Revista SescTV - Agosto de 2013

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Agosto/2013 - edição 77 sesctv.org.br

ÓPERAS TEMPORADA DE PROGRAMAS COM INTÉRPRETES NACIONAIS E INTERNACIONAIS

MUSICAL THE BUDOS BAND mescla AFROBEAT E ROCK SETENTISTA

CONTRAPLANO EM DEBATE, O OLHAR DO CINEMA SOBRE O BRASIL E A AMÉRICA LATINA


Debates sobre comportamento, poder, sociedade e cultura a partir de obras cinematográficas brasileiras e latino-americanas.

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s e s c t v . o r g .b r

Episódio: Drogas. Foto: Estudio D Foto

Estreia dia 23, sexta, às 22h


ATRAVÉS DO PALCO

A arte é o que se vê, mas também o que está oculto no processo de criação. Assim, o entendimento dos cenários culturais, sociopolíticos e econômicos em que uma obra foi concebida em muito contribui para que ela seja apreciada de uma maneira mais abrangente. Passagens determinantes da história estabeleceram a espinha dorsal dos textos das óperas clássicas. Neste mês, o SescTV inaugura com La Traviata, de Giuseppe Verdi, uma série de 10 programas apresentados no palco do Teatro Municipal de São Paulo. Esse drama explora o papel social feminino na Europa nos meados do século XIX, época em que a entrega a um casamento formal era o comportamento delas esperado. Trazer os bastidores para a cena é uma estratégia importante sobretudo para compreender os fenômenos ainda em fase de sedimentação pelo tempo. De um século para cá, o cinema foi testemunha dos acontecimentos no mundo, e os arquivos fílmicos tornaram-se então verdadeiros documentos dos fatos. A série Contraplano, que estreia neste mês no canal, propõe um recorte desses registros para a realidade brasileira e latino-americana, analisando a produção cinematográfica do país e a latina a partir de aspectos de cultura, poder, sociedade e comportamento. A cada programa, dois especialistas de áreas de conhecimento diversas discutem filmes relacionados aos temas em questão. No elenco de debatedores estão, entre outros, o cineasta Ugo Giorgetti, o psicanalista Tales Ab’Saber, o ator e palhaço Hugo Possolo e o escritor Reinaldo Moraes. Os episódios de Contraplano foram dirigidos por Luiz R. Cabral, documentarista com uma extensa bagagem de trabalhos para a TV. Ele é o entrevistado desta edição da revista. O artigo de Sérgio Casoy, professor da Faculdade de Música da Universidade de São Paulo, por sua vez, discorre sobre como a televisão contribui para disseminar o gênero da ópera e ampliar o repertório do telespectador. Boa leitura! Danilo Santos de Miranda Diretor Regional do Sesc São Paulo

CAPA: La Traviata, de Giuseppe Verdi. Foto: Divulgação Contraplano. Foto: Alex Ribeiro.

destaques da programação 4 entrevista - Luiz R. Cabral 8 artigo - Sérgio Casoy 10 3


MúSICA

Foto: Kisha Bari

Barbas de molho

para o afro soul. E, nos últimos anos, fomos influenciados pelo rock setentista. Ainda temos a percussão, como as bandas afro e latinas, mas nosso foco está mais na distorção e no peso das guitarras e em uma bateria de rock.” Essa deverá ser a tônica de seu quarto disco – uma quebra na lógica dos anteriores. “Nossos três primeiros álbuns são como uma trilogia, bem similares no quesito musical”, avalia o saxofonista. “E, definitivamente, no quarto, queremos mudar um pouco o rumo do nosso som, o jeito de escrever e tudo o mais, para que as pessoas não tenham a sensação de que ele se funde com os três primeiros. Estamos tocando algumas músicas novas e já é possível perceber que estamos utilizando mais distorção e uma pegada mais rock.” No programa que vai ao ar no dia 28, The Budos Band mapeia seus caminhos diante de um público incrível e caloroso, nas adjetivações dos próprios músicos. “Já tocamos em vários lugares dos EUA e da Europa e nunca tivemos algo comparável ao amor que recebemos aqui, fiquei impressionado”, ressalta Tankel.

Manifestar-se politicamente nunca foi o objetivo do grupo instrumental estadunidense The Budos Band, atração inédita deste mês. Isso a despeito de suas origens – sonoras e de batismo. “Eu li um artigo em 1999 sobre os revolucionários cubanos dos anos 50, antes de derrubarem o Batista, e eles se denominavam Los Barbudos”, conta o baterista Brian Profilio. “E, como todos nós temos barba, achamos esse nome bem legal.” Ele passou, porém, a funcionar involuntariamente como um rótulo. “Começamos a tocar em lugares no Brooklyn [em Nova York] e alguns cubanos que frequentavam nossos shows sempre perguntavam qual a razão de utilizarmos esse nome, pensando que tínhamos algum posicionamento político enquanto banda, coisa que a gente não tinha”, diz Profilio. “Aí tivemos que mudá-lo, porque estávamos ficando estigmatizados politicamente. O nome que usamos hoje é apenas uma abreviação de Los Barbudos. Colocamos Band no final porque não queríamos que ficasse somente The Budos, gerando algo do tipo ‘O que é isso?’.” O afastamento de uma posição engajada chegou também ao caráter musical do conjunto, cuja gênese se fundamentou no ritmo do afrobeat, “um estilo de música político, que existe para mudar a política”, define Profilio. “Mas a gente se distanciou disso...”, ressalva. O saxofonista barítono Jared Tankel cataloga essa evolução: “Acho que, hoje em dia, nos caracterizamos como rock desértico instrumental dos anos 70”, frisa. “Fizemos a transição indo para o afro funk e depois

O GRUPO AMERICANO THE BUDOS BAND MANIFESTA SUA EVOLUÇÃO SONORA EM ATRAÇÃO INÉDITA

MUSICAL The Budos Band Dia 28/8, quarta, 22h

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ÓPERAS

La Traviata, de Giuseppe Verdi. Foto: Divulgação.

Temporada de canto lírico

No enredo, Violetta se rende ao cortejo do burguês Alfredo, por quem abandona uma rotina de festas e diversão. O casamento, nesse contexto, seria a instituição – ou o sacrifício – a redimir a maculada figura feminina de seus desvios por meio da devoção ao marido. Contudo, a despeito dessa busca pela virtude, é a maldição imposta não pelo destino, mas pelo meio, que conduzirá o desfecho da história. Ao estrear em 1853, La Traviata não agradou ao público. Só se tornou sucesso mundial um ano depois, quando a encenação acentuou o caráter de sofredora da protagonista. Na montagem exibida pelo canal, o papel de Violetta cabe à soprano Rosana Lamosa. O tenor Fernando Portari interpreta Alfredo. O corpo instrumental da Orquestra Sinfônica Municipal é regido por Abel Rocha, também responsável pela direção musical do espetáculo.

O SescTV estreia neste mês uma série de dez programas com óperas exibidas e gravadas no Teatro Municipal de São Paulo. Entre as montagens, realizadas com intérpretes nacionais e estrangeiros, há trabalhos consagrados de nomes como Wagner – O Crepúsculo dos Deuses –, Mozart – Idomeneo –, Claude Debussy – Pelléas et Mélisande –, Igor Stravinsky – O Rouxinol – e Gluck – Orfeo ed Euridice. As gravações para TV foram dirigidas por Daniel dos Santos. Na abertura de cada programa – um por mês –, o ator Paschoal da Conceição se encarrega, em uma narração em off, de situar historicamente a obra e o compositor em questão. O primeiro espetáculo é La Traviata, escrita em 1853 pelo italiano Giuseppe Verdi, cujo bicentenário de nascimento é comemorado neste ano. Com duas horas de duração, a ópera é apresentada integralmente no dia 30, com intervalos entre os seus três atos. O texto encerra uma trilogia, iniciada com Rigoletto (1851) e Il Trovatore (1853), em que Verdi examina os costumes éticos e morais de sua época. La Traviata, uma adaptação do romance A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas Filho, expõe o preconceito contra mulheres que não se enquadravam em um modelo de comportamento social que presumia a submissão. Sua personagem principal, Violetta Valéry, reúne traços tanto da musa inspiradora de Dumas, a cortesã Marie Duplessis, uma das amantes do escritor e influente entre os nobres, como da segunda mulher de Verdi, a soprano Giuseppina Strepponi, estigmatizada por seu convívio com o músico antes de serem oficialmente casados.

LA TRAVIATA, DE VERDI, INAUGURA SÉRIE DE DEZ ESPETÁCULOS GRAVADOS NO TEATRO MUNICIPAL DE SÃO PAULO

ÓPERAS La Traviata, de Giuseppe Verdi Dia 30/8, sexta, 23h

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CONTRAPLANO

Foto: Alex Ribeiro

Ugo Giorgetti, Miguel De Almeida e Tales Ab´Saber.

Filmes na mesa

A proposta da série Contraplano, que estreia neste mês no SescTV, é que especialistas de áreas diferentes, dois por programa, analisem o olhar do cinema sobre o Brasil e a América Latina a partir de quatro grandes linhas temáticas – cultura, poder, sociedade e comportamento. Com direção de Luiz R. Cabral e mediação do jornalista Miguel De Almeida, Contraplano reúne em seu elenco de debatedores Ivana Bentes, ensaísta, professora e curadora; Mary Del Priore, doutora em história e escritora; Ugo Giorgetti, cineasta; Tales Ab’Saber, psicanalista; Hugo Possolo, ator, palhaço, dramaturgo e diretor; Tadeu Chiarelli, professor e curador de artes plásticas; Celso Favaretto, professor de filosofia; Reinaldo Moraes, escritor; Luiz Aquila, pintor, desenhista, gravador e professor; e Geraldo Carneiro, poeta, ensaísta, tradutor e roteirista de cinema e TV. Um episódio especial da série fez parte da programação do Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo, realizado em julho. No primeiro episódio exibido pelo canal, Revoluções e Golpes, que vai ao ar no dia 23, quatro filmes sobre revoltas político-sociais na América são discutidos por Giorgetti e Ab’Saber. Em ¡Revolución! – A Verdade sobre Fidel Castro (Cuba, 1959), do diretor Victor Pahlen, Giorgetti questiona a legitimidade do testemunho de um ator “bêbado, decadente” (Errol Flynn, marcado por papéis de capa e espada na cinematografia estadunidense) sobre a revolução cubana. “Não sei nem se ele estava lá na época. Os planos são todos muito ambíguos”, diz. A contraposição a esse antiexemplo, A Batalha do Chile II – O Golpe de Estado (Chile/Cuba/França/ Venezuela, 1977), filme dirigido por Patricio Guzmán, é introduzida por Ab’Saber como “um dos maiores documentários já feitos em todos os tempos”. “Ele tem a força de uma quantidade imensa de material”,

argumenta. “É como se houvesse uma prontidão histórica. Não tem um plano no filme que não seja altamente revelador. Parece que foi feito pelo Chile, não pelo diretor que o organizou.” A coerência narrativa já não é o ponto forte de Condor (Brasil, 2007), de Roberto Mader, na opinião dos debatedores. Embora o filme se sustente pelo material de arquivo, dizem, seu impacto se dilui ao perder o foco entre vários dos aspectos da união das ditaduras latino-americanas na década de 70 para exterminar exilados políticos. “Ele não é orgânico, mas chega à questão do horror do desenho de vidas de pessoas destruídas”, ressalta Ab’Saber. O efeito, então, é de cunho emocional. Para o psicanalista, Che (EUA, 2008), visão ficcional de um diretor norte-americano, Steven Soderbergh, sobre a revolução cubana, é “uma espécie de Apocalypse Now antiamericano” em que a jornada pelas circunstâncias do movimento se faz mais interessante que o personagem principal em si. No segundo episódio de Contraplano, que vai ao ar no dia 30, o ator e diretor Hugo Possolo e o professor Tadeu Chiarelli discutem a diversidade sexual a partir dos filmes Madame Satã, XXY, Morango e Chocolate e Como Esquecer.

NOVA SÉRIE REÚNE ESPECIALISTAS DE DIVERSAS ÁREAS PARA DISCUTIR O MUNDO SOB O OLHAR DO CINEMA

CONTRAPLANO Sextas, 22h

Revoluções e Golpes, com Ugo Giorgetti e Tales Ab´Saber Dia 23/8

Diversidade Sexual, com Hugo Possolo e Tadeu Chiarelli Dia 30/8

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FAIXA CURTAS

O Filho do Vizinho. Foto: Divulgação.

Panoramas da infância

também dos pesadelos a elas associadas. As roupas nele guardadas, metaforicamente, são as que, em breve, não servirão mais para a criança e tampouco para o velho, ambos transformados pela experiência vivenciada naquela espécie de máquina do tempo – e do espaço. Fica evidente, assim, que, tanto para a imaginação como para as explorações do real, não há idade. A série Faixa Curtas, que tem curadoria de Luis Carlos Soares, mostra ainda neste mês os inéditos A Sutil Circunstância / O Sete-Trouxas, no dia 5; Pendular / Um Sentido Bélico para as Coisas Belas, no dia 12; e Desventuras de Um Dia / Carro-Forte / Amor Caliente, no dia 19.

Questões da vida adulta incorporadas pelo entendimento do olhar infantil definem a temática de um dos programas inéditos da série Faixa Curtas no mês, que vai ao ar no dia 26. O Filho do Vizinho (2010), dirigido por Alex Vidigal e que ganhou, entre outros prêmios, o de direção de arte do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro em 2010, enxerga a aceitação das diferenças, físicas e comportamentais, na convivência entre dois meninos – um deles o narrador da história. A partir de sua janela, onde o espectador divisa apenas seu rosto – e quase somente os olhos –, esse garoto, estático, observa a dinâmica das aventuras de um moleque da vizinhança, descrevendo suas peraltices em tom de admiração e cumplicidade. Com direção de Caroline Fioratti, A Grande Viagem (2011) traz conflitos marcados no encontro de gerações. O menino desse filme embarca em uma viagem de conhecimento de si mesmo a partir da descoberta sentimental que faz de seu avô, interpretado por Abrahão Farc. O idoso, por sua vez, reconstitui no convívio com o neto um sentido para sua vida após a perda da mulher e a própria falência como vendedor de guias de viagem. Um terceiro membro funciona como obstáculo para a relação dos outros dois: a mãe do garoto, imbuída de um pragmatismo que reserva compartimentos bastante estanques para as existências da infância e da velhice. Na interface lúdica entre esses extremos, um dia o neto se depara com o avô dentro do guarda-roupa. Ao sair dali, o ancião se apresenta como um vendedor de guias de viagem – ou de ilusões, uma vez que ambos partem então para desbravar, nos limites do quarto, roteiros inventados ao redor do mundo. O armário funciona como o simbólico do refúgio de fantasias – e

EPISÓDIO DESTACA FILMES QUE TRATAM DE CONFLITOS DO MUNDO ADULTO SOB A PERSPECTIVA DA CRIANÇA

FAIXA CURTAS Segundas, 21h

A Sutil Circunstância/O Sete-Trouxas Dia 5/8

Pendular/Um Sentido Bélico para as Coisas Belas Dia 12/8

Desventuras de Um Dia/Carro-Forte/ Amor Caliente Dia 19/8

O Filho do Vizinho/A Grande Viagem Dia 26/8

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entrevista

Foto: Nathy Silva

A vida na tela

O Contraplano é uma espécie de continuidade do Sala de Cinema. Como surgiu esse programa antecessor? Eu, o Miguel De Almeida [jornalista e apresentador] e o Beto Tibiriçá, da Plateau [Produções], chegamos à conclusão de que faltava um olhar mais aprofundado que mapeasse a cadeia produtiva do cinema nacional, desde a elaboração do roteiro, passando pela direção, pela direção de arte, pela distribuição. E conseguimos fazer esse mapeamento, em cerca de 130 programas do Sala de Cinema. A série começou em 2009, entrevistando sempre um diretor, roteirista, ator. Era uma forma de colocar questões novas, fervilhantes, sobre a mesa? O Sala de Cinema é um belo arquivo para quem quer pesquisar hoje o cinema nacional, mas não acho que ele tenha trazido discussões subliminares. Obviamente ele discutia política de distribuição, política de financiamento, discutiu muito o cinema comercial e o cinema autoral. São questões que foram levadas adiante por vários diretores, vários profissionais. A intenção era mesmo fazer um registro do cinema brasileiro. Como se chegou ao Contraplano? O Contraplano é uma segunda dentição do Sala de Cinema, pensando antropofagicamente. Achamos que o Sala estava se esgotando na forma. Foram

Luiz R. Cabral, 52, é documentarista e diretor de TV. No SescTV, assina a direção das séries Sala de Cinema e Contraplano.

“O CONTRAPLANO É UMA SEGUNDA DENTIÇÃO DO SALA DE CINEMA QUE DISCUTE O CINEMA E A VIDA”

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três anos de programa, e, embora ainda houvesse o que se falar, pensamos que seria legal ampliar essa discussão, discutir o cinema e a “vida”, cinema e ditadura, cinema e música. Criamos um debate, abrimos quatro guarda-chuvas de temas: cinema e cultura, cinema e comportamento, cinema e sociedade, cinema e poder. Como vocês chegaram a esses quatro temas principais? No final de 2011, eu, o Miguel De Almeida e o Beto Tibiriçá elencamos esses quatro guarda-chuvas grandes de maneira meio consensual. Debaixo desses guarda-chuvas, elencamos subtemas. Em poder, por exemplo, há cinema e ditadura, cinema e povo no poder, cinema e golpes. E para definir os subtemas? Foram grandes discussões. Com os temas definidos, chamamos um pesquisador que faz pós-graduação em cinema na USP e é curador de algumas mostras. Ele foi adicionado ao grupo, e fazíamos reuniões. Cada guarda-chuva teria de render de dez a 12 programas. E foi feita então uma pesquisa, com 60 laudas sobre cada tema, com filmes ligados aos assuntos relacionados. Ele [o pesquisador] vinha com as propostas de filme e nós as negociávamos. Chegamos, então, a quatro filmes por programa, um em cada bloco de 15 minutos. Cheguei a fazer o piloto com seis filmes, mas ficou muito fragmentado. Da pesquisa constavam a sinopse de cada filme, críticas, material de apoio sobre o assunto, artigos. Eu e o Miguel assistíamos a todos os filmes e eu fazia um resumo da pesquisa. Sobre os tipos de filme, há os comerciais também, não adiantava fazer só com os que estão à margem. Você passar pelo olhar comercial, pelo cinema de entretenimento, é importante. Quando discutimos religião e cinema, você tem o Chico Xavier e, em contraponto, O Pagador de Promessas. Havia um roteiro bem definido para o desenvolvimento de cada programa? No Sala de Cinema, era feito um roteiro de perguntas. No Contraplano, como é um debate, eu só levantava assuntos para o Miguel levantar a bola para os debatedores. Eu entregava para ele um resumo da pesquisa. Os debatedores viam os filmes e recebiam a pesquisa, mas não o resumo, para que houvesse um frescor, uma surpresa. O resumo era a base do programa e sua linha editorial. E quanto aos nomes dos debatedores, de que maneira foram escolhidos?

“QUERÍAMOS PESSOAS LIGADAS A DETERMINADAS ÁREAS. QUERÍAMOS UM ACADÊMICO, UM ESCRITOR, ALGUÉM DAS ARTES PLÁSTICAS. QUERÍAMOS QUE O PROGRAMA FOSSE FEITO POR PESSOAS QUE VÃO AO CINEMA, E NÃO POR PESSOAS QUE FAZEM CINEMA”

Foram em conversas entre eu, Miguel e Beto. Queríamos pessoas ligadas a determinadas áreas. Queríamos um acadêmico, um escritor como o Geraldo Carneiro [poeta, ensaísta e roteirista], alguém das artes plásticas. Para cada guarda-chuva, teríamos o Miguel e mais dois participantes fixos. Por exemplo, em cinema e cultura, o Celso Favaretto [professor de filosofia] e o Geraldo Carneiro. Cinema e poder tem o cineasta Ugo Giorgetti e o Tales Ab’Saber, psicanalista. Queríamos que o programa fosse feito por pessoas que vão ao cinema, e não por pessoas que fazem cinema, com exceção do Ugo Giorgetti. Então você tem um representante das artes plásticas, o Tadeu Chiarelli, [diretor] do MAC [Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo]; você tem o Hugo Possolo, que é um palhaço e ator. Eles não trazem informações que são para amigos de cinema, não é um programa para o próprio cineasta. É um programa para o público, são espectadores e que têm algo a dizer, têm uma leitura da vida, do mundo. Eles trazem outro olhar sobre o cinema. E a tal da química entre as pessoas acabou casando. Se em cultura, por exemplo, você tem um acadêmico como o Celso Favaretto, do outro lado você tem um poeta que fala com um repertório mais pop [Geraldo Carneiro]. Na concepção do programa, qual a importância do cenário? Ele surgiu para dar uma densidade ao programa. No Sala de Cinema, havia um cenário que revelava os bastidores. No Contraplano, não quisemos chamar a atenção para os bastidores. O cenário simboliza que a discussão está toda na mesa. Por isso há a imagem do filme na mesa, refletida por um olho. Esse cenário é mais teatral, tem uma luz mais teatral. Ele esconde o que o outro revelava, o cabo-man, os trilhos. A única coisa que eu pedi no projeto [do cenário] foi que o filme fosse projetado na mesa.

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artigo

Ópera na TV Quando se fala em ópera, a primeira coisa que nos ocorre é o prazer auditivo de belas vozes cantando bem. Mas devemos nos lembrar de que a ópera, embora se movendo num universo todo particular, em que os cantores são fundamentais para o sucesso do espetáculo, não é somente um recital de canto lírico. É principalmente teatro, um teatro que escolheu contar suas histórias, quer sejam comédias, dramas, quer sejam tragédias, através da combinação do canto humano com os sons dos instrumentos da orquestra sinfônica. Os intérpretes, portanto, além de vozes adequadas, devem ser dotados no mínimo de razoáveis habilidades cênicas para que o faz de conta que se estabelece entre o público e os artistas funcione. Só assim poderemos nos emocionar ao ouvir um soprano chorar em italiano ou um tenor exultar em alemão. Como todas as outras artes performáticas, o público só experimentará a fruição total da apresentação ao vê-la ao mesmo tempo em que a ouve. Mas, infelizmente, nem todos conseguem ter acesso ao teatro de ópera. Há impedimentos de ordem financeira e geográfica. Montar uma ópera envolve, entre cantores, músicos e pessoal técnico, mais de uma centena de pessoas, o que implica um ingresso caro, e, no Brasil, salvo raras e honrosas exceções, apenas os grandes centros urbanos têm equipamentos culturais que permitem tais produções, alijando do processo os moradores de cidades menores e mais afastadas que não se proponham a viajar. É aí que a televisão pode fazer a grande diferença. Com sua hoje comprovada capilaridade tanto nas residências quanto nos estabelecimentos comerciais do País – hoje vemos aparelhos de TV em restaurantes, salões de barbeiro e salas de espera de consultórios –, quando seus programadores têm a sensibilidade necessária em apostar, como alguns têm feito, na transmissão de cultura, a mídia televisiva se transforma num poderoso instrumento democrático de divulgação das várias formas de arte, entre elas a ópera. Exibir gravações de óperas ao vivo representa franquear virtualmente o acesso ao teatro lírico a toda a população interessada, divulgando o repertório e criando um novo público. E quem sabe se, assim como aconteceu comigo no século passado, algum – ou mais de um – menininho travesso, espiando a telinha por trás da porta, se apaixone pela ópera tanto quanto eu.

Uma das minhas mais antigas lembranças relativas à ópera está também, curiosamente, ligada a uma das minhas primeiras lembranças da televisão, a qual fez seu triunfal ingresso em nossa casa quando eu andava entre meus sete ou oito anos de idade, sob a forma de um moderníssimo aparelho Invictus em branco-e-preto de dezessete polegadas. Meses depois, minha mãe, após o jantar, sentou-se diante da TV para assistir a um programa especial: a falecida Tupi, PRF3TV canal 3, ia transmitir uma ópera ao vivo diretamente do Teatro Municipal de São Paulo! Corria o ano da graça de 1957 e, como rezava nossa legislação familiar naquela época, criança tinha de dormir cedo. Eu já tinha sido devidamente posto na cama, mas fiquei curioso em saber o que era aquela tal de ópera e, mesmo correndo o risco de um puxão de orelha, resolvi me esgueirar e assistir em pé, atrás da porta entreaberta. A primeira imagem que vi foi a do saudoso Heitor de Andrade, mestre de cerimônias impecável em seu smoking, a explicar o argumento da ópera, o qual eu não entendi nada. Para ser honesto, devo confessar que não enganei ninguém. Minha mãe, como me contou anos depois, logo percebeu que eu estava ali e resolveu fingir que nada vira para ver quanto eu aguentava. Devo ter aguentado bem, pois após algum tempo em pé trocando os pés um pelo outro, ela ficou com pena – mãe é assim mesmo – e me chamou para assistir à televisão a seu lado, dividindo a poltrona. Ao evocar hoje esse programa, lembro-me perfeitamente de como fui ficando cada vez mais fascinado com a música e com a representação que dela emanava, com os artistas se movendo no palco. Fiquei totalmente absorto. Transcorrido mais de meio século, não me recordo bem de toda a récita, mas alguns flashes voltam periodicamente à minha memória. A lembrança mais nítida que tenho é a de uma cena com uma moça de longos cabelos louros, sozinha no palco enorme, cantando uma melodia que depois não me saiu da cabeça – eu a assobiei durante meses –, feita de trinados e belos agudos. Anos depois identifiquei o trecho e, por tabela, a primeira ópera que vi representada em minha vida. A ária era Caro Nome, da ópera Rigoletto de Verdi, da heroína Gilda, a moça de cabelos loiros, cantada, naquela noite, como uma pesquisa posterior determinou, pela grande soprano brasileira Niza de Castro Tank. Não é à toa que até hoje o Rigoletto é minha ópera favorita; tenho dela uma infinidade de gravações diversas em áudio e vídeo. E gosto de pensar que o meu grande amor à ópera foi em parte estimulado por essa fascinante experiência infantil proporcionada pela TV.

Sérgio Casoy é professor na Faculdade de Música da Universidade de São Paulo e, há 40 anos, pesquisa e divulga a música lírica.

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último Bloco Foto: Roberto Menescal. Foto: Divulgação.

MENÇÃO HONROSA ÀS LOUCEIRAS

EXPERIÊNCIA MUSICAL Reprises de shows exclusivos de músicos brasileiros na faixa dos 70 anos de idade são o destaque do mês da série Instrumental Sesc Brasil, aos domingos, às 21h, e às quintas, às 18h. A programação inclui Dori Caymmi, no dia 1; Carlos Lyra, no dia 4; Heraldo do Monte, no dia 8; Francis Hime, no dia 11; João Donato, no dia 15; Raul de Souza, no dia 18; Hermeto Pascoal, no dia 22; Roberto Menescal, no dia 25; e Sebastião Tapajós, no dia 29. Direção para TV: Max Alvim.

Foto: Giros Produções.

O documentário Louceiras, dirigido por Tatiana Toffoli, recebeu uma Menção Honrosa ao disputar a Mostra Competitiva do FICA – Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental de 2013, realizado em Goiás de 2 a 7 de julho; a cerimônia de premiação ocorreu no dia 6. O filme mostra o cotidiano das mulheres que confeccionam utensílios de barro na aldeia Kariri-Xocó, em Porto Real do Colégio, Alagoas. Além dos pormenores dessa atividade produtiva, explora costumes como o uso de ervas para o tratamento de doenças e em rituais. Louceiras é exibido no dia 21 (quarta), às 20h, com reprises no dia 22, às 12h, no dia 24 (sábado), às 11h06, e no dia 27 (terça), às 7h.

CAMINHOS PREMIADOS No final de julho, a série Caminhos, coproduzida pelo SescTV e pela Maquina Filmes, foi a vencedora da categoria Produção de Série dos Prêmios TAL. Realizados pela Televisión America Latina, os prêmios visam incentivar e divulgar a excelência de trabalhos audiovisuais de emissoras públicas e culturais do continente latino-americano. Com direção geral de Heloisa Passos, Caminhos, que estreou em março de 2012 e está em exibição no canal, é constituída de 13 documentários que mostram os trajetos de casa para a escola, simbolizando as regiões culturais do País. O projeto contou com o incentivo da Ancine, pelo Fundo Setorial do Audiovisual do Ministério da Cultura.

PALCOS REGIONAIS Uma sala de espetáculos em geral diz muito sobre a região em que ela está localizada. A proposta da temporada Palcos Brasileiros da série Coleções é tratar de aspectos da cultura brasileira ao visitar teatros de várias cidades do país. Neste mês, o canal exibe os episódios inéditos: Theatro José de Alencar, no dia 1/8; Theatro da Paz e Theatro Alberto Maranhão, no dia 8/8; Teatro Municipal de São Paulo, no dia 15/8; Teatro Municipal de Niterói (RJ), no dia 22/8; e Teatro Amazonas (AM), no dia 29/8. Quintas, 21h30. Direção: Belisario Franca.

Para sintonizar o SESCTV: Anápolis, Net 28; Aracaju, Net 26; Araguari, Imagem Telecom 111; Belém, Net 30; Belo Horizonte, Oi TV 28; Brasília, Net 3 (Digital); Campo Grande, JET 29; Cuiabá, JET 92; Curitiba, Net 11 (Cabo) e 42 (MMDS); Fortaleza, Net 3; Goiânia, Net 30; João Pessoa, Big TV 8, Net 92; Maceió, Big TV 8, Net 92; Manaus, Net 92; Natal, Cabo Natal 14 (Analógico) e 510 (Digital), Net 92; Porto Velho, Viacabo 7; Recife, TV Cidade 27; Rio de Janeiro, Net 137 (Digital); São Luís, TVN 29; Uberlândia, Imagem Telecom 111. No Brasil todo, NET 137; Oi TV 29 e Sky 3. Assista também em sesctv.org.br. Para outras localidades, consulte sesctv.org.br

SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO – SESC

Administração Regional no Estado de São Paulo Presidente: Abram Szajman Diretor Regional: Danilo Santos de Miranda

A revista SESCTV é uma publicação do Sesc São Paulo sob coordenação da Superintendência de Comunicação Social. Distribuição gratuita. Nenhuma pessoa está autorizada a vender anúncios. sescsp.org.br Coordenação Geral: Ivan Giannini Supervisão Gráfica e editorial: Hélcio Magalhães Editoração: Stefanie Cabrino Revisão: Marcelo Almada

Este boletim foi impresso em papel fabricado com madeira de reflorestamento certificado com o selo do FSC® (Forest Stewardship Council ®) e de outras fontes controladas. A certificação segue padrões internacionais de controles ambientais e sociais.

Direção Executiva: Valter Vicente Sales Filho Direção de Programação: Regina Gambini Coordenação de Programação: Juliano de Souza Coordenação de Comunicação: Marimar Chimenes Gil Redação: Edson Valente Divulgação: Jô Santina, Jucimara Serra e Glauco Gotardi Envie sua opinião, crítica ou sugestão para atendimento@sesctv.sescsp.org.br Leia as edições anteriores em sesctv.org.br Av. Álvaro Ramos, 776. Tel.: (11) 2076-3550

Sincronize seu celular no QR Code e assista ao vídeo com os destaques da programação.


Vocacional, uma aventura humana

Pátio do Ginásio Vocacional Oswaldo Aranha - Brooklin - SP. Foto: Divulgação

A experiência educacional do Ginásio Vocacional, escola pública implantada na década de 1960 Direção: Toni Venturi

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