O Índio no Poder: a atuação política do indígena brasileiro
O ÍNDIO NO PODER
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O Índio no Poder: a atuação política do indígena brasileiro
Copyright 2017 by Taiguara e.Books
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O Índio no Poder: a atuação política do indígena brasileiro
Jesus, Samuel de. Índio no Poder. As trajetórias e as vozes de Mario Juruna, Raoni, Ailton Krenak, Marcos Terena/ Samuel de Jesus – 2017. Taiguara e. Books l. Direitos. 2. Democracia. 3. Política. 4. Luta. I. Título.
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SUMÁRIO
I.
Introdução, p. 6
II. Raoni, p. 10 III. Mario Juruna, p.22 IV. Ailton Krenak, p.36 V. Marcos Terena, 47 VI. Partido indígena, p.59 Considerações Finais, p.63 Anexos, p.68 Sobre o autor, p. 97
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Introdução Uma das passagens mais subversivas da Literatura Brasileira está em “O triste Fim de Policarpo Quaresma” quando Policarpo defende o ensino de Tupi Guarani nas escolas. Foi uma das passagens literárias mais espantosas, ameaçadoras e desconfortáveis que a Literatura Brasileira poderia gestar. A ideia de ver indígenas no comando, o resgate de sua importância colide frontalmente com a ideia de civilização. Quem diria então, ver o índio na política? A única experiência palpável é a de Mario Juruna, eleito deputado em 1982. Juruna denunciou a classe política brasileira na sua flagrante hipocrisia e corrupção. Os pacotes de dinheiro e o seu gravador emitiam as provas cabais da corrupção nas entranhas do Congresso Nacional. Lembro-me, no Fórum Social Mundial de 2002 em Porto Alegre, quando conversei com Ailton Krenak. Falei sobre meu projeto de pesquisa do mestrado sobre o Sistema de Vigilância da Amazônia, o SIVAM. Convidou-me para comparecer no fórum indígena marcado para o dia seguinte e compareci. A questão da demarcação indígena, como não poderia deixar de ser, foi a temática principal. Notei que entre o público presente se encontrava também o exsenador Eduardo Suplicy. A terra, o chão como vida, lutas, sobrevivência, dignidade e identidade. Lembro-me também de Raoni que possui uma atuação militante e conheceu o cantor Sting. Juntos chamaram a atenção do mundo em relação ao que acontecia na Amazônia. Hoje a oposição à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte mobiliza o líder Kaiapó.
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Atualmente existe uma corrente entre os indígenas que promove a construção de um partido que leve em frente à defesa as causas dos povos da floresta, sobretudo em relação à demarcação indígena, em relação às questões de proteção do meio ambiente. Embora não seja um consenso entre a comunidade indígena, a criação deste partido levanta a questão da inserção do índio no sistema político brasileiro. Ailton Krenak afirma que seu povo precisa de representação, mas isto não quer dizer necessariamente a criação de um partido politico, pois teme o preço seja a homogeneização cultural de um povo tão heterogêneo. Do ponto de vista da política liberal eles não estão errados se considerarmos que existe só na Câmara dos Deputados uma bancada com mais de 200 deputados pertencentes à bancada ruralista. Este livro propõe entender a problemática da introdução do índio no sistema político brasileiro, mas do ponto de vista e da fala indígena. Aqui o considerado subalterno tem a palavra. Vivenciamos um momento de descolonizações ou a criação de novas identidades que sepultem a presença da mentalidade colonial europeia sobre o nosso cotidiano. Uma tentativa poderá ser a introdução do índio no sistema político, o índio no poder. Certamente não existe nada mais subversivo, pois além de darmos voz, eles chegariam ao poder para defender uma legislação que preserve o meio ambiente, influenciariam decisivamente sobre o processo de demarcação das terras indígenas e promoveriam mudanças no Estatuto do Índio (LEI Nº 6.001, de 19 de 1973), sua abolição ou a elaboração de um novo estatuto. O índio é o subalterno que ainda está submetido à mentalidade colonial. O que vem a ser isto? Da carta de Pero Vaz de Caminha, os Diários de Colombo, os relatos de Hans Staden em Viagem ao Brasil, o Caramuru: Diogo Alvares, José de Alencar de Iracema, O Ubirajara e o Guarani, sua tríade formadora da brasilianidade. O que entendemos sobre os povos apelidados pelo europeu de índios foi contado pelo homem branco. É hábito já secular não ouvirmos os povos originários, não lhes damos voz.
Os primeiros cronistas são europeus e possuímos apenas
fragmentos contados por eles sobre como homens e mulheres naturais desta
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terra. Quais eram e as suas primeiras impressões sobre aqueles homens vestidos dos pés à cabeça que chegavam do oceano em grandes canoas. Olhamos sempre pela retina do europeu. Para Aníbal Quijano (2005), o processo de colonização baseou-se na ideia de raça, o que produziu identidades como a dos indígenas, os negros e os mestiços. As relações sociais, sobretudo a estratificação social formaram hierarquias, lugares e papéis sociais. Na América a ideia de raça foi uma maneira de outorgar legitimidade às relações de dominação impostas pela conquista europeia. As novas identidades históricas produzidas sob a ideia de raça foram associadas à natureza dos papéis e lugares na nova estrutura global de controle do trabalho, assim cada forma de controle de trabalho esteve ligada a criação de uma ideia de raça em particular. Aos brancos europeus foi reservada uma posição de controle do ouro, prata e outros objetos valiosos obtidos pelo trabalho gratuito dos índios, negros e mestiços. O domínio colonial sobre todas as regiões e populações no mundo possibilitou esse controle. Desta maneira experiências históricas, recursos e produtos culturais terminam também articulados em uma só ordem cultural global. (Quijano, 2005) O Pós-colonialismo tem como um dos seus expoentes Gayatri Spivak que elabora uma importante pergunta em forma textual: pode o poder subalterno falar? Pensadora indiana questiona a possibilidade dos subalternos falarem ou terem autonomia. Seu pensamento problematiza suposições do pensamento pós-colonialista dos chamados: estudos subalternos, noções de resistência e ações políticas. Faz a critica às concepções de um sujeito homogêneo e monolítico. Propõe o estudo de categorias que refletem movimentos abrangentes caracterizados pela heterogeneidade ou falar do lugar do subalterno. Uma questão essencial é o questionamento das formas pelas quais os sujeitos do “terceiro” mundo têm sido representados pelo discurso hegemônico, por exemplo, o trabalhador. Refere-se à crítica aos relatos de representação do oprimido que através de um matiz libertário acaba por contribuir na manutenção de práticas essencialistas e imperialistas.
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Procuramos fazer a nossa análise a partir dos discursos dos líderes indígenas. As possíveis mediações levarão em consideração a fala do subalterno e partirá delas para entender os limites da participação indígena no universo da política liberal e burguesa. Neste ínterim a atuação política de Mario Juruna como deputado federal é um objeto muito importante, pois ele mostra os entraves á inserção do indígena na sociedade dos brancos. Ele foi o primeiro e único deputado eleito e enfrentou sérias e graves oposições à sua atuação. Ele não poderia compreender o sentido daquele universo hipócrita e chegou por breves momentos a se corromper, terminou seu mandato enfraquecido politicamente devido às armadilhas postas em seu caminho pelo homem branco. Ailton Krenak é de uma geração de líderes indígenas que estudaram e compreenderam a dinâmica da política brasileira e possui uma ideia muito clara em relação às limitações na criação, por exemplo, de um partido político indígena. Raoni fez da militância e a busca de apoios no exterior, ferramentas para denunciar o desmatamento nas terras Kaiapós. Atualmente Belo Monte é o seu mote de luta. É o maior opositor desta Usina Hidrelétrica. Reunimos suas falas em depoimentos, entrevistas e discursos.
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RAONI
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I
Ninguém sabe ao certo o dia em que Raoni nasceu, estima-se que tenha sido em torno de 1930. A localidade de seu nascimento é o vilarejo de Krajmopyjakare, hoje chamado somente Kapôt em Mato Grosso. Com 15 anos Raoni foi guiado pelo seu irmão Motibau a instalar o seu labret, adorno que carrega ainda hoje em seu lábio inferior. Este é o objeto símbolo dos guerreiros dispostos a morrer por sua terra. Em 1954 se encontrou com os irmãos Villas Boas e foram com eles que começou a aprender a língua portuguesa e, sobretudo a consciência de que existiam outros mundos, diferentes daquele ao qual estava acostumado. O encontro com o jovem cineasta Jean Pierre Dutilleux ocorreu em 1973. Anos mais tarde produziu o longa metragem com o nome de Raoni. O filme concorreu ao prêmio Oscar. O filme chama a atenção do mundo para a preocupação dos Caiapós em relação ao desmatamento. Em 1984, apareceu em público armado e pintado para a guerra a fim de negociar com o ministro do interior, Mário Andreazza, a demarcação de sua reserva. Durante a reunião com o ministro, deu-lhe um puxão na orelha e lhe disse: "Aceito ser seu amigo. Mas você tem de ouvir índio". No jornal indígena “Porantim” de junho-julho de 1982, noticia a ida dos líderes Raoni, Krumare e Kokoretire para Brasília levando um ultimato: ou a funai demarca até setembro (de 1982), uma faixa de terra para separa suas reservas das fazendas instaladas nas margens do Rio Xingu, ou eles próprio o farão (...) até mesmo a violência poderá ser usada se houver a resistência por parte dos fazendeiros. Raoni, afirmou:
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Antigamente, meu paí, minha mãe, minha avó eram livres. Não tinha gente como tem agora, que está enchendo o saco do nosso Kaiapó, então eu acho muito bom, muito melhor para mim e para o branco também, que o branco vai deixar nosso mato, nossa terra. Demarcar direitinho, aí vai muito bem pra nós não esquentar a cabeça de jeito nenhum”. Fonte
Depois do encontro com o cantor Sting no Parque Indígena do Xingu em 1987, Raoni alcançou notoriedade internacional. Em 12 de outubro de 1988 participou com Sting, em São Paulo de uma conferência de imprensa da turnê Human Rights Now! da Anistia Internacional. Diante do impacto do evento, Sting, sua esposa Trudie Styler e o cineasta belga Jean-Pierre Dutilleux vieram a ser cofundadores da Rainforest Foundation, organização criada para sustentar os projetos de Raoni. Dentre esses projetos, a maior prioridade era a demarcação dos territórios caiapós, que estavam sendo ameaçados por invasões de colonos. Em 21 de maio de 1989 o jornal O Estado de S. Paulo publicou artigo assinado por Reali Júnior, intitulada: Uma dupla excêntrica luta pela floresta. Menciona: “Uma nova dupla causa sensação e chama a atenção do mundo. O cacique Caiapó Raoni e o músico inglês Sting (...) nas últimas semanas os dois empreenderam uma turnê internacional por diversos países – entre os quais Estados Unidos, Dinamarca, Inglaterra, França e foram recebidos e foram recebidos como autoridades em Amazônia por interlocutores como o Primeiro Ministro espanhol Felipe Gonzáles, o príncipe Charles e o Papa João Paulo II”. FONTE
Em vídeo Raoni aparece ao lado de Sting e J. P Detilleux. Sting faz uma pergunta em inglês e J.P. faz a tradução da pergunta para RAONI em português. A pergunta era: “Ele que saber o que está acontecendo com seu povo lá no mato?” Raoni, responde: “Aconteceu...meu povo tem doença...tem queimado mato...acabando rio também..é por isso que eu tô muito preocupado com meu povo que acaba o mato, é por isso que eu pedi para você ajudar...conseguir dinheiro para demarcar terra para não mais acontecer problema...essa é a minha pensamento...sempre que os meu espirito tão avisando, quando povo acaba mato, não tem mais sombra aí vai começa o vento muito forte, vai começa sol muito quente, aí não vai dá pra respirá mais, não só nóis índio vai morre, todo mundo vai morre, essa é a
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minha preocupação, tô avisando vocês, tem que pensa, tem que muda ideia...” FONTE
A grande turnê que Raoni empreendeu com Sting em dezessete países de abril a junho de 1989 lhe permitiu divulgar sua mensagem em escala planetária. Doze fundações Floresta Verde foram criadas no mundo com o objetivo de recolher fundos para ajudar na criação de um parque nacional na região do Rio Xingu, na Amazônia, com uma superfície de mais ou menos 180 000 quilômetros quadrados. Em fevereiro de 1989, Raoni foi um dos mais ferozes opositores ao projeto da barragem de Kararaô (hoje, conhecida como Belo Monte). As emissoras de televisão do mundo inteiro estavam presentes para recolher suas propostas em Altamira no momento de uma gigantesca assembleia de chefes que ficou registrada nos anais daquela cidade. O projeto de barragem foi finalmente abandonado. O projeto acabou sendo depois retomado com pequenas alterações. Transformando-se no embaixador do combate pela proteção da floresta amazônica e dos povos indígenas, Raoni Metuktire, depois do ano de 1989, efetuou numerosas outras viagens pelo mundo, como, por exemplo, uma visita aos esquimós da costa norte de Québec, no Canadá, em agosto de 2001. Ou a visita ao Japão em maio de 2007. Voltou também à França em 2000, em 2001 e em 2003, recebendo o apoio de Jacques Chirac.
Belo Monte A Usina de Belo Monte está localizada na bacia do Rio Xingu, próximo ao município de Altamira, no sudoeste do estado Pará. Será a terceira maior usina hidrelétrica do mundo, ficando atrás somente das usinas de Três Gargantas na China e Itaipú na divisa entre Brasil e Paraguai. Seu custo, inicialmente, estava orçado em 26 bilhões de reais. Esta hidrelétrica sempre encontrou forte oposição de ambientalistas e de comunidades indígenas, o que levou seus
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gestores decidiram que seria a única usina no rio Xingu. Em 1975 a 1980 foram iniciados estudos de viabilidade técnica e econômica. A diminuição da vazão do rio Xingu e a proibição de transporte fluvial impedirão o transito dos moradores locais à região de seu entorno. A formação de lagos, artificiais, representarão impactos ambientais. Afetará os indígenas devido à impossibilidade da pesca, sobretudo o desmatamento e a ocupação desordenada do território. FONTE O documentário “Belo Monte – Depois da inundação”, do diretor Todd Southgate, que percorreu a cidade de Altamira e parte do Rio Xingu para registrar como estão indígenas e ribeirinhos, após o enchimento do reservatório da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte, no início de 2016. Após a exibição, um debate contou com a presença dos indígenas Jailson Juruna, afetado pela barragem de Belo Monte, e Edovaldo Datie Munduruku, que mora na região que seria afetada pela construção da UHE São Luiz do Tapajós, no Rio Tapajós, ambas no estado do Pará. Todd Southgate acompanhou o processo de construção de Belo Monte desde o começo e, em entrevista à Agência Brasil, disse que foi um choque quando presenciou os impactos após a inundação do reservatório. “Eu já estava filmando lá nos últimos sete ou oito anos. A primeira que fiz um sobrevoo na barragem, com o reservatório todo inundado. Foi um choque. Tudo o que você já viu, como estava a floresta, os lugares que você conheceu os pescadores, está tudo embaixo d'água. Foi mais pesado do que imaginava”. Há 25 anos o diretor produz documentários que dão voz a pessoas que sofrem pelo esquecimento ou por serem ignoradas. “Comecei a documentar Belo Monte para levar esse problema para outras partes do mundo. Minha missão é contar as histórias do meio ambiente, dos problemas sociais. Gosto de ajudar dando voz para eles, que historicamente não têm essa voz”, disse Todd. A usina fez com que a população de Altamira dobrasse. O desemprego ocasionado pelo fim das obras, o aumento do número latrocínios, a violência contra as mulheres são as marcas visíveis deste processo. Muitos ribeirinhos foram obrigados a deixar suas casas e mudarem para reassentamentos urbanos
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construídos pela NORTE ENERGIA. Essas casas foram mal construídas. Thaís Santi, Procuradora da República de Altamira afirma: “barrar o rio Xingu sem saneamento básico que evitaria um colapso sanitário na região. Sem um hospital que acolheria a sobredemanda?” A Lei não é aplicada, alegam, por interesses de Segurança Nacional. 10 mil indígenas de 11 grupos étnicos vivem ao longo do rio Xingu. As aldeias Arara e Juruna estão situadas a 10 km da jusante da barragem principal. Em 20 de fevereiro de 2016 foram encontradas mais de 16 toneladas de peixes mortos. A empresa NORTE ENERGIA foi multada em mais de 35 milhões. Esta mortandade de peixes foi ocasionada pelo enchimento do reservatório principal da usina de Belo Monte. FONTE Raoni é, com certeza, o maior opositor da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Ele é a figura se sintetiza a luta dos diferentes povos indígenas da região do Xingu contra esta obra. Ele atua internacionalmente contra esta Usina Em uma entrevista à televisão francesa divulgada na ocasião de uma turnê europeia (França, Bélgica, Suíça, Mônaco, Luxemburgo) em maio de 2010, Raoni declarou guerra ao projeto de Usina Hidrelétrica de Belo Monte, que ameaça os territórios indígenas situados na beira do Rio Xingu, no estado brasileiro do Pará. “Neste momento, todos os indígenas estão aqui lutando contra a construção da usina de Belo Monte em Altamira. Nós indígenas não aceitamos a construção da usina aqui. Ela não atingirá somente Altamira, não só aqui no rio Xingu que fica próximo a Altamira. O rio Xingu tem que estar vivo, tem que estar limpo, não precisa da construção de Belo Monte. Se a usina for construída, causará danos, prejudicará medicinas tradicionais, estragará os peixes que nós consumimos no rio Xingu. Neste ano eu estive com Jacques Chirac. Eu conversei com ele e expliquei a situação, o que está acontecendo aqui em Altamira, a construção da usina Belo Monte. O presidente disse que vai apoiar, que iria apoiar esta questão. E pediu para que o governo brasileiro respeitasse os povos indígenas. Na mesma viagem eu conversei com outras autoridades lá da França e falei das mesmas questões sobre as quais havia conversado com Jaques Chirac”. FONTE
Belo monte e a perda do território
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Entrevista publicada por Brasil de Fato fala sobre a incapacidade dos Kaiapós de migrarem, como faziam antes, devido à perda de espaço, território: Antigamente, quando eu era bem pequenininho, os nossos ancestrais, os parentes, minhas famílias, mudavam de moradia indo a outros lugares e depois voltavam até mudar de novo. Mas hoje em dia nós temos só um território mesmo, não tem mais espaço como era antes. Esses territórios são como se fossem a nossa casa, não tem mais lugar para morarmos longe da nossa moradia. Então, hoje, os jovens da nova geração estão mais envolvidos na questão da cultura dos brancos, estão perdendo a cada dia esse conhecimento. E se eles continuarem assim, não vai ter mais território. Eu vejo todos os problemas que afetam os territórios. Como você falou, são as hidrelétricas dentro da área indígena, o desmatamento das florestas, as plantações de soja e isso afeta muito as comunidades. Na minha visão, essas são as coisas piores. E daqui para frente, quando os fazendeiros continuarem a desmatar as florestas, não vai ter mais ar para a gente respirar. Às vezes, eu vou a Câmara dos Deputados pedir às pessoas que trabalham lá para elas pararem de fazer isso, mas elas continuam e não me escutam. Isso é muito grave.
A relação entre Estado e os índios Na época que o homem branco teve contato com os índios era muito melhor, e hoje em dia não temos a mesma situação. Antigamente, homem branco ajudava os povos indígenas com recursos para atender nossas necessidades, como a saúde, a Funai e demais coisas. Hoje não ajuda mais a gente, está mais focado no caso dos brancos em geral e nos esquecendo. Até hoje venho lutando pela nossa causa, para não acontecer desmatamentos e hidrelétricas, isso eu não aceito!
Indígenas e a cultura do homem branco
Temos essa preocupação. É muito ruim, porque os jovens de hoje, quando vão à cidade, acabam se adaptando àquele lugar. Nunca vi um índio ter esse conhecimento avançado na cultura dos brancos para poder voltar à aldeia e ajudar o povo. Então, isso eu não gosto e é minha preocupação. A juventude de hoje está mais envolvida na cultura do branco e isso é muito preocupante. A última liderança indígena de mais O jovem que já tem a formação e o conhecimento de branco tem que escrever a história e riqueza da nossa cultura. Tem que documentar tudo isso, enquanto eu estou aqui
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ainda vivo. Entregar o documento na mão do governo exigindo nosso respeito e direito. Temos que nos unir, escrever e documentar. Já falei aos meus parentes Kayapó, e eles já estão com um documento aguardando eu chegar para entregar a autoridade. Nós também temos força e poder e somos capazes de lutar. Se não fosse assim, nós tínhamos acabado. Nós temos nossa resistência e precisamos nos unir para usar a aprendizagem de branco para lutar contra quem está nos ameaçando.
Indígenas e representação política O que está faltando é um índio ter conhecimento muito avançado dos brancos, por isso que nenhum índio está na Funai ou no Congresso. Então, alguns deles têm que estudar e buscar esse conhecimento para poder estar lá defendendo nossos povos. Isso que está faltando.
Aldeia multiétnica
Estou feliz de estar aqui, mas ao mesmo tempo fico triste de ver muitos índios envolvidos com a cultura branca de camisa e roupa. Os nossos parentes estão se acostumando com a cultura de vocês, e hoje em dia cada um dos nossos povos está na cidade para aprender o conhecimento e poder nos defender. Os brancos querem acabar com as florestas, os territórios indígenas, e isso é muito ruim. Com indígenas tendo esse conhecimento, poderão proteger e ajudar os nossos povos. Está acontecendo tudo o que os Villas-Bôas tinham falado. O Cláudio apontou na minha cara e disse: “Escuta o que estou falando pra você, aprende, não esqueça, você tem que ser você para depois ajudar seu povo”. Estou usando a fala dele para me orientar na fala com o delegado, as autoridades, o juiz, chefe e governo. Estou usando tudo que ele ensinou para defender nossos parentes. Temos que preservar nossos direitos, preservar nossa cultura. Não é só o branco que está destruindo a nossa cultura, nós próprios, índios, também estamos. Os jovens têm que aprender comigo, só assim temos força e somos capazes de lutar pelos nossos direitos.
A política brasileira?
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Vamos esperar que entre eles, autoridades, façam esse tipo de bagunça, a politicagem deles. Quando acalmar, aí vamos levar o nosso documento para entregar ao governo que vai assumir depois. Quando o branco ficar quieto, vamos nos juntar. Quero todos os caciques de todas as etnias unidos para ir lá falar com o governo e entregar o documento para ele escutar nossa fala, para o povo dele não nos criticar mais. Os brancos também são preguiçosos, por que tem gente dormindo e pedindo esmola na rua? As máquinas que ajudam a produzir muito, fazem muita coisa por dia para o branco. Mas nós não, nós fazemos as coisas com nossas mãos e braços. O branco usa tecnologia para produzir muita coisa e depois dizer que nós índios somos preguiçosos, mas nós não somos. O branco está nos destruindo e nos afastando do nosso direito, por isso temos que nos unir e usar o que aprendemos.
A perda de costumes dos Kaiapós, dentre eles o nomadismo devido à diminuição do seu território por gerações sucessivas. Este fato está ligado ao surgimento de projetos governamentais como o da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. A retenção da água gera alagamento das terras, desabriga, tira o trabalho dos pescadores, pois os deslocam para uma área longe da região de pesca original, sem contar a mortandade de peixes aos milhares. Preocupa Raoni a adaptação do jovem indígena à cultura do Branco, para ele são os próprios índios que destroem a sua cultura.
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Juruna
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II Foi um líder indígena e político brasileiro. Filiado ao Partido Democrático Trabalhista, foi o primeiro e único deputado federal indígena do Brasil. Juruna nasceu em 03 de setembro de 1943 na aldeia xavante Namakura, próxima a Barra do Garças, no estado de Mato Grosso. Era filho do chefe da aldeia. Viveu na aldeia, sem contato com o a população branca brasileira até os dezessete anos, quando sucedeu seu pai na liderança da aldeia. Aventureiro e corajoso, assim se autodefinia Mario Juruna: “não tinha medo de nada” complementa: “Só tive medo quando vi o homem branco pela primeira vez. Tinha 17 anos e nunca imaginei existir outra gente que não fosse o índio. Fugi. Passei muito tempo escondido no mato, longe daquela gente estranha. Mas depois me recuperei e ganhei força para lutar e defender meu povo”. O pai de Juruna era cacique e falava: “Se branco vier atacar, foge, atravessa o rio das mortes e se defende do outro lado. Mesmo a gente fugindo o branco transmitiu muitas doenças pro nosso povo. Morreu muito índio de sarampo, gripe e coqueluche”. Narra que o dia em que os Xavantes não tinham mais para onde correr foram obrigados a aceitar a doutrinação chamada de “pacificação”. Lembra que no colégio dos padres sofria castigos: “Nem meu pai nunca me deu castigo, porque os outros haviam de me castigar? Sai da tutela dos padres e fui trabalhar nas fazendas que se instalavam por lá”. O primeiro encontro de Juruna com os brancos se deu em Couto Magalhães, no Mato Grosso, acima do Rio das Mortes.
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Mario Juruna foi o primeiro indígena (até hoje) a chegar ao centro do poder. Conheceu a hipocrisia, as mentiras, a desfaçatez, a falsidade, a arrogância e a dissimulação presentes na política. Sua trajetória partidária ocorre em 1981 quando se filiou ao Partido Democrático Trabalhista, o PDT de Brizola e Darcy Ribeiro. Foi eleito deputado Federal pelo Rio de Janeiro com 31.904 votos e não pelo Estado de Mato Grosso. No site do PDT existe uma página sobre Mario Juruna no qual se destaca a fala do deputado Xavante: “Juruna é o primeiro índio que está representando brasileiro, porque o governo brasileiro não dá oportunidade para índio”. Em outra passagem: “único índio que tá falando hoje, único deputado que tá falando hoje: não é o terceiro, não é o quinto deputado, não é cinquenta deputado. Se tiver ao menos mais 50 Juruna, o Juruna tinha mudado o Brasil”. Antes de chegar ao Congresso Juruna já era um nome nacional na luta pelos direitos de seu povo. Nos anos 70 percorreu os gabinetes da fundação nacional do índio, em Brasília, reivindicando a demarcação das terras indígenas. Seu ex-assessor, o antropólogo José Porfírio Fontenele de Carvalho afirmou em entrevista concedida ao Diário do Grande ABC (05.03.2006) que foi contra a candidatura de Mario Juruna, pois achava que estavam se aproveitam da imagem dele. A presença de Juruna na Câmara dos Deputados chocava as pessoas, principalmente os deputados que se achavam a “nata” da República. Eles fizeram de tudo para diminuí-lo. Apenas cinco deputados o defendiam como Dante de Oliveira, Modesto da Silveira, Freitas Nobre, Eduardo Suplicy e Israel Dias Novais. Muitos deputados ludibriavam Juruna, convidam-no para jantar, comiam, bebiam e depois saiam, um a um, deixando-o sozinho para pagar a conta. Saia na mídia a notícia de que Juruna tinha dado mais um golpe no restaurante da câmara dos Deputados. Porfírio conta que Mario tinha recebido dinheiro de Paulo Maluf, o então candidato a presidente pelo Colégio Eleitoral em 1985. Estava correndo um boato de compra de votos. Juruna perguntou a Porfírio se era verdade. Ao final acabou se envolvendo. Calim Eid o chamou
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para um hotel e mostrou uma planilha. O primeiro pagamento seria feito quando Juruna “malufasse” ou declarasse publicamente seu voto em Maluf. A segunda parcela seria feita quando, após trinta dias, ainda estivesse “malufando”, a terceira na véspera da eleição e a quarta, após a confirmação do voto em Paulo Maluf. Mario chegou a receber a primeira parcela, mas escondeu de Porfírio. Revela que Juruna sabia contar, somente, até dez. Recebeu o dinheiro e não podia contar, também ficou com peso na consciência, resolveu denunciar e devolver. A ideia era entregar o dinheiro para o ministro da Justiça Ibrahim Abi Ackel para que a candidatura de Maluf fosse cassada. Brizola pensou em capitalizar politicamente a denúncia para o PDT. Juruna colocou os pacotes de dinheiro em cima da mesa e chamou a imprensa. Todos os corruptores negaram seu envolvimento, inclusive Maluf que seguiu com sua candidatura e acabou sendo derrotado por Tancredo Neves. O dinheiro foi devolvido na conta de Calim Eid. Juruna era uma figura exótica na Câmara dos Deputados e a imprensa o seguia para onde fosse. Ele era uma novidade, dava audiência. Era uma figura televisiva com seus cabelos com franjinha e de rabo longo. Algumas vezes aparecia com um cocar enorme que lembrava um pavão. Era tão popular, na época que foi composta uma marchinha em sua homenagem, chama-se Depuíndio, são os autores; Vevé Calazans e Dito, sendo interpretada por Emílio Santiago. Segue a letra: Índio foi eleito deputado Lá no Plenário tá botando pra quebrar Não caía na conversa do apito Gosta de loira, sem biquíni, sem colar Quando ele pinta, todo mundo grita alto: Ianê Caruca lá no meio do Planalto Ianê Caruca, Ianê Caruca O depuíndo tá fundindo a nossa cuca (fonte)
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Marcelo Tas encarnando sua persona Ernesto Varela, o repórter, entrevistou Juruna, perguntou: - O que o índio pode ensinar para o branco? Juruna respondeu: - O índio pode ensinar muita coisa pra branco, por que aqui...dentro da civilização, do selvagem aqui no Brasil, tem muita coisa que tem gente que tá aproveitando e nunca vai servir nada pra comunidade brasileira, porque a vida do índio é muito simples, é muito mais séria, e muito mais palavra pura, não é como aqui que a gente tá fazendo confusão”. Começou a gravar as promessas dos militares da Fundação Nacional do índio – FUNAI – que prometiam, não cumpriam e ao serem cobrados diziam que entregaram para Juruna. Este gravador passou a fazer parte da atuação parlamentar do Xavante. Jacupe (2010, p. 227) conta que o primeiro gravador foi roubado. Isto ocorreu durante uma palestra que Juruna ministrava em Brasília. Deixou-o por perto, mas quando foi procurá-lo tinha desaparecido. O gravador foi reaparecer somente em 2009 pelas mãos de um senhor de aproximadamente 70 anos durante o Encontro de Escritores Indígenas. O senhor afirmou que Juruna tinha esquecido em sua casa e não mais o encontrou, e mesmo depois de tanto tempo resolveu devolvê-lo, mesmo após a morte de Juruna. Confessou um pequeno remorso por não tê-lo feito antes. Segundo Olívio Jecupe (2010) em seu artigo “Roubaram o gravador do Juruna”, todos... ...achavam engraçado um índio ser deputado, e a cada vez que falava na imprensa, mais conhecido ficava. E para o povo, era engraçado ver um índio cabeludo, falava um português arrastado, e que no começo não queria usar gravata, pois tinha um costume diferente, tinha vivido a vida toda no cerrado de sua aldeia. Só que como agora se tornou um deputado então foi obrigado a usar o terno do chamado homem branco. (JECUPE, 2010, p. 225).
Reunimos alguns discursos do Deputado Mario Juruna na Câmara dos Deputados. Este datado de 1983, Mario revela que sua ascensão ao cargo foi
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questionada por muitos que achavam que os indígenas não tinha nada a fazer no parlamento. Compara a questão indígena à questão das camadas sociais subalternas.
“Eu quero apresentar exemplo com minha candidatura, porque hoje já podia ter deputado índio. Podia ter deputado aqui no Brasil, mas nós não somos culpados. Quem é culpado, é responsável, é essas pessoas que não dão oportunidade pra índio. É por isso que nós só aprende, só estuda o primário. Então primeiro eu quero falar em nome do companheiro trabalhador, porque vocês é a mesma coisa como índio, como posseiro, é a mesma coisa como lavrador e é a mesma coisa como a tribo. Esse pessoal que está lá em cima, que a gente sofre repressão da autoridade, esse pessoal é o filho do empresário, o filho do deputado, o filho do senador. Esse resto que é o pessoal filho de pobre, eu quero considerar mais ainda esse pessoal que leva sacrifício, pessoal que sofre muito mais que a gente que está vivendo muito bem aqui na Câmara Federal. E muita gente que achava, quando eu entrei na política, muita gente falava contra Juruna, falava: “Imagina como que Juruna vai entrar no plenário, imagina, o índio, o que é que vai resolver no plenário, como é que índio vai representar índio?” E eu quero saber: imagina, o que é que o branco pode? Talvez índio pode representar melhor do que qualquer deputado, qualquer senador e qualquer da República. Juruna é o primeiro índio que está representando brasileiro, porque o governo brasileiro não dá oportunidade pra índio, porque ele quer continuar tutelar toda vida índio. E nós não somos tutelados, somos responsáveis, nós somos gente, nós somos ser humano. Quem não tem consciência, me trata como objeto, me trata como boneca. E quando eu passo aqui dentro de plenário e alguns companheiros à frente de mim e diz cara emburrada é ridículo. Eu não vim aqui fuxicar com ninguém, eu vim aqui pra trabalhar, pra defender povo, eu vim aqui pra lutar. Eu quero que gente começa a respeitar nome de Juruna. Eu quero que gente trata índio brasileiro o mais possível dentro do melhor. Cada um de nós tem consciência e cada um de nós tem capacidade. Ninguém tem menos capacidade. Todos nós tem capacidade e todos nós tem inteligência e todos nós tem a vontade para assumir onde que existe poder. Eu acho esse já é fruto está nascendo aqui dentro do Brasil, esse já é sinal está nascendo aqui dentro do plenário. Único índio que tá falando hoje, único deputado que tá falando hoje: não é terceiro, não é quinto deputado, não é cinquenta deputado. Se tiver ao menos mais cinquenta Juruna, o Juruna já tinha mudado o Brasil. (JURUNA, 19.04.1983)
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Nesta passagem de seu discurso critica duramente o Presidente Figueiredo e Delfim Neto, Ministro do Planejamento, invoca as Diretas Já e defende Leonel Brizola.
Governo da República não pode ser indicado por uma pessoa. Presidente da República tem que ser mais votado com povo brasileiro. Até eu me lembro muito bem que antes de 64 Brasil tinha muito ouro, era muito sagrado e hoje Brasil não tem mais muito ouro não. Está estragado. O Brasil não tem mais ouro. Quem está estragando o Brasil é o próprio governo federal, é este presidente da República que está estragando nosso Brasil, junto com Delfim, esse responsável pelo Brasil. Quero falar problema do Brizola. O Brizola é homem, foi cassado, como acontece com o índio, por isso eu apoio Brizola e por isso quero dar liberdade para Brizola, porque, como acontece com o posseiro, como acontece com o índio, o Brizola foi expulso do Brasil sem necessidade. E por que o governo não expulsa outro agora? Expulsa todo o ministério, tira todo o ministério! Bota na rua todo mundo! Se o governo federal, ele tem capacidade, ao lado do povo, se o governo federal assume, como homem, tira meia dúzia de ministro que atrapalha o nosso Brasil. Tirava meia dúzia, o presidente da República, qualquer um de nós apoiava ele. Nós apoiamos o presidente da República e nós levava para crescer mais ainda o nome dele. Desse jeito, ninguém vai apoiar o presidente. Ninguém pode apoiar sujeira. Eu mesmo não pode apoiar sujeira porque eu quero que o presidente muda o nosso Brasil. Porque o presidente é responsável da Nação, o presidente é juízo do povo, o presidente é o pai do povo, o pai do Brasil. Agora, como está hoje, o presidente é o pai do povo? Não existe pai do povo, não. Aqui não tem pai do povo, não. O presidente foi eleito com empresário, presidente foi compromisso com multinacional, com fazendeiro, com empresário e grande empresário. Se presidente pai do Brasil, presidente segurava toda barra que está acontecendo no Brasil. E aqui gente tá morrendo. E por quê? Porque não tem presidente, não tem autoridade. E toda autoridade é comprada, toda autoridade está se vendendo, quer o dinheiro, quer ganhar dinheiro. Às vezes, presidente é bom e assessor diretor quem engana o presidente, assessor que não leva verdade para presidente. Por isso que presidente passa mal assessorado. Se tiver assessor bom, se tiver diretor bom que levava recomendação do povo, eu acredito que
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presidente atendia pedido do povo. (JURUNA, 30.08.1983,
p.4580)
Finaliza mencionando suas origens e convocando todos à divisão da terra e da riqueza.
Sou homem do povo, sou homem de campo, quando me criei não encontrei nem um branco, não encontrei nem um avião, nem automóvel, nem estrada; onde me criei era sertão, eu só escutava canto do passarinho, e hoje eu encontro muito pressão contra índio, e invasor, e estrada. A gente está recebendo muita pressão. Quando eu tive na Holanda, é país pequeno, todo holandês vive igual. Aqui Brasil é muito grande e muita gente tá precisando da terra. Aqui eu quero pedir a V.Excia., presidente, vamos pensar juntos, vamos reformar o nosso Brasil, viu? Vamos dividir, terra é para posseiro, é terra para fazendeiro, é terra para índio, vamos dividir a nossa terra.”
Juruna sofreu um processo parlamentar que pedia sua cassação, movido pelo Governo Figueiredo. O motivo foi o discurso feito no plenário, em setembro de 1983, no qual chamou os ministros de “ladrões”, proferiu: “Todo ministro é a mesma panelinha, é a mesma cabeça. Não tem ministro nenhum que presta. Pra mim todo ministro é corrupto, ladrão, sem vergonha e mau caráter. Não vou dizer que todo ministro é bom, legal e justo. Vou dizer que todo ministro é do mesmo saco que aproveita o suor do povo trabalhador”. (JURUNA, 30.08.1983, p.4580)
Em discurso de novembro de 1984, disse:
“Eu nunca vou estar satisfeito aqui na Câmara Federal, porque eu também sou parte e tenho que cumprir a minha obrigação, o meu dever de defender mais ainda a nossa pátria. É muito bonito ser deputado, mas deputado não pode ser bonito, deputado tem que praticar também para fazer alguma coisa em benefício da nação, em benefício do povo brasileiro. Quero fazer mais em benefício do povo brasileiro (...) se tivesse poder talvez eu mudasse o Brasil. Então o governo brasileiro nunca vai assumir o compromisso com o povo, nunca vai lembrar do Brasileiro, nunca vai prestigiar, todo o governo brasileiro civil. Eu conheço a tradição do governo civil, o tempo da
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República, o tempo do Império, o tempo do Presidente da República. E quanta gente foi expulsa de sua terra, o próprio índio. Ninguém muda nada. Ninguém representa a nação. (...) Como mato-grossense, governador do Estado do Mato Grosso, o Júlio Campos, essa semana toda ele está metendo o pau em mim? Empresário, ele tem quatro fazendas. Fica roubando o dinheiro da nação na fazenda dele. Porque esse governador, nosso companheiro mato-grossense, que tirou 33 mil professores e tinha botado na rua, ainda que apontar, fica dizendo a vida do deputado Juruna?” Ele não fez nada com a vida dele. Tinha roubado o povo na votação, na hora da eleição. Tinha jogado a pessoa que votou dentro do rio Cuiabá, jogou um avião e ninguém disse nada. Agora porque branco tem coragem de mexer com a vida do deputado Juruna? Eu acho que o branco não pode mexer com a vida do deputado Juruna. Eu acho que todo branco tem muita malícia, todo branco é aproveitador, todo branco quer explorar o pobre, todo branco quer matar o pobre, atira contra o pobre, compra consciência do juiz, compra consciência do deputado, mas com deputado Juruna não vai acontecer nada disso. Venho aqui com o coração limpo, com a consciência limpa, e quando assumi mandei o recado. Eu não venho aqui pra puxar o saco de ninguém, eu venho aqui para defender o povo” (...) Já fui batalhador, já fui guerreiro, já fui porta-voz da comunidade. Se não tivesse Juruna no país não tinha mudado. E ainda bem que fui eleito pelo Rio de Janeiro para defender a nação. Então eu me considero um porta-voz da nação. Eu me considero um símbolo do Brasil. Por isto, tenho muita consideração com a minha vida, com a minha gente. Eu peço a V. Exas que encerrem o processo contra Juruna. (JURUNA, 22.11.1984)
Juruna fala sobre a suspeita de assassinato que envolvia o então governador Júlio Campos e o então secretário de Segurança, Oscar Travassos. Foram acusados de terem mandado matar o candidato do PMDB à prefeitura de Várzea Grande no pleito de novembro de 1982. O inquérito realizado concluiu pela isenção de culpa do governador. Juruna não conseguiu se reeleger em 1986, Porfírio afirma que ficou depressivo pela derrota nas urnas. Tentou voltar nas eleições seguintes em 1990 e 1994. A revista Isto é Gente publicou a reportagem de André Barreto (em 06.03.2000) intitulado: “Cacique Juruna longe do poder”. O texto da reportagem inicia com a frase: “triste, infeliz e esquecido”, demonstra a situação difícil em que se encontrava nos seus últimos anos de vida. Vivia em um casebre na cidade satélite de Guará I
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Ailton
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III
Ailton Krenak nasceu no Vale do rio Doce, em Minas Gerais, no ano de 1954. Os Krenak registravam uma população de cinco mil pessoas no início do século XX, número que se reduziu a 600 na década de 1920 e a 130 indivíduos em 1989. Na época, Ailton pressagiou: "se continuar nesse passo, nós vamos entrar no ano 2000 com umas três pessoas". Felizmente isso não aconteceu. Contando com esforços também do próprio Ailton, os Krenak fecharam o século com 150 pessoas. Com 17 anos Ailton migrou com seus parentes para o estado do Paraná. Alfabetizou-se aos 18 anos, tornando-se a seguir produtor gráfico e jornalista. Na década de 1980 passou a se dedicar exclusivamente à articulação do movimento indígena. Em 1988 participou da fundação da União das Nações Indígenas (UNI), fórum intertribal interessado em estabelecer uma representação do movimento indígena em nível nacional, participando em 1989 do movimento Aliança dos Povos da Floresta, que reunia povos indígenas e seringueiros em torno da proposta da criação das reservas extrativistas, visando a proteção da floresta e da população nativa que nela vive Segundo a dissertação de Mestrado, intitulada; União das Nações Indígenas (UNI): contribuição ao movimento indígena no Brasil (1980-1988) de Sidiclei Roque Deparis, a União nacional dos Movimentos indígenas surgiu
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da realização de um seminário nacional para debater as questões indígenas, realizado entre 17 e 20 de abril de 1980. Em Campo Grande–MS. Ao evento reuniram-se 15 etnias. A realização deste seminário surgiu da iniciativa da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, do governo estadual e da FUNAI. A presença significativa das etnias, de setores da sociedade como simpatizantes da luta indígenas e imprensa reforçou o movimento. Neste cenário de movimentação indígena e conduzidos pela necessidade de formar um movimento capaz de fazer um enfrentamento reivindicando os direitos indígenas de forma autônoma, a União das Nações Indígenas (UNI) representou a coesão ao possibilitar a união de grupos heterogêneos que vivenciavam os mesmos problemas. Ailton participou dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte que elaborou a Constituição Brasileira de 1988. Foi durante a Assembleia Constituinte, em 1987, que Ailton protagonizou uma das cenas mais marcantes da mesma: em discurso na tribuna, pintou o rosto com a tinta preta do jenipapo, segundo o tradicional costume indígena brasileiro, para protestar contra o que considerava um retrocesso na luta pelos direitos dos índios brasileiros. Afirmou: Este processo de luta de interesses...que tem se demonstrado completamente aético...e eu espero não agredir com a minha manifestação o protocolo desta casa...mas eu acredito que.....os senhores não poderão ficar....omissos...os senhores não terão como ficar...alheios a mais esta agressão movida pelo poder econômico, pela ganância...pela ignorância do que significa ser um povo indígena...o povo indígena tem um jeito de pensar...tem um jeito de viver...tem condições fundamentais para a sua existência e pela manifestação da sua tradição, da sua vida, da sua cultura que nunca colocaram em risco a existência...sequer dos animais que vivem ao redor da área indígena sequer os seres humanos. Eu creio que um dos senhores poderia nunca contar, atos, atitudes da gente indígena do Brasil que colocou em risco, seja a vida, seja o patrimônio de qualquer pessoa, de qualquer grupo humano nesse país. E hoje nós somos o alvo de uma agressão...que pretende atingir na essência a nossa fé, a nossa confiança de que ainda existe dignidade...de que ainda é possível construir uma sociedade que sabe respeitar os mais fracos, que sabe respeitar aqueles que não tem o dinheiro para manter uma campanha incessante de difamação, que saiba respeitar um povo que sempre viveu à revelia de todas as riquezas, um povo que habita casas cobertas de palha, que dormem em esteiras no chão...não deve ser identificado de jeito nenhum como povo que é inimigo dos interesses do Brasil, inimigo dos interesses da nação que coloca em risco qualquer desenvolvimento, o povo indígena tem regado com sangue cada
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hectare dos oito milhões de KM² DO Brasil, os senhores são testemunhas disto...eu agradeço...a presidência dessa casa, agradeço aos senhores e espero não ter agredido com as minhas palavras o sentimento dos senhores que se encontram nesta casa. DEFESA DE EMENDA PARLAMENTAR DA UNI (UNIÃO DAS NAÇÕES INDÍGENAS) Plenário da Câmara dos Deputados, 04 de setembro de 1987.
Foi no início dos anos 1980 que passou a engajar-se no movimento indígena. No ano de 1985 fundou a ONG Núcleo de Culturas Indígenas e integrou o Congresso Nacional do Brasil para a Constituição Brasileira de 1988. Foi um dos fundadores da União dos Povos Indígenas. Em 1989 participou da Aliança dos Povos da Floresta, movimento que lutou pelo estabelecimento de reservas naturais na Amazônia para a subsistência econômica através da atividade de extração do látex da seringueira e coleta de outros produtos da floresta. Através do Núcleo de Cultura Indígena é organizado desde 1998 na região da Serra do Cipó, em Minas Gerais, o Festival de Dança e Cultura Indígena. Em 1999, sua narrativa "O Eterno Retorno do Encontro" foi publicada no livro "A Outra Margem do Ocidente", sob a organização de Adauto Novaes. Recebeu o título de Professor Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) no dia 18 de fevereiro de 2016. Nesta instituição ministrou as disciplinas de "Cultura e História dos Povos Indígenas". "Artes e Ofícios dos Saberes Tradicionais". “O pensamento colonial se prolifera como praga”, adverte Ailton Krenak entrevista concedida ao blog COMBATE RACISMO AMBIENTAL, Nonada lembra o discurso histórico que garantiu a Emenda Popular das Nações Indígenas na Constituição de 1988 e lembra que após 30 anos o Congresso Brasileiro quer aprovar a PEC 215 que propõe retirar do Poder Executivo, a atribuição exclusiva de demarcação das terras indígenas, um retrocesso e pergunta sobre o contexto histórico que permite esse retrocesso. Ailton – Que nós estamos vivendo em um período onde a expressão dos movimentos sociais perdeu validade ante a quem está no poder. Quem exerce o poder político do país não se sente representante da sociedade, isso é uma revelação muito importante para a gente sacar. Se quem está no exercício do poder não representa mais a sociedade,
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ele não precisa atender mais nenhuma demanda da sociedade, é ilegítimo, entendeu? Estamos vivendo em uma situação de ditadura, e ela é anterior ao golpe, por que tem uma mentalidade autoritária instalada no poder. Se lembra dos protestos contra Belo Monte? Isso foi antes do golpe, mas a tropa de choque foi lá, deu porrada em todo mundo, o trator passou, a hidrelétrica foi feita e inaugurada. Aquilo lá foi uma antecipação da cultura de golpe que cultivamos entre nós. A PEC 215 passa por que quem tá no poder não representa a sociedade nem se sente constrangido pelas manifestações dos movimentos sociais. ”. (KRENAK, 2013, p. 218-226).
Sobre a apropriação indígena das novas tecnologias de comunicação, sobretudo a atuação das rádios Yandê e Comunicação Kuery. Ailton menciona Chomsky: Ailton – Tem um camarada chamado Noam Chomsky, um linguista e grande pensador do ocidente, que vive confrontando a mediocridade do pensamento gringo, americano, que quer dominar o mundo. Ele tem uma visão muito crítica sobre essa ideia da conspiração. Ele acha o seguinte. Se essas tecnologias foram apropriadas pelo capital e domina todo o cenário, ela não pode dominar as possibilidades de rebeldia e insurgência. Essa “periferia”, onde aparece a rádio yandê e outros movimentos sociais como mídia ninja, é exatamente a parte que o sistema não controla. As vezes podemos achar que tem uma coisa conspiratória controlando tudo, mas nada controla tudo. Sempre tem alguma coisa que fica vazando, e é nesse espaço que vaza que temos que atuar, entendeu? ”. (KRENAK, 2013, p. 218-226).
Sobre a temática indígena na escola brasileira como resultante de uma brecha no sistema, Os saberes indígenas nas Escolas. Ailton – Olha, Saberes Indígenas nas Escolas é interessante porque é um contrafluxo de todo o bombardeio que sai de dentro dos sistemas de produção de conhecimento pra cima da vida das pessoas. O contrafluxo de levar o saber indígena para a escola é uma gota no oceano, mas é uma gota e tem a ver com aquilo que a gente falou, nem tudo está dominado: sempre tem a possibilidade de uma gota no oceano”. (KRENAK, 2013, p. 218-226).
Pode ser um mote de diálogo com o Governo por contar com verba Federal?
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Ailton – Você não ouviu meu comentário sobre como o sistema financeiro global se utiliza das mídias e tecnologias de informação para consolidar o domínio dele, mas mesmo assim algo acaba vazando? A ideia de que um aparato do Estado, através dos governos locais, promovam ações afirmativas ou que leve o saber indígena nas escolas, não é uma coisa que esses governos fazem voluntariamente, eles fazem isso porque eles não conseguem conter essa parte, porque se eles pudessem, nem isso eles deixavam acontecer. (KRENAK, 2013, p. 218-226).
Nesta passagem Ailton fala sobre retirar o governo Temer a partir das mobilizações populares, dentre eles os sindicatos. Ailton – É um desafio. Se nós não fizermos isso nós vamos ficar sempre nas bordas sentindo a pressão. Os movimentos sociais tão na rua aí, de repente eles estão na rua porque os sindicatos querem ir pra rua. Até dois anos atrás os sindicatos todos estavam adorando o que tava rolando e muitos desses sindicatos foram para a rua pedir o golpe e agora estão começando a despertar e perceber que fizeram uma cagada. Eles agora estão pensando em mobilizar a população dos municípios do país. Se esse conjunto de interesses conseguir mobilizar todo mundo, tiram esses caras que estão aí. (KRENAK, 2013, p. 218226).
Nonada pergunta sobre o Meio Ambiente: o que fazemos para nos alimentar e o que fazemos com o lixo? A terra tem limite? Ailton – Exatamente, a grande questão que o nosso querido xamã Yanomami coloca é, se essa civilização não para de crescer e ela demanda tanta comida, tanta produção de alimento, aonde é que ela joga seu lixo? A pergunta básica é, se ela tem que comer tanto, aonde é que ela caga depois? Aí a gente só pode responder, elas estão cagando o planeta inteiro: nos rios, nos mananciais, nas nascentes, na floresta… Esse paradigma tem que ser virado, se a gente não mudar o paradigma, a gente não muda essa prática. Eu estou colaborando com um amigo meu que é engenheiro, na produção de um texto, onde dizemos que nós temos que provocar uma séria reflexão sobre o modo de produzir. O modo de produzir é determinado pela técnica que foi desenvolvida e que chegou nisso que nós somos hoje. A engenharia domina o mundo da produção em amplos termos; todas as engenharias dominam o mundo da produção. Então, se você não formar pessoas nas universidades, nas escolas, com outro paradigma, você vai continuar tendo uma tecnologia e engenharia destrutiva do planeta, sustentando o capitalismo e mantendo a roda girando desse jeito, até a gente destruir a última água. (KRENAK, 2013, p. 218-226).
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Em entrevista concedida a Marcos Savio com o título MOVIMENTO INDÍGENA E A CONSTUIÇÃO DE 1988, Ailton Krenak lembra a formação da embaixada dos povos da floresta que durou cinco anos em São Paulo, capital. Ficava entre o rio Pinheiros e o Pirajussara, uma casa bandeirante do século XVII. Foi uma ocupação sob a concessão da então prefeita Luiza Erundina que fez a cessão de uso por tempo indeterminado. Lembra que antes de 1988 os índios praticamente não existiam no Direito Brasileiro, eram como crianças incapazes cuja representação era exercida pelo Estado. Afirma que não é possível falar em movimento indígena, foi uma união passageira devido ao medo dos brancos, medo do progresso. Esclarece que foi cobrado pela CUT e pelo MST. Estes movimentos queriam que os indígenas somasse força á eles, no entanto afirma que um movimento unificado acabaria por homogeneizar os índios. Afinal, os índios são diferentes em suas culturas. Lembra que durante os debates em torno da Constituinte de 1988 pode ver como as pessoas odiavam os índios. O pessoal da Federação das Indústrias, da UDR, eram como fascistas, ameaçavam, intimidavam e matavam.
“A Constituição de 1988, a gente conseguiu os direitos de organização da terra, de uma norma na lei, de que os locais onde os índios ainda vivem precisam ser respeitados. Aconteceu um grande avanço na questão da demarcação de terras (...) apesar da Constiuição dizer que os índios possuem direito de livre associação, eles continuam sendo organizados pela FUNAI. Então muitas das conquistas da constituinte não saíram do papel, ou estão postas em perigo”. (KRENAK, 2013, p. 226).
Sobre a formação de um partido indígena Krenak afirma que seria ruim, pois plasmaria todos em uma coisa só e se virassem uma coisa só não irão a lugar algum. Perderão a riqueza cultural singular de cada etnia apenas com o intuito de formar uma frente política. Sobretudo seria necessário fazer alianças complicadas para eleger representantes indígenas.
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Precisamos lutar para ter representação indígenas no Congresso, no Senado, pelos nossos interesses, pelo pensamento indígenas. Mas não através de um partido.
Na revista Lua Nova em junho de 1984 sobre a atuação de Mario Juruna, afirma que é necessário o reconhecimento do Estado em relação à atuação do índio na política e enquanto isto não ocorrer o esforço ocorrerá apenas de um lado. A partir do momento Juruna passou a legislar, criando a comissão do índio e um projeto de lei que propôs a reestruturação da FUNAI, passou a incomodar o Estado e começou a ocorrer uma forte oposição à sua permanência no parlamento. De forma geral todos os povos indígenas que vivem no Brasil veem Mario Juruna um representante legitimo de seus interesses (...) Mario conseguiu a síntese de representar os interesses dos povos indígenas, que uma hora ou outra pode votar em alguém, mas não se sente tão desprotegido e longe das decisões quanto aos indios. (KRENAK, 2013, p.24).
Sobre isto reflete que enquanto o país não reconhecer a identidade particular dos grupos que o compõe, continuará ocorrendo choques de índios e fazendeiros, mas entre brasileiros. (KRENAK, 2013, p. 25). Sobre a UNI afirma que a existência de um movimento indígena organizado já ocorreu antes, com a Confederação dos Tamoios, em 1535. A reunião dos povos indígenas para enfrentar os portugueses do litoral. A grande novidade da UNI é uma reforma institucional de representação para reunir diferentes nações indígenas para a forma organizada defender seus interesses e necessidades. Destaca neste esforço a atuação de Marçal Guarani, Angelo Pankararé, Angelo Kretã, Domingos Terena e os povos Tikuna, Tukano e Miranha. Essa é uma geração anterior à Krenak que pertence a uma geração mais jovem formada por índios que tinham frequentado a escola, feito algum curso técnico ou superior como Paulo Bororo, Paulo Tikuna, Lino Miranha, Alvaro Tukano e Ailton Krenak. (KRENAK, 2013, p. 25). Foi essa nova geração que organizou o primeiro encontro indígena no Mato Grosso em 1979 que reuniu representantes do Kadiwéu, Terenas e
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Xavantes. O segundo encontro reuniu Mais gente e formou uma diretoria: Marcos Terena, presidente, Alváro Tukano, vice, Lino Miranha como secretário. Foi esse grupo que trabalhou no ano de 1981 para criar a UNI. Explica a reunião de 1982 foi boicoitada pela FUNAI e em 1983 no encontro de Goiás foi formada uma coordenadoria nacional, coordenadorias regionais e em cada aldeia teria um representante da UNI em ligação aos coordenadores regionais.
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Marcos Terena
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IV Marcos Terena, nascido em 1954, em Aquidauana, Mato Grosso do Sul. Ainda criança gostava de ver os aviões e se perguntava se aquela fumaça que saia do avião era porque estavam cozinhando no avião? Este foi o primeiro despertar de interesse do primeiro aviador indígena brasileiro. Em 1972 se alistou na Aeronáutica, na base aérea de Campo Grande. Ali fez curso de pilotagem de aeronave na Força Aérea Brasileira. Em seu primeiro voo de treinamento pilotou uma aeronave Universal T-25 monomotor. “O primeiro voo você tem que fazer um negócio bem caprichado, treinar na sua cabeça, decorar aquele monte de reloginhos, colocar tudo aquilo na sua mente. Saber onde está cada parte da máquina, as alavancas de emergência, a bússola. E, é claro não ficar apavarado”. Marcos dirigiu vários tipos de Aeronaves além do Universal T-25, tais como o Cessna 172, Cessna 205, Sêneca 1, 2 e 3, Bandeirante e Islander. Fonte. Em 1980 Marcos Terena pilotava um avião Sêneca da FUNAI que transportava vários caciques da etnia Kren-Nacarole que voltava para suas aldeias no alto do Xingu, em Mato Grosso. Em certo momento o avião perdeu o equilíbrio, passou a balançar, tremer e chegou a perder o controle do avião. Lutou para estabilizá-lo e só conseguiu quando bateu um vento contrário. Conseguiu pousar, apesar da bequilha do trem de pouso ter quebrado. Depois de 15 anos ficou sabendo através de um relatório reservado da Polícia Federal que o avião Sêneca foi sabotado. Conta que sonhava em pilotar na Varig, mas foi barrado pelos militares que comandavam a empresa aérea pelo fato de ser índio. Seguraram seu brevê por três anos. Sem pilotar ficou em Brasília e começou se dedicar à politica indígena. Ao final a Procuradoria Geral da República e o
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Ministério da Aeronáutica deram parecer jurídico favorável ao seu pedido para pilotar aviões de carreira. Escreveu o livro “O índio aviador” que tratam das suas aventuras como aviador. O livro foi como um afago no brio de seu povo. “Posso ser o que você quiser sem deixar de ser quem eu sou” Fonte No site de Silvestre Gorgulho é mencionada a resposta de Marco ao jornalista Zózimo Barroso do Amaral conhecido como: jornalista da elite que escreveu em sua coluna sobre a demissão de Terena da FUNAI. O título da nota “Procura-se” foi pouco respeitosa, assim como o texto que afirmava que Marco Terena só tinha entrado em avião como passageiro medroso. A resposta foi publicada no Jornal do Brasil, escreveu: Sou um dos 240 mil índios brasileiros e um dos seus interlocutores junto ao homem branco. Quando ainda tinha nove anos, fui levado a conhecer o mundo. Era preciso ler, escrever e falar o português. Um dia a professora me pôs de castigo, não sabia por quê, mas obedeci. Fiquei de frente para o quadro negro, de costas para a sala. Quando meus colegas entraram, morreram de rir. Não sabia o motivo, mas sentia-se orgulhoso por fazê-los rir. Eles riam porque descobriram meu segredo: meu sapato não tinha sola, apenas um buraco, amarrado por arame. Naquele momento, sem querer, acabei descobrindo o segredo do homem civilizado: suas crianças não eram apenas crianças. Apenas uma palavra as separava das outras crianças: pobreza. (...) Um dia me chamaram de ‘japonês’ ". Decidi adotar essa identidade. E fiz isso por 14 anos. Fonte.
No Brasil para o jovem Terena era melhor ser Japonês que índio. Explica que o motivo de sua demissão foi pelo fato de ser índio. Demonstrou respeito que o jornalista não teve para com ele: Não guardo rancores pela nota. Foi mais uma oportunidade de fazer valer a nossa voz como índio. Gostaria apenas que o jornalista inteirasse dessas informações todas e soubesse de minha vontade em tê-lo como amigo. Fonte
Na entrevista Silvestre Gorgulho pergunta sobre as candidaturas indígenas a cargos públicos: Você foi candidato a deputado por duas vezes. A política é uma arma para se fazer justiça ou um caminho mais fácil para encobrir injustiças? Marco Terena, responde: O poder legislativo é um pêndulo necessário entre os três poderes. O ideal seria assegurar algumas cadeiras no Senado e na Câmara aos diversos setores sociais, como uma verdadeira
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"assembleia do povo brasileiro" e não somente aos sindicatos organizados ou aos cartéis dos ricos. A pergunta também sobre a atuação de Mario Juruna: Juruna foi um líder eleito pelo homem branco. Valeu, para os índios, essa experiência
parlamentar?
Resposta:
Não
só
valeu
essa
experiência
parlamentar, como prá lamentar...Como Cacique foi o maior dos últimos tempos, mas não teve assessoria suficientemente hábil, para sua reeleição e para abrir portas para novos valores indígenas, até hoje... A atuação política de Marco terena é riquíssima. Segue uma breve relação sobre suas ações. Marcos Terena foi um dos criadores da União das Nações Indígenas. Foi um dos articuladores indígenas na Assembleia Constituinte que redigiu a Constituição Brasileira de 1988. Em 1992 organizou, na Rio 92, a Conferência dos Povos indígenas sobre território, Meio Ambiente e Desenvolvimento. Em 9 de agosto de 2007, assumiu a gerência do Memorial dos Povos Indígenas de Brasília, sendo o primeiro indígena a assumir o cargo. - Contribuiu na demarcação das terras indígenas dos Yanomâmi em Roraima, dos Xavante e Txucarramãe em Mato Grosso, dos Pataxó na Bahia, dos Apurinã no Acre, dos Apinajé no Tocantins, dos Potiguara na Paraíba e dos Kayapó no Pará. - Contribuiu na inclusão indígena no Projeto Pantanal e no Gasoduto BolíviaBrasil, em Mato Grosso do Sul. - Foi chefe de gabinete da Fundação Nacional do Índio e assessor do Ministro da Cultura. - Foi criador do programa "A Voz do Índio" pela Rádio Nacional da Amazônia. - Escreveu os livros "O Índio Aviador" e "Cidadãos da Selva". - Foi idealizador dos Jogos dos Povos Indígenas e do Festival Nacional das Culturas e Tradições Indígenas, como ações afirmativas de iniciativas indígenas para o resgate da identidade cultural.
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- É articulador dos direitos indígenas junto à Organização das Nações Unidas, à Organização dos Estados Americanos e aos programas dos bancos de fomento multilaterais. - Participou da criação do Fórum Permanente da Organização das Nações Unidas sobre Questões Indígenas em Nova Iorque e da coalizão "Land is Life", e também dos debates e aprovação da Declaração da O Foi coordenador do Diálogo dos Pajés sobre a Proteção dos Conhecimentos Tradicionais no Brasil e junto à Organização Mundial da Propriedade Intelectual, em Genebra. - Coordenou o tema indígena na Conferência Santiago +5, sobre igualdade racial. - Coordenou a Comissão Indígena para o Acesso a Novos Conhecimentos e Tecnologias da Informação junto à União Internacional de Telecomunicações, dentro das metas da "Inclusão Digital e a Sociedade da Informação" na Organização das Nações Unidas. - É membro da Comissão Brasileira de Justiça e Paz. É conselheiro da Agência de Notícias do Direito da Criança e Adolescente. - É coordenador do Fórum Indígena Internacional sobre Biodiversidade e do tema Conhecimento Tradicional e Espiritualidade na Cátedra Indígena Internacional. Mariana Tokarnia repórter da Agência Brasil entrevistou Marcos Terena. A primeira pergunta foi: o que há para comemorar no dia do Índio? Ele responde que não existe nada para comemorar tendo em vista que no último ano não ocorreram avanços em relação às questões indígenas. Menciona a importância das ações, mobilizações em torno das suas causas, a ausência de índios no parlamento e a PEC 2015 que transfere para o Congresso a Atribuição da demarcação das terras indígenas.
Do último ano para cá, a gente não conseguiu avançar em termos da questão indígena, nem em relação ao governo nem em relação às políticas públicas. E tudo isso nos deixou pensando no que está acontecendo. De um lado, a gente consegue promover os próprios indígenas, promover grandes eventos, chamar o público, chamar as
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próprias autoridades do governo; mas a ação, a proposta de uma política indigenista forte, ela não acontece. Porque a gente acredita que não existe uma plataforma chamada política indigenista na agenda do governo. A gente tentou, quando a gente fez os Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, mostrar isso à presidente Dilma. Ela viu isso de perto, ela conviveu com a gente duas vezes, mas há o setor político, que é justamente o setor conservador que não gosta da questão indígena, acha que isso atrapalha o desenvolvimento. Isso está arraigado dentro do Congresso Nacional. Esso é um dos pontos mais carentes, mais vulneráveis que a gente enfrenta. Nós não temos indígenas como parlamentares, deputados. As alianças que a gente consegue fazer é com uma minoria dos deputados que vivem no Congresso Nacional. A gente sofre de forma dispersiva, inclusive, várias ataques, como a famosa PEC 215, que tenta tirar o poder de demarcar as terras de dentro do governo e também a proposta de mineração em terra indígena, onde nós somos sempre as vítimas. O conceito é que nós atrapalhamos o desenvolvimento. Com isso, talvez há um tempo, a gente veja que o Governo Federal não encontra formas de combater isso de maneira eficaz e de maneira salutar. Nós não somos contra o desenvolvimento do Brasil, mas a gente não pode ficar sempre sendo tratados como vítimas. Fonte
Explica a importância das demarcações
A questão das terras é sempre o ponto principal de qualquer comunidade indígena. É impossível a gente conduzir a vida dos povos indígenas se não houver a tranquilidade, a paz nas regiões e, isso, a gente só consegue com a demarcação. É muito importante também destacar que a demarcação das terras indígenas é para proteger as aldeias e criar um limite oficial para que os invasores, sejam ruralistas, às vezes a construção de uma estrada mesmo, ou projeto do governo, não invadam de qualquer maneira uma terra aparentemente sem dono. A demarcação das terras é um sinal de que nós queremos a paz com os vizinhos que chegam perto das aldeias e, principalmente, sinal que nós queremos participar. Nós temos que criar uma forma de gestão territorial que não pode ser mais só a caça e pesca, temos que ser realistas nesse ponto. Hoje, a tecnologia é muito avançada. Agora, a gente não pode também a ser jogado com cestas básicas, que mais uma vez anulam a iniciativa do índio na sua soberania e na sua forma de crescimento. Fonte
Educação indígena
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Eu faço parte do grupo de trabalho do MEC para a criação da Universidade Indígena. Eu penso que a educação foi uma das grandes ferramentas, e muito eficaz, para neutralizar a vida do índio, criando conceitos de que o índio é selvagem, que o índio é preguiçoso, que a gente pouco a pouco vai limpando dos currículos escolares. Ao mesmo tempo, um indiozinho como eu, que saí da aldeia, chega na cidade e tem que aprender imediatamente o be-a-bá, aritmética, as contas, a história, a geografia e em uma língua que não era nossa, que é difícil de aprender, que é a língua portuguesa. A educação é uma ferramenta de valorização da identidade, da cultura, mas também de soberania dos povos. Nesse novo milênio, para os próximos anos, nosso grande objetivo é fazer nascer no Brasil a primeira universidade intercultural indígena. Por que as primeiras nações do Brasil não podem ter uma universidade de ponta, uma universidade indígena, inclusive com a valorização dos conhecimentos tradicionais dos nossos pajés? A gente não pode menosprezar os investimentos que o governo federal fez nesse campo, porque os indígenas não ficavam mais falando só no idioma, mas aprenderam a falar português, a escrever bem, a interpretar as regras. Hoje nós temos no Brasil, muitos indígenas com curso superior, fazendo mestrado, fazendo doutorado, temos indígenas que estão estudando medicina, antropologia, engenharia, economia. Muita gente, o próprio MEC, acha que quando um indígena médico se forma ele vai voltar para a aldeia, isso é quase impossível. Depois de estudar 5, 6 anos, se especializar em uma área como a medicina ou a própria engenharia, onde que ele vai trabalhar na aldeia? Às vezes, ele pode contribuir. A gente não pode menosprezar os avanços que os povos indígenas conquistaram, mas com esse cuidado, de não virar um profissional desempregado também. Fonte
Índio na presidência da FUNAI Temos que falar um pouco da Funai. Justamente porque não temos uma política indigenista definida, ela é o patinho feio do Ministério da Justiça. Ninguém queria assumir a presidência da Funai, a não ser aqueles políticos que perderam a eleição, uma das coisas que a gente não entende. A gente não entende também por que o governo brasileiro não investiu no próprio índio para assumir as rédeas da Funai, para criar um plano de ação, para fazer lobby no Congresso Nacional para que o orçamento da União, o orçamento parlamentar, pudessem contemplar a Funai. A Funai trabalha com mais de 300 nações indígenas no Brasil. A Funai tem uma demanda de 240 línguas no Brasil e tem que administrar territórios correspondentes a quase 15% do Brasil. É muito maior que qualquer ministério do próprio governo. Ela não tem orçamento, não tem dinheiro para sementes da roça, não tem dinheiro para fazer vigilância do seu território. É preciso que a gente comece a pensar que a economia mundial cobra dos povos
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indígenas uma postura que não seja a postura da cooptação econômica. Você não pode chegar numa aldeia e pedir para o índio explorar o ouro sem ter uma compensação adequada, ou explorar madeira sem ter uma compensação adequada. Para isso, o índio tem que aprender a linguagem da economia moderna. Fonte
Contexto político na atualidade e os índios
A presidente Dilma esteve várias vezes junto aos indígenas, criou uma conferência nacional de questões indígenas, criou um conselho consultivo para questões indígenas, mas ela não estabeleceu um programa. Não existe isso nem na Funai, nem no governo. Nós também observamos, o Brasil todo, os povos indígenas acompanharam seja nas marchas, nas aldeias, pelas rádios ou pela televisão, assistindo a pobreza que é a qualidade cultural e a qualidade intelectual dos deputados que votaram contra a presidente. O parlamentar eleito é despreparado. Ele não conhece as questões brasileiras. Ele transforma tudo em brincadeira. Os deputados não estavam fazendo charme ou brincadeira, tratava-se do futuro da presidência do nosso país. Todos estavam como se estivessem diante de um palco iluminado para falar as suas besteiras. Ficávamos pensando, onde nós, indígenas, vamos poder confiar em pessoas que não entendem a demanda do branco, quanto mais a demanda dos povos indígenas. Pensamos também que muitos daqueles que estavam lá receberam votos de algumas aldeias. Agora estamos pensando duas coisas: primeira, criar uma forma na eleição municipal, de termos vereadores eleitos, o maior número possível, independente do partido. Uma questão que a gente não pode mais levar em conta é se o partido é de esquerda ou direita. Tem que ser o partido que abraça ou não a causa indígena. Por outro lado, havendo essa mudança, precisamos já começar a negociar, seja com Michel Temer [vice-presidente], seja com [senador] Romero Jucá [PMDB-RR], que foi presidente da Funai, para mostrar que a gente não quer uma Funai pobre, uma Funai paternalista, mas uma Funai de ponta, científica, cultural, e a Universidade Indígena, com plano de ação para que a gente possa respirar um pouco melhor até a próxima eleição. Fonte
Articulação indígena
Os indígenas são muitos. Não falo por 100% da articulação, porque isso é impossível e nem temos uma única representação para falar com os poderes, isso não existe na relação indígena. Cada povo é dono da
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sua própria palavra. Essa articulação indígena tem que ser, por um lado, política. Por exemplo: quando algum indígena for falar com Michel Temer e sua equipe, tem que saber o que está querendo, tem que saber argumentar, defender seu ponto de vista. Por outro, tem que ser de identidade. Têm índios chamados ressurgidos ou renascidos, que se autoidentificam como índios, que requerem a sua condição tribal. Muitas vezes ele não viveu isso, mas ele requer. Ele aparece com cocar, às vezes ele não conhece o sentido daquele cocar, mas ele viu que para ser índio, ele tem que usar cocar, pintar o corpo. Essas identidades visuais também fazem parte da afirmação dos povos, não pode ser uma brincadeira só no Dia do Índio ou de uma marcha daqui ou dali. É importante que a gente aprenda a usar a força da dignidade dos indígenas para avançar como povos distintos. Vamos esperar que, no próximo Dia do Índio, a gente tenha uma plataforma mais igualitária para a sociedade e mais digna para as aldeias. Fonte
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Partido Indígena
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IV
O advogado Ary Paliano, formado pela Unochapecó (SC) e índio Caicangue de 56 anos é o presidente da sigla Partido Nacional Indígena (PNI). O novo partido precisa de 487 mil assinaturas para legalizar o partido cujo lema é: “colocar índios no Congresso pela porta da frente”. O PNI teria como objetivo reprovar a Proposta de Emenda à Constituição 215 – PEC 2015 -. Essa emenda transfere ao Congresso Nacional a atribuição de demarcação de terras indígenas. Esta PEC é uma ameaça tendo em vista que no Congresso os fazendeiros poderosos formam uma frente parlamentar ruralista com mais de 200 deputados.
PARTIDO NACIONAL INDÍGENA - PNI ATA DE REUNIÃO REALIZADA EM 7 DE FEVEREIRO DE 2013 Aos sete dias do mês de Fevereiro do ano de dois mil e treze, realizouse a reunião para fundação do PARTIDO NACIONAL INDÍGENA PNI, no Auditório do SINDSEP, Setor Bancário Sul ,Quadra 1, Bloco K-Brasília-DF, foi indicado para presidir os trabalhos o Senhor Ary Paliano, que imediatamente passou a compor a mesa, informando que a reunião teria a seguinte pauta: 01. Fundação do Partido Nacional Indígena (PNI); 02 Escolha da Diretoria Provisória. 03. Discussão sobre o Programa partidário; 04. Discussão sobre o Estatuto; 04. Aprovação do Programa e do Estatuto do Partido; Foi declarada aberta a reunião, dando-se inicio aos trabalhos, o Presidente da reunião o Senhor Ary Paliano, pediu para um secretário recolher os dados dos presentes, após a determinação, prosseguiu os trabalhos explanando os objetivos da criação do Partido Nacional Indígena e as estratégias para obtenção do sucesso esperado, bem como as diretrizes que devem ser colocadas no programa do PNI,, voltados a defesa e inserção dos índios em todas as discussões sobre a questão indígena . Prosseguindo os trabalhos, deu-se início a pauta de número 01, com votação direta, após a contagem dos votos, foram eleitos os dirigentes, e a direção do partido ficou composta da seguinte forma: Presidente Ary Paliano, Vice Presidente, Bemoro Metuktire: 1º Daniel Aparecido Toniolo,
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1ºTesoureiro Rivelino Pereira De Souza que passaram de imediato a exercer suas funções, e após a leitura dos nomes dos dirigentes, foram aplaudidos por todos os presentes. Dando prosseguimento aos trabalhos, deu-se início a pauta de número 01, Discutindo e sobre a fundação do PNI, sendo aprovado por unanimidade pelos participantes com sede e foro em Brasília SKI-04 LT 120 SETOR INDUSTRIAL GAMA- DF CEP 72445-040- discutindo acerca do Programa do Partido, foi debatido e elaborado o documento denominado PARTIDO NACIONAL INDÍGENA - PNI. Partindo para a pauta de número 03, e com base no Programa foi elaborado o Estatuto do partido, com indicações e apontamento dos presentes. Após um recesso de 20 minutos, partiu-se então para a pauta de número 04, quando foi lido em voz alta a todos os presentes o documento denominado PARTIDO NACIONAL INDÍGENA - PNI, e o Estatuto, dando inicio para votação a aprovação dos referidos documentos, após a deliberação foi aprovada por todos. O senhor Presidente prosseguiu com pauta de número 05, e primeiramente foi discutido sobre a bandeira/símbolo do partido, e com base no Programa, foi definido que seriam as letras P-N-I indicando o significado de PARTIDO NACIONAL INDIGENAS onde a letra P seria em Vermelho simbolizando a atenção e urgência ao respeito a mãe terra, aletra N em Amarelo, simbolizando o sol que aquece e traz vida a todos, além das cores amarelo e vermelho simbolizando a origem indígena, a letra Iem Verde, simbolizando as matas existentes que garante o oxigênio indispensável ao ser humano e a preservação da natureza e ainda uma lança cruzada abaixo das letras simbolizando a lança 8 um objeto sagrado aos indígenas e o direcionamento ao futuro. Ainda foi definido que o número a ser utilizado pela legenda nas eleições seria o número (52), (CINQUENTA E DOIS). Foi discutido acerca do futuro site, concluindo assim a pauta de número 05. O secretário que recolheu os dados dos presentes entregou a lista ao Senhor Presidente, que comunicou que haviam 110 eleitores, com domicílio eleitoral em um terço dos Estados, conforme Art. 08 da Lei nº 9.096, de 19 de Setembro de 1995). O Senhor Presidente perguntou se outra pessoa gostaria de fazer o uso da palavra, Todos os presentes tiveram 10 minutos para falar e por unanimidade aprovaram a fundação do PNI Partido Nacional Indígena e solicitaram "URGENCIA" no encaminhamento formal do Partido, então o Senhor Presidente teceu algumas palavras agradecendo ao Senhor Deus pela reunião, e agradeceu o apoio dos (cento e trêz) presentes, discorreu sobre a situação econômica e política dos índios e a sociedade como um todo, e disse que o momento necessita de mudança, e devemos buscar a inclusão e defesa dos Direitos Indígenas, além do compromisso com a sociedade não indígena de uma forma igualitária, sem qualquer preconceito ou racismo onde o espirito guerreiro dos Índios severamente irão se opor contra injustiças e corrupção. Em seguida, o Senhor Presidente solicitou a presença de todos para assinarem na lista de presença do Livro de Atas, e em seguida foi lida e aprovada por todos, que segue assinada por mim e pelo Presidente. Encerrada a cessão. Esta ata é o fiel espelho acontecido. Brasília-DF, 7 de fevereiro de 2013 ARY PALIANO Presidente do PNI-PARTIDO NACIONAL
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Em entrevista concedida ao portal ORM em 27.08.2013 Ary Paliano afirmou que a falta de peso político do indígena é a causa da ausência de políticas públicas para o povo índio. A criação de u partido tem como objetivo colocar o índio no poder. Como é de conhecimento da sociedade, os índios não têm como defender seus direitos, porque tudo depende da política e os índios não têm peso político. Nós não temos representantes para defender as nossas causas no Congresso. Tanto no executivo, como no legislativo, nós ainda não conseguimos quebrar essa barreira para levar as políticas públicas em benefício do nosso povo. Então, o PNI nasceu para ser um mecanismo que coloque, de fato, os indígenas no poder. Porque, a partir do momento em que os índios estiverem no poder eles mudarão a realidade dos índios em todo o Brasil. Hoje, tem muitas políticas públicas, mas os índios não têm acesso a elas. Faltam mecanismos que façam com que os índios sejam inclusos nessas políticas. Os índios no Brasil estão excluídos de tudo, esse é um dos nossos problemas principais. Tanto os partidos políticos como os nossos representantes eleitos ou nomeados terão a condição de fazer algo mais efetivo pelo seu povo com a caneta na mão. O Partido quebrará a barreira da exclusão. Com os mecanismos do partido político na mão, nós podemos mudar esse contexto caótico do índio, hoje, no Brasil. É um mecanismo legal, constitucional, mas, nós também enfrentaremos dificuldades, porque política é política, e nós já tivemos divergências de não índios com índios, mas tudo é superável.
Sobre a Usina Hidrelétrica de Belo Monte:
Nós temos uma proposta para aquele problema. E essa proposta diz que todo e qualquer empreendimento que respeite a convenção 69 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)- nós queremos que ela seja cumprida, antes de tudo - colocará os índios como empreendedores e não como alguém que recebe uma indenização ou algo assim. Se os índios tiverem que sair, que saiam, mas que os índios sejam respeitados dentro da Lei e da convenção e que tenham uma participação permanente no empreendimento, como empreendedor.
Ao ser perguntado se o partido endossa as manifestações promovidas por índios no Pará contra a Usina Hidrelétrica de Belo Monte afirmou que sim, pois o partido tem formado comissões para auxiliar na eficácia dos protestos.
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...nós teremos comissões para todas as áreas em que os índios têm se manifestado, ultimamente. Essas comissões auxiliarão nesses casos e ajudarão a dar mais voz e eficácia aos protestos. Teremos uma comissão jurídica, indígena, de educação, de saúde, das mulheres indígenas etc., tudo isso muito bem instituído dentro do partido.
Sobre a política brasileira na atualidade, afirmou:
A política que tem sido feita hoje no País, claramente age contrariamente aos interesses dos índios por prezar questões de popularidade e desenvolvimento a qualquer custo para a obtenção de lucros. Eles (agentes políticos) trabalham para uma classe e passam por cima de nós, dos nossos direitos, da nossa voz. Somos todos massacrados. Eles violam a constituição federal em nome de popularidade com uma sociedade da qual nós somos excluídos. Sociedade que em parte concorda com tudo isso. Esse desenvolvimento a qualquer custo pode ser bom para alguns setores da sociedade, mas, para nós que vivemos do ornamento da terra, dos bens naturais, pode não ser tão bom assim e eles não avaliam isso, não nos consideram, nos excluem. Não trabalham para o nosso benefício nunca! Além de destruir essas terras, os governos não fazem uso dela para a sobrevivência dos índios.
Ao final foi perguntado sobre qual é a grande ambição do PNI, Paliano, encerrou:
Colocar nossos índios no poder para decidir os destinos do nosso povo. A primeira etapa é chegar ao Congresso Nacional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Nas comemorações dos 500 anos do Brasil tinha índio apanhando da polícia. Nada mais sintomático. A festa não era para eles e nem poderia ser, pois foi o dia do juízo final, dia que marca o início da subjugação. Fazer uma festa de 500 anos é comemorar o genocídio pela espada ou por uma guerra química
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exterminadora de centenas de milhares de povos originários desta terra chamada por eles de Pindorama. Caíam no chão aos milhares, acometidos das enfermidades europeias trazidas no corpo do colonizador e para o qual não tinham a devida proteção. Foi uma hecatombe. Se existiu um apocalipse, para os índios, ele se deu a partir de 22 de abril de 1500. Comemorar o que? Neste livro fazemos uma grande provocação: índio no poder. Soa como uma heresia, um sacrilégio, uma brincadeira de mau gosto, um mal dizer, uma tolice, algo improvável, absurdo e sem chance de acontecer segundo a maioria. A justiça para os indígenas é uma problemática que parece insolúvel, longe de terminar. Sem dúvida a trajetória de Raoni, Mario Juruna, Ailton Krenak e Marcos Terena nos faz refletir sobre uma sociedade indionófila ou que não possui o mínimo respeito aos seus povos originários. O processo de conquista da civilização europeia não terminou com Francisco Pizarro, carrasco de Atahualpa, nem tão pouco com o regicida Hernán Cortez, continua nos dias de hoje em escaladas genocidas, em nome do progresso e da civilização. Belo Monte demonstra o avanço da civilização e gera impactos com o alagamento de áreas vitais. Raoni afirma que seu povo não é mais nômade, pois a redução de sua terra os abrigou a tornar sedentários. É preciso gerar energia para a civilização industrializada, o progresso e o desenvolvimento brasileiro que aspira alcançar a condição de potência no mundo. Raoni entendeu isto faz muito tempo. Sua capacidade de mobilização se deu nos anos 80 com a associação com astros de rock, cineastas que proveram recursos e divulgaram a causa indígena. Percorreu o mundo para denunciar o que ocorre com seu povo e com a floresta, não se calou. Seu grande inimigo hoje é Belo Monte. Tem sido implacável ao condenar sua construção, pois trará grandes impactos negativos. As toneladas de peixes mortos, o alagamento do lar dos ribeirinhos pescadores, o deslocamento da população para casas de qualidade duvidosa e a completa ignorância e desprezo pelos atingidos pela barragem demonstra o processo civilizatório europeu em curso.
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Juruna chegou lá, foi o índio no poder e a experiência foi válida, mas ficou demonstrado o desprezo do branco por aquele legitimo representante do povo. Mario entendeu na prática o que seria a chegada do índio ao poder. Enganado, seduzido, subestimado, chegou a corromper-se, voltou atrás e perdeu a linha. Isto custou sua reeleição em um momento decisivo como a Constituinte de 1988. Esquecido, terminou seus dias de forma triste. Aquele senhor sentado em uma cama e que se locomovia, somente, em uma cadeira de rodas era uma sombra do que foi. Um jovem altivo, orgulhoso e que não tinha papas na língua para dizer o que estava ocorrendo. Ailton Krenak e Marco Terena são de uma geração posterior, índios que estudaram e criaram uma consciência política entendendo que a atuação militante era seu único meio. Terena tentou ser o segundo índio ao chegar ao Congresso Nacional, mas até o presente momento não conseguiu. Foi o primeiro aviador indígena do Brasil e foi perseguido por esta ousadia, cassaram sua permissão para voar, foi sabotado e demonstrou habilidade para salvar a ele e todos os caciques que estavam naquele voo do avião Sêneca em 1980. Estaríamos tornando-os vitimas, caso não contássemos sobre a sua luta, suas trajetórias e suas ideias. Existem discordâncias em relação à inserção do índio no âmbito partidário e parlamentar. Ailton Krenak teme a descaracterização, a perda de identidade de seu povo na lida, na participação de um sistema eleitoral e político de origem europeia. Considera importantes políticos que defendam a causa indígena, mas teme a formação de um partido indígena. Marcos Terena, contrariamente, considera a necessidade de uma representação parlamentar autenticamente indígena, inclusive defende que os índios devam ocupar a presidência da FUNAI e transformá-la em uma instituição com autonomia, desvinculada do Ministério da Justiça. A criação de um partido indígena tem sido articulada por Ary Paliano que, em 2013, deu o primeiro passo rumo a este intento. O Partido Nacional Indígena precisa de mais de 400 mil assinaturas para entrar no sistema eleitoral, ou seja, para poder concorrer às eleições, ter
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candidatos. Algumas vozes afirmam que o contingente indígena é insuficiente para a formação de uma bancada indígena. É necessário que os grupos sociais sejam representados no Congresso Nacional com a formação de bancadas, pois hoje observamos a formação de bancadas: religiosa, ruralista, fabricante de armas, bingo e jogos de azar, entre outros. O poder econômico está fazendo valer seus interesses em Brasília, no parlamento. As mulheres são 7% do Congresso e o MST? A Comunidade LGBT? Os negros? Temos em 2017, o Congresso Nacional mais conservador desde a Constituinte de 1988. A PEC 214 (que retira da Presidência da República a atribuição de demarcação das terras indígenas e a coloca nas mãos do Congresso Nacional) só é proposta pois a bancada ruralista tem maioria. A sociedade precisa ter deputados e senadores, principalmente os indígenas. Raoni está certo em se preocupar e alertar as novas gerações para que não percam a sua cultura ancestral, suas referências. Esta é uma preocupação em uma sociedade de massas que conta com uma indústria cultural disposta converter os cidadãos às suas ideologias de consumo. São muitas as ameaças vividas por seu povo. A entrada do índio na política significaria perder um muito de sua cultura, converter-se, despersonalizar-se? Ou é melhor lutar para manter as raízes, a identidade cultural? É uma encruzilhada em que o povo da floresta se encontra. A adesão à política partidária e parlamentar não é um consenso interno, existem muitas visões contrárias. Juruna falava que se tivesse 50 Jurunas no Congresso Nacional, o país mudava. Chamou os ministros de ladrões, enfrentou um processo e no final venceu, escapou ileso. Seu gravador contra a hipocrisia andava com ele para lá e para cá. Raoni, Marcos e Ailton consideram válida a atuação de Juruna. Certamente não existe nada mais provocativo do que a frase: indio no poder. Essa frase é assustadora para muitos grupos sociais que comparam os índios a árvores, considera-os incultos ou até mesmo achamos que índio não pode ter celular, notebook, andar de automóvel ou pilotar avião. Espera vê-los sempre morando em cabanas, entregues à sorte e sofredores de um extermínio total.
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Aqui mencionamos apenas quatro importantes atores políticos indígenas que estão atuando intensamente, estão percorrendo o mundo, mobilizando-se. Este livro foi uma tentativa de reunir seus pensamentos em torno da possibilidade da chegada do índio ao poder. É realmente assustador que tenhamos poucas publicações que refletem uma questão tão importante como a possibilidade de chegada ao poder do povo indígena.
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ANEXOS
Periódicos\Porantim\1982 IV Nº 36 - Janeiro/Fevereiro-82\V Nº 40/41 - Junho/Julho-82 http://docvirt.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=hemeroindio&pagfis=3586
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Cacique Juruna longe do poder O único índio que virou deputado vive doente num casebre no Guará I, cidade-satélite de Brasília
André Barreto
Foto:Roberto Jaime
“Fui infeliz e vou morrer infeliz”, diz Juruna, prostrado em seu quarto, onde passa a maior parte do tempo deitado. Triste, infeliz e esquecido. É assim que se sente hoje o ex-deputado federal Mário Juruna, único índio na história brasileira a assumir um mandato no Congresso Nacional, pelo PDT. Aos 60 anos, ele vive em um casebre no Guará I, cidade-satélite de Brasília. Ganha R$ 3 mil como secretário do partido. O dinheiro é utilizado para sustentar 15 pessoas, entre filhos e netos, que dividem o mesmo teto.
Mas Juruna, na prática, não exerce sua função. Ele tem apenas um rim funcionando e está condenado a uma cadeira de rodas por causa de uma cirurgia que extraiu parte do fêmur infeccionado. Passa a maior parte do tempo deitado na cama, onde exala seu descontentamento com o presidente Fernando Henrique Cardoso, ex-companheiro de tribuna. “Esse presidente é um cínico. Seria melhor que continuássemos no regime militar”, desabafa. Juruna foi eleito deputado federal e cumpriu mandato de 1983 a 1987.
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Como parlamentar, criou a Comissão do Índio. Irreverente, chamava dinheiro de “lixo” e jamais conversava com uma autoridade sem a companhia de um gravador, para não correr o risco de ser chamado de mentiroso. Foi fundamental na eleição de Tancredo Neves, em 1985, ao denunciar a tentativa de compra de voto, feita por Calim Eid, tesoureiro de Paulo Maluf. Decepcionado, acha que seu trabalho em favor de seu povo foi em vão. “Já sofremos demais. Fui infeliz e vou morrer infeliz”, diz.
O primeiro contato que o xavante teve com um branco foi aos 17 anos. Queria aprender com o “tal povo civilizado” e foi estudar em uma missão religiosa. Não falava português, mas ainda assim pediu permissão para sair da escola e trabalhar na cidade. Quando retornou à aldeia, em 1964, foi recebido com a ira do padre que catequizava os índios. Chegou a ser expulso da tribo, mas continuou na luta. http://www.terra.com.br/istoegente/31/reportagens/rep_juruna.htm
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"Depuíndio" Autores: Vevé Calazans e Dito
Intérprete: Emílio Santiago
Ano de lançamento: 1983
"Índio foi eleito deputado Lá no plenário tá botando pra quebrar Não cai na conversa do apito Gosta de loura sem biquini, sem colar
Quando ele pinta todo mundo grita alto Ianê caruca lá no meio do Planalto Ianê caruca, ianê caruca O depuíndio tá fundindo a nossa cuca"
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Eu vi a planilha do mensalão para Juruna, diz assessor Alceu Luís Castilho Especial para o Diário No início dos anos 80, um personagem sacudiu a política nacional: o cacique xavante Mário Juruna elegeu-se deputado pelo PDT do Rio de Janeiro com 40 mil votos e ganhou a simpatia das câmeras de televisão. Mais de 20 anos depois, um assessor parlamentar direto do líder indígena, o antropólogo José Porfírio Fontenele de Carvalho, conta com exclusividade detalhes do período em que Juruna esteve na Câmara. Em meio a uma campanha sistemática de deputados para desmoralizar o cacique, o indigenista, hoje consultor de empresas, destaca um episódio: o da compra de votos para a eleição presidencial – indireta – de 1984. O corruptor, segundo ele, chamava-se Paulo Salim Maluf.
A vítima da corrupção, Juruna. O esquema, Carvalho não tem dúvidas de chamar de mensalão. “Isso não é uma coisa nova”, dispara. O indigenista diz que no papel escrito à mão, e entregue por Calim Eid – braço-direito de Maluf na época – a Juruna num hotel de Brasília, estavam previstos US$ 40 mil em quatro etapas: na hora do cacique ‘malufar’, na reafirmação do apoio ao então deputado, no dia anterior à votação e no seguinte. Em tempos de mensalão, e num momento em que a população indígena cresce na mesma medida que a possibilidade de uma liderança étnica ser eleita, principalmente nos estados do Norte, o relato de Carvalho torna-se ainda mais importante – além de oferecer uma pitada indigesta da história recente do Brasil.
DIÁRIO – O senhor se aposentou em 1997. Na Funai fazia exatamente o quê? JOSÉ PORFÍRIO DE CARVALHO – Eu era sertanista. Sou ainda sertanista. Não é algo que se deixa de ser. Especializei-me em índios Waimiri Atroari e Parakanã.
DIÁRIO – O senhor tinha alguma vinculação partidária nessa época?
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CARVALHO – Não. Nem MDB nem Arena. Em relação à ditadura eu fui processado várias vezes. Na minha portaria de demissão da Funai, em 1983, fui acusado de comunista e subversivo. Fui cassado, e em 1997 anistiado. Minha cassação foi antes do governo Figueiredo, tive os direitos políticos cassados, aí voltei para a Funai com mandado de segurança, durante o governo Geisel.
DIÁRIO – Em 1983 o que acontece? CARVALHO – Eu tinha sido demitido antes, em 1980, por motivos políticos, mas entrei com outro mandado de segurança. Em 1983 saí de uma vez. Fui trabalhar na Câmara com o Mário Juruna, como secretário dele, na Comissão do Índio.
DIÁRIO – O senhor se decepcionou com a interrupção da projeção política do Juruna? CARVALHO – Não. Eu tive problemas - e é natural que haja problemas. Na hora de conviver com os deputados, ele passou a entender (a atividade parlamentar) de uma forma errada. Tentei mudar essa visão dele, mas Juruna se sentia muito senhor de si, e preferi sair. Estava doente, não pude ficar.
DIÁRIO – Ele foi cooptado? CARVALHO – Não diria assim. Diria que passou a ouvir muito o pessoal do mensalão. Ali dentro da Câmara não tem santo.
DIÁRIO – Mas qual foi a reação dos parceiros nessa época? CARVALHO – O Juruna chocava as pessoas. Imagina os deputados, os parlamentares brasileiros se sentem a nata da nação, pessoas superpreparadas, eles “se acham”. E de repente aparece um índio no Congresso, aquilo desmoralizava eles, a presença daquele índio. Parecia mais um folclore, uma pessoa totalmente despreparada para estar ali no parlamento brasileiro. E eles tentavam cada vez mais diminuí-lo, fazer arapucas de discursos para fazê-lo se perder. Contavam histórias para ele sobre dinheiro, sobre fortunas, sobre como usar o dinheiro. Então ele começou a ficar em dúvida entre o que era bom e ruim, o que era mau e o que era justo.
DIÁRIO – Não havia um grupo de cinco ou seis deputados que tomavam a frente desse processo?
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CARVALHO – Uns cinco defendiam o Juruna, o resto era tudo contra ele. Um negócio pesado, muito pesado. Ele conseguiu conviver um bom tempo com muita dignidade. Mas aí começou a ver que aquela presença não tinha a importância que ele imaginava. E começou a se cansar daquilo. Todo dia ele ia para o plenário, ele pensava que todo deputado tinha de ficar ouvindo todos os discursos. Ia para lá e se sentava. E lá ficava. E não saía dali. Aí eles começaram a dizer: vamos tirá-lo daí de dentro. Porque parecia uma talaia - uma pessoa lá, marcando presença. Aí começaram muitos problemas.
DIÁRIO – Mas quem tomava a frente dessa postura, entre os deputados? CARVALHO – Diretamente, não. A maioria levava na brincadeira. Só aquela turma do PMDB, Dante de Oliveira, Modesto da Silveira, Freitas Nobre, o Eduardo Suplicy, eram pessoas dignas, o tratavam com muita dignidade. Outro que o tratava com respeito era o Israel Dias Novais , um deputado por São Paulo, protegia ele, procurava protegê-lo dessas arapucas, dessas histórias. E saía notícia no jornal que ele ia para o restaurante da Câmara, no anexo 4, e aí jantava, almoçava e não pagava a conta. Os deputados o convidavam para a mesa porque ele era a atração, a imprensa sempre procurava. Aí saía todo mundo, um por um, sem pagar a conta, deixavam o Juruna, sozinho, para pagar. Olha o mau caratismo. Aí os garçons vieram cobrar dele as despesas. Ele disse: não. Apareceu então o (jornalista brasiliense) Marconi Formiga dizendo: Juruna mais uma vez deu um golpe no restaurante da Câmara. Eram coisas desse tipo, dessa baixaria.
DIÁRIO – Quando ele não conseguiu se reeleger, o que aconteceu? CARVALHO – Ele entrou em depressão. Quando se candidatou a deputado, já tinha rompido em parte com o trabalho dele. A tribo achava que os militares tinham feito dele um vilão. Era uma pessoa que, pela comunidade, era para ter relacionamento com os brancos. E ia lá com os militares pedir coisas para a tribo. Eles não cumpriam. Aí surgiu o gravador, que era útil para ouvir os militares na Funai. Ele levava o gravador de volta para que as pessoas ouvissem o que os caras prometeram. Porque quando a comunidade cobrava dos militares, eles diziam: nós já entregamos para o Juruna. Ele ficou em situação difícil com a comunidade. Tinha amizade com o Darcy Ribeiro, que tinha acabado de voltar do exílio e se juntou com o Brizola, e o lançaram candidato a deputado federal. Eu já tinha amizade com ele e fui contra ele ser candidato. Disse que seria um aproveitamento da imagem dele, ele já tinha uma imagem nacional, pela sua figura televisiva, seus cabelos, e foi bem utilizado na campanha política do Brizola. Eu não acreditava que ele ia ser eleito. Teve 40 mil votos. Com muita grandeza, me convidou para ser um dos secretários dele.
DIÁRIO – Quando o senhor fala da turma do mensalão, diz que ele recebia dinheiro?
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CARVALHO – Teve uma acusação grave contra ele, sobre receber dinheiro do Maluf. Era um mensalão. Quando o Maluf foi candidato (contra Tancredo Neves, na última eleição indireta para presidente), correu um boato na Câmara - e pelo jeito era verdade - que o Maluf comprava voto a voto. E não era conversa a boca pequena. O valor era alto. O Juruna chegou a me perguntar: é verdade, será que é verdade? Disse que era conversa, não dei muita importância. E ele terminou de uma certa maneira se envolvendo nessa história. O interlocutor foi um sujeito chamado Calim Eid. Esse Calim Eid o chamou num desses hotéis e fez uma planilha, igual à do mensalão - isso não é uma coisa nova. Eu peguei a planilha, cheguei a ver. A planilha tinha assim: primeiro pagamento - quando ele malufasse. Malufar seria declarar publicamente que iria votar no Maluf. Na época falavam: fulano de tal malufou. “X” cruzeiros. Correspondia mais ou menos a US$ 10 mil. A quantia para o Juruna, não sei a dos outros. A segunda parcela viria quando, 30 dias depois de malufar, ele reafirmar publicamente que continuava. A terceira era na véspera da votação, e a quarta quando confirmasse o voto. Era um bolão de aproximadamente US$ 40 mil.
DIÁRIO – E? CARVALHO – Ele recebeu a primeira parcela. Quando eu senti que ele tinha recebido... Ele não sabia contar. Não sabia contar acima de dez. Pegou dinheiro, dinheiro vivo, e não sabia contar. E não podia falar comigo nesse assunto, porque sabia da minha reprovação. Mas ficou com peso na consciência, me chamou e contou. Eu vi o dinheiro e tinha que tomar uma providência. Como ele era do PDT, comuniquei à liderança do PDT esse fato grave e que ele estava pronto para devolver. Fui ao Brizola, com o Mário Juruna. Nessa época o ministro da Justiça era o Ibrahim Abi-Ackel. Minha idéia, meu plano, e uma das razões por que saí foi justamente essa história, era que o dinheiro fosse devolvido ao vivo para o Abi-Ackel. Era a prova do mensalão do Maluf. Ele levaria o dinheiro em espécie e devolveria para o ministro. O que aconteceria? Seria cassado o Maluf, não seria candidato.
DIÁRIO – Mas não foi o que aconteceu... CARVALHO – O Brizola usou outro método: chamar toda a imprensa e querer capitalizar para o PDT a denúncia. Mas todo mundo negou: o Maluf, o Calim Eid negou, que nunca tinha dado, que aquilo era um truque do Brizola.
DIÁRIO – E você era uma testemunha. CARVALHO – Vi a planilha. Não tinha nome, nada, mas estava lá a planilha, num papel rascunho.
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DIÁRIO – Datilografado? CARVALHO – Não, a mão. Mas como eles usaram para capitalizar politicamente para o PDT a história, não teve repercussão. O Brizola era inimigo tradicional do Maluf, virou um... Mas, na minha opinião, se o Juruna fosse devolver fisicamente o dinheiro na mão do Abi-Ackel, ele seria obrigado a encontrar de onde veio o dinheiro.
DIÁRIO – Depois desse período o senhor continuou amigo do Juruna? CARVALHO – Sim. Foi devolvido o dinheiro, e depositado. Ninguém recebeu. Descobriu-se o número da conta do Calim Eid e foi depositado na conta dele.
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PARTIDO NACIONAL INDÍGENA - PNI ATA DE REUNIÃO REALIZADA EM 7 DE FEVEREIRO DE 2013 Aos sete dias do mês de Fevereiro do ano de dois mil e treze, realizou-se a reunião para fundação do PARTIDO NACIONAL INDÍGENA - PNI, no Auditório do SINDSEP, Setor Bancário Sul ,Quadra 1, Bloco K-Brasília-DF, foi indicado para presidir os trabalhos o Senhor Ary Paliano, que imediatamente passou a compor a mesa, informando que a reunião teria a seguinte pauta: 01. Fundação do Partido Nacional Indígena (PNI); 02 Escolha da Diretoria Provisória. 03. Discussão sobre o Programa partidário; 04. Discussão sobre o Estatuto; 04. Aprovação do Programa e do Estatuto do Partido; Foi declarada aberta a reunião, dando-se inicio aos trabalhos, o Presidente da reunião o Senhor Ary Paliano, pediu para um secretário recolher os dados dos presentes, após a determinação, prosseguiu os trabalhos explanando os objetivos da criação do Partido Nacional Indígena e as estratégias para obtenção do sucesso esperado, bem como as diretrizes que devem ser colocadas no programa do PNI,, voltados a defesa e inserção dos índios em todas as discussões sobre a questão indígena . Prosseguindo os trabalhos, deu-se início a pauta de número 01, com votação direta, após a contagem dos votos, foram eleitos os dirigentes, e a direção do partido ficou composta da seguinte forma: Presidente Ary Paliano, Vice Presidente, Bemoro Metuktire: 1º Daniel Aparecido Toniolo, 1ºTesoureiro Rivelino Pereira De Souza que passaram de imediato a exercer suas funções, e após a leitura dos nomes dos dirigentes, foram aplaudidos por todos os presentes. Dando prosseguimento aos trabalhos, deu-se início a pauta de número 01, Discutindo e sobre a fundação do PNI, sendo aprovado por unanimidade pelos participantes com sede e foro em Brasília SKI-04 LT 120 SETOR INDUSTRIAL GAMADF CEP 72445-040- discutindo acerca do Programa do Partido, foi debatido e elaborado o documento denominado PARTIDO NACIONAL INDÍGENA - PNI. Partindo para a pauta de número 03, e com base no Programa foi elaborado o Estatuto do partido, com indicações e apontamento dos presentes. Após um recesso de 20 minutos, partiu-se então para a pauta de número 04, quando foi lido em voz alta a todos os presentes o documento denominado PARTIDO NACIONAL INDÍGENA - PNI, e o Estatuto, dando inicio para votação a aprovação dos referidos documentos, após a deliberação foi aprovada por todos. O senhor Presidente prosseguiu com pauta de número 05, e primeiramente foi discutido sobre a bandeira/símbolo do partido, e com base no Programa, foi definido que seriam as letras P-N-I indicando o significado de PARTIDO NACIONAL INDIGENAS onde a letra P seria em Vermelho simbolizando a
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atenção e urgência ao respeito a mãe terra, aletra N em Amarelo, simbolizando o sol que aquece e traz vida a todos, além das cores amarelo e vermelho simbolizando a origem indígena, a letra Iem Verde, simbolizando as matas existentes que garante o oxigênio indispensável ao ser humano e a preservação da natureza e ainda uma lança cruzada abaixo das letras simbolizando a lança 8 um objeto sagrado aos indígenas e o direcionamento ao futuro. Ainda foi definido que o número a ser utilizado pela legenda nas eleições seria o número (52), (CINQUENTA E DOIS). Foi discutido acerca do futuro site, concluindo assim a pauta de número 05. O secretário que recolheu os dados dos presentes entregou a lista ao Senhor Presidente, que comunicou que haviam 110 eleitores, com domicílio eleitoral em um terço dos Estados, conforme Art. 08 da Lei nº 9.096, de 19 de Setembro de 1995). O Senhor Presidente perguntou se outra pessoa gostaria de fazer o uso da palavra, Todos os presentes tiveram 10 minutos para falar e por unanimidade aprovaram a fundação do PNI -Partido Nacional Indígena e solicitaram "URGENCIA" no encaminhamento formal do Partido, então o Senhor Presidente teceu algumas palavras agradecendo ao Senhor Deus pela reunião, e agradeceu o apoio dos (cento e trêz) presentes, discorreu sobre a situação econômica e política dos índios e a sociedade como um todo, e disse que o momento necessita de mudança, e devemos buscar a inclusão e defesa dos Direitos Indígenas, além do compromisso com a sociedade não indígena de uma forma igualitária, sem qualquer preconceito ou racismo onde o espirito guerreiro dos Índios severamente irão se opor contra injustiças e corrupção. Em seguida, o Senhor Presidente solicitou a presença de todos para assinarem na lista de presença do Livro de Atas, e em seguida foi lida e aprovada por todos, que segue assinada por mim e pelo Presidente. Encerrada a cessão. Esta ata é o fiel espelho acontecido. Brasília-DF, 7 de fevereiro de 2013 ARY PALIANO Presidente do PNI-PARTIDO NACIONAL INDÍGENA
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ESTATUTO INDÍGENA
DO
PARTIDO
NACIONAL
DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES Art. 1º. O Partido Nacional Indígena - PNI, fundado em conformidade com o art. 17 da Constituição Federal e legislação pertinente, com sede e foro em Brasília - Distrito Federal, podendo seus órgãos nacionais instalar-se ou reunir-se em outras unidades da Federação. O PNI orientará a sua ação pelo seu Programa e se organizará e funcionará de acordo com este Estatuto. § 1º O PNI- PARTIDO NACIONAL INDÍGENA, como Partido Político destina-se a assegurar, no interesse do Regime Democrático e de Direito, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos indígenas e a sociedade não indígenas como um todo definidos na Constituição Federal. § 2º O PNI - PARTIDO NACIONAL INDÍGENA, exercerá a sua ação, de forma permanente e em âmbito nacional, sem subordinação a entidades ou governos estrangeiros. § 3º O PNI- PARTIDO NACIONAL INDÍGENA, não ministrará instrução militar ou paramilitar, nem utilizar-se-á de organização da mesma natureza bem como não adotará uniforme para seus membros, salvo uso de camisetas com a sigla partidária em locais não proibidos. § 4º O Partido Nacional Indígena é representado em juízo, ou fora dele, pelo presidente do Diretório Nacional.Nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios a representação do Partido é exercida, respectivamente, pelos presidentes dos Diretórios Estaduais e Municipais. DO PROCESSO DE FILIAÇÃO AO PARTIDO NACIONAL INDÍGENA Art. 2º. A filiação ao Partido, feita em fichas impressas conforme modelo determinado pela Comissão Executiva Nacional e em duas vias, observará as condições estabelecidas neste Estatuto.
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Parágrafo único. Da ficha constará declaração de aceitação, pelo filiando, doPrograma e Estatuto do PNI - Partido Nacional Indígena. Art. 3º. A filiação será feita nos Diretórios Municipais em que o filiando for eleitor e somentepoderão filiar-se eleitores maiores de 16 (dezesseis) anos de idade. Parágrafo único. O Diretório Nacional poderá criar sistema especial de filiação paraincentivar a militância partidária entre jovens indígenas não eleitores, menores de 16 anos. Art. 4º. Não existindo Diretório Municipal organizado, a filiação poderá ser feita perante oDiretório Estadual, através de representação do PNI. Parágrafo único. É admitida a filiação perante o Diretório Nacional ou Estadual.Art. 5º. Solicitada à filiação, será aberto o prazo de 3 (três) dias para apresentação, por escrito, de impugnação, o que poderá ser feito por qualquer filiado, assegurando-se igual prazo para contestação. § 1º O prazo de que trata o "caput" deste artigo inicia-se no dia subsequente a data da assinatura do pedido de filiação. § 2º Decorrido o prazo estabelecido, desde que não ocorra impugnação, será considerada deferida a filiação. § 3º Em reconhecimento ao ato de vontade do eleitor filiado, considera-se como data de filiação ao partido, a data da assinatura do respectivo pedido de filiação. § 4º Ocorrendo impugnação, a Comissão Executiva deliberará a respeito, no prazo de até 3 (três) dias contados a partir do dia subsequente ao do término do prazo de impugnação. § 5º Da decisão denegatória da filiação, caberá recurso a Comissão Executiva Estadual, a ser interposto no prazo de 5 (cinco) dias, sem efeito suspensivo, contados a partir do dia subsequente da decisão denegatória, ressalvada a hipótese de filiação perante o Diretório Estadual, quando o recurso será interposto à Comissão Executiva Nacional. § 6º O eleitor Filiado receberá como comprovante de filiação, uma via da ficha e a outra ficará na Secretaria do órgão partidário no qual ocorreu a filiação. Art. 6º. São membros do Partido: I- fundadores: os que assinaram a Ata de Fundação do PNI - Partido Nacional Indígena ou nele se inscreverem até 60 (sessenta) dias contados da publicação, na Imprensa oficial, do seu Manifesto de Fundação. II - efetivos: os que nele se filiarem nos termos da lei e deste Estatuto. III- militantes: os que optarem por intensa participação nas atividades partidáriase concordarem em contribuir para a manutenção do Partido nos termos do Estatuto,
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estando reservado ao Filiado Militante o exercício de funções partidárias, a designação pelo Partido para o exercício de funções públicas e a participação, como candidato, em pleitos eleitorais. Art. 7º. O cancelamento da filiação partidária verificar-se-á nos seguintes casos: I - desligamento voluntário; II - desligamento por determinação da Justiça Eleitoral; III - morte; IV - perda dos direitos políticos; V - expulsão em decorrência de processo regular; VI- não recadastramento. § 1º Ocorrendo a suspensão temporária dos direitos políticos na forma prevista em lei,a filiação será suspensa até que cesse a pena. § 2º Para desligar-se do Partido, o Filiado fará comunicação escrita ao órgão partidário,junto ao qual estiver filiado, enviando, ainda, cópia desta comunicação ao Juiz da ZonaEleitoral em que for inscrito, considerando-se como data de desfiliação a dacomunicação ao Partido. § 3º Na hipótese de transferência de domicílio eleitoral, o Filiado deverá fazercomunicação ao órgão partidário ao qual estiver filiado, a fim de que seja excluído darelação de Filiados, cabendo a este fazer idêntica comunicação ao órgão partidário danova jurisdição eleitoral do Filiado, objetivando a sua inclusão. § 5º O Partido poderá, no Município, publicar em órgão de imprensa ou em sua faltaencaminhar ao respectivo Juízo Eleitoral, edital de convocação aos Filiados, para queem local determinado e durante o período de 30 (trinta), dias com data inicial e final estabelecida, compareçam para atualização de seus dados cadastrais. O nãocomparecimento de Filiado autoriza seu desligamento do Partido. DOS DIREITOS E DEVERES E DA DISCIPLINA PARTIDÁRIA Art. 8º - Todos os filiados têm os mesmos direitos e deveres. Art. 9º - São direitos do filiado: I - participar, regularmente, das atividades do PNI; II - votar e ser votado para todos os órgãos na forma da lei e deste Estatuto; III - exercer, em caráter preferencial, funções públicas de livre provimento nos órgãos em que o Partido venha a ter a responsabilidade de administrar e nos gabinetes dos parlamentares filiados ao Partido, atendidos os requisitos de capacitação e pertinência;
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IV - disputar, observadas as exigências da Constituição, da lei, e deste Estatuto, cargo público eletivo e função partidária; V- manifestar-se livremente sobre questões doutrinárias e políticas, desde que não conflitem com o regime democrático, com os princípios doutrinários e programáticos do Partido e no âmbito interno do Partido sobre decisões partidárias adotadas; VI- impetrar recursos em defesa de seus interesses políticos perante a Justiça; VII- representar à autoridade partidária contra os que violarem a legislação eleitoral, este Estatuto e o Código de Ética Partidária. FONTE
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Primeiro indígena a ter diploma de nível superior quer fundar partido Ary Kaingang articula a organização do Partido Nacional Indígena
http://noticias.orm.com.br/noticia.asp?id=662633#.WaLn8fiGPIU
28/07/2013 - 10:00 - Brasil
No apagar das luzes de 2012, o primeiro Kaingang, etnia indígena do sul e sudeste do Brasil, a obter um diploma de nível superior e se tornar bacharel em direito deu início ao processo que resultaria na fundação do Partido Nacional Indígena (PNI).
Ary Paliano Kaingang, agora presidente nacional do PNI, reuniu seu projeto político com as propostas de representantes de etnias de nove Estados brasileiros, entre eles Roraima, o único do Norte do País, e deu início ao processo de estruturação do partido político com a proposta de incluir a classe indígena com eficácia nas pautas discutidas dentro das três instituições públicas que compõem a Praça dos Três Poderes, em Brasília.
O primeiro passo é colocar os índios dentro do Congresso Nacional e Câmaras Estaduais, não como protestantes ou convidados, mas sim como funcionários eleitos para representar, democraticamente, uma parcela da sociedade. “Foram 513 anos sofrendo exclusão por esses representantes que aí estão, agora tomaremos conta da nossa própria vida”, disse.
Para tanto, Ary está correndo para proceder com todos os trâmites legais exigidos pelo Tribunal Superior Eleitoral. O Partido já foi anunciado pelo Diário Oficial da União (DOU) e ainda resta, segundo o presidente do PNI, obter as assinaturas necessárias (já têm 200 mil das 500 mil exigidas) e um Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ).
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A direção do PNI, formada somente por Índios, também já está se articulando para alugar a sede do partido, em Brasília e trabalhando para conseguir mais afiliados. “O partido é aberto a todos que forem adeptos à nossa causa. E nós teremos, também, programas e instituições especiais para excluídos das políticas públicas do governo”, completou Ary.
Em entrevista a O Liberal, o bacharel kaingang prometeu: “O PNI colocará, de fato, o índio no poder. Nós só estaremos do lado de quem se juntar, também, à nossa causa”. O PNI já tem a primeira convenção marcada para o dia 18 de agosto, em Brasília. E mesmo considerando que os índios têm sido prejudicados por gestões em todas as esferas do governo, o Partido já trabalha pensando em coligar-se para alcançar seus objetivos. Confira, a entrevista:
O que significa a criação desse Partido?
Como é de conhecimento da sociedade, os índios não têm como defender seus direitos, porque tudo depende da política e os índios não têm peso político. Nós não temos representantes para defender as nossas causas no Congresso. Tanto no executivo, como no legislativo, nós ainda não conseguimos quebrar essa barreira para levar as políticas públicas em benefício do nosso povo. Então, o PNI nasceu para ser um mecanismo que coloque, de fato, os indígenas no poder. Porque, a partir do momento em que os índios estiverem no poder eles mudarão a realidade dos índios em todo o Brasil. Hoje, tem muitas políticas públicas, mas os índios não têm acesso a elas. Faltam mecanismos que façam com que os índios sejam inclusos nessas políticas. Os índios no Brasil estão excluídos de tudo, esse é um dos nossos problemas principais. Tanto os partidos políticos como os nossos representantes eleitos ou nomeados terão a condição de fazer algo mais efetivo pelo seu povo com a caneta na mão. O Partido quebrará a barreira da exclusão. Com os mecanismos do partido político na mão, nós podemos mudar esse contexto caótico do índio, hoje, no Brasil. É um mecanismo legal, constitucional, mas, nós também enfrentaremos dificuldades, porque política é política, e nós já tivemos divergências de não índios com índios, mas tudo é superável.
No processo de criação apenas um representante do Norte estava envolvido. O Norte não é a região central dos índios no País?
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De fato apenas uma representação de Roraima se uniu a nós no processo de criação do PNI. Mas, hoje a situação é completamente diferente, já temos representantes de todos os Estados. Esse contexto foi no começo, quando estávamos nos organizando, mas, logo em seguida começamos a expansão. Mesmo que ainda muitos não estejam registrados, já temos pessoas de todo o Norte trabalhando conosco, inclusive do Pará. De toda forma, sempre pensamos em todos índios, em todas as realidades das etnias, independente de quem esteve presente nas reuniões. Nós vamos lutar pelos direitos de índios de todo o Brasil. Já temos 19 Estados conosco e teremos sedes em todos eles.
Há algum projeto específico para os índios da Amazônia?
O projeto partidário contempla o Brasil inteiro, de acordo com as especificidades de cada região. Já estamos desenvolvendo e publicando projetos específicos para a Amazônia. Vamos entrar na área social, na área demarcatória, na área indígena, na área ambiental, na área de educação e de saúde. Vamos trabalhar muito com aquela região.
E os conflitos envolvendo índios na construção da Usina de Belo Monte? Quais serão as atitudes do partido diante desse caso?
Nós temos uma proposta para aquele problema. E essa proposta diz que todo e qualquer empreendimento que respeite a convenção 69 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)- nós queremos que ela seja cumprida, antes de tudo - colocará os índios como empreendedores e não como alguém que recebe uma indenização ou algo assim. Se os índios tiverem que sair, que saiam, mas que os índios sejam respeitados dentro da Lei e da convenção e que tenham uma participação permanente no empreendimento, como empreendedor.
E o partido endossa todas as manifestações dos últimos meses, promovidas por índios no Pará, onde está sendo construído esse empreendimento?
Sim e, inclusive, nós teremos comissões para todas as áreas em que os índios têm se manifestado, ultimamente. Essas comissões auxiliarão nesses casos e ajudarão a dar mais voz e eficácia aos protestos. Teremos uma comissão jurídica, indígena, de educação, de saúde, das mulheres indígenas etc., tudo isso muito bem instituído dentro do partido.
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E como o senhor tem observado a atuação política em níveis regional, estadual e municipal em relação aos índios?
A política que tem sido feita hoje no País, claramente age contrariamente aos interesses dos índios por prezar questões de popularidade e desenvolvimento a qualquer custo para a obtenção de lucros. Eles (agentes políticos) trabalham para uma classe e passam por cima de nós, dos nossos direitos, da nossa voz. Somos todos massacrados. Eles violam a constituição federal em nome de popularidade com uma sociedade da qual nós somos excluídos. Sociedade que em parte concorda com tudo isso. Esse desenvolvimento a qualquer custo pode ser bom para alguns setores da sociedade, mas, para nós que vivemos do ornamento da terra, dos bens naturais, pode não ser tão bom assim e eles não avaliam isso, não nos consideram, nos excluem. Não trabalham para o nosso benefício nunca! Além de destruir essas terras, os governos não fazem uso dela para a sobrevivência dos índios.
Mesmo assim o partido pensa em coligação?
O Partido é aberto. Nós convidamos os simpatizantes da causa indígena, os excluídos das políticas públicas e nós temos um programa que vai contemplar outros segmentos que queiram se juntar a nossa causa. Nós já temos propostas de fazer uma grande aliança, mas não concretizamos ainda porque estamos trabalhando para obter o aval do TSE para participar das eleições. Ainda não posso falar qual partido está mais próximo de nós porque estamos em fase de discussão. Mas, temos sido procurados por grandes partidos. Nós temos uma proposta e queremos tentar encaixá-la neles. Independente de qualquer coisa, inclusive, nós vamos lançar candidatos ano que vem. Se não pelo PNI, por meio de outro partido.
Independente disso, o PNI já pensa em quem apoiará para a corrida presidencial?
Ainda não, nós estamos conversando com a Rede, o PT e com o Aécio. Nós temos conversado com eles. Estamos aguardando. A melhor proposta nós vamos fechar.
Alguma empresa privada procurou vocês?
Ainda não.
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Qual a ambição central do PNI?
Colocar nossos índios no poder para decidir os destinos do nosso povo. A primeira etapa é chegar ao Congresso Nacional.
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Samuel de Jesus samuel.jesus@ufms.br Samueldj36@yahoo.com.br
É doutor em Ciências Sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Ciências e letras da UNESP - Araraquara - SP. É Mestre em História desde o ano de 2003 pelo programa de Pós - Graduação em História da UNESP de Franca/SP, atuando principalmente nos seguintes temas: História, política, democracia, militarismo, segurança, defesa e Relações Internacionais. Membro do Grupo de Pesquisas sobre História Política e Estratégia - GEHPE-UFMS e do Núcleo de Pesquisas sobre o Pacífico e Amazônia - NPPA (FCLAr UNESP). É colaborador do CEIRI NEWSPAPER. É professor de História da América da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul - UFMS - campus de Coxim/MS Currículo Lattes:
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4759747Z2 Outras publicações: https://ufms.academia.edu/SamueldeJesus
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