obsessĂľes de
Woody Allen 4 de fevereiro a 29 de março de 2014
Com quantas obsess천es se faz cinema?
Todo grande artista é aquele que não só domina os recursos técnicos de sua linguagem, os meios de sua arte, como também faz dessa linguagem e desses meios uma forma de se debruçar sobre si mesmo e o outro, de intervir sobre o mundo, de partilhar suas dúvidas, desejos, temores e aspirações. Isso porque o domínio da linguagem, o conhecimento dos meios, a experiência com as formas, a precisão do artista, mal escondem o fato de que a arte, no fundo, é sempre um modo de lidar com a paixão, esse pendor aos sentimentos mais perturbadores que nos tomam completamente. Por isso mesmo, toda arte, de algum modo, revela as obsessões que movem seu criador. E na história do cinema, poucos cineastas encarnam tão profundamente a paixão pela arte e a arte como pathos do que Woody Allen. Poucos cineastas construíram uma obra tão marcada pelas próprias obsessões: a cidade de Nova York, com seus lugares e pessoas, cenário definitivo de Manhattan; o amor, com seus
encontros e desencontros, certezas e medos, ora cômico ora doloroso, como em Noivo Neurótico, Noiva Nervosa; o sexo, espécie de Santo Graal na vida de tantas personagens, mas que se gasta em compulsões e neuroses, em quase todos os filmes. Da mesma forma, temos as relações domésticas e familiares, assinaladas por desentendimentos, silêncios e ressentimentos, como aqueles que paralisam as irmãs de Interiores, filme que deixa entrever outra obsessão fundamental de Allen: a influência de Ingmar Bergman, o cineasta sueco que deu status de arte absoluta à família e seus conflitos domésticos, fazendo dos enganos pessoais, das pequenas vilanias e dos desentendimentos surdos de cada um a constante fundamental de seu cinema. O próprio cinema é uma obsessão permanente, incontornável, que Woody Allen reverencia e ironiza, de forma crítica e na mesma medida, com a força que só as paixões colocam em
jogo. Reverência que faz do cinema uma fantasia que nos desloca de nossas próprias infelicidades, como com a garçonete de A Rosa Púrpura do Cairo, que assiste filmes para se libertar, momentaneamente, de um marido bêbado e violento; ironia que se materializa nos impasses criativos que o diretor e roteirista de Memórias vive diante de um público que espera o que ele, por várias razões, já não pode mais fazer. As ideias fixas, os argumentos compulsivos, a insistência dos temas e motivos, o humor e o pathos - tudo isso faz de Woody Allen um desses artistas raros, para quem a arte não é só a precisão do gesto, o domínio da linguagem e dos recursos técnicos, mas um modo de buscar uma resposta a tudo o que nos obseda. Ainda que essa resposta não exista.
Márcio Scheel, Professor de Teoria da Literatura do Ibilce/Unesp.
Bananas Neste que é um dos filmes políticos de Woody Allen, temos a personagem de Fielding Mellish (Woody Allen), um sujeito alienado, que trabalha testando produtos em uma grande empresa. No entanto, ao se apaixonar por Nancy (Louise Lasser), uma ativista de esquerda dedicada às causas políticas e sociais, Fielding decide transformar-se, ele mesmo, num “animal político”. Em chave farsesca, acaba envolvendo-se com manifestações e indo parar em San Marcos, uma republiqueta de “bananas” no interior da América Central, tomando parte num processo revolucionário que o conduz, e todos os seus equívocos, à presidência do país. EUA.1971, 81 minutos.
04/02, 20h
Após a exibição, bate-papo com Márcio Scheel, Professor de Teoria da Literatura do Ibilce/Unesp.
A Última Noite de Boris Grushenko Sexto filme de Allen, o diretor volta ao tema político e, ao mesmo tempo, presta uma homenagem à cultura e à literatura russas que tanto admira. É impossível não ver a influência de Tolstói e seu Guerra e Paz. Novamente, a partir do crivo da comédia, Allen cria um filme de caráter histórico em que um jovem sem talento militar, diferentemente do espírito guerreiro de seus irmãos, alista-se no exército russo para lutar contra a invasão napoleônica e, por acidente, acaba vencendo uma importante batalha, recebendo honrarias militares e tomando parte num plano para assassinar Napoleão. EUA/França. 1975, 85 minutos.
05/02, 20h
Manhattan
A literatura, obsessão permanente de Woody Allen, dá o tom desse que é um dos mais belos filmes do diretor. Isaac é um neurótico escritor de meia-idade, que, separado da esposa, terá de lidar com o fato de que ela, após se casar com uma amiga, decide publicar um livro em que revela a intimidade sexual e afetiva com o ex-marido. Para completar o círculo de enganos e equívocos que consome Isaac, ele se apaixona pela jovem Tracy (Mariel Hemingway), que só tem 17 anos. Comédia dramática, Manhattan explora não só os conflitos amorosos, as indecisões e os medos que envolvem o amor, mas também a paixão de Allen por Nova York, seus lugares, espaços e pessoas. EUA. 1979, 96 minutos.
06/02, 20h
Interiores Interiores é, sem dúvida, o mais bergmaniano dos filmes de Allen. Renata (Dianne Keaton), Joey (Mary Beth Hurt) e Flyn (Kristin Griffith) são três irmãs cuja relação é marcada pela distância, pelo desconhecimento, pelos medos, preconceitos e frustrações de classe que caracterizam a vida e a educação no interior de uma família burguesa. No entanto, quando seu pai resolve divorciar-se de sua mãe, colocando toda a família em crise, elas terão de confrontar-se consigo mesmas, com os valores e os ressentimentos mal dissimulados que marcam suas vidas e a própria história familiar. EUA. 1978, 96 minutos.
07/02, 20h
Noivo Neurótico, Noiva Nervosa Alvy Singer (Woody Allen) é um humorista e escritor de origem judaica, incapaz de lidar com seus fracassos amorosos e com o constante sentimento de inadequação diante do mundo e, particularmente, das mulheres. Divorciado, sozinho, frequentando há quinze anos as mesmas sessões de análise que parecem aprofundar sua angústia, acaba se apaixonando por Annie Hall (Diane Keaton), aspirante à cantora que tem uma vida sentimental tão complicada quanto a do próprio Alvy. Nesse filme, além das complicações amorosas, percebem-se outras das influências obsessivas de Allen: Freud e a psicanálise. EUA. 1977, 98 minutos.
08/02, 17h
Memórias O cinema e o humor dão o tom de Memórias, filme sobre um diretor e roteirista de comédias que, em crise criativa, viaja para participar de uma retrospectiva de seus trabalhos. A mostra, então, acaba o envolvendo com uma plateia hostil, que já não aprecia seu trabalho, fazendo com que ele coloque em perspectiva, por meio da lembrança, episódios significativos de sua vida, de sua carreira e de seus livros. Em Memórias, Allen faz um tributo a filmes como Oito e meio, do italiano Federico Fellini, e Morangos Silvestres, do sueco Ingmar Bergman. EUA. 1980, 88 minutos.
25/03, 20h
A Rosa Púrpura do Cairo
Obra-prima de Woody Allen, temos a história de Cecilia (Mia Farrow), uma garçonete pobre de Nova Jersey, que vive uma vida de infelicidades e frustrações junto de seu marido, um desempregado bêbado e violento a quem tem de sustentar e que a despreza. Como forma de escapar à própria vida, Cecilia passa boa parte de seu tempo indo ao cinema e sonhando com uma história pessoal que se confunda com as dos filmes que vê. Até que o personagem de um desses filmes resolve sair do enredo e oferecer à jovem a possibilidade de uma nova vida. Em A Rosa Púrpura do Cairo, Allen abandona as neuroses e obsessões que marcam suas personagens e boa parte de seus filmes para criar uma das mais belas fantasias do cinema contemporâneo. Trata-se do poder da imaginação e da beleza da arte como resistência à vida e suas amarguras. EUA. 1985, 72 minutos.
26/03, 20h
Após a exibição, bate-papo com Marcelo Janot, jornalista, crítico de cinema.
Tudo o Que Você Sempre Quis Saber Sobre Sexo, Mas Tinha Medo de Perguntar Um dos mais desconcertantes trabalhos de Allen, Tudo o que você sempre quis saber sobre sexo, mas tinha medo de perguntar é um filme que coloca em evidência, por meio da ironia, do deboche e do humor nonsense, a obsessão do diretor (e nossa, de modo geral) com a sexualidade. A partir de sete fragmentos diferentes, independentes entre si, Allen parodia o interesse da sociedade contemporânea pelo sexo, colocando em evidência o fato de que nunca se falou tanto no assunto, a ponto de se transformar em artigo de consumo fácil, no qual até as perversões viram atração televisiva (num dos melhores quadros do filme), ao mesmo tempo em que nunca fomos tão moralistas ao vivenciar nossos próprios desejos. EUA. 1972, 87 minutos.
27/03, 20h
A Era do Rádio Tributo nostálgico à era do rádio e seu poder de agregar as pessoas, reunir as famílias, entreter e informar, mudar comportamentos e atitudes. Allen foi um dos poucos cineastas a compreender, de forma tão marcante, o quanto o rádio significou não só como veículo de comunicação, mas como uma experiência cultural, social e afetiva típicas de uma realidade que se inaugurava com o que Theodor Adorno chamou de indústria cultural. Ao mesmo tempo, como é típico de Allen, o cineasta nos revela os bastidores da produção, as intrigas e vaidades que animam as pessoas, criando uma alegoria poderosa acerca do lugar da arte na sociedade do espetáculo. EUA. 1987, 87 minutos.
28/03, 20h
Dorminhoco
Um dos melhores e mais divertidos filmes da primeira fase de Woody Allen, Dorminhoco põe em cena a personagem de Miles Monroe (Woody Allen), um músico de jazz que foi congelado e, 200 anos depois, é ressuscitado. De forma inusitada, Allen faz com que a comédia enverede pelos caminhos da ficção científica de forma paródica, marcada pela ironia e pelo sarcasmo, ao mesmo tempo em que explora, também acidamente, a temática política, pois, ao acordar, o músico acaba se envolvendo com um grupo de revolucionários que tentam derrubar um governo ditatorial. EUA. 1973, 90 minutos.
29/03, 17h
O Teatro no Cinema de Woody Allen Com Myriam Pessoa Nogueira, doutoranda em artes/cinema pela Universidade Federal de Minas Gerais, especialista em cinema, fez doutorado-sanduíche na Wayne State University, EUA, onde estudou a obra de Woody Allen. Neste curso, Myriam Pessoa Nogueira mostra como os autores de literatura dramática influenciam o cinema de Woody Allen e também como as peças de teatro que o próprio cineasta escreve servem de matriz para seus filmes, que também têm como base seus contos e scripts de humorismo.
11 e 12/03, 19h às 22h. Grátis. Vagas Limitadas. Inscrições na Central de Atendimento.
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