GONE GIRL

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Aba:

Conheça Bliss Cavendar! Fã de indie-rock, 16 anos, adorável e excêntrica, ela vive presa em Bodeen, uma cidadezinha do interior do Texas. A mãe, uma viciada em concursos de beleza e em inscrever suas filhas neles, acredita que está tudo certo para que sua preciosa Bliss enfim conquiste a coroa de Miss Bluebonnet. Mas a jovem prefere morrer a se submeter ao ritual mais uma vez e elabora um plano de fuga: Roller Derby. Um esporte radical só para garotas e, ops, teoricamente proibido para menores de 18 anos. Bliss não perde tempo: compra os patins, protege os joelhos e começa a frequentar os treinos de Derby na cidade vizinha, Austin – um paraíso cheio de lojas e de vida em comparação a Bodeen. A menina ganha um nome de guerra e rapidamente embarca em uma jornada épica, repleta de garotas tatuadas e divertidas, garotos de banda irresistíveis e, claro, algumas lições que até mesmo uma descolada praticante de Derby não pode ignorar!


Para toda e qualquer garota encrenqueira, este ĂŠ para vocĂŞs.


A vida não é tão bela assim

Não sei como isso foi acontecer nem que tipo de acordo foi feito por trás dos panos, mas aparentemente estou morando numa pequena cidade do Texas com dois impostores culturalmente limitados como guardiões legais, quando sei que meus pais verdadeiros estão por aí em algum lugar. Provavelmente são esses tipos artísticos superdescolados que moram num loft em Nova York. Ou talvez São Francisco. Isso também funcionaria. Trocaria essa cidade com fedor de vaca por São Francisco sem pensar duas vezes. Queridos provavelmente maneiros pais, Se de repente derem falta de uma filha adoravelmente sarcástica de 16 anos, enviem uma passagem de avião. Estou pronta para voltar para casa. Beijos, Sua rebenta complacente. Obs: Se não forem meus verdadeiros pais e por acaso acharem este bilhete(e forem modernos e sem filhos),apelo para que considerem o maravilhoso mundo da adoção.* *Oferta de adoção válida apenas para os que vivem numa cidade legal. Conceito de cidade legal a ser determinado pela adotada. Escrevi isso num cartão de primavera passado quando fui forçada a participar de um lançamento de balões ridículo-demais-da-conta na escola(não pergunte). Até agora, tive exatamente zero respostas, mas a esperança é a última que morre. Esperança é provavelmente a única maneira de sobreviver em Bodeen, Texas. A não ser, é claro, que você seja um caipira jogador de futebol americano, adorador-de-caminhões, fã-de-música-country. Se for esse o caso, naturalmente, Bodeen é sua cidade alma gêmea. U-hu pra você. Mas se você por acaso é uma garota desajustada, fã-de-indie-rock, perita-em-brechós, usuária-de-camisetas-customizadas, com tinta azul no cabelo, que acha que a vida é um filme dos anos 1960, então Bodeen pode ser, e geralmente é, uma gigantesca bola de chatice. Ah, a linda Bodeen, lar dos mullets nada irônicos, e da ―mundialmente famosa‖ fábrica de sorvetes Bluebonnet. As delícias congeladas são produzidas localmente, e pessoas viajam de longe só para dar uma olhada na fabricação do tal sorvete ao vivo e em cores. Honestamente, o processo é tão fascinante quanto golfe na TV numa tarde de sábado, mas os turistas dizem oohs e ahhs como se fosse uma porcaria de experiência religiosa, como se o chocolate com marshmallow que estão comendo não fosse exatamente o mesmo lixo que compram aos galões na sua padaria local. A propósito, quando digo turistas, não quero sugerir que Bodeen seja uma Meca para viajantes do mundo todo, nem ninguém remotamente interessante, ou seja, garotos por quem valha a pena babar. Toda a coisa da fábrica-de-sorvete-como-destino-de-férias não significa muito para essa parcela da população. Acredite, fiz meu dever de cassa no assunto. Passei inúmeras horas observando ônibus de turismo após ônibus de turismo se esvaziando, esperando desesperadamente um relance de beleza masculina entre a multidão de bundas gordas e pochetes - nunca acontece. Você ainda vai ver


Jesus Cristo andando de skate pelas ruas de Bodeen antes de um cara gato um dia atravessar a fronteira. E se isso não fosse o bastante, Bodeen de alguma maneira virou sinônimo de ―destino romântico para casais‖, o que significa que os pais de outras pessoas arrastam seus relacionamentos deprimentes até aqui para um pequeno fim de semana ―reconciliador‖. Eles se hospedam num dos nossos charmosos hoteizinhos e se ocupam fazendo o que quer que seja que os pais fazem quando estão cercados por papel de parece do tempo da minha avó, cortinas rendadas e aroma de muffins recém-assados (fator nojo: alto!). Toda sexta-feira à noite, quando esses casais descem na minha cidadezinha, penso: ―Em algum lugar perdido no Texas está um bando de adolescentes cujos pais os deixaram sozinhos no fim de semana,‖ E imagino que deve haver um garoto, esperto, obcecado por música e bonitinho, que realmente dê valor a uma menina com cabelos azuis e uma coleção impressionante de CDs... E então me pergunto: Por que é que eu não estou com ele? EU DEVERIA ESTAR LÁ ENQUANTO MEUS PAIS ESTÃO AQUI. Dói. Dói de verdade.

Pequena casa dos horrores

Então, não há por que você não saber que meu nome é Bliss Cavendar. Deus, só de falar em voz alta me dá vontade de vomitar. Bliss, ou seja, felicidade plena, é uma piada particularmente cruel, porque até agora não experimentei nenhuma(a não ser que minha obsessão por balas conte – mas a felicidade que isso trás tem limite). Obviamente, minha mãe desequilibrada estava esperando um raio de sol sapateador quando foi escolher nomes para bebês. Nada de sapateado, nada de raio de sol. Para piorar as coisas, Brooke (minha suposta mãe biológica) sofre de uma rara e devastadora doença: vício em concursos de beleza. Tiara-ismo, como gosto de chamar. Aparentemente, Brooke era uma supergata no seu tempo, ganhando uma coleção de títulos, coroas e faixas, incluindo a coroa das coroas locais, Miss Bluebonnet. Minha avó e bisavó também foram Miss Bluebonnet. Infelizmente para Brooke, Miss Bluebonnet não foi o suficiente. Ela cobiçava, mas nunca realmente conseguiu, os maiores prêmios do mundo dos concursos, um fato que só atiçou ainda mais sua épica luta estilo Senhor dos anéis para assegurar que sua filha ganhasse a maior de todas as coroas. Sim, Brooke decidiu que se ela mesma não pôde ser Miss América, ela seria a orgulhosa mãe de uma. É aí que entro, vítima número um. Passei meus anos de escola participando de uma torturatona de brilhantes falsos atrás da outra (eu era tão ingênua na época). Brooke penteava meu cabelo escorrido ate atingir a altura de um arranha-céu e passava tanta maquiagem que, juro por Deus, daria papa me ver numa foto de satélite tirada do espaço. Nunca ganhei nada mais que um ―Certificado de Participação‖, o que na linguagem dos concursos significa ―otária perdedora‖. Mas isso não parou Brooke, que nunca deixa coisas pequenas como a realidade atravessarem seu caminho quando está obsessivamente


perseguindo uma meta. Ela me arranjou um treinador, e no meu décimo terceiro aniversario estreei um novo talento, que supostamente me lançaria ao título de ―Pequena Miss Howdy-Roo‖ na cidade vizinha de Dripping Springs. Senhoras e senhores: Deem as grandes boas-vindas texanas à Bliss Cavendar, sensação do malabarismo com bastão! Vocês tem que acreditar quando digo que dei tudo o que tinha àquele maldito bastão. Eu rodopiava, gritava e pulava de um pé para o outro como se minha vida dependesse daquilo. Mas o laquê me deixou tonta, e em algum ponto da metade do meu final arrebatador, os deuses da coreografia fizeram uma pausa para fumar e me deixaram na mão. O bastão ricocheteou após bater no meu pé enquanto dava uma estrela, voou para a plateia e nocauteou a jurada Darla Schaffer bem no meio da cabeça. Bom, não se pode dizer que parou tudo. Demoraram cinco minutos para que a Srta. Schaffer recobrasse a consciência. Na chuvosa volta para casa, enquanto eu segurava outro ―Certificado de Participação‖, minha mãe não parava de dizer: - Tudo bem, meu docinho. Temos apenas que acertar aquele final e ganhamos o ouro. Você sabe, não se vira Miss América desistindo. Mas eu sabia, e estava de saco cheio. Duas semanas depois, iniciei uma greve de fome inspirada em Gandhi e finalmente consegui me libertar do culto a concursos da minha mãe. Ou quase. Ela ainda espera que eu participe do Miss Bluebonnet em dezembro – um fato doloroso que tento manter enterrado bem no fundo da minha mente. Eu o considero o fim de minha longa e completamente malsucedida trajetória de concursos. Enquanto isso, minha mãe mirou seu foco de Miss América na minha irmãzinha, Shania (outro feio, mas muito adequado, nome para concursos), que acaba de completar... batam os tambores, por favor... quatro anos. Chamo minha angelical irmã caçula de Sweet Pea porque acho o nome escolhido por Brooke repugnante demais para ser pronunciado em voz alta. Além disso, quando Sweet Pea crescer e olhar para trás para sua infância, quero que saiba que eu estava lutando pelo seu bem. O estranho sobre Sweet Pea, a rainha dos concursos de 4 anos, é que ela realmente parece adorar competir. Nunca chora ou ameaça fugir quando Brooke penteia seu cabelo. E, olha só isso, a criança inclusive guincha de felicidade quando é dia de usar aquele abominável pedaço de algodão-doce com brilhos que chamam de vestido. Talvez por isso sempre ganhe. Ela é a realização do sonho de concursos de beleza de Brooke. Às vezes me sinto culpada, como se devesse estar protegendo Sweet Pea do culto de minha mãe (tendo sobrevivido a ele e tal). Mas, ao mesmo tempo, sou grata porque minha irmãzinha traz pra casa os troféus que eu nunca consegui trazer, o que tira um pouco Brooke do meu pé. E meu lema é, quanto menos Brooke na minha vida, melhor. Claro que esse retrato de família estilo catálogo-de-loja-de-departamento não estaria completo sem mencionar meu pai, Earl Cavendar. Aqui está tudo o que precisa saber sobre o bom e velho Earl. O resumo, se preferir assim. Ele é dono da Longhorn Móveis (lar dos sofás mais feios do mundo), pronuncia talvez três palavras por dia, e geralmente adormece na sua poltrona de veludo marrom após as notícias de futebol americano. Earl sabe que não é páreo para o Tornado Texano com quem se casou, e adotou uma tática de sobrevivência


com destreza: faz exatamente o que mandam e fica bem longe do caminho de Brooke. Ah, e aqui vai uma curiosidade divertida. Recentemente descobri que, ao contrario do que dizem os arquivos oficiais da família, a verdadeira data de casamento de Earl e Brooke foi apenas cinco meses antes de eu nascer. Surpresa! O amor não é lindo?

O show de Pash Amini

Apesar do cenário desfavorável, consegui encontrar a melhor amiga que uma esquisitona de cidadezinha jamais poderia sonhar: a própria, a única, Pash Amini. Ano passado, quando eu estava morrendo de tédio (estou falando de nível UTI - não era bonito), Pash se mudou para a cidade e me trouxe de volta a um ambiente social saudável. Ela estava na escola não havia nem 45 minutos antes de me perseguir até meu armário. Sem medo, se aproximou, ignorando solenemente todas as regras e clichês garota-nova-da-escola. - Ei - disse. - Meu nome é Pash, tipo paixão. Dei uma olhada em sua saia-lápis estilo anos 1950 e brincos de caveira feitos à mão enquanto ela silenciosamente avaliava minha calça de smoking e camiseta anos 1970 com uma imagem de Jesus pulando amarelinha. Foi amor de melhor amiga à primeira vista. Não só ela é hilariante e incrivelmente esperta (notas máximas, com honras e tudo), como é a mais linda árabe-americana desse lado do Rio Pecos, parece uma pinup. A única pinup árabe-americana, ela me lembraria. Naturalmente, a beleza exótica de Pash um dia ainda vai ser reconhecida como deveria pelos idiotas de fala arrastada da Bodeen High. Entendo sua dor. Não que tenhamos rapazes dignos de desmaios, mas seria bom ser admirada. Secretamente admirada, até. É o auge do verão e faz mil e dois graus no calor escaldante de agosto: só um pequeno lembrete de que Bodeen, Texas, realmente é o inferno. Pash e eu andamos pelas ruas aproveitando nossa última meia hora de liberdade antes de bater ponto no Emprego Tão Horrível Que Não Ousamos Pronunciar Seu Nome (ETHQNOPSN). Tudo bem, vou explicar, mas só desta vez. Depois, você deve engolir esse pedaço de papel porque oficialmente nunca esteve aqui. Pash e eu trabalhamos no Oink Joint, uma lanchonete "famosa" (ou seja, nada famosa) pela gigante escultura de dois andares de um porco que fica no estacionamento, a mais pegajosa de todas as armadilhas para turistas. ETHQNOPSN é tão horrível que eu estava na fila de espera por uma vaga no Wal-Mart antes de aceitar trabalhar lá. É o lugar para onde vai quando ninguém mais quer você. Naturalmente, Pash e eu éramos as candidatas mais fortes. *


Dividimos uma casquinha dupla Bluebonnet de biscoito e creme (para mim) e uma de menta choc-chip (para ela), lutando esgrima com nossas colheres de plástico. Agora, por mais que deteste o alvoroço cafona de turistas que cerca a fábrica de sorvetes Bluebonnet, estaria mentindo se não admitisse que seus sorvetes são meu grupo alimentar favorito. Aquelas vacas leiteiras de Bodeen sabem bem o que fazem. Poderia, no entanto, passar sem os outdoors de propaganda Bluebonnet que cercam a paisagem da cidade. Não se anda duas quadras sem que um outdoor apareça na sua frente, e não é qualquer outdoor. Os outdoors Bluebonnet são um fenômeno cultural por si só. Sempre mostram a atual Miss Bluebonnet num vestido de ordenhadeira decotado, sorrindo enquanto lambe um cintilante sorvete de casquinha. Sexy, mas saudável (para nunca lançar dúvidas quanto à castidade da Miss Bluebonnet, sendo uma comunidade cristã e tudo mais). Agora, adivinhem quem não pode passar por um outdoor sem suspirar dramaticamente um "É esse seu destino, Bliss", o que acontece apenas umas... 35 vezes por dia? Dou uma chance. A maior rival pela coroa de Miss Bluebonnet é Corbi Booth, líder de torcida e tão esperta quanto um esquilo. Francamente, eu simplesmente entregaria a coroa em suas mãos agora mesmo se isso não fizesse com que Brooke surtasse. Corbi e eu éramos melhores amigas (para sempre!) há um milhão de anos, mas quando eu descobri música de verdade e ela dedicou sua existência à procura do brilho labial perfeito, foi hora de seguirmos nossos caminhos separadamente. Agora, você-sabe, eu sei, e todos no mundo sabem, que em dezembro Corbi vai ganhar a coroa e vou sumir na obscuridade de concursos, mas aqui está um pequeno porém. A mãe de Corbi, Val, uma propaganda viva para tudo que é plástico, ainda vê em mim uma concorrente por causa da impressionante linhagem de Miss Bluebonnet na minha família. Ah, e porque minha mãe acabou com ela no ano em que foi a escolhida. Então, por mais que eu pareça a zebra da vez - qual é, uma garota de cabelo azul? - sou persona non grata no radar de Corbi. O que falta de inteligência em Corbi ela compensa em fofocas maldosas e saias minúsculas. E, por acaso, ela também é há muito tempo a namorada do maior astro de futebol da Bodeen High, Colby Miller. Colby e Corbi - ahhhh, não é fofo demais? (Resposta: nem um pouco fofo!) Toda a cidade está sob algum tipo de presunção distorcida de que esse clichê disfarçado de romance colegial é a resposta de Bodeen a um casal de Hollywood. Ninguém se cansa do casalzinho adorável. Mas Pash e eu já tivemos mais que a nossa cota, muito obrigada. Não podemos nem aproveitar nosso sorvete sem a dupla dinâmica aparecendo do nada na picape meu-pai-comprou-para-mim-essa-enormidade-porque-sou-umrei-do-futebol de Colby com sua futura Miss Bluebonnet aninhada a seu lado enquanto "Brooks & Dumb" toca alto através das janelas (a cereja no topo desse pequeno sundae de tortura). E qual é a dos adolescentes com peles perfeitas sem espinhas bem na época que deveria ser a mais espinhenta de suas vidas? É mais do que injusto. Com certeza vão ter que pagar por isso de alguma maneira no futuro... ou então não existe justiça.


Os pombinhos param no sinal vermelho, e Colby olha para nós - para mim, na verdade. Seu rosto se contorce com desprezo e confusão, tipo, Como é que você, só pra começar, foi autorizada a existir? Corbi treme e agarra os bíceps inflados de esteroides de Colby, como se para dizer, Me tira daqui antes que a completa esquisitice delas passe para mim! (Como se eu não fosse a garota em cuja cama ela fazia xixi quando dormia na minha casa - como ousa me julgar?) Assim que o sinal fica verde, Colby e Corbi saem em disparada como amantes adolescentes aterrorizados por um bando de zumbis famintos num filme de terror trash. Nunca imaginei que era tão assustadora. Quase encaro como um elogio. Pash e eu ficamos em silêncio enquanto o ar quente do Tejas paira entre as duas. Estamos ambas tendo o mesmo pensamento deprimente, então não faz sentido dizer em voz alta. Como é que esses dois idiotas encontram o amor enquanto nós passamos por uma seca de romance? Mas Pash não consegue ficar calada muito tempo. É fisicamente impossível, atestado por médicos e tudo. - Bliss, sei que minha resolução de ano-novo era não ficar obcecada com esse assunto, mas se não conseguir alguma séria interação menino-ePash imediatamente, vou explodir - diz. - Aí vão realmente achar que você é terrorista - ofereço, e Pash começa a rir. Sim, o racismo está vivo, e muito bem obrigada, em Bodeen, e minha garota sofreu sua cota de calúnias e olhares suspeitos, então zombamos dos caipiras sempre que podemos. Humor negro é tudo.

Le Bistrô d'Oink

Eu poderia falar horas e horas sobre o horror de enfrentar o público numa medonha bata xadrez, o constante fedor de churrasco no cabelo, e a tarefa sugadora de almas que é cronometrar pessoas doentias enquanto tentam comer o Sanduíche Squealer (quatro quilos e meio de carne de porco) em dez minutos para ganharem uma camiseta de graça e terem sua foto pendurada no "Squeal da Fama". Mas, na verdade, não é tão ruim, contanto que Pash e eu tenhamos o mesmo horário. Nos divertimos constantemente praticando atos de rebeldia contra o sistema do Oink Joint. Não atrapalha o fato de Dwayne "Homem-Pássaro" Johnston estar totalmente apaixonado por nós duas. Não que isso seja lisonjeiro de qualquer maneira, cor ou forma. Confie em mim. O HomemPássaro é completamente nerd, o tempo todo, e não do tipo legal. Apesar de estar embriagado de poder desde que foi oficialmente promovido a gerente. Como hoje. Pash e eu estávamos usando nossos velhos truques para sobreviver, tirando fotos brilhantemente engraçadas (modéstia à parte), e colando-as às escondidas no mural do "Squeal da Fama" entre todas as fotografias amareladas de turistas gordos segurando pratos limpos. Homem-


Pássaro vem correndo do outro lado do restaurante abananado seus braços magrelos. - O que vocês duas pensam que estão fazendo? - pergunta, nos encurralando e tentando soar autoritário, como se tivesse ficado horas escondido nos fundos, praticando sua voz de gerente. - Fazendo arte - explicou Pash, apontando para uma Polaroide minha, na qual eu olhava para baixo, em direção a uma poça de molho barbecue tão grande quanto uma lata de lixo. - Chama-se Garota considera se matar no molho secreto. - Uma obra muito importante, Homem-Pássaro - acrescento. Ele tentou fazer com que tirássemos a foto, mas depois de o ridicularizarmos por ter se vendido ao corporativismo, concordou em deixar a arte ficar exposta por uma semana. - E - acrescentou - quero que vocês duas comecem a me chamar de Dwayne agora que sou gerente. É mais digno. - Nem pensar - protesta Pash. - Homem-Pássaro é muito mais sexy. - É, dá um ar de mistério - completo enquanto vamos embora. Portanto, Homem-Pássaro concordou em continuar Homem-Pássaro. Realmente é a única coisa que tem a seu favor; não podíamos simplesmente deixá-lo estragar isso. São triunfos como esse que fazem o ETHQNOPSN ser suportável. Isso, e a rotina de fechamento Pash Amini/Bliss Cavendar. Pash está varrendo quando, de repente, abre aquele sorriso maldoso familiar, que surge momentos antes de começar a cantar. Temos essa brincadeira onde fingimos que nosso trabalho é na verdade um musical ruim. Inventamos nossas próprias letras ao som de melodias da Broadway, dando aos clássicos alguma Pashificação. Hoje é "Over The Rainbow" cantada num ritmo mais jovem e punk-rock. Vai com tudo, Pash: Somewhere over the rainbow, Bliss's hair is blue, (Além do arco-íris, Bliss tem cabelo azul) There's a land that I heard of once, full of yummy guys! (Ouvi falar de uma terra cheia de caras gatos!) Someday I’ll meet a boy who plays no sports, (Um dia conhecerei um garoto que não gosta de esportes) He'll want me for my brilliant mind and not (E porque sou inteligente ele vai se apaixonar) Cause I wear boy shorts, (Não por causa dos meus micro shorts) In his bed - that's where you'll fiiiiiind me! (E na cama dele você vai me encontraaaar!) Fazemos umas danças ruins hilárias que nunca verão a luz do dia na MTV, pausando dramaticamente para o grandioso final. Somewhere over the rainbow, blue birds play, (Além de arco-íris, azulões se divertem) If blue birds play, (Se azulões se divertem) Then why can't we get laid?


(Por que não conseguimos dar pra ninguém?) Pash, que tem, tipo, metade do meu tamanho, se joga em cima de mim, e desabamos como um castelo de cartas numa mesa, rindo. Não tenho certeza se a genialidade desse momento musical espontâneo está explícita, mas acredite em mim, podíamos cair na estrada com esse show. Ou talvez estejamos entorpecidas pelo cheiro de carne malpassada. Enquanto fechamos e damos adeus para o Homem-Pássaro, olho para o outdoor de Miss Bluebonnet do outro lado da rua. - Deus. Se não sair de perto dessas coisas, essa cidade vai ver a minha ira. - Ah, verdade? - Pash ergue uma única sobrancelha com a precisão perversa de uma supervilã. - Tem alguém se sentindo criminosa? - Ah, Srta. Amini, achei que nunca perguntaria - digo, na minha melhor voz de Scarlett O'Hara enquanto damos os baços e saímos em busca de alguma boa e velha encrenca. U-hu!

Festa no corredor sete

Não é como se eu morresse de amores por furtar lojas. Só faço isso para manter minha mente longe de atividades mais perversas, como ser líder de torcida e planejar a formatura. Além disso, o Wal-Mart pede o tempo todo por isso pelo jeito nojento como tratam os funcionários. E não estou dizendo isso só porque não me contrataram (eles tinham "problemas" com minhas roupas dane-se). Quem diabos quer trabalhar no Wal-Mart, aliás? Os uniformes de poliéster acabam com a identidade de qualquer um. As portas gigantescas deslizam e se abrem, e a loja recebe Pash e eu com um abraço de ar-condicionado. Checamos os corredores em busca de inspiração para mãos leves. Sedutoramente abano um CD do Toby Keith para Pash. - Seu namorado diz "oi". - Amigas não deixam amigas escutarem Toby Keith. Pash declara, arrancando a música ofensiva de minhas mãos e enterrando embaixo de uma pilha de CDs do White Stripes. Nos arrastamos até o departamento de lingerie e rimos entre fileiras de monstruosas calcinhas de vovós (imaturo, pode ser, mas engraçado mesmo assim). - Pense em todo o elástico que teve que morrer só para fazer essas calcinhas - diz Pash com tristeza Continuamos, recusando-nos a deixar a tristeza pelas calcinhas de vovó desviar nossa missão. Pash e eu entramos num provador abandonado e bagunçado com nossas escolhas penduradas nas costas. - Você primeiro - ela insiste, e seguro um sutiã vermelho-prostituta com renda dourada, exatamente no tamanho de Pash. - Você realmente me odeia! - grita antes de entregar um sutiã rosashocking de oncinha para mim - E eu digo o mesmo.


Rio enquanto experimentamos os sutiãs bregas. Olho para Pash. A vida é cruel. Seus peitos são perfeitos, dignos de prêmio, mesmo num sutiã feio e barato. - Ah, isso é tão injusto! - digo. - Peguei o mais detestável, e mesmo assim fica incrível em você! - Sim, bem, trocaria meus peitos pela sua barriga lisa e perfeita a qualquer hora do dia - ela revida, o que me fez sentir um pouco melhor acerca de meu nada grande tamanho de sutiã. Além do mais, o sutiã de oncinha, na verdade, ficou até bonitinho em mim. Uma coisa meio retrô Marilyn-Monroe-sex-symbol, só que não sou uma Marilyn Monroe, nem uma sex-symbol. Mas caso um dia eu me transforme em tal criatura, é reconfortante saber que vou ter o sutiã certo na reserva. Minutos depois, Pash e eu saímos do provador com nossa nova lingerie espalhafatosa guardada em segurança por baixo de nossas camisetas. Damos mais umas duas voltas casuais pela loja para não levantar suspeitas. Isto é, até Pash apontar um globo preto escondendo uma câmera de segurança na sessão de armas - tecnicamente, o "departamento de esportes". Penso: se atirar uma arma é um esporte, então acho que roubar um sutiã também é. Vou convencer o Comitê Olímpico a reconhecer meu esporte, pedir algum patrocínio. Medalha de ouro por roubo de sutiãs, aí vou eu. - Ei, acho que essas câmeras de segurança idiotas nem funcionam - diz Pash. - Mesmo? Por que não levanta a blusa na direção delas então e descobre? - provoco, esquecendo que Pash rapidamente aceita qualquer desafio proposto. O que geralmente significa que tenho que aceitar também, uma cláusula do manifesto não pronunciado entre melhores amigas. Como previsto, ela está com a camiseta levantada num estilo que zomba Girls Gone Wild antes de eu puxá-la para baixo como um pai reprimido que tenta evitar que sua filha de 3 anos mostre as calcinhas no playground. - Estamos indo - digo, agarrando seu pulso. - Com certeza. Depois de você mostrar algum amor para a câmera espiã também - insiste. Pash segue o comando com um olhar que quer dizer: Estamos nessa juntas, fazendo-me sentir culpada por deixá-la passar por essa sozinha. Então, como um relâmpago, levanto a blusa com rapidez. Camiseta para cima, camiseta para baixo. Agora, vamos dar o fora daqui. Andamos até a saída e acenamos gentilmente para a senhora de 80 anos trabalhando na porta (aparentemente, ela pode ter cabelo azul, mas eu não). Quando atravessamos o estacionamento, Pash e eu estamos livres. Wal-Mart nem faz ideia do que o atingiu. Compras de volta às aulas

OK, não sei a qual santo agradecer ou a qual Deus reverenciar, mas acabo de testemunhar um pequeno milagre em meu próprio quarto. Brooke realmente bateu em minha porta (um choque por si só), e ao ter sua entrada concedida, me ofereceu carona até Austin para comprar algumas roupas de escola. Austin! (Anjos cantam, nuvens se abrem, raios de sol descem, e estou saltando num campo de margaridas).


Você precisa entender que, comparada a Bodeen, Austin é Nova York. Tudo de legal que acontece no Texas acontece em Austin, fim da história. Veja bem, Austin tem essa coisa que Bodeen não tem: "civilização". Cinemas legais, lojas que você não tem vergonha de entrar, e boates de verdade! Não aquele lixo tipo Ricky's Roadhouse, aonde caipiras vão para dançar coreografias country, mas lugares de verdade onde bandas indies e punks tocam música ao vivo toda noite. Se Austin fosse uma pergunta típica de prova seria algo do tipo: Legal está para Nova York assim como ______ está para o Texas. Resposta: Austin Austin fica a apenas uma hora de carro de Bodeen, mas é "um admirável mundo novo", como dizem por aí. Já que ainda preciso providenciar meu próprio veículo (Pash e eu estamos trabalhando nisso, confie em mim), minha única chance de sair dessa cidade é na limusine de Brooke. Aceito sua oferta tout de suite. Estou tão incrivelmente empolgada, que ignoro todos os sinais de alerta que sugerem que essa onda de amor mãe/filha, no melhor estilo Oprah, pode acabar com um banho de água fria. Sinal de alerta número 1: Pash não pode vir junto, o que normalmente garante que Brooke se comporte. Estou sozinha sem meu "escudo protetor melhor amiga". Sinal de alerta número 2: Contrariando a premissa "só nós duas", minha mãe subitamente insiste que Sweet Pea venha junto para ela ganhar roupas novas também (seu armário minúsculo já está duas vezes mais cheio que o meu). Isso significa que vai ter uma excursão à loja da Disney, e é contra meus princípios pisar numa loja da Disney. Sinal de alerta número 3: Brooke parece estar ignorando minha meticulosa pesquisa na internet sobre os melhores lugares para se fazer compras - ou seja, perto da faculdade, o epicentro de tudo que é moderno. Mas nada disso me desanima. Na ida, tudo é perfeito. Nem sequer pisco quando Brooke joga meu CD do Hot Hot Heat no banco de trás para dar espaço ao seu karaokê Céline Dion com Sweet Pea. Meu desempenho filha exemplar é tão convincente que me pergunto se sou na verdade um talento dramático ainda não descoberto. Imagino-me ganhando um Oscar e fazendo um discurso tão brilhante que inspira garotas desajustadas de todos os lugares a levantarem-se contra seus opressores. Sou uma mulher revolucionária. Porém, duas horas mais tarde, num shopping suburbano sem graça, minha fachada começa a ruir. Para Brooke pagar por todas as minhas roupas, ela tem de aprovar todas as minhas roupas, o que requer tato diplomático. Brooke odeia tudo o que gosto, e odeio tudo que ela gosta. Não há meio-termo. Por que não posso ser uma daquelas garotas cujos pais apenas entregam seu cartão de crédito para comprar o que quiserem sem interferência? Alguém, por favor, me diz como conseguir a poção mágica que faz os pais obedecerem a essas leis de compras para adolescentes. Quanto mais recuso, mais Brooke força. Rosa, rosa, e mais rosa. Em um momento ela até levanta um par de jeans com franjas rosa de camurça descendo pelas pernas (!) e ousa perguntar por que não gosto dele. Sério, se houvesse uma exposição de jeans mais feios e horrorosos da América, esse


seria a pièce de résistance. E ela quer que eu diga o que há de errado com ele? - Hum, tudo - digo. - Bem, essa é a sua opinião - ela rebate, toda ofendida. - Acho que são simplesmente adoráveis. Seriam perfeitas para a nova coreografia de vaqueira de Shania. Vou comprá-las para compor o figurino. Oh, perdão, entendi esse dia todo errado. Achei que estávamos fazendo compras de volta às aulas para Bliss, mas pelo visto estamos comprando para os concursos de Shania. Não entendi essa parte do recado. Vamos para a Gap, também conhecida como "Crap", ou seja, Porcaria (porque Pash e eu achamos sua visão de legal meio forçada demais), mas posso pelo menos comprar umas camisetas para cortar e customizar. Agarro qualquer coisa ou todas as coisas, vou correndo para o provador, e me delicio com um muito merecido tempinho longe de Brooke. Posso ouvir minha mãe andando pela loja jogando conversa fora com alguém sobre como é "difícil" comprar para mim. Aquela vaca duas caras. Com licença, por que eu aceitaria dicas de moda de uma mulher de 41 anos que acha a Michael's Craft Store sua referência de alta-costura? No espelho descubro uma espinha monstruosa bem no meio da minha testa. Parece um chifre bebê. Adorável. Além de tudo, estou virando um unicórnio. Mordo os lábios para não começar a chorar. Quando voltamos para o carro, finalmente bombardeio minha mãe. - Por que: não posso ir só a uma, uma loja que não fica no shopping? Uma loja onde posso realmente achar algo de que gosto. Me prometeu uma viagem até Austin. Isso não é Austin, isso é o shopping. Há uma longa pausa, como se Brooke mal conseguisse compreender o que estou falando, como se nunca tivesse passado pela sua cabeça comprar fora de um shopping. Pelo menos ela diz: - Tudo bem, Bliss, o que você considera que seja Austin? - Bem, tipo, perto da faculdade, onde as lojas alternativas ficam. Não fica nem a dez minutos daqui. Ela dá um suspiro de mártir, como se eu estivesse pedindo o impossível, como se estivesse pedindo que me carregue até lá nas suas costas. - Tudo bem - diz ela. - Uma loja. - Maneiro! Vamos à Atomic City. Lá tem os melhores sapatos! - grito, sabendo muito bem que minha mãe está desesperada para me ver em outros sapatos que não sejam esses velhos All Star com silver tape na ponta (um "estou me lixando para o certo/errado das revistas de moda"). Entro na Atomic City, uma loja barulhenta numa casa velha que abriga os punks locais, rockabillys, góticos, hippies, ravers, mods e qualquer rótulo que não seja comum. Praticamente voo pela pilha de tinta de cabelo da Manic Panic, camisetas japonesas, quiosque de óculos escuros mais-descoladosque-você e vestidos retrô de pin-up à procura do que realmente vim atrás: sapatos John Fluevog. E a variedade é ainda melhor ao vivo do que na internet. Bingo! Experimento vários estilos e ouço opiniões de um trio de meninos lindos de morrer que também estão comprando. Eles têm idade para estar na faculdade, e Brooke está com o "modo espião" ligado, então tenho de flertar o mínimo e mais discretamente possível. Mas acredite, estou suspirando por


dentro. Muito. Até esqueço (momentaneamente) da minha espinha de unicórnio. Essa é a minha ideia do que é Austin. Finalmente decido levar um par de sapatos-boneca robustos num roxo brilhante com duas tiras azul-turquesa. Legais e confortáveis, e valem cada centavo dos 175 dólares (tudo o que eu podia gastar nas compras, mais um extra que ganhei como babá). O melhor de tudo, esses calçados fabulosos dizem, até aos observadores mais distraídos: "Não fomos comprados no shopping." Talvez em Marte, mas não no shopping. Até Brooke parece aliviada em me comprar algo que obviamente amo. Ela está prestes a sacar o cartão de plástico e fechar o negócio quando algo do outro lado da loja chama sua atenção: uma prateleira de vidros claros e coloridos iluminados pelo sol. - Aah, aquilo ali sim parece bonito! - ela exclama um pouco alto demais antes de se dar conta do que está admirando. É uma prateleira cheia de bongs de 30 centímetros. O rosto de minha mãe fica pálido, enquanto todos dentro da Atomic City se viram e riem coletivamente até cair. Brooke está hu-mi-lha-da. Levam exatos três segundos para ela reconsiderar minha preciosa compra. - Bliss - diz tão piamente que praticamente vejo a auréola subindo acima de sua cabeça -, não acho que estaria cumprindo meu papel de mãe se comprasse seus sapatos de volta às aulas num estabelecimento que também vende acessórios para uso de drogas. Você acha? - Mãe - digo, tentando permanecer calma diante da declaração -, só quero os sapatos, não os cachimbos. - Primeiro são os sapatos, depois é o cachimbo. - Tá, isso mesmo - rio. - Sapatos são a porta de entrada para as drogas. - Muito engraçado, Bliss - ela zomba, sem rir. - Pelo visto você não se importa em sustentar traficantes. - Que seja - protesto. - Alguma vez já reparou nos boys que trabalham para o papai? Alô. Tá na cara que são maconheiros. Isso faz do papai alguém que sustenta traficantes? Minha mãe tapa os ouvidos inocentes de Sweet Pea com ambas as mãos: - Está perdendo a linha! Estou perdendo a linha? Ela que está. Toda essa droga de passeio de compras está perdendo a linha! Brooke nem estaria aprontando essa cena se Pash estivesse aqui. Estaria ocupada demais se exibindo, bancando a mãe perfeita. - Qual é, mãe, por favor. Deixa isso pra lá - imploro. - Quer saber, se convencer seu pai a lhe dar esses sapatos, são seus declara, sacando seu celular cheio de brilhantes falsos e discando freneticamente. Posso sentir a loja inteira assistindo a nosso pequeno drama, torcendo por mim. Tenho vontade de dizer a eles para não alimentarem esperanças. Brooke consegue pôr Earl no telefone e o pega completamente de surpresa com seu discurso injusto e interminável. Um clássico dela. - Oi, amor, sou eu. Se importaria em explicar à sua filha de 16 anos por que é inapropriado para cristãos como nós comprar sapatos de 175 dólares de pessoas que sustentam traficantes de drogas? - Brooke pergunta no tom de


voz que diz a meu pai "ou está com Brooke ou está contra Brooke". E Earl nunca quer estar contra Brooke. Nunca. Ela me entrega o telefone e convencida diz "boa sorte". - Pai, não é nada disso... - Menina, o que você quer com sapatos de 175 dólares? - ele interrompe. - Estou pagando uma parte, e não é nem essa a questão! - argumento. - Pra mim é - suspira. - Olha, não tenho tempo de bancar o juiz. Tem uma família mexicana aqui comprando uma sala de estar inteira. Sabe que esse povo paga em dinheiro. Tenho que fechar o negócio, então o que sua mãe resolver está bom pra mim. - E desliga. E, simples assim, esse dia oficialmente se tornou uma mega-chatice. Na volta para casa, me recuso a sentar ao lado de minha opressora. Fico no banco de trás, furiosamente tramando todas as maneiras possíveis para cometer suicídio e realmente despedaçar seu coração. Imagino meu funeral: a música, o caixão, os flores (lírios brancos). E então me ocorre que se eu morrer minha mãe realiza seu maior desejo: vai poder me vestir. E a ideia me enfurece ainda mais. Prometo ficar viva em protesto. Olho para baixo e percebo que ainda estou segurando um dos vários flyers de bandas que peguei antes de sair da Atomic City, propagandas de shows a que nunca vou poder assistir. Pelo menos posso usá-los para decorar meu quarto. Um flyer verde-limão chama minha atenção - uma foto incrível de uma garota durona em patins estilo anos 1970, meia-calça arrastão e uma minissaia rasgada (uma tendência da moda que apoio inteiramente). O anúncio não é de uma banda, mas de uma liga de Roller Derby. Diz: Saias, Patins & Arranhões! TODAS AS MANOBRAS DAS ANTIGAS COM UMA NOVA ATITUDE PUNK ROCK Venham ver as LONE STAR DERBY GIRLS A LIGA DE ROLLER DERBY DE AUSTIN SÓ PARA MULHERES HOLY ROLLERS VS. FIGHT CREW SHOW NO INTERVALO COM OS CHIMNEY SWEEPS Isso não é um workshop para líderes de torcida, galera! Tudo bem, não tenho certeza do que exatamente toda essa coisa de Roller Derby significa, mas algum alarme interno dispara dentro de mim, e sinto que tenho de ver qual é. Olho para minha mãe no banco da frente, alegremente cantando com seu CD ruim enquanto dirige cada vez mais para perto de Bodeen, e me levando cada vez mais para longe da minha cidade alma-gêmea. E penso: "Foda-se você e seu ruído Céline Dion. Vai chegar o dia em que não vou precisar da sua permissão para sair de Bodeen. De agora em diante, vou para Austin quando tiver vontade. Tente só me impedir!"


Inferno sobre rodas

Grande acontecimento no setor de transportes: os pais de Pash deram a ela um carro no primeiro dia de aula (prova de que são mil vezes mais legais que Brooke & Earl). Graças ao Pash-móvel, posso agora me aposentar do inferno chamado ônibus escolar. Sim, para todos vocês calouros no último banco que acham imitar barulhos de pum com as axilas o ápice da comédia, para o quarteto de imitadoras de Corbi aplicando litros de perfume fedido e barato, para os caipiras fazendo serenata dia e noite com sua música rap inspirada em country (um crime contra a humanidade, acredite), e, sim, até para Mortimor - seu motorista idiota, você, com suas meias de poliéster trocadas e aparelho auditivo doado pelo governo - ofereço a todos adieu. (Graças a Deus. Achei que esse dia nunca chegaria.) Sério, tive o mais bizarro grupo de colegas de ônibus na história de grupos bizarros de ônibus. E não era um bizarro bom, apenas bizarro bizarro. Sei que tecnicamente somos "todos filhos de Deus", mas uma olhada nas pessoas em meu ônibus e você não poderia chegar a outra conclusão que não a de que Deus tem uns filhos muito ferrados. E sim, estou me incluindo no grupo. Mas isso tudo ficou para trás agora. Hoje é o primeiro dia do resto de minha vida livre de ônibus. Escuto o carro de Pash frear na frente de minha janela exatamente às 8h32. A música está tão alta que usar a buzina é desnecessário. Não que isso a impeça. Um toque da buzina de Pash e estou fora do quarto, caminhando na ponta dos pés até nossa sala nada estilosa. Furtivamente agarro minha mochila, jogo um beijo para Sweet Pea e corro para a porta. Mas quando toco na maçaneta, escuto minha arqui-inimiga gritando da cozinha. - Bliiiiiss! E seu café da manhã? Viro e lá está Brooke no auge de alguma fantasia de mãe de programa de Tv. Está segurando um prato fumegante com ovos, bacon, salsicha, batatas e torrada. É quase emocionante, exceto que não como ovos desde que tenho tipo, uns 5 anos, e meu vegetarianismo está firme e forte há pelo menos dois anos. Brooke sabe disso. (Mandei a ela um release, para não falar nos lembretes mensais em meu jornalzinho "Guia para serem pais de Bliss".) Ela se recusa a aprender. Então lá está ela, cheia de pérolas, esfregando um prato de animais mortos na minha cara logo de manhã cedo. Nham nham. Estou a meio segundo de vomitar em cima de seu avental à la Martha Stewart só com o cheiro (e é quase tentador, acredite). Mas ela está com um olhar lunático no rosto, como se o teto fosse cair se eu me recusasse a comer, e de repente sinto uma curta, mas potente, mistura de culpa e tristeza por ela. Deixo passar meu típico monólogo revirarde-olhos, você-não-respeita-minhas-crenças, e faço o que qualquer adolescente faria quando está tentando sair da casa o mais rápido possível enquanto enfrenta uma armadilha materna: me transformo em uma puxa-saco. - Ah, minha nossa, você é, tipo, a melhor mãe do mundo! - explodo, emocionada. - Que cheiro maravilhoso!


- Mesmo? Acha mesmo? - ela pergunta, não querendo a resposta correta. - É claro. Mas mãe, acha que poderia embalar para viagem? Quero chegar à escola a tempo de falar com a Sra. Luntz sobre a vaga para líder de torcida, estão substituindo Jerri Lynn Templeton - digo. - Estão substituindo Jerri Lynn Templeton? - Brooke arfa com animação até demais. - Ah, como rezei por isso! Demoram exatamente vinte segundos para minha mãe - uma obsessiva por gritinhos de torcida - sacar um sanduíche, enrolar numa pequena e charmosa fralda-guardanapo, e enfiar na minha mão antes de me apressar porta afora. - Não se atrase, Bliss. Vai, vai, vai! Vai ser uma líder de torcida! - Obrigada, mamãe! - digo, beijando sua bochecha. Atinjo o carro de Pash antes de Brooke sentir o perfume de ironia que deixei para trás. Pash me recebe aumentando o som de um clássico bem apropriado de nossos amados Ramones. (Descanse em paz, Joey!) Well, I don't care about history. Rock, rock, rock'n'roll high school! 'Cause that's not where I wanna be. Rock, rock, rock'n'roll high school... Já me sinto melhor. Pash acelera quando nos aproximamos de meu antigo ponto de ônibus. Ciao, otários! Mais perto da escola, faço Pash parar para doar meu café da manhã para algum calouro que parece não fazer uma refeição decente desde o quarto ano. - Isso é tão escoteira da sua parte - Pash observa, enquanto aplica seu lápis de olho preto (marca registrada) no retrovisor. - Na verdade não. Estou planejando me meter em muita encrenca, então estou tentando ganhar uns pontos carma bom. - Ooh. Que tipo de encrenca? - ela sorri. - Bem... - Limpo a garganta para um efeito dramático. - Ah siiiim, aquele negócio Roller Derby - ela provoca. - É nesse fim de semana? Não lembro, você só me falou o dia vinte milhões de vezes! É verdade, tagarelei como uma louca 24 horas por dia, sete dias por semana, escondendo lembretes pelo seu quarto e até na sua caixa de absorventes, o que provocou uma reação vagamente irritada (mas sei que secretamente ela adorou a criatividade). - Ah, qual é! - grito. - Concorda logo! Considere meu presente de aniversário! - Seu aniversário é daqui a seis meses, imbecil. Se te der um presente agora, vai esquecer totalmente e então me acusar de ser uma amiga ruim. - Não mesmo. Se providenciar que minha triste pessoa chegue a esse negócio Roller Derby, nunca vou acusá-la de ser nada além de "a mais maravilhosa melhor amiga do planeta". O que é grande coisa porque eu mesma já sou das melhores. Ah, e mencionei que o fator caras-gatos provavelmente vai ser alto? - Maldita Bliss, usando o argumento caras-gatos. - Só estou falando...


- Francamente - ela suspira. - A essa altura, nem sei se conseguiria identificar uma beleza genuína. Tem noção de que o último sonho erótico que tive foi com o Ryan Seacrest? - Eca! Isso é tão errado. - Tenho ânsias. - É, sim - Pash diz. - Fui dormir visualizando um cenário lindo com meu namorado, Connor Oberst, mas não sei como tudo se misturou, e quase na hora de acordar, estava aos amassos com Ryan Seacrest. - Informação demais! - grito, tapando as orelhas com as mãos. - Desculpe, eu só... - Estou tão perturbada no momento - digo, totalmente enojada. - Obviamente, meu julgamento está comprometido - Pash suspira. - Obviamente. E é exatamente por isso que precisa estar perto de garotos de verdade para acertar sua balança. - Está só me usando para ir de carro - Pash diz com suspeita, me zombando. - Seu carro, suas roupas, seus CDs, o que tiver. Anda logo, Pash, minha única alternativa é postar umas fotos vulgares na internet para atrair algum doido recém-saído da prisão para me levar. - Eca! Não, não vou deixar se vulgarizar desse jeito! - Então isso significa que você dirige? - pergunto, sorrindo. - Estou pensando. Mas tem que bolar um plano. - Já estou trabalhando nisso. Rock, rock, rock, rock, rock'n'roll high school! Mesmice e chatice

Mesmo sabendo que não devia, um pedacinho meu sempre fica empolgado com o primeiro dia de aula. Lá atrás, no primário, o legal era batizar uma caixa novinha em folha de lápis de cera ou estrear uma merendeira da Vila Sésamo intocada. Mas hoje em dia é mais sobre antecipar a chegada do namorado perfeito na forma de um exótico estudante de intercâmbio ou talvez apenas um professor bem sexy que me tire do bom caminho (pior pra ele, melhor pra mim). Lá pelo terceiro tempo, é dolorosamente óbvio que o milagre do estudante de intercâmbio mais uma vez fugiu do meu alcance. Sim, meus amigos, este ano está tão deprimente quanto o último, e por mais chocante que soe, meus colegas de alguma maneira conseguiram ficar ainda mais irritantes depois do verão. Prova A: Lisa Catchum, minha vizinha de armário. Assim pessoalmente, não tenho nada contra Lisa. Isto é, até suas escolhas de roupas começarem a interferir na minha busca da felicidade, o que agora acontece de maneira descontrola. Veja bem, Lisa é uma devota fanática do jeans estilo Britney Spears, e toda vez que se curva para pegar seus livros, sou violentada com uma mega exibição de calcinha fio-dental (de purpurina dourada, nada menos prova de que a exibição de bunda não é acidental). Conforme o dia se desenrola, me encontro impedida de acessar o armário por garotos desesperados que entopem o corredor em busca de uma olhadinha. E Lisa não decepciona. De hora em hora, o fio dental dourado aparece para dar um oi. (Tchau!!!!)


- O que é isso, Feitiço do Tempo? - Pash pergunta. - O sinal não toca até Lisa nos mostrar sua calcinha? - Aparentemente sim - digo, empurrando os curiosos animados. A agressão visual de hora em hora é tão nojenta que Pash e eu não temos escolha a não ser passar nosso almoço escrevendo uma carta anônima abordando a questão de bunda à mostra de Lisa Catchum. Querida Lisa, Chamou nossa atenção que toda vez que usa seu armário, seu traseiro fica completamente à mostra. Talvez você não perceba isso, talvez ache que a brisa que sente quando se abaixa vem da correria da multidão indo e vindo, ou talvez esteja treinando para ser uma estrela pornô. Qualquer que seja o motivo, isso é definitivamente errado. Ser forçada a olhar para sua lingerie do tamanho de um alfinete atrapalha nossa concentração, e não de uma maneira boa. Só porque quer mostrar sua calcinha ao mundo não significa que o mundo queira vê-la. Então, por favor, Lisa, pelo bem de toda a humanidade, gentilmente enfie sua bunda e calcinha-tamanho-band-aid de volta em seu jeans-apertadodemais, e não seremos forçadas a vomitar em você. Sinceramente, Pessoas pelo Tratamento Ético de Calcinhas Maldosa? Talvez, mas situações extremas requerem medidas extremas. Além disso, você devia ter visto os dois primeiros rascunhos que Pash e eu bolamos, gargalhando até chorar e molhar nossas já murchas batatas fritas da lanchonete. E quando, no quinto tempo, Lisa começa a usar seu moletom com brilhantes amarrado em volta da cintura como cobertura extra de bunda, a vitória é minha. Posso agora me dirigir ao meu armário em paz. Yoda Cowboy

Agora, entre você, eu e Pash, existe um detalhe brilhante nessa farsa que chamam de Sistema Educacional de Bodeen. Esse detalhe seria o professor de economia, Sr. Smiley. O que posso dizer dessa joia de homem? Ele se parece muito com o Yoda, tem talvez 1,55m de altura em suas botas cowboy de salto, e é fã de ternos estilo country até o fim. E quando digo estilo country, não estou falando de uma fantasia qualquer que só adiciona um toque cowboy. Estou falando do tipo de poliéster que pararam de fabricar em algum ponto dos anos 1970, o tipo fabricado apenas em cores pastéis geralmente só vistas em M&M's edição especial de Páscoa: pêssego, limão, lavanda, verde menta - Sr. Smiley tem a coleção inteira e mais. Deve ter feito um estoque quando soube que iam acabar. Normalmente, um estilo de se vestir tão ousado para um professor diante de adolescentes críticos resultaria em abjeta ridicularização (é só testemunhar a Sra. Gomer e seus bizarros "brincos de sexta-feira"). Mas o Sr. Smiley agilmente evita essas armadilhas. Ele nunca deixa ninguém esquecer que, apesar de ter 108 anos e ser membro de honra da sociedade apreciadora de cores pastéis, acabaria com a


raça adolescente em um segundo. Nem os meninos mais bravos ousam se meter com o Sr. S. E se a glória fashion não foi suficiente para convencê-lo de sua grandiosidade, pense em seu lendário uso de apelidos. Sr. Smiley tem um apelido para todos os estudantes que cruzam seu caminho - Esperta, Nadinha, Black Jack, Joaninha, Chicote, Biscoito.... Ele vai se gabando pelos corredores, pedindo aos alunos que se dirijam à sala de aula. - Saidinha, Batom. O sinal já vai tocar - diz, num exagerado sotaque arrastado do Texas. - Você também, Pipoca. E leve Amarelinha e Johny Diamond junto... Wanda Sue, estou te vendo... Acabou o intervalo, Domador de Leões... Doritos, não está isento... Em meus breves esbarrões com Sr. Smiley, já fui chamada de Betty Rebelde, Espoleta, Fora da Lei, Rapsódia Boêmia e Possuída. Ele nunca repete os apelidos. Jamais. Às vezes acho que quando o Sr. Smiley finalmente for para aquela grande sala de aula no céu, não vai ser por causa de um ataque cardíaco ou algo do tipo. Vai ser porque finalmente não consegue inventar novos apelidos. Ele assume sua esquisitice de maneira tão genuína, que só de pensar me dá vontade de chorar. Eu o idolatro totalmente, e por isso resolvi dedicar minha declaração fashion de volta às aulas a ele - uma camiseta feita em casa que diz SR. SMILEY É MEU MELHOR AMIGO em letras de veludo coladas com o ferro de passar. Quando me sento para assistir o sétimo tempo, Yoda Cowboy olha a vestimenta com resguardo e suspeita, mas abro meu sorriso sincero, para mostrar a ele que não é brincadeira (o sorriso que guardo para Pash e para o namorado que ainda vou conhecer.) Sr. Smiley se comove. Suas orelhas pontudas até se retorcem em aprovação. - Bem, Framboesa - declara -, já era hora de eu ter meu fã clube. - Sem dúvida - digo. Trocamos um high five, e meus colegas de classe sem noção observam, confusos, os queixos caídos, e tentando decidir se isso foi ou não legal. (Claro que foi.) Elas patinam à noite

Sexta feira à noite, 20h23, Pash e eu estamos dirigindo a aproximadamente 160 quilômetros por hora para chegar até Austin a tempo de nosso batizado Roller Derby. Enganamos os pais de Pash com uma história comovente sobre duas garotas que amam tanto torcer pelo time de futebol de seu colégio que não podem suportar perder a estreia da temporada contra o Killean High, a duas horas de distância. Considerando que ser uma "adolescente americana normal" vence tudo na casa dos Aminis, eles concordam em estender a hora de chegada de Pash para uma da manhã, O que nos dá tempo suficiente para mergulhar os dedinhos nas águas da diversão de verdade. Naturalmente, vou dormir na casa dela também, o que mantém nosso plano a salvo do radar de Brooke. U-hu! Estou tão ligadona que mudo de roupa mil vezes no carro em busca de grandiosidade fashion. Com as opções se esgotando, entro no meu velho vestido de reserva, um microminivestido que fiz a partir de uma camiseta


vintage, preso por nada mais que milhões de alfinetes de segurança estrategicamente espetados. Uso sobre leggings para amenizar o fator quase vulgar. Normalmente amo usar esse vestido, mas hoje não estou sentindo que é o ideal. Talvez meu romance com minha roupa preferida tenha acabado. - Estou tão de saco cheio de todas as minhas roupas - digo, remexendo o banco de trás em busca de opções que ainda não tenha experimentado. Pash bate em uma de minhas mãos e grita por cima do CD "Músicas rumo ao Roller Derby" que fiz especialmente para a ocasião: - Chega de se trocar! - grita. - Você fica demais nesse vestido, então pare de ser mulherzinha e insegura. Está prestes a me fazer bater o Pashmóvel. - Não acha que esse vestido tem alfinetes de segurança demais? pergunto. - Alfinetes de segurança nunca são demais! Além disso - continua, contradizendo totalmente a confiança que acabou de mostrar -, eu sou a garota com uma fatalidade fashion aqui. Pash levanta seu cabelo vermelho-vivo, recentemente tingido, para revelar o resíduo de tinta Manic Panic que forma um colar improvisado atrás de seu pescoço. - Te avisei sobre pintar o cabelo em casa - digo. - Não é para iniciantes. - Eu sei, mas estava loucamente entediada e precisava dar um tempo do estudo de francês. Era isso ou comer metade de um bolo de chocolate. Escolhi pintar o cabelo. - Vê, nisso que dá estudar demais - digo. - Atrapalha seu senso de estilo e te deixa sem sobremesa. Pash dá de ombros e faz uma careta para a estrada. - Na verdade, seu cabelo está maravilhoso - digo. - Apenas use solto e ninguém vai reparar na mancha. - Acha mesmo? - Acho. - E quando estiver aos amassos com um cara e... - Amassos com um cara? Ora, ora, alguém tem grandes planos para esta noite. - Sempre. - Bem, se ele perguntar, diga apenas que é uma tatuagem. De uma ameba vermelha gigante. Ela ri e aumenta o som. Essa é a Pash que conheço. Entre os nossos

Finalmente chegamos em Austin, mas nos perdemos tão tragicamente tentando localizar o esquivo distrito dos armazéns (obrigada por nada, mapas da internet!), que quase perdemos toda a maldita coisa. Literalmente, somos tipo as duas últimas pessoas a entrar antes dos ingressos esgotarem. Mas um passo adentro e sei que minha pequena e chata maratona de insistência valeu a pena. Muito. Em Bodeen, uma "sexta-feira à noite maneira" resume-se a um bando de adolescentes caipiras circulando pelo Sonic Drive-In com suas picapes emprestadas dos pais. Mas isso, isso é de verdade colegiais alternativos misturando-se numa boa ao pessoal mais descolado da faculdade. Você precisa entender que, no meu estado desprovido de pessoas


interessantes, só estar perto de centenas de pessoas legais é um pouco mais que impressionante. É um maldito milagre. Tenho ao menos permissão de estar num lugar tão legal? Com certeza alguma coisa vai atrapalhar. A Ordem Mundial da Diversão vai fazer uma ligação de emergência para Brooke que vai aparecer e me levar de volta. Foi por pouco, hein - quase conseguiu se divertir dessa vez. De volta à vida real agora. Pash, ainda bem, não é dada a tais espasmos cerebrais de paranoia. Ela inclina a cabeça para trás, abre os braços, e declara feliz: - Esses... são dos nossos. - Totalmente - digo, antes de ver um cara parecendo um homem das cavernas graciosamente esvaziando uma lata de cerveja Lone Star. - Menos ele. Ele não é dos nossos. - Eca, é, ele não. Todos menos ele. Tirando o homem das cavernas, a multidão de fãs do esporte oferece meninos dignos de cobiça até onde nossos olhos podem ver (e nossos olhos podem ver bem longe). Então, enquanto esperamos que as garotas Derby façam a sua coisa de patins, Pash e eu nos dedicamos a uma Procura De Gatinhos Profissional (PDGP). - OK - Pash sussurra -, que tal ele, o cara alto com óculos de armação preta? - Nham. Mas, aimeudeus, saca só o garoto com um cigarro atrás da orelha ali. - Me viro subitamente para a direita. - Aah! Só de olhá-lo me dá vontade de fumar - suspira Pash. - Com certeza. - Vamos pedir um cigarro pra ele - declara, entrelaçando seu braço no meu e me arrastando na direção do garoto. - Não! - digo, freando. - OK, Senhora Uso um Sexy Microminivestido, mas Tenho Medo Demais de Falar com um Garoto. Você é tão medrosa. - Não sou medrosa - protesto. - Sou só... debilitada no quesito paquera. - Espere! Ele! Olha, olha, meu futuro marido bem ali - Pash grita, agitando sua cabeça loucamente para a direita como uma epiléptica. Uma epiléptica bem bonitinha. - Jesus, por que tem tanta atração por garotos de moicano?- pergunto. - Por que eu não teria tanta atração por garotos de moicano?- Pash declara. E enquanto discutimos isso, o Menino Moicano se vira para nós. Sem perder um segundo, Pash lança para ele um bem planejado sorriso discreto. Ele responde com um aceno de cabeça tipo E aí? Sinto a súbita necessidade de sair da linha de fogo de paquera para Pash e MM continuarem com seu rolo. Olho para o chão, tentando desaparecer. Reparando no mar de sapatos, me ocorre que quase todo mundo está usando All Star Converse. (All Star aqui, All Star ali, All Star, All Star em todo lugar!). Graças a Deus Pash me emprestou suas botas de salto esta noite porque, por mais que ame meus clássicos tênis de cano longo, está totalmente na cara que estão prestes a virar clichê. Igual a caveirinhas. A pessoa tem que sair de Bodeen para observar essas mudanças dinâmicas na moda indie.


Em meio à massa de tênis legais-demais-para-escola, acho um par de sapatos oxford desgastados cobertos de manchas de tinta. Poderiam esses ser os sapatos de um cara artista e interessante? Fico imediatamente intrigada. Meu olhar se desloca para cima, seguindo as manchas de tinta até chegar em um par de jeans surrado, camiseta esfarrapada, e por último, mas não menos importante, uma massa de cabelo despenteado e preto. Se ele é bonito assim de costas... * ...E então ele se vira. O lugar inteiro vira um borrão enquanto esse rapaz sexy entra em foco. Seu cabelo despenteado (sou fã incondicional de cabelo estilo acabei-de-sair-da-cama) é até melhor de frente, metade caindo sobre seus olhos esmeralda. Repetindo, olhos esmeralda. Sem falar no corpo magro, de roqueiro, e pele pálida que sugere muito tempo passado em lugares fechados ouvindo discos. Em resumo, per-fei-ção. E apesar de Señor Sensual ser obviamente um grande vencedor na loteria da beleza, ele parece passar exatamente 0,0002 segundos pensando nisso - o que só o faz mais gato. É no meio desse pensamento que me dou conta que SS está olhando em minha direção - bem para mim. Meu estômago se revira e sinto um frio na barriga. E depois, fica tudo preto. OK, por favor, diga que não acabei de desmaiar por causa de um garoto que nunca vi antes. Por favor, por favor, por favor, deixe me reconfortar sabendo que nem eu seria tão deprimente. E então escuto uma parede de gritos subir à minha volta e percebo que ainda estou de pé. Foram as luzes que se apagaram, não eu. Salva do desastre. Ufa - essa foi por pouco. Pash agarra uma de minhas mãos enquanto a onda-de-humanidadederby nos leva até a pista onde a loucura está prestes a começar. Olho para trás, mas Señor Sensual sumiu na escuridão. O batizado Roller Derby

A expectativa do público faminto é tamanha que começo a pensar que o teto do armazém vai explodir e voar. Mas então - vrum! - focos de luz chovem pela pista e o show começa a cem quilômetros por hora. Por mais que seja bom ficar olhando os carinhas, essas garotas oferecem seu próprio tipo de entretenimento irresistível. Primeiro, a Fight Crew patina pela pista. É um time de antipáticas aeromoças, produzidas em uniformes de matar das comissárias dos anos 1960 (só seus uniformes estilo mod já me dão inveja fashion). Para não falar em seus nomes incríveis, como Holly Go-Fightly, Eva Destruction e Kami Kazzi. Algumas delas jogam bebidas e saquinhos de amendoins de um carrinho para o público. Então vêm as Holy Rollers, garotas malvadas de colégio católico que poderiam encher um ônibus escolar. Seus uniformes consistem em - acertou minissaias xadrez, complementadas por meia-calça arrastão rasgada e muitas tatuagens (mais inveja fashion). Elas também têm apelidos legais como Annie Social, Helena Handbasket e Dinah Might, a menina do pôster.


Mas a apresentação dos times é apenas um aperitivo para a refeição de quatro pratos que se segue: a patinação. Honestamente, nem tenho certeza de quais são as regras do Roller Derby, mas do primeiro ao último apito, a noite é um borrão de patinação em altíssima velocidade e manobras de tirar o fôlego. É de longe a coisa mais digna de reverência e medo que já vi em toda a minha vida. Garotas mergulham na pista, caem umas sobre as outras, se agrupam para brigar, pulam sobre os corrimãos até o público (mais de uma vez!), e basicamente destroem umas às outras... E ainda assim, dá pra ver que é a maior diversão de suas vidas. É um paraíso de filme-B dos anos 1970. E Dinah Might das Holy Rollers - meu Deus! Ela é pequena, com traços frágeis, mas quando patina é "pura dinamite", como dizem. Amo Dinah da mesma forma que os meninos amam o Super-Homem. Quero ser ela. Quando tudo acaba, as Holy Rollers venceram as Fight Attendants com um placar de 72 a 44, mas isso é tão irrelevante! Se o punk-rock fosse um esporte organizado por garotas rudes sobre patins, o resultado seria Roller Derby. Cada uma das garotas é completamente estonteante de sua própria maneira: tem garotas magricelas, garotas gordinhas, garotas altas, garotas baixas, garotas com bundonas, garotas com peitões, garotas sem peitos, garotas com tatuagens, garotas sem - e o público adora todas. Resumindo, é a atividade que tem mais a ver com Bliss que já vi em minha vida, um refresco tão anticoncurso. Fui convertida. Quando a patinação acaba, o armazém vira uma festa gigante, com as garotas Derby se misturando à multidão. Mas antes de poder conhecer uma de minhas novas heroínas, Pash balança seu relógio da Hello Kitty na minha cara. - São 0h07 - diz. - Temos que ir. - Mas não terminei de me divertir. - Se não tenho tempo de ficar com um gatinho, você também não tem tempo de brincar de tiete Roller Derby - ela ladra, me empurrando para a saída como gado. A garota não dá bobeira com os deuses do horário de chegar em casa. E assim que estamos indo embora, passamos pela barraca de suvenir, onde as garotas Derby vendem tudo, de camisetas a figurinhas. Elas têm as próprias figurinhas! Como se atraída por um imã, me solto de Pash e vou ver mais de perto. Encontro-me cara a cara com uma loira platinada durona usando mechas azuis que, odeio admitir, ficam bem melhores nela do que em mim. Pra não falar na tatuagem irada de sereia cobrindo seu braço esquerdo. Ela franze as sobrancelhas descoladas e me dá um olhar que sugere estar decidindo se deve ou não acabar com a minha raça. Antes de me censurar, a seguinte pérola sai de minha boca: - Vocês todas são minhas novas heroínas! Quero ser vocês! - solto, como uma menininha de 13 anos durante seu primeiro show de boy band num parque de diversões. - Então levanta essa bunda até a pista e faça acontecer ela diz, com encorajamento amigável. - Por mais que Roller Derby seja divertido de assistir, é ainda melhor participar. - Ah, não conseguiria - digo. - Quer dizer, nem toco nos meus patins da Barbie desde tipo, o sexto ano.


- E daí - ela diz. - Você se lembra. Vamos fazer seleções na terça-feira. Devia dar uma olhada. Pensando bem, meus anos de ensino fundamental tiveram uma fae de patinação bem intensa. Bicicletas e patinetes podiam ser o meio de transporte ideal para meus colegas, mas o meu negócio eram os patins. E é simples assim: uma ideia que há cinco minutos pareceria completamente insana agora parece totalmente lógica. - Tô dentro! - subitamente guincho, levando minha idiotice a novos níveis. Para registrar, nunca guinchei na minha vida, mas aqui estou me expressando por meio de barulhos de porcos. Deprimente. - Só tem de ter 18 anos, você tem 18, certo? - Sinto Pash se aproximar e me dirigir seu silencioso olhar de morte, que ignoro. - Ahn, claro, acabei de fazer aniversário - minto. - Legal. Sou Malice - ela diz -, Malice no País das Maravilhas. - Demais. Sou Bliss. - Ela me dá um olhar que diz, Você só pode estar de sacanagem com um nome desses. - Mas posso mudar isso totalmente. - Vai precisar - Malice diz, com um sorriso. - Estamos indo agora. - Pash subitamente interrompe, acabando com a conversa e me puxando para fora pela manga. No caminho até o Pash-móvel, mal consigo me conter, dando pulinhos o tempo inteiro. Pash se vira para mim: - OK, que diabos foi aquilo? - pergunta. - Que diabos foi o quê? - Não pode jogar Roller Derby! - ela praticamente berra. - Vamos fazer os testes juntas - digo, entre mais pulinhos. - Vai ser tão divertido! - Bem, com licença, ser espancada por um bando de garotas duronas de patins não é exatamente minha ideia de diversão. Para seu governo, não tive uma fase patins-da-Barbie, OK? Tive uma fase garota-gorda-sentada-em-casalendo-um-livro. Ao contrário de algumas pessoas - completa -, conheço meu limite. - O que quer dizer com isso? - Aquelas garotas são seriamente agressivas. E Bliss, você - ela pega meu braço despreparado e o torce num golpe indiano tão bruto que grito alto não é agressiva. - Bem, ainda não - digo, mansamente. - Mas talvez possa ser. - Que seja. Sua mãe vai sur-tar. - Não, não vai. Ela nem vai saber - digo. Como se algum dia fosse realmente contar a Brooke que estou praticando Roller Derby. - Ooh. - Pash diz, com súbita aprovação. - Você é uma menina malvada e destemida. - Vamos! - Dou um cutucão. - Faz a seleção comigo. - Não vou sacrificar minhas notas - Pash diz com firmeza, abrindo o carro. Mais uma vez sou lembrada de que minha melhor amiga é um gênio da medicina, e todas aquelas notas máximas que batem ponto no seu boletim não são à toa. No mundo acadêmico, ela é a rock star e eu sou a ajudante de palco. - Não vai ser tão divertido sem minha Pash - digo triste, quebrando vários segundos de silêncio.


- Se conseguir passar - diz -, irei a todos os jogos pra torcer pela sua linda bunda. Já me sinto melhor. Corremos de volta a Bodeen para vencer o relógio dos pais. Pash passa pela Sonic só para pegarmos o placar do jogo de futebol dos deprimentes, mas úteis, perdidos perambulando sem o que fazer até tarde da noite. São 1h02 (ainda dentro da tolerância de cinco minutos de atraso) quando entramos pela porta cantando uma música de briga entre colégios que inventamos no carro. - Como foi o jogo? - pergunta o Sr. Amini. - Incrível - Pash responde. - Ganhamos. - Catorze a três - complemento, dando os detalhes que legitimam nossa farsa. Quando chegamos a seu quarto, Pash e eu mal conseguimos fechar totalmente a porta antes de cair numa gargalhada conspiratória em cima de sua cama eternamente desarrumada. Bingo

Na manhã seguinte, monopolizo o computador de Pash para pesquisar sobre o esporte, uma atividade que nem ouso tentar em casa por dois motivos. Primeiro, o hábitat de Earl e Brooke não é exatamente um antro de tecnologia moderna. Ambos estão dolorosamente empacados na Idade da Pedra de internet discada (literalmente, dá para testemunhar uma espinha nascer, estourar e ir embora de seu rosto enquanto aquele triste PC encontra um jeito de se conectar à Web). E segundo, nas raras ocasiões em que se encontra a santa paciência para usar o computador em câmera lenta, existe 103 por cento de possibilidade de Brooke ficar andando por perto, espionando cada clique seu. Prefiro não me submeter à tamanha vigilância, muito obrigada. Então, enquanto Pash ronca seu sábado todo, me sirvo de uns dois (OK, quatro) dos biscoitos recheados que ela deixa estocados atrás do som e me acomodo para passar um tempo produtivo no site das garotas Derby. Descubro que elas farão uma seleção para a próxima temporada na terça-feira àS 19h. Testes - aí está uma palavra horripilante. Claro, parece tão inocente e casual, mas nunca fui realmente testada para nada na minha vida. Só a ideia me deixa tão nervosa, que já estou suando mais que minha tia Brenda num piquenique de 4 de julho e, acredite, aquela mulher realmente sabe suar. E ainda assim, tem alguma coisa em observar aquelas garotas e ouvir seus patins martelarem na pista - é como se tivesse dado uma espiada na janela de como a vida poderia ser fora de Bodeen. Quero mais. Preciso de mais. Os nervos que se danem, tenho de voltar àquela janela. Quero abri-la e pular. Se apenas conseguisse providenciar algum transporte. O Pash-móvel está proibido, mas tem a possibilidade do Ônibus para o Bingo dos Cidadãos Idosos de Bodeen, uma carruagem que carrega velhinhos locais para o Bingo Palace em Austin todas as terças e quintas-feiras para que eles possam marcar seus B-7 e N-65 com suas canetinhas. (Observação: Bodeen é tão chato que até nossos cidadãos idosos têm de sair daqui para se divertirem.) Talvez não se importem se eu pegar uma carona.


O transporte geriátrico

Com o tempo pode ser que eu tenha de entrar em meu pequeno laboratório de mentiras e elaborar um álibi a longo prazo para cobrir minhas escapadas Roller Derby, mas por enquanto digo a Brooke que estou na casa de Pash estudando para meu trabalho sobre A Letra Escarlate. Desenterro meus patins da Barbie abandonados atrás de um cemitério de animais de pelúcia no fundo do armário, sopro a poeira, e luto para que meu pé crescido demais entre num deles. Não cabe perfeitamente, mas pelo menos consigo amarrar o cadarço. Enfio o par na mochila e carrego-o para lá e para cá o dia inteiro na escola. O último sinal não poderia ter tocado mais devagar. Quando Pash me deixa no Centro de Idosos de Bodeen, uma dúzia de velhinhas já está no ônibus, e partindo. Tenho de perseguir a coisa e, balançando meus braços, digo: - Espera! Espera! O motorista, um caipira acabado chamado Todd que gosta do visual sem camisa para acompanhar seu rabo de cavalo ralo que claramente já viu dias melhores, freia e abre a porta. Digo "obrigada", pulo para dentro, e me encontro subitamente encarando uma gangue de velhinhos mal-humorados. Essa gente é bem territorial quanto a seu transporte para o bingo. Não estão dispostos a ceder um lugar vazio para uma menina de 16 anos. Por um momento, meio que espero que me ataquem com suas bengalas e andadores. Nota mental: não se intrometa entre um cidadão idoso e seu horário de bingo. É preciso alguma negociação e conversa - e uma pequenina mentira sobre estar indo visitar "minha vovó doente" em Austin - até Helen, uma coisinha doce e velha arrasando num par de Keds vermelhos, se pronunciar em meu favor. - Ela está comigo. E se vocês não gostam, podem ir se catar - declara Helen, dando tapinhas no lugar vazio a seu lado. - Obrigada - digo, aceitando sua oferta. Noto que seu capacete de cabelo enrolado bem apertado está pintado de azul-velhinha. - Adorei a cor de seu cabelo. - Obrigada. Eu mesma faço - diz, me entregando uma bola de linha enquanto tricota. Desligo-me de meus companheiros raivosos de ônibus de bingo pelo resto da viagem com meu iPod (esse grande salvador de situações sociais desconfortáveis). Uma hora depois, a condução para em frente ao Bingo Palace, e pego outro ônibus para o centro que me deixa a duas quadras do armazém. Dou a volta num beco e chego bem a tempo.

Nação iniciação

Assim que chego ao armazém, também conhecido como Casa de Bonecas, o lugar cai num silêncio intimidador. Quarenta garotas se viram todas de uma vez e olham curiosas para mim como se eu fosse uma invasora - pelo menos é o que parece. Estou tão acostumada a não dar a mínima para o que os outros pensam, e mesmo assim de repente uma onda gigante de insegurança me atinge.


Numa escala de maneirice, essas garotas são 10. Num dia bom, sou 2,7. Sinto-me aquela nerd da matemática, triste e desengonçada, tentando se infiltrar na panelinha das líderes de torcida durante o almoço como em todos os filmes de adolescente ruins que você desejava nunca ter visto (só que viu, várias vezes). E todos sabemos que essas situações não acabam bem. Especialmente para a nerd da matemática. Olhem só elas cheias de atitude, casualmente, vestidas em camisetas de banda rasgadas e calças cortadas, já comparando nomes artísticos. - Serei Princess Slaya - diz uma garota alta que parece cruel. Nem comecei a pensar num nome ainda. Admito, quero que elas gostem de mim. Nada disso, droga, quero que me amem. Droga de Pash e suas ambições de Harvard, me deixando para enfrentar esse mundo cruel sozinha. E se checarem a identidade e descobrirem que só tenho 16? Melhor tirar minha bunda fracassada daqui e correr enquanto posso. Se me apressar, ainda alcanço Helen para uma partida de bingo. Mas uma voz me tira do meu transe autodepreciativo: - Você veio! Me viro para ver Malice vindo em minha direção com seus patins lindamente pendurados em seu ombro. Sorrio e dou um aceno meio bobo. Malice gentilmente ignora minha falta de traquejo social e me leva para dentro. Ela me coloca cotoveleiras, protetores de pulsos, joelheiras e um capacete. Quando finalmente estou toda equipada, bravamente subo na pista e BAM!- imediatamente caio em cima de minha bunda novata. Mal registro a humilhação antes de duas garotas chegarem para me ajudar. - Não esquenta - dizem. - Está só começando. Certo. Fácil falar enquanto praticam pulando por cima de cones de trânsito laranja dispostos na pista. Tropeço pela pista como o Bambi recémnascido aprendendo a andar, mas o tombo é muito mais feio do que o do Bambi. A Terra circula o sol quatro vezes antes de eu conseguir dar a volta na pista uma só vez. Então um apito marca o fim de nosso aquecimento. Deixeme recapitular: eu patino e caio ao redor da pista só uma vez e o aquecimento já acabou! Todas as 15 garotas sendo testadas fazem fila no lado de dentro da pista. Olho rápido e vejo que cada uma dessas garotas poderia acabar comigo. Então, as seis capitãs dos times se apresentam. Tem a Juana Bear'n das Sirens, que usam uniformes e parecem policiais malvadas. Ela é sexy e curvilínea, aquele tipo J-Lo símbolo sexual - se J-Lo fosse legal e não a robô cafona que é. Depois vem Eva Destruction, uma gótica pálida que é chefe da Fight Crew. Tinker Hell, uma loira feminina que pareceria mais em casa numa quadra de tênis, comanda as BlackWidows, enquanto Joan Threat, uma garota indie-rock de cabelo arrepiado, apresenta as Cherry Bombs. Malice é capitã das Hurl Scouts. E por último, mas não menos importante, está Dinah Might das "invictas Holy Rollers". Estou tão deslumbrada quando Dinah se apresenta, que solto: - É por sua causa que estou aqui! O lugar fica em silêncio, todas as cabeças se voltam para mim, e Dinah diz: - Hum, é, ser puxa-saco não vai garantir seu lugar no meu time.


OK, acabei de ofender a garota mais maneira do lugar. Bom começo. Deslanchamos numa série de manobras para mostrar nossos talentos. A ideia é que os times possam nos ensinar Roller Derby. Só temos de mostrar que sabemos patinar. Só entre nós, sempre fui uma excelente patinadora quando criança - vivia nessas rodas - mas não sobraram muitas evidências disso para essa noite. Toda a coisa é um borrão de humilhações. Aqui estão os destaques: (a) Passo mais tempo caída sentada do que em Pé nos patins. (b) Em certo momento, sinto Dinah olhando meus patins rosa da Barbie. Seu olhar de desaprovação me faz cair. (c) Quando temos que patinar juntas num grupo, batendo umas nas outras para mostrar que não temos medo de dar nem de levar pancada, deslizo bons dois metro para trás, medrosa demais para participar. Fazemos uma pausa para beber água e sinto a vibração coletiva de pena. Sou a garota de quem as outras têm pena. É até bom eu estar suando tanto - esconde as lágrimas que sinto descerem. Um apito soa, sinalizando o fim do intervalo para beber água. Ficamos em fila para alguns testes. Tudo que precisamos fazer é patinar ao redor da pista cinco vezes o mais rápido que conseguirmos. Quando voltamos para a pista, Malice agarra meu braço. - Ei - diz -, pare de se julgar tanto. Tente apenas se divertir, OK? - OK - digo comovida, mas sem saber que diabos fazer com esse conselho. Uma a uma, as esperançosas garotas correm durante seus testes cronometrados. Algumas caem, mas levantam de novo e continuam; outras deslizam com facilidade ao redor da pista. A maioria mostra uma experiência básica de patinar com rapidez, mas ninguém está quebrando recordes de velocidade também, isso é fato. Tudo que tenho de fazer é dar a volta cinco vezes. Isso eu consigo. Vou para a fila, o apito soa, e imediatamente tropeço quando dou impulso. Continuo patinando, lutando contra minha tremedeira, e dou a volta uma vez com relativa facilidade (sim!). Mas então alguma coisa acontece na segunda volta. Inclino-me para a frente na pista, empurro o máximo que consigo e - bingo - saio voando pelas curvas em uma velocidade que nenhuma das garotas alcançou. Por um segundo, parece que não vou conseguir controlar a rapidez, mas dobro mais os joelhos e consigo ir ainda mais rápido. Dali em diante, a pista é minha. Ataco-a com tudo. Quando termino minha quinta volta, Tinker Hell olha por cima de seu cronômetro e grita: - Vinte e dois vírgula quatro segundos! - É metade do tempo que as outras meninas conseguiram. Sem saber como parar, dou um encontrão no corrimão e caio na pista. Todos aplaudem, e fico deitada ali, ofegando, me sentindo orgulhosa mas um pouco atordoada. Não sabia que tinha isso dentro de mim. De repente me pergunto o que mais posso ter dentro de mim que foi reprimido por anos e anos participando de concursos de beleza. Tenho de correr de volta até o ponto de ônibus para pegar a condução do bingo a tempo, o que consigo. Por pouco.


Os idosos estão reclamando da "marmelada" que acabaram de testemunhar, enquanto Helen conta o que ganhou no canto. Aquela espertinha safada. Helen e eu, as duas somos vencedoras esta noite. Osso duro de roer

Então, no dia seguinte, na escola, eu vou mancando até Pash e ela me olha com piedade. - O que aconteceu com você? Parece que levou uma surra. - Ah, e levei mesmo - sorrio. - Mas adivinha só. Consegui! Sou uma Hurl Scout! Sim. Malice, que adotei oficialmente como minha fada madrinha de patins, me escolheu para seu time. - Parabéns! - diz Pash. - Estou tão orgulhosa! - Eu sei - digo. - Agora, tudo que tenho a fazer é comprar um par de patins de verdade, mudar meu horário no trabalho e... - Pash fica pálida e faz a expressão oficial de melhor-amiga-séria. - O quê? Não! A única coisa que faz com que aquele trabalho maldito não me faça sair por aí matando, dominada por uma fúria assassina, é porque temos o mesmo horário. Não pode mudar, Bliss. Agora, por mais que eu ame e adore Pash, sem chances de não entrar pro Roller Derby. A vida fora de Bodeen começa com Derby. - Sempre teremos as sextas-feiras - digo, colocando meu braço ao seu redor. - Te odeio - Pash diz, colocando o braço em volta de mim. Depois de muita consideração e ensaio em frente ao espelho do meu quarto, explico aos velhos que minha iminente ausência de casa às terças e quintas é porque me juntei a um grupo de estudos para me preparar para o vestibular. Brooke olha para cima enquanto alfineta uma fantasia para Sweet Pea. - Sabe, Bliss, não é má ideia - diz, seu faro para tiara se aguçando. Garotas inteligentes estão na moda nos concursos hoje em dia, e pode apostar seu dinheirinho que os juízes do Miss Bluebonnet vão ficar impressionados com isso. Está vendo com o que tenho de lidar aqui? Minha própria mãe não quer que eu seja esperta só por ser esperta ou, é, sei lá, ir para a faculdade - ela quer que eu seja esperta para um concurso de beleza. Poderia alguém (qualquer um), por favor, dizer a ela que estamos no século XXI?

A antiescola

Estou adiantada para meu primeiro treino oficial com as Hurl Scouts. Já até coloquei meus acessórios quando as outras garotas começam a chegar. Quando termina o casual aquecimento, o treinador Brian, também conhecido como Blade, nos coloca para trabalhar. Uma nota sobre Blade: ele talvez tenha 23 anos e é meio bonitinho de um jeito nerd e metaleiro brega


(significando que em outras circunstâncias não teríamos nada a dizer um para o outro). Mas acontece que Blade ama patinação e é muito bom nisso, o que faz dele um bobo para o resto da sociedade, mas um deus para a gente. Até quando Blade está acabando com a nossa raça com as manobras de patinação, as garotas continuam sua eterna busca por maneiras de deixá-lo vermelho de vergonha com suas piadas sujas, o que torna tudo divertido quase a ponto (quase) de esquecermos como estamos dando duro. É o tipo de clima engraçado que nunca veria no mundo treinador-ditador-histérico de esporte colegial. Roller Derby é tão antitudo isso. A maioria das minhas colegas de time são estudantes de faculdade (algumas têm até mais de 21 - ora, ora). Ninguém questiona meu status de menor de idade, apesar de contar a elas uma pequena fábula sobre morar em Bodeen, trabalhar no Oink Joint para juntar dinheiro para a faculdade, o que elas acham que significa que já me formei (e não tenho a mínima intenção de corrigi-las). A vida já está melhorando. Sou como a irmãzinha caçula adotada de quem todas estão cuidando, o que adoro. E que fique registrado: a irmandade Roller Derby é verdadeira, não manchada por aquele falso poder feminino, estilo Oprah que você vê nos comerciais de Dove (ao qual sou profundamente alérgica). E é assim que realmente sei: ninguém diz "poder feminino". É mais tipo "você arrebenta" ou "você arrasou", mas não aquele lixo idiota "poder feminino". Meu dever de casa para o próximo treino, além de dominar as habilidades em patinação, é inventar um nome Derby, afinal todas concordam que Bliss não vai rolar. (Digo isso a Brooke há anos.) Metamorfose

As três semanas seguintes voam enquanto minha vida vira patinação, o tempo todo. Encomendo meu próprio par de patins usando o dinheiro que daria pelo sapato John Fluevog. Naturalmente, mando entregar na casa de Pash para não levantar suspeitas de Brooke. Dizemos a seus pais que a caixa tem um telescópio, e eles aprovam. No treino, o fator humilhação despenca enquanto minha patinação melhora. Apesar de estar coberta de manchas roxas, também conhecidas como "beijos dos patins", me sinto surpreendentemente orgulhosa do que estou aprendendo a fazer. (É tão estranho, pareço uma atleta falando.) Até saio escondida tarde da noite para praticar minhas paradas e derrapadas poderosas no estacionamento, determinada a me igualar as outras garotas. Adoro o jeito como o vento atravessa meus cabelos no treino quando voo pelas curvas, me abaixando, me inclinando para a pista para atingir a velocidade máxima. Parece que minha vida esteve devagar por tanto tempo, que é divertido finalmente estar rápida. Se eu apenas conseguisse aprender a coisa de bloquear. Você sabe, a parte do esporte que faz ser Roller Derby e não apenas patinação. Até agora, toda vez que Emma Geddon ou Crystal Deth ou Malice se aproximam de mim para algum contato, imediatamente caio no chão. Depois de um desses já característicos episódios, Blade patina até mim e diz:


- É um esporte de contato, Bliss. Isso significa que uma hora vai ter que fazer contato. OK, faz sentido. Mas ainda me sinto uma merda por ser chamada a atenção. Enquanto isso, atazano Pash dia sim, dia não, constantemente consultando-a (ela diria assediando) sobre o nome perfeito para Roller Derby. Podemos estar no meio de uma conversa perfeitamente aleatória sobre por que o diretor Starsiak é um velho malvado total e então digo: - Que tal Punky Bruiser? Ou Maggie Mayhem? Ou Raggedy Annarchy? Quando tento tocar no assunto de novo, Pash finalmente apenas revira os olhos. - Se começar com a história do nome, não vou a seu jogo. - Tudo bem - digo -, porque Malice e eu já resolvemos. - Você realmente escolheu um nome? Desembucha - Pash diz. - Não. Vai ter de esperar pelo jogo - digo, deixando-a no corredor enquanto desapareço para a aula de inglês. Dentro do armário

A coisa surpreendente sobre minha vida dupla de patins é que sei que tenho de desempenhar o papel filha-perfeita para evitar Brooke. E ouvindo a velharia discutindo no ônibus do bingo, minha tática de sobrevivência é manter meus fones de ouvido no máximo e o nariz enfiado nos livros. Desde que uma das minhas mãos esteja livre para segurar a bola de linha de tricô de Helen, não tenho como errar. Então, no auge da rebeldia e mentira para meus pais, consigo levar para casa o tipo de notas que não vejo desde a segunda série. Um dez após o outro. Bliss vintage. É incrível - dá pra se safar de tudo desde que seu boletim seja digno de se gabar. Por que não pensei nessa estratégia antes? Até Earl me puxa para um canto e docemente coloca uma nota de cem dólares em minhas mãos. - Estou muito orgulhoso de você, garotinha - ele diz. Toda a cena quase me faz explodir em lágrimas porque normalmente Earl não gosta de se envolver. Além disso, apesar de não me importar com quase nada hoje em dia, não tenho como deixar de me importar quando meu pai me chama de garotinha. Espero que nunca deixe. Uma estréia arrebatadora

É isso, esta é a noite: minha estreia como a própria, a única, Babe Ruthless diante de uma plateia de fãs adoradores. Ainda melhor, Sadie, Juana e sua colega de quarto Octavia (que chamamos de Rocktavia porque ela merece) planejaram uma festa insana depois em sua casa. Finalmente (finalmente) minha vida de verdade está prestes a começar, e estou levando Pash comigo. Na verdade, quando mencionei a festa, Pash respondeu: - Está muito ferrada se não me convidar. Como se ela tivesse mesmo que pedir. Não ousaria ir a uma festa sem minha Pash Amini.


Usamos a boa e velha "Vou dormir na casa da Pash, e ela vai dormir na minha casa" desculpa para os pais de ambas. Normalmente, essa tramo ia levantaria grandes suspeitas com Brooke, mas uma fortuita virada de acontecimentos ajudou nossa causa. Brooke teve que acompanhar Sweet Pea para um concurso de Pequena Miss O-Que-Quer-Que-Seja em Dallas, me deixando sob os cuidados de meu pai não-muito-inteirado-das-regras. Se me sinto mal mentindo para Earl quando ultimamente ele tem sido tão legal? Vamos encarar assim: Bliss se sente culpada, mas Babe Ruthless sabe que o show deve continuar. Pash e eu ganhamos a oportunidade de ouro de ficar fora a noite toda. Pretendemos tirar vantagem total disso. Esta noite, a liga de garotas Derby está representada pelas Sirens, um time de policiais corruptas, e pelas Hurl Scouts, uma gangue de escoteiras que ficaram malvadas. Podemos ouvir a multidão enchendo o armazém enquanto nos arrumamos. Crystal Deth me empresta uma maquiagem para olhos fabulosa que faria qualquer fã de Rocky Horror Picture Show se derreter de inveja. E quando finalmente entro em meu adorável vestido verde de escoteira com minhas meias arrastão preta e verde néon rasgadas, quase choro. Pareço sexy e má ao mesmo tempo - minha ideia do que é fabuloso. Quando anunciam Babe Ruthless, dou minha volta pela pista, esvaziando uma lata de biscoitos na multidão. É difícil dizer quem está se divertindo mais: eu ou eles. Acho que eu. Malice me escolhe para ser a primeira do nosso time a atacar. O apito soa e algo entra em erupção dentro de mim. Disparo como se saída de um canhão, costurando e evitando as zagueiras oponentes que tentam me derrubar. Elas erram. Até consigo uma linda arrancada por meio de Emma Gedden entrando numa curva. Ela joga um de seus braços para trás, eu o agarro, e sua força me lança longe da curva, mandando-me para a frente das Sirens. É uma jogada que agradou o público, pode ter certeza disso. Quando acaba o tempo, consegui juntar impressionantes seis pontos para as Hurl Scouts. (Sei que não é essa a questão, mas dá um tempo, é minha primeira vez!) Minha adrenalina está no teto, e tenho que sentar longe da confusão só para retomar o fôlego e lidar com um caso agudo de boca seca. Esvazio uma garrafa de água, procurando por garotos na multidão. Claro que estou atrás de um vislumbre do Señor Sensual, o delicioso roqueiro que assombra cada devaneio meu desde que pus os olhos nele pela primeira vez seis semanas atrás. Garotos bonitos em toda parte mas, que droga, nada de SS. Não surpreende - ele devia ser uma miragem. Ou até pior, não tão bonito assim (sua beleza apenas um produto da minha imaginação). Se o visse agora, provavelmente ficaria desapontada até o ponto de me assustar. E estou me divertindo demais para tristezas românticas. Estou jogando Holler Derby! Antes do intervalo, Crystal machuca o joelho e tem de ficar de fora por algumas voltas. Durante um tempo, Malice me chama para bloquear. Dou a ela um olhar deve-estar-louca. Está bem fundamentado que bloquear não é meu ponto forte. Malice me puxa de lado e diz:


- Sabe o que faço quando tenho que bloquear? Penso em meu exnamorado, Dax, e no idiota que ele foi. Um pequeno conselho, Ruthless, nunca namore um cara de banda ou um leonino: são totalmente tóxicos. Enfim, quando bloqueio, penso em acabar com a raça do Dax e sua preciosa guitarra. Ajuda muito. Pense em coisas que te enfurecem, e vai conseguir ótimos bloqueios. Então, estou lá no meio, de zagueira, bloqueando, e Robin Graves está no ataque, pronta para me passar e marcar ponto. Normalmente, deixaria Robin passar, mas não desta vez. Desta vez sigo o conselho de Malice. Penso em Brooke, e Corbi, e todos os clientes mal-humorados que não dão gorjeta todos juntos - e assim que Robin se abaixa para passar, jogo os quadris e ombros e - bingo! - faço contato. Robin cai na pista enquanto patino como louca. No final, já estou tão integrada que me sinto invencível e, ouso dizer, impiedosa. Agora estou bloqueando, não atacando. Posso fazer a manobra que quiser. E, de alguma maneira, com o público nos incentivando a um grande final, uso a manobra mais vovó de todas: pular o corrimão. Apenas três garotas na liga conseguem acertar essa, mas de alguma maneira decido que vou ser a quarta. Então levo um empurrão de Juana Beat'n das Sirens e vou para o alto da pista a toda a velocidade. Quando chego à ponta, alcanço o corrimão e dou uma estrela. A queda é de uns 2,40m no concreto frio e duro. A multidão perde o fôlego... Não vejo nada além de um borrão de luzes enquanto voo pelo ar... E então - SLAP!- meus patins batem no chão. O público ruge, e percebo que ainda estou em pé. Consegui! Consegui pular a porra do corrimão! E, simplesmente assim, sou uma lenda da Derby Girls, pelo menos na minha cabeça de qualquer maneira. No minuto em que saio da pista sinto minha vida social dando uma guinada para melhor. Sou engolida por fãs. Pash corre até mim, expulsando todos eles e gritando: - Ah, meu Deus, Bliss! Você é uma porra de uma rock star! Um cara charmoso, mas velho demais, interrompe: - Você é demais, Babe Ruthless - diz, começando a me passar uma cerveja. Malice se intromete como uma leoa protetora. - Ela só tem 18 anos, babaca - ladra, empurrando o cara velho para trás. - Mas eu queria aquela cerveja - reclamo. - Pegamos uma para você na festa - diz Malice. Ilha da pegação

Quando Pash e eu chegamos para fazer nossa entrada triunfal na festa, as ruas em volta estão tão lotadas de carros que somos obrigadas a estacionar praticamente em Bodeen. Não que eu esteja reclamando. A épica caminhada vale muito a pena. O lugar está lotado de gatinhos. Margaritas e Lone Stars passam pelas mãos dos festeiros como ponche num aniversário de uma criança de 5 anos. E Pash não perde tempo para se servir de álcool e garotos.


Não sei como, mas sou encurralada por algum skatista nojento chamado Adam que talvez tenha uns 14 anos, enquanto minhas colegas de patinação parecem não ter problemas agarrando as escolhas mais desejadas. Quando chega meia-noite e meia, a Concentração da Patinação vira Concentração da Pegação. Na grama, na cozinha, no corredor, nos quartos, em ambos os banheiros e até no quintal, casais parecem estar aos amassos. Todos menos eu, e pareço não conseguir me livrar desse nojento me seguindo de sala em sala enquanto procuro por Pash, que desapareceu. Á beira de lágrimas de tédio, me nomeio DJ e tomo conta do som. (Estamos escutando o mesmo CD do Beck há duas horas, e isso é simplesmente errado — mesmo quando se gosta de Beck. Passo os olhos pela coleção de discos de Rocktavia, procurando inspiração divina. O álbum Velvet Underground and Nico chama minha atenção. Penso em quantas vezes já li sobre essa banda em artigos de música, mas até hoje não os escutei realmente. Às vezes só quero explicar aos superentendidos de música que tenho apenas 16 anos, e que só escuto música de verdade há dois. Me dá um tempinho pra me inteirar! Jogo o disco na vitrola, curiosa para descobrir finalmente por que é que falam tanto do Velvet. A agulha encosta no vinil, a música começa e...aimeudeusdocéu. Estou mais que perplexa. Não é nem um pouco o que estava esperando, um híbrido de punk barulhento. O que está saindo das caixas de som é um gênero por si mesmo, um conto de fadas adorável e fodido que imediatamente parte meu coração das melhores maneiras possíveis. Me estico no chão com um ouvido bem ao lado do som, em transe. Coloco a capa do disco em cima do meu rosto para bloquear qualquer tipo de interrupção enquanto "I'll Be Your Mirror" me seduz. Imediatamente adiciono a música à minha lista mental de dez melhores músicas de todos os tempos. E enquanto balanço a cabeça com abandono sonhador, escuto uma voz: - Boa escolha, DJ - diz. Devagar deslizo a capa do álbum até descobrir meus olhos e olho para cima. Vejo seus sapatos primeiro — manchados de tinta. Meu coração para quando olho para seu rosto. Pele pálida, cabelo despenteado e preto, olhos esmeralda... Señor Sensual! Ele tem 18, talvez 19 anos. E não, minha imaginação não estava mentindo, ele realmente é tão devastador agora quanto na primeira vez em que o vi. Só que ainda mais, por que acabou de elogiar meu gosto musical. Rapidamente me viro e levanto. Só de olhar para ele, sou atingida por um raio fulminante. A corrente me rasga ao meio, e literalmente tropeço para a frente - ele tem de esticar o braço para me estabilizar. - Fiquei tonta - digo, tentando recuperar o fôlego e a dignidade. - Esse álbum faz isso com as pessoas. - É incrível. Nunca tinha escutado até agora. - Mesmo? - pergunta, com interesse - Então, o que acha? Agora, se você é o tipo de pessoa que experimenta profunda vergonha misturada à humilhação quando alguém faz papel de idiota, sugiro que pule esta parte. Caso contrário, aqui estão os detalhes sórdidos. - Bem - digo -, sabe quando às vezes as pessoas ficam falando "Cara, esse é o melhor disco do planeta! Você não viveu de verdade até ter escutado isso!"? E então você escuta, e fica, tipo, "Grande coisa, estou tão nem um


pouco impressionada"? Mas, outras vezes, escuta uma banda pela primeira vez, e é tão boa que faz seu estômago doer de um jeito bom? Ah, acho que esse é o caso. Ou sei lá. - Lentamente meu semancol finalmente entra em ação e mordo os lábios para evitar que me envergonhe ainda mais. Señor Sensual fez uma pergunta simples e consegui me lançar num monólogo sem fôlego, expondo toda minha idiotice de primeira. Mas talvez ele tenha uma queda por garotas idiotas, porque ele simplesmente sorri. - OK, quem é você, e de onde veio? - pergunta. (Venho me fazendo a mesma pergunta minha vida inteira. Entre na fila, amigo.) - Sou de Bodeen - confesso. - Eu sei, nada legal, mas... - Tipo a cidadezinha caipira? - pergunta. Não, tipo a excitante metrópole de tudo que é maravilhoso. - Sim, mas estou só trabalhando nesse restaurante idiota para juntar dinheiro para a faculdade - explico. Quanto mais explico minha "história oficial", mais parece verdade. Ás vezes, quando estou passeando por Austin, realmente esqueço que ainda moro na Merdalândia e estudo na Merdalândia High. Especialmente quando estou paquerando um garoto como SS. Espera ai meu Deus. Isso é paquerar? Acho que deve ser. Estou tendo uma epifania na arte de paquerar. Jesus Cristo, aleluia! A maldição acabou! Mas antes de SS e eu entrarmos em detalhes em nossa conversinha vamos-nos-conhecer-melhor, a voz de um cara vem do quintal. - Oliver! Traga sua bunda esquelética para cá agora mesmo! A guitarra do Eddie está no seu porta-malas! Oliver se vira novamente para mim. - Ei. O que estará fazendo em aproximadamente três minutos? pergunta. - Humm.... Sem planos - ofereço. - Legal. Te encontro aqui então. - Claro - digo. E assim, ele se vira e sai correndo da sala. Oliver! O nome dele é Oliver! Já estou apaixonada. A pior hora do mundo

Corro até o banheiro para fazer xixi, passar nas axilas um pouco de desodorante barato emprestado (nojento, mas estou desesperada, então não me julgue) e aplicar só uma gotinha de brilho não-estou-tentando-demais antes de encontrar meu namorado dos sonhos de volta no som. Apesar de não ter experiência com todo o ritual de acasalamento "prazer em te conhecer, quer um boquete?" que parece definir todos os romances de Bodeen High, meu coração está batendo alucinadamente rápido. Só de pensar em Oliver meu sutiã praticamente abre sozinho. Num esforço para evitar qualquer sinal de parecer vulgar, me olho no espelho, séria. - Pode dar uns amassos com ele, mas é só - digo a meu reflexo doidopor-garotos. - Quem é você, minha mãe? - devolve uma voz familiar, talvez bêbada, detrás da cortina do chuveiro. Me viro e abro a cortina para dar de cara com Pash nos braços de um garoto magrelo com cabelo moicano (é claro). - Babe Ruthless! - ela grita, abrindo seus braços. - Aí está!


Seu cabelo está uma bagunça, tem batom borrado numa bochecha, e o sutiã está pendurado no bolso detrás da calça. - Savage e eu estávamos te procurando por toda a parte - ela diz, acenando para o igualmente descabelado garoto, que tem uma mancha de batom idêntica na bochecha. - Mas agora estamos indo num mercado porque estamos com larica, e Savage quer carne. Savage? Seu nome é Savage? O garoto é tão magro que até eu ganharia dele numa briga. - Tem noção do quanto eu te amooooooooo? Você é a melhor amiga do mundo! - Pash grita, como se estivesse tentando conversar comigo a duas cidades de distância. Só que estou bem em sua frente enquanto meus tímpanos levam uma surra. - Está seriamente chapada, e de jeito nenhum vai dirigir - digo, tirando as chaves das mãos de Pash. - Eu não, você. Porque é minha melhor amiga e te amoooo e levo você pra lá e pra cá, então agora é a sua vez. Pash tropeça para fora da banheira e cai em meus braços. Ela mal consegue ficar de pé, e Savage é inútil no departamento me-ajuda-a-segurarminha-melhor-amiga-bêbada. É nessa hora que o rosto de Pash muda rapidamente, alternando entre várias tonalidades antes de parar num verde visto não tão saudável. Já sei o que vem depois. Rapidamente a viro para a privada, levanto a tampa, e tento não morrer de nojo enquanto a pobre garota põe as tripas para fora. O mesmo não pode ser dito de Savage. Ele ergue os braços se rendendo. - Vou nessa - diz enquanto passa por cima de Pash e vai embora. Pash recupera o fôlego e olha para cima. - Acho que quando vomita na frente de um cara, o relacionamento acabou - suspira. - Acho que quando o nome dele é Savage, nunca nem começou acrescento. Pash ri e começa a vomitar de novo. Tudo que quero é sair e ficar com Oliver, mas de alguma maneira a idéia de largar o cabelo da minha melhor amiga enquanto ela vomita só pra ficar com um garoto (apesar de ser incrivelmente sexy) me parece o cúmulo da maldade. Sou má apenas num nível superficial - não jogo tão baixo. Cruzo os dedos das mãos e dos pés, torcendo para que Oliver espere, mas depois de cuidar de Pash e voltar para a festa, não há nem sinal dele. E acredite, faço uma busca completa, digna do FBI nos casos de pessoas desaparecidas, por toda a casa, procurando nos cantos mais obscuros dos jardins da frente e dos fundos. No entanto, nada de Oliver. Mesmo assim, consigo reunir algumas informações sobre meu evasivo alvo: Oliver tem 19 anos, fama de superfofo entre as garotas Derby, e inclusive é baixista de uma banda local em ascensão chamada Stats, que Emma descreve como "a melhor banda do mundo, se gosta de toda aquela coisa emo, garoto magrela, roqueiro". Gosto, admito. Quando Pash e eu finalmente vamos dormir às 5h33 no chão na sala de Rocktavia, com apenas um cobertor e um travesseiro mínimo entre nós, ela não para de perguntar se a odeio. - Me odeia? Me odeia por ter ficado daquele jeito?


- Não - digo, zombando. - Te odeio por ficar daquele jeito sem dividir comigo. - Sou um lixo de melhor amiga - ela reclama. - Verdade, mas provavelmente me salvou de um garoto lindo que partiria meu coração de seis maneiras diferentes até domingo. - Parece gostoso - suspira, quase adormecendo. - Ridiculamente - suspiro, antes de finalmente dormir também. O fedor do rosa

Quando o Pash-móvel finalmente me deixa em casa na manhã ou tarde seguinte, ou qualquer que seja a hora do dia, estou mais do que exausta. O sol arde em meus olhos cansados como cloro de piscina, e é preciso cada grama de energia minha para andar até a porta da frente. Preferia engatinhar. Só quero tomar um banho, cair na cama e dormir para sempre - não tanto pela necessidade de sono, mas pelos sonhos com Oliver que sei que me aguardam. (Estaria mentindo se dissesse que não estou ansiosa para isso.) Dou exatamente um passo dentro do quarto antes de perceber que forças maiores (literalmente) andaram trabalhando contra meus grandes planos para uma preguiçosa tarde de domingo. Tem uma roupa rosa pendurada na porta do meu armário. Repito: tem uma roupa rosa pendurada na porta do meu armário. Uma jaquetinha rosa com uma sainha rosa. complementada de um trio de botões de strass cor-de-rosa. É o seguinte: Não. Uso. Rosa. Quase ao mesmo tempo em que meu estômago começa a se revirar em resposta a essa invasão de cor em meu espaça privado, vejo Brooke parada na porta usando exatamente a mesma roupa. - Aí está! - ela canta. - Estava quase telefonando para mãe de Pash para saber por que estava demorando tanto. Não queremos nos atrasar. - Para? - pergunto, sem a mínima idéia do que significa essa conspiração roupas-rosa. - Devo realmente acreditar que se esqueceu do brunch mães e filhas Miss Bluebonnet? - Brooke diz, uma de suas mãos em seu quadril rosa. Merda! O brunch dos infernos mães e filhas que pareceu tão medonho que na hora tirei da cabeça? Aquilo é hoje? Tipo, agora? No momento exato em que preciso de um pouco de sono e tempo sozinha com meus pensamentos em Oliver? Querido Deus, obrigada por me odiar. Você é uma droga. Com amor, Bliss. - Não esqueci - consigo murmurar. - Bom. Você não tinha nem um trapo para usar, então pensei em fazer uma surpresa - Brooke diz, entregando a roupa rosa para mim. - De nada - diz, antes de sair de meu quarto. Às vezes sinto como se fosse apenas uma atriz coadjuvante no filme estrelado por Brooke. O roteiro foi escrito bem antes de eu aparecer, e o que quer que eu faça que desvie da história é simplesmente ignorado. Claro, fui erroneamente escolhida para o papel da mais velha de dois prodígios dos concursos de beleza, mas Brooke não liga. O show tem que continuar. E é essa filosofia que me faz estar parada na sala meia hora mais tarde, usando a temida roupa rosa. (Tenho quase certeza que, daqui a vinte anos, quanto estiver no consultório do meu psicólogo tendo um colapso nervoso total,


todos os meus problemas convergirão para este exato momento. Este momento ainda vai me custar muito dinheiro.) Ah, e para todos vocês por aí que amam rosa, não levem para o lado pessoal o fato de eu odiar a cor favorita de vocês. Tenho meus motivos. Por exemplo, tem garotas que são tão fodas que, usando rosa, parecem ainda mais maneiras (principalmente quando em conjunto com meias listradas em preto e branco ou uma coleira de caveirinha). Nessas mulheres fatais e poderosas, rosa vira uma ousadia que diz "Ei, mundo, mesmo na cor mais feminina de todas, ainda sou maneira pra cacete, então não se metam comigo." Mas eu, Bliss Cavendar, não sou uma dessas garotas. Sou tão não legal que, mesmo coberta nas mais agressivas tatuagens, só um toque de rosa ainda me faria parecer uma líder de torcida saltitante. Preciso de todo o preto possível. Daí o grito silencioso que sinto enquanto entro na sala vestida como uma Barbie Executiva (não que Barbie tenha realmente uma profissão). Brooke arfa em triunfo materno. - Ah, amorzinho, parece mais doce que um pêssego Fredericksburg! Não parece, Earl? Ela se vira para Earl, que no momento está em seu próprio filme. Nessa cena emocionante da vida de Earl, ele plantou sua bunda e atenção ininterrupta na tela de TV enquanto o Dallas Cowboys enfrenta os Denver Colts. Não sei muito sobre futebol americano mas quando vejo um jogador derrubando seu oponente com um sinistro bloqueio pelo ar, não consigo evitar sentir imediato e recém- descoberto respeito. Qualquer garota derby que valha suas rodas mataria para fazer um bloqueio desses. - Que bloqueio incrível! - grito. Espera, disse isso alto? Na frente de meus pais? Volta, apaga. Uma das mãos sobe rapidamente para cobrir a boca. Tarde demais. Earl para, desvia os olhos leeeentamente da TV, e me encara. - Desde quando você gosta de futebol americano? - diz com suspeita, e talvez um toque de esperança. Se Earl de repente descobrisse outro fã de futebol na casa, seria como acertar na loteria que ele nunca jogou. Não me leve a mal. Sou super a favor que Earl ganhe a loteria, mas não à minha custa. Não quero deixá-lo com esperanças, então rapidamente encubro. - Ahn, bem, não gosto de futebol - digo. - Só respeito toda a ação completo, gaguejando. - Temos que correr ou vamos nos atrasar - Brooke diz antes da conversa ficar ainda mais estranha. E lá vamos nós em nossas roupas mãe e filha combinando. Para de rir não tem graça. Podia ser com você. O brunch dos infernos

Realmente espero que independente de quem quer que você seja e o que quer que tenha feito em sua vida (torturar o gato da família aos 5 anos etc.), seu carma nunca inclua sair vestida em público igual a sua mãe. Ninguém merece. Sou forçada a "socializar" (ou seja, observar) e tentar não vomitar enquanto uma dúzia de duplas de mãe / filha se exibe no Salão Cisne do Country Club de Bodeen, que é completamente brega, mas com pretensões de grandeza.


Corbi e sua mãe, Val, andam pela sala como autonomeada realeza, e todos parecem fazer ooh e ahh com todos os seus restos. É tão nojento. Até minha tentativa de ficar disfarçada perto da tigela de ponche é frustrada quando a dupla dinâmica vem, cheia de sorrisos e falsos desejos de boa sorte. Enquanto Val e Brooke trocam conversas educadas (fingindo que não querem matar uma à outra), Corbi só me olha murmurando "perdedora" de novo e de novo. Menina de classe, essa Corbi. Mais tarde, andamos por um corredor onde os organizadores do Miss Bluebonnet arranjaram uma "galeria de garotas". Uma maneira chique de dizer que pegaram fotos de todas as vencedoras passadas, mandaram ampliar, e colocaram-nas em molduras para o mundo admirar. E então vejo a foto de minha mãe. Ali, em preto e branco, está o momento da coroação de Brooke ampliado em um pôster. E quer saber? Apesar das roupas cafonas anos 1980 e penteados armados até o teto, ela era deslumbrante. Acho que ainda é, em sua própria maneira, quando paro para pensar (apenas normalmente não paro porque seu comportamento forçado eclipsa sua beleza). Estou hipnotizada. - Mãe - digo embasbacada -, olhe só para você. - Quanto mais alto o cabelo, mais perto de Deus, costumávamos dizer ela suspira ligeiramente envergonhada. - Que seja. Você é uma gata! - Não. Isso foi há muito tempo. Agora é a sua vez, e de Shania. OK, isso não é estranho? Estou em público, firme e forte numa roupa dos infernos mãe e filha, que, se por um lado, me faz odiá-la mais do que nunca, por outro lado, me derruba subitamente por essa tristeza que sinto por ela. Tipo, de alguma maneira é cristalino como água que ela vive através de suas filhas porque não se sente tão bem quanto a si mesma. E me pergunto por que é tão óbvio para mim, que tenho 16 anos, e ela não se dá conta aos 40. Claro, toda a situação é engraçada, esquisita e irritante, algo para ferozmente protestar contra, mas lá no fundo, sei que um dia vou deixar Bodeen. Vou entrar na obscuridade de concursos com essa cidade de lixo cada vez mais longe em meu espelho retrovisor. Estarei livre. Mas Brooke ainda vai estar aqui, ainda perseguindo os melhores dias de sua vida, os que aconteceram quando tinha 16 anos. Sabe quando você sabe de alguma coisa, como se ela sempre tivesse existido, mas não muito nítida? E então um dia você realmente sabe - estava escuro, e agora tem um grande e gordo holofote em cima? É assim com minha mãe. É tão triste que quase caio aos prantos ali mesmo na minha roupa corde-rosa. Pelo resto do almoço, domo minha irritação interior e mantenho os gestos "te odeio" o mais reprimidos possível: apenas um suspiro irritado, meio revirar de olhos e dois grunhidos "não te escutei". E, como bônus (por um tempo limitado apenas), nem toco no meu assunto familiar favorito: o fato de que ainda acredito ser adotada. Um desempenho estrelar. Atordoada na escola

Num esforço para me livrar do resíduo de roupa rosa e recuperar minha


identidade pessoal, uso minha camiseta de brechó favorita para a escola no dia seguinte: uma estilo beisebol do Stryper, de 1984. Quem é Stryper?, você pergunta. Apenas a mais perfeita e horrível banda de heavy-metal cristão de todos os tempos dos anos 1980. Não que eu soubesse disso quando comprei minha camiseta. Simplesmente adorei a imagem de cinco caras tentando parecer fortes com seus grandes cabelos de permanente, quilos de maquiagem e calças de lycra listradas de preto e amarelo. Em resumo, um desastre fashion de proporções tão grandes que tive que gastar quatro dólares na camisa. Fico tão feliz quando uso. Falando sério. Em um dia de tédio, depressão, ou ambos, procure Stryper no Google e faça a festa. Garantido. Além disso, adoro usar uma camiseta velha de verdade que achei por trocados do que uma "camiseta vintage" de quarenta dólares vendida na Abercrombie & Fitch. Quer dizer, fala sério. Comprado no shopping, não é vintage. E não estou sendo esnobe. Isso é fato. Usando minha camiseta do Stryper fico de bom humor, o que preciso hoje, pois estou me cansando rapidamente da encheção de saco de Corbi. Toda vez que ela passa por Pash e eu no corredor, tem que dar aquela olhada, e então dá aqueles risinhos com as amigas, do tipo "Estou tão obviamente falando de você, e não pode fazer nada a respeito." É tão clichê. Ensinam isso no Manual de Garotas Populares? É uma palestra secreta e exclusiva do treinamento de líderes de torcida? Sou totalmente a favor de ser superior, mas tal comportamento de megera só pode ser ignorado até certo ponto. Tenho o direito de sofrer durante minha educação de meia tigela sem o assédio adicional da Srta. Suéter Rosa Insosso constantemente me enchendo só porque existo. Deixar esse tipo de babaquice reinar estimula mais ainda. Então, quando Pash e eu estamos andando pelo corredor e Corbi nos dá seu olhar de sempre, não tenho escolha a não ser reagir. Não é como se tivesse sido planejado, coreografado, ou até mesmo ensaiado, mas assim que passamos meu quadril ganha vida própria e - BAM! - derrubo Corbi num estilo derby por uma fileira de armários. O corredor inteiro fica quieto enquanto Corbi tenta recuperar o fôlego e cai perplexa e em silêncio no chão. - Ooops - digo, com sarcasmo máximo. - Sou tão desastrada. - Argh! Não pode fazer isso comigo! - Corbi finalmente se esgoela. - Ahn. Acho que ela já fez - Pash diz, vindo em minha defesa. Continuamos alegremente pelo corredor, saímos pelas portas da escola e saboreamos um pouco da liberdade da tarde que Bodeen tem a oferecer. Valeu, camiseta do Stryper. Não teria conseguido sem você. Às vezes Deus não me odeia

Quando estamos no trabalho, Pash conta a Homem-Pássaro tudo sobre o Episódio Empurrão-de-Quadril-na-Corbi. Pash faz uma imitação engraçadíssima da queda em câmera lenta, completa com expressões faciais exageradas de Corbi enquanto levava o tranco. Ela passou por toda a gama de emoções, de megera-superior, a megera-chocada a megera-envergonhada. Homem-Pássaro está tão entretido com a performance de Pash, que sinto seu termômetro de amor platônico apontando em sua direção. Ótimo, assim ele me dá um tempo.


E é nessa hora que olho pela janela e vejo um carro estacionado. É verde-limão, dos anos 1970, com uma listra preta de corrida em volta, e - oh, quem liga pro tipo de carro. O que importa é que Oliver (!) está encostado nele. Oliver! O tal Señor Sedutor, o roqueiro gostoso que estava totalmente meio que dando em cima de mim antes da missão romântica ser abortada pela minha melhor amiga vomitona. Meu queixo cai. Praticamente sinto-o batendo no chão. Tenho vontade de fazer xixi e vomitar, tudo ao mesmo tempo. E ainda assim, nunca estive tão feliz. Oliver me dá um aceno - ai meu Deus, o melhor aceno que já vi em minha vida - que de alguma maneira diz: "Ei, estou aqui, mas meio que me sentindo um idiota apesar de saber que você sabe que não sou um idiota." Como é possível se apaixonar por alguém pela maneira com que ele acena? Mas tenho quase certeza de que me apaixonei. Apesar de todas as ideias loucas que correm pela minha cabeça, como suco num daqueles canudos enroladinhos, fico quieta. Pash estala os dedos na frente da minha cara. - Seu turno acabou. Vou cobrir você. Vai - diz, me empurrando para a porta. - E me liga mais tarde. Ainda escuto Homem-Pássaro protestar enquanto passo pela porta. - E daí? Aquele cara aparece aqui com seu carrinho moderno, e simplesmente a deixamos ir com ele? - Não preocupe sua cabecinha bonita com isso- Pash diz. - Mas e se ele for perigoso? - Homem-Pássaro protesta. - Dã. Esse é o objetivo - Pash diz. Amo essa garota. Saio do Oink Joint e vou em direção a Oliver. Durante a eternidade perfeita que demoro em cruzar o estacionamento, ele fica parado me olhando. Me concentro tanto em cruzar o asfalto sem tropeçar, cair, deixar a bolsa escorregar, ou qualquer demonstração pública de humilhação mata-romance, que me esqueço de pensar em algo para dizer quando estamos finalmente cara a cara; e subitamente estamos. Não que eu consiga olhar em seu rosto. Meu coração está batendo rápido demais. Estou nervosa demais para olhar para ele diretamente, então meus olhos passeiam pela sua camiseta. Tem um buraco na costura perto de seu ombro, revelando um pedaço de pele pálida e uma única sarda. Subitamente sinto vontade de beijar, morder e beliscar aquele pedaço de pele que me tenta com sua gostosura. Quero me mudar, colonizar, e viver o resto de minha vida naquela adorável sarda. Rapidamente olho para seus sapatos antes de fazer uma cena. Ou pelo menos tento. Mas esse Oliver é cheio dos truques. Ele consegue prender meu olhar e meio que ri, tipo, "Ei, não é uma coincidência engraçada exceto que não é porque de jeito nenhum alguém com a cabeça no lugar acabaria sem querer em Bodeen, mas vamos apenas fingir que é." Começamos a conversar. Bem, mais ou menos. Eu sei, escrito parece a conversa mais imbecil na história das conversas, mas garanto que o diálogo mental entre nós é profundo. OLIVER: Então... BLISS: Então... (põe uma mecha de cabelo atrás da orelha igual uma boba)


OLIVER: Hum... (sorri sonhador) BLISS: É... OLIVER: Eu, é... (enfia ambas as mãos nos bolsos) BLISS: Está, tipo, me seguindo? OLIVER: Não. Talvez, mais ou menos. Importa-se? BLISS: Não. Eu meio que sempre quis ter meu próprio perseguidor. Gargalhamos como você gargalha da sua piada favorita, quando tudo que alguém tem que fazer é pronunciar o final e você dispara a rir. É esquisito, mas também confortável. Com o tempo, nosso papo segue uma linha mais direta de perguntas. Ele olha para minha blusa. - Está realmente usando uma blusa do Stryper? - diz, com empolgação e impressionado. - Espera - digo, com suspeita. - Nem finja que sabe quem é Stryper. Quer dizer, é claro que ele é gato e tudo, mas essa camiseta é uma piada interna entre eu & eu mesma. Oliver não pode simplesmente aparecer e pegar uma parte para si. Pode? Ele me encara bem no olho e diz, com inteligência desafiadora: - Stryper: anos 1980, banda de heavy-metal cristão. Suas letras eram ruins e claramente as escolhas de roupa sobreviveram apenas para irônica diversão. Mas, para seu governo, o guitarrista, Oz Fox, aquele cara mandava bem. Oliver me dá um sorriso travesso, abre a porta de seu carro e diz: - Entre, garota irônica. E bem ali sei que vou transar com ele. Quer dizer, não bem aqui e agora, no estacionamento do Oink Joint (me dê algum crédito). Mas um dia. Stampede

Já ouvi lendas urbanas desse tipo - onde uma garota pega carona de um cara delicioso em seu carro -, mas nunca aconteceu comigo (uhu, high five interno). Para marcar minha desvirginização garota-anda-com-garoto-em-seu-carro, estou tomando sérias notas mentais, catalogando, quietinha, tudo no carro: CDs espalhados no chão, um saco vazio de salgadinhos, uma explosão de paletas de guitarra e uma foto amarelada de Siegfried & Roy onde alguém escreveu "Oliver, queremos domá-lo como um tigre" enfiada no visor de passageiro. É bem divertido. Oliver põe o som nas alturas, e ouço um mix feito em casa que pula de Voxtrot para Be Your Own Pet, de Rolling Stones das antigas para The Kinks, e um bando de outras coisas tão antigas para o mundo MP3, que nunca tinha ouvido antes. As janelas estão abaixadas, e o vento embaraça meu cabelo numa bagunça pela qual sei que vou pagar mais tarde, mas no momento não posso perder tempo com isso. Estou em seu carro. Vai valer cada uma das três horas que vão demorar até desembaraçar esse ninho de rato. Um CD chama minha atenção como um ovo dourado numa caça ao tesouro: The Stats.


- Posso pegar esse emprestado? - pergunto, tentando parecer casual. De alguma maneira as palavras saem de minha boca com ousadia. Não apenas quero desesperadamente escutar como é a banda dele, mas estou bem ciente de que se pegar emprestado um CD, significa que um dia vou ter de devolver, o que significa que precisaremos nos ver de novo. Posso não saber muito sobre essa coisa de relacionamentos, mas sei que se ver de novo é uma parte fundamental. - Tudo bem. Mas se eu encontrar numa cesta de usados na Waterloo você me paga. - Ele balança um punho furioso como um velho rabugento, e rio muito mais alto do que provavelmente deveria. Olho para seu casaco enrolado perto do pedal da embreagem. É cinzaescuro, com exceção das letras cor de laranja bordadas na frente como algum tipo de código: 3.585.000. - Então, qual é a dos números? - pergunto. Oliver parece um pouco envergonhado. - Ah. É meu recorde nesse jogo de pinball que eu e meus amigos da banda sempre jogamos. É basicamente o jogo mais estúpido já inventado. Somos totalmente obcecados. - Parece divertido. Quer dizer, adoro essas esquisitices. - Sério? Quer ver qual é? Concordo, e Oliver acelera. Entramos em Austin e Oliver dirige para um bairro chamado Hyde Park, onde todas as casas são velhas como tataravós e, francamente, incríveis. Nada como nos subúrbios chatos de Bodeen. Paramos no estacionamento mínimo da farmácia Hyde Park. É uma relíquia total, tipo algo de uma maratona de seriados antigos a que seu pai a faz assistir quando está com o controle remoto na mão. Tem uma máquina de refrigerante nos fundos, com balcão azul-turquesa, e ao lado está o objeto de afeto do entretenimento de Oliver: uma máquina de pinball chamara Stampede. Oliver não estava brincando. Realmente é o jogo de pinball mais ridículo de todos os tempos. Stampede tem um tema faroeste cafona com ilustrações bobas de cowboys, touros e cavalos luminosos que piscam. Depois de várias rodadas, ainda não tenho ideia do que está acontecendo, exceto que adoro a sensação de Oliver casualmente se encostando em mim enquanto guia minhas mãos pelos botões para movimentar os flippers nas horas certas. Acerto um com perfeição, e a bolinha cai no alvo máximo do jogo. Milhões de luzes começam a piscar, a máquina chacoalha enquanto o estrondo de mil cavalos desencadeia uma voz idiota de cowboy que grita: - Yeeeeeeeehaaaaaaaaw! Tempestade chegando! Stampede! O ataque de ruídos é tão impressionante que quero me esconder embaixo de uma mesa ao lado. - Oliver! Essa é a coisa mais horrível que já escutei - grito. - Eu sei - diz, com uma risada perversa. - Quero usar numa de nossas músicas. De alguma maneira conseguimos desperdiçar duas horas jogando o Stampede idiota de novo e de novo, prova de como estou disposta a sofrer só para sentir suas mãos nas minhas. Além disso, parece que apenas dois segundos se passaram quando me dou conta de que tenho dez minutos para chegar ao treino de Roller Derby.


Ring my bell

Quando Oliver me deixa na Casa de Bonecas, estou tão nervosa que pulo fora de seu carro como um ladrão saindo da cena do crime. Então me ocorre que nem disse tchau, e corro de volta à janela de Oliver e coloco a cabeça para dentro. - Então, ahn, obrigada pela carona - digo. - Sem problemas - responde, me olhando. E não olhando para mim, estou dizendo me olhando, como se enxergasse até minha alma. Sinto meus nervos a toda e, antes de ter tempo de sair correndo de novo, seus lindos lábios estão nos meus. OK, não é como se eu fosse a abelha-rainha na arte de beijar, mas quando alguém gato como Oliver me dá um beijo desses, aprendo rápido. Faço aquele beijo durar - longo, demorado, e mais doce que mel. Isto é, até sentir um forte tapa na bunda e ouvir Emma gritar: - Arrumem um quarto! Ela ri com algumas de minhas colegas de time enquanto entram para o treino. Oops. Fiquei tão entretida no meu beijo com Oliver que esqueci totalmente da primitiva demonstração pública de afeto que estávamos cometendo. Ah, enfim. Esse garoto vale a pena. Vou para o treino, meio drogada pelo meu primeiro beijo de verdade na vida. (OK, teve aquela triste tentativa de dar uns amassos com Jeremy, também conhecido como Germy, na excursão para o Sea World no oitavo ano, mas acredite, quanto menos falar sobre isso melhor.) Enfim, estou tão aérea e nervosa, que minha primeira tentativa pós-beijo de me preparar para o treino acaba com minha joelheira direita em meu cotovelo esquerdo e minha cotoveleira direita no joelho esquerdo. Sou uma ameaça à sociedade. As garotas estão acabando comigo, gargalhando enquanto fico cada vez mais vermelha. Acho que deve ser bem engraçado quando não se está no meu lugar. Não posso me dar esse luxo. Malice entra com pressa e dramaticamente larga sua bolsa ao lado da minha. - Ruthless! - grita, fazendo uma cena. - O que foi que falei sobre namorar caras de banda? - O quê? - digo, genuinamente perplexa. Perdi alguma coisa? - Oliver Hastings - Malice diz, como se tivesse acabado de descobrir o segredo de algum grande mistério não desvendado. - Ele tem uma banda! - Malice. Estamos em Austin. Todo mundo tem uma banda - Emma diz casualmente. - Sim, mas os Stats são, tipo, uma banda de verdade, uma banda que não é um lixo - Malice rebate. - Tá tudo bem - digo. - Para ele - Malice avisa -, não para você. Não fazia ideia de que era tão protetora. - Oliver não é nem um pouco assim. Ele é meio nerd, na verdade. É superfofo - digo. - Oh, Senhor, lá vamos nós - Malice diz, olhando todas as outras. - Sabe, nem todos os caras de banda são canalhas completos, ó Amarga Total - Crystal diz, revirando os olhos para Malice.


- Mesmo? - Malice diz, examinando as 24 garotas amarrando seus patins. - Todas aqui que já namoraram um cara de banda, levantem a mão. Todas as mãos se levantam. - OK. E quantos desses garotos não eram canalhas? Todas as mãos com exceção da de Letha se abaixam. - Letha, namorar um trombonista da banda da faculdade não conta Malice solta enquanto Letha abaixa o braço. Malice cruza os braços: - Caso encerrado, meritíssimo. Crystal sorri: - Tudo bem, Malice. Está me dizendo que se Jack White entrasse aqui agora e ficasse todo, "Malice, gostaria que tocasse na minha guitarra", você falaria, tipo, "Não, obrigada, você tem uma banda"? Todas nós olhamos para Malice, que começa a desmoronar com a ideia de um encontro imaginário com o Sr. White Stripes em pessoa, sua paixão platônica de todas as paixões platônicas. - OK, certo - Malice admite finalmente. - Eu tocaria na sua guitarra, mas não iria ao Kinko's fazer filipetas para o show de sua banda na sexta. - Caso encerrado, meritíssimo - Crystal diz enquanto todo mundo cai na gargalhada. Até Malice dá uma risada se rendendo. Ela põe o braço sobre meus ombros e diz: - Apenas se cuida, tá? - Tá. - Assinto. Não sei por que está tão preocupada. De todas as histórias de terror que já ouvi sobre namorar caras de banda, prometo, nenhuma se aplica a Oliver. Ele é totalmente diferente. * Quer dizer, qual é, se Oliver fosse o Babaca-Mor, se daria ao trabalho de ir até Bodeen me buscar? Iria me buscar depois do treino e me levar de volta até Bodeen, tudo de novo? Duvido. Apesar disso, ao entrar de volta em Chaticelândia, EUA, de repente me ocorre que preferia que me deixasse no Oink Joint do que em minha casa. A apresentação "Oliver, esses são meus velhos. Velhos, esse é meu Oliver" vai me deixar vulnerável a toda uma série de perguntas que não estou nem um pouco pronta para responder. Não esta noite. Está tudo bom demais. Mas Oliver, o cavalheiro, insiste em me deixar em casa considerando que já está escuro, apesar de meus argumentos de que "Bodeen não tem registros de crime. Crimes contra a moda, sim. Mas crimes de verdade, não". - Que seja - diz Oliver. - Todos sabem que os assassinatos mais estranhos sempre acontecem em cidades pequenas. Vou tomar conta de você. Então, quando o carro de Oliver entra em minha rua, faço-o parar na entrada dos Gundersons, quatro casas depois da minha. Os Gundersons são um casal de idosos que sempre apagam as luzes às 19h - nunca saberão que estivemos aqui. Oliver desliga a chave e me olha casualmente: - OK então, a gente se vê - ele diz zombeteiro. - É, até mais - digo, sem me mexer. - Cai fora - diz, desligando o carro. - Já fui - digo, arrancando as chaves de suas mãos.


Paramos, olhamos um para o outro e, então, como se numa deixa silenciosa, começamos uns amassos. Não amassos tipo sétimo ano, mas, tipo, de verdade. Oliver escorrega suas mãos por meus ombros, indo devagaaaar para meus braços, e quando chega aos pulsos, me empurra para trás no banco. Ele me prende ali, me encara, então calmamente deixa um rastro de beijos do meu colo até a orelha. É elétrico. Meus dedos do pé se enroscam em meus chinelos e, mesmo que não tenha nada muito ousado acontecendo, não é uma cena recomendada para crianças. É bem adulta, pelo menos em minha cabeça. Minutos depois, quando o carro de Oliver sai da entrada e aceno aérea na porta dos Gundersons (fingindo que é a minha), um pensamento pisca em meu cérebro como um néon vermelho: Quero. Ele. Música, maestro

Como um ladrão de filmes antigos, cuidadosamente abro a porta da frente e vou na ponta dos pés até meu quarto, tentando entrar a salvo antes que alguém me veja. Ainda estou ardendo do beijo quente de Oliver, e sei que meus talentos dramáticos não são suficientemente bons para esconder as chamas evidentes, considerando que deveria estar voltando do meu "grupo de estudos do vestibular" e tudo. Escuto os sons distantes de Brooke, sem dúvida com Shania a seu lado, vendo America's Next Top Model nos fundos da casa. Entro então em meu quarto despercebida. Atravesso com dificuldade a sempre presente pilha de roupas no chão até o som. Cuidadosamente tiro o CD dos Stats da minha bolsa como se fosse uma pedra preciosa roubada de alguma terra distante, coloco no som e aumento o volume, me certificando de que os fones de ouvido estão encaixados, é claro. Por um momento, durante aquele soluço de silêncio antes da música começar, entro em pânico. E se a banda de Oliver for um lixo total? Meus sentimentos crescentes por ele estão fortemente baseados no fato de que vou gostar da sua banda. E se não gostar? E se eles tocarem como alguma monstruosidade Disneyficada criada por cientistas num laboratório para garotas de shopping insípidas que não reconheceriam música de verdade nem se caísse em cima de suas cabeças? Música é basicamente minha religião. De jeito nenhum conseguiria idolatrar algo que me faz ter ânsias. De. Jeito. Nenhum. Mas ainda assim, Oliver beija tão bem. OK, tudo bem. Não vou me apaixonar. Vou só dar uns amassos. A música começa e, graças a Deus, não é uma atrocidade. Os Stats são bastante bons, inclusive. Honestamente, detesto descrever bandas, porque sempre sinto que estou falando a mesma coisa de novo e de novo, e nunca faço a música parecer tão boa quanto é na verdade. Para quê, afinal? Música é uma linguagem em si. Mas, só para você não achar que estou escondendo o jogo, os Stats são rock de garagem clássico e cru, com riffs de guitarra que pegam e um toque de


melodia suave aqui e ali. Nada mulherzinha, mas também não bruto demais para nosso gosto. São 84 por cento ruídos altos e 16 por cento nerdices doces, o que está bom o suficiente para meu gosto. É a sexta faixa que realmente traz à tona meu amor pela música, uma música de matar chamada "Será que mortos ainda podemos ficar juntos?" A letra descreve esse cara totalmente ferrado que odeia o mundo e quer se matar. Então ele conhece essa garota igualmente ferrada e fazem planos de suicídio juntos, mas enquanto estão odiando o mundo e planejando seus funerais, ele acaba se apaixonando por ela. Além disso, tem alguns momentos incríveis de Oliver no baixo. É completamente sarcástica e alta e hilariante, mas então esse verso agridoce é cantado no final: Quando me senti mais vivo, foi planejando minha morte com você. Me dá frio na espinha e imediatamente a concedo a honra de ser minha nova música favorita. Fico acordada ouvindo-a cem vezes seguidas como demonstração de boa-fé. Estudo a discreta capa feita em casa do CD dos Stats - nada de livrinho cheio de frescuras ou agradecimentos, são realmente uma banda iniciante -, exibindo uma polaroid granulada de Oliver e seus três companheiros de banda sentados num sofá de vovó na traseira de uma caminhonete. Brilhante. Eu viro e leio os créditos atrás. Alguns nomes são mencionados, mas meus olhos só veem um: Oliver Hastings: Baixo. Oliver Hastings: Baixo, Oliver Hastings: Baixo, Oliver Hastings: Baixo, Oliver Hastings: Baixo. Pergunta: Poderia a escola ser mais chata? Resposta: Não.

Então, Pash e eu estamos sentadas na aula do Sr. Smiley enquanto ele fala sem parar sobre reservas e filosofias econômicas e, quem estou tentando enganar, estou praticamente dormindo. Cabeça na mesa, a um triz de ter uma pequena poça de baba perto da boca. Isso é o que acontece quando alguém se encontra além de exausta. Sem ronco, apenas baba, mas geralmente em meu travesseiro na segurança e conforto de minha própria casa. Não em público. Enquanto Sr. Smiley fala sobre nosso projeto de seis semanas e como devemos nos dar bem com nossos colegas de projeto e saber que "antes tarde do que nunca" (linguagem do Sr. Smiley para "comecem já"), Pash suspira para mim: - Está falando de você, preguiçosa. - Sabe que sou uma procrastinadora - digo, nem levantando a cabeça da mesa. - Mas vou fazer. Podia passar sem o olhar de desaprovação que sinto Pash lançar para mim enquanto fecho os olhos. Quem ela pensa que é? Da última vez que chequei, não era a única tirando as melhores notas. Além disso, preciso muito que ela escute os Stats agora mesmo. Seria injusto guardar a banda de Oliver em segredo. - Escuta - digo, passando disfarçadamente a ela um dos meus fones de iPod. - Não é a melhor música do mundo?


Antes de Pash poder absorver a música adequadamente, um ajudante do escritório entra e entrega ao Sr. Smiley um bilhete oficial. Ele lê o bilhete e então balança o discreto papel amarelo em minha direção. - Girassol, você acaba de arrumar um encontro com o destino - Cowboy Yoda diz antes de entregar o papel e me despachar. Vozzzzê pode zzzzzzer tudo o que quizzzzer

Entro no escritório principal, mostro meu bilhete amarelo, e rapidamente sou encaminhada como convidada VIP até a sala da Sra. Meyers. A Sra. Meyers é a conselheira da escola, que nem guia nem aconselha. Não que não tente. A Sra. Meyers gosta realmente de slogans. Seu preferido é "Vozzzzê pode zzer tudo o que quizzzzer" - uma afirmação que ela gosta de frisar apontando para uma bijuteria de abelhinha que sempre usa. Par example: estou andando inocentemente pelo hall, tentando não ser notada, quando a Sra. Meyers me põe na mira. - Bom dia, Bliss. Como está? - diz. - Estou bem, Sra. Meyers - respondo. - Bom. Não esqueça, Bliss. Vozzê pode zzer - aponta para o anel de abelhinha - tudo que quizzer zzer - indica o brinco de abelhinha. É como um truque que ela desenvolveu numa vida passada como orientadora emocional num pobre show para crianças de 6 anos, só que a parada não deu certo e, graças ao milagre de alguns cursos sabiamente escolhidos na faculdade da comunidade, a Sra. Meyers agora aplica sua arte em colegiais. E, naturalmente, ela trouxe sua sabedoria abelhuda consigo. Sorte nossa. Não faltam enfeites de abelha para a mulher. Dê um exemplo e a Sra. Meyers tem - anéis de abelha, broches de abelha, brincos de abelha, colares de abelha; e às vezes usa tudo de uma vez. Hoje Sra. Meyers está bem contida, apenas com um único e brilhante broche de abelha preso em seu ombro, as asas de strass bem abertas, como se a abelha tivesse acabado de voar janela adentro e pousado ali. É bem legal em se tratando de ter uma identidade fashion. Provavelmente chamaria de genial se a Sra. Meyers não fosse tão irritante. Ela fala beeeeeeeeeeeeeem devagar, enunciando tudo demais. Além disso, é o tipo de conselheira que adora pendurar pôsteres de motivação em toda sua sala. Sabe como é, o tipo de propaganda hiperpositiva, para cima, feita para manter os adolescentes longe das drogas e gravidez indesejada. Mas, honestamente, os pôsteres são tão ridículos que fico tentada a engravidar, começar a injetar heroína e me juntar a uma gangue, só de protesto. De qualquer maneira, a Sra. Meyers está sempre tentando fazer com que "aprendamos algo" sobre nós mesmos em sua sala. Apesar de sua média de sucesso ser igual a zero nesse quesito até agora, devo confessar que realmente aprendi algo sobre mim mesma hoje. Aprendi que nada aciona tanto minhas ânsias de vômito quanto entrar em seu escritório e ver meus pais sentados lá. Ah, sim. Abro a porta e ali estão: Brooke e Earl Cavendar, sentados lado a lado. Mas que...? Quem os chamou? Agora, não sei por que fui chamada à sala da Sra. Meyers, mas garanto a você, o que quer que seja, não precisamos


envolver pais no assunto. Mãe, Pai, apenas voltem com tranquilidade até o carro e esqueçam-se que vieram aqui um dia. A Sra. Meyers e eu podemos resolver isso sozinhas. Quem dera. Já posso ver que minha mãe está com o alerta máximo de muita maquiagem, nunca um bom sinal. Tudo bem, Brooke tão repetidamente se entope de maquiagem Mary Kay que é difícil identificar quando o alerta máximo está ligado - para quem não está treinado. Mas eu sei. Quanto mais nervosa ou chateada, mais maquiagem usa. - Nunca vá à guerra sem sua armadura - ela gosta de dizer. A Sra. Meyers me olha e sorri. - Olá, Bli-iss. Eeentre e seeeente-se. Mas Brooke vai direto ao assunto, atirando flechas através de seus cílios Tammy Faye. - Bliss Cavendar, me diga que não empurrou Corbi Booth contra um armário ontem - diz. - Ah, isso - digo. Óbvio, devia ter imaginado que é o motivo para estar aqui. Antes de poder explicar, a Sra. Meyers cruza as mãos sobre a mesa e diz: - Corbi está com um hematoma enorme atrás da perna. - E ela tem de ser líder de torcida hoje à noite! - minha mãe acrescenta, em pânico, como se a simples ideia de Corbi Booth ter um hematoma na perna fosse um sinal de apocalipse no mundo de líderes de torcida, como se a ordem mundial dos pompons fosse perseguir Brooke por ter procriado a criança que começou tudo. Dane-se. - Então - digo -, cancelem o jogo. - Bliss Cavendar! - Minha mãe diz, quase pulando da cadeira. E então começo a ficar um pouco brava - não, muito brava. Minha mãe não está nem aí para mim ou para meu lado da história. Tudo que importa é Corbi. - Olha, sei que Corbi é a Pequena Miss Oba-Oba Perfeita pra vocês. Mas, para seu governo, ela é bem má. E não vou aturar mais. A Sra. Meyers inclina a cabeça e mantém sua voz irritantemente calma: - Tuuuuudo beeeem estar zangada, Bliss, mas o que me preocupa é como expressa sua raiva. Talvez seja a Babe Ruthless em mim, mas antes que consiga me conter, a frase "Acho que lidei muito bem com a minha raiva" sai de minha boca. O sempre calado Earl começa a prender o riso de um jeito que revela que, por baixo da fachada "pai e mãe unidos", ele talvez esteja do meu lado, afinal (Isso, Earl!). Mas Brooke imediatamente o cala com um olhar fulminante. No final, a Sra. Meyers não está equipada para lidar com as delicadas verdades sobre megeras-ameaçadoras de colegial e as quietinhas que inesperadamente desafiam seu poder. Então ela rapidamente termina a reunião. Prometo ser menos desastrada e a Sra. Meyers me lembra de "zzer tudo que puder zzer" antes de me mandar de volta para a aula. Roupa'n'Roll À luz da vergonha e humilhação que o caso Corbi trouxe à minha família inteira (tradução: Brooke e apenas Brooke), ou forçada a fazer alguma penitência


imediata para evitar que minha mãe surte completamente. E é por isso que estou nesse momento parada em pé no Clara's Sewing Stop, ajustando um vestido feito sob medida para o Miss Bluebonnet, em vez de andando por aí com Oliver. Isso que é tortura. Não me leve a mal, adoro a ideia de roupas feitas sob medida. Quer dizer, realmente adoraria estar em Paris, Milão, ou qualquer lugar remotamente parecido com uma das capitais mundiais da moda. Bodeen, Texas, no entanto, não chega nem perto da roda da alta-costura. Mas não diga isso a Clara. Quando se trata de noivas e formaturas, todo mundo que é alguém no município de Bastrop procura Clara para confeccionar sua roupa. E seus vestidos para concursos? Bem, meus amigos, estes são verdadeiras lendas. - Concursos são telas em branco para minha arte - Clara gosta de dizer. E agora mesmo estou usando o molde de musselina do que em seis semanas é a "garantia" de uma vaga no círculo dos vencedores. A saia é tão enorme que daria pra esconder um carro pequeno por baixo. Brooke está atrás de mim, espetando e puxando a musselina até vestir perfeitamente, enquanto Clara prende os alfinetes. - Ah, Clara, a silhueta está adorável- Brooke suspira, inclinando a cabeça enquanto me olha pelo espelho. Minha tática de sobrevivência nesse momento é tirar pequenas férias na minha cabeça, pensando em Oliver. E naquele beijo, aquele incrivelmente perfeito beijo no carro com suas mãos em meus pulsos. Não sai da minha cabeça - nem por um segundo - desde que aconteceu. Na aula, enquanto estou mordendo uma caneta, sinto o beijo. Andando na fila da lanchonete da escola, vejo o beijo. Experimentando esse vestido de miss, sinto o gosto do beijo. - Agora, se pudéssemos apenas apertar um pouco essa cintura - Brooke aperta tanto o corpete que sinto minhas costelas lutarem por suas vidas. - Mãe - digo, arfando para fora do meu sonho com Oliver -, não consigo respirar. - Claro que consegue. Agora, só mais uma coisinha - diz, ignorando meu pedido por oxigênio. Ela saca de repente um par de sutiãs com enchimento de silicone da bolsa e os enfia na frente do vestido tomara que caia. - Aarrgh! - digo, horrorizada. - Você está me molestando! - É por uma boa causa. Boa causa? De que diabos ela está falando, "boa causa"? Está planejando doar minha coroa de Miss Bluebonnet para as vítimas de desastres naturais? Agora, abençoados sejam seus corações, sei que aquela terrível tempestade destruiu suas vidas e tornou-os desabrigados e tudo, mas aqui está. Aqui está uma coroa de strass para ajudá-los a superar isso. Boa causa uma ova. Dou uma conferida no meu reflexo. A cintura está incrivelmente apertada e meus peitos de repente parecem infláveis - fui Barbieficada contra minha vontade. - Não - declaro. - Não vou usar peitos falsos. - Ah, coelhinha, não estou dizendo que seus peitinhos não são um amor. Eles são, na vida real. Mas isso não é a vida real. Isso é o concurso Miss Bluebonnet, e precisamos de algo a mais.


Está prestando atenção nisso? Minha mãe não apenas me apalpou em público, mas também se referiu a meus seios como "peitinhos". Adorável. Prepare-se, Shania, enquanto pula por aí brincando com sua varinha de condão. Um dia vai ser você aqui no meu lugar. Uma hora depois, quando o trem da alegria se dirige ao Wal-Mart para umas compras, encontramos Corbi e Val. Perfeito. Simplesmente perfeito. - Ora, ora, veja só quem é! - Val diz, dando a volta com sua cesta. Como é que as senhoritas estão? Val tem um jeito de dizer a mais doce das frases como estivesse sacando uma espada. - Ah, estamos ocupadas, ocupadas, ocupadas! Acabamos de voltar do Clara's fomos fazer a prova do vestido da Bliss - Brooke diz, tentando se gabar. A competitividade primitiva e latente, presente em todas as doces conversas de Brooke e Val, aumenta um ponto. - Ah. Ainda frequentam a Clara, isso é tão ... adorável. Acabamos de voltar de Houston. Para o vestido de Corbi. A mente de Brooke congela, algo está errado. Tenho certeza de que nunca lhe ocorreu ir para a cidade grande para isso - O quê? Vocês não vão pedir para Clara fazer o vestido de Corbi? - Ah, Brooke. Clara é ótima. Para Bodeen. Mas estamos pensando além de concursos de beleza. Modelo, filmes, música, TV. Quer dizer, um grande agente de talentos viu Corbi em Houston e disse que ela poderia facilmente ter seu próprio Laguna Beach. Ela é uma estrela em ascensão. - Puxa. Bem, isso parece excitante. - Claro que é - Val se gaba. - Bem, boas compras, meninas! - Boas compras! - Brooke sorri por trás de sua amargura. Quando Val e Corbi desaparecem pelo corredor de cereais, Brooke se vira para mim, os olhos pestanejando de preocupação competitiva. - Bliss! O que é Laguna Beach? - ela exige saber como uma préadolescente esganiçada à caça da mais nova e descolada marca de jeans antes que qualquer outra possa descobrir. É nisso que se tornou a minha vida? Contar à minha mãe sobre um programa fútil da MTV, com um monte de piranhas mimadas que roubam os namorados umas das outras? Por mais que eu preferisse não ser a referência de cultura pop de minha mãe, sei que se não der uma resposta rápido, ela não vai calar a boca sobre o assunto. Então, dou de ombros e digo com a máxima seriedade: - Laguna Beach é um reality show sobre um bando de adolescentes superinteressantes, profundos e inteligentes, e que fazem de tudo para tornarem o mundo um lugar melhor. - Bom. Se Corbi poderia estar num desses programas, você também poderia. É melhor nos apressarmos, Bliss - Brooke diz. Seu detector de sarcasmo está claramente com defeito hoje. O grande O

Parece que se passaram um milhão de anos até eu finalmente ver Oliver de novo. OK, foram só 48 horas, mas já estou viciada e desesperada por uma dose.


Estou na casa de Pash quando eu e ele começamos uma maratona de mensagens no Messenger antes de Pash me expulsar do seu PC em um ato de puro egoísmo. (Algo sobre ter de fazer dever de casa. Doideira.) Antes da interrupção pela garota inteligente, Oliver e eu fazíamos planos de nos encontrarmos amanhã. Ele vai me buscar no Oink Joint ao meio-dia para irmos para Austin passar o tempo. Não há uma maneira sutil de eu sair da escola às 11h sem levantar grandes suspeitas da administração (teria de ter autorização por escrito de minha mãe). Então resolvo simplesmente matar o dia inteiro para fazer o encontro valer a pena. Tudo que preciso fazer é trazer um bilhete no dia seguinte dizendo que estava doente (sempre quis colocar em prática meus talentos de falsificação por uma boa causa), e para essa transação não é preciso um encontro cara a cara entre diretoria e pais. Já tivemos o bastante ultimamente. Quando conto a Pash que vou faltar, ela me olha DAQUELE jeito - seu olhar marca registrada que começa com desaprovação e se dissolve em total aprovação. Ela é boa nisso. - Oliver tem algum amigo? - pergunta, apenas meio que pra valer, mas essa metade é realmente pra valer. - Hum, talvez - grunhi. Não quero ser egoísta, mas pretendo passar meu dia de matar aula sozinha com Oliver. Pelo menos dessa vez. Mas não vou dizer isso a ela. Espero que ela desista. - Ah, esquece - diz. - Não vou ficar de vela. Apenas... se conhecer alguém que ache legal para mim... - Claro. Para passar o tempo antes da carruagem de Oliver me levar embora, ando pelo Oink Joint, folheando revistas e ouvindo meu iPod. Homem-Pássaro me dá aquele olhar "O que está fazendo fora da escola?". E o respondo com um olhar silencioso de "Não é da sua conta, volte a ser gerente". Eu tenho meio que uma afeição pelo Homem-Pássaro, mas me ofende totalmente o jeito como ele encoraja qualquer tipo de rebeldia mas se volta contra você se não tiver sido incluído. Foi mal, Homem-Pássaro, mas não pode vir junto no meu encontro. Supera essa, cara. São 12h37 quando Oliver chega, com o cabelo "acabei de sair da cama" e adorável. - Estou atrasado? - pergunta. - Não - minto. - Bom - ele diz, abrindo a porta do seu lado do carro. Eu pulo para dentro. - Estou faminto - diz. - E você? - Sim, mas não recomendo o Oink Joint - digo, encarando a saída do arcondicionado. Não consigo olhar para ele sem ficar toda nervosa de novo. Tenho que superar isso seriamente. - Não se preocupe. Já providenciei a parte da comida - diz, saindo da cidade. Adoro quando Oliver dirige. Está concentrado na estrada, então posso roubar todos os olhares que quiser. Em Austin, vamos à Tamale House e comemos a melhor comida mexicana barata de todos os tempos. Sentamos no meio-fio, e jogamos migalhas a uns pássaros pretos gulosos que estão na rua, uma versão mais chique e legal dos pombos.


Depois da comilança, cutuco Oliver. - Devíamos ir a uma loja de discos. - Loja de discos - ele diz, refletindo dramaticamente sobre a sugestão. Hum. OK, tô dentro. Vamos então para a Waterloo, o mais tradicional lugar de Austin para consumo de música. Quando entramos, Oliver balança a cabeça. - Cara, é tão cruel baixar músicas da internet. É assim que os verdadeiros fãs de música compram. Dentro, o lugar está coberto de pôsteres de shows e amantes da música olham tudo com seriedade absoluta. Oliver cumprimenta com a cabeça o completamente nojento, mas surpreendentemente amigável, ruivo gordo atrás do balcão. - Oliver, e aí? - pergunta o gordinho. - O de sempre, o de sempre - Oliver responde. Seguimos caminhos separados, olhando prateleiras de CDs. Em um momento, Oliver passa por mim quando estamos no mesmo corredor. Ele engancha o dedo no passador de cinto do meu jeans, me puxa para ele e sussurra "você é sexy" em meu ouvido antes de desaparecer atrás de uma caixa de discos. Fico tão distraída que levo vários segundos até voltar a atenção para meus CDs e, quando o faço, percebo que estou segurando uma cópia da última transgressão de Ashlee Simpson. Rapidamente ponho de volta e pego um CD dos Dead Boys, só para me sentir normal de novo. Waterloo tem uma parede de cabines fechadas para ouvir discos que parecem aquelas antigas cabines de telefone que vemos nos filmes dos anos 1980. Você entra, fecha a porta, e escuta a música antes de comprar. Ou pode entrar com o cara pelo qual acabou de matar as aulas do dia e finge escutar o novo álbum do Bright Eyes enquanto rouba beijos quando ninguém está olhando - e é isso que Oliver e eu estamos fazendo. Isto é, até Oliver finalmente dizer: - Quer dar o fora daqui? - Claro - digo, como se tivesse ideia de para onde poderíamos ir. Como dar amassos no cinema

Oliver estaciona a umas duas quadras do campus da universidade e me guia por um caminho como se fosse o dono do lugar. Essa é uma das melhores coisas que começo a observar em Oliver. Não importa aonde ele vá, é como se pertencesse ao lugar. E quando estou com ele, eu pertenço ao lugar também. Ele é meu passaporte para tudo que é mais legal e interessante que Bodeen. Acabamos chegando ao Auditório Hogg, onde todos os estudantes cabeça de cinema ficam, assistem filmes antigos e obscuros, e pagam, tipo, dois dólares para entrar. Hoje um filme francês dos anos 1960 em preto e branco chamado Acossado está nos letreiros. Oliver e eu entramos de fininho 15 minutos depois de ter começado, sentamos bem atrás, e basicamente damos uns amassos o filme inteiro. Pelo menos, é o que tentamos até eu ter um pequeno colapso nervoso de auto estima que quase causa uma pequena confusão. Veja bem, não sou a garota mais experiente do mundo. Estou fadada a cometer um erro ou dois (ou cinquenta). Como hoje. Oliver e eu começamos


uma beijatona frenética (muito boa), quando subitamente me dou conta de que esqueci de raspar minha perna direita essa manhã (muito ruim). Agora, tenho certeza de que está se perguntando "que tipo de idiota burra esquece de raspar uma das pernas?" E confie em mim, se tivesse a resposta para isso, estaria aqui sentada e linda com duas canelas macias como seda, beijando esse rapaz delicioso sem uma preocupação sequer na vida. Mas, no entanto, minha configuração genética defeituosa dá sempre um jeito de estragar minhas tentativas de diversão. Às vezes fico tão ocupada sonhando acordada, que esqueço as pequenas tarefas que deveria estar fazendo, tipo lembrar-me de raspar as duas pernas enquanto tomo banho. Vergonhoso como não poderia deixar de ser, a mão de Oliver fica tentando tocar minha perna direita. E fico afastando-a - não quero deixá-lo com nojo da minha canela de cacto -, mas suas mãos estão determinadas. Quanto mais afasto a perna, mais elas me perseguem. E isso continua e continua até eu estar tão encolhida na cadeira, que poderia estar logo sentada no chão. - O que há com você? - ele finalmente sussurra, meio irritado. - Nada - digo. - Nada? Está praticamente no chão, sua louca. - Oliver diz, me olhando enquanto minha bunda está pendurada a sete centímetros do chão coberto de chicletes. Procuro freneticamente uma desculpa que faça sentido, mas tudo que consigo é: - Eu só, hum, eu não ... quero que toque na minha perna agora. OK? - Ah - Oliver diz, e depois de uma longa e desconfortável pausa. - Olha, se não quer estar aqui, não quero forçar nada. Não precisa ficar toda estranha e sentar no chão. Oliver se endireita e tira o braço dos meus ombros. Assim que ele tira, sinto como se tivesse sido jogada numa tempestade de neve sem casaco. Está congelando. Incrível como se pode se acostumar rápido com o abraço de alguém. Estava apenas tentando poupá-lo da nojeira de minha perna cabeluda, e agora ele pensa que o odeio. Meu coração afunda e acelera em silêncio até eu finalmente soltar: - Eu gosto de você, sério. É só que nãoraspeiminhapernadireita e não queria te deixar com nojo, OK? Oliver para e me olha. - O quê? - diz. - Você me ouviu - digo. - Esqueci de me raspar. Sou uma completa mulher das cavernas. - Espera, você esqueceu de raspar uma das suas pernas? - Oliver ri. Cara. Você é uma figura e tanto. - Desculpa. Sei que é nojento - digo enquanto ele passa uma das mãos pela minha perna. - Ai. Espeta. Isso é maneiro. Se minha mão coçar, vou simplesmente esfregar na sua perna para coçar por mim. Ele sorri. Estamos no escuro, mas já posso ouvir como é o som de suas palavras quando está sorrindo. Adoro isso. Adoro que ele ria de mim - no bom sentido. Decido que é uma característica muito importante de se ter no garoto com quem você fica e secretamente espera que vire oficialmente seu namorado.


Não fazia ideia de que um cara pudesse ser tão desencanado sobre uma garota com as pernas cabeludas. Esperava que ele vomitasse e saísse correndo porta afora. Será que é só o Oliver, ou todos os caras não estão nem aí para esse tipo de coisa? É estranho - isso ninguém te conta. Ah, e a respeito do filme, só para não pensar que sou totalmente ridícula, recomendo fortemente que assista Acossado, afinal é provavelmente o filme francês em preto e branco mais legal já feito. Não posso contar a história (estava meio distraída), mas foi filmado em Paris e as roupas estilo mod são de morrer. Confie em mim. Se tiver a oportunidade, devia ver apenas pelo orgasmo fashion. Essa não é minha bela vida

No assunto Roller Derby, fico feliz em informar que depois de nossa derrota contra as Sirens, as Hurl Scouts estão invictas. Derrubamos as Cherry Bombs, as Black Widows, a Fight Crew, e hoje à noite temos uma segunda chance contra as Sirens. Entre os bloqueios ferozes de Malice e Emma Geddon, os ataques mortais de Crystal Deth e Babe Ruthless (alô, essa sou eu), aquelas policiais malvadas não vão nem conseguir anotar a placa do caminhão. Nem Blade consegue conter seus passinhos idiotas de dança quando ultrapasso a perna quilométrica de Emma para marcar quatro pontos. - Guarda isso pra festa depois, sua aberração! - Juana Beat'n grita do banco enquanto vários skatistas envergonhados atacam-no com garrafas de água vazias. Não que isso o impeça de saltitar. O cara tem pés hiperativos. Particularmente, adoro as coreografias toscas espontâneas de Blade. Consegue imaginar um técnico em qualquer outro esporte rebolando no banco? Somente em Roller Derby, meus amigos. Só queria que Pash estivesse aqui para testemunhar a genialidade divertida disso tudo. Ela entrou em quarentena por conta própria em Bodeen para terminar algum mega-projeto da feira de ciências, algo brilhante demais para minha mente plebeia compreender. Acho que, se ela está por aí procurando a cura do câncer, não posso odiá-la demais. Além disso, quando as garotas Derby invadem a lanchonete Star Seeds depois da partida, os melhores momentos são piadas internas e referências ao esporte. Não sei se Pash realmente entenderia. Essas garotas definitivamente se tornaram minha família. Bem, todas exceto Dinah Might, que tem resistência de carteirinha a se juntar ao fã clube de Babe Ruthless. Ela está ressentida comigo, mais do que nunca. Para piorar as coisas, as Hurl Scouts vão enfrentar suas invictas Holy Rollers na próxima rodada. Tudo que todos falam é de como nós duas vamos ser "as rivais da temporada". Ótimo. Como se eu precisasse da pressão. Quanto mais tento ser legal com Dinah, mais consigo vê-la planejando internamente minha morte. E juro que não é coisa da minha cabeça. Semana passada, nos alinharam para uma corrida num amistoso. Dei a Dinah um aceno de cabeça respeitoso e um sorriso amigável. Ela me olhou feio e sibilou "beije meus patins, novata", enquanto o apito soava. Essa é sua nova tática. Dinah finge que não importa o que eu faça, não importa o quanto me esforce para patinar, não importa quantas vezes Atom Bomb me mencione nos anúncios de


jogos - para ela, sou invisível. Como se não pudesse nem se dar ao trabalho de lembrar-se de meu nome. É meio óbvio e imaturo, de um jeito Corbi (mesma atitude, esporte diferente), mas estaria mentindo se dissesse que não me incomoda. Corbi é apenas uma líder de torcida e candidata à Miss Vulgaridade para quem não dou a mínima no final das contas, mas Dinah é uma patinadora incrível, a estrela da liga, a razão pela qual quis praticar Roller Derby. Seria legal se ela realmente me desse algum reconhecimento. Não poderia reclamar com alguém sobre Dinah. Ela é sagrada. Todos a amam. Não sou uma total desajustada, apesar de tudo. Hoje à noite, estamos espalhadas entre cinco mesas na lanchonete Star Seeds, e Eva Destruction, da Fight Crew, está de pé numa mesa, segurando um tubo enrolado. - OK, tagarelas, calem suas bocas sujas por dois segundos! Tenho um anúncio a fazer. Como sua escrava de pôster oficial, apresento a vocês o último e incrível cartaz para a próxima partida - diz. Observo enquanto Eva desenrola o pôster, uma vez mais dividindo seu brilhante talento gráfico conosco. Como sempre, é mais irado que irado, mas algo parece estranho. A garota no pôster - ela tem pernas familiares, braços que reconheço -, e então, Ah, merda! Não é Dinah no pôster. Sou eu! Todos aplaudem e Malice joga um pedaço de cebola em mim: - É isso aí, baixinha! - grita. Gostaria de poder dizer que é um momento high-five, eba-pra-mim, mas dois pensamentos imediatamente sobrepõem-se à comemoração. Um: Do canto de meus olhos, vejo Dinah duas mesas atrás quase engasgar com uma batata-frita quando o pôster é revelado. E não tenho dúvida de que vai tentar me matar semana que vem. E dois: Tudo que consigo pensar é: Minha mãe não pode nunca ver esse pôster. Não sei por que - não é como se Brooke frequentasse os estúdios de tatuagem, pizzarias e cafeterias que exibem o lindo trabalho de Eva -, mas o frio que inunda minha barriga sobe até a garganta. E é quando estou sozinha em meu quarto, no dia seguinte, que realmente vejo a cópia do pôster que Eva me deu. OK, confesso, é incrível. Faço uma pequena dancinha de felicidade. Miss Bluebonnet pode ficar com seu outdoor. Sou uma garota num pôster Roller Derby! Escuto minha mãe vindo pelo corredor e rapidamente enfio o cartaz embaixo do colchão, onde deve permanecer indetectado. Quando BFFs atacam

Então, Pash e eu estamos criando esculturas - como sempre fazemos - com o purê de batata reidratado do almoço da escola e estou dizendo a ela como não ligo para qual cura do câncer ela está tentando descobrir, desde que jure agora mesmo, por tudo que é mais sagrado, que vai assistir à próxima partida. Não apenas quero-a torcendo por mim, quero uma testemunha para contar a meus pais o que aconteceu caso morra nas mãos de Dinah. E que os amava, apesar de todos os malentendidos, e músicas, e roupas ruins que tentaram forçar sobre mim. Você imaginaria que uma melhor amiga seria tranquila quanto a essas coisas, te daria apoio. Pash não. Não hoje em dia. É como se estivesse constantemente irritada comigo por nada. O que não é nada Pash.


E, aimeudeus, nunca deveria ter dito uma palavra sobre ser a garota do pôster. Seu humor imediatamente piorou ao ouvir essa. Ela não disse "Bliss, isso é tão legal" ou "Incrível - mal posso esperar pra ver." Não. Minha grande notícia foi recebida por uma nuvem negra pairando sobre sua cabeça. - Adivinha o que fiz ontem? - Pash pergunta, me desafiando. Subitamente percebo que o delineador de Pash está diferente. Não a cor, mas o ângulo. Bem estilo gatinha; é sexy. - Mudou o delineador - digo. - É, tipo, duas semanas atrás - ela rebate, e me sinto uma poça de lama. - E ontem, fui ao Wal-Mart e... peguei algumas coisas - diz. - O quê? Roubou sem mim? Pash! Isso é uma coisa nossa, não uma coisa solo - praticamente grito. - Bem - diz -, quando não existe "nós" por perto, acho que tem que ser solo. - Desculpe, tá? Te devo um bom tempo juntas. Só me promete que vem à partida esse fim de semana. Vai ter uma festa boa mesmo. Diversão épica. Festas são o ponto fraco de Pash. Ela não pode negar. - Tudo bem, mas não vai poder ficar beijando o Oliver em algum canto escuro o tempo inteiro. - OK - concordo. Só entre nós, estou sentindo a vibração de ciúme com C maiúsculo. E não é que eu queira chamar a atenção dela para isto. Não quero que Pash se sinta mal por não passarmos mais tanto tempo juntas quanto antes. Mas, para registrar, eu tentei sim fazê-la entrar no Roller Derby comigo. Implorei, e ela disse não. Não pode me culpar por me divertir sem ela. Enfim. Se eu estivesse presa na Caipiralândia 24 horas por dia, sete dias por semana e minha melhor amiga arranjasse um namorado, estaria odiando a vida também. E com certeza não gostaria da melhor amiga em questão me acusando de ciúmes. Então, por ora, vou deixar passar. Esse fim de semana vai ser o máximo. Desde que sobreviva à partida. Hurl Scouts vs. Holy Rollers

Sábado à noite. Uma hora antes do altamente aguardado confronto entre as Hurl Scouts e as Holy Rollers, Malice patina nos bastidores. - Puta merda. Está alucinadamente lotado lá fora! - diz. - Está pronta, garota do pôster? - Emma diz, se virando para mim. - Tô - minto, amarrando meus patins. Não coloquei nem uma roda na pista, mas já estou sentindo os pingos de suor se formando sobre os lábios. Atom Bomb anuncia a escalação de nosso time, que termina com: - E por último, mas não menos importante, a grandiosa novata, número 48 ... Baaaaaaabe Ruuuuuuthless! A multidão grita tão alto que o barulho quase me derruba dos patins. Tecnicamente, garotas Derby devem parecer duronas e malvadas o tempo todo, mas não consigo evitar sorrir como uma boba ao ouvir todas essas pessoas torcendo. Claro, quando as Holy Rollers entram na pista para sua volta, Dinah tem a mesma acolhida. Talvez mais, mas e daí? Não me assusta. Não esta noite. Vejo rapidamente Oliver e Pash na plateia e penso: Vou arrasar aqui. Dinah quem?


O lugar vira um furor elétrico quando Dinah e eu nos alinhamos para nossa primeira jam, ou corrida. Ela me dá um olhar frio de desdém. Apenas sorrio. O primeiro apito soa e o bando de bloqueadoras decola. O segundo apito balança na sua caixinha de metal, Dinah e eu disparamos como foguetes sincronizados. Entrando na primeira curva, estou meio passo à frente, cortando, me abaixando, e desviando pelo bando. Estou na liderança. Patino forte, me inclinando pela pista e atravessando-a para velocidade máxima. Subitamente ouço a multidão rugir quando Dinah vem por trás e me ultrapassa. Dinah entra no bando primeiro, passando três de minhas bloqueadoras por três pontos. Apesar de estar meio passo atrás, ultrapasso três de suas bloqueadoras - estamos empatadas com três pontos cada. Dinah consegue os primeiros pontos, mas é advertida por uma falta ao dar uma cotovelada em Malice, e tem que passar a próxima rodada na área do pênalti como punição. Com Dinah fora, estou enfrentando Ella Mental. Ella é uma garota legal, mas enfrentá-la é como tirar doce de criança. A pobre Ella não entende nem o que aconteceu quando, um minuto depois, já passei o bando duas vezes, marcando seis pontos. O público enlouquece. Por um momento ínfimo, fico chateada que meus pais não estejam aqui. É claro que Roller Derby não é, nem nunca será, a praia de Brooke, mas seria legal se ela pudesse testemunhar algo em que não sou uma fracassada completa. Quer dizer, tem uma multidão aplaudindo. Ela poderia respeitar pelo menos isso? Mais ou menos? Quando Dinah sai da área do pênalti, parece uma presidiária recémlibertada e pronta para acertar as contas. As Holy Rollers podem até ter Deus do seu lado, mas as Hurl Scouts não estão prontas para desistir. Nós as seguramos. E não apenas eu - meu time inteiro. Malice pede tempo para fazer uma reunião e oferece quatro palavras de sabedoria: - Podemos vencer essas piranhas! Ao que respondemos: - É isso aí! E acreditamos mesmo nisso. Quanto mais acreditamos, melhor patinamos. Quanto melhor patinamos, mais as Holy Rollers ficam nervosas. Quanto mais ficam nervosas, mais se desesperam. Tenho certeza de que isso poderia dar numa das sofisticadas teorias econômicas do Sr. Smiley, mas quando olho para o placar marcando "Holy Rollers, 9, Hurl Scouts, 16", penso ser bem simples. É basicamente uma boa e velha surra texana. U-hu! Estamos a algumas rodadas do intervalo, e sinto o desespero de Dinah. Ela está fazendo tudo o que pode para igualar o placar antes da metade do tempo. Nos alinhamos lado a lado quando, de repente, homens vestindo casacos amarelo-berrante pontilham toda a multidão. Eles rapidamente chegam de trás do público até a frente. Em segundos, a misteriosa gangue de carinhas de casaco amarelo cerca a pista.


Não tenho ideia de que diabos está acontecendo, mas sei que não pode ser bom quando escuto Atom Bomb ir de seus usuais gritos de "amigos, temos uma batalha real essa noite!" para um abrupto "merda". Olho para Emma, que já está tirando seus protetores de pulsos. - Maldito chefe dos bombeiros - diz. Um minuto depois tomo uma aula intensiva sobre o mundo dos chefes de bombeiros. Aparentemente, tem um departamento legal inteiro dedicado a fiscalizar a capacidade de lotação. No fim das contas, o motivo pelo qual a Casa de Bonecas parece tão lotada esta noite é porque realmente está. Temos trezentas pessoas além do permitido. É um flagrante. Então, justo quando nossa adrenalina estava chegando ao ápice, nossa partida é cancelada. Passamos de prestes a derrotar as invictas Holy Rollers para expulsão imediata da Casa de Bonecas. É isso ou prisão. E não estão de brincadeira. Ainda estou com meus patins enquanto deslizo pela onda de pessoas porta afora. Lá fora está um caos e policiais estão em toda a parte. Alguns caras irritados gritam para os tiras enquanto saem: - Roller Derby não é crime, cara! - O que me faria rir se já não estivesse apavorada com a quantidade de policiais zanzando por ali. Não vejo Oliver nem Pash em lugar algum. Quando me viro, vejo Malice, Dinah e as outras capitãs contra a parede sendo interrogadas pela polícia. - Malice! - grito preocupada. - Tá tudo bem, Ruthless. Apenas nos encontre na festa! - ela grita de volta. Me viro e subitamente estou cara a cara com o peito parrudo e bíceps musculoso de um uniforme azul escuro e um distintivo brilhante. Inclino a cabeça para cima para ver o policial mais assustador da face da Terra olhando para mim. Quase faço xixi nas calças, mas felizmente consigo me controlar. - Vou ter de ver sua identidade - diz o Policial Embriagado de Poder. - O quê? - digo, surtando internamente. - Mocinha, ou me mostra sua identidade ou vai para a cadeia - ele diz enquanto acaricia as algemas em seu bolso para um efeito mais dramático. Como se precisasse disso. Acredite, estou assustada o suficiente. Pode imaginar o telefonema para Brooke se fosse presa jogando Roller Derby? Nem eu. Estou rezando enquanto procuro com o braço enfiado dentro da bolsa e entrego a ele a única coisa que tenho, a identidade da escola. Policial EP dá uma olhada, aponta a lanterna para meus olhos (valeu, cara), então pergunta: - Só tem isso? - Sim - digo, antes de acrescentar -, senhor. Sim, senhor. - Tem apenas 16 anos? - pergunta. É realmente necessário falar isso tão alto? Aqui não é o melhor lugar para anunciar minha idade! - Sim, senhor - respondo rapidamente, esperando que possamos mudar para um assunto menos polêmico. - Bem, Srta. Cavendar, não acha que é um pouco jovem demais para andar com essas pessoas? De novo a história da idade. Quero mandá-lo para aquele lugar; ele não me conhece, essas são as melhores pessoas com quem já tive o prazer de andar. Mas não quero ir para a


prisão ou fazer uma cena para que todas as minhas irmãs de esporte subitamente descubram que não tenho exatamente 18 anos. Então... - Sim, senhor. Por isso estou indo embora agora mesmo, senhor. Para ir para casa. Senhor. - Os "senhores" podem ser excessivos, mas consigo ver que o Policial Embriagado de Poder adora. Toda vez que digo "senhor" seu distintivo brilha um pouco mais forte. - Tudo bem - finalmente diz. - Vou deixá-la ir. Mas tem de entender que será cúmplice se infringirem alguma regra de segurança novamente. - Sim, senhor - concordo. - Está livre para ir - diz, me devolvendo a identidade da escola. Quando volto para o meio da multidão já dispersa, um braço envolve minha cintura. - Aí está você! - Oliver diz. - Cara. Essa foi a melhor partida de todas! Pena que foi cancelada. - Com certeza. Viu Pash? - Não. A gente a encontra na festa. Vamos nessa - diz, me empurrando para seu carro. Normalmente eu ficaria e esperaria a estilosa cabecinha de Pash surgir em meio à multidão, mas quando olho para cima e vejo helicópteros chegando ao local, sei que é hora de sumir. Já me safei de uma ligação para meus pais uma vez. Não quero arriscar minha pele de novo esta noite. Pego o celular de Oliver e mando uma mensagem para Pash: BOBA! KD VC? FUI P/ FESTA. T VEJO LAH. rs: SEM MOICANO P/ VC HJ, BEBADA! Estou meio que numa seca de celular no momento (perdi quatro deles em três meses, então minha mãe me excluiu da revolução digital), por isso dependo da bondade de estranhos/ namorados que emprestam seus telefones. Sem homens da lei aqui

Por causa da invasão do chefe dos bombeiros, a festa começa com um clima meio pesado. No entanto, quando vemos a dura passando no noticiário noturno, todos mudam rapidamente para modo "celebração". A sensação é um pouco de perigo e crime, tipo a glória de ter uma tatuagem sem ter sofrido a dor da agulha. Além disso, todos estão tão empolgados sobre a quase derrota das Holy Rollers, que as capitãs dos times estão fazendo uma reunião improvisada perto do barril de cerveja para discutir as possibilidades de uma nova partida. Durante a primeira hora, checo o telefone de Oliver de novo e de novo para ver se Pash respondeu a minha mensagem. Duas horas depois, desisto. Ela deve ter simplesmente voltado para Bodeen. Aquela maluca. Não acredito que está perdendo toda essa diversão. Oliver e seu irmão mais velho, Hank, por si só um deus grego (prova de que essa árvore genealógica está recheada de gatinhos), pegam suas guitarras e fazem uma serenata com uma versão acústica improvisada no quintal. Hank é o vocalista e compositor de 24 anos dos Stats (ou seja, consegue todas as garotas). Oliver está feliz em ficar no fundo, encarando os sapatos e tocando seu baixo enquanto o cabelo cai nos olhos. Hank pode ser a escolha óbvia, mas eu preferiria Oliver sem pensar duas vezes, o que meio que funciona a meu favor, considerando que já o tenho.


Em algum momento depois de uma da manhã, Oliver e eu acabamos no quarto de Octavia, conversando e nos revezando como DJs no som dela. Estamos sentados no chão, preguiçosamente lutando com travesseiros enquanto conversamos, principalmente sobre bandas. E do nada ele pergunta: - Adivinha só? - O quê? - pergunto. - Vamos sair em turnê - diz -, com os Benedicts. Meus olhos subitamente ficam maiores que pratos de jantar. Os Benedicts são basicamente a banda de indie-rock mais legal de Austin. Mesmo que não tenha ouvido falar deles, com certeza reconheceria sua música. Confie em mim. Eles são os caras. - Fala sério! - guincho, não porque sou de guinchar, mas porque é assim que extravaso minha empolgação de surpresa (sou uma idiota). - Isso é tão incrivelmente maneiro! Sério, é a coisa mais maneira que já aconteceu com alguém que conheço. Não poderia ser mais maneiro nem se... - Bliss - Oliver interrompe. - Quê? - Tem de parar de falar maneiro. Concordo com a cabeça e depois penso melhor. - Maneiro, maneiro, maneiro, maneiro, maneiro, maneiro, maneiro - digo, até Oliver tapar minha boca com uma de suas mãos e me calar. Mordo sua mão e ele ri. - Quando vai? - pergunto. De repente tenho essa fantasia de Oliver e sua banda caindo na estrada num grande ônibus de turnê durante o verão, comigo indo visitá-lo em diferentes cidades. Minha mente viaja por todo o país, imaginando várias casas de shows, com Oliver tocando no palco e eu assistindo dos bastidores (usando algum vestido vintage de matar, é claro). Ele vai acenar para mim entre as músicas e vou revirar meus olhos envergonhados para ele de volta, amando secretamente tudo. Humm... É, acho que vou gostar dessa coisa de turnê. - Partimos na segunda-feira - Oliver diz. - O q-quê? - engasgo. É cedo demaaaais. - Só soubemos hoje. Não se preocupe, são só três semanas. - ele explica. - Uau, não, tudo bem - luto com as palavras. - Quer dizer, não, não está tudo bem porque não deveria dizer isso, mas, er... vai sentir minha falta? - Você vai sentir minha falta? - ele sorri. - Totalmente - digo. - Vocês todos vão ter seu próprio ônibus de turnê? - Está mais pra uma van nojenta - Oliver ri. - Não respondeu minha pergunta - digo. - Claro que vou sentir sua falta. Por isso é que preciso de uma dose extra de você agora - responde. Com "Pinkerton" do Weezer no som (trilha sonora perfeita para amassos), Oliver me puxa para seu colo e me beija. Suas mãos escorregam para baixo da minha camisa, até meus ombros e para baixo nas minhas costas. Ele passa seus dedos pela cintura do meu jeans, movendo-o para baixo da tira de elástico da minha calcinha. Movo minhas mãos por baixo de sua esfarrapada camiseta, sentindo suas omoplatas. Abaixo a cabeça, beijando aquela minha sarda favorita que ele tem no ombro.


Com sua mão agarrando a parte de trás de meu pescoço, Oliver me puxa de volta para que meu rosto se encontre com o dele. Levemente encosta seus lábios nos meus antes de morder/chupar com firmeza meu lábio inferior. Não sei como essa tática é chamada, mas mi-au! Minha respiração imediatamente muda. E a de Oliver também. Ele rapidamente tira minha camisa, o que entendo como a deixa para tirar a dele também. Suas mãos, agora determinadas, escorregam por dentro do meu jeans, passeiam pelas minhas coxas, e vão até a parte interna da minha perna. É uma sensação, tipo - sei lá - aterrorizante e incrível ao mesmo tempo. Levanto meus quadris para ele, louca para que me toque... Mas assim que seus dedos se movem, pulo, subitamente assustada e distraída e me dando conta da festa acontecendo bem do lado de fora da fina porta do quarto, e não quero que Oliver me odeie e saia correndo. Só quero dizer a ele que o amo (amo? Acho que sim). E quero que ele diga que me ama. Ele ama? É deprimente querer isso? Ele me olha confuso. Expiro devagar, pego sua mão, e coloco de volta na minha coxa, dando o sinal verde. Eu quero. De novo, os dedos de Oliver sobem por minhas pernas e... de novo, pulo. - Não me diga que se esqueceu de raspar uma de suas pernas de novo Oliver sussurra/sorri em meu ouvido. - Não. Eu só... - gaguejo. - Você é engraçada - ele ri. - Não, não sou - protesto. - Sim, você é. Não é como se estivéssemos no colegial, como se nunca tivesse feito isso antes, certo? Hum, certo. Isso é o que pensa, amigo. Eu me sento e suspiro, me desculpando. - Desculpe. Só que aqui não, OK? Depois de vários minutos de um silêncio constrangedor, preenchidos ironicamente por "Why Bother?" do Weezer tocando no som – Why bother It's gonna hurt me It's gonna kill when you desert me! Oliver diz: - Vamos voltar para a festa. Ele se levanta, estica um de seus braços, e me puxa do chão. Dormindo fora

No fim da festa (o que é relativo porque para algumas garotas, a festa nunca termina - elas apenas continuam, são os coelhinhos a pilha da diversão), sigo Oliver até seu carro. Ele me agarra com seus braços magros, musculosos de tocar guitarra e diz: - Chega. Estou te raptando. Você vai para casa comigo. Considerando que Pash me abandonou, decido ceder a seus instintos criminosos. Apesar de alertá-lo:


- Só não espere conseguir um gordo resgate da minha família. - Não estou nessa pelo dinheiro - sorri perversamente. Dirigimos até a casa que ele divide com Hank, Eric e Jesse (seus dois outros companheiros de banda). Não tenho muita certeza do que estava esperando, mas me permita dizer que quando quatro caras moram juntos, não é nada bonito. A casa deles é um chiqueiro. Não que eu seja a pequena senhorita arrumadeira, mas claramente os garotos estão vivendo na era das cavernas da limpeza. No universo doméstico deles, coisas pequenas como espanadores e aspiradores ainda estão para ser inventadas. Não estou dizendo que não seja legal - porque é. É só que... estou com medo de me sentar. Oliver me olha, um pouco envergonhado. - Ah, é, a sala é meio terra de ninguém. Prometo que meu quarto não é tão assustador - diz, me puxando por uma das mãos através do corredor. - Só está tentando me enrolar - digo. - Talvez sim - diz. - Talvez não. Entramos em seu quarto e posso confirmar que, enquanto é beeeeem mais limpo, ainda é bagunçado o suficiente para eu respeitá-lo. Me jogo no colchão que está no canto, sem cama. (Um estilo que quis fazer no meu quarto até Brooke dar um basta. Disse a ela que parecia "legal e minimalista". Ela disse que parecia "de mendigo".) - Desculpe ser tão pequeno - Oliver diz -, mas sou o mais novo, então me deram o menor quarto. Cretinos. Acho que seu quarto é perfeito e um pouco misterioso, cheio de todo tipo de coisas de garoto e de Oliver. É tipo um estúdio musical com uma cama. Muitos cabos, pedais de guitarra, um amplificador com a tela arrancada que está no conserto, um milhão de CDs, um velho gravador de fita para fita, e algo que ele explica ser um "gravador manual porque ProTools soa perfeito demais". Tem um pôster dos Três Patetas e uma foto da Joan Jett em seus anos "Runaway", um desodorante em cima de uma mesa de cabeceira feita de engradados de leite, e todas as suas roupas estão no chão do closet. Uma coisa está pendurada - uma camisa azul arrumadinha de botões da Banana Republic, ainda com as etiquetas. - É, minha mãe me deu isso de aniversário - ele ri enquanto mexe em alguns discos, então coloca o clássico Highway 61 Revisited do Bob Dylan. Não dá pra discutir com esse. Acabamos sentando e depois, deitados em sua cama, nos beijando, ouvindo música, nos beijando um pouco mais, ouvindo mais música, conversando sobre como estamos cansados, e então nos beijando de novo. É uma sensação tão perfeita apenas estar ao lado dele, que esqueço totalmente que em menos de 48 horas vai ter ido embora. Agora, nunca repita isso para Pash, mas estou começando a pensar em Oliver como meu melhor amigo. Talvez possa ter dois melhores amigos, um com quem dou uns amassos (O.) e uma com quem tiro sarro dos outros na escola (P.).Posso contar qualquer coisa a Oliver, e acho que ele sente o mesmo. Por exemplo, estamos deitados ali, e começamos a falar em fazer sexo e não de um jeito totalmente embaraçoso. Apenas casual. Tipo, devemos fazer


agora? Ou devemos esperar até ele voltar da turnê? Pesamos os prós e contras. Posso ver que ele realmente quer fazer (quer dizer, sinto que quer - ahã), mas ele meio que me deixa decidir. Não me leve a mal, estou pronta para o trabalho (pelo menos acho que estou), mas quero que seja tudo perfeito. E qual é a pressa? Acho que é meio puritano, mas penso que talvez fosse melhor esperarmos até ele voltar da turnê, nos dar algo a que antecipar. Então, por volta das cinco da manhã, com raios de sol cor de laranja entrando pelas persianas, Oliver e eu adormecemos enrolados um no outro. Sem sexo, apenas dormindo juntos, o que é tão bobo, mas o tipo de bobeira que é maravilhosa. Oh, it's such a perfect day I'm glad I spent it with you

Quando desperto na manhã seguinte, Oliver já levantou. Está olhando para mim e sorrindo de um jeito supertonto e amoroso que não é nem um pouco maneiro, mas parte completamente meu coração. Não sabia que ele tinha essa coisa fofa nele. Quero engarrafar e guardar para sempre. - O que está fazendo? - digo, com voz de sono, cobrindo o rosto com as mãos. - Só olhando você - diz, bocejando. Cara, se Malice visse Oliver desse jeito, ela concordaria totalmente que ele não é como os outros caras de banda cafajestes. Ela mudaria o disco - e o trocadilho é intencional. - Bem, então para - digo, enterrando minha cabeça em seu peito. - Tudo bem - diz. - Nunca mais vou ficar olhando. - Ótimo. Não quero que olhe. - Ótimo, então não vou - diz, enquanto beija minha bochecha. É quase uma hora da tarde, e tecnicamente deveria arrastar minha bunda de volta para Bodeen (ah, é, Bodeen), mas decido abusar da sorte um pouco mais. Enquanto Oliver está no banheiro ligo para casa e digo que ainda estou na casa da Pash, e que estamos dando duro no nosso projeto de economia que é para esta semana. - OK, coelhinha. Não trabalhem duro demais - minha mãe diz, num raro e surpreendente bom humor. Meio que desejei que ela tivesse implicado um pouco mais, porque agora estou com um pequeno nó de culpa no fundo do estômago. É muito mais fácil desafiá-la quando estou com raiva dela. É claro, quando mentalmente volto ao Mundo de Oliver (costumava se chamar Austin, mas agora, para mim, é o Mundo de Oliver), a culpa some quase. Em seu último dia na cidade, preparo para Oliver uma festa de despedida improvisada para um, indo a todos os seus lugares favoritos de Austin: a farmácia Hyde Park (para algumas rodadas de despedida de Stampede), Tamale House, Waterloo Discos e Peter Pan Putt-Putt (lar de uma gigantesca escultura do Peter Pan feita nos anos 1960 para ser amigável e recepcionar as crianças, mas na verdade acabou ficando estranha e assustadora - em resumo, incrível). Antes de nos darmos conta, a noite já está chegando.


- Preciso voltar para casa urgentemente - digo, meio que me desculpando. - Não - Oliver diz. - Sim. - Nã-ã, não pode me deixar sozinho em minha última noite na cidade. - Você é um chato - digo, me sentindo atormentada. OK, alguém me explica de novo porque não posso pular logo para os 18 anos e deixar para trás esse pequeno detalhe de ter que pedir permissão para meus pais para tudo? Não é justo. Ele cede e, quando estamos voltando para Bodeen, paramos para abastecer. Oliver entra para pagar e meu coração está dizendo Nãaaaaao! Esse dia não pode acabar! Ainda não. Pego o celular de Oliver e ligo para casa de novo, abusando muito, muito mesmo da minha sorte. Certifico-me de ligar para o número de casa, que toca no telefone antigo e caro de minha mãe com o discador giratório. Brooke adora esse telefone pelo charme de antiguidade, mas eu o adoro pela genial falta de identificador de chamadas. - Mãe, posso, por favor, por favor, ficar na casa da Pash de novo esta noite? - É noite de aula - minha mãe diz. - Exatamente. Estamos fazendo dever de casa. Vamos ficar acordadas até tarde terminando nosso projeto, e precisamos usar o computador dela porque o nosso não é tão rápido. Não tem como terminarmos aí - minto. Nosso projeto é só para quarta-feira (o que me lembra, preciso começar logo essa colagem). Passam-se vários segundos de silêncio do outro lado quando finalmente: - E não tem problema para a mãe de Pash? São duas noites seguidas, Bliss. - É claro, mãe. Notas são tudo que importa por aqui. Pash é uma ótima influência. - Tudo bem, mas só dessa vez. Não se acostume. Você ainda mora na minha casa - diz. - Entendi. Obrigada! Te amo! - desligo bem na hora que Oliver abre a porta e volta para o carro. O recebo com um sorriso radiante. - O quê? - pergunta. - Dá a volta - digo.- Vou ficar com você esta noite. A noite final é basicamente uma repetição da noite anterior perfeita. Tentamos ficar acordados até o mais tarde possível, para não dormir durante nossas últimas horas juntos. Então por volta de 1h37, Oliver está na cama a meu lado, dedilhando sua guitarra, e mudo de ideia. Tiro a guitarra de suas mãos e... basicamente o ataco. Fazemos "aquilo" como Pash diria, e não porque ele forçou ou porque eu queria ser popular, ou por ter baixa autoestima, ou qualquer coisa de meninas dramáticas do tipo, mas simplesmente porque quis. E sim, usamos camisinha, o que Pash ficaria feliz em saber, afinal, está sempre me dando sermão sobre coisas assim, apesar de ainda ser virgem. Mesmo assim, a primeira vez dói demais e quase termina comigo praticamente gritando, "Sai de cima de mim". Oliver fica bem quieto.


- Cara, me sinto um babaca. - Por quê? - pergunto. - Porque não sabia que era sua primeira vez. Por que não me contou? - Sei lá - digo. - Só não queria que fosse um "problema", entende? Coloco seus braços em volta de mim. E adormecemos nessa posição por algumas horas antes de acordarmos, começarmos uns amassos de novo e, bem, fazemos aquilo de novo. Não sei se é assim para todas as garotas, mas para mim, a segunda vez foi muito melhor. E, lá pela terceira, decido que essa coisa de sexo é o máximo - graças a Deus. Tinha um pouco de medo de odiar sexo. É só entender como fazer direito. Au revoir

Na manhã seguinte, quando Oliver me deixa em frente à casa dos Gundersons, começo a me arrepender da parte do sexo. Não muito, mas me sinto tão próxima dele, como se nem soubesse que era possível se sentir tão próxima de outro ser humano, e agora tenho que deixá-lo ir por três loooongas semanas. Não quero dizer adeus. Quero fazer mais sexo. Posso perceber que Oliver se sente do mesmo jeito pela maneira como nós dois nos recusamos a dizer tchau. Ficamos sentados em seu carro por uma eternidade, evitando aquela palavra horrível, e então ficamos sentados por mais tempo ainda, continuando a ignorar a realidade da situação. É uma daquelas manhãs frias, quando o outono está flertando com a ideia de virar inverno. Está frio, então me aninho em Oliver, tremendo. A van da banda sai de Austin às 9h em ponto, o que Oliver diz ser a linguagem de Hank para 9h30, mas ele tem de voltar porque ainda nem fez as malas. Dá pra entender. O menino andou meio distraído. E, naturalmente, preciso estar na escola em vinte minutos. Ficamos ali parados, aproveitando cada um dos últimos segundos juntos, tentando não falar. Ele apenas acaricia meu cabelo enquanto me apoio em seu peito. Tem tanta coisa que quero dizer. Quero dizer que acho toda essa coisa emo idiota e que garotasmulherzinhas suspirando por garotos sempre foram deprimentes com um D maiúsculo. E sei que sou sarcástica e defensiva, faço piada de tudo e sou altamente resistente a qualquer coisa que lembre remotamente baboseiras sentimentais, mas mesmo assim estou lhe dando meu coração todo porque estar com você é como estar em casa, e sei que não vai parti-lo. Quero dizer que o amo. E principalmente, ouvi-lo dizer que me ama, porque sinto isso. Mas talvez seja cedo demais para isso tudo, então finalmente sussurro: - Oliver. - Quê? - Quero te dar uma coisa - digo, procurando na minha bolsa. Tiro minha amada camiseta do Stryper e entrego a ele. - Mentira - diz. - Essa é a coisa mais legal que alguém já me deu. - Bom, é uma camisa de garoto. Você vai arrasar nela - digo.


- Vou protegê-la com a minha vida - diz, me abraçando forte. Depois de um momento, ele se afasta. - Feche os olhos. Eu fecho. Escuto-o se mexendo e sinto alguma coisa cobrir meus ombros, e então escuto o zíper. - Pode abrir - Oliver diz. Olho para baixo e me dou conta que estou enrolada em seu casaco - o casaco com o recorde do Stampede. - Vou protegê-lo com a minha vida - digo. Finalmente concordamos em não dizer adeus. Então, enquanto o carro de Oliver vai se afastando grito: - Olá! - Oi! - ele grita de volta, desaparecendo rua abaixo. Nunca odiei tanto o conceito de três semanas em toda minha vida. Tenha pena de mim

Indo para a escola depois de meu muito importante fim de semana, sinto como se estivesse dando três passos gigantes para trás na vida. Subitamente superei essa cidade, essa esquisita coisinha de colegial. Envolvo o casaco de Oliver em mim como consolo. Olho pra frente e vejo Pash parada em frente a meu armário. Mesmo de longe, dá pra ver que está irritada. Não sei por que, mas tenho certeza de que estou prestes a descobrir. - Ei, Pash - começo. - Não venha com "Ei, Pash" pra cima de mim - diz, me cortando. - O quê? O que foi que fiz? - Me deixou na mão, sua idiota. Tive que ir para a festa sozinha, e quando cheguei lá não me deixaram entrar porque tinha gente demais. Estavam preocupados com outra visita da lei. - Pash! Eu nem sabia - digo. - Sentei lá fora uma hora te esperando. Até desistir e voltar para casa. - Desculpa. Te mandei uma mensagem. Porque não me respondeu? - Me mandou uma mensagem? - diz, descrente. - Bem, não recebi. Apenas me diga que está com nossa maldita colagem. - Colagem? - digo. - Que colagem? - A colagem. Para nosso projeto de economia - diz ela, enunciando claramente cada palavra, como se inglês fosse minha segunda língua. - Pash, calma - digo. - Tenho dois dias para terminar. Ela para e me olha. - Não, não tem. É para o terceiro tempo de hoje! - Não, não é. É para quarta-feira - argumento, como se falando em voz alta fosse virar verdade. A única coisa que faz é deixar Pash ainda mais puta. Ela se volta para mim e começa a disparar, falando a mil quilômetros por hora. - Bliss! Fiz todo o texto sozinha, e tudo que tinha que fazer era a estúpida, fajuta colagem. Um A fácil para nós duas, e nem isso consegue fazer. Sabe, nem todo mundo tem uma vida de patins-namorado-rockstar para se garantir. Se não for a oradora de turma nessa piada de escola, não ganho minha bolsa, o que provavelmente significa que posso dar adeus ao sonho de ser cirurgiã. Não sou somente uma neurótica com notas, sabia? Estou tentando sair dessa cidade de merda. Igual a você.


- Pash - digo, me sentindo como um pedaço de lama na sola de um sapato. Ela me despacha com um balançar de pulso com desprezo. - Dane-se. Obrigada por nunca mais passar tempo comigo. Obrigada por me largar na festa. Obrigada por me usar como álibi para passar a noite com seu namorado imbecil. Mas, principalmente, obrigada por arruinar minha média. Você é uma amiga maravilhosa, Bliss - diz com sarcasmo brutal. Nunca mais fale comigo. Antes que eu possa responder à granada verbal, Pash se vira e desaparece na multidão do corredor. Sinto como se fosse vomitar. No terceiro tempo, imploro ao Sr. Smiley para que puna a mim, não a Pash, pela falta da colagem em nosso projeto. O Cowboy Yoda não quer nem saber. Sinto Pash me fuzilando com os olhos em sua mesa no fundo da sala. Quando tento encará-la, ela desafiadoramente olha para outra direção. Perdi minha melhor amiga, e a verdade é que Pash está certa. Que tipo de pessoa desprezível estraga um A garantido quando Pash está fazendo todo o trabalho pesado? Eu. Sou podre. Pelo resto da semana, tento desesperadamente seduzir Pash de volta à esfera da amizade, mas ela não morde a isca. Não a encontro em seu armário, não importa o quanto eu espione. Toda vez que ela me vê chegando, imediatamente se vira e segue para outra direção. E durante o almoço, desaparece. (Será que está comendo em algum canto escuro da biblioteca? Fico me perguntando.) Lá pela quinta-feira, começo a deixar bilhetes engraçadinhos no seu armário (observações geniais sobre a idiotice que é o colégio Bodeen, o tipo de coisa que ela adora), mas todos são devolvidos ao meu armário com um "devolver ao remetente" furiosamente rabiscado na letra de Pash. Machuca. Lembro dos dias quando aquela letra era usada para mim, não contra mim. Eu sei, eu sei. Ferrei tudo. Não precisa esfregar na minha cara. É assim que eu vou

À luz da grande Briga entre Melhores Amigas de 2007 entre Pash Amini/Bliss Cavendar e da turnê de Oliver, estou de volta ao ônibus do bingo para chegar a Austin. Não que me importe. É legal andar com Helen novamente. Nós, garotas de cabelo azul, devemos ficar juntas, especialmente em tempos de crise. Até deixo meu iPod guardado na mochila e seguro a bola de lã de Helen enquanto ela tricota e me conta sobre sua vida. Ela reclama sobre suas "mãos com artrite", mas vou te contar, Helen mexe naquelas agulhas como uma rock star. E sei disso por experiência. Cometi o erro fatal de tentar tricotar um cachecol no último Natal. O que começou como uma esperançosa bola de lã acabou parecendo um descanso de copo desfigurado que foi atropelado por um carro umas cem vezes. E eu nem tenho artrite. No caminho, secretamente me pergunto se por ser super legal com Helen vou ganhar uns pontos extras de carma para recuperar Pash. Como se, em algum lugar do universo, as pessoas que controlam essas coisas estivessem assistindo e pensando, "Não podemos deixar Bliss longe da sua melhor amiga por tanto tempo. Ela obviamente é uma boa pessoa. Seu método pode ser todo errado, mas seu coração é bom."


Talvez esteja apelando. É só que sinto falta de Pash, e é meio estranho saber que 101 pedidos de desculpas não significaram, nada, zero, nadinha. Quem inventou calendários, afinal?

No treino, Razor e as capitãs dos times anunciam uma mudança nas datas da temporada. Por causa da dura da polícia, foi decidido que o jogo inacabado entre as Hurl Scouts e as Holly Rollers vai se repetir no sábado. Isso significa que todos os outros jogos serão adiados uma semana, incluindo os campeonatos da liga, que agora acontecerão no dia 17 de novembro, em vez de 10 de novembro. Agora, normalmente não planejo minha vida através de calendários. Estou ocupada demais seguindo a maré para ser controlada por um bando de caixinhas organizadas por números num pedaço de papel. Isso é coisa pra Brooke, e tento ficar o mais longe possível. Mas, pensando bem, talvez não seja a escolha mais sábia. Chego em casa vindo do treino, faminta por nutrientes. Vou até a cozinha, onde minha mãe pergunta como foi meu grupo de estudo. - Incrível - digo, indo direto até a geladeira. Abro-a e pego a garrafa de leite, que está quase vazia, um presentinho dos céus. É um daqueles raros momentos em que posso beber do gargalo sem provocar a ira de minha mãe. Jogo a cabeça para trás, fecho os olhos e aproveito cada gota até a última. Ahhhhhhhh. Então abro meus olhos e me encontro encarando um extremamente detalhado "Calendário de Eventos dos Cavendar" cobrindo a porta da geladeira. O nome de Shania está por toda a parte naquela coisa, pequenos adesivos de tiaras rosa e com purpurina marcando suas várias idas e vindas de concursos. Mal sou mencionada, exceto pelo lembrete "Bliss: dentista", em 2 de novembro. Então, dou uma olhada mais de perto. Tem uma tiara grudada em minha homenagem, no dia do concurso Miss Bluebonnet, que por acaso é... 17 de novembro. Espera - 17 de novembro? O campeonato e o concurso Miss Bluebonnet são na mesma noite? Tenho que confessar, essa é a mais perversa pegadinha que já vi em toda minha vida. Na minha aula de inglês, quando estávamos estudando Hamlet e Macbeth, a Srta. Weaver falava e falava sobre como todos os grandes personagens de Shakespeare tinham uma "falha", o teimoso erro humano que era a fonte de seus destinos dramáticos. Nunca imaginei que tinha uma falha. Até agora. Claramente, minha incompetência para lembrar datas me custou minha melhor amiga, e agora isso. Estou tão ferrada. Estou ferrada com chantilly, granulado e uma cereja no topo. Resistir é inútil

Depois de muito pensar, esquematizar, conspirar e planejar, decido que a melhor maneira de lidar com minha ruína iminente é simplesmente ... ignorar. Tirando encenar meu próprio suicídio ou ser abduzida por extraterrestres (o que seria divertido - se conhece algum extraterrestre, diga para ele que estou


disponível para uma excursão), não existe nenhum jeito de escapar da armadilha do Miss Bluebonnet. Então é melhor aproveitar toda a ação de patins que conseguir enquanto isso. Não importa o que aconteça nos campeonatos, depois de sábado todos vão saber que as Hurl Scouts estão na mão das Holy Rollers. Durante a semana, me empenho ainda mais nos treinos sabendo que a partida pode ser a última chance de provar meu valor. E o do meu time. Na escola, passo minha hora de almoço enfiada na biblioteca, lendo os e-mails de Oliver, ou melhor, não lendo os e-mails de Oliver. Eu mando coisas pra ele, mas não recebo resposta. Não que realmente espere que ele pare em todos os cyber cafés e me mande notícias de hora em hora enquanto está no meio de uma turnê com os Benedicts (hum, alô). O verdadeiro obstáculo aqui sou eu e minha falta de celular. Isso coloca em nosso relacionamento uma séria deficiência de mensagens de textos. Oliver podia estar namorando uma garota das cavernas que daria no mesmo. Ainda assim, seria bom checar minha caixa postal e ver algum amor. Tudo que recebo ultimamente são anúncios da Urban Outfitters, que são ainda mais deprimentes porque estou dura. Sério, estou bem, juro

No sábado, Homem-Pássaro liga em pânico e me convence a trabalhar no turno de almoço do Oink Joint. Normalmente diria que de jeito nenhum, mas imagino que me manter ocupada trabalhando vai ser uma válvula de escape para minha energia nervosa antes do jogo. Quando entro às 10h30, noto um cartão de ponto familiar ao lado do meu - o de Pash. Essa é a primeira vez que trabalhamos juntas há séculos, apesar de "juntas" ser um termo relativo. Nos ignoramos o tempo inteiro. Nada de gracinhas com a polaroide, nada de números musicais sarcásticos, nada de revirar os olhos em sincronia quando clientes nos irritam. Estou dizendo, a Sibéria das melhores amigas é um lugar frio. Se algum dia for para lá, recomendo fortemente levar um casaco. Em um dado momento, algumas velhinhas usando trajes de turistas completos (pochetes e sandálias ortopédicas) se desafiam a pedir o sanduíche Squealer, como se fosse a ideia mais ultrajante de todos os tempos. Elas riem conspiratoriamente como melhores amigas. OK, admito, são velhas, nada maneiras, e amaldiçoadas com aquela infeliz pelanca que as avós ganham debaixo dos braços (querido Deus, por favor, não deixe nunca que aconteça comigo), mas Maybelle e Jolene são tão ridiculamente adoráveis. Quando me contam sobre como são melhores amigas desde que tinham 15 anos, quando pegavam o ônibus juntas para a Beeville High, quase corro para a cozinha e choro baldes perto da frigideira. Mas não posso, porque Pash está trabalhando e me recuso a dar a ela a satisfação de me ver chorando no trabalho. Homem-Pássaro tenta amenizar as coisas enquanto recarrego o portaguardanapo. - Não seja boba - diz. - Ela também sente muito sua falta. Concordo com a cabeça. Valeu por tentar, cara, mas sério - esse problema é maior que você e todos os seus talentos de gerente. Pelo menos ele me deixa sair quinze minutos antes. Tenho tempo contado para chegar em casa, lavar o fedor de churrasco entranhado em meu


corpo e voltar ao Oink Joint, onde Malice tão generosamente ofereceu ir para me buscar. Senti-me envergonhada de pedir carona, mas Malice não quis nem ouvir. - Ah, cala a boca - falou. - É claro que vou buscar você e sua bunda prostrada. Se não tivermos Babe Ruthless, não temos time. É bom saber que pelo menos uma pessoa não me odeia. No entanto, ao chegar em casa, descubro um pequeno empecilho para meus planos noturnos. Entro em meu quarto e faço a descoberta mais chocante de toda a minha vida. Meu quarto está limpo. A cama está feita. E dá até pra ver o chão! Algo definitivamente está errado. Uma pequena recapitulação de todo o esquema sobre limpar o quarto. Três anos atrás, quando tinha 13 anos, minha mãe e eu tivemos uma guerra por causa do estado de arrumação do meu quarto, antes de Earl ser forçado a negociar um complicado cessar-fogo. Concordamos que, desde que não deixe bagunça espalhada pela casa ou esconda nenhum prato cheio de migalhas embaixo da cama, meu quarto é o meu espaço. Todo meu. Essa trégua manteve as coisas cordiais, mais ou menos, durante quase três anos. Até deixei passar quando minha mãe invadiu meu templo sagrado com a roupa rosa ridícula mês passado. Claramente, minha diplomacia naquela situação apenas encorajou-a a invadir minha privacidade ainda mais, o que nunca é bom. Nunca. E hoje, jogaram patins no ventilador. Barraco em cartaz

Então, estou me sentindo a estrela do meu próprio episódio de Além da Imaginação, parada em pé nesse quarto imaculado que não reconheço. Essa manhã deixei meu ninho bagunçado apenas para voltar e encontrar uma fantasia de revistas de decoração. Não a minha fantasia, mas de minha mãe. Olho a porta de meu armário fechada e sinto o rosto esquentar. Vou correndo em sua direção, abro-a, e ali bem na minha frente está uma fileira de roupas imaculadamente penduradas. Caio de joelhos e procuro beeeeem no fundo do armário, meu esconderijo secreto para a parafernália de patinação - meus patins, meu capacete. Mexo minhas mãos pra todo lado, mas só sinto o tapete. - Cadê meus patins? - me pergunto alto, pensando, esperando, rezando para que talvez, apenas talvez, tenha os colocado em outro lugar. Então sinto - a presença dela. Como a sombra do Pé Grande encobrindo um inseto indefeso e pequeno na floresta. Me viro e vejo minha mãe parada atrás de mim. E ela não parece satisfeita (somos duas). - Estou com seus patins - diz. Ahhhhhhh. Pooooooorra. O que ela acabou de dizer? Por um momento, encaro-a sem expressão, tentando descobrir exatamente o quanto ela sabe, para então saber como responder. Tipo, estou cinquenta por cento encrencada? Ou todos os cem por cento? Então vejo o pôster enrolado em sua mão. OK, estou morta.


- Há quanto tempo, Bliss? - pergunta ela, calma. - Há quanto tempo tem fugido pelas minhas costas para fazer essa... essa coisa de Roller Derby? E imediatamente fico na defensiva. Quer dizer, é claro que sei que vou me dar mal, mas não sem brigar primeiro. E talvez brigar não seja a palavra certa. Honestamente, quero que ela entenda que Roller Derby é muito importante para mim, não algo que faço só para irritá-la. - Mãe, sei que parece ruim - começo -, mas posso explicar. - Bliss, não posso confiar em nada do que você diz agora - declara, se virando e saindo, como se tivesse sido tão traída que a mera ideia de ter uma conversa inteira fosse demais para ela. Mas pra mim não é. Tenho um jogo hoje à noite, e minha carona vai me buscar em trinta minutos. Preciso do meu equipamento. Preciso dos meus patins e preciso dar o fora daqui. Então a sigo até a sala de estar, determinada a negociar a devolução do que é meu por direito. - Mãe, não precisamos falar sobre isso agora. Só me devolve os patins digo, na minha voz mais madura, tipo vamos-ser-adultos-sobre-isso. - Não vai acontecer, Bliss. - ela responde fria. - Me. Devolve. Os. Patins - repito calmamente, minha última tentativa de uma persuasão pacífica. Brooke se vira, me olha bem nos olhos, e diz: - Não. E é aí que começo a surtar. - Paguei por eles! São meus! - cuspo. Ela responde: - Está de castigo até segunda ordem - diz, antes de fechar a porta de seu quarto, o que me enlouquece completamente. De repente estou pensando como, ano após ano, aguentei calada e me submeti à sua maratona de humilhações em concursos, enquanto ela não consegue nem tentar entender como preciso de uma partezinha da minha vida só para mim. Não é assunto para discussão porque Brooke não liga, e se Brooke não liga, então não existe. Eu não existo. Bem, tarde demais, dona, você me fez. Estou aqui e EXISTO. Então, se vira! Esquece manter a paz, esquece ficar longe de encrencas, esquece delicadamente tentar convencê-la a devolver meus patins. Vou até a porta de seu quarto, abro com força e praticamente berro: - Você nem me conhece! E, juro por Deus, preciso de todo meu autocontrole para não continuar a frase com "sua vaca gorda". Mas guardo essa parte pra mim, já que não quero morrer imediatamente. Ou me arrepender de ser tão dura. Ela me olha e ri - ela ri! - Bliss, você tem apenas 16 anos. Nem você se conhece. - Sei que não sou Miss Bluebonnet - digo, jogando de volta na sua cara. - Isso eu sei. Estou tremendo. Sinto-me à beira de ou cair no choro ou de enfiar a porrada em alguém - só não sei em quem. Mas sei que, mesmo com toda minha raiva, bater na minha mãe não é exatamente uma opção. Meu pai, ouvindo a comoção, vem correndo do trabalho no jardim lá fora. No minuto em que o pobre Earl vê minha mãe e eu enfiadas em nossas trincheiras dignas de uma Terceira Guerra Mundial mãe x filha, percebo que ele


preferia estar aparando a grama. O que quer que esteja acontecendo aqui, Earl não quer ter nada a ver com o assunto. Mas é tarde demais. Minha mãe está determinada a ganhar um aliado e músculos extras para seu lado. Ela balança o pôster para ele, como uma mulher traída numa novela mexicana. - Isso! É isso que nossa filha tem feito! Earl, provavelmente ainda meio incerto do que exatamente está causando o colapso nervoso de minha mãe, demora um tempo para digerir o conteúdo do pôster. E em seguida acontece. Um sorriso se espalha pelo seu rosto, um pequeno brilho de alegria que nunca esquecerei até o dia em que morrer, e ele diz: - Roller Derby voltou? Bom, que diabo, costumava assistir isso na TV tarde da noite. Comprávamos uma caixa de cerveja, íamos para a casa de Freddy Jasper e tínhamos uma... - Earl! - Brooke grita, pulando da cama como um foguete. - Ela tem feito isso em segredo pelas nossas costas! O sorriso de Earl imediatamente desaparece enquanto ele volta pra fila do regime militar de Brooke. Me deixa tão triste, que as lágrimas que estive bravamente lutando para segurar começam a arder em meus olhos e borram minha visão. - Por favor - imploro, como uma prisioneira implorando para ver o sol. Apenas escute, OK? Pela primeira vez, não me sinto uma aberração completa ou como se tivesse algo errado comigo. - Você não vai andar por aí com essas garotas e suas tatuagens. Não é coisa de mulher. - Bem, então acho que temos ideias diferentes sobre o que significa ser uma mulher - suspiro. - Sei que menti, e realmente sinto muito. Pode me deixar de castigo depois. Mas me deixe ir agora. Por favor. Pai? Meu pai olha para mim. Sei que quer dizer sim, mas Brooke joga para ele um olhar "Earl Cavendar, nem pense nisso", então ele diz: - Você mentiu, garota. Não tem como se livrar dessa. Então jogo a última carta do meu baralho. Me viro, corro para meu quarto, e bato a porta. Na verdade, bato duas vezes só para expressar realmente a minha mensagem: Odeio vocês dois! Runaways - a primeira banda de Joan Jett e eu

Então, estou sentada aqui no meu quarto transformado e imaginando-o pegando fogo, o que é reconfortante, mas apenas por alguns minutos. Começo a sentir que vou surtar de novo. Essa coisa de castigo-até-segunda-ordem é uma babaquice completa. Meu relógio marca 5h13. Malice estará no estacionamento do OJ em dezessete minutos, e quer saber? Estarei lá para encontrá-la. Com patins ou sem patins, minha bunda estará naquele banco do carona em direção a Austin. Agarro minha mochila da Emily the Strange e enfio quantas roupas consigo dentro, até a costura gritar e implorar por misericórdia. Então pulo pela janela e saio correndo. Inicio uma corrida louca para encontrar Malice, o que parece dramático, mas confie em mim, é difícil não se sentir uma fracassada correndo pelas ruas de Bodeen, Texas, com uma mochila Emily the Strange entupida batendo na


sua coxa e escorregando de seu ombro a cada passo. Mas, pensando bem, acho que não tem um jeito maneiro para espontaneamente fugir de casa. Graças a Deus, Malice chega na hora. Ela derrapa pelo estacionamento como um carro de fuga num filme policial e ladrão, uma trilha sonora irada grita pelos alto-falantes completando o cenário: Obrigada, New York Dolls. Abro a porta do passageiro e rapidamente olho a janela do OJ, onde Pash e HomemPássaro estão fazendo uma dobradinha (isso é que é gente esforçada, pro seu governo). Homem-Pássaro murmura um "boa sorte", enquanto Pash olha de cara feia e vira de costas. Pravocêtambémgata, penso, enquanto me jogo na segurança e conforto do carro de Malice. - Onde estão suas coisas, Ruthless? - Malice pergunta. - Roubadas - respondo, o que não é exatamente mentira. - Merda. Bom, não se preocupe. Vamos pedir pra uma das garotas arranjar algo pra você - declara. Ela é uma boa moça, essa Malice. Nada nunca é um problema. Sempre existe uma solução. - Valeu - digo. - Pronta para acabar com a raça de algumas Holy Rollers? - Malice, nunca estive tão pronta em toda minha vida. Ela assente, tipo É isso aí, e levanta a mão. Retribuo e penso, Vem com tudo, Dinah. Não tenho medo de você! Tenho muita raiva que precisa ser canalizada esta noite. Discriminação por faixa etária

Assim que chegamos, Malice escancara a porta da Casa de Bonecas. - Tudo bem, vadias! É bom uma de vocês emprestar seu número 39 para Ruthless! Ela grita, tentando superar a tensão e barulheira pré-jogo - martelos ocupados fazendo consertos de última hora na pista, garotas discutindo qual cor de sombra faz com que pareçam 'mais rebeldes - sabe como é, o de sempre. Só que desta vez somos recebidas com silêncio, e não é um silêncio bom. É o tipo de silêncio que parece um tapa na cara. Vemos Razor se reunindo com as outras capitãs de time, e todas viram as cabeças ao entrarmos. - Que porra é essa, galera? Quem morreu? - Malice pergunta, tentando tirá-las do transe do que quer que tenha acontecido. - Malice, precisamos conversar - Blade diz. - Bliss, não o saia daí. Dinah me dá um olhar convencido, e ainda não registrei a gravidade da situação. Às vezes sou meio devagar, mas alguns minutos depois já estou a par de tudo. Segurem-se - não é bonito. Aparentemente a liga ficou sabendo que posso não ter exatamente 18 anos e, que, na verdade, tenho 16. O que, se me perguntar, não deveria ser grande coisa a essa altura. Posso patinar tão bem quanto - senão melhor, alguns diriam (não eu, porque não sou convencida assim) - todas as outras garotas. E o Senhor sabe que sei me comportar no quesito festa; sem problemas de imaturidade aí. Mas algumas pessoas são difíceis de agradar.


Por causa do escândalo da dura no outro dia, as capitãs de time estão com medo de que qualquer problema ponha a liga em risco de alguma maneira, ou, como Malice explica: - Ruthless, se você se machucar, seus pais poderiam nos processar e acabar de vez conosco. Ela meio que tem razão. Do jeito que minha mãe é irritante, poderia totalmente imaginá-la ameaçando tomar uma ação legal. Não seria a primeira vez. Mas não vou admitir isso. Ainda estou imaginando por que estão desconfiadas. Estou desconfiada da desconfiança delas. - Alguém ouviu um policial dizer que você tinha 16 anos na dura - diz Juana. - Pista anônima - Dinah completa, com tanto orgulho que poderia simplesmente ter EU TE DEDUREI tatuado na testa. Sabia que ela era baixa, só não sabia que era tanto assim. Se eu não fosse um exemplo tão grande de classe e cidadã modelo, teria chutado a cara dela com meus patins. Se tivesse meus patins. Ela tem sorte que não estou com eles - e isso é tudo que vou dizer. Malice parece prestes a chorar quando diz: - Desculpe, Ruthless, mas se não puder provar que tem 18 anos, não podemos deixá-la jogar. - Notinha mental: É sempre bom ter uma identidade falsa. Só por precaução. A essa altura, meu time inteiro já se reuniu à nossa volta. Esperava que estivessem com raiva, que me rodeassem como uma gangue de garotas cruéis numa missão para fazer de mim um exemplo, e que me batessem até eu virar uma massa de tomate. Em vez disso, todas estão gentis e muito... desapontadas. Finalmente, Emma diz: - E se conseguíssemos permissão dos seus pais? Se concordarem em deixar você patinar, não podem nos processar. Todas as outras garotas se empolgam com gritos de "É!", "Por que não?" e "Podia tentar isso". Realmente. São garotas doces, mas não têm ideia de com quem estão mexendo. E nem ao menos mencionei o fato de que fugi de casa duas horas atrás. Todas se viram e olham para mim, as esperanças e sonhos em relação ao jogo pairando sobre meus ombros magrelos. E, ainda assim, a crença delas em mim é sedutora. Começo a acreditar também. E esse tipo de força pode fazer você pensar coisas, fazer coisas - coisas doidas. ...In a Blaze of Glory

Triiin... triiim... No celular emprestado de Malice, espero meu pai atender do outro lado da linha. - Alô? - Hum, pai... - Bliss! Onde em nome de Deus você foi parar? Sua mãe está fora de si. Está em segurança? - Claro que estou em segurança. - Tem certeza?


- Não, pai, fui sequestrada por um bando de petroleiros morenos e exóticos e estou a caminho de Dubai para ser a esposa número oito num harém de escravas brancas. - Essa é sua ideia de humor? - Mais ou menos. Estou bem, OK? Tenho apenas uma pergunta rápida para fazer. Entre você e eu, pai. - Quando vai voltar para casa? - Pai, sei que acha que eu praticar Roller Derby é meio legal. Você nunca admitiria, mas está tão de saco cheio da ditadura de concursos de Miss quanto eu. Silêncio. - Então, pai, por favor, pode me dar sua palavra de que não vai processar as garotas se eu patinar? Mamãe não precisa saber. - Bliss. - Por favor? Uma eternidade de silêncio. - Bliss, vou te contar uma coisa. - O quê? - Tenho mais dois anos com você em minha casa. Mas tenho uma vida inteira pela frente com sua mãe. Está entendendo? - Sim, estou entendendo. Nunca vai enfrentá-Ia, vai? Não sei o que estava pensando ao ligar pra ele em primeiro lugar. Fecho o celular de Malice e dou meia-volta para encarar os rostos cheios de expectativa de minhas colegas de time. - Foi mal, pessoal - digo, balançando a cabeça. - Você tentou - Crystal Death diz, ajeitando suas meias arrastão. - Está bem? - Malice pergunta. - Tô - suspiro. - Mas meio que, tipo, preciso me mudar para sua casa. - Claro. - Ela assente e põe um braço à minha volta. Jogar para quê mesmo...?

Adoraria florear essa parte da história com algum tipo de espírito de nobreza "fizemos o nosso melhor, ainda somos vencedoras apesar de ter perdido engulam essa!", mas a simples verdade é que as Hurl Scouts foram massacradas pelas Holy Rollers. É claro que Dinah está desfilando por todo o lugar como se fosse o milagre divino da patinação, e ainda quero chutar sua cara com os patins que não tenho, mas estou meio ocupada no momento. Estou no telefone. Como a nova colega de quarto oficial de Malice, agora tenho acesso a um celular! Então, imediatamente ligo para Oliver, esperando falar com ele antes que toquem em - onde era mesmo? - Cleveland ou Cincinnati? Não importa. O que importa é que tenho de ouvir a voz dele de qualquer maneira. Sério. Se Oliver não pode estar aqui para me envolver com seus braços, então ficarei feliz em me envolver com o som de sua voz. Mas tudo que consigo é caixa postal. - Ei, é o Oliver. Me deixe algum amor. Biiiiip. Apesar de conseguir apenas a voz gravada de Oliver, é reconfortante escutar uma prova real da sua existência. Até pulo a parte de deixar recado só


para poder rediscar e ouvir sua voz de novo ... e talvez fazer com que atenda. Nada feito. Cai na caixa postal de novo. Respiro fundo e disparo uma mensagem tagarela que, pelo que me lembro, é algo do tipo: - Ei, rockstar, sou eu. Como está a vida? Estou bem, acho ... Bem, na verdade não. Estou meio em guerra com o mundo hoje, e o mundo está ganhando. Enfim, meio que saí de casa - longa história -, mas você pode me ligar de volta no telefone da Malice. Quando tiver tempo ... estou com saudades da sua voz e hum... de todo o resto. Apesar de estar bastante para baixo no momento (e acredite, não sei aonde vai dar, apenas que vou bem para baixo), sou grata de ainda ter o casaco de Oliver. É meu novo cobertor de estimação. Enquanto desabo no futon de Malice (no seu pequeno e perfeito apartamento cheio de coisas fabulosas de brechós e antiquários), escuto ecos de Velvet Underground que ela ouve em seu quarto. Tudo que consigo pensar é em Oliver e em como sentir saudades suas passou subitamente de uma irritação para uma dor. Dói fisicamente, do meu estômago até o resto do meu corpo. Mal posso esperar para que me ligue de volta amanhã para termos pelo menos alguns minutos para conversar. Minha guardiã ilegal

Malice leva minha mudança bem a sério. Ela se recusa a me deixar matar aula e insiste em levantar da cama a essa "hora maldita" para me levar até Bodeen sem que eu perca meu primeiro tempo. Ela até prepara um almoço no saco de papel para mim, que consiste num burrito congelado esquentado no microondas e enrolado em papel-alumínio para conservar o calor até a hora do almoço. E uma banana mais que madura como complemento. Acho que o que vale é a intenção. Me deixando na escola, Malice está com um roupão psicodélico dos anos 1960 que é a solução da moda para o café. Uma olhada para aquele pano colorido e você acorda: cafeína não é mais necessária. O roupão provoca vários olhares desaprovadores de meus colegas, mas Malice responde à altura. - Ei, baixinho - ela grita pela janela enquanto Matt Holtzman passa e ri -, eu não usaria essas suas calças de pregas nem morta, então dane-se. Ela se vira para mim e sorri. - Sabe, Bliss, se tivesse que aguentar esse lixo cultural diariamente, também teria fugido de casa e começado a jogar Roller Derby. Finalmente. Finalmente alguém que entende o que quero dizer. - Malice, me adota? - pergunto. - Nem pensar. Mal posso bancar minha faculdade - responde. E então começa a ficar séria, tipo, séria estilo conselheira estudantil (só que sem as bijuterias de abelhinha). - Ruthless - diz, remexendo um saco de Cheetos de validade duvidosa que tirou de debaixo do assento do carro -, adoro você pra caramba, todas nós adoramos, mas alguma hora vai ter que voltar pra casa e resolver as coisas com seus pais. - Não tem jeito. Eles não me entendem.


- Tem que dar uma chance a eles. Meus pais ainda me acham uma aberração de circo, mas sei que me amam - Malice diz. Seus pais têm seus motivos: ela está usando um roupão hippie florido, comendo um saco de Cheetos velhos e bebendo café frio de uma xícara onde está escrito "Melhor Avô do Mundo". Nem todas as famílias do mundo entenderiam a essência de Malice. - Sou super a favor de ser rebelde - continua -, mas às vezes tem que saber quando fazer as pazes. É cedo demais para digerir esse sermão improvisado, então saio do carro e sorrio: - Valeu, mãe. - Adeus, querida - diz para mim em sua melhor voz anos 1950, estilo June Cleaver. - Tenha um dia supimpa na escola! Sem olhar para trás, mostro o dedo para ela e continuo andando até a porta. Escuto sua buzina em agradecimento. Como poderia voltar para minha casa e minha família agora que tenho Malice? O presente que continua rendendo

Para perdedoras como eu, o único refúgio é a biblioteca da escola. Adoraria dizer que tenho devorado grandes obras literárias e expandido minha mente, mas ultimamente tenho passado a maior parte do meu tempo acampada num dos 23 computadores, na central de wi-fi em Bodeen. Tecnicamente, devemos usar os computadores da escola apenas para "trabalhos" (conforme vários cartazes colados nas paredes nos lembram o tempo todo), mas quem estamos tentando enganar? O mundo é do MySpace, e estou apenas vivendo nele. Os melhores cartazes, no entanto, são os amarelo-fluorescentes sobre entrar em qualquer tipo de "sites adultos na Web", ou seja, baixar pornografia. Qualquer estudante pego usando a propriedade da escola de uma maneira tão inapropriada será imediatamente expulso. Apesar do aviso sinistro, todo ano alguém quebra as risíveis medidas de segurança e começa a mandar fotos proibidas para todos. Enquanto tenho que admitir que garotos do colegial babando por causa de fotos de peitos e fotos nojentas de vaginas entram na categoria "totalmente deprimente", tem algo ainda mais deprimente sobre adultos tão sem noção que nem conseguem evitar isso. Além disso, é engraçado, e sempre torço pelo engraçado. Particularmente, sou grata pelo acesso livre aos computadores. Meu período miserável de almoço passa muito mais rápido quando posso esquecer o fato de que não tenho amigos de verdade, e então fico passeando pelo MySpace com os de mentira. Apesar de, confesso, poder já estar superando esse vício. Vou dar uma olhada no site dos Stats, curiosa para ver se Dylan, o baterista e nerd extraordinário, atualizou alguma coisa. Nada. Imagino se Oliver estará me ligando no telefone de Malice agora. Argh. Malice podia ter me deixado faltar à escola só para eu poder estar por perto quando Oliver ligar de volta. Vou para o scrapbook da turnê, uma nova adição ao site. Aah. Então é aqui que Dylan tem postado as novidades. Olho as fotos de turnê que caem


todas em uma das três categorias seguintes: (1) alguém da banda tocando no palco, geralmente banhado em luz azul, de vez em quando vermelha; (2) a banda em algum restaurante beira de estrada devorando comida barata; e (3) integrantes da banda, suados por terem acabado de tocar, segurando uma garrafa de cerveja numa das mãos e um cigarro na outra enquanto conversam com alguma pessoa aleatória que claramente acabaram de conhecer. Fãs. Não sei como explicar, mas ver fotos de Oliver me faz ter saudades de casa. Não sabia que era possível ter saudades de casa por causa de alguém, especialmente quando esse alguém que está viajando. Mas tenho. Acho que é em Oliver que mora meu coração. Dou uma olhada nas impressoras perto da mesa de entregas da biblioteca, tentando avaliar se conseguiria me safar ou não com uma impressão da minha foto favorita de Oliver. Quase morri quando vi. Está tocando baixo no seu clássico estilo cabeça abaixada, cabelo no rosto, mas dá pra ver um de seus olhos por baixo da franja, e ele está com um pequeno sorriso. Tipo, está tentando parecer tranquilo, mas está se divertindo tanto que não consegue evitar. E o melhor de tudo, Oliver está usando minha adorada camisa do Stryper. No palco! Nunca pensei que uma foto de metaleiros dos anos 1980 em calças de lycra pareceria tão sexy, mas quando essa imagem está esticada sobre os largos ombros e o peitoral do meu garoto tocando baixo ... é delicioso de babar. Mas então, como um ato criminoso que muda sua vida para sempre, algo dá errado. Terrivelmente errado. Noto outra foto na qual aparece a minha camisa do Stryper. Não consigo entender direito o que se passa naquela fotinha, mas... Meu coração dispara quando clico na foto e a amplio. A imagem subitamente enche minha tela com uma verdade cruel para a qual não estou nem um pouco preparada, como se estivesse andando pela rua num dia de sol e de repente - crash - do nada, fosse atropelada por um carro. Minha camisa do Stryper definitivamente está na foto e Oliver também, mas ele não está usando a tal camisa. Outra pessoa está. Uma garota, uma loira sorridente que gostaria de agora em diante me referir para sempre como Aquela Piranha Maldita Na Minha Camisa Do Stryper. E ela está se jogando em Oliver. Não apenas suas mãos e corpo, mas rastros de seu batom. E eles parecem repulsivamente felizes. Pelo visto, Oliver teve bons tempos com APMNMCDS. Depois de mais algumas investigações, vejo os dois no fundo de uma foto de Hank, se beijando contra uma van. Pensando bem, ser atropelada por uma carro teria sido melhor do que isso. Pelo menos estaria inconsciente a essa altura. Em vez disso, estou acordada, bem acordada. Meu corpo inteiro parece estar pegando fogo e tenho que dar o fora daqui. Para longe deste computador, desta biblioteca, desta escola, desta cidade, deste planeta. Tenho de ir. Corra Forrest, corra

Estudos mostram que pessoas em crise podem realizar atos incríveis de força física, o que provavelmente explica como consigo passar correndo pelo guarda da escola e sair pela porta da frente. Bodeen High supostamente tem tolerância


zero para coisas como uma garota correndo porta afora no meio de um dia de aulas, mas uma garota com um coração recém-partido burlando a segurança? Eles não têm a mínima chance. Tudo que sei é que não tenho ideia de para onde estou indo e não consigo parar de correr. Me sinto tão exposta que o sol machuca, o vento arde, e não consigo me livrar dessa onda de dor súbita que me joga contra a praia. Que porra foi essa que acabou de acontecer? Minha mente está acelerada com um filminho de tudo que se refere a Oliver - vendo-o pela primeira vez na primeira partida de Derby quando era apenas Señor Sensual, ouvindo Velvet Underground com ele, a surpresa dele parado no estacionamento do Oink Joint, jogando Stampede, conversando às três da manhã, beijando, sendo beijada, música, música, música, e rindo, rindo, rindo. Era tudo mentira. O que foi que fiz de errado? Por que não fui boa o suficiente? E como Malice podia estar certa? Tentei tomar cuidado, tentei mantê-lo interessado com meu sarcasmo e encontros inocentes para provar que não era fácil, para provar que não ia ficar toda caidinha por ele só porque toca numa banda. Fiz com que ele provasse seu valor para mim, o fiz merecer - e mereceu. Então dei tudo que era meu para ele: minha confiança, meu coração, minha alma, tudo. Dei tudo para ele cinco vezes em seu quarto enquanto esquecia completamente da minha melhor amiga. E agora ... só queria pegar tudo de volta. Baixo, mais baixo, baixíssimo

Devo ter desmaiado porque não sei quem nem o quê me trouxe até aqui. Tudo que sei é que estou sentada no chão de uma cozinha familiar em frente a uma porta de geladeira gigante. Me dou conta de que estou com fome. Bem, não tanta fome quanto necessidade desesperadora de enfiar o máximo de comida que conseguir na boca para evitar que comece a gritar. Faz sentido? Claro que não, mas estou em dolorosa queda livre. Abro com força a porta da geladeira e começo a esvaziar seu conteúdo no chão ao meu redor até acertar o alvo com um potinho de restos de torta de carne moída. Eu amo torta de carne moída. Tiro a tampa e vou à forra. Escuto o leve chacoalhar de chaves a distância, mas continuo comendo, tentando me distrair de todos os pensamentos tos esperançosos "isso deve ser algum mal-entendido - Oliver me ama de verdade" que correm pela minha cabeça. É difícil se enganar quando se é uma pessoa esperta, mesmo quando se sente burra. Explicações fajutas e carentes não vão mudar o que agora sei sobre Oliver. Me sinto tão... usada. Olho para cima e lá está ela - Brooke. Estou tão surtada neste momento, que nem percebi que estava na minha própria casa. Não era esse meu plano. (OK, não existia um plano na verdade, mas não esperava acabar aqui.) Ela olha para mim. Eu olho para ela. Não venho em casa há três dias, mas parecem três anos. Ela não conseguiria nem começar a imaginar pelo que passei. Como um animal


encurralado e confuso, começo a entrar em pânico, querendo escapar, mas sem saber como. Não consigo nem encontrar palavras. Tudo que consigo dizer é "Por favor, apenas ... " antes da represa que segura minhas lágrimas começar a ceder e então vir a enchente. Tenho certeza que dá a ela uma satisfação triunfal me ver chorando incontrolavelmente em frente a um pedaço de torta de carne, mas não consigo parar. Brooke dá um passo em minha direção e me preparo para o novo round de luta livre para o qual deve estar prestes a me convocar. Não ligo se estiver de castigo até os 65 anos, apenas não tenho energia nesse momento. O que quer que aconteça, ela ganhou. Mas outra coisa acontece. Ela coloca uma das mãos sobre seu coração e suspira: - Ah, coelhinha... Ela chuta um tablete de manteiga para fora do caminho e se ajoelha a meu lado. Estou chorando tanto, que demoram vários segundos até perceber que os braços de minha mãe estão à minha volta, me ninando. Ela é quente e macia, e é uma sensação tão boa, como se tivesse 5 anos e ela estivesse me confortando com seu amor. Pode rir, mas é a verdade. Talvez seja alguma linguagem mãe/filha secreta nunca mencionada, mas mesmo que nunca tenha dado um pio a ela sobre Oliver, parece saber exatamente por que estou tão devastada. Ela ajeita meus cabelos para trás e diz apenas uma coisa: - Quem quer que ele seja, não merece você. - Mãe, acho que vou morrer - digo. - Não, não vai. - Não, é sério, acho que vou. Ele deu a ela minha camisa do Stryper, e ela estava usando. Como se faz isso com alguém? Minha mãe continua me abraçando e então diz: - Stryper? Fui vê-los quando era uma caloura na Texas Christian. Meu Deus, aqueles rapazes tinham o cabelo maior que o meu. Eu rio. A ideia de minha mãe curtindo heavy metal cristão dos anos 1980 - cantando junto "To Hell with the Devil" - é uma surpresa tão bem-vinda. Ela nem imagina. Cupcake

OK, pode dizer. Vá em frente. Tive o coração partido por ______ (não pronuncio mais seu nome), e a primeira coisa que faço é ir correndo para a casa da mamãe. Bem, e daí? Não ligo se não sou durona. Estou apenas tentando sobreviver a essa altura. Minha vida está por um fio. Vou para meu quarto e tiro uma soneca de uns mil anos, o coma do sono. Por mais legal que seja ser a colega de quarto temporária de Malice, nunca consigo dormir direito lá. Esse quarto idiota, nessa casa idiota, nessa cidade idiota é onde durmo melhor. Acho que é meu lar. Por enquanto. Acordo com um dos meus cheiros favoritos, cupcakes quentes. Minha mãe bate em minha porta e entra carregando uma bandeja de cupcakes de chocolate recém-saídos do forno - receita original, com recheio de chocolate e


cobertura de chocolate. São uma bomba de açúcar completa, mas tãããão bons de vez em quando. - Obrigada, mãe, mas não estou com muita fome - digo. Ela deixa a bandeja perto do som. - Pro caso de mudar de ideia. Eu mudo, e imediatamente pego um. Meu pai entra, vindo do corredor. - Aí está - sorri. - Tem sorte de ter aparecido. Estava prestes a colonizar seu quarto. Transformá-lo num quarto para assistir futebol. Dê-me uma tela plana e... Mando de volta um olhar "nem ouse pensar em pintar bolinhas de futebol nas paredes do meu quarto" e ele me dá uma cutucada. - Bom ter você de volta, garota. - Tá, e desculpe por ter sido uma babaca no telefone. Meu pai balança uma das mãos como se não fosse nada. - Já esqueci. Ele beija minha testa, rouba um de meus cupcakes e sai. Enquanto minha mãe sai de meu quarto, ela acrescenta: - Acho que podemos esquecer a história do castigo por enquanto, não acha? Então, acho que a receita secreta para que seus pais sejam bacanas é ter uma grande briga, fugir de casa, e voltar três dias depois um caco emocional. Não podem te sacanear nesse estado. O que é bom. Não sei se aguentaria agora. Ter meu coração pisado por ______ já é punição suficiente. Em vista de tanta gentileza materna, decido responder minha mãe à altura. - Mãe. Se realmente quer que eu esteja no concurso de Miss Bluebonnet, eu vou - digo. Ela se vira. - Bem, não quero forçá-la. - Não. Quero ir - digo, o que é meio mentira, mas não é como se fosse me matar. Uma última aventura dos concursos. Vou me aposentar arrasando. Minha mãe se anima: - Bom. Isso faria muito bem a meu coração. Pash parte 2

Imagino que se minha mãe e eu conseguimos chegar a um acordo, então ainda existe esperança para mim e Pash. Levanto cedo, corro até sua casa e me escondo no banco traseiro de seu carro, deitando enquanto espero. Ela nem me nota quando joga os livros no banco e se prepara para ir à escola. Os livros por pouco não fazem contato com meu rosto. Graças à pontaria nada apurada de Pash para atirar coisas ainda tenho um nariz. Pash liga o carro e aumenta o som - é o novo CD do The Killers (O quê? Achei que tivéssemos concordado que, exceto pelo charme sedutor de "Mr. Brightside", aquela banda era só falatório.)


Deixo-a dirigir por algumas quadras antes de levantar do banco traseiro como uma criatura num filme de terror sangrento. Pash grita e freia com pressa. - Porra, Bliss. Me assustou pra cacete! - grita pelo retrovisor. - Desculpe - respondo. - Só que tinha de falar em um lugar em que você não pudesse fugir ou desligar na minha cara. Além disso, nunca tranca suas portas, então considere isso uma lição. E se eu fosse algum pervertido? Estaria supersequestrada nesse momento. Pash revira os olhos: - Desembucha. - Olha, sei que fui exilada do Reino de Pash e mereço totalmente. Fui uma péssima amiga e não importa o que aconteça, só quero que saiba como estou arrependida por ter estragado sua média. Só isso. Pash para num sinal e pulo de trás para o banco do carona, abrindo a porta para sair. No último segundo, sinto uma de suas mãos agarrarem as costas do meu casaco. - Volta aqui, sua imbecil - Pash diz. E, simples assim, ela reabriu os portões de mármore da amizade. - Senti sua falta! - Me sinto radiante enquanto nos abraçamos. - Senti a sua também. Tem sorte que ainda sou a primeira da classe, ou isso não teria funcionado. Por mais que o purgatório da amizade seja um saco, é tão bom ser perdoada que fazer besteira quase valeu à pena. Quase. Uma semana depois

Pash e eu voltamos à vida sintonizada de melhores amigas, o que proporciona muito alívio para a minha preparação para o Miss Bluebonnet. Nada distrai mais de ter de andar por um longo palco num vestido coberto de apliques de flores do que roubar meias do Wal-Mart. Tudo isso me ajuda a não pensar em ______ e suas mentiras. Dói demais se eu pensar por muito tempo no assunto, e não quero dar a ele esse poder sobre mim. Ele não merece. Pash até me apoia com um pouco de terapia ex-namorado. Queimamos o casaco de ______ num campo perto do Oink Joint, com todos os CDs que ele me deu. É cruel, mas ele também foi - tinha de ser feito. Senão, estaria tentada demais a ficar obcecada por ele. No trabalho, Pash continua cética sobre meus planos de participar do Miss Bluebonnet. - Está se vendendo - diz quando chego, após uma sessão no salão Curl Up & Dye e sem cabelo azul. Mas Pash não entende. Ela não estava lá quando minha mãe catou meus cacos do chão da cozinha sem uma única crítica. Além disso, esse concurso é uma tradição entre as garotas Cavendar. Minha avó ganhou aquela coroa, e minha mãe também; eu devia ao menos tentar. Não que espere ganhar. Vamos encarar a realidade. Quando chegar sábado, vai ser o show de Corbi do começo ao fim. E não se preocupe. Assim que a coroa for entregue, volto para meu azul Manic Panic.


Tem outra pequena informação revelada depois da Grande Reconciliação Bliss Cavendar / Pash Amini que tenho de dividir. Segurem-se firme, crianças, essa é uma bizarrice completa. Pash e Homem-Pássaro são oficialmente um casal. Mais ou menos. Você me ouviu. Minha melhor amiga estonteante e nosso magrelo varapau, gerente do Oink ]oint, se uniram. Realmente não tenho como explicar essa virada dramática de eventos românticos, então, sem mais delongas, dou a vocês Pash Amini em suas próprias palavras: Bliss, eu estava mal, OK? Você me abandonou e estava, tipo, a dois centímetros do chão de tão deprimida, e meu projeto "Melhor Mix de iPod de todos os tempos por Pash Amini" estava empacado. Era sábado à noite e o Homem-Pássaro estava me dando sermão sobre como limpar a grelha, e sei lá, simplesmente o agarrei. Queria bater nele, mas não sei como acabei beijando-o. Não tem desculpa, mas eu fiz. É claro, imediatamente o empurrei pra trás e disse: "Esqueça. Isso nunca vai se repetir." Mas o negócio é que - e é aqui que fica estranho - Homem-Pássaro beija incrivelmente bem. É como se tivesse relâmpagos no lugar dos lábios. Ficava pensando no assunto. Eu queria mais. E também não conseguia parar de pensar em como ficamos amigos desde que parei de andar com você. No começo foi uma coisa meio de desespero, mas quer saber? Depois que ele esquece aquela coisa de tentar-forçadamente-demais-ser-legal, ele realmente é... legal. É inteligente, engraçado, sabe todo tipo de informação inútil e divertida e tem a mente aberta quanto à música boa. É claro, é um desastre no departamento de estilo, mas estou trabalhando nisso. Notou que ele raspou aquele bigode fininho? Isso aí, pode me agradecer por essa. Deus, como ele beija bem. Então Pash cai na minha cama com um suspiro sonhador. - Não vai fazê-lo usar um moicano, vai? Porque acho que o mundo não está preparado para um Homem-Pássaro metade careca - digo, tentando me ajustar à esquisitice de Pash e ele serem um casal. - Nunca! - promete. - Então, tá. Estou muito feliz por você. Pash se levanta, toda defensiva e arisca: - Não esteja ainda. O Homem-Pássaro não é meu namorado. É só um... projeto. Tá bom. Algo me diz que Pash e o Sr. Relâmpagos no Lugar de Lábios vão ser um casal oficial mais cedo que tarde. E honestamente. Não tem como negar o coração bem-intencionado do Homem-Pássaro. Ele é um cara legal, não o tipo de babaca que levaria sua camisa favorita do Stryper na turnê dele e a daria de lembrança para alguma prostituta aleatória atória que ele arranja enquanto convenientemente esquece que você algum dia existiu. Enquanto Pash me ensina os detalhes de todas as coisas sobre Homem-Pássaro, meu pai bate na porta.


- Bliss, telefone. Alguém chamada Malice? No País das Maravilhas? ele pergunta como se estivesse duvidando de que eu realmente conheceria alguém com esse nome. - Valeu, pai. Já atendi - digo, pegando o telefone. - Ei Malice! Como é que está? - Escuto sons de um frenesi derby ao fundo. As Hurl Scouts estão ocupadas se preparando para o próximo jogo do campeonato no sábado, uma revanche contra as Holy Rollers que vai ser basicamente inútil. - Ruthless! - Malice grita. - Me diga que vem à partida para torcer pela gente. Posso ouvir Kid Vicious, Crystal Deth e Emma Gedden se reunindo em volta do telefone de Malice. - É! - Crystal grita. - Você é a alma do time! - Não posso. É na mesma noite do meu concurso. Estarei lá em espírito - digo, meio forçado. Como se isso algum dia tivesse significado alguma coisa. Quando desligo o telefone, Pash olha para mim e dispara: - Tem saudades, não tem? - Não. - É a pior mentirosa de todos os tempos - diz, antes de voltar a conversa para ela e Homem-Pássaro, porque realmente já não falamos o suficiente sobre isso esta noite. ZZZZzzzzzzzzzzzzzzz. Alergia a faixas

Minha nossa, se eu já achava que o frenesi de minha mãe por tiaras era algo para detestar, descobri que era apenas um aquecimento para em quem ela se transforma no dia do concurso Miss Bluebonnet. Senhoras e senhores, favor contemplar: Mãe-de-Miss Neurótica. De hora em hora, sou preparada, pinçada e alfinetada, e nem chegamos ao clube ainda. Será que ela realmente acha que posso ganhar? Quero levantar uma de minhas mãos na metade do dia e dizer: - Alô, lembra de mim? Sou Bliss, a que ganha o "Certificado de Participação", não a coroa. Não que isso fosse acalmá-la. É uma mulher numa missão e esse é o último concurso de minha vida, então pra que me rebelar? (OK, sim, há muitos motivos para se rebelar sempre que garotas estão sendo recompensadas por sua beleza com uma coroa brilhante, mas essa é a nova eu, a madura, a que está tentando manter a paz.) Duas horas, um vestido feito sob medida e cem fotos depois, estou estacionada nos bastidores em meu próprio espelho, fazendo minha maquiagem. Trouxe Pash comigo para ser meu amuleto da sorte, mas na verdade é só para me fazer companhia e evitar que eu enlouqueça e tente matar todas as outras rivais irritantes do concurso. Enquanto Corbi e todas as outras que querem ser como Corbi correm pra lá e pra cá nos bastidores, numa competição nunca mencionada para ver quem consegue ser mais dramática, Pash e eu relaxamos no meu espelho. Quando começo a aplicar sombra azul nos olhos, Pash finge estar tendo convulsões.


- Pare - digo, rindo, deixando ainda pior o processo para aplicação da maquiagem medonha. - Não posso vê-la fazer isso com seu próprio rosto - declara. - Ei - argumento -, se vencer, ganhamos sorvete Bluebonnet grátis durante um ano. - Então espalha essa purpurina aí! - grita, folheando a cópia abandonada da revista de alguém. Ela zomba de todas as superestimadas e desnutridas atrizes. - Acho que deveria doar seu sorvete para essas garotas. - Sim - digo. - Para todas as garotas passando fome em Hollywood, esse Chocolate com Marshmallow é para vocês! Essa aventura não seria nem de perto tão divertida sem o Show de Pash Amini. Até minha mãe me deixa nas mãos capazes de Pash e fica zanzando pelo auditório, fazendo a social que gosta de fazer na Concursolândia. Mais ou menos às 18h07, somos notificadas de que o show vai começar pontualmente às 18h30 e que devemos estar prontas em nossa roupa "formal diurna", que é uma baboseira que quer dizer "roupa". Às 18hll a porta de emergência dos bastidores é escancarada por fora, e entra então o choque cultural mais louco que o mundo de concursos de Bodeen já viu. Tudo que escuto é a voz de Emma Gedden dizendo: - Larguem o gloss rosa e se afastem do espelho. Me viro para ver meu time de Roller Derby inteiro - cada uma das Hurl Scouts - andando pelo camarim. Crystal parece tão chocada em me ver quanto eu estou em vê-la: - Ruthless, o que foi que aconteceu com seu cabelo? Já vi carros alegóricos em paradas menores que isso. - Bem - digo, dando tapinhas em meu cabelo penteado pro alto e cheio de spray -, é assim que usamos em Bodeen. - Exatamente por isso temos que tirá-la daqui - Kid Vicious declara. - O quê? - pergunto, lentamente entendendo o fato surreal de que minha vida na patinação e minha vida nos concursos de beleza estão colidindo bem na frente de meus olhos. - Fizemos uma enquete - Crystal diz enquanto joga alguns olhares divertidos de "vou quebrar sua cara" para Corbi -, e as Scouts decidiram que preferimos abandonar o campeonato a patinar sem Babe Ruthless. - Eu voto em uma fuga - Pash diz, mostrando seu apoio à causa delas. - Suas doidas! - digo, completamente lisonjeada. - Foi o máximo terem vindo aqui. Mas não tem como pular fora sem matar minha mãe. E como se pegando a deixa, escuto-a entrando no camarim. - Bliss... ? Bliss Cavendar, onde está? - Brooke chama. Fico pálida, mais pálida que o normal- translúcida. - Galera, minha mãe está vindo. Escondam-se! - digo, balançando meus braços e surtando totalmente. Elas se espalham em direções opostas, tentando se misturar às outras participantes do Miss Bluebonnet. Meu coração está disparado quando minha mãe vem até mim. - Ei, mãe - digo casualmente. Nada para ver aqui. Pode sair. Ela me dá esse olhar sério, "Estou prestes a ter com você uma conversa de coração de mãe para filha" , e rezo para que seja rápido.


- Coelhinha, só quero te dar um presente de boa sorte para sua grande noite - diz. Então me entrega uma bolsa, uma sacola pesada de mercado que é bem diferente do estilo Brooke Cavendar de embrulhos perfeitos. Abro a sacola e puxo (mentira! meus patins.) Meus patins, meus patins, meus patins, meus patins, meus patins, meus patins! - Agora vamos dar o fora daqui - completa. - Como é? - pergunto. - Shania sim, leva jeito. Ela será Miss Bluebonnet algum dia. Mas você; você é Babe Ruthless. E tem um campeonato para ganhar. Me ocorre que não apenas ela está devolvendo meus patins, mas também minha liberdade. Sinto meus olhos marejando com lágrimas de gratidão. Minha mãe, sem perder o fio da meada, dá uma olhada em volta do camarim e pergunta: - Qual de vocês inventou esse nome, afinal? O braço tatuado de Malice leeeentamente levanta detrás de uma arara de vestidos de babados e ela se revela. - Esperto - diz minha mãe. - Mas não quero vê-lo tatuado no braço dela. - Combinado - Malice diz, antes de abraçá-la. - Obrigada, mãe! - grita. Conversas futuras irão revelar que Earl foi quem começou a guerra em meu favor. Não sei se ele a chantageou, deu uma chave de braço ou ameaçou fazer um mutirão pelas ruas, mas o que quer que tenha feito, funcionou. E isso significa mais para mim do que qualquer coisa que aconteça no jogo. E sim, muitos agradecimentos a Brooke por me libertar da jaula Miss Bluebonnet. Não pode ter sido fácil para ela virar aquelas chaves. O significa...

No que deve ter sido a maior virada da sorte na história de nossa pequena liga, uma hora depois estou vestida no meu uniforme das Hurl Scouts e pronta para ir. Convenço minhas garotas a manter em segredo as notícias da minha volta para surpreender o pessoal. - Qual é, não vamos contar a ninguém até começar a introdução. Então Atom Bomb é quem vai anunciar meu nome - digo, convencendo-as sobre minha ideia. - Isso, todo mundo vai pirar! - Emma acrescenta, me apoiando. Então aqui estamos, na partida da temporada, com as Hurl Scouts enfrentando as ainda invictas Holy Rollers. (O que acho chato a essa altura. Eba, você. Ganhou de novo, que super-hiper-legal.) Todos esperam que as Rollers patinem até a vitória sem nem um rasgo em suas meias-calças arrastão. Bom, a grande coisa sobre a vida - conforme estou aprendendo - é que coisas inesperadas acontecem no caminho, e quando Atom Bomb me anuncia, por último, a multidão realmente pira. Ahhh. É bom estar de volta, mas é ainda melhor ver a expressão chocada de Dinah. Sorrio quando vejo seu mecanismo interno começar a dar defeito e uma pequena nuvem de fumaça zangada sair de seu capacete. É o momento surpresa do século, e estaria mentindo se dissesse que não adorei cada segundo dele.


Da pista, vejo minha família sentada nos bancos, apertados entre um bando de roqueiros caipiras fortões com os braços cobertos com tatuagens. Brooke aparenta estar hilariantemente aterrorizada enquanto aperta Shania com força em seu colo. Earl olha em volta, meio confuso, como se estivesse esperando instruções sobre como se comportar. Me vem à mente que, se ao menos tivesse uma câmera, esse seria o cartão de Natal perfeito da família Cavendar, não que eu seja responsável por essas coisas. Mas seria genial. Razor apita e o jogo começa. É claro, não patino há duas semanas e demoro algumas voltas para sacudir a poeira, então Dinah e as Rollers pulam para uma vantagem de 11 a 6. Seus fãs não perdem tempo em mostrar apoio gritando "Rollers! Rollers!" Mas quer saber? Não menti para meus pais, criei uma vida secreta e fugi de casa para deixar Dinah Might roubar a cena justo na noite em que minha família vem ver o motivo de eu ter me virado de cabeça para baixo. Podem não ver Miss Bluebonnet, mas com certeza vão ter um show de Babe Ruthless. E começa agora! Na rodada seguinte, passo bem no meio das pernas de Robin Graves das Holy Rollers e através do bando. Quando volto para a pista para marcar, Emma se equilibra numa perna e eu pego impulso na sua perna tamanho Texas, que me manda voando para fora, e na frente de todas as Holy Rollers. E fazemos de novo, e de novo, e de novo, ganhando a liderança. O canto da torcida muda de "Rollers! Rollers!" para "Ruthless! Ruthless!". O lugar inteiro está elétrico enquanto todos alegremente antecipam a primeira derrota das Holy Rollers. Estou com vocês, pessoal. - As Holy Rollers podem ter Deus a seu lado - grita Atom Bomb da cabine de anúncio -, mas essas Scouts estão prestes a ganhar suas medalhas da vitória! Olho pros bancos e vejo minha mãe, Earl e Shania, todos em pé e gritando. Até vejo minha mãe pulando e cumprimentando os roqueiros caipiras fortões. Agora, isso sim é cartão de Natal. Indo para a corrida final, o placar é Holy Rollers, 34, Hurl Scouts, 38. Se as bloqueadoras de Dinah me impedirem de marcar, ela pode facilmente igualar a diferença. Mas isso se - não ligo para que cartas essas colegiais safadas tenham escondidas nas mangas. Não. Vou, Ceder. Dinah e eu nos alinhamos, e trocamos olhares glaciais. Ela parece terrivelmente confiante para alguém prestes a perder, apesar de que, olhando de perto, consigo enxergar uma psicose louca brotando em seus olhos. - Não pode vencer, Ruthless - Dinah diz friamente. Sorrio. - Beije meus patins, Dinah. O apito soa e ambas disparamos como foguetes, mas Dinah me corta na primeira curva, ganhando a liderança. Dou impulso vigoroso, tirando tudo o que posso da força de minhas coxas. Malice e Emma fazem um paredão para desacelerar Dinah, mas ela se abaixa e roda entre as duas.


A multidão adora. Pulo por cima de Robin para sair do bloqueio, enquanto Dinah já está na metade do caminho para marcar seus pontos. Vai, vai, vai. Só não desiste, não desiste. Sou rápida, mas Dinah se esgueira pelo canto na minha frente, são os três segundos cruciais em que ela pode ultrapassar nosso bloqueio e marcar pontos antes que eu tenha a chance também. Não desiste, não desiste. Dinah vai por fora para contornar Emma, mas Malice saca um bloqueio estilo Super-Homem na hora perfeita. Ela detona Dinah com tanto gosto que todas as outras garotas caem também. Então estou voando não para um bando, mas para uma pilha de sete Holy Rollers e Hurl Scouts emboladas. Fecho os olhos, faço uma pequena oração, e pulo sobre os escombros... ...E passo por todas! OK, então eu quase caio de bunda, mas me safo aparando a queda com os joelhos, e volto à minha posição de pé. O que me falta em estilo, compenso com pontos - quatro para as Hurl Scouts, nenhum para as Holy Rollers. Estamos todas nos abraçando e chorando como se fosse o melhor momento de nossas vidas. Uma coisa é certa, ver um monte de garotas Derby malvadas aos prantos, enquanto os delineadores pretos escorrem por suas bochechas é bastante engraçado. Não vou falar e falar e ser supermetida sobre a coisa toda, mas preciso confessar que ganhar o campeonato é bom pra k.c.t. Minha mãe, papai e Shania correm das arquibancadas e me enchem de abraços. Meu pai está fora de si: - Rapaz do céu, vou te contar, já vi uns bons jogos na minha época, mas isso aqui supera tudo! Não que Earl fosse confessar, mas sempre tive a impressão de que ele adoraria ter um filho que jogasse futebol. Acho que eu praticar Roller Derby pode ser quase tão bom quanto. Viro-me para minha mãe, que está balançando seu pompom verde das Hurl Scouts. - Ah, minha nossa, aquilo foi tão assustador! - Ela dá gritinhos e então acrescenta: - Mal posso esperar pela próxima temporada. Tenho de fazer uma camiseta "BABE RUTHLESS É MEU BEBÊ". Shania olha para cima e diz: - Mamãe, quando posso ter meus próprios patins? Brooke responde com um olhar de ih-merda. Quando meus pais dão o fora do lugar, me encontro rapidamente sozinha, observando a cena, deixando todo esse dia ser absorvido por mim. Sei que vou visitá-Io muitas vezes pelo resto de minha vida. É bom ter algumas memórias assim guardadas. Então escuto - aquela voz, aquela voz familiar. - Belo jogo, sexy - diz. Meu estômago revira. Dou meia-volta, e lá está ______. - Desculpe não ter podido ligar. Foi tudo uma loucura - explica. Gostaria de dizer que ele está horroroso, que engordou, que subitamente foi invadido por uma acne deformadora. Mas a verdade é: o garoto é muito gato. E ninguém veste uma camiseta rasgada tão bem quanto ele.


Pela primeira vez no dia, não me sinto forte. Então assim é a vida? Mesmo quando se tem o melhor dia de todos seus amigos torcem por você, seus pais finalmente a entendem (pelo menos por enquanto), você conquista algo em que é realmente boa - uma pequena bola de chatice tem que vir voando em sua direção e estragar tudo? Olho para Pash e Homem-Pássaro juntos atrás da pista, empurrando um ao outro, rindo, e parecendo completamente apaixonados. Uma pin-up anos 1950 e o nerd que a adora. É tão errado que é certo. E é aí que me dou conta. Com ______, era tão certo que era errado. Bom demais para ser verdade. - Então, vamos ficar juntos? Ou o quê? - ele pergunta, jogando seu delicioso charme para mim. Uns amassos rápidos parecem tentadores, mas sei das coisas. Sou uma garota esperta. O encaro e respondo: - Ou o quê. Agora, vou dizer isso só dessa vez e dessa vez apenas e nunca deve ser repetido novamente, mas minha mãe estava certa. Ele não me merece. Então me viro para ir embora. - Ei - ele diz e agarra meu pulso, mas sacudo até que solte. Enquanto patino para longe, ele é parado por uma barreira formada por minhas colegas de time, que subitamente aparecem para me dar apoio. - Um pequeno conselho - escuto Malice dizer -, não se meta com uma garota de patins. * Então, acho que devo resumir minha grande aventura Roller Derby com algumas revelações profundas sobre o que aprendi. Tá legal. Se aprendi alguma coisa, é que a vida é bem mais confusa do que você pensa. Seus pais deprimentes podem ter momentos de extrema maneirice, enquanto que as pessoas que você acha extremamente maneiras podem acabar se revelando uma decepção mesmo. E, sério, se puder te dar um pequeno, mínimo, conselho, é este: não namore um cara de banda. Repito, NÃO NAMORE UM CARA DE BANDA! Mas se insistir cegamente em ignorar a sabedoria acima, NÃO DÊ PARA ELE SUA ADORADA CAMISA DO STRYPER. Nunca vai vê-la novamente. Confie em mim. Aprendi do jeito difícil. (E, porra, sim, ainda dói, mas vou ficar bem.) Minha nova e melhorada meta é achar um cara que seja apenas obcecado por música como eu, mas que não toque música. Acho que esse é o segredo. Então, se conhecer alguns, mande-os para mim. U-hu!

FIM


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