STOP MOTION A fascinante ilusão de movimento
Em época de animações em 3D, a técnica artesanal, surgida oficialmente no início do século passado, atrai o interesse de realizadores de várias idades texto Ana Farache
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A representação imagética do movimento é uma aspiração que nos acompanha há milhares de anos. Sequer construíamos nosso próprio abrigo, mas usávamos as paredes das cavernas para desenhar pessoas e animais em movimento. Já devidamente abrigados e sedentários, os egípcios adornavam seus utensílios domésticos com pinturas que simulavam pássaros em pleno voo. Os gregos começaram a dar mobilidade à figuração do corpo humano com a técnica do contraposto nas suas esculturas de mármore... Foram estudos e experimentos que atravessaram idades históricas, escolas artísticas e momentos de rupturas que marcaram as vanguardas modernas. Tentativas
destinadas a captar e representar a animação do mundo à nossa volta. O significado da palavra animação, do latim animatio, oferece algumas pistas para a definição do seu método: ato ou efeito de animar, dar vida. A animação em stop motion é uma dessas habilidades que têm uma longa história de pesquisa e desafios, que surgiu e foi aperfeiçoada a partir de experiências de artistas e cientistas de diversas áreas do conhecimento. Pode ser definida como uma técnica que produz uma ilusão de movimento, a partir da captura de imagens paradas, de figuras vivas ou inanimadas, que vão sendo mudadas de posição quadro a quadro e, posteriormente, montadas em sequência.
1 dia estrelado
Filme de Nara Normande, com 17 minutos, levou quatro anos para ser feito
É imerso nessa técnica minuciosa e artesanal, e que demanda tempo aliado à paciência, que o realizador uruguaio Walter Tournier, 68 anos (veja entrevista no box), desenvolve há quase quatro décadas seus filmes de animação em stop motion. Maestria e dedicação que já lhe renderam reconhecimento internacional e prêmios em países como Alemanha, França, Argentina, Bolívia, Cuba, Espanha, Peru e Brasil. Seu curtametragem Nuestro pequeño paraíso foi selecionado como um dos melhores filmes de animação do século 20, no consagrado Festival de Annecy, na França, em 2000. Desde 1998, o diretor mantém o estúdio Tounier Animación, instalado em Montevidéu. O espaço reúne profissionais que desenvolvem desde roteiro até pós-produção digital. Tournier deixa claro que não tem nada contra a animação computadorizada em 3D. Tanto é que, quando necessário, recorre a profissionais da área. Foi o que aconteceu no seu primeiro longa Selkirk, el verdadero Robinson Crusoe, uma coprodução do Uruguai, Argentina e Chile, de 90 minutos, previsto para ser lançado em fevereiro do próximo ano. No filme, os personagens são animados em stop motion e os cenários desenvolvidos em 3D. “Há muita gente boa trabalhando com essa técnica, mas eu fico com a minha”, diz, com a convicção de um mestre que domina e tem orgulho de sua arte. Entre suas produções mais relevantes, destacam-se a série Los tatitos, veiculada nas televisões do Uruguai e Argentina, El jefe y el carpintero e Navidad caribeña, produzidos para a TV de Gales e o Discovery Kids, além do curta A pesar de todo e da série Los derechos del niño, transmitidos em mais de 200 emissoras da América Latina. Grande parte desses filmes poderá ser vista na abertura do Brasil Stop
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Motion 2011 – I Festival Internacional de Stop Motion do Brasil, que vai acontecer no Recife e em Olinda, neste novembro, entre os dias 22 e 26, com projeções no Cinema São Luiz. Walter Tournier será o convidado de honra do festival, que tem o patrocínio do Governo de Pernambuco, por meio do Edital Audiovisual do Funcultura.
MASSA DE MODELAR
Como estrela maior de Pernambuco, o I Brasil Stop Motion terá a jovem realizadora Nara Normande, 25 anos, diretora do filme Dia estrelado, uma produção de 17 minutos, finalizado recentemente, após quase quatro anos de trabalho contínuo. Nara desenvolveu seu projeto usando, principalmente, papel e massa de modelar para dar vida a um cenário inóspito, no qual se desenrola a luta pela sobrevivência de um menino e sua família. “Eu e minha equipe trabalhamos duro para fazer desse filme uma pequena obra de arte – tudo foi feito manualmente, do papel machê, arame e espuma, para construir os cenários, aos 200 kg de massa de modelar para fazer o
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Atualmente, o stop motion é feito através da captura digital, com programas de computador específicos céu. Eu adoro o fato de poder ver as impressões digitais nos bonecos”. Assim como Tournier, a realizadora não se interessa pela animação computadorizada em 3D. E explica: “Gosto do trabalho artesanal e, com o stop motion, é possível se fazer um filme mais rústico, em que as mãos dos criadores possam ser reconhecidas e atestadas como atuantes em toda a encenação”. Atualmente, a animação em stop motion é obtida a partir da captura digital das imagens que são, posteriormente, editadas sequencialmente no computador, com o uso de programas específicos para a técnica. Dentre suas modalidades, destacam-se as produções com
bonecos, objetos e pessoas. O stop motion está presente no cinema, nos filmes experimentais, na publicidade. Mas, até chegar a ser uma técnica reconhecida e aplaudida pelo grande público, por filmes premiados como O estranho mundo de Jack (1993), do americano Tim Burton, e A fuga das galinhas (2000), produzido pelo Aardman, um dos grandes estúdios ingleses de animação com modelos, o stop motion percorreu um longo caminho.
PRECURSORES
Foi no contexto da expansão científica na Europa, na metade do século 17, que o padre jesuíta Athanasius Kirther lançou seu livro A grande arte da luz e sombra (Ars magna lucis et umbrae), em 1665, que dedicava seu último capítulo à invenção da lanterna mágica: uma caixa com orifício e lente curva, iluminada internamente por vela ou lâmpada a óleo, que projetava, em tamanho ampliado, desenhos feitos sobre placas de vidro. Constitui-se assim, o equipamento antecessor dos modernos sistemas de projeção de diapositivos e do
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Entrevista
WALTER TOURNIER “o stop motion nos aproxima mais do real” 2 lara severi
Diretora de arte do estúdio Tournier fará palestra durante o Brasil Stop Motion 2011
3 série
os derechos del niño, de Walter L Tournier, é exibida em mais de 200 emissoras da América Latina
cinema. Apesar do ceticismo inicial, o fascínio pela lanterna mágica espalhou-se, tornando-se um objeto de interesse geral do público. Quase 100 anos depois, outro alemão, Pieter van Musschenbrock, apresenta um disco removível com sequência de imagens que produziam a ilusão do movimento. O invento provocou um verdadeiro rebuliço no mundo do espetáculo e, segundo Charles Solomon, no seu livro A história da animação, a partir de então, “como uma tempestade no mar, surge o primeiro entretenimento animado”. Os inventos não pararam de surgir, mas, apesar da multiplicidade deles, os artefatos que simulavam o movimento utilizavam apenas desenhos, pinturas e
CONTINENTE O que o levou a utilizar a técnica de animação em stop motion? WALTER TOURNIER Meu primeiro filme nessa técnica foi En la selva hay mucho por hacer, de 1973. Foi produzido a partir de recorte de papel e os personagens eram movimentados com agulhas sobre a mesa de animação. Queria usar materiais disponíveis no nosso país, sem ter que depender de insumos de fora, já que acetatos e tintas tinham que ser importados, o que era complicado e caro. Assim, comecei com o recorte de papel, em seguida com a argila e, agora, com estruturas e revestimentos mais complexos. Outra razão de usar essa técnica é que me interessa trabalhar o volume como forma expressiva, tanto pela espacialidade como pela proximidade com o real que proporciona. CONTINENTE Como vê a produção da animação em stop motion na América Latina? WALTER TOURNIER Essa produção
é ainda muito pequena e de difícil acesso, já que, em muitos casos, são filmes em curta-metragem, com pouca chance de difusão. Vivienne Barry, René Castillo, Juan Pablo Zaramella, Rodolfo Pastor são referências do stop motion no nosso continente. No caso do Brasil, estou curioso com o longa Minhocas (produção do Animaking), que está sendo realizado e que espero ver pronto. CONTINENTE Neste tempo da animação em 3D, o que acha que mais motiva a realização de filmes em stop motion? WALTER TOURNIER Acho que a animação em stop motion nos aproxima mais da realidade. A pureza e a perfeição do virtual provocam uma distância do espectador, enquanto que o stop motion estabelece uma relação mais direta com os objetos, mostra-nos um mundo que, embora inexistente, nos avizinha do verdadeiro, pelo espaço e também por certa imperfeição dos seus cenários e personagens. Com essa técnica tradicional, o animador manipula objetos reais e não virtuais ou planos. Ele penetra nesse pequeno mundo, existente apenas em escala menor, mas que a câmera irá dissimular. Esse é um desafio que motiva muitos realizadores.
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oqo FIlmes
La increíble historia de la niñapajaro, da produtora espanhola, estará na mostra especial do festival
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El color del agua é um dos filmes de Walter Tournier que estão na mostra
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INDICAÇÕES
recortes. Com o surgimento da fotografia, entra em cena o lendário fotógrafo inglês Eadweard J. Muybridge, nascido em 1830. Os estudos pioneiros de Muybridge sobre a mobilidade animal e humana foram revolucionários no captar, decompor e representar o movimento. O fotógrafo também marcou espaço na projeção de imagens com a invenção do zoopraxiscópio – equipamento usado para dar animação às suas fotografias. Muybridge morreu em 1904, logo após ter sido realizado, em 1898, The Humpty Dumpty Circus, dos ingleses Albert E. Smith e James Stuart Blacklton, apontado por pesquisadores como o
primeiro filme animado com a técnica de stop motion. Sobre a animação, Smith relatou que fez uso de um brinquedo de madeira da sua filha, composto por figuras de artistas e animais de circo, cujas articulações móveis permitiam colocá-los em posições equilibradas. “Foi um processo tedioso, na medida em que o movimento só poderia ser alcançado apenas por fotografias feitas separadamente a cada mudança de posição. Sugeri que deveríamos obter uma patente sobre o processo; Blackton, no entanto, achou que não era importante o suficiente para patenteá-lo.” Apesar do depoimento ter sido registrado, não restou nenhuma cópia do filme. Foi também no início do século 20 que o mágico e ilusionista francês George Méliès vislumbrou no stop motion uma ótima possibilidade para dar sequência aos seus truques que encantavam a todos, tendo alcançado o ápice de sua carreira cinematográfica com o filme Viagem à Lua, de 1902. Ao longo desse século, a técnica foi aprimorada por diversos diretores e usada para criar os efeitos especiais na indústria cinematográfica, que ainda não dispunha de uma tecnologia capaz de resultar em cenas digitais. Com a expansão da indústria cinematográfica em 3D, a técnica do stop motion está fadada ao desaparecimento? Para o mestre Tournier, essa é uma questão sem fundamento: “Basta olhar para a nova produção cinematográfica. Na verdade, estão sendo feitos cada vez mais filmes com esse sistema tradicional de animação”.
EXPERIMENTAL
FILMEFOBIA
Direção de Kiko Goifman Com Jean-Claude Bernadet, José Mojica Marins, Marcela Bannitz Lume Filmes
Vencedor dos prêmios de Melhor Filme (Júri e Crítica), Melhor Ator (Bernadet), Melhor Direção de Arte e Melhor Montagem, no Festival de Brasília de 2008, o primeiro longa de ficção de Kiko Goifman acredita que “a única imagem real é a de um fóbico diante da sua fobia”. Nele, os fóbicos não podem se desviar daquilo que lhes desperta medo. O filme alterna momentos situados entre ficção e documentário.
DOCUMENTÁRIO
DRAMA
FELIZ QUE MINHA MÃE ESTEJA VIVA
Direção de Claude Miller e Nathan Miller Com Vincent Rottiers, Sophie Cattani e Yves Verhoeven Imovision
Com o roteiro inspirado num recorte de jornal, Feliz... começou a ser gerado em 1996, ganhou ares de filme maldito, mas só foi lançado no início deste ano. Conta a história de Thomas, filho adotivo que resolve ir em busca da mãe biológica. As relações mostradas entre os familiares – adotivos e biológicos – são bem cruas. Destaque para a bela atuação de Cattani.
drama
UM LUGAR AO SOL
CÓPIA FIEL
“Você sabe qual é a definição que aprendeu, no colégio, de ‘ilha’? A cobertura é a mesma coisa, mas você tem outra dimensão. É o ‘por cima’ .” A opinião sobre a sensação de se morar numa cobertura, oferecida por um dos personagens do documentário dirigido por Gabriel Mascaro, dá uma ideia do que será encontrado no filme. Contando com depoimentos controversos, muitos espectadores veem no longa uma crítica ao estilo de vida daqueles que, literalmente, estão no topo da sociedade.
Partindo do encontro entre dois personagens – que se conhecem numa palestra do escritor inglês James Miller (Shimell), assistida por Elle (Binoche), galerista que vive há anos na Itália –, o longa começa discutindo a tese do livro de Miller de que uma cópia vale tanto ou mais que a obra original. A partir daí, levantamentos são feitos, transitando pela relação do homem com aquilo que pode ser gigantesco aos olhos de um, e risível, aos do outro.
Direção de Gabriel Mascaro Vitrine Filmes
Direção de Abbas Kiarostami Com Juliette Binoche, William Shimell e Jean-Claude Carrière Imovision
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