Carla cassidy perigosamente sedutora (mi extra 36)

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Perigosamente Sedutora Reluctant wife

Carla Cassidy

ELE ESTAVA PRESTES A CAIR NA ARMADILHA DO AMOR! Tyler Sinclair sabia que Samantha Dark era um perigo. Com seu jeito sensual, seu caminhar ondulante, fazia com que ele pensasse em outras coisas que não fosse trabalho. Aliás, nas noites insones, pensava até em deixar de lado sua boa vida de solteiro... Tyler era o homem com quem Samantha sempre sonhara. Mas aquele homem frio e controlado parecia nem perceber que fazia seu coração bater acelerado! Samantha decidiu então que chegara a hora de conquistá-lo! E prometeu a si mesma que faria com que o coração de Tyler despertasse para o amor... Isto é, se ele realmente tivesse um coração!

Digitalização: Tatja Revisão: Cassia


Momentos Íntimos nº36

Perigosamente Sedutora

Carla Cassidy

Querida leitora, Nada como um bom romance para alegrar a vida. E nós temos romances para todos os gostos. É só você procurar nas bancas o herói dos seus sonhos. Tenho certeza de que irá encontrá-lo. Ah, e não perca as novas minisséries. Elas já estão nas bancas!

Janice Florido Editora Executiva Carla Cassidy Perigosamente Sedutora Copyright © 1998 by Carla Bracale Originalmente publicado em 1998 pela Silhouette Books, divisão da Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução total ou parcial, sob qualquer forma. Esta edição é publicada através de contrato com a Harlequin Enterprises Limited, Toronto, Canadá. Silhouette, Silhouette Desire e colofão são marcas registradas da Harlequin Enterprises B.V. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência. Título original: Reluctant wife Tradução: Dorothy Sophie Editor: Janice Florido Chefe de Arte: Ana Suely S. Dobón Paginador: Nair Fernandes da Silva EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. Rua Paes Leme, 524 - 10e andar CEP: 05424-010 - São Paulo - Brasil Copyright para a língua portuguesa: 1998 2


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. Fotocomposição: Editora Nova Cultural Ltda. Impressão e acabamento: Gráfica Círculo

CAPÍTULO I

A segunda coisa mais difícil que Samantha Dark já tinha feito fora retomar à sua cidade natal, Wilford, em Kansas. A primeira, haviam se passado seis anos, quando tinha ido embora. Não, não era bem assim, tinha fugido, ela se corrigiu enquanto colocava o carro num estacionamento em frente ao café local. Com a idade de vinte e três anos, ela fugira da sua família, deixando a pequena cidade para viver sozinha. Agora estava de volta, mas relutava em ir diretamente à mansão onde morara, e onde sabia que não havia ninguém a esperar por ela. Samantha olhou no relógio. Passava das sete horas. Queria comer alguma coisa antes de se dirigir á casa. Quando saiu do carro viu a figura de um velho saindo do café, e o reconheceu de imediato. — Jeb? Ele parou, fitou-a, e seu rosto enrugado se abriu num sorriso quando a reconheceu. — Samantha? Samantha Dark? — Jeb correu em direção á ela com passos rápidos, porém vacilantes. Samantha sentiu ternura quando ele a abraçou e depois deu um passo para trás para olhá-la melhor. Jeb sorriu. Aquele cálido e mágico sorriso sempre tivera o poder de fazer Samantha sentir-se melhor, por mais triste que estivesse. — Quando você chegou? — ele perguntou. — Nesse exato momento. Ainda nem fui para casa. — Samantha pegou-lhe as mãos e segurou-as entre as suas. — Você é a primeira pessoa que eu encontro. Diga- me, ainda é o zelador do cemitério? Ele assentiu com um gesto de cabeça. — O que mais eu poderia ser? É o único lugar onde os patrões não reclamam. Faço meu serviço, supervisiono a área e mantenho as crianças do lado de fora. — Você nunca me manteve do lado de fora — Samantha recordou-lhe, e largou as mãos do velho, lembrando-se de todas as vezes que Jeb a tinha acalmado e consolado. Ela fugia com freqüência do pai, quando ele era rude, sabendo que Jeb enxugaria suas lágrimas e acalmaria seu coração magoado. A primeira vez que encontrara Jeb ela estava escondida atrás de uma lápide, soluçando, infeliz, e ele a consolara. Isso fora o começo de uma amizade especial e duradoura. 3


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Você era um caso especial, Samantha. Fico muito contente em vê-la, pois estou enfrentando um problema muito grave. Talvez você possa ajudar. — O que é? Qual é o problema? Você sabe que farei tudo o que for possível para ajudá-lo. — Não é comigo, é com o meu menino. — Dominic? O que há de errado com ele? O que aconteceu? A imagem de Dominic Marcola, de uniforme, apareceu com nitidez em sua memória. Era um homem bonito, de cabelos e olhos negros poucos, anos mais novo do que ela. — Ele foi preso ontem. — O quê? Dominic... Preso? As rugas de Jeb pareceram ficar mais acentuadas pela expressão de desalento e preocupação. — Ele foi preso por assassinato. Samantha arregalou os olhos, surpresa com a notícia. Quando deixara Wilford, seis anos atrás, Dominic tinha acabado de ingressar na polícia. — Dizem que ele matou Abigail Monroe, mas meu menino jamais machucaria alguém. Querem pôr a culpa nele, e preciso da sua ajuda. — Minha ajuda? Jeb pegou uma das mãos de Samantha. — Por favor, fale com o Dr. Sinclair. Ele trabalhava para o seu pai, vocês cresceram juntos e tenho certeza de que atenderá um pedido seu... Peça que ele pegue o caso de Dominic. Não somos ricos, mas farei o que for necessário para que meu filho tenha o melhor, e Tyler Sinclair é o melhor advogado de defesa de Kansas. — Ele apertou a mão de Samantha. — Por favor, fale com ele, Samantha! A última coisa que gostaria de fazer era pedir um favor a Tyler, mas não podia esquecer que Jeb sempre estivera ao seu lado, enxugando-lhe as lágrimas, sossegando seu espírito e amenizando a dor causada pelas palavras cruéis do seu pai. — Falarei com ele e verei o que posso fazer — ela concordou. Agradecido, Jeb apertou-lhe a mão mais uma vez, com os olhos marejados de lágrimas. — Sinto muito por seu pai, Samantha — ele acrescentou. Samantha assentiu com um gesto de cabeça, sem saber o que responder. Ela também sentia muito e estava triste pelo acontecido. Sentia muito a respeito de várias coisas. Sentia muito por seu pai ter morrido havia duas semanas, e ela só ter sabido no dia anterior. Sentia muito por ele não ter ficado sabendo como ela mudara de vida por completo. Ainda agora, ela não conseguira aceitar a morte do pai. Não sabia como ele havia morrido. Se, ficara doente ou se sofrerá algum acidente. — Tenho de ir trabalhar — Jeb disse, interrompendo os pensamentos sombrios de Samantha. — Você me avisará sobre Tyler logo que for possível? — Claro. Fique tranqüilo. Farei o que puder. 4


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Estou feliz por você ter voltado menina. Já era tempo de regressar à sua terra. — Afastou-se com um sorriso triste. De volta a sua terra. Aquelas palavras ficaram ecoando em sua cabeça enquanto olhava Jeb se afastar. Havia fugido dali, buscando a felicidade em lugares distantes, no meio de estranhos. Não havia dado certo. De algum modo soubera que sua felicidade estava atada àquele lugar e que ela precisava exorcizar os demônios que a tinham expulsado dali. Voltou para o carro e a idéia de ter que falar com Tyler Sinclair lhe pareceu muito desagradável, mas teria de fazê-lo, mais cedo ou mais tarde. Ou, quem sabe, naquele momento fosse melhor. Ficaria livre da incumbência de uma vez. Tyler Sinclair. Quando Tyler tinha dezessete anos de idade, o pai de Samantha, Jamison Jackson Dark, tinha tomado o garoto sob sua responsabilidade e Tyler assumiu o lugar do filho que Jamison nunca tivera. Jamison dedicara toda a sua afeição, todo o seu orgulho ao jovem moreno e bonito que Samantha crescera desprezando. Talvez ele ainda estivesse no escritório. Tyler era fanático pelo trabalho e seis anos não o teriam mudado tanto. Sentiu uma leve satisfação quando parou na frente do escritório de advocacia do pai e viu que havia luz no segundo andar. Ela acertara. Tyler ainda estava lá. Samantha estacionou o carro, mas permaneceu sentada, juntando coragem para entrar. Tirou a chave da ignição e no mesmo chaveiro, encontrou aquela que abria a porta da frente do prédio de dois andares. Pensou que talvez o pai tivesse mudado a fechadura, mas duvidou. Jamison não costumava mudar. Era um homem rígido, metódico e previsível, o que sempre a desequilibrara. O prédio era cinza e irradiava dignidade e respeito entre as fachadas dos outros prédios. A vida de Samantha sempre girara ao redor daquele prédio, de onde seu pai dirigia os negócios e as duas filhas, com disciplina e rigidez, por detrás da escrivaninha de carvalho. Samantha lembrou-se de um Natal que comemoraram no escritório porque seu pai estava com um caso difícil e não quis se afastar de lá. Samantha sempre amara aquele prédio. Adorava o cheiro de papel e de tinta, o aroma do café aquecido por muito tempo e o cheiro dos lanches que o pai comia no lugar do almoço. Todos aqueles aromas combinados tinham para ela o odor da justiça. Por fim, ela desceu do carro e se dirigiu à porta da frente. A grande placa sobre a porta anunciava o estabelecimento, "Escritório de Advocacia Jamison Jackson Dark — Sócio Majoritário". As últimas palavras sempre a divertiram. Sócio majoritário? Ele sempre fora o único sócio. A chave entrou na fechadura. Samantha abriu a porta e entrou, tomando o cuidado de fechá-la de novo. Estava tudo em silêncio. O vestíbulo era pequeno, mas decorado com bom gosto. A mesa da recepcionista ficava a um canto da sala e no outro canto a escada que levava aos andares superiores. O escritório de Jamison ficava no primeiro andar e o de Tyler, no segundo. Parecia que nada havia mudado a não ser que seu pai estava morto. Não podia 5


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy acreditar que ele morrera e nem Tyler nem sua irmã Melissa a tivessem avisado. Afastou tais pensamentos para usar toda a sua energia para enfrentar Tyler. Samantha passou pelo escritório do pai, no primeiro andar, mas não parou, dirigindo-se direto para as escadas que levavam ao escritório de Tyler. Conforme subia os degraus se lembrava do rosto cansado e sofrido de Jeb e de seu olhar preocupado e desesperançado. Era o mesmo olhar que ela vira muitas vezes nos olhos dos clientes do pai. A idéia de Dominic matar alguém era absurda. Lembrava-se dele como um rapaz sério que desde criança almejara entrar para á policia. Samantha havia comparecido à cerimônia que o introduziu na força policial e nunca se esquecera do orgulho estampado no rosto dele e de Jeb. Jeb estava certo a respeito de uma coisa. Tyler Sinclair não só era o melhor advogado de defesa de Kansas, mas talvez o melhor do oeste do Mississipi. Por enquanto. A porta do escritório estava fechada, mas ela podia ouvir ruídos, mostrando que havia gente do lado de dentro. Ruído de papéis, ruído de uma cadeira. Mesmo com uma porta os separando, ela podia sentir a energia de Tyler. Seu poder vibrante. Sua arrogância. Respirou fundo, abriu a porta e entrou no escritório. Ele estava sentado atrás da escrivaninha, recostou-se na cadeira e sorriu. — Olá, Samantha! Estou esperando por você há duas semanas. Irritada ela respondeu: — Isso é estranho. Como poderia estar me esperando se nem ao menos me avisaram a respeito da morte de papai? Ele pegou da gaveta um monte de cartas e as colocou sobre a mesa. Samantha deu um passo à frente, se aproximando o suficiente para ver que eram endereçadas a ela e todas tinham o carimbo de devolução do correio. Ela sentiu-se corar. — Eu mudei. E acho que o aviso de mudança de endereço expirou. — Isso dificultou um pouco nosso contato com você. Tyler apontou para uma cadeira em frente da escrivaninha. — Por favor, sente-se. Temos algumas coisas para discutir. Apesar de ter preferido permanecer em pé para sentir-se com alguma vantagem sobre ele, Samantha sentou-se. — Dê-me apenas um momento. — Tyler fez algumas anotações numa folha de papel e enquanto isso Samantha aproveitou para estudá-lo. Seis anos não o tinham mudado muito. Apenas seus traços estavam mais definidos o que o deixava ainda mais bonito. Ele tinha vinte e seis anos quando ela se foi. Portanto estava agora com trinta e dois. Seus cabelos grossos e negros estavam bem penteados e sem nenhum fio branco, e as pequenas linhas nos cantos dos olhos lhe acrescentavam o charme que geralmente vinha com a idade. Apesar do adiantado da hora e de ele estar sozinho, ainda vestia o paletó e a 6


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy gravata estava no lugar certo. Samantha tinha certeza de que seu longo dia transparecia na sua roupa amassada e nas mechas de cabelos que se soltaram do coque. Havia passado batom antes do almoço e não o retocara, e suspeitava de que o rímel devia estar manchado. Tyler sempre a havia feito sentir-se desse modo: inadequada e desleixada. Samantha endireitou as costas, lembrando a ela mesma que não era mais a jovem de vinte e três anos, sem autocontrole, de quando fora embora. Agora tinha vinte e nove anos, havia se formado em Direito com louvor, e não ia ser intimidada pela petulância do homem que estava na frente dela. — Pronto. — Ele pôs a caneta na mesa e fechou a pasta na qual estava trabalhando. Mais uma vez, recostou-se na cadeira e seus olhos azuis a fitaram com um jeito divertido que a fez ter vontade de gritar. — Uma vez que não conseguimos contatá-la para lhe informar da morte de Jamison, como você descobriu? — Tenho uma assinatura do jornal de Wilford, mas infelizmente não o leio todos os dias. Ontem estava organizando alguns papéis e encontrei o obituário. O olhar de Tyler ficou sério. — Sinto muito que você tenha sabido dessa maneira. Samantha ergueu os ombros. — É minha culpa. Não me lembrei que o prazo de correção de endereço tinha expirado e que meu telefone ainda não está na lista. Também era sua culpa ter ficado, de propósito, sem contato com todas as pessoas de Wilford. Sentiu remorso, mas tentou parecer o mais fria possível. — Como ele morreu? — Sua voz traiu a emoção que estava sentindo, e a frieza que tentava aparentar. — Foi um acidente. Ele caiu da sacada do quarto de sua mãe. Samantha olhou para ele estarrecida. Sua mãe tinha morrido da mesma maneira, quando Samantha tinha apenas seis anos de idade. — Não é possível... — sua voz não passava de um sussurro. — Papai não entrava naquele quarto havia mais de vinte anos, desde que mamãe morreu. E ele nunca chegaria perto da amurada, pois tinha pavor de altura. — Os fatos mostraram o contrário. Ele foi encontrado na manhã seguinte. A amurada da sacada estava velha e podre. Aparentemente quebrou e ele caiu. Havia alguma coisa errada. Samantha sentia, mas não sabia o que poderia fazer a respeito. Tyler debruçou-se um pouco sobre a mesa e Samantha pôde sentir seu perfume. Uma colônia suave misturada com o cheiro de sabonete. Um odor agradável que fez com que Samantha se lembrasse de fatos antigos. Lembrou-se de estar aninhada nos braços de Tyler, dentro de um carro, sua mão acariciando as coxas firmes dele. Era o mesmo perfume daquela noite em que os dois haviam se desejado. Samantha voltou para o presente, recusando-se a ir mais longe, sem querer lembrar7


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy se da maior humilhação por que passara: á noite em que ela tentara seduzir o grande Tyler Sinclair. — Seu pai deixou um testamento — Tyler disse. — De acordo com os termos do testamento, você e Melissa ficam com a casa e tudo que há nela. Eu moro lá desde que Melissa se casou, mas deixarei o lugar se você resolver ficar na cidade. — Pretendo ficar aqui, mas você não precisa se mudar. A casa é grande e não há necessidade de mudarmos nada até que eu fale com Melissa e decidamos o que fazer. Samantha passou a mão pela testa, como se fosse assaltada por informações demais. — Quando Melissa se casou? — Perdera tantos acontecimentos devido à sua teimosia e orgulho, e de repente sentiu uma grande necessidade de ver a irmã. — Ela se casou seis meses após você ter ido embora, mas se separou do marido há pouco tempo. — Ela se casou com alguém que eu conheço? Tyler negou com um gesto de cabeça. — Acho que não. Seu nome é Bill Newman. Ele se mudou para cá logo depois que você partiu. Dirige uma empresa de aquecimento e refrigeração. Mais uma vez Samantha passou a mão pela testa sentindo que uma dor de cabeça estava se aproximando. — Não posso me conformar por ter ficado tanto tempo sem contato — disse com um tom de arrependimento. — Lembro-me de que quando você partiu, disse que nunca mais iria querer ouvir, pensar ou falar com alguém de Wilford para o resto de sua vida — Tyler a lembrou com frieza. — E há ainda algumas pessoas em relação às quais penso do mesmo modo — Samantha respondeu, esperando que ele percebesse que estava incluído na lista. — Mas eu cresci nos anos que estive fora, e sei que às vezes é necessário lidar com pessoas das quais não gostamos. Mais uma vez uma ponta de bom humor passou pelos olhos de Tyler. — Estou contente que pense dessa maneira, porque parece que você e eu teremos que negociar um com o outro daqui em diante. — Por quê? Do que você está falando? — Seu pai deixou instruções para a firma. Cinqüenta por cento para você e cinqüenta por cento para mim. — Parabéns! — exclamou com sarcasmo. — Acho que bajular meu pai durante todos esses anos, afinal surtiu efeito. Dessa vez, o olhar de Tyler mostrou raiva e talvez um pouco de mágoa. O que a surpreendeu. Ela nunca havia visto aquela expressão antes. Tyler se levantou e foi até a janela, dando as costas para ela, que se arrependeu do comentário infantil. Em seguida, Samantha lembrou-se de que ele sempre conseguira fazer aflorar o que ela tinha de pior. — Sei que você não acredita em mim, Samantha, mas eu gostava do seu pai. E nunca 8


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy me importei com o dinheiro dele. Ele virou-se e fitou-a com uma expressão fria. — Farei uma boa oferta pela sua parte do negócio — Tyler disse. — Isso é muito engraçado. Eu estava pensando em lhe propor a mesma coisa. Por um momento os dois ficaram se olhando, sócios com partes iguais, mas nenhum deles interessado nessa sociedade. "Como pode um homem com uma aparência tão sensual ser na realidade tão frio?", Samantha pensou. O rígido autocontrole de Tyler sempre fora uma das coisas que mais a irritara. Ela gostaria de vê-lo, pelo menos uma vez, perder o controle. — E quanto a Melissa? Papai não deixou para ela alguma parte da firma? Tyler meneou a cabeça. — Ele lhe deixou uma generosa poupança. Samantha levantou-se e mudou de assunto. — Parei no café logo que cheguei e encontrei Jeb Marcola. Ele quer que você represente Dominic e me pediu para pleitear isso com você. — Eu sei. Ele já me telefonou uma dúzia de vezes desde que Dominic foi preso. — Você vai pegar o caso? Tyler negou com um gesto de cabeça. — É um caso perdido. Pelo que sei, as provas circunstanciais são tão evidentes como o arsênico colocado na comida para envenenar alguém. — Ah, agora sei como conseguiu a fama de invencível! Você só pega casos fáceis. Mais uma vez o olhar de Tyler ficou sombrio, mas seus lábios esboçaram um sorriso. — Um bom advogado pega seus casos por instinto. E os meus instintos me dizem para ficar fora desse caso. — Conheço Dominic e sei que ele não mataria quem quer que fosse. Tyler deu a volta na mesa e parou perto dela. — Você conhecia Dominic. Você está fora há seis anos, Samantha. Acontecem coisas e as pessoas mudam. — As pessoas não mudam tanto. Dominic não é um assassino. — Como sempre, está pensando com o coração em vez de pensar com a razão. Samantha deu um passo para trás, o coração batendo num ritmo fora do normal à aproximação de Tyler. — Estou surpresa que você reconheça isso, uma vez que não tem coração. Ele riu e voltou para trás da mesa. — Um bom advogado não precisa ter um coração. — Ele sentou-se. — De fato, a maioria dos advogados acha que ter coração é uma deficiência. Samantha pensou que o pai havia sido um ótimo professor para Tyler. Era a própria filosofia de vida de Jamison Jackson Dark. — Então... Você não vai pegar o caso? — Não quero esse caso. Isso vai se tornar manchete de jornal e essa firma sempre foi conservadora, mantendo-se afastada de casos controvertidos e sensacionalistas. 9


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Samantha suspirou ao lembrar-se do rosto de Jeb. Ela tinha que ajudá-lo... Ajudar Dominic. Jeb sempre fora muito bom para ela. — Eu agora tenho cinqüenta por cento dessa firma? — ela perguntou. — Sim, e o Escritório de Advocacia continua não pegando casos desse tipo. — Agora pega. — Ela sorriu, tirou da bolsa uma cópia do diploma de direito e jogou sobre a mesa. — Se você não vai representá-lo, então eu o farei. Até mais tarde, sócio. Samantha saiu do escritório deixando-o chocado. Só quando entrou no carro é que se deu conta do que acabara de fazer. Com a ousadia que sempre a colocara em situações difíceis no passado, ela acabara de anunciar a intenção de defender Dominic Marcola da acusação de assassinato. Ia ser o seu primeiro caso criminal. Na realidade ia ser o seu primeiro caso. Mas o que mais a aborrecia, era não ter a certeza de que pegara o caso por acreditar em Dominic, ou por querer provar alguma coisa a Tyler Sinclair. O caos havia voltado. Foi isso que Tyler pensou quando Samantha saiu do escritório. Sempre soubera que um dia isso aconteceria. O que ele não esperava era que ela voltasse formada em Direito. Tyler recostou na cadeira, e olhou para a fotocópia do diploma em suas mãos. Ele pensara que ia conseguir comprar a parte dela na firma. Tinha dedicado toda a sua vida para essa firma, sempre com a promessa de Jamison de que um dia, seria dele. Não contava com o fato de Samantha vir a ser sua sócia. Mas não deveria estar tão surpreso, pois Samantha sempre fizera coisas inesperadas. Isso era parte do seu charme, a parte que o deixava louco e o atraía. Mas Tyler não a queria na firma, e nem na sua vida. Ela acabava com seu autocontrole, o fazia ficar irracional, fazia-o sonhar com coisas que há muito havia posto de lado. Samantha era uma ameaça a tudo o que ele conseguira com tanto trabalho. Fechou os olhos e a imagem dela povoou sua mente. Os cabelos loiros de Samantha, seus olhos castanho-claros brilhantes e cheios de vida, seu porte esguio, as pernas bem torneadas, os quadris arredondados e provocantes. Ela estava ainda mais bonita, os anos lhe haviam acrescentado charme e um olhar sedutor e confiante, comum nas mulheres que tinham consciência de sua beleza. Diferente da irmã mais nova, que parecia sempre pronta a seguir regra, Samantha gostava de quebrá-las. Podia mentir sem piscar e tinha o dom de sair de qualquer situação, por mais tensa ou difícil que fosse. Tyler sorriu conformado. Ela seria uma advogada terrível. Mas Samantha não poderia estar falando sério a respeito do caso Marcola. Seria um suicídio para a carreira dela. Não pôde evitar lembrar-se do que ela havia afirmado sobre o fato de ele só pegar casos fáceis. Não era verdade. Tinha pegado casos difíceis e ele também perdera alguns. O que mais o desagradava no caso Marcola era o fato de ter elementos que tomaria o caso sensacionalista, bem ao gosto dos tablóides. Já tinha saído não só nos jornais locais, mas também nos jornais de Kansas. A mídia iria fazer alarde, e Tyler não queria fazer 10


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy parte de manchetes de jornal. Além disso, o escritório não costumava pegar casos de assassinato. Se Samantha estivesse falando a sério e Dominic a aceitasse como advogada, Tyler tinha o pressentimento de que seria engolido pelo caso. Sim, o caos tinha voltado e... Seu nome era Samantha.

CAPÍTULO II

A mansão dos Dark ficava numa colina, de onde se avistava a pequena cidade de Wilford, em Kansas, como se fosse o castelo de um senhor feudal que de cima pudesse avistar e dominar todo o seu reino. E, na realidade, Jamison Dark tinha sido rei de Wilford. Possuía metade das terras da cidade e tinha sido um poderoso amigo para os seus comandados e um perverso adversário para quem se opunha a ele. A luz da varanda estava acesa, como se desse as boas- vindas a quem chegasse. Mas Samantha sabia que isso era mera ilusão. A casa nunca possuíra qualquer calor de afeição familiar. Sempre fora fria e austera, uma perfeita réplica de seu pai. Samantha bateu na porta da frente, pensando se a governanta que tomava conta da casa com mãos de ferro, ainda seria a mesma. Logo, Virgínia Wilcox abriu a porta, e seus olhos negros brilharam de surpresa. — Samantha! — ela exclamou como se o nome pusesse um gosto amargo na sua boca. — Olá, Virgínia. Samantha correu o olhar ao redor da rígida mulher grisalha. Odores familiares a assaltaram: o perfume do polidor de móveis, misturado com o odor da lenha na lareira da sala de visitas. Seu pai sempre amará ter a lareira acesa e só nas noites muito quentes abria mão desse capricho. Embora Virgínia não demonstrasse o mínimo de emoção, Samantha pôde sentir sua surpresa e desprazer quando depositou a bagagem no chão. — Meu quarto ainda está disponível? — perguntou à governanta. — É claro! O Sr. Tyler me telefonou há alguns minutos e me pediu que o preparasse. Samantha pegou uma das malas, suspirando de descontentamento quando ela se abriu e as roupas se espalharam. — Eu pego — Samantha disse, apesar de Virgínia não ter se movido. — Você pode voltar ao que estava fazendo. Sei o caminho para o meu quarto. Virgínia concordou e saiu do vestíbulo com um silêncio de desaprovação. Samantha a seguiu com o olhar, e então se curvou para apanhar as roupas levando apenas um 11


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy minuto para perceber que teria que fazer duas viagens, pois não havia maneira de colocar as roupas dentro da mala quebrada. Subiu á escada de dois em dois degraus pensando qual seria o quarto ocupado por Tyler. Provavelmente o azul. Podia até visualizá-lo naquele quarto, com mobília masculina e o papel de parede azul-marinho e prata. Ao passar pelo quarto, Samantha parou, abriu a porta e deu uma olhada no seu interior. O cômodo tinha o cheiro da colônia que Tyler usava e o closet estava aberto, deixando entrever os ternos dependurados com muita ordem. Fechou a porta e continuou andando pelo longo corredor, até o seu próprio quarto. Com a graça de Deus, enquanto ela estivesse ali, Tyler estaria num dos extremos do corredor e ela, no outro. Samantha não se surpreendeu por Tyler morar ali. Ela tinha catorze anos quando seu pai apresentou seu protegido e nesse exato momento ficou óbvio que dali em diante Tyler iria receber do seu pai todo o amor, respeito e amizade que ela sempre esperara dele. E fora naquele momento que ela começara a odiar Tyler Sinclair. Samantha abriu a porta do seu quarto. Estava exatamente como ela ô deixara seis anos atrás. As janelas altas estavam abertas e as cortinas descerradas. Não parecia estar desocupado havia tanto tempo. A cama branca, feminina, estava com uma colcha colorida, de babados, que ela tinha escolhido quando tinha doze anos de idade. Ela jogou na cama as roupas que estava segurando e começou a andar pelo quarto, tocando nos velhos e familiares objetos, deixando que sua memória corresse livre. Ali estava á caixa de música que tinha ganhado de Samuel Edwards, um rapaz que seu pai considerara indigno de uma Dark. O animal de pelúcia que ela ganhara numa feira que passara pela cidade quando tinha dezesseis anos. Os dedos de Samantha acharam suas iniciais, gravadas por ela no lado da cômoda, com uma faca, e sentiu vergonha da infantilidade que a tinha impelido àquilo, como se riscando a mobília ela pudesse ferir seu pai. Samantha passara muito tempo naquele quarto, para onde geralmente era mandada como castigo por ter infringido as rígidas leis do pai. Quando ficou mais velha, achara outros lugares para esconder-se da condenação do pai, lugares muito menos apropriados. Fizera muitas escolhas erradas, na impetuosidade da juventude, e estava triste por seu pai não estar ali para ver a mulher na qual ela afinal se tornara. — Você quer comer alguma coisa? Samantha se virou e viu Virgínia à porta. A mulher movia-se como um animal na selva, sem fazer ruído algum. — Não, não... Obrigada. — Então vou embora. Já está na minha hora. — Antes que se vá, pode me dar o número do telefone de minha irmã? A feição de Virgínia se suavizou. — É claro. Ela telefona quase todos os dias. — Espere, deixe-me pegar um pedaço de papel e um lápis. Samantha pegou a bolsa e procurou o que estava precisando. É claro que Melissa telefonava todos os dias. Ela sempre fora a filha boazinha. 12


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Pronto. Pode falar — Samantha disse com um lápis na mão. Virgínia disse o número com um tom de voz seco e severo. — Obrigada e até amanhã. Com um breve meneio de cabeça, Virgínia saiu do quarto. Poucos minutos mais tarde, Samantha ouviu o barulho do motor de um carro. Sabia que era Virgínia saindo. Olhou para o número do telefone em sua mão, pensando no que estaria Melissa fazendo naquele momento. Depois da morte da mãe, as duas nunca mais tinham sido muito íntimas, mas houve momentos nesses seis anos em que Samantha sentira muita falta da irmã. Sem se dar tempo para refletir, Samantha sentou-se na beirada da cama e pegou o telefone na mesa-de-cabeceira. Discou os números e esperou. No segundo toque a voz familiar de Melissa atendeu. — Melissa, é Samantha. Seguiu-se um silêncio. Então Melissa respondeu: — Pensei que não fosse mais vê-la e nem ouvi-la. Onde você está? — Em Wilford. Em casa. Senti muito ter perdido o funeral. — Todos em Wilford compareceram. Parecia o enterro de uma celebridade — a voz de Melissa era fria, distante. — Quanto tempo você vai ficar na cidade? — Não pretendo mais ir embora. Samantha desejou voltar no tempo e abraçar a garotinha que a seguia como uma sombra. Mas sabia que essa garota não mais existia, colocada de lado pela irmã mais velha, que tinha muito ódio dentro de si para se unir à irmã. — Gostaria de vê-la. Podemos, talvez, almoçar juntas amanhã? Outra vez, uma longa pausa, como se Melissa não estivesse certa de querer encontrar Samantha para almoçar. — Está bem. Samantha sentiu-se mais tranqüila. — Ótimo. Onde nos encontraremos? — Que tal no clube? Samantha hesitou. Sempre odiara o clube de campo, mas chegou à conclusão de que o lugar não importava desde que se encontrasse com a irmã. — Está bem. Encontro você por volta do meio-dia. Despediram-se e Samantha desligou, pensando na irmã. Tyler lhe dissera que ela havia se separado do marido. Por que então Melissa não estaria morando ali? Onde seria sua casa? Quantas perguntas. Talvez... Talvez fosse tarde demais para que as duas se tornassem amigas. Mas Samantha queria ao menos tentar. Quem sabe, sem a interferência do pai, poderiam encontrar o amor fraterno que tinham perdido através dos anos. Samantha nunca tinha se importado em ficar sozinha, mas agora percebia que havia diferença entre a solidão e o isolamento. Nos últimos anos de sua vida, ela tinha estado 13


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy isolada, longe de todos e estudando com afinco. Distante, em sua memória, ouvia o eco das risadas de duas garotinhas e da mãe. Quando sua mãe morrera, a risada tinha ido com ela e as duas meninas foram se afastando uma da outra. A mãe era o elo que as unia. — Não era tarde demais — Samantha disse para si mesma. Não é tarde demais para recuperar a intimidade que uma vez tivera com Melissa. Poderia ser necessário tempo e paciência, mas apesar de Samantha nunca ter tido muita paciência, tempo não lhe faltaria. Com esses pensamentos, saiu do quarto e dirigiu-se ao quarto que fora da mãe. Abriu a porta e entrou sem acender a luz. Por um momento, fechou os olhos e imaginou sentir a fragrância que a mãe usava. Um suave aroma floral. Respirou fundo, desejando poder capturar o perfume para sempre. Quando abriu os olhos, percebeu que era tudo fruto da sua imaginação e o odor que sentia era, na realidade, o aroma de um quarto que estava fechado havia muito tempo. Acendeu a luz e olhou ao redor. Tudo estava como quando sua mãe era viva. A penteadeira ainda exibia os perfumes e os cremes, como se sua dona tivesse apenas saído para se divertir e fosse voltar a qualquer momento. Apesar do cheiro, o quarto parecia limpo. Virgínia devia limpá-lo de vez em quando. Samantha nunca entendera seu pai, que não derramara uma só lágrima ou mostrara qualquer tipo de emoção pela morte da mulher, mas se recusara a permitir qualquer mudança naquele quarto. Era um tipo de dicotomia de sentimentos que ele sempre demonstrara. Até mesmo ela e a irmã foram proibidas de entrar no quarto. Com um misto de curiosidade e medo, Samantha se aproximou das cortinas de brocado dourado que cobriam as portas da sacada. Com as mãos trêmulas, abriu as cortinas e as portas. O ar frio da noite a acariciou quando saiu para a sacada. Bem na sua direção havia um rombo na amurada, coberto por uma ripa de madeira, como medida de segurança. Depois da queda e morte da mãe, Samantha ainda se lembrava de Virgínia implorando a seu pai que consertasse a amurada e lacrasse as portas. Mas isso nunca havia sido feito. A sacada permanecia do mesmo jeito depois de tantos anos. E por ironia, seu pai havia morrido do mesmo modo que a mãe. De novo, ela teve a sensação de que havia alguma coisa errada. Não se lembrava de uma única vez que seu pai tivesse entrado naquele quarto e muito menos saído na sacada. Apesar da personalidade forte, Jamison tinha pavor de altura. Samantha aproximou-se da amurada com cautela e olhou para o terraço de concreto abaixo. O que seu pai teria ido fazer ali? Como tinha vencido o medo e se aproximado da amurada? — Você não deveria estar aqui. Samantha deu um grito de surpresa e susto, se virou e deparou com Tyler à porta. — O que você está tentando fazer? Quer que eu tenha um ataque de coração? Passou por ele e entrou no quarto com as pernas tremendo pelo susto que levara. 14


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Acho que isso é seu. — Ele segurava peças de lingerie. Um conjunto de sutiã e calcinha de renda cor-de-rosa, que lhe escaparam da mão e caíram no chão. — Estavam no vestíbulo. Samantha sentiu-se corar e com rapidez pegou as peças do chão. — Minha mala quebrou — ela explicou. E acrescentou logo em seguida: — Quero ver o relatório da autópsia do meu pai. Tyler pareceu surpreso. — Você terá que pedir ao médico legista. Não tenho uma cópia. — Ele apertou os olhos e perguntou: — Está querendo mexer em caixa de marimbondos, Samantha? — Não pretendo mexer em nada — ela replicou. Tyler a seguiu enquanto ela saía do quarto da mãe. — Quero apenas saber os detalhes sobre a morte do papai. — Samantha dirigiu-se à escadaria e começou a descer. — Por que você não me oferece uma bebida e me conta o que se passou por aqui desde que fui embora? Tyler a seguia sentindo uma leve inquietação. Samantha estava em casa havia menos de uma hora e sua presença já era bem evidente. Suas roupas íntimas espalhadas no vestíbulo despertaram-lhe pensamentos, um tanto obscenos, sobre o corpo esguio e bonito de Samantha vestida com aquela calcinha de renda transparente e o minúsculo sutiã. O fogo que Virgínia deixara aceso na lareira da sala crepitava agradavelmente. Enquanto Samantha se dirigia ao bar, Tyler sentou-se num dos sofás, com a esperança de que ela não bebesse o suficiente para tentar seduzi-lo como o fizera alguns anos atrás. Ele estava cansado, sentia-se estranho e não queria enfrentar cena desagradável alguma. — O que você quer beber? — Samantha perguntou por detrás do balcão de mármore do bar. — Uísque. Colocou duas doses de uísque num copo, e se serviu de um copo de soda com uma fatia de limão. — Não se surpreenda — ela disse quando lhe entregou o copo. — A última vez que bebi foi á noite que você me tirou do bar do James. Naquela noite percebi que o álcool me deixa estúpida. Tyler não a tinha achado estúpida e sim terrivelmente sexy e arrojada, o que quase ô fez jogar para o alto tudo pelo que havia trabalhado, incluindo seu auto-respeito. — Então, você parou de beber e se tornou uma advogada. Conduta exemplar. — Conduta própria de uma Dark — ela comentou com uma ponta de ironia, enquanto sentava-se perto dele. Tyler sorriu. — Sempre é louvável ter conduta apropriada. — Não quando ela lhe suga a vida. — Samantha olhou-o de lado, sob os cílios longos. — Além do mais, condutas impróprias são muito mais divertidas. Ele manteve o sorriso, embora sentisse o sangue ferver. 15


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Não há nada de errado em andar conforme as regras — Tyler reafirmou. Os olhos castanho-claros de Samantha refletiam curiosidade. — Diga-me uma coisa, Tyler, você sempre foi assim rígido e intransigente ou foi meu pai que o transformou? Ele riu achando, como sempre, que Samantha era um mistura de candura e irritante impetuosidade. — Diga-me você uma coisa, Samantha: algum dia vai crescer ou continuará sendo uma fedelha rebelde que fala o que quer? Por um momento, os dois ficaram se encarando sem vontade de desviar o olhar. Por fim, Samantha baixou os olhos, rindo suavemente. — Empatamos. Tyler concordou, tomou um gole do uísque, enquanto a observava andar até a lareira. Aos vinte e nove anos, a beleza da jovem de alguns anos atrás havia florescido. A boca que antes parecia um pouco grande, agora estava em perfeito equilíbrio com seu rosto e seus lindos olhos castanho-claros tinham matizes sombreados que lhe davam um ar de mistério e sedução. "Sim, ela sempre foi muito bonita", pensou Tyler, que continuava vislumbrando em Samantha todas as características que ele nunca gostara numa mulher. Mas Tyler tinha consciência de que Samantha representava um perigo para ele. Se fosse um tipo diferente de homem, não se importaria em partilhar com ela uma noite de paixão, mas isso poderia arruinar todos os sonhos e planos que ele construíra para si. Apesar da grande atração física que sempre sentira por ela, não pretendia deixá-la atrapalhar sua vida particular, e nem sua vida profissional, pegando o caso de Dominic Marcola. — Samantha, não pode pegar o caso de Dominic. Ela parou de andar e encarou-o com olhos brilhantes, que o fizeram se arrepender de imediato do que havia dito. As palavras não pode não funcionavam com Samantha. Era como acenar com uma bandeira vermelha para um touro. — Sim, eu posso. Se Dominic concordar que eu o represente, será exatamente o que farei. — Você nem mesmo sabe dos detalhes do caso — Tyler objetou. — Me informarei. — Vai ser um caso tumultuado e com muita divulgação. Samantha ergueu os ombros e deu um sorriso irreverente. — Acho que minha fotografia sairá bem nos jornais. Tyler tomou outro gole, desejando que a bebida fosse mais forte. — Você vai se machucar — ele insistiu. — Não será a primeira vez. — Sentou-se de novo ao lado dele. — Se você não quer que eu pegue o caso, faça você. Tyler meneou a cabeça, num gesto de negação. — Não posso. Nunca peguei um caso desse tipo. 16


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Mas você já defendeu crimes... — ela protestou. — Não um caso de assassinato, Samantha! Não vou representar Dominic Marcola e está acabado. Tyler não podia lhe contar o verdadeiro motivo. Era uma coisa que ele tinha enterrado muito tempo atrás e não pretendia revolver o passado, e expô-lo a quem quer que fosse. — Você não está me dando alguma razão válida — ela insistiu. — Não lhe devo explicações pelas decisões que tomo. — Então, representarei Dominic. Como sócia da firma, em iguais condições, tenho à minha disposição todos os recursos que você tem. — E se ele for mesmo culpado? Ela lançou-lhe um olhar surpreso, como se tal possibilidade nunca tivesse passado por sua mente. — Então verei se eu posso atenuar as circunstâncias e conseguir a pena mínima. Sem que Tyler percebesse, estavam sentados tão próximos que ele podia sentir o perfume dela e ver a minúscula pinta que Samantha tinha do lado esquerdo do lábio inferior. — Sabe — ela continuou —, fui estudar Direito exatamente para defender pessoas que não tem quem as defenda. Aquele era um lado de Samantha que ele não conhecia. Por que o caso era tão importante para ela? O que Dominic Marcola significava para ela? — Esse caso é complexo demais para você trabalhar nele sozinha. Dominic vai enfrentar a pena de morte. Ele precisa de um advogado experiente e não de uma principiante que mal sabe o caminho do tribunal. Ela franziu o cenho e atacou: — O melhor advogado não quer o caso. Além disso, tenho uma vantagem sobre outros advogados. — E qual é? — Ao contrário de outros profissionais que conheço, ainda tenho um coração, e ele me diz que Dominic é inocente. Tyler terminou seu uísque e se encaminhou para o bar. Virou e encarou-a. — Você está numa profissão que roubará seu coração, Samantha. Não é uma carreira que se enfrenta com superficialidade, por se estar entediado e querer provar alguma coisa. Samantha olhou para ele com raiva. — Não estou jogando e não sou uma menininha rica brincando de advogada. Tenho consciência das implicações de um caso como este. — Ela ergueu a cabeça e continuou a enfrentá-lo: — Do que você realmente está com medo, Tyler? De que eu seja boa? Talvez superior a você, e que possa usurpar sua posição de melhor advogado de Kansas? Tyler caminhou até ela e os dois se entreolharam desafiadoramente. — E isso que o caso representa para você, Samantha? Está interessada em defender Dominic para provar que é melhor do que eu? 17


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Tyler ergueu a mão e deslizou-a pelo rosto de Samantha, que permitiu a carícia, sempre com o olhar desafiador. Ficou encantado com a suavidade da pele delicada e com a paixão e vivacidade com que ela defendia seus pontos de vista. — Você está prestes a pegar um caso que vai abalar suas convicções. Os que não têm coração é que vencem. Samantha deu um passo para trás, o rosto corado. — Talvez essa discussão venha a ser inútil, e Dominic nem aceite que eu o represente. Tyler abaixou a mão e riu com sarcasmo. — Samantha, eu duvido que nosso bom policial escape da sua esperteza. Se você quer ser sua advogada, ele aceitará. Você consegue convencer até o diabo. "E a reputação do nosso escritório de advocacia estará em suas mãos", ele pensou. — Saberemos amanhã. Pretendo falar com Dominic logo pela manhã. — Samantha olhou no relógio de pulso. — Acho que está na hora de ir para a cama. Foi um longo dia e penso que amanhã será ainda mais longo. "Sim, amanhã será um longo dia", Tyler pensou enquanto a olhava subir a escada. Serviu-se de outra dose de uísque e sentou-se na frente do fogo. Olhava para as labaredas que dançavam e pensou em Jamison Jackson Dark. O velho ia se mexer na sepultura se soubesse das intenções da filha. O escritório dele sempre trabalhara com os crimes de colarinho-branco, e sempre se mantiveram afastados de publicidade. Certamente Jamison não se surpreenderia com os planos da filha mais velha, pois Samantha passara a adolescência e os primeiros anos da vida adulta flertando com problemas, fazendo péssimas escolhas e agindo como uma garota rebelde, embora Tyler suspeitasse de que fosse apenas para chamar a atenção do pai. Jamison havia sido um homem brilhante... Mas difícil. Ele inspirava medo, respeito, mas raramente amor. Mesmo assim, dera a Tyler uma chance de se tornar alguém na vida. Ele vira em Tyler alguma coisa que valia a pena salvar e por causa disso sempre lhe seria agradecido, mas não a ponto de deixar Samantha arruinar tudo que o pai dela e ele haviam conquistado durante tantos anos... Samantha não gostava de Tyler, nunca havia gostado. Ele era um clone rejuvenescido de seu pai, com a mesma arrogância pomposa e a mesma rigidez de atitudes. Mas havia alguma coisa em Tyler que despertava nela uma forte paixão. Talvez fosse seu enigmático passado. Ela não sabia nada a respeito, e de onde ele tinha vindo. Ele simplesmente aparecera na vida de sua família um dia, e nunca mais fora embora. Tyler conseguira o respeito de seu pai, roubando todo amor que ele pudesse ter pelas filhas. Tomara-se o filho que Jamison sempre quisera ter e Samantha o odiava por isso. Ela ouvira, com freqüência, os dois conversarem na sala de visitas, rindo e trocando as experiências do dia. Era um ritual masculino cuja entrada sempre fora vedada a ela. Samantha pendurou o resto das roupas e foi até a janela. Afastou as cortinas e de 18


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy onde estava era possível avistar a sacada do quarto da mãe. Mais uma vez, as dúvidas surgiram em sua mente. O que seu pai teria ido fazer lá? Em todos os anos que vivera naquela casa nenhuma vez vira o pai entrar naquele quarto. O que o teria feito ir até aquela sacada e se debruçado na amurada velha e podre? Suicídio? Nunca poderia imaginar uma atitude dessas do pai, por quaisquer que fossem os motivos. Então quais eram as alternativas? Um acidente que não fazia o menor sentido? Ou assassinato? Sentiu um frio percorrer-lhe a espinha ante esse pensamento. Seria possível que ele não tivesse caído e sim, empurrado? Largou as cortinas e afastou-se da janela. Sempre que um assassinato era cometido, a primeira pergunta era sobre quem ganharia com essa morte. Por certo, ela e Melissa poderiam ganhar com a morte do pai, mas pensar na irmã cometendo um crime não fazia sentido. Samantha sentou-se na cama, e continuou na mesma linha de pensamento. A outra pessoa que poderia ganhar com a morte de Jamison Jackson Dark era Tyler. Samantha franziu as sobrancelhas e passou á mão na testa, a dor de cabeça que sentira pela manhã voltava a acometê-la, dessa vez com mais força. O pensamento de Tyler cometendo um crime era tão ridículo quanto o anterior. Impossível. Samantha não gostava de Tyler, mas isso não o tornava um homem capaz de cometer um assassinato. Estava cansada e em razão disso, mais suscetível àqueles pensamentos. Tyler nada significava para ela, a não ser um sócio. Precisava ter isso em mente para resolver os problemas que tinha e que não eram, poucos. Queria se aprofundar nas circunstâncias da morte do pai precisava lutar para tentar salvar Dominic, e mais do que tudo, queria achar um modo de forçar Tyler Sinclair a sair do escritório e da sua vida.

CAPÍTULO III

Samantha acordou mais cedo do que de costume. Tomou banho e vestiu um conjunto de duas peças que lhe dava a aparência profissional necessária para visitar Dominic na cadeia. Alguns minutos mais tarde; se olhou no espelho do banheiro enquanto prendia os cabelos num coque, na altura do pescoço, com olhar crítico. A camisa parecia mais curta do que se lembrava da última vez que usara e o batom estava brilhante demais. Tirou o excesso com um lenço de papel, ajeitou a camisa e desceu para o desjejum. O cheiro de café fresco chegou até ela quando entrava na requintada sala de jantar. 19


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy No bufê de madeira antiga já estava depositada uma bandeja com um serviço de café completo. Ela se serviu e sentou-se à mesa, onde já estava o jornal da manhã. Samantha não pegou o jornal, pois não queria ler a respeito do caso Marcola, preferindo ter a primeira impressão direta do seu provável cliente. Muitos acusados haviam sido julgados e condenados pela mídia, e ela não queria correr o risco de se influenciar e acreditar em alguma coisa além dos verdadeiros fatos. Enquanto tomava café, tentou pensar apenas no encontro que iria ter com Dominic. Não queria que sua mente se dispersasse com outras preocupações. Sentiu o sutil perfume da colônia de Tyler antes mesmo de vê-lo. Virou a cabeça para a porta e seu perfume o antecedeu. Tyler parou à porta, surpreso em vê-la. — Bom dia — ele a cumprimentou, dirigindo-se ao bufê para se servir. — Estou me lembrando dos dias em que você só aparecia à noite — observou, enquanto se sentava à frente dela. — Naqueles dias eu não tinha uma razão para me levantar. Agora tenho. — Samantha sorriu ao ver a expressão admirada de Tyler. — Você pensou que talvez eu tivesse mudado de idéia a respeito do caso Marcola? — Esperava que uma boa noite de sono lhe fizesse recuperar a razão — Tyler respondeu com rispidez. — De jeito nenhum. Samantha continuou a tomar seu café, estudando-o, enquanto ele abria o jornal. Tyler era o tipo de homem que sempre a atraíra. Alto, moreno e com misteriosos olhos azuis, que contrastavam com a cor da pele e os cabelos escuros. Ele aparentava uma frieza calculada, só delatada pelo brilho do olhar que denotava uma perigosa sensualidade, fazendo com que ela tivesse vontade de deixar-se envolver por aqueles braços fortes e... Mas, no momento, Tyler tinha a personalidade de um homem velho, completada por uma expressão de desaprovação e de desdém que tinha a propriedade de enraivecê-la. Samantha serviu-se de outra xícara de café e olhou para o relógio de pulso. Mais uns quinze minutos e ela, sairia para ver Dominic. Esperava que ele a aceitasse como advogada, porque queria muito pegar o caso para provar a todos, e a si mesma, que podia fazer alguma coisa boa e que valesse a pena. Não se importava com o que Tyler tinha dito. Sentia que o destino colocara aquele caso no seu caminho para lhe dar a oportunidade de fazer algo positivo, e pela primeira vez em sua vida não iria desperdiçar a chance. — Gostaria de ir com você até a prisão — Tyler disse, enquanto dobrava o jornal. Samantha o olhou surpresa. — Por quê? Pensei que não quisesse saber do caso... — E não quero — ele admitiu. — Mas como você insiste em representar o réu, como sócio do escritório preciso saber com exatidão o que está acontecendo. Samantha deu de ombros. 20


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Você é quem sabe. — Além do mais — Tyler continuou —, trabalhei demais para merecer a reputação de profissional competente. Não quero que cometa erros estúpidos que possam resultar num fracasso no tribunal, e que isso reflita negativamente no escritório. Samantha endireitou as costas àquelas palavras. "Como ele é pomposo", pensou. — Meus estúpidos erros serão problemas meus, e eu não pegaria o caso se tivesse alguma dúvida a respeito da minha competência. Tyler sorriu com frieza. — O preço será alto, se você estiver errada. — Sim, mas se eu estiver certa, poderei derrubá-lo do seu trono. Tyler riu, e o som profundo e melódico daquela risada provocou um calafrio na espinha de Samantha. Logo ele se recompôs, mas uma ruga formou-se na sua testa. — Apenas para lembrá-la, seu objetivo é defender Dominic e não me derrubar do trono. — Sei muito bem qual é meu objetivo — ela afirmou e levantou-se da mesa. — Vejo-o na prisão, sócio. Momentos mais tarde, quando Samantha se dirigia para a prisão, que ficava no centro da pequena cidade de Wilford, tentava entender por que ou como Tyler Sinclair a atraía tanto. Sempre fora assim. Desde quando podia se lembrar, ele sempre fora capaz de mexer com ela, e sem muito esforço. Não ajudava muito, o fato de ele ter testemunhado tudo que fizera em nome da rebeldia da adolescência. Tyler estava presente quando fora pega pelo pai escalando a treliça que levava à janela do seu quarto, depois do toque de recolher. Também estava presente quando ela voltara para casa depois de ter sido expulsa da faculdade. E, é claro, fora ele que a tirara daquele bar de esquina, onde ela, bêbada, se encontrava numa situação perigosa. Samantha sentiu-se enrubescer quando se lembrou da tentativa de seduzi-lo, no carro, quando voltavam para casa. Então, ficou triste ao pensar que seu pai não teria a oportunidade de ver que ela finalmente crescera, e que aquela conduta tola e autodestrutiva estava superada. Ás vezes se surpreendia por ter conseguido concluir a faculdade, formar-se em Direito e trabalhar para se sustentar e ser motivo de orgulho para o pai. Samantha sabia do fundo de seu coração que pegar o caso Dominic era uma tentativa de provar a si mesma e ao finado pai, de uma vez por todas, que ela era uma pessoa inteligente e boa, e que merecia usar o sobrenome Dark. Samantha parou no estacionamento do Departamento de Polícia de Wilford decidida a se dedicar de corpo e alma ao objetivo a que se propusera e a deixar para trás todos os fatos do passado. O Departamento funcionava num prédio de dois andares que fora construído em 1927. A estrutura do prédio mostrava a idade que tinha, pelas paredes descascadas, as janelas quebradas e o cheiro de poeira dos papéis velhos que ela sentiu quando entrava, pela porta da frente. 21


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Sabia que no térreo funcionavam os escritórios da polícia e no andar superior, o escritório do promotor. Ela mal conhecia o promotor e não sabia qual era seu método de trabalho. Mas tinha o pressentimento de que ele não perderia a chance de se promover a custa daquele caso. No porão do prédio ficavam as celas. Samantha começava a descer as escadas que levavam ao local, quando Tyler a alcançou. — Parece que estamos entrando numa masmorra, não é? — ela comentou. — Sim, Wilford podia ter uma cadeia um pouco mais moderna. Infelizmente, não há fundos para isso, pelo menos no dizer dos políticos locais. Quando chegaram ao final da escada foram impedidos por um guarda de entrar, que lhes pediu identificações e o propósito da visita. Levou-os então á uma pequena sala usada para o encontro entre os presos e seus advogados. O aposento continha apenas uma mesa e algumas cadeiras. Samantha colocou sua maleta sobre a mesa e sentou-se. Tyler encostou-se à parede e cruzou os braços. — Você não vai se sentar? Tyler negou com um gesto de cabeça. — Não quero que Dominic pense que vou fazer parte da defesa. — Então não deveria ter vindo. — Estou protegendo o que é meu — respondeu, com uma risada forçada. — Metade é seu — ela lhe lembrou. Nesse momento a porta se abriu e Dominic entrou, acompanhado por dois guardas, algemado. Seus olhos escuros brilharam de surpresa quando olhou primeiro para Samantha e depois para Tyler, mas não disse palavra alguma até que os guardas tiraram suas algemas e saíram da sala. Samantha tentou disfarçar a decepção pela aparência de Dominic. A última vez que o vira, ele era forte e cheio de saúde. Agora estava pálido e magro. — Quando você voltou? — ele lhe perguntou. — Ontem. Samantha apontou para uma cadeira à sua frente. — Graças a Deus! — Ele respirou fundo, sentou-se e olhou para Tyler. — Papai estava tentando conseguir que o Dr. Sinclair pegasse o meu caso, mas não pensei que houvesse chance de ele se interessar. — O Dr. Sinclair não vai participar da sua defesa. Ele é apenas representante do Escritório de Advocacia Jamison — Samantha explicou. Dominic pareceu surpreso. — Então o que vocês dois estão fazendo aqui? — Estou aqui para oferecer-me como sua representante. Gratuitamente. Tyler engoliu em seco de surpresa. Não imaginava que Samantha iria representar Dominic à custa do escritório. Dominic fitou-a por um longo momento. — Você é advogada? 22


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Sim. E sou uma boa advogada. — Ela evitou o olhar de Tyler para não ver dúvida ou ironia nos seus olhos. — E gostaria de defender você. Os olhos de Dominic fitavam-na como se procurassem por algum tipo de resposta. Finalmente ele concordou. — Aceito. Acho que você pode ser melhor do qualquer nome que eu ia procurar às cegas, numa lista telefônica. Samantha tentou sorrir, e abriu a maleta tirando uma pasta com papéis e uma caneta. — Agora, diga-me com exatidão, o que aconteceu na noite do assassinato de Abigail Monroe. Samantha franziu as sobrancelhas, distraída pelo perfume de Tyler, que se aproximou da mesa. Ela preferia que ele não tivesse vindo, pois sentia certo desconforto com sua presença. Se por acaso, ele a corrigisse na frente de Dominic, poderia prejudicar sua autoconfiança e também a confiança do acusado. Com esforço, ela desviou a atenção de seu atraente sócio, para seu cliente. Dominic levou pouco tempo para explicar que antes do casamento de Abigail com um banqueiro mais velho eles haviam mantido um relacionamento. Abigail casara-se com Monroe por conveniência, preferindo viver com conforto e com tudo o que a riqueza dele pudesse lhe oferecer. Entretanto, deixara claro que esperava que o relacionamento entre eles continuasse. Dominic não aceitara, pois não tinha interesse numa ligação adúltera. De acordo com Dominic, ele a tinha visto muito pouco durante os dois meses que durara o casamento de Abigail. Então, na noite do crime, ela lhe telefonara parecendo muito alegre e excitada, implorando que ele fosse até a casa dela, porque precisava falarlhe. Apesar de relutante, acabou concordando, e foi recebido por uma Abigail muito excitada e falante. Enquanto Dominic falava, Samantha tomava nota com expressão impassível. — Abigail comportava-se como uma desequilibrada — Dominic explicou. — Ela serviu champanhe e dizia que era para comemorar, mas se recusava a contar o motivo, até quando já tínhamos bebido várias taças. Dominic passou a mão pelos cabelos grossos e negros, o rosto tenso. — Champanhe nunca fizera aquele efeito em mim. Depois de duas taças eu já estava zonzo. — Continue... — Samantha o incentivava a continuar relatando os fatos, apesar de ver como estava sendo difícil para ele. Embora Tyler não dissesse uma palavra, ela percebeu que ele se debruçava sobre a mesa para não perder uma só palavra, como se o que Dominic fosse dizer em seguida fosse crucial. — Finalmente, ela me disse que o casamento havia sido um erro, mas que encontrara um jeito de conseguir um divórcio que a deixaria rica. Tomamos mais champanhe, e então eu já estava completamente embriagado. Samantha percebeu que as mãos de Dominic tremiam e que ele as apertava sobre a 23


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy mesa para tentar conter o tremor. Ele fechou os olhos e quando os abriu de novo, eram olhos torturados e apavorados. — Ela queria fazer amor, começou a se despir, mas eu a impedi. Lutamos. Ela foi para o quarto e eu a segui. Abigail começou a se despir de novo e tomamos a lutar. Caímos na cama e isso é tudo de que consigo me lembrar. — Dominic respirou fundo, e então continuou: — Quando acordei, ainda estava na cama. Abigail estava perto de mim, nua... E morta. Estrangulada com uma echarpe. Antes que eu pudesse perceber o que havia acontecido, dois policiais entraram no quarto e me prenderam em flagrante, por assassinato. Samantha franziu o cenho. — Como os policiais chegaram lá naquele momento? Dominic ergueu os ombros, completando a narração: — Ouvi dizer que alguém telefonou, dizendo que Abigail estava gritando como se estivesse sendo atacada. Samantha franziu a testa mais uma vez e fez várias anotações. Conversaram por mais alguns minutos, Samantha fazendo perguntas, ouvindo as respostas com muita atenção e tomando notas. — Não a matei, Samantha. Alguém quer que eu pague por isso, mas juro que não a matei. Não poderia... Eu a amava. — Sei disso e vou fazer tudo o que for possível para provar sua inocência. Samantha pegou as mãos dele entre as suas, olhando-o com confiança e dizendo com firmeza: — Vamos tirá-lo dessa confusão. Dominic negou com um gesto de cabeça. — Você está muito mais otimista do que eu. Sou um tira e sei como as evidências estão contra mim. — Faça-me apenas um favor: não fale com ninguém a respeito das circunstâncias do crime — Samantha avisou, levantando-se. Guardou os papéis e a caneta na maleta e fechou-a. — A única pessoa com quem deve falar é comigo. Virei vê-lo daqui a um ou dois dias e conversaremos mais, para traçarmos a estratégia de defesa. Samantha caminhou até a pesada porta de ferro e deu um sinal para o guarda de que já havia terminado. Dominic foi levado de volta á cela, observado por Samantha que ficou pensando se não estaria, mais uma vez, enfrentando uma situação além de suas forças. Apesar de suas reservas, Tyler teve que admitir que ficara impressionado com Samantha, que fizera todas as perguntas que um bom advogado de defesa teria feito, e não parecera em momento algum, intimidada pelas respostas incriminadoras. Enquanto subiam a escada, Tyler ficou pensando por que a competência dela o irritara. Seriam por ela mostrar de um modo tão natural, as qualidades que ele trabalhara muito para conseguir? Ou seria por ela usar uma saia, que exibia suas pernas longas e muito bem torneadas? Deveria haver uma lei contra pernas como aquelas. Como estava atrás dela, podia apreciar seu andar sexy e o gingado dos seus quadris. 24


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Também deveria haver uma lei contra um andar daqueles. — Você tem que ir direto para o escritório ou há tempo para uma xícara de café? — Samantha perguntou enquanto passavam pela porta da delegacia. — Tenho algumas coisas para lhe perguntar. Tyler, que não queria se encontrar com ela para tomar café, surpreendeu-se com a própria resposta: — Terá que ser um cafezinho rápido. Ela concordou. — Ainda existe aquele pequeno café na esquina da Rua Oak com a Main? — Sim, o Café Corner. — Encontro com você lá. Quando ela caminhava em direção ao carro, a brisa do outono levantou a barra de sua saia a uma altura perigosa, despertando o desejo e a ira de Tyler. "Eu deveria ter ido direto para o escritório, essa manhã", ele pensou enquanto entrava no carro e se dirigia ao café. Samantha estava a apenas um dia na cidade e já virara seu mundo de cabeça para baixo. Depois da morte de Jamison, Tyler havia ficado chocado com o testamento que deixara metade do escritório para sua rebelde filha mais velha. Sentiu-se traído pelo homem que havia considerado como um pai, e que havia deixado claro que um dia o escritório de advocacia; seria só dele. Nos últimos anos de sua vida, Jamison tinha trabalhado pouco na firma. Dependia de Tyler, que carregara nas costas todo o serviço, enquanto Jamison levava a vida de um quase aposentado. Tyler não se importava, pois considerava isso como um investimento para o futuro, um futuro que ele agora, tinha que partilhar com Samantha. Tyler estacionou na frente do Café Corner. Sentia vontade de maldizer Jamison por ter dividido o escritório, forçando-o a suportar sua filha. Tyler tinha esperança de que Samantha fracassasse e fugisse de novo... Ou que ficasse cansada do trabalho e do desgaste emocional decorrente dele, e abandonasse tudo. Embora o café estivesse lotado, logo que entrou avistou Samantha. Ela tinha conseguido dois lugares, num local mais reservado, onde teriam privacidade para conversar. — Pedi café para nós dois — foi logo dizendo, enquanto Tyler sentava-se à sua frente. — Com creme, certo? — Certo — Tyler respondeu surpreso por ela se lembrar de uma coisa tão insignificante. — Então, sobre o que você quer falar? — Que agência de investigação nós usamos? Tyler sorriu. Era óbvio que ela pensava que isso seria fácil. — Nós não usamos agência de investigação. Uma pequena ruga apareceu na testa de Samantha. — Não entendo. É claro que você deve usar alguém para esse tipo de serviço... Um investigador particular ou algo parecido. 25


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — A maior parte dos casos que pegamos não precisa de muita investigação e o pouco que tem, faço eu mesmo. O sorriso dele se alargou quando viu que a ruga na testa de Samantha ficara mais profunda. — Eu lhe avisei Samantha, que nós não pegamos casos como o de Dominic. Nossos casos são na maioria cíveis e não há necessidade de investigação. — Sei que papai usava alguém, alguns anos atrás. Lembro-me de tê-lo conhecido numa tarde em que fui ao escritório. — É provável que fosse Wylie Brooks. Um homem corpulento e calvo? — Sim, é ele. — Wylie passa a maior parte dos dias pescando. Está aposentado há seis meses. — Tyler encostou-se à cadeira. — Samantha, você não vai encontrar alguém que a ajude nesse trabalho. Morgan Monroe não é apenas respeitado na cidade, ele é poderoso. Os Investimentos Morgan possuem metade das hipotecas da cidade de Wilford. — Bem, meu credor ele não é. Tudo que papai possuía está livre e desimpedido e uma das primeiras coisas que vou querer saber, é a respeito do álibi que o Sr. Monroe tem para a noite do crime. Você sabe que, com freqüência, o marido é o principal suspeito. — O álibi do Sr. Morgan é incontestável. Na noite do crime ele estava a quilômetros de distância, proferindo uma palestra sobre oportunidades de investimentos, durante um banquete com importantes homens de negócios. Ele tem centenas de testemunhas. Tyler quase sentiu pena pela frustração que percebeu no olhar de Samantha, o que acentuou mais a ruga entre as sobrancelhas. Mas ele a tinha avisado. — Não compreendo. Quando você defendeu aquela jovem, no caso de ameaça de morte, vários meses atrás, o escritório não usou um investigador? Tyler a olhou surpreso e sorriu. — Você conseguiu acompanhar minha carreira mesmo morando em outra cidade? — Não fique envaidecido. Já lhe disse que tenho uma assinatura do jornal de Wilford, e li um artigo a respeito do caso. Qual é a diferença entre ele e o caso Dominic? Tyler tomou um gole de café e sorriu para ela mais uma vez. — Samantha, há uma enorme diferença entre um caso de assassinato e um caso de ameaça de morte. — Sim, há! Dominic pode ser condenado à cadeira elétrica e o ameaçador a apenas alguns anos de prisão. — O caso que eu defendi não acabou com a morte de alguém. Foi um caso simples que só interessou às pessoas envolvidas. — Mas ainda assim, é um caso criminal — Samantha pressionou. — Papai nunca pegou esses casos, como você conseguiu convencê-lo? Tyler hesitou. — Para ser franco, eu nunca lhe contei... Até ser tarde para ele me impedir. Os olhos de Samantha brilharam divertidos. — O quê? O garoto perfeito se rebelando contra seu amado mentor? Não posso 26


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy acreditar. Jamais esperava isso de você. O tom de voz de Samantha o irritou. Ela estava tão certa de que ele não passava de uma sombra de Jamison, tão certa de que ele era um entediante advogado de causas cíveis, que o enfureceu e ele agarrou-lhe o pulso, sentindo a pulsação dela com o polegar. — Você ficaria mais surpresa ainda, se soubesse que rebeldes e incríveis fantasias passam pela minha cabeça — Tyler respondeu, contraindo o maxilar. Imediatamente sentiu o pulso de Samantha acelerar. De alguma maneira suas palavras a tinham tocado. Ele largou-lhe o pulso, deu um suspiro e continuou: — Entretanto, eu escolho minhas atitudes rebeldes com muito cuidado, e sei que é melhor ter fantasias do que ilusões que não se concretizam. Tyler sentiu o sangue ferver com o sorriso enigmático e sexy que ela esboçou. — E aí que você se engana, Tyler — Samantha respondeu com voz rouca e baixa. — Algumas fantasias tornam a realidade mais interessante, e você só tem que escolher entre as que valem á pena e as que devem ser deixadas de lado. — Você tem certeza de saber diferenciá-las? — Tyler indagou irritado pelo fato de ter quase perdido o controle. Ela deu de ombros, com o mesmo sorriso ainda estampado na face. — Meu julgamento não era muito bom quando eu era mais jovem, mas aprendi a ter mais discernimento com o passar dos anos. Samantha se curvou e ele pôde sentir seu perfume. Uma essência que lembrava as árvores frondosas de uma floresta, e o cheiro da chuva umedecendo a terra. E esse aroma despertou alguma coisa de primitivo nele. Tyler tomou o último gole de café e levantou-se. — Tenho de voltar ao escritório. Samantha também se levantou. — E eu preciso ir ao fórum para notificar que sou a advogada de Dominic. Cada um deles deixou um dólar sobre a mesa e saíram juntos do café. Uma vez na calçada, ela pegou no braço de Tyler e falou com sobriedade: — Não fique preocupado, Tyler, não pretendo arrasar sua reputação... Nem a do Escritório de Advocacia Jamison. Pretendo melhorá-la, provando que Dominic é inocente. — E como você espera fazer isso? — Tyler perguntou divertido, ao constatar a confiança exagerada demais para uma novata. — Encontrando o verdadeiro culpado. Antes que Tyler pudesse dizer como suas intenções poderiam se tornar perigosas, ela se dirigiu ao carro. A saia de Samantha ondulava acompanhando seu andar, lembrando a Tyler uma das fantasias que costumava ter com ela. Quando Samantha chegou à porta do carro, virou-se para ele, sorriu e o provocou: — Talvez mais tarde possamos comparar nossas fantasias. Eu gostaria de lhe sugerir quais valeria a pena você perseguir. Samantha fez um gesto de adeus e entrou no carro. 27


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Tyler ficou olhando Samantha se afastar, respirou fundo, tentou relaxar e foi para o carro. Ficou pensando no que ela faria se soubesse que fazia parte de uma de suas fantasias. Tinha a intuição de que acharia divertido descobrir que ela era a figura central da sua sexualidade reprimida. Houve uma época em que Samantha ocupava um espaço nos seus sonhos, sonhos eróticos que ô deixavam, frustrado e revoltado. Naquele tempo, ele sufocava o que sentia em respeito á Jamison, o homem a quem ele devia sua vida, e não queria retribuir tudo o que recebera dele dormindo com sua filha caprichosa e indócil. Embora Jamison tivesse morrido Tyler não queria se imiscuir na vida de Samantha. A vida dela, e suas escolhas, representavam uma espécie de caos que Tyler não pretendia enfrentar. Samantha tinha a habilidade de inspirar paixão nas pessoas que a cercavam. Ela era emotiva e anarquista. No passado, Tyler fora parecido com Samantha, carregando dentro de si uma raiva autodestrutiva, e tinha levado anos para superar isso e deixar o passado enterrado. Tyler conhecia muito bem o perigo das paixões quando explodiam sem controle. Não permitiria que Samantha o levasse de volta àquele tempo de loucura e crime. Eram aquelas memórias distantes que tornavam impossível para ele, representar Dominic. E eram essas mesmas memórias que impossibilitavam qualquer relacionamento pessoal entre ele e Samantha.

CAPÍTULO IV

O clube de campo de Wilford fora criado para que os ricaços da cidade tivessem um lugar exclusivo para se distraírem. Era um prédio branco de dois andares, com campo de golfe, um restaurante caro no primeiro andar e academia de ginástica no segundo. A taxa anual paga pelos sócios era suficiente para sustentar uma família de quatro pessoas durante pelo menos dois anos. Samantha nunca se sentira confortável ali, mas seu pai adorava o clube. Passava todo o tempo livre no bar que funcionava junto do restaurante, onde os homens se reuniam para discutir política e negócios. Samantha estava nervosa com a expectativa de almoçar com Melissa, o que não era natural entre as irmãs. Constantemente olhava-se no espelho retrovisor do carro, para ajeitar os fios de cabelo que estavam escapando do coque, entristecida por ela e Melissa ter vidas tão separadas. Melissa era a única família de Samantha, que esperava ainda ter tempo de se aproximar da irmã e cultuar um relacionamento mais íntimo. Àquela hora do dia o restaurante costumava estar cheio. A um canto havia uma 28


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy grande mesa ocupada apenas por mulheres que tomavam aperitivos antes de pedir o almoço. "Um aperitivo seria bom", Samantha pensou, mas logo desistiu da idéia. Aprendera, com o passar dos anos, que tinha pouca resistência ao álcool, e muita tolerância para fazer coisas estúpidas depois de um ou dois aperitivos. Samantha logo viu a irmã, sentada sozinha, olhando pela janela que havia perto da mesa. Enquanto caminhava na direção da mesa, percebeu que Melissa mudara muito pouco nos últimos seis anos. Seus cabelos loiros, curtos, realçavam a beleza dos olhos grandes e dos traços bonitos e graciosos e parecia perfeitamente adequada à elegância do ambiente. Samantha sentiu um antigo ressentimento, ao lembrar que Melissa várias vezes servira de anfitriã para o pai, em festas e jantares. Ela tinha um porte refinado e elegante, que junto com sua beleza a tinha tornado a favorita de Jamison. "Por que você não pode ser como sua irmã?", seu pai lhe falara inúmeras vezes. Samantha afastou esses pensamentos enquanto se aproximava da mesa ocupada pela irmã. — Alô, Issa — Samantha falou com doçura, repetindo o apelido que a mãe delas usava para chamar Melissa, que ergueu a cabeça e a olhou com inesperado carinho. — Oi, Sá. Beijaram-se e no intervalo daquele abraço voltaram a ser duas garotinhas, irmãs e amigas, e a memória de Samantha ficou repleta de recordações agradáveis de união e de amor. — Sente-se. — Melissa indicou a cadeira à sua frente, tomou um gole de água e quando olhou para Samantha outra vez, o olhar carinhoso não mais existia. — Então, você está de volta há menos de vinte e quatro horas e já é o centro de um furacão! — Você está se referindo ao caso Marcola? Melissa afirmou com um gesto de cabeça. — Como você já está sabendo? — A cidade é pequena. As notícias sobre as suas escapadas sempre correram de um extremo da cidade ao outro com uma rapidez espantosa. Fiquei sabendo pelo caixa da mercearia hoje de manhã. — Essa não é uma das minhas escapadas — Samantha refutou, já na defensiva. — É um trabalho, uma causa na qual acredito. — Você irritou Tyler ao pegar esse caso. Samantha sorriu. — Eu irrito Tyler por estar viva. Ele superará isso. — O único motivo de você pegar o caso Marcola foi para contrariar Tyler. — Foi isso que ele lhe disse? Melissa brincava com o copo de água. — Tyler apenas me disse que não gostaria que você pegasse o caso. A opinião de que 29


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy você é perversa e só o fez para contrariá-lo é minha. — Melissa recostou-se na cadeira e olhou para Samantha com frieza. — Não o magoe, por favor. Samantha olhou surpresa para a irmã. — Hum... As coisas mudaram. Houve época em que você odiava Tyler tanto quanto eu. Nós duas achávamos que ele era um intruso e que roubara o amor de nosso pai. — Você foi embora, Samantha. Virou as costas e fugiu. — Melissa tomou outro gole de água. — Tyler foi bom para mim. A chegada do garçom interrompeu a conversa. Elas fizeram o pedido e quando o homem se retirou a tensão ainda perdurava. Samantha estudava a irmã para tentar saber se ela sentia alguma coisa por Tyler, talvez esse fosse o motivo do seu casamento ter acabado. Ela sentiu um mal-estar no estômago ao pensamento de Tyler e Melissa, juntos, mas disse a si mesma que o incomodo era causado pela fome que sentia. Samantha não se importava com quem Tyler pudesse estar, mas tremeu ao lembrarse da conversa que os dois tiveram no café. Fora um diálogo dúbio e cheio de subentendidos que a haviam estimulado e excitado. Fantasias. Tyler devia gostar de mulheres submissas, que passassem suas calças muito bem, e cuidasse de uma casa com perfeição. Voltou sua atenção para a irmã, irritada pela facilidade com que Tyler invadia seus pensamentos. — Entendo. Você e seu marido se separaram há pouco tempo, e Tyler a apoiou. Melissa assentiu com um gesto de cabeça e seu olhar se entristeceu. — Mas Bill não está contente com a situação. Ele não quer o divórcio. — E você, o que quer? Melissa desdobrou o guardanapo de linho e o colocou no colo. Quando olhou de novo para Samantha seu olhar estava ainda mais sombrio. — Não sei. Há dias em que acho que a separação foi melhor, mas aí Bill me telefona e tenta me convencer do contrário, e já não tenho mais tanta certeza. É muito difícil viver sozinha. — Melissa deu uma risada amarga. — Mas, é claro, você não deve concordar com isso, pois sempre se sentiu muito bem vivendo, só. Samantha não respondeu apesar de Melissa estar enganada. Ela nunca estivera feliz com a solidão, e esse era um dos motivos de sempre procurar a companhia de Jeb. Mas essa era uma vulnerabilidade que ela não queria que ninguém soubesse, nem mesmo Melissa. — Onde você está morando? — Samantha perguntou. — Num pequeno apartamento ao norte da cidade. — Por que não mora na nossa casa? Por que não voltou, quando se separou? Melissa ergueu os ombros. — Voltar para casa iria parecer um retrocesso. Precisava de tempo para pensar, e decidir o que quero, sem ser influenciada por ninguém. 30


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy O garçom surgiu com o almoço. Uma salada e chá gelado para Melissa e um bife com fritas para Samantha. Enquanto comiam a tensão entre as duas foi diminuindo, e a conversa tornou-se mais amena, com as fofocas que Melissa tinha para contar. Samantha ria e espetava uma batatinha com o garfo. — Acho que há coisas que nunca mudam. Melissa ficou séria e franziu as delicadas sobrancelhas. — Algumas coisas mudaram. Papai está morto. Samantha concordou. — E nós precisamos decidir o que fazer com a casa. Você quer vendê-la? — Não sei. Minha vida está tão confusa. Podemos deixar as coisas como estão por um ou dois meses, e então tomarmos uma decisão? — Para mim, está bem — Samantha concordou, e fez uma pausa para mudar de assunto, apesar de que o que estava para dizer também não fosse agradável. — Melissa, eu pretendo investigar a morte de papai. Melissa arregalou os olhos. — Por quê? O que há para ser investigado? — Você não acha muito esquisito que um homem que tinha pavor de altura, e que perdera a mulher em uma queda da sacada, tenha ido exatamente para lá... E caído de uma amurada que ele sabia estar podre? — Acho muitas coisas esquisitas — Melissa retrucou com voz trêmula. — Acho estranho que a pessoa que mais gostava de desobedecer a leis, tenha se tornado uma advogada e também acho estranho que você tenha querido almoçar comigo depois de seis anos de silêncio. Melissa limpou os lábios com o guardanapo, sem encarar Samantha, que a olhava surpresa, e continuou: — Quem sabe o que estava se passando na mente do papai, na noite em que caiu? — Mas... E se ele não caiu? E se ele foi empurrado? Melissa olhou para a irmã, com sombras nos olhos azuis. — Por que pensa uma coisa dessas? — Por que não? Papai não era uma pessoa muito querida na cidade. Tenho certeza de que tinha alguns inimigos. — Sim, acho que tinha. — Melissa concordou. — Mas não consigo imaginar qualquer um deles se esgueirando pela casa, forçando papai a ir até a sacada e empurrando-o para a morte. Samantha meneou a cabeça, mostrando dúvidas. — Não sei o que aconteceu. Tudo que sei é que alguma coisa está errada, e eu pretendo investigar e descobrir se na realidade foi acidente ou não. Melissa pôs o guardanapo sobre a mesa. — Por que não deixa as coisas quietas? Você já está envolvida no caso Marcola. Não é controvérsia demais? 31


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Não acho que defender um homem inocente seja uma controvérsia — Samantha respondeu com frieza, ante o ressentimento da irmã. Melissa levantou-se. — Samantha, minha vida já está bastante tumultuada por causa da separação. Não preciso de você mexendo e bisbilhotando nos fatos sobre a morte de papai. — Não quer saber a verdade? — A verdade é que acho que você deveria vender a metade que lhe pertence do Escritório de Advocacia Jamison para Tyler. Ele trabalhou para isso e merece. A verdade é que acho que Dominic ficaria mais bem servido com outro advogado, porque quando as coisas ficam sérias demais a sua tendência é fugir. — Melissa parou para tomar fôlego. — Nossa! Como é bom voltar para casa! — Samantha exclamou sarcástica. Melissa ruborizou. — Sinto muito, não tive intenção de ser rude. Tenho que ir. Avisei o garçom para pôr a refeição na minha conta. Conversaremos de novo, mais tarde. Samantha não disse uma palavra para impedir a irmã de ir embora. Terminou seu café, ignorando os olhares curiosos das matronas, na mesa ao lado. De algum modo, ela não estava surpresa pela explosão de raiva de Melissa, que sempre sufocara seus ressentimentos contra a irmã mais velha. Samantha percebera, antes de ir embora que essa mágoa às vezes aflorava nas atitudes de Melissa. O que ela não conseguira entender no passado e não entendia agora, era o motivo desse sentimento. O que teria acontecido? O que teria provocado esse abismo entre elas, que já haviam sido tão unidas? Samantha pensava nas palavras de Melissa e a tristeza se apoderava de seu coração. Tinha esperança de reconstruir o que elas haviam partilhado na infância, o amor de família que havia quando a mãe ainda era viva. Seria tarde demais? Podia ser tarde demais para ela e a irmã, mas não seria tarde para provar à Melissa e Tyler que os dois estavam errados á seu respeito. Não tinha pegado o caso Marcola para ser perversa e nem iria fugir quando as coisas ficassem difíceis. Jogou o guardanapo sobre a mesa e levantou-se. Tinha muitas coisas para fazer, e não podia perder tempo, sentada refletindo sobre os problemas de Melissa. Tinha que preparar a defesa de Dominic e talvez com isso se redimir perante os olhos de Tyler e da irmã. Em quinze minutos, e pela segunda vez desde que chegara a Wilford, entrava no escritório de advocacia. Dessa vez uma mulher ruiva ocupava a escrivaninha da recepção. — Aí está a minha garota! — saudou a recepcionista, perfumada, de seios fartos e um pouco acima do peso, saindo detrás da mesa para abraçar Samantha. — Oi, Edie, é muito bom vê-la outra vez — respondeu Samantha, retribuindo o abraço efusivo. Edie Burges tinha sido secretária de Jamison Dark desde quando Samantha podia se lembrar. 32


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Fora Edie que acompanhara Samantha na compra do primeiro sutiã, e que comprava presentes de aniversário e de Natal para as duas irmãs órfãs. — Deixe-me olhar para você. — Edie se afastou e examinou Samantha com um olhar crítico. Seus lábios vermelhos se curvaram num sorriso largo. — Você está maravilhosa, querida! Samantha riu. — Meus cabelos estão horríveis e minha saia curta demais. — Eu não me importaria nem se você estivesse nua e fosse careca — Edie respondeu ainda sorrindo. — Estou muito feliz por estar de volta ao lugar ao qual pertence. Pegou a mão de Samantha e a fez sentar-se numa cadeira próxima à sua mesa. — Venha, sente-se. Temos anos de conversa atrasada. Samantha sempre achara incompreensível que um homem sério e circunspecto como seu pai, contratasse uma mulher que usava roupas um tanto justas demais, batom brilhante e vermelho e os cabelos ruivos como labaredas de fogo. — Conte-me tudo — Edie exigiu quando viu Samantha acomodada na cadeira. — Ninguém me disse se você está casada ou divorciada, se está apaixonada ou curtindo alguma dor de cotovelo. — Nada disso — Samantha respondeu, pensando que nos últimos seis anos tivera vários namorados, desfrutara a companhia de um colega de faculdade e tinha ficado entusiasmada com um sexy entregador de pizza. Mas nada durara muito tempo. Quando os homens tentavam tornar o relacionamento mais sério e íntimo, ela terminava o namoro. Não tinha vontade de se apaixonar. Só o que queria era se divertir ter o controle da situação e não se envolver sentimentalmente com homem algum. — Não tive tempo para romances. — respondeu — Oh... Vou falar a você o que sempre digo para Tyler. É preciso arrumar tempo para o amor. De outro modo acabarão sozinhos... Como eu. — Seus lábios vermelhos fizeram um muxoxo e lágrimas escorreram pelo rosto maquilado. — Oh, Samantha querida, sinto tanto pelo seu pai! Samantha piscou desconcertada pela mudança súbita de assunto. Naquele instante, sentiu um aperto na garganta e uma forte vontade de chorar que ela sufocou incapaz de entender porque estava triste pela morte de um homem que ela sempre pensara odiar. Edie abriu a bolsa e pegou um lenço. Enxugou os olhos e voltou a sorrir se desculpando: — Deus meu, eu não queria fazer isso. — Deu um, tapinha na mão de Samantha. — Agora, diga-me... O que há de verdade sobre, você pegar o caso Marcola? — É tudo verdade. Vou defender Dominic. — Samantha confirmou. — E vou precisar da sua ajuda, Edie. — Samantha sorriu e apertou a mão da secretária. — Como sempre, acho que me meti numa coisa grande demais para mim. Tyler mastigava um comprimido de antiácido, fazendo careta. Fechou a pasta sobre a qual estivera trabalhando e esticou os braços para alongar os músculos das costas. Tinha sido um longo dia. Primeiro, a ida à prisão para a entrevista de Dominic, e 33


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy depois o caso no qual estava se dedicando e que requerera horas de pesquisa. Tyler passou a mão pelos cabelos e olhou no relógio de pulso. Passava das sete. Fora um dia pesado e era hora de parar. Levantou-se, pegou o paletó do armário, saiu do escritório e desceu a escada. — O que está fazendo aqui até tão tarde? — perguntou surpreso por ver Edie ainda na recepção. — Apenas dando ordem em algumas coisas. — Ela sorriu. — Parece que o dia não tem horas suficientes. — Diga-me — Tyler perguntou, inclinando a cabeça em direção ao escritório de Jamison. — Ela já foi para casa? — Saiu há alguns minutos, mas não acho que tenha ido para casa — Edie respondeu sem encará-lo. — Aonde ela foi? Edie hesitou e isso acendeu uma luz de alerta na mente de Tyler, que se apoiou na mesa da secretária e forçou-a a encará-lo. — Edie, aonde Samantha foi? — repetiu. — Ela disse alguma coisa sobre ir ao Cozinha do Diabo. — Edie apertou o lábio superior num gesto de ansiedade. — Tentei impedi-la, disse-lhe que não era lugar para ela, mas você conhece Samantha... Tyler praguejou e desceu a escada com pressa, dirigindo-se ao carro. Por que Samantha tinha ido a um lugar daquele tipo? Era o bar mais mal freqüentado e perigoso da cidade. Enquanto dirigia, tentava ignorar que a acidez do seu estômago tinha piorado. Droga. O que ela pretendia fazer? Todo mau elemento da região freqüentava aquele bar. Ela não tinha nada que ter ido lá, por qualquer razão que fosse. O bar estava localizado na parte norte da cidade. Quando Tyler parou o carro no estacionamento lotado, percebeu que o apartamento de Morgan Monroe era a apenas dois quarteirões de distância, e teve o pressentimento de que esse era o motivo da presença de Samantha naquele lugar. O Cozinha do Diabo era um prédio baixo que originalmente fora pintado de preto e que o tempo desbotara para cinza. Um luminoso de néon, pendurado na fachada, mostrava um diabo sorrindo e segurando um garfo. Tyler abriu a porta e foi tragado pela fumaça e pelo barulho. Parou por um momento, esperando que seus olhos se acostumassem à penumbra do local. A vitrola eletrônica espalhava uma melodia que não conseguia competir com o vozerio da multidão que lotava o local. Tyler procurava por Samantha, pensando se alguma vez veria de novo tanta tatuagem num só lugar. Tyler já procurara bares daquele tipo, para se afogar na raiva e na ilegalidade que reinam em lugares como aquele. Percebia agora que, vestido num elegante terno, usando um relógio de pulso caro e aparentando riqueza, ele representava uma tentação para os outros homens no bar, que 34


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy poderiam achar que ele seria uma presa fácil. Começou a andar no meio da multidão, olhando ao redor à procura de Samantha. Tyler poderia se considerar de sorte se saísse inteiro dali e, se isso acontecesse, brigaria com Samantha por tê-los colocado num lugar tão arriscado. Ficou apreensivo por não ver Samantha em lugar algum da área principal do bar. Sabia que ela estava ali, pois seu carro estava no estacionamento. O único lugar que faltava olhar era um reservado que havia nos fundos do bar. Tyler olhou horrorizado. Não era possível que ela estivesse lá. Sua mente foi povoada por imagens terríveis: Samantha sendo atacada por vários homens, entre barris de bebida, lutando até esgotar suas forças e ficar fraca demais para resistir. Com todo aquele barulho ninguém ouviria seus gritos. Sem hesitar, atravessou a porta dos fundos e ouviu o som da risada de Samantha. Sentiu-se relaxar, se ela podia rir era sinal de que estava bem. Caminhou por entre caixas de bebidas e a viu, sentada sobre um barril, conversando com um homem alto e esquelético, com o rosto cheio de espinhas, como o de um adolescente. — Tyler! — Ela pulou de onde estava sentada. — O que está fazendo aqui? — Procurando por você. Samantha apontou para o homem com o qual conversava. — Tyler, esse é Silas Gorman, mais conhecido como "Osso". Osso, esse é meu sócio, Tyler Sinclair. Osso estendeu a mão magérrima, mas não encarou Tyler. — Oi, cara... — ele mais resmungou do que falou. — Você me telefona se souber de alguma coisa? — Samantha perguntou ao magricela. — Farei tudo o que quiser Sá. — Sorriu, expondo um dente de ouro bem na frente. Samantha sorriu parecendo satisfeita e se virou para partir. Tyler seguiu atrás dela, pensando em como ela conhecera o Sr. Osso... Mas não estava certo de querer mesmo saber. Enquanto atravessavam o salão principal, Tyler observava como todos os homens se viravam para olhá-la. Com a graça de Deus ela não estava usando saia curta e sim uma calça jeans e uma camiseta de tamanho grande. Samantha já estava quase na porta da frente, quando um homenzarrão agarrou-a pelo braço e disse alguma coisa em seu ouvido. Apesar de Tyler estar muito longe para ouvir, ele viu os olhos de Samantha arregalar enquanto tentava soltar o braço. — Eu sabia — Tyler falou para si mesmo. De alguma maneira ele sabia que não conseguiriam sair daquele lugar sem nenhuma altercação. Correu para perto dela e viu que o delinqüente ainda estava segurando o braço delicado. — Deixe á senhorita sair — Tyler exigiu. — Meta-se com seus próprios negócios — o homem respondeu, exalando um forte 35


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy cheiro de uísque e de muitos cigarros. — A senhorita é meu negócio — Tyler afirmou, cerrando o maxilar e se aproximando do gigante. Sua úlcera deu sinal, quando Tyler percebeu que o homem era uma cabeça mais alto do que ele, e muito mais forte. Entretanto, o medo estampado no rosto de Samantha aumentou a quantidade de adrenalina no sangue de Tyler, que voltou a falar: — Vou repetir mais uma vez: deixe á senhorita sair. E se você não entender minhas palavras, talvez entenda uma comunicação mais direta. Os olhos do homem arregalaram como se achasse divertida a idéia de brigar com Tyler. Suas narinas incharam como se fossem as de um touro pronto para atacar. Tyler viu o punho do grandalhão vindo em direção do seu rosto e se afastou com agilidade. O marginal se preparou de novo, olhando para o queixo de Tyler. Tyler ouviu o grito de Samantha, mas o ignorou, prestando toda a atenção no seu antagonista. Os dois homens se estudavam, andando em círculos, encorajados pelos gritos do povo que assistia com entusiasmo. Ninguém parecia interessado em chamar a polícia ou apartar a briga, e Tyler esperava que, se conseguisse derrubar aquele, outro não viesse substituí-lo. — Pegue-o, Brennon! — gritaram. — Sim, suje o terno dele, Rick! — berrou outro. Rick Brennon. Pelo menos Tyler sabia o nome do homem que o encurralava. E esperava que quando o grandalhão acabasse com ele, ainda tivesse forças para lembrar-se de que fora Samantha que o metera naquela enrascada. Mas Tyler não pretendia se safar. Crescera no lado escuro de St. Louis, enfrentando marginais como Rick Brennon, num esforço para continuar vivo. Tyler prendeu a respiração quando viu uma faca aparecer na mão de Brennon. — Venha cá, bonitão — Brennon o provocava. — Venha provar o corte da minha faca. Tyler olhava para ele, enfrentando-o. — O que há? Está com medo de me enfrentar sem essa faca na mão? Os olhos de Brennon se apertaram e ele deu uma gargalhada. Atirou a faca para um homem gordo que estava perto e fez um gesto para Tyler se aproximar. — Vem bonitão, vem! Consciente de que não havia outro jeito senão enfrentar a briga, Tyler reuniu suas forças e esperou que Brennon o atacasse. Quando ele o fez, Tyler revidou. Em três investidas, Tyler jogou Brennon de costas no chão, e pisou na garganta do homem. — Um homem honrado deixaria isso terminar aqui — Tyler disse numa voz baixa e ameaçadora. Então continuou: — Um homem estúpido continuaria essa briga até que um de nós fosse subjugado e ferido. Eu, pessoalmente não quero sujar meu terno de sangue. E você, vai ser honrado ou estúpido? Brennon murmurou a resposta e Tyler tirou o pé da garganta dele. O homem 36


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy levantou-se, Tyler agarrou o braço de Samantha com rapidez, e se dirigiu para a porta. — Entre no meu carro — ordenou, quando já estavam fora do bar. — E o meu? — Viremos buscar depois. — Mas... — Samantha, entre no carro antes que eu perca a paciência e jogue você de volta naquele covil de maus elementos. Samantha percebeu a raiva na voz de Tyler e obedeceu. Abriu a porta e entrou no carro. Tyler sentou à direção e agora que o perigo havia passado e ele conseguira sobreviver, sua raiva ficou restrito à mulher que estava á seu lado. — Tyler, eu... — Samantha, faça um favor a si; mesma. Não diga nada nesse momento. Ele ligou o carro e saiu do estacionamento. — Não sei, até agora, por que não torço esse lindo e pequeno pescoço. — Tyler lhe endereçou um olhar maligno e continuou: — Fique calada e use esse tempo para pensar nas razões porque não fiz isso, pois é o que você merecia.

CAPÍTULO V

Samantha sabia que Tyler estava furioso. Endireitou-se no assento, e desviou o ar quente do carro que vinha direto em seu rosto. Não entendia por que Tyler estava tão bravo. Era provável que tudo acabasse bem se ele não tivesse interferido. Mas achou melhor não tocar no assunto. Estavam já perto de casa quando ele perguntou: — Você pode me dizer agora o que foi fazer naquele lugar? — Tyler tentava controlar a voz. — Na noite em que Abigail Monroe foi morta, houve um telefonema anônimo para o 911, feito do Cozinha do Diabo — Samantha respondeu. Depois de breve hesitação, continuou: — Você não acha estranho que alguém corra dois quarteirões para telefonar e dizer que uma mulher estava correndo perigo no apartamento 502? Tyler permaneceu em silêncio e franziu as sobrancelhas. Samantha se mexeu no banco do carro e virou-se para olhar para ele, e continuou: — Acho que o verdadeiro assassino fez o telefonema, sabendo que Dominic estava inconsciente e que seria culpado pelo crime. — E você achou que o verdadeiro culpado estivesse ao telefone hoje à noite? — Tyler perguntou sarcástico. — É claro que não! — Samantha respondeu irritada. 37


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Fui lá para fazer algumas perguntas, para achar alguém que pudesse saber alguma coisa sobre o assassinato de Abigail Monroe. Muitas vezes o álcool faz com que as pessoas soltem a língua e a fanfarronice é uma forma de arte, num lugar como o Cozinha do Diabo. — Como você conheceu Osso? — Tyler parou o carro e desligou o motor. — Por que não terminamos a conversa na sala? — Samantha sugeriu. Sentir-se-ia melhor dentro de casa, onde poderia manter uma distância segura entre os dois. Não se deixava enganar pela calma aparente de Tyler. A raiva que ele estava sentindo transparecia no olhar, e eles estavam muito perto um do outro. Saíram do carro e Samantha caminhava atrás de Tyler, lembrando-se da facilidade com que ele subjugara Rick Brennon. Ainda estava surpresa com o que se passara no bar. Pela primeira vez, desde que Tyler entrara na família, muitos anos atrás, Samantha sentiu curiosidade em saber como fora a vida dele antes dos Dark. Virgínia esperava-os na porta da cozinha e olhou para Samantha com desaprovação. — Há presunto e batata assada na geladeira e pão feito em casa no armário. — Que ótimo! — Samantha exclamou, percebendo que estava com fome. — Estava ótimo, duas horas atrás — Virgínia respondeu, pegando o casaco no encosto de uma cadeira e vestindo-o. — Estou no meu horário de sair — completou, olhando para os dois e meneando a cabeça como gesto de despedida. — Nunca entendi porque meu pai contratou Virgínia — Samantha comentou quando a empregada saiu. — É a mulher mais amarga que já conheci. — Ela foi devotada á seu pai durante muitos anos — Tyler respondeu sentando-se à mesa da cozinha. — Jamison deixou-lhe uma pequena herança, mas ela quis continuar trabalhando, então a mantive aqui. Samantha foi até a geladeira e pegou os alimentos que Virgínia tinha preparado para o jantar. Percebia que Tyler ainda estava bravo. Os músculos do seu rosto estavam contraídos e ele tamborilava na mesa com os dedos, como se estivesse pensando nos meios que usaria para castigá-la. O ambiente estava tenso, e para quebrar o gelo Samantha perguntou, enquanto se servia: — Está com fome? Tyler respondeu com ódio: — Perdi o apetite quando percebi que tinha que enfrentar o Golias para tirá-la daquele bar. Samantha fez dois pratos e os colocou no, microondas. — Mas precisa comer alguma coisa. Virou-se para olhá-lo e comentou: — Confesso que fiquei admirada com a rapidez dos seus movimentos. Onde aprendeu a lutar daquela maneira? Tyler parou de tamborilar na mesa, franziu o cenho, e respondeu com rispidez: — Ao contrário do que você possa pensar, não nasci rico, nem do lado conservador da lei. 38


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Onde você nasceu? Era incrível que em todos aqueles anos que vivera ao lado de Tyler, nunca houvesse lhe perguntado nada pessoal. — Nasci em St. Louis e vivi lá até que seu pai me mandou para a faculdade. — Como você conheceu meu pai? Tyler recostou-se na cadeira e Samantha pôde perceber que a tensão havia diminuído. — Eu estava no segundo grau quando seu pai foi fazer uma palestra na aula de Educação Cívica. — O olhar de Tyler se suavizou á lembrança desse fato. — Ele era o homem mais dinâmico que eu havia conhecido. Transpirava poder, controle, coisas que eu jamais tivera em minha vida até aquele momento. — Tyler sorriu. — Seu pai podia ser uma pessoa muito carismática quando queria. Samantha concordou com um gesto de cabeça. — Então ele foi à sua classe... Isso não explica como você se tornou protegido dele. Tyler também sorriu e continuou: — Depois da palestra houve um debate, e Jamison me contou mais tarde, que eu tinha sido o único que fizera perguntas inteligentes. — Então ele se ofereceu para ser o seu mentor — Samantha completou, desejando que seu pai também tivesse lido no olhar dela o quanto ela precisara dele, em vez de só enxergar seus atos de rebeldia. Tyler concordou. — E os seus pais? O que eles acharam disso? O sorriso de Tyler desapareceu. — Nunca conheci meu pai. Ele abandonou minha mãe quando ela estava no sétimo mês de gravidez e nunca mais ouvimos falar dele. Minha mãe morreu quando eu tinha catorze anos de idade. Samantha sentiu pena de Tyler, pois conhecia a dor de perder a mãe quando ainda se é uma criança, e imaginou que o trauma tenha sido o mesmo para ele aos catorze anos como fora para ela, aos seis anos. Todo o tempo em que ela odiara Tyler, nunca pensara na possibilidade de ele não ter outra família. — Sinto muito, Tyler — Samantha disse com suavidade. — Sua mãe morreu de doença ou foi algum acidente? Tyler respirou fundo, passou a mão pelos cabelos negros, o olhar transparecendo tristeza e dor e Samantha; pensou que talvez tivesse ultrapassado o limite e invadido a privacidade dele. O microondas; deu sinal e Samantha se levantou da cadeira. Tyler sorriu. — Faço parte da sua vida há quase quinze anos e você nunca demonstrou curiosidade a meu respeito. Por que esse interesse agora? Samantha pôs um prato na frente dele, pegou o outro para ela e sentou-se. — No momento, estou gostando de você. — Ela sorriu ao ver que ele franzia o cenho. 39


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Mas não se preocupe esse sentimento logo passará. Tyler sorriu novamente, mas dessa vez foi um sorriso verdadeiro e não um mero esgar dos lábios, uma coisa que ela nunca esperara dele. Samantha sentiu-se estranha, baixou os olhos e fixou o olhar no prato. Mas não sentia o gosto da comida, apenas tentava recobrar o equilíbrio. Arrependeu-se de ter perguntado sobre a família de Tyler, pois era muito mais difícil manter um distanciamento se houvesse empatia entre os dois. Tyler comia metodicamente e parecia perdido nos próprios pensamentos. Samantha, pela primeira vez em anos, se permitiu pensar na noite em que tentara seduzir Tyler. Como sempre, ela saíra de casa depois de ter brigado com o pai. Não se lembrava mais qual fora o motivo da briga, só se lembrava que, ferida e com raiva, dirigira até a Taverna James, onde bebera sem parar. O dono da taverna, que era cliente de Jamison, telefonara e pedira para que viessem buscá-la. A chegada de Tyler ao bar á deixara ainda mais enraivecida. Seu pai nem se incomodara em vir ele próprio, preferira mandar seu subordinado. Tyler chegara ao bar com um olhar severo, pegara-a pelo braço e a levara embora. No carro, seu silêncio mostrava mais desaprovação do que qualquer palavra que ele pudesse dizer, e a raiva de Samantha se contrapunham à atração que sempre sentira por ele. Na proximidade que o interior do carro oferecia, com o cheiro da colônia de Tyler impregnando o ar, o desejo recalcado de Samantha aflorou, e o álcool a fez superar a inibição usual. Além do desejo, havia ainda a vontade de ser amparada, ajudada e amada. Samantha chegou perto de Tyler e pôs a mão na coxa dele. A reação foi imediata. Ela o ouviu respirar fundo e sentiu seus músculos enrijecerem. Não se sentira triunfante por perceber que ele também a queria, apenas sentiu que seu coração disparava. Encostou-se nele e roçou os lábios no queixo de Tyler, desejando que pelo menos por alguns minutos ele a fizesse sentir-se amada. — Samantha? Arrancada do passado, Samantha sentiu o rosto esquentar. — O quê? — perguntou, esperando não ter enrubescido. — Você tem que me prometer uma coisa. — Os olhos azuis de Tyler a fitaram por um longo momento. — Que tipo de promessa? — Prometa-me que não fará nada tão estúpido como o que fez essa noite. Prometame que não se aproximará daquele bar outra vez. — Não posso fazer isso — Samantha respondeu, ainda lutando para esquecer que o desejara e precisara dele. — Tenho que ir aonde minhas investigações me levarem, onde eu possa colher provas da inocência de Dominic. Tyler levantou e levou seu prato vazio para a pia. — Amanhã telefonarei para Wylie Brooks e tentarei tirá-lo da aposentadoria, para dar uma ajuda a você — falou, enquanto passava uma água no prato e o colocava na 40


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy máquina de lavar louça. — Nesse meio tempo, você pode ao menos me prometer que não irá a lugar algum sozinha? Se precisar investigar alguma coisa fora do escritório, avise-me que irei junto. — Pensei que você não quisesse se envolver de jeito nenhum... — Não queria, mas em sã consciência não poderei vê-la andar por aí... Arrumando problemas e se arriscando. — Deixe-me adivinhar. É ruim para a reputação da firma? — ela perguntou com sarcasmo. — Exatamente. Tyler abriu a boca para acrescentar mais alguma coisa, mas desistiu e, passando a mão nos cabelos, perguntou: — Pretende comparecer ao funeral, amanhã? Samantha assentiu com um gesto de cabeça e brincou. — Quem sabe o verdadeiro criminoso apareça e se atire no caixão. Tyler sorriu. — Coisas assim só acontecem no cinema, e eu tenho o pressentimento de que não haverá momentos de suspense nesse caso. Apenas muito trabalho e aborrecimento. Pelo seu próprio bem, espero que você esteja preparada. — Pelo bem de Dominic, tenho que estar preparada. Apesar de parecer forte e, decidida ela sentia medo. Medo de provar que seu pai e sua irmã estivessem certos. No passado, ela própria sofrerá as conseqüências dos seus atos tresloucados, mas agora havia a vida de outra pessoa em jogo. Samantha sentia que aquela era a sua última chance de provar alguma coisa, não só para Tyler, Melissa e toda a cidade de Wilford, mas também para si mesma. Tinha plena consciência de que a vida de Dominic estaria em suas mãos e de que ele poderia acabar no corredor da morte. O funeral de Abigail Monroe fechou quase todo o comércio de Wilford. Proprietários e funcionários pararam suas atividades durante á tarde para prestar suas condolências à morta, mas muito mais ao homem poderoso com quem tinha se casado. Eram apenas duas horas da tarde e ela já se sentia cansada. A citação de Dominic tinha sido naquela manhã. Samantha não havia ficado surpresa, mas desapontada por não ter conseguido falar com o juiz Halloran e obter uma fiança razoável. O cemitério já estava lotado quando Samantha passava entre as outras sepulturas até chegar à grande tenda que tinha sido erguida para a cerimônia fúnebre. Ouvia-se um vozerio abafado e era forte o cheiro das coroas de flores. Perto do caixão branco, Morgan Monroe estava sentado numa cadeira, cercado de amigos e parentes. Morgan não tinha a aparência de um assassino cruel. Parecia um velho sofrido, o rosto sem cor e os olhos vermelhos. Samantha já tinha checado o álibi do viúvo, e como Tyler dissera parecia irrefutável. Mas isso não queria dizer que ele não pudesse ter 41


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy contratado alguém para fazer o serviço por ele. Perto de Morgan estava um jovem de compleição física semelhante, e com os mesmos traços fisionômicos, mas que não mostrava sinais de tristeza. "Deve ser filho dele", pensou Samantha, acrescentando o rapaz na sua lista de suspeitos em potencial. Tentou não pensar que seu pai estava enterrado nas imediações. Talvez um dia até viesse trazer flores ao seu túmulo, mas no momento não estava preparada para dizer adeus ao homem que dirigira sua vida e suas opções, um homem que nunca encontrara uma razão para amá-la. — Samantha? Samantha virou-se à voz feminina atrás dela. — Márcia? Márcia Wise? A morena miúda sorriu. — Márcia Wellington agora. Casei com Dennis, logo depois da nossa formatura. Samantha lembrou-se de Dennis Wellington, um dos astros do time de futebol de Wilford. Márcia era a chefe da torcida, nunca foram amigas, mas tiveram um relacionamento cordial. — Tinha ouvido dizer que você estava na cidade. É bom tê-la de volta. — Acho que você é uma das poucas pessoas que acha bom eu estar de volta. — Quanta gente, não? — Márcia falou, indicando a multidão embaixo da tenda. — Você era amiga de Abigail? Márcia meneou a cabeça numa negação. — Na realidade, não. Eu a tinha visto pela cidade, mas nunca fomos apresentadas... Dennis trabalha no banco do Sr. Morgan. Ele está trabalhando nesse momento, mas achei que seria uma boa idéia que pelo menos eu comparecesse para trazer as condolências. — Parece que toda a cidade teve a mesma idéia — Samantha observou, olhando para o grande número de pessoas presentes. — Também tinha muita gente no funeral do seu pai. — Márcia apertou o braço de Samantha. — Sinto muito pela morte dele. — Obrigada. Por um momento, as duas ficaram em silêncio observando as pessoas. Samantha não estava surpresa por ter tido muita gente no enterro do pai. Jamison Jackson Dark tinha sido; tão poderoso e respeitado, como Morgan Monroe. — Samantha, eu ouvi dizer que você vai representar Dominic. — Sim, é verdade. — Dennis e eu somos bons amigos dele, e apesar de tudo parecer contra, sabemos que não mataria Abigail sob nenhuma circunstância. Ele a amava. Samantha concordou. — Sinto a mesma coisa, e pretendo fazer tudo que estiver ao meu alcance para que a verdade venha à tona. Era bom saber que havia mais pessoas que acreditavam na inocência de Dominic. 42


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Samantha retesou as costas quando avistou Tyler no lado oposto da tenda. Eles não haviam mais conversado desde a noite anterior. Ele tinha subido para o quarto logo depois de terminada a refeição, enquanto ela ficou mais um pouco sentada, tentando digerir seus medos e apreensões. Tyler estava com a cabeça inclinada para o lado, prestando atenção no que lhe falava uma mulher loira e de pequena estatura. Estava vestido com um, sobretudo preto, amarrado na cintura, e de vez em quando sorria para a atraente loira. Samantha sentiu-se ressentida, pois ele nunca havia sorrido de modo tão simpático para ela. Os sorrisos que ele lhe endereçava eram sempre arrogantes e antipáticos. — Ele é bonitão, não é mesmo? Samantha sorriu, percebendo que Márcia tinha acompanhado o seu olhar, e estava se referindo a Tyler. — Sim, ele é simpático — concordou meio sem graça. — Simpático? Eu diria que a maioria das mulheres aqui em Wilford tem loucas fantasias com o Sr. Simpático. Se eu fosse solteira não o largaria nem por um minuto. Samantha achou ótimo o padre começar a missa naquele exato momento, pois desse modo a conversa sobre Tyler seria interrompida. Mais uma vez, enquanto o padre proferia o sermão, os pensamentos de Samantha voltaram àquela noite do passado, quando estivera perto de Tyler e precisara dele e do seu carinho, queria que ele lhe dissesse que ela era uma boa garota e que tinha valor. Em vez disso, Tyler a rejeitara empurrando-a e fitando-a com desprezo, o mesmo desprezo que ela sempre via no olhar do pai. Samantha levantou a gola do casaco para proteger o pescoço do vento frio, mais uma vez sentindo a humilhação que sofrerá naquela noite. Se ela tivesse conseguido seduzi-lo, e eles tivessem feito amor, Tyler teria ficado chocado ao descobrir que a garota má de Wilford era virgem. Samantha sabia que tanto Tyler quanto seu pai, sempre pensou o pior a respeito dela, inclusive que ela tinha uma vida sexual completamente livre. Mas não era verdade. Ela convivia com rapazes de péssima reputação e namorava aqueles que sabia serem odiados pelo pai, mas não fazia sexo com eles. Samantha quase entregara sua virgindade a Larry, um garoto de olhos carinhosos que falava que a amaria até o final dos tempos, e ao qual respondera que se ele a amava realmente teria que esperar até que ela estivesse preparada. Pelo jeito, aquela frase significara o fim do relacionamento para ele, que terminou o namoro naquela mesma noite. Depois de Larry, nem outro a atraíra e lhe inspirara paixão. Até Tyler. Samantha ficava irritada e furiosa porque o único homem com quem ela não deveria querer nada era o que a fazia pensar em lençóis amassados, corpos nus, mãos quentes e suspiros profundos. Desviou os olhos dele, tentando prestar atenção nas palavras do padre, que dava o adeus final a Abigail Monroe. Tinha a sensação de que o responsável pela morte de 43


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Abigail devia estar presente, dando seu adeus particular. O serviço fúnebre foi curto. Depois, as pessoas ainda ficaram conversando, como se relutassem em voltar para seus serviços e para suas vidas. Samantha ficou parada num lugar de onde podia ver Morgan Monroe e seu filho serem cumprimentados. Morgan aceitava as palavras de conforto e simpatia com uma dignidade contida, como se de um momento para o outro fosse desabar em mil pedaços. — Doutora... Estou surpreso por encontrá-la aqui. Samantha forçou um sorriso para o assistente da promotoria, o homem que ela ia enfrentar no julgamento de Dominic, e que havia encontrado naquela manhã no tribunal quando entregara a petição para a fiança do réu. Chester Spark tinha sido um rival de Jamison, apesar de o seu pai menosprezá-lo. Chester se achava elegante e se insinuava a todas as mulheres, tentando conquistálas. Ele fora casado três vezes e o olhar lascivo que endereçava a Samantha mereciam uma sonora bofetada. — Você é muito inexperiente para tentar substituir seu pai — Chester disse, aproximando-se tanto de Samantha que ela conseguiu sentir o perfume do desodorante que ele usava. Samantha se afastou dele e retrucou: — Sou ambiciosa. Ele riu e olhou para Samantha com presunção e superioridade, o que fez com que se sentisse insignificante. — Estou esperando com ansiedade o dia de enfrentá-la no tribunal. Sempre achei que uma boa discussão é um estímulo sexual. E você? — Finalmente a encontro... — Samantha ouviu a voz de Tyler, que se aproximou e pegou-lhe o braço, cumprimentou Chester com um meneio de cabeça e sorriu para ela. — Estou procurando por você, temos que voltar para o escritório. — Esse homem deveria ser preso — Samantha resmungou quando saíam da tenda. Tyler largou seu braço e riu. — Infelizmente ser galanteador não é crime. — Seu gosto para escolher gravatas deveria torná-lo culpado por má conduta. — Samantha parou de andar. — Obrigada por ter me livrado dele. Mais um minuto ou dois e você teria que me representar por assassinato. — Pude perceber isso pelo olhar que dirigia a ele. — Lembro-me de que papai dizia que se cobra usasse gravatas, elas seriam chamadas de Chester. Tyler riu e Samantha achou encantador o som da sua risada. O sol da tarde batia nos cabelos dele deixando à mostra reflexos avermelhados que normalmente não eram visíveis. O vento frio tinha posto cor no rosto dele, mas Samantha achava que apesar do tempo frio, ele deveria ter uma pele quente e agradável. Samantha desviou o olhar, querendo saber por que ele lhe despertava sensações tão selvagens. 44


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Todas as pessoas se dirigiam a seus carros quando a atenção de Samantha foi atraída para uma mulher, toda vestida de preto, e com uma expressão sofrida, chorando. — Tyler, quem é aquela mulher? — É Geórgia Morgan, a primeira esposa do Sr. Morgan. — Por que será que está tão desesperada? — Acho que Geórgia e Abigail eram amigas. Samantha viu a mulher tirar um lenço da bolsa e entrar no carro. Mais um nome para ser acrescentado à sua lista de suspeitos. De repente, sentiu que o tempo estava passando depressa demais. O julgamento de Dominic poderia ser dali a duas semanas e ela havia apenas começado as investigações. Samantha olhou para Tyler. — Mais uma vez, obrigada. Tenho que voltar ao escritório há muito trabalho esperando por mim. Entrou no carro e deu um último olhar para Tyler. O vento despenteava seus cabelos. "Céus, como ele é bonito", pensou. Mas não podia se esquecer de que ele era seu adversário e que havia entrado na vida dela e roubado o amor do seu pai. Conseguira no coração de Jamison o lugar que sempre lhe fora negado. E agora, tinha metade do Escritório de Advocacia Jamison. Samantha o odiara durante anos, e tinha alimentado esse ódio. Agora parecia que esse sentimento estava arrefecendo... Por quê? Isso a assustava. Tyler sempre deixara claro o que pensava sobre ela, e a última coisa que desejava era nutrir por ele qualquer tipo de afeição. Seria dor de cabeça na certa, e ela já tivera o suficiente. Havia muito tempo decidira não permitir que homem algum entrasse no seu coração, e Tyler não iria ser uma exceção à regra. Saiu do cemitério com a convicção de enterrar para sempre qualquer sentimento que pudesse nutrir por Tyler.

CAPÍTULO VI

Pela terceira vez em poucos minutos, Tyler mudava de posição na cama, sentindo-se desconfortável como se o colchão, de repente, estivesse duro e cheio de nós. Costumava adormecer assim que se deitava, mas naquela noite estava se virando na cama havia mais de meia hora... E nada de o sono chegar. Impaciente, estendeu as pernas para fora da cama e levantou-se. Sentia como se tivesse um buraco no estômago que ele massageava com uma das mãos enquanto pegava o roupão com a outra. Fazia algum tempo que sua úlcera não se manifestava com tal intensidade e ele sabia muito bem qual era a causa disso: Samantha. 45


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Passara os últimos dois dias, ouvindo uma alegria ruidosa pela escadaria do prédio dos escritórios, e a risada melódica e vibrante de Samantha enchendo todo o ambiente. Ela, Edie e Miranda, uma moça que ela contratara para tomar conta dos arquivos tinha tomado conta do elegante escritório de Jamison, como se fossem os três mosqueteiros. Tyler tinha a impressão de que Samantha tinha encarregado Edie e Miranda de fazer as investigações do caso Marcola e isso ô preocupava. Era tudo que ela precisava como assistentes, uma recepcionista exagerada e uma arquivista risonha demais. Na manhã seguinte não poderia se esquecer de contatar Wylie Brooks e convencê-lo a interromper a aposentadoria para ajudar no caso. De roupão, Tyler saiu do quarto e desceu para o estúdio. O fogo da lareira já estava quase apagado, só restando ás brasas incandescente. Acrescentou mais lenha às brasas, e mexeu com o atiçador até que as chamas se avivaram de novo, incendiando a madeira nova e seca. Colocou o atiçador de lado e ficou olhando as labaredas subirem, enquanto massageava o estômago distraidamente. — Obrigada, eu estava com muita preguiça de pôr mais lenha na lareira. Tyler se assustou e virou-se, vendo Samantha sentada com as pernas encolhidas, numa Berger, próxima da lareira. — Você me assustou! — Tyler exclamou. — Pensei que estivesse sozinho. — Desculpe. — Samantha sorriu. — Achei que você tivesse me visto e não quisesse conversar. Agora ele a via bem, com o ambiente iluminado pelo fogo da lareira. Samantha estava com um robe azul-marinho, sem maquiagem, e com os cabelos soltos que iam até a altura dos ombros e parecia suave meiga e... Vulnerável. Tyler acendeu o abajur sobre o pequeno bar, pegou a garrafa de uísque e tentou ignorar a dor de estômago que o incomodava. — Seria melhor que você tomasse um copo de leite — ela observou. — O que você tem? Uma úlcera? Surpreso, ele percebeu que estava de novo esfregando o estômago. Sorriu descontente por ela ter percebido, pois para ele, úlcera era sinal de fraqueza e falta de controle sobre o próprio corpo. Meneando a cabeça em sinal de afirmação, ele colocou a bebida num copo e caminhou até a lareira, sentando-se numa poltrona na frente dela. — Leite seria melhor, mas prefiro uísque. Samantha sorriu. — E é a mim que chama de perversa. Há quanto tempo sofre do estômago? — Dois anos. Desde o caso Waltrip Burlington. — Foi um caso muito difícil? — O caso não era tão difícil, mas os dois litigantes eram terríveis. Foi a primeira e única vez que fui desrespeitado pela explosão de raiva ultrajante do meu cliente. O juiz Halloran não gostou da cena que aprontaram na sala de audiência e chegou a chamar minha atenção. 46


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Ele é um juiz muito severo? Tyler tomou um gole de uísque antes de responder: — É severo, mas justo. — Ele não foi tão mau na petição que encaminhei essa manhã. Tyler concordou. — Nunca se esqueça de que é ele quem manda no tribunal, e você se dará bem com ele. — Tyler a olhou com curiosidade. — Por que você fez Direito, Samantha? Samantha devolveu a pergunta: — Por que não? — E sorriu com tristeza. — Sei por que você está surpreso. Com a minha natureza rebelde, você esperava que eu fizesse alguma coisa menos... Um pouco menos convencional. Talvez uma dançarina exótica ou uma stripper. Tyler teve a visão instantânea de Samantha num palco, com o foco de luz sobre ela, vestida num brilhante espartilho que mal lhe cobria os seios, dançando provocadoramente. Fixou o olhar no copo sentindo o estômago queimar e a virilha latejar. — Você tem de admitir que quando saiu daqui não era propriamente uma pessoa que estava na trilha do sucesso. — Não... Eu era uma pessoa confusa. — Samantha suspirou e virou a cabeça para olhar o fogo. Tyler ficou surpreso por ela ter admitido. Estudou a fisionomia de Samantha, iluminada pelas chamas douradas da lareira. Por que a achava tão fascinante? Ela era linda, mas como um advogado de sucesso, e cobiçado por todas as mulheres de Wilford, ele poderia ter qualquer mulher bonita da cidade. Não... Não era a aparência de Samantha que o atraía. Era a paixão com que Samantha fazia todas as coisas que o cativava. Era a maneira de ela pensar e as ações que decorriam dos seus pensamentos que o intrigavam. Porém ele não pretendia alimentar essa atração. — Papai sempre esperou o pior de mim, e foi isso que dei a ele. Só depois que saí daqui e o deixei, é que comecei a esperar mais de mim mesma. — Samantha tornou a olhar para Tyler, retornando à pergunta inicial. — Por que não Direito? Era o que eu conhecia o meio onde eu tinha vivido. — Sorriu para ele. — Além do mais, é muito mais respeitável do que tirar a roupa como meio de ganhar a vida... Você não gosta muito de mim, não é? De novo, ela o pegou de surpresa, dessa vez com sua costumeira falta de tato. — Não gostava quando você era adolescente — respondeu com sinceridade. — Agora, ainda estou tentando conhecer a mulher que você se tornou para saber se gosto ou não. Samantha concordou, como se não esperasse outra resposta dele. — Não temos que gostar um do outro para trabalharmos juntos. — Quem sabe? Talvez com o tempo, possamos aprender a nos apreciar e respeitar. Samantha riu. — Você teria que ser um pouco menos tenso para que isso pudesse acontecer. Tyler devolveu o sorriso. 47


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — E você, um pouco menos direta. Por um momento, uma amigável camaradagem fluiu entre eles. O fogo crepitava alegremente e as sombras das chamas dançavam pelo aposento. Tyler recostou-se na poltrona, olhando para Samantha. — Não deve ter sido fácil viver por sua própria conta e estudar Direito — Tyler disse aquelas palavras com um tom de admiração. Pela primeira vez, estava levando em conta como deveria ter sido a vida dela nos últimos seis anos sem o amparo da família ou dos amigos. Tyler terminou o uísque e pôs o copo numa mesinha ao lado da poltrona. — Foi difícil — Samantha concordou, olhando para o fogo e se envolvendo com os próprios braços. — O que me ajudou foi á pequena herança que havia recebido de mamãe. Consegui viver com esse dinheiro no primeiro ano, e depois trabalhei em empregos de meio período até terminar a faculdade. Tyler meneou a cabeça. — É engraçado. A escola de Direito estaria fora do meu alcance se não fosse pelo seu pai. Ele fez por mim o que você se recusou a deixá-lo fazer por você. — Não recusei nada — ela objetou, olhando novamente para ele. — Meu pai nunca me ofereceu nada além de censura e reprovação. Ás vezes penso que fiz Direito apenas para feri-lo. Tyler riu. — Agora parece a Samantha Dark que eu conheço. Os dois olharam para o fogo em silêncio. Tyler percebeu que em algum momento, nos últimos minutos, seu estômago parara de doer. Quem poderia pensar que ele e Samantha pudessem ter uma conversa racional, e quase agradável? Olhou para Samantha e ficou surpreso ao perceber lágrimas nos olhos dela. — Samantha? — Inclinou-se na direção dela, sem acreditar no que estava vendo. Ela sorriu embaraçada, e enxugou as lágrimas. — Desculpe. Isso acontece comigo sem qualquer aviso prévio. Samantha respirou; fundo e mais uma vez passou os braços em volta dos ombros, como se estivesse com frio. — Você está bem? — Tyler perguntou demonstrando preocupação. Samantha fitou-o com os olhos brilhantes. — Não posso acreditar que ele tenha morrido. — E para horror de Tyler, rompeu em prantos. Durante todos os anos em que Tyler fizera parte da família Dark, jamais vira Samantha chorar. E ele estava chocado pela repentina demonstração de vulnerabilidade, uma característica que nunca observara nela. Até aquele momento, não estava certo se Samantha tinha sido atingida pela morte do pai. Não havia chorado, não tinha ido ao cemitério, e raramente falava no pai. Tyler estava inseguro, sem saber o que fazer. O sofrimento dela o chocava. Não esperava tal atitude de Samantha, não por um homem que ela parecia odiar a vida inteira. 48


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Como as lágrimas de Samantha não paravam de cair, Tyler aproximou-se dela, querendo confortá-la, mas não sabia como. Antes que ele fizesse alguma coisa, Samantha se levantou e atirou-se nos braços dele, envolvendo-o com o perfume do seu corpo e dos seus cabelos. Tyler a abraçou, meio sem jeito, dando-lhe tapinhas nas costas, enquanto ela continuava a chorar com a cabeça apoiada em seu peito. — Vai ficar tudo bem — Tyler murmurou, querendo encontrar palavras certas para confortá-la. Ele era um advogado, e advogados devem ser homens de muitas palavras, mas todas as frases que vinham à sua mente pareciam vazias e sem sentido. Optou então pelo silêncio, apenas amparando-a com os braços ao redor dela, que não parava de soluçar. Em questão de minutos os soluços foram diminuindo de intensidade, mas ela não se soltava dos braços de Tyler, pelo contrário parecia que se aconchegava mais, como que necessitada do calor daquele corpo. Os; tapinhas que ele lhe dava nas costas tornaram-se carícias, e o robe de seda de Samantha se abriu com sensualidade. A proximidade do corpo de Samantha o aquecia e despertava nele o desejo contra o qual sempre lutara. Ela levantou a cabeça do peito de Tyler e apoiou-a no ombro dele. Ficaram assim abraçados por um bom tempo, até que afinal ela parou de chorar. Tyler sabia que precisava se afastar dela, dos braços que o envolviam, mas em vez disso começou a pensar se ela estaria usando alguma coisa sob o roupão de seda. Parecia que não estava vestindo nada. "E muito provável que durma nua", ele pensou, torturandose com eróticas visões de Samantha deitada na cama, nua, e sorrindo com sensualidade. Tyler a abraçou ainda mais, apesar do perigo que estava correndo. Samantha afastou a cabeça e olhou para ele. Seus lábios estavam afastados como à espera de um beijo, e seus olhos imploravam por carinho. Do mesmo modo como soubera, resignado, que não conseguiria sair do Cozinha do Diabo sem lutar, também estava consciente de que não conseguiria deixar de beijar Samantha. Em algum lugar da sua mente, ele tinha a esperança de que se a beijasse aplacaria seu desejo por ela de uma vez por todas. Então, beijou-lhe os lábios de uma maneira contida, mas no momento em que ela entreabriu a boca, perdeu o controle. Samantha tinha gosto de luxúria. Tyler passava os dedos pelos seus sedosos cabelos e o beijo aumentava de intensidade. Quando suas línguas se tocaram, cada nervo do corpo dele parecia estar sendo percorrido por uma descarga elétrica. Seu raciocínio ficou embotado, a precaução o abandonou e ele se perdeu no calor daquele beijo. Quando pararam de se beijar, Samantha inclinou a cabeça para trás, permitindo que ele tivesse acesso ao seu pescoço. A respiração era rápida, e Tyler percebeu que ela também o desejava com intensidade. Encostou os lábios no lóbulo da orelha de Samantha e depois começou a beijar-lhe o pescoço, na altura da garganta. Ela tremia, dominada pelas carícias de Tyler que iam 49


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy ficando mais íntimas. Um gemido escapou da garganta de Tyler quando moveu as mãos das costas de Samantha para os seios, ainda cobertos pela seda do robe, e com os bicos túrgidos como que tentando escapar da roupa. Tyler descobriu um dos ombros de Samantha e não se surpreendeu por estar nu. Ela segurou o roupão e o olhou nos olhos por um longo momento. Tyler permaneceu quieto, o coração disparado. Deu um passo para trás, inseguro. Estava corroído pelo desejo, mas não tinha certeza até que ponto poderia avançar. Prendeu a respiração ao vê-la sorrir e deixar cair o roupão. Vestia apenas calcinha de renda e a visão do seu corpo seminu o deixou extasiado. Ela era realmente muito bonita. Seu corpo era escultural. Os seios arredondados, as auréolas pequenas e rosadas. Naquele exato momento, a janela perto deles arrebentou. Samantha gritou enquanto Tyler a empurrou para o chão, sem saber o que estava acontecendo. Ouviram então o som dos pneus de um carro se afastando apressadamente. Tyler deu um pulo até a janela a tempo de ver os faróis traseiros do carro que desaparecia na escuridão da noite. Permaneceu de pé, com a respiração ofegante e o cérebro tentando se acomodar entre o desejo por Samantha e a ameaça de perigo. Afastou-se da janela tentando evitar os pedaços de vidro estilhaçados sobre o carpete. — O que está acontecendo? — Samantha perguntou com a voz assustada, vestindo o robe e amarrando-o na cintura. No chão, estava um tijolo que havia sido arremessado contra a janela. Tyler pegou e viu que havia uma mensagem escrita. — É uma mensagem do seu fã clube — ele disse ao entregar-lhe o tijolo para que ela pudesse ler o que estava escrito. Deixe o caso Marcola. Samantha sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo. — O que significa isso? — ela indagou enquanto andava de um lado para o outro em frente da lareira, com o tijolo nas mãos, sem saber o que pensar ou fazer. Tyler a olhava, e a cada passo que Samantha dava, o roupão se abria deixando ver as pernas longas e bem torneadas, tornando difícil para ele se concentrar no que acabara de acontecer. O incidente viera na hora certa, impedindo-os de cometer uma loucura. — Eu a avisei que esse caso tinha todas as características de se tornar um caso explosivo. Talvez você tenha mexido com alguém na sua visita ao Cozinha do Diabo. Pelo amor de Deus, poderia parar de andar e sentar-se? Samantha parou e deixou-se cair pesadamente na poltrona, aparentando surpresa pelo tom raivoso da voz de Tyler. Olhou fixamente para ele e afirmou: — Se você, ou qualquer outra pessoa, pensa que um tijolo vai me fazer desistir do caso está redondamente enganado. Isso apenas me torna ainda mais determinada, pois me deixa consciente de que alguém tem medo do que eu possa vir a descobrir. Agora tenho 50


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy certeza de que Dominic é inocente. — Samantha, gostaria que você reconsiderasse. Deixe um advogado de o Estado cuidar do caso Marcola. — E eu gostaria que você me vendesse a sua metade do Escritório Jamison — ela respondeu brava. — Mas... Nem sempre podemos ter o que queremos. Tyler franziu o cenho e ficou pensando se o que quase acontecera entre os dois havia poucos minutos, não seria uma manipulação da parte de Samantha. Talvez ela pensasse que o seduzindo, ele concordaria em ceder-lhe sua parte no escritório. Mas afastou esse pensamento, incapaz de acreditar que ela pudesse ser capaz disso. Ela era sincera e direta demais para usar esse tipo de subterfúgio. — Por que está tão determinada a defender Dominic? Teve alguma coisa com ele no passado? Aquela era uma pergunta que lhe martelava o cérebro, desde que Samantha manifestara intenção de representar o suposto assassino. — E você... Está tendo um caso com minha irmã? — Santo Deus... Não! — Tyler respondeu chocado. — Nunca houve nada entre Dominic e eu. Acho que ele é o único homem na cidade com quem não tive alguma "coisa" — Samantha respondeu com sarcasmo. — Além de mim... E então você tentou seduzir-me naquela noite em que fui buscá-la na Taverna James. A reação de Samantha a tais palavras foi imediata. Ela endireitou as costas e seu rosto ficou vermelho. — Isso não conta, eu estava bêbada e não sabia o que estava fazendo. — Pelo contrário, você parecia saber muito bem o que estava fazendo, como alguns minutos atrás. Tyler sabia que estava alimentando a raiva de Samantha do mesmo modo com atiçara o fogo na lareira. Mas não conseguia evitar. Sentia-se mais seguro fomentando a raiva entre eles. Samantha levantou-se da poltrona e se aproximou de Tyler, só parando quando estava bem perto dele. — Pode ficar tranqüilo que não farei mais avanços sobre você — disse com suavidade, enquanto seus seios levantavam e abaixavam sob sua respiração. — Eu dormiria com Henry Watkins, e sua peruca horrorosa, antes de dormir com você. — Para mim está bem — ele respondeu. — Geralmente eu só durmo com as mulheres que amo, e não estou certo nem se gosto de você. Samantha deu um passo para trás. — Pode ter certeza que isso não vai me fazer perder o sono. — Nem eu esperava por isso. O que vai lhe fazer perder noites de sono será a defesa que tem de preparar para impedir que Dominic vá para o corredor da morte. Os olhos de Samantha ficaram sombrios. — E você acha que não sei disso? Mas você também perderá noites de sono depois 51


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy que eu vencer o caso no tribunal. Serei a advogada número um do Escritório Jamison, e não ficarei sossegada enquanto não o puser para fora. Ela virou-se e se dirigiu para a porta, saindo do estúdio. Tyler ouviu seus passos na escadaria que levava aos quartos. — Chame a polícia — ele gritou indo atrás dela. — Precisamos fazer um boletim de ocorrência do que aconteceu. Samantha não respondeu. Tyler passou a mão pelo estômago, á queimação voltara ainda mais forte. Como ela conseguira fazê-lo perder o controle por completo, a ponto dos dois discutirem como duas crianças, trocando insultos e revolvendo o passado? Tyler olhou para a janela quebrada e lembrou-se dos momentos anteriores ao incidente. Quase fizera amor com ela. Mesmo agora a lembrança do beijo e da nudez parcial de Samantha provocava uma resposta física nele. Droga. E aquela pergunta a respeito da irmã dela? Meneando a cabeça, com desânimo, ele foi até a cozinha para pegar uma vassoura. Não havia necessidade de deixar aquela bagunça para o dia seguinte. A polícia não acharia pista alguma no meio de cacos de vidro. Enquanto limpava o chão, tentava encontrar algum sentido na terrível atração física que sentia por Samantha. E a imediata resposta dela mostrava que o sentimento era recíproco. Não era racional e não tinha lógica, mas o fato era que, apesar de não gostar dela, desejava-a com loucura. E era melhor reconhecer do que fingir que essa atração não existia. Tyler foi até a despensa e achou um pedaço de madeira compensada para tapar o buraco da janela e usou mais força do que a necessária para martelar os pregos, pensando que esgotando suas forças acabasse também o desejo que sentia por Samantha. Se fosse esperto sairia daquela casa ainda naquela noite, e iria para um motel até achar um lugar para morar. Pôs o martelo de lado e pegou o tijolo, lendo de novo a mensagem. Ele não era a única pessoa na cidade que fora perturbado pela presença de Samantha. Pela primeira vez, pensou que talvez Samantha estivesse certa a respeito da inocência de Dominic. E, se Dominic era inocente, o assassino estava de olho em Samantha. Não, ele não poderia mudar-se e deixá-la sozinha com uma governanta que ia embora depois de servir o jantar. Ouviu baterem na porta e uma voz anunciando que era a polícia. Tyler foi atender, passando a mão no estômago, com a certeza de que a paz que ele tentara encontrar com tanto esforço estava ameaçada. Sua vida regrada e metódica estava prestes a explodir. Tudo por causa de um caso de assassinato e... De uma bela loira de pernas comprida chamada Samantha.

CAPÍTULO VII 52


Momentos Íntimos nº36

Perigosamente Sedutora

Carla Cassidy

— Obrigada por receber-me, Sra. Morgan — Samantha disse à mulher de cabelos grisalhos que havia visto no funeral de Abigail. — Por favor, pode me chamar de Geórgia. — Ela abriu a porta para deixar Samantha entrar na sala do elegante apartamento. — Concordei em recebê-la, mas não sei o que teria para falar-lhe. — Seus olhos azuis brilhavam de espanto. — Se você não se importar, podemos conversar na cozinha porque estou fazendo massa para pão. Samantha atravessou a sala, decorada com muito bom gosto, e seguiu a Sra. Morgan até cozinha que recendia à farinha e fermento. Geórgia lhe indicou uma cadeira e se dirigiu para frente de um balcão onde havia uma montanha de massa descansando. — Eu lhe agradeço muito por ter me recebido, apesar da sua agenda lotada de compromissos — Samantha declarou, enquanto Geórgia passava farinha nas mãos e começava a abrir a massa. Geórgia Morgan era uma mulher atraente e apesar dos cabelos grisalhos, tinha os traços joviais, sem sinais de rugas. "Deve ter feito plástica", pensou Samantha. — Oh, querida já não tenho tantos compromissos como antes. Quando era casada com Morgan, minha vida era um pesadelo de jantares de negócios e deveres de anfitriã. — Suas mãos trabalhavam a massa com destreza. — Agora, minha vida é muito menos complicada. — Quanto tempo você esteve casada com Morgan? — Quarenta e dois anos. Casei-me com ele quando tinha apenas dezenove anos. — E há quanto tempo estão divorciados? — Samantha perguntou, enquanto tirava do bolso um pequeno bloco de anotações. — Completará dois anos no próximo mês. — Foi á senhora ou seu marido que pediu o divórcio? Geórgia parou de trabalhar a massa e olhou para Samantha com tristeza. — Na época do divórcio eu tinha sessenta e um anos de idade, portanto um tanto idosa para entrar no time das solteiras. — Ela suspirou. — Nesse tempo, Morgan estava enfrentando uma crise de meia-idade. Começara a fazer ginástica no clube, na tentativa de recuperar sua juventude. — Isso deve tê-la magoado muito — Samantha comentou com simpatia. Fez uma pausa e acrescentou: — Deve ter odiado Abigail. Geórgia sorriu. — Você conheceu Abigail? Samantha meneou a cabeça negando. — Era impossível odiar Abigail. Ela era tão cheia de vida e tão bonita... No início eu quis odiá-la, mas percebi que se não fosse Abigail teria sido outra. Morgan não estava feliz ao meu lado, e vi como Abigail o deixava feliz. Como poderia odiá-la, se trouxera tanta felicidade a ele? 53


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy As palavras de Geórgia pareciam verdadeiras e ela as pronunciava sem tensão ou estresse que pudessem indicar que estava mentindo. Mesmo assim, Samantha achou estranho que a primeira esposa aceitasse a segunda com tanto desprendimento. Mas Samantha sabia que as emoções humanas eram complexas e estranhas. Geórgia pareceu perceber as dúvidas de Samantha. — Olhe, Srta. Dark, eu não vou fingir que não fiquei arrasada quando Morgan pediu o divórcio. Eu o amava. — Ela meneou a cabeça com tristeza. — Provavelmente o amarei para sempre, mas me adaptei ao meu novo estilo de vida. Tenho minha cozinha, gosto muito de fazer pão, e meu clube de bridge. Meu filho mora comigo, e minha vida é agradável e sem preocupações. Geórgia olhou direto nos olhos de Samantha. — Se você pensa que tenho alguma participação na morte daquela pobre garota, está complemente enganada. — Estou apenas colhendo informações. Acredito que Dominic Marcola é inocente e o melhor modo de defendê-lo dessa acusação de assassinato é ter certeza sobre os fatos anteriores ao crime. — É claro — Geórgia concordou e começou a amassar o pão novamente. — Mas Dominic foi encontrado ao lado do corpo e pelo que ouvi dizer estava muito embriagado. Não tenho idéia de que tipo de informação eu posso dar-lhe, para ajudá-la a desvendar esse caso. Samantha sorriu. — Acho que nesse aspecto, nós duas estamos no escuro. — Samantha virou várias páginas do bloco e perguntou: — Qual é o nome do seu filho? — Kyle. — Geórgia olhou horrorizada para Samantha. — Certamente você não está pensando que ele teve alguma coisa a ver com esse crime. — Estou apenas me certificando dos fatos — Samantha respondeu. — E qual é a idade dele? — Quase vinte e um. — Suas feições se suavizaram quando falou no filho. Samantha fez um cálculo mental. — Então a senhora tinha quarenta e dois anos quando Kyle nasceu? — Ele foi um presente do céu. Um anjo que me foi mandado do Paraíso. Naquele momento, o rosto terno e maternal de Geórgia tornava impossível para Samantha imaginá-la com as mãos em torno do pescoço de Abigail... Era impossível pensar que ela pudesse ter qualquer envolvimento no assassinato. — A senhora pode pensar em alguém que tivesse uma razão para matar Abigail? Geórgia meneou a cabeça numa negação. — Oh, Abigail podia às vezes ser egocêntrica e egoísta, mas não posso imaginar que alguém a odiasse tanto, a ponto de matá-la. — Lágrimas caíam dos olhos de Geórgia. — Pobre Abigail... E pobre Morgan. Ele está destruído. 54


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy O som da porta da sala se abrindo e a saudação que se seguiu impediram Samantha de formular outra pergunta. — Mamãe, eu cheguei. — A voz de Kyle Morgan soou na sala de visitas. — Estou na cozinha, querido. Kyle entrou na cozinha, e seu sorriso apagou-se quando viu Samantha. — O que você está fazendo aqui? — Kyle, querido, a Srta. Dark está apenas fazendo algumas perguntas. — Geórgia deu um rápido sorriso a Samantha. — Ele é muito protetor. — Enxugou as mãos e indicou a Kyle a cadeira oposta a Samantha. — Sente-se Kyle. Vou fazer para nós um bom chocolate quente. Kyle era um rapaz bonito e atraente, mas sua atitude encobria essas características. — Então, o que você quer? — perguntou a Samantha, os olhos negros fitando-a com antipatia. — Gostaria de fazer-lhe algumas perguntas — Samantha falou não se deixando intimidar. — Não... Eu não gostava de Abigail e não... Eu não a matei. — Kyle respondeu com animosidade. — Então, você não ficou feliz quando seu pai casou-se com ela? — Meu pai estava obviamente pensando com outras partes do corpo que não seu cérebro. — Kyle! — Geórgia pareceu chocada. O jovem olhou para a mãe. — É verdade, mamãe, e você sabe disso. Abigail era uma cavadora de ouro e papai foi estúpido demais para enxergar. Geórgia olhou furiosa para o seu "presente dos céus". — Já chega Kyle. Não quero você falando desse modo sobre seu pai. Kyle levantou-se da mesa com o rosto conturbado pela emoção, e antes que a mãe pudesse impedi-lo, saiu da cozinha. Um segundo depois, a porta bateu indicando que ele havia saído de casa. — Por favor, não pense mal de Kyle. Tudo isso o atingiu tremendamente. Morgan e eu o mimamos, talvez, demais. Com o divórcio e o crime ele se deu conta de que o mundo nem sempre é um lugar agradável e fácil. Samantha concordou e levantou-se. — Mais uma coisa e eu a deixarei em paz. Quando foi a última vez que a senhora viu Abigail? Geórgia franziu o cenho. — Acho que foi dois ou três dias antes do crime. Encontramo-nos por acaso no centro da cidade e almoçamos juntas no clube. — Mais uma vez seus olhos azuis se encheram de lágrimas. — Ela estava tão excitada! Achava que estava grávida, mas creio que estava enganada, porque não ouvi mais nada a respeito... Você sabe... Depois. Samantha tentou disfarçar sua surpresa. Tinha feito uma leitura rápida na necropsia. 55


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Agora estava ansiosa para voltar ao escritório e ler com mais atenção. — Obrigada pela atenção que me dispensou, e pela sua franqueza comigo. Geórgia pegou a mão de Samantha entre as suas. — Se o jovem que defende não é o responsável pela morte de Abigail, espero que descubra o verdadeiro culpado, seja ele quem for. — Sorriu mais uma vez — Gosta de pão de canela, feito em casa? — Soltou a mão de Samantha. — Claro — Samantha respondeu surpresa com a súbita mudança de assunto. Geórgia foi até um armário perto do forno, onde estavam enfileirados diversos embrulhos de papel de alumínio enfeitados com fitas coloridas. — Pão de canela é minha especialidade. Faço três vezes por semana e dou para minha família e amigos. — Ela pegou um, enfeitado com uma fita vermelha e o entregou a Samantha. — Vermelho é para as terças-feiras. Isso quer dizer que foi assado ontem. Se você tivesse vindo um pouco mais tarde, teria ganhado um com fita azul. Azul é para as quartas-feiras. Samantha se dirigiu para a porta carregando o pão embrulhado e sentindo muita simpatia pela mulher que tinha tão pouco a fazer na vida que se distraía assando pão e os codificando com fitas coloridas. Enquanto dirigia para o escritório, sua mente era tomada de suposições. Abigail estaria mesmo grávida? Teria perdido esse detalhe quando lera a necropsia? Se realmente houvesse uma gravidez, seria possível que esse fosse o motivo do crime? Mas por quê? No escritório, ela encontrou a recepção vazia. Olhou para o relógio de pulso e se surpreendeu por já passar das cinco horas. Dirigiu-se à sua sala e procurou pelo relatório da necropsia no meio da pilha de papéis que estava sobre a mesa. Encontrou-o, tirou os sapatos e sentou-se na poltrona macia do outro lado da sua mesa e começou a ler. Tyler parou o carro no estacionamento do prédio sem ficar surpreso de o carro de Samantha ainda estar lá apesar do adiantado da hora. Ele mal a tinha visto nos últimos dias, desde a noite em que quase tinham feito amor. Desligou o motor do carro, pensando na noite em que se abraçaram e se beijaram iluminados pelo fogo da lareira. Graças a Deus que aquele tijolo tinha entrado pela janela, naquele momento, impedindo-os de perpetuar aquela loucura. Sim... Tinha sido loucura. Não havia outra explicação para a paixão que havia varrido a sanidade mental dos dois. Tyler saiu do carro e usou sua chave para abrir a porta do prédio. Precisava pegar alguns arquivos antes de ir para casa. Viu a luz acesa pela fresta da porta do escritório de Jamison. Escritório de Samantha, ele mentalmente se corrigiu. Tentou não pensar na mulher que estava no escritório, e se concentrar naquela com quem tinha acabado de jantar. Sarah Baylor tinha trinta anos e era o tipo de mulher que Tyler tinha idealizado para ser sua esposa. Bonita, sabia como agradar um homem e tinha deixado claro que não estava interessada em apenas um ocasional jantar. Era professora, tinha pontos de vista conservadores e Tyler sabia que Sarah nunca o deixaria; embaraçado ou comprometeria 56


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy sua integridade profissional. Um mês antes, Tyler estava disposto a propor-lhe um compromisso mais sério, mas agora essa idéia o atraía menos. Tyler pegou os documentos que precisava e desceu as escadas. Passando pela porta da sala de Samantha, olhou e hesitou. Ela tinha trabalhando com afinco nessa última semana. Levantava-se antes dele, e voltava para casa depois que ele havia ido para a cama. Se continuasse assim, não iria defender ninguém. Acabaria num hospital com esgotamento. Lembrou-se da correria que acompanhara o seu primeiro caso e sabia que era muito provável que Samantha estava com a taxa de adrenalina mais alta. E sabia também que isso não era saudável. Samantha não tinha ninguém para dizer-lhe essas coisas. Se Jamison estivesse vivo, gostaria que Tyler a prevenisse da importância de não se queimar na fase inicial do processo. Decidiu-se, e bateu na porta, de leve. Não obteve resposta. Bateu mais uma vez e... Nada. Abriu a porta e olhou para dentro. A luminária da mesa clareava pouco, mas o suficiente para que ele a visse encolhida na poltrona. Seus cabelos tinham escapado da presilha que os prendia na altura da nuca e caíam sobre seu rosto como uma cortina clara de seda. Uma das mãos se apoiava sobre uns papéis e a outra estava sob seu queixo. Ela parecia confortável apesar das longas pernas enoveladas sobre o assento da poltrona. Tyler hesitou entre acordá-la ou deixá-la dormir, mas concluiu que se ela passasse a noite naquela posição, não conseguiria movimentar as pernas no dia seguinte. — Samantha? — ele chamou com suavidade. Ela não se moveu e ele se aproximou mais. Podia sentir a suave fragrância do perfume floral que ela usava. Teve que lutar para conter o impulso de tocá-la, acariciar seu rosto e passar os dedos pelos cabelos loiros e sedosos. O que aconteceria se ele se curvasse e lhe beijasse os lábios? Estremeceu ante tais pensamentos fantasiosos. O que estava imaginando? Nenhum beijo transformaria Samantha numa princesa dócil e inocente. — Samantha, acorde... Tyler tocou-lhe o ombro e deu um passo para trás. Ela despertou esticando as pernas e os braços, e os papéis que estavam no seu colo se espalharam pelo chão. Abriu os olhos, endireitou-se na poltrona e bocejou. — Que horas são? — perguntou. — Já passa das nove. — Droga então eu estou dormindo há muito tempo. Inclinou-se para frente para pegar os papéis do chão. — Samantha... — Tyler apoiou uma das mãos no ombro dela. — Por que não descansa essa noite? — Não tenho tempo para descansar. — Levantou-se arrumando os papéis, e 57


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy caminhou até a mesa. — O julgamento será daqui a uma semana e há ainda muita coisa para fazer. Tyler notou um tom de pânico na voz dela. Sentou-se na beirada da mesa, perscrutando-lhe o rosto sob a claridade da luminária. — Por que não pede um adiamento? Provavelmente o juiz Halloran lhe daria mais tempo para preparar a defesa. Samantha negou com um gesto de cabeça. — Dominic não aceita. Ele tem direito a um julgamento rápido e insiste nisso, embora eu tivesse lhe dito que com mais tempo talvez eu consiga mais evidências para ajudar a inocentá-lo. — Samantha franziu as sobrancelhas e esfregou o meio da testa com o dedo indicador. — Acho que Dominic pensa que tenho algum coelho escondido na cartola. Ele tem absoluta confiança na minha habilidade, acha que vou conseguir inocentá-lo e não quer passar nem um dia sequer a mais na cadeia. Tyler segurou o queixo de Samantha com os dedos. — Não adiantará nada se trabalhar até a exaustão e estiver esgotada no dia do julgamento. Você está se desgastando demais, com olheira profunda e magra. Sua aparência é horrível. Quando foi a última vez que fez uma refeição decente? Ela afastou a cabeça. — Se você veio até aqui para fazer com que eu me sinta melhor, não está fazendo um bom trabalho. E hoje tomei o café da manhã. — E o que comeu no café da manhã? Uma rosquinha, aí, sentada à mesa? Um olhar no rosto de Samantha confirmou o que ele dissera. Tyler puxou Samantha pelo braço, forçando-a a levantar-se. — Ei... O que está fazendo? — ela gritou, enquanto Tyler a puxava em direção à porta e ela lutava para se soltar. Ele parou perto da porta e a encarou. — Samantha, o cérebro precisa de combustível e esse combustível vem em forma de alimento. — E não largava o braço apesar da expressão de rebeldia estampada no rosto dela. — Vou levá-la ao Restaurante Royale, onde fazem um filé, grosso e suculento. A expressão rebelde se esvaiu. — Um filé com molho de pimenta? Tyler concordou. — Com pimenta suficiente para fazer você soltar fogo pelo nariz. — Sorriu com suavidade notando mais uma vez como ela estava abatida. — Vamos, deixe que seu sócio lhe pague um jantar, e você poderá me contar o que já conseguiu para a defesa de Dominic. — Sério? Você quer mesmo saber? — Olhou para Tyler como se suspeitasse de que ele estivesse brincando. — Não se importaria de conversar sobre o caso? Tyler hesitou. A última coisa que ele queria era se envolver no caso Marcola. Pelo que ouvira a respeito, havia semelhanças demais com a tragédia da sua própria vida. Não 58


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy queria revolver aquele passado que enterrara havia tanto tempo. Em silêncio, Samantha o fitava com os olhos brilhando de esperança. Tyler se lembrou das noites em que ele e Jamison ficavam discutindo sobre aspectos dos seus casos, partilhando idéias e simulando estratégias. Aqueles anos trabalhando juntos tinham criado um respeito mútuo e uma inquebrantável confiança entre os dois. De repente, Tyler teve vontade de fazer o mesmo com Samantha. — Vamos, falaremos enquanto você come. Samantha sorriu... Um sorriso lindo que o aqueceu interiormente. Levou apenas alguns momentos para chegar ao Restaurante Royale, o mais caro e freqüentado pela elite de Wilford. O maitre que os recebeu franziu as sobrancelhas para Tyler. — Noite agitada? — perguntou-lhe, enquanto os levava até uma mesa num canto mais privativo. Tyler sentiu-se ruborizar, percebendo que o maitre estava se referindo ao encontro que ele tivera com Sarah no mesmo restaurante, uma hora antes. Samantha olhou para Tyler com curiosidade e quando o maitre se afastou, perguntou: — Noite agitada? — Estive aqui mais cedo para jantar. — Sozinho? — Ergueu a mão para impedi-lo de responder. — Desculpe-me, isso não é da minha conta. — Na verdade tive um encontro — ele respondeu, querendo saber por que se sentia como um marido admitindo um erro. Samantha ergueu uma sobrancelha. — É alguém que eu conheço? — Sarah Baylor. Ela leciona na faculdade. — A pequena... Loira? — Você a conhece? — ele perguntou surpreso. — Não, mas acho que o vi conversando com ela no funeral de Abigail. — Sim, ela estava lá. — Tyler tomou um gole de água. — Agora me diga como você está indo com a investigação. — Ele não sabia o motivo, mas se sentia desconfortável em falar a respeito de Sarah com Samantha. Samantha se recostou na cadeira, e seus olhos brilhavam. — Encarreguei Wylie de fazer um retrospecto sobre a vida de Abigail, para tentar descobrir se havia algum fato no passado dela que pudesse ter alguma ligação com o crime. Por falar nisso, obrigada por convencê-lo a me ajudar. — Ele descobriu alguma coisa útil? O brilho do olhar de Samantha diminuiu. — Ainda não. — Ele é bom, Samantha. Se houver alguma coisa, Wylie descobrirá. A conversa foi interrompida com a chegada do garçom. Samantha pediu o filé e Tyler 59


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy apenas um café. — Entrevistei Geórgia e Kyle Morgan, hoje. — Samantha falou quando o garçom se retirou. — E? — Não tenho certeza. — Ela franziu as sobrancelhas e desdobrou o guardanapo, colocando-o no colo. — Geórgia foi agradável, mas o filho, não. Aquele rapaz parece ter problemas comportamentais. Tyler tentou esconder um sorriso. Parecia irônico ouvir Samantha falar sobre desvios de comportamento. — Não ouse dizer uma palavra... — Samantha o avisou como se tivesse lido o pensamento dele. Tyler riu e juntou as mãos como que pedindo perdão. — Não, eu não... Jamais ousaria. — Bem — ela continuou bem-humorada —, ele não está competindo comigo ao título de Senhor Personalidade. Seu bom humor desapareceu. Ele odiava Abigail, achava que ela era uma cavadora de ouro e que estava apenas atrás do dinheiro do seu pai. — Você acha que ele tem alguma coisa a ver com o crime? — Não sei. Talvez. Wylie vai checar. Mas eu descobri coisas interessantes através de Geórgia. Ela almoçou com Abigail poucos dias antes do assassinato e Abigail lhe disse que suspeitava estar grávida. — Você checou o relatório da autópsia? Samantha concordou. Seus cabelos brilhavam sob a luz da vela no castiçal no centro da mesa. — Era o que eu estava fazendo quando adormeci. De acordo com a autópsia, ela não estava grávida. — Então chegamos a um caminho sem saída — Tyler observou, pensando como aquela vela fazia efeitos magníficos no rosto e nos cabelos de Samantha, e ele não notara o mesmo em Sarah. — Não... Não acho. O que importa não é o fato de ela estar grávida ou não, e sim a quem teria contado. Tyler á fitou admirada. A astúcia de Samantha o surpreendia e ele não sabia bem por quê. Talvez porque ela sempre demonstrara falha nos julgamentos e escolhas que fizera durante a adolescência. Mais uma vez foram interrompidos pelo garçom que chegava com a refeição de Samantha. Por alguns minutos foi impossível conversarem, pois ela estava ocupada com o prazer de saciar a fome. Tyler recostou-se na cadeira tomando seu café e olhando-a devorar o filé. Samantha não parecia preocupar-se com calorias ou colesterol, pois colocava creme nas batatas e passava muita manteiga no pão. Tyler ficou imaginando se ela fazia amor com o mesmo apetite. Achava que sim. Ela não devia se preocupar em desmanchar os cabelos ou variar as posições. Deveria se atirar 60


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy no ato sexual da mesma forma apaixonada e intensa como se atirava em tudo que fazia. — Desculpe-me... Não tinha percebido como estava faminta. — Ela se retraiu fazendo Tyler perceber que estava olhando para ela com o cenho franzido. Samantha limpou os lábios com o guardanapo e continuou: — Bem, onde estávamos? Ah, sim. Na gravidez de Abigail. Tyler se esforçou para prestar atenção no que Samantha falava e parar de imaginá-la fazendo amor. — Dominic disse que Abigail estava excitada, e com um segredo para lhe contar, uma coisa que a faria fazer um bom acordo com Morgan. O segredo seria uma suposta gravidez? — Samantha falava animadamente: — Esse foi meu pensamento inicial, mas não estou segura de como exatamente um bebê poderia ajudá-la a conseguir dinheiro de Morgan. Certo, ele teria que pagar uma pensão à criança e a ela, mas seria tudo que ela poderia esperar. Não, acho que havia mais alguma coisa nesse segredo, além da possibilidade de ela ser mãe. E também acho que se desvendar esse segredo eu terei uma pista segura para descobrir quem matou Abigail. — E que tipo de defesa você está preparando para o caso de não descobrir o verdadeiro culpado? O garçom reapareceu para servir mais café a Tyler, e levar o prato vazio de Samantha, que pediu um pedaço de torta e café também para ela. Depois que o garçom se afastou, ela se debruçou sobre a mesa e falou com uma expressão perturbada: — Na realidade, as únicas coisas que tenho são um relatório superficial da polícia, alguns fatos inconsistentes e a esperança de que os jurados vejam como é ridícula a acusação de Dominic. — Deixe-me bancar o advogado do diabo — Tyler sugeriu. Ela concordou e se inclinou mais ainda. De novo, Tyler percebeu o brilho do seu olhar. Olhar de inteligência, de emotividade e confiança. "Se o júri pudesse ver esse olhar ela conseguiria convencê-los do que quisesse", ele pensou. — Primeiro, há o relatório toxicológico da polícia. Tanto Abigail como Dominic estavam com alta concentração de barbitúricos no sangue, mas a quantidade de álcool estava abaixo do índice de embriaguez. Esquisito, não é? Tyler concordou. O que ele achava mais esquisito era o esforço que tinha que fazer para prestar atenção nas palavras dela. Esquisito era perceber que, apesar de conhecê-la havia anos, não sabia nada a seu respeito. Também o fato de nunca ter percebido que os cabelos de Samantha não tinham apenas um tom de loiro, mas centenas de nuanças, o que os deixava ainda mais bonitos. Naquele momento percebeu que seu sorriso começava nos olhos e só depois curvava seus lábios. Samantha continuava a expor suas idéias: — O mais estranho, de tudo, é que ninguém testou o champanhe. A garrafa foi jogada fora por acidente. Você acha que eles poderiam ter sido drogados? É a única hipótese que faz sentido. Dominic diz que não bebeu o suficiente para ficar embriagado, mas que ficou zonzo e dormiu. Disse que a garrafa já estava aberta quando ele chegou, e 61


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy que estava pela metade quando Abigail começou a beber. Agora Tyler estava bem atento. — Continue — ele a exortou. — Na minha entrevista com Morgan, perguntei sobre os hábitos de Abigail. Fui informada de que ela tomava várias taças de champanhe à noite, tanto que havia sempre uma garrafa na geladeira. E o telefonema para o 911, feito a dois quarteirões de distância da cena do crime, também é estranho. — O caso todo ficaria muito mais conclusivo se você descobrisse outras pessoas que tivessem motivo para matar Abigail — Tyler observou. — Sem problema. — Ela deu mais um daqueles sorrisos maravilhosos. — Posso começar com Kyle Morgan que deve ter ouvido alguma coisa sobre a suposta gravidez de Abigail e ficou com medo de ter que dividir a herança com o bebê, além da esposa. Há o próprio Morgan, que apesar do álibi pode ter contratado um assassino profissional para livrá-lo de uma mulher que casara com ele apenas por dinheiro. E tenho a impressão de que, quando Wylie terminar suas investigações, ele me apontará outros suspeitos que poderei usar na defesa de Dominic. Tenho a esperança de que, se foi um crime encomendado, Osso descobrirá alguma coisa. — Você não me disse como conheceu Osso. — Ele foi um dos muitos com quem eu saía quando estava no colégio. Ajudou-me a fugir de casa em várias ocasiões. O estômago de Tyler doeu ao pensar que Osso fora um dos namorados de Samantha. Teria ele sido um dos companheiros dela nas conspirações contra o pai? E ficou surpreso ao perceber que era ciúme o que fazia seu estômago doer. Irritação e emoção fizeram-no admoestá-la: — Você magoou muito seu pai com sua revolta da juventude. Em um segundo, o calor dos olhos de Samantha foram substituídos por uma expressão gelada. — Ele também me magoou muitas e muitas vezes. Não estava aqui nos primeiros anos depois da morte de minha mãe. Não viu meu pai me rejeitar. Só conheceu o grande Jamison Dark, brilhante e carismático orador, competente e imbatível advogado. Não conheceu o homem... A figura paterna distante e fria, o homem que me disse incontáveis vezes, que eu nada significava e que nunca seria alguém na vida. — Samantha, é isso que o caso significa para você? Quer provar para seu pai que é alguém? Ele está morto agora. Você não pode provar mais nada a ele! Ela sorriu, e fez um gesto de desânimo. — Você não entende Tyler. Não quero provar nada a meu pai. Quero provar a mim mesma. Se eu vencer, saberei que tenho valor e que posso fazer coisas boas... Se perder, saberei que meu pai tinha razão. Saberei que não sou nada e que nunca serei alguém. — Samantha, isso é apenas um caso — Tyler protestou. — Não, Tyler. É a minha vida. O garçom chegou trazendo a sobremesa. Samantha comeu em silêncio, com o olhar 62


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy fixo na vela sobre a mesa. Tyler sabia que estava para fazer alguma coisa incrivelmente estúpida. Lutou contra, mas sentia que era em vão. O caso Marcola o tinha interessado e era importante para Tyler que Samantha vencesse. — Samantha, eu sei que lhe disse que não queria me envolver nesse caso, mas se quiser, ficarei feliz em assessorá-la. O prêmio de Tyler foi o olhar carinhoso que ela lhe endereçou e o sorriso meigo que lhe iluminou o rosto. — Ás vezes você mostra sinais de inteligência, Tyler Sinclair — ela disse com suavidade. Tyler suspirou, pensando se na tentativa de salvar a alma de Samantha, ele não corria o risco de perder a sua.

CAPÍTULO VIII

Tyler acordou com falta de ar, e o coração disparado, devido ao pesadelo que tomara conta de seu sono. Sentou na cama tentando se acalmar. Na última semana, desde que oferecera ajuda a Samantha no caso Marcola, vinha tendo aquele pesadelo com freqüência. Tyler levantou-se, passou a mão pelos cabelos para afastar da mente as últimas imagens do pesadelo. Foi até a janela pensando se Samantha conseguira dormir. O julgamento de Dominic ia começar naquela manhã, e na noite anterior ele e Samantha tinham ficado acordados até tarde discutindo os detalhes finais. Um júri composto por oito mulheres e quatro homens decidiria o destino de Dominic. Samantha ficara satisfeita pela maioria ser composta por mulheres, pois achava que as mulheres seriam mais fáceis de serem convencidas de que um homem não cometeria um crime daqueles contra a mulher amada. Tyler, fazendo o papel de advogado do diabo, á tinha lembrado que muitos assassinos professavam amor pelas suas vítimas. Seguira-se uma acalorada discussão, Samantha mantendo sua opinião de que um amor verdadeiro não pode matar, e Tyler insistindo no contrário. Afastou-se da janela e foi para o chuveiro. Enquanto se deixava molhar, a sensação ruim trazida pelo pesadelo foi afastada, como também o último resquício de sono. Tinha o pressentimento de que aquele ia ser um longo dia. Pouco depois, vestido num dos seus vários e elegantes ternos, desceu as escadas sentindo o agradável aroma de café fresco. Olhou para o relógio de pulso e constatou que era cedo demais para Virgínia ter chegado. Entrou na cozinha e viu Samantha sentada à 63


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy mesa, com uma xícara de café à sua frente. — Pronta para o seu grande dia? — Vai ser moleza — Samantha respondeu com um brilhante sorriso apesar de ele perceber que suas mãos estavam; tremendo ao levantar a xícara para levá-la à boca. Tyler se serviu de café e juntou-se a ela. — Está com fome? Posso preparar um desjejum para nós — ele disse. — Alguns ovos e um pouco de presunto? — Não, obrigada. Trabalho melhor de estômago vazio. Tyler concordou. Lembrava-se bem do que sentira no seu primeiro dia no tribunal: adrenalina correndo por suas veias e a vontade de vomitar. "Bem vinda ao grupo", ele pensou. Mas apenas respondeu: — Você se sairá bem. — Pretendo me sair melhor do que isso — Samantha respondeu. — Estou planejando algo grandioso. Tyler sorriu ante o otimismo forçado de Samantha. Se aquela confiança contasse, era certo de que ela conseguiria seu intento. O nervosismo era natural, seria estranho se não estivesse apreensiva e nervosa. Se assim não fosse, ele duvidaria de sua performance no tribunal. — Desculpe-me — Samantha disse e levantou-se da mesa com pressa, desaparecendo da cozinha. Tyler ouviu bater a porta do lavabo. "Sim, ela ficaria bem, depois de vomitar", pensou com um sorriso. Poucos minutos antes das oito, Samantha e Tyler entraram no carro e foram para o tribunal. O julgamento começaria ás nove, e Samantha queria um tempo para conversar com Dominic antes de a seção iniciar. Tyler dirigia e olhava disfarçadamente para sua sócia. Estava muito atraente vestida num conjunto de saia e blazer, que comprara para essa ocasião. Seus cabelos estavam presos numa trança e seus lindos olhos brilhavam na antecipação de uma boa briga. Samantha falava baixinho para si mesma e Tyler pôde perceber que estava ensaiando sua fala de abertura. Ela calou-se quando ele parou o carro no estacionamento ao lado do tribunal e viu o caos que se formara na escadaria que levava ao prédio. — Aquela cobra — ela resmungou quando viu Chester Sparks falando diante de uma câmera de televisão. — O julgamento ainda nem começou e ele já está tentando conquistar a opinião pública. — Samantha... — Tyler a avisou. — Não faça nenhuma loucura. Ela agarrou sua maleta e sorriu para ele, saindo do carro. — Não se preocupe. Já lhe falei que minha fotografia iria parecer ótima nas primeiras páginas dos jornais. — Deu-lhe outro sorriso e ele sentiu sua úlcera dar-lhe um sinal. — Vamos ver como fico na TV. — Com um sorriso, caminhou em direção aos repórteres. Tyler viu quando a mídia percebeu a presença dela, e sabia que o pronunciamento da 64


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy defesa era muito mais interessante que o da promotoria, especialmente quando a advogada de defesa era uma linda loira de pernas bonitas. Para surpresa de Tyler, Samantha falou com os repórteres como se estivesse habituada a isso. Com bom humor e simpatia, ela conseguiu demonstrar confiança na inocência do seu cliente, sem falar algo específico sobre o caso. — Ei, Tyler! Ele se virou e viu Gary Watters, um repórter do jornal de Wilford, se aproximando dele. — Sem comentários, Gary. Gary riu. — Não lhe perguntei nada, ainda. — Aproximou-se de Tyler com uma câmera na mão. — Vamos, responda apenas algumas perguntas. Não quer que eu perca meu emprego, não é? Tyler riu bem-humorado. — Gary, nós dois sabemos que seu emprego não depende das minhas respostas. — Apenas me responda por que você não lidera a defesa. — Porque minha sócia a está liderando. — Ela é tão boa quanto o pai? — É melhor. — Há boatos que existe mais do que negócios entre você e a atraente Dra. Dark. — Isso é ridículo — Tyler respondeu irritado. — Chega de perguntas. — Afastou-se do repórter rapidamente. Ainda com a mídia fazendo-lhes perguntas, Tyler e Samantha abriram caminho entre os repórteres e entraram no prédio ainda tranqüilo do tribunal. Samantha vibrava de energia e seu rosto estava vermelho de excitação. Quando entraram na sala reservada para encontrarem seu cliente, Samantha virou-se para Tyler. — Diga que posso fazer isso, Tyler. — Ela agarrou a mão dele. — Diga que acredita em mim. Como sempre, ver o lado vulnerável de Samantha o surpreendia. Saber que sua opinião era importante para ela, tocou-lhe num lugar secreto que não era tocado havia muito tempo. Ele acariciou-lhe o rosto com as mãos, viu as dúvidas que obscureciam seu olhar, e o medo do que estava por vir acelerar seu pulso. — Samantha, eu nunca acreditei em uma pessoa como acredito em você nesse momento. — A resposta carinhosa atingiu diretamente o coração de Samantha. — Seu pai teria orgulho de você — ele acrescentou. Os olhos de Samantha mudaram de expressão e ela se afastou dele. — Não arruíne meu dia falando no meu pai. — Caminhou até a mesa, onde colocou a maleta. Tyler a observava tirar os papéis da maleta com movimentos bruscos. — Samantha, mais cedo ou mais tarde você terá que enfrentar seus sentimentos em 65


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy relação a seu pai. Mais cedo ou mais tarde, você terá que perdoá-lo. Para o seu próprio bem. O olhar que Samantha endereçou a Tyler era frio e impessoal. — Agora, tudo que tenho que fazer por mim é vencer esse caso. Não devo perdão ao meu pai. Não lhe devo nada. A conversa foi interrompida por um guarda que introduziu Dominic na sala. Imediatamente, eles passaram a preparar Dominic para as situações que iria enfrentar no tribunal. Exatamente às nove horas começou o caso do Estado de Missouri contra Marcola. Chester Sparks, vestindo um terno bege com uma gravata coral, abriu á seção com seu costumeiro, estilo bombástico. Elevando a voz como um padre exorcizando demônios, ele salivava, e seu rosto avermelhava pelo esforço teatral com que falava para o corpo de jurados. Quando Samantha se levantou para seu pronunciamento inicial, Tyler sentiu um espasmo nervoso no estômago. O estilo de Samantha era calmo e amigável. Ela olhava nos olhos de cada jurado, sorrindo com confiança, como a dizer-lhes que sabia que eles eram inteligentes e que iriam concordar com suas afirmações sobre o caso. Tyler começou a relaxar quando percebeu que os jurados pareciam aceitar o que ela falava. Eles se inclinavam ligeiramente para frente, para prestar atenção no que ela falava, com calma, como pretendia provar que Dominic não poderia ter matado e não matara Abigail Monroe. Quando terminou e se dirigiu à sua mesa, passou por Chester, e sussurrou algo que ô fez empalidecer e depois enrubescer. Por um momento, ele pareceu completamente desorientado. — Dr. Sparks... Sua primeira testemunha — O juiz anunciou. — Sim, é claro... — Ele folheou seus papéis e limpou a garganta diversas vezes, enrubescendo de novo enquanto olhava furtivamente para Samantha. Tyler inclinou-se em direção à sócia e sussurrou: — Você quebrou a concentração dele, destruiu seu ritmo. O que afinal você lhe disse? Ela sorriu os olhos castanho-claros brilhando com malícia. — Eu lhe disse que minha calcinha é da cor da gravata dele. Tyler ficou na dúvida se achava engraçado ou se ficava apavorado. Era o tipo de conduta que ele não aprovava, e que ainda não podia saber se dava resultado. Como tática de guerra era brilhante. Chester Sparks ainda estava tentando recobrar a compostura. Tyler mais uma vez se inclinou para Samantha. — Você é terrível. Samantha sorriu. — Isso é apenas o começo. — Diga-me de novo... Fui bem, não fui? — Samantha perguntou a Tyler quando eles entravam em casa depois daquele longo dia. Cheia de energia, ela foi direto ao estúdio, 66


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy onde Virgínia tinha deixado fogo na lareira. Ligou o som... Queria um pouco de música. Tinha vontade de cantar, de dançar e de gritar. Tyler encostou-se ao batente da porta, com um sorriso estampado no rosto enquanto ela chutava fora os sapatos de saltos altos e pisava descalça no grosso carpete. — Sim... Você foi ótima! — ele concordou entusiasmado. — Foi tudo muito bem, mas lembre-se de que foi apenas o primeiro dia. Será um longo julgamento, você terá momentos bons e também maus momentos. Samantha negou com um gesto de cabeça. Não queria ouvir nada negativo. Queria celebrar. — Admita, eu desequilibrei o pomposo promotor — Samantha falava e ria. Tyler também riu. — Sim, você foi ótima. — Está com fome? Eu estou faminta. Vamos ver o que Virgínia preparou para nós. Minutos depois os dois estavam sentados à mesa da cozinha, comendo sanduíche de rosbife e comentando os fatos do dia. — Nem pude acreditar, quando o oficial Winstead declarou que o telefonema ao 911 era suspeito. Foi como um presente dos céus caindo no meu colo — Samantha comentou quando pegava mais batatas fritas. — Ele é um guarda inexperiente e jovem demais para saber que você não poderia lhe fazer esse tipo de pergunta pessoal. Alguém vai chamar a atenção dele por esse lapso. — E aí, a acusação terá que admitir que a polícia, errou ao jogar fora a garrafa de champanhe. Samantha ficou eufórica ao lembrar-se da reação dos jurados diante dessa informação. — Se o júri tivesse que deliberar essa noite, eu teria vencido. — Infelizmente, eles não deliberaram essa noite e amanhã Chester poderá ter um dia proveitoso. Samantha arqueou as sobrancelhas. — Por que você está tentando tirar a azeitona da minha empada? — Não estou — Tyler protestou. — Estou apenas tentando fazer com que mantenha os pés no chão. Samantha abaixou os olhos para o prato ao descobrir o calor que irradiava dos olhos de Tyler, e ao ouvir o tom carinhoso da voz dele. Tentou prestar atenção no assunto que discutiam e não na atração que sentia por ele. — Sei que hoje foi o primeiro dia e que tive sorte com algumas testemunhas da acusação, e sei que amanhã poderá ser diferente. Mas por hoje quero me sentir feliz. Está tão errado assim? — Não, não está. — Ele sorriu. — Lembro-me do primeiro dia do meu primeiro caso. Também foi um dia feliz e eu me senti exultante com o sucesso. Seu pai então me disse que eu ainda estava "cru" e que tinha muito a aprender antes de me achar tão bom. Samantha concordou, lembrando-se das inúmeras vezes em que seu pai havia 67


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy verbalmente acabado com sua autoconfiança. — Papai era muito bom em destruir egos. Levantou-se e colocou seu prato na máquina de lavar louça. Não queria pensar no pai. As palavras de Tyler naquela manhã, a respeito de perdão a tinham deixado aborrecida. Sabia que ele estava certo, mais cedo ou mais tarde teria que superar a raiva que sentia do pai. Mas não naquela noite. Aquela seria uma noite de celebração. Embora já fossem quase dez horas, e havia sido um dia exaustivo, Samantha estava excitada demais para ir para a cama. Tyler passara o dia todo sentado ao lado dela, dandolhe apoio moral e também profissional. Durante todo o dia ela sentira seu perfume e o calor do corpo dele ao seu lado. Quando, depois do pronunciamento da defesa, ela voltou para a mesa, Tyler apertara-lhe a mão e a fitara com orgulho. — Não vá para a cama ainda — Samantha pediu, sabendo que essa devia ser a intenção dele. Aproximou-se, pegou-lhe a mão e acrescentou: — Vamos fazer uma festa de comemoração. — É tarde para fazer convites. — Uma festa só para nós dois. Venha até o estúdio dançar comigo. — Samantha sentiu que Tyler hesitava. — Por favor, Tyler. Esse foi o melhor dia da minha vida e eu não quero que ele termine ainda. Tyler sorriu. — A senhorita quer dançar? Então, vamos dançar. Com o estéreo tocando velhos sucessos, e o fogo crepitando na lareira, eles dançavam uma melodia alegre e de ritmo rápido. Samantha ficou surpresa ao constatar que Tyler era um bom dançarino. Movia-se com ritmo e com naturalidade. Samantha tinha tirado o blazer e Tyler, a gravata. Enquanto dançavam, discutiam alguns aspectos do dia e a estratégia para o dia seguinte. Samantha nunca se sentira tão cheia de vida. Não queria que a noite acabasse, queria guardar para sempre a felicidade que estava sentindo. Quando o estéreo começou a tocar uma melodia lenta e terna, ela se aconchegou nos braços de Tyler. Não queria pensar nas razões que tinha para não estar nos braços dele, razões nebulosas que eram fáceis de esquecer estando tão próximos um do outro. Samantha passou os braços ao redor do pescoço de Tyler, e pôde sentir as batidas rápidas do seu coração junto do dela. De repente lembrou-se da noite em que o tijolo entrara pela janela do estúdio, á noite em que quase tinham feito amor. Oh, como ela o desejara naquela noite! Ergueu a cabeça e o fitou consciente de que o queria de novo. Gostaria que ele a beijasse e expulsasse para longe qualquer pensamento racional. Queria fazer amor com ele. Tyler devia ter visto o desejo estampado em seus olhos, pois Samantha sentiu que ele prendia a respiração e a fitava com intensidade. Os braços dele á apertaram mais, as mãos, nas costas dela, desciam em direção às nádegas. — Beije-me, Tyler — disse com suavidade. — Beije-me e faça amor comigo. Eu quero você... Muito! 68


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy A boca de Tyler procurou com ansiedade pelos lábios de Samantha. Não havia mais motivo para dançarem e apesar de a música continuar, os passos tornaram-se cada vez mais lentos até que os movimentos se concentraram em beijos ardentes. Samantha retribuía o beijo com paixão, procurando a língua dele e deixando-se dominar pelo fogo daquele desejo que os unia. Tyler a apertou mais e Samantha pôde sentir o desejo dele impudente e impetuoso contra ela. Quando o beijo chegava ao fim, Samantha inclinou a cabeça para trás para que ele pudesse beijar seu pescoço. Tremores percorreram-lhe o corpo quando Tyler lhe mordia e lambia o pescoço. Enquanto isso, Samantha desabotoava a camisa de Tyler, querendo ver seu peito, senti-lo nu sob seus dedos. Desabotoou o último botão, e pôde admirar o tórax moreno e coberto de pêlos. Samantha repetiu os gestos na própria blusa, mas parou quando ele agarrou sua mão. — Deixe-me fazer isso — sussurrou, e quase com reverência, abriu botão por botão, parando para beijar cada centímetro da pele de Samantha que ia sendo desnudada. Quando a blusa caiu no chão, os joelhos de Samantha se dobraram e ela deitou-se sobre o carpete, na frente da lareira. Tyler acompanhou-a sem soltá-la e tentava desabotoar-lhe o sutiã. Quando conseguiu, jogou-o de encontro á blusa, e sentou-se por um momento para admirá-la. — Você é tão linda! — exclamou com voz rouca. Deitou-se sobre ela. Seu peito a aquecia e os pêlos do peito roçavam nos seios de Samantha, deixando-a ainda mais excitada. Beijou-a de novo, um beijo intenso e profundo que lhe tirou a respiração e qualquer dúvida que lhe passasse pela mente. Com os dedos trêmulos, Samantha começou a descer o zíper da calça de Tyler. Sabia que se o tocasse, não haveria possibilidade de recuo ou arrependimentos. E era isso que queria. Sem dúvidas nem questionamentos, ela sentiu como se tivesse passado metade de sua vida esperando por aquele momento com Tyler. Era inevitável... Assim como respirar. Quando os dedos de Samantha desceram o zíper, Tyler gemeu o que elevou o desejo de Samantha às alturas. Não sabia que o desejo causava tanta angústia, e nunca havia sentido esse tipo de satisfação. Tyler tirou a calça, ficando, só com uma exígua roupa de baixo que não escondia muita coisa. Uma espécie de medo passou por sua mente quando ela tirou a saia ficando, só com uma calcinha de renda coral. Acariciou Tyler mais uma vez, querendo que ele a possuísse antes que recobrasse sua sanidade mental. Tyler se afastou um pouco de Samantha e apoiou-se nos cotovelos. — Devagar... — disse, enquanto seus dedos dançavam pelos ombros dela e depois pelos seios. — Vamos fazer bem devagar. Samantha estremeceu com a promessa contida na voz e nos olhos de Tyler. 69


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Ele abaixou a cabeça em direção ao bico dos seios, que apertou entre os lábios, e passava a língua até que eles ficaram túrgidos, e com a mão acariciava o ventre liso e macio. Samantha sentia que perdia o controle de seu corpo e de sua mente. Era apenas um conjunto de terminações nervosas. Cada toque, cada carícia colocava-a cada vez mais nas alturas. Quando ele finalmente tocou a renda de sua calcinha, ela arqueou o corpo de encontro às mãos de Tyler, que com gentileza começou a tirá-la, passando por seus quadris, coxas e atirando-a ao lado. Samantha sempre pensara que se sentiria embaraçada ao ficar nua na frente de um homem. Mas Tyler não lhe deu tempo para isso, e quando a tocou novamente, um soluço saiu da garganta. — Você é tão bonita! — ele exclamou e a beijou com paixão. Tyler a acariciou até que achou que fosse perder a razão. Ele sabia muito bem onde tocar e onde beijar para levá-la a lugares onde nunca havia estado. Implacavelmente, ele não parava de acariciá-la até que Samantha chegou ao ápice de todas as sensações. Quando parecia que ele não suportaria mais esperar, Samantha segurou a mão dele. Gostaria que atingissem o clímax juntos. Queria que ele perdesse o controle e se perdesse nela. Samantha desceu a mão até o elástico da cueca de Tyler è, nesse momento, soube que ele não mais se controlaria. Com um movimento frenético, ele tirou a última barreira que existia entre os dois e começou a mexer-se sobre ela. Quando a penetrou, seus olhos se fitavam, falando uma linguagem tão antiga como o mundo e Tyler, mostrou no olhar surpresa e admiração. Ele parou os movimentos, chocado. — Samantha, você é... — Shh, não fale... E não pare. Ela o puxou mais, com os braços em torno das costas de Tyler, tentando mostrar que o desejava ainda mais dentro dela. Antes que ele pudesse fazer um movimento, ela ergueu os quadris em direção a ele e um gemido de dor saiu de sua garganta, enquanto lágrimas caíam pelas suas faces. Logo o gemido de dor foi substituído por gemidos de prazer e por sussurros. — Estou bem... Por favor, me ame. Ele começou a mover-se novamente. — Sim... — ela gemia. — Oh... Sim. Samantha viu a surpresa dos olhos de Tyler desaparecer a cada movimento dos quadris dela contra os dele. Então, ela fechou os olhos e se perdeu no prazer intenso daquele momento. Depois que Tyler rolou para o lado de Samantha e a respiração dos dois voltou ao normal, ela abriu os olhos e fixou-os nele. Mais uma vez Tyler estava ao seu lado, apoiado nos cotovelos e admirando-a com uma expressão impossível de interpretar. — Nossa... Dr. Sinclair! Você sabe como animar uma festa — Samantha disse com 70


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy suavidade, e ficou surpresa por não obter resposta. — Tyler, por favor. Por favor, não diga nada. — Ela sentou-se e afastou os cabelos do rosto. — Não me insulte dizendo que foi um erro. Não foi. Eu quis que acontecesse. O rosto de Tyler estava na sombra tornando impossível que ela visse sua expressão e pudesse adivinhar o que estava sentindo. — Por que eu? — ele perguntou. — Por que não? Eu queria você estava ao meu lado e não o ouvi protestar. — Levantou-se e caminhou até onde estavam suas roupas. Tyler a olhava enquanto ela se vestia e dizia: — Você tem que me desculpar. Não sei como agir depois do sexo. Devemos nos beijar? Dizer boa-noite... Fumar um cigarro? Samantha percebia que o músculo da mandíbula de Tyler se contraía. Ela estava sendo volúvel e o estava deixando furioso. Mas o que ele esperava? Que ela dissesse como o amava? Como sentira o mundo girar ao toque dos seus dedos? Não podia. Sabia muito bem que não era o tipo de mulher que Tyler podia amar. Ele poderia desejá-la e querê-la com intensidade, mas ela jamais conquistaria seu coração e nunca deixaria que ele conquistasse o dela. Aprendera muito tempo atrás, que amar alguém fazia a pessoa sofrer. Seu pai lhe ensinara isso muito bem e ela nunca daria esse poder a mais ninguém. — Eu ainda não entendo — ele disse. — O que há para entender? Não dê a isso mais importância do que realmente tem. Os dois pularam quando o telefone tocou. Tyler o alcançou primeiro e atendeu, enquanto Samantha pegava a blusa do chão e a vestia. — É para você — ele avisou. Samantha pegou o aparelho imaginando quem poderia ser àquela hora da noite. — Alô? — Sá, eu tenho novidades para você. — Osso falava baixo, do outro lado da linha. — O que é? — Ela estremeceu. — Comenta-se na rua que há um míssil para ser disparado em direção à sua cabeça. — Como? — Samantha ficou pensando se havia ouvido direito. — Por quê? — Alguém quer muito que você fique fora do caso Marcola. E logo. Um frio percorreu a espinha de Samantha. — Quem? — Não sei. O que sei é que essa pessoa está oferecendo cinco mil dólares para tirá-la do julgamento. É tudo o que sei. — Você me contará se souber de mais alguma coisa? — Você sabe que sim. — Desligou sem se despedir. Samantha colocou o telefone no gancho devagar, tentando digerir o que tinha ouvido. Virou-se para Tyler que subia o zíper da calça e abotoava a camisa. — Era Osso. Tinha notícias para mim. 71


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Tyler esperou que ela continuasse. — Parece que alguém me quer morta e oferece uma recompensa a quem fizer o serviço.

CAPÍTULO IX

— Alguém quer que eu morra... As palavras de Samantha assombraram Tyler pelo resto da noite e continuaram a preocupá-lo por toda a maçante manhã de testemunhos, no tribunal. Depois do telefonema de Osso, Tyler e Samantha conversaram a respeito, tentando descobrir quem Samantha estaria incomodando, e de quem poderia vir á ameaça. Mas não chegou a resposta alguma. Tyler estava assustado. Sabia que o perigo era cada vez mais iminente e sentia-se impotente para evitá-lo. A preocupação não era só por Samantha, mas também por ele, e a confusão em que se envolvera. Tyler disfarçou um bocejo e endireitou-se na cadeira que ocupava junto à mesa da defesa. Nesse momento, um perito estava explicando a respeito de tudo que fora encontrado no quarto de Abigail Monroe. Deu uma olhada para Samantha. Ela parecia completamente alheia à tormenta que criara na vida dele. O testemunho do perito atraía a atenção de Samantha, que desviava os olhos do homem apenas para fazer anotações. Nada demais... Era o que ela falara a respeito do amor que haviam feito na noite passada. Nada demais... Tyler olhava para baixo, mais uma vez dominado por um sentimento confuso. Para ele representa muita coisa. Fazer amor com Samantha, descobrir que ela era virgem acabara com todas as opiniões preconcebidas que ele tinha a seu respeito. Muitas vezes ele escutara Jamison falar que suspeitava que a filha mais velha fosse promíscua. O fato de Samantha ter se entregado a ele, e de ter sido a sua primeira vez, enchera seu coração de uma opressão que ele nunca sentira antes. Por que ela fizera amor com ele? Fitou-a novamente. Como sempre, fios de cabelo haviam escapado do coque que usava na altura do pescoço e ela não demonstrava qualquer emoção. Os dois haviam sido formais quando se encontraram para o café da manhã e nenhum deles fizera qualquer menção a respeito do que acontecera na noite anterior. Tyler sabia que as palavras que Samantha proferira depois que fizeram amor, nada mais eram do que um mecanismo de defesa. E também sabia que as pessoas geralmente ficam na defensiva quando se sentem culpadas ou quando escondem alguma coisa. Como Samantha seria sem aquela agressividade que a fazia ir de um infortúnio a outro? 72


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Pela primeira vez, Tyler teve vontade de saber sobre sua infância, que ela dizia ter sido horrível. Queria conhecer o tipo de pai que Jamison havia sido para as duas filhas. Samantha teria razão quando acusava Tyler de ser cego ante o carisma de Jamison? Teria Tyler enxergado apenas o que quisera, sobre o homem que havia sido seu protetor? Olhou de novo para Samantha, lembrando-se de como ela era suave e macia ao seu toque, e de como se encaixaram com perfeição no ato do amor. Sentiu um calor percorrerlhe o corpo e a virilha latejar. Desviou os olhos dela, irritado ao perceber como a simples memória do que houvera entre eles era tão poderosa e provocava uma reação tão potente. Era só o que lhe faltava: ter um desejo obsessivo por uma mulher voluntariosa e com tendência a arrumar problemas. Tyler se mexeu na cadeira para afastar-se um pouco de Samantha, enquanto o perito levantava-se e era substituído pelo patologista. Talvez ele conseguisse prestar mais atenção ao desenvolvimento do julgamento se não sentisse o perfume de Samantha impregnar-lhe a alma. No momento em que viu a primeira fotografia da vítima, projetada numa tela, Tyler teve a certeza de que tinha se metido num problema. Olhou fixamente para a jovem mulher morta e lembrou-se de outra mulher que também tinha sido assassinada. Seu estômago doeu e ele sentiu náusea. Exatamente como nos pesadelos. Visões aterradoras tomaram conta da sua mente, visões que ele tentava esquecer-se desde que era um garoto de catorze anos. Afastou o olhar da tela e respirou profundamente para se recompor. Fechou os olhos, mas as memórias tomavam conta da sua mente com rapidez. Tyler se assustou quando Samantha tocou no seu braço, e perguntou com olhar preocupado: — Você está bem? Tyler lutava para superar a náusea que ainda estava sentindo. — Sim, estou bem. Percebeu pela expressão de Samantha que não a havia convencido. Quando o juiz chamou-a para inquirir o patologista, Samantha sugeriu um intervalo para o almoço. O juiz concordou, e momentos depois Tyler e Samantha caminhavam para a sala de reunião da defesa. — Diga-me — pediu quando fechou a porta —, o que está acontecendo? — Nada. Não é nada. — Tyler começou a andar pela sala, na tentativa de espantar seus fantasmas. — Tyler, alguma coisa o perturbou. Por favor, fale comigo. Estou fazendo alguma coisa errada? Tyler olhou para ela que se sentava à mesa. Passou a mão pelos cabelos e perguntouse se contar para alguém a respeito daquela noite o livraria dos pesadelos, o faria exorcizar os demônios que o perseguiam. 73


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Aquelas fotografias de Abigail lembram minha mãe. — Sua mãe? — A voz de Samantha era suave. Virando o rosto para a janela, ele olhou para as copas das árvores que eram visíveis do andar em que estavam. Conforme ele olhava, as árvores pareciam derreter e ele se via de volta às ruas de St. Louis onde havia crescido. — Eu tinha catorze anos e estava brincando com meus amigos. Já era hora de voltar para casa, mas eu não queria. Sabia que o namorado de minha mãe estava no apartamento e eu não o suportava. Ele era o último da lista de perdedores que minha mãe namorara. A voz de Tyler era fria e distante, e ele continuava a narrar os acontecimentos. — Todos os meus amigos começaram a ir para casa e eu também tive que ir. Quando virei á esquina, vi um carro de polícia parado na frente do prédio. — Tyler pôs a mão sobre o estômago que doía. — Acho que naquele momento eu soube que ela estava morta... Que ele á tinha matado. — Oh, Tyler, isso é terrível. Tyler percebeu que Samantha se levantara e sentiu sua presença atrás dele, mas não se virou para olhá-la. Em vez disso continuou: — Os guardas tentaram me impedir de entrar, mas eu consegui passar por eles e subi correndo seis andares. Havia um guarda à porta, mas também passei por ele e fui até o quarto. — Respirou fundo como se precisasse de mais oxigênio. — Ela estava na cama, parecendo adormecida. Tyler se virou e olhou para Samantha. — Por um minuto pensei que era um engano, que ela iria acordar e tudo ficaria bem. Então vi que a frente da camisola dela estava coberta de sangue e soube que nada mais ficaria bem novamente. — Tyler, sinto muito. — Samantha passou os braços ao redor do pescoço dele e o abraçou com carinho. Ele apoiou a cabeça em seu ombro, deixando que o confortasse como ele a havia confortado quando chorara pela morte do pai. — Você deveria ter me contado antes. — Samantha passava a mão pelos cabelos grossos. — Poderíamos ter evitado o fato de você estar presente ao testemunho do patologista. Tyler afastou os braços de Samantha, embaraçado pela demonstração de fraqueza. — Estou bem. Ficarei bem agora. A fotografia de Abigail me chocou e me reportou ao passado. Samantha sentou-se novamente à mesa. — Quer pedir o almoço? Tyler negou. — Não estou com fome. — Eu também não. Tyler estava consciente do olhar de Samantha quando se virou mais uma vez para a janela e olhou para fora. Esperava que o fato de ter contado a Samantha sobre sua mãe o fizesse parar de pensar na sua trágica morte. 74


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Mas as visões continuavam. O farol do carro da polícia, a remoção do corpo, o choro, o patético pedido de perdão do assassino enquanto era algemado. Com as memórias veio a raiva que ele tentava afastar, consciente que era um sentimento destrutivo. — É por isso que não pega casos de assassinato, não é? A voz de Samantha o trouxe de volta à realidade. Virou-se para ela e concordou. — Nunca acreditei que pudesse ser objetivo o suficiente para defender um assassino. Sempre tive medo que minhas próprias emoções impedissem que eu fizesse uma boa defesa. — O que aconteceu ao assassino de sua mãe? Exausto pela emoção que a conversa despertara, Tyler se jogou numa cadeira na frente de Samantha. — O nome dele era Doug Woods. Foi feito um acordo e ele pegou sete anos — Tyler completou com amargura. — E por que se tornou um advogado de defesa? Com esse tipo de experiência você tinha tudo para ser um promotor — Samantha observou. Tyler sorriu pela primeira vez, desde que tinham entrado na sala. — Por um tempo, meu objetivo na vida foi crescer e ficar forte o suficiente para matar Doug Woods quando ele saísse da cadeia. Então encontrei seu pai. Depois de uma sucessão de orfanatos, eu estava tão faminto pela atenção de um adulto que se seu pai fosse um trapaceiro eu teria me tornado um ladrão só para agradá-lo. Samantha esticou o braço sobre a mesa e pegou-lhe a mão. — Estou feliz por meu pai ter encontrado você. Tyler olhou para ela, querendo saber como e quando aquilo havia acontecido. Como conseguira fazer uma coisa tão estúpida e tão horrível como apaixonar-se por Samantha Dark. Foi um dia curto no tribunal. Depois de uma tarde sem grandes novidades, Samantha e Tyler saíram. Lá fora, sentindo o vento do outono, Samantha parou na calçada. — Não vou voltar para o escritório. Vou passar o resto da tarde na biblioteca. Tyler franziu o cenho em sinal de desaprovação. — Não acho uma boa idéia, especialmente depois do telefonema que você recebeu de Osso. E ainda sou da opinião de que precisamos avisar a polícia. — O que a polícia pode fazer? Até agora só foram ameaças e não sabemos a origem delas. Samantha meneou a cabeça. Eles já haviam discutido a respeito na noite anterior antes de se recolherem cada um para seu quarto. Não queria discutir sobre o assunto de novo. — Tyler, eu não posso passar todos os momentos do dia na sua companhia para me sentir segura. A biblioteca é um lugar público, e estamos no meio da tarde. Ficarei bem. — Como irá para casa? — Pegarei um táxi. 75


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Samantha pôs a mão no braço dele. Não podia dizer-lhe que precisava de algum tempo e de alguma distância dele. Nos últimos dois dias as emoções a tinham atingindo como uma avalanche e, ela precisava respirar um pouco... Sozinha. — Não se preocupe, tomarei cuidado — acrescentou. — Levo você até a biblioteca. Samantha assentiu, foram até o carro de Tyler e entraram. Tyler parecia exausto. O efeito das terríveis recordações estava estampado no rosto dele. Samantha tinha a impressão de que ele usaria o resto do dia para ficar sozinho e se recompor, tentando fazer com que sua memória entrasse em recesso. Eles levaram apenas alguns minutos para chegar à Biblioteca Pública de Wilford, um prédio grande e antigo, de dois andares, de tijolos aparentes. Tyler parou no acostamento e Samantha abria a porta para descer, quando foi impedida por Tyler que a segurou pelo braço. — Samantha, por favor, tenha cuidado. — Seus olhos azuis mostravam muita preocupação. — Vá direto para casa quando terminar. — Irei. Pode me esperar para o jantar. Ela desceu do carro e esperou que ele se afastasse, até que percebeu que ele não sairia dali antes que ela entrasse e ficasse em segurança no interior da biblioteca. Samantha acenou, subiu a escadaria e entrou no prédio. Segundo a história, a Biblioteca de Wilford fora o terceiro prédio construído na formação da cidade. Fora edificado pelo milionário John Wilford, fundador da cidade e era um testemunho de sua paixão pela literatura. Samantha passou pelo balcão da recepcionista, onde os livros eram conferidos e as taxas eram pagas. Caminhou entre várias estantes de livros até a escadaria que levava ao segundo andar. No andar superior havia mesas e cadeiras dispostas na frente de uma estante com revistas e jornais. Samantha escolheu uma mesa num canto para que pudesse trabalhar sem ser perturbada. Abriu a maleta e tirou uma pasta grossa com papéis e documentos, mas sabia que nenhum daqueles papéis continha informações sobre o que ela mais queria saber: Tyler. Recostou-se na cadeira, fechou os olhos e se pôs a pensar no modo como ele a beijara, como a tocara e a amara na noite anterior. Nunca tinha tido uma experiência como aquela em toda a sua vida. Fora além da sua imaginação. Mesmo agora, com o odor dos livros empoeirados penetrando pelas suas narinas, ela podia sentir o cheiro másculo da pele de Tyler. Podia também ouvir seus gemidos e seus suspiros de satisfação. Não, não a amara. Ela abriu os olhos e observou os papéis na sua frente. Fizera sexo com ela. Seria um erro confundir amor com sexo, um erro que ela não devia cometer para não ser ferida. Tyler quase atingira seu coração com a história do assassinato da mãe. Quando ele contara a respeito daquela noite trágica, sentira muita pena do sofrimento do pobre 76


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy garoto. Tivera vontade de tirar aquela dor de dentro do seu coração e destruí-la para que ele jamais viesse a senti-la novamente. Era raro para Samantha, entender a dor alheia, pois passara muitos anos curtindo a própria dor. Samantha tentou imaginar o que seria crescer sem pai e sem mãe, como seria passar uma parte da vida em orfanatos. Embora soubesse que havia boas instituições como também bons pais adotivos, sabia também que havia os maus. E tinha a sensação de que a experiência de Tyler não havia sido feliz. Seria melhor ter um mau pai do que nenhum? Embora tivesse odiado seu pai, sentindo-o sempre distante e frio, ela sempre soubera que se tivesse algum problema ele resolveria. Sempre sentira a presença dele em sua vida. Meneou a cabeça como que para espantar os pensamentos. Não queria mais pensar em Tyler e nem no pai. Seu pai estava morto e apesar de Tyler estar bem; vivo e ela pudesse vir a fazer amor com ele novamente, esse era um caminho sem volta, nada além de uma mútua atração física. Espalhando os papéis na mesa, Samantha forçou-se a se concentrar no caso Dominic. Trabalhou durante várias horas, tomando notas e considerando vários aspectos do julgamento. Outras pessoas entravam e saíam, homens liam revistas, crianças faziam trabalhos e tarefas, mas Samantha não se distraía olhando para eles. Em vez disso olhava fotos de cenas de crimes, reavaliando evidências e tentando achar alguma coisa que pudesse apontar para algum suspeito, além de Dominic. Depois de ter entrevistado Morgan Monroe, a suspeita que tinha dele ter contratado alguém para matar Abigail havia enfraquecido. A não ser que fosse o melhor ator do mundo, ele realmente parecia destruído pela morte da jovem esposa. Nesse momento Samantha suspeitava de Kyle. Apesar de achar que ele pessoalmente, não fizera o serviço, ela tinha o pressentimento de que o rapaz tinha alguma coisa a ver com o crime. Infelizmente, precisava de um motivo forte para convocá-lo a prestar depoimento. Quando seu estômago deu sinal de fome, ela olhou no relógio de pulso e ficou surpresa de já ser quase seis horas. Recolheu os papéis, fechou a maleta e desceu as escadas. Estava a caminho de um telefone para chamar um táxi, quando viu sua irmã examinando vários livros. Caminhou na direção dela. — A gente encontra as pessoas mais inesperadas numa biblioteca. Melissa levantou a cabeça e sorriu. — Olha quem é... A sexy Samantha Dark, defensora da justiça. Os olhos azuis de Melissa brilhavam e Samantha notou que ela parecia calma e tranqüila e bem mais feliz do que no dia em que tinham almoçado juntas. — Por que você não está no tribunal? — Melissa perguntou, carregando alguns livros para o balcão da recepcionista. — Hoje o dia no tribunal foi curto. Eu estava no andar de cima trabalhando. Melissa inclinou a cabeça, num gesto muito parecido com o da mãe. 77


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Por que aqui e não no escritório? Samantha ergueu os ombros e as duas se afastaram do balcão. — Achei que a mudança de ambiente me ajudaria a pensar. — Estou indo a um restaurante mexicano. Quer jantar comigo? Samantha hesitou, pensando em Tyler que a estaria esperando em casa. Uma súbita irritação tomou conta dela. Não estava casada e nem namorando, com ele. Não devia nada a Tyler só porque haviam feito amor uma vez. — Adoraria — concordou, satisfeita por essa oportunidade de se reaproximar da irmã. — Ótimo! — Melissa sorriu com carinho, e Samantha teve a certeza de que fizera a escolha certa. Juntas, saíram da biblioteca. — Então, como está indo o julgamento? — Melissa perguntou, enquanto se dirigiam à Cantina La Casa. — Ainda é cedo para saber. O julgamento está apenas começando e provavelmente só começarei a defesa daqui a uma semana. — Você está preparada? — Não. — Samantha sorriu para a irmã. — Mas estou me empenhando. Wylie Brooks está trabalhando para mim, tentando descobrir alguma coisa que eu possa usar na defesa de Dominic. Melissa pareceu surpresa. — Pensei que ele estivesse aposentado. — Tyler pediu-lhe para me ajudar. Pararam de conversar ao entrarem no restaurante. — E o seu divórcio, como está indo? — Samantha perguntou depois que se sentaram à mesa e fizeram o pedido. — Não está. Eu parei o processo. — Por quê? — Samantha perguntou surpresa. Melissa sorriu demonstrando felicidade. — Bill está tentando ajeitar as coisas entre nós. Estivemos conversando... Sobre nossos problemas. Acho que dará certo. E... Vou ter um bebê. Descobri essa manhã. — Oh, Melissa, isso é maravilhoso! — Samantha apertou a mão da irmã por sobre a mesa. — Estou tão feliz por você! Melissa riu e também apertou a mão de Samantha. — Eu também. — Alisou a barriga com a mão. — Ainda não estou acreditando, mas o doutor me garantiu que terei o bebê daqui a sete meses. — Você já contou a Bill? Melissa meneou a cabeça em sinal de afirmação. — Contei-lhe assim que soube. Ele está encantado. Acho que vai dar certo, Samantha. Realmente acho. — Soltou a mão de Samantha. Samantha sentiu uma ponta de inveja de Melissa. Um marido. Um bebê. Eram 78


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy sonhos que ela nunca acalentara. Embora acreditasse que isso fosse possível para outras pessoas, achava que para ela não era. — Fale-me de você. Você e Tyler estão se dando bem? — Bem, ainda não nos matamos. — Samantha riu. — Já é um progresso — Melissa respondeu também sorrindo. Samantha ficou imaginando o que a irmã pensaria se soubesse que, além de estarem se dando bem, tinham feito amor na noite anterior. Mas decidiu que certas coisas não se contam, nem mesmo á uma irmã. — Samantha, me desculpe por ter sido tão rude com você no dia em que almoçamos juntas. Eu estava preocupada com tantas coisas... A morte de papai, a possibilidade do divórcio... — E sentimentos ambivalentes em relação a mim — Samantha acrescentou. Melissa a olhou surpresa, e Samantha sorriu. — Melissa, eu sei que precisamos falar de nós. Você e eu. Quando mamãe era viva, nós éramos tão unidas, e depois que ela morreu e nos tornamos adultas nossa amizade terminou. Quero essa união de volta, mas para isso precisamos conversar a respeito do motivo de estarmos bravas uma com a outra. — Não estou brava com você. — Sim, você está. Eu também tive raiva de você. Raiva que papai alimentou — Imitou o modo do pai falar: — Por que você não é como sua irmã? Ela conhece as regras e as segue. O que há de errado com você, Samantha? Por que não pode ser como Melissa? Melissa olhou sério para a irmã por alguns segundos, e depois desatou numa sonora risada. — Samantha, você sabe o que é realmente engraçado? Ele sempre falou as mesmas coisas para mim. Por que você não é inteligente como Samantha? Apesar de ela fazer escolhas más, tem uma inteligência aguçada, é afiada como uma lâmina, enquanto você não faz nada além de sorrir. — Papai realmente dizia isso? — O tempo todo. Se não falava a respeito de suas escapadas, falava sobre seus sucessos. E sempre queria saber tudo sobre você. A vida dele parecia dedicada a pensar em você. Samantha sentiu como se o mundo estivesse se inclinando, como se essa revelação de repente a fizesse perder o equilíbrio. — Sempre pensei que ele só se importava com você... Melissa é a líder da torcida. Melissa foi eleita rainha. Todos amam Melissa... E ninguém ama Samantha. Samantha pôs o guardanapo sobre o colo, com a raiva que sempre acompanhara seus sentimentos pelo pai. — Você acha que ele fazia isso de propósito? Melissa meneou a cabeça e seu sorriso ficou triste. — Não, acho que não. Acho que ele era dominado pela preocupação de ter de criar sozinho, duas garotas e usou as únicas ferramentas de que dispunha: sarcasmo, 79


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy comparações e frieza. Ele não era mau, Samantha, apenas não sabia ser pai. — Eu o odeio. Ninguém vai me fazer acreditar que ele me amava e eu nunca; poderei perdoá-lo — Samantha falou com raiva e engoliu em seco para desfazer o nó que se formara em sua garganta. — Nunca... É tempo demais. — Sei que dizem que errar é humano e perdoar é divino. Bem, sou humana e não posso esquecer e nem perdoá-lo. A garçonete apareceu com a comida e as duas pararam de falar, até que ela se fosse. — Eu menti — Melissa afirmou. — A respeito do que? — Sobre ter raiva de você. Eu tive raiva, sim — ela admitiu. — Oh, Samantha, por que você foi embora? Por que me deixou sozinha? Fui abandonada duas vezes, primeiro por mamãe e depois por você. Samantha desviou o olhar, incapaz de encarar Melissa que a olhava com um misto de acusação e dor. — Nunca abandonei você. Foi papai que eu abandonei. Eu estava me acabando, morrendo dia a dia. — Olhou para Melissa. — Estava fazendo coisas para me autodestruir. Tive de partir para sobreviver. Melissa confirmou com um gesto de cabeça. — Sei disso agora, mas na época não sabia. — Dessa vez foi Melissa que pegou a mão de Samantha. — Parece que as garotas Dark finalmente cresceram. — Já era tempo — Samantha respondeu sorrindo e apertando a mão da irmã. Uma conversa agradável, risadas e recordações, acompanharam o resto do jantar. Um tempo de abandono e perdão que saciaram a alma de Samantha como o alimento sacia a fome. Acabaram de comer e estavam pagando a conta quando Melissa olhou no relógio. — Tenho que me apressar. Bill e eu vamos conversar a respeito de ele voltar para casa. Você quer uma carona até em casa? Samantha negou com um gesto de cabeça. — Não, não é necessário. Vá falar com seu marido. Manterei contato. — Não esqueça. — Com um sorriso trêmulo de emoção Melissa acrescentou: — Eu amo você, Sá. Eu a amava mesmo quando sentia raiva. Samantha riu e as lágrimas afloraram em seus olhos. — Vá, saia daqui. Samantha ficou olhando a irmã sair do restaurante, sentindo o coração leve e cheio de amor e esperança. Ela e Melissa poderiam ainda ter algumas rusgas, discordarem em muitos assuntos, mas agora Samantha sabia que tudo iria acabar bem. Sorriu, sentindo-se cansada. Melissa estava certa. Talvez, depois de todos aqueles anos, finalmente, Samantha Dark se tornara adulta. Olhou em volta para ver se havia um telefone. Chamaria um táxi e estaria em casa em poucos minutos. Era bem provável que Tyler estivesse irritado, porque lhe dissera que 80


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy estaria em casa para o jantar, mas quando lhe explicasse, ele entenderia. Depois de chamar o táxi, Samantha saiu do restaurante. Apesar de estar escuro e frio, não havia vento, e o céu estava estrelado. Um bebê. Melissa ia ter um bebê. Como seria carregar o fruto do amor? Sentir uma vida dentro de si? Ergueu a gola do casaco mais para proteger o pescoço. Provavelmente nunca saberia como era se casar e ter filhos. Mas seria a melhor tia que uma criança pudesse ter. — Saia daqui, tia Sá — ela disse a si mesma com um sorriso. Um movimento atrás dela desviou seus pensamentos. Antes que percebesse e pudesse sentir medo, foi presa por mãos fortes que lhe seguravam os braços atrás das costas. E antes que pudesse recuperar o fôlego, ainda confusa com o que estava acontecendo, sentiu uma pancada na perna que a fez gritar. Então sentiu uma segunda pancada. "Ele quebrou minha perna", ela pensou sentindo muito medo. Ainda com a cabeça abaixada e sem poder ver quem a estava atacando, sentiu uma dor terrível e a escuridão tomou conta de sua mente. Alguma coisa a atingira na cabeça, e a escuridão aumentou. A última coisa que pensou foi que Tyler iria ficar mais bravo ainda.

CAPÍTULO X

Quando Samantha não apareceu para o jantar, Tyler começou a ficar preocupado, ao mesmo tempo em que tentava se convencer de que não devia ter acontecido nada. Samantha era irresponsável e impetuosa, e se atrasar para o jantar não era motivo para preocupações. Tyler esperou até as sete horas e então jantou sozinho. Enquanto comia, seu pensamento voltou ao intervalo que haviam tido para o almoço quando lhe confidenciara a respeito da morte de sua mãe. Tinha sentido certo alívio por ter, afinal, contado a alguém a respeito do horrível dia que mudara sua vida para sempre e lhe roubara a única mulher que verdadeiramente o amara. Amor. Sentira uma emoção diferente quando Samantha o confortara e ouvira suas confidências, mas achou que o que tinha sentido era um misto de gratidão e amizade. Nada mais do que isso. Virgínia interrompeu seus pensamentos aparecendo à porta da sala de jantar. — Se não precisar mais de mim, vou embora. Não pretendo ficar esperando que ela volte para casa. — Posso lhe fazer uma pergunta, Virgínia? — Ela meneou a cabeça e deu um passo para dentro da sala. — Por que você não gosta de Samantha? 81


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Virgínia deixou transparecer que a pergunta lhe causara certo desconforto. — Não é que eu não goste dela. Apenas não aprovo a maneira como ela age. — Eu também não — ele concordou. — Mas... É mais do que isso para você, não é? A governanta pensou por alguns segundos. — Samantha sempre foi... — Fez uma pausa como se estivesse procurando as palavras. —... Difícil. Ela espera demais das pessoas e faz todos ao seu redor sentirem-se inadequados. Estava sempre pendurada em mim, puxando-me pelo braço, me abraçando e exigindo que eu lhe desse amor. Eu não estava acostumada com crianças, nunca quis ter uma. — Virgínia franziu o cenho para demonstrar seu descontentamento. — Ela fazia o mesmo com o pai. Sempre atrás dele, abraçando-o e querendo atenção e exigindo amor. Ela era tão carente... Isso faz as pessoas sentirem-se desconfortáveis. Tyler concordou com um gesto de cabeça entristecido pela imagem de uma garotinha desesperada por ser amada. Talvez por isso ela recorresse a atitudes más, para chamar atenção, uma vez que ser boa e obediente não dera resultados. — Você quer mais alguma coisa? — Virgínia perguntou mais uma vez. Ele negou com um gesto de cabeça. — Não, pode ir para casa. Obrigado, Virgínia, o jantar estava ótimo, como sempre. Quando a governanta saiu, os pensamentos de Tyler voltaram à Samantha. Ele, pelo menos, tivera a bênção de ter sua mãe, que era impetuosa e um tanto irresponsável, mas sempre o amara... Até a idade de catorze anos. Samantha tinha tido a mãe junto dela, até apenas os seis anos de idade. Depois tinha sido deixada aos cuidados de um homem frio e impessoal e uma governanta também incapaz de preencher a necessidade de amor da menina. Enquanto Melissa se recolhera a uma concha de perfeição, sempre fazendo tudo para agradar ao pai, Samantha tinha se rebelado, sem perceber que a culpa não era dela. O pai a tinha condenado a ser uma criança carente e a conviver com adultos que não tiveram a capacidade e o bom senso de preencher suas necessidades. Mas, onde ela estaria agora? Ele olhava para o relógio com ansiedade. Mais uma hora e a biblioteca fecharia, mas certamente ela não estaria trabalhando até tão tarde. Um telefonema à biblioteca lhe dera a resposta. A bibliotecária disse que ela havia saído com Melissa. Tyler sentiu-se aliviado. Se ela estava com a irmã, era provável que tudo estivesse bem. Percebeu então, que estava pensando nela como se fosse um marido ansioso. Subiu para o andar superior e resolveu dormir mais cedo. Apesar de estar cansado, o sono não vinha, pois estava muito preocupado com Samantha e o caso Marcola. Com relutância, Tyler começou a pensar na inocência de Dominic. Mas os fatos que havia para tentar inocentá-lo eram inconsistentes. A polícia havia feito a prisão com muita pressa e encerrara o caso sem uma investigação apropriada. Não podia culpá-los, pois haviam flagrado Dominic com a arma do crime. Mas Tyler tinha o pressentimento de que Dominic era apenas uma peça de um jogo muito maior. Tinha sido o homem que fora pego no lugar errado, na hora errada. De 82


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy algum modo Tyler sentia que ele e Samantha estavam deixando escapar alguma coisa, alguma coisa importante. Mas... O quê? Sua cabeça estava cheia de imagens. Mas não imagens do julgamento e sim de Samantha nos seus braços, se entregando a ele. Por quê? Por que o tinha escolhido para ser o primeiro? Se não a conhecesse melhor, poderia acreditar que ela permitira que ele fosse o seu primeiro homem só para acabar com sua paz e para confundir-lhe os pensamentos. Tyler tinha sentido como se também para ele fosse á primeira vez. Cada sensação que experimentara parecia totalmente nova. Virou-se na cama, irritado com os pensamentos que o impediam de conciliar o sono. Não deveria estar pensando em Samantha, e sim em Sarah, que seria uma boa esposa e um modelo de mãe. Uma mulher que nunca se atrasaria para o jantar, nunca faria seu estômago doer. Uma mulher... Com a qual ele nunca sentiria a mesma paixão e o mesmo desejo que sentia por Samantha. "Droga...", ele pensou ajeitando o travesseiro mais uma vez. Acendeu o abajur na mesa-de-cabeceira, e sentou-se com a certeza de que não conseguiria dormir antes que ela voltasse para casa sã e salva. Pegou o jornal do tribunal que estava lendo antes de deitar-se e o abriu na página em que havia parado a leitura, e tentou se convencer de que logo mais ela estaria em casa. Acabou pegando no sono, mas foi acordado pelo toque do telefone. Agarrou o receptor, ao mesmo tempo em que olhava para o relógio na mesa-de-cabeceira. Quase uma da manhã. — Samantha? — ele disse. — Tyler, sou eu. Tyler sentiu um grande alívio e agradeceu aos céus por estar ouvindo a voz dela. — Onde você está? — perguntou com ansiedade. — É por isso que estou telefonando. Para ver se você pode vir me buscar. — Onde você está? — ele repetiu. — Não se assuste. Tudo está bem agora, e os médicos disseram que minha perna ficará boa e sem problema algum. — Sua perna? — Tyler imaginou suas pernas, longas e bonitas. — O que aconteceu com sua perna? — Está quebrada. Mas o motorista do táxi ficou mais preocupado com minha cabeça. Tyler apertava o telefone tomado pelo nervosismo e apreensão. — Sua cabeça? Não importa! Apenas diga-me onde você está para que eu possa buscá-la. — Estou no hospital. — Estarei aí em cinco minutos. — Tyler desligou o telefone e praguejava enquanto se vestia. O que teria acontecido? Algum acidente de carro? Os motoristas de táxis em Wilford não eram tão experientes quanto os de uma cidade grande. E começou a imaginar Samantha sentada no banco de trás do táxi, com uma das suas incríveis saias curtas e o 83


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy motorista tentando olhar para as suas pernas pelo retrovisor do carro. Acidentes aconteciam. Principalmente quando envolviam Samantha. Tyler levou pouco tempo para chegar ao hospital de Wilford. Entrou pela emergência, mas lhe informaram que Samantha estava no quarto 212. No momento em que chegava ouviu a voz dela. — De jeito nenhum, doutor. Não posso passar a noite aqui. — Sua voz era bem audível no silêncio e na penumbra da sala de espera. Uma enfermeira saiu do quarto, parecendo aflita. Sorriu para Tyler e passou por ele. Tyler respirou fundo e prometeu a si mesmo que não ficaria nervoso ou bravo. Entrou no quarto 212. Samantha estava sentada na beira da cama, vestida com uma camisola do hospital, e com a perna esquerda engessada. Olhou para ele e sorriu como a pedir-lhe ajuda. — Oh, Tyler, diga-lhes. Diga-lhes que não posso passar a noite aqui, que preciso estar no tribunal logo cedo. Tyler olhou para o Dr. Bumgarten, que era o médico da família Dark havia muito tempo. O velho médico olhava desanimados, os óculos levemente caídos e os cabelos brancos em desalinho. — Samantha, você sofreu uma pancada na cabeça. Eu ficaria mais tranqüilo se passasse a noite aqui — respondeu Dr. Bumgarten, olhando para Tyler como a lhe pedir socorro. — É claro que o juiz concederá um adiamento sob essas circunstâncias. — Quais são exatamente as circunstâncias? — Tyler perguntou. — Não é nada. — Samantha desceu da cama e vacilou com um pouco de tontura. O médico a amparou, ela sorriu e depois olhou para Tyler. — Tentaram me roubar. — E houve agressão? — Tyler arregalou os olhos. — É raro alguém ser atacada nas ruas de Wilford. — Como disse, não é nada. — Samantha pegou suas roupas e se dirigiu para o banheiro. — E não há possibilidade de adiar o julgamento ou de passar a noite aqui. Estarei pronta em um minuto, e iremos para casa. — Olhou para Tyler, entrou no banheiro e fechou a porta. O Dr. Bumgarten suspirou, e passou a mão pelos cabelos finos e ralos. — Ela é tão teimosa quanto o pai — falou, sentando-se numa cadeira ao lado da cama. — Conte-me exatamente o que aconteceu — pediu Tyler, sentindo-se como se tivesse entrado numa peça no terceiro ato. — Samantha disse que tentaram assaltá-la. O médico meneou a cabeça. — Não foi simples tentativa de assalto. A bolsa não foi roubada e nenhum assaltante pega a vítima por trás e dá uma pancada na perna da vítima a ponto de quebrá-la. Tyler prendeu a respiração. — Foi isso que aconteceu? Ela viu quem foi? O Dr. Bumgarten meneou a cabeça mais uma vez. — Tudo que ela se recorda é de ter sido agarrada por trás, ser atingida na perna e 84


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy depois caiu, sendo então agredida na cabeça. Ela desmaiou. — Onde aconteceu? — Na frente do restaurante mexicano na Rua Main. Tinha chamado um táxi e estava esperando na calçada. O motorista chegou e o agressor fugiu. Foi ele que a trouxe. Tyler sentiu um arrepio percorrer-lhe a espinha. O médico estava certo. Não parecia um assalto. Parecia mais uma tentativa de assassinato. — E qual é seu diagnóstico? — Ela ficará bem. A pancada na cabeça foi superficial e para a perna já lhe ministrei um analgésico poderoso, e também um relaxante para que ela tenha uma boa noite de sono. Tyler concordou, percebendo por que ela lhe dera um sorriso tão pálido quando ele chegara, era o efeito dos medicamentos. Naquele momento Samantha saiu do banheiro. — Obrigada pela ajuda, doutor. Nem Tyler e nem o médico lhe avisaram que ela havia abotoado a blusa errado e que a saia estava de trás para frente. — Vamos, Tyler. Vamos para casa. — E sem esperar por ele, saiu do quarto. — Quero vê-la daqui a uma semana — exigiu o Dr. Bumgarten. — Quando o efeito dos analgésicos passarem ela vai se sentir, arrasada. — Acho que eu também — Tyler resmungou. Agradeceu o médico e se apressou para alcançar Samantha. — Obrigada por ter vindo me buscar. — Samantha o olhou de relance. — Esperar por um táxi na calçada pode ser perigoso. Tyler não respondeu. Ele queria discutir sobre o assunto, mas não no estacionamento de um hospital. Esperaria que chegassem, em casa. Ele a ajudou a entrar no carro, onde ela se sentou, apoiou a cabeça no encosto do banco e fechou os olhos. Permaneceu assim até que estavam próximos de casa. Quando Tyler estava quase parando o carro ela abriu os olhos. — Você está bravo, não está? Odiei tê-lo acordado, mas quem mais poderia ir me buscar? Tyler estacionou o carro e olhou para ela incrédulo. — Acha que estou bravo porque me acordou? — Franziu as sobrancelhas. — Vamos, vamos entrar. Os dois entraram e foram imediatamente para o estúdio. Samantha sentou-se numa das Berger, Tyler acendeu o fogo da lareira, e olhou para ela. — Samantha, eu não estou bravo por que me acordou. — Que alívio! — Sorriu. — Estou tão bem, que não quero ninguém bravo comigo. As pílulas que o Dr. Bumgarten me fez tomar, deram-me uma sensação de euforia. — Mas temos que conversar a respeito do que aconteceu. Percebeu que não foi simplesmente uma tentativa de assalto? — Eu sei. Inclusive tenho uma pista de quem me atacou. E não acho que teve alguma 85


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy coisa a ver com o caso Marcola. Tyler a olhou surpreso. — Não? E quem foi? Samantha tirou alguma coisa do bolso e entregou a ele. Era um prendedor de dinheiro de prata com as iniciais R.B. gravadas. — Estava no chão, perto de mim quando acordei. Rick Brennon. Tyler se lembrou do homem com quem lutara no Cozinha do Diabo. Será que atacar Samantha tinha sido uma vingança? Samantha olhou para ele sorrindo, mas com os olhos sonolentos pela reação dos medicamentos. — Acho que Brennon pensou que me atacando atingiria você. Tolo, não? — Samantha, isso não é caso para brincadeira — Tyler respondeu sentindo o sangue ferver-lhe nas veias, à idéia de Samantha sendo agredida por Brennon. — Você fez o boletim de ocorrência? Deu informações à polícia? Ela concordou. — O delegado Caldwell veio ao hospital pegar meu depoimento. Não lhe contei sobre o clipe de prender dinheiro, mas lhe falei a respeito das minhas suspeitas de Brennon estar envolvido. Tyler olhou para o clipe na sua mão. — Sei que o homenzarrão não possui uma inteligência brilhante, mas até para Brennon isso parece estúpido demais: é como deixar a carteira de identidade na cena do crime. Acho que está errada. Brennon é um briguento de bar, não faz o tipo de homem que ataca uma mulher indefesa por vingança. — Pessoalmente, eu prefiro acreditar que quem me atacou queria me impedir de prosseguir com o caso Marcola — Samantha disse com os olhos pesados, mal podendo fixar o olhar em Tyler. — Porque isso significaria que estão com medo das minhas investigações. Eles temem que eu consiga provar a inocência de Dominic. Isso é o que penso. — As palavras mal podiam ser pronunciadas, os remédios debelando sua consciência. — Vamos doutora, é hora de dormir. Eles se levantaram e foram para a escada que levava ao andar de cima. Quando lá chegaram Samantha parou e olhou para o topo da escada, suspirando. Sem hesitação, Tyler a pegou no colo, ela imediatamente passou os braços ao redor do seu pescoço e encostou a cabeça no peito de Tyler. — Obrigada — murmurou. — Quero que seja o primeiro a assinar o meu gesso. Tyler não respondeu. Carregou-a até o quarto, puxou as cobertas da cama e deitou-a, mas ela não o largou. — Fique comigo — ela sussurrou e tentou fazê-lo deitar-se ao seu lado. — Oh, Tyler, quando fui atacada pelas costas, senti tanto medo. Pensei que ia morrer. — Shh, você está a salvo agora. Com gentileza, ele lhe tirou os braços do pescoço. Depois lhe tirou o sapato. Olhou 86


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy para o gesso e ficou imaginando Rick Brennon atacando-a com um... Pedaço de pau ou... A barra de ferro, ferindo aquela pele macia com tanta força que lhe quebrara a perna. Foi dominado por uma fúria assassina. Se o delegado não prendesse Brennon, se o sistema legal falhasse, ele mesmo faria justiça. Não se importava quanto tempo levaria, mas mais cedo ou mais tarde o culpado ia pagar pela dor que estava causando a Samantha. — Tyler... — A voz de Samantha era suave, baixa e confusa pelo efeito dos remédios. — O quê? — Ele ajeitou os lençóis a sua volta. — Estou contente por termos feito amor. — Deu um breve sorriso. — Eu... Eu não queria morrer sem ter feito amor. — Suas palavras foram morrendo até que ela se rendeu ao sono. Tyler ficou olhando para ela por muito tempo. Ele ficou ao lado da cama, de pé, admirando seus cabelos loiros e brilhantes esparramados sobre o travesseiro, as pálpebras com pequeninas veias que lhe davam uma aparência de fragilidade. Ele a amava. Era inútil tentar ignorar. Amava-a muito, como nunca amara alguém antes. Admitir o fato encheu-o de horror. Não queria amá-la, tinha medo de sentir qualquer emoção por ela. Saiu do quarto, mas não foi muito longe. Encostou-se à parede do corredor, tentando respirar pausadamente, numa luta interior entre o medo e o amor. Amar Samantha o assustava mais do que qualquer outra coisa. Tyler jurara a si mesmo, alguns anos atrás, que não mais deixaria o destino enganar o seu coração e também não queria se apaixonar por uma mulher independente e que parecia gostar de enfrentar perigos. Amara uma mulher uma vez e se magoara muito. Mais cedo ou mais tarde teria que tomar uma decisão. Teria que aprender a odiar Samantha ou teria que lhe vender a sua parte no Escritório de Advocacia, e sair da cidade. — Deve ter havido um engano. — Samantha olhou surpresa para o homem idoso, grande e calvo, sentado à sua frente. — Eu poderia jurar que tinha sido atacada por Rick Brennon. Wylie Brooks ergueu os ombros largos. — Só se o homem tem o poder de estar em dois lugares ao mesmo tempo. Como você pode ler no meu relatório, na hora do assalto, ele estava participando da festa de casamento de uma sobrinha. Mais de trinta pessoas são testemunhas. Samantha pôs o relatório de lado e ela começou a folhear outros, que Wylie tinha trazido. — Alguma coisa interessante na vida pregressa de Abigail? Wylie meneou a cabeça numa negação. — Nada que precise ser pesquisado. Antes de casar com Morgan Monroe, ela vivia sozinha, namorava o seu cliente e trabalhava como garçonete no clube de campo. Nenhum escândalo, nenhuma contravenção e nenhum suspeito. — Obrigada Wylie — Samantha agradeceu desanimada. — Vou examinar esses relatórios e se eu precisar de alguma coisa eu lhe telefono. 87


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Depois de Wylie sair do escritório, Samantha recostou-se no encosto da cadeira e deu um longo e profundo suspiro. No dia seguinte ao assalto, ela comparecera ao tribunal, mas o juiz adiara o julgamento por uma semana devido à sua saúde, apesar dos protestos dela. — Srta. Dark, não tem condições de trabalhar normalmente, depois do que passou a noite passada — o juiz Halloran explicou. Samantha discutiu com ele, mas o juiz foi irredutível. Ela voltou para casa e passara os dois dias seguintes de cama, finalmente concordando que o juiz tinha razão. Seu corpo doía e sentia-se fraca. Naquela manhã, acordara sabendo que era tempo de voltar ao trabalho. Agora tinha dois objetivos: tirar Dominic da cadeia e descobrir quem tinha tentado matá-la. Examinou os relatórios de Wylie, procurando por alguma coisa que pudesse usar na defesa. Tinha pedido a Wylie que averiguasse tudo sobre o passado de Abigail, Kyle e Geórgia Monroe, e Rick Brennon. No relatório de Brennon, Samantha observou que ele havia sido preso mais de uma vez por Dominic Marcola. Envolvido em problemas desde a adolescência, Brennon teria razões suficientes para tramar contra Dominic. E se era uma trama contra o oficial Marcola, Brennon não gostaria que a investigação e o processo fossem reabertos. Fazia sentido pensar que ela fora atracada por Brennon. A prova estava no relatório de Wylie. Mas como não tinha sido ele, a quem interessaria fazê-lo passar por culpado e plantar uma pista falsa? Samantha recostou-se mais uma vez na cadeira e pôs a perna engessada sobre a escrivaninha. Embora a perna estivesse engessada havia três dias começara a coçar e ela pegou um lápis para tentar atingir o lugar com a borrachinha da extremidade do lápis. — Não me lembro disso estar na lista de recomendações do Dr. Bumgarten. Samantha ergueu a cabeça e viu Tyler parado na soleira da porta. Ela corou, tirou o lápis do interior do gesso e abaixou a perna. — Coça. — Há coceiras que é melhor não coçar. Samantha riu. — Não concordo. Sou da opinião de que tudo o que coça deve ser coçada. O sorriso desapareceu dos seus lábios quando viu que Tyler não respondia e nem retribuía o sorriso. Ele estava frio e distante desde a noite do atentado, apesar de insistir em levá-la e trazê-la do escritório, e não ir a lugar algum a não ser que ela tivesse companhia. — Pronta para ir para casa? Ela concordou. — Espere apenas que eu pegue uns papéis. — Esperarei ali fora. — Ele saiu e Samantha rapidamente colocou os relatórios de Wylie dentro da maleta. — Pronto — disse a Tyler um momento depois, quando o encontrou esperando por ela, perto da mesa de Edie. 88


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Boa noite, Edie — disse à recepcionista ruiva. — Não trabalhe até muito tarde. Edie riu. — Querida, atualmente trabalhar é o que há de mais excitante em minha vida. — Acenou para eles que saíram para o entardecer frio do outono. — Vi Wylie há pouco — Tyler falou quando entraram no carro. — Ele veio me trazer uns relatórios. — Alguma coisa proveitosa? — Na realidade, não. Mas agora tenho certeza de que não foi Rick Brennon que me atacou. Na hora do ataque, ele estava na festa de casamento de uma sobrinha, do outro lado da cidade. Os outros relatórios ainda não li, mas Wylie disse que nada chamou sua atenção. Eles ficaram em silêncio, não o silêncio harmonioso que une os amigos, e sim um silêncio cheio de tensão. Samantha agüentou até que chegaram, em casa, e então falou: — Tyler, está bravo comigo? — Fez alguma coisa para me deixar bravo? — Não que eu saiba, mas nem sempre sei quando irrito alguém. Tyler estacionou, desligou o motor e a fitou. Samantha viu irritação no olhar dele, mas também percebeu uma coisa que a perturbou: a chama do desejo. Ela sabia que era uma tola por também desejá-lo, mas não conseguia impedir. Ela se inclinou para ele, com a intenção de beijá-lo, mas num rápido movimento, ele saiu do carro. — Espero que Virgínia tenha preparado um bom jantar. Estou faminto. — A voz dele tentava passar uma despreocupação que não era verdadeira. — Eu também — respondeu, mas não estava se referindo ao jantar. Estava faminta pelas carícias de Tyler, queria fazer amor com ele novamente. "Não tem nada a ver com amor", ela pensou enquanto caminhava até a porta da frente. Samantha achava que podia fazer sexo sem amor. Lembrou-se da noite em que tinham se amado e o desejo tomou conta dos seus sentidos. Sim, ela queria estar nos braços dele mais uma vez, queria sentir a alegria daquela união. A casa recendia a molho de macarrão com alho. Virgínia os encontrou na porta, obviamente satisfeita por terem chegado na hora. — Acabei de pôr a mesa. Samantha e Tyler sentaram-se, e Virgínia foi acabar de preparar a macarronada. Quando o pai de Samantha era vivo, todas as refeições eram feitas na sala de jantar, mas Tyler e ela preferiam comer na mesa da cozinha, que era um lugar mais acolhedor. A mesa era menor, redonda, e tornava as refeições mais íntimas. Samantha gostava de sentar perto de Tyler para sentir seu perfume, e para ver seus olhos de perto quando conversavam. Virgínia os servia e Samantha olhava para o prato sentindo-se confusa. Gostava de sentar-se à mesa com Tyler, e comentarem os acontecimentos do dia como se fossem 89


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy casados. Quando isso começara a acontecer? Como esse homem, que ela deveria odiar o homem que possuía metade de seu escritório de advocacia, tinha se tornado parte integrante da sua vida? Era loucura pensar que um relacionamento com Tyler poderia levá-los a algum lugar. Era absurdo pensar até, numa longa convivência com ele. Ela nunca seria o tipo de mulher que ele queria. Por que então estava tão certa de que, antes que essa noite terminasse, ela estaria de novo nos braços dele? Por que a certeza de que fariam amor mais uma vez, naquela mesma noite?

CAPÍTULO XI

Samantha permaneceu quieta durante todo o jantar, o que deixou Tyler preocupado, pois eles costumavam conversar bastante durante as refeições. Debatiam temas legais e discutiam a respeito de decisões a serem tomadas, e pontos de vista nem sempre coincidentes. Naquela noite o silêncio era total. Samantha estava concentrada na refeição, obviamente cheia de pensamentos que preferia não partilhar com ele. O que estaria pensando? — Você está muito quieta. — Tyler afinal quebrou o silêncio opressivo. Samantha olhou para ele e sorriu. — Estou pensando. — Não há nada que você queira me contar? Ela hesitou, como que só pesando opiniões, e fez um gesto negativo com a cabeça. — Não, não é nada importante. — Ela enrolava o macarrão com o garfo diversas vezes, pensativa, antes de levá-lo à boca. — Alguma vez pensou onde estaria agora, se meu pai não o tivesse encontrado? — Eu sei onde estaria: na cadeia. Samantha concordou séria e formou-se uma ruga entre as sobrancelhas. — Às vezes penso onde eu estaria agora, se não tivesse ido embora daqui. — Provavelmente na cela contígua à minha — Tyler respondeu sorrindo. Samantha também riu, despertando o desejo de Tyler. — Provavelmente está certo — Samantha concordou, o sorriso desapareceu dos seus lábios quando seus olhos se encontraram. — Sabe; eu era quase tão má quanto, todos acreditavam que eu fosse. — Os olhos de Samantha brilharam com intensidade, o que tocou o coração de Tyler. — Eu sei. 90


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Ás vezes eu tenho pensamentos tão iníquos que o fariam enrubescer se soubesse. — E riu de novo, dessa vez provocadoramente. A vida com Samantha nunca seria enfadonha e maçante, e mais uma vez Tyler sentiu que precisava se distanciar dela. Levantou-se e foi colocar o prato na pia. — Oh, Tyler, às vezes você é tão previsível! — ela o provocou. Ele passava água no prato e ficou pensando por que "previsível" parecia significar "maçante". — Você faz com que "previsível" pareça um traço negativo. — Colocou seu prato na máquina de lavar louça. — Pelo contrário, acho que é um traço admirável. — Samantha se levantou e caminhou na direção dele. "Como ela pode parecer tão sexy com uma das pernas engessada?", Tyler pensou quando Samantha parou à sua frente, e ficou tenso olhando para o débil sorriso que se formava nos cantos dos lábios dela. — Há alguma coisa boa em ser previsível — Samantha disse em voz baixa e continuou: — Por exemplo, sei que se eu fizer isso — passou os braços ao redor da cintura de Tyler comprimindo seu corpo ao dele —, sentirei seu coração disparar contra o meu. Tyler tentou impedir que seu corpo respondesse a ela, mas era impossível. — Samantha... O que está fazendo? — Estou demonstrando como você é previsível. — Pressionou os lábios no pescoço de Tyler. — E, quando beijo você assim, sinto-o apertar seus braços ao meu redor. Tyler praguejou baixinho e puxou-a para mais perto dele. Maçante? Previsível? Ela o olhou, admirada quando a pegou no colo e a carregou em direção à escada. — O que está fazendo? — perguntou, rindo. Ele retribuiu o sorriso e respondeu: — Estou lhe mostrando que posso ser imprevisível. — Subiu a escada até o quarto dele. Queria fazer amor na cama onde passara tantas noites solitárias pensando nela. Quando seus lábios se encontraram, perderam todo o controle que se impunham. Na primeira vez em que fizeram amor, tinha sido uma relação calma e controlada, um tempo de descoberta e de encantamento. Dessa vez, não houve carícias gentis. O fogo do desejo tomou conta deles e os fez perder o controle, deixando que a paixão explodisse e eles rasgassem as roupas um do outro. Mais uma vez ele sabia que estava errando. Podia se perdoar por ter feito amor com ela uma vez, mas agora era a loucura total que os levaria a lugar nenhum. Mas mesmo consciente de tudo isso ele não podia parar. Mais tarde. Mais tarde ele manteria distância dela. Mais tarde ele poderia aprender a controlar essa atração. Agora, queria apenas amá-la. Eles se moviam como dois animais esfomeados, virando-se na cama um sobre o outro, trocando beijos impetuosos e se acariciando com sofreguidão. Quando Tyler a penetrou, o pouco de racionalidade que restara se esvaiu e se perderam febris, na loucura 91


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy daquele amor. Depois, ficaram um nos braços do outro, esperando que suas respirações e seus batimentos cardíacos voltassem ao normal. Tyler achou que deveria dizer alguma coisa, falar sobre a combustão espontânea que ocorrera entre eles, mas não sabia bem o que dizer. Ele não poderia se afastar dela enquanto o caso Marcola estivesse em andamento, pois prometera que a ajudaria. E também não podia prometer a si mesmo que não faria amor com ela quantas vezes surgissem oportunidades. Entretanto sabia que seria melhor para os dois que isso não mais se repetisse no decorrer do julgamento. — Samantha? — Tyler tirou o braço de baixo dela e sentou-se. Não ouviu resposta. Ele acendeu o abajur da mesa- de- cabeceira e viu que ela estava dormindo, com a calma e a paz de um bebê. Ficou olhando para ela durante um longo tempo, memorizando cada traço do seu lindo rosto. A forte linha do queixo, o contorno arrogante de cada sobrancelha, o nariz delicado. O rosto da mulher que ele amava. A certeza daquele sentimento o atingia numa alternância de alegria e desespero. Tinha prometido a si mesmo que nenhuma mulher o magoaria que nunca mais seria vulnerável à perda da uma mulher. Fechou os olhos com a visão de sua mãe a invadir sua mente. Ela estava sorrindo como se a vida fosse uma festa da qual ela era a dona. Era Tyler que a lembrava de pagar a conta de luz, que fazia a lista dos mantimentos e era ele que cozinhava. Era ele que, ficava horas esperando por ela, preocupado se estaria bem. E na única noite em que não a esperara, na única noite que ele decidira fazer com que ela esperasse por ele... Ela tinha morrido. Tyler não suportava sentir aquela dor e aquele medo novamente. E amar Samantha o fazia temer que um dia tivesse que enfrentar esses sentimentos mais uma vez. Ela era impetuosa demais, e tão cheia de vida, que ele temia que ela se transformasse num alvo fácil do destino. Em silêncio, para não acordá-la, mas incapaz de ficar por mais tempo ao lado dela, Tyler se levantou e saiu do quarto. Em baixo, no estúdio, acendeu o fogo e serviu-se de uma dose de uísque. Sentou-se, apreciando a dança das chamas na lareira. Invejava Samantha que conseguia ter um sono tranqüilo. Aparentemente ela não sofria dilema moral algum e era capaz de separar a atração física de um pretenso amor. Durante décadas as mulheres tinham reclamado da capacidade que os homens tinham de fazer sexo sem amor. Aparentemente Tyler era uma anomalia, pois ele não podia se imaginar fazendo sexo sem amor, sem pôr o seu coração e sua alma na relação. Tentou imaginar-se fazendo amor com Sarah. Ela era uma mulher atraente, ele já a beijara e achara agradável, mas não tinha a intensidade que tinha os beijos de Samantha. Tomou um gole da bebida e fechou os olhos. Era impossível acreditar que ele pretendera se casar com Sarah. Ela seria uma ótima esposa e a vida em comum com ela devia ser agradável e... Morna, opaca e sem graça. Como poderia torná-la sua esposa? Ele 92


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy não a amava, não podia enganá-la e se comprometer com ela, com o coração repleto da imagem de Samantha. Estremeceu e se recusou a considerar a profundidade de seus sentimentos em relação a ela. — Que horas são? A voz de Samantha interrompeu seus pensamentos. Ele virou-se e á viu parada na soleira da porta. Estava vestida com um robe azul- marinho os cabelos estavam soltos e os lábios ainda úmidos pelos seus beijos. Parecia muito sexy e tentadora. — Não é tarde. Passa um pouco de oito horas. Ela caminhou até a janela e olhou para fora. — É impressionante como escurece cedo no outono. — Virou-se e olhou para ele. — Eu o perturbaria se trabalhasse um pouco aqui? — De jeito nenhum — ele mentiu. É claro que o perturbaria. Tudo, em relação á Samantha o perturbava. Tomou mais um gole de uísque e viu-a abrir a maleta e tirar um maço de papéis. Ela sentou-se numa poltrona na frente dele e começou a ler. Tyler ficou admirando-a e pensando se algum dia se cansaria de olhar para Samantha. Achava que não. O rosto de Samantha mudava conforme suas emoções. Era sempre belo, mas nunca o mesmo. E não eram apenas seus atributos físicos que encantavam Tyler. Ele admirava sua inteligência, amava a vulnerabilidade que ela tentava ocultar com altivez e destemor e adorava a lealdade que norteava sua vida. Numa das muitas conversas que tiveram ao jantar, Samantha lhe contara a respeito de suas escapadas para o cemitério, onde Jeb a consolava abraçava e enxugava suas lágrimas. Tyler sabia que era a lealdade ao carinho que recebera de Jeb na infância, que a fizera pegar o caso Marcola e lutar arduamente para conseguir inocentar Dominic. Franziu o cenho, tomou outro gole da bebida e olhou de novo para o fogo. Ele prometera ajudá-la na defesa de Dominic e ia cumprir a promessa, mas assim que o caso fosse encerrado pretendia partir. Venderia sua parte no escritório de advocacia, e iria para outro lugar, recomeçar a vida. A idéia não era agradável, mas era melhor do que ficar em Wilford e continuar amando-a. Era a única opção que ele tinha. — Melissa contou que está grávida? — Samantha lhe perguntou, interrompendo seus pensamentos. — Não, não disse. Mas telefonou para me dizer que interrompesse a ação de divórcio. — Tyler olhou para ela, que colocou os papéis no chão próximo à poltrona onde estava sentada. — Alguma vez pensou em ter filhos? — ela perguntou. — Não. — Sentiu um aperto no coração. Sua resposta era uma mentira. Ás vezes, antes de dormir ou quando acordava de manhã, ele tinha vontade de ter uma família. Mas nunca se deixara influenciar por esses sonhos porque não achava que fossem possíveis. — Decidi á algum tempo atrás que minha carga genética não deve ser boa para correr o risco de ser pai. 93


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Samantha olhou para ele intrigada. — O que você quer dizer com... Carga genética? — Eu amava minha mãe. Ela era tudo que eu tinha. — Tomou mais um gole de uísque. — Mas não foi uma boa mãe. Não que tenha sido abusiva ou algo parecido. Ela era distraída e agia guiada por impulsos. Quando se lembrava que era mãe, era até boa, mas o problema era que não se lembrava disso com muita freqüência. — Mas isso não significa que você cometeria os mesmos erros — Samantha observou e olhou fixamente para o fogo. — Se eu tivesse filhos não seria como meu pai. Eu me certificaria de que eles fossem amados a cada minuto. — Samantha sorriu com meiguice. — Minha mãe era assim. — Você tem boas recordações dela? Samantha concordou. — Minha mãe enchia a casa com sua risada. Ela sempre estava rindo ou cantando. — Passou os braços ao redor dos ombros como que para impedir que as recordações fugissem. — Lembro-me de uma vez, quando meu pai disse que ela era uma das pessoas especiais do mundo, e que estar ao lado dela fazia todos se sentir especial também. — Seu pai deve tê-la amado muito. Ela pensou por um momento e assentiu. — Sim, acho que sim. — Mais um exemplo de amor e de perda — Tyler observou com amargura. Samantha continuava a olhar para ele. — É por esse motivo que você nunca se casou? Porque tem medo de perder a pessoa amada? Tyler não respondeu. Samantha deu uma risada pálida e inexpressiva. — Não formamos uma dupla? Nós dois fingimos não ter coração quando na verdade nossos corações estão tão feridos que não confiamos mais no amor. — Não tenho medo de nada — Tyler respondeu. — Não me casei porque não encontrei uma mulher com quem eu tivesse vontade de viver para sempre. Qual é a sua desculpa? — Não me casei porque não encontrei um homem que quisesse viver comigo para sempre — Samantha respondeu rindo e completou: — Além disso, decidi não querer um homem em minha vida, mas gostaria de ter filhos. — Samantha, você é capaz de fazer muitas coisas, mas filhos sem um homem para compartilhar as responsabilidades acho que nem você agüentaria — Tyler contestou. — Só preciso de um homem para conceber... Do resto cuido sozinha — Samantha retrucou. Tyler olhou-a horrorizado. Seria essa a razão de ela ter dormido com ele? — Não — disse como se tivesse lido os pensamentos de Tyler. — Embora eu tenha a certeza de que faríamos lindos bebês, não precisa se preocupar. Tomo pílulas. Eu sabia que estava pronta para ter sexo, mas não para ter filhos... Ainda. 94


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Então por que dormiu comigo? — Tyler perguntou sem nem saber por que. Samantha não desviou o olhar. — Porque eu quis. Porque, apesar de achar você um dos homens mais irritantes que conheci sempre me; senti atraída por você. — O fogo da paixão apareceu de novo no olhar de Samantha, que continuou: — Porque, enquanto o resto das garotas do colegial tinha fantasias com os astros do futebol ou o último astro do rock, eu tinha fantasias com você. Mas não deixe que esse elogio lhe suba à cabeça, certo? — Ela se levantou. — Vou para a cama. Vejo você de manhã, — E sem esperar pela resposta, saiu da sala. Tyler se arrependeu de ter-lhe perguntado. A idéia de Samantha deitada na cama, tendo fantasias sexuais com ele, tocou seu coração. Ela fora uma jovem carente de amor e ele tinha povoado seus pensamentos. Mas as fantasias raramente se sustentavam quando se deparavam com a fria realidade. Tyler encostou a cabeça no encosto da poltrona e fechou os olhos. Começou a imaginar Samantha como mãe. Ela seria uma boa mãe, como fora a mãe dela, que enchia a casa de risadas e de alegria, cuidando das filhas com devoção e amor. O pai de Samantha a magoara muito e era certo que ela nunca cometeria os mesmos erros que ele cometera. Tyler havia sido sua fantasia, mas nunca se tornaria sua realidade. Sabia que se ela incorresse no erro de amá-lo ele se tornaria apenas outro homem que a trairia e a magoaria. Samantha estava na sacada do quarto da mãe. O ar frio que prenunciava a chegada do inverno agitava seus cabelos e a fazia tremer de frio, vestida apenas com o fino robe de seda. Mas precisava de ar frio para ajudá-la a clarear seus pensamentos. A conversa com Tyler a deixara inquieta. Estava concentrada numa das frases que ele proferira: "Seu pai deve tê-la amado muito." No momento em que Tyler falara aquilo a respeito do modo como seu pai devia ter amado sua mãe, memórias esmaecidas começaram a se tornar mais nítidas. Lembrou- se de um café da manhã, com toda a família em volta da mesa. Sua mãe estava contando a respeito de uma reunião de mulheres no clube, de uma maneira vivida e cheia de detalhes engraçados. E Samantha, de repente, lembrou-se da expressão do pai olhando para a mãe: era uma expressão de devoção, de indulgência e de amor. Aquela lembrança puxou outras. O som das risadas dos pais no quarto... Os olhares cheios de segredos que eles trocavam... O modo como eles muitas vezes se tocavam. Ele a amava. Completa e desesperadamente. Sentiu admiração pelo relacionamento dos pais e as lembranças ficavam cada vez mais vividas em sua mente. Enquanto sua mãe era viva, Jamison tinha amado as filhas. Os olhos de Samantha encheram-se de lágrimas. Lembrou-se do pai abraçando-a, beijando-a e carregando-a nos ombros quando iam ao circo. Ele amara suas filhas quando sua esposa era viva. Então, o que acontecera? Por que isso tinha mudado? Pela primeira vez, Samantha pensou na possibilidade de alguém amar tanto uma pessoa a ponto de sua morte destruir o que possuía de melhor. Teria sido isso que 95


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy acontecera com seu pai? Sua dor teria sido tão intensa e tão profunda, que ele não conseguira mais encarar as duas garotinhas deixadas com ele? Melissa e ela o lembrariam diariamente a perda irrecuperável da esposa a ponto de ele não poder amar mais ninguém? E o que acontecera a Tyler? Teria a morte da mãe levado com ela o que ele possuía de melhor... Sua capacidade de amar? Samantha enxugou as lágrimas e entrou no quarto. Fechou a porta da sacada com cuidado, e cerrou as cortinas. Se ao menos ela pudesse fechar seu coração com tamanha facilidade... Houve um tempo em que Samantha tinha medo de não ser capaz de amar. A rejeição que sofrerá da parte do pai a fizera pensar que também não merecia ser amada. Quando a última peça do quebra-cabeça se encaixou, ela percebeu que amava Tyler. Talvez estivesse apaixonada por ele havia anos. Mas sempre tivera medo de amar, medo de ser vulnerável e de se magoar. Mas dessa vez sentia seu coração pulsar de amor. Ela o amava. E valia a pena amar. Agora, tudo o que tinha a fazer era convencer Tyler de sua descoberta.

CAPÍTULO XII

No dia seguinte houve pouco tempo para declarações de amor ou pensamentos sobre a vida particular. Tyler desceu tarde, perdendo a hora do café da manhã e parecendo preocupado. Samantha queria contar a ele sobre a descoberta de que o amava, mas achava que o momento não era oportuno. Uma vez no escritório Tyler subiu logo para a sua sala e Samantha entrou na sala dela. Em minutos, todos os pensamentos de Samantha a respeito de Tyler e do seu amor por ele, foram substituídos pelo caso Dominic, ao preparar a estratégia para o dia seguinte. Ela sabia que a promotoria tivera um dia ou dois para apresentar a acusação e agora seria a sua vez de apresentar a defesa. Embora tivesse conseguido achar algumas falhas na teoria da promotoria, estava preocupada de não ser o suficiente para despertar dúvidas razoáveis. A vida de Dominic pesava na sua mente. Ela tinha pouco para apresentar ao júri, nada substancial que fizesse diferença quando fossem deliberar. Antigos namorados poderiam ser prováveis suspeitos, mas infelizmente Dominic era o único antigo namorado. Samantha suspirou desanimada, quando ouviu baterem à porta. — Entre — ela ordenou. Edie entrou com um lanche numa das mãos e uma lata de Coca-Cola na outra. 96


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Já passa da uma hora e você ainda não almoçou. Comprei um lanche de rosbife com queijo. — Colocou o sanduíche e o refrigerante sobre a mesa. — Obrigada Edie. Bem lembrado. Samantha abriu a caixinha do lanche e fez um sinal para que Edie se sentasse na cadeira em frente à mesa. — Sente-se e faça-me um pouco de companhia. — Na verdade não é a mim que você deve esse lanche. Tyler desceu há pouco e me recomendou que se ainda não tivesse comido, eu deveria trazer-lhe alguma coisa. — Ele comeu? — Samantha perguntou sem saber se deveria ficar irritada ou agradecida pela preocupação dele. — Ele saiu para almoçar com um cliente. Samantha resolveu não dar tanta importância a uma coisa tão simples. Olhou para a mulher sentada à sua frente e perguntou: — Por que você não se casou Edie? — De repente ficara fascinada para saber dos relacionamentos das pessoas que conviviam com ela. Edie ergueu os ombros. — Acho que não estava escrito no meu destino. — Você nunca se apaixonou? Em todos os anos de convívio, Samantha nunca ouvira Edie mencionar algum namorado ou algum relacionamento com alguém. Era curioso, pois apesar de um pouco extravagante, Edie era uma mulher atraente e de muito bom coração. — Estive apaixonada... Mas ele não estava disponível. — Edie abaixou os olhos como se a declaração a deixasse embaraçada. — Ele era casado? — Samantha perguntou com carinho. — Eu... Eu não cheguei á saber qual era a seriedade do comprometimento dele — ela respondeu e levantou-se. — É melhor que eu volte à minha mesa. — Saiu e fechou a porta. Samantha ficou olhando para a porta compadecendo-se de Edie. Era uma pena, pois ela seria uma esposa carinhosa e dedicada e uma mãe amorosa, já dera demonstrações disso em relação á Samantha e Melissa. Pena não ter encontrado o homem certo, que tivesse retribuído seu amor, para formarem uma família. Quando Samantha terminou o lanche, a conversa com Edie já estava esquecida e ela afundou-se de novo no caso Marcola. Ela anotou as primeiras testemunhas todos os amigos de Dominic, que tinham se oferecido para testemunhar. Seriam argumentos fracos, mas era um começo. O que ela precisava era de momentos do tipo Perry Mason. Fechou os olhos e ficou imaginando o verdadeiro culpado respondendo ao seu brilhante interrogatório. Abriu os olhos meneando a cabeça com desânimo. Pura fantasia. Infelizmente não tinha pista de quem poderia ser o verdadeiro criminoso. Às quatro horas, Edie pôs a cabeça no vão da porta para avisar que Wylie Brooks havia chegado com novos relatórios. — Wylie. — Samantha levantou-se para cumprimentar o velho investigador. — 97


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Tenho esperança de que você tenha alguma coisa mais interessante do que os últimos relatórios que me trouxe. Wylie riu e lhe entregou um maço de papéis. — Acho que você encontrará pontos interessantes. Samantha sentiu-se animada àquelas palavras de Wylie. Sentou-se e abriu a pasta que continha os novos relatórios. — Sente-se e me conte o que você descobriu. Ele negou com um meneio de cabeça e sorriu. — Não posso ficar. Tenho um plano para pôr em desenvolvimento. Vou ao México para uma pescaria. — Agora? — Samantha perguntou decepcionada. — E se eu precisar de você? — Eu disse a você e a Tyler que faria o que pudesse para ajudá-la, mas não que abriria mão dessa viagem, planejada há seis meses. Além disso — ele apontou para os papéis que acabara de entregar —, fiz tudo o que pude. Esses relatórios contêm todas as informações que consegui recolher a respeito de Geórgia e Kyle Monroe. E também toda a vida pregressa de Rick Brennon e Morgan Monroe. É tudo o que você me pediu. — Está certo. — Samantha suspirou. — É provável que não haja mais nada que você possa fazer por mim. — Levantou-se e estendeu a mão para Wylie. — Obrigada por sua ajuda, Wylie, sei que não tinha sido esse o modo como você planejara gozar sua aposentadoria. — Uma vara de pescar numa das mãos e uma latinha de cerveja na outra. É essa a idéia que tenho sobre estar aposentado. Samantha riu. — Faça uma boa viagem e... Boa pescaria! Logo que Wylie saiu, Samantha sentou-se e começou a ler os novos relatórios. Depois de alguns minutos, encontrou os fatos que Wylie achara poderiam ser interessantes no processo. Samantha ficou excitada. Agarrando os papéis, saiu de sua sala. — Tyler já voltou do almoço? — perguntou a Edie. — Não, ainda não voltou. — Ele falou onde ia almoçar? — Mencionou o clube de campo. — Chame um táxi. — Samantha voltou à sala e pegou seu casaco. Alguns minutos depois, sentada no banco traseiro do táxi, lia e relia o relatório a respeito de Geórgia Monroe, se perguntando se não estaria superestimando os fatos. Precisava falar com Tyler, contar-lhe o que Wylie tinha descoberto analisar se sua linha de raciocínio estava correta ou se estava no caminho errado. Pensou vagamente em quem poderia ser o cliente que estava almoçando com Tyler. Mas ele entenderia sua interrupção. A vida de Dominic estava em jogo e precisava trocar idéias com Tyler o mais cedo possível. Quando o táxi parou na frente do clube, ela desceu. — Espere aqui, serão só alguns minutos e estaremos de volta. 98


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Não dispensou o táxi, pois Tyler poderia já ter ido embora. E se ainda estivesse almoçando com o cliente, não pretendia atrapalhar. Apenas lhe daria uma idéia das novas pistas e iria embora. Só quando entrou no luxuoso restaurante é que se deu conta da situação da sua perna, da mancha de mostarda que sujara sua blusa e de que, como sempre, seus cabelos não estavam bem arrumados. Fechou bem o casaco, esperando esconder a mancha de mostarda e passou a mão pelos cabelos tentando ajeitá-los, sob o olhar de desdém da recepcionista. — Não se preocupe, não ficarei por muito tempo — ela disse, reparando nos cabelos impecavelmente penteados da mulher, e olhando para Tyler que estava a uma mesa, acompanhado de um senhor idoso e distinto. Tyler ergueu os olhos mostrando-se surpreso. Acenou para ele, que pediu licença ao homem e foi até onde ela estava já com o semblante preocupado e o cenho franzido. — Samantha, o que está acontecendo? O que está fazendo aqui? — Ele a pegou pelo braço e se afastaram da recepcionista. — Wylie me entregou relatórios novos e achei fatos interessantes que... — Isso não pode esperar? — Tyler a interrompeu. — Estou no meio de um negócio importante. — Seu semblante estava sério e sua voz, rude. Samantha olhou para ele surpresa pela óbvia irritação que despertara nele. — Desculpe-me. — Ela respirou fundo. — Que falta de bom senso da minha parte. — Virou para sair. — Samantha, espere! Ela não parou e Tyler ficou olhando-a afastar-se, sabendo que a magoara. Tyler ficara surpreso com a repentina aparição de Samantha e não queria que ela soubesse que o homem com quem estava conversando era o dono de um importante escritório de advocacia em St. Louis, que viera para entrevistá-lo para um possível emprego. Quando Tyler a viu, foi tomado por um sentimento de culpa que ô fez levantar-se para impedir que ela chegasse à mesa. Tyler voltou para a mesa. Mais tarde se desculparia com ela e lhe explicaria o teor do negócio que estava entabulando com aquele senhor. Se fechasse negócio para obter sociedade na firma de St. Louis poderia lhe vender a parte dele na sociedade e os dois ficariam numa posição melhor. Samantha voltou ao táxi e foi diretamente para casa. Não estava brava com Tyler pela rudeza com que fora recebida por ele. Tinha sido tola e ridícula, interrompendo um almoço de negócios. Deveria ter esperado e falado com ele mais tarde, ao jantar, como costumavam fazer. Como sempre, deixara que um impulso dominasse seu modo de agir. Em casa resolveu tomar um banho bem quente e pensar a respeito dos relatórios que acabara de ler. Minutos depois estava na banheira, com a perna engessada para fora e a cabeça 99


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy apoiada numa almofada inflável. A água fez com relaxasse, tornando impossível qualquer raciocínio. Estava quase dormindo quando o telefone tocou. Ela pegou o telefone sem fio ao lado da banheira e atendeu. — Alô? — Samantha? — Tyler estava do outro lado da linha. — Apenas queria me certificar de que você tinha chegado bem em casa. — Estou aqui. — Ela sentou-se, percebendo que a água já não estava tão quente. — Samantha... Desculpe-me. Fui muito brusco com você, no clube. — Não Tyler, eu é que tenho de pedir desculpas por ter interrompido seu almoço. Descobri alguns fatos novos no caso Marcola e quis contar para você. Mas deveria ter esperado que voltasse ao escritório. Poderemos conversar a respeito quando você chegar, em casa. — Chegarei daqui a pouco. Tenho poucas incumbências para terminar. — Onde você está agora? — No aeroporto. Tive que embarcar alguém. — Você se importaria de passar no escritório e pegar minha maleta? Enquanto falava com Tyler ela abria a torneira de água quente. — Não tem problema, eu pegarei. Que barulho é esse? — É a torneira. Estou na banheira. — Ela sorriu e acrescentou: — Se você se apressar ainda conseguirá pegar algumas bolhas. — Samantha... — Apresse-se, Tyler. — Desligou o telefone e encostou-se na almofada novamente. Nessa noite eles fariam amor, e ela lhe confessaria que o amava. Samantha estremeceu de excitação. Se ela estivesse certa a respeito do que lera nos relatórios, Dominic estava a caminho de uma absolvição e ela a caminho da felicidade ao lado de Tyler. Tyler. Naquela noite lhe diria que o amava, e ele lhe confessaria a mesma coisa. Bem, ele não tinha dito nada ainda, mas ela sabia que o faria. O amor transparecia no olhar dele quando os dois estavam se amando, e na preocupação dele com sua saúde e integridade física. Momentos depois ela saiu da banheira e vestiu um vestido confortável de seda. Era o dia de folga de Virgínia e quando isso acontecia geralmente eles encomendavam o jantar. Essa noite queria fazer uma surpresa para Tyler, ela mesma preparando alguma coisa. Mas antes precisava dar um telefonema, para seguir uma pista que Wylie lhe tinha indicado. Pegou o telefone da cozinha e discou para Geórgia Monroe, pensando no que iria cozinhar. "Omeletes", ela pensou. Era rápido e fácil e uma das suas especialidades culinárias. — Geórgia, é Samantha Dark — falou quando a mulher atendeu. — Sinto incomodála, mas eu... Uh... Derramei café sobre algumas anotações que você me deu — ela 100


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy improvisou. — Oh, querida, também faço coisas desse tipo o tempo todo — Geórgia respondeu de maneira muito simpática. — Gostaria de conferir algumas informações, só para constar do relatório. — Claro. Estou ã disposição. — Quando você disse ter encontrado com Abigail antes do crime? — Uns dois dias antes. Deixe-me pensar... — Geórgia fez uma pausa. — Abigail foi assassinada numa quarta-feira e acho que almoçamos juntas na segunda. Samantha sentiu uma onda de excitação. — E quando você disse que Kyle nasceu? Seguiu-se uma longa pausa. — Não sei por que a data de nascimento de Kyle possa interessar na morte de Abigail. Um tom de voz frio substituiu o tom amistoso da voz de Geórgia. — Nem eu — Samantha respondeu. — Mas estou pensando... Como você teve Kyle com quarenta e dois anos, tendo se submetido a uma estereotomia quando tinha trinta e cinco? Ela ouviu a respiração da mulher do outro lado da linha. — Você fez a sua lição de casa muito bem, Srta. Dark. — Mais uma pausa. — Kyle foi adotado, mas preferi não contar porque ele não sabe. No que diz respeito a Morgan e a mim, ele é nosso. — Mas tenho uma cópia da certidão de nascimento que aponta Morgan como pai e você como mãe. Mais uma longa pausa e Geórgia, respondeu com rispidez: — O dinheiro faz coisas miraculosas. — Obrigada, Geórgia, é tudo o que preciso por enquanto. Samantha desligou e ficou pensativa. Então Kyle era adotivo. E Morgan e Geórgia teriam pagado alguém para esconder a verdade. De que maneira essa informação poderia ajudar no caso Dominic? Saiu da cozinha e foi para o estúdio, onde as fotografias do caso Marcola estavam espalhadas sobre a mesa que fora do seu pai. Ainda bem que o fotógrafo tinha sido zeloso, como se tivesse sido pago por cada fotografia tirada. Havia fotos de Abigail na cama, fotos da garrafa de champanhe e de duas taças na sala de visitas. Cada cômodo do apartamento de Morgan tinha sido fotografado. Samantha passava pelas fotos até que chegou à foto da cozinha. — Aqui está — ela disse triunfante enquanto olhava para a imagem de um embrulho contendo um pão e amarrado com uma fita azul. Azul para quarta-feira. O dia em que Abigail fora assassinada. Geórgia tinha mentido. Ela tinha visto Abigail no dia do crime. Por que mentira se não havia nada para esconder? Samantha voltou à cozinha sentando-se numa das cadeiras. Súbito sentiu frio. Seria 101


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy possível que Abigail tivesse descoberto a verdade sobre a origem de Kyle e ameaçado contar a verdade para o rapaz? Haveria possibilidade de Geórgia ter matado a moça para manter seu segredo? Samantha lembrou-se da força com que Geórgia trabalhava a massa do pão, no dia em que fora á casa dela. Sim, era possível. Onde estava Tyler? Precisava discutir sobre isso com ele, para se convencer de que não estava seguindo uma pista sem fundamento. Mesmo que isso não fosse motivo para o crime, ela poderia usar essa informação para despertar dúvidas nos jurados. Levantou-se e começou a juntar os ingredientes para a omelete. Enquanto cortava cebolas e pimenta verde, tentava pensar em algum outro motivo que fizesse sentido. Adicionou presunto e queijo aos ovos batidos e seu raciocínio não parava de trabalhar. Como não tinha idéia de quanto tempo Tyler demoraria em chegar, deixou tudo preparado e voltou ao estúdio e às fotos. Embora não pudesse provar nada, seria essa informação suficiente para despertar dúvidas razoáveis? Faltava a objetividade necessária. Pegou de novo o relatório de Wylie sobre Geórgia. Tinha dito a Wylie que queria saber tudo a respeito de Morgan, Geórgia e Kyle Monroe e Rick Brennon. Wylie tinha sido um gênio, dando detalhes da vida de todos eles, e Samantha suspeitava que conseguisse aquelas informações por métodos legais e ilegais. A estereotomia de Geórgia tinha sido feita num hospital de Kansas, e Samantha achava que tivesse sido lá justamente para que ninguém, em Wilford, ficasse sabendo. Nos meses que antecederam ao nascimento de Kyle, Geórgia ficara fora do país e Samantha achava, mais uma vez que havia sido para ninguém saber que o bebê não; era dela e a adoção provavelmente, tinha sido ilegal. Mas seria motivo tão forte para matar alguém? Pensativa, Samantha passou a mão pelos cabelos. Sabia que às vezes, era necessário muito pouco para despertar um assassino em potencial. Foi até a janela e viu que a noite estava se aproximando. Onde estaria Tyler? Já tivera tempo de terminar suas pendências e chegado em casa. Onde estaria? Tinha sido oferecida a Tyler, a sociedade na firma Bruner, Sandorf e Kearnes de St. Louis. Antes que Leo Bruner pegasse o avião, Tyler dissera ao homem de meia-idade que pensaria na oferta. A firma gozava de ótima reputação e era uma das maiores do meiooeste. Tyler sabia que ficaria muito bem como sócio dessa firma. Depois que terminara de fazer o que precisava, foi até o estacionamento, entrou no carro e ficou sentado por um tempo olhando para o prédio onde passara a maior parte de sua vida nos últimos dez anos. O Escritório de Advocacia Jamison não era uma firma tão poderosa quanto a Bruner, Sandorf e Kearnes, porque Jamison não quis expandi-la trazendo mais advogados e aplicando mais dinheiro. A firma tinha, sido dele e de Tyler, que tinha dedicado sua vida e colocado sua alma no trabalho, que era o único objetivo da sua vida. Saiu do carro e entrou novamente no prédio. Em vez de ir direto para o escritório de Samantha, para pegar a maleta que havia esquecido, dirigiu-se ao dele, sentou- se à mesa, fechou os olhos e seus pensamentos eram um misto de medo e arrependimento, emoção e 102


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy lógica. A idéia de deixar a firma lhe causava muita dor, mas era necessário. Não podia permanecer ali, trabalhando com Samantha, amando-a e não podendo assumir um compromisso mais sério. Ela merecia mais do que ele poderia oferecer. Mas talvez não precisasse partir, assoprou-lhe uma voz interior. Samantha não lhe dissera que o amava talvez ele estivesse tornando a situação mais séria do que realmente era. Talvez ela estivesse apenas se divertindo com sua primeira experiência sexual. Talvez ela se desinteressasse dele e decidisse procurar um companheiro mais permanente. Não tinha idéia de quanto tempo ficou ali sentado, perdido nos pensamentos, quando ouviu um ruído que lhe avisou que não estava sozinho no prédio. Prestou atenção, querendo saber se podia ser o ruído do encanamento do aquecedor ou alguma coisa mais séria. Um novo ruído, e o furtivo som de passos, fez com que ele ficasse de sobreaviso. Teria estado sentado ali por tanto tempo que Samantha cansara de esperar e viera ela mesma buscar sua maleta? Tyler saiu do escritório e foi até o topo da escada. Olhou para baixo e viu uma pálida claridade no escritório de Samantha. A apreensão se transformou em irritação. Ela era a mulher mais impaciente que conhecia. Podia ouvir o som de papéis sendo manuseados. — Samantha, eu lhe disse que levaria a maleta para você. — Começou a descer a escada. Os sons cessaram e Tyler voltou a ficar apreensivo. Samantha teria respondido, pois sempre tinha uma resposta na ponta da língua. Tyler parou no meio da escada, incerto se deveria continuar ou voltar para cima. O silêncio continuava. Imaginou ouvir a respiração de alguém, mas percebeu depois, que se tratava da sua própria respiração. Com cautela, desceu os degraus pé ante, pé, até chegar à porta do escritório de Samantha. Respirou fundo e sentiu seu sangue ferver quando entrou. Ninguém. A luminária da mesa estava acesa. Tyler franziu o cenho. Teria imaginado coisas? Quando olhou em volta e deparou com o arquivo aberto e papéis esparramados pelo chão, viu que não era sua imaginação. Alguém tinha estado ali. E não era Samantha. Ouviu um som atrás dele, e virou-se. — Você! — exclamou surpreso, no momento em que a escultura preferida de Jamison atingiu-lhe a cabeça.

CAPÍTULO XIII

Samantha olhou para o relógio pela centésima vez na última hora, querendo adivinhar o que estava retendo Tyler por tanto tempo. Quando a campainha da porta 103


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy soou, ela pulou da escrivaninha, certa de ser ele que havia esquecido a chave. Abriu a porta e ficou surpresa ao ver Osso parado na varanda. — Osso! O que aconteceu? O que está fazendo aqui? — Tenho uma informação importante para você, Samantha. Coisa que poderá ajudar seu cliente. — Entre. — Ela o fez entrar e acompanhou-o ao estúdio. — Aqui poderemos falar à vontade. — Ei, que lugar bonito! — ele exclamou quando se viu dentro do estúdio. Andou até o bar olhando as garrafas. — Você se importa? — Sirva-se. Samantha sentou-se no braço de uma poltrona e esperou com impaciência que ele se servisse de uma boa dose do uísque preferido de Tyler. — Então, o que você tem para mim? — perguntou quando ele sentou-se na cadeira oposta a ela. Osso tomou um gole grande de uísque, recostou-se na poltrona e suspirou. — Isso é que é vida. Não posso acreditar que você deixou tudo isso quando partiu de Wilford. — Há coisas mais importantes na vida, do que uma casa grande. — Samantha respondeu cada vez mais impaciente. — Então, o que você tem para mim, Osso? Eu tenho muito pouco tempo para salvar Dominic da cadeira elétrica. — Eu já lhe falei que costumava fazer um pouco de jardinagem? Samantha olhava para o homem alto e magro, pensando sobre o que ele estaria falando. — Que bom, Osso, mas... — Sim, eu trabalhei para Geórgia Monroe por alguns anos. Senhora gentil. Eu estava lá quando Morgan lhe disse que queria o divórcio. — Olhou para Samantha com os olhos brilhando. — Triste. A pobre mulher ficou arrasada. Depois de tudo que havia feito para ele... Pegou seu filho ilegítimo, criou o garoto como se fosse seu próprio filho e aquele foi o agradecimento que recebera. Samantha estava tensa. — Eu não sabia que você e Geórgia eram assim tão; íntimos. — Geórgia poderia sobreviver ao divórcio — Osso continuou. — Pelo menos ela tinha dignidade, mas então Abigail descobriu sobre Kyle e ameaçou contar a todos. Todos na cidade sabiam que Morgan não só estava se divorciando dela como a tinha enganado durante todo o tempo em que estiveram casados. E com isso Geórgia não podia conviver. Ela se transformou em motivo de chacota na cidade. Então me chamou, e contou que Abigail se tornara um problema. Samantha começou a sentir medo conforme olhava para o homem em quem tinha confiado e que pensava fosse seu amigo. Sentia-se como se estivesse presa numa teia, prisioneira do olhar de Osso e do tom da sua voz. Sabia que precisava fazer alguma coisa, que estava em perigo, mas não conseguia mover-se. 104


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Como... Osso sorriu, colocou o copo de uísque nos pés da poltrona onde estava sentado. — Foi fácil. Geórgia fez uma visitinha a Abigail naquela manhã, e colocou pílulas para dormir na garrafa de champanhe. Ela sabia que Abigail adorava champanhe e bebia todas as noites. — E Dominic? — Não devia estar lá. — Osso sorriu. — Imagine minha surpresa quando abri a porta do quarto e achei não uma única pessoa inconsciente na cama, mas duas. — Ele ergueu os ombros. — Dominic foi um presente inesperado. — Sabia que se o deixasse vivo, ele provavelmente seria incriminado e o caso estaria encerrado. — Osso franziu o cenho e esfregou a testa com os dedos. — Mas você pegou o caso e começou a investigar. — Ele olhou para Samantha com simpatia. — Tentei assustar você para que desistisse. Primeiro com o tijolo e depois com isso. — Apontou para a perna engessada de Samantha. Nesse momento, Samantha sentiu que precisava fazer alguma coisa. Fora ele que quebrara sua perna. Mas não podia agir por instinto, tinha que permanecer calma e racional. Osso era perigoso e o fato de ele ter confessado o assassinato de Abigail significava que não pretendia deixá-la viva para usar essa informação contra ele. — Foi fácil conseguir o prendedor de notas de Brennon. Ele se embebeda quase todas as noites e o deixa sobre o balcão. Eu deixei o clip perto de você para confundi-la. Eu não queria machucá-la, Samantha. Por que você não abandonou o caso? — Porque um inocente está na prisão — ela respondeu. — É melhor você sair daqui, Osso. Tyler deve chegar a qualquer momento. Se você sair agora, talvez tenha tempo de sair da cidade. Osso deu uma risada assustadora, e um arrepio percorreu a espinha de Samantha. — Tyler não virá para casa nessa noite e... Em nenhuma outra. Samantha prendeu a respiração. — O que... O que está querendo dizer com isso? — Tyler sofreu um horrível acidente no prédio da firma. Uma estátua caiu na cabeça dele. Samantha sentiu o chão se abrir debaixo dos seus pés. Por um momento seu coração pareceu parar de bater quando tentou imaginar o mundo sem Tyler. Não... Não, não podia ser verdade, seu coração gritava. Não agora, que tinha descoberto que o amava. O pensamento de Osso ferindo Tyler encheu-a de uma raiva incontrolável. Sem hesitar, ela se atirou do braço da poltrona e ergueu a perna engessada atingindo Osso num dos lados da cabeça. Com um grito de dor e surpresa, ele caiu no chão. Samantha não parou para verificar o que tinha acontecido com ele. Correu desajeitada, arrastando a perna engessada pelo carpete. Ouviu atrás dela um grito de raiva e uma ameaça de morte. E correu para a única direção que pôde: para a escada. Tyler voltou a si com um gemido. A primeira coisa que viu foi á estatueta da Justiça, de olhos vendados e segurando a balança, coberta de sangue. Sangue? A estátua estaria 105


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy sangrando? Seus pensamentos estavam confusos. Sentou-se por um momento, desorientado e olhando ao redor. O lado esquerdo de sua cabeça doía e latejava com intensidade causando-lhe náuseas. Passou a mão no lugar da dor e seus dedos ficaram ensangüentados. Olhou para a estátua... Era seu sangue. De repente se lembrou. Levantou-se cambaleando e quase caindo de tontura. Samantha. Começou a rezar. Oh, Deus, havia quanto tempo estaria desacordado? Não tinha idéia do que Osso estava fazendo no escritório e o que estaria procurando, mas o pensamento de Samantha sozinha em casa, o fez gelar e não sentiu mais dor nem medo. Tinha de ir para casa e contar-lhe que Osso não era confiável. Enquanto saía do edifício, sua cabeça doía não só pelo ferimento, mas pela confusão dos seus pensamentos. O que estaria Osso fazendo no escritório de Samantha? Qual seria seu envolvimento? Nada fazia sentido. Nada a não ser que precisava ir até Samantha. Tyler suspeitava que Osso tivesse achado que o ferira mortalmente. Devia dar graças a Deus pelos seus reflexos. Tinha conseguido desviar a cabeça um momento antes de ser atingido pela estátua, impedindo que o golpe o matasse. A mesma pergunta voltou à sua mente. O que Osso estaria procurando? O que era tão importante a ponto de matar para consegui-lo? Teria algo a ver com o assassinato de Abigail? Teria ele atingido Tyler e ido atrás de Samantha? O coração de Tyler parecia querer saltar-lhe do peito enquanto dirigia pela Rua Main em direção à mansão dos Dark. Por favor... Por favor... As palavras eram uma prece. Aquilo não poderia acontecer de novo. Ele tinha de chegar a tempo. Tyler sentia como se fosse personagem de um dos seus pesadelos. Lembrou-se do carro da polícia, as luzes piscando e a visão da mãe morta na cama. Se ele tivesse chegado a tempo... Se não tivesse voltado para casa mais tarde, teria conseguido salvá-la. Era sua culpa... Sua culpa... Tinha de chegar, em casa a tempo de salvar Samantha. Tinha que ter entrado no escritório dela, pego a maleta e ido imediatamente para casa em vez de ter ficado tanto tempo sentado ali, pensando. Era sua culpa, do mesmo modo como quando tinha catorze anos. Se alguma coisa acontecesse com Samantha ele ficaria louco. Tinha que chegar a tempo. Quando entrou no caminho que levava à frente da casa, seu coração quase explodia de medo. Apesar de não haver carros de polícia e nada que indicasse que alguma coisa grave houvesse acontecido, ele tinha certeza que Osso viera atrás de Samantha. "Oh, Deus, permita que eu chegue a tempo", ele orou baixinho. Parou o carro e desceu. Correu até a porta da frente e gritou: — Samantha? Mas seu grito foi seguido por um silêncio absoluto. Não se ouvia nada... Nenhum ruído, nenhum som. Ele entrou no estúdio, o coração disparado. Uma cadeira virada, um copo quebrado... Um quadro torto. Algo mal tinha acontecido ali. Seu estômago começou 106


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy a doer rivalizando com a dor da cabeça. — Samantha! — gritou novamente. Não se importava que Osso também ouvisse. Se ele ainda estivesse ali, dessa vez não ia pegá-lo desprevenido. E Tyler o mataria se ele tivesse feito algum mau a Samantha. Ele o mataria com a raiva que estava reprimindo havia anos e que agora explodia dentro dele. Levou só um segundo para procurar no andar térreo. Samantha não estava em lugar algum. A cabeça doía muito, mas ignorou a dor e correu até o começo da escada. O vestíbulo do andar superior estava na penumbra, mas via-se claridade em cada um dos quartos. Ele sabia que não estava sozinho na casa, sentia isso como se fosse um animal pressentindo o perigo. Estava com medo de subir a escada, com medo de entrar em algum dos quartos e encontrar Samantha numa cama... Morta. Exatamente como sua mãe. Dessa vez ele não sobreviveria. Enlouqueceria de dor e de culpa. Subiu as escadas lentamente, temendo o que poderia encontrar, desejando escutar sons que indicassem que não estava sozinho. Quando chegou ao topo da escada, ele parou quieto apurando os ouvidos. Seus instintos estavam à flor da pele, mas manteve o pensamento em Samantha, consciente de que se pensasse na possibilidade de ela estar morta ficaria completamente incapacitado de fazer qualquer coisa. Foi até a porta do primeiro quarto, desejando encontrar um revólver... Uma faca... Qualquer coisa que pudesse usar contra Osso. Seu único conforto era pensar que Osso também não estava armado, pois se estivesse teria usado a arma contra Tyler, no escritório. O primeiro quarto estava vazio. Tyler encostou-se à parede e suspirou. Onde estava Samantha? O quarto dela também estava vazio. E também o dele. Em cada quarto as portas dos armários estavam abertas, como se alguém tivesse olhado dentro, procurando alguma coisa ou... Alguém. Tyler olhou tudo até que parou na frente da porta do quarto da mãe de Samantha. Se houvesse alguém na casa tinha que estar naquele quarto. Ele agarrou a maçaneta da porta com a palma da mão suando. Não fez barulho quando girou o trinco e abriu a porta. Suspirou de novo quando viu o quarto vazio. Samantha não estava morta na cama e parecia que não havia ninguém no quarto. "Céus... onde ela está?", pensou aflito sentindo-se gelar. Teria Osso á levado para algum outro lugar? Estaria ela, nesse momento, no porta-malas de algum carro, sendo levada a algum lugar onde seria assassinada? Ele preparava-se para sair do quarto quando viu um pedaço da cortina presa na porta da sacada. Apavorado, ele olhou para a porta. Oh, Deus! Não! Sentindo as pernas pesadas, andou até a porta com medo de olhar... Medo de achar Samantha caída no pátio embaixo da sacada. Abriu a porta e saiu. Samantha estava lá. Com Osso. Ele tinha uma faca encostada no pescoço dela e a segurava perto da amurada quebrada da sacada. Uma faca. Droga. Tyler pensava que 107


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Osso estivesse desarmado e que a luta seria em igual condição. — Afaste-se ou eu a corto em fatias e jogo lá embaixo — Osso ameaçou. Os olhos de Samantha estavam toldados de medo. — Ele matou Abigail Monroe, Tyler. E foi esse desgraçado que me atacou e quebrou minha perna. Em algum lugar do seu cérebro, Tyler percebeu que não era medo o que ele via nos olhos de Samantha, era raiva, pura raiva. — O que você quer? — Tyler perguntou enquanto pensava em alguma opção. Não podia atacar o homem. A sacada era pequena demais para que ele pulasse sobre o marginal que estava com a faca no pescoço de Samantha. Podia cortá-la com facilidade. Era arriscado demais. — Quero apenas sair daqui. As coisas não correram como eu esperava. Agora, afastese. — Solte-a — Tyler exigiu. Osso negou com um gesto de cabeça, o braço firme ao redor do pescoço de Samantha. — Ela é minha garantia. Ela vai comigo. Quando eu estiver a salvo, eu a soltarei. Tyler sabia que o homem estava mentindo. Ele e Samantha sabiam demais para que Osso os deixasse vivos. Com medo que Osso cumprisse a ameaça, Tyler deu um passo para trás e entrou no quarto. Pelo menos teria espaço para se mover. Quando Tyler entrou no quarto, Osso e Samantha avançaram. Tyler estava tenso e se preparando para atacar. — Nem pense nisso — Osso avisou com se tivesse lido sua mente. — Eu a corto antes que você me alcance. — E para provar encostou a ponta da faca no pescoço de Samantha que gritou enquanto um fio de sangue escorria do pequeno corte. O ódio de Tyler ficou ainda maior. — Se você a machucar novamente, eu o mato. — O som da voz de Tyler era frio, distante e ele sentia o instinto assassino que experimentara uma vez quando era mais jovem. Não passaria pela mesma tragédia duas vezes na vida... Não passaria pela morte da pessoa amada mais uma vez. Morreria antes que Osso pudesse ferir Samantha. Osso riu e falou com ironia: — Não acho que esteja em posição de me ameaçar. — Ele apertou os olhos. — Agora, saia do quarto e desça. Sem alternativa, Tyler obedeceu. Conforme ia descendo a escada ele pensava num jeito de agir sem colocar a vida de Samantha em risco. Chegou ao vestíbulo e olhou para cima onde estavam Samantha e Osso, este sempre com a faca sob o queixo dela. Deus precisava ajudá-lo. Ele não sabia o que fazer para salvá-la. Aquela faca apontada para ela tornava impossível qualquer tentativa de resgate. Tyler fechava as mãos sentindo-se inútil. Sabia que se Osso ferisse Samantha ele o mataria... Mas se alguma coisa acontecesse a ela... Tyler morreria também. 108


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy No meio da escada, Samantha percebeu que precisava fazer alguma coisa. Osso não ficaria satisfeito em matá-la apenas. Quando ele acabasse com ela, iria atrás de Tyler. Tyler era forte e estava irado, mas sua força e sua raiva não podiam competir com a faca afiada de Osso. Não poderia deixar que ele chegasse até Tyler. Tinha que fazer alguma coisa... E rápido. Cada passo que eles davam era atrapalhado pelo gesso de Samantha e pelos passos que Osso dava para mantê-la perto dele. Prendendo a respiração, sabendo que poderia passar o resto de sua vida inválida, Samantha, em um único movimento, deu um, tapa na mão de Osso. A faca caiu e Samantha tentou escapar. — Ei! Indiferente ao grito de Osso ela se soltou dele e se atirou escada abaixo. Sentiu cada degrau raspando e batendo contra seu corpo até que caiu de costas no vestíbulo, o gesso se chocando contra o chão com uma pancada surda. — Samantha! — Tyler gritou e se abaixou perto dela enquanto Osso subia a escada novamente. — Não fique aqui... Vá atrás dele — ela conseguiu falar. Depois de um momento de hesitação, Tyler subiu a escada correndo atrás do assassino. Com cuidado, Samantha sentou-se e começou a se examinar para se certificar de que não tinha quebrado mais nada. Apesar de dolorida pela queda, não achou que o tombo tivesse causado danos maiores. Levantou-se, pegou a faca e subiu a escada mancando, para ajudar Tyler. Encontrou os dois homens outra vez no quarto de sua mãe, gingando como dois bêbados num bar. Parou na porta do quarto, insegura do que fazer, enquanto Tyler e Osso trocavam socos. Tyler tinha sangue do lado da cabeça e um dos olhos inchado. Osso estava com o lábio superior cortado e o sangue escorria até o queixo. Os dois homens pareciam empatados, Tyler com raiva e Osso com vontade de sobreviver. Trocavam socos como dois lutadores de boxe tentando acabar um com o outro. Samantha gritou quando os dois se atracaram e foram em direção à sacada. Ela correu até a porta da sacada aterrorizada pela perigosa proximidade que os dois estavam da amurada quebrada. Queria dar a faca para Tyler, mas tinha medo que fosse parar nas mãos de Osso. Os dois rolavam pela sacada, primeiro Osso sobre Tyler e depois Tyler sobre Osso. Nenhum conseguia acertar um soco no outro. Eles chegavam cada vez mais perto da amurada, até que finalmente Osso estava sobre Tyler que tinha o torso pendurado na beirada da sacada, no espaço por onde seu pai tinha caído, seguro apenas pela ripa de madeira que tapava o buraco da amurada. Tyler tentava se segurar e Osso; tentava empurrá-lo para baixo. Samantha deu um grito e atacou, cravando a faca nas costas de Osso. Ele se esticou quando a faca penetrou no seu corpo, com o rosto e os olhos refletindo surpresa e dor. Levantou-se tentando se equilibrar até que se aproximou da beirada da sacada e caiu sobre o concreto abaixo. 109


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Soluçando, Samantha ajudou Tyler a se levantar. Ele imediatamente a abraçou. — Eu o matei — ela falou chorando. — Não, você me salvou. — Ele a apertou nos braços e beijou-lhe a testa, as faces molhadas de lágrimas e os lábios. Samantha se agarrou a ele pensando se algum dia esqueceria o momento em que pensou que ele cairia para a morte. — Tive tanto medo. — Ela soluçava. — Acabou — Tyler sussurrou. — Está tudo acabado. Entraram no quarto, desceram a escada e foram para o estúdio de onde telefonaram para a polícia. Sentaram-se então, para esperar a chegada das autoridades. — Foi Geórgia. Ela é a responsável pela morte de Abigail. — Samantha relatou a Tyler o que havia nos relatórios que Wylie lhe entregara. — Ela mandou Osso aqui depois do telefonema que lhe dei. Ela sabia que eu estava á par da adoção. Acho que foi uma combinação de fatos que a empurraram para esse desfecho: o divórcio, o casamento de Morgan com Abigail e a ameaça de Abigail de contar a Kyle sobre sua origem. Ela contratou Osso para matar Abigail. E Dominic estava no lugar errado na hora errada. Tyler a abraçava com força e Samantha fechou os olhos lembrando-se dos momentos anteriores à chegada de Tyler, quando Osso tinha lhe contado a respeito do crime, sobre o atentado que lhe tinha quebrado a perna e que havia matado Tyler. Ele pretendia matá-la, atirando-a da sacada. E teria conseguido se Tyler não tivesse chegado a tempo. — O importante é que você fez o que queria. Dominic será solto. — Sou uma advogada terrível, não sou? — Sorriu para Tyler. Ele retribuiu o sorriso e concordou. — Você não é apenas uma advogada terrível, você é uma mulher terrível. Antes que ela pudesse responder, o som de sirenes quebrou o silêncio e logo em seguida bateram na porta. A polícia havia chegado. — Cansada? — Tyler perguntou a Samantha depois de fechar a porta, à saída do último policial. Começava a amanhecer e o céu estava brilhante e alaranjado. Fora uma noite de interrogatórios e explicações. — Exausta. — Por que não vai se deitar? Não há nada mais para ser feito. Dominic será solto, Geórgia será presa e pelo que o delegado me disse, ela já confessou tudo. Falou à polícia do seu ódio por Abigail que lhe roubara o marido e que pretendia contar a verdade sobre a origem do filho. O segredo devido ao qual Abigail fora, morta era que Kyle era o resultado de um amor ilícito e Geórgia não queria que a cidade soubesse que Morgan havia sido infiel durante o casamento. Ela matou Abigail por orgulho. — Preciso resolver mais uma coisa antes de ir para a cama e descansar — Samantha disse, e pôs a mão no bolso de onde tirou um brinco. — O que é isso? — Tyler a olhou com curiosidade. Não estava certo sobre quem parecia pior, ela ou ele. Seu olho esquerdo estava quase fechado de tão inchado e ele se sentia como se tivesse estado embaixo de um rolo compressor. Samantha parecia um 110


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy pouco melhor. Tinha sangue na frente do vestido e seu rosto estava completamente sem cor. — Quando Osso estava atrás de mim, eu me escondi na sacada, na esperança de que ele não pudesse me encontrar e fosse embora. E lá, encontrei isso entre as rachaduras da madeira do piso. — Ela segurava o brinco entre os dedos. Era grande, no formato de um trevo de quatro folhas e com uma esmeralda no centro. — Eu o reconheci. Quando eu tinha dezessete anos comprei esses brincos para Edie no seu aniversário. Preciso falar com Edie para saber como e quando isso foi parar naquela sacada. — Samantha... — Tyler começou a protestar, mas percebeu pelo seu olhar, que ela estava decidida. — Está bem. Vamos até a casa de Edie — ele disse com resignação. Quase uma hora depois Tyler e Samantha chegaram ao prédio de apartamento de Edie, que era do outro lado da cidade. — Como está sua cabeça? — Samantha quebrou o silêncio. — Ainda dói um pouco, mas os paramédicos que vieram com a polícia me asseguraram que não há motivo para preocupação. — Eu sei que não há motivo para preocupação. Você tem uma cabeça tão dura, que uma simples estatueta não iria quebrá-la. — Samantha riu para ele com carinho. O caso Dominic estava encerrado. Tyler estava livre, e sabia que tinha que contar à Samantha que ia aceitar a oferta recebida pela firma de advocacia, e partir para St. Louis. Mas agora não era á hora certa para isso. Falaria mais tarde. Tyler olhou de lado para Samantha. Ela parecia exausta. Formaram-se sombras escuras embaixo dos olhos e a cada vez que mudava de posição no banco do carro ela fazia uma expressão de dor. — Você tem certeza de que quer fazer isso agora? Podíamos deixar essa conversa com Edie para mais tarde. Samantha negou com um gesto de cabeça. — Não, preciso fazer isso agora. — Olhou para o brinco que segurava entre os dedos. — Esse brinco na sacada não faz sentido, e a queda do meu pai também não. Preciso esclarecer tudo agora. — Pode haver uma explicação racional para o brinco — Tyler sugeriu. Samantha olhou para ele com uma expressão preocupada e ansiosa. — Espero que sim — ela sussurrou. Tyler estacionou o carro na frente do grande prédio onde Edie morava no terceiro andar. — Você quer que eu espere aqui? — Tyler perguntou. — Não. Quero você comigo. — Samantha segurou a mão de Tyler. — Sei que você me acha meio louca e sei que tudo isso é uma perda de tempo, pois eu precisaria de mais pistas e mais indícios. Mas devo isso a meu pai. Sei que ele não pularia da sacada, e não posso imaginá-lo caindo acidentalmente. — Samantha apertou a mão de Tyler. — Já tive muitos finais infelizes na minha vida. Devo isso a mim mesma, preciso encerrar tudo, para 111


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy que a morte do meu pai não me assombre para sempre. Tyler concordou. Tocou no pequeno ferimento que Osso tinha feito no pescoço dela. Ia sarar. Deixar Samantha seria muito mais sério que um ferimento, mas ele esperava também sarar. Ela era uma mulher especial e precisava de um homem à sua altura. Infelizmente, sabia que nunca seria esse homem.

CAPÍTULO XIV

— Samantha... Tyler... Edie os cumprimentou á porta, vestida com um roupão e chinelos. Sua expressão denotava surpresa e ela olhava de um para o outro. — O que está acontecendo? O que aconteceu? Tyler... O seu olho. — Ela pôs as mãos nos quadris. — Por favor, alguém pode me dizer o que aconteceu? — Podemos entrar? — Samantha pediu, sentindo frio, pois era muito cedo e a manhã estava gelada. Samantha sabia que se o que ela suspeitava fosse verdade seria muito difícil de enfrentar, e ela queria acabar com tudo o mais cedo possível. — Claro. — Edie escancarou a porta para que eles entrassem. — Vamos para a cozinha. Eles a seguiram através da sala de visitas, muito bem arrumada, até a cozinha, pequena, mas confortável. — Sentem-se, vamos tomar café... Acabei de fazer. Vocês parecem estar precisando. Tyler e Samantha sentaram-se ao redor de uma mesa redonda enquanto Edie pegava xícaras em um armário. Edie os servia, enquanto Samantha contava-lhe os últimos acontecimentos sobre o caso Marcola. — Não posso acreditar. Se bem que Geórgia Monroe sempre foi muito orgulhosa, e preocupada demais com a opinião das outras pessoas, mas nunca pensei que chegasse a tanto. Vocês têm sorte por estarem vivos. Edie olhou para Samantha com carinho. — Então, seu cliente está livre. Você trabalhou bem. Seu pai ficaria orgulhoso de você. Ele ficou tão excitado quando soube que você estava cursando Direito. Samantha olhou-a admirada. — O que você está dizendo? Como ele soube? Eu não contei a ninguém... — Wylie não lhe disse? — Wylie? O que ele tinha para me contar? — Um dos últimos serviços que Wylie fez para seu pai, foi averiguar se você estava bem. Seu pai ficou arrasado quando você fugiu, mas sempre quis saber onde você estava e 112


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy o que estava fazendo, pronto para intervir caso precisasse dele. — Wylie nunca mencionou isso — Samantha respondeu, sentindo um nó na garganta. Ela havia sido importante para ele. Seu pai se preocupava com ela. — Wylie não podia contar — Tyler observou. — Não podia trair a confiança de Jamison. — Jamison estava orgulhoso por você ter a força e a determinação de ir embora e construir sua vida sozinha. Disse-me, uma vez, que você estava agindo como ele, usando sua inteligência e determinação. — Edie pegou a mão de Samantha por sobre a mesa. — E você o teria feito ficar inchado de tanto orgulho. Você não só livrou seu cliente da cadeia como solucionou todo o caso. Samantha tirou a mão do meio das mãos de Edie e declarou: — E agora, preciso da sua ajuda para solucionar outro caso. Edie franziu as sobrancelhas. — O que é? Você sabe que eu faria tudo para ajudá-la. Samantha tirou o brinco do bolso do casaco e o mostrou a Edie. — Isso lhe parece familiar? — Meu brinco! — Edie exclamou e pegou a jóia da mão de Samantha. — Sempre quis saber o que tinha acontecido com ele. Lembro quando você me deu. — Você não vai me perguntar onde o encontrei? — É claro! Onde foi? — Na sacada de onde papai caiu. — Samantha fez uma pausa e continuou: — Edie, o homem sobre o qual você me falou por quem era apaixonada... Era meu pai, não era? Edie estava com o olhar fixo no brinco e não respondeu de imediato. Finalmente, falou num sopro de voz: — Não sei do que está falando. — Você nunca soube mentir, Edie — Samantha falou tensa. — Não quero magoá-la, apenas quero saber a verdade. Como esse brinco foi parar na sacada? Eu preciso saber... Por favor. Edie pareceu sucumbir diante do olhar de Samantha. Lágrimas começaram a cair pelas suas faces, parando na gola do roupão colorido que estava usando. Quando afinal, ela ergueu os olhos para Samantha, seu olhar irradiava uma dor tão grande que Samantha ficou sem poder respirar. — Sim, eu amei Jamison. Acho que me apaixonei por ele no dia em que me entrevistou para o emprego. Mas nada aconteceu entre nós até que você tinha doze anos. Foi só por essa ocasião que nos tornamos amante. Samantha recostou-se na cadeira. Ela nunca havia dado muita importância à vida particular do seu pai, ao fato de que um homem precisa de uma mulher, e Edie era uma escolha lógica. Estava disponível, tanto emocional como fisicamente. Samantha começou a juntar fatos de sua vida. Como Edie freqüentava sua casa, como estava sempre presente nos aniversários e nas reuniões de família. 113


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy As pistas eram evidentes, mas Samantha estava muito preocupada e envolvida com a própria infelicidade para ver o que se passava à sua volta. — Então, o que aconteceu? — Samantha perguntou. Edie enxugou as lágrimas e sorriu com amargura. — O que aconteceu? Nada aconteceu. Ele vinha aqui ou eu ia à sua casa e dormíamos juntos. Ela se levantou e pegou lenços de papel de uma caixa decorada que estava sobre o balcão e continuou: — No começo, eu não me importei. Mesmo que fosse pouco o que eu recebia, eu aceitava faminta. Mas no fundo do meu coração, eu tinha esperança de me casar com ele. Eu amava você e Melissa, e sonhava que nós quatro poderíamos nos tornar uma família. Os anos foram passando e nada mudava, e eu tentava ser paciente. Sabia que ele adorara sua mãe e sofria muito, mas achava que isso passaria com o tempo. Santo Deus, quanto tempo poderia um homem viver para lamentar a morte da esposa? — Edie sorriu com amargura. Tyler pegou a mão de Samantha, como se soubesse que o que Edie ia falar em seguida, seria difícil de ouvir. — O que aconteceu naquela noite? Como meu pai caiu? — Samantha perguntou com suavidade. Edie olhava para um lenço de papel que tinha nas mãos e o fazia em pedacinhos enquanto falava: — Jamison me telefonou às sete horas para ir à sua casa. Tyler tinha saído e era noite de folga de Virgínia. Como de costume, eu fui e nós... Nós dormimos juntos. — Seu rosto ficou vermelho e ela começou a chorar novamente. — Quando... Quando nós acabamos, ficamos conversando um pouco mais do que o habitual, e então ele me disse para ir embora. Dessa vez eu fiquei zangada, e falei que já estava farta de ser seu pequeno segredo, que eu havia lhe dado anos da minha vida, e que já era tempo de assumirmos um compromisso. Ele riu. — Edie olhou para Samantha. — Seu pai sabia ser cruel, às vezes. Samantha concordou, com muita pena de Edie. E entendeu sua dor, a necessidade de sentir-se amada e de pertencer a alguém. Doar-se a um homem e sentir-se rejeitada. — Bem, ele me disse que gostava de mim, mas que estava satisfeito com nosso relacionamento, e que jamais se casaria comigo. Nós discutimos. Ele saiu do quarto e foi para o quarto de sua mãe... E eu o segui. Eu estava tão brava e tão magoada, e fiquei falando que ele tinha de esquecê-la, que ela tinha morrido e não voltaria mais. — Edie falava cada vez mais rápido, quase perdendo o fôlego. — Eu o puxei para a sacada para lhe mostrar de onde sua mãe havia caído, para tentar fazê-lo enxergar que não tinha mais volta. Eu... Eu não queria que nada de mal acontecesse. Ele falou mais algumas grosserias, eu o empurrei para que ele parasse de falar... Ele estava muito perto da beirada, perdeu o equilíbrio e caiu. — Edie gritava histérica e em seguida rompeu em prantos. Agora Samantha sabia tudo, e apesar das circunstâncias, sentiu paz. Todas as peças haviam se encaixado. Agora... Poderia esquecer. 114


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Eu não quis... — Edie abaixou a cabeça sobre a mesa. — Eu o amava. Oh, Deus, como eu o amava! Só queria que ele á esquecesse e... Amasse-me também. Samantha se levantou e puxou Tyler até a porta. Não havia mais nada a fazer ali. Era hora de ir para casa. — Você vai chamar o delegado? — Tyler perguntou momentos depois, quando já estavam no carro, voltando para casa. Samantha meneou a cabeça numa negação. — Para quê? Acredito em Edie. Foi como as autoridades concluíram: um acidente. — Ela pode ser acusada de homicídio não premeditado. — Com que objetivo? — Samantha olhou pela janela. — Já chega de tanta tragédia e de tanta dor. Edie viverá com as lembranças daquela noite horrível. E mais do que um castigo. Por alguns momentos eles ficaram em silêncio. Samantha continuava a olhar pela janela, tentando digerir tudo o que havia acontecido e tudo o que havia aprendido nas últimas vinte e quatro horas. Estava exausta. Seu corpo doía da queda que levara na escada. Seus olhos pareciam cheios de areia e seu coração entorpecido. Quieta, ela procurava razões para que tudo isso tivesse acontecido, para achar uma lógica naquele mundo louco. — Continuo pensando que há alguma lição a ser aprendida em tudo isso... Mas estou cansada demais para saber o que é — Samantha finalmente quebrou o silêncio. — A lição é que amar alguém pode ser perigoso e arriscado. Samantha olhou para Tyler surpresa. — Você não acredita realmente no que está dizendo. Tyler ergueu os ombros, também cansado. — Reflita comigo. Abigail Monroe morreu porque Geórgia amava muito Morgan e Kyle. Dominic foi preso porque todos pensavam que ele amava Abigail. Seu pai morreu porque Edie o amava, e ele amava muito sua mãe. Convenhamos de que essas não são provas de que o amor é uma coisa maravilhosa. Tyler estacionou o carro. — Você está errado... — Samantha forçou um sorriso. — Mas estou cansada demais para provar isso a você. Mais tarde. Mais tarde discutiremos a esse respeito. Desceram do carro e entraram em casa. Samantha parou no pé da escada e olhou para cima. Com a perna engessada, subir os degraus era um sacrifício. — Deixe-me ajudá-la. — Tyler pegou-a no colo. Agradecida, ela relaxou nos seus braços e apoiou a cabeça no peito dele, ouvindo as batidas do seu coração. De repente, Samantha se lembrou dos planos que fizera para a noite anterior. A omelete que pretendia fazer, a noite de amor, e sua intenção de finalmente, confessar seu sentimento por Tyler. Agora não parecia o momento certo. Os dois estavam muito cansados para 115


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy declarações de amor. Fechou os olhos enquanto era levada para o quarto, e não os abriu até que ele com delicadeza; colocou-a na cama. Então se agarrou ao pescoço de Tyler. — Fique aqui comigo — falou sonolenta. Ela queria dormir sabendo que ele estava ao seu lado. — Samantha... — Por favor, Tyler. Durma ao meu lado. Apenas quero saber que você está aqui. Tyler hesitou por um momento, mas capitulou. Tirou os sapatos e deitou-se ao lado dela. Em poucos minutos, Samantha estava dormindo. Tyler olhava-a dormir. Também estava exausto, mas lutava contra o cansaço, consciente de que essa poderia ser a última vez que veria Samantha na intimidade. Nunca mais se permitiria o prazer de vê-la dormindo, de segurá-la em seus braços e de fazer amor com ela. Um dia, com o tempo e a distância, esperava poder esquecer o perfume dos seus cabelos, o encanto da sua risada, seu raciocínio rápido e estimulante. Com o tempo, ele esqueceria o brilho dos seus olhos, a curvatura dos lábios e o calor do seu corpo. E com o tempo... Ele esqueceria que a amava. Tyler deitou-se de costas e ficou olhando para o teto, pensando nos acontecimentos das últimas horas. Durante muito tempo, suspeitara que Jamison tivesse uma mulher. Seu mentor desaparecia, às vezes, por algumas horas à tarde, mas nunca suspeitara de Edie. Era tudo tão triste. Nunca havia vencedores no jogo do amor. Houve um tempo em que Tyler quisera imitar Jamison em tudo. Admirava sua força, seu poder e até seu caráter frio. Agora, não estava mais certo de querer isso. Nem estava certo do que queria. Virou-se de lado e olhou para Samantha mais uma vez. Pelo menos ela estava em paz. Ela e Melissa estavam a caminho de um relacionamento mais íntimo e ele sabia agora, que apesar de o pai não ter demonstrado, ele amara as filhas. E o escritório de advocacia a manteria ocupada. Com o triunfo do caso Marcola, era muito provável que tivesse muito serviço, mais do que um dia imaginara. Talvez ela encontrasse outro homem capaz de amá-la como merecia: completamente, sem medo e sem barreiras. Sim, Samantha ficaria bem. E ele... Sobreviveria. Fechou os olhos e em minutos estava dormindo. — Samantha? — ele chamou e sentou-se. Não houve resposta. Tyler foi ao banheiro e jogou água fria no rosto. Seu olho ainda estava inchado e vermelho, mas doía menos. — Samantha? — ele chamou mais uma vez, enquanto descia a escada. Ela não estava no estúdio, nem na cozinha. Olhou na garagem e viu que o carro dela não estava lá. No mesmo instante, concluiu onde ela poderia estar. Tyler pegou o casaco, vestiu-o e foi até seu carro. Dirigiu até o cemitério onde Abigail Monroe estava enterrada e... Jamison também. Tinha o pressentimento de que encontraria Samantha ali, finalmente capaz de dizer adeus ao pai. Estacionou o carro ao lado do dela e desceu. A distância pôde vê-la perto da 116


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy sepultura do pai. O fato de ter sabido de imediato onde ela estaria era uma prova de como o relacionamento entre os dois tinha se tornado profundo. Houve um tempo em que ele não se importava em saber onde ela estava ou o que poderia estar fazendo. Agora, seu coração e seus pensamentos pertenciam-lhe. Tyler caminhou até ela sem fazer barulho. Samantha não percebeu sua aproximação. Tyler parou quando estava a certa distância, para não invadir sua privacidade, mas para estar por perto se ela precisasse dele. Samantha estava ajoelhada e com um buquê de flores do campo na mão. A mão que segurava o buquê tremia levemente, de frio ou de emoção, Tyler não saberia dizer. — Oh, papai! Desculpe-me por ter esperado demais de você. A voz dela chegava até onde Tyler estava talvez trazida pelo vento frio que soprava. Ele ouviu-a chorando e quis correr até ela para abraçá-la e consolá-la, mas sabia que Samantha precisava desabafar. — Agora percebo que você me amava da única maneira que sabia... — Ela abaixou a cabeça e suas palavras seguintes foram abafadas e entrecortadas. — Sinto muito... Amo você. Tyler conseguia ouvir trechos do que ela confessava ao pai. Confessava seu arrependimento e concedia-lhe o perdão. Ouviu o som do seu pranto, mas sabia que isso era saudável, que era uma catarse e que ficaria bem. Virou-se para sair, percebendo que ela não estava precisando dele. Finalmente, Samantha estava enterrando sua infância e tinha crescido o suficiente para entender a fraqueza do pai e a imperfeição dos homens. — Amo Tyler... Tyler parou, e gelou quando aquelas palavras chegaram até ele. Incapaz de se conter deu mais um passo, não queria ouvir mais nada, mas não conseguia mover-se. — Eu o amo como nunca amei alguém antes... Como você deve ter amado mamãe. Samantha havia parado de chorar e sua voz era vibrante e alegre. Tyler a viu tocar a lápide do túmulo do pai com um gesto carinhoso. — Ele me faz feliz, papai. Nós vamos nos casar e encher aquela casa de crianças. Tyler sentiu-se sufocar. O vento atingia seus olhos fazendo lágrimas aparecerem. Ele não queria acreditar que ela o amava. Apertou o estômago, e percebeu que a dor era mais acima, no coração. Tyler não queria admitir o que acabara de ouvir. O amor de Samantha por ele era real, e o dele era impossível. Isso tornaria sua partida ainda mais difícil. E ele tinha de partir. Sem fazer qualquer ruído, ele se virou e voltou para o carro. Samantha disse tudo que precisava e ainda relutava em sair dali. Apesar do vento frio, o calor do seu coração a aquecia. As memórias da sua vida com seu pai sempre a entristeceram, mas agora aquelas 117


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy mesmas memórias pareciam distantes e compreensíveis. E com o entendimento, veio o perdão. Ele a tinha amado. Não havia sido um amor perfeito, mas tinha sido o que ele pudera lhe dar. Até contratara Wylie Brooks para saber se ela estava bem. E se alguma vez duvidasse desse amor, era só lembrar-se de que ele tinha deixado para ela o que ele mais amava: o Escritório de Advocacia Jamison. E com isso, lhe deixara um sócio por quem se apaixonara. Estava livre do ódio e do rancor que sentira por toda a sua vida e estava pronta para amar Tyler de coração aberto. Percebia agora, a lição que deveria aprender com os fatos do passado. Com o coração em paz, tocou mais uma vez na lápide do túmulo do pai. — Adeus, papai. Eu amo você. Colocou as flores aos pés do túmulo e foi para o carro rapidamente, pois queria falar com Tyler... Ansiosa para confessar-lhe seu amor.

CAPÍTULO XV

Tyler não estava em casa quando Samantha voltou do cemitério. Não tinha idéia de onde ele poderia estar, mas não estava preocupada com sua ausência. Passava do meio-dia e ele deveria ter ido ao escritório para cuidar de algum processo mais complicado. Samantha sabia que o envolvimento de Tyler no caso Marcola o obrigara a negligenciar alguns dos seus próprios casos. Samantha se ocupou em jogar fora os ingredientes para a omelete que havia preparado e acabara não fazendo. Virgínia havia chegado cedo, naquela manhã, quando Tyler e Samantha se preparavam para ir à casa de Edie, e Samantha lhe dissera para ir para casa pelo resto do dia. Enquanto punha ordem na cozinha, sentiu-se feliz por ter dispensado Virgínia. A simples tarefa de lavar louça a fazia sentir-se muito bem. Era um trabalho que não exigia raciocínio, e era o que estava precisando para preparar seu coração para Tyler. Sorriu ao pensar nele. Quem poderia imaginar que, algum dia, ela se apaixonaria por Tyler, o homem que odiara durante tanto tempo por ter-lhe roubado o amor do pai? Embora Samantha soubesse que os dois tinham uma filosofia de vida diferente, a certeza do amor que os unia seria suficiente para se respeitarem e construírem uma vida juntos. Tyler não havia dito que a amava, mas ela sabia que o faria. Era uma questão de tempo. Talvez ainda não tivesse percebido, mas Samantha sabia que ele a amava profundamente. Sorriu com alegria sentindo que cada experiência por que passara na vida, cada 118


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy sofrimento e cada noite solitária serviram apenas como preparação para o momento de entregar-se inteiramente a Tyler. A vida era repleta de contradições. Havia jurado odiar Tyler para todo o sempre e ele acabara sendo o primeiro homem a possuí-la, física e emocionalmente. O sexo entre os dois era completo, sem tabus e sem limites. Eles se entregavam um ao outro com paixão e com luxúria, e principalmente com o carinho e o respeito que só o amor podia dar. Depois que a cozinha estava em ordem, Samantha foi ao telefone e discou o número de Melissa. Queria compartilhar sua felicidade com a irmã, e contar-lhe que amava Tyler. — Como estão hoje minha irmãzinha e meu sobrinho ou sobrinha preferida? — Samantha perguntou, quando Melissa atendeu ao telefone. — Samantha — a voz de Melissa mostrava alívio. — Acho que eu é que devia lhe perguntar como você está. Ouvi comentários no supermercado, e tentei falar com você durante toda a manhã. — Você não devia dar ouvido a fofocas — Samantha respondeu rindo. — Oh, Sá, você realmente está bem? Ouvi dizer que alguém tentou matá-la e... Que Dominic é inocente e que a pessoa que o matou tentou pegá-la a noite passada. — Hmm, parece que dessa vez os linguarudos da cidade estão certos. Eu estou bem, Melissa. — Samantha passou a contar para a irmã, tudo o que havia acontecido com Osso, com Geórgia... E finalmente com o pai e com Tyler. — É tudo tão triste, não é? — Melissa comentou, quando Samantha terminou o relato. — Sim, é. — Samantha riu para aliviar a tensão que as notícias tinham despertado em Melissa. — Mas algumas coisas nunca mudam. Alimentei as fofocas locais durante tantos anos, e depois de tanto tempo ainda continuam a falar de mim. Melissa riu. — Estou muito contente por você estar em casa. — Eu também. Perdemos tempo demais, Melissa, mas juro que vamos compensar essa perda. — Sim, eu gostaria muito — a irmã respondeu com simplicidade. Samantha pensou em tudo que gostaria de falar para a irmã. Pretendia dizer-lhe como amava Tyler, mas percebeu que não estava pronta para verbalizar seus sentimentos. Era tudo tão novo, tão fresco e tão precioso que não queria partilhar com ninguém antes de falar com Tyler. Contaria para Melissa mais tarde. — Bem, liguei para colocá-la a par dos acontecimentos — disse Samantha. — Diga a Bill que estou lhe mandando um abraço e que nos veremos mais tarde. Depois de desligar o telefone, Samantha sentou-se na poltrona em frente à lareira, olhando para as chamas e pensando no belo futuro que tinha pela frente. Passou a mão pela barriga, pensando que poderia estar abrigando uma nova vida; o bebê de Tyler poderia estar crescendo dentro dela. Ele seria um pai maravilhoso e ela tinha certeza de que seria uma boa mãe. Oh, sim... A mansão Dark ia ser alegre novamente, cheia de amor e de risadas como quando sua mãe estava viva. 119


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy O som da porta da frente se abrindo, á despertou, fazendo-a perceber que havia cochilado. — Tyler? — Ela pulou da poltrona e encontrou-o na porta do estúdio. — Eu estava começando a me preocupar com você. — Estava no escritório. Tinha alguns assuntos que precisavam ser resolvidos. Tyler colocou sua maleta na mesa e caminhou até a lareira. Colocou as mãos perto das chamas para se aquecer, pois o dia lá fora estava muito frio. Ele parecia cansado, e Samantha queria abraçá-lo, e desfazer aquela ruga que se formara entre as sobrancelhas dele. — Estava esperando que você chegasse. Há uma coisa que preciso lhe dizer — Samantha disse ansiosa. Tyler se virou e encarou-a. — Também tenho algo para dizer-lhe, e acho que é melhor que eu fale primeiro. — Ele deu um suspiro profundo e Samantha pressentiu que ele ia dizer alguma coisa desagradável. — Estou indo embora, Samantha. Samantha ficou sem ar, como se aquelas palavras fossem um pedaço de concreto que estava sendo colocado sobre seu peito. — Você está indo embora? Eu não entendo... — disse, olhando para ele, confusa. — O que você quer dizer com isso? Tyler passou a mão pelos cabelos, e a ruga entre as sobrancelhas ficou mais profunda. — Estou partindo de Wilford... Saindo do Escritório de Advocacia Jamison. "Ele está me deixando", Samantha pensou sem poder acreditar no que estava ouvindo, no que estava acontecendo. Ela sentou-se na poltrona, com as pernas tremendo incapaz de sustentá-la. — Tyler... Não estou entendendo. Por que você quer partir? Sei que no início ambos não queríamos essa sociedade, mas deu certo, trabalhamos bem juntos. No momento, ela pensava apenas na parte comercial, incapaz de atinar que podia haver mais que negócio. — Você não pode deixar o escritório. Não pode me deixar. Tyler sentou-se na poltrona à frente dela. — Samantha, desde o dia em que chegou aqui e soube que era minha sócia, você tem dito que não ficaria feliz enquanto eu não vendesse minha parte para você. Agora, você pode realizar seu desejo. — Eu não desejo mais isso! — ela gritou exasperada. — Isso foi antes... Foi antes de eu me apaixonar, Tyler. Eu amo você. — As palavras saíram num turbilhão incontrolável, deixando-a sem fôlego e orando pela resposta que estava por vir. — Eu sei — ele disse com suavidade, sem encará-la. — Mas é provável que não seja amor. Você está confusa porque eu fui o primeiro homem com quem fez amor. — Não queira me dizer o que estou sentindo — Samantha respondeu com raiva. — Não desmereça meu sentimento, o que está no meu coração, dizendo coisas desse tipo. — Desculpe-me. Você tem razão. Eu não deveria ter dito isso. 120


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Samantha levantou-se e foi sentar-se no chão, aos pés de Tyler, olhando-o sem raiva, mas confusa. Sabia o que sentia por ele, mas teria se enganado a respeito dos sentimentos dele? Teria confundido atração sexual com amor, da parte dele? Teria se enganado com a expressão que vira em seus olhos tantas vezes, e com o carinho de suas carícias? Não... Não era possível. Mesmo agora, podia perceber amor nos olhos de Tyler. — Sei que você me ama, Tyler. Talvez não me ame como eu o amo. Sei que sou uma pessoa impetuosa e difícil. Sei que às vezes posso ser insuportável. — Respirou profundamente, buscando coragem para continuar. — Sei que não sou o tipo de mulher com que provavelmente você sonhou... — Droga, Samantha, pare com isso. — Tyler se levantou, e caminhou até a porta. Parou, virou-se para ela e continuou: — O problema não é você. Adoro o fato de ser teimosa e impulsiva... Adoro até quando fica insuportável, mas não quero sofrer de novo. — Seu rosto denotava o tormento que o dominava. — Sou um covarde, Samantha... E não sou o homem que merece ser amado por você. — Virou-se e saiu da sala. Samantha ouviu seus passos subindo a escada. O que estava errado com ele? Ela sabia que a amava. Então, por que estava negando a chance de serem felizes? E o que havia de errado com ela? Não podia ficar ali sentada, deixando-o sair da sua vida e se afastar do seu amor. Devia estar lá em cima, brigando com ele, fazendo-o entender que pertenciam um ao outro. Subiu a escada num turbilhão de emoções. Tyler estava no quarto, e uma mala estava aberta sobre a cama. — O que está fazendo? — Ela o observava tirar roupas do armário e colocá-las na mala. — Tenho planos de estar ainda essa noite em St. Louis. Amanhã pela manhã tenho uma reunião com o pessoal da firma de advocacia para a qual pretendo trabalhar. Ele não encarava Samantha. Em vez disso foi ao closet, pegou uma camisa e voltou à cama, dobrou a peça de roupa com cuidado e colocou-a na mala. — Então, você vai jogar tudo para o alto? — Não há nada para jogar. — Há. Há nossas vidas — Samantha disse com paixão. Ele meneou a cabeça com desânimo. — Não existem "nossas vidas". — É alguma coisa relacionada com sua mãe? Tyler gelou, e olhou para Samantha. — É relacionado a tudo. É relacionado com minha mãe, com Abigail e com seu pai. É relacionado a amor e perda. Samantha se aproximou dele. Queria tocá-lo, queria fazê-lo mudar de idéia. Os olhos dele estavam muito tristes e Samantha foi chegando mais perto, cada vez mais perto. — Oh, Tyler, amar não é perder. Tyler se afastou dela, os olhos não mostravam mais dor e confusão, e sim rancor. — Confie em mim, Samantha. Não pode me amar. Eu não a mereço. — Sua 121


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy fisionomia agora era de um homem em agonia. — Você não entende? Se não fosse por mim, minha mãe ainda estaria viva. — As palavras saíram numa explosão, como se estivessem presas havia muito tempo. Samantha olhou para ele surpresa. — Do que está falando? Você não matou sua mãe. — É como se a tivesse matado... Eu cheguei, em casa mais tarde que de costume. — Seus punhos estavam cerrados. — Se tivesse voltado para casa na hora de sempre, eu teria impedido que ele... Eu poderia ter mudado o curso dos acontecimentos. — Deus do céu, Tyler! Você era apenas um garoto. Se tivesse chegado, em casa mais cedo, talvez tivesse sido morto também. Ele piscou como se nunca tivesse considerado tal hipótese. Em seguida se acalmou, descerrou os punhos e replicou: — Isso não importa, agora. É passado e eu não quero sofrer esse tipo de perda de novo. Tyler se virou para voltar ao closet, mas Samantha agarrou-o pelo braço. — Escute-me, Tyler. Sei muito bem o que é sentir-se mau, sentir-se culpado e achar que nunca seria amado por ninguém. Mas você está errado. — Ela fez-lhe um carinho no rosto. — Eu não me apaixonaria por um homem que não merecesse. Não sou uma mulher fácil de agradar. Tyler se afastou, não agüentaria ser tocado por ela. — E eu não me apaixono com facilidade. Samantha o viu pegar outra camisa do closet. Seu coração estava disparado e sem ritmo. Procurava desesperadamente achar argumentos que o convencessem, procurava um modo de fazê-lo entender que haviam nascido um para o outro. — Finalmente entendi a lição que devia com tudo o que aconteceu — a voz de Samantha tremia de emoção. — Sobre esquecer. Tyler parou de dobrar uma camisa e olhou para ela, os olhos azuis com uma expressão impossível de ler. Samantha sentou-se na beirada da cama, sabendo que era a última chance de convencê-lo, de livrá-lo do sentimento de culpa e do medo que o dominava. — Se meu pai tivesse sido capaz de esquecer minha mãe, seu coração teria se aberto para um novo amor e ele não estaria morto. Se Geórgia tivesse sido capaz de esquecer Morgan, talvez Abigail ainda estivesse viva. Samantha olhava para ele, tentando adivinhar se suas palavras o estavam atingindo. — E foi só depois de eu ter esquecido o meu passado com meu pai que meu coração se abriu à possibilidade de encontrar o amor com você. Esquecer as mágoas passadas e amores perdidos para poder amar novamente. Esqueça Tyler... Ele ficou quieto por um tempo que pareceu uma eternidade. — É exatamente o que vou fazer — ele disse finalmente. — Vou esquecer você. Samantha sentiu como se tivesse sido esbofeteada. Não havia mais esperança. Ela 122


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy podia perceber pelo tom de voz de Tyler, e pelo seu olhar, que ela o havia perdido, antes mesmo de tê-lo. Tyler continuou a arrumar sua mala e ela tentava conseguir forças para sair do quarto. Samantha tinha tido medo de que, se perdesse o caso Marcola, poderia de algum modo perder sua alma. Agora percebia que isso não podia ter acontecido. Tyler possuía sua alma e seu coração e agora os estava destruindo. Mas ela ainda o amava, o suficiente para fazer uma última coisa, para oferecer a ele um último presente de amor. — Você não precisa ir embora — Ela levantou-se e caminhou em direção à porta. — Eu venderei para você a minha parte da firma. — O quê?! — Tyler estava chocado. — Você me ouviu. — Ela forçou uma risada. — Você me conhece, Tyler. Não levaria muito tempo para que eu ficasse entediada aqui em Wilford. E o Escritório de Advocacia Jamison, jamais me pertenceu. Sempre foi seu. Você trabalha ali há anos. Você o merece. — Samantha, eu não vou deixar que faça isso — ele protestou. — Não se trata de deixar ou não. Vai comprar a minha parte como se eu fosse uma pessoa qualquer. De um jeito ou de outro vou vender a minha parte. — Samantha tentou parecer impessoal. — Quando você estava fora, essa manhã, uma firma de Chicago me telefonou. Eles me ofereceram um emprego e eu aceitei. Serei muito mais feliz numa firma maior e numa cidade grande. Prepararei os papéis para a venda. — Sem esperar pela resposta de Tyler, ela saiu do quarto. Samantha foi para seu quarto e trancou a porta. Agora que se decidira, não queria mais falar a respeito e não queria que ele tentasse dissuadi-la. Tyler havia dedicado sua vida à firma, dando continuidade ao trabalho que seu pai havia começado tantos anos atrás. Não era justo que ele partisse deixando tudo para trás. O certo era ela ir embora. Anos antes, ela partira com o coração ferido por ressentimentos, raiva e revolta. Agora partia com o coração cicatrizado e despojado, mas ainda sob o peso da angústia e da decepção. Entendia agora a dor de Edie. A dor dos sonhos desfeitos e do amor impossível. Algum dia Edie conseguiria deixar de sentir dor, de sofrer? E ela, conseguiria? Não conseguia imaginar o tempo passando, sem amar Tyler. O amor que sentia por ele era como o sangue que corria em suas veias. Precisava dele para respirar... Para viver. Andou até a janela, lutando para não chorar, mas com os olhos e a garganta queimando. Precisava fazer planos, pensar para onde iria e o que faria. "Mais tarde", ela pensou. Mais tarde pensaria em tudo isso. No momento, estava sofrendo muito. Naquele momento, queria chorar... Por Tyler, por ela mesma e por todas as coisas maravilhosas que eles nunca partilhariam. Tyler encostou a cabeça no encosto do assento do avião. Estava exausto. Mas não era apenas cansaço físico. Era seu coração que estava despedaçado. Não conseguira dormir a noite toda. Quando amanheceu, desceu à cozinha e encontrou um papel sobre a mesa. Era um documento de Samantha lhe vendendo sua parte na firma. "Ela também não deve ter 123


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy dormido", pensou ele. Fechou os olhos e a visão de Samantha ocupou todos os seus pensamentos. Era a imagem dela, sentada na cama e olhando para ele com os olhos cheios de lágrimas e uma expressão de dor profunda. Sabia de antemão que o confronto final com ela seria doloroso e difícil, mas não imaginara que seria tanto assim. Mas fizera a coisa certa. Ela viveria melhor sem ele. Samantha o surpreendera com a oferta de vender sua parte para ele. Sua primeira reação fora ignorar a oferta e continuar com seus planos de mudar para St. Louis. Mas ela deixara claro que não pretendia permanecer em Wilford e que queria trabalhar na firma de Chicago. Então, decidira ir até St. Louis para dizer pessoalmente à firma Bruno, Sandorf e Kearnes que estava declinando da oferta. Ia ficar em Wilford, em seu próprio escritório. Embora Samantha fosse partir Tyler não queria continuar na casa. Precisava mudarse. Não poderia sentar-se perto da lareira sem ver a imagem de Samantha, naquele sexy robe azul de seda, sentada na Berger com as pernas encolhidas, olhando para ele. Não poderia sentar-se à mesa da cozinha e não vê-la com os olhos brilhando a debater com ele sobre os acontecimentos do dia. Mais do que tudo, não poderia dormir na sua cama e não lembrar-se dos cabelos loiros e sedosos de Samantha esparramados sobre os lençóis azuis, e o esplendor de fazer amor com ela. Acharia um pequeno apartamento, um lugar sem a presença e as lembranças de Samantha. E, se ele conseguisse tirar tais memórias da cabeça, ficaria bem. Quando os motores do avião foram ligados e começaram as manobras de decolagem, ele disse a si mesmo mais uma vez, que fizera o que deveria ter feito. Samantha viveria bem em Chicago. Não carregava mais as cicatrizes da sua infância e seu coração se abririam para um novo amor. Sim, fizera a coisa certa. Então, por que estava sofrendo tanto?

CAPÍTULO XVI

— É o meu locador. Ele continua entrando no meu apartamento quando não estou. — Gina Morris, uma atraente moça de dezoito anos, sentou-se na frente da escrivaninha de Samantha, com o rosto corado e um tanto embaraçado. — O que você quer exatamente que eu faça? — Samantha perguntou à jovem. — Gostaria que você escrevesse uma carta, dizendo-lhe para parar de invadir minha privacidade. Ele não pode fazer isso, pode? Entrar no meu apartamento toda vez que tem vontade? 124


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Não, ele não pode — Samantha lhe assegurou, sorrindo. — Escreverei a ele ainda essa tarde. — Samantha se levantou e acompanhou a moça até a porta. — Pode avisar o Sr. Sinclair, se houver necessidade de fazer mais alguma coisa. — Oh, obrigada... Eu realmente lhe sou agradecida. Samantha deu um suspiro de alívio quando fechou a porta atrás de Gina. Faltavam alguns minutos para o meio-dia e ela já havia visto quatro presumíveis clientes. Logo que a liberdade de Dominic havia se tomado pública, Samantha passou a ser conhecida como a próxima Clarence Darrow. Cada pessoa com quem ela conversava, dizia que não ficaria na cidade por muito tempo, anotava os casos e os passava para Tyler. Era o que ia fazer mais uma vez. Tyler. Bastava seu nome para lhe causar uma dor profunda. Tinha ouvido quando ele saíra de casa aquela manhã e tinha achado um bilhete quando finalmente se levantara e descera. O bilhete dizia que ele aceitava os termos da venda e que ele tinha ido para St. Louis, a fim de falar pessoalmente com os proprietários do escritório de advocacia, declinando da oferta que lhe haviam feito. Terminara o bilhete, acrescentando que estaria de volta em poucos dias, tempo que ele aproveitaria para manter distância dela tanto física como emocionalmente. Samantha decidira ir ao escritório porque não conseguiria ficar andando pela casa lembrando-se de Tyler e no que havia acontecido entre os dois. E ficou surpresa quando viu Edie na mesa da recepção, ao chegar ao escritório. — Eu... Eu não sabia se deveria vir trabalhar ou não — Edie falou quase chorando. — Claro que deveria. — Samantha abraçou Edie. — Samantha... Eu nunca quis... — Shh, não vamos mais falar nesse assunto. Samantha olhou para o relógio. Ia encontrar Melissa no clube para o almoço em poucos minutos e depois tinha que decidir onde iria morar. Talvez pudesse contatar a firma de St. Louis. Já que Tyler não ia aceitar o emprego, ela poderia tentar. Mas não era uma alternativa que lhe agradava. Dissera a Tyler que ia para Chicago, e era para lá que iria. Ela nunca estivera em Chicago, que tinha fama de ser uma cidade onde ventava muito e talvez fosse um bom lugar para ela esquecer Tyler e começar uma nova vida. Foi até a janela e ficou olhando para fora sem nada ver. Pelo menos em Chicago não haveria nada que lhe lembrasse de Tyler. Franziu as sobrancelhas, pensando a quem estava querendo enganar. Sempre haveria alguma coisa para evocar lembranças dele. O azul do céu a lembraria dos olhos de Tyler. As noites escuras á fariam recordar de seus cabelos, o pôr-do-sol a lembraria dos dois fazendo amor na frente da lareira, e o amanhecer que passaria mais um dia sem ele. Deus... Como conseguiria viver sem ele? Estava livre do ódio que sentira pelo pai durante toda sua vida, sentia-se otimista em relação à sua profissão, estava iniciando um relacionamento íntimo com Melissa, ia ser tia, mas perdera o homem que amava e que também a amava. — Que vida... — disse com um suspiro. 125


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Por que Tyler tinha que ser um homem tão difícil? Por que não enxergava que estava errado e que não poderia existir vida sem amar, sem se arriscar e sem lutar? Antes que começasse a chorar, antes que seu coração começasse a pesar de tanta dor, ela saiu do escritório. — Vou almoçar — avisou a Edie. — Tentarei estar de volta lá pelas duas horas. Se você precisar de mim antes disso, pode me telefonar no clube. Minutos depois, quando dirigia para o clube, pensou na desagradável tarefa que teria que desempenhar com Melissa: dizer-lhe que iria deixar a cidade novamente. Só que dessa vez seria diferente. Ela não ia se, impor um auto-exílio e nem pretendia ficar sem conversar e ver a irmã. Dessa vez haveria telefonemas, cartas e visitas. Chicago não era muito longe e Samantha poderia visitar Melissa e o marido de vez em quando. Esperava que Melissa entendesse que não poderia ficar em Wilford e ver Tyler todos os dias. A recepcionista conduziu Samantha à mesma mesa em que tinham almoçado um dia depois que Samantha voltara à Wilford. Samantha sentou-se e olhou pela janela, lembrando-se de que num certo ponto da conversa que as duas haviam tido naquele dia, Melissa a advertira para não ferir Tyler. Que ironia! Fora Tyler quem decidira o destino dos dois. Nada do que falara surtira efeito, nenhum argumento que usara o tinha convencido. O dia estava cinza, nublado e refletia perfeitamente o estado de espírito de Samantha. No curto espaço de tempo que ficara em Wilford, ela encontrara a paz que estava procurando havia tanto tempo. O lugar de onde fugira uma vez pensando que nunca mais voltaria. Mas ficar era uma hipótese absolutamente impossível de considerar. Não havia possibilidade de permanecer em Wilford, e morrer mais um pouco a cada vez que visse Tyler ou ouvisse falar dele. — Ei, você chegou cedo! — A voz de Melissa interrompeu os pensamentos de Samantha. Samantha sorriu para a irmã, que se sentou na cadeira à sua frente. — Como está minha sobrinha? — Ou sobrinho. — Melissa sorriu acariciando a própria barriga. — Não, decidi que você precisa ter uma menina. Garotas, eu entendo, mas meninos... É impossível. Melissa olhava atentamente para a irmã. — O que aconteceu, Samantha? — Você parece tão... Perdida. Samantha estava orgulhosa dela mesma. Durante toda a manhã, conversara com as pessoas, controlara situações e nenhuma só vez havia perdido o controle. Mas as palavras de Melissa fizeram com que alguma coisa rompesse dentro dela e as lágrimas afloraram em seus olhos. Samantha tentou se controlar. — Entrei numa situação equivocada e fiz algo estúpido. Melissa sorriu carinhosamente. — Isso não me surpreende nem um pouco. O que você fez dessa vez? 126


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Consegui me apaixonar desesperadamente por Tyler e esse é um amor sem chance alguma — Samantha confessou. Melissa juntou as mãos como se fosse aplaudir. — Mas isso é maravilhoso! — O sorriso de Melissa desapareceu quando viu que Samantha não ria. — Não é maravilhoso? Samantha meneou a cabeça desanimada. — É impossível. — Samantha suspirou e começou a contar para a irmã a respeito do seu amor por Tyler e da rejeição dele. — Então, decidi vender a ele minha parte do escritório, e me mudar para Chicago. De propósito, não mencionou que a oferta de emprego em Chicago era uma invenção, pois isso só deixaria Melissa preocupada. — Chicago... Parece tão longe. — Melissa segurou a mão da irmã por sobre a mesa. — Pensei que tivéssemos nos reencontrado, mas estou vendo que vou perdê-la de novo. Samantha agarrou a mão de Melissa. — De jeito nenhum. Você não vai me perder. Visitarei você e sua família pelo menos uma vez por mês e... Falaremos pelo telefone todos os dias. Não vai ser como da última vez. Eu juro que será diferente. — Sim, dessa vez eu acredito em você — Melissa concordou. A conversa foi interrompida pelo garçom que anotou os pedidos e se afastou. Melissa tomou um gole do seu chá gelado, encostou-se à cadeira e suspirou. — Tem certeza de que não pode ficar na cidade? Samantha hesitou e então meneou a cabeça negando. — Um de nós tem que ir, e não é justo que seja Tyler. Ele é mais dessa cidade do que eu. Aqui ele tem seu lar... Seu trabalho... Não posso tirar isso dele. — Samantha, eu não quero que vá, mas estou muito orgulhosa da sua decisão. Você realmente amadureceu e também deu prova de muito desprendimento e amor. Tyler é o verdadeiro perdedor em tudo isso. Você seria boa para ele. — Tenho certeza de que seria uma excelente esposa como ele nunca imaginou que pudesse ter — Samantha disse com convicção e rompeu em prantos. Samantha não chorou por muito tempo, logo se controlou e conseguiram almoçar em paz. Depois de se despedir da irmã, Samantha pegou o carro e dirigiu-se a uma banca de revistas onde vendiam jornais de outras cidades. Comprou vários jornais de Chicago e voltou para o escritório. — Não passe os telefonemas para mim, Edie. Anote os recados que eu ligo mais tarde. Nas próximas duas horas não quero ser incomodada. — Samantha entrou na sua sala e fechou a porta. Samantha não queria perder tempo conversando com clientes cujos casos ela não poderia acompanhar, uma vez que estava para se mudar. E não queria adiar nem por mais um minuto a procura de um lugar para morar e de um emprego. Queria partir logo... Antes de Tyler regressar da sua viagem. 127


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Não poderia mais suportar ter que morar na mesma casa com ele, vê-lo no escritório, amá-lo a cada momento e não ter esse amor correspondido. Era dolorido demais... Seria muito sofrimento. Tinha que partir... Logo. Tyler dirigia um carro alugado pelas ruas das vizinhanças, e as lembranças do passado afloravam em sua mente. Seu amigo Paul não morava naquela esquina? Quando a casa tinha se transformado em uma loja? Os gêmeos Gerdes moraram ali, onde agora era uma estação do Corpo de Bombeiros? Estaria sua memória falhando, ou a cidade crescera tanto que estava irreconhecível? Certamente que não era sua memória. Nada ficava igual. A vida e o tempo tudo mudavam. Menos ele. Quando saíra dali, era um homem revoltado e irado e agora retornava com os mesmos sentimentos em ebulição dentro dele. Samantha estaria certa? Teria que esquecer o passado, para encontrar a paz e recomeçar uma nova vida? Ele dirigia devagar procurando lugares que lhe fossem familiares. Quando chegou ao local onde devia estar o prédio de apartamentos onde vivera, encontrou um terreno vazio, apenas com balanços e gangorras e algumas crianças brincando. Em algum momento do passado o velho prédio de oito andares tinha sido demolido e substituído por um parque para a vizinhança. Tyler parou o carro ao lado da calçada e abaixou a janela. Duas garotinhas estavam brincando na gangorra, vestidas com pesadas roupas de inverno, e rindo muito animadas enquanto ao lado um grupo de crianças estava no balanço gritando e rindo enquanto davam impulso com as pernas para que o brinquedo ficasse cada vez mais alto e mais rápido. Pareceu a Tyler que as risadas e gritos das crianças eram um prenúncio de esperança e de recomeço. De algum modo que ele não saberia explicar, o lugar que antes significava a morte, era agora um parque onde crianças brincavam e sonhavam com o futuro, daquela maneira pura e singela que só as crianças podem pensar. Tyler olhou para o relógio. Ia pegar o vôo das duas horas de volta a Wilford. Ainda havia tempo, e ele tinha que ir a outro lugar antes de dizer adeus a St. Louis para sempre. Ele levou alguns minutos para ir até o cemitério de Chapelwoods. Nunca mais havia ido lá, desde o enterro da mãe e naquela época estava irado demais e com grande sentimento de culpa para despedir-se dela como devia. Como dissera a Samantha que ela devia ficar em paz com seu pai, Tyler sabia que agora era a sua vez de ficar em paz com sua mãe. Diferente do túmulo de Jamison, que era grande e ornamentado, o túmulo de sua mãe era pequeno, um simples pedaço de concreto com o nome dela e as datas de nascimento e morte gravados na lápide. Não havia dinheiro para nada mais sofisticado. Tyler se abaixou e começou a arrancar o mato e algumas folhas secas. Olhou para as datas. Ela tinha trinta e dois anos quando foi morta. Tão jovem, mas ele tinha a impressão de que vivera mais do que muitas pessoas que morrem velhas. Como Samantha, Kelly Sinclair vivia cada momento de sua vida como se fosse o último. Era uma característica para se invejar e não para se temer. 128


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Endireitou o corpo e percebeu que a raiva e a revolta, que sempre sentira pela morte da mãe, haviam desaparecido. Também não se sentia mais culpado. O único sentimento que abrigava no coração era seu amor por Samantha. Era tarde demais para se proteger do sofrimento e da dor. Ele amava Samantha como ela o amava e não adiantaria ela ir para Chicago ou para a lua, ele sempre se sentiria vazio e perdido sem ela. Tyler temia que Samantha o deixasse do modo com sua mãe o deixara, mas percebia agora que preferia um só momento nos braços de Samantha do que uma vida inteira sem ela. Ele tinha que voltar para Wilford. Tinha que impedi-la de aceitar a oferta do escritório de Chicago. Enquanto voltava para o carro, sua mente fervilhava com pensamentos que haviam passado despercebida. Era estranho que a oferta de emprego viera um dia depois de eles terem sido atacados por Osso. Samantha disse que tinham ficado sabendo do caso Marcola e tinham-na procurado para lhe fazer a oferta. Mas era impossível. O caso ainda não havia sido publicado no jornal, não havia como o escritório de Chicago estar ciente dos acontecimentos. Tyler entrou no carro e olhou para o painel. "Ela mentiu", concluiu. Ela mentira e ele acreditara. Por quê? Por que ela inventaria uma coisa daquele tipo? Porque ela o ama, uma voz sussurrou dentro dele. Ela o ama a ponto de lhe deixar o Escritório de Advocacia Jamison. Ela o ama o suficiente para abrir mão do legado do pai para que você tenha o que sempre quis. Como pudera dar as costas a um amor assim? Tyler sentiu um aperto na garganta ao perceber a profundidade do amor de Samantha. E ele estava a ponto de jogar tudo isso para o alto. Deu partida no carro orando para que quando ele chegasse a Wilford, Samantha ainda estivesse lá e ainda quisesse o seu amor. — Gary Watters insiste em falar com você — Edie falou da porta da sala de Samantha. — Por apenas alguns minutos, Samantha. — disse Gary, enquanto passava por Edie e sentava-se na cadeira em frente à mesa de Samantha. Ela olhou para o relógio. Eram mais de quatro horas. Precisava ir para casa arrumar suas malas, e tinha centenas de coisas a fazer antes de partir. Edie tinha driblado os repórteres durante toda a tarde e Samantha decidiu que ela mesma daria conta, desse. Além do mais, gostara da manchete que Gary tinha escrito sobre ela no jornal. A sexy advogada Samantha Dark consegue desvendar o caso Marcola. — Dez minutos — Samantha concordou. O repórter pegou um bloco e um lápis. — Obrigado, Samantha. Todos os jornais deram as notícias oficiais sobre os acontecimentos da noite passada, mas ninguém conseguiu entrevistá-la. Isso vai ser um tremendo furo. Samantha riu da euforia de Gary. — Se você tem os dados oficiais, então provavelmente tem tudo que precisa. 129


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — De jeito nenhum — Gary protestou. — Quero saber dos fatos contados por você... Como descobriu que Geórgia Morgan estava envolvida? Como se sentiu quando Osso a atacou? E quero também saber o que a fez defender Dominic Marcola quando todos na cidade tinham certeza de que ele era culpado. Antes que Samantha pudesse começar a responder, a porta do escritório se abriu e Tyler entrou. — Saia, Watters. Preciso falar com minha sócia — Tyler ordenou. — Fique, Gary. O Sr. Sinclair não tem nada para me dizer que eu queira ouvir. "Droga", ela pensou, por que ele estava de volta tão cedo? Por que estava tão bonito? Por que não ficara em St. Louis até que ela partisse de Wilford? Por que tinha de vêlo mais uma vez? Gary olhava de um para o outro sem se levantar da cadeira. — Você mentiu para mim, Samantha — Tyler a acusou. — Você mentiu sobre a oferta de emprego em Chicago. Samantha sentiu-se corar. — Tyler, esse não é o momento apropriado para discutirmos isso. Gary está no meio da entrevista. — Você vai me dizer o que é apropriado ou não? — Tyler afastou a cabeça e riu. — Pode até ser, mas no momento, não estou dando a mínima importância sobre o que é certo ou não. — Aproximou-se da escrivaninha de Samantha. Samantha levantou-se de um salto, preocupada com a expressão que via no olhar de Tyler. Por que ele estaria tão nervoso e tão fora de si? Samantha foi se afastando dele até que se encostou à parede. — Diga-me por que mentiu Samantha. — Ele segurou-a pelos dois braços impedindo-a de ir a qualquer lugar. — Por que mentiu? — Repetiu a pergunta, agora com um tom de voz mais suave e mais baixo. — Tyler... — ela disse entre os dentes fazendo um sinal para que ele compreendesse que Gary estava presente e tomava nota de tudo na maior rapidez, e com um sorriso estampado no rosto. — Você ficou louco? — Ela tentou escapar, mas não conseguiu, pois ele a segurava com força. — Diga-me, Samantha — ele insistia. Samantha olhou de novo para Gary, que parecia estar adorando a cena, e então olhou para Tyler desanimada. — O que você quer Tyler? Quer que eu diga tudo de novo? Quer me ouvir dizer que eu o amo mais do que qualquer coisa e qualquer pessoa que já amei na vida? Por isso menti sobre o emprego de Chicago. Apesar de não me amar, eu o amo o suficiente para não tirar o Escritório de Advocacia Jamison de você. — Horrorizada, Samantha percebeu que estava chorando. — Amo-o tanto a ponto de ir embora e deixá-lo viver sua vida em paz. Samantha enxugou as lágrimas, furiosa por ter perdido o controle e se humilhado. — Por favor, Gary, poderia sair? — ela pediu. 130


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy — Não se levante daí! — Tyler ordenou ao repórter. — Seria previsível demais de a minha parte pedir para você sair. E apenas para provar que não sou assim tão previsível, quero que fique e ouça a proposta que vou fazer. — Proposta? — Samantha olhou para Tyler surpresa. — Essa vai ser quente! — Gary exclamou. — Propor o quê? — Samantha tornou a perguntar com os olhos arregalados. Ela não se atrevia a pensar que seu sonho pudesse vir a se tornar realidade. — Casamento, o que mais poderia ser? — Tyler abraçou Samantha que ficou sem respiração ao ver a paixão com que ele a olhava. — Case-se comigo Samantha. Seja minha sócia... Seja minha mulher. A essas palavras, o coração de Samantha disparou, mas ela se conteve. Escondeu sua alegria, pois tinha medo de estar se iludindo. Precisava ter certeza absoluta. — Ontem, você me disse que não podíamos nem ser sócios no escritório. Agora está me pedindo para ser sócia da sua vida? O que mudou de ontem para hoje? Tyler segurou o rosto de Samantha entre suas mãos e a fitou com tanto amor que ela se sentiu invadir por uma onda de calor e de felicidade. — Nada mudou... E tudo mudou. Fui ao túmulo de minha mãe e percebi que o medo que tinha de admitir que a amasse devia-se ao fato de eu achar que você pudesse vir a partir, como ela. Samantha meneou a cabeça, mal podendo acreditar em tudo que estava ouvindo. — Não pretendo ir a lugar algum. — De qualquer modo, não importa mais. — Ele acariciou o rosto de Samantha com os polegares, sem soltar-lhe o rosto. — O tempo que houver, quero passar ao seu lado, se for um momento, uma hora... Ou anos. Oh, Samantha, fui um tolo quando pensei que poderia dar as costas para o amor. Diga-me que não é tarde demais. Diga que se casará comigo. — Sim... Sim, eu me casarei com você. Ela mal acabara de pronunciar tais palavras e Tyler beijou-lhe os lábios num beijo que exprimia tudo que ela queria ouvir, numa promessa que iria durar toda a vida. Tyler se afastou e olhou para Samantha, emocionado. — Vamos povoar aquela casa de crianças e de amor. Você vai ser uma mãe maravilhosa. — Serei também uma esposa maravilhosa — Samantha prometeu com um sorriso trêmulo. — Essa vai ser uma história maravilhosa! — Gary exclamou atrás deles. Samantha se assustou. Havia se esquecido completamente da presença do repórter. — Saia daqui, Gary — Tyler disse sem tirar os olhos de Samantha. — Sim, Gary... Saia. — Samantha repetiu. — Sim, mas a história... — Fora! — Tyler e Samantha gritaram ao mesmo tempo. Gary levantou-se e, sorrindo, dirigiu-se para a porta. 131


Momentos Íntimos nº36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Quando ele saiu, Tyler estreitou Samantha em seus braços apertando-a com paixão. — Onde estávamos mesmo? — Fitou-a com os olhos brilhantes e incendiados de desejo. — Estava dizendo como me ama e que não pode viver sem mim — Samantha respondeu. — Até poderia viver sem você, Samantha, se eu fosse obrigado, mas não seria viver, seria sobreviver. E já vivi assim por muito tempo na minha vida. Fechei-me emocionalmente, mergulhando na dor do passado por tempo demais. Samantha passou o dedo indicador na ruga que se formara entre as sobrancelhas de Tyler. Ela sabia o que era dor emocional, e de algum modo acreditava que o destino os unira para que eles superassem juntos e esquecessem toda a dor do passado. — Acho que fomos destinados a ficar juntos desde o momento em que meu pai trouxe você para casa na primeira vez. Tyler sorriu sem sombras no olhar, apenas amor. — E eu acho que me apaixonei por você naquela noite em que fui buscá-la no bar e você tentou me seduzir no carro. — Deveria ter deixado que eu o seduzisse naquela noite. Pense no tempo que perdemos. Tyler riu. — Não quero mais perder um minuto sequer. Diga-me, se eu fizer amor com minha noiva aqui mesmo no escritório... Seria imprevisível? Samantha confirmou com a cabeça. — Seria muito escandaloso. — Oh, meu amor, quem melhor do que você para protagonizar um escândalo... Comigo? — Parece que está aprendendo rápido, Dr. Sinclair — Samantha falou com suavidade. Tyler riu e começou a beijá-la novamente. — Estou apenas começando, meu amor. Seus lábios se uniram num longo beijo que selava promessas de um futuro alegre e desafiador, mas, mais do que tudo, um futuro de amor... Para todo o sempre.

Fim

CARLA CASSIDY teve seu primeiro romance, Retalhos de Família, publicado em setembro de 1991, e desde então escreveu mais de vinte e cinco livros para a coleção 132


Momentos Ă?ntimos nÂş36 Perigosamente Sedutora Carla Cassidy Silhouette. Ela espera escrever muitos livros mais e trazer horas de prazer para os seus leitores.

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