Capitulo 3-Blog Terra da Lâmpada 2008
Domingo ,2 de Dezembro ,2007
A Morte, afinal ,existe
E sem que fosse ainda Primavera Cobriram-Te de flores Fazendo de Ti uma criança. Parava ali a dádiva da Tua vida A morte, afinal, existe! Mas sossega: Apesar dela o mundo avança. A luta foi cheia de sentido 1
Quando transformaste dores, em sorrisos Nos rostos de tantas crianças.
Ninguém poderá destruir as pontes que Te levaram ao sonho Nem os passos com que calcorreaste as veredas sinuosas Com fantasmas espreitando a toda a hora, medonhos!... Toldados de rancor e desamor, prontos a lançar suas verrinas insidiosas S (no dia do Teu aniversário)
Terça- feira,1 de Janeiro FIM DE ANO A vida não pára..... 2
E lá vou emergindo do assombro. A tentar explicar-me que tudo isto, talvez, faça sentido. E logo me revolto com tal ideia. O facto é que, perante certas pessoas singulares, parecemos, por vezes, ainda acreditar que haverá excepções à regra. Estúpido ?!.( não é.?!),mas que hei-de eu fazer... Agora a certeza: a morte é morte. Fim. Fim de caminho,de viagem, inexorável separação para sempre. Quem acreditar noutra coisa, não a desminto. Felicito-a. Não me dói por isso a alma, porque a não tenho .Mas doem-me os sentidos que me esclarecem o imutável da realidade. Mas lá que gostei de ter sido um espectador privilegiado daquela vida de pertinácia, querer, ousadia e dádiva:- lá isso gostei. Sempre a apreciá-la a cavalgar em cima do sonho. Nunca a perguntar-se se tinha forças para ir tão longe. Não perguntava pela simples razão de não duvidar que tinha. Para isso, e muito mais. E a verdade é que tinha. Até onde poderia ir? Não que me pergunte por via d' Ela, ao não ter ido mais longe.Não. Mas tão só, por descortinar o mal que poderia ter sido evitado, ou simplesmente amenizado, a tantos outros, não fora a tacanhez oligárquica de meia dúzia de títeres demitidos da consciência. E outros tantos, piolhosamente abúlicos, exilados em si próprios, indiferentes. Repito: morreu como as boas árvores: - de pé! .Por isso pouco importa a morte em si O importante foi a coerência existencial com que viveu. De uma nobreza exemplar. Ponto final! Que a hora não é de florir o passado. Mas a de acreditar -mesmo duvidando - que vai haver futuro, que já não serei eu a cantar, mas que outros hão-de ousar. 1 de Janeiro,2008 BALANÇO DO ANO.(2007) 3
Olho para o Blog de 2006, neste mesmo dia, e perpasso uma olhadela pelos DEZ DESEJOS que exprimi no final de 2006, para que se concretizassem em 2007.Em jeito de balanço, vejamos o que foi feito. Erradicaram-se –ou fez-se alguma coisa para erradicar, ou sequer atenuar –as bolsas de pobreza, existentes em Ílhavo? Não!, nada se fez. E eu constato hoje que há ainda claras, insistentes e preocupantes bolsas de pobreza, em Ílhavo. Ninguém parece aperceber-se disso. Por isso entendo que a decisão de dar a edição do Blog (2007) aos Vicentinos, foi boa. Muito significativa a recolha, e, com ela, a possibilidade de minorar verdadeiras chagas sociais, que só existem porque passamos a assobiar para o lado, incomodados. Concretizou-se um Plano de Solidariedade para o Concelho? Não!. Bem pelo contrário. Quando a Câmara foi chamada a intervir no caso dos A.T.L‘s fê-lo de uma maneira desastrada, espumando inconsciência em tudo o que disse. Pesporreia, vileza e inoperância, foi só o que se viu. Se «lá» não estavam outros para responder à demanda, enquanto o homenzito escoiceava, teria sido o bom e o bonito. Fortaleceram–se os Laços de Identidade Comuns? Não!. Foram-se é cortando os fiapos que ainda existiam. Somos uma sociedade de indivíduos que já pouco têm algo em comum, senão o sermos incomummente desinteressados. A Terra de Ílhavo (T.L.) em desagregação social, ultrapassou o limite de irreversivel, além do qual já só resta o abismo. Démos passos significativos na construção de uma Politica Cultural? Não!. Clara e inequivocamente, não!. Só que – infelizmente - há medo de dizer o que estes últimos dez anos representam de tempo perdido, tantas eram as possibilidades para fazer o certo. Fez-se o balofo, o desproporcionado e até o inconcebível. O que aí vem é 4
cultura comprada ao pacote. Vem aí uma mão cheia de valores falsificados, vendida como se fosse mercadoria sã. Pôs-se fim à auto-promoção, populista e chocarreira, do eleito? Não!, bem pelo contrário, nunca essa politica esteve tão activa, como nunca esteve tão trauliteira. De tal modo que andam para aí uns tantos a tremer de medo. Definiram-se Obras Estruturantes que desenhassem o Futuro? Não!, bem pelo contrário, o que se fez foi coisa avulsa, sem sentido ou ajustamento, à realidade. E se tal não bastasse, ainda se utilizaram dinheiros que nem tínhamos, a fazer filhos em mulheres alheias. (Biblioteca). Deu-se apoio à Escola Pública?.Não!, O espaço circundante das Escolas está porco, sem iluminação, inseguro. O diálogo Escola - Autarquia foi, ao que dizem, inexistente. Um diálogo de surdos. Uma ou outra boutade não chegaram para fazer entender como é que a Autarquia vê a realidade da comunidade Escolar. «Ela» pensa que não tem nada a ver com isso. Desenvolveu-se qualquer tipo acção para dinamizar a riqueza da oferta turística? Não!, Ou quase nada, de consecutivo; coisas desgarradas em que o poder local se colou ao que os outros faziam,não construindo nada de sólido, estruturante, de resultados continuados. Contudo não foi por não se gastar uma pipa de massa. Não!....Gastou-se à tripa forra; andam agora a espernear, para esclarecer para onde foi tamanha verba, pois não se acredita que tenha ido só parar para essas acções, tão fracas e desinteressantes foram, na generalidade. Salvo uma ou outra. Coisa pouca.
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Criaram-se (ou cativbaram-se) empresas ou centros de saber, incitando-os ao apport de novas tecnologias? Não!, Nada se fez. Rigorosamente nada. E tantas são as possibilidades que, se houvesse ambição e ou ideias, associadas á nossa posição geográfica, privilegiada, poderíamos muito bem aspirar a ter futuro. Os ílhavos são cada vez mais emigrantes. Aqui o futuro já foi. Já não será. Deixou-se a arrogância, a falta de educação, a cupidez, a parvoíce diletante e demagoga, substituindo-as por bom trato, discrição, civilidade, urbanidade e respeito? .Não!, Nem pouco mais ou menos. Quando muito encaixotaram-se os tiques e levaram-se, para exibição e gala, em Lisboa. Valha-nos ao menos tal libertação. Os lisboetas, esses, estão habituados aos dislates. Não vão estranhar. Posto isto: Mas nada de maior haverá para assinalar, em 2007?... Nada que tenha vindo a aumentar, haverá a realçar? SIM!!! Há..., A divida da Autarquia, Que no ano passado era de 10 Milhões; este ano assumiram-se 24! Milhões, e agora fala-se – e parece que é completamente verdade – que, afinal já devemos (?), QUARENTA E CINCO MILHÕES DE EUROS. Aqui sim!..Aqui crescemos. Somos mesmo citados como um dos maiores caloteiros da Praça. Em 2007 uns já começaram a fugir; os que forem atrás -ao menos!: - que fechem as portas.
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Domino,6 de Janeiro,2008 Saldos na Feira em Terras de Stª Maria.
Ribau andava triste : Ah Camões, estou passado. Nesta ilha desafortunada, p'ra te glorificar Não tenho gente. Povo este, coitado, Mudo , envergonhado Já não sabe navegar. A mão sustenta aparando o rosto Cala voz perante o mar Cego, olha a fria madrugada À espera do que prometi: nada! O vate ouviu o traste, e lá do Olimpo sentenciou: -Vai á feira, em Stª Maria da dita: Aí poderás encontrar, Comprar ou até achar Feliz assombro. Apregoa: o mar é o mesmo Que mais do que assombro O que vos vale é o meu ombro Ribau ,não esteve com meias medidas. Foi à feira de Stª Maria da dita, e 7
comprou um Homem da cultura. E nem experimentou. Trouxe-o logo que o viu a bater palmas.. Pois venha quem vier Nunca terá Grandeza maior, Pois só ele, o Berimbau Capaz será de cumprir a ilha tal. Mas mais ainda :- Portugal!
Quarta-feira ,9 de Janeiro,2008 Vem por mim… Queria nesta noite Beijar a mais bela rosa do meu jardim. Encostar a minha boca à tua Para que ela fique tão rubra Como papoila viva, carmesim. Queria ver, afogueadas e brilhantes As maçãs do teu rosto lindo, Transformadas framboesas gulosas, e assim Embriagar-me no licor doce do teu olhar E envolver meus dedos nas ondas do teu 8
cabelo Para dele sorver a fragrância do alecrim Anda, vem .Atravessa a solidão da noite E vem acolher-te nos meus braços de pedinte Para deixar de ser o que somos, na madrugada (vem por mim)
Segunda-feira ,21 de Janeiro. Os «ílhavos» e o S.Pedro». O «ílhavo», tipo rude e forte, roncão no falar, era por norma um espécime de «homem de carácter», cumpridor nas suas obrigações, e temente a Deus. Era conhecida a óptima relação com S.Pedro, orago de predilecção destas gentes, santinho a quem dedicavam fervoroso culto. E a quem anualmente, com júbilo, pompa e circunstância, rendiam notório festim, para o efeito engalanando a Vila e a sua Igreja Matriz com colgaduras para receber os visitantes aportados a esta santa terrinha, no intuito de gozarem as delicias dos festejos que duravam três dias. Mas atraídos, também, pela chança e gala no bem receber, apanágio destas gentes remediadas, mãos abertas, coração escancarado no propósito de bem acolher e partilhar. Tão boa era a relação destes migrantes da beira-mar com o «porteiro do céu», que corria à boca cheia a faladura de ser bastante a evocação da naturalidade, para que uma alma, ainda 9
que penada, ida daqui, visse escancaradas as portas do céu. Franqueadas por aquele sempre atento fiscal do bom comportamento e virtudes, o S.Pedro, olheiro astuto, sempre diligente e operoso no intuito de manter o mar bonançoso do céu, limpo dos fraldocos. Ora num dia em que o S Pedro foi abrir o portal, deu com um façudo mal-encarado, a quem perguntou: -Então o que pretendes?. -Entrar no céu. -E tu mereces a dádiva? O que fizeste para tal? De onde és?. -De «Ílhavo». O S Pedro mirou …remirou, e muito embora desconfiado, lá disse ao penegante, -Entra. Aguarda aí na recepção que eu vou lá dentro confirmar a listagem de embarque chegada pela última pomba da noite. Passados uns minutos, quando regressou para dizer ao malencarado, e mentiroso, que não era verdade, que ele não era de Ílhavo, mas estava, isso sim, na «lista de Vagos» ,constatou que o biltre tinha desaparecido, infiltrando-se por uma das entradas laterais, nunca mais sendo visto. S Pedro ficou fulo. (Que os Santos, também só são Santos até certo ponto). E de si para si, lá foi dizendo: - deixa estar que quando me aparecer cá outro já não me leva assim Vá lá um santo acreditar nestes safardanas. Não tardou muito que ouvisse bater: tràs…tràs, tràs. Alguém chegava parecendo ter pressa em não perder a maré da manhã. -Já lá vai, avisa o S.Pedro. Se tens pressa vai lá p’ra baixo, que está mais quentinho. E resmungando enquanto entreabria o portão, perguntou: -Então quem és, e o que queres?. 10
-Oh!... S Pedro, sou o Zé Cachino, lá da Malhada, e c’ria que m’amabotasses aí p’ra dentro… raio! que venho cansado da viaje e c’riame chichar aí dentro. Avia-te, raios!.Q’uinda perco a enchente. - E donde és tu, ó Cachino? . -Sou d’ibalho, raios! Atão eu ia lá astrigar-me a mentir sobre a minha terra. Nado, bautizado e cebado em íbalho, saiba vòssomocê ,santinho. Astão tu não m’enxergas, não t’ alembras cá do Zé? Q’’intè no mês passado fui juiz da festa c’a ta fizemos lá em íbalho. És mesmo desconfiado. Mexe-+ ´’«08aa8baaaaaa
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« «’0q -Não é isso, mas é que noutro dia apareceu-me cá um finório de Vagos – daqueles que deixaram o Senhor na rua para acudir ao bacalhau! - que me enloilou com essa de ser «d’Íbalho….» -É S Pedro(?!? ; raios ,estipor !... ,deixa-me entrar c’«amando-te um xalabar de sardinha bibinha,..a saltar …, tenta o Cachina convencer o orago. -Entra Cachino, entra ; que por essa da «sardinha bibinha a saltar», estás identificado, mas vê lá se a mandas da «restomenga». -Tòmórolha, estás muito sabichão, responde-lhe o Cachino.
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(inspirado em ideia original de João Teles) Terça-feira,22 de Janeiro Eternidade afinal, existe
Volto a esta tela Neste dia ensoalheirado Revendo a ria, o céu e os montes Olhando para tudo, extasiado. Quem teria sido o autor Que a pintou com tão grandiosa intensidade E com tão aguda sensibilidade, Para a deixar, assim, Em frente de mim postada, Para me provar Que afinal existe eternidade. Quarta-feira,23de Janeiro. Ílhavo, Hoje. Qualquer coisa próximo daquela definição do pensador: Onde a arte de fazer politica é a arte de criar rebanhos, que se dividem em animais cornudos e não cornudos; e estes em bípedes e quadrúpedes. A politica, aqui, é pois a arte de conduzir bípedes sem cornos e sem penas (o homem). Um galo depenado, será isso?. 13
Críticas Abeirou-se de mim, um pouco façanhuda, pensando magoar ao dizer-me: -Não gosto nada dos seus Blogs. Incomodam. Mas leio-os sempre. .-E que culpa tenho eu disso..:- respondi. -Como não?!..retorque um pouco espantada com a minha desfaçatez. -A culpa foi dos seus Pais, minha cara - disse-lhe entre o sério e o gozo. Mas verdade: eu não peço que me leiam; e lendo-me, muito menos peço, que concordem comigo. Mais críticas. Outro conterrâneo abordou-me, para me dizer: -Sabe hoje a técnica dos Blogs é a de terem mais fotografia e menos palavreado. -Sei disso, meu caro, respondi. O problema é que quando comecei a escrever, só havia fotografias a preto e branco. Olhava-se menos com os olhos, e pensava-se mais com a cabeça. Hoje, olha-se com a máquina fotográfica, e escreve-se com os pés. Bebe à vontade - Esta ria da Costa Nova embriaga-me os sentidos, dizia-me.. - Oh pá, ainda bem que apanhas uma borracheira de água. Passa-te quando atravessares a ponte. Por isso bebe à vontade disse-lhe eu.
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Sexta-feira,25 de Janeiro,2008 Voltando (para já) a Filinto Elísio. De vez em quando, ou de quando em vez, dou uma volta pelos papéis que andam por aí, arquivados. Fi-lo recentemente, e lá voltei a dar com o «Filinto Elísio», praticamente pronto, mas parado. Foi um trabalho que me deu muito que fazer. Tenho fundadas esperanças de que um dia esta terra acorde - finalmente! - e se interesse por aquele que foi um eleito, um grande senhor da literatura. E da cultura, pátria, filho de dois humildes «ílhavos»,daqueles que foram daqui fazer vida, para Lisboa. A mãe, Maria Manuel, levava já o seu rebento na barriga, quando daqui se foi. Se Filinto (Francisco Manuel Nascimento de seu nome verdadeiro) não foi nado e criado em Ílhavo, foi aqui gerado. E enquanto Filinto repousa no Arquivo à espera do tempo, ao reler as notas que enformam aquele trabalho, chamou-me a atenção um poema de uma das suas alunas dilectas, a Marquesa de Alorna, que julgo por bem aqui incluir. Poucos se debruçaram sobre a obra de Filinto Elísio, para lá dos estudiosos da cultura portuguesa: Teófilo Braga, António José Saraiva, Óscar Lopes e Hernâni Cidade José Tavares, o «meu» reitor do Liceu, homem culto, muito sabedor e um excelente pedagogo, dedicou a Filinto um pequeno (mas não menos importante) trabalho, em que deu a conhecer alguns dados biográficos do poeta, juntando-lhe uma série de poemas, por si seleccionados, para sustentar o estudo. 15
O Prof. Fernando Moreira, nas «Obras Clássicas da Literatura Portuguesa», publicou todas as obras de Filinto, vertendo-as para 12 Volumes. Só por esta simples referência é possível extrair a ideia da extensão da obra poética de Filinto. Mas lendo-o, reconhece-se facilmente a grandeza do notável escritor, figura impar do período Pombalino, que em odes, sonetos, canções e madrigais, se expressou no belo lirismo do mais puro Camonismo, visando a restauração do estilo clássico de quinhentos, pedagogicamente ensinando a falar e a escrever a verdadeira língua portuguesa, de Camões e Vieira. A. Sané considera-o un des meilleurs (poètes) du XVIII siècle, que voulait rendre à la langue portugaise cette élégante concision,cette euphonie, cette pureté vraiment latines(..). Filinto viveu grande parte da sua vida (pós Viradeira) exilado em Paris, perseguido pela Inquisição. Referem-se os estudiosos ao seu reconhecido talento, vertido num esforço de regenerar a escrita pátria, tendo chegado a considerá-lo o maior cultor da língua, depois de Camões e Vieira. O poeta insigne pretendeu recuperar o sonho ideal do Homem português e da Identidade Nacional propostos por Camões ;- um povo mais do que um povo; uma nação mais do que uma nação, um território mais do que um território, nem que tal expressão não corresponda, em exacto, à história lusa. O P. António Vieira emprestou a arte da palavra para convencer, em estilo profético, que não importava a exiguidade territorial. O que era preciso era acreditar que um dia (complexo sebastianico) chegará a hora do Quinto Império, se os portugueses se determinassem a querer mais do que aquilo que seria licito esperar. Nasceria, assim, providencialmente, um novo Portugal, uma pátria gloriosa, superior a todas as outras: - tal era a profecia de P. A.Vieira. Ora Filinto viveu no tempo de Pombal, tempo de um Portugal inferior. O Marquês pretendeu opor-se à posição da Igreja e dos Jesuítas com uma politica realista, de como, e o quê, se deve ensinar, para que Portugal fosse capaz de criar elites que o colocassem a par das nações mais desenvolvidas da Europa. 16
Filinto viveu junto do poder no tempo de Pombal e será ele, ao tempo, o porta voz das ideias filosóficas de Rosseau «de como os homens se igualam», ao denunciar todos os astutos malandrins que alienavam as mentes dos povos, impedindo-lhes o rumo de serem livres. De Filinto -um padre! -. brotaram as palavras mais rudes contra a acção nefasta da Igreja e dos frades no governo dos povos. Foi professor no Convento de Chelas das duas filhas de D João de Alorna, fidalgo implicado no atentado que o Duque de Aveiro teria perpetrado contra D José.. D. João, homem culto, fidalgo de grande carácter, sem soberba nem arrogância, era casado com uma Távora. Por tal motivo pretendeu-se envolvê-lo no caso do atentado, com o fim de riscar os Távoras e os seus próximos, do mapa social pátrio. Se é certo que escapou a ser torturado, esventrado e depois queimado, como sucedeu entre outros, aos seus sogros, foi contudo encerrado nas masmorras da Torre de Belém, separado da esposa e filhas (e filho, D. Pedro, o ultimo dos Távoras), que foram internadas no convento de Chelas, de onde só sairiam com a «Viradeira» (deposição de Pombal). E teria sido aí que Filinto Elísio foi professor aplicado de D. Leonor de Almeida, futura 4ª Marquesa de Alorna, e de sua Irmã D. Maria (Daphne) Almeida (com quem se insinuou ter mantido uma relação pecaminosa(?!)). Foi o poeta da Arcádia quem proporcionou a D. Leonor o acesso aos livros de Rousseau, Voltaire, Diderot e D’ Alembert, e quem lhe abriu as janelas às ideias do iluminismo francês e às novas correntes literárias do tempo, o que fez de Leonor, uma mulher sensível, muito culta e inquieta, adiantada para a época, que se tornará numa poetisa de grande dimensão sob o arcádico nome de Alcipe, tendo publicado inúmeras obras recolhidas nas «Obras Poéticas da Marquesa de Alorna». Traduziu, ainda, grandes autores , debaixo da influência e orientação de Filinto Elísio ,como foi o caso da «Arte Poética», de Horácio. O que pretendemos hoje, ao remexer nos papéis sobre Filinto, é registar uma Ode de D. Leonor (Alcipe), que consideramos do maior interesse. 17
Para
o
Nada,
a
Não
existência,
caminhamos.
Das ideias erradas o fermento. Produziu nova série de infortúnios. Fomos Francos (franceses), Hibérios (ingleses), Só não fomos sensatos portugueses. Ah, senão renascer com a Pátria a glória. Se a ciência (o uso recto da razão),a justiça ainda dormitam, Se a Moral não desperta, a Industria (o espírito, o engenho)acorda -ao que caminhamos. (Marquesa de Alorna) Terça-feira, 29 de Janeiro Hoje a minha Mãe É noite. É noite na noite. A morte veio, e levou-Te Para baixo da terra Onde só há noite. Que venha ..Que venha… Essa magana. Venha ela e me detenha, Que eu levo-Te um cravo. O jardim já não tem gente Nem sequer nele há sonhos Mas apenas olhares vagos. 18
Só a custo suporto o travo Dos que vivem tristonhos Sem nada entenderem, Ou sequer quererem Que surja outra madrugada quente.
(No dia do seu aniversário)
Domingo,17 Fevereiro Bons governantes ou governantes bons?. Continuo a olhar o mundo com pena de não ter tempo – e às vezes paciência – de gozar o deslumbramento que sinto com a vida, mesmo que agora vista (já) a uma certa distância. Deslumbro-me; mas sinto medo do que virá aí para as novas gerações. Não sei se estas irão perceber os novos tempos. Há uma falta clara de grandes figuras a orientá-lo. Washington., Gandhi, Mandela, Churchill…foram-se. Mesmo que ainda houvesse meia dúzia de «Mários Soares», isso já me alegrava. Não. Hoje já não há figuras com dimensão ética, politica e humana, que possam ombrear com aquelas (e outras) que desbravaram o árduo caminho por onde o homem se foi emancipando, adquirindo alforria e direitos, e compreendeu haver deveres a cumprir. A polémica que corre no Reino Unido com as declarações absurdas do arcebispo da Cantuária, Rowan Williams, que são 19
uma espécie de capitulação civilizacional, deixam-me perplexo. Isto é: ou afirmamos sem complexos que as conquistas conseguidas sobre o domínio da religião(dona de todos os valores até então) só foi possível por uma iluminação do pensamento europeu do séc. XVII, e que, custe o que custar não estamos dispostos a deixar soçobrar essa «superioridade temporal», ou voltaremos a um mundo tenebroso, obscuro, que não aceita o multiculturalismo, e que a breve trecho está exposto, de novo, à cegueira do fanatismo religioso. Parece que se tem medo e se começam a fazer concessões perigosas. Em nome de uma pseudo aceitação das tradições menores, desprezamos as conquistas maiores. Por este caminho fazemos desta destruição de conquistas uma espécie de emblema de liberdades. Bons governantes ou governantes bons? O que queremos, de facto?.
Sonho curto …mas ainda sonho (nem que seja em Mirandês) Se não piorar vou acabar num desespero de não ter conseguido resolver as equações da minha vida. Quando a vida se despedir de mim – sim, porque o contrário julgo que me não acontecerá – não terei tido tempo de resolver, e ou encontrar o X= . Começo, por falta de compagnons de route, a olhar demasiadamente para mim. E agrido-me interiormente. .Às vezes sem necessidade. A vida quando se alheia de algumas coisas que se movem à nossa volta, começa a ser estranha. Parece que nem os prazeres somos já capazes de viver. A vida parece que já não nos empolga. Até deixamos de ser agressivos para os outros…e apenas o ser para nós mesmos. Mau sinal quando é necessário (ainda) sê-lo, porque as coisas não melhoram: - pioram!. Eu não quero enfeitar o passado Não!.. não procuro branqueá-lo. Aceito os erros. Na verdade o que eu queria 20
-e teimo apesar de -,era sonhar com o futuro. Ainda que fosse curto o sonho. Glosando Amadeu Ferreira. You inda num sou de ls que me quedo ,pus num me falta que fazer, mas que balor le dana l que un biello faç?Morremos-nos, mesmo ,mesmo ,quando yà naide mira para nós. Se cuntinamos a andar porqui ye porque I semitério inda num mos qiuier. A vida é como uma maçã. Tudo por causa da trincadela de uma delas… Só que é verdade:- a vida é como descascar uma maçã. Só depois de aberta (depois de vivida) encontramos uns podres. Se não forem muitos, vale a pena, ainda, dar-lhe uma trincadela. As ( maçãs,e as vidas ) mais saborosas, são mesmo as que têm alguns podres. Se estão todas podres, o melhor é deitá-las no caixote do lixo….
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Segunda-feira,18 de Fevereiro
Não contes...
Não contes do meu Sorriso Que corre para ti, hoje. Nem que fecho A cortina Para a tua ternura ficar comigo
Deixa que te envolva, Ao menos, No carinho de um suave abraço Não contes a ninguém O desvelo Com que o faço Deixa ficar o segredo E com ele O nó sem laço 22
Deixa passar o vento Abre a janela E deixa-me entrar Um dia havemos de ir Como os rios Correr direitos ao mar Para ouvir um búzio Na praia Dizer, que bom é amar
Quarta-feira,21 de Fevereiro Pérola literária. Há dias, alguém amigo fez-nos o favor de enviar a carta que reproduzimos abaixo, guardada desde há muito. Chamava-nos a atenção para a notabilíssima pérola literária que a mesma é. Indubitavelmente. Difícil manobrar melhor e com mais estro, a pena. É uma peça literária plena de graça e ironia, na abordagem de drama íntimo, sério, para a resolução do qual se pede mais que tratamento clínico adequado à maleita, mas empenho solidário. A lembrança leva-me a partilhá-la com os leitores deste Blog. Dirão os meus caros : finalmente coisa boa no Blog !. Seja… Não posso – ou não devo adiantar muito mais –, senão alertar que em breve nos vai ser dada a oportunidade de aceder a um 23
conjunto de inéditos de Frederico de Moura, por onde perpassa em vigoroso –e muito próprio –, mas não menos excepcional estilo, as vivências do médico empenhado, do cidadão livre, do intelectual assumido, figura de dimensão homogénea cuja memória nos honra recordar. Para já fiquemos com esta deliciosa entrada:
Carta dirigida pelo Dr. Frederico de Moura, ao Dr. Nogueira de Lemos, Médico Cirurgião de Aveiro
Meu caro Lemos. É coisa axiomática que o pénis não obedece a freio; e é coisa de esperar que, a natureza o tenha dado a animal que lhe não obedece. Mas como a esta estuporada profissão que exercemos só aparecem anormalidades, aberrações e coisas em desacordo com a natureza, surgiu-me hoje no consultório esse rapazinho que lhe envio, com um freio de tal dureza e de tal conformação que o insubmisso pénis, tradicionalmente indomável, não teve outro remédio senão ceder. Calcule os mistérios e os paradoxos desta ladina natureza! Esse moço, na casa dos 20 anos com uns corpos cavernosos que devem estar isentos de qualquer esclerose ou de qualquer obstrução, e concerteza dispondo de uma libido afinada capaz de lhe fazer sair, erecto, o próprio umbigo, resolve ir para o casamento com os seus (dele) três vinténs e confirma, então a suspeita que já tinha, de que no auge da metálica erecção, o pénis fica em crossa como o báculo de um bispo, por incapacidade de vencer a brevidade e a dureza do freio que lho verga para a terra. Calculará o meu prezado Lemos, as acrobacias de alcova que este desgraçado terá de realizar para conseguir a penetração de um membro viril, quase tão torto como uma ferradura, na vagina suplicante da consorte. De modo que o rapazinho veio pedir-me socorro, e eu condoído 24
peço-lhe a sua colaboração em favor da harmonia conjugal, com a certeza de que por isso ninguém nos irá acoimar de chegadores. Condoa-se a cirurgia de braço dado com a medicina que, por intermédio deste fraco servidor que eu sou, já se condoeu e endireitemos o pénis torto (e nada de confusões, que não é mole pelo que me afirma o proprietário). Lembremo-nos, sobretudo, ao praticarmos esta obra, que vem aí um tempo em que um pénis destes, mesmo em arco ou em forma de sacarolhas, nos faria um jeitão, e ajudemos o pobre rapaz que se compromete comigo a fazer bom uso dele, emprenhando a mulher da primeira vez que o usar, depois da operação ortomórfica que o meu amigo lhe vai fazer sem sombra de dúvida. Desculpe mandar-lhe desta vez uma tarefa fálica! Ouvi uma mulher um dia dizer que um Phallus é um excelente amu1eto e que dá sorte verdadeira. Se quiser tirar a prova não tem mais que endireitá-lo... e jogar a seguir na lotaria. Desculpe, pois, a remessa de bicho tão metediço que eu por mim prometo, logo que possa, e em compensação, mandar-lhe uma vulva virgem e nacarada como uma concha de madrepérola. Um abraço do seu amigo certo, Frederico de Moura. P.S. - Como a minha letra é muito má segundo a sua opinião, e como o assunto desta carta é muito importante para duas pessoas, uma das quais do sexo fraco, entendi do meu dever dactilografá-la. Assim. não haverá nenhuma razão para que o meu amigo dizer que não entendeu o que eu queria e, por partida, deixar o aparelho na mesma ou pior ao rapaz. Quero ainda dizer-lhe que para sua compensação, tenciono depois do êxito que o seu ferro cirúrgico vai alcançar, comunicar o seu nome à mulher beneficiada que, por certo, lhe ficará eternamente grata, ficando sempre com a sua pessoa presente na memória nos momentos - e oxalá que sejam muitos! - em que se sentir penetrada por um pénis que só o meu Amigo conseguiu endireitar. E nem sei se o Estado virá louvar a sua acção, se lhe 25
for dado conhecimento que os filhos que saírem daquele casal são devidos em grande parte (não ao seu pénis) mas, sem dúvida, à sua mão. E filhos com a mão nem toda a gente se poderá gabar de os fazer! Creia-me seu afeiçoado, Frederico de Moura
Quinta-feira,28 de Fevereiro
Exigência
Era noite e havia luar, Quando passámos pela Capelinha E juntinhos fomos até ao mar. Deitados na areia, entre o céu e a água Sonhávamos que a vida era poesia. Havia paz na noite E no ar que nos trazia a maresia. Na tela pintada ao natural, Só o marulhar da vaga cortava O desvelo com que olhava Os contornos ternos do teu rosto. Dos teus lábios vinha a frescura. 26
Eram mais rubros que a papoila. Cantavam a vida imaginada Onde o mar não fosse enfurecido E o dia se não escondesse enevoado. Para que o barco por nós conduzido Transformado ilha flutuante Aportasse ao mundo mágico, acordado, Onde a água fosse tão límpida Que permitisse ver nossas mãos entrelaçadas Reflectindo no cristal Tanto amor a exigir eternidade.
Sexta-feira,7 de Março 2008
Um canto novo virá. Minha terra Minha amada de sempre Minha terra para sempre Terra de gentes Da ria, do sol E do mar, Porque Te sinto chorar? 27
Eu sei que já não és hoje A mesma que foste outrora. Tuas azenhas já não choram E o teu sol já não brilha, Tua ria está cansada de correr Para se ir afogar no mar. Mas Tu estás longe de morrer! Um dia lá virá um canto novo No bico de uma gaivina Que pousará levando-te acreditar Que com ele chegou a hora De devolver o sonho ao teu povo E pô-lo de novo a ousar..
De novo a navegar….
Quarta –Feira,12 de Março. Fome …aí a têm. Já não foi a primeira vez que aqui adverti para os perigos da Globalização. A tragédia que se avizinha da carência, e por isso do consequente aumento (incontrolável) de preços, dos cereais, 28
não é mais do que uma primeira consequência da referida Globalização: países como a China e a Índia, abandonam produções porque a população abandona os terrenos onde a mesma se fazia, destruídos pelas agressões ambientais, o que faz com que a produção diminua.Por outro lado com o aumento – ainda que mínimo – dos rendimentos, há uma maior procura, na ânsia lícita de finalmente!, matar a fome. Os preços sobem. Enquanto isso, na Europa e nos EUA, fixaram-se níveis de produção e impõem-se artifícios alfandegários de protecção à entrada de cereais, para proteger a produção interna. E o espectro de fome a nível do planeta, é possível e próximo. O que pode redundar numa tragédia sem limites. O aumento dos preços dos factores de produção pode contribuir para uma total inversão do que se deveria fazer: produzir mais, muito mais, e em força. Sexta –feira,14 de Março ESCANDALIZEI?! Aqui há uns tempos parece que escandalizei, quando publicamente disse que «me estava marimbando para os que me liam, pois não era essa a minha preocupação quando escrevinhava». Nos últimos dias tenho-me deliciado – é o termo – com a leitura de Luís Pacheco, o escritor maldito. Ora nele, e no drama de uma quase loucura libertina perpassada pela genialidade, detectei algumas sensações que, com espanto, me são também comuns. Serei menos louco que Luís Pacheco. Vá lá! Certamente. O que serei - isso é certo - é um zero cultural perante um dos maiores da cultura portuguesa, que nela só não foi tudo, porque não quis. Quando o vejo dizer que ficava passado (ele disse-o em calão, claro!) quando o elogiavam; e que, ao contrário, restava muito melhor quando o atacavam e ou censuravam, pois ficava muito mais descansado porque ,assim , o ajudavam a meditar. 29
Reflicto, na leitura de L.P. dei com aquilo que tenho repetido imensas vezes neste Blog: - as censuras motivam-me; os elogios (felizmente bem poucos) atrapalham-me, inibem – me. Mas mais espantoso foi a afirmação de L.P que dizia : quando escrevo quero é lá saber do leitor. Ele fazia aquilo para si e nem sabia se o ia publicar. Se lhe dava gozo, fazia-o; se não lhe dava, rasgava. O leitor que se lixasse… dizia. Ora é isto mesmo o que eu quis dizer com a minha – oh! céus – terrível afirmação. Explico: as coisas quando começam, são só e exclusivamente feitas, para mim mesmo. O gozo inebria-me. Por vezes o difícil é parar. Ora durante o tempo em que as palavras são só minhas, divirto-me. Tenho mesmo medo que o prazer se vá. Mas quando chego ao fim e dou por mim, num caso ou noutro, a entender (sem ouvir opinião seja de quem seja) que aquilo até «tem forma e virtualidades» para ser publicado, o gozo finda. Vai. Esfuma -se. Começar a corrigir, pôr-me no lugar do leitor, avaliar o sentido, o ritmo, tudo enfim, torna-me ansioso, enerva-me, força-me, retirame todo o prazer ao trabalho (nesta fase já é trabalho, por vezes forçado). A naturalidade com que surgiram as ideias que deram corpo ao escrito, desaparece como por encanto. Parece que me chego a aborrecer com aqueles que um dia, eventualmente, me poderão vir a ler, parecendo culpá-los do prazer que me retiraram, de aquilo não ser só para mim. A primeira fase exige-me espontaneidade, naturalidade, sinceridade. Deixar-me levar pela intuição sem esquemas rígidos: escrever tudo de um jacto, sem uma emenda, sem a preocupação de ser bonito, pois é só para mim :- gozo que me fascina, seduz, e até me suborna, afastandome de prazeres mundanos. A segunda exige-me paciência, esforço, insistência, que por vezes se transformam em sofrimento. Expliquei-me?!. Então esqueçam o que disse… o escriba. 30
Domingo,16 de Março Marginalizado não ; «Marginal» assumido. Perguntou-me, não sem um certo ar de compaixão : -Não te incomoda seres, assim tão marginalizado, por estes invertebrados que representam o poder serôdio, aqui…? - Não pá, … não me incomoda, nada. Porque de facto eu não sou marginalizado por eles, eu sou, tão só, um Marginal (assumido) do lamaçal onde chafurdam. AMIGOS SIM, MAS …«SEMI-VELHOS» ?????? É Bom.. Ontem num grupo de comensais, um pouco inesperadamente, ouvi da boca de um dos presentes um rasgado elogio ao« Zé Balseiro». Gabava o presente – ele médico também –, no Zé, a sua extrema fidelidade ao «amigo», a sua íntegra forma de estar, a sua inegável, mordaz e inteligente ironia, e aquela indesmentível rudeza que por vezes fazia gala de exibir, se e quando, fosse necessário chamar os bois à canga.O Zé era de uma rudeza genuína, daquelas que vinham e logo iam, passada a borrasca. Ora o elogio saiu sem o autor, sequer, saber ou imaginar, a relação próxima – tão próxima que eu nunca a soube, bem, distinguir da votada a um irmão – que existiu entre nós dois, vida fora, desde menino até à sua partida. Que nunca teve momentos 31
baixos nem altos, porque foi sempre de grande cumplicidade. Na casa dos seus Pais, sempre me senti como um filho mais novo, pois era constante a minha presença, numa vivência intensa e próxima, quase diária. Qual não foi a surpresa do companheiro de mesa quando puxei dos meus galões. E recordei muitas das cumplicidades – e foram tantas! - tidas com aquele companheiro de jorna. Às tantas o colega do José, disse-me: -Espere aí. Então estou a ver que você era «o tal» de quem ele falava, dos jantares do «25 do dito» da gravata preta, etc. etc. -Pois:- eu próprio! O que reunia á volta de uma mesa -que era provavelmente das mais plurais reunidas nos tempos convulsos pós 25 de Abril – uma plêia de amigos que ia da extrema esquerda à extrema direita, que, descontraída e de um modo plural, mas não menos vivamente, numa elegia à fraternidade, reforçava os laços serzidos ainda muito antes da revolução, já aí de diferentes cores, mas acima de tudo privilegiando a amizade . Como que a cobrindo com um balandrau, obviando a que a conturbação dos tempos os folgasse, ou sequer deslaçasse. E desse modo, mantendo intacta a proximidade que vinha de muito atrás, e que era necessário preservar a todo o custo. O que aconteceu, até que uns atrás dos outros, foram partindo. Fui ficando desagradavelmente só, apenas com as recordações. Ora durante os repastos da comemoração de Abril, o meu amigo Zé Balseiro, de gravata preta, fazia gala em se levantar sempre que pronunciado o nome de Salazar. Por sacanice, passávamos a jantarada a evocar o fradalhão de Stª. Comba. E o Zé a levantarse, tantas vezes quantas o excelso personagem – para ele, claro! – fosse pronunciado.
Quarta-feira,19 de Março
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PORQUE ESCREVINHO. Tenho ultimamente abordado este assunto. Dizê-lo melhor que o nosso D Duarte era bem difícil: Achey po boo e proveitoso remeduio alguas vezes pensar e de mynha mãao screver em esto por requirymento de voontade e folgança que em ello sento ;cá de outra guisa nunca o faria ,porque bem sey quanto pêra mym preta fazello o leixallo de fazer. D. Duarte («ENSINANÇA DE BEM CAVALGAR TODA A SELA»)
ALÁ É GRANDE.EU SOU PEQUENO… Seja no pino do Inverno, seja em Maio, ou até em Agosto, a mínima baixa de temperatura dá-me a oportunidade de, na Costa Nova, acender a lareira. Censuram-me o gesto. Que censurem. Que quando estou bem as censuras parecem-me pregações aos peixes. Faço-o - eu que me adapto muito melhor ao frio que ao calor: -mais por passatempo que por necessidade. Passatempo para os olhos e para o ecrã onde o que vejo se reflecte. Interiormente. Coloco-me estrategicamente na posição que orquestrei quando projectei aquela casa bicuda. Sentado em frente ao fogo que dança em labaredas numa coreografia irrepetível, em cada acto, deixo que o brasido vá amorrentando enquanto lanço um olhar inquiridor a norte e a sul. Um simples volteio da cabeça, mo permite. A tarde abranda; com ela as gaivotas tornam-se mais pachorrentas, menos erráticas. Fico a olhá-las enquanto o sol 33
esmorece e sobre a coroa descoberta pela maré navega uma poalha ténue de neblina. O brilho do ar parece esmaecer. Chegam os tardios – ou madrugadores – arroteadores do molusco. Abicam as embarcações, não se dando ao trabalho de alçar o barco; a maré desce. E daqui a pouco, toda embarcação,da bica à ré, estará varada. A estadia está calculada. Horas para a vaza e outras tantas para a flutuação. Envergando as botifarras que sobem até lhes servirem de albaióis, os navalheiros saltam lestos, prontos para catar o lodo sob o qual «as navalhas», ofegantes, respiram. Dois olhitos na areia denunciam-nas, traindo a sua posição. Antes de as borrifarem com o sal, param para acender um cigarrito; olham em volta, parecendo incomodados com a agressão à natureza. Mas encolhem os ombros e atiram-se de novo à cata dos caralhoses. O pescador procura apenas a sobrevivência. A sua tarefa tem tanto de agressividade como a do seu antecessor erectus que espetou um Tyrannosaurus com uma lança de sílex. Estendo o olhar sobre a paisagem. Os borrelhos aterram, dispondo-se estrategicamente alerta, prontos a levantar voo ao menor sinal de perigo. Fixo o seu sentido de auto-defesa. Como o meu. Não gosto que os outros interfiram no meu mundo, especialmente em momentos em que, como este, busco o calor exterior na lareira para compensar a falta do que me vai na alma. Ninguém, nenhum intruso se intrometa, senão levanto voo. Resmoneando, emborco um – um, dois, ou três…- whiskies. Acto de que há quarenta anos estou expressamente proibido de o fazer. Mas é proibido, proibir .O meu Pai dizia sempre : -bebe sempre o que tiveres de melhor em casa. Nunca sabes se é a última vez. Volto a olhar para longe, preguiçoso de despegar o olhar da paisagem. Vislumbro o Caramulinho recortado no azul avermelhado do lusco-fusco. Amanhã, se aqui vier cedo, vejo-o já todo plasmado num saltarico de verde, empertigado, soberano guardador da paisagem lagunar. As serras enclausuram-me. Vou lá e fujo. A planura lagunar dá-me liberdade. Fico por aqui aguilhado, preso na sua liberdade. 34
Sinto medo de a perder. É nestes momentos que me acodem visões de um exército de belzebus, comandados por um al moeda (?) Ibn-el- ORIBAU, que à frente de uma horda de azenegues nazarenos ou encarnavos se propõe fazer palácios árabes, infiéis, mais altos que o Caramulinho. Encarrapitados a boiar sobre a laguna. Alá é grande! E não consentirá… Eu sou pequeno. Bebo á saúde de Alá. Dele!.. e louvaminho todos os deuses que não consintam que eu deixe de dormitar à lareira, a descansar os olhos naquele oiro esparrinhado no azul lagunar. E vou recordando neste dia, o maior companheiro da minha vida :- o meu Pai. Ele era grande! Para mim bem maior que Alá. ( 19 de Março ,no dia do seu aniversário)
Quarta-feira,26 de Março. PULSO LIVRE. Tive o grato prazer – e até deleite -confesso, em ler com antecipação a edição do opúsculo contendo a mensagem que o nosso conterrâneo, Dr. António Malaquias, irá transmitir aquando da apresentação de «Pulso Livre», de Frederico de Moura. Bateu certa a minha previsão sobre a pessoa mais indicada para enquadrar o esplêndido livro de Frederico de Moura. Difícil fazer melhor, senão impossível. Porquanto A.M. junta à prodigalidade da forma como avalia o autor, um conteúdo exaustivo e subtil da personalidade daquele “que o que queria é que fossem libertados os «rústicos» de toda a espécie de grilhetas que os atormentavam». E que não gostava de se ater entre varais, e que 35
até gostava de ter opiniões diferentes. Avaliação fundamentada em um contacto directo, próximo e até familiar, que leva o introdutor à leitura do «Pulso Livre» a sublinhar –o que reforça a nossa opinião –que não chega o passar-lhe os olhos por cima ,à vol d’oiseau ,sendo imperioso lê-lo ,mastigá-lo… e saboreá-lo. Pois só assim poderemos apreender a bonomia das deformações humanas, que sendo no livro (hiper) sublinhadas – que uma leitura apressada nos poderia conduzir a uma acentuação excessiva dos males – são antes uma expressão estética, subtil, de um olhar para o homem como resultado do meio em que se insere, «rústico» na superficialidade, mas xaroposo, doce, na verdade interior. E para o qual F.M. olhava com o mesmo desvelo paternal, idêntico ao que aquelas gentes dispensavam ao bulir do milheiral para lhe retirar as danosas, ou no gadanhar da leira para aconchego dos seus animais. O opúsculo que em boa hora se entendeu registar, merece, ele também, uma leitura atenta. Tem momentos de louvável ternura, à mistura com outros de deliciosa erudição, orlada de citações tão a propósito, e tão bem enquadradas na prosa doce, que não resta outra atitude que a de nos deixar enlear, até ao fim, na dialéctica deste mestre, algures refugiado na sua toca – que pena! – e que dela saiu para nos deliciar com a sua leitura do «Pulso Livre». Mas e fundamentalmente com a leitura que faz do autor, numa elegia à sua inquieta identificação com as raízes e as gentes da sua criação, impermeável a todas as deformações que lhe obliterassem, ou distorcessem, a fidelidade que parecia -e assumia - dever ao seu chão. Com esta motivação acrescida, conto ansioso pelas horas que faltam para ouvir falar de um Amigo que me tratou, tantas vezes, a mim – rústico de tantos saberes – dos meus excessos racionais, levando-me a entender que o mundo é fascinante desde que o olhemos com óculos adequadamente prescritos.
Segunda-feira,31 de Março 36
Esta é a ditosa pátria m COMO VAMOS DE SAGE?.. Quando olho e me detenho a observar o que abóia por aí, na política, não posso de pensar no sophos de Platão. Como é possível que quando, ainda o tempo era menino e moço, ou o novo tempo ainda nem sequer tinha ousado, e já alguém pensava que o poder (só) deveria ser atribuído aos que sabem. E entre outras coisas ensinava-nos que o politico sagaz – sem ela não há politico que se afirme -não pode ter só e apenas conhecimentos, mas deve-lhe sobrar temperamento. Correcto é concluir que aqueles a quem falta o dito, são incapazes de governar. Porque tendem, ao menor espirro, a inclinar-se sob o poder, incapazes de combater os que só têm razão na multidão. Para Platão não haveria governo se os que mandam não tivessem um pouco de filósofos, ou até melhor seria, que os filósofos chegassem a reis. Se assim fosse, estaríamos livres de uns carroceiros que do uso do poder só têm a visão do exacerbar de um ego patético, lerdaço, génios na patarrela mas medíocres na cidade. Lá vamos. Esperem só um pouco…
Quarta-feira,30 de Abril. SE O ESTEVES É DO P.S.D, ENTÃO EU ESTOU BEM NO PS. OU EM QUALQUER OUTRO. 37
Se fosse eu que chamasse «ESTAROLA» ao Esteves ,logo uns pateta-alegres, diziam: lá está o tipo… Mas não fui eu.Com pena de ainda me não ter lembrado, que, de facto, ele é isso mesmo. No jornal «O Público», de hoje, Rui Tavares, chama-lhe, no Editorial «ESTAROLA», com as letras todas. Antes de ontem, o «Diário de Notícias», pouco faltava para o classificar de Imbecil. Enfim!...foi como eu previ. Quatro meses foram suficientes para se perceber que o bacoco, só não era um emplastro, aqui no lameiro, porque habitado por um montão de capados da mente. O Esteves,não fala, circunloqueia; ouve-se a si próprio na praça pública, mas as ideias não vêm. Porque não as tem. Nem uma, original; e muito menos uma-UMA!..UMA!!! palavra iluminada. Porque o Esteves, não duvidem ,é a imagem de um safardão mal educado, é a meta da decadência do espírito culto dos «ílhavos» . Que ele envergonha há dez anos. O Esteves, meus!, não é inteligente, nem decente, nem educado. É só um embófia. Riam-se …riam-se …olhem que está de volta. Quem vos avisa… Se por acaso alguém Vos perguntar de que terra sois, nunca digais que sois da terra do Esteves. Digam que sois de Freixo- deEspada- à- Cinta ou da Merdaleja.
Quinta-feira,3 de Abril Saudades de mim, menino
Ai barcos, ai barcos
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Triste é vosso negror, Por onde ides navegar? Que espreitais (?), Pelo olho que levais na proa. Ai amores, ai amores Da ria amada, Ai amores do verde pino… Ai saudades de mim, menino, Levai-me no vosso vagar.
Quinta-Feira 16 de Abril. Falidos …mas alegretes. Sucedeu-me, finalmente (!),ter em mãos, um relatório de contas da Câmara Municipal de Ílhavo (referente a 2007). Espantoso como tudo bate certo com o que pensámos e várias vezes denunciámos neste Blog. Espantoso como um parlapatão utiliza todos os artifícios de como devem ser utilizados os órgãos de comunicação social para fazer crer o que não é:- baralha, confunde, atordoa, apregoando falsas verdades, que passam por verdades de lei. 39
E a verdade é só uma: a dívida -o calote! – lá está, evidenciada sem qualquer tipo de acanhamento, escancarado na dimensão dos números que constam no relatório, atingindo os 28 Milhões de Euros. Esta dívida excede, já (!), a receita corrente da Câmara. Mas escondida, surge uma outra dívida. É que para lá da escancaradamente exibida, ficámos também a saber que se venderam também os anéis, e já só restam os dedos:- venderam-se créditos a médio prazo para regularizar dívidas a terceiros. Embolsou-se dinheiro, adiantadamente, e quem vier a seguir que vá pedir pelas portas. É fácil perceber que a divida da Câmara Municipal de Ílhavo, na realidade, nua e crua, ultrapassa os QUARENTA MILHÕES DE EUROS. Brutal!, Já serve de gabarolice, o dizer-se que se cumpriu o serviço da divida (relatório de contas de 2007). Era só o que faltava! O PASSIVO da Câmara Municipal de Ílhavo cresceu SETE vezes, de 2002 a 2008! Já vai em 44 MILHÕES DE EUROS…. E agora? Quarenta e quatro milhões!...Investiram-se Sessenta Milhões de euros entre 2002 e 2006, em activos corpóreos. Só(?!) que se ficaram a dever Quarenta Milhões. Mas o mais grave é responder, a :- investiram-se em quê? Em mudanças profundas no sentido de dar resposta às novas realidades sociais com que nos defrontamos? Dinamizámos um processo de mudança de atitude? Fomentámos uma participação empenhada para resolução de causas comuns? Socialmente o que foi feito? Em solidariedade o que foi gasto? Em apoio aos mais carenciados o que investimos? Foi um gastar por gastar. Onde as obras não se justificam por serem válidas, mas tão só «porque foram as mais caras …» Em definitivo, nestes anos comprometemos todo o modelo de desenvolvimento iniciando o nosso processo de decadência. Devíamos fazê-lo com indignação. Ao contrário, fazemo-lo com 40
um encolher dos ombros. Para muitos um bem-estar. Todos sussurram a podridão do regime local; mas quase todos se dão bem vivendo numa sonolência, no desprezo pela ideia que poderia ajudar a mudar.
Sábado,10 de Maio
AMOR DE AMOR
E não terem mais fim Estes dias, E esta vida, Para beber dos teus seios Encaixar no teu ventre Sorver o teu bafo Dançar a tua musica Em mil volteios Em mil enleios, A deixar que o fogo do teu olhar Me queime E nele se consuma A paixão sem parar Tornada cinza, Para me diluir em ti No frio Inverno. Não digas nada, Amor, Só amor de amor 41
Só nós, eu e tu Somos eternos
Sexta-feira,23 de Maio GLOSA AO “PADRE ETERNO”
Não creio em Deus eterno Nem que a alma é imortal… ----------------------------Não creio que depois Do derradeiro sono Haverá uma treva Para o ditador Que usurpou o trono. Nem creio, pois, Que haverá uma luz Para aquele que na terra Aguentou de pé, uma cruz.
Não tenho crença firme, Ou sequer crença néscia Que Deus há-de fechar Numa jaula de ferro Por sua própria mão 42
A alma dum fero. E que guardará a seu lado Num trono debruado d’oiro A alma de Platão. ----------------------------Mas creio em Cristo hodierno Homem só, como eu, simples mortal.
Quarta-feira,11 de Junho. PEDRAS FÉRTEIS. Desde longe ,muito longe que desisti de fazer a pergunta: - o que é que a cultura pode fazer por esta terra?.., e antes procurei interpelar-me: - o que consigo – eu! – fazer por ela?... Sábado vou – com os amigos – tentar dar mais uma resposta, à questão. Se ainda, a muitos, ela passar despercebida, pouco me importa. Pois que seja. Fazem que andam distraídos. A propósito de distraído: É costume se dizer que as respostas estão escritas nas estrelas. Não sei se estão, ou não; nunca me preocupei com esses saberes. Mas agora ao reler o Ábio de Lápara (José António Paradela), e a sua «Uma Ilha No Nome» sei que as respostas estão por aí, em frente aos nossos olhos, que parece, não sabem ler, nem cuidam de sabê-lo. Interroga-se Ábio de Lápara: que ganhou a nossa terra quando fomos costa abaixo à procura de pão que aqui escasseava? Que ganhou a nossa terra com a aventura do bacalhau? 43
E o que temos em troca? Após a aventura o que sobrou? Para nas pedras encontrar a resposta: -não faças sempre a mesma pergunta. Apenas luta por uma resposta diferente. Certamente se eu andasse atento encontraria a resposta para a minha pergunta: Porque apostei tudo o que tinha e saí a perder (?!)"….Ou será que tenho andado distraído, e o que deveria fazer, como mostra Ábio de Lápara, era apenas lutar por uma resposta diferente. «Uma Ilha no Nome» não precisa de palavras elogiosas… Não!..,não precisa. Precisa,apenas,de ser lido. É indispensável que o seja, para continuarmos a ter,orgulho em pertencer a uma comunidade com gente desta estirpe, como nos diz o «João Bocanegra» da «Ilha No Nome». E lá está Ábio da Lápara: Construímos durante muitos anos, talvez séculos, uma comunidade fechada em torno de uma luta que suplantou todas as outras e nos isolou, fechando os nossos corações num círculo apertado. Saímos navio e chegávamos de navio, com longas ausências pelo meio. Quisemos ser uma «ilha» e conseguimo-lo…. Porquê?... Pois lá estava nas pedras, uma vez mais, a resposta: às vezes preciso de me evadir, deixar a razão de lado para poder sentir…fugir desta realidade que não me deixa sonhar. E de resposta em resposta, lá veio a resposta final: “Construamos as pontes para os que, vindos de longe, escrevam nas pedras…FIQUEMOS!!!” Quinta-feira,11 de Junho. Para me destruir basto eu. 44
Continuo a ser um impenitente compartilhante de vida. Sempre senti uma necessidade irreprimível, em o ser. Por isso, tive sempre à minha volta, muitos e variados amigos, com quem me esforcei por lhes dar o meu melhor. E hoje, desaparecida a maior parte deles – eu sempre fui o mais novo de todos! o que parece não ter,mas tem... e muito! Significado-, começo a não ter com quem compartilhar momentos (os ditos momments). Talvez que esta montanha de palavras que vou despejando, se um dia olhada, exprima exactamente esse vício de dar de mim em cada momento, o que de melhor – ou mais útil -tenho para dar. Mas há angústias insuportáveis. E vai daí: - precisava de um parceiro(a) de vida, daqueles(a) com quem estamos, sempre, em construção. Porque é verdade: Para me destruir basto eu.
Sexta-feira, Julho 25, 2008
MARX, cada vez com mais razão. Mário Soares é citado, hoje, na Comunicação Social, a recuperar Marx.
Parece
que
andou
muito
distraído. 45
Neste Blog -creio que já no ano passado – levantei a mesmíssima questão. Precisamos de recuperar uma ideologia, senão, será o descalabro total. Marx estava correcto nas suas teorias. Foram é mal aplicadas. Isto é hoje claro: a aplicação prática do marxismo na União Soviética – Marx julgava que o mesmo se iria concretizar num país industrialmente desenvolvido, como por exemplo na Inglaterra – deu cabo das boas intenções – e ideias – de Marx. O comunismo duro e puro, centralizado, de Lenine (o menos mau); a paranóia terrifica de Staline dos seus continuadores até Grovachov (que pôs finalmente em causa o processo) não permitiram que um socialismo cientifico, recuperasse e corrigisse os erros do Capitalismo, que começaram a ser evidentes, logo no início da revolução
industrial,
dos
fins
do
séc.XIX.
Ora o que hoje estamos a assistir, já o referi várias vezes. O Capitalimo mostra ser autofágico, alimentando-se de si próprio para continuar a sua senda de exploração, agora não já regional mas
global.
A Globalização incontrolada,
exacerbada
e
hiperbólica, tendo como única regra a satisfação das necessidades do mercado, que ele próprio incute e gera nas pessoas, fazendo-as dependentes do consumismo irracional, seja a que preço for, é feita hoje por processos especulativos, sem rosto, e a níveis que fogem já ao controlo dos blocos políticos. Se a paranóia do 46
mercado não for parada, estancada e controlada, este Capitalismo selvagem acabará numa tragédia, de que ninguém ficará para contar como foi. Hoje o Capitalismo galopa sobre o seu próprio cadáver. Isto é: para gerar mais riqueza, canalizada só para alguns, muito poucos que nem sabemos quem são! -, obriga o social a despejar tudo, e a pagar-lhe as dividas, recuperando as migalhas que distribuiu com o único fito de as mesmas voltarem breve à sua posse. Para «ele», para o privado, ficará só a parte lucrativa. E assim sob a forma de apoios ao investimento estrangeiro, é pago hoje aqui por «uns», para que «lhes» explore a mão-de-obra local; e amanhã será já por outros; e depois por outros, sempre… em exploração estratos sociais mais atrasado (mão obra a tuta e meia). De degrau em degrau vai descendo (ou subindo) a escada da exploração, até ao último degrau. E aí chegado como acabará a história?, importa interrogar-mo-nos. Mas para aproveitar o «bom» do Marxismo, temos de lhe vestir outra roupagem. E reconsiderá-lo nas Escolas, reexaminando-o, corrigindo-o, discutindo-o. E aí nasce a questão, que é o saber quem ainda não está tocado pelo podre do capitalismo, disposto a arriscar
(?!)
Dinheiro ?!: É para já.Parece que anda aí, a rodos. 47
Atente-se no colapso imobiliário, começado na América, e cujo efeitos ainda não sabemos de que modo os iremos pagar, ou que quota-parte
iremos
assumir.
Certo é que por cá o sistema fez o mesmo, só que em menor dimensão (só porque somos menos e começámos mais tarde). A partir da década de oitenta os bancos assentaram as suas estratégias no endividamento colectivo. Para isso oferecendo, com o beneplácito dos Governos, dinheiro fácil. Dinheiro para casa, móveis,ou obras inventadas, a pagar em dez (!), depois em vinte, agora já vai em trinta anos; e por este andar o cidadão ainda vai pagar mesmo depois de enterrado, e bem enterrado. Já se fala passar para 50 anos.(o que francamente era hipótese a considerar na actual crise, amortecendo as prestações) Para alimentar a indústria automóvel, à beira do colapso, os carros ofereceram-se a três anos, depois a cinco, agora já vai em sete.
Ou
até
já
nem
se
compram:
-
alugam-se.
Até hoje no Diário de Aveiro se oferecia dinheiro,de imediato. Ring...ring…e já está. É só dizer quanto, para poder ir de férias (a fazer figura de rico). Há dias um banco ofereceu-me uma aplicação a quinze meses, a quinze por cento. O cartaz era assim mesmo que dizia. Eu que não sou parvo perguntei à funcionária se o banco estava numa de 48
mecenato, a vender mais barato do que compra. Então ela explicou:- quinze por cento ao ano (1,2% mês) só diz respeito à taxa vencida no 15º mês, e só para o capital remanescente. Quanto ao resto, nos outros meses (14) era uma aplicação pior que muitas outras que andavam para aí. Para ir a um Banco, aconselhamos: -não leve um dicionário; leve antes um intérprete. Os Bancos aqui – e lá fora – são verdadeiros caças níqueis, com publicidade consentida profundamente enganosa. Agora aparecem as empresas paralelas a meter o cidadão em mais sarilhos. Primeiro ofereciam mil, via telemóvel, agora cinco mil, amanhã dez mil. Tudo parece fácil, Recebe já, e paga ….depois,quando quiseres. Muitos iludem-se e um dia acordam e nem a camisa lhes deixaram vestida.Conheço muitos amigos que estão com sérios problemas. Não por eles, mas para salvar os filhos da desgraça, desgraçando-se eles também. Alguém andou a convencer os putos que eram Berardos em potência, e agora deixaram-nos com o papel na mão, inútil. E as promissórias com os avais dos Pais, essas ainda vão servir para aguentar a desgraça imediata. Mas chegados ás gerações seguintes,a assinatura dos pais (os filhos de hoje) nem para promissórias vale algo. Até quando este Capitalismo selvagem, enganoso e destruidor, vai
continuar
a
andar
por
aí
à
solta?
Tive esperanças que Sócrates já tivesse actuado. Sei que romper o 49
sistema pode originar uma catástrofe, mas já se deveriam ter tomado medidas. Ps- Curioso como este Blog, escrito em Julho ,profetizava o que veio acontecer em Setembro. não tenho a
Domingo 27 de Julho de 2008 Senos da Fonseca, errou no paragrafo 8º- disse (R.E). Sem direito a contraditório, fui acusado publicamente. Direi eu agora plagiando o meu antigo professor, Dr. Euclides, Abóboras.…presidente…abóboras. Não sei se R.E. pensa (?) –é difícil o acto de, eu sei - que alguém ainda o leva a sério. Porque normalmente R.E., não pensa, fala! E quem fala muito…pouco acerta, lá o diz o opiniático povinho. Porque entendamo-nos .No tal paragrafo 8º do Prefácio a «Ângelo Ramalheira –O Rigor Cientifico Numa Personalidade de Eleição», digo.(…) Ora, é a estas comparações que os farfalhos temem sujeitar-se, preferindo deixar os exemplos fechados nos arcazes onde repousam memórias, que não querem recordar..Débeis, temem as comparações. Vivem do escalracho poluído da retórica balofa. E isso lhes basta. Pobres de espírito. Disse, e volto a afirmá-lo. Vejamos, já lá vai praticamente meio ano, quando foi feita informação à Câmara da pretensão de honrar o Eng. Ângelo da Graça 50
Ramalheira ,um ilustre «ilhavense» que aquela -e Câmaras anteriores - tinham, pura e simplesmente descartado. E solicitada ,então , a cedência de uma Sala para a evocação .E mais: sugerido, fosse atribuído o seu nome a uma artéria, e ou praça – tendo-se indicado dois locais - para memória futura. Justificadas as razões, não fosse haver por lá ignorância a mais. Parece-me pois, que meio ano, seria suficiente para decidir, na matéria .Ou não seria? Os «farfalhos » são pois, muitos e variados….e não só R.E..Cada um que enfie a carapuça... Só há duas razões para explicar o esquecimento :ignorância ou temor .Ignorância no caso, não!. Tinham informação, mais do que suficiente. Outras desculpas –reactivas - remetendo «a coisa», para o modernaço thinking , metendo-a no baú pejado de teias de aranha, é escalracho poluído de retórica balofa . Repito,pois o que disse. Enganei-me ?!. Ora isso queria eu, pensar de que.O caso é só com Ângelo Ramalheira? Que o fosse, e já seria merecedor de censura. Mas não é. Querem outros exemplos: Euclides Vaz ,um portentoso escultor, dos mais notáveis do séc. XX, do seu país, onde está lembrado? Frederico de Moura, um «ilhavense ,aveirense ,vaguense », um espírito humanista de dimensão invulgar, homem de superior cultura e rara capacidade em a tratar de vários modos e em várias vertentes, onde está lembrado?... Manuel Ferreira da Cunha, incansável lutador pela sua terra, espírito cientifico reconhecido pela França e Itália, feitor da desanexação em 1898, onde foi referido na tardia evocação do acontecimento. Onde está lembrado? Luís Barreto,o demiurgo da Costa-Nova, onde está lembrado ? Filinto Elíseo, de quem o crítico de literatura, Teófilo Braga, disse ser o maior cultor da língua portuguesa ,depois de Camões e 51
P.António Vieira; sobejamente enaltecida a sua grande qualidade poética por Hernâni Cidade, no que foi seguido por Camilo, Mendonça Figueiredo etc. etc-, filho de ílhavos».Onde está lembrado?
Não. Não fui excessivo. Fui apenas - e uma vez mais !- tolerante. Engolindo sapos. Mas pelo eng. Ramalheira, um sapo sabe-me a doce conventual. E agora que já sabe…UÈ ?! Venha lá esse livro. Ao contrário do que pensa, não me amofina. Empolga-me saber que fui o causador, reactivo. Sabe que mais? Abóboras Sr Presidente …Abóboras..
Domingo,6 de Julho O Discurso do Século . Um surpreendente discurso feito pelo embaixador Guaicaípuro Cuatemoc, de descendência indígena, advogando o pagamento da dívida externa do seu país, o México, deixou embasbacados os principais chefes de Estado da Comunidade Europeia. A conferência dos chefes de Estado da. União Europeia, Mercosul e Caribe, em Maio de 2002 em Madrid, viveu um momento revelador e surpreendente: os chefes de Estado europeus ouviram perplexos e calados um discurso irónico, cáustico e de exactidão histórica, que lhes fez Guaicaípuro Cuatemoc. -------------------------------------------------------------------------Aqui estou eu, descendente dos que povoaram a América há 40 mil anos, para encontrar os que a descobriram só há 500 anos. 52
O irmão europeu da aduana me pediu um papel escrito, um visto, para poder descobrir os que me descobriram. O irmão financista europeu me pede o pagamento - ao meu país -, com juros, de uma dívida contraída por Judas, a quem nunca autorizei que me vendesse. Outro irmão europeu me explica que toda dívida se paga com juros, mesmo que para isso sejam vendidos seres humanos e países inteiros sem pedir-lhes consentimento. Eu também posso reclamar pagamento e juros. Consta no Arquivo da Cia. das Índias Ocidentais que, somente entre os anos 1503 e 1660, chegaram a São Lucas de Barrameda 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata provenientes da América. Teria sido isso um saque? Não acredito, porque seria pensar que os irmãos cristãos faltaram ao sétimo mandamento! Teria sido espoliação? Guarda-me Tanatzin de me convencer que os europeus, como Caim, matam e negam o sangue do irmão. Teria sido genocídio? Isso seria dar crédito aos caluniadores, como Bartolomeu de Las Casas ou Arturo Uslar Pietri, que afirmam que a arrancada do capitalismo e a actual civilização europeia se devem à inundação de metais preciosos tirados das Américas. Não, esses 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata foram o primeiro de tantos empréstimos amigáveis da América destinados ao desenvolvimento da Europa. O contrário disso seria presumir a existência de crimes de guerra, o que daria direito a exigir não apenas a devolução, mas indemnização por perdas e danos. Prefiro pensar na hipótese menos ofensiva. Tão fabulosa exportação de capitais não foi mais do que o início de um plano 'MARSHALL MONTEZUMA', para garantir a reconstrução da Europa arruinada por suas deploráveis guerras contra os muçulmanos, criadores da álgebra, da poligamia, e de outras conquistas da civilização. Para celebrar o quinto centenário desse empréstimo, podemos perguntar: Os irmãos europeus fizeram uso racional responsável ou pelo menos produtivo desses fundos? Não! No aspecto estratégico, dilapidaram nas batalhas de 53
Lepanto, em navios invencíveis, em terceiros reichs e várias formas de extermínio mútuo. No aspecto financeiro, foram incapazes, depois de uma moratória de 500 anos, tanto de amortizar o capital e seus juros quanto impenderem das rendas líquidas, das matérias-primas e da energia barata que lhes exporta e provê todo o Terceiro Mundo. Este quadro corrobora a afirmação de Milton Frimam, segundo a qual uma economia subsidiada jamais pode funcionar e nos obriga a reclamar-lhes, para seu próprio bem, o pagamento do capital e dos juros que, tão generosamente, temos demorado todos estes séculos em cobrar. Ao dizer isto, esclarecemos que não nos rebaixaremos a cobrar de nossos irmãos europeus, as mesmas vis e sanguinárias taxas de 20% e até 30% de juros ao ano que os irmãos europeus cobram dos povos do Terceiro Mundo. Nos limitaremos a exigir a devolução dos metais preciosos, acrescida de um módico juro de 10%, acumulado apenas durante os últimos 300 anos, com 200 anos de graça. Sobre esta base e aplicando a fórmula europeia de juros compostos, informamos aos descobridores que eles nos devem 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata, ambas as cifras elevadas à potência de 300. Isso quer dizer um número para cuja expressão total será necessário expandir o planeta Terra. Muito peso em ouro e prata... quanto pesariam se calculados em sangue? Admitir que a Europa, em meio milénio, não conseguiu gerar riquezas suficientes para esses módicos juros, seria como admitir seu absoluto fracasso financeiro e a demência e irracionalidade dos conceitos capitalistas. Tais questões metafísicas, desde já, não inquietam a nós, índios da América. Porém, exigimos assinatura de uma carta de intenções que enquadre os povos devedores do Velho Continente e que os obriguem a cumpri-la, sob pena de uma privatização ou conversão da Europa, de forma que lhes permitam entregar suas terras, como primeira prestação de dívida histórica.. ------------------------------------------------------------------------Quando terminou seu discurso diante dos chefes de Estado da 54
Comunidade Europeia, o Cacique Guaicaípuro Gatemos não sabia que estava expondo uma tese de Direito Internacional para determinar a verdadeira dívida externa
Terça-feira,29 de Julho. EMPRESTAR A RIA, OU VENDÊ-LA ?) ,OU VENDÊ-LA. Eis a questão. Ontem, numa interessante Tertúlia – pelo que ela teve de confronto de posições – falou-se de coisas que poderão comprometer ou descomprometer o futuro da Ria de Aveiro. Na mesa – ou melhor no lado de lá – estiveram os que alcandorados a postos desenvolvimentistas, tinham -ou têm – por missão, no cumprimento das suas tarefas, o pugnar pelo futuro dentro do modelo estritamente económico, a que se ligaram. Eu compreendo-os …Presentes o Presidente da A.P.A e o Presidente da, ainda, Rota da Luz. E ainda, a questionadora, a Profª D Fátima Alves, que não deixou de colocar pertinentes questões, especialmente à catadupa de planos com que se vem brindando a Ria, baralhando-se uns aos outros, entrechocando-se, rapidamente caindo em saco roto, por inócuos. Espera-se para breve a definição exacta do Órgão que virá gerir a Ria. Que terá de ser totalmente independente dos interesses que se movimentam em seu torno. Entregar esse órgão à disputa Autárquica, é passar um certificado de óbito à Laguna. Conciliar as pretensões válidas da A.P.A, as da pesca Artesanal, ou a da utilização da Ria como área privilegiada de gozo da Natureza, deverá ser ,pois, tarefa do referido Órgão. Que para isso deverá gozar de autonomia, ser desburocratizado, mas acima de tudo, responsável. E se fosse possível – aqui a grande questão - despartidarizado. Ficou ontem claro que a sociedade civil exige a defesa intransigente da Ria, pretendendo manter e preservar - e 55
melhorar! -, todas as suas virtualidades. Que são imensas. A dita, mostrou ali, que repudia planos irresponsáveis e ofensivos à estabilidade e integridade lagunar. Vistam a roupagem que vestirem. Mesmo aos que mascarados de cordeiros, à primeira distracção mostram a dentuça do lobo mau. (Para que serão tais dentes ?!). O P.I.M.B.A (Projecto Imobiliário da Marina da Barra), mascarado com uma Marina, é claramente o produto de mentes subordinadas aos interesses de grupos económicos, o (reles) resquício do 25 de Abril que tarda a ser extinto. Mas será, não tenhamos dúvida. Aquele insulto, hoje, mercê da informação saída do esforço de contestação de há quatro anos, tem a absoluta oposição dos que se preocupam com o futuro da Ria. Valeu a pena ! Curiosamente o Presidenta da APA, no seu direito de contraditório, foi o único ponto da charla em que optou por nem sequer pretender, nele, falar. O que quererá dizer este silêncio?. Seria interessante saber-se…É preciso estar atento. O polvo ainda mexe. O Dr. Pedro Silva tem o discurso na ponta da língua. Só que o mesmo não resiste ao primeiro embate do contraditório. Turismo de massa , captação de operadores, «venda» da marca ,etc. etc. ,é saber advindo das teorias de marketing turístico ,lido em qualquer revista. Mas não é, certamente, o modelo para «emprestar» - não «vender» –, a Ria de Aveiro. O Dr. Pedro se mais actualizado pelo que vai no mundo turístico, se estivesse atento, saberia que a sua grande preocupação deveria ser a de planificar a «CULTURA DA RIA DE AVEIRO». Hoje o turismo começa a transmutar-se para este tipo de nova paixão, que a Internet ajuda a promover. Ora a «Cultura da Ria de Aveiro» – muito para lá dos passeiozinhos ridículos do vou ali e já venho – é de uma riqueza inigualável: - a cultura lagunar das suas gentes, dos seus costumes, das suas tradições, das suas artes, da sua natureza, limpa e límpida. Emprestemo-la para usufruto de 56
alguns, mas guardemo-la, como jóia, com uma relíquia que é, e queremos que seja: -NOSSA. Quanto á Professora Fátima Alves, eu percebi a sua desilusão com tanto plano. Mas os académicos são, em parte, os culpados. Custa a entender que dificilmente se encontrem, em Portugal dois sábios com posição idêntica sobre o mesmo assunto. Então poderemos dizer: se um é sábio o outro não o é, de certeza. Verdade Lapalisseana. Sabe Profª(?) os sábios anda muito promíscuos, e gananciosos. Eles também mais interessados em vender o seu saber, assoldando-o, do que usá-lo para o bem comum. E a verdade é que os sábios custam muito dinheiro à comunidade. Devem-lhe por isso, respeito. Olhe Profª!: pessoalmente não gosto nada da promiscuidade entre a Universidade de Aveiro e a APA. Acabo: -a Ria de Aveiro foi a circunstância das gentes que somos; que sejamos agora nós a circunstância que lhe proporcionará o remoçar..Só isso....remoçar... Valeu a pena, a Tertúlia de ontem. E de continuar. Já o vinha dizendo há um bom par de anos. Talvez repensada, para o período que se avizinha.
certeza de que a desgraça não chegue, continuando nós a ir por onde vamos.
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Quinta-feira,7 de Agosto
Inventando os teus lábios
Silencioso este voo nocturno Nem é dia nem é noite, tanta é a claridade Perturbá-lo seria trair o instante que indecifrável, passa Deixo-o seguir viagem Por mim aqui fico a inventar o espaço De olhos fechados. Deixo-o passar. Na sede de adormecer Inventando teus lábios.
Quarta-feira,28 de Agosto (????)
A HECTACOMBE FINANCEIRA. 58
Espanta-me como alguns Sábios ainda duvidem, que mais tarde ou mais cedo, a crise, directa e ou indirectamente, vá chegar ao País. Vai!..e já vão ver como. A crise neste momento tem ainda, quase e só, uma dimensão financeira. Se o plano Bush for em frente - na hora em que rabiscamos o blogo, parece que foi aprovado - o Estado Americano (todos os contribuintes americanos) vai (vão) adquirir os activos podres dos Bancos, fazendo implodir a tal bolha especulativa imobiliária. Só que, ficando o Estado com milhões de prédios na mão, a pergunta é:- o que irá fazer com eles? Ora dos anteriores donos que por não poderem satisfazer os seus compromissos viram os seus prédios hipotecados, serem executados, só uma pequena parte se irá candidatar a adquirir novamente o que perdeu, mas em condições exigidas de muito mais segurança. Será uma percentagem mínima que conseguirá voltar a ter habitação própria. Em consequência a construção e actividade imobiliária descerão inexoravelmente Atrás delas virá um abrandamento que se reflectirá em outros centros de produção. O crédito apertar-se-á cada vez mais, as grandes indústrias (automóvel, aeronáutica e muitas outras) abrandarão, e a recessão será inevitável. Neste quadro – para mim evidente - o dinheiro que vinha dos EUA alimentar os grandes bancos Europeus; deixará de atravessar o Atlântico. Será - todo! - preciso do outro lado. Em consequência os grandes Bancos Europeus irão limitar os empréstimos ao pequeno Banco Nacionais, porque lhes falta liquidez. Então a crise financeira chegará aos pequenos Países. E depois, e pelo mesmo modo, a seguir, virá um abrandamento (maior ou menor) da actividade económica; o desemprego subirá e a recessão estará aí em breve. Porque é que isto sendo o b..à..rà da política económica parece ser difícil de intuir, e levar a tomar medidas quanto antes?
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Intervenção dos Órgãos Reguladores? - Sim e depressa O Presidente da CMVV dizia hoje algo profundamente errado. Dizia Carlos Tavares que a situação não exigia maior regulação, mas sim maior transparência nos produtos financeiros. Ora parece ser bem claro que há que passar ao crivo, os produtos financeiros oferecidos (fundos, seguros, capitalização, etc.) mas para o fazer é preciso muita proximidade e intervenção constante do Órgão regulador (e fiscalizador). Pois acreditamos que tenha de ser nessa maior intervenção que possa estar um dos instrumentos mais valiosos para antecipar a crise e diminuir-lhe os efeitos. Recessão Económica já chegou hoje á Europa A recessão económica começou já a chegar. A Irlanda – lembram-se como ainda há meio ano era dada como exemplo de desenvolvimento sustentado - entrou em colapso. Parece que Alemanha e Espanha se seguirão – é lógico. Juntamente com A Grã-Bretanha eram os países que têm a economia mais ligada(dependente) do sistema fiduciário americano. Foram as primeiras a apanhar os efeitos do Tsunami. Portugal está muito ligado aos empréstimos Ingleses e alemães. Se aquelas entrarem em quebra notória, ninguém nos vai valer. E isto seja qual for o governo que lá esteja. E para situações difíceis e muito complicadas o certo é que só este deu, ainda, mostras de encarar as dificuldades com grande coragem e sentido de responsabilidades. Imaginemos numa crise destas termos lá o Pedrito ou Luís F. Meneses (e o sacrista Ribau) . Era o fim da picada.
Sexta-feira ,12 de Setembro
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Fim de Verão…Voltando á «Terra da Lâmpada»(TL). Retirar um tempo aos trabalhos onde me envolvo, às vezes inesperadamente, permite uma olhadela ao Blogo, e dentro deste á Terra da Lâmpada. É tempo de regresso, de aviar as malas e emalar a trouxa, e á falta do carro do «Zé Parracho» para levar a tralha, vai-se de popó, o que é mais depressa :e por isso tempo de olhar para a T.L com um olhar mais atento. No Jornal «O Ilhavense» apareceu o anúncio da Venda da Quinta de Algueirão. Assim vão desaparecendo, aos poucos, pedaços da nossa história, sem quase nos apercebermos de tal desaconchego. A esta hora, João Sousa Ribeiro ,o Capitão – Mor de Ílhavo, pai da pátria (lagunar), deve estar a revolver-se no túmulo. Tanta honra, tanto alarde na casa senhorial d’ «Algueirão, para agora ser retalhada em lotes. Mas o que tem de singular este anúncio, é sugerir uma leitura de algo misterioso e ainda não explicado, que é o da pertença do lote (?!) da referida Quinta, o local onde foi edificada a Biblioteca Municipal. Que o Tribunal veio sentenciar ser propriedade do Construtor Civil, de quem se dizia, a Câmara o ter recebido a troco de (não se sabe de quê, ao certo). Comprou mas não pagou (ou não cumpriu com o prometido, o que vai dar ao mesmo), e agora o terreno reverteu (inabalavelmente) para o dito empreiteiro. E o que está nele edificado (na nova demanda judicial em curso) poderá ter de ser demolido (como é expressamente pedido na referida demanda). Então a que diz respeito este anúncio de venda? Ao local (e ao que lá está indevidamente aposto), ou só ao terreno que nos impingiram ser o local para construir o Palácio da Justiça (cujo protocolo com o Ministério da Justiça nos disseram ter sido já assinado (?!)) Haverá por aí alguém que ajude a clarificar esta trapalhada? Então como se compreende a emissão de licenças de construção, e se recebem comparticipações para a mesma, quando 61
sobre o terreno pendiam ónus ainda de todo não resolvidos? Alguma vez isso poderia suceder com um particular? E quais serão(de momento) as preocupações do partido da Oposição (P.S) que permite (até hoje) o silêncio em vez de nos explicar o que andam os seus representantes por lá a fazer, na Câmara, sem obrigar a que entidade hierarquicamente superior venha esclarecer o imbróglio? Coitado do major Valentim. A ver cada vez mais próximo o dia em que verá o sol coalhado de ferrinhos, por muito menos. Comparado com o Tenente Lateiro (e que lata!), da «Terra da Lâmpada», o major é um cabo raso, um aprendiz.
Sexta-feira,12 de Setembro O «PIMBA». O PIMBA (Projecto Imobiliário da Marina da Barra) volta a ser notícia. O R.E já tinha ameaçado (curioso nu?!) com a pipa de massa que o Promotor iria exigir ao Estado, por este lhe ter negado o projecto Imobiliário delirante, que a CMI, e R.E, promoveram, (e a Câmara pagou!). Muito mais do que o dito. O Projecto no seu todo está chumbado, e bem chumbado. Pode voltar – e voltará – mas reduzido à sua essência inicial, que era o de fazer uma Marina inofensiva para o ambiente, e útil para as finalidades do Turismo sustentado da Laguna (há vinte anos que o vimos sugerindo). Imobiliário – já o afirmou tantas vezes -terá de ser algum. Mas com conta peso e medida. E sujeito a uma clara e inequívoca definição, e condição: -pousado em terra. As trapalhadas da gestão da APA, praticadas pelo «socialista» Raul Martins – um perfeito incapaz, inapto e descabelado homem do aparelho partidário distrital, que um dia se viu nomeado para a Presidência daquele organismo, apenas e só por razões politicas -, culminaram com o fervor e a pressa do «socialista» Cravinho, e 62
daí as trapalhadas de um concurso internacional (?) feito á medida de um mestre-de-obras, habituè e expedito em alimentar a sua estrutura empresarial com as obras portuárias. O concurso antes de o ser já teria (?) destinatário apalavrado, infere-se das candidaturas que não apareceram. E quando assim é, sabe-se na gíria, porquê ?!…
O PIMBA, MIRÓ E MOEDAS RARAS… O suporte financeiro do projecto PIMBA era do BPN, que vendo sendo notícia recente com a indiciação da prática de ilícitos em fase de investigação, consumados na Presidência de uma patética figura nem sempre referenciada pelos bons motivos, mas isso sim, profundamente comprometida com os diversos barões do PSD. Ora hoje a Comunicação Social dava conta que o actual Presidente, Miguel Cadilhe, para salvar o Banco de possível dissolução, resolveu vender muitos dos activos, e destes, para lá das pinturas de Miro e da colecção de moedas raras (euro 2004), alguns projectos em carteira, de «finalidade duvidosa». Estou na expectativa de saber se os 49,9 % do PIMBA (mais do que duvidoso, pateticamente escandaloso), detidos pelo BPN, foram alienados, e nesse caso quem se teria proposto à sua compra? Ora aí está uma boa altura para a CMI, de R.E - que tão farta de recursos deve andar, tantos e tão inimagináveis gastos tem levado a cabo - os adquirir, e fazer com os Irmãos Cavaco uma parceria pública – privada. Coisa que parece ter sido o poço de petróleo achado no pinhal da Amarona, que lhe vai permitir continuar a cantar e rir…como a cigarra tonta. E por hoje basta…. 63
MAS HÁ MAIS…
Terça-Feira ,9 de Setembro. A VISITA AO S.PAIO.
Segunda –feira, mal ataviado e mal informado ,procurei, contudo, não faltar ao encontro anual com o Orago. Desamourei o «Costa-Nova», essa beleza de bote de fragata (já agora aqui fica a informação, pois andam sempre a perguntar-me que tipo de barco é aquele), icei velas e, toque-a toque – no caso bole-bole que o vento estava mareiro em duas horas e meia atracava o C.N. ao cais dos pescadores, na Torreira. A meio da singradura, na ilha da Testada descobri dois enormes bandos de flamingos, que sossegados - tão sossegados que nem reagiram ao meu pompom! para ver se os fazia levantar, e assim admirar o deslumbrante espectáculo daquelas pernas longas ,rosados, flops em baixo, a ganhar altura - procuravam a mariscada que lhes dá os salpicos da plumagem . Chegado á Torreira, o foguetório estreloiçava no ar, avisando que a festa ainda ia a meio. E a procissão, também, pensei eu de que. Amainadas as velas, trincados os cabos, arrumadas as tralhas, fechados os paióis de proa e ré, olhei espantado para uma série de bateiras embandeiradas que se faziam ao regresso. Interrogado um amigo com quem regateei (?!), em tempos, no Moliceiro «O ilhavense» - paz á sua alma e a quem assim ordenou o seu fim, o 64
de apodrecer no cais da Bruxa - fui informado que a regata dos «Chicharros» em que eu pretendia participar hors- série, se tinha realizado no sábado. Bem, engano por engano - um homme nasce p’ra ser enganado, se for que não se veja!. dizia o Felisberto «Ógado» o da Inês «Mamalhuda» - que até de vaca era corno! -,decidi render de imediato visita ao S.Paio, não fosse ele levar a mal, a falta de urbanidade. E com santos, nada há como os não indispor, que zangados podem atirar cá para baixo alguma maroteira. A procissão, essa, já não ia no adro, pois tinha era acabado. Os andores jaziam já encanteirados dentro da igreja, ainda exuberante e prodigiosamente floridos, exibindo, ao lado, um dístico: Proibido roubar flores. Sem mais. Que raio ?! Lá que se roube um Multibanco, eu compreendo. Mas uma flor(?), flor, não das outras, está bem de ver!.. Se ali estivesse a «Manelinha» Leite, aproveitava para afirmar com aquele ar de beata empedernida: - a onda de criminalidade já chegou ao interior dos lugares de culto, tudo por culpa desses maçons socráticos. E foi então aí que vislumbrei o Sampaio, não o pequeno e mulato S.Paio, avinhado como uma linguiça, escurecido por tanto baptismo com tintol. Este Orago tem uma história. A Torreira (meados séc.XVIII) é um pouco mais nova que a Costa-Nova. Começou por ser um ponto do litoral onde se empregou a Xávega. Ora, conta a tradição que um dia, na coada de uma das artes, terá vindo arrolado um santinho de pau, com rosto de criança, que logo foi adoptado para orago, por aquela gente da borda. Companhas sem orago, não puxa remo. O ser o orago uma criança, até teria as sua vantagens, deveriam ter pensado aquelas gentes. Mas para o que eu não encontro explicação, é para o facto da tradição, mandar verter almudes de vinho sobre a criança-santo, despejando-os pela cabeça abaixo do pobrezito, a tal ponto que as faces rosadinhas tomaram uma cor arroxeada que mais parecia provocada por cirrose de figadeira empapada em vinhaça, a que só faltaria uma cebolada para dele fazer umas excelentes iscas. Ora o S.Paio é santo de muita 65
devoção lá para a Galiza. E eu acredito, mais, que aqueles que trouxeram as artes grandes no séc.XVIII, para estas bandas, teriam trazido com eles o santinho, dando conta do seu feitio milagreiro. A entrega do santo deveria ter tido festa de arromba. E copos a mais. Ás tantas foi um banhada. E daí a tradição foi o que foi. Mas ao que parece, já não é… Voltemos ao rendez – vous. No andor estava o Orago e muito embora exiba a cara de menino, tem um corpo de rapaz espigadote. Estive tentado a dizer-lhe: -Vai chamar o teu irmão mais novo. Mas como nisto de falar com santos, não sei em que dialecto se faz, decidi antes inquirir uma santa mulher, que ajoelhada em frente do irmão(?) mais velho, se lhe encomendava, confiadamente. -Olhe por favor, não me sabe dizer o que é feito do santinho «bebedola»? -Está guardado. -Então porquê? Não me diga que têm medo que o roubassem… adiantei eu, com cara de santa ingenuidade. -Pois olhe o senhor, que até «assucedeu», uma vez….Uns «escaramentados velhacos», quiseram levá-lo p’rá Aveiro. Mas não é por isso. É que faziam –lhe uma tropelias e o Sr. Prior achou por bem acabar com elas. O santo não compareceu ao encontro, não por sua culpa ,que até devia de gostar desta visita de um ateu, respeitoso, seu conhecido e com quem mantém bom relacionamento desde há mais de cinquenta anos. Paciência. Como habitual dei uma volta pelo arraial da feira antes de entrar numa das muitas tasquinhas para a bacalhauzada do costume. São dois quilómetros de barraquinhas das vendas. Tudo de marca(?!): malas Versage, óculos Raybam, camisolas Lacoste, Calvin Kleiner, etc. etc. Este ano proliferavam, contudo, os hair dressers a anunciar: fazem-se TERERÉS e RASTA. Nas vendas de roupa, por todo o lado se exibiam body’s para todos os gostos e tamanhos: vermelhinhos como as 66
«papoilas(ih,ih!) saltitantes» do Benfica, negros como a Briosa, ou branquinhos como as pombas que pretendem engaiolar. Dei comigo a apreciar como uma Murtoseira avantajada, daquelas que só debaixo de um capote de Varino disfarça os refegos, mirava e remirava, tirando medidas a um dos vermelhos, tipo fio dental. Não entendi lá muito bem – ou imaginei - como seria a troglodita vestida (despida), com o bodesão a conformar-lhe as regueifas. Ainda se fosse ás riscas. O que estaria ela a pensar fazer com aquele body extra largo? Dei tratos de polé á minha imaginação que dizem fértil, a pensar no que seria o ataque do bode (salvo seja). Mas a verdade é que na feira se encontra tudo. Por exemplo: - eu que me vejo atrapalhado sempre quero comprar uns boxers (fino não é?!) -XL, ali tinha ao dispor a medida XXXL. A 5€ a molhada. Não podia perder a oportunidade, até porque a marca era convidativa: «DESPERADO», assim mesmo. Elucidativo, quando um home se vê com as ditas na mão. Adiante que estamos a falar de coisas sérias...… Regressei ao cais. Foi aí que deparei com um grupo especado, embasbacado, contemplando o «Costa-Nova». Claro que quando cheguei meteram conversa, inquirindo onde tinha eu ido buscar aquela maravilha. Palavra puxa palavra, e eis que do grupo, há um velhote simpático que me atira: - pena é que tenha sido pintado «à moliceiro». Foi lamiré bastante para eu já o não largar. -Então mestre diga-me porquê ?. -Olhe: - ali e ali faltam os botões de rosa; ali, àquelas letras falta-lhe ressaimento, e no painel de popa falta a corda da embelezadura. E a bica não é pintada em preto. Fiquei espantado: andei eu na semana passada a dilucidar sobre as diferenças, levando horas a ensaiar a dissertação, e o homenzinho, um pintor de Varinos, Faluas e Fragatas, explica-me, ali, tudo bem explicado, em duas penadas. Ora era exactamente como eu pensava ser. As diferenças são, de facto, abismais. Então abri o jogo e lá lhe expliquei que eu sabia a diferença. Só que não podia levar o barco todos os anos à Moita para ser 67
pintado por mestre. E assim, tinha-me socorrido do que havia (do melhor!) por cá. Como não havia outros para acomparar, fiqueime pelos mestres de cá, e o barquinho faz um vistão. Pudera… Conversa puxa conversa, e quando dou comigo – e com o «CostaNova» - velas içadas, ambos desejosos de regressar para trazer cumprimentos do orago á Srª da Saúde,o CN estava em seco, encalhado, abusacado no lodaçal. -Estou bem aviado, pensei. Agora vou passar aqui a noite. Resolvido lá me atirei para o lodo,e zás! fui por ali abaixo. Espetado até à cintura, eu já queria, era ao menos, saltar para dentro. Mas o que vale é que por aquelas bandas tenho muito conhecido. Lá vieram quatro deles, safar-me: -a mim e ao «C.N». A calmaria apanhou-me entreáguas, e lá arrolei com a maré e com um sopro de vento, até ao CVCN.Lancei mourão às dezanove. Tempo de tirar as arrufadas da bica da proa; o Clube estava vazio. Parecendo «O Ilhavense» no cais da Bruxa.E eu descontraidamente lá vinha para casa todo sujo de lodo, quando ouço uma voz: -Onde é que vai de cuecas?! Então não era mesmo verdade que despidos os calções …por causa do lodaçal, eu nem tinha dado que vinha naquele preparo! Ao menos se estivesse atento, tinha calçado as «Desperadas». Mas no fim, cumpri a minha promessa. As contas com este estão em dia. Sábado,4 de Outubro DESPEDIDA ….
Hora de cerrar os vitrais, correr as portas e deitar um olhar de adeus ao silêncio daquela luz. 68
Ouço o longínquo apelo Da gaivina a espairecer No quintal da infância. Verão ainda, ou já inverno? Sou todo silêncio, pouco mais; As pálpebras dormentes Impedem saber em que rosa- dosventos Descortino o tempo. Invento no espaço A cor da palavra suspensa No torpor da tarde. Já inverno, o pôr do sol Vem de madrugada. Por ali fico indefeso a ler teu poema Com a luz apagada, Na praia iluminada
(04.10.2008)
Domingo ,14 de Outubro
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Para mim a vida não foi cruel….(até aqui…)
Hoje a conversa no mar da palha, estava um pouco bizarra. Cada um, já não muito longe do fim, a deitar contas ao que resta da vida. Havia unanimidade de que é sempre bom, um homem ir á frente. Como lhe compete observei, sabe-se lá dificuldade das veredas a prosseguir. Uma mulher adapta-se claramente ao aspecto mais terrível e cruel, que é o da solidão. Falo das mulheres das gerações anteriores, pois não sei se com os ganhos, ditos civilizacionais, no futuro, as coisas se irão processar da mesma maneira.
Medo da morte, logo que a conversa entra em maior proximidade, é já perceptível em todos. Eu já abordei aqui, várias vezes, o tema. Eu o que tenho medo é de um dia qualquer, ter medo dela. Porque não há objectivamente razão para eu ter medo dela, mas sim do que virá depois dela ,para os indefesos. Por muito que deixe tudo programado sei que o mundo não é bom para esses, em particular. Chegado aqui, pouco - muito pouco mesmo - deixei ficar para trás. Tive uma vida já longa e duvidei por diversas vezes que isso aconteceria, pois que a minha vida foi de uma violência física ,desmesurada ,excessiva. No cômputo geral fui feliz ( se é que se pode sê-lo, perante a realidade que nos cerca?!) - se medir essa felicidade por mim, e em mim – ainda que menos no que 70
me ultrapassou. E mesmo nestas situações, consegui vislumbrar razões que me recompensaram das escolhas – ou sorte imperfeitas, e nelas mesmo soube encontrar motivação para me superar e aceitar a missão com redobrada força interior. Capaz de minimizar os imponderáveis, para os quais não tinha (nem tenho) solução, mas contra as quais lutei como se houvesse. Nunca me rendi. Fiz até dessa situação, sem queixume nem amargura (exterior), uma procura interior que me fez perceber melhor que a franqueza e a fraqueza, não admitem partilha. Amado por uns odiados (?!) por outros: de há muito que me vem sendo dada esta qualificação com a qual passei a conviver, ainda que com ela não concorde. Exagerada, pura e simplesmente. Mas, se tiver algo de verdade, então já agora, aos primeiros dei-me, mas não todo. Reservei sempre uma parte de mim mesmo, que nunca deixei antever. Por instinto de precaução. Para que se doesse, doesse menos. Por isso creio que fui mais «amado» do que aquilo que dei em troca. Foi bom. Porque, repito, não dei tudo, tendo recebido muito mais. Aos segundos pareceu-me que não é bem «ódio» mas apenas irritação por eu nunca ir atrás deles para me poderem exibir a seu lado. Nunca soube nem me quis mudar para sítios ensoleirados: preferi sempre ficar no meu sítio: - onde mora a fantasia, o sonho utópico que me inquieta e me transforma no mexeroto que gosto de ser. Mais a viver do instinto que do acto mental. Não tive momentos cruéis a toldarem-me a alegria de viver, salvo o desaparecimento, um a um, dos que me eram próximos. Mas mesmo essa sucessiva repetição dolorosa, aceitei-a como inevitabilidade tirana da vida. Não me revoltei contra ela (por 71
essas serem as regras do jogo),nem contra NINGUÉM, porque só me queixaria se antes LHE tivesse agradecido a dádiva (o que nunca sucedeu). E sempre nesses actos compreendi que era melhor que tivesse sido assim, porque aqueles que ali estavam, no final, já não eram os meus. Já nem sequer percebiam que eu era, ainda, o seu. E quando assim é, não é vida, é morte em vida. Sem serem cruéis, esses momentos foram terríveis estados de alma amargos, quase ininteligíveis para a compreensão dos que me rodeavam. Eu queria amparo; o que me ofereciam era desamparo, no aconchego circunstancial, do tem paciência é a vida. E eu sem saber, uma vez mais, porque é que se tem de ter paciência com a vida, mas tive-a. Quando deixei a vida activa, preocupei-me como iria percorrer o tempo que restava. E foi agarrando-me à construção de palavras que percebi que caminhava bem mais despreocupado do que antevira, por finalmente poder perceber muita coisa que a lufalufa da vida me tinha deixado escapar. A escrever, embora isolado do meu semelhante –eu !, um obsessivo pelo convívio! -, parece que O visito todos os dias, para lhe dar conta dos meus desencontros, talvez para me perder ainda mais. Uma coisa é certa: -Não mudo, porque já não tenho tempo para isso. E mesmo que o quisesse fazer, estava certo que a caneta não mo deixaria fazer. Porque então, tudo o que dissesse era mentira. E no momento mais crucial do dia, que é quando me olho, de manhã, ao espelho, ao não me encontrar comigo, tenho a certeza 72
de que n達o descansaria enquanto n達o me fosse procurar por entre o lixo da mediocridade. Senos da Fonseca
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