FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA INTRODUÇÃO À MITOLOGIA GREGA:
Ναρκισσος Μυθος
SOFIA PIRES JUNHO/2015
O MITO DE NARCISO
INTRODUÇÃO Interessou-me pensar o mito de Narciso por se tratar de um mito que tem uma enorme receptividade na tradição pictórica e literária europeia – com autores tão díspares como Gaston Bachelard, Paul Valéry ou Rainer Maria Rilke a abordarem-no amplamente nas suas obras – e que, na minha opinião, parece situar-se na génese de muitos gestos artísticos. Através da duplicação do mundo – tal como as árvores são duplicadas no espelho de água da fotografia de 1842 de Henry Fox Talbot – o artista (re)cria o mundo uma e outra vez em cada pintura, em cada desenho, em cada fotografia, munido apenas do seu olhar, da matéria que é o mundo e das ferramentas da obra, dos pincéis, das goivas, das câmaras, que dão forma à matéria. Se tomarmos como exemplo a fotografia percebemos como a própria natureza do fenómeno fotográfico – onde através de um conjunto de químicos ou, agora, de um conjunto de informação binária formamos uma imagem do mundo, um simulacro do fragmento descontínuo de mundo que escolhemos enquadrar com a nossa câmara – replica qualquer coisa que encontramos já na natureza, que a natureza produz naturalmente, ininterruptamente há milhares de anos, e que está intimamente ligada ao mito de Narciso: a produção de imagens, entendendo imagem, etimologicamente, como reprodução, representação, cópia. Por outro lado, parece-me existir qualquer coisa de muito contemporâneo na noção de reflexo, explorada nas suas mais diferentes acepções em todas as versões do mito, ancorada à estrutura essencial da narrativa de Narciso. Aqui estamos nós, habitantes deste começo de milénio, tal como Ovídio e Cónon outrora foram habitantes de um outro começo de milénio, a viver num mundo de reflexos e simulacros que nos iludem com experiências virtuais que replicam experiências mil vezes replicadas muito distantes mas que em tempos foram reais. E é com este air du temps, que se resume plenamente na imagem desta sala de espelhos onde vivemos, onde a luz que se propaga se reflecte infinitamente e infinitamente cria novas imagens, um pouco como o clímax do filme The Lady from Shangai de Orson Welles, essa irrepetível ode ao simulacro, que pretendo abrir este trabalho.
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Henry Fox Talbot, Trees and Reflections, 1842
Orson Welles, Still de The Lady from Shangai, 1947 3
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LISTAGEM DE FONTES
Cónon, Narrations 24 Escritor, mitógrafo grego que viveu entre o século I A.C. e o século I D.C. Narrations – colecção de 50 narrativas relativas a episódios míticos e heroicos.
Ovídio, Metamorphosis 3. 339-509; Fasti 5. 222 ff Poeta latino que viveu entre o século I A.C. e o século I D.C. Metamorphosis – poema épico em 15 livros que reúne episódios mitológicos gregos e romanos; Fasti – poema incompleto em 6 livros de elegias descrevendo cada livro um mês do calendário romano, de Janeiro a Junho.
Pseudo-Hyginus, Fabulae 271 Escritor latino do século I D.C. Fabulae – colecção de fábulas sobre mitos e genealogias. “ (…) Two extant collections of fables were attributed to him: the Fabulae (or Fables) and Astronomica (or Astronomy). The poor quality of these works lead most to believe they are either wrongly attributed to this distinguished scholar or are a later abridgement of his works composed by a C2nd grammarian. In spite of the poor writing style and numerous errors, the works do preserve many myths and alternative versions of myths not found elsewhere.(…) ” (Theoi)
Statius, Thebaid 7. 340 ff Poeta romano do século I D.C. Thebaid – poema épico em 12 livros sobre o episódio mítico dos Sete contra Tebas.
Pausânias, Description of Greece 9. 31. 7-9 Escritor, viajante, geógrafo grego do século II D.C. Description of Greece – colecção de episódios e observações que, em 10 livros, descrevem a Grécia Antiga, travelogue.
Lucian, Dialogues of the Dead 5 Escritor satírico e retórico grego do século II D.C. Dialogues of the Dead – livro composto de 30 diálogos satíricos que têm lugar no Mundo Subterrâneo, o reino de Hades.
Philostratus the Elder, Imagines 1. 23 Escritor grego do século III D.C. Imagines – colecção de breves ensaios que descrevem pinturas de tema mitológico, em detalhe. 4
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Callistratus, Descriptions 5 Escritor grego do século III ou IV D.C. Descriptions – colecção de catorze breves ensaios descrevendo estatuária de personagens míticas, em detalhe.
Claudian, Rape of Proserpine 2. 130 ff Poeta latino do século IV D.C. Rape of Proserpine – poema épico centrado no episódio mítico do rapto de Propserpine.
Nonnus, Dionysiaca 11. 322 ff; Dionysiaca 48. 582 ff Poeta grego do século V D.C. Dionysiaca – o último grande poema épico da Antiguidade que relata, em 48 livros, a história de Dionisio centrada no episódio da sua expedição à Índia.
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COMPARAÇÃO DE FONTES Procurei estudar o mito de Narciso a partir da comparação de três fontes literárias que me permitissem, de algum modo, observar a evolução e as variações do mito numa mesma época – comparando dois autores que viveram entre o século I A.C. e o século I D. C. e que foram provavelmente contemporâneos, nomeadamente Cónon e Ovídio – e numa época já posterior, cerca de um século depois de Cónon e Ovídio, através de Pausânias e do seu livro Descrição da Grécia. Seria interessante, claro, poder acrescentar à comparação anterior uma fonte da época grega arcaica, por exemplo, ou outra do período clássico e observar as variações do mito através do processo de transmissão até à sua recepção pelos romanos comparando esta fonte mais anterior com as Metamorfoses de Ovídio, por exemplo. Contudo, esse tipo de comparação não é possível pois não sobreviveram quaisquer fontes literárias de qualquer período da civilização grega que descrevam este mito e, de acordo com o LIMC e o comentário de Malcolm Brown na sua tradução das Narrations de Cónon, a única fonte iconográfica que nos resta é uma estátua em terracota de Tanagra do período helenístico (LIMC 44) que descreve Narciso “in the already well-known act of removing his mantle [with Eros] on his right shoulder perched helping him to expose his beauty”(LIMC) mas cujo paradeiro é actualmente desconhecido. Sendo assim, as fontes literárias mais antigas, que remontam a um período situado algures entre o séc. I A.C. e o séc. II D.C., que temos para estudar o mito de Narciso são as Narrations de Cónon e as Metamorphosis de Ovídio. E são precisamente estes dois autores que, em primeiro lugar, através das suas obras, nos permitem estabelecer um elo entre o período helenístico grego – e, tendo em conta a impossibilidade de determinar a origem de qualquer mito, todos os períodos que o precederam – através do qual o mito terá sido transmitido e a sua recepção pelos gregos e romanos do século I D.C.. Interessa também pensar que estes dois autores, apesar da contiguidade temporal das suas vidas, eram bastante diferentes um do outro, sendo importante estabelecer como distinção primeira o facto de Cónon ser grego e Ovídio romano. Logo após, será relevante considerar que Cónon é um mitógrafo grego acima de tudo interessado em recolher e fixar uma tradição viva que são os mitos e ritos da cultura onde ele próprio se insere e Ovídio é um poeta que, apesar de muito próximo e igualmente inserido nessa tradição, está, antes de tudo, empenhado em cantar um poema, um poema épico, claro, totalmente imerso em narrativas míticas, claro, mas, antes de tudo, um poema, um 6
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poema onde se pode alongar (como vemos pela rica duração das suas descrições), um poema onde pode fantasiar e unir elementos que provavelmente nunca terão estado ligados (por exemplo, a ligação de Narciso e Eco), um poema que, como qualquer poema, é idealizado, poetizado, veja-se a lírica metamorfose de Eco ou a morte de mágoa, de cansaço de Narciso que não é mais uma morte mas antes um deixar-se morrer. Talvez tenha sido precisamente o misterioso fulgor poético que encontramos nas linhas de Ovídio a razão que levou esta versão a perdurar durante tantos séculos e tantas épocas como a versão mais popular, senão mesmo a única versão. Basta observar algumas pinturas a óleo da tradição europeia para perceber como, por exemplo na pintura de Constanzi (Fig. 12, pág. 20) ou na de Poussin (Fig. 8, pág.18), Eco surge sempre associada a Narciso, ligação que é unicamente estabelecida nas Metamorfoses, ou até, se quisermos recuar ao próprio século de Ovídio, percebemos, através das pinturas murais encontradas nas ruinas de Pompeia (LIMC 45-50), que é claramente a sua versão, e não a de Cónon, seu contemporâneo, que detém toda a relevância e popularidade. Por fim, vem Pausânias, o geógrafo, o viajante grego, um século depois, recontar-nos o mito no seu travelogue de Descrição da Grécia, um dos primeiros livros de literatura de viagem, onde procura, de um ponto de vista racionalista, explicar o mito tornando-o – a considerar por exemplo a forma como muito sistematicamente resolve a questão da origem da flor Narciso – mais inteligível através da elisão dos pormenores fantásticos das versões anteriores. A versão de Pausânias não deixa contudo de ser relevante uma vez que a sua tentativa de explicação racionalista do mito acrescenta à narrativa um elemento de grande pregnância quando pensado na sua relação com a simbólica geral do mito de Narciso. Pausânias traz ao mito o gémeo que é o elemento idêntico, o duplo de si mesmo, o reflexo que não é já virtual mas real, carnal, palpável. Em Descrição da Grécia encontramos a única narrativa deste mito onde, contrariamente às versões anteriores, o acto de observar-se a si mesmo, de observar o seu próprio reflexo na água, é tornado consciente, ou seja, Narciso sabe que se observa a si mesmo na água e escolhe observar-se pois isso recorda-o da sua irmã gémea morta: “…knowing that it was his reflection that he saw, but in spite of this knowledge finding some relief for his love in imagining that he saw, not his own reflection, but the likeness of his sister.” Na versão de Ovídio, pelo contrário, a tomada de consciência é entendida como um peso, um fardo e é o resultado, ou antes, a consequência final do castigo dos deuses, não é nunca uma escolha pois, no momento em que Narciso sabe a verdade, não é capaz de suportá-la e deixa-se morrer.
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É este episódio de tomada de consciência que, em Pausânias, condensa todas as forças que nas restantes versões surgem apenas latentes. Todos os vectores que revestem o símbolo espelho/reflexo – sempre ele próprio duplo mesmo múltiplo – de significâncias duplas e opostas, de tensões entre virtual e real, simulacro e original, matriz e duplo, tornam-se patentes neste episódio. Porque Narciso escolhe, o simulacro de si mesmo que vê reflectir-se na água devém o duplo originário, a sua irmã gémea, e os três – Narciso, o seu reflexo e a sua irmã gémea – confundem-se numa espécie de potência originária onde, devido à fusão indistinta dos três elementos, a procura do elemento original (que não é duplicado) perde toda a importância. Podemos também deduzir que a orquestração dos elementos que constituem a narrativa ovidiana favorece, de algum modo, a ideia de metamorfose na medida em que nesta narrativa, que neste aspecto singular dista largamente das outras, Ovídio coloca as personagens sob completo jugo divino para que este, como autor, não fosse o seu livro chamar-se as Metamorfoses, possa sujeitá-las às mais fantásticas transformações, metamorfoseando a ninfa Eco em voz sem corpo ou com esqueleto de pedra e Narciso homem em Narciso flor. Nas outras versões, não existe nenhum processo de metamorfose: Pausânias resolve muito rapidamente a questão da origem da flor, remetendo-a para os versos de Phampos, supostamente anteriores ao mito, e na versão de Cónon, apesar de não ser muito claro, deduz-se que não há nenhuma metamorfose pois não é o corpo de Narciso que dá lugar ao nascimento da flor mas antes o sangue de Narciso que origina a flor. Na versão de Cónon, assim como na de Pausânias, o local de nascimento de Narciso é precisado com mais detalhe que nas Metamorfoses de Ovídio, distinção que se prende, na minha opinião, com o facto de o episódio de Narciso surgir no livro III após o episódio de Tirésias [316], também ele, tal como Narciso, natural da região de Aónia, mas também com o facto de a construção mais solta e aberta desta enunciação ser mais propícia à linguagem poética de Ovídio. É, no entanto, Ovídio quem em maior detalhe explica a genealogia de Narciso: [342] “a lovely Nymph, named Liriope, came with her dear son, who then fifteen, might seem a man or boy—he who was born to her upon the green merge of Cephissus' stream—that mighty River-God whom she declared the father of her boy”, que tanto na versão de Cónon como na de Pausânias é elidida possivelmente por ambos serem mitógrafos gregos porventura mais empenhados em tentar enquadrar um culto local a Eros recorrente na região de Téspias na narrativa mais geral do mito de Narciso do que em definir a sua genealogia mítica. Na versão de Ovídio, existe um oráculo ao qual o recém-nascido, levado a visitar Tirésias pela mãe, não poderá nunca escapar e que a ninfa Liriope durante longos anos desvaloriza. 8
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Contrariamente, na versão de Pausânias não há oráculos e os deuses não são nunca chamados a intervir na punição de Narciso. Na versão de Cónon, apesar do enamoramento pelo seu próprio reflexo ser uma punição dos deuses, de Nemésis em particular, não existe a priori nenhum oráculo a que Narciso não possa de modo algum escapar. A ideia da existência de um oráculo é também muito útil à construção poética de Ovídio pois permite que, através da existência de um oráculo ao qual nenhuma personagem pode escapar, os deuses sejam chamados a intervir na irremediabilidade do oráculo se cumprir, permitindo assim que, através dos castigos dos deuses, as personagens se metamorfoseiem, Narciso transformando-se em flor, Eco reduzindo-se a voz. Tanto na versão de Ovídio como na versão de Cónon, Narciso é um belo rapaz com inúmeros pretendentes de ambos os géneros. Ovídio circunscreve, depois, no decorrer da narrativa, a pluralidade dos pretendentes apenas à ninfa Eco e Cónon a Amínias. Já a versão de Pausânias, sendo, como sabemos, a mais racionalista das três, elimina da narrativa qualquer ideia plural de pretendentes e concentra toda a dimensão erótica/amorosa do mito na relação entre os dois irmãos gémeos. De facto, é interessante notar como as três versões sintetizam a acção de Eros, sempre presente ao lado de Narciso na iconografia (LIMC 27- 44), a partir de dois tipos muito diferentes de sujeito erótico e um particular objecto de desejo: nas Narrações de Cónon, definitivamente – com o suicídio de Amínias por amor e o suicídio de mágoa de Narciso, partilhando a espada que enviara a Amínias e com a qual este também se matou – a mais trágica das versões, o sujeito que ama Narciso é um rapaz e, por isso, a trágica pulsão sexual é nutrida por um sujeito do mesmo género (Narciso), o episódio narrado por Cónon é o exemplo da libido homossexual; depois, na versão de Ovídio, apesar da referência inicial aos seus diversos pretendentes dos dois géneros, temos a materialização mais clássica da pulsão heterossexual, a ninfa Eco perdida de amores por Narciso que a rejeita rudemente mas que ainda assim, na hora da morte de Narciso, sente por ele uma tremenda, quase maternal, compaixão e, apesar de não o ter perdoado ainda pela sua rejeição, faz ecoar breves palavras de despedida e partilha da sua dor; por fim, Pausânias traz-nos a pulsão incestuosa que permite a inversão dos papéis das versões anteriores. Em Descrição da Grécia é Narciso quem nutre desejo pela sua irmã gémea que por estar morta está para sempre fora da sua esfera de alcance, ou seja, é, nesta versão, Narciso que está apaixonado por uma coisa que nunca poderá possuir, contrastando com as outras versões onde são os seus pretendentes, Amínias e Eco, que estão apaixonados por alguém que nunca lhes retribuirá o mesmo amor mas apenas desdém, e que, por isso, nunca poderão possuir, enquanto Narciso permanece apaixonado pelo seu reflexo no espelho e mata-se quando toma consciência de que, tal como os seus pretendentes, nunca o poderá possuir.
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A introdução do elemento gémeo na narrativa mítica introduz, como já referi, uma camada adicional de significados à já tão complexa constelação de ideias produzidas pelo próprio mito que, a meu ver, coloca este mito em convergência com uma outra ideia igualmente querida à tradição pictórica e literária europeia e que percorre tematicamente, pensando agora num caso mais particular, uma parte significativa da pintura e literatura germânicas: o Doppelgänger. Assim, uma outra análise que seria, na minha opinião, relevante fazer seria precisamente esta de pôr em relação, a partir do mito de Narciso, a versão ovidiana que foi a que mais longamente perdurou na tradição pictórica e literária europeia com a versão de Pausânias que, de algum modo, parece circunscrever um tema assaz recorrente nessa mesma tradição que é a ideia do duplo, do Doppelgänger, do ser fantástico que vive entre nós e que, como uma sombra, nos duplica, dentro do próprio mito de Narciso, que é, nas suas versões mais populares, a história de alguém apaixonado por uma ilusão, por um simulacro, pelo seu reflexo em movimento que não poderá nunca possuir, e que, na versão de Pausânias, se traduz por alguém apaixonado pelo seu duplo defunto, irremediavelmente perdido, que encontra na adoração do seu próprio reflexo a última e ínfima possibilidade de encontro com o seu duplo originário.
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Ναρκισσος
Local de nascimento
Oráculo
Conon, Narrations 24 Séc. I A.C. – Séc. I D.C.
Ovidio, Metamorfoses 3. 339 – 509 43 A.C. – 17 D.C.
Pausanias, Description of Greece 9. 31. 7 – 9 115 D.C. – 180 D.C.
Cidade de Téspia, perto do Monte Hélicon, na região de Beócia:
Região de Aonia (?):
Povoado (?) de Donacon, na cidade de Téspia:
“In Thespeia in Boeotia (the town is not far from Mt. Helikon) a boy was born…”
Não há qualquer referência ao oráculo ou ao adivinho Tirésias. Pelo texto depreendemos que Narciso nasce já assim, muito bonito, vaidoso e desdenhoso do amor e dos seus pretendentes e que o facto de se apaixonar pelo seu próprio reflexo não deriva de nenhum oráculo ao qual não possa escapar, como na versão Ovidiana, mas antes de um castigo dos deuses pela sua conduta para com os seus pretendentes, em particular, para com Amínias:
[339] “Tiresias' fame of prophecy was spread through all the cities of Aonia, for his unerring answers unto all who listened to his words.”
Tirésias: [348]“If he but fail to recognize himself, a long life he may have beneath the sun”
“In Thespeia in Boeotia a boy was born, Narkissos, extremely beautiful and disdainful of Eros and erastai”
Pretendentes
Muitos pretendentes:
Muitos pretendentes:
“And the rest of his erastai swore off loving him…”
[353]“And many a youth, and many a damsel sought to gain his love“
Entre eles, Amínias:
Entre eles, a ninfa Eco:
“And the rest of his erastai swore off loving him but Ameinias was very persistent and importunate.”
[359] “Once a noisy Nymph, (who never held her tongue when others spoke, who never spoke till others had begun) mocking Echo, spied him as he drove, in his delusive nets, some timid stags.” [370] “One day, when she observed Narcissus wandering in the pathless woods, she loved him and she followed him, with soft and stealthy tread. The more she followed him the hotter did she burn, as when the flame flares upward from the sulphur on the torch. Oh, how she longed to make her passion known! To plead in soft entreaty! To implore his love! But now, till others have begun, a mute of Nature she must be.”
“In the territory of the Thespians is a place called Donacon (Reed-bed). Here is the spring of Narcissus” Não há qualquer referência a um óraculo pois, segundo Pausânias, apesar de a versão de Ovidio, em todas as suas variações, ser a mais popular “it is utter stupidity to imagine that a man old enough to fall in love was incapable of distinguishing a man from a man's reflection” e por isso no livro 9 do seu “Description of Greece”, procurando uma explicação mais racionalista do mito, Pausânias procede à transmissão da versão do mito que, segundo ele, é a menos popular (mas a mais “plausível”).
Não há qualquer referência a algum pretendente. Pausânias refere que, segundo esta sua versão do mito, Narciso teria tido uma irmã gémea por quem se apaixonou. “It is said that Narcissus had a twin sister; they were exactly alike in appearance, their hair was the same, they wore similar clothes, and went hunting together.” “The story goes on that Narcissus fell in love with his sister”
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Amínias suicida-se às portas de Narciso com uma espada enviada por este: “When, however, [Narkissos] did not admit him but even sent him a sword, [Ameinias] killed himself before Narkissos’ doors after earnestly beseeching the god to avenge him.”
Morte/metamorfose do(s) pretendente(s)
Amínias: Personagem que pede aos Deuses o castigo de Narciso
“[Ameinias] killed himself before Narkissos’ doors after earnestly beseeching the god to avenge him.”
Não especifica o deus que é chamado a intervir mas refere-se a ele no singular, Eros (?), Nemésis (?): “[Ameinias] killed himself before Narkissos’ doors after earnestly beseeching the god to avenge him.” Deus que é chamado a punir Narciso
O corpo de Echo desaparece, com o sofrimento da rejeição de Narcisso, restando apenas os seus ossos que acabam por se transformar em pedra e a voz da ninfa em eco que todos nos bosques e montes ouvem, mas que nunca veem: [393] “Thus rejected she lies hid in the deep woods, hiding her blushing face with the green leaves; and ever after lives concealed in lonely caverns in the hills. But her great love increases with neglect; her miserable body wastes away, wakeful with sorrows; leanness shrivels up her skin, and all her lovely features melt, as if dissolved upon the wafting winds—nothing remains except her bones and voice—her voice continues, in the wilderness; her bones have turned to stone. She lies concealed in the wild woods, nor is she ever seen on lonely mountain range; for, though we hear her calling in the hills, 'tis but a voice, a voice that lives, that lives among the hills”
Algum pretendente (masculino “his hands”) que Narciso outrora desprezou, Amínias (?):
Nesta versão do mito, contrariamente às duas versões anteriores, não há metamorfoses. A irmã morre, simplesmente, sem qualquer explicação, e o destino de Narciso não nos é nunca revelado. Ficamos, por isso, sem saber se morre, se se transforma em flor ou se fica eternamente a admirar o seu reflexo na fonte. Breve referência à morte da irmã: “The story goes on that Narcissus fell in love with his sister, and when the girl died…” Parágrafo final do relato concernente à personagem de Narciso, não à flor: “The story goes on that Narcissus fell in love with his sister, and when the girl died, would go to the spring, knowing that it was his reflection that he saw, but in spite of this knowledge finding some relief for his love in imagining that he saw, not his own reflection, but the likeness of his sister.”
Nesta versão do mito, nenhuma personagem pede vingança e os deuses não são, por isso, chamados a intervir.
[404] “and therefore, someone whom he once despised, lifting his hands to Heaven, implored the Gods, “If he should love deny him what he loves!”
Nemésis: [406] “and as the prayer was uttered it was heard by Nemesis, who granted her assent.”
Nesta versão do mito, nenhuma personagem pede vingança e os deuses não são, por isso, chamados a intervir.
Na versão em francês das “186 Récits de Cónon” por Abbé Gedoyn, o deus chamado a intervir é explicitado, Eros: “Après avoir invoqué l'Amour & l’avoir conjuré d'être son vengeur, il prend cette épée & va s'en percer le cœur sous les fenêtres du cruel Narcisse.”
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Em desespero, Narciso suicida-se por julgar ter já sofrido justamente por causa da sua conduta incorrecta para com os sentimentos de Amínias – segundo as duas traduções – e por não poder possuir aquilo por que está apaixonado – motivo que a tradução francesa acrescenta:
Morte de Narciso
“Finally, at a loss and believing that he suffered justly in return for his contemptuous treatment of Ameinias’ passionate desires, he killed himself.” “Enfin, désespéré de ne pouvoir jouir de ce qu'il aimait & croyant porter la juste peine des rigueurs qu’il avait exercées contre Amintas, il se tua lui-même.”
Nacimento da flor
Morto de dor, exaustão, mágoa, tristeza. [487] “When as glass again the rippling waters smoothed, and when such beauty in the stream the youth observed, no more could he endure. As in the flame the yellow wax, or as the hoar-frost melts in early morning 'neath the genial sun; so did he pine away, by love consumed, and slowly wasted by a hidden flame. No vermeil bloom now mingled in the white of his complexion fair; no strength has he, no vigor, nor the comeliness that wrought for love so long: alas, that handsome form by Echo fondly loved may please no more.” [502] “He laid his wearied head, and rested on the verdant grass; and those bright eyes, which had so loved to gaze, entranced, on their own master's beauty, sad Night closed. And now although among the nether shades his sad sprite roams, he ever loves to gaze on his reflection in the Stygian wave.”
Segundo os Téspios, a flor terá brotado do lugar onde o sangue de Narciso se derramou:
A flor brotou espontaneamente no lugar onde o corpo de Narciso havia morrido:
“The inhabitants believe that the narcissus flower first appeared from that spot of ground on which the blood of Narkissos was shed.”
[509] “And in his body's place a sweet flower grew, golden and white, the white around the gold.”
O destino final de Narciso não nos é nunca revelado e ficamos, por isso, sem saber se morre, se se transforma em flor ou se fica eternamente a admirar o seu reflexo na fonte. Parágrafo final do relato concernente à personagem de Narciso que fecha esta versão do mito deixando-nos sem saber o que acontece, por fim, a Narciso: “The story goes on that Narcissus fell in love with his sister, and when the girl died, would go to the spring, knowing that it was his reflection that he saw, but in spite of this knowledge finding some relief for his love in imagining that he saw, not his own reflection, but the likeness of his sister.”
Pausânias procurando dar uma explicação racionalista para o nascimento da flor, contraria, de novo, as duas versões anteriores, argumentando que, tendo em consideração os versos de Pamphos, o nascimento da flor só pode, com certeza, ser anterior a este episódio mítico: “The flower narcissus grew, in my opinion, before this, if we are to judge by the verses of Pamphos. This poet was born many years before Narcissus the Thespian, and he says that the Maid, the daughter of Demeter, was carried off when she was playing and gathering flowers, and that the flowers by which she was deceived into being carried off were not violets, but the narcissus.”
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ÍNDICE DE FIGURAS
1. Michelangelo Caravaggio, Narciso, 1546-48, Galeria Nazionale d’Arte Antica di Palazzo Barberini; 2. Mat Collishaw, Narcissus,1990, Colecção Privada; 3. Nicolas Bernard Lépicié, Narcisse, 1771, Musée Antoine-Lécuyer; 4. Lucian Freud, Narcissus, 1948, The Lucian Freud Archive, Bridgeman Art Library; 5. Duane Michals, Narcissus,1985, N.D.; 6. William Turner, Narcissus and Echo, 1804, Tate Gallery; 7. Laurent de La Hyre, Narcissus, 1620, National Gallery of Art; 8. Nicholas Poussin, Echo and Narcissus, 1630, Musée du Louvre; 9. John William Waterhouse, Echo and Narcissus, 1903, Walker Art Gallery; 10. Cecil Beaton, Narcissus, 1967, N.D.; 11. Antonio da Trento, Narcissus at the well (after Parmigianino), 1527-30, The Metropolitan Museum of Art; 12. Placido Constanzi, Narcissus and Echo, S/data, Colecção Privada; 13. Giovanni Boltraffio, Narcissus, 1400-09, The National Gallery; 14. Jean Cocteau, Still de Orphée, 1950, N.D.; 15. Stefano Della Bella, Narcissus (from Game of Mythology), 1644, The Metropolitan Museum of Art; 16. Claude, Landscape with Narcissus and Echo, 1644, The National Gallery; 17. Benjamin West, Narcissus and Echo, 1805, Colecção Privada; 18. Salvador Dali, Métamorphose de Narcisse, 1937, Tate Gallery; 19. Jacob Pynas, Mountain landscape with Narcissus, 1628, The National Gallery; 20. William Turner, Narcissus and Echo, S/data, Tate Gallery; 21. Nicolas Bernard Lépicié, Narcisse changé en fleur, 1771, Château de Versailles; 22. John Gibson, Narcissus, 1838, Royal Academy of Arts; 23. Jess, Narkissos: The Last Translation,1978-91, The Museum of Modern Art; 24. Jess, Narkissos, 1976-91, The San Franscisco Museum of Modern Art; 25. Gyula Benczúr, Narcissus, 1881, Magyar Nemzeti Galéria.
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O MITO DE NARCISO
BIBLIOGRAFIA
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