quando a ideia começa a adquirir uma forma mais concreta, indo desde a apresentação de uma estrutura de projeto e produto até desenhos das primeiras peças. Apresentação da proposta ao cliente: nesta etapa todo o material já desenvolvido deve ser apresentado ao cliente para aprovação e possíveis alterações. A avaliação da proposta pode ser feita não apenas pelo cliente, mas também através de pesquisas com o público-alvo, pessoas indicadas pelo cliente, etc. Com o resultado das avaliações, ajustes serão realizados na proposta, podendo ocorrer na conceituação ou mesmo nos estudos preliminares. Apenas neste momento entramos na etapa chamada desenvolvimento do projeto. Segundo Melo outros profissionais passam a fazer parte do desenvolvimento do projeto, como por exemplo, fotógrafos. Nessa etapa pode haver a necessidade de o designer gerenciar a equipe, em vista de que também deve ser feitas avaliações de modelos, e após todas as alterações, uma nova revisão antes que o projeto seja enviado para produção. Para assegurar as intenções do designer o autor ressalta a necessidade do acompanhamento de um designer gráfico ou produtor gráfico no processo de pré-produção e produção. Mesmo que não seja de responsabilidade do designer, a implantação e/ou distribuição do produto deve fazer parte do briefing inicial como componentes do problema. Melo afirma ainda que o processo não termina em sua implantação e defende um estudo das reações do público-alvo ao produto, que forneceriam subsídios para problemas futuros. Refletir sobre todo o desenvolvimento do processo realizado pode também ser enriquecedor e apontar aspectos do projeto, ou da maneira que o mesmo foi conduzido, que até então tinham sido ignorados pelo designer. Documentar e divulgar o processo, segundo ele, constrói uma memória do designer e do design.
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Conhecimento das necessidades e deficiências da sociedade ou da parcela em questão Briefing Levantamento de dados Conceituação do projeto Elaboração da proposta preliminar do projeto Apresentação da proposta ao cliente Avaliação da proposta Ajustes Desenvolvimento do projeto Implantação e/ou distribuição
O autor alia dados objetivos à criatividade e não determina que ela tenha que estar em uma fase específica. Ressalta a importância de o designer estar atendo às necessidades da sociedade em que está inserido e para a qual produz. 49
O designer Lauro Machado (2010) fala sobre a criatividade contida na própria ideia e sobre o método como um auxílio ao embasamento da criatividade. Segundo ele, método, técnica e repetição são fundamentais para alcançar a forma ideal. Lauro usou como exemplo o trabalho de Wassili Kandinsky (1866-1944), artista que introduziu a abstração nas artes visuais. Segundo o designer, Kandinsky repetia o desenho de seus quadros mais livres inúmeras vezes até chegar ao resultado expressivo imaginado por ele. Este exemplo mostra como muitas vezes algo que parece ser instintivo, até visceral segundo Lauro, é na verdade fruto de muito estudo e repetição. Para o designer, trabalhos autorais têm como essência, exercício criativo, uma maneira de expressar suas ideias através do seu estilo. Acredita que trabalhos pessoais são fundamentais para explorar as possibilidades do que poderá ser aplicado em um futuro projeto comercial. Percebemos que o método e as respostas aos diversos impasses que acontecem em um projeto, dificilmente serão únicos e imutáveis. Cada designer é influenciado pelo momento social e cultural, do contexto no qual está inserido. Também o momento pessoal ou profissional pode interferir nas diversas soluções do mesmo problema, pois estas modificam o olhar do designer. Lauro Machado (2010) ao ser questionado sobre metodologias, afirma que assim como em outras áreas é influenciado a todo o momento, utiliza métodos que conheceu nos locais onde trabalhou, como por exemplo, Ana Couto Branding & Design, de onde extrai os processos de briefing, pesquisa, monitoramento e apresentação. Ele acredita que tanto os trabalhos pessoais quanto os comerciais podem levar a criação de uma metodologia própria, o próprio fazer é direcionado neste sentido. O designer admite, no entanto, que em um trabalho comercial com briefing e prazo, a necessidade de seguir um método é maior e que o processo criativo se altera de acordo com as características do projeto. Também o Colletivo (2011), relata que mesmo acreditando que a metodologia seja sim influenciada pelos trabalhos experimentais, a mesma tende a ficar atrelada ao tipo de trabalho e ao prazo de entrega. Mesmo tendo como base de seu trabalho a experimentação, o Colletivo admite nem sempre conseguir conciliar trabalho de mercado e metodologia. O designer Felipe Guga (2010) crê que trabalhos autorais levam a uma metodologia própria de trabalho, e que desconstruir o método levará a ideias novas e consequentemente irá gerar novas soluções. O método é um caminho que busca a maior clareza do problema e suas possíveis soluções.
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Kandinsky, composição VIII. 1936
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AU TO RIA 53
3.1
CONCEPÇÕES DE AUTOR E AUTORIA
Etimologicamente, autoria vem do latim actor(ia), sendo que autor, é definido como “a pessoa que faz algo, que cria”. O autor Roland Barthes (2004), em 1968 escreveu “A morte do autor”, propondo que “[...] é a linguagem que fala, não o autor” (p. 59). A obra torna-se completa apenas a partir do momento em que interage com o leitor. Segundo Barthes é a partir da interação com diferentes culturas que uma obra torna-se completa. Com as diferentes visões da obra, esta deixa de ser uma verdade absoluta do autor, e passa a permitir inúmeras interpretações que dependem do contexto e do conhecimento do usuário. Desvendar a obra através do autor traria uma interpretação absoluta que fatalmente seria unilateral. Apenas o leitor, com seu universo de possibilidades interpretativas, poderia tornar a obra completa.
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Assim se desvenda o ser total da escritura: um texto é feito de escrituras múltiplas, oriundas de várias culturas e que entram umas com as outras em diálogo, em paródia, em contestação; mas há um lugar onde esta multiplicidade se reúne, e esse lugar não é o autor, como se disse até o presente, é o leitor: o leitor é o espaço mesmo onde se inscrevem, sem que nenhuma se perca, todas as citações de que é feita uma escritura; [...] (BARTHES, 2004, p. 64). A “morte do autor” vem atrelada a um maior poder do leitor, que passa a ser um co-autor da obra. O escritor passa a afastar-se ao máximo de possíveis características individuais. Em 1969, um ano após a Morte do autor, Michel Foucault publica seu texto “O que é um autor”. Nesta obra, debate a relação do texto com o autor, pois, segundo ele a morte do autor não ocorreu. Foucault levanta duas problemáticas acerca da morte do autor, a noção de obra e a noção da escrita. Quanto à noção de obra, segundo Foucault uma teoria da obra não existe e são muitas as questões que a envolvem. Neste contexto, “a palavra “obra” e a unidade que ela designa, é provavelmente tão problemática como a individualidade do autor” (FOUCAULT, 1992, p. 39). Quanto à segunda problemática, a noção da escrita, Foucault considera o empirismo do autor, pois não podemos desconsiderar o gesto de escrever e as possíveis marcas de algo que o autor possa ter querido dizer. Foucault busca preencher as lacunas que surgiram como consequência da “morte do autor” anunciada por Barthes. O ensaio de Foucault busca uma maior análise do autor e o que ele considera como funções do mesmo. O autor é quem inicia a prática discursiva dentro da sociedade, produzindo e possibilitando produções por meio da interpretação da obra. Foucault (1992) relata que a função do autor é “característica do modo de existência, de circulação e de funcionamento de alguns discursos no interior 55
de uma sociedade” (p. 46). Analisando a função do autor, Foucault distingue quatro características. Primeiro, o autor passa a ser individualizado quando surge a necessidade de punição para possíveis transgressores, tornado o discurso não mais um ato e sim uma propriedade. Segundo, a função do autor não é universal ou constante. Textos literários da idade média eram considerados verdadeiros apenas por serem antigos enquanto os textos científicos tinham sua veracidade comprovada por meio da assinatura do autor. Entre o século XVII e XVIII, o autor deixa de ser o ponto chave para o discurso científico, que passa a ser importante por si só, paralelamente os textos literários passam a necessitar da função autor. Terceiro, a atribuição de autor se dá de forma complexa. O que torna o indivíduo um autor pode variar de acordo com o meio, mas existe para Foucault uma invariável. Foucault (1992) afirma que “o autor é uma espécie de foco de expressão que, sob formas mais ou menos acabadas, se manifesta da mesma maneira, e com mesmo valor, nas obras, nos rascunhos, nas cartas, nos fragmentos, etc.” (p. 54). A quarta característica considera a função autor pelo conjunto de sua obra, diversos textos do mesmo autor podem ligar-se dando origem a novos discursos. Este entrelace de textos do mesmo autor pode gerar novas teorias que em nada se assemelham, mas que também não invalidam sua origem. O autor articula o discurso que pode assumir diversos “eus” de acordo com sua época e sociedade. Podemos entender que através das questões da literatura levantadas por Barthes e Foucault é possível traçarmos questões acerca da autoria no design. Após sua criação, a peça de design espalha-se por um âmbito sem limites. Assim como na literatura, o objeto de design, seja este gráfico ou de produto, é influenciado pelo meio no qual se origina: a sociedade e a cultura em que o designer está inserido, e também pelo destino deste objeto, que não necessariamente é o mesmo local de origem do designer. Neste sentido, é possível encontrar no leitor todo um novo universo de possibilidades interpretativas que o tornam coautor do objeto. Assim como os escritores buscaram afastar-se da obra, para que suas características não pudessem ser identificadas no texto, muitos designers defendem a neutralidade no design comercial. A busca moderna por cientificar o design tem, ainda hoje, enraizada na teoria do design, uma neutralidade justificada pelo bem 56
do cliente/leitor. Não obstante, a visão pós-moderna admite que a criação e a imaginação, podem fazer parte da construção de textos científicos, tirando da ciência a ideia de neutralidade. A terceira e a quarta características de autor dadas por Foucault são pertinentes ao trabalho do designer. As escolhas do designer no decorrer da elaboração de um projeto refletem suas preferências e ideias, portanto, uma forma de autoria. Ao analisarmos projetos de design de forma independente podemos não nos atentar a estas preferências sutis do designer, entretanto, ao analisarmos uma sequência de projetos isso pode tornar-se mais claro. As ideias e preferências expressas pelo designer por meio de suas escolhas, bem como certa linearidade no conjunto de seus projetos, podem ser caracterizadas como formas de autoria.
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3.2
CONCEPÇÕES DE DESIGN GRÁFICO
Antes de falarmos sobre autoria no design, acreditamos que seja importante a conceituação de design. Derivado da língua inglesa, a palavra design se origina de designo (as-are-ave-atum), que em latim significa designar, indicar, representar, marcar, ordenar. Design em português tem seu sentido muito próximo de desígnio: projeto, plano, propósito (FERREIRA apud VILLAS-BOAS, 2003). A diferença entre os termos é que desígnio está mais próximo do campo das ideias, enquanto design tem uma maior aproximação com o palpável, o projeto. Quando falamos de design e drawing, ambos termos em inglês, podemos perceber uma diferença mais acentuada. Drawign corresponde ao sentido do termo desenho em português, significando de forma mais especifica “a representação figurativa de formas sobre a superfície, com o uso de linhas, pontos e manchas – recurso ao qual o design gráfico constantemente recorre” (VILLAS-BOAS, 2003, p. 49). Com a Revolução Industrial, acentuou-se a necessidade do desenho e, por conseguinte, ocorreu um maior desenvolvimento de suas práticas, trazendo a necessidade de uma divisão terminológica. Adotou-se e se difundiu o termo design. A expressão graphic design, foi utilizada pela primeira vez por William Addison Dwiggins, em 1922, passando a ser amplamente utilizada após a Segunda Guerra Mundial (LI58
VINGSTON E LIVINGSTONE apud VILLAS-BOAS, 2003). A industrialização e o surgimento das sociedades foram fatores que trouxeram a necessidade da produção em escala para atender um novo mercado consumidor que estava surgindo. O designer André Villas-Boas define um projeto de design gráfico como sendo “um conjunto de elementos visuais – textuais e/ou não textuais – reunidos numa determinada área preponderantemente bidimensional e que resulta exatamente da relação entre estes elementos” (op. cit., p.12). O designer Richard Hollis (2000), define o design gráfico como a arte de criar ou escolher marcas gráficas (linhas e pontos que formam imagens), combinando-os em uma superfície qualquer para transmitir uma ideia. O design gráfico é uma “atividade de combinação” (LIVINGSTON & LIVINGSTONE apud VILLAS-BOAS, 2003), apresentando entre as características que o distingue de atividades como a arte e o artesanato, por exemplo, a preocupação com a transmissão da mensagem (comunicação) e com a reprodução a partir de uma matriz (podendo esta ser virtual). O design gráfico faz parte da cultura do mundo contemporâneo, com os avanços da tecnologia as imagens e informações são transmitidas de maneira cada vez mais rápida. Neste contexto, design gráfico tornou-se não apenas uma maneira de organizar e transmitir mensagens, mas uma linguagem.
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3.3
AUTORIA NO DESIGN
O americano Michel Rock, escreveu o ensaio, “The designer as author”, originalmente publicado na revista Eye, em 1996, e posteriormente na série Looking Closer 4 (2002). Analisando os discursos de Barthes e Foucault, Rock (2001) propõe cautela na aplicação da função de autor para o designer. A atribuição de autoria ao trabalho do designer é vista muitas vezes como grau de status e valor. Assim como novas visões podem ser discutidas, teorias preconceituosas podem acabar sendo reforçadas por uma visão equivocada do termo. Rock (2001) relaciona a morte do autor, proposta por Barthes, com a interpretação do usuário. Barthes e Foucault relatam as mudanças históricas no papel do autor, já citadas anteriormente no presente trabalho. Procurava-se na obra sinais da intenção do autor, elevando-o a um grande grau de importância perante a obra. Leituras pós-estruturalistas mudam o foco para a obra e suas possibilidades de significação. Barthes proclama nesse novo universo de possibilidades que o leitor pode trazer a morte do autor e Foucault acredita na figura do autor, mas se pergunta, o que importa quem fala? Rick Poynor (2003), em No más normas, Diseño Gráfico Pós-moderno (2003)³, livro em que trata das vertentes do design gráfico pós-moderno, afirma que a apari60
ção do designer como autor é uma das ideias chave do design gráfico pós-moderno. O autor afirma que os designers pós-modernos contavam com a participação do leitor em seus projetos, não tinham como objetivo “impor uma leitura fechada, restrita, única e sim propiciar estruturas abertas que encorajassem a participação e interpretação da audiência” (POYNOR, 2003, p. 119). Enquanto no período moderno o foco parecia encontrar-se apenas no projeto e o trabalho parecia relativamente homogeneizado, os designers no pós-modernismo ressaltam a importância do receptor como coautor da mensagem. Esta participação do leitor como coautor do projeto já havia sido citada por Roland Barthes em “A morte do autor”. Segundo Barthes a obra torna-se completa apenas na interação como o outro.
3. Da obra original em inglês No More Rules: Graphic Design and Pos-modernism de Rick Poynor, 2003.
Nos anos 1980, o design passou a ser mais conhecido e também a exercer fascinação no público em geral. Os designers passaram a exibir e explicar seus trabalhos em um crescente número de conferências informais e concorridos congressos. As apresentações eram, segundo Poynor (2003), do mesmo grupo de designers considerados estrelas internacionais. As entrevistas para periódicos de design davam à personalidade do designer, a mesma importância que dedicavam ao trabalho gráfico. Alguns designers gráficos – Neville Brody, David Carson, Tibor Kalman – chegaram a atrair a atenção de outros meios de comunicação convencionais, onde foram descritos como arquitetos da cultura visual contemporânea. Com as alterações desencadeadas pela postura “pós-moderna”, que se manifesta em vários aspectos da cultura e do comportamento a partir dos anos 1960, o design gráfico adota algumas características-chave em sua prática, tais como maior liberdade no uso das formas, transgressão às normas rígidas de legibilidade e padrões tipográficos, utilização de recursos como o pastiche e a expressão individual. Essas características possibilitaram horizontes mais amplos e uma maior liberdade de métodos e soluções, o “design de autor” passou a ter uma maior aceitação. No entanto, ques61
tões como: possíveis prejuízos à funcionalidade do produto e a maior relevância da fivgura do designer sobre a obra ainda geram muitas dúvidas. Por isso, há uma tendência de os designers afirmarem sua relevância mesmo diante do paradigma de que este profissional deva expressar a mensagem do cliente de forma neutra. O ato de projetar, segundo Poynor (2003), “nunca é um processo completamente neutro, o designer sempre traz algo pessoal para o projeto” (p.120). O designer não pode evitar ser influenciado pelo meio sociocultural onde está inserido. Os processos socioculturais são complexos, se acumulam, se enriquecem e se diversificam de forma muito mais rápida do que os processos biológicos, já que são transmitidas de uma geração para outra, ou mesmo de um sistema cultural para outro. O comportamento do ser humano é moldado pelos padrões culturais e históricos do grupo em que está inserido, devido ao processo cumulativo de cultura, ele reflete o conhecimento e experiência adquirida pelas inúmeras gerações antes dele. Desta forma, a cultura acaba por ser referência para tudo o que o indivíduo é, faz, comunica, e toda a sua possível criação. Mesmo vinculado a um padrão de comportamento socialmente transmitido, não podemos esquecer que ainda existe individualidade no modo pessoal de agir, suas possíveis realizações e desejos. O designer deve estar atento aos diversos aspectos que envolvem o desenvolvimento de determinado produto, entre estes o ambiente cultural; perceber que suas escolhas, preferências perceptuais e as possíveis aparências de seu produto são infl uenciadas pela cultura. Ao criar ele age culturalmente, se apoiando na cultura e dentro de uma cultura. Até o final dos anos 1980, poucos eram os designers que descreviam seu trabalho como autoria gráfica. O designer como autor não se generalizou até meados dos anos 1990, continuou sendo um fenômeno essencialmente norte-americano e tendia a despertar polêmica e confusão. O designer canadense Bruce Mau, foi, segundo Poynor (2003), um dos primeiros e mais conscientes expoentes da ideia. Citando o artigo de Walter Benjamin, The Author as a Producer (1984), e invertendo notadamente sua imagem, Mau afirma que sua intenção era desempenhar o papel de “produtor como autor”. No meio digital (Internet), o livro já havia se libertado de sua utilização, função e forma convencionais. O designer Bruce Mau desafiou as convenções do design de livros, explorando os limites do material impresso. 62
No princípio dos anos 1980, Mau trabalhou na Pentagram, em Londres, quando retornou desencantado a Toronto, fundou a firma Public Good, especializada em trabalhos gráficos em âmbito social, cultural e educativo. A Bruce Mau Design, sua segunda empresa, ficou conhecida em 1986, com a publicação de Zone ½ , uma compilação de artigos acadêmicos sobre a cidade contemporânea. Essa publicação foi o que direcionou todos os outros trabalhos de Mau. Seu objetivo era que a Bruce Mau Design fosse em direção a uma área em que poderiam ser criadores de conteúdo. Poynor (2003) afirma que para Mau até então era fundamental estabelecer uma relação estreita com o conteúdo antes de poder exigir sua autoria. Mau foca-se em buscar clientes que respeitem e confi em em seu trabalho, a ponto de contratá-lo desde o início do projeto. O também designer gráfico pós-moderno, diretor de arte e tipógrafo Neville Brody, se formou na London College of Printing. Recém-formado trabalhou para o estúdio de design Rocking Russian, seus primeiros trabalhos como designer foram capas de discos. Brody passou a trabalhar para o Stiff and Fetish Records, dois selos independentes, na Stiff Records, Brody pode usufruir de liberdade criativa. “Um ambiente absolutamente livre onde o ultraje não era somente aplicado no design das capas
Bruce Mau, Zone ½.1986
Neville Brody, capas da revista "The Face".1980s
de discos”, assim Steven Heller (BRODY, 2007, p. 148) definiu o ambiente de trabalho na Stiff Records. Ao que tudo indica um ambiente propício ao desenvolvimento de trabalhos autorais, favorável à experimentação. Foi no design editorial que Brody quebrou todas as regras conhecidas até então, inovou criando tipografias para layouts específicos. Com uma nova geração de revistas, foi um dos primeiros designers a fazer uso das novas tecnologias, utilizando Desktop Publishing, com Apple Macintosh. Entre 1981 e 1986, foi editor de arte da revista “The Face”, para a qual desenhou a fonte geométrica Typeface Six (1986). A revista “The Face”, segundo Steven Heller (2007), foi o primeiro trabalho editorial significativo de Neville Brody. Com 24 anos, Brody levou “sua rebelde sensibilidade punk para um território maior e mais orientado para o consumidor” (BRODY apud HELLER, 2007, p.147), que desafiou o que até então se fazia no design editorial. Brody e seus projetos inspiraram designers de todo o mundo. Segundo Heller (op.cit.) era essa a intenção, inspirar outros designers e fazer com que questionassem sobre suas próprias soluções gráficas. Esta ainda é uma questão relevante para os designers contemporâneos, o questionamento sobre suas práticas. As discussões que surgem por meio dos indícios de autoria no design gráfico, podem ser um caminho para alargar o pensamento crítico, teórico e prático do design. Neste contexto uma metodologia de ideias, como a de Luiz Antonio Coelho (2008), onde a criação é vista como um refletir sobre as práticas do processo, apresenta-se como uma questão atemporal para as práticas do design. A autoria pode se apresentar como um pensamento reflexivo do designer. Segundo Richard Hollis (2000), com o auxílio do computador, o designer adquiriu maior liberdade para experimentar outros formatos e possibilidades. Isso trouxe uma ruptura com as limitações até então impostas por métodos anteriores de impressão. Esta possibilidade de experimentação parece muitas vezes ter sido esquecida pelo design contemporâneo, em favor de uma tecnologia vista apenas como “facilitadora” do trabalho. A vertente “Techno”, que surgiu nos anos oitenta, buscou explorar as possibilidades de uma nova estética. A tecnologia era recente e limitada. Poynor (2003) relata que designers americanos da costa oeste, como April Greiman e o grupo Emigre, Rudy VanderLans e Zuzana Licko, adquiriram computadores Apple Macintosh assim que chegaram ao mercado, em 1984, com isso, dedicaram-se com entusiasmo a experimentar novas ferramentas. Para Greiman, o computador era “uma nova ferramenta, uma nova “lousa mágica” que abriria uma nova era de possibilidades 64
para os artistas gráficos” (POYNOR, 2003, p. 96, tradução nossa). April Greiman foi de grande importância para a aceitação do uso de recursos tecnológicos nas artes e nos processos de design. Após 1984, o trabalho de Greiman passou a caracterizar-se pela introdução de elementos digitais, a pixelização e os “erros” de digitalização são algumas dessas características. A designer assimilava ao seu trabalho efeitos produzidos pelo acaso e baixa resolução de textos e imagens (HOLLIS, 2000). Entre seus trabalhos mais conhecidos está um pôster desdobrável para a revista Design Quarterly, contendo o autorretrato de April Greiman nua e em tamanho real interagindo com textos e imagens. Podemos também notar símbolos que tinham uma significação pessoal para a designer, uma enunciação da intenção da autoria. Hoje softwares de editoração e tratamento de imagens fazem parte do cotidiano dos designers. Os trabalhos são feitos de forma cada vez mais rápida e as possibilidades se multiplicam de maneira até mais acelerada que nossa capacidade de absorvê-las. Um grande auxílio para a experimentação, os recursos tecnológicos trouxeram a possibilidade de modificar o trabalho inúmeras vezes. Fazendo o caminho inverso ao dos procedimentos pós-modernistas (teorias abordadas aqui como possibilidades de experimentação no design autoral) está o estúdio Colletivo. Ainda hoje, a ideia na prancheta é valorizada e utilizada também como possibilidade exploratória na criação. Segundo o estúdio Colletivo (2011), esse método de trabalho, segundo eles como era feito “antigamente”, vem de encontro com o DNA criativo do estúdio. Esta valorização do trabalho manual faz com o estúdio tenha uma identidade bem definida. Percebemos nessa contraposição de métodos de exploração do processo, como o design autoral pode ser um espaço de experimentação livre. O que norteará este processo será o próprio designer, em uma busca por experimentação, conhecimento e desenvolvimento de seus métodos de trabalho.
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April Greiman, revista EE UU.1986
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Segundo Rock (2001), a grande contribuição das discussões acerca da autoria vem da constatação de que a mensagem não é única e universal. A posição do autor como detentor do real significado da mensagem deixa lugar para uma mensagem que pode ter infinitas possibilidades de interpretação. Rock cita o trabalho da designer Katherine McCoy , que ultrapassa a tradicional questão de design problema-solução. Para Rock, Katherine cria conteúdo e tem uma consciência crítica da mensagem, adota papéis próximos ao da arte e da literatura, “foi uma das designers representativas na tendência denominada “desconstrucionista” ou “desconstrutivista”, as convenções do design gráfico profissional, tanto as modernas como as ecléticas, foram deliberadamente questionadas” (ROCK apud POYNOR, 2003, p. 44). A “desconstrução” foi um termo introduzido pelo filósofo Jacques Derrida, em seu livro A Gramatologia, publicado originalmente em 1967. Na década seguinte suas ideias tiveram um enorme impacto nas universidades. O crítico literário Jonathan Culler, sugere que o propósito essencial da desconstrução deve ser entendido como uma crítica às oposições hierárquicas que tradicionalmente estruturam o pensamento ocidental, as quais ele exemplifica com as oposições: fala/escrita, mente/corpo, forma/significado, etc. Segundo Poynor (2003) não se trata de oposições naturais e inevitáveis, como crê o ocidente, e sim, construções culturais que assumimos sem questionar como inevitáveis. O objetivo não é destruir e, sim, modifi car a estrutura, para que passem a funcionar de formas distintas. Uma designer representativa desta vertente foi Katherine McCoy. Não apenas uma tendência histórica do design, acreditamos que a desconstrução pode ser também um viés para a crítica do processo, um autoquestionamento do designer. Em um processo de desconstrução de seu trabalho o designer pode questionar seus próprios projetos. O desenvolvimento de trabalhos de forma mais pessoal, passa a envolver questões de autoria, promovendo um discurso mais rico por parte do designer, um exercício crítico e teórico da prática do processo. Em 1971, Katherine McCoy se tornou copresidente, com seu marido Mike McCoy, do departamento de design na Cranbrook Academy of Art, percorrendo o caminho da desconstrução dos elementos verbais que compõem o texto. No lugar das composições uniformes, McCoy construía páginas de livros e cartazes com diversos símbolos e tipologias. Através da quebra de regras do projeto gráfico (alinhamento, simetria, tipografia), criou questionamentos acerca da significação da linguagem, explorando e descobrindo os enredamentos da comunicação. 68
Katherine McCoy, revista EE UU. 1989
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Colagens e sobreposições também são utilizadas pela designer. Em 1980, o seu programa de graduação em Design foi estabelecido como um dos mais inovadores no ensino de design norte-americano. Ellen Lupton e J. Abbot Miler, dois designers/autores significativos para os anos 1980, dão importância à pesquisa na concepção do design. Expressaram esse compromisso em um manifesto de três palavras: Design/Writing/Research. Escreveram em várias publicações como Emigre, Print e Eye a partir da teoria de Foucault, de Derrida e do linguista Ferdinand de Saussure. O posicionamento de Lupton e Miller enquanto escritores e a fusão que realizaram da escrita com a imagem lhes qualifi cava com o status de autores. O livro Design Writing Research, uma compilação de seus textos críticos sobre teoria, design e meios de comunicação, confirmavam sua posição. Em 1993, o artigo, “What has Writing got to do with Design”, publicado pela designer e educadora Anne Burdick, defendia uma inseparável relação entre o verbal e o visual (POYNOR, 2003, p.126). Burdick (apud POYNOR, 2003) acredita que a escrita pode ser um meio para uma análise crítica e uma liberdade de indagar sobre a própria obra. A autora evita sugerir que a autoria no design tenha a intenção de controle dos processos editoriais por parte dos designers. Steven McCarthy é menos cuidadoso, afirmando que controlando as palavras o designer pode controlar a mensagem. Poynor (2003) acredita que a autoria gráfica é completa quando o designer tem controle total sobre o texto. A School of Visual Arts de Nova Iorque, inicia em 1998, o primeiro Mestrado em Artes Visuais, baseado no conceito de designer como autor, curso em atividade até o momento. Seu fundador, o diretor Steven Heller (acesado em 26/01/2010), considera que o conceito de autoria está enraizado na criação independente de ideias dirigidas para qualquer produto. O foco do curso é, segundo ele, a autoria no seu sentido mais amplo. O curso foi criado como uma alternativa aos cursos tradicionais da linha bauhausiana. Ao descrever a missão do curso, Heller afirma que o importante para o designer do futuro é a integração do profissional com as mais várias plataformas de comunicação. No curso, os alunos são incentivados a buscar referências em artistas visuais e de comunicação que tenham como parte de seu trabalho a produção autoral, buscam adotar um amplo conjunto de linguagens visuais como a base para toda a atividade criativa. 70
Poynor (2003) conclui suas observações dizendo que ao comprometerem-se com formas complexas de investigação gráfica e literária, os autores incentivam seus leitores a explorar, experimentar e questionar o mundo. Para expressar a ideia do designer enquanto mediador, Rock (2001) utiliza a expressão “facilitadores de rosto”, retomando a ideia moderna do designer submetido ao sistema, renunciando personalidade e detendo interpretação. Rock acredita que talvez agora esse rosto possa se mostrar, espalhando-se por novos campos. Superficialmente pode parecer uma reivindicação de propriedade sobre a mensagem, no entanto, algumas características da prática do design entram em confl ito com tentativas de autoexpressão. Parece difícil imaginar a ideia de uma mensagem descentralizada em uma relação profi ssional em que o cliente está pagando para que o designer transmita uma informação específica ou emoções. Rock também ressalta a grande quantidade de trabalhos colaborativos, tanto na relação com o cliente, quanto dentro de estúdios que utilizam o talento criativo de várias pessoas. Desse modo, definir a origem da autoria de qualquer ideia parece incerto, também às pressões da tecnologia e da comunicação apenas tornam o cenário ainda mais obscuro. Barthes (2004. op. cit.) trata em seu ensaio, o fim da ideia de autor/deus, detentor de todo o significado e questiona o poder interpretativo do leitor. A figura do autor como sujeito que detém um controle totalitário sobre a atividade criativa, parece, para Rock (2001), um ingrediente essencialmente das artes visuais. A medida definitiva de realização artística dava-se quando a figura central era elevada ao nível de gênio. Atividades como o cinema e o design que não dispunham de uma figura central clara e por isso eram desvalorizadas. Com o desenvolvimento da teoria do cinema, o crítico de cinema e cineasta François Truffaut, promulgou pela primeira vez, em 1954, a “Politique des Auteurs”, uma polêmica estratégia para reconfigurar a teoria crítica do cinema. A questão estava em como criar uma teoria que tornasse um trabalho, que foi resultado de amplo processo colaborativo, como um filme, em um trabalho de um artista, assim como na obra de arte. Para Truffaut a solução foi definir um conjunto de critérios que permitiria a um crítico definir determinados diretores como autores. A medida de declarar o diretor, que na verdade é apenas um terço da trinca criativa, como autor que tinha controle total sobre o projeto, teve o propósito de elevar o cinema ao status de arte. O crítico americano, Andrew Sarris (apud ROCK, 2001) adotou a te71
oria do autor de Truffaut e indagou três critérios para o diretor passar para a classe de autor: (1) o diretor tem de demonstrar competência técnica, (2) deve ter uma assinatura estilística que seja visível ao longo de vários filmes e (3) através de sua escolha e tratamento dos projetos cinematográficos, mostrar, uma consistência de visão e sentido subjetivo. Rock (2001) afirma que existem diversos paralelos que podem ser estabelecidos entre a direção de filmes e a prática do design. Diretores de cinema, diretores de arte e designers, tendem a distanciar-se de seu material de trabalho, dirigindo outras pessoas criativas, de forma colaborativa, em uma série de projetos diferentes. Ao longo da carreira, pode-se trabalhar com diversos níveis de potencial criativo. Se utilizarmos à teoria de autor de Sarris, para os designers gráficos, poderíamos elevá-los ao status de autor. A proficiência técnica poderia ser reivindicada, no entanto, quando adicionamos a essa uma assinatura estilística, o campo de possibilidades estreita-se. Contudo, Rock (2001) também afirma que não basta apenas técnica e estilo para elevar o sujeito à função de autor, uma vez que se juntar a isso a exigência de sentido subjetivo, a avaliação torna-se ainda mais difícil, pois a subjetividade é um dado intangível. A teoria do autor pode parecer limitada para nosso atual panorama da autoria no design, mas existem, segundo Rock (2001), outras maneiras de enquadrar a questão com base em diferentes tipos de prática como: o livro de artista, poesia concreta, ilustração editorial, etc. Porém, Rock (2001) questiona-se como ver o trabalho concebido como poética. O poema, assim como a obra de arte, é visto tradicionalmente como algo contido em si mesmo, enquanto o design tem uma função exterior ou intenção evidente. Esta oposição entre o prático e o poético pode, para Rock (2001), ser resolvida em dois exemplos de produção de design: o livro de artista e o design de ativismo. O livro de artista oferece uma forma de autoria em design em que a função foi exorcizada, em geral, é concreto, possuindo referência em si mesmo. O livro de artista permite uma série de experiências visuais, sem o ônus do cumprimento de paradigmas comerciais. Existe na história do design uma extensa tradição de livros de artista, alguns exemplos são: os Situacionistas, o grupo Fluxus e publicações experimentais nas décadas de 1960 e 1970. Entre os expoentes desta mistura eclética entre designer e autor estão: Dieter Rot, Tom Phillips, Warren Lehrer, Tom Ockerse, Johanna Drucker. Assim como artistas visuais: Robert Morris, Barbara 72
Kruger, Mary Kelly, Jenny Holzer, Hans Haacke. Rock (2001) relata que Dieter Rot produziu um conjunto monumental e consistente de livros que exploram de uma maneira autorreflexiva a natureza dos livros. Lehrer concentrou-se nos processos de produção, impressão, encadernação, aspectos do diálogo e da narrativa. Ele produziu grupos de retratos gráficos, distribuídos sob a forma de brochura. Poynor (2003) afirma que, nos anos 1980, alguns dos designers/autores mais influentes teriam surgido do gênero de livro de artista. A principal motivação dos designers era expressar conteúdo, aprendendo de forma autodidata, as técnicas gráficas necessárias para a articulação mais eficaz possível. Johanna Drucker produziu uma série de livros experimentais, onde ela escrevia, editava, desenhava e algumas vezes até imprimia. Em um de seus livros, o “The history of the/my world”, encontramos inovações tipográficas, trocadilhos visuais e jogos linguísticos. Uma obra singular que combina a história oficial com a memória pessoal da artista. Os textos em vermelho são inserções da memória da artista na história contada. O livro é também conhecido por ser uma crítica feminista a recorrente posição patriarcal da linguagem da época. Ao invés de se sentir limitada pelas restrições da impressão tipográfica, ela utilizou suas características para estruturar seus livros e ampliar sua investigação. O livro de artista pode utilizar-se de palavras, imagens, estruturas e materiais diversos para contar uma história ou invocar uma emoção. Pode ser a forma mais pura de autoria gráfica, mesmo que muitos designers qualificados venham declinando tais projetos por causa de sua singularidade, baixa qualidade técnica e ausência de aplicação prática, pois acreditam que podem acabar alienando seu profissionalismo.
Johanna Druckwerk, revista EE UU. 1990
Os sketchbooks (livro de rascunho) são cada vez mais conhecidos no meio do design. Trata-se de um suporte onde o designer pode registrar e desenvolver ideias e conceitos, transpondo limites e paradigmas do design convencional, em que os condicionamentos são deixados de lado e a espontaneidade da composição aparece. Segundo Roger Basseto e Cézar de Almeida no livro “Sketchbooks - As páginas desconhecidas do processo criativo” (2010) o caderno guarda os estudos, exercícios e arestas de futuros trabalhos. Ainda segundo os autores os cadernos são um meio para conhecer os segredos do processo criativo, pois eles trazem rascunhos e rejeições que nos revelam a organização mental do designer, por meio da experimentação como prática do cotidiano do designer, as respostas prontas, que não necessariamente significam soluções visuais efetivas, dão lugar ao experimentar, ao testar. Esses processos, consequentemente, aproximam o fazer design de alternativas inovadoras e criativas. A experimentação torna-se para o designer espaço onde tudo pode ser testado, um construir conhecimento. Incentivar jovens profissionais a “aprender a aprender” mostra-se como fundamental para o desenvolvimento de profissionais mais experientes e ousados (ROSSI, 2009). Ainda encontramos no ensaio de Rock (2001) mais dois exemplos de trabalhos que podem indicar um nível de autoria gráfica. Projetos de larga escala onde o designer é chamado para produzir sentido entre os materiais enquanto constrói uma narrativa. O autor exemplifica falando que o designer funciona como um diretor de filme sobre a estrutura cinematográfica, em uma posição primordial em relação à elaboração do material. Por último, os designers que usam o meio do design gráfico profissional para criar declarações e composições autorreferenciais. Desenvolvidos no espaço entre a orientação do projeto e a livre expressão, as obras evitam parâmetros de relacionamento com o cliente e mantêm as formas ditadas pelo mercado. Acreditamos que o fator relevante para o presente trabalho não seja uma definição centralizadora da autoria, e, sim, a busca da prática do design autoral como um fenômeno catalisador para a refl exão e o desenvolvimento teórico e prático do design. Rock (2001) conclui ao final de seu ensaio, que assim como atribuir à função de autor para o designer pode ser confuso e complexo, a maneira como os designers vêm aplicando o termo também é assim. A rejeição do papel de facilitadores e a transcendência à produção tradicional podem implicar em uma visão de design autoral como algo mais elevado e puro. O autor afirma que “a amplificação da voz 74
pessoal legitima o design tanto quanto as formas de autoria tradicionalmente privilegiadas”⁴. Depois se replica dizendo: “mas se designers devem objetivar leituras abertas e interpretações textuais livres – como uma ladainha dos teóricos contemporâneos nos convenceu – este desejo é frustrado pelas teorias opostas de autoria”⁵. Retomando Foucault questiona-se à volta do autor à responsabilidade da autoria, e um consequente estreitamento interpretativo. Neste debate de pontos positivos e negativos dos últimos anos ,o autor espera ir além do modelo do designer como herói e um dia perguntar: “que importa quem projeta?”⁶. O autor nos mostra uma visão crítica da ideia moderna de autoria no design, defendendo processos e métodos onde a multiplicidade seja respeitada, o designer como detentor de liberdade e oportunidade de experimentação, seja de forma coletiva ou individual.
4. ROCK, Michel, The designer as author Revista Eye. Copyright eye magazine © 2001. Disponível em: http://www.eyemagazine. com/feature.php?id=30&fi d=258 acessado em: 20/07/2010. 5. Ibid 6. Ibid
A formação do design gráfico internacional e, dentro deste, o brasileiro teve como grande influência a escola Bauhaus. Em seu início, a Bauhaus tinha como proposta o respeito à produção totalmente interdisciplinar, que buscava interação e colaboração entre diferentes áreas do saber. Valorizava-se desta maneira os mais diferentes processos de criação e expressão, individuais ou coletivos. No entanto, ao longo de seu desenvolvimento, a Bauhaus, adotou uma postura racionalista dos meios, a função tornou-se a qualidade predominante. O funcionalismo se estabeleceu e se estendeu para outras escolas de design como Ulm, e a Escola Superior de Desenho Industrial (ESDI) no Rio de Janeiro, um marco histórico no design gráfico brasileiro. Foi o primeiro curso superior da área de design no Brasil. Entre seus professores estava Alexandre Wollner, também integrante da comissão que organizou a ESDI. Com formação acadêmica na Alemanha e em outras escolas da Europa, os professores da ESDI, importaram, em grande medida, preceitos da estética racionalista da Escola de Ulm. Os padrões 75
formais e funcionalistas, adquiridos na formação estrangeira dos professores, tiveram grande impacto na formação de nossos designers e consequentemente, na produção do design nacional entre as décadas de 1950 a 1980. O design brasileiro sofreu grande influência dos estilos racionalistas que o precederam, com projetos objetivos tanto na linguagem como na técnica, distanciou-se da experimentação e das atividades manuais. (GOMES, 2009) Mesmo inserido neste cenário racionalista, com referências do estilo das escolas Bauhaus e Ulm, o designer, diretor de arte, poeta, escritor e professor, Rogério Duarte, apresentava em seu trabalho uma identidade visual própria. Um dos representantes do design gráfico dos anos 60, Rogério Duarte desenvolveu capas de discos, de livros entre outros. Suas peças apresentavam uma profusão de cores, tendência do psicodelismo que foi amplamente difundido nos anos 60, influenciando tanto o design gráfico como a publicidade (MELO, 2006). Duarte (2003) afi rma que era um artista se utilizando de novas linguagens, podemos afirmar também que Duarte buscava uma interação entre as linguagens emergentes na década de 60 como a música tropicalista, a televisão e o cinema. Assim como os anos 60 foram influenciados pela música, Melo (2006) afirma que os anos 70 foram fortemente influenciados pela televisão, apontando o sinal da Rede Globo com um dos mais importantes da década. Uma mudança de mentalidade em direção a uma maior liberdade no uso da linguagem gráfica passa a ser notada a partir da década de 1980. Essa década trouxe a difusão de ideias entre as várias linguagens do design. O uso das novas tecnologias passou a ser mais recorrente e o computador trouxe a facilidade da experimentação e a visualização antes da finalização dos projetos. A diversidade de materiais e ténicas de processo de criação, o hibridismo cultural e uma maior liberdade expressiva do designer, características do pós-modernismo, são parte da realidade da cultura brasileira. O designer Rafic Farah (YONAMINE, s/d), afirma que o povo brasileiro é naturalmente criativo, o que acaba sendo desenvolvido mediante a necessidade do indivíduo. Farah auto-referência seu trabalho como “arte”, e coloca a música como parte importante do seu processo de criação, demonstrando seu hibridismo. Um bom exemplo é a produção do designer Rico Lins, expoente do design brasileiro, detentor de um currículo amplo e diversificado de trabalhos em diferentes suportes, tais como revistas, jornais, televisão entre outros. Para citar alguns exemplos, Rico Lins já passou pelos canais de televisão MTV e Nickelodeon, 76
RogĂŠrio Duarte, capas de LP. s/d
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pela revista Newsweek e pelo jornal Times. Premiado e reconhecido internacionalmente, Lins transita entre a fronteira do design gráfico e as artes visuais. Utiliza-se tanto de técnicas mais tradicionais, que refletem sua bagagem cultural, como gravuras, ilustrações e colagens, quanto de softwares de edição e criação digital.
Design, arte e artesanato têm muito em comum e hoje, quando o design já atingiu uma certa maturidade institucional, muitos designers começam a perceber o valor de resgatar as antigas relações com o fazer manual (CARDOSO, 1964, p. 15).
Para Rico Lins (2009) as novas tecnologias devem ser utilizadas como possibilidade de misturar o tradicional (técnicas manuais) com o digital, sempre em busca de uma identidade. Ele afirma também que o digital trouxe a possibilidade do “erro” e se o designer, assim como o artista visual, estiver aberto a aceitar os imprevistos poderá vislumbrar um novo mundo de possibilidades. O acaso não se limita ao inesperado, mas a um olhar atento que entende tudo ao seu redor como possibilidade para o objeto, desde uma foto no jornal do dia até uma cena cotidiana do trabalho. O “erro”, um imprevisto no percurso da criação, quando utilizado como uma nova possibilidade no processo pode acabar tendo bons resultados no produto final, este é um exemplo de como através do acaso podemos gerar novas descobertas (SALLES, 1998). O processo autoral, como um meio de desenvolvimento autônomo e independente, não está submetido aos problemas do “erro”. Sendo um meio de desenvolvimento livre dos paradigmas comerciais, está aberto a todas as possibilidades. Podemos aqui estabelecer uma analogia com o pensamento de Paul Klee (1990), segundo o qual, “a estupidez também nos ajuda a fazer descobertas” (p. 236). Assim se dá “a ação do poder criador do acaso” (SALLES, 1998, p.34), através de uma mente aberta, à procura de possíveis soluções para o objeto. A criação e as 78
ideias que nascem da ação do acaso, não fazem parte de um processo linear, podem surgir de caminhos inesperados. É estando aberto a novas possibilidades que o designer Rico Lins transita no limite entre arte e o design, fazendo experimentações com as variações de tamanho e formato de fontes e ilustrações, explorando o que cada uma dessas expressões permite. As alterações de proporções e formatos são características das artes gráficas industriais tanto quanto a reprodutibilidade técnica. Essas experimentações podem ser vistas nos cartazes para a mostra “Brasil em Cartaz” (figuras 07 e 08), onde Rico Lins não só brincou com tamanho e o formato das fontes e ilustrações, como também com a diagramação do cartaz. Neste mesmo projeto, Lins sobrepõem às técnicas offset, serigrafia e lambe-lambe, em um projeto totalmente experimental. “Quando um selo vira cartaz ou um cartaz vira um selo, não é só o tamanho ou a função que se modificam, mas, sobretudo, sua relação com o espectador e o contexto” (LINS, 2009). Para Lins (2009), a imagem não é obrigada a concordar com o texto e tem personalidade própria. “O importante é transferir um significado a ela, no sentido de se forjar um repertório” (2009), defende. “Quando se estabelece uma coexistência entre os dois, a qualidade do trabalho editorial é superior, porque se obriga o leitor a treinar o olhar, ampliando sua possibilidade sensorial e intelectual” (LINS, 2009). Também com características híbridas e autorais destaca-se a produção de Guto Lacaz, artista, ilustrador, designer, cenógrafo e editor de arte. Lacaz explora em seu trabalho objetos do cotidiano e possibilidades tecnológicas, transitando entre design gráfico e arte. Uma das referências de Lacaz é o designer Neville Brody, já citado neste texto. Lacaz faz parte de uma geração de profissionais que se tornaram designers de forma autodidata ou que vinham de uma formação em arquitetura, que até então abrangia várias especialidades. Entre os trabalhos já realizados está o livro Personagens, de Vânia Toledo e o redesign do projeto gráfico da revista Junguiana, da Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica. Segundo o próprio Lacaz, o interessante da profissão de designer é que cada dia se faz algo novo, mas com uma essência em comum, uma marca da autoria. Quando se acompanha a trajetória de um designer pode-se identificar os projetos feitos por ele mesmo, sem sua assinatura. O desenho revela a empresa, o cliente e ao mesmo tempo a marca do designer que o fez. Segundo Lacaz, isso acontece em cada solução conquistada pelo designer (LACAZ, 2004). Guto Lacaz tem o humor sutil permeando desde seus trabalhos de design gráfico até suas ilustrações pessoais. Sua paixão pelo estilo cartoon também pode ser percebida em ambos os trabalhos. 79
Designers como Guto Lacaz e Rico Lins assumem uma postura de constante experimentação em seus processos. Utilizam-se de uma cultura multidisciplinar jå rica no Brasil para o desenvolvimento de trabalhos pessoais e comerciais.
Guto Lacaz, folder. s/d
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Guto Lacaz, desenho autoral. s/d
Rico Lins, mostra "Brasil em cartaz". 2005
Rico Lins, mostra "Brasil em cartaz". 2005 81
3.4
DESIGN AUTORAL E OS NOVOS DESIGNERS
O designer Lauro Machado (2010), do Estúdio Insólito, relata em entrevista que sempre procura adaptar e incorporar experiências visuais ao trabalho profissional. O designer usa como exemplo algumas ilustrações que fez para a revista Vida Simples da editora Abril e compara com algumas ilustrações pessoais, nas quais os elementos e técnicas relacionam-se de forma perceptível. Podemos perceber como traços de seu trabalho autoral, também notados em trabalhos comerciais. O uso de texturas, linhas e transparências sobrepostas nas figuras 11 e 12, podem ser notados com uma aparência mais limpa nas figuras 13, 14 e 15. Podemos perceber também a ilustração relacionando-se com as palavras de forma muito semelhante nas figuras 12 e 15. Machado (2010) afirma que a diferença entre elas é uma abordagem mais didática que deve ser desenvolvida no trabalho comercial, enquanto no pessoal ele não tem a obrigação da compreensão por parte do receptor/leitor. Outras diferenças são de cunho estético como, por exemplo, a composição mais limpa nos trabalhos para revista que tem uma composição mais minimalista segundo o designer. Mesmos com trabalhos comercias dialogando de forma tão clara com a produção autoral do designer, acredita que as exigências e obrigações de um trabalho comercial o distanciam do pessoal, tornando a fusão entre ambos um objetivo um tanto quanto utópico. Podemos notar esse distanciamento na revista institucional com perfil corporativo da Fundação 82
Vale, desenvolvida por Machado no Estúdio Insólito. Também podemos perceber um trabalho bem limpo e objetivo no desenvolvimento da identidade visual para e empresa de consultoria tributária Millenium. Atualmente relata ter pouco tempo para desenvolver trabalhos mais autorais, mesmo assim acredita que eles têm um grande valor, principalmente em relação à exploração de novas técnicas e possibilidades que futuramente poderão ser empregadas em um trabalho comercial.
Lauro Machado, ilustração pessoal.2007
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Lauro Machado, ilustraçþes pessoais. 2008
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Lauro Machado, Identidade visual Millenium. 2008 Lauro Machado, revista Vida Simples. s/d
Lauro Machado, revista Vida Simples. s/d
Lauro Machado, revista Vida Simples. s/d
Lauro Machado, perfil corporativo fundação Vale. 2007
Lauro Machado, perfil corporativo fundação Vale. 2007
Colletivo, revista Computer Arts. 2009
Colletivo, redesign da marca. 2009
Colletivo, redesign da marca. 2009
O Estúdio Colletivo, localizado em São Paulo, e em atividade desde 2003, acredita que trabalhos autorais são um exercício a criatividade. Alinhado a esse pensamento, o Colletivo (2011) apresenta trabalhos experimentaIs, além da mistura de materiais, como base de seus projetos (figura 19). Atuando nos mais diversos segmentos do design, já atenderam a clientes como Nike, Pepsi Co., MTV, Nickelodeon, Almap BBDO, Microsoft Zune, Hello Kity, Converse, Adidas, F/NAZCA, dentre outros. Acreditam que através da experimentação eles podem sair do comum. No trabalho desenvolvido dentro do estúdio, o Colletivo (2011) afirma valorizar as ideias, partindo da prancheta e do lápis, utilizando o computador apenas como uma ferramenta sem a necessidade de se prender às limitações de um software. Para o grupo, é no papel que podem ultrapassar a área limite do computador. Em uma entrevista concedia para o site da abc Design (2009), os designers falam de um olhar único, uma mistura da todas as pessoas que trabalham no Colletivo. Segundo eles são as referências individuais e a cumplicidade entre eles que transmite ao grupo as mais diversas maneiras de mostrarem como veem o mudo. Para eles, é isso que faz com que a equipe funcione, os diferentes profissionais se completam. Em seu perfil na Internet, o estúdio Colletivo relata que “o design não tem que ser só” (acessado em 26/01/2011), pensamento este que demonstra a visão multidisciplinar do grupo que procura trabalhar em conjunto com outras disciplinas e profissionais ao invés de isoladamente. O design “pode ser inspiração e teoria. Cérebro e emoção. Comercial e experimental” (anexo, 2011). Com esse pensamento o Colletivo não tem medo de assumir uma unidade em seu portfólio que transporta características dos trabalhos experimentais para os comercias, todos com muita ilustração, cor e humor. Trabalhos que demonstram que é possível a criação e autoria dentro de um grupo de designers.
Colletivo, revista Computer Arts. 2009
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O designer Felipe Guga (2010) criou duas coleções de camisetas em que desenvolveu um briefing próprio e gerou um conceito para coleção. Um exemplo claro da autoexpressão e autorreferência discutidas por Rock. A coleção “Equívocos” traz estampas com temas cotidianos, como o aquecimento global e o fast-food em forma de paródia. Guga acredita que a prática de trabalhos autorais é de fundamental importância, pois, segundo ele, gera um universo visual único, próprio, onde a sua linguagem é reconhecida. Podemos perceber em trabalhos comerciais como: design de superfícies, ilustrações e design gráfico, do designer Felipe Guga, as mesmas referências dos trabalhos pessoais, ambos desenvolvidos com colagem e sobreposição de imagens e tipografia. A integração de desenhos feitos com nanquim e recursos de softwares de tratamento de imagem parecem ser a marca registrada do designer, presente nas mais variadas vertes de seus projetos. Em uma palestra que ministrou na PUC-Rio, refletindo sobre a importância do trabalho autoral, Guga (2010) afirma ter chegado à conclusão de que os trabalhos pessoais são as sementes dos próximos trabalhos, as próximas referências de si mesmo. Marcos Cherfêm, também designer entrevistado para esta pesquisa, realiza trabalhos autorais mais voltados para a exploração do processo. O designer relata que são os mais gratificantes no sentido da liberdade de construção da forma gráfica. Para Cherfêm, o que perfaz a trilha de todo o desenvolvimento de um trabalho autoral acaba sendo a própria mente/intuição, tendo como base a racionalidade, para que o trabalho não se perca ou acabe sendo algo sem fundamento. O designer afirma que o design autoral ajuda cada vez mais na questão da identidade do designer que é guiado por aquilo que mais lhe agrada e atrai. Como exemplo de exploração de processo ele cita o Projeto Re-gina. Segundo o designer não existe um motivo claro para resolver experimentá-la, mas acredita que o que causou bastante interesse foi o fato da imagem ser um tanto quanto Felipe Guga, ilustrações pessoais . s/d
“banalizada”, tendo como referência a questão imagem/marca. Para experimentação e exploração do projeto, Cherfêm fragmentou a estrutura básica da imagem e passou a testar possibilidades construtivas do projeto. Segundo o designer “é como entrar no DNA da imagem tendo que tomar o devido cuidado de não perder sua essência” (CHERFÊM, ANEXO 2010).
Felipe Guga, cartaz para festa Maja. 2008
Colletivo, materiais gráficos Spezzato Teen. 2007
Felipe Guga, coleção "Equívocos". 2008
Felipe Guga, revistas Capricho, Simples e Zupi. s/d
Felipe Guga, trabalhos para Redley e Farm. s/d Felipe Guga, cartaz para festa Maja. 2008
Para Cherfêm, trabalhos assim propiciam duas situações essenciais: uma em que você acaba desenvolvendo cada vez melhor o “modus operandi” para iniciar qualquer projeto e outra em que se torna mais fácil a associação das formas, cores e etc; com a pessoa que as cria. O designer afirma ainda que a prática do projeto autoral não possui muitos “paras” e “porquês”, mas ao mesmo tempo possibilita um aprendizado sufi ciente ou mesmo essencial na questão intelectual de exploração do estudo: � da forma; � de algum contexto; • da não vivência; • ou mesmo do caráter plástico/estético/experimental. Em trabalhos comerciais, como o que Cherfêm (2010) desenvolveu para as comemorações do 1º ano de existência da Votorantim Siderurgia, podemos notar a construção de uma identidade em que se faz uso dos próprios materiais vendidos tipicamente para tal segmento. Podemos notar que, assim como no Projeto Re-gina, existe uma apropriação de elementos cotidianos e sua aplicação para novas possibilidades visuais. A variedade de possibilidades para exploração de outras dimensões do design, como por exemplo: desconstrução, apropriação e autoria nos remetem às reflexões de Rick Poynor (op. cit. 2003) já citado no presente trabalho.
Marco Cherfêm, projeto gráfico experimental. 2010
Toda a pluralidade do pós-modernismo mostra-se cada vez mais necessária aos dias de hoje. As mudanças são cada vez mais rápidas e a comunicação cada vez mais complexa. Um exemplo de pluralidade é o trabalho de Juliana de Campos Silva (2011), arquiteta e urbanista pela FAU-USP, também pós-graduada em Design e Humanidade no Centro Mariantonia. Juliana desenvolve trabalhos em estúdio como assistente de arte e designer, participa de um coletivo onde é responsável pela identidade visual de produtos de comunicação e desenvolve trabalhos como freelancer. Juliana é adepta dos sketchbooks. Segundo ela, são separados por tema ou por data, tornando-se um apoio para o pensamento sem deixar de ser um projeto pessoal. Quanto ao método admite não existir uma “receita de bolo”, cada trabalho exige metodologias específicas. Mesmo sem a pretensão de imprimir em seus trabalhos uma “assinatura”, Juliana (2011) reconhece elementos comuns, ela cita como exemplos a busca pela clareza, legibilidade e simplicidade. Juliana acredita ver em suas peças um toque de humor e surpresa, e que estes devem estar associados a um trabalho bem desenvolvido. Os trabalhos de Juliana além de plurais quanto à linha de desenvolvimento, também apresentam uma variada experimentação de técnicas. O trabalho pessoal onde Juliana imprime suas gravuras sobre impressão tipográfica nos remete aos trabalhos de Rico Lins em “Brasil em Cartaz”. Juliana é mais uma designer que integra a diversidade em seus projetos e acredita no desenvolvimento de trabalhos autorais.
Marco Cherfêm, 1º Ano de Votorantim Siderurgia. s/d
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebemos que existem ainda muitas lacunas a serem preenchidas, não obstante, algumas questões puderam ser levantas no presente projeto. Podemos perceber uma maior autonomia em designers com projetos autorais e verificamos que o fenômeno autoral se desenvolve associado à criatividade. Esta deixa de fazer parte de uma esfera de “inspiração”, ascendendo para um campo mais palpável, quando pode ser exercitada e desenvolvida. Buscamos no primeiro capítulo conceitos sobre criatividade que pudessem delimitar e apoiar nossas discussões quanto à importância da autoria como um fenômeno que abre novas possibilidades criativas. No decorrer de nossa pesquisa, acabamos percebendo que o fenômeno autoral, não apenas auxilia no desenvolvimento da criatividade e sim está inserido nela. Através de nossa pesquisa, percebemos que o fenômeno autoral e a experimentação são intrínsecos à criatividade. As teorias que buscam desenvolver o processo criativo acabam por conduzir e incentivar a ocorrência do design autoral. Constatamos que o desenvolvimento de trabalhos autorais e experimentais estabelece oportunidade de diálogo do designer consigo mesmo, bem como com seu processo de trabalho. “Sem dúvida, experimentações projectuais não se aplicam a qualquer produto ou cliente, mas são importantes para aqueles que trabalham com inovação” (ROSSI, 2009, p.170). Essa prática independente acarreta para o designer uma necessidade de organização e investigação dentro de seus processos de criação. Ao discutirmos questões relacionadas ao método de trabalho, entendemos que o desenvolvimento de metodologias próprias é relevante ao design. Em nossa pesquisa e entrevistas realizadas, percebemos que o designer pode desenvolver seu trabalho de forma mais livre se estiver dentro de uma metodologia própria de trabalho. O design experimental e o fenômeno autoral propiciam ao designer a vivência da prática do desenvolvimento do processo de trabalho. Quando o designer domina seus métodos e estes estão alinhados com suas preferências, um alargamento da visão das possibilidades do projeto pelo designer torna-se mais favorável. Percebemos também que a sistematização do trabalho pode não ser tão rígida quanto à palavra “método” pode parecer. Os designers apresentaram métodos como refl exões internas e até pessoais, desenvolvidas no decorrer do processo de criação. O design autoral vem também de encontro a uma pluralidade de técnicas e meios, pois, traz para o cotidiano do designer uma investigação processual. Acreditamos que a abertura a uma maior expressividade no processo criativo não 93
significa, necessariamente, uma deficiência na funcionalidade do objeto. Do mesmo modo, a possibilidade de identificar um designer pelas suas marcas, não significa que este não reconheça os limites da autoria. As tendências pós-modernistas no design levantaram muitas questões quanto à autoria e também demonstraram como o fenômeno autoral e a experimentação, são um campo fértil ao desenvolvimento de trabalhos com um cunho investigativo no design. As discussões levantadas quanto à autoria no design são benéficas para uma reflexão do designer sobre suas práticas. A autoria e a experimentação apresentaram-se como catalisadores para a inovação no design. A inovação e a criatividade são recorrentes na prática do design, exigindo para seu desenvolvimento exercícios de imaginação, método e criação como um todo. Os processos autorais e experimentais são uma via para ampliar as possibilidades de resultado no design.
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PALESTRAS E ENTREVISTAS CHERFÊM, Marco. Entrevista concedida por e-mail a Simone Pereira de Assis. São Paulo, 2010. DELLANI, Bruno. Entrevista concedida por e-mail a Simone Pereira de Assis. São Paulo, 2010. GUGA, Felipe. Entrevista concedida por e-mail a Simone Pereira de Assis. São Paulo, 25 de janeiro de 2010. LINS, Rico. Palestra na Conferência de Design e Arte Pixel Show. São Paulo, 2009. MACHADO, Lauro. Entrevista concedida por e-mail a Simone Pereira de Assis. São Paulo, 2010. REFERÊNCIAS EM MEIO DIGITAL Rico Lins + Studio, http://www.ricolins.com/ acessado em 5/01/2011 Guto Lacaz, www.gutolacaz.com.br acessado em 07/01/2011 Estúdio Insólito, www.estudioinsolito.com.br acessado em 13/12/2010 Felipe Guga, www.felipeguga.com acessado em 07/12/2010 Marco Cherfêm, www.marcocherfem.com.br acessado em 15/12/2010 Homepage do livro Sketchbooks - As páginas desconhecidas do processo criativo www.sketchbooks.art.br acessado em 28/01/2011 Home page Estúdio Colletivo, http://www.colletivo.com.br/site/src/index_ful. html acessado em 26/01/2011
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LAURO MACHADO
Entrevista concedida via e-mail por Lauro Machado a Simone Pereira de Assis em 2010 Você desenvolve trabalhos autorais além dos comerciais? Qual a importância e influência dessa prática para você? Machado: Atualmente tenho pouco tempo para desenvolver trabalhos mais autorais, mas acredito que eles têm um grande valor, principalmente em relação à exploração de novas técnicas e possibilidades que futuramente poderão ser empregadas num trabalho comercial. Acredita que o desenvolvimento de trabalhos pessoais pode levar a uma metodologia própria de trabalho? Machado: Tanto os trabalhos pessoais quanto comerciais podem te levar a criar uma metodologia própria. Acredito que o próprio fazer te direciona esse sentido. Obviamente que num processo comercial, com briefing e prazo, a necessidade de se seguir um método é maior. Utiliza algum método de trabalho que tenha sido desenvolvido por outro designer ou pesquisador? Quem? Machado: somos influenciados a todo o momento, com a metodologia não é diferente. Hoje utilizo no meu escritório alguns dos métodos que conheci nos lugares onde trabalhei. Um exemplo seria a Ana Couto Branding&Design, de onde extraí os processos de briefing,
pesquisa, monitoramento e apresentação dos trabalhos. Acredita que a utilização de métodos inibe a criatividade? Machado: Não acredito nisso. Acho que o método ajuda a embasar a criatividade. Para mim a criatividade é a ideia em si, o método, a técnica, a repetição são fundamentais para alcançar a forma ideal. Um exemplo, o Kandinsky repetia o desenho dos seus quadros mais livres inúmeras vezes até chegar ao resultado expressivo que ele imaginou. O que parece ser algo instintivo, visceral é na verdade fruto de muito estudo e repetição. Trabalhos autorais podem ser um exercício a criatividade? Machado: Claro, essa é a essência deles. É uma maneira de expressar a sua ideia através do seu estilo. Gostaria de sua opinião sobre seu trabalho. Semelhanças e diferenças em peças puramente comerciais e outras com alguma marca de autoria. (Acrescentar as imagens dos exemplos que serão citados nesta resposta) Machado: Em anexo estão às imagens dos trabalhos e abaixo alguns comentários. Usei como exemplo essas ilustrações para a vida simples, pois elas têm a melhor relação com os trabalhos autorais. De forma geral, a maior diferença entre 105
eles está na abordagem visual mais didática do tema. Enquanto nos autorais, trato de temas puramente pessoais, que não têm a obrigação da compreensão pelo espectador, na vertente comercial, a editora me passa o assunto a ser tratado pela coluna e tenho que fazer uma imagem que remeta a ele e que seja identificada pelo leitor. Os temas das imagens são: vida_simples_01: amorosidade (a capacidade de nos doar) vida_simples_02: o prazer da mesa vida_simples_03: ausência (quando alguém se afasta de nós) Outras diferenças são de cunho estético, como uma composição mais limpa nos trabalhos para a revista (pois a revista tem um projeto gráfico bem minimalista) e a inclusão da figura humana como elemento chave para o reconhecimento do tema. Outras considerações a respeito do assunto? Machado: De maneira geral acho um tema bem relativo pois o processo criativo pode variar de acordo com as características do projeto.
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Lauro Machado, capas de livro. s/d
Fragmento
Vida Simples 01
Jardim
Occiptal
Vida Simples 02
Vida Simples 03
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FELIPE GUGA
Entrevista concedida via e-mail por Felipe Guga a Simone Pereira de Assis em 2010 Você desenvolve trabalhos autorais além dos comerciais? Qual a importância e influência dessa prática para você? Guga: Faço sim, já fiz umas duas coleções de camisetas, na qual eu mesmo me briefei e gerando todo o conceito da coleção. Essa prática do trabalho autoral é de fundamental importância pra mim pelo fato de gerar um universo visual único, próprio onde a minha linguagem é reconhecida no meio e também por quem está de fora. Acredita que o desenvolvimento de trabalhos pessoais pode levar a uma metodologia própria de trabalho? Guga: Acredito que sim, porque trabalhando pra mim mesmo, gerando uma linguagem própria, sem briefings pré-definidos por diretores de arte, eu dou espaço para minha criatividade trabalhar livremente e o resultado é sempre gratificante porque não houve intercessões de terceiros ou de fatores comerciais que podam o fator criativo da coisa. No fim dessas contas, o trabalho autoral leva sim o artista a ter uma metodologia própria, sua. Utiliza algum método de trabalho que tenha sido desenvolvido por outro designer ou pesquisador? Quem?
Guga: Não, tudo o que eu sempre criei foi baseado nas minhas vivências e inspirações, nunca segui nenhum método de trabalho alheio...se segui foi inconscientemente uma vez que nunca tive muito acesso a métodos alheios, além de achar que traçar o meu próprio caminho é sempre uma escolha acertada. Acredita que a utilização de métodos inibe a criatividade? Guga: Não sei, não me sinto podado criativamente pelo fato de ter um método teoricamente meu de trabalhar..claro que desconstruir o método levará a novas ideias e irá gerar novas soluções pros problemas, mas tudo vai depender de onde se quer chegar. Quando me sentir vazio de ideias fatalmente irei desenvolver um novo método para abrir novos caminhos e possibilidades. Trabalhos autorais podem ser um exercício a criatividade? Guga: Com certeza, acredito até que a grande maioria dos trabalhos de fato criativos foram os que surgiram nesse exercício..justamente porque não houve nenhum limitador ou regra a ser seguida. Gostaria de sua opinião sobre seu trabalho. Semelhanças e diferenças em peças puramente comerciais e outras com alguma marca de autoria. (Acrescentar as imagens dos exemplos que serão citados nesta resposta) 109
Guga: Vou te anexar dois trabalhos, um mais comercial e outro mais pessoal/autoral. Na ilustração comercial, do homem com a bola de futebol, existiram mil regras e exigências para a execução do mesmo, tinha que ser um homem x, de estatura x, com cor de pele y, e por aí vai... Certamente foi um dos trabalhos mais trabalhosos que eu já fi z, uma vez que até a aprovação dele tive que desenhar pelo menos umas 6 vezes o rosto e o corpo do personagem..o cenário também, fiz algumas vezes até chegar nesse resultado...cada tom de cor a mais era retirado, cada elemento a mais também,a perspectiva não foi das mais fáceis pra se fazer também..Enfim, foi um trabalho totalmente voltado pra se vender um produto da faculdade, Mackenzie, no caso e cheio de regrinhas que limitavam por completo meu jeito de criar e ilustrar. Já a ilustração autoral, o briefing foi criado por mim mesmo, a direção de arte também e o resultado fi nal foi uma colagem criativa para uma marca de roupa daqui do Rio q sempre me encomenda esse tipo de linguagem pras suas estampas e coleções. Eu praticamente inventei esse novo jeito de fazer estampas e eles compraram a ideia e sempre encomendam com uma única exigência, que eu faça o que eu achar bonito e inovador. Aí, ao contrário da 110
ilustração comercial, nessa eu posso fazer o que me der na telha, o prazer de fazer um trabalho como esse é quase incomparável com um comercial, mais quadradão. Outras considerações a respeito do assunto? Outro dia refletindo sobre a importância do trabalho autoral numa palestra que eu dei na faculdade PUC aqui do Rio, cheguei a conclusão de que os trabalhos feitos pra mim mesmo, são as sementes dos próximos trabalhos que irão me pedir, serão as minhas próximas referências de mim mesmo e também dos diretores de arte que conhecem meu trabalho..o trabalho autoral gera uma demanda de algo que ainda não existe demanda, mas vai existir provavelmente daqui um tempo e isso é muito animador para quem trabalha com trabalho autoral.
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bruno dellani
Entrevista concedida via e-mail por Bruno Dellani a Simone Pereira de Assis em 2010 Você desenvolve trabalhos autorais além dos comerciais? Qual a importância e influência dessa prática para você? Dellani: Até o momento não, tenho algo em andamento, faço algo próximo disso que é pegar os trabalhos comerciais e dar uma retrabalhada para meu portfólio pessoal, uma vez que muitas das artes que faço precisam de algumas limitações por se tratar de estamparia. Daí faço minha versão do material, seguindo texturas, misturando as lógicas do que estava trabalhando para diversas peças. Acredita que o desenvolvimento de trabalhos pessoais pode levar a uma metodologia própria de trabalho? Dellani: Sim, como artista ajuda a desenvolver um estilo, uma linha de raciocínio. Mas comercialmente é complicado uma vez que é necessário seguir a necessidade do projeto em desenvolvimento.
Acredita que a utilização de métodos inibe a criatividade? Dellani: Comercialmente pode limitar um pouco uma vez que, pelo menos na área de moda, é necessário variedade de estilos e técnicas. Trabalhos autorais podem ser um exercício a criatividade? Dellani: Sim, claro, tenho dois projetos pessoais em andamento, os primeiros por sinal totalmente fora do campo profi ssional. Isso ajuda o artista/designer a exercitar a pesquisa, a saber misturar ideias e criar conexões entre diferentes temas/ideias. Outras considerações a respeito do assunto? Dellani: É importante frisar que o trabalho do designer é um trabalho voltado para uma necessidade comercial/ industrial e o trabalho do artista é uma necessidade puramente pessoal. Ter estilo no design pode ser limitador, enquanto na arte nem tanto, mas ambos precisam de bons conceitos, pesquisa e muito trabalho.
Utiliza algum método de trabalho que tenha sido desenvolvido por outro designer ou pesquisador? Quem? Dellani: No meu trabalho eu não chego a me espelhar especificamente em um estilo ou artista/designer. Vai muito da necessidade do tema abordado nas coleções que trabalho. 113
marco cherfĂŞm
Entrevista concedida via e-mail por Marco Cherfêm a Simone Pereira de Assis em 2010
referencia e a partir de então vou dando os cortes no que julgo mais importante até chegar a um resultado final.
Você desenvolve trabalhos autorais além dos comerciais? Qual a importância e influência dessa prática para você? Cherfêm: Faço sim. E sinceramente acho que são os mais gratificantes no sentido da liberdade de construção da forma gráfica. No meu caso sinto que o que trilha todo o desenvolvimento de um trabalho autoral acaba sendo a própria mente/intuição tendo como base a racionalidade, para que o trabalho não se perca e nem torne algo sem fundamento. Acredito que o design autoral ajuda cada vez mais na questão da identidade do designer que é guiado por aquilo que lhe mais agrada e atrai.
Utiliza algum método de trabalho que tenha sido desenvolvido por outro designer ou pesquisador? Quem? Cherfêm: Admiro muito os trabalhos do Stefan Segmaister e da Paula Scher. Na verdade não conheço muito bem ambas as metodologias, mas é notório quanto produto final a pesquisa e o cuidado que é dado para cada projeto. Acho que pra qualquer designer o processo sempre é mais interessante do que o próprio resultado final.
Acredita que o desenvolvimento de trabalhos pessoais pode levar a uma metodologia própria de trabalho? Cherfêm: Depende muito... Acredito que a uma metodologia especifica é um termo muito forte a partir que se têm as mais variadas propostas para desenvolver algum projeto. Aqui me refiro ao suporte a ser trabalhado e os materiais como também na questão do tempo a ser cobrado pela elaboração. Mas no geral a uma metodologia sequencial do processo criativo acho que pode ser defi nido sim... No meu caso pelo menos costumo sempre com um painel de
Acredita que a utilização de métodos inibe a criatividade? Cherfêm: Acho que os métodos dados nas escolas de design devem ser muito bem explicados. Digo enquanto regras “briefing” antes de cada elaboração de projeto. Coisa que não acontece na maioria das vezes nas aulas como de laboratório experimental ou mesmo desenho. Os professores infelizmente decidem as regras conforme os alunos criam e isso com certeza inibem sim!! Nesse momento fica bastante explicito a falta de conhecimento do professor e mais do que isso, o sentimento de insegurança que é passado ao aluno que esta se desafiando a trilhar uma própria linha de raciocínio.
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Trabalhos autorais podem ser um exercício a criatividade? Cherfêm: Só olhar os trabalhos autorais de qualquer designer da Bauhaus até chegar à própria Zarah hadid. Já terá qualquer resposta! Risos. Gostaria de sua opinião sobre seu trabalho. Semelhanças e diferenças em peças puramente comerciais e outras com alguma marca de autoria. (Acrescentar as imagens dos exemplos que serão citados nesta resposta) Cherfêm: Acho que o exemplo que tenho mais como referência e que posso argumentar é o Projeto Re-gina. Na verdade não sei de onde ou por que resolvi experimentá-la, mas acho que o que causou bastante interesse foi o fato dela ser uma imagem o tanto quanto “banalizada” (na questão enquanto imagem/marca). Quando comecei a fragmentar seu rosto tendo como principio apenas sua estrutura básica (no caso o formato do rosto, olho e boca), comecei a modifi car todo o resto e ver que possibilidades existiram enquanto estava sendo processado. A sensação é de entrar no DNA da imagem e tendo que tomar sempre o devido cuidado em não perder a sua essência. Acho que o mais bacana desse tipo de trabalho tem como principio duas situações essenciais: 116
- uma em que você acaba desenvolvendo cada vez melhor o modus operandi para iniciar qualquer projeto; - e fica cada vez mais fácil a associação das formas, cores, etc, com a pessoa que os cria. Acredito que o projeto autoral não tem muito “paras” e “porquês”, mas ao mesmo tempo possibilita um aprendizado sufi ciente ou mesmo essencial; seja na questão intelectual de exploração do estudo: • da forma; • de algum contexto; • da não vivência; • ou mesmo do caráter plástico/estético/experimental. Outras considerações a respeito do assunto? Cherfêm: Acho que tem uma citação do Roland Barthes que resume bem a sua pesquisa: “Ha uma idade em que se ensina o que se sabe; mas vem em seguida outra, em que se ensina o que não se sabe: isso se chama pesquisar. Vem talvez agora a idade de uma outra experiência a de desaprender, de deixar trabalhar o remanejamento imprevisível que o esquecimento impõe à sedimentação dos saberes, das culturas, das crenças que atravessamos. Essa experiência tem, creio eu, um nome ilustre e fora
de moda, que ousarei tomar aqui sem complexo, na própria encruzilhada de sua etimologia: Sapientia: nenhum poder, um pouco de saber, um pouco de sabedoria, e o máximo de saber possível” (BARTHES, Roland - ANATOMIA DO DESIGN, pág 168).
Marco Cherfêm, experimental. s/d
Marco Cherfêm, capa de revista. s/d
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juliana silva
Entrevista concedida via e-mail por Juliana de Campos Silva a Simone Pereira de Assis em 2011 Você desenvolve trabalhos autorais além dos comerciais? Qual a importância e influência dessa prática para você? Juliana: Penso no que seria exatamente essa diferença entre trabalhos autorais e comerciais. O trabalho autoral seria o trabalho sem “cliente”, sem usuário, sem finalidade? Isso eu acho que não existe, e, mesmo que seja às vezes difícil de identificá-lo, é algo que precisamos fazer (nem que isto mude ao longo do processo), mas é algo que ajuda muito no trabalho. Atualmente desenvolvo trabalhos nas três esferas que você menciona na sua pesquisa: estúdio ou ateliê, onde sou assistente de arte e designer; coletivo, num escritório de projeto e planejamento urbano, em que sou designer responsável pela identidade visual da empresa e produtos de comunicação externa; e freelancer, quando trabalho em casa no projeto de um livro de pequena tiragem, por exemplo. É nestes trabalhos em que queimo os miolos, pesquiso, desafio a mim mesma a chegar em algum lugar desconhecido. Uma coisa que faço constantemente é ter cadernos de anotações e desenhos.
Separados por temas, ou por data, são um apoio ao pensamento, que acho que pro arquiteto e pro designer se manifesta muito em sketches e palavras. De certa forma os cadernos são também um projeto pessoal. Outro espaço importante é o da pesquisa: estou finalizando uma pós-graduação em design gráfico e filosofia, fiz alguns outros cursos de temas específicos que me interessam. Isso é uma forma de alimentar esse repertório pessoal e profissional, uma experiência que não vem especificamente do trabalho, mas que vem para transformá-lo, certamente, na medida em que me transformo. Acredita que o desenvolvimento de trabalhos pessoais pode levar a uma metodologia própria de trabalho? Juliana: Sim, claro. E é importantíssimo conhecer a sua própria metodologia de trabalho. Cada um tem a sua, não tem receita. Conhecer o próprio processo ajuda o desenvolvimento dos trabalhos. Utiliza algum método de trabalho que tenha sido desenvolvido por outro designer ou pesquisador? Quem? Em cada experiência de trabalho que tive, adquiri conhecimentos a cerca de metodologias de trabalho. Como cada ideia, cada coisa, cada produto, exige um tipo de processo, então a metodologia muda. Mas sou muito interessada 119
em processos, estou sempre os investigando a fim de aperfeiçoar o processo e chegar a lugares mais interessantes. Acredita que a utilização de métodos inibe a criatividade? Juliana: Acho que não! Talvez, se a pessoa se sentir muito presa a algumas regras, mas a metodologia é a descrição da forma que se trabalha melhor. Trabalhos autorais podem ser um exercício a criatividade? Juliana: Com certeza o são, o que não significa que sejam fáceis ou prazerosos! Criar pode ser bem sofrido e angustiante, enquanto se percorre o caminho de pedras em direção ao punctum! Gostaria de sua opinião sobre seu trabalho. Semelhanças e diferenças em peças puramente comerciais e outras com alguma marca de autoria. (Acrescentar as imagens dos exemplos que serão citados nesta resposta) Juliana: Novamente aqui sinto dificuldade em fazer esta diferenciação. Talvez porque eu não tenha uma preocupação em expressar a minha “assinatura” nos trabalhos que faço, mas sim em apresentar o conteúdo deles da melhor maneira possível! Assim, posso apontar elementos que se repetem em todos os tipos de trabalho: um compromisso com a clareza, com a legibilidade, a busca pela simpli120
cidade, e a tradução imagética dedigna do conteúdo. Preocupações com a composição, proporção... Isto sem falar na qualidade de imagens, tipos, impressão, impacto ambiental... Enfim, coisas do design! Alguma graça, algum elemento surpresa também é recorrente, como o catálogo infantil para a Editora 34 (http:// www.behance.net /julianacsilva/frame/416152), que tem no corte da capa um jacaré numa paisagem e que, na quarta capa, se revela outra situação, nessa belíssima ilustração do Andrés Sandoval. Outra capa, do livro A bicicleta e as cidades (http://www.behance. net/julianacsilva/frame/417238), tem a janela que mostra o mesmo ciclista em diferentes situações: a atual, e outra possível. Enfim, são as responsabilidades envolvidas em colocar as coisas no mundo, e ainda com alguma graça, que a gente precisa nessa vida!
Juliana Silva, projeto grรกfico de livro. 2011
Juliana Silva, aerea paulista. 2012
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colletivo
Entrevista concedida via e-mail por o Colletivo a Simone Pereira de Assis em 2011 Você desenvolve trabalhos autorais além dos comerciais? Qual a importância e influência dessa prática para você? Colletivo: Sim, desenvolvemos sempre como estúdio até porque os trabalhos experimentais e a criação são à base do trabalho do estúdio. Acreditamos que a importância e influência disso esta diretamente ligada ao exercício da criatividade. Acredita que o desenvolvimento de trabalhos pessoais pode levar a uma metodologia própria de trabalho? Colletivo: Além dos trabalhos do estúdio cada pessoa da criação, tem seus trabalhos experimentais. Acho que a metodologia sim é influenciada, mas quando se trata de mercado, a metodologia fica muito atrelada a tipo de trabalho e prazo de entrega. Não dá para conciliar tudo sempre. Utiliza algum método de trabalho que tenha sido desenvolvido por outro designer ou pesquisador? Quem? Colletivo: Não. Na verdade a metodologia do estúdio por se tratar de um lugar que tem como DNA a criação e o uso de muita ilustração, o rought e a prancheta, a ideia, é muito valorizada ainda aqui. Como era feito antigamente. Isso nos
ajuda e também faz com que o estúdio tenha sua identidade forte. Acredita que a utilização de métodos inibe a criatividade? Colletivo: Claro que não. A ideia tem que ser criativa e pensada. O método auxilia apenas na ferramenta. Trabalhos autorais podem ser um exercício a criatividade? Colletivo: São exercícios de criatividade com certeza. Gostaria de sua opinião sobre seu trabalho. Semelhanças e diferenças em peças puramente comerciais e outras com alguma marca de autoria. (Acrescentar as imagens dos exemplos que serão citados nesta resposta) Colletivo: No flickr do Estúdio www.flickr.com/colletivo você pode dar uma olhada no nosso portfólio e ver, que no caso do Colletivo, as peças tem unidade no caso, por conta de ilustração e a pegada que temos de criação. Outras considerações a respeito do assunto? Colletivo: Estou à disposição.
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Esta obra foi impressa pela Inprima Soluções Gráficas em papel off-white 90g/m² no miolo e alta alvura 150g/m² na capa. Famílias tipográficas: Lulo Clean, Aktiv Grotesk e Avenir.