É crime ser gay?

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É crime ser gay? Parece ridículo pensar na possibilidade de que opção sexual pode ser crime diante de tantos “avanços” que acompanham a evolução da sociedade. Mas não é. Cerca de 2,79 bilhões de pessoas vivem em países que consideram sim, punições para quem se denomina homossexual, segundo pesquisa da Associação Internacional de Gays e Lésbicas (ILGA). Dos aproximadamente 205 países do mundo, cinco decretam pena de morte para a homossexualidade. No Irã, Mauritânia, Sudão, Arábia Saudita e Iêmen admitir ser gay é uma questão de vida ou morte. Outros 71 consideram prisões e punições corporais. O levantamento também destacou que 1,3 bilhão de pessoas moram em países com proteções legais contra a discriminação. São 53 os países que aplicam leis antidiscriminação, no entanto, somente 26 reconhecem a união homoafetiva. No Brasil não é crime jurídico ser gay, mas é um crime social para muitas mentes preconceituosas. De acordo com a Associação Brasileira de Lésbicas, gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) chega a 300 o número de vítimas assassinadas por ano no país. A legalização do casamento de pessoas do mesmo sexo, decisão do Supremo Tribunal Federal trouxe algumas mudanças como: regime de comunhão parcial de bens, direito de pedir pensão em caso de separação judicial, pensão do INSS para companheiros de pessoas falecidas e adoção. Mas sempre há um “porém”. No caso de adoção, por exemplo, a preferência é de casais heterossexuais, o que demonstra que a igualdade não é tão igual quanto parece. A Constituição Federal decreta a família como base da sociedade, tendo especial proteção do estado. No Artigo 226, § 3º está determinado que: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. Ou seja, ela se restringe a uniões entre homens e mulheres. Entretanto, como explica o advogado Lucas Dal Bello, “a Constituição Federal é uma carta política (que dispõe sobre diversos tipos de princípios diferentes), e também garante o direito à igualdade e à dignidade. É com base nesses princípios que surgem as leis homoafetivas, pois presume-se que esses direitos se sobrepõem à disposição sobre o casamento”. Não existem muitas leis específicas que protegem ou igualam heterossexuais e homossexuais. É através de advogados, suas teses, recursos e consequente jurisprudência, que estes cidadãos têm conseguido resguardar seus direitos. A união estável para pessoas do mesmo sexo, por exemplo, foi criada a partir de uma tese em que equipararam os direitos homoafetivos com uma união estável. Rio Grande do Sul / Porto Alegre O Rio Grande do Sul foi o primeiro estado brasileiro a reconhecer a união civil igualitária, a partir da desembargadora Maria Berenice Dias. A Secretária Adjunta da Livre Orientação Sexual Gloria Crystal reconhece que é preciso avançar muito mais com relação


aos direitos homossexuais no estado, mas ressalta que em Porto Alegre houve positivas melhorias com a criação da Secretaria Adjunta da Livre Orientação Sexual. Ligada à Secretaria Municipal de Direitos Humanos, ela é única no Brasil e foi criada para atender as políticas LGBT’s. O objetivo é coordenar e controlar as políticas públicas relativas à população LGBT no Município de Porto Alegre, em substituição ao Núcleo de Políticas Públicas para a Livre Orientação Sexual (NPPLOS). Nos outros municípios existem apenas núcleos de políticas LGBT’s. A secretaria procura trabalhar em parceria com os movimentos sociais e atender denúncias de vítimas de homofobia, juntamente com o Centro de Referência às Vítimas de Violência (CNRVV). A secretária ressalta que muitas pessoas sofrem caladas ao invés de lutar pelos seus direitos: “Nós só não atendemos mais pessoas porque muitas destas vítimas não fazem boletim de ocorrência, desta forma fica difícil de darmos continuidade aos casos”. Porto Alegre também está entre as quatro cidades que realizam cirurgia de mudança de sexo. O Hospital de Clínicas de Porto Alegre oferece o procedimento através do Serviço Único de Saúde, mas o tempo de espera pode ser até mesmo de anos, devido a grande demanda para poucos hospitais. Outros pontos relevantes é o requerimento de um laudo psiquiátrico dos pacientes e as perguntas geralmente muito invasivas que são realizadas antes do procedimento. O estudante de psicologia da PUCRS Ramiro Catelan destaca que há muitas ações que podem ser efetuadas para diminuir o preconceito ainda presente na capital. Reconhecer as diferenças entre as pessoas, sem querer regular o desejo dos outros é a principal. Além disso, é imprescindível evitar piadas desnecessárias; chamar travesti de “traveco”, ensinar desde cedo para as crianças diversidade e identidade de gênero e saber a diferenciação entre orientação sexual e identidade de gênero. A dica de Ramiro para evitar constrangimentos é reagir aos insultos, tendo em vista que não é comum o enfrentamento, o que faz com que o agressor se acovarde e pare com o afronto. Ramiro também é um dos fundadores do coletivo LGBT da Universidade, que atualmente está em processo de formação. Ele conta que já passou por diversos constrangimentos e quase foi agredido devido a sua opção sexual, o que demonstra que Porto Alegre ainda tem muito a evoluir.


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