Vida jagunça (A Saga de Margarosa)

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Título : Vida jagunça (A Saga de Margarosa)

Autor: Liliana Elisabeth Alegre

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Vida Jagunça (A saga de Margarosa) Autor Liliana Elisabeth Alegre.

Personagens primários: As vendedoras de Cordel: Mariana Filhas : Maria das Dores Maria dos Anjos Maria das graças Juvêncio Personagens secundários: Margarosa Meninas do sertão Rendeiras Jagunço Mirosmar Maria jagunça Velho Comadres.

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Vida Jagunça (A saga de Margarosa) A chegada dos contadores de história e vendedores de cordel.

As vendedoras de cordéis chegam à cidade. A trupe é composta por Mariana, suas filhas e o menino Juvêncio seu afilhado. Eles chegam puxando a pequena carroça onde cabaças e pandeiros se misturam com colorido de fitas e flores. As três filhas são conhecida como as três Marias. Maria das graças, Maria dos Anjos e Maria das Dores. Mariana, Juvêncio e Das Dores passam a montar o local de trabalho com um painel de tecido onde na frente são colocados algumas almofadas de rendeiras cabaças e pandeiros e estendem seu varal de livros de cordel enquanto as outras filhas se encarregam de chamar o povo. Das Graças - Chegue mais meu povo! Que tem história de montão contando toda a sina de quem vive no sertão. Só um conto - por um conto levam um conto. Dos Anjos -

Mulher de Deus tome tento. Deixe o povo se abancar. Deixe ficar no conforto para depois negociar Pois se assusta vão embora. Daí que vamos nos lascar.

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Das Graças- Ora essa! Vê quem fala! Quer me ensinar a negociar? Vive deitada na rede e nem gosta de trabalhar Quer me ensinar a vender quem nunca pode comprar E se compra é no fiado e nunca volta pagar

Dos Anjos- Escute aqui abusada Eu não lhe devo satisfação Nunca aprendeu a ler e quer me ensinar a lição? Quem não serve de empregado quer dar uma de patrão. To perdendo a paciência e não custa meter lhe a mão.

Das Dores( intervindo)- Desse jeito não dá jeito e se as duas se atracar Isso aqui vai virar rinha E se o povo começar a apostar? Não vai sobrar um tostão para o cordel comprar. Das Graças- Pensando bem é verdade e penso que ela tem razão Das Dores- Se a gente quer vender é melhor ter educação. Dos Anjos- Se a gente sair de tapa. No tabefe ou bofetão. Pior que perder a venda é a gente perder a razão

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Das Dores- Vamos deixar de conversa Não vamos perder mais tempo. Pois é vendendo esta arte que a gente tira o sustento. Se abracem e façam as pazes que todos ficam a contento. Das Graças- Eu vou começar de novo agora nesse momento. Chegue mais meu povo, que tem história de montão. Que conta a triste sina de quem vive no sertão. Dos Anjos- Como eles vão comprar se não conhece a história? Das Dores -A gente conta uma pra eles e daí eles compram as outras. Das Graças- Chame o menino Juvêncio e vamos amarrar o nosso cordel. (Gritam)- Juvêncio Juvêncio- Corujas de mau agouro. Não me deixam descansar. È só eu pensar em rede que já começam a piar Dos Anjos-Eu pio e tu cale o bico Se quer continuar comendo È melhor vir trabalhar Trate de amarrar o cordel para a história começar

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Juvêncio- Se o feito é desta feita. Bichinha tu podes deixa. Deixa que eu amarre daqui Mas tu que amarres de lá. Todos -“ Vem chegando Margarosa pra sua história contar.”

2-Apresentação Entra Mariana e se junta com Juvêncio tocando o pandeiro e as meninas os acompanham com cabaças. ( Versos cantado pelo grupo) Eu Venho lá de outras bandas Eu venho de lá pra cá Arrastando meu cordel Pra muita história contar Eu conto e não invento ponto Mas num ponto hei de parar Pois esta vida é jagunça Que vem doida pra matar Meu cordel tem a poeira De estrada de sertão Fazendo sua parada Onde me der à benção De oferecer pousada Eu deixo por gratidão A cada um uma história Que conto com exatidão 6


Nesta vida que é jagunça De sol semente e solidão.

3-Transformam em personagens da história (Neste ponto todos passam a viver os personagens da historia contada)

A saga de Margarosa 1-O nascimento Margarosa - Eu não sei se é direito o que dizem que Deus escreve certo por linhas tortas, pois quando ele escreveu minha vida ele fez mesmo foi garrancho. Pois penso que a vida de uns e escreveu com letras redondinhas e a minha ele rabiscou foi de qualquer jeito. Se pensarem que resmungo feito uma mamangava eu lhes mostro que tenho razão.

Das graças- Como tudo começa um começo, começo é do nascimento. Neste sertão onde tantas crianças não vingam é fácil lembrar uma que vingou. A mãe embuchou e já tinha 45 anos idos. Como se isso fosse pouco, o nascimento é que foi pior... Juvencio - Sai da frente... Sinhá Maróca parteira vem chegando Sebo na canela Sinhá maróca. Corre ou não dá tempo. Sinhá Maróca vem sem pressa com seu avental florido, trazendo uma bacia cheia com os equipamentos para ajudar no parto.

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Sinhá Maróca ( Dos Anjos) - Menino desarvorado que corre feito pé de vento pois se o bichinho quer nascer ele que me espere. Sinhá maróca vai para trás do painel (Off)-Mulher grita-Valha me Deus, eu vou morrer!... Sinhá maróca( Dos Anjos) - Vai não, Fia de Deus o bichinho tá entalado, mas deixa que desentalo este cabra e é já. Começa o desespero e falatório Das Dores- Alguém dá uma vela pra rezar pra nossa senhora do bom parto Dos Anjos - Chama a Dona Benditinha benzedeira pra ajudar. Das Graças- Não carece não, demora muito, mas vamos rezar que é melhor. Sinhá Maróca (Dos Anjos)- Vamos lá gente, quem tiver alguma coisa aí amarrada no corpo pode soltar que senão dá azar e amarra o parto e o bichinho não nasce. E as mulheres desamarram seus lenços e laços. (Off)- Padim Ciço me ajuda...

Sinhá Maróca (Dos Anjos)- Valha-me santinho, pois o bichinho tinhoso não quer nascer de jeito nenhum... (Off) Choro de criança... Sinhá Maróca (Dos Anjos) - Nasceu!... Nasceu...Menina muié! Cabrita da moléstia já nasceu tentando homicídio, quase mata a mãe.- Eita! Pobre criança coloca nome de flor que é pra ver se desenfeia. 8


Margarosa- Minha mãe queria Margarida e meu pai que eu fosse Rosa (falatório) Margarida-Rosa- rosa -margarida- rosa... Margarosa- Depois de mais de uma semana de pendenga me Chamaram de “Margarosa”. Das Dores- Ô mãe santa! Tratava ainda como se fosse obra do divino. Das graças- A mãe que era galega ficou ainda mais branquinha. Juvencio- O sangue demorou mais de mês pra voltar a correr direito nos caniços das vêias

2-A infância Margarosa - Como se isso fosse pouco, com o passar dos dias fui ganhando uma cor escurinha por demais. Meu pai que também era galego começou a olhar desconfiado e começou a exigir satisfação e não havia maneira dele acreditar que a cor era castigo de uma promessa não cumprida .Desse jeito fui crescendo e fui amargando a vida enquanto eles foram vivendo um de cara amarrado com o outro e cada um me olhando como se de tudo eu fosse culpada.

Das Dores - Aos sete anos, mal aprendeu as escritas e teve que deixar o estudo e ir para o roçado, pois o pai caiu no mundo, deitou cabelo na saroba, deu pé, sumiu. 9


Das graças- Assim com sete anos ganhou seu primeiro presente Margarosa - uma enxada, Dos Anjos- com oito... margarosa- um facão de corte. Das Dores - Com nove... margarosa -Um machado. Juvêncio - E com dez anos já ganhava o pão suado. Margarosa - A ultima lembrança que tenho meu pai é ele montado, trotando em seu cavalo com seu velho gibão e chapéu de couro indo e sumindo aos poucos lá ao longe na poeira no fim da estrada.

5- Sonhos de meninas do Sertão. Cantiga de roda tocada com pandeiro e colheres de pau (maculelê) Quem não sabe fazer renda. Quem não sabe namorar Tem que virar rezadeira Ficar velha sem casar Meu padrinho, meu padrinho. Tenha pena de quem chora Pois a mágoa vira água Que o olho joga fora.

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Das Dores - Quando eu me casar vai ser é com coronel. Não vou buscar água na cacimba, não vou lavar roupa na tina. Vou ser é dona de engenho, e ter muitos vestidos do melhor tecido vindo da capital e vai ser um mais lindo que o outro e vou é andar nos trinques. Vou ser cheia dos brincos, colares e anéis. Vou andar de chapéu emplumado, sapato de fivela e as meias serão tão finas quanto será minhas mãos. Das Graças e Dos Anjos - Ah, mais vai! Das Dores- Margarosa vem brincar? Das Graças e Dos Anjos - Margarosa brinca não! (música) Quem não sabe fazer renda. Quem não sabe namorar Tem que virar rezadeira Ficar velha sem casar... Dos Anjos Eu vou me casar é com moço de cidade que há de me levar pra longe desse lugar. Na cidade hei de ter uma linda casa com uma varanda enorme, onde vou amarrar minha rede e descansar nas tardes de sol. Todo dia vou tomar banho de cheiro e meu cabelo vai ficar lindo e claro como cabelo de espiga nova e minha pele há de ficar branca e macia como algodão. Vou viver de sombra e água fresca. Todo o mundo que passar vai me cumprimentar com respeito, os homens tirando o chapéu e as mulheres me acenando as mãos. Das Graças e Das Dores- Ah, mas vai!.. Dos Anjos - Margarosa vem brincar? Das Graças e Das Dores - Margarosa brinca não!

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Quem não sabe fazer renda. Quem não sabe namorar Tem que virar rezadeira Ficar velha sem casar

Das GraçasMinha mãe quer que eu me case, mas eu não quero me casar. Quero mesmo é estudar e já estou até aprendendo as primeiras letras. Vou morar na capital hei de ter um bom trabalho e ser chamada de senhorinha. Homem pra falar comigo vai se ajoelhar, vai ter que fazer minhas vontades e só me agradar. Vou sair pra passear de guarda sol enfeitado e não vou sacolejando em cima de burro, cavalo ou de carroção, pois eu vou mesmo é de carro de motor. Dos Anjos e Das Dores-Ah, mas vai! Das Graças - Margarosa vem brincar? Dos Anjos e Das Dores - Margarosa brinca não! (Saem cantando até as almofadas e bilros de rendeiras.) Quem não sabe fazer renda... ...Vou levando minha sina E no céu em riba deu Hei de ter felicidade Que padim me prometeu.

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3- A Mãe Margarosa- Era eu minha Mãe e a vida. A Vida foi roubando a infância. Era eu na lavoura. Era minha mãe nas rendas. Eu ouvindo ao longe brincadeiras que não eram minhas. Era Minha mãe vendo entre os dedos sua vida passar. A renda enredava os sonhos e a lavoura barganhava com nosso Sustento.O tempo ia tirando o doce da vida e colocando na cana e botando o amargo na vida da gente.

Representação de mulheres rendeiras

As atrizes atrás das almofadas de rendas batem cabaças ou colheres de pau produzindo o som dos bilros. (Musica ritmada pelo som dos bilros) A rede vai a rede vai/ a renda vem, a renda vem. A rede que enreda a renda /que é renda que não enreda ninguém. 2x Margarosa - Mainha vivia sempre de olhos baixos o tronco e a cabeça curvados sobre a enorme almofada com seus casulos de fios enquanto tecia suas rendas. Das Graças - A lida difícil debaixo do sol dessa vida jagunça castiga e envelhece a gente dia a dia antes mesmo de ter idade de ser velho. O corpo curvo a pele marcada não combinam com a agilidade das mãos. 13


A rede vai a rede vai/ a renda vem, a renda vem. A rede que enreda a renda /que é renda que não enreda ninguém. Margarosa- Enquanto tecia, ela que já não ria e falava pouco, ficava fechada em seus pensamentos. Tecia como se o mundo dependesse da agilidade dos seus dedos para continuar girando. Dos Anjos- Os dedos dançam no emaranhado de fios seguindo o som dos bilros, como agulhas de pau, batendo uns nos outros, o barulho não combina com o sol que queima lá fora, pois lembra a chuva caindo no beiral da casa. A renda vai a rede vem/ a rede que enreda a renda /que é renda /que não enreda ninguém Margarosa- A única coisa a que dava atenção, além da renda que tecia, era uma pequena caixa de madeira entalhada onde guardava uns trocados de dinheiro resultado da venda de seu trabalho que eu levava ao mercado da cidade. Um dia encontrei a caixinha e minha mãe, caídas uma ao lado da outra. Corri para a janela e vi ao longe um homem trotando em seu cavalo com seu velho gibão e chapéu de couro indo e sumindo aos poucos lá ao longe no fim da estrada. (Silencio)

Todos - Acho que o mundo parou de girar

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4-Trabalhadoras de usina de cana de açúcar. (versos cantados) Vai gemendo a moenda Vou gemendo minha sina Que o sol dessa vida Castiga e ensina Que a vida da gente é engenho de usina. 2X Versos narrados (Das Dores) Quando ha chuva no sertão, a vida faz melhorar. A gente vê pau florando e tudo parece cantar Quando chove, no sertão tudo muda de lugar. Vou pedindo a Padim Ciço Pra tudo abençoar

Que a vida da gente é engenho de usina 2x

(Dos Anjos) Quando chove no sertão tudo parece mudar Tem cacimba se enchendo e gado no campo a pastar Muita cana pra usina e rapadura no embornal Vou pedindo a Padim Ciço Pra sorte continuar. 15


Que a vida da gente é engenho de usina.2X

(Das Graças) Quando chove tudo é festa para o povo do lugar Os homens vão ao roçado e as mulheres cozinhar. Bota a lenha no fogo e só o fogo aumentar Viúva vai se assanhando e moça nova quer casar E pede pra Padim Ciço, pra sua sorte mudar. (verso cantado ) Vai gemendo a moenda Vou gemendo minha sina Que o sol dessa vida Castiga e ensina Que vida da gente é engenho de usina(2x)

5- Vida de Margarosa Das Dores Pelas virgens do descaso. Da até pra desconfiar deste fogão apagado Talvez ninguém compreenda porque ele tá sem fogo? Espera aí que vão contar. 16


Como dois e um são três. Tudo que conta é verdade. Nisso pode acreditar.

Margarosa - Tinha eu 14 anos, sozinha no mundo de meu Deus tendo eu que me arranjar. Num dia desses de sol de rachar macuco eu fui até a ribeirinha buscar água pra lavar a roupa que tava uma inhaca de suja. Foi quando ali apareceu montado em seu cavalo o negro Jagunço que carregava no lombo o peso de muitas mortes e a graça do nome de Mirosmar. Apeou do cavalo de trabuco nas costas que quando eu lhe olhei nos olhos meu coração ficou troncho e frouxo. Das Dores- Igual semente dentro de jatobá maduro, Margarosa- as minhas pernas bambearam... Dos Anjos- ...Feito caniço no vento, Margarosa- Eu tremi feito doida...igual...igual... Das Graças- ...vara verde nas mãos de Dona Calmosa tangendo a educação dos meninos. Juntas- Porque não fugiu? Margarosa- Tentei correr, mas que jeito? Eu tava era ruim de pernas e ele era bom de corda, me pegou no laço igual égua fugida. Atarracou-me nos braços e disse:

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Juvêncio(Jagunço)- Gostei de ti o menina, bichinha tu vai ser minha pelo resto de sua vida. Margarosa- Pobre de mim, sem ninguém pra socorrer. Sem ninguém pra me ajudar. Todos- Pois ninguém em juízo perfeito enfrentaria Mirosmar. Das Dores- Assim assinou sua sina, naquele dia na ribeirinha, quando Encontrou Mirosmar Margarosa- pois o desgraçado jagunço resolveu me desposar. Dos Anjos- Se ao menos fosse cangaceiro feito lampião, Corisco ou canário. Margarosa- Eu viveria no inferno, mas seria igual Maria Bonita, Jovina, Catarina ou Dadá. Mas o Desgraçado era jagunço do ruim, de buraco no coração que recebe pra matar. Das Dores- Se tu não sabes pra jagunço só três coisas interessam fazer. Sair montado a cavalo pela estrada tramando tocaia pra selar a má sina de alguém. Montar na mulher fazendo filho ou comer feito um cão danado. Margarosa- E de fato era assim. Saia e voltava doido de fome. No caminho sempre caçava um bicho pra jantar. Porque jagunço é assim, vê o bicho de légua e puxa o trabuco e acerta o tiro bem no meio da testa e daí era só pegar o bicho pelas orelhas e jogar no meu pé dando ordem de patrão. Juvêncio (jagunço) -Vê limpa direito e não erre no cozido não quero mole feito lama e nem duro de quebrar dente. 18


Margarosa- Cortei tanta barriga de tanto bicho que já não sei nem contar. E se acaso a comida não agradasse lá vinha chicote em meu lombo. Eu chorava a dor junto a dor da minha sina sem ninguém pra me ajudar. Todos- Pois até o doido mais doido, não enfrentava Mirosmar.

6- Margarosa se transforma em Maria Jagunça Dois pandeiros ( desafio de repentistas) 1-Vi o homem feito bicho 2- Que a mulher destratou 1-Viu a flor virando espinho 2 Quando ela se rebelou 1 e 2 Não viu mais comida no fogo /Nem a roupa mais lavou 1-Onde não vi o carinho 2-O Amor, fé e gratidão. 1-Vi homem perdendo o respeito 2-Mulher perdendo a razão 1-Vi gente mudando a sina 2-Debaixo do sol da vida 1e2-Tornando se opressora /Quem era um dia oprimida Margarosa-Tudo que é bom e justo vem de encontro, um dia eu fiquei sabendo do boato que corria lá pras bandas da vila do araçá. Que tinha tal lobisomem que todo mundo tava doido pra pegar. Daí me veio o 19


pensamento, e se o tal lobisomem fosse o jagunço Mirosmar?

(Inicia a transformação de Margarosa em jagunça). Chocalhos com cabeças (Suspense) Margarosa-Numa noite ele voltava sem ninguém lhe ver chegar De tanto ouvir de tocaia aprendi a tocaiar. Atraí-lhe pro Galinheiro e foi só ele entrar Fui puxando da peixeira e destripei Mirosmar. Pratiquei usar a peixeira cortando bucho de bicho que mandava preparar Herdei trabuco, chapéu, um cavalo e um embornal. Deixo sem fogo o fogão e a roupa sem lavar Vou seguindo outra sina E tu podes acreditar. Virei Maria jagunça viúva de Mirosmar.

Chocalhos e Sons Margarosa- Tentei outra Sorte e mudar minha sina, mas alguma coisa tava sempre aqui, entalada no gorgomilo... E eu sabia o que era! As pendengas que tinha que acertar com meu pai

7-O acerto de contas com o pai

Tropel de cavalos ( Sonoplastia produzida com cabaças)

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Das Graças -Não digo que deixou pra trás uma vida, porque quem deixa vida pra trás é defunto. Mas deixou tudo o que tinha, e era pouco, e só deus sabe se um dia voltaria. Arrumou a bagagem e montou a cavalo e saiu trotando disposta a fazer o diabo neste mundo de Deus.

Margarosa- Peguei caminho, cortei atalho de sol no lombo dia após dia. A noite ia trocando de lua e eu seguindo caminho pra onde a sorte me levava.

Seguindo em frente.( Tropel de cavalos)

Das Dores - Banhava em riacho e muitos dias comendo poeira e bebendo vento. Quanto mais a solidão lhe batia e o sol queimava mais ela endurecia o coração. Caçava bicho na caatinga pra comer e assim treinava a pontaria. Foi ficando tão boa no trabuco como era na peixeira.

Seguindo em frente. (Tropel de cavalos)

Margarosa - Tinha que resolver minhas pendengas e por isso em cada vila que passava, parava e procurava por meu pai. Dava nome e descrição. Um dia, numa dessas paradas descobri que o velho estava a um quarto de milha de onde eu me encontrava.

Seguindo em frente. (Tropel de cavalos)

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Dos Anjos- Chegando ao lugar deparou, no meio de um pasto, uma casa de pau a pique aproximou e pela janela viu sua miséria interior e lá reconheceu pendurada na parede um gibão e um chapéu de couro empoeirado e carcomido do tempo.

Margarosa - Vi um velho sentado na varandinha me aproximei e vi que estava, além de velho, um tanto cego e muito doente. Perguntei seu nome e ele não respondeu. Inchou-me as ventas, ajeitei o trabuco e perguntei: -Velho tu sabe quem sou eu? Ele levantou sua mão, tremendo para o céu e me disse:

Juvêncio (velho) - Sei! Tu és aquela que veio me tirar o fardo, tu é aquela que vem me tirar esta dor que tanto me pune. Tu és a morte que eu tanto espero.

Margarosa -Eu não disse uma palavra, mas baixei o trabuco e saí sem dizer adeus. Não tirei lhe a vida porque neste mundo jurei que jamais cumpriria um só desejo seu. Não lhe devia obediência e nem cumpriria suas vontades.

Montei meu cavalo e segui em frente. (Tropel de cavalos se afastando)

A vida que escreve a sorte Vai riscando tudo Desenhando a morte Não sou a queda sou o tiro 22


Não sou ferida sou a bala. Eu sou todos os desatinos Quem escreve o destino. Onde as palavras que calam

8-O Povo do Sertão

Das Graças - Contamos a história, mas ainda não contei como conhecemos a jagunça. Foi quando ficou 197 dias sem cair uma gota d’água no chão. Tu te lembras Dos Anjos?

Dos Anjos - Foi!...Resolvemos se ajuntar pra pedir aos santos pra levar um recado pra Nosso Senhor, pra ajudar a gente naquela seca Jagunça que vem doida levando a vida onde passa com seus passos rijos.

Das Graças- Juntou tudo que é gente das redondezas, no terreiro do compadre Genival pra cumprir a rezaria. Cada um trouxe um santo de sua devoção e pra ninguém ficar descontente resolvemos rezar pra todos os santos dos presentes participantes. Santo de leste a oeste, norte a sul e de A ao Z do dicionário dos devotos. Das Dores- E dona Candoca, queria que colocasse no rol dos santos seu falecido marido, dizendo que ele era um homem santo de bom. Arre égua! Bastou pra aparecer tudo o que é nome de pai, filho é espírito santo. E pra não haver discórdia ficou decidido! Como 23


todo mundo que morre vira santo, rezaria também pras almas.

Dos Anjos- Na confiança de depois da reza tudo melhorar, cada um foi pra casa pegar o pouco de comida que restava pra alimentar os rezadores. E de pouco em pouco formou foi um banquete.

Juntos- (batida de pandeiro) Reza vai, reza vem, reza vai, reza vem.... Das Graças- A barriga roncando feito maraca... Paramos para comer. Canjiquinha e Macaxeira, carne de Sol e farinha de pau.

Juntos-(batida de pandeiro) Prosa vai, prosa vem,Prosa vai, prosa vem.

Das Dores- Acenderam a fogueira no meio do terreiro pra iluminar a Santaria. Voltamos às reza!

Juntos (batida de pandeiro) - Reza que Reza Canta Que Canta... Dos Anjos- Paramos de Novo pra comer a raspinha do banquete e dar descanso aos santos. Serviram umas cachacinhas e...

Juntos (batida de pandeiro) ...Bebe que bebe, bebe que bebe.

Das graças- Compadre Genival puxou do fole da sanfona pra distrair os rezadores e o Juca que levou a viola acompanhou e comadre Emerenciana foi logo entregando o pandeiro ao menino Zuia. E a rezaria virou foi um santo forró.

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Dos Anjos- Foi então que eu mais Jerê e mais dona Carmosa vimos ali encostada num canto aquela mulher jagunça armada até os dentes, aquela visão arrepiou dos pés a cabeça. Fiquei matutando-será que era alma penada do bando de lampião? Quem mandou rezar pras almas!...

Das Dores- Acabou o forró! O povo tremia na pontaria da Jagunça e já pensando que ia falar pessoalmente com o altíssimo. Foi quando aconteceu o fato.

A jagunça aproxima e coloca no fogo seu embornal,cantil, facão e trabuco. Ajoelha e pede com devoção

Margarosa (Jagunça) -Padim padre Cícero, aqui tem tudo que eu tenho e sei que é pouco mas é tudo que posso oferecer. Eu lhe peço que ampare esse povo nesta vida que é mais jagunça que eu.(sai) Das Graças- E o céu escureceu. Era relâmpago e trovão como machado de fogo cortando a seca no chão. Dos Anjos- E a chuva então desceu e regou o chão. E choveu a noite inteira, quase que inunda o sertão. Das Dores- Bem cedinho juntou todo mundo e foi até a beira do rio que tinha enchido e lá estava pendurado em sua margem - o cantil, o chapéu e o embornal.

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Das Graças- Dizem que foi Padim Ciço que devolveu e só levou lá pro céu o facão e o trabuco porque só quem pode levar a gente desta vida jagunça é Deus.

9 - final (Entra Margarosa com vestido de laços e fitas)

Juvêncio-

A jagunça vendo a alegria deste povo em devoção Aprendeu que nesta vida A melhor arma é o perdão Voltou a ser Margarosa Esqueceu a solidão Virou uma moça dengosa Que ajuda na plantação.

10-Canto final Desamarro meu cordel E vou pra outro lugar Amarrar outro cordel E outra história contar Vou pedindo a Padre Ciço. Pra ele abençoar 26


Quem fez aqui a parada Pra minha história escutar Juvêncio- Eu digo adeus a este povo Todos- Até nos ver outra vez Juvêncio- Mas deixo um papel em branco Todos - Conte outra história vocês

Fim

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