Abril/2013 - edição 73 sesctv.org.br
ARQUITETURAS A obra, o espaço, a relação com as pessoas e a cidade
Coleções Imigrantes que escolheram o Brasil
Entrevista Os dez anos do Movimento Violão, com Paulo Martelli
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em novo horário na tv domingos, 21h
shows ao vivo Sesc Consolação e na web: instrumentalsescbrasil.org.br segundas, 19h youtube.com/sesctv
@sesctv
Traços da cultura
A cultura, como expressão do simbólico, é reveladora das identidades de um povo. Manifestações artísticas como a música, a literatura, a pintura e a dança evidenciam escolhas e reúnem informações que aproximam os grupos, em sentido e unidade. Assim como as outras artes, a arquitetura também fornece – com seus traços, propostas, cálculos e desenhos – elementos para compreender a história e os componentes culturais de uma sociedade. Em Arquiteturas, série dirigida por Paulo Markun e Sérgio Roizenblit, com estreia neste mês, a relação entre as pessoas e a apropriação dos espaços é apresentada em sua conexão com a cultura. Realizada em treze episódios, em linguagem documental, a série visita alguns dos projetos-ícone da arquitetura brasileira e entrevista profissionais da área, oferecendo ao telespectador um panorama da diversidade presente no País. A multiplicidade de identidades no Brasil é resultante, em parte, da vinda de imigrantes das mais diversas nacionalidades, como mostram, neste mês, quatro episódios inéditos da série Coleções. Os programas apresentam como vivem os imigrantes espanhóis, angolanos, indianos e ucranianos. A programação musical destaca o show da Sun Ra Arkestra, que mistura jazz, bebop, swing e tambores africanos. A Revista do SescTV deste mês entrevista o músico Paulo Martelli, idealizador do projeto Movimento Violão, que comemora em 2013 uma década de existência. O artigo do historiador Paulo César Garcez Marins aborda o tema da arquitetura como expressão da cultura. Boa leitura! Danilo Santos de Miranda Diretor Regional do Sesc São Paulo
CAPA: Mercado do Ver-o-Peso, em Belém (PA). Foto: Revanche Produções
destaques da programação 4 entrevista - Paulo Martelli 8 artigo - Paulo César Garcez Marins 10 3
Arquiteturas
Tijolo sobre tijolo Foto: revanche produções
equilibrar. O resto é conforto. Um pouco de conforto aqui, um pouco de conforto ali”, definiu o arquiteto João Batista Villanova Artigas. O SescTV estreia, neste mês, Arquiteturas, uma série de 13 episódios, com uma hora de duração, que apresenta as relações entre a apropriação dos espaços arquitetônicos, a cultura e a sociedade. Dirigida por Paulo Markun e Sérgio Roizenblit, e concebida em linguagem documental, a série traz entrevistas e depoimentos de arquitetos, artistas e outros profissionais que trabalharam nesses projetos, fazendo um panorama sobre as obras e sua conexão com a cultura e a arte. O primeiro episódio mostra o Instituto Inhotim, em Brumadinho (MG), que reúne galerias de arte em torno de uma área verde, com características distintas de qualquer outro museu no País. “Inhotim era primeiro um jardim em volta de uma casa. Depois, tornou-se um conjunto de várias galerias com um grande parque no meio e uma coleção botânica. É um museu também, com obras de arte, galerias para entrar. E provavelmente se transformará no futuro”, afirma o diretor artístico do Instituto, Jochen Volz. A série será exibida semanalmente, com um novo episódio a cada sábado, às 21h (confira no quadro).
A busca pelo equilíbrio, o exercício da criatividade, o desafio à lei da gravidade, a construção do harmônico. Há quem aproxime a Arquitetura das ciências exatas, por reunir informações e conhecimentos matemáticos necessários para levantar edifícios e organizar espaços nas cidades. Há quem destaque o status de arte intrínseco a ela, pois suas criações, de caráter autoral, deixam muitas vezes um legado cultural, alterando o ambiente, provocando sensações e reações. “Arquitetura é uma coisa muito ampla. É a relação do homem com o meio ambiente. De um lado você vê certas expectativas, certos desejos, e os espaços vão ter atributos e características que vão atender melhor ou pior as vontades e necessidades”, afirma o arquiteto Francisco Leitão. Antes mesmo de levantar um edifício, a Arquitetura já está presente na decisão dos profissionais envolvidos no projeto, que irão definir como o espaço será ocupado. “Acho que nem precisa ter construção para ser Arquitetura. Selecionar um espaço para mim já é uma decisão arquitetônica. Se decido fazer minha casa ali e não aqui já estou fazendo Arquitetura”, diz Leitão. Valores, referências e o contexto histórico também estão presentes na prática da profissão, indo além da questão utilitária que mobiliza a construção de um edifício. Dessa forma, a Arquitetura é uma ferramenta para conhecer a História e a cultura de uma sociedade. “Arquitetura é, basicamente, desafiar a lei da gravidade. Eliminar apoios, arrojar vãos,
Série com 13 episódios apresenta as relações entre a apropriação dos espaços arquitetônicos, a cultura e a sociedade
Arquiteturas Sábado, 21h
Instituto Inhotim (MG) Dia 27/4 Mercado do Ver-o-Peso (PA) Dia 4/5 Biblioteca Mário de Andrade (SP) Dia 11/5 Igreja de São Francisco de Assis (MG) Dia 18/5
Novo Espaço Natura (SP) Dia 25/5 Superquadras de Brasília Dia 1/6 Copromo – Cooperativa Pró-Moradia de Osasco (SP) Dia 8/6 Teatro Municipal – Rio de Janeiro e São Paulo Dia 15/6 FAU-USP (SP) Dia 22/6 Palácio Gustavo Capanema (RJ) Dia 29/6 Estádio Serra Dourada (GO) Dia 6/7 Museu de Arte Moderna (RJ) Dia 13/7 Sesc Pompeia (SP) Dia 20/7 4
Artes Visuais
Pose para uma flor foto: divulgação
e centros culturais, sem ser convidado”, conta. Depois de uma discussão com sua mãe, Feliciano teve o impulso de cortar todas as plantas do jardim que ela cultivava. “Claro que me arrependi e, para tentar amenizar, criei uma escultura de gesso no formato de uma câmera fotográfica, colori e a arranjei sobre um dos troncos, como se fosse uma flor. Assim, renascia a vida naquela natureza morta.” Feliciano aprimorou essa ideia, estudou as proporções áureas – presentes na natureza e nas obras renascentistas – e criou um molde, a partir do qual ele cria câmerasflores para produzir seus jardins. Na formatura de sua graduação, ouviu de seus professores: “Agora, você já pode ser um Jardineiro”. O nome artístico foi adotado e assim ficou. “Quando alguém vai fotografar com uma câmera, a gente paralisa e posa. Quando alguém filma, a gente posa em movimento. Mas e se uma flor tira uma foto da gente, como a gente posa para ela? De alguma forma, a gente quer mostrar qual é a nossa natureza, para tentar se relacionar diretamente com ela”, acredita. O SescTV exibe, neste mês, episódio inédito da série Artes Visuais com o artista Jardineiro. Também serão apresentados neste mês programas com Ana Prata, dia 3/4; e sobre o 32º Panorama Itinerário, Itinerâncias, em duas partes, dias 17/4 e 24/4. Artes Visuais tem direção de Cacá Vicalvi.
“Minha preocupação maior é com a natureza da arte, tentar torná-la mais viva, cultivá-la de várias formas”, resume André Feliciano, cujo nome artístico revela essa intenção: Jardineiro. “Mas nem sempre fui Jardineiro”, ressalta. Suas primeiras incursões nas artes plásticas ocorreram aos 16 anos de idade, quando cursava o ensino médio. Encantado com as infinitas possibilidades que a fotografia oferecia, ele improvisou um estúdio em sua casa, onde realizava experiências das mais diversas: no registro de imagens abstratas e com intervenções diretamente no papel fotográfico, usando lanternas e até mesmo vagalumes para marcar o papel, que ele batizou de “fotografia da natureza”. Naquela época, ele se definia como “moderno” e, para exteriorizar sua arte, produzia as próprias roupas. “Eram bem coloridas e mal costuradas”, diverte-se. Feliciano cursou a Faculdade de Artes Plásticas e aprimorou seus conhecimentos sobre fotografia. “Passei a ser pós-moderno”, afirma. Suas pesquisas, porém, iam além dos registros fotográficos. “Abandonei a técnica e fiquei só com a relação com a fotografia. Não tinha mais filme nem papel fotográfico, mas o desenho, a pintura e a gravura”, lembra. Um dia, durante uma aula de desenho, a câmera surgiu dentre outros traços e, a partir daí, passou a ser cultivada por ele. Nas mais diferentes vertentes artísticas que aprendia e testava, lá estava ela. Os professores incentivavam essa marca registrada. “Já no último ano do curso, passei à fase contemporânea. Usava novas roupas, fazia performances nas galerias
Episódio inédito apresenta a arte de André Feliciano, o Jardineiro, conhecido por suas flores de câmeras fotográficas
Artes Visuais Quartas, 21h30
Ana Prata Dia 3/4
Jardineiro André Feliciano Dia 10/4
32º Panorama Itinerário, Itinerâncias – Panorama 1 Dia 17/4
32º Panorama Itinerário, Itinerâncias – Panorama 2 Dia 24/4
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Música
Sonoridade cósmica foto: Camila Miranda
que cada um trazia. “Ele conhecia bem sua música. Sabia como fazer tudo sob medida para cada pessoa, suas vibrações, suas características”, lembra Allen. O músico destaca as qualificações de Sun Ra como arranjador e líder. “Ele trabalhava a sonoridade da banda de modo bastante sincopado. É por isso que se ouve um som tão particular nessa orquestra”, afirma Allen, para quem Sun Ra foi um grande professor. “Sun Ra era um mestre. Se você já teve a oportunidade de conviver com um mestre, em qualquer que seja a profissão, sabe que ele parece emanar alguma coisa que faz dele um mestre, como uma dávida do Criador, sabe?” Durante um show em Nova Iorque, em 1988, Sun Ra conheceu um grupo de capoeiristas e músicos brasileiros, dentre eles Louremil Lourenço, Negro Gato e Elson Nascimento, e os convidou a integrar sua orquestra por um tempo. Sun Ra morreu em 1993 e deixou um legado, defendido pela Sun Ra Arkestra, que hoje conta com 15 músicos, liderados por Marshall Allen. “Quando Sun Ra partiu para outro planeta, ele deixou a música e todas as combinações possíveis entre os estilos. E é o que nós fazemos: pegamos essas combinações, tentamos nos lembrar delas e encaixamos uma na outra.” O SescTV exibe, neste mês, show gravado no Sesc Pompeia, em fevereiro de 2012, durante o Nublu Jazz Festival, com direção para TV de Camila Miranda.
Nascido Herman Poole, em Alabama (EUA), em 1914, o instrumentista, compositor e filósofo Sun Ra tinha a música como ferramenta de conexão com o Cosmos. Músico eclético, conjugava as mais diversas sonoridades, num processo constante de criação, que mesclava o jazz ao som dos tambores africanos, ao bebop, ao expressionismo livre e ao swing. Pouco se sabe sobre seu passado: abriu mão de seu nome de nascença para ser chamado de Sun Ra, o deus egípcio do Sol. Acreditava na sonoridade e na poesia presentes no universo cósmico, que ele levava para os palcos traduzidas em composições inéditas – não raras vezes carregadas de improvisos – e em performances teatrais. “Sun Ra falava do espaço sideral e todas suas variadas sonoridades, de transcender as moléculas em direção a outros planetas ou ir para a lua. Ele chamou isso de space music, algo relacionado ao Cosmos”, explica o saxofonista Marshall Allen. Sun Ra influenciou inúmeros músicos e muitos deles passaram a acompanhá-lo; assim nascia a Sun Ra Arkestra, num rearranjo à palavra “Orquestra”. Marshall Allen foi um deles. “Conheci o Sun Ra em 1958, em Chicago. Na época, a banda já estava entrosada. Eu cheguei com meu sax no lugar em que eles estavam ensaiando e falei com ele, porque sabia que o grupo procurava por novos talentos, e eu queria entrar na banda”, conta. Sun Ra desafiava seus músicos para extrair uma sonoridade única, a partir das habilidades
Show da Sun Ra Arkestra traz as composições do músico que mesclava jazz, tambores africanos, bebop e swing
Música Sun Ra Arkestra Dia 24/4, 22h
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Coleções
Foto:divulgação
De casa nova
O que motiva uma pessoa a sair de seu país e eleger uma nova pátria como seu lar? A busca por melhores condições de trabalho; a fuga de uma guerra civil; os estudos; a vontade de vivenciar novas culturas. Inúmeras foram as razões que trouxeram imigrantes de diversos cantos do mundo para viver no Brasil. As referências trazidas por esses grupos se somaram e se fundiram, reforçando a diversidade que caracteriza a cultura brasileira. Em alguns períodos da História, os fluxos imigratórios foram mais intensos, como ocorreu no final do século 19, quando europeus foram incentivados pelo Império brasileiro a se mudar para cá, ocupando territórios pouco habitados, como a região Sul do País, e substituindo a mão de obra escrava nas fazendas de café do interior paulista. Foi nesse contexto que famílias deixaram a Ucrânia e se instalaram em Santa Catarina e no Paraná, onde introduziram a produção rural no sistema de faxinal. Trata-se do uso coletivo de terras particulares para criação de animais. Uma das formas de preservação da cultura de origem foi através da manutenção da língua. “A primeira coisa que esses imigrantes fizeram foi criar escolas. A música também foi ensinada às novas gerações”, explica Meroslawa Krevei, diretora do Museu do Milênio, que conta a história da imigração ucraniana, na cidade de Prudentópolis (PR). Foi naquele período também que se intensificou a imigração espanhola. “A presença é antiga, da época da Colônia, mas é mais marcante no final do século 19 e começo do 20, dentro do contexto da imigração em massa, que veio substituir a mão de obra escrava. Oitenta por cento desses imigrantes foram para o interior paulista, trabalhar na produção de café”, explica a historiadora Ismara Izepe de Souza. Houve um segundo fluxo imigratório em consequência da guerra civil espanhola. Nesse caso, os imigrantes se instalaram nas cidades. “Eles se dispersaram, não se fixando num
bairro específico, como os italianos”, afirma Ismara. As consequências de uma guerra civil também foram estímulo para a vinda de angolanos, na década de 1990. “A guerra vai até 1999 e coincide com grande movimento imigratório, especialmente de homens jovens, que queriam escapar do alistamento obrigatório”, diz o professor Jonuel Gonçalves. O fato de falarem a língua portuguesa facilitou a adaptação. “A saudade da família é o mais difícil”, revela a cabeleireira Patrícia de Almeida, no Brasil desde 2002. O SescTV exibe, neste mês, episódios inéditos da série Coleções com o tema Colônias de Imigrantes. Quatro programas mostram a vida de imigrantes da Colônia Ucraniana, dia 4/4; da Colônia Espanhola, dia 11/4; da Colônia Angolana, dia 18/4; e da Colônia Indiana, dia 25/4. Coleções tem direção de Belisario Franca.
Episódios inéditos mostram processo de adaptação de imigrantes da Ucrânia, Angola, Espanha e Índia
Coleções Quintas, 21h30
Tema: Colônias de Imigrantes Colônia Ucraniana Dia 4/4
Colônia Espanhola Dia 11/4
Colônia Angolana Dia 18/4
Colônia Indiana Dia 25/4
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entrevista
Violão, o som do Brasil Foto:Alexandre Nunis
Como o violão surgiu na sua vida? O primeiro contato foi em família. Meu irmão, Pedro Martelli, é violonista profissional, mas antes disso meu avô e meu pai já tocavam, como amadores. Na verdade, comecei aprendendo piano, com sete anos de idade. Mas esse não era um instrumento barato. E violão nós já tínhamos em casa. Como sou canhoto, de início meu irmão invertia as cordas, para que eu pudesse aprender. Depois, ele me convenceu a tocar como destro. Por volta dos meus 22 anos de idade, ganhei o prêmio Jovens Concertistas Brasileiros e recebi uma bolsa para estudar nos Estados Unidos, onde vivi por dez anos. Então, a saudade foi aumentando e resolvi retornar. Como nasceu o Movimento Violão? Depois que voltei para o Brasil, passei a dar aulas e idealizei um concerto com três alunos na biblioteca pública de Araraquara. O público lotou o lugar, o que foi um fato curioso, porque era no meio da semana. Em seguida, dois desses alunos foram estudar na Juilliard School, em Nova Iorque. Percebi o potencial do projeto, que foi crescendo ano a ano. Conseguimos o Teatro Municipal de Araraquara, depois passamos a apresentar espetáculos também em Ribeirão Preto e no Centro de Cultura Judaica, na capital paulista. Em 2009, os espetáculos começaram a ser gravados e exibidos pelo SescTV, o que ampliou a visibilidade. Gravamos CDs, DVDs. O projeto ganhou outras dimensões. Em 2013, o projeto completa dez anos. Que mudanças foram percebidas ao longo dessa década? Começamos como um concertinho de alunos! Se me perguntar se eu tinha noção da projeção que ele teria, digo que não. Nunca imaginei que fosse crescer tanto. E o bacana é perceber que o projeto se consolidou pelo mérito dos próprios violonistas que se apresentaram nesses dez anos. No ano passado, tivemos um fato muito marcante: pela primeira vez, apresentamos uma obra inédita, composta especialmente para o Movimento Violão. Trata-se da peça Lendas Amazônicas, de Marco Pereira, criada para dois violões e orquestra, sob regência de Rodrigo Vitta. Foi algo histórico, não apenas para o Movimento Violão, mas para a própria música brasileira. Gosto de pensar o violão como o mais brasileiro dos instrumentos musicais. Ele timbrou com a nossa música; é essencial na bossa nova, por exemplo. Está presente no chorinho, no samba. Heitor Villa-Lobos foi o precursor ao introduzir o violão na música erudita. Ele foi o primeiro a compor uma obra para violão. É um instrumento com a cara do Brasil.
Paulo Martelli é violonista e idealizador do projeto Movimento Violão, que oferece ao público uma série de concertos instrumentais com músicos brasileiros e do exterior. Nascido em Araraquara, no interior paulista, numa família de violonistas – seu avô, seu pai e seu irmão já tocavam o instrumento –, Martelli comemora em 2013 uma década de existência do projeto, que também é exibido pelo SescTV. Neste mês, o canal estreia nova temporada da série, às terças, 20h, com os seguintes espetáculos, gravados nas unidades do Sesc São Paulo: Duo Assad, dia 16/4; Carlos Barbosa Lima, dia 23/4; e Daniel Wolff, dia 30/4. Classificação indicativa: Livre.
“gosto de pensar o violão como o mais brasileiro dos instrumentos musicais. ele timbrou com a nossa música... é um instrumento com a cara do brasil”
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E quais foram as dificuldades enfrentadas no projeto? Tive de aprender a fazer produção. Logo no primeiro ano em que os concertos seriam gravados para televisão, eu descobri, às vésperas do início dos espetáculos, que precisava tirar o visto de trabalho dos músicos estrangeiros. Eu não sabia nem o que era esse documento! Aos poucos, fui aprendendo e hoje conto com uma assistente. Também enfrentamos dificuldades na contratação de músicos mais renomados, que vêm do exterior para tocar aqui. Para trazer o Duo Assad, levamos sete meses! Aliás, quando eles tocaram, em Ribeirão Preto, aconteceu algo curioso. Assim que cheguei ao teatro, encontrei os irmãos Sérgio e Odair meio quietos. Pensei: “Brigaram!”. Até que um deles me levou para fora do teatro. Ele apontou para uma casa do outro lado da rua e contou: “Está vendo aquela casa? Nós moramos ali na infância. E mais: frequentamos esse teatro, que na época era uma sala de cinema. Estamos muito emocionados”. Foi tocante ouvir aquele relato! Como é a receptividade do público? Hoje temos um público cativo. O brasileiro tem uma afetividade com o violão e chega aberto para as apresentações, mesmo sabendo que são concertos instrumentais. Apesar de grande parte do repertório ser erudito, sempre combinamos que os músicos incluam pelo menos 15 minutos de repertório popular. Mas mesmo essa classificação do que é erudito e popular é relativa, a divisão é tênue: Villa-Lobos, Chico Buarque, Ernesto Nazareth são compositores eruditos ou populares? E também abrimos espaço para músicos iniciantes. Nos concertos deste ano, teremos seis programas com jovens talentos brasileiros. É uma obrigação que nós temos com a arte, porque sabemos que é muito difícil viver da música. E o Brasil é revelador de talentos desse instrumento? O violão é para o Brasil o mesmo que o futebol. Nossa escola é tão forte quanto a espanhola. Temos grandes intérpretes e compositores, a começar pelo Villa-Lobos. O nome violão só existe no Brasil, remete a uma viola grande. Nos outros países, ele é chamado de guitarra. A facilidade de mobilidade desse instrumento fez com que o brasileiro se apaixonasse. E também temos grandes fabricantes aqui, já que ainda hoje sua construção é feita num processo totalmente artesanal. Em 2011, o projeto realizou a gravação de uma série de concertos, em DVD, e distribuiu gratuitamente nas escolas de música. Qual o objetivo dessa ação? O objetivo é a fomentação cultural. Quando o projeto começou, ainda não havia farto conteúdo disponível na internet. Então, surgiu a ideia de registrar esses concertos em CD e em DVD para distribuir às escolas de música. Esse material é usado pelos professores em suas aulas e ajuda a ampliar o
“o violão é para o brasil o mesmo que o futebol. nossa escola é tão forte quanto a espanhola. temos grandes intérpretes e compositores, a começar pelo villa-lobos”
Foto:Alexandre Nunis
repertório e a mudar a referência que os alunos têm da música instrumental, ampliando as possibilidades. Nossa ideia era a de criar mesmo um acervo rico e diversificado, que ficasse para a posteridade. Como a televisão pode contribuir para disseminar a música instrumental? A exibição na TV amplia a magnitude do projeto, porque o alcance é enorme. Um projeto que surgiu como concerto no teatro passa a ser visto não apenas em outras regiões do Brasil, mas até no exterior. Isso reforça a imagem do Brasil como um país de tradição no violão. Também podemos pensar nesses programas como um acervo cultural de imensa importância. Sabemos que o violão está presente em nossa cultura, e até mesmo nas universidades ele é valorizado, como provam os inúmeros cursos para profissionalização, em diversas faculdades de música do País. Violão é um fenômeno. É uma representação do que temos de melhor.
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artigo
Arquitetura como expressão da Cultura Em 2007, ao completar seu centenário, Oscar Niemeyer foi alvo, no Brasil e no exterior, de uma infinidade de homenagens à sua obra, veiculadas em livros, reportagens e documentários. Nelas foram destacadas a inventividade de sua criação arquitetônica e a revolução que suas formas curvilíneas provocaram no panorama da arquitetura modernista mundial. Sua opção pelas linhas livres estaria arraigada na própria condição de ser um brasileiro, experiência marcada, poética e plasticamente, pela “curva que encontro nas montanhas do meu País, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, nas nuvens do céu, no corpo da mulher preferida”. Essas célebres palavras de Niemeyer ressaltavam sua condição de intérprete do Brasil, numa ânsia de tradução que marcava os modernistas de sua geração, cuja maior ambição era criar uma arquitetura essencialmente nacional. Essa celebração nacional e internacional da arquitetura modernista brasileira, da qual Niemeyer é o grande emblema, e Brasília, capital do País, o maior símbolo, tem um paralelo igualmente incensado no passado brasileiro. A arquitetura do período colonial, ou luso-brasileiro, praticada ao longo de três séculos, foi homogeneizada a partir da década de 1920 em torno de um “apelido” abrangente, o barroco, que aqui passava a incluir também as formas maneiristas e rococós. Estudado por modernistas como Mário de Andrade e Lucio Costa, o barroco teria culminado nas igrejas mineiras da segunda metade do século 18, quando teria se consolidado a raiz de uma cultura arquitetônica nativa, nossa, brasileira. A obra de Aleijadinho foi eleita como evidência de nascimento de uma arquitetura com caráter nacional, cujas formas curvilíneas seriam retomadas por Niemeyer, o outro “gênio” nacional. Esses dois nomes são, genericamente, aqueles únicos que permanecem na memória dos brasileiros quando pensam na arquitetura do País. Tal glorificação, ao mesmo tempo em que dificulta a consciência das imensas variações regionais e temporais da fase colonial, cujas heranças portuguesas eram adaptadas e relidas nos confins da América portuguesa, igualmente ofusca a imensa produção arquitetônica brasileira ao longo dos séculos 19, 20 e 21. Nossas cidades e espaços rurais abrigaram muitas outras expressões arquitetônicas que, sem tanto alarde quanto aquelas adoradas pelos modernistas, documentam a incrível diversidade cultural do Brasil. A Primeira República, por exemplo, foi um
período fértil para a arquitetura urbana, pois muitas cidades foram reformadas visando aproximá-las de padrões parisienses. Rotulados pelos modernistas de meras “cópias” de modelos europeus, edifícios como estações de trem, palacetes, vilas operárias e palácios eram certamente neles inspirados, mas jamais foram réplicas servis. Os teatros municipais de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, foram traduções locais do modelo universal constituído pela Ópera Garnier de Paris. E assim também eram as edificações neoclássicas brasileiras do período imperial, que, a despeito de serem referenciadas nos prédios esbranquiçados da França Napoleônica, aqui foram quase sempre despojadas das colunas e frontões triangulares, e ainda coloridas em azul, rosa ou amarelo. A gigantesca expansão urbana brasileira efetivada ao longo do século 20 ofereceu inúmeras oportunidades de criação e recriação arquitetônica, numa era em que os modelos constituídos pelas diversas correntes da arquitetura moderna provenientes do Hemisfério Norte eram também, aqui, reelaborados. Fachadas de vidro, volumes prismáticos e plantas livres foram sinais do impacto das formas modernistas norte-americanas e europeias, assim como da chamada art déco que marcava, com suas geometrizações e escalonamentos, a paisagem de arranha-céus de Nova Iorque. Nesse sentido, é importante perceber que, se as formas arrojadas de Niemeyer foram uma revolução radical, outras tantas mais sutis, e bem menos cultuadas, se insinuaram pela paisagem das cidades brasileiras antes mesmo das experiências do célebre arquiteto. É um desafio descobri-las, assim como as criações de nossa multifacetada arquitetura contemporânea. Em um país formado por tantos povos e heranças diferentes, construções como casas, templos, edifícios governamentais, escolas, bibliotecas, espaços cênicos, fábricas, mercados ou equipamentos esportivos são a evidência de que não é possível falar em uma única cultura brasileira, coesa e uniforme. Nossas expressões arquitetônicas, tão múltiplas e criativas quanto os sujeitos sociais que construíram o Brasil, aguardam nossos olhares inquietos e nossa reflexão sem preconceitos.
Paulo César Garcez Marins é historiador, docente do Museu Paulista da Universidade de São Paulo e do Programa de Pós-Graduação da FAU/USP. 10
foto: heloisa passos
foto: divulgação
último Bloco
Percurso cotidiano Como é o percurso e o que encontram pelo caminho as crianças, jovens e adultos que vivem uma rotina escolar? Dirigida por Heloisa Passos, a série Caminhos mostra os diferentes cenários e realidades brasileiras, e revela histórias, em 13 episódios, com linguagem documental e 24 minutos de duração. Uma correalização do SescTV e da Maquina Filmes, no ar todas as terças, 17h30. Neste mês, serão exibidos: O Espelho de Téo, dia 2/4; A Casa da Nonna, dia 9/4; Trilhos e Grãos, dia 16/4; Pelo Canavial, dia 23/4; e Memória e Leite, dia 30/4.
Série em novo formato A série Faixa Curtas estreia, neste mês, episódios inéditos e com novo formato, em programas de 30 minutos de duração. Com direção de Luís Carlos Soares, a série exibe curtas-metragens de ficção, sempre às segundas-feiras, 21h. O curta Amigos Bizarros do Ricardinho, de Augusto Canani, conta a história de um rapaz que é levado ao limite da tensão em um ambiente corporativo e, a partir desse fato, passa a narrar histórias insólitas para amigos e familiares. Dia 22/4. Na semana seguinte, a série exibe os filmes Homem-Bomba, de Tarcísio Lara Puiati, e Preciosa, de Eliane Coster, que têm em comum o tema sobre as reações de jovens perante a violência do cotidiano. Dia 29/4.
Mudanças na grade
Cinema do Nordeste A região Nordeste do País vive uma efervescência de novos projetos na área cinematográfica. Neste mês, a série Sala de Cinema apresenta entrevistas com profissionais dessa região, que falam sobre sua trajetória e seus projetos: Marcelo Gomes, dia 4/4; Cláudio Assis, dia 11/4; Lírio Ferreira, dia 18/4; e João Miguel, dia 25/4, sempre às 22h. Sala de Cinema tem direção de Luiz R. Cabral e apresentação do jornalista Miguel de Almeida.
É Tudo Verdade
O mês de abril marca mudanças na grade básica de programação do SescTV. Algumas séries do canal estão em novos dias e horários, numa redistribuição nos períodos da manhã, tarde e noite. A mudança atende a uma diversidade maior de público e contempla a pluralidade de linguagens, com espetáculos musicais, dança, documentários e entrevistas. Confira a programação completa e as estreias do mês em sesctv.org.br.
O documentário Louceiras, dirigido por Tatiana Toffolli e realizado pelo Sesc SP, foi selecionado para a mostra O Estado das Coisas do 18° Festival Internacional de Documentários é Tudo Verdade, marcado para este mês, em São Paulo e no Rio de Janeiro. O filme aborda o cotidiano e a produção de utensílios de barro das louceiras da aldeia Kariri-Xocó, em Alagoas.
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Arquiteturas
Biblioteca Mário de Andrade. Foto: Revanche Produções
Os espaços arquitetônicos e sua relação com a cultura e a sociedade. Direção: Paulo Markun e Sérgio Roizenblit Estreia dia 27/4, às 21h
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