Sobre Trilhos - Reabilitação Urbana de Ribeirão Preto

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REABILITAÇÃO URBANA

SOBRE TRILHOS DE RIBEIRÃO PREtO

TAINÁ MARCOLIN E SILVA 2020



Centro Universitário estácio

TAINÁ MARCOLIN E SILVA

REABILITAÇÃO URBANA

SOBRE TRILHOS

DE RIBEIRÃO PRETO

Trabalho final de graduação apresentado como requisito para aprovação do curso superior de Arquitetura e Urbanismo ao Centro Universitário Estácio orientadora Profª MA.

catherine d’andrea





AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus por me capacitar e me guiar para a conclusão de mais uma etapa de minha vida, pois foi minha fé que nos momentos mais difíceis não me permitiu desistir. A minha família que sempre torceram por mim e acreditaram nos meus sonhos. Aos meus pais Marcelo e Roberta, obrigada por sempre sonharem meus sonhos, me apoiarem e me incentivarem, por todos os ensinamentos que levo em meu coração e por todo suporte e batalha para me proporcionar as melhores oportunidades da vida. Aos meus irmãos Guilherme e Laís, que respeitaram meu tempo dedicado a este trabalho, me apoiaram e acreditaram em mim. Aos meus amigos que me acompanharam nesta jornada em especial meus colegas e parceiros de sala Yara, Flor, Mica, Gabi, Iza, Le, Tai, Ju e Yas. Obrigada por toda caminhada e troca de aprendizado, vocês tornaram a caminhada leve e por toda ajuda durante o desenvolvimento deste trabalho em um momento atípico e delicado no qual temos vivido. Levarei vocês para avida. Também sou grata aos mestres que me conduziram durante estes cinco anos letivos com muita maestria, dedicação e amor por essa profissão. Obrigada por toda sabedoria e conhecimento que foi proporcionado. Em especial gostaria de agradecer a Prof. Ana Tereza Cirigliano, que me encantou e inspirou um olhar mais dedicado ao tema com suas aulas ministradas com maestria e amor. Meu muito obrigada por apoiar minhas ideias e por todo conhecimento ao longo do curso. A minha coordenadora e orientadora Prof. Catherine, que soube nos guiar, apoiar e acreditar em nosso potencial em momentos difíceis.

Deus é bom o tempo todo, todo tempo Deus é bom.


RESUMO Ao longo do presente trabalho foram elaboradas pertinentes questões relativas ao Patrimônio Industrial e sua relação com o espaço urbano em que ele se insere. Contudo, o principal objetivo deste trabalho é elaborar uma visão crítica sobre o tratamento do patrimônio ferroviário da cidade de Ribeirão Preto e como intervenções em espaços de preexistência podem abordar uma escala urbana, voltada para um planejamento territorial, espaços públicos qualitativos, valorização patrimonial e preocupação com a comunidade. A proposta projetual tem como objetivo desenvolver uma intervenção urbana que se volte para reabilitação do espaço público e que abarque soluções de mobilidade, desenvolvimento físico, econômico e social, além de contribuir para preservação do patrimônio. PALAVRAS-CAHVE: REABILITAÇÃO. PATRIMÔNIO. FERROVIÁRIO. PLANEJAMENTO URBANO.


ABSTRACT Throughout the present work, questions related to Industrial Heritage and its relationship with the urban space in which it is inserted were elaborated. However, the main objective of this work is to elaborate a critical view on the treatment of the railway heritage of the city of RibeirĂŁo Preto and how interventions in pre-existing spaces can address an urban scale, focused on territorial planning, qualitative public spaces, heritage valuation and concern with the community. The project proposal aims to develop an urban intervention aimed at the rehabilitation of public space and which encompasses solutions for mobility, physical, economic and social development, in addition to contributing to the preservation of heritage. KEYWORDS: REHABILITATION. PATRIMONY. RAILWAY. URBAN PLANNING.



apresentação Os recentes estudos acerca do patrimônio Industrial têm nos mostrado que o tema abrange várias áreas de conhecimento, se colocando como uma questão multidisciplinar. Os inúmeros esforços voltados para a compreensão de seu lugar na história, nos revela a importância de sua preservação e valorização, pois são testemunhos de manifestações culturais, sociais e físicas de um passado que mudou diretamente a configuração das cidades e da sociedade (KÜHL, 2006). Os processos industriais não somente inovaram os métodos de produção e construção, mas também a configuração das cidades, influenciadas principalmente pelas ferrovias. Os assentamentos férreos estiveram intrinsicamente ligados ao desenvolvimento das cidades pois, em sua maioria, constituíram suas primeiras configurações urbanas a partir das linhas. Todavia, o crescente investimento em rodovias, trouxe o obsoletismo dos assentamentos ferros e por conseguinte sua desvalorização. Atualmente muitas linhas e instalações ferroviárias se encontram desativadas e em processo de degradação. Tendo em vista os fatos citados, o presente trabalho tem como objetivo sistematizar um breve estudo sobre a importância do Patrimônio Industrial, em especial, no que se refere a cidade de Ribeirão Preto. O desenvolvimento urbano, econômico e social, esteve ligado diretamente a instalação da malha ferroviária da cidade, que configurou sua primeira expansão urbana, sendo assim, as instalações férreas sempre estiveram presentes nas áreas mais desvalorizadas da cidade. Em suma, tendo o fato de que toda edificação, pública ou privada, deve cumprir sua função social visando sempre o interesse coletivo, abrangendo os princípios urbanos e assim sendo grandes capacitadores de transformação urbana, social e cultural (ZAMBONI, 2012). A proposta do projeto é estabelecer o patrimônio industrial como instrumento de transformação da paisagem.



Figura [01] -Detalhes da estação Barracão. Arquivo da autora. Abril de 2020

“ o passado não volta importantes são a continuidade e o perfeito conhecimento de sua história. ” Lina bo bardi


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INTRODUÇÃO

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[ TEMA / JUSTIFICATIVA / OBJETIVOS ] 18

sobre trilhos [ A ARQUITETURA DO FERRO ] 22 [ BRASIL: CAFÉ E TRILHOS ] 24 [ companhia mogiana de estradas de ferro ] 30

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CONCEITOS LIGADO A PATRIMÔNIO [ PATRIMÔNIO HISTÓRICO ] 34 [ o patrimônio industrial e a arqueologia industrial ] 36 [ os princípios de restauração ] 40 [ patrimônio histórico urbano ] 44


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referências PROJETUAIS [ High line park] 50 [ Parque gleisdreieck ] 62 [ domino park ] 72

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REFERÊNCIAL TEÓRICO [referêncial teórico] 162

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O PROJETO

[diretrizes projetuais] 124 [ Conceito e partido] 130 [apresentação do projeto] 136 [consideraçõES FINAIS] 160

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ANÁLISE DA ÁREA DE INTERVENÇÃO [ HISTÓRICO] 86 [ ESTAÇÃO BARRACÃO ] 94 [ LEVANTAMENTO DA ÁREA ] 102


[ INTRODUÇÃO ]



TEMA JUSTIFICATIVA OBJETIVOS O interesse pelo tema, surge através da significativa relevância que as instalações ferroviárias tiveram para a história e desenvolvimento de Ribeirão Preto. Junto com os assentamentos férreos surgiram as primeiras configurações sociais da cidade, acrescidas com os imigrantes, em especial os italianos, que formaram o Núcleo Colonial Antônio Prado, onde marcaram o processo de urbanização da cidade. Atualmente, o que era o Núcleo, constitui-se os primeiros e mais tradicionais bairros da cidade, carimbados de valores históricos advindos do processo de industrialização e desenvolvimento socioeconômico do complexo cafeeiro.

“ é ato de respeito pelo passado

presente e voltado para o futuro PARA QUE OS BENS CULTURAIS POSSAM VOLTAR A SER EFETIVOS E FIDEDIGNOS SUPORTES DE MEMÓRIA COLETIVA ” interpretado no

Beatriz Kühl

À colocação de Beatriz Kühl (2006), JUSTIFICA a reflexão de quanto os bens culturais são de suma importância para a preservação da memória da identidade daquilo que já existiu, pois são íntegros testemunhos de uma história, na qual permeia um passado marcado pela industrialização. Esquecer-se desta história, é esquecer de uma geração, avanços dos processos de produção, transporte e arquitetura de uma era. Diante disso, a história de Ribeirão Preto está intimamente ligada com a modernização advinda pelo complexo cafeeiro e as ferrovias, configurando as primeiras manifestações sociais, físicas e econômicas da cidade, mas a história enraizada sobre o que já foi o triunfo do município, tão pouco é contada. Diante dos conceitos analisados, os objetivos gerais do projeto é gerar por meio das antigas instalações ferroviárias, que incluem os trilhos, uma reabilitação urbana na cidade de Ribeirão Preto para promover incentivo a preservação e valorização da cultura e história. OBJETIVOS ESPECÍFICOS se constituem em: • Projetar um equipamento que promova cultura e reabilitação de áreas degradadas por falta de incentivo a preservação patrimonial; • Restauração das ruínas ferroviárias sem apagar a memória • Novos usos e programas que contemplem a preexistência dos trilhos e da estação • Promover lazer e cultura de acesso a todos 18


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[ SOBRE TRILHOS ]



AS PRIMEIRAS FERROVIAS NO MUNDO Com um cenário favorável para a industrialização - uma burguesia rica, um poder político sedento por expansão comercial, abundante reserva de minério (principal matéria-prima) e mão-de-obra barata - a Inglaterra foi a grande percursora da Revolução Industrial em 1730 e 1850, que, mais tarde, trouxe mudanças significativas para toda a Europa. O trabalho predominantemente artesanal, passou a ser substituído por máquinas e permitiu a expansão de trocas com mercados externos, marcando o sucesso do capitalismo.¹ Durante a segunda metade do século XVIII, as novas técnicas de produção fabris permitiram o aumento da produção do ferro e a diminuição de seu custo, o que influenciou fortemente o processo da Revolução: “ Quando o ferro se tornou a matéria mais importante da produção, foi ele, então, o acontecimento dos acontecimentos na evolução da humanidade” (KÜHL apud MORGAN, 1877, p. 20). Da fusão de vários avanços que se somaram a Revolução, o surgimento da ferrovia favoreceu intrinsicamente, não somente como transporte, mas também como estímulo para a expansão de indústrias e proporcionou também novas configurações para as cidades.¹ Segundo Kühl (1998), o sistema ferroviário alastrou-se mais enfaticamente na terceira década do século XIX na Europa e Estado Unidos, mas desde o século XVI a Europa já possuía extratos de caminhos de ferro devido a mineração, porém o seu início apenas foi considerado em 1830, com a ligação da linha Liverpool e Manchester. A partir deste momento houve uma grande difusão da rede ferroviária por vários países: “Três décadas depois, a Inglaterra possuía uma rede de 15.762 quilômetros, a França 9.000 quilômetros e a Bélgica de 1.713 quilômetros” (KÜHL, 1998, p. 59) O espraiamento da rede ferroviária trouxe uma tipologia que marcou o século da Industrialização: as estações ferroviárias. Muitos desses edifícios eram “híbridos”, comumente de tijolos para o edifício de passageiros e metálica, para as coberturas de plataformas. ² [Figura 2.01] 1. HAGATONG, Ana Teresa Martins. Património industrial ferroviário: uma arquitectura em risco. 2015. 2. KÜHL, Beatriz Mugayar. Arquitetura do ferro e arquitetura ferroviária em São Paulo: reflexões sobre a sua preservação. Ateliê Editorial, 1998.

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Com a produção do ferro em escala industrial, expressivas transformações ressignificaram o estilo arquitetônico da época, que preponderou na produção de variados programas, equipamentos, avanços construtivos e tecnológicos. As novas técnicas da produção arquitetônica somadas com o processo de pré-fabricação, marcaram amplamente as soluções formais e estruturais, principalmente da arquitetura ferroviária (HAGATONG, 2015). Para além das novas tipologias inerentemente ligadas ao ferro, as estações trouxeram equipamentos como: depósitos, garagens para as locomotivas, armazéns, oficinas. Trouxeram ainda o aprimoramento de técnicas para superar os obstáculos postos à frente das expansões das linhas como aclives e declives naturais do solo, assim, o surgimento de pontes, túneis e viadutos, foram endossados pelos assentamentos férreos. ²

Figura [2.01] -Estação Euston, Londres - Ilustração por J Harris, J e Thomas Talbot Bury, 1837

Fonte: Coleção do Grupo do Museu da Ciência. Disponivél em: <https://collection.sciencemuseumgroup.org. uk/objects/co8020392/plate-1-the-station-at-euston-square-print> Acessado em 8 de abril de 2020 - adaptação da autora


Figura [2.02] - Estação Euston, Londres 1951. Por Claude H Buckle. Fonte: Coleção do Grupo do Museu da Ciência. Disponivél em: <https://coimages.sciencemuseumgroup.org.uk/images/119/423/medium D _ S120713.jpg> Acessado em 8 de abril de 2020 - modificação da autora

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BRASIL: CAFÉ E TRILHOS

Figura [2.03] - Estação Da Luz, SP. Fonte: Transporte Sobre Trilhos, O Futuro da Mobilidade .Disponivél em: <https://www. transtrilhos.com/2015/10/estacao-da-luz-sao-paulo.html> Acessado em 11 de abril de 2020 - modificação da autora

Com a ascensão das ferrovias pelo mundo pós Revolução Industrial, o capitalismo também se expandia, promovendo a comunicação comercial de mercadorias entre vários países. O Brasil não ficou para trás, impulsionadas efetivamente pela produção e exportação de café, as primeiras tentavas da instalação dos assentamentos férreos surgem no país. Ao final do século XVIII, o Brasil dava início ao cultivo do café inicialmente plantado ao Norte do país, mais especificamente nos arredores da capital do maranhão onde se desenvolve, mas não se destaca em relação a outras atividades. Em 1760 algumas mudas são levadas para o centro do Rio de Janeiro, onde a princípio possui lento desenvolvimento, mas logo depois já se expande, destinando-se até 1815 quase que totalmente ao consumo interno (FRAGA, 1963). Segundo FRAGA (1963), cerca de um século após sua introdução no Brasil, o café, assumia a produção e exportação mundial do produto. Apesar do preponderante sucesso em solo fluminense, o Brasil passa a assumir a locomotiva da produção e exportação do café - após aproximadamente 30 anos - quando o produto se expande para o estado de São Paulo. No final do século XIX, com o declínio do comércio açucareiro, as plantações de cana de açúcar passam a ser substituídas pelas plantações dos cafezais. Inicialmente introduzido pela região do Vale da Paraíba, a plantação do produto é impulsionada pela vasta disponibilidade de terras e fertilidade do solo. Para além disso, as dificuldades de acesso ao interior do país eram inerentes as suas dimensões continentais. O transporte para o escoamento do café era um grande obstáculo para o sucesso econômico, já que era escoado no lombo de animais - como bois e mulas. As grandes distâncias percorridas custavam tempo e prejuízo, já que muitas sacas de café eram perdidas.

Por mais algumas décadas deveriam servir ainda os velhos caminhos de mulas e de carros de boi, pouco alterados durante os séculos coloniais. Estradas adequadas de rodagem praticamente não existiram até o surgimento da ferrovia (BEM, 1998, p. 17).

Tendo em vista o fato descrito, os assentamentos férreos notoriamente foram efetivos meios de transformação, resolvendo problemas de ligação territorial, transporte de mercadorias, passageiros e modificando significativamente as configurações sociais, assim, as ferrovias fizeram de São Paulo e do Brasil a locomotiva da produção e exportação de café (BEM, 1998). 25


Figura [2.04] - Estação De Pacobaíba, marco zero das estradas de ferro no Brasil. Fonte: IBGE. Disponivél em: < https://biblioteca.ibge.gov.br/biblioteca-catalogo.html?id=445551&view=detalhes> Acessado em 13 de abril de 2020 - modifacção da autora

Rio de Janeiro

Figura 2.05 - Mapa do Brasil

Magé

Oceano Atlântico Figura 2.06 - Estado Rio de Janeiro

Magé

Baía de Guanabara Figura 2.07 - Magé

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No brasil, as primeiras tentativas de construção de estradas de ferro, para ligar Rio de Janeiro as capitais das Províncias, foram insatisfatórias. Diante deste fato, as ferrovias só vieram a se expandir a partir da segunda lei geral em 26 de junho de 1852. Apesar de não usufruir das virtudes da lei de 1852, o primeiro trecho surge em 30 de abril de 1854, graças aos investimentos de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, que deu início ao desenvolvimento ferroviário no Estado de São Paulo. O trajeto contava com cerca de quatorze quilômetros de linha que ligava o porto Mauá, na Baia da Guanabara, à serra de Petrópolis. Segundo dados do IBGE, é considerado o marco zero das estradas de ferro do brasil, onde se localiza a Estação Ferroviária Guia de Pacobaíba, em Magé no Rio de Janeiro, de onde saiu a primeira locomotiva chamada “Baroneza”, em homenagem a esposa do Barão (KÜHL, 1998, p. 130). O Barão de Mauá foi um grande visionário e seus investimentos foram de grande importância para o desenvolvimento ferroviário, influenciando posteriormente a supremacia do estado de São Paulo na produção e exportação do café. Em virtude da iniciativa do Barão de Mauá, a expansão ferroviária no país ganhou forças. Em 1855, após algumas tentativas anteriores sem sucesso, foram criadas duas leis geral que estabeleceram condições favoráveis para a constituição da primeira ferrovia no estado de São Paulo.


Com estímulos do Barão e de interesse por parte do mercado já consolidado na Europa, nasce a São Paulo Railway Company (formada em Londres), conhecida como estrada de ferro Santos Jundiaí. A produção de café fez de São Paulo o polo da economia do país, antes centralizado nas regiões leste de nordeste do país, assim o produto cada vez mais se enraizava no interior do país e a junto com sua crescente expansão, a necessidade de comunicação dos portos já que os cafezais se encontravam cada vez mais distante do litoral (BEM, 1998, p. 26-27). Havia um grande obstáculo a ser vencido que dificultava o escoamento o produto até o porto de Santos: a Serra do Mar. Segundo RIBEIRO (2012, p. 39) a principal rota de escoamento de café foi implantada graças aos engenheiros ingleses e o investimento de recursos próprios do Barão de Mauá, que custou sua falência. O grande desnível de 800 metros foi vencido e o planalto já não se encontrava mais isolado do porto de Santos. Em suma, esse fator foi de grande relevância para o desenvolvimento agrícola para o estado. [Figura 2.08]

Enquanto o Estado do Rio era recortado de caminhos por onde trafegavam os carros de bois em direção à inúmeros portos, em São Paulo a serra do Mar levantava-se como enorme obstáculo ao escoamento do produto para o exterior (FRAGA, 1963, p. 3).

Figura [2.08] - Viaduto Serra do Mar. Foto por Guilherme Gaensly. Fonte: Museus Ferroviários de São Paulo. Disponivél em: <http://museusferroviarios.net.br/antigas-companhias/sao-paulo-railway/> Acesso em 14 de abril de 2020

Estado de São Paulo

Jundiaí São Paulo Santos Oceano Atlântico

Figura 2.09 - Caminho de Santos a Jundiaí

Apesar das inerentes dificuldades, o sucesso da linha encantou os produtores de café, que passaram a investir cada vez mais no assentamento dessas estradas e assim paulatinamente permitindo sua ramificação, adentrando o interior paulista e atendendo cada vez mais os interesses do escoamento do café. Foi constituída a ligação através de planos inclinados, que desafiavam as técnicas de engenharia da época, para além de outros problemas como o clima, que por muitas vezes resultava em deslizamentos, exigindo dos operários a manutenção frequente das linhas. Com o exorbitante crescimento das linhas pela província de São Paulo, a Serra do Mar canalizava toda a produção do café para o porto de Santos, em direção ao mercado Europeu (RIBEIRO, 2012, p. 40-41). A partir da grande difusão dos trilhos, outras Companhias e empresas surgiam de acordo com as necessidades dos cafeicultores, atendendo a seus interesses privados, portanto, não havia uma padronização das bitolas utilizadas nas construções das linhas já que - apesar do interesse nacional na ligação territorial para o desenvolvimento da exportação - os investimentos eram privados.

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mas teria desistido de sua concepção. Sendo assim, em 1868 para que a linha chegasse até Campinas, foi estimulada a criação de uma nova Companhia - Companhia Paulista de Estrada de Ferro Jundiaí a Campinas - consolidada por fazendeiros e produtores de café da cidade de Campinas. A configuração urbana da cidade estava mudando e o processo de modernização e industrialização, crescia junto com a cultura cafeeira e os trilhos (ZAMBONI, 2012). Nos anos seguintes foram construídos novos prolongamentos, além da consolidação d novas empresas, constituídas preponderantemente por fazendeiros de café. Sendo assim, na década de 70 os assentamentos férreos já eram fortemente consolidados por todo estado de São Paulo e em crescente expansão. A ramificação dos trilhos teve como consequência a integração de grande parte do território do estado, o levando a supremacia da produção e exportação do café. Levou muitos municípios, antes isolados, a fazerem parte da economia do país, colaborou com a expansão da ocupação do território, auxiliou na agricultura e futuramente nas indústrias (KÜHL, 1998, p. 131- 137).

Figura [2.10] - Evolução das estradas de ferro em São Paulo 1970. Disponivél em: <https:// www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/17.201/6435> Acesso em 15 de abril de 2020 - modificação da autora

O acelerado processo de modernização da região de São Paulo intimamente ligado com a ascensão das ferrovias, trouxe junto com os trilhos e o café a urbanização e consolidação de um mercado e uma elite fundiária. Com os avanços dos trilhos para o interior, permitiu-se a descoberta de novas terras para o cultivo e uma nova configuração de sociedade se estabelecia no interior paulista. Segundo FRANCISCO (2007, p. 48)

As cidades passaram a receber um novo conjunto de atribuições, sobretudo no aspecto de sua urbanização. As transformações estabelecidas na esfera da produção agrária repercutiram na dinâmica da espacialização de funções, equipamentos e bases produtivas, configurando novas complexidades a cidade e reforçando a ideia de que sua urbanidade estaria diferentemente associada às atividades extensivas agrárias. A ferrovia, surgida como resposta às insuficiências da rede viária comparativamente à expansão econômica de São Paulo, configurou-se, então, como ícone desses novos tempos, imbuindo à cidade ritmos e costumes até então desconhecidos.

Naturalmente, a linha principal de Santos a Jundiaí se estenderia até Campinas e a São Paulo Railway obtinha privilégios para sua construção, 28

KM 1870 1880 1890 1900 1910 1920 1930 1940

AUMENTO 139 1.212 2.425

100%

3.373

39%

4.825

43% 6.616

37% 7.100 8.622

7% 21%

Figura [2.1] - Evolução das estradas de ferro em São Paulo 1970. Fonte: KÜHL, Beatriz Mugayar. Arquitetura do ferro e arquitetura ferroviária em São Paulo: reflexões sobre a sua preservação. Ateliê Editorial, 1998. - modificado pela autora


Figura [2.12] - Estrada de ferro em Jaguariúna da Cia. Mogiana. Disponivél em: < https://www.flickr.com/photos/ breno-ribeiro13/17790661905/> Acessado em 15 de abril de 2020 - modificações da autora

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COMPANHIA MOGYANA DE ESTRADAS DE FERRO Em 1872 é constituída a Companhia Mogyana de Estradas de Ferro que ligaria Campinas até Mogi Mirim, com um ramal para a cidade de Amparo. Assim como a maioria das companhias, a Mogiana foi idealizada por fazendeiros de café e tornou-se umas das mais importantes linhas férreas do Brasil e principalmente para o estado de São Paulo, consolidada com a maior extensão de linhas. Fundada sob a Lei provincial N° 18 de 21 de março de 1872, autorizou-se o transporte de café e gado partindo de Campinas. Companhia crescia de acordo com os interesses dos cafeicultores, atraída até fazendas e plantações de café, criando por conseguinte ramais e sub-ramais. A produção do produto aumentou após o funcionamento das linhas logo nos primeiros anos, assim o escoamento do café até os portos aumentou também. A construção do primeiro segmento da Cia Mogyana - ligando Campinas a Mogi-Mirim com seu primeiro ramal a Amparo – teve início em 1875. Segundo Zamboni (2012), o prolongamento até Casa Branca e Franca foi concebido em 1878, mas seguiu até Casa Branca e o projeto do traçado que seguiria para Franca foi alterado, requisitando à Assembleia Provincial o prolongamento até Ribeirão Preto e São Simão. Inicialmente a Assembleia negou o pedido da Companhia e apenas em 1880, com a lei de 26 de abril, foi concedido o prolongamento. A Mogyana chega ao município de Ribeirão Preto em 23 de novembro de 1883. Para a efetiva consolidação da linhas em no município, é importante ressaltar que as regiões de maior produção de café: Rio de Janeiro e Vale da Paraíba , passaram a apresentar esgotamento do solo e os resultados da produção de café se tronaram insatisfatórios, fazendo com que os produtores procurassem recursos e outras terras. Dentro deste contexto, a cidade de Ribeirão Preto se destacava pela qualidade e disponibilidade de suas terras. O café foi o evidente triunfo das estradas de ferro, mas foi também o motivo de sua queda. Durante seus primeiros anos, mesmo com a queda do consumo mundial do produto, a Cia. Mogyana manteve altos índices de

exportação, chegando a ser a principal e maior rota de escoamento até o porto de Santos. Até os últimos anos que anteciparam a Revolução de 1930, a companhia conseguiu manter seus lucros a vigor da lei de valorização do café, constituída em 1906 e que se encerraria em 1930. Logo após o encerramento da lei, em 1931 a queda na exportação do café foi notória, a quantidade de café que chegava ao porto de Santos diminuiu intensamente e os trens passaram a transportar outros tipos de produto como milho, soja e algodão. Mesmo com a diversificação dos produtos exportados, não chegava ao preponderante lucro oferecido pelo café. Além disso, somou-se ao forte investimento rodoviário a partir de 1940, incentivado pelo Governo Federal, já que oferecia versatilidade e baixo custo e assim os investimentos e manutenções dos assentamentos férreos se tornavam cada vez mais inviáveis (KÜHL, 1998, p.135). As estradas de ferro passaram a entrar em um processo de obsoletismo e decadência. Com os prejuízos gerados para os proprietários privados, as ferrovias paulistas começaram a passar por um processo de estatização, com o estado então assumindo o controle das linhas. Nesse sentido, nesse sentido, a empresa Ferrovia Paulista S.A (FEPASA) - instituída pelo decreto nº 10.410, de 28 de outubro de 1971 – passou a incorporar as linhas paulistas com objetivo de unificá-las. A Mogyana em específico, com a crise, recorreu ao capital inglês e assim gerou dividias externas. Sendo assim, em 1940, recorre aos bancos brasileiros e quita sua dívida externa. Em 1947 a Mogyana solicita o processo de estatização e no mesmo ano encerra suas atividades como empresa privada (ZAMBONI, 2012). Após 27 anos do processo de criação da FEPASA, o estado decidiu vender a união e em 1998 a empresa foi incorporada à Rede Ferroviária Federal, e logo no ano seguinte foi privatizada e passou a pertencer à América Latina Logística (ALL). Atualmente a malha ferroviária de São Paulo é operada por Ferrovia Centro-Atlântica S.A, a MRS Logística S.A e América Latina Logística Malhas Paulista e Oeste. Figura [2.13] -Palácio da Cia Mogyana, Campinas. Disponivél em: <https://www.flickr.com/photos/gttsu/5764079346/> Acessado em 29 de abril de 2020 - modificações da autora

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[ CONCEITOS LIGADO AO PATRIMÔNIO ]



PATRIMÔNIO HISTÓRICO O monumento histórico constitui-se em 1420 após o exílio do papa Avinhão, que havia deixado Roma. Esta, que se encontrava em ruínas, da vida as primeiras iniciativas de preservação dos monumentos, estabelecendo as primeiras noções de desenhos, inventários, coleções e escavações “[...] um novo clima intelectual se desenvolve-se em torno das antigas ruínas que, a partir daí, falam de história e confirmam o passado fabuloso de Roma [...]” (CHOAY, 2014, p. 33). Assim, os antiquários e museus surgiram como as primeiras iniciativas de “evocar a Antiguidade”, passando a abrigar as coleções de elementos que a princípio restringiam-se somente a antiguidade greco-romana, responsáveis por grande mobilização que caracterizaram um período de exploração a procura de vestígios da antiguidade clássica (CHOAY, 2014, p. 65). Até o século XVIII, as ações voltadas para a preservação dos monumentos eram circunstanciais, realizadas quase sempre por aristocratas e pela igreja, para a conservação de seus bens. Porém, a ameaça de monumentos que já eram consolidados como bens culturais, mobilizou o interesse de sua preservação. Segundo CHOAY (2014), os primeiros princípios em prol da preservação dos monumentos históricos se instituíram na França durante o século XIX. Esses, foram motivados em decorrência da Revolução Francesa, quando grandes monumentos históricos foram devastados e saqueados. Concomitantemente, com as intensificações dos atos de vandalismo, surge a partir da Comissão de Artes (1793), um interesse não mais apenas cultural, mas também político. Surge então o conceito posse coletiva como cidadania, que inspira o patrimônio a denominar conjunto de bens como propriedade da nação. Dessa forma, a noção de patrimônio se compreende pela constituição de identidade nacional e passa a cumprir diversas funções e assim a preservação passou a se caracterizar como interesse público com justificativa ideológica (FONSECA, 1997, p. 57-60).

Patrimônio histórico. A expressão que designa um bem destinado ao usufruto de uma comunidade que se ampliou a dimensões planetárias, constituído pela acumulação contínua de uma diversidade de objetos que se congregam por seu passado comum: obras e obras-primas das belas artes e das artes aplicadas, trabalhos e produtos de todos os saberes dos seres humanos (CHOAY, 2014).

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A criação da primeira Comissão dos Monumentos Históricos em 1837, definiam três categorias de monumentos históricos: vestígios da antiguidade, edifícios religiosos da Idade Média e alguns castelos. Mas foi após a Revolução Industrial que as definições passaram a abranger novas escalas. Após a Segunda Guerra Mundial, o número de bens considerados patrimônio cresceu, advindos essencialmente da arqueologia. As descobertas da arqueologia expandiram as definições do monumento histórico, e assim os produtos resultantes dos processos industriais passaram a compartilhar dos mesmos diretos de conservação das demais obras primas. Segundo CHOAY, a Revolução Industrial teve papel importante para acelerar e generalizar a valorização a partir da criação de leis, visando a proteção dos monumentos históricos (CHOAY, 2014, p. 12). No Brasil, é possível verificar algumas iniciativas preservacionistas desde os anos 20, devido ao abandono das cidades históricas, denunciado por intelectuais. Em 1933, compreende-se uma importante iniciativa do governo federal quando a cidade de Ouro Preto foi declarada monumento nacional pelo decreto nº22.928, de 12 de julho. Somente em 1936 a entrada do Estado no âmbito patrimonial foi consolidada, com a criação do primeiro órgão nacional de preservação ao patrimônio - o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN). O SPHAN passou a ser regulamentado em 1937, com a lei nº378, de 13 de janeiro e assim efetivamente integrado ao Ministério da Educação e Saúde (FONSECA, 1997, p. 94-98). Segundo FONSECA (1997), nos anos seguintes após sua criação, as políticas preservacionistas do IPHAN se voltaram para a estética, se distanciando dos conceitos de historiografia. Ao ressaltar a seleção de bens culturais para tombamento, PINHEIRO (2006) frisa que os critérios para a prática privilegiavam a excepcionalidade e representatividade de bens culturais de alguns momentos específicos da história.

Figura [3.01] - Coliseu, Roma. Disponível em: < https://www.flickr.com/photos/cnader/4888231962/> Acesso em 15 de abril de 2020 - modificado pela autora.


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PATRIMÔNIO INDUSTRIAL E A ARQUEOLOGIA INDUSTRIAL Segundo KÜHL (2008), o interesse pela preservação dos bens que representam o patrimônio industrial é recente, tendo em vista que sua relevância histórica, social, cultural e arquitetônica tardou a ser compreendida como bens culturais como outras manifestações tradicionais. Os debates sobre o tema se iniciaram na Inglaterra - apropriando-se da expressão “Arqueologia Industrial” - em 1950 e mais enfaticamente em 1960, quando importantes testemunhos arquitetônicos foram demolidos. Em suma, o patrimônio ferroviário está intrinsicamente relacionado a identificação e preservação do patrimônio industrial, pois também são vestígios que testemunham o início de uma nova sociedade e cultura, atuando de maneira enfática para o impulso da industrialização e por ela impulsionado.

um monumento industrial é qualquer edifício ou outra estrutura, em especial do período da Revolução Industrial, que, sozinho ou associado a equipamentos, ilustra o início e desenvolvimento de processos industriais e técnicos, incluindo meios de comunicação (KÜHL, 2008, p. 39 apud RAISTRICK, 1973, p. 2)

Os debates se iniciaram mais precisamente após a Segunda Guerra Mundial, quando importantes construções foram demolidas com o objetivo da reconstrução urbana, devido as destruições causadas pela guerra. Importantes equipamentos se encontravam ameaçados devido ao seu desuso e expansão da cidade. Desde então, movimentou-se esforços para a compreensão do que constituía o patrimônio industrial, para sistematizar o que deveria ser preservado e o porquê. Nesse sentido, compete a arqueologia industrial o estudo e levantamento de registros dos vestígios da industrialização. (KÜHL, 2008, p. 37-39).

[...]a arqueologia é industrial é um método interdisciplinar que estuda os vestígios materiais e imateriais, os documentos, os artefatos, a estratigrafia e as estruturas, as implantações humanas e as paisagens naturais e urbanas, criadas para ou pelos processos industriais[..] (KÜHL, 2008, p. 51)

Segundo KÜHL (2006), a arqueologia industrial compete a vários campos de estudo, se constituindo como um esforço multidisciplinar. O levantamento de documentos, vestígios, análises de tipologias, edifícios e matérias, compõem um estudo das manifestações socio-físicas dos processos industriais. Neste sentido, no que refere a arquitetura industrial, o conjunto de valores que compõem os processos industriais, abordam os seus monumentos como um todo, visando o exame de seus processos construtivos, meios de produção, comunicação, energia e transporte. Por conseguinte, o interesse pela proteção, compilação de inventários e investigações dos testemunhos do processo de industrialização, se consolidaram ao longo das décadas pelo mundo. Desse modo, devese compreender sua preservação no âmbito de cultural, pois apresentam valores históricos, artísticos e simbólicos, reconhecendo sua perpetuação para as gerações futuras (KÜHL, 2008, p. 58). As discussões relacionadas a preservação do patrimônio industrial vêm ganhando espaço e movimentando organizações dedicadas a este fim, que realizam reuniões científicas periodicamente. Segundo KÜHL, a UNESCO movimentou grupos específicos para defini critérios e lapidar os estudos para incluir a herança dos processos industriais na lista do Patrimônio Industrial e com participação do TICCIH (Comitê Internacional para a Conservação do Patrimônio Industrial). Durante o congresso internacional em 2003 na Rússia, realizado pela TICCIH, foi elaborada uma Carta - Carta de Nizhny Tagil sobre patrimônio industrial – com desígnio de salientar a importância do legado industrial e sua preservação, onde refere-se a Carta de Veneza. A Carta Nizhny Tagil foi apresentada à XV Assembleia Geral do ICOMOS (O Conselho Internacional de Monumentos e Sítios), 2005, onde foi reconhecido a importância do patrimônio industrial e assim propondo uma discussão específica acerca do tema na XVI Assembleia Geral do ICOMOS, em 2008. Realizada no Canadá, a Assembleia visava analisar os princípios e diretrizes propostas da carta e assim conquistar à aprovação da Assembleia Geral (KÜHL, p. 50). Figura [3.02] - Detalhe do ornamento Estação da Luz, SP. Disponível em: < https://www.flickr.com/photos/32283095@ N05/4471129423/> Acesso em 15 de abril de 2020 - modificado pela autora.

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A partir do documento aprovado pela Assembleia Geral, constituise as definições acerca do Patrimônio Industrial e Arqueologia Industrial constadas na Carta de Nizhny Tagil [p.03]: DEFINIÇÃO DO PATRIMÔNIO INDUSTRIAL: O património industrial compreende os vestígios da cultura industrial que possuem valor histórico, tecnológico, social, arquitectónico ou científico. Estes vestígios englobam edifícios e maquinaria, oficinas, fábricas, minas e locais de processamento e de refinação, entrepostos e armazéns, centros de produção, transmissão e utilização de energia, meios de transporte e todas as suas estruturas e infra-estruturas, assim como os locais onde se desenvolveram actividades sociais relacionadas com a indústria, tais como habitações, locais de culto ou de educação. DEFINIÇÃO DO ARQUEOLOGIA INDUSTRIAL: A arqueologia industrial é um método interdisciplinar que estuda todos os vestígios, materiais e imateriais, os documentos, os artefactos, a estratigrafia e as estruturas, as implantações humanas e as paisagens naturais e urbanas, criadas para ou por processos industriais. A arqueologia industrial utiliza os métodos de investigação mais adequados para aumentar a compreensão do passado e do presente industrial.

Considerações importantes presentes na apresentação da carta, pertinentes sobre sua FINALIDADE [P.02]: Os delegados reunidos na Rússia por ocasião da Conferência 2003 do TICCIH desejam, por conseguinte, afirmar que os edifícios e as estruturas construídas para as actividades industriais, os processos e os utensílios utilizados, as localidades e as paisagens nas quais se localizavam, assim como todas as outras manifestações, tangíveis e intangíveis, são de uma importância fundamental. Todos eles devem ser estudados, a sua história deve ser ensinada, a sua finalidade e o seu significado devem ser explorados e clarificados a fim de serem dados a conhecer ao grande público. Para além disso, os exemplos mais significativos e característicos devem ser inventariados, protegidos e conservados, de acordo com o espírito da carta de Veneza, para uso e benefício do presente e do futuro¹.

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¹A Carta do Património Industrial deverá incluir as importantes Cartas anteriores, como a Carta de Veneza (1964) e a Carta de Burra (1994), assim como a Recomendação R(90) 20 do Conselho da Europa.


Neste sentido, o patrimônio ferroviário é incorporado ao patrimônio industrial, bem como seus trilhos, maquinário e estações. No Brasil, as discussões frente a preservação do patrimônio Industrial tem por início o I Seminário Nacional de História e Energia, em 1986 e a elaboração da Declaração em Defesa das Construções e Instalações Utilitárias, década de 90 – também conhecida como Declaração de Campinas - , documento constituído pelos membros do participantes do Grupo de História e da Técnica, da UNICAMP. Atualmente as questões referentes ao patrimônio ferroviário são pertinentes ao IPHAN e outros órgão estudais. Como descrito pelo Iphan:

A Lei 11.483, de 31 de maio de 2007, atribuiu ao Iphan a responsabilidade de receber e administrar os bens móveis e imóveis de valor artístico, histórico e cultural, oriundos da extinta Rede Ferroviária Federal SA (RFFSA), bem como zelar pela sua guarda e manutenção. Desde então o Instituto avalia, dentre todo o espólio oriundo da extinta RFFSA, quais são os bens detentores de valor histórico, artístico e cultural.

Este patrimônio engloba desde as estações, até os pátios, armazéns, rotundas, terrenos e trechos de linha, até material rodante, como locomotivas, vagões, carros de passageiros, maquinário, além de bens móveis como mobiliários, relógios, sinos, telégrafos e acervos documentais. Apesar abraçar todos estes elementos, a tutela não se estende sobre estes. Apesar dos avanços frente ao campo dos remanescentes industriais, é notório que os processos de tombamento e práticas preservacionistas são reduzidas a produção arquitetônica, em geral as estações. A compreensão restrita dos bens pertencentes ao patrimônio ferroviário, exclui dos processos de preservação as conexões e suas estruturas, equipamentos e documentos que são de suma importância para o entendimento como um todo destes bens, por tanto é elimina-se sua complexidade. Entender este conjunto de elementos é fundamental para delimitar conceitos a respeito de sua proteção e reconhecimento (FREIRE; LACERDA, 2017).

Figura [3.03 e 04] - Detalhes da estação Barracão. Arquivo da autora. Abril de 2020

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PRINCÍPIOS DO RESTAURO Como descrito anteriormente, até o século XVIII, as práticas voltadas para a conservação dos monumentos históricos ocorriam ocasionalmente e eram realizadas por classes dominantes. Com a institucionalização do patrimônio histórico devido as ameaças contínuas da Revolução Francesa, o interesse cultural somou-se ao interesse político, consolidando a preservação como atividade sistemática. A partir deste momento, conflitantes teorias sobre as práticas preservacionistas foram difundidas pela Europa (FONSECA, 1997, p. 57-62). Dos conceitos voltados para as obras de restauro, o presente trabalho evidenciará os princípios de Camillo Boito, Gustavo Giovannoni e Cesare Brandi. As proposições teóricas de Eugène Emmanuel Viollet-le-Duc e John Ruskin (1819-1900), contribuíram para o desenvolvimento posterior de outras teorias frente ao restauro. Para Eugène Emmanuel Viollet-le-Duc (1814-1879), não considerava por absoluto a autenticidade do objeto. Seu método propunha a reconstituição da forma original e na ausência de informações precisas a respeito do objeto, supunha-se uma forma que fosse coerente com as obras do período em que o edifício se inseria. Assim, Viollet consolida suas práticas conservacionistas baseadas na reconstrução do estado original dos monumentos, até mesmo um estado que nunca houvesse existido: “restaurar um edifício é restabelecêlo num estado completo que talvez nunca tenha existido” (CHOAY, 2014, p. 160-166). Viollet considerava que a autêntica arquitetura nacional francesa era baseada na arquitetura gótica, a qual voltou sua dedicação. Porém, seus métodos foram mais tarde criticados, sobretudo com os conceitos descritos na Carta de Veneza, acusando suas obras de uma manifestação de falso histórico (FONSECA, 1997, p. 60-63). Em oposição aos conceitos de restauração de Viollet-le-Duc, John Ruskin (1819-1900) abordava a concepção do restauro em estilo como um atentado a autenticidade do objeto (CHOAY, 2014, p. 160). Ruskin era a favor da criação de uma organização europeia de proteção dos monumentos históricos. Para o inglês, os monumentos eram como objetos sagrados e insubstituíveis: “não temos direito de tocá-los. Eles

não são nossos. Eles pertencem em parte aos que os construíram, e em parte a todas as gerações da humanidade que virão depois de nós” (FONSECA, 1997 apud RUSKIN, 1956). Ruskin defende o ato de manutenção preventiva dos monumentos, se opondo ao movimento de restauração, denunciando a reconstituição ou cópia. Deste modo, ele apoia o anti-intervencionismo, baseado em sua concepção ética e moralista a respeito dos monumentos, pois considerava as impressões do tempo sobre aquele sua essência, ou seja, Ruskin defendia o movimento Anti-Restauro por se preocupar com a desagregação dos valos e princípios (éticos ou estéticos) do objeto (CHOAY, 2014). Camillo Boito (1853-1914), em 1893, formulou uma concepção frente a restauração, entre os extremos propostos por Ruskin e Viollet-le-Duc. Boito considerava a manutenção dos monumentos, assim a restauração seria uma ação extrema de intervenção, quando todos os outros meios de resguardar fracassam. Boito defendia intervenções mínimas nos edifícios e que deveriam ser evidenciadas, se mostrando não pertencentes da obra antiga. Para além disso, considerava que os acréscimos sucessivos ao longo das épocas deveriam ser respeitados e por conseguinte criticava a reconstituição de das partes extintas. Para ele, o tratamento aplicado a diferentes monumentos deveria ser afunilado e assim ele propõe intervenções em três âmbitos: para a antiguidade, um restauro arqueológico, onde a preocupação seja antes pela exatidão cientifica e quando houver a necessidade de reconstituição, essa considere apenas a massa e volume. Para o gótico, um restauro pitoresco, onde considere apenas seu esqueleto e assim ornamentações e decorações sejam abandonas à ruína. Por fim, os monumentos clássicos e barroco, propondo um restauro por totalidade do edifício. Os conceitos de Boito, estabeleceram critérios críticos enquanto disciplina frente ao restauro. (CHOAY, 2014, p. 166169). Até meados dos anos sessenta, do século XX, as práticas voltadas para conservação dos monumentos históricos concentravam-se nos edifícios religiosos e civis e quase sempre eram fiéis aos princípios de Viollet-le-Duc. A primeira conferência internacional dos monumentos históricos foi realizada 41


em Atenas, 1931. Esta, que marcou o início de diretrizes voltadas para a conservação do patrimônio cultural, elaborou princípios fundamentais para a preservação dos monumentos históricos em âmbito internacional. A conferência foi realizada dois anos antes da conferência dos CIAM, que mais tarde elaborou a Carta de Atenas de 1993. A Carta de Atenas de 1931 foi organizada pelo Escritório Internacional dos Museus Sociedade das Nações, onde destacou conceitos referente ao restauro do edifício individual. A Carta abordou considerações importantes destacadas por Giovannoni, que permitiu um evolutivo caminho para o entendimento do patrimônio no âmbito urbano. Seus conceitos evidenciaram a importância da preservação dos conjuntos antigos, não somente para a preservação da relação entre monumento e entorno, mas pelos próprios valores empregados a esses conjuntos. Em resposta às dinâmicas transformações que apontavam no início do século XX frente a sociedade e a cidade, em consequência da Revolução Industrial, surge o amadurecimento da disciplina do urbanismo. As ações voltadas para a preservação do monumento histórico eram precedidas pela destruição e reconstrução das cidades antigas europeias, onde se destacou especialmente os trabalhos de Haussmann, em Paris (CHOAY, 2014, p. 189193). O conjunto de intervenções urbanísticas realizadas por Haussmann teve cunho higienista e fez com que a nova malha urbana da cidade, ocasionasse a destruição de grande parte dos bairros medievais em Paris. As intervenções de Haussmann embasaram e difundiram práticas semelhantes, essas intervenções tão pouco se preocuparam com as consequências que teriam sobre as cidades antigas e seus valores. Contudo, se consolidava cada vez mais o trabalho isolado dos monumentos históricos, com o desmantelamento de seu entorno (RUFINONI, 2009, p. 64-66). O Século XX foi marcado pelos embates entre propostas urbanísticas de cunho conservacionista – tratadas na Carta de Atenas em 1931 – e por aquelas de influência moderna, acendidas pela Revolução Industrial. Gustavo Giovannoni (1873-1943), engenheiro e urbanista, foi importante figura para as discussões que competem ao restauro, onde tange importantes contribuições para a compreensão do tecido urbano como patrimônio. Giovannoni foi considerado o primeiro autor a abordar o tema da preservação urbana empregando a expressão “patrimônio urbano”. O 42

urbanista considera que a arquitetura não deve ser compreendida apenas por objeto isolado, mas deve ser considerado seu contexto, por tanto deve ser respeitada a relação do edifício com seu entorno. Os conceitos de Giovannoni constituíram o método “desadensamento construtivo” – também chamado de restauro de liberação - dos conjuntos urbanos, que propunha intervenções pontuais para melhorias frente a salubridade. Essas intervenções consistiam em aberturas de espaços e cessação de obstáculos visuais, por tanto suas soluções conciliariam três fatores primordiais: desobstrução da circulação local, a conservação do aspecto artístico e o atendimento das necessidades higiênicas (RUFINONI, 2009, p. 85). Os conceitos do patrimônio urbano foram ampliados pela Carta de Amsterdã, 1975. Cesare Brandi ((1906-1988) foi grande seguidor do restauro crítico, no qual defendia diálogo entre valores estético e valores históricos do objeto, por tanto, no ato de restauro, as duas questões devem ser analisadas com o objetivo de definir qual instância deve prevalecer e ser considerada no restabelecimento da obra para não induzir um falso histórico ou artístico, respeitando os traços que o tempo imprime sobre a obra. Brandi defende que os mesmos princípios recomendados para as obras de arte – pinturas e esculturas – sejam aplicados igualmente sobre os monumentos históricos. Sua teoria permitiu importante ligação com o urbanismo, onde ele tange questões de como entender as conexões com o entorno e assim as questões da escala arquitetônica deve se estender ao ambiente em que ela se insere, por tanto deve ser empregado os mesmo instrumentos de restauros referente as obras individuais (RUFINONI, 2009, p. 120-124). A Carta do Restauro compila as contribuições de Boito e Brandi, estabelecendo o processo necessário que deve preceder o restauro. Com da extensão do conceito de patrimônio histórico sobre o âmbito urbano, somava-se a consolidação dos princípios do urbanismo modernos, apresentados a partir do Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna, os CIAM, onde foi elaborada a Carta de Atenas de 1933. A Carta sumariava os preceitos do urbanismo moderno, influenciados especialmente pelas ideias de Le Corbusier. Para além disso, o segundo pós-guerra interferiu diretamente no cenário das teorias frente ao restauro. O período representou uma rica reformulação das teorias sobre os novos conceitos de patrimônio e as particularidades do restauro. Para além, há uma


significativa participação de diferentes campos disciplinares, em vista da expansão de artefatos do qual a representatividade cultural passava por identificação e valorização (RUFINONI, 2009, p. 128). Em 1964, o II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos de Monumentos Histórico, resultou na redação da Carta de Veneza. Esta teve papel fundamental para sintetizar os embates entre os conceitos preservacionistas do urbanismo e aqueles de cunho modernista. A partir do documento aprovado pelo II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos de Monumentos Histórico, constitui-se as definições da Carta de Veneza:

DeFINIÇões: Artigo 1º - A noção de monumento histórico compreende a criação arquitetônica isolada, bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou de um acontecimento histórico. Estende-se não só às grandes criações, mas também às obras modestas, que tenham adquirido, com o tempo, uma significação cultural. A partir dos preceitos descritos nas Cartas apresentadas, podemos notar que os conceitos de patrimônio não se restringem mais apenas aos objetos isolados e “as grandes obras de arte” como ocorria no passado.

Figura [3.05 página 40] - Obra de restauro por Viollet-le-Duc. Disponível em: < https://br.pinterest.com/ pin/38843615527197082/> Acesso em 29 de abril de 2020 - modificado pela autora. Figura [3.06 página 40] - Desenho po John Ruskin. Disponível em: < https://br.pinterest.com/pin/639722322052203348//> Acesso em 29 de abril de 2020 - modificado pela autora. Figura [3.07 página 40] - Obra de restauro por Camillo Boito Disponível em: <https://twitter.com/romacristiana/status/688441588645781504/photo/3> Acesso em 29 de abril de 2020 - modificado pela autora. Figura [3.08] - Cidade de Siena, Itália. Classificada pela UNESCO como Patrimônio da Humaninada Disponível em: <https:// www.flickr.com/photos/22746515@N02/49817597312/> Acesso em 29 de abril de 2020 - modificado pela autora.

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Figura [3.09] - Vila Industrial Maria ZĂŠlia, SP. Detalhes da fachada. DisponĂ­vel em: <https://www.flickr.com/photos/alinealmeida/7523679754/> Acesso em 29 de abril de 2020 - modificado pela autora.

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PATRIMÔNIO URBANO E A PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO INDUSTRIAL Com a ampliação da noção de patrimônio e a mundialização das práticas e referências europeias, passaram a constituir o patrimônio histórico os monumentos, conjuntos urbanos sítios arqueológicos ou outros conjuntos que possuem representatividade história, artística ou científica. Diante deste fato, a Convenção Geral da Unesco em 1962 através da Recomendação Relativa à Salvaguarda da Beleza e do Caráter das Paisagens e Sítios, elaborou mediadas com fins voltados para a proteção das paisagens naturais e as paisagens e sítios formados pelo homem, em especial os sítios urbanos. Essa noção ampliada fez ascender a preocupação do estabelecimento do diálogo entre composição arquitetônica e o seu entorno, e assim, simultaneamente com as preposições da Carta de Veneza, as paisagens industriais obtiveram representatividade como patrimônio cultural (RUFINONI, 2009, p. 142). Dessa forma, foi possível analisar a elaboração posterior de múltiplos documentos com o intuito de aprofundar os tópicos particulares da Carta de Veneza. Essa valorização dos conjuntos urbanos permitiu a constituição de conceitos, diretrizes, práticas de proteção e conservação frente ao patrimônio urbano. Contudo, a Conferência geral da Unesco em Paris, 1972, aprofundou as questões relativas à reunião de 1962 e define: Art. 1º. Para fins da presente convenção, serão considerados como “patrimônio cultural”: - os monumentos: obras arquitetônicas, de escultura ou de pintura monumentais, elementos ou estruturas de natureza arqueológica, inscrições, cavernas e grupos de elementos que tenham um valor universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência; 25 - os conjuntos: grupos de construções isoladas ou reunidas que, em virtude de sua arquitetura, unidade ou integração na paisagem, tenham um valor universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência; - os sítios: obras do homem ou obras conjugadas do homem e da natureza, bem como as áreas que incluam sítios arqueológicos, de valor universal excepcional do ponto de vista histórico, estético, etnológico ou antropológico (UNESCO, 2004).

Para além disso, a Convenção propôs um sistema internacional de colaboração e apoio para a identificação e preservação dos bens culturais mundialmente representativos que seriam incorporados a Lista do Patrimônio Mundial.

As definições abarcadas pela Convenção embasaram diversos documentos posteriores, que visavam compreender os métodos de atuação com o planejamento urbano, buscando análises apuradas das configurações do tecido urbano. A Carta de Restauro de 1972 foi um importante documento sobre restauro publicada pelo Ministério da Instrução Pública da Itália. Nela consiste preposições específicas de atuação frente aos centros históricos (RUFINONI, 2009, p. 144). Tendo em vista a presente Carta, em relação às intervenções nos centros históricos, essas devem garantir a permanência de seus valores incumbidos das características do conjunto - pelo tempo. Sendo assim, devem ser conservadas não apenas as características formais de arquitetura, mas também de todos os elementos responsáveis por suas características:

ANEXO D - A coordenação se posicionará também em relação à exigência de salvaguarda do contexto ambiental mais geral do território, principalmente quando lhe houver assumido valores de especial significado, estreitamente unidos às estruturas tal como tem chegado até nós (como por exemplo, a cercadura de colinas históricas de Florença, a laguna veneziana, as centúrias romana de Valpadana, a zona trulli de Apulia, etc) (Carta do Restauro 1972, IPHAN). Os anexos presentes na Carta evidenciam as diferentes escalas de intervenção envolvidas na conservação de um ambiente construído. A incorporação da proteção e conservação dos conjuntos urbanos, passam a compor os instrumentos de planejamento urbano, tema que foi abordado com maior clareza no Congresso do Patrimônio Europeu de 1975 – onde foi redigida a Declaração de Amsterdã. A Declaração reafirma a ampliação da noção do conceito de patrimônio, contudo, há um incentivo de procedimentos apoiados no diálogo entre urbanistas e arquitetos restauradores (RUFINONI, 2009, p. 148). Como supracitado, os remanescentes industriai foram inseridos no conjunto de bens abrangidos pela ampliação da noção de patrimônio e assim, paralelamente com a ampliação das discussões acerca do urbanismo e o interesse da tutela das paisagens urbanas, crescia 45


a preocupação da persistência das estruturas industriais. Segundo RUFINONI (2009), o reconhecimento dessas estruturas permitiu a compreensão de particularidades de determinados conjuntos urbanos, assim reconhecendo seus valores históricos e estéticos. As particularidades de um conjunto revelam um ordenamento espacial específico para atender as funções das atividades industriais ali exercidas, portanto a preservação isolada de edifícios, não garante efeito para a manutenção da paisagem, contudo, a relevância cultural dos sítios está intimamente ligada a compreensão de suas especificidades que foram responsáveis pela delimitação da “personalidade” de uma dada região. A preservação do patrimônio industrial abrange inevitavelmente a escala urbana e, portanto, deve ser tratado aos moldes da conservação integrada, como citado através dos documentos discutidos anteriormente. Os procedimentos realizados em áreas desativadas e degradadas, necessitam ser articulados com os distintos fatores e dinâmicas urbanas. Deste modo, a inserção de novos elementos precisa estabelecer conexão com aqueles preexistentes e os novos usos devem ser adequando com a escala e o entorno do local. Em suma, deve haver cautela minuciosa com a reinserção das áreas restauradas em uma nova realidade (RUFINONI, 2009, p.181-182). Ainda segundo RUFINONI, referente ao cenário brasileiro, a autora cita a dificuldade de preservação das áreas desativadas, uma vez que essas compõem grande parcela do terreno urbano e devido a este mesmo motivo são cobiçadas pelo mercado imobiliário. A autora destaca que muitas intervenções, sejam em edifícios ou em sítios industriais, ignoram os princípios mais básicos do restauro, principalmente aqueles pertinentes a Carta de Veneza e os documentos posteriores que a complementam. De modo geral, as intervenções para áreas industriais, segundo a autora, tratam-nas como reservas de terrenos para novos projetos, assim os valores pertinentes as preexistências são ignorados. Neste contexto, conciliar a conservação do patrimônio urbano ao planejamento urbano, apresenta-se como um desafio. Projetos urbanos, exibem um eminente potencial frente a preservação do patrimônio e concomitante mente com o planejamento urbano, são ferramentas capazes de transformar a cidade e seus espaços. Neste sentido, a reabilitação urbana constitui-se como uma forma de ação integrada sobre o tecido, no qual o patrimônio é mantido e adaptado a novas funções, assim conservando e melhorando suas condições de uso. É pertinente ressaltar que essas ações visam a integração com a comunidade buscando atender suas necessidades e interesses, assim, não se tornam espaços excludentes. 46


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[ REFERÊNCIAS PROJETUAIS ] 48


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Figura [4.01] - Parque High Line, Nova York. Fonte: ArchDaily. Disponivél em: <https:// www.archdaily.com.br/br/627644/um-passeio-pelo-high-line-com-iwan-baan/542194d8c07a80a9910000a4?next_project=no> Acessado em 17 de abril de 2020 - modificado pela autora.

HIGH LINE PARK reconstrução da antiga linha férrea de manhattan em parque urbano Localização: Manhattan, New York Escritório: Diller Scofidio + Renfro / colaborações de James Corner Field Operations e Piet Oudolf Ano do Projeto: Fase I - 2009 / Fase II - 2011 / Fase III - 2014 Área: 2,5Km 51


Contexto O que hoje constitui o High Line, possuía configurações bem diferentes na década de 1930. No início dos anos 30, a Ferrovia Central de Nova York concebeu a linha férrea a oeste da cidade de Manhattan - área industrial - para transporte de mercadorias de abastecimento do município. Denominada “Live Line”, a linha elevada chegava a cerca de 10 metros acima do nível da rua, liberando a passagem do solo. Cerca de 4 décadas a linha atendeu bem as necessidades da região, perdendo vigor após o surgimento de veículos que tronaram possível a flexibilidade das rotas, fator que não era possível através do transporte sobre trilhos. Após 40 anos de sua constituíção, o elevado se encontrava em estado de abandono - tomado pela vegetação e em cosntante processo de degradação - a prefeitura de New York desejava demolir a linha elevada e foi a partir desse momento que, pela iniciativa de Joshua David e Robert 52

Hammond, criarama associção Friends Of The High Line para impedir sua demolição. 5 anos após a criação da associação - Friends Of The High Line – e seus esforços para a criação do projeto de um parque ao longo do ferroduto, foi aprovado e foi organizado - pelo Conselho da Cidade de New York - um concurso, ganho pelo escritório Diller Scofidio + Renfro com colaborações de James Corner Field Operations e Piet Oudolf. O projeto consiste em um parque linear de 2,5Km de extensão, partindo da Gansvoort Street, Meatpacking District, chegando a West 34th Street, em Hudson Yards., assim cruzando 3 bairros da cidade. A concepção do parque se estrutura em três fases, sendo a primeira tendo início após dez anos de planejamento em 2006 e finalizada em 2009 (seção I), a segunda em 2011(seção II) e a terceira em 2014(seção III).


NOVA YORK

MANHATTAN EUA

Figura [4.02 e 03] - Linha Férrea de Manhattan, 1934. Disponível em: < https://epoca.globo. com/colunas-e-blogs/viajologia/noticia/2013/09/bhigh-line-de-nova-yorkb-o-jardim-suspenso-da-babilonia-moderna.html>. Acessado em 15 de abril de 2020 - modificado pela autora Figura [4.04] - Vista High Line. Disponivél em: <https://www.flickr.com/photos/25077121@ N02/37504091930/. Acessado em 15 de abril de 2020 - modificado pela autora Figura [4.05] - Vista High Line. Disponivél em: < https://www.archdaily.com.br/br/627644/um-passeio-pelo-high-line-com-iwan-baan?adm _ edium=gallery>. Acessado em 15 de abril de 2020 - modificado pela autora

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We st SEÇÃO III 2014

Rio Hudson

34T HS T

SEÇÃO II 2011

5

We st

6

20T HS T 4 2 SEÇÃO I 2009

o entorno

O elevado sempre causou impacto na configuração no desenho urbano da cidade. Em sua primeira atividade - como linha férrea para abastecimento da cidade – sua contribuição para a economia foi de fato grandiosa, mas concomitantemente as consequências na paisagem urbana também. O elevado se colocava na paisagem como uma barreira física, desvalorizou sem entorno devido a poluição sonora e visual. Após o cumprimento de sua função, a estrutura abandonada, We passa a ser objeto de reestruturação urbana para promover novo st 3 0TH ST aspecto a cidade. O intuito de sua implantação era a revitalização de uma área em processo de degradação e totalmente obsoleta, constituindo área verde sobre a antiga plataforma dos trilhos e ainda promover desenvolvimento social do entorno, assim, os bairros originalmente industriais, passaram a ganhar novos programas e configurações como galerias de arte, museus, restaurantes, etc. Ao longo de sua implantação podemos perceber que há um grande desenvolvimento de equipamentos, lazeres e serviços, que movimentam toda a região. Apesar do parque surgir como meio de reativação da paisagem, houve alguns problemas intrínsecos a sua requalificação. O crescimento exorbitante da especulação imobiliária na região, afeta a vida de moradores que já habitavam a região antes da consolidação do High Line.

1- espaço para exposições 2- epaço de alimentação e atividades 3- espreguçadeiras 4- mirante 5- arquibancada 6 - gramado contemplativo

2 3 1 Figura [4.06] - Vista aérea do parque. Fonte: Google Earth. Acesso em 12 de agosto de 2020 - modificado pela autora

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Gansevoort ST


ACESSOS E CIRCULAÇÃO O parque se insere na paisagem de forma linear e seu percurso em alguns momentos é conduzido pelos estratos vegetativos e o mobiliário. Dessa forma o caminhar não se torna exatamente definido, se abrindo para áreas de permanência e redirecionando o percurso, o tornando menos monótono. O elevado conta com dez unidades de acessos distribuídas ao longo de sua extensão. Em média a cada duas ruas encontramos escadas que dão acesso ao parque, cinco delas contém elevadores para pessoas de mobilidade reduzida.

Programa e atividades Com uma extensão de 2,5Km, o parque possui uma diversidade de programas e atividades. Os espaços de permanência configuram infinitas possibilidades de se apropriar do local. Vão desde espaços de contemplação, locais de descanso, bancos, mirante, arquibancadas a céu aberto, unidades básicas como praça de alimentação e sanitários, locais de interação com água e canteiros com vegetação. Devido a flexibilidade de apropriação do espaço, o parque não configura predefinições de atividades e zonas programáticas, ou seja, não é possível estabelecer uma relação de programas.

Figura [4.07] - Esquema de acesso ao parque. Disponível em: <https://i.pinimg.com/originals/42/ de/44/42de44e06057f059493bb64a8e33e5ad.jpg>. Acesso em 12 de agosto de 2020 modificado pela autora

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mobiliário O mobiliário do parque vai desde bancos, arquibancadas, espreguiçadeiras e decks. Todos eles conversam com o design linear do High Line, seguindo sempre um caráter retilíneo. Os bancos surgem como a continuação do próprio piso, saindo do dele e se transformando em assentos, acentuando a continuidade na paginação e permitem que os usuários se apropriem do espaço de várias maneiras. Os assentos são de madeira, e permitem o prolongamento de sua durabilidade, fazendo com que não haja necessidade de substituição e manutenção constantes. Podemos notar que sempre acompanham os bancos, elementos de drenagem e iluminação. Além disso, sem sua maioria, as áreas de permanência sempre são acompanhadas de vegetação, que proporcionam sombras, locais mais frescos e agradáveis, além da interação com a natureza.. METAL

MADEIRA CONCRETO

ELEMENTO DE DRENAGEM

Figura [4.08] - Espreguiçadeiras. Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/joevare/3615428494/in/pool-1704227@N21/>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora Figura [4.09 e 10] - Imagens dos programas. Disponível em: <https:// www.thehighline.org/photos/at-a-glance/best-of/?pages_loaded=3>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora Figura [4.11] - Espreguiçadeiras. Disponível em: <https://www.thehighline. org/photos/by-photographer/?>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora

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Figura [4.12] - Apropriação do espaço. Disponível em: <https://fhl-website.s3.amazonaws.com/content/uploads/2018/06/25195001/11_gallery_ programscomm_publicprograms0 _ 236_lizligon.jpg>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora

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Iluminação Como já citado anteriormente, a iluminação se faz presente em todos os elementos do parque como: bancos, trilhos, espreguiçadeiras, vegetação. Para além disso, os demais pontos de iluminação foram sempre instalados em altura média, para não ofuscar a caminhabilidade dos usuários, já que temos a forte presença de iluminação do seu entorno, assim o pedestre caminha com segurança e conforto devido ao caminho sutilmente iluminado. Para compor a iluminação foi feito o uso de LED, pois assim como em todos os elementos do High Line, o LED apresenta maior durabilidade e assim reduzindo a necessidade de substituição. Além disso as lâmpadas de LED, em relação a outras, não possuem mercúrio e assim não afetam a natureza. Ao percorrer o parque, podemos notar que a luzes são um complemento do seu entorno com sutileza. Além disso, a iluminação ressalta a vegetação e outros elementos durante a noite.

Paisagismo O projeto paisagístico do parque, busca a diversidade de espécies para proporcionar cores, alturas aromas distintos, mas sempre prezando por espécies nativas. Foi uma busca pela reprodução da aparência selvagem e nativa da vegetação, para reduzir custos e manutenções, já que as plantas locais resistem à seca. Foram cerca de 300 espécies plantadas após um estudo cuidadoso. Foi usado o sistema comumente encontrado para a implantação de telhado verde, dispondo de várias camadas de materiais que ajudam na drenagem, assim os canteiros retem o máximo de água possível.

Figura [4.13] - Disponível em: <https://www.thehighline.org/photos/by-photographer/?>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora Figura [4.14] - Mobiliário do parque. Disponível em: <https://www.flickr. com/photos/25077121@N02/29446826344/>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora Figura [4.15 e 16] - Disponível em: <https://www.thehighline.org/photos/ by-photographer/?>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora Figura [4.17] - Estruturação do piso. Disponível em: <https://www.theatlantic.com/entertainment/archive/2011/07/first-drafts-james-corners-high-line-park/240695/>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora

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materiais E PAGINAÇÃO DE PISO Para além dos materiais provenientes das antigas instalações – estruturas de ferros e outros elementos que preponderaram das antigas instalações – foram empregados outros materiais, respeitando a redução de manutenção e substituição para reduzir o descarte. Os materiais que constituem os elementos são o concreto prémoldado, madeira e o metal – resquícios das antigas instalações. O sistema implantado para a paginação de piso consiste em placas de concreto prémoldado, que permitem uma fusão entre as áreas verdes em um sistema gradiente. São quatro tipos de forma que permitem distintas configurações, assim há uma fusão bem clara entre equipamentos, vegetação e piso, para isso se tem um termo chamado “Agre-Tecture”. Além disso, as juntas abertas do piso, permitem a drenagem da água para amenizar o escoamento superficial. Segundo a descrição do próprio escritório

estado de ruína É importante destacar no High Line a decisão do escritório de manter a sua estrutura original, mantendo um design industrial e moderno. A opção pela não demolição da estrutura parte também do princípio de sustentabilidade que é bem predominante no projeto, assim reduz gastos, energia e o emprego de novos materiais. Os arquitetos decidiram evidenciar os detalhes industriais e mantê-los, assim as grandes de ferro foram usadas como guarda corpo, optaram pela reforma da estrutura industrial e até mesmo a valorização dos trilhos. A reforma dos trilhos trouxe a proposta da função original do elevado e são revelados ao longo do caminho pelo parque, se misturando com a vegetação e pavimentação de forma espontânea e assim permitindo sua contemplação. As estruturas de aço foram jateados para remover a pintura original e foram repintadas. Foram feitas algumas intervenções como impermeabilização e a retirada de algumas vigas onde houve a instalação das escadas, para que pudessem passar pela estrutura. O piso foi instalado sobre suportes para que houvesse espaço entre a estrutura, assim puderam instalar a parte elétrica e de irrigação. Figura [4.18] - Antiga estrutura. Disponível em: <https://www.thehighline.org/photos/by-photographer/steven-severinghaus/?pages_loaded=2>. Acesso em 19 de abril de 2020 - modificado pela autora

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Figura [4.18] - Parque Gleisdreieck, Berlim. Fonte: ArchDaily. Disponivél em: <https:// www.archdaily.com.br/br/762169/gleisdreieck-park-atelier-loidl/54c84b12e58ece457a000148-com_loidleb_ erlin_gleis2_ 01306202_ 01306210 _1814-jpg> Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora.

Parque Gleisdreieck TRANSFORMAÇÃO da antiga linha férrea de manhattan em parque urbano Localização: Berlim, Alemanha Arquitetos: Felix Schwarz, Andreas Lipp Ano do Projeto: 2013 Área: 31,5 Hectares 61


Contexto Gleisdreieck - “triangulo de trilhos” - é um dos mais recentes projetos arquitetônicos de Berlim responsável por contemplar áreas verdes e históricas. Finalizado em 2013, o parque se localiza na área dos pátios ferroviários de Anhalter e Potsdamer – principal ponto de encontro entre as duas principais ferrovias de Berlim -, onde, desde 1945 devido ao pós-guerra, constituía uma área ociosa e degradada. Localizado no coração de Kreuzberg, o parque reinseriu a área na malha urbana e modificou intimamente seu entorno, este, marcado pela história. A cidade de Berlim teve uma acelera industrialização, porém, após o difícil período segundo pós-guerra, a área de foi abandonada e escondida pela vegetação, chegou a servir como lixão. A vegetação selvagem que assumiu o local gerou uma biodiversidade local. Através de 62

uma pesquisa realizada em 1980, registrou 413 espécies diferentes de plantas, outra pesquisa mostrou certa de dez mamíferos e 112 espécies de borboletas. Em setembro de 1997, o Departamento do Senado apresentou seu conceito para o desenvolvimento do parque. O projeto contou com a participação dos cidadãos, que permitiu acrescentar um caráter íntimo ao parque. Com cerca de 31,5 hectares de espaços verdes de lazer, o projeto foi desenvolvido entre os distritos de Kreuzberg, Schöneberg e Yorckbrücken, naturalmente dividido pela linha ferroviária. A primeira seção foi inaugurada em 2011, Kreuzberg e a segunda em 2013, Schöneberg. O conceito do projeto, foi o enfoque do desenvolvimento futuro e a mudança da imagem visual do local. O parque carrega a história, mas traz a modernidade.


ALEMANHA

KREUZBERG SCHÖNEBERG

EUROPA

Figura [4.30] - Linha Férrea de Berlim, Alemanha XIX. Disponível em: < http://goeasyberlin. de/wp-content/uploads/2016/07/20160 _ 72_ 3G _ leisdreieck-3.jpg>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.31] - Área do parque, 1943. Disponivél em: <https://www.publicspace.org/works/-/ project/g047-park-am-gleisdreieck>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.32] - Parque Gleisdreieck . Disponivél em: <https://www.archdaily.com.br/br/762169/gleisdreieck-park-atelier-loidl/54c84af6e58ece5c5e000157-com_loidleb_ erlin_gleis2_ 01306202_ 01306210 _ 1633-jpg?next_project=no>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

BERLIM

Figura [4.33] - Parque Gleisdreieck . Disponivél em: <https://www.agendaberlim.com/antiga-ferrovia-vira-parque-urbano-berlim-gleisdreieck/>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

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SEÇÃO II WESTPARK 2013

1

8 5 4 2

1

SEÇÃO III Gargalos 2014

7 SEÇÃO I OSTPARK 2011

1- TRILHA DESERTO 2- RELÍQUIAS FERROVIÁRIAS 4- JARDIM DAS ROSAS 5- ESPAÇO DE INTERAÇÃO COM A NATUREZA 6 - ACADEMIA 7- PEQUENA FLORESTA 8- CASCALHO ECOLÓGICO

2 1 Figura [4.34] - Vista aérea do parque. Fonte: Google Earth. Acesso em 12 de agosto de 2020 - modificado pela autora

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o entorno A área teve grande importância em sua primeira função, já que marcava o entroncamento das principais linhas férreas bem no centro da cidade. Diante deste fator, o local se tornou grande alvo para os bombardeios durante a guerra o que levou a dizimação de todo o entorno, e assim, a área permaneceu vazia durante muito tempo. Ao longo do tempo, com a reunificação e os processos urbanos da cidade, logo permitiram a edificação dos lotes vazios. Todavia, os resquícios históricos da catástrofe que havia preponderado no local abrem espaço para um local público. No entorno do parque podemos notar edificações altas e empreendimentos, assim o parque surge como um respiro urbano, reintegra as áreas residuais na malha urbana e cria uma conexão norte a sul. Para além disso, Gleisdreieck é integrado com o sistema regional de ciclovias e sua inserseção é privilegiada, já que está próximo a equipamentos importantes como a praça Portdamer Platz, ao Museu Alemão de Tecnologia e ao bairro da estação Anhalter. O parque surge como uma costura da antiga malha urbana recortada pela ferrovia e integra a paisagem urbana, as ruínas dos trilhos e o espaço verde.

Programa e atividades O design compõe os princípios básicos da arquitetura da paisagem, o parque se constitui de configurações simples, sem muitos ornamentos e detalhes finos. Ele integra elementos construtivos e elementos vegetativos, estimulando a contemplação e ao mesmo tempo atividades esportivas. Com uma configuração simples e clara, o Parque Gleisdreieck dispõe de pequenos bosques, florestas, terraços, áreas de esporte e a praça central. É possível notar, que os equipamentos e atividades se concentram pelo perímetro do parque, mantendo os grandes gramados de contemplação ao centro, por tanto, essa configuração facilita o acesso cotidiano pelo público, pois além de se encontrarem no perímetro ficam próximos as entradas [mapa p. 70]. O parque surge com uma forte intenção poética, segundo o próprio escritório. A intenção era abrir os espaços para interpretação dos usuários, assim, apesar das áreas de recreação, exercícios e esportes, o parque não delimita como deve ser usado. Durante o verão, os grande gramados são abertos as várias formas de utilização, enquanto no inverno se constitui como o pista de patinação.

aCESSOS E CIRCULAÇÃO O parque possui 14 acessos distribuídos ao lingo de seu perímetro, esses são como prolongamento das ruas que lhe dão acesso e assim segue a mesma linguagem da malha de Berlim.

Acessos

Sanitários

Quadra poliesportiva

Vôlei de praia

Parque Infantil

Pista de skate

Área para cães Bocha

Tenis de mesa

Quadra de basquete

Horta comunitário

Figura [4.35] - Implantação do parque . Disponivél em: <https://www.stadtentwicklung.berlin. de/aktuell/wettbewerbe/ergebnisse/2006/gleisdreieck/pix/sla_10008_ 00.jpg>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

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Figura [4 .36, 37, 38 e 39] - Quadra Poliesportiva . Disponivél em: <https://www.archdaily.com.br/br/762169/gleisdreieck-park-atelier-loidl?ad_source=search&adm _ edium=search_resulta_ ll>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.40 e 41] - Jogos . Disponivél em: <https://www.publicspace. org/works/-/project/g047-park-am-gleisdreieck>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.42] - Quadra e Vôlei . Disponivél em: <https://www.publicspace.org/works/-/project/g047-park-am-gleisdreieck>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

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paisagismo materialidade mobiliário Como supracitado, o projeto paisagístico foi reconhecido por sua simplicidade, assim o parque integra bosques intocáveis - que conservam as áreas dos trilhos que foram escondidos pela vegetação selvagem -, jardins de rosa, os jardins de cascalho e os vastos gramados. Os arquitetos usaram concreto, aço e principalmente madeira e assim garantir a redução de manutenção. O mobiliário do parque também se alterna entre madeira, aço e concreto e vão de bancos, arquibancadas, brinquedos e equipamentos de ginástica. Podemos notar o uso de cores e cascalhos nas áreas de atividades, assim temos uma brincadeira com texturas e uma ferramenta para chamar a atenção dessas áreas.

O NOVO E O ANTIGO Os trilhos desativados que foram tomados pela natureza selvagem, permanecem em pequenos bosques ao longo do parque. Muitas estruturas foram mantidas e assim sempre ressaltam a história do local. Como alguns trilhos cortam o parque e os trens atravessam de seu galpão para o Museu Alemão de Tecnologia uma vez por mês, as estruturas de sinalização foram mantidas e garantem a segurança dos usuários de Gleisdreieck.

Figura [4.43] Imagem das quadras. Disponivél em: <https://aplust.net/imagenesb_ log/loidl/aplust-loidl-berlin-01.jpg>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.44] Imagem do gramado. Disponivél em: <https://www.flottwellhotel.de/gallery/wp-content/uploads/sites/6/nggallery/Gallery---Park-am-Gleisdreieck/flottwell-berlin-hotel-park-am-gleisdreieck-7.jpg>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.45] Instalações antigas e o parque. Disponivél em: <https://landezine-award.com/ wp-content/uploads/2017/07/BerlinG _ D_15OST.jpg>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.46] Sinalização antiga. Disponivél em: <https://www.agendaberlim.com/wp-content/ uploads/2015/06/Parque-Gleisdreieck-Agenda-Berlim-5.jpg>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

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Figura [4.47] - Parque Domino, NY. Disponivél em: <https://images.adsttc.com/media/ images/5ca8/cfa4/284d/d113/c900/0bc3/slideshow/FEATUREF_ OD _ OMINOP_ARK0 _ 8T_HE_LAWN_ BARRETTD _ OHERTY.jpg?1554567064> Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora.

Parque domino transformação da antiga Fábrica de Açúcar Domino Localização: NOVA YORK, NY - EUA Arquitetos: James Corner Field Operations Ano do Projeto: 2018 Área: 365 M 71


Contexto O que já foi a maior e mais produtiva refinaria do mundo, atualmente se constitui o Park Domino. Localizado no Brookling, na orla de East River, o parque homenageia e celebra a história industrial. Dos mesmos criadores do High Line, Domino deu vida aos terrenos que se tornaram ociosos devido à queda das atividades industriais da refinaria, sendo fechada em 2004. O projeto integra cerca de 30 relíquias recuperadas da antiga função do local como tanques de xarope, colunas do antigo deposito, guindastes de pórtico e outros artefatos, onde recria o passeio pela história. Segundo as descrições do escritório, o parque visa estratégias de sustentabilidade e resiliência para o local. Em 2012, após anos de inatividade do local o terreno foi comprado e os primeiros debates projetuais começaram a despontar, e assim, para além 72

do projeto do parque, foi elaborado pela Shop Architects um master plan para toda a áreas. Os master plan prevê o aumento de áreas verdes no local, reutilização da refinaria como espaço para escritórios, quatro novos edifícios de uso misto que abrigaram 700 unidades de habitação com preços acessível, lojas e espaços comunitários além dos projetos de sustentabilidade ambiental, voltados para os problemas frete as enchentes. O sistema de infraestrutura foi elevado, a ruas inclinadas para que a água das enchentes escoe até o rio e seja drenada facilmente, além de retirar os edifícios da orla para que estruturas como ruas e parques implantados, sejam como esponjas. A criação e extensões de quarteirões conecta o parque com a vizinhança e assim proporcionam fácil acesso e integração do local.


NOVA YORK

EUA

BROOKLING

Figura [4.48] - Antiga Usina Domino. Disponivél em: <https://pxhere.com/pt/photo/333613>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.49] - Antiga Usina Domino . Disponivél em: <http://www.pristina.org/fotografia/domino-sugar-factory-paul-raphaelson/>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.50 e 51] - Parque Domino, Brookling . Disponivél em: <https://ndga.wordpress. com/2019/11/12/sinalizacao-e-identidade-domino-park/>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

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Grand ST

EAST RIVER

REFINARIA DOMINO WILLIAMSBURG

S 5th ST Ponte de Williamsburg

Figura [4.52] - Vista aérea do parque. Fonte: Google Earth. Acesso em 12 de agosto de 2020 - modificado pela autora Figura [4.53] - Implantação do parque . Disponivél em: <https://www.archdaily.com.br/br/917748/ parque-domino-james-corner-field-operations/5ca8cfea284dd1149400003d-domino-park-james-corner-field-operations-plan>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

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acessos e circulação O parque pode ser facilmente acessado ao longo de sua extensão. Podemos notar dois principais eixos de circulação: um paralelo a orla e o outro a avenida [figura 66]. Esses eixos são cortados por caminhos menores e perpendiculares que surgem como um prolongamento das ruas. O passeio é definido pelos espaços de permanência e atividades e assim eles delimitam a circulação.

programas e atividades Domino possui uma divisão programática bem definida. Dividido em três áreas, o parque contempla a estância de lazer ativo com áreas para cães, bocha, quadra de vôlei e um campo flexível [figura 67 e 73]. Esta se encontra em da água que faz a transição para a outra extremidade, o lazer contemplativo.

Lazer ativo Bocha campo fLEXÍVEL área para cães QUADRA VÔLEI

CAMINHO DOS ARTEFATOS

O lazer contemplativo se volta para extremidade que está resguardada de grandes avenidas e movimento, compondo a praia, um extenso gramado, playground, praça de alimentação e um loung [figura 66]. Como supracitado, muitos elementos da antiga fábrica foram usados em sua composição, fortemente notado no playground. Projetado pelo artista e designer Mark Reigelman, o playground imita uma mini refinaria, onde inclui alguns remanescentes industriais e celebra de uma maneira divertida a história. O parque foi elevado devido as inundações. Para isso, ele se constitui como um deck. Para não perder a intenção projetual, foi feito um recorte no deck que permite a visualização das estruturas antigas, além de permitir permeabilidade [figura 74].

Praça da água ABERTURA NO PIER

TANQUES DE XAROPE

ARQUIBANCADA E FONTE DE ÁGUA

Lazer contemplativo PLAYGROUND ÁREA DE ALIMENTAÇÃO LOUNG PASSARELA ELEVADA

PARAFUSOS

GUINDASTES

REFINARIA EM MINIATURA

GRAMADO

PRAIA

PONTE COLUNAS DE ARMAZENAMENTO DE AÇICAR

TRILHOS DO GUINDASTE GRUAS

TRANSPORTADOR

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Figura [4.54 e 55] - Mobiliário . Disponivél em: <https://images.adsttc. com/media/images/5ca8/cfc4/284d/d113/c900/0bc4/slideshow/ FOD _ OMINOP_ARK_13T_HEF_ OUNTAIN B_ ARRETTD _ OHERTY.jpg?1554567097>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.56 e 57] - Mobiliário . Disponivél em: <https://saopaulosao. com.br/exemplos/3952-domino-novo-parque-infantil-em-nova-york,-revitaliza-%C3%A1rea-no-bairro-do-brooklin.html#>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.58] - Mobiliário . Disponivél em: <https://gothamist.com/ arts-entertainment/first-look-at-williamsburgs-gorgeous-new-domino-park-on-the-east-river>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.59 e 60] - Mobiliário . Disponivél em: <https://tribecacitizen. com/2018/06/22/field-trip-domino-park/>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

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material mobiliário Paisagismo Como já citado, muitos elementos da antiga refinaria foram incorporados no projeto, sendo assim, a madeira utilizada na composição do mobiliário é recuperada do antigo piso da fábrica. Temos também a presença do concreto na paginação de piso, além de ser permeável. O aço também faz parte da composição dos materiais, presente no mobiliário, brinquedos e os próprios artefatos recuperados. O mobiliário compõe bancos, espreguiçadeiras, arquibancada, passarela e o playground. Os bancos e espreguiçadeiras são compostos por madeira e metal preto, o playground, para além de peças recuperadas, também utiliza de madeira e aço recuperados da antiga refinaria. A passarela que acompanha grande parte do parque foi erguida por colunas metálicas. Os canteiros que compõe o paisagismo são regulares e possui uma variedade de plantas nativas. Esses se configuram de modo a guiar o passeio e delimitar programas. Cerca de 43% do parque é vegetado, com aproximadamente 175 árvores.

O antigo e o novo É pertinente ressaltar que o projeto não visou apenas respeitar o antigo, mas também os incorporar ao novo projeto. Este fator evidencia de maneira íntima a presença histórica do local e não apaga seus valores.

Figura [4.61] - Mobiliário . Disponivél em: <https://vemprany.com/post/175110915928/domino-park>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.62] - Detalhe da pavimentação. Disponivél em: <https://ndga.wordpress. com/2019/11/12/sinalizacao-e-identidade-domino-park/>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

Figura [4.63] - Tanques de xarope . Disponivél em: <https://saopaulosao.com.br/exemplos/ 3952-domino-novo-parque-infantil-em-nova-york,-revitaliza-%C3%A1rea-no-bairro-do-brooklin. html#>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora Figura [4.64 e 65]- Detalhe do paisagismo e antiga Fábrica. Disponivél em: <https://theculturetrip.com/north-america/usa/new-york/articles/domino-park-adds-a-touch-of-sweetness-to-the-williamsburg-waterfront/>. Acessado em 1 de maio de 2020 - modificado pela autora

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RELAÇÃO ENTRE O ANTIGO E O NOVO

REATIVAÇÃO DO ESPAÇO URBANO

TRANSFORMAÇÃO URBANA

RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS

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INTEGRAÇÃO RELAÇÃO COM A COMUNIDADE

SENTIMENTO DE PERTENCIMENTO

RELEVÂNCIA SOCIAL E AFETIVA As leituras projetuais apontadas ao longo do caderno nos mostram como projetos urbanos, quando relacionados com o patrimônio Industrial, geram equipamentos de lazer e recuperação urbana, para além da valorização e preservação patrimonial. Podemos também notar que todos os projetos procuraram a participação da comunidade e buscaram entender e atender o espaço urbano local e suas necessidades. 81


ANÁLISE DA ÁREA DE INTERVENÇÃO 82


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IPIRANGA

5 km

CENTRO

Figura [5.1 e 2] - Mapa da Cidade. Fonte: Google Earth. Acessado em 01 de junho de 2020. Modificado pela autora. Figura [5.3] - Configuração do Núcleo Colonial Antônio Prado, 1886. Fonte: DA SILVA MANHAS; MANHAS, 2011. Disponivél em: <https://www.ufmg.br/rededemuseus/crch/simposio/ CAPRETZA _ DRIANAE_MANHASM _ AXP_AULO.pdf> Acessado em 15 de abril de 2020 - modificado pela autora.

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escolha da área de intervenção A escolha da área de intervenção se deu pela importância que o Núcleo Colonial Antônio Prado teve para a cidade. O Núcleo constituiu a primeira expansão da cidade e ainda conta com a presença de importantes remanescente ferroviário do município, que contribuíram para a ascensão da terra do café. O mapa abaixo mostra a configuração do Núcleo colonial Antônio Prado cerca de 1886. Atualmente, o que constituiu o núcleo configura alguns dos mais antigos bairros da cidade como Ipiranga, Alto do Ipiranga e Campos Elísios. A área que já foi considerada periferia da cidade, hoje se encontra bem localizada, próxima ao quadrilátero central e com importantes vias de

acesso e apesar da próxima localização, se encontra na zona oeste da cidade e possui evidentes problemas de investimentos em infraestrutura, lazer, esporte e cultura. A escolha do terreno teve a preponderante influência dos remanescentes ferroviários. A estação Barracão, localizada no bairro Ipiranga – originalmente parte do núcleo colonial Antônio Prado. Parte de seus trilhos, pertencentes ao ramal que ligava Ribeirão a Sertãozinho, ainda é existente, percorrendo a Av. Rio Pardo. Sobre os trilhos a situação é precária, descarte de lixo e resíduos, habitações irregulares e usos informais, deixam os trilhos esquecidos.

Segunda seção “Barracão de cima”

Terceira seção “Barracão de Baixo”

Sede

Quarta seção Núcleo Urbano

N

Primeira seção E.F Cia Mogyana

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Figura 5.04 - Uma das portas fechadas da Estação Barracão. Fonte: autora. Acessado em 1 de junho de 2020.

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A terra do café Fundada em 19 de junho de 1856, antes de se tornar a locomotiva do café, Ribeirão Preto se consolidava como vila, apossamentos que mantinham uma economia de subsistência. Com o avanço do café para o interior do estado, as terras de Ribeirão Preto chamavam a atenção dos cafeicultores, devido a disponibilidade de terras férteis e por serem próximas aos centros de exportação. Atendendo os interesses dos fazendeiros e exportadores de café, os trilhos chegam à região e com eles surge a primeira estação em 23 de novembro de 1883. Provisoriamente localizava-se na atual Avenida Caramuru, porém, como localizava-se longe do núcleo urbano da cidade, logo foi construída uma nova estação, em 1885 na Rua General Osório. Essa configuração redirecionou a expansão da cidade para o que era o centro e desde então Ribeirão Preto se destacou no estado de São Paulo com uma economia diferenciada, baseada na cultura cafeeira (SILVA, 2007).

Figura [6.04] - Distribuição das sacas de café, cerca de 1886. Disponivél em: <https://www. ribeiraopreto.sp.gov.br/portal/arquivo-publico-historico/galeria/fotos-historicas> Acessado em 15 de abril de 2020 - modificado pela autora

Impulsionada pela “Lei de Terras” de 1850 - que idealizava a criação dos núcleos coloniais - nasce a primeira expansão urbana da localidade. Com a crise da mão de obra escrava, os fazendeiros com a necessidade de mão de obra para o café, passaram a disponibilizar pequena propriedades para imigrantes e assim surge uma expansão dos núcleos pelo estado entre 1885

e 1911, dentre eles o Antônio Prado que se localizava em terras devolutas de Ribeirão Preto. A idealização do núcleo era fixação de mão de obra que servissem as fazendas de café (SILVA, 2007). Localizado na área de várzea de Ribeirão Preto, junto ao córrego Retiro e a estrada de ferro Mogyana, que foram fatores definitivos de sua configuração, originariamente os lotes funcionavam como chácaras e se dispunham da estrada de ferro para escoamento dos produtos. Segundo Da Silva Manhas (2011), notou-se na década de 1920 um amplo crescimento de comércio local oriundos de pequenas produções. Foram, também, notáveis pequenas indústrias de necessidades mais básicas e outras ramificações de trabalhos voltando para manufatura. Com a crescente imigração para o núcleo, em 1900 a Estação Barracão é consolidada para receber e alojar essa população. Da estação sai a locomotiva que ligava Ribeirão Preto a Sertãozinho. A pesar de ser uma área próxima ao quadrilátero central, na época era considerado uma região de várzea da cidade. Desse modo o intuito do núcleo era ser um anexo da cidade que futuramente se tornaria uma cidade independente. Porém com o processo de emancipação em 1893, os lotes de domínio público passaram a ser privados, sendo assim, os lotes originais puderam ser comercializados e assim começam a surgir os bairros. Assim se deu a origem dos bairro barracão, em razão da estação barracão que ali se encontrava. O que hoje se da por Ipiranga, era considerado o “Barracão de cima” e o “Barracão de baixo” que mais tarde se tornou Campos Elísios. Para além da segregação causada pela própria linha férrea que dividia o bairro, o início desse zoneamento levou também à política de exclusão e desigualdade nos preços das terras, ou seja, além dos lotes serem mais baratos por falta de infra estrutura, o zoneamento visava expulsar focos de doenças e os pobres para longe da burguesia (centro). O esquema a seguir (p.92) mostra a distribuição das estações de Ribeirão Preto, porém, muitas não existem mais ou estão em total estado de degradação. Figura [5.05 - 17] - Estações ferroviárias de Ribeirão preto. Disponivél em: <https://www.estacoesferroviarias.com.br> Acessado em 20 de abril de 2020 - modificado pela autora.

87


Estação Ribeirão Preto 1883 Data da foto: 1963

Estação Guimarães 1890

88

Estação Luiz Miranda 1890

Estação Santa Tereza 1896 Data da foto: 1910

Estação Bonfim 1892 Data da foto: 1910

Estação do Alto 1911 Data da foto: 1982

Estação Barracão 1900 Data da foto: 1990


Estação Joaquim Firmino 1913 Data da foto: 1915

Estação Silveira do Val 1913 Data da foto: 1915

Estação Evangelina (velha) 1928 Data da foto: 1953

Estação Usina 1928 Data da foto: 1956

Estação Francisco Maximiano 1913 Data da foto: 1913

Estação Ribeirão Preto (SPM)1928 Data da foto: 1985

Estação Figueira (SPM) 1960 Data da foto: 1980

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edifícios industriais em ribeirão preto Como o esquema anterior exemplificou, a cidade possuiu além da Mogiana outras empresas ferroviárias. O complexo ferroviário da região era composto pela Cia. Mogiana, que contavam com o ramal de Sertãozinho e Jataí, o ramal Ribeirão Preto da SPM (Estrada de Ferro Santa Tereza) e o ramal Ribeirão Preto da E.F. Dumont. As operações da linha tronco Cia. Mogyana foram encerradas em 1964, juntamente com todo seu patrimônio, assim, as operações foram transferidas para a linha Variante Bento Quirino, sob domínio da Ferrovia Centro-Atlântica – ainda em operação para transporte de carga. A estação Luís Miranda foi inaugurada por volta de 1890 e por volta de 1940 foi desativada, não há registro da edificação. A estação Guimarães - também inaugurada por volta de 1890 e demolida em 1940 -, não possui registros fotográficos e nada sobrou da edificação, no local atualmente se encontra plantação de cana-deaçúcar. A maioria das estações foram desativadas nos anos 70 e 80. Muitas após a desativação foram demolidas, outras foram desativadas e tiveram seus trilhos suprimidos, e assim foram abandonadas a ruína. Sendo assim, no que se refere a tutela dos edifícios históricos da cidade, podemos notar que as poucas intervenções e ações de preservação se volta para os edifícios históricos de representatividade excepcional. Apesar dos edifícios e elementos do complexo ferroviário terem valor intrínseco para a configuração socioeconômica da cidade, muito pouco se sobrou das diversas estações que a cidade concebeu. A estação Barracão é a única tombada na cidade pelo decreto-lei 149, de 15 de agosto de 1969, a resolução do tombamento se deu em 7 de maio de 1982 (CONDEPHAAT). A estação Barracão foi inaugurada em 1 de junho de 1900 e fazia parte da linha tronco da Companhia Mogyana. Existe relatos de que antes de sua inauguração oficial, a estação funcionava como um barracão que recebia e abrigava os imigrantes que ali chegavam e assim derivou seu nome. Da estação, saia o ramal Sertãozinho e a partir de 1914, esse ramal passou a se ligar com o ramal de Pontal, da Cia. Paulista, concedendo a ligação entre as duas linhastronco principais das duas companhias. E em 1964, com a modificação da linhatronco da Mogiana, a estação passou a fazer parte do próprio ramal, ficando fora do tronco, e o ramal passou a sair da nova estação de Ribeirão. Com a estação Nova, a antiga linha foi ficando paulatinamente sem uso. 90

Figura [5.18] - Detalhes da Estação Barracão Arquivo da autora. Acessado em 15 de Maio de 2020 - modificado pela autora.


91


92


93


94


estação barracão ANÁLISE DA EDIFICAÇÃO Localização: Av. D. Pedro I esquina c/ rua Rio Grande do Sul, bairro Ipiranga, munic. de Ribeirão Preto, SP Linha Férrea: Companhia de Estradas de Ferro Mogiana Distância: Km 314.264 Data da construção: inauguração - 01-06-1900 Uso Original: estação ferroviária Uso Atual: sem uso Trilhos no Local: existentes, inoperantes Contexto: urbano Proteção Existente: estadual, CONDEPHAAT Estado de Preservação: integro Figura [5.19] - Estação Barracão. Fonte: arquivo da autora. Acessado em 07 de junho de 2020. Modificado pela autora.

Estado de conservação: considerável

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A barracão Como já estudado anteriormente, os assentamentos férreos mudaram a configuração das cidades por todo o mundo e deram origem a novos tipos de edificações. A tipologia advinda dos trilhos marcou o século da industrialização, onde as novas técnicas construtivas e o processo de pré-fabricação, constituíam as soluções formais das estações ferroviárias (p. 22). Segundo o estudo de KÜHL (1998), o transporte ferroviário exigiu um complexo de edificações, desde depósito para locomotivas ou vagões, oficinas, armazéns e outros. No brasil as estações apresentaram dois tipos de classificações: estações terminais e estações de passagem. As estações terminais configuram-se nas extremidades, enquanto as estações de passagem eram as intermediárias. As estações intermediárias conceberam vários tipos de linhas e podiam ser dispostos de várias maneiras, dessa forma, deram origem a outros tipos de estações: estação de entroncamento, estação de contato ou cruzamento de linhas. O edifício destinado aos passageiros buscava soluções formais de modo que, os locais fossem dispostos pela ordem de operações e que não houvesse conflito entre o embarque e desembarque de passageiros, mercadorias, bagagens e funcionários. A disposição deveria ocorrer de modo que seguissem as atividades realizadas pelos passageiros. Contudo, foi possível notar uma variação da disposição desses edifícios, essa dependia da separação de serviços ou disposição dos trilhos. A seguir, os esquemas exemplificaram a disposição das estações e foram retirados dos estudos de KÜHL (1998). A- a estação chamada de lateral, foi a composição mais usual das estações de passagem pelo mundo. sua disposição é paralela aos trilhos. B- as estações bilaterais e dividiam o embarque e desembarque de passageiros, sendo assim, essas configuravam dois edifícios paralelos aos trilhos e em lados opostos ad linhas. C- as estações chamadas de frontais eram dispostas perpendicularmente as linhas, sendo assim, o embarque era feito pelo centro da edificação. As estações em forma de L ou U era comumente edificações das estações terminais. D- a estação chamada de L dispunha suas funções de embarque na parte perpendicular às linhas e o desembarque na parte frontal. E- por fim as estações chamadas de U, que muitas vezes atendiam serviços locais e internacionais. 96

a

b

c

d

e

De acordo com o estudo, notoriamente a estação Barracão se encaixa na classificação de estações de passagem chamada lateral. Os trilhos são paralelos a estação, esta disposição é comumente notada das estações paulistas. As estações tiveram grande influência inglesa, uma vez que a primeira Companhia fundada no Brasil, foi formada em Londres - São Paulo Railway Company. Em sua maioria, os ingleses eram responsáveis pela elaboração dos projetos e tiveram papel importante no conhecimento técnico dos engenheiros brasileiros. Tendo em vista as informações supracitadas, foi possível observar a influencia inglesa na constituição das estações da Comapanhia Mogiana. Comumente as soluções arquitetônicas das estações são tijolos aparentes, cobertura em duas águas, telhas francesas e cobertura apoiada em mãosfrancesas de madeira. A seguir, alguns exemplos das estações da Companhia Mogyana de Estradas de Ferro:


Figura [5.20] - Estação Barracão. Fonte: arquivo da autora. Acessado em 07 de junho de 2020. Adaptação da autora.

Figura [5.21] - Estação do alto. Disponível em: <http://www. estacoesferroviarias.com.br/a/alto.htm>. Acessado em 07 de junho de 2020. Adaptação da autora.

97


PLANTA DE COBERTURA armazém

casa do chefe

P1

J3 J4

P3

J6

J1

P4

P1

P2

P3

P4

J1

J1

J1

P5

J2

estação PLANTA BAIXA

A disposição do edifício se da de forma retangular, com os trilhos paralelos a sua implantação. Através da planta, podemos perceber que a edificação possuía uma divisão bem definida de seus usos. Em seu corpo funcionava três programas: o armazém, a estação propriamente dita e a casa do chefe. Figura [5.22 a 25] - Desenhos técnicos da estação. Fonte: Denis Esteves, membro do Conppac (Conselho Municipal de Preservação do Patrimôni Cutural. Acesso em 5 de junho de 2020. Modificado pela autora.

98


VISTA 1 - ACESSO RUA RIO GRANDE DO SUL

A elevação 1 se volta para a rua Rio Grande do Sul onde se localizava a praça Antônio Prado que funcionava como esplanada para aqueles que ali chegavam. A praça foi murada e desassociada da estação com a implantação da rua Rio Grande do Sul. Atualmente, o que era a praça, foi incorporado pela escola EMEFEM Prof. Alfeu Luiz Gasparini. A fachada é inacessível, deste modo não foi possível seu levantamento adequado. Nesta fachada se encontra o acesso a casa do chefe da estação, ao saguão e ao armazém.

CORTE A Figura [5.26 a 29] - Detalhes da fachada. Fonte: arquivo da autora. Acesso em 5 de junho de 2020. Modificado pela autora.

99


CORTE B

VISTA 2 - AV. DOM PEDRO I

A fachada 3 está voltada para a Av. Dom Pedro I. Apesar de alguns agentes de degradação natural, temos a presença de grafite. A visualização desta é interrompida por alguns elementos urbanos e algumas árvores. Apesar dos obstáculos, foi possível mapear os danos.

VISTA 3 - ACESSO AV. RIO PARDO

A fachada 3 está voltada para a AV. Rio Pardo. Esta se encontra os trilhos - ainda existentes - e podemos notar que é a fachada mais afetada do edifício. Temos pontos afeados por desgastes recorrentes do tempo e a exposição a intempéries, mas temos a forte presença de grafites. 100


Colonização Biológica

Desgaste da Madeira

Pátina

Alteração de Material / Preenchimento de cimento

Grafite

Desgaste do Material

Figura [5.30 a 32] - Desenhos técnicos da estção. Fonte: Denis Esteves, membro do Conppac (Conselho Municipal de Preservação do Patrimôni Cutural. Acesso em 5 de junho de 2020. Modificado pela autora. Figura [5.33 a 36] - Detalhes da fachada. Fonte: arquivo da autora. Acesso em 5 de junho de 2020. Modificado pela autora. Figura [5.37 a 40] - Detalhes do interior. Fonte: Denis Esteves, membro do Conppac (Conselho Municipal de Preservação do Patrimôni Cutural em 11 de junho de 2005. Acesso em 5 de junho de 2020. Figura [5.41 a 48] - Detalhes da esquadrias. Fonte: arquivo da autora. Acesso em 5 de junho de 2020. Modificado pela autora.

Apesar de serem fotos antigas, podemos ter uma noção de como é o interior da estação. A primeira foto é o interior do saguão e a porta do acesso para a plataforma. A segunda foto, ainda no interior do saguão mostra o acesso para a sala de espera. A terceira foto são os guichês para bilhetes e telegramas. A ultima foto é o detalhe do forro tipo “saia-e-blusa”.

As aberturas de portas e janelas são de madeira maciça. Muitas estão com grafites e outas com partes quebradas. As esquadrias da fachada inacessível foram levantadas de acordo com os desenhos técnicos. TABELA DE ESQUADRIAS ID P1 P2 P3 P4 P5 J1 J2 J3 J4 J5

LARGURA 2.20 1.20 1.40 1.00 0.90 1.00 1.10 0.70 1.30 1.30

ALTURA 3.00 3.00 3.00 3.00 2.10 2.10 1.65 0.50 2.20 2.20

PEITORIL 1.00 1.00 1.90 1.00 1.00 101


esporte, cultura e lazer

+

Figura [5.49] - Mapa de equipamentos. Fonte: Google Earth. Acessado em 1 de junho de 2020. Adaptação da autora. Figura [5.50 a 56] - Iamgens dos pontos críticos dos núcleos de favela. Fonte: Arquivo da autora. Acessado em 1 de junho de 2020. Adaptação da autora.

102

+


O mapa ao lado mostra os equipamentos de maior fluxo da região. É pertinente ressaltar o grande número de instituições voltadas para educação ao longo da área. Públicas ou privadas, essas atendem toda a região e principalmente os bairros em que se encontram. Deste modo, em uma análise perceptiva do local, podemos notar que esses equipamentos geram um grande fluxo, principalmente de pedestres, sendo assim, quem percorre a área, se depara com obstáculos físicos e visuais como os destacados nas imagens. É relevante destacar que não há oferta de equipamentos voltados para lazer e cultura na região. Os espaços públicos de lazer existente, sofrem com a falta de infraestrutura e investimento. A população local relata a falta de manutenção, iluminação e segurança, sendo assim, a situação precária dos espaços obriga a população a não os usar. ESCALA DE ABRANGÊNCIA

TERRITÓRIO

BAIRRO

VIZINHAÇA

ENTIDADE MANTENEDORA PARTICULAR

MUNICIPAL

ESTADUAL

FEDERAL

EDUCAÇÃO (CRECHES E ESCOLAS) RELIGIÃO ABASTECIEMNTO (SUPERMERCADOS E FÁBRICAS) ESPORTE E LAZER

+

SAÚDE PATRIMÔNIO

103


1

uso e conservação

1

1

2

3

1

3

2

2 3

Figura [5.57] - Mapa das praças. Fonte: Google Earth.. Acessado em 7 de junho de 2020. Adaptação da autora. Figura [5.58 a 68] - Iamgens das praças presente na área de estudo. Fonte: Arquivo da autora. Acessado em 7 de junho de 2020. Adaptação da autora.

104


4

4

4

4

4

O mapa tem o intuito de mostrar um estudo detalhado das praças que se encontram no entono imediato da área de intervenção. Através de uma análise perceptiva, podemos notar que há um pequeno fluxo durante o dia na praça do Alto do Ipiranga. Geralmente, encontramos pessoas caminhando ou passeando com cachorros. No que se refere ao uso noturno, não há utilização do espaço, uma vez que falta iluminação adequada, vegetação alta e pontos de tráfico na região. A praça Corpo de Bombeiro está em total abandono, sendo até difícil reconhecer seu uso. Na praça da Ceterp, encontramos intervenções dos próprios moradores, no entanto, sem programas atrativos. Por fim, temos a praça Pedro Biagi, local de grande fluxo, principalmente pelos alunos da escola localizada ao lado. No entanto, o local não possui programas de uso atrativo, os equipamentos e mobiliários são simples e muitas vezes cobertos pela vegetação alta. Foi possível notar que a vegetação muitas vezes se torna um problema. A arborização da praça não possui manutenção, muitos troncos e galhos se encontram caídos e a maioria das árvores implantadas não são adequadas, já que as raízes são maiores e acabam danificando o calçamento e causando obstáculos para quem percorre a área. No geral, esses espaços apresentam problemas frequentes de conservação e manutenção, falta de mobiliário adequado e programas atrativos, segurança, iluminação e limpeza. 1

PRAÇA ALTO DO IPIRANGA

2

PRAÇA CORPO DE BOMBEIRO

3

PRAÇA DA CETERP

4

PRAÇA PEDRO BIAGI

105


uso do solo

O gráfico abaixo mostra a relação da faixa etária residente do local. Conclui-se que os programas propostos deveram ser baseados de acordo com a faixa etária da população para melhor alcançar as necessidades dos moradores (Fonte IBGE censo 2010).

15% 50%

55 A 89 ANOS

35%

106 106

0 A 14 ANOS

15 A 54 ANOS


O local foi a primeira expansão urbana da cidade, cuja primeiras denominações eram Barracão de Cima e Barracão debaixo (Ipiranga e Campos Elísios). Podemos notar - devido a sua primeira configuração – que a área possui uma conformação espontânea, mantendo muitas características de vilas. A AV. Dom Pedro cria um importante eixo de serviços e comércio que abastece toda a região. Desse modo temos um tráfego de veículos e pedestre intenso no local. No entanto, ao adentrar os bairros, notamos a diminuição de circulação. Apesar de observar estabelecimentos comerciais e de serviço, estes possuem uma escala menor e não geram grande deslocamento da população entre os bairros. Temos também a presença dos assentamentos irregulares na região. Edificados sobre parte dos trilhos ao longo da Av. Rio Pardo - apesar já serem bem consolidados - estes possuem uma grande precariedade de infraestrutura como falta de saneamento básico, pavimentação das vias e insalubridade, alto índice de adensamento e ocupação do solo.

SEM USO

VAZIOS

INSTITUCIONAL

COMERCIAL

ÁREA VERDE

PRESTAÇÃO DE SERVIÇO

INDUSTRIAS

RESIDENCIAL

Figura [5.69] - Mapa de uso do solo. Fonte: Google Earth. Acessado em 01 de junho de 2020. Adaptação da autora.

107 107


GABARITO PREDOMINANTE

108


Como é possível observar, o gabarito predominantemente térreo pode ser um fator positivo para a implantação do projeto, por tanto, com a pouca verticalização do bairro, não teremos grandes obstáculos que obstruam a ventilação, insolação e vistas para quem utilizar o parque. OCUPAÇÃO TÉRREA OCUPAÇÃO DE 2 PAVIMENTOS OCUPAÇÃO COM MAIS DE 3 PAVIMENTOS

Figura [5.70] - Mapa de gabarito. Fonte: Google Earth. Acessado em 1 de junho de 2020. Adaptação da autora.

109


ASSENTAMENTOS IRREGULARES

1

2

1

Favela dos Trilhos

2 Favela SBT Figura [5.71] - Mapa dos assentamentos irregulares da região. Fonta: Google Earth. Acessado em 1 de junho de 2020. Adaptação da autora. Figura [5.72 a 76] - Iamgens dos pontos críticos dos núcleos de favela. Fonte: Arquivo da autora. Acessado em 1 de junho de 2020. Adaptação da autora.

110


Na região temos a consolidação de dois assentamentos irregulares, a chamada favela Monte Alegre (SBT) e a favela dos Trilhos. O processo de assentamento desses núcleos se inicia por volta do final da década de 70. O núcleo conhecido como dos Trilhos, ocupa o antigo leito ferroviário que, segundo o plano viário da cidade, prevê a implantação de uma avenida. Toda a área está ocupada e possui altos índices de ocupação e demandam ações de controle. Apesar das habitações serem avaliadas de qualidade razoável pelo Plano, podemos notar que devido a alta densidade não há salubridade, as vielas entre as edificações não são asfaltadas, o esgoto corre a céu aberto e o descarte de lixo irregular é pertinente. Outro núcleo relativamente antigo é o conhecido como Monte Alegre (SBT), que apresenta uma qualidade habitacional relativamente razoável e previa um projeto de urbanização para o assentamento, porém segue ainda sem investimentos em infraestrutura. Segundo dados oferecidos pelo Plano Local de Habitação de Interesse Social, os núcleos de favelas estão localizados em áreas públicas municipais e em bairros bem consolidados, portanto, possuem fácil acesso a rede de infraestrutura, equipamentos urbanos e estabelecimentos comerciais e de serviço, por isso são consideradas consolidadas. No entanto, o acelerado processo de expansão da favela dos Trilhos, fez com que ações políticas como projeto de remoção desta - fossem consideradas, uma vez que há a diretriz para implantação da avenida (mapa p.112). As imagens ao lado mostram alguns exemplos que encontramos ao percorrer a área. Ao percorrer as ruas do núcleo Monte Alegre, notamos uma qualidade razoável de infraestruturas como ruas asfaltadas, menor densidade e habitações de qualidade considerável. No entanto, os assentamos do Trilho, encontramos situações precárias. Durante o caminho, encontramos esgoto a céu aberto e muitas vezes essa situação se encontra em frente as residências. As vielas, nas quais seriam a constituição da avenida, podemos notar a insalubridade, descarte de lixo, falta de asfaltamento, dentre outros problemas de saneamento. As tabelas a seguir mostram dados coletados pela prefeitura do município, através da tabela de Caracterização dos Núcleos de Favela de Ribeirão Preto, em 2010.

FAVELA DO SBT LOCALIZAÇÃO MONTE ALEGRE/ IPIRANGA

NÚMERO DE UNIDADES

ÁREA ESTIMADA 50,810 M²

POPULAÇÃO ESTIMADA 1.280

338

INFRAESTRUTURA E HABITAÇÃO SANEA M ENTO ENERGIA ELÉTRICA E BÁSICO ILUMINAÇÃO CONSOLIDADO

CONSOLIDADO

CONDIÇÕES DE ADENSAMENHABITABILIDADE TO CONSOLIDÁVEL

CONSOLIDADO

DÉFICIT ESTIMATIVA DE REMANEJAMENTO E/OU REASSENTAMENTO

FAVELA DOS TRILHOS LOCALIZAÇÃO MONTE ALEGRE/ IPIRANGA

NÚMERO DE UNIDADES

ÁREA ESTIMADA 279,36 M²

POPULAÇÃO ESTIMADA 1.190

238

INFRAESTRUTURA E HABITAÇÃO SANEA M ENTO ENERGIA ELÉTRICA E BÁSICO ILUMINAÇÃO CONSOLIDÁVEL

CONSOLIDÁVEL

CONDIÇÕES DE ADENSAMENHABITABILIDADE TO

CONSOLIDÁVEL

CONSOLIDADO

DÉFICIT ESTIMATIVA DE REMANEJAMENTO E/OU REASSENTAMENTO

A partir das tabelas elaboradas, podemos concluir que o reassentamento do núcleo dos Trilhos seria viável, já que temos como diretriz a implantação da avenida e contamos com a presença de uma ZEIS I próxima ao local e, por tanto, não afetaria o acesso desta população aos equipamentos básicos que estas já possuíam. 111


Circulação e mobilidade

I VIAS ARTERIAIS - VIAS EXPRESSAS IMPLANTADAS A IMPLANTAR II VIAS PRINCIPAIS - AVENIDAS IMPLANTADAS A IMPLANTAR III VIAS SECUNDÁRIAS - VIAS DE DISTRIBUIÇÃO E COLETORAS IMPLANTADAS CICLOVIA A IMPLANTAR

112


Através de uma leitura perceptiva da área somada aos mapas disponibilizados pela prefeitura, podemos ressaltar a importante implantação da continuação da Av. Rio Pardo, uma via relevante para a região, mas que é interrompida pelos assentamentos irregulares. A implantação prevê uma via de mão dupla e um canteiro central – atualmente ocupado pelas habitações irregulares. Além disso é previsto a implantação de uma ciclovia, que será de grande relevância para quem atravessa a região. Contudo, temos a estruturação de corredores de transporte público na Av. Dom Pedro. Com as obras iniciadas em 2020, o projeto prevê uma faixa exclusiva para a circulação de transporte público que, segundo a prefeitura municipal, o corredor de ônibus será implantado da Av. Fábio Barreto até a praça Amin Calil, Av. Mal Costa e Silva, Av. Capitão Salomão, Av. Dom Pedro I, Av. Luiz Galvão Cezar até a Rotatória Alceu Paiva Arantes. Podemos notar que a área e bem abastecida pela frota de transporte público, principalmente no eixo da Av. Dom Pedro, promovendo um grande fluxo de veículos e pedestres.

Figura [5.77] - Mapa do viário com as principais diretrizes. Fonte: Google Earth e mapas disponibilizados pela prefeiturada cidade. Acessado em 1 de junho de 2020. Adaptação da autora.

113


RESTRIÇÕES URBANÍSTICAS

2

114

1


ZUP – zona de urbanização preferencial: áreas dotadas de infraestrutura e condições geomorfológicas propícias para urbanização, onde são permitidas densidades demográficas médias e altas; incluindo as áreas internas ao Anel Viário ZUD I – zona de uso disciplinado: área interna ao Anel viário e região do município onde o uso e a ocupação do solo deverão ser disciplinados com o principal objetivo de reduzir o impacto das enchentes urbanas ZEIS I – zonas de interesse social: terrenos baldios ou subutilizados, nos quais deve ser proposta a produção de moradias de interesse social, equipamentos sociais, culturais etc. ZEIS II – zonas de interesse social: áreas ocupadas por comunidades em assentamentos precários e irregulares, com grande potencial de urbanização e produção de habitação de interesse social.

ZUP - Zona de urbanização preferencial

ZUD 1 - Zona de uso diciplinado 1

ZEIS 1 - Zonas de Interesse social

2

ZEIS 2 - Assentamento infrormal passivel de regularização

Figura [5.78] - Mapa da legislação urbanística. Fonte: prefeitura da cidaade. Acessado em 07 de junho de 2020. Adaptação da autora.

115


4

análise visual e perceptiva 3

5

4

1

3

2

2

Figura [5.79] - Mapa da visão serial. Fonte: Google Earth. Acessado em 07 de junho de 2020. Adaptação da autora. Figura [5.80 a 87] - Iamagens de pontos que mais chamam a atenção. Fonta: Arquivo da autora. Acessado em 07 de junho de 2020. Adaptação da autora.

116

1


5

A anålise visual e perceptiva destaca pontos que mais chamam atenção ao longo do percurso. Ao analisar os locais destacados, foi pensado como seria esses espaços, sendo assim, os desenhos nas fotos pretendem fazer um contraste entre a realidade e como poderia ser melhor.

6 6

7

7

8

8 117


diagrama síntese

AUSÊNCIA DE ÁREAS DE LAZER ATRATIVAS E EM BOM ESTADO MOBILIÁRIO PRECÁRIO ILUMINAÇÃO PRECÁRIA FRAGILIDADES

DESCARTE IRREGULAR DE RESÍDUOS FALTA DE INFRAESTRUTURA POUCO FREQUENTADO (ESTÍMULO PARA CRIMINALIDADE) FALTA DE RECONHECIMENTO DO PATRIMÔNIO LOCAL

LOCALIZAÇÃO ACESSÍVEL PRÓXIMO AO QUADRILATERO CENTRAL POTENCIALIDADES

EXISTENCIA DE ÁREAS VERDES E VEGETAÇÃO INTERESSE DA COMUNIDADE EM ÁREAS PARA USO PATRIMÔNIO HISTÓRICO, CULTURAL E URBANO

Figura [5.88] - Diagrama Síntese. Fonte: Desenho da autora. Acessado em 10 de junho de 2020. Figura [5.89] - Mapa da área. Fonte: Google Earth. Acessado em 10 de junho de 2020.

118


Criação de um parque linear que seja instrumento de reabilitação urbana para a região Valorização e recuperação do patrimônio ferroviário presente na região. Recuperação das áreas degradas. DIRETRIZES

Melhorias em infraestrutura Mobiliários e equipamentos atrativos Resgatar o espaço público Participação da comunidade

Promover novos usos e programas para estímular o uso e circulação da população local Promover uso do patrimônio local - trilhos e estação Melhorias na infraestrutura local OBJETIVOS

Incentivar a sustentabilidade e preseração Incentivar o esporte e lazer com programas que atedam devidamente as necessidades Promover cultura de acesso a todos Promover Sentimento de pertencimento

119


área de intervenção a escolha do terreno

OESTE

O terreno escolhido foi o fator direto da escolha temática do presente trabalho. A área sempre foi objeto de observação e pesquisa da autora, tanto por fatores físicos e sociais, como pelos notórios problemas urbanos presente na região. Localizado na Av. Rio Pardo, trecho por onde percorriam os trens do ramal Sertãozinho em direção a Estação Barracão, constitui um local assentamentos irregulares, degradado, com nítidos problemas sociais e urbanos. Esse trecho apresenta um local com maior integridade dos remanescentes de patrimônio industrial da cidade e por tanto além de possuir intrínseco valor cultural e social, é uma área cheia de memórias históricas de fatores físicos, sociais, econômicos e culturais, devendo ser considerada uma área de patrimônio urbano. Intervenções voltadas para a valorização patrimonial e somada a um planejamento urbano, podem gerar um espaço público dinâmico e qualitativo de grande potencial para a qualidade de vida da população.

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Estação Barracão Ventilação predominante


Figura [5.90] - Mapa da รกrea. Fonte: Google Earth. Acessado em 10 de junho de 2020. Modificado pela autora.

N

Figura [5.91, 92, 93, 94 e 95] - Fotos da Av. Rio Pardo. Fonte: Arquivo da autora. Acessado em 10 de junho de 2020.

LESTE

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a comunidade a importância da participação coletiva Segundo o artigo “Falando de arquitetura com estranhos”, de Daisy Froud, publicado na coletânea “Making good” e com os estudos elaborados durante o processo de desenvolvimento deste trabalho, foi possível observar a importância da participação da comunidade criação dos espaços urbanos. As pessoas que vivem nas cidades e por tanto a utilizam diariamente, tendem a reproduzir os espaços urbanos de acordo com suas necessidades e assim conseguimos trazer espaços bem planejados, de qualidade, atrativos e assim evitamos que s tronem espaços subutilizados.

• “Não, apenas entulhos são jogados e não tem espaço e nem atração para a população frequentar o espaço.”

Através da elaboração de um questionário, foi possível obter contato com moradores da região e pessoas que atravessam a área todos os dias. Diante deste fato, foi possível elaborar um levantamento de programas e atividades com participação da população, para assim criar o sentimento de pertencimento pela comunidade e procurar um uma proposta que não exclua a população, mas seja acessível a todos. A seguir, algumas estatísticas montadas através das respostas obtidas pelo questionário:

• “Não, pq são mal iluminadas, com mato alto, acabam sendo locais perigosos!”

• “Não, as pessoas têm medo, principalmente à noite, por causa dos problemas de iluminação e segurança. Muitas áreas no bairro viram pontos de tráfico..”

• “Não, por conta que muitas vezes não tem como estar usando devido às condições que se encontra o local.”

síntese de dados 1- Você sente falta de áreas de lazer e atividades na região?

3 - Você acha que a criação de um parque linear ao longo dos trilhos somado a um projeto de REQUALIFICAÇÃO da estação é relevante para a área?

100% 95% 5% 2 - Os espaços públicos existentes na região como praças, são utilizados frequentemente pela população? Se sim de que maneira? Caso não, porque acha que não são utilizadas? As respostas nos revelam como a falta planejamento dos espaços urbanos levam sua subutilização e afastam a população.

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A maioria das repostas foram positivas em relação a proposta de intervenção. Algumas respostas questionaram o fato das famílias que abrigam o local. Baseado no estudo elaborado sobre os assentamentos irregulares (pg. 110-111), é possível o remanejamentos dessa população para uma área próxima destinada para habitação de interesse social. A seguir algumas das respostas dos moradores da região:


• “Sim, desde que seja utilizada para o bem da população.”

• “Acho que agora não, pois muitas famílias já habitam nesse local, seria inviável.”

• “Siim, iria diminuir a quantidade de entulho que algumas pessoas jogam e a frequência que colocam fogo em lixo no local, porque creio teriam um olhar diferente.” • “Acharia ótimo!” 4 - Quais programas e atividades de lazer você acha que seriam importante para a região, pensando no projeto de um parque linear ao longo dos trilhos na Av. Rio Pardo?

5 - No que se refere a Estação Barracão, pensando em novos usos para a edificação, o que você sugeriria como programa?

• “Com isso, poderia ter vários pontos para food truck ao decorrer dos trilhos, muita vegetação, árvores florais e frutíferas, bancos, e o chão com muitas pedras, bem cultural mesmo.”

• “Poderia ser o local de apoio ao parque linear com um museu áudio visual contando a história da estação de uma forma mais dinâmica que atraia a atenção da população da região , na tentativa deles valorizarem mais o local.”

• “Atividades de recreação para crianças, para consciêntizar as crianças sobre a preservação de espaços públicos, limpeza e reciclagem de lixo.”

• “Colocar várias coisas que erram transportadas pela ferrovia, quadros com fotos originais da época, fazer uma decoração bem rústica, contratar um monitor onde explicaria toda a história dos trilhos ferroviários. Com tanto, chamando mais turistas e a própria população indo lá passear, sendo assim gerando mais empregos, mais consumo da população, mais relaxamento, entretenimento familiar e lazer, com isso não seria apenas o reconhecimento e proteção das edificações patrimoniais da cidade, seria também um investimento, girando mais ainda a econômia da cidade..”

• “Um parque arborizado, com uma ciclofaixa, pista para caminhada, aparelhos de ginástica para a terceira idade e play ground para as crianças e projeto de educação e concientizacao a população na preservação do ambiente.” • “Programas que atendam a faixa etária proxima.” • “Atividades coletivas e esporte.”

• “Programações de cultura e demonstração do valor histórico”

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[ O PROJETO ] 124


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desenvolvimento projetual estudo de diretrizes e intervenções pontuais

novos usos reforma/restauro edificações de valor histórico e cultural áreas verdes implantação da ciclovia articulação das áreas verdes delimitação da área de intervenção 126

trecho 1


das intervenções 1. DIRETRIZ VIÁRIA - A primeira fase consiste na implantação das diretrizes viárias. De acordo com o Plano Municipal de Mobilidade Urbana de 2012, vias principais são responsáveis por ligações e essenciais para o escoamento de todo território e com isso a implantação do trecho destacado no mapa é de extrema importância uma vez que são vias de grande fluxo e importante para o deslocamento dos moradores da região. Além disso, são importantes eixos de transporte público que dão suporte a população. Paralelamente ao desenvolvimento deste trabalho, já está sendo executada as obras de implantação de corredores de transporte público na Av. Dom Pedro I, a estruturação desses sistemas de apoio proporciona a potencialização da área e somado a implementação de infraestruturas da Av. Rio Pardo trarão essencial dinamismo para a região. Para além da demanda notória do transporte coletivo, a implantação da ciclovia se torna mais do que essencial no local. 2. intervenções pontuais nos espaços públicos existentes - A criação de espaços públicos planejados de acordo com a necessidade da população ajuda a criar equipamentos que não se tornem subutilizados. Conforme estudado anteriormente, esses espaços ao entorno da área de intervenção são pouco atrativos, sem manutenção e com mobiliário precário. Haja vista os problemas expostos em análise, a intervenção nessas áreas visa estímulo do seu uso com a criação de novos espaços que contemplem conforto e segurança, novos mobiliários, manutenção da vegetação e caminhabilidade, priorização dos pedestres e ciclistas, iluminação adequada e suporte para a permanência dos pedestres nesses espaços urbanos. Para além das intervenções citadas, é imprescindível a articulação dessas áreas com a implantação do parque linear e assim, os locais existentes não serão subutilizados e excluídos com a nova proposta.

3. REMANEJAMENTO DAS HABITAÇÕES IRREGULARES Como mostra o levantamento realizado baseado no Plano Local de Habitação de Interesse Social (p. 110 e 111), a remoção e realocação da população que constitui a chamada favela dos trilhos seria notoriamente viável, uma vez que temos a diretriz de implantação da Av. Rio Pardo por onde parte dessas ocupações se encontram (trecho 1, p. 126). Na área temos a presença de ZEIS 1, área destinada para habitações de interesse social e por ser próxima muito próxima ao local, as famílias realocadas não seriam excluídas do planejamento e nem destinadas para locais desprovidos de acesso fácil a suas necessidades cotidianas. A área em destaque representa uma parte para além dos trilhos e da Av. Rio Pardo que os assentamentos irregulares ocupam. Essa área constitui um trecho onde devera ser loteado de acordo a Legislação Municipal vigente e do código de obras, a fim de gerar espaços para novos lotes. 4. INTERVENÇÃO EM PRÉ EXISTÊNCIA - Por fim, a reabilitação da Estação Barracão que será transformada em museu ferroviário. A Estação, tombada pelo CONDEPHAAT, já possui estudos a respeito de sua transformação. A diretriz visa na preservação da identidade da estação e na reabilitação da edificação, respeitando o tempo e espaço que ela ocupa, seus materiais originais e principalmente novos usos que respeitem sua integridade. As intervenções na edificação devem respeitar os princípios básicos de restauro que foram estudos ao longo do presente trabalho, a fim de não apagar, mas respeitar a história da Barracão. Para além do Museu ferroviário, parte da estação deverá abrigar um centro de apoio aos moradores da região que possa respalda-los socialmente, principalmente quando falamos das regiões mais carentes de suporte.

Figura [6.01] - Mapa síntese da área. Fonte: Google Earth. Acessado em 10 de Agosto de 2020.

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programa de necessidades análise dos usos e carências

lazer

esporte

educação

cultura

comunidade

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Para o levantamento do programa, foi estruturado cinco pontos importantes: 1. Lazer: por definição constitui-se dois tipos: o lazer contemplativo e o ativo. As áreas de lazer buscam incorporar programas atrativos, com mobiliários adequados e que oferte usos que a população procura, a fim de gerar dinâmica das áreas públicas e tornar as mesmas seguras e não subutilizadas. As áreas de contemplação buscam gerar integração com a natureza e a contemplação do que é o objeto chave do projeto: o patrimônio. 2. Esporte: as áreas destinadas a esporte constituem espaços de integração e inclusão. Mais do que práticas esportivas, esse tipo de atividade gera entendimento do convívio coletivo, orientação de práticas sociais, éticas e morais, geram cidadania e agregam na educação. 3. Educação: paralelo ao desenvolvimento do presente trabalho, vivemos um momento atípico. A pandemia tem mudado a concepção da sociedade e com o isolamento social a necessidade de espaços públicos e interação social tem sido cada vez mais pertinente. Além disso uma questão muito discutida e levantada tem sido o acesso a informação e educação, uma vez que nem todos tem acesso ao estudo remoto. Dessa forma, foi pensado como a implantação do parque nesse local, onde temos questões sociais e econômicas tão pertinentes, pode gerar suporte desse tipo para a população. 4. Cultura: espaços culturais visam promover a cultura e interação dos vários níveis sociais sem exclusão de classe, cor e gênero! Esses espaços são responsáveis pela expressão cultural como danças, artes, apresentações e outras atividades e eventos sociais que permitam a participação de crianças, jovens e adultos. Esses espaços serão mediadores de transformação social, fortalecimento da identidade social e cultural, além de reforçar o sentimento de pertencimento da população local. 5. Comunidade: ao analisar a área podemos notar apropriações espontâneas da população. As manifestações físicas mais habituais foram consideradas para compor o programa e dessa forma gerar um equipamento que se molde a população para não se tornar um espaço excludente. Além disso, o questionário ajudou a compor a distribuição desse programa, mostrando como a participação da população deve ser considera imprescindível.


FLUXOGRAMA setor de lazer ativo

setor contemplativo

setor esporte

setor educação

setor cultura

comunidade

playground

espreguiçadeiras

mini quadras

biblioteca comunitária

memorial dos trilhos

hortas comunitárias

espaços lúdicos

arquibancadas

área skate

quiosques

espaços multiuso

equipamntos de apoio

área de jogos

redário

academia ao ar livre

pontos digitais

estação barracão

espaços para food truck

área para pet

mirante

paineis informativos

espaço de exposições

equipamentos aquáticos

deck

gramados

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conceito e partido Desde o início o objetivo do projeto era o resgate do patrimônio ferroviário em uma área de importante valor histórico para a formação cidade. Ao longo dos estudos foi possível observar a necessidade de integração no local em diversos âmbitos. Por isso a ideia central é criar um eixo de integração de atividades e que somado ao planejamento urbano, promova o fortalecimento da identidade da população, senso de comunidade, pertencimento, vivacidade e valorização da área. Por tanto, a criação de

um espaço público ao longo desse eixo, cria a ideia de integração cultural patrimonial com um espaço físico qualitativo. Para dar vida as ideias apresentadas, o partido do projeto se concretiza a partir da costura desses espaços pelo elemento linha. Com a presença da linha férrea foi impossível não pensar na linha e como os espações poderiam surgir como os ramais. Dessa forma o desenvolvimento do projeto se deu da seguinte maneira:

linha A linha, principal elemento desde projeto, é a responsável por formar delimitações de espaços. A composição entre retas e ortogonais criam uma malha

linha férrea Ao criar a malha ao longo da área foi possível identificar que a composição não conversava com a implantação do terreno, sendo assim foi proposto o trabalho da linha inclinada, gerando uma maior flexibilidade, movimento e criando uma implantação mais harmônica.

A malha cria planos que surgem como dobras

vegetação

caminhos e espaços

Figura [6.02] - Diagramas explicativos. Fonte: Croquis da autora. Acessado em 10 de junho de 2020.

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Figura [6.02] - Foto da Av. Rio Pardo. Fonte: Arquivo da autora. Acessado em 10 de junho de 2020.

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estudo de setorização academia ao ar livre

mini quadra de areia

gramados

espaço de jogos

horta comunitária

espaço lúdico

horta comunitária

espaço cultural gramados mini quadra área pet

academia ao ar livre

ponto digital biblioteca comunitária food truck 132


memorial

horta comunitária

gramados

horta comunitária

playground

skate

horta comunitária redário

playground

mirante

exposições

Figura [6.03] - Imagem aérea da área. Fonte: Google Earth, modificado pela autora. Acessado em 10 de junho de 2020.

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mobilidade estudo das vias

faixa de proteção

faixa de proteção faixa de rolagem corredor de ônibus

Figura [6.04] - Corte esquemático da Av. Rio Pardo. Fonte: Reprodução da autora. Acessado em 10 setembro de 2020.

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faixa de rolagem

corte de estudo av. rio pardo esc. 1:75


A Av. Rio Pardo é uma importe via de acesso que contorna todo o projeto de intervenção! A fim de melhorar a mobilidade urbana da região, o projeto também se volta para a priorização e segurança de pedestres.

faixas de rolagem As vias contaram com recapeamento para garantir a segurança de pedestres, ciclistas e automóveis. Ao longo de toda a via possuirá faixas com rampas para travessia de pedestres e faixa elevada de acordo com ABNT 9050 e semáforo com sinal sonoro e botoeira nos principais cruzamentos. Os cruzamentos entre a faixa de rolagem e a ciclovia possuirá semaforização para veículos, ciclistas e pedestres, com sinal sonoro e botoeira. A ciclovia projetada será bidirecional com 3,00m de largura e será implantada ao longo do parque, para que proporcione uma experiência mais segura e agradavel.

CORREDOR DE ÔNIBUS

calçadas As calçadas possuem L=3,00m sendo 2,20m de passagem e 0,80cm destinados para faixa de proteção com canteiro drenante onde será disposto vegetação, postes, lixeiras e sinalizações A altura do meio fio h=10cm As rampas de acesso possuem 1,20m de comprimento e 8,33% de inclinação. Os passeios serão restaurados a fim de melhorar e estimular a caminhabilidade dos pedestres e também para aqueles com mobilidade reduzida.

planta de estudo av. rio pardo esc. 1:100 135


o projeto

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Figura [6.05] - Imagem do projeto de intervenção. Fonte: Reprodução da autora. Acessado em 10 Novembro de 2020.

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área infantil esc. 1:300

Figura [6.05] - Proposta de projeto para área infantil. Fonte: Reprodução da autora. Acessado em 10 setembro de 2020.

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esc. 1:100


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ginástica ao ar livre esc. 1:300

Figura [6.06] - Proposta de projeto para área infantil. Fonte: Reprodução da autora. Acessado em 10 setembro de 2020.

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esc. 1:100


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espaรงo jogos esc. 1:300

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esc. 1:100


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arquibancadas esc. 1:300

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esc. 1:100


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espaรงo ocupado

quadra esc. 1:300 148


esc. 1:100

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152 esc. 1:100


barracĂŁo esc. 1:300

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MATERIALIDADES E iluminação COMPOSIÇÃO DO DESIGN os materiais foram escolhidos a partir do critério da durabilidade e manutenção. O concreto e a madeira, para além de compor um design bonito, proporcionam menos manutenção. Os pisos que compõe áreas como quadras e áreas infantis são de borracha de pneu reciclado, para dar estabilidade e seguranças para as atividades. As cores foram escolhidas nos tons de vermelho até mais alaranjado.

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Balizadores para compor espaços de passagem e áreas de atividades.

O revestimento que compõe todo o parque, desde o chão até mobiliário, é de concreto drenante na cor cinza claro.


O piso da ciclovia também é de concreto drenante na cor vermelha.

Os assentos dos bancos e arquibancadas, bem como mesas e outros assentos, são de madeira de reflorestamento. O assento de madeira dá maior conforto térmico para os usuários. Postes de 1M para compor os espaços de vegetação.

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EQUIPAMENTOS DE APOIO A partir da observação das necessidades da área, dois principais equipamento se destacam: ponto de ônibus, a fim de criar espaços adequados, seguros e confortáveis para quem espera o transporte coletivo. Os pontos de transporte coletivo ao longo da rio pardo foram realocados ao longo do parque.

A biblioteca comunitária espalhada ao longo do parque proporciona acesso gratuito a livros, espaço de leitura e acesso a internet e energia.

TOMADAS TOMADAS

Acesso para cadeirantes PONTOS DE WIFI

VEGETAÇÃO

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SEM ESCALA

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CONSIDERAÇÕES FINAIS O desenvolvimento do presente trabalho possibilitou a análise da relação entre o patrimônio industrial e a reabilitação urbana, bem como sua influência no espaço urbano. A escolha da temática teve relação direta com a atual situação da Av. Rio pardo, onde percorre por bairros do que já compôs o antigo Núcleo Colonial Antônio Prado. Visando demonstrar como as questões discutidas poderiam ser aplicadas de modo a terem influência em escala urbana, desenvolveu-se uma proposta urbana com intuito de proporcionar reabilitação urbana da área e trazer em destaque questões sociais, econômicas e culturais. A proposta constituiu-se através do referencial teórico que permitiu uma análise minuciosa da importância do patrimônio industrial e sua influência no espaço urbano, de modo a entender o espaço público e suas necessidades. Os estudos abordados ao longo do trabalho permitiram uma visão ampla das necessidades da área, bem como a importância de um equipamento que se volte para as necessidades da população e evitando a transformação do espaço em um equipamento subutilizado. As intervenções abrangem desde diretrizes para a mobilidade do local até o principal equipamento: o parque linear. O projeto conecta áreas de lazer e atividades relembrando sempre a presença dos trilhos e outros mobiliários patrimoniais presente no local. O foco do projeto é proporcionar espaços atrativos e de qualidade, mobiliários adequados e resgatar a memória da importância do patrimônio industrial.

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[ REFERENCIAL TEÓRICO ] 162


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2020 ribeirĂŁo preto


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