Revista Continente Nº 76

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nasce uma

ESTRELA A ATRIZ HERMILA GUEDES GANHA ESPAÇO NACIONALMENTE, COM TRABALHOS QUE VALORIZAM O ATOR E EVITAM PIROTECNIAS

Alexandre Figueirôa

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o assistir O Céu de Suely, de Karim Aïnouz, Ainouz, muita gente pelo Brasil afora ficou surpresa com aquela moça alvinha, de olhar decidido e, ao mesmo tempo, melancólico, que durante a hora e meia do filme nos oferece de forma imperativa um retrato comovente de uma jovem do interior do Ceará que, para alcançar os seus objetivos, não hesita em rifar o próprio corpo. Para os pernambucanos a surpresa não foi tão grande, sobretudo, para quem acompanha a cena teatral recifense, assiste aos curtas-metragens locais ou simplesmente a encontra alegre e sorridente por bares badalados como o Central ou Garagem. Hermila Guedes é uma daquelas figuras capazes de deixar sua marca por onde passa e que, por trás da aparência frágil e delicada, esconde um vulcão de de emoções emoções e,e, oo me-lhor, melhor, de talento em plena fase de amadurecimento. Em 1998, Hermila estreou nas telas em O Pedido. Fez o teste para entrar no elenco do curta-metragem de Adelina Pontual, levada pelo diretor teatral e amigo João Ferreira, com quem trabalhava num espetáculo infantil. Tinha apenas 16 anos e, como ela mesmo afirma, era um período no qual ainda não tinha noção do que estava acontecendo. “Eu gostava de cinema, mas nunca tinha visto um curta. Não passava de uma atriz de brincadeira, ensaiando no quintal de uma casa do Janga e me apresentando em palcos do subúrbio”. Mesmo assim encarou ficar frente a frente com veteranos da arte de representar como Geninha da Rosa Borges e Jones Melo, e, para seu espanto, deu certo. O filme ganhou prêmios no Festival de Cinema do Recife e do Ceará e ela percebeu que talvez ser atriz profissional fosse um caminho a seguir.

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CAPA Divulgação

Em sentido horário, Hermila Guedes em O Céu de Suely, no palco em Angu de Sangue e interpretando uma prostituta no longa Deserto Feliz

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Tuca Siqueira/Divulgação

Desde então, Hermila não parou. Voltou a trabalhar com Adelina Pontual em um dos episódios de Assombrações do Recife Antigo; foi fazer teatro outra vez, agora com Antonio Cadengue em Meia Sola e logo recebeu convite de André Brasileiro para integrar o elenco de Angu de Sangue. Conheceu Marcelo Gomes e atuou em Cinema, Aspirinas e Urubus, dirigido por ele, e foi Fred Jordão/Imago/Divulgação Marcelo quem a levou para o teste de O Céu de Suely. Neste meio tempo trabalhou com Cláudio Assis, em Baixio das Bestas, onde tem um pequeno papel de prostituta; com Paulo Caldas em Deserto Feliz – aqui também na pele de uma mulher de vida fácil –, porém, com mais destaque; protagonizou o premiado curta-metragem Entre Paredes, de Eric Laurence; e já colocou o pé na Hollywood brasileira, ao interpretar nada menos que Elis Regina no especial Por Toda Minha Vida, realizado pela TV Globo no final de 2006. Tanta coisa acontecendo quase simultaneamente, no entanto, não parece perturbar a garota de belos olhos claros e rosto expressivo que, aos 11 anos, veio de Cabrobó para o Recife com a mãe e a irmã mais nova após o assassinato do pai, e, quando cresceu um pouco mais, passou a freqüentar as sessões do Cinema do Parque e foi fazer Turismo no Cefet. “Tenho medo da velocidade dos fatos, por isso sempre busco chão, pois você começa a ficar deslumbrada em ser reconhecida, com os pedidos de autógrafos. Quero experimentar de tudo, cinema, televisão, teatro, mas não quero ser uma pessoa de plástico”, afirma convicta, embora confesse que, até bem pouco tempo, não imaginava a grande repercussão obtida hoje pelos seus trabalhos. “Foi o João Jr. (produtor dos filmes de Adelina Pontual, Marcelo Gomes e Karim Ainouz) o primeiro a vislumbrar o que ia acontecer comigo”. Vendo Hermila na tela, ninguém duvida do senso apurado de João. Ela é uma intérprete nata e confessa sentir-se mais à vontade diante de uma câmera, embora se declare apaixonada pelo teatro, expressão para a qual pretende dedicar toda a atenção possível. Prova inconteste de considerar-se ainda uma atriz em formação, foi voltar recentemente ao palco para refazer Angu de Sangue e superar as possíveis dificuldades nas encenações ao vivo. “Meu problema é o público, saber que todos os olhares estão ali presentes voltados para mim, mexe comigo”. Hermila diz gostar do naturalismo da atuação permitido pelo cinema. Sua interpretação está afinada com o tipo de filme que prefere, isto é, obras que valorizam o ator e evitam pirotecnias. “As mulheres dos filmes em que trabalhei até o momento se parecem comigo e em O Céu de Suely minha infância veio à tona”, revela, admitindo ter descoberto técnica naquilo que achava ser mera intuição, sobretudo depois de ser preparada por Fátima Toledo, responsável pela direção do elenco no filme de Karim Ainouz. Neste ponto a escolha para ser a protagonista foi um marco divisor


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A atriz, no Teatro de Santa Isabel, diz achar "bacana" fazer trabalhos em várias linguagens Hans Manteuffel

da vida da atriz. Quem ia fazer o papel da Hermila era Georgina Castro, mas 15 dias antes do início das filmagens Karim Ainouz mudou tudo e inverteu os papéis das duas. “Ensaiávamos duramente em Iguatu, cidade onde o filme foi rodado. Morávamos na casa em que acontece boa parte das cenas e Karim confiscou nossas roupas, obrigando-nos a vestir o figurino que seria usado no filme. Ele, no entanto, ficou me observando e depois de algumas atitudes minhas e coisas que falei, ele decidiu me escolher”. A inversão dos papéis deixou Georgina Castro mal. “Ela ficou chateada”, conta Hermila. “Tudo que estou vivendo seria ela quem estaria passando, mas ela é uma atriz linda e já superamos isto, eu descobri o meu potencial e agora me sinto mais segura.” A personalidade de Hermila parece ser um fator essencial para este crescimento. “Sou uma pessoa muito livre, a profissão de atriz exige desapego de vaidades, de pudores e procuro nos trabalhos que realizo estar perto dos amigos.” Hoje, ela conta com o apoio deles e da mãe que vê os filmes da filha, mas não faz nenhuma restrição aos papéis por ela protagonizados. Agora, Hermila já se considera uma pessoa do mundo, foi a Cuba, Veneza, mas diz adorar as raízes e prefere, pelo menos por enquanto, permanecer morando no Recife. “Continuo uma matuta desconfiada”, diz. E o futuro? Para a maior estrela do cinema em Pernambuco da atualidade, os próximos passos ainda estão se delineando. “Minha carreira está tomando um rumo muito inesperado”, diz Hermila. Aos 26 anos, com um curso de Letras na Universidade Federal de Pernambuco em banho-maria, ela pretende voltar a fazer televisão, pois acha “bacana” brincar com as diversas linguagens. “Encarnar a Elis foi uma experiência interessante, mas reconheço que não gostei do resultado, não tive muito tempo de me preparar, em uma semana tive que perder o sotaque e o ritmo das gravações era muito intenso”. Ela, porém, quer voltar para a telinha. “Sou insistente, tenho que fazer mais para saber se é bom.” Depois do especial para a Globo ela fez clipe para a Mundo Livre, para a Tanga de Sereia, banda de brega-cult, e aguarda a estréia dos filmes de Cláudio Assis e de Paulo Caldas. Não sabe qual será a reação do público para estes novos trabalhos, mas diz estar tranqüila, pois não se cobra tanto, mesmo quando erra. “Não tem problema, se não der certo. Quero apenas estar feliz e na carreira não quero me transformar em algo que não sou.” •

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