REVITALIZAÇÃO DO ENTORNO DA ESTAÇÃO DA MOOCA TATIANA CREMA TOBARA
Universidade de São Paulo Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
REVITALIZAÇÃO DO ENTORNO DA ESTAÇÃO DA MOOCA
Tatiana Crema Tobara n.USP 5402272
Orientador: Prof. Dr. José Eduardo de Assis Lefèvre
2º semestre de 2010
AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer primeiramente à minha família, por todas as oportunidades que me deram e pelas mais diversas formas de apoio. Ao Rafael Leidinger, pelo carinho, compreensão e apoio incondicional. Às amigas Carla Montenegro, Heloisa Ferreira e Natássia Okazaki pela torcida constante. Agradeço à todas as amigas que fiz ao longo da FAU, com as quais passei os momentos da minha vida univesitária. Nesse processo de TFG compartilhamos angústias, opiniões e incentivos. Aos membros da banca professor José Rollemberg Filho, o Zico, por ter aceitado o convite e ao professor Fabio Mariz Gonçalves por ter acreditado neste trabalho. Por fim, agradeço ao professor José Eduardo de Assis Lefèvre, que me orientou neste TFG, pela sua competência, experiência e paciência em nossas inúmeras conversas.
SUMÁRIO 1- NOTAS INTRODUTÓRIAS................................................................................................. 02 2- ANÁLISE DA ÁREA......................................................................................................... 2.1- tecido urbano..................................................................................................... 2.2- estação da Mooca e sua inserção urbana............................................................ 2.3- situação atual e Plano Regional da Subprefeitura da Mooca................................. 2.4- a Mooca na Operação Urbana Diagonal Sul......................................................
06 08 11 13 18
3- PATRIMÔNIO INDUSTRIAL................................................................................................ 19 3.1- análise da área em torno da ferrovia nas imediações da Estação da Mooca.......... 20 3.2- por que preservar?............................................................................................. 30 4-
PROPOSTA DE INTERVENÇÃO.................................................................................. 33
5-
ELEMENTOS GERAIS DA PROPOSTA......................................................................... 34
6-
PROJETO.................................................................................................................. 6.1- circulação elevada e a nova estação de trem...................................................... 6.2- praça/acesso avenida Presidente Wilson............................................................. 6.3- parque linear ao longo da ferrovia...................................................................... 6.4- galeria comercial e telecentro............................................................................. 6.5- praça/acesso rua Borges de Figueiredo...............................................................
7-
CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................ 77
8-
BIBLIOGRAFIA.......................................................................................................... 79
35 37 47 52 62 72
1- NOTAS INTRODUTÓRIAS O tema inicialmente proposto para o desenvolvimento deste trabalho final de graduação é a discussão do patrimônio industrial na escala urbana e como o desenho urbano pode ser um instrumento de melhoria para a cidade e de valorização dos bens. Diante das mudanças do perfil produtivo de São Paulo, tendo como reflexos a fragmentação das atividades industriais no território e a desativação de plantas fabris, surgem no tecido urbano grandes áreas degradadas ou subutilizadas. Essas antigas áreas industriais tendem a ter importância estratégica, tanto pela sua dimensão física quanto pela sua localidade no tecido urbano. Em São Paulo, apresentam-se como regiões ociosas, degradadas e de baixo custo, vantagens para implantação de novos empreendimentos. Além, e principalmente, do mercado imobiliário privado, o poder público tem demonstrado interesse nessas áreas por causa de seu evidente potencial fundiário e econômico para o desenvolvimento de grandes projetos urbanos. Portanto, essa questão vem assumindo significativa representatividade no panorama das políticas de desenvolvimento urbano em diversas escalas. Entretanto, muitas vezes a questão da preservação e manutenção desse patrimônio, visto do ângulo cultural tem sido deixada em segundo plano. 2
O trabalho pretende propor a ocupação desses edifícios industriais por novos usos, produzindo espaços adequados às atividades urbanas cotidianas, respeitando sua memória.
de funções econômicas e sociais, quanto o impacto dos extensos eixos de transporte na descontinuidade da trama urbana, atuando como barreiras físicas para o pedestre.
Nesse sentido, o trabalho apresenta uma proposta de requalificação da área ao longo do eixo ferroviário da linha 10 da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), na região da estação da Mooca. São espaços que oferecem grande oportunidade de repensar a construção da cidade através de propostas embasadas na sua formação e suas problemáticas. E, principalmente nessa região, a mobilidade intra-urbana é peça-chave para o entendimento do processo de funcionamento da cidade, seja na constituição da rede de transporte público que atende a região metropolitana, ou ainda na composição dos percursos do pedestre na escala do bairro.
Tais barreiras dividem o tecido urbano, produzindo espaços dentro da cidade sem conexão física, funcional e social. Isso se reflete também nos conjuntos fabris, que hoje se encontram abandonados ou subutilizados. Portanto, o trabalho teve de lidar não só com a questão do patrimônio industrial, mas como ele está inserido na cidade. E nesse sentido, a questão urbana era fundamental para a discussão do tema central, pois sem pensar na escala da cidade, a preservação se tornaria uma ação isolada.
O entendimento da noção de patrimônio urbano, a identificação de conjuntos construídos como 1 Segundo Flávio Villaça , a infraestrutura monumentos coletivos portadores de valores de transporte tem grande influência sobre e especificidades e que compõe paisagens a formação espacial da cidade, trazendo únicas, raramente comparece na elaboração de conseqüências para a prática do uso do projetos de intervenção. De 1975, a Declaração 2 espaço, tanto no que diz respeito à produção de Amsterdã , já evidenciava a relevância dos de centralidades no entorno das estações 2 Resultado do Congresso do Patrimônio Arquitetônico sendo evidenciado o seu papel potencializador Europeu de 1975, o documento expôs com detalhes 1 VILLAÇA, Flavio. O espaço intra-urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel, 2001
a necessidade e oportunidade de inserir exigências da preservação do patrimônio arquitetônico dentre os objetivos do planejamento urbano e territorial.
complexos construtivos e dos bairros históricos na definição do patrimônio cultural e ressaltava a necessidade de integrar conservação e preservação desse patrimônio nos objetivos do planejamento urbano e territorial. Segundo a Declaração,
a estação Mooca da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e o conjunto de edifícios industriais em seu entorno.
O patrimônio cultural inclui não só os edifícios individuais de excepcional qualidade e as suas envolventes, mas também todas as áreas das cidades ou das vilas com interesse histórico ou cultural. E sua preservação
deve tornar-se parte integrante do planejamento urbano e regional, em vez de ser tratada como um assunto secundário ou como uma ação exigida aqui e acolá, como tem sido tão frequentemente o caso no passado recente. Portanto, pretende-se abordar a questão do projeto urbano, visando o resgate e a valorização do patrimônio urbano-industrial. O entendimento da problemática e a intenção de se chegar à resposta projetual para a questão exigiu a delimitação do foco de estudo para [1] Localização da área de trabalho, dentro da região centro-leste de São Paulo. Base: Google Earth, 2010. Elaboração: autora
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Conjunto da Antarctica Conjunto de galpões da Rede Ferroviária Federal S.A.(RFFSA) e as antigas Officinas Vanorden Atual estação da Mooca da linha 10 da CPTM Antigos armazéns da São Paulo Railway
Pátio de manobras que faz conjunto com os armazéns da São Paulo Railway
Ferrovia Santos-Jundiaí, antiga São Paulo Railway, hoje operada pela CPTM Rio Tamantuateí, Avenida do Estado e Expresso Tiradentes
[2] Área de trabalho e pontos principais que serão abordados durante o projeto. Base: Google Earth, 2010.
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[3] Área de trabalho, compreendendo a estação da Mooca e seu entorno. Fonte: Panoramio.com
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2- ANÁLISE DA ÁREA Os cursos d’água tiveram papel importante na expansão da cidade em direção as suas várzeas. Os rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí forneciam grande parte dos alimentos e mercadorias à população exercendo função importante na acessibilidade da região, e suas águas que corriam limpas, eram utilizadas para os afazeres domésticos dos moradores. Em sua várzea, ao lado das pontes, as mulheres, com trouxas e tábuas, lavavam as roupas, os homens pescavam e os animais bebiam água.
determinante não só para a configuração da região, mas para a formação da cidade de São Paulo. Assim como o rio, em 1867, quando foi inaugurada, a Estrada de Ferro São Paulo Railway veio acentuar ainda mais a bipartição do espaço disponível para a expansão da cidade. Implantada no Vale do Tamanduateí, a ferrovia aumentou a barreira representada não só pelo rio, mas também por sua ampla área inundável. Com isso, dificultou-se o acesso ao centro pela região situada além das barreiras, no caso, a zona leste, uma vez que As grandes áreas de várzea dos rios sempre sua superação se limitava a alguns locais onde foram um obstáculo à ocupação do espaço havia pontes, possibilidade de cruzamento da urbano. Segundo Villaça1 , essa divisão foi ferrovia e aterro da várzea. 1 VILLAÇA, Flavio. O espaço intra-urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel, 2001
A ferrovia foi o grande fator de localização
[1] Margem do rio Tamanduateí que abrigava o antigo mercado. Percebe-se como o leito do rio era largo e mais raso. Fonte: TOLEDO, Benedito Lima de. Prestes Maia e as Origens do Urbanismo Moderno em São Paulo. São Paulo: Empresa das Artes, 1996.
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industrial no período da industrialização, uma vez que era o principal meio de transporte de mão-de-obra, de matéria-prima e de produtos acabados. Outros aspectos influenciaram a instalação das indústrias nessa área como o baixo custo da terra, a facilidade de transformar as então presentes chácaras em lotes industriais, o fornecimento de água para a produção e lançamentos de efluentes industriais nos rios. Com a imigração, esses fatores permitiram a ocupação e o desenvolvimento urbano dessas áreas. Chácaras e sítios abriram espaço para a acomodação de pequenas casas geminadas e moradias coletivas com o intuito de abrigar os operários das fábricas. Este padrão de ocupação do solo permitia alta densidade em partido arquitetônico horizontal, apropriado para as tecnologias existentes na época. Esses conjuntos residenciais horizontais eram formados por sobrados geminados em série sem recuo (a maioria com disposição de sala, cozinha, banheiro e 2 dormitórios) ao longo da via principal ou em ruas sem saída que tinham função de áreas de uso comum, circulação e áreas de lazer na forma de vielas. Isso contribui para a caracterização do bairro. A demanda provocada pela implantação das indústrias gerou a construção de melhoramentos
urbanísticos, o que teria colaborado para a expansão do povoamento para leste do Tamanduateí. Em 1946, com o final da concessão governamental, a ferrovia passou a fazer parte da Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA) sob o nome de Estrada de Ferro Santos-Jundiaí (EFSJ), período marcado não apenas por uma nova administração da ferrovia, mas também pela competição direta com o transporte rodoviário, que teve sua rede expandida para todos os lados, inclusive com abertura de rodovias modernas paralelas à via férrea.
a paisagem gerada por essa forma particular de ocupação. Parte considerável dos armazéns e edifícios industriais ainda permanece na região da Mooca, principalmente ao longo da linha férrea. Em 1997, no cumprimento do programa de desestatização proposto pelo Governo Federal de então, a antiga malha da Santos-
Jundiaí foi entregue sob regime de concessão à MRS Logística para a operação de cargas. Atualmente encontra-se sob o domínio da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, que ali opera a linha 10 (trecho Luz-Rio Grande da Serra).
A expansão da rede rodoviária é acompanhada pelas novas indústrias, que veem melhor oportunidade de implantação em áreas distantes do centro urbano, causando um lento abandono dos complexos produtivos mais antigos. O alto valor dos terrenos dentro da cidade e as vantagens de se implantar uma indústria fora da área urbana, como incentivos fiscais, mão-de-obra mais barata e distância dos sindicatos, são fatores que causam a fuga das grandes indústrias para outras regiões. A progressiva desativação de algumas dessas fábricas a partir dos anos 50 do século XX não chegou a alterar substancialmente, no entanto,
[2] A ferrovia na década de 1940. Fonte: EMFA, Coleção PMSA, acervo Museu de Santo André
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2.1- tecido urbano A ligação quase exclusiva da ferrovia à produção econômica impediu que ela se integrasse à malha social urbana. Seus poucos pontos de conexão ao tecido serviam apenas aos passageiros de viagens de longas distâncias, indiferentes ao trajeto intra-urbano. Essa falta de integração ao tecido urbano é observada através dos mapas históricos de 1897 e 1930. É possível perceber que a configuração de traçado atual se dá em função da localização do rio e, posteriormente da linha férrea, formando assim vias num eixo único no tecido urbano. Algumas transposições são feitas por ruas, no entanto percebe-se claramente que o rio Tamanduateí e a ferrovia São Paulo Railway foram determinantes para o traçado da vias e para a configuração do tecido urbano da região. No mapa 1, de 1897, é possível perceber claramente o Rio Tamanduateí e até alguns caminhos de água como barreiras urbanas, através das formações do tecido urbano. A região ainda era formada por chácaras e outras propriedades rurais, contando somente com o Caminho da Mooca, hoje Rua da Mooca. [1] Planta Geral da Capital de São Paulo organizada sob a direção do Dr. Gomes Cardim, Intendente de Obras, 1897. Câmara Municipal de São Paulo
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[2] Planta de 1930. Mapa Sara Brasil.
Em seu ano de inauguração, a ferrovia servia apenas para o transporte de carga. A área
em questão, certamente além dos limites metropolitanos, não era atendida por trens de passageiros nem tinha estações de passageiros, porém já apresentavam demanda urbana sobre um sistema de transporte extra-urbano. Esses setores ferroviários foram ocupados principalmente pelas camadas de mais baixa renda. Com a inauguração da estação da Mooca, em 1898, além da busca por uma proximidade ao emprego industrial ao longo da ferrovia, essas camadas procuravam facilidade de transporte e proximidade ao centro principal, por apresentar a maior concentração de empregos e subempregos. Portanto, diante dessa situação, as estações de trem adquirem importância na dinâmica da região, uma vez que elas estabelecem a relação com o centro da cidade.
fachadas das construções fabris, sucedendose umas às outras, gerassem uma perspectiva diferente, com sequências de quarteirões fechados, sem recuos frontais e laterais. Esse tipo de implantação define uma paisagem bastante peculiar, articulada ao mesmo tempo com as quadras fronteiras e próximas, ocupadas por residências, seja no correr de casas, nas casas isoladas e nas vilas, ou ainda pelos estabelecimentos comerciais de pequeno porte.
Em alguns casos, a implantação de fábricas em áreas praticamente desocupadas contribuiu para a definição de acessos e até mesmo o arruamento da região. A proximidade dessas fábricas à linha férrea e aos seus ramais secundários ocasionou a formação de extensos aglomerados de edificações industriais. Em algumas ruas, as fachadas sucedem-se uma às outras fechando amplos quarteirões sem recuos, loteamentos sobrepostos, ligados entre si por vias estreitas e desconectadas. Ao ocupar esses terrenos ao longo da linha férrea, as indústrias voltaram os fundos para esta e o acesso principal está nas ruas paralelas, como avenida Presidente Wilson e a rua Borges Figueiredo.
As características de parcelamento do solo em regiões ocupadas pela atividade industrial, como o da região estudada, apresentam um ordenamento espacial específico. A procura pela funcionalidade e otimização de fluxos produtivos criou uma configuração própria e dinâmica que permite a observação da No mapa 2 de 1930, já é possível observar o própria urbanização do local. Em alguns traçado da Avenida Paes de Barros definido e ramos industriais específicos, a necessidade algumas vias paralelas a ferrovia, ao sul da Rua de extensas áreas repercutiu diretamente da Mooca. Alguns conjuntos industriais já eram no parcelamento do solo urbano com a representados, como os galpões da RFFSA, a delimitação de grandes lotes e consequente Companhia Antártica, as Indústrias Matarazzo ordenação do sistema viário que acaba por contornar extensas e compactas parcelas e a antiga estação de trem da Mooca. urbanas. Atualmente esses grandes lotes são A extensa aglomeração de galpões de alvo da atividade imobiliária, implantando [3] fachada dos galpões das antigas Officinas Vanorden armazenamento e de edifícios industriais junto muitas vezes grandes torres residenciais. voltada para a rua Borges de Figueiredo. Foto da autora, à ferrovia, fez com que, em algumas ruas, as 2010
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Ainda hoje é possível perceber os grandes lotes determinados pela ocupação industrial. Mesmo nas áreas em que se desenvolveram outras atividades, ainda é possível perceber as características originais, como blocos contínuos,
muitas vezes compactos de massa edificada. Essa situação é facilmente percebida na área de trabalho, com diversos galpões um ao lado do outro, formando uma massa contínua.
Ocupando em geral grandes lotes, muitas dessas construções foram feitas de alvenaria de tijolos aparentes, algumas com estruturas importantes, de ferro fundido ou aço; tesouras metálicas ou mesmo madeira forma empregadas na construção dos amplos telhados com sheds de iluminação ou duas águas e lanternim. A técnica utilizada e a arquitetura adotada na construção destes edifícios não variavam muito: eram construídos com alvenaria de tijolos aparentes e estrutura de ferro fundido ou aço. Em alguns casos, as estruturas metálicas eram importadas da Europa e montadas no Brasil. As coberturas de estrutura metálica ou madeira eram a solução mais usual, em sheds ou em duas águas sucessivamente repetidas lado a lado. Mas o símbolo urbano característico da arquitetura industrial é, sem dúvida, a chaminé, que é também o símbolo da transformação da manufatura à usina, do uso da máquina à vapor ou do uso do vapor para trabalhos específicos.
[4] chaminé do Conjunto da Antarctica. Fonte: Panoramio.com
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2.2- a estação da Mooca e sua inserção urbana A necessidade de demarcar o trajeto de embarque e desembarque da Estação original para quem se encaminhasse para os lados da rua da Mooca, uma das mais antigas da região, possivelmente determinou a abertura, ainda no século XIX, de uma passagem entre a estação e a confluência das então chamadas rua de Oliveira e alameda Taubaté, ambas constituindo atualmente a rua Borges Figueiredo. Atualmente, o que se verifica, no caso da estação Mooca da CPTM, são dois acessos, um deles feito através de uma generosa praça arborizada na avenida Presidente Wilson com
[1] Mapa do final dos anos 1890 com o pátio da Mooca, estação original, rua Taubaté (hoje R. Borges de Figueiredo), a avenida Bavaria (Av. Presidente Wilson), a rua da Estação (R. Monsenhor João Felipo) e a Cervejaria Bavária, posteriormente Antártica. Acervo Ralph M. Giesbrecht, disponível no site http://www. estacoesferroviarias.com.br/m/mooca.htm
algum potencial e o outro, um ‘corredor’ com acesso na rua Monsenhor João Felipo comprido e estreito. Aquela acaba facilitando a parada de automóveis e o embarque e desembarque de passageiros, apesar de não haver uma área oficial da estação destinada a este fim. A ferrovia, neste trecho especificamente, segrega as duas partes do bairro da Mooca e a única ligação disponível entre os lados leste e oeste acontece pela passarela interna a estação, de uso exclusivo dos usuários da linha. Além disso, ela não possui acessibilidade aos portadores de mobilidade reduzida, pois apresenta lances de escadas.
nos domingos. Uma das causas desse atraso é o transporte de cargas concomitante ao de passageiros. Numa alternativa de retirá-lo da área urbana, existe uma discussão sobre a construção de um anel ferroviário em volta da cidade de São Paulo, porém muitos depósitos de carga e descarga ainda estão em atividade
A única opção para o pedestre que não tem destino a estação e quer transpor a linha do trem é o viaduto Prof. Alberto Mesquita de Camargo, 400 metros a norte da estação. Este, como muitos outros de São Paulo não apresenta qualidade mínima necessária para o percurso do pedestre, ao lado encontra-se uma passarela exclusivamente de pedestres que não está em estado de conservação adequado, somente possui lances de escadas e é pouco convidativa. O intervalo entre os trens varia de oito a 15 [2] ‘Corredor’ de acesso à atual estação de trem da minutos em geral, chegando a 20 minutos Mooca. Foto da autora, 2010 11
dentro da área urbana. Uma alternativa colocada recentemente é de enterrar as linhas férreas desde a Lapa até o Brás, integrando o tecido urbano dividido há décadas. O projeto está em desenvolvimento na CPTM, porém não inclui o trecho da estação do Brás em diante. A justificativa é a dificuldade de transpor o rio Tamanduateí, que se encontra entre as estações Brás e Mooca da CPTM. A estação Mooca da CPTM é uma parada da linha 10 que não possui conexão com outras linhas de metrô nem linhas da CPTM, sua conectividade intermodal acontece quase que exclusivamente através de ônibus municipais. A região a leste da estação apresenta maior quantidade de paradas, localizadas principalmente após 150 metros dessa, porém a região a oeste possui uma parada logo na saída da estação.
[3] pontos de ônibus próximos à estação de trem da Mooca. Base: Google Earth 2010. Elaboração da autora.
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2.3- situação atual e Plano Regional da Subprefeitura da Mooca (PRES-MO) Alguns galpões industriais desativados abrigam hoje depósitos e usos diversos, como universidades, espaços para festas, eventos, ou são ocupados por indústrias e fábricas de menor porte. Os que permanecem desocupados efetivamente são poucos. Paralelamente à transformação de uso dos galpões industriais, e em função da proximidade com a região central e do transporte, está em andamento na região da Mooca um processo de valorização imobiliária que vem resultando, desde os anos 1980, em uma tendência à verticalização de certas áreas. Por conta disso, conjuntos industriais próximos ao núcleo inicial do bairro acabaram sendo demolidos, dando lugar a empreendimentos de grandes proporções, destinados principalmente à exploração de um outro modo de morar para a classe média urbana. Diante dessas mudanças que vem ocorrendo no bairro, fica visível a urgência de se fazer observar com determinação as diretrizes apontadas no PRES-MO. Pode-se dizer que o tipo de ocupação urbana em andamento naquela região tem sido consideravelmente determinado pela ação do mercado imobiliário. A presença de lotes amplos remanescentes do uso industrial, o valor mais baixo da terra se comparado com outras áreas consolidadas
da cidade, aliados à proximidade com o centro e suas facilidades estão subordinando a vida do bairro ao assentamento de grandes condomínios residenciais fechados. Com ligeiras variações, o modelo adotado nesses complexos desconsidera a cidade à sua volta, caracterizando-se basicamente pela implantação de altas torres sobre plataformas de dois ou três pavimentos acima da cota da calçada que, ocupando grande parte do lote, se destinam às vagas de garagem. Esse modelo gera muralhas cegas que se estendem pelas quadras, comprometendo a vida urbana que se desenvolve no nível da rua e das áreas residenciais de gabarito baixo que ainda marcam forte presença no bairro. As ruas estreitas do bairro, que historicamente foram espaços de convivência, intermediando a relação casa-trabalho, passam a ser vistas apenas com a função de passagem.
o “desenvolvimento humano e qualidade de vida” encontram-se recomendações no sentido de “evitar o surgimento de grandes áreas que concentrem apenas o uso residencial e uma mesma faixa de renda”1 Para a elaboração do PRES-MO, a Subprefeitura da Mooca produziu uma ampla documentação que foi encaminhada à Secretaria de Planejamento (SEMPLA), em 2004. Nele identificaram-se as atuais tendências de ocupação de toda aquela região. Com isso foi possível verificar que o processo de verticalização está predominantemente ligado ao uso residencial, consolidando-se ao longo da avenida Paes de Barros, mas encontrandose mais difusamente por outras áreas das cotas mais baixas da região.
O comércio de âmbito local sofre o impacto dessa nova escala urbana. Ao mesmo tempo, empreendimentos comerciais de grande porte se instalam na área ignorando as estruturas construídas existentes e as especificidades do tecido urbano na região. É esse tipo de ocupação que o PRES-MO propõe modificar. Entre seus objetivos para
1 PRES-MOOCA, p.23
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[1] Mapa Uso e Ocupação do Solo. Fonte: PRE-SÉ, PREMOOCA, PRE-IPIRANGA. Prefeitura Municipal de São Paulo 2004
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14-Mapa-Tombamento Rua Borges de Figueiredo-Mooca.jpg (1754x1240x16M jpeg)
A partir desse diagnóstico foram elaboradas propostas que buscam a manutenção de traços característicos da área, considerando a hipótese de preservação de uma série de edifícios, incluindo construções industriais, identificados em função do reconhecimento de seus valores culturais, histórico e/ou arquitetônico, inclusive com a participação da população. Essas edificações foram listadas como “indicação para preservação”, sendo enquadradas como Zonas Especiais de Preservação Cultural (ZEPEC) e consequentemente sugeridas para estudo de tombamento. As indicações foram acolhidas pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (CONPRESP), que abriu processo de tombamento, em 2004. Através da Resolução 14 de 2007, foram tombados, entre outros, o conjunto dos Grandes Moinhos Gamba, os depósitos da antiga Polipel (atual Artec), da Cooperativa Banco do Brasil e da antiga Ceagesp, todos na rua Borges de Figueiredo.
[2] Mapa de bens tombados no entorno da estação da Mooca e área envoltória. Fonte: Conpresp, Resolução 14 de 2007
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O PRES-MO propõe “o incentivo à permanência do uso industrial no bairro, a implantação de novas indústrias não incômodas, de menor porte”
linha férrea voltado à utilização da população do entorno e população metropolitana, que possa abrigar equipamentos para jovens e terceira idade” e recomendava, para tanto, um mapeamento do patrimônio existente (vilas, O Plano propõe também ‘recriar o tecido fábricas, casarios) para “possível aplicação urbano’, indicando a abertura de ruas e de instrumentos urbanísticos que estimulem travessias, cortando eventualmente grandes sua preservação e orientem a reconversão de lotes industriais e “definindo novas passagens uso”3 por sobre os obstáculos hoje existentes”. As propostas da Subprefeitura de criação de A proposta foi acolhida pelo PRES-MO, com novas vias subdividindo o tecido urbano indicação da faixa ao longo da ferrovia existente resguardam, no entanto, os lotes como Parque Linear. Ela abrange os terrenos industriais considerados de valor histórico que seguem paralelos ao eixo da via férrea, que deveriam permanecer em suas condições compreendendo a área entre a avenida originais. Desta forma, o Plano prevê, para Presidente Wilson e a rua Borges de Figueiredo, esses locais de interesse histórico, fazer com e incluindo toda a área de galpões industriais que “os equipamentos públicos ou indústrias aí existentes. que precisem de glebas maiores ocupem o patrimônio industrial dos galpões industriais do início do século XX, para ao mesmo tempo preservarem e darem um uso”2. Dentro dessa premissa, o PRES-MO procurou identificar as principais demandas do bairro, no que se refere a equipamentos e áreas verdes e incentivou ‘usos diversos’. [3] Mapa da Rede Hídrica Ambiental. Parque linear proposto ao longo da ferrovia. Fonte: PRE-MOOCA. PMSP, 2004
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A Proposta PRES-MO, 2004, prevê a implantação de um “parque linear ao longo da 2 Proposta PRES-MO, 2004, v.1, p.07
3 Proposta PRES-MO, 2004, v.2, p.63
Ainda com relação aos instrumentos urbanísticos previstos pelo PRES-MO está o “direito de preempção, outro importante instrumento de gestão urbana, proposto pelo Estatuto da Cidade que permite ao poder público a prioridade de compra de um terreno no momento em que estiver à venda. A Prefeitura define no Plano Diretor as áreas onde quer exercer o direito de preempção, geralmente porções consideradas estratégicas para futuros projetos de requalificação ou reestruturação urbana. Algumas destas propostas foram, de certa forma, incorporadas na redação final do Plano Diretor. O Plano, votado em 2004, delimitou Zonas Especiais de Preservação Cultural nas áreas sugeridas pela população e demarcou também grande parte do eixo da estrada de ferro como área sujeita ao direito de preempção. O exercício destes mecanismos possibilitaria a criação de parques lineares e recuperação paisagístico-ambiental do eixo do rio Tamanduateí. No entanto, somente algumas porções foram regularizadas e estão definidas nos PREs como áreas sujeitas ao direito de preempção, como o terreno do antigo Grandes Moinhos Gamba e as antigas Officinas Vanorden, hoje tombados. [4] Área sujeita à incidência do direito de preempção - fls 3. Fonte: PRES-MOOCA. 17
2.4- a Mooca na Operação Urbana Diagonal Sul Foram previstas no Plano Diretor Estratégico de São Paulo (2002) diversas operações urbanas, que têm como finalidade: “I- implantação de equipamentos estratégicos para o desenvolvimento urbano; II- otimização de áreas envolvidas em intervenções urbanísticas de porte e reciclagem de áreas consideradas subutilizadas; III- implantação de Programa de Habitação de Interesse Social; IV- ampliação e melhoria da Rede Estrutural de Transporte Público Coletivo; V – implantação de espaços públicos; VI – valorização e criação de patrimônio ambiental, histórico, arquitetônico, cultural e paisagístico; VII – melhoria e ampliação da infraestrutura e da Rede Viária Estrutural; VIII – dinamização de áreas visando à geração de empregos.” O Art.59 do PRES-MO estabelece que a Operação Urbana Diagonal Sul, criada por 18
lei específica deverá atender às seguintes VIII. definir medidas mitigadoras e diretrizes: compensações ambientais para as áreas com solo ou águas subterrâneas, nas antigas áreas “I. implantar um parque linear ao longo da via industriais da operação.” férrea; II. controlar o impermeabilizadas
aumento
de
áreas
III. promover ocupação que privilegia arborização intensa e adequada para diminuir o desconforto térmico, a poluição atmosférica e sonora; IV. promover a criação de áreas verdes, preferencialmente públicas ou em parceria com a iniciativa privada; V. reservar áreas de drenagem e contenção, áreas verdes e áreas de uso público, as últimas valorizando preferencialmente, os terminais de embarque de transporte coletivo existente e previsto, a integração entre eles e com as ruas comerciais e as centralidades; VI. promover parceria com órgão competente para viabilizar a modernização das estações de trem da CPTM; VII. promover a integração física das regiões separadas pela via férrea;
3- PATRIMÔNIO INDUSTRIAL O tema Patrimônio Industrial é relativamente novo no Brasil. Apesar do primeiro tombamento relativo à arquitetura industrial ter sido realizado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1964, sendo este conjunto formado pelos remanescentes da Real Fábrica e Ferro São João de Ipanema no município de Iperó, as ações de preservação acabaram por não constituir uma prática. O interesse pelo tema tem crescido gradativamente e representa uma forte tendência de preservação pelo mundo, incorporadas os setor produtivo através de atividades comerciais, de serviços, institucionais e habitacionais, ou ligadas ao turismo, com resultados interessantes do ponto de vista social, cultural e ambiental. As antigas edificações industriais abandonadas ou sub-utulizadas foram aproveitadas de formas diversas e integradas à vida da população, sem que suas referências históricas fossem esquecidas. As origens desse interesse no plano internacional encontram-se nos anos 60 e estão ligadas à ampliação dos conceitos e debates sobre Patrimônio Cultural e sobre elementos que integram esse patrimônio. Cartas de preservação se sucederam ao longo desse período, consagrando uma nova e ampliada
visão a respeito do tema patrimônio histórico e materiais e técnicas construtivas e racionalização cidade: Carta de Veneza de 1964, Declaração da construção. de Amsterdã de1975, Carta de Washington - valor de excepcionalidade para processos de1986, entre outras. de produção e sítios raros, como os exemplos O tema foi colocado desde o início em um mais antigos e pioneiros. amplo contexto, envolvendo diversas áreas de conhecimento. O patrimônio relacionado com Assim, faz-se necessário compreender a era industrial não passa apenas pelos objetos amplamente a abrangência dos processos e edifícios, mas pela sua inserção na cidade, industriais no momento de instituir proteção e pela ligação que estabelece com os demais legal para os remanescentes de interesse. A setores da sociedade. Na carta de Nizhny Carta é muito elucidativa nesse sentido, ao Tagil são apontados alguns valores intrínsecos sugerir que as medidas sejam capazes de proteger as fábricas, as máquinas, elementos ao patrimônio industrial, tais como: subterrâneos e estrutura no solo, conjuntos de - opondo-se ao valor de singularidade de edifícios e armazéns, bem como as paisagens objetos excepcionais, destaca-se o valor industriais, uma vez que a preservação do universal dos processos industriais, com patrimônio industrial está ligada a autenticidade profundas consequências para a história da de sua integridade funcional. Segundo Beatriz humanidade; Kuhl, quando a “degeneração não incide apenas sobre um edifício específico ou sobre - ao conferir identidade na história da vida das um bairro, mas abrange inteiros setores de pessoas, revela-se o valor social; uma cidade..., apenas uma abordagem ampla e articulada do problema, em termos sociais, - valor científico e tecnológico para a história políticos e econômicos e de escala, pode das ciências e da arquitetura; resultar mais completivos” 1 - valor estético pelo seu design e pela 1 KÜHL, Beatriz Mugayar. Preservação da Arquitetura sua arquitetura, destacando-se a escala, Industrial em São Paulo: questões teóricas (relatório composição, introdução e consolidação de científico elaborado em apoio da FAPESP) São Paulo, FAUUSP, 2005, p.109
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3.1- o conjunto industrial nas imediações da Estação da Mooca antigas Officinas Vanorden
atual estação da Mooca
rua Borges de Figueiredo
ferrovia
Os edifícios industriais que serão tratados neste trabalho estão localizados nos dois lados da antiga São Paulo Railway. Esses conjuntos configuram uma situação urbana peculiar que detém ainda hoje um conjunto arquitetônicoferroviário-industrial representativo do início da industrialização paulista. Trata-se, portanto de um sítio urbano altamente privilegiado do ponto de vista da representação do surgimento da industrialização em São Paulo. Há, portanto um especial interesse históricocultural nessa área por estar ali retratado um importante segmento da memória constitutiva da cidade de São Paulo.
galpões da RFFSA 20
antigos armazéns da São Paulo Railway
pátio de manobras
avenida Presidente Wilson
[1] Destaque dos conjuntos industriais que serão abordados neste trabalho. Base: Google Earth, 2010.
Segundo pavimento Antigas Officinas Vanorden*
Antiga estação da Mooca. Inaugurada em 1898 (fonte: site da cptm e mapa acervo Ralph M. Giesbrecht) Galpões da São Paulo Railway. Construídos entre 1898 e 1900 (fonte: Rufinoni, Manoela Rossinetti. Preservação do Patrimônio Industrial na cidade de São Paulo: o bairro da Mooca. Dissertação de mestrado apresentada à FAUUSP. São Paulo, 2004. p. 104) Oficinas da Casa Vanorden. 1909 (fonte: Arquivo Municipal) Ampliação das Oficinas da Casa Vanorden. 1911 (fonte: Arquivo Municipal) Galpões pertencentes à RFFSA. Posteriores a 1930 (não constavam no mapa Sara Brasil de 1930) Galpões construídos entre as décadas de 1930 e final da década de 1950 (não constam nos mapas de 1930 e já aparecem nas fotos aéreas de 1958) Atual estação da Mooca. Datada de final da década de 1950 (fonte: Foto aérea de 1958 in www.geoportal.com.br/1958/) * Na ampliação de 1911, além da adição de mais 7 galpões, dois dos dez primeiros galpões com cobertura de shed foram incorporados no volume da esquina.
[2] Planta de Cronologia Construtiva Base: Gegran de 1972 com atualizações do Google Earth de 2010. Elaboração da autora
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constitui solução menos comum para a época do que tesoura metálicas planas.
GALPÕES DA RFFSA Existe ainda hoje, na rua Monsenhor João Felippo, um conjunto de três galpões remanescentes da operação da antiga Ferrovia Santos Jundiaí. A despeito de serem posteriores à 1930, podem ser considerados exemplares da expressão arquitetônica que caracteriza as construções ferroviárias das primeiras décadas do século XX. Ocupando toda a área de lotes bastante profundos, foram construídos em alvenaria de tijolos com coberturas de duas águas e lanternim para ventilação e iluminação. As tesouras de sustentação do telhado, ao que tudo indica serem francesas, são metálicas e muito delgadas. É possível observar que os nós da tesoura apresentam um desenho espacializado bem interessante, o que
Um dos galpões está voltado para a ferrovia. Abre-se para ela por meio de portas que dão para uma plataforma de cota elevada, o que imediatamente sugere a existência de um ramal ferroviário muito próximo para embarque e desembarque de mercadorias, denotando sua função de armazém de estocagem. Ainda hoje encontram-se alguns poucos exemplares da mão francesa que suporta a cobertura da doca. [2] Cobertura metálica dos galpões formando nós espacializados. Por falta de iluminação, atualmente é difícil observar a solução das tesouras da cobertura. Foto da autora, 2010
[1] Fachada do conjunto voltada para a rua Monsenhor João Fellipo. Foto da autora, 2010
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Esse conjunto de galpões vem sendo utilizado como estacionamento. Por causa do novo uso, foi construído um bloco de serviços dentro dos dois primeiros galpões, no sentido da ferrovia.
Com isso, foram colocadas aberturas na fachada voltada para a rua Monsenhor João Fellipo. Apesar desses três galpões serem tratados como um conjunto único, eles apresentam alguma diferenças entre si, principalmente entre o primeiro paralelo à ferrovia e os outros dois. Tanto que os proprietários atualmente são distintos. Uma vista aérea evidencia que o primeiro armazém mantém a cobertura original enquanto os dois outros tiveram as telhas francesas substituídas por telhas fibrocimento. Os três apresentam tesoura em estrutura metálica, no entanto a solução daquele paralelo à ferrovia é ligeiramente diferente dos outros dois.
[3] Volume construído provavelmente por causa do uso atual, intervindo também na fachada voltada para a rua Monsenhor João Fellipo. Foto da autora, 2010
[4] Fachada voltada para a ferrovia. Observa-se a solução de mão francesa para sustentação da cobertura da plataforma de carga e descarga de mercadorias. Foto da autora, 2010
A fachada também evidencia essa diferença, não só pela intervenção posterior da aberturas nos dois galpões próximos à rua Monsenhor João Fellipo, mas também pela solução de frontão e as siglas inscritas na fachada apenas daquele primeiro paralelo à ferrovia. Um deles também apresenta uma viga metálica sustentada por pilares também metálicos, diferenciando-se daqueles em alvenaria pintada, provavelmente mais antigos. 23
ARMAZÉNS DA SÃO PAULO RAILWAY AO segundo indicações1 , entre 1898 e 1900, LADO DA ESTAÇÃO DA MOOCA possivelmente abrigavam oficinas para o reparo de locomotivas. Suas fachadas quase idênticas No lado oposto da ferrovia, ou seja, no estão voltadas tanto para a passagem existente acesso para a estação da Mooca a partir entre a estação e a avenida, em frente às da avenida Presidente Wilson, em frente às instalações da Antarctica, como para o amplo instalações da Companhia Antarctica, existe pátio de manobras que se espalha na faixa de um outro conjunto isolado de três galpões terreno próxima à avenida Presidente Wilson. longitudinalmente geminados e remanescentes da antiga ferrovia São Paulo Railway. Esses 1 RUFINONI, Manoela Rossinetti. Preservação do galpões são evidentemente mais antigos do Patrimônio Industrial na cidade de São Paulo: o bairro que os comentados anteriormente. Construídos, da Mooca (Dissertação de mestrado apresentada à FAUUSP) São Paulo: 2004, p.104
Assemelham-se, de todo modo, às construções típicas da linguagem ferroviária e industrial do final do século XIX, em São Paulo. Ou seja, construídos de alvenaria de tijolos aparentes com telhados de duas águas e tesouras planas feitas de estrutura de ferro. Nos dois galpões das extremidades encontram-se, em cada um de seus frontões, óculo circular para a iluminação do interior. O galpão central talvez apresentasse solução semelhante também no frontão voltado para a passagem, o que, contudo, parece não ter resistido às modificações a que ficou sujeito
[1] Interior dos galpões, mostrando a cobertura em tesouras metálicas, parte destelhado, usado como depósito de material de construção. Os vagões de trem abandonados criam o cenário ferroviário. Nessa foto ainda não haviam instalado as novas telhas metálicas. Foto: Carolina Catelan, 2007
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no tempo. A cobertura de telhas francesas dos galpões desse conjunto foram substituídas por telhas metálicas, modificando a aparência original. Hoje em dia o conjunto está sendo utilizado por particulares como depósitos para materiais de construção, como areia, pedra e cimento.
[2] Fachada do conjunto, voltada para a estação da Mooca. As aberturas foram descaracterizadas. Aparentemente, a alvenaria do galpão central foi refeita, sem o óculo central. Foto: Mariana Cavalcanti, 2007
[3] Lateral do conjunto. Nessa foto, percebe-se as novas telhas metálicas e o ressecamento das portas de madeira. Foto da autora, 2010
[4] Vista dos armazéns em 1960, a partir do edifício da Antarctica. É possível observar a continuação da cobertura na doca voltada para a ferrovia, estruturada através de mão francesa. Foto retirada do estudo feito pelo DPH para o tombamento do conjunto de entorno da estação da Mooca e área envoltória
[5] Fachada dos armazéns voltada para o pátio ferroviário. Na foto, é possível perceber a solução original adotada para o frontão central: óculo circular e um arco acima da abertura feito com a própria alvenaria. Foto da autora, 2010
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ANTIGAS OFFICINAS VANORDEN
por uma sequência modulada de antigos proprietária daquele lote na época, com projeto galpões fabris de reconhecida qualidade arquitetônico feito pelo arquiteto Jorge Krug. Completando o conjunto de galpões existentes arquitetônica. que serão tratados neste trabalho, encontramA construção que configurava a esquina se na rua Monsenhor João Felipo, um imóvel de Levantamentos feitos no Arquivo Histórico do teria abrigado primeiramente os escritórios dois pavimentos de aparência quase residencial Departamento do Patrimônio Histórico apontam administrativos da empresa, ao que parece que configura a esquina da rua Monsenhor que esses imóveis foram construídos em 1909 uma indústria gráfica, editora ou ligada à Felipo com a rua Borges de Figueiredo, seguido pela Sociedade Anônima Casa Vanorden, fabricação de papel. Essa primeira construção assobradada foi feita concomitantemente com os galpões que lhe davam sequência na face voltada para a antiga alameda Taubaté. Tratava-se de um conjunto de dez galpões com cerca de 6 metros de altura, modulação horizontal bem demarcada a cada 4,5 metros. Pouco tempo depois, em 1911 todo o conjunto passou por algumas modificações. Foi ampliado o imóvel de esquina, uma construção de dois pavimentos originalmente muito estreita e alongada, absorvendo-se para tanto, dois módulos da sequência de galpões existentes na face voltada para a alameda Taubaté. Com isso, a área do imóvel da esquina triplicou, pois passou de 4,5 metros de largura para 13,5 metros. Ao que parece, a ampliação manteve as mesmas características construtivas e arquitetônicas do imóvel inicial, ou seja, [1] Desenhos de 1909. Projetados pelo arquiteto Jorge Krug, os imóveis foram construídos pela Sociedade Anônima Casa Vanorden. Fonte: Arquivo Municipal.
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dois pavimentos, feitos em alvenaria de tijolos aparentes, com pilastras bem evidenciadas quebrando os planos contínuos nas fachadas voltadas para as duas ruas. As envasaduras apresentam composições diferenciadas no pavimento térreo e no andar superior, embora todas sejam arrematadas com esquadrias de madeira. O emprego de platibandas por toda a extensão das fachadas não permite ver, ao nível da rua, a cobertura de telhas francesas, distribuídas por quatro águas. Uma vista aérea da cobertura revela que os dois módulos anexados posteriormente estão sob um único telhado de quatro águas, distinto do anterior, porém com a mesma solução de platibandas. Configura-se assim um imóvel de características arquitetônicas uniformes que desde 1911 passou a demarcar a esquina, construindo a finalização para a perspectiva de quem viria da rua da Mooca rumo à estação passando pela antiga rua de Oliveira, trecho inicial da atual Borges de Figueiredo. Tal perspectiva se mantém até os dias de hoje. [2] Desenhos de ampliação das antigas Officinas Vanorden, de 1911. Fonte: Arquivo Municipal.
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Quanto aos galpões fabris que se encontram na sequência imediata do imóvel que configura a esquina, a consulta aos projetos originais indica que em 1909, haviam sido feitos dez galpões com estrutura modular de 4,5m por 6,30m, e que na reforma de 1911, dois desses galpões foram absorvidos para a ampliação do imóvel de esquina. Foram então construídos mais nove galpões idênticos aos anteriores, ocupando toda a face do lote voltada para a rua Borges de Figueiredo, numa extensão de 90 metros.
[3] Interior dos galpões construídos em 1909. A parede ao fundo, denotando uma porta, faz a divisão com a ampliação de 1911. Foto da autora, 2010
O resultado que se vê ainda hoje é um conjunto uniforme de 17 galpões modulados a cada 4,5 metros, com cerca de 6,5 metros de altura, harmonioso e muito elegante. Pode-se dizer que se trata mesmo de um belo exemplar da arquitetura fabril do final do século XIX. Distingue-se na paisagem da rua pela extrema horizontalidade da sequência, assim como pelo desenho contínuo e dentado da cobertura, resultante do emprego de sheds como solução para iluminar o espaço interno.
[4] Fachada do conjunto voltada para a rua Borges de Figueiredo. Nota-se que a pintura, acima da alvenaria aparente, decorrente do novo uso prejudica a apreensão do conjunto. Foto da autora, 2010
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[5] Fachada dos galpões voltada para a rua Borges de Figueiredo. Observa-se a sequência marcante da cobertura em shed. Foto da autora, 2010
[6] Fachada do conjunto voltada para a rua Monsenhor João Fellipo. Nota-se que a pintura, acima da alvenaria aparente, decorrente do novo uso prejudica a apreensão do conjunto. Foto da autora, 2010
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3.2- por que preservar? A presença da estrada de ferro se tornaria responsável não só por uma estética assumida pelos edifícios à sua margem, a estética fabril, como por uma estética urbana que caracterizaria a área considerável da cidade, a estética industrial. Como estética urbana se poderia reconhecer a caracterização dos espaços de produção propriamente, assim como dos destinados ao armazenamento e circulação da matéria prima e mercadoria. Mas seria necessário reconhecer também os espaços de circulação, os espaços voltados à moradia operária, os espaços educacionais, os da nascente idéia de lazer urbano, os de atendimento social de modo amplo. No caso da Mooca, essa estética está restrita a uma determinada área remanescente ao longo da ferrovia que ainda mantém a idéia de conjunto nas fábricas e galpões de armazenagem. A presença das fábricas e dos armazéns fica evidenciada nos lotes amplos e quase totalmente recobertos por tantos telhados, nos quais se distinguem soluções como sheds,
lanternins e coberturas de duas águas. Muito próximo dessas áreas é possível observar outras bem demarcadas por uma situação oposta: pequenos lotes denotam tentativas de otimizar espaços destinados à moradia dos operários nas proximidades das fábricas. As ruas ali são estreitas, sugerindo um convívio intensificado nas pequenas comunidades geradas em torno dos vínculos estabelecidos a partir da produção. Nesse caso, as ruas são voltadas para um uso quase exclusivo de encontro e de aproximação da dimensão pública dos pedestres locais. A área em torno da ferrovia permite estabelecer esse tipo de diálogo com a história da cidade por que está, principalmente em termos construtivos, intimamente relacionado a todo esse processo de ocupação e de caracterização de uma estética industrial no bairro da Mooca.
A ferrovia é o elemento estruturador de uma paisagem urbana que nos coloca ainda hoje em contato direto com parte importante da história da cidade de São Paulo. Nesse sentido, a presença da ferrovia na paisagem urbana é uma forma da história da cidade continuar a ser contada, e efetivamente vivida. [1] Vista aérea da ferrovia e do rio Tamanduateí, sentido centro. Observa-se os grandes lotes fabris, em contraposição com lotes menores, destimados à moradias e comércio e serviço locais. Fonte: Panoramio.com
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Com relação ao papel histórico secundário das vias em relação à presença da ferrovia, é possível dizer que sua importância inicial estava mais no fato de constituir um acesso de apoio aos lotes voltados para a ferrovia do que elemento propriamente caracterizador de suas frentes. Por conta disso, as construções voltadas para as ruas, como por exemplo, a rua Borges de Figueiredo, a ser menos cuidadas do que aquelas imediatamente visíveis a partir da ferrovia. Tal condição parece ter sido revertida a partir do uso de veículos, que terminaram por substituir o papel da ferrovia nos primeiros tempos de industrialização. Com essa inversão, no caso dos lotes lindeiros à estrada de ferro, parecem ter sido invertidos também os papéis desempenhados pelos edifícios no interior desses lotes, transformando assim as construções voltadas para a ferrovia em fundos de quintal. Outra questão relevante para ser considerada a partir da ferrovia é de que se reporta à geografia original da cidade. A preservação da situação atual em torno da ferrovia permite uma condição privilegiada tanto para observar como para apreender a cidade. A manutenção de um gabarito baixo garante uma amplitude visual considerável. Com isso, mantém-se a possibilidade de uma imediata compreensão
da topografia. Da cota da ferrovia é possível observar ao lado oeste, bem destacado na paisagem o espigão da avenida paulista e seus prolongamentos. Do lado leste, num aclive suave e muito mais próximo, se percebem as terras mais altas que caracterizam o bairro do Alto da Mooca, região hoje em processo de verticalização. Do ponto de vista contrário, a área de baixada onde se situa o leito da ferrovia permite organizar o olhar em torno da passagem do rio Tamanduateí, em grande parte recoberto e, portanto, pouco identificável na sua condição de rio urbano. Do conjunto construído às margens da ferrovia que caracteriza uma estética industrial podese perceber a importância assumida tanto pelas chaminés ainda esparsamente presentes, como por alguns dos prédios industriais que detém um gabarito um pouco mais alto. Esse conjuntos tendem a constituir referências urbanas concretas para o bairro, e de certo modo para toda a cidade.
[2] Vista da ferrovia, a partir da estação da Mooca sentido Santos. Fonte: Panoramio.com
A região, portanto possui valores legítimos para a cidade que se propõem a dialogar o passado com o futuro e de recontar sua própria história através dela mesma.
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[3] Área de trabalho. Observa-se a ferrovia, o rio Tamanduateí, a avenida Paes de Barros, os grandes lotes industriais e a verticalização crescente. Fonte: Panoramio.com
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4- PROPOSTA DE INTERVENÇÃO O projeto de intervenção é a resposta projetual a uma série de questionamentos levantados durante a análise da região. Buscou-se recuperar o sentido urbano desta área através da reaproximação de trechos isolados da cidade, gerando maior coesão espacial e social, da recuperação dos conjuntos industriais e da proposição de novos usos. Portanto foi escolhida a estação Mooca da CPTM como centro da intervenção e o conjunto de galpões imediatamente no entorno de seus dois atuais acessos, os armazéns da antiga São Paulo Railway, o conjunto de galpões da RFFSA e as antigas Officinas Vanorden. A intenção é de criar um elemento de ligação desses dois fragmentos urbanos, criando uma centralidade na região e produzindo um espaço público democrático e de referência arquitetônica para a população. A área objeto deste trabalho abrange uma faixa de aproximadamente 70mil m² nas imediações da Estação da Mooca, compreendendo os dois lados da antiga São Paulo Railway, depois Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, atualmente operada pela CPTM no trecho metropolitano de São Paulo. As porções construídas dessas duas faces externas estão intimamente ligadas pela condição interior de estarem ambas voltadas para a estrada de ferro. Isso permite dizer
que a ocupação desse território desenvolveuse a partir de um mesmo eixo, a ferrovia, que une as duas porções e as particulariza como presença histórica nesse lugar, colocandoas, ao mesmo tempo, em relação com outras situações urbanas similares reconhecidas ao longo do percurso dessa ferrovia dentro da cidade de São Paulo.
urbano, e afirmar que intervenções pautadas na memória da cidade conseguem absorver seu entorno imediato e interagir com as localidades, da mesma forma que possibilita produzir espaços novos.
Procurou-se, portanto, no projeto de intervenção resgatar esse caráter histórico e memorial desse conjunto industrial e de sua estrita relação com a ferrovia, através da introdução de um novo elemento conector. Esse potencial deve ser explorado numa intervenção na escala urbana visando criar centralidades. Procurou-se articular as escalas do edifício e da cidade, baseado no entendimento dos problemas e nas potencialidades da região. Portanto, a todo momento, o projeto teve a interface da escala urbana para a escala de bairro. Procurou-se também incluir o pedestre na escala da cidade, pois tem este sido deixado em segundo plano no planejamento da cidade. Se expressa aqui a vontade em recontar a história da cidade através de um projeto 33
5- PROJETO O projeto proposto procurou como referência um tipo de crescimento urbano chamado de Adição ou Acréscimo, que o chileno Rodrigo Pérez de Arce coloca em seu artigo URBAN TRANSFORMATIONS & The Architecture of Additions1 . Nele, o arquiteto enuncia as várias maneiras de expansão e renovação urbana, que são limitadas a três tipos: crescimento por extensão, caracterizada pela urbanização de novas áreas que são incorporadas a cidade; crescimento por substituição, que ocorre quando novos elementos urbanos substituem aqueles pré-existentes, envolvendo assim demolições e reconstruções; e crescimento por adição, quando um núcleo urbano original é transformado por graduais adições de novos itens. As adições e acréscimos oferecem vantagens, pois, por serem graduais, incorporam parte do existente. Essa forma de crescimento urbano confere certo senso de lugar em termos espaciais e históricos, menores custos sociais e materiais, além de permitir certa continuidade no processo de construção. 1 ARCE, Rodrigo Perez de. URBAN TRANSFORMATIONS & The Architecture of Additions. Architectural Design
n.4, 1978 págs 237-266
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Nesse sentido, o partido do projeto buscou criar um elemento de conexão espacial-funcional, incorporando, valorizando e dando outro significado ao espaço existente. Um elemento que se integra ao espaço existente, buscando o pedestre em seus acessos e conduzindoos aos espaços públicos, sejam aqueles que desempenham algum uso específico, seja a própria rua. Um elemento que é rua, escada, rampa, circulação, mezanino ou cobertura. Introduz-se assim, através da transposição, com seus acessos e percursos, e de espaços livres públicos, com seus usos e particularidades a coerência global do trabalho baseada em seus principais elementos.
6- ELEMENTOS GERAIS DO PROJETO TRANSPOSIÇÃO
configurações atuais.
Nesse sentido, a proposta é de criar um elemento de transposição que permita a livre circulação de pedestres entre os dois lados da ferrovia, integrando-o ao tecido urbano, aproximando os dois lados não só fisicamente, mas também funcionalmente. O projeto de A CPTM tem um plano de enterramento das linhas uma nova estação de trem, que se adéque à de trem, porém inclui apenas o trecho Luz-Brás, nova demanda da região e à modernização pois segundo estudos técnicos a transposição da ferrovia também se faz necessário. do rio se torna complexa. Portanto, mesmo com a possibilidade de enterramento da ferrovia, a ESPAÇOS PÚBLICOS estação Mooca não está incluída no projeto. Com isso, este trabalho tem como premissa a Este trabalho acredita que os espaços públicos manutenção da ferrovia em superfície, em suas são a melhor forma de trazer de volta o A ferrovia forma uma cicatriz no tecido urbano produzindo fragmentos na cidade sem conexão física, funcional e social. Essa condição oferece uma nova possibilidade de um projeto articulador.
caráter verdadeiramente urbano aos cidadãos. Portanto, criar espaços de uso coletivo, sejam eles de lazer, comércio, educação, é a melhor forma de trazer vitalidade e resgatar a dimensão pública perdida. E tratando de patrimônio urbano, propor um uso público a esses conjuntos é uma forma de reinseri-los na vida urbana e no cotidiano do bairro. Fazer com que a população se identifique com eles através de sua ocupação, é contribuir com a preservação de valores culturais amplos desses espaços fabris, hoje ociosos e vulneráveis à demolição e aos processos característicos da atividade imobiliária.
35
3
2
1 4
6
1. Circulação elevada e estação de trem [transposição] 2. Conjunto da RFFSA e das antigas Officinas Vanorden [espaço público] 3. Praça Borges de Figueiredo [transposição/espaço público]
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5
4. Praça Presidente Wilson [transposição/espaço público] 5. Parque linear ao longo da ferrovia [espaço público] 6. Armazéns da antiga São Paulo Railway [espaço público]
Planta geral 0
30m
120m
6.1- circulação elevada e estação de trem Considerando que a ferrovia continuará em suas configurações atuais, a sua transposição pode ser estabelecida de duas maneiras: por cima ou por subsolo. Optou-se por fazê-lo por cima da ferrovia, através de uma circulação pública elevada, possibilitando a criação de visuais e novos pontos de vista da paisagem urbana, proporcionados pela topografia de várzea. Além disso, a passagem por subsolo seria uma maneira de renegar a ferrovia e tirá-la do Praça Presidente Wilson [acesso à estação]
percurso do pedestre, e como já foi explicado anteriormente, a ferrovia é um elemento de extrema importância para a paisagem urbana e para a memória industrial.
do tecido urbano e permitindo a existência de uma rede de fluxos contínua. Através dela é possível transpor a ferrovia, entre a avenida Presidente Wilson e rua Borges de Figueiredo, e acessar à nova estação de trem.
Assim, essa transposição se configura como um elemento integrador dos espaços Essa plataforma elevada foi pensada de fragmentados, de forma a dar continuidade ao maneira a manter a proporção com o entorno, espaço público e à rua, proporcionando maior mas ao mesmo tempo ser vista pelo pedestre. acessibilidade para o território, continuidade
Conjunto Antarctica
Escadaria de acesso à circulação elevada
Vestiários [parque linear ao longo da ferrovia] Circulação elevada
Plataforma de embarque e desembarque Rampa de acesso ao centro comercial Projeção da antiga estação Mooca
Galpão da RFSSA [centro comercial]
0
5m
20m
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A NOVA ESTAÇÃO DE TREM DA MOOCA A estação de trem, que se encontra no nivel da circulação elevada, é formada por dois blocos e possui quatro acessos, com quatro circulações verticais de acesso à plataforma de embarque e desembarque. A largura das circulações em volta da estação não ficaram suficientes para o fluxo gerado por uma estação de trem, pois elas estão limitadas pela própria largura da orla ferroviária. Portanto, pensou-se em criar uma espécie de circulação interna à estação, aumentando assim as possibilidades do pedestre. Os blocos da estação de trem formam módulos que permitem a implantação em fases. Essa forma de implantação foi pensada, pois o comportamento de estação de transporte público é instável, face à sua relação com a rede de transporte metropolitano. Os fechamentos da estação são transparentes ou translúcidos, pois procurou-se uma maior relação entre os acessos e a estação.
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1 2 4
1. Área de livre circulação 2. Área de livre circulação dentro da estação
3
2
1 4
3. Área restrita aos passageiros 4. Área restrita aos funcionários
4
4
3
1
Planta da estação de trem - nivel 740 0
5m
20m
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Conjunto Antarctica
Antigo armazém da São Paulo Railway [centro de convivência]
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Acesso à estação Praça avenida Presidente Wilson
Projeção da antiga estação de trem Mooca
Estação de trem
Acesso à estação Praça rua Borges de Figueiredo, em frente à rua Guaratinguetá [associação dos trabalhadores da CPTM]
0
5m
20m
0
5m
20m
41
ACESSOS Os acessos à circulação elevada e à nova estação da Mooca são os braços conectores do elemento integrador. Cada acesso é um espaço público que forma praças, comércios, ligandose ao parque linear e aos conjuntos industriais existentes a serem mantidos.
4
3
São eles: 1. Espaço que conforma a praça da avenida Presidente Wilson [existente - nova proposta]
2 1
2. Do parque ao longo da ferrovia [proposta] 3. Da galeria comercial na rua Monsenhor João Felipo [proposta] 4. Da praça proposta na rua Borges de Figueiredo, em frente à rua Guaratinguetá [proposta]
Planta geral - nivel 740m 0
42
20m
80m
Os acessos foram pensados a partir da análise dos fluxos de pedestres e de transporte público. O principal fluxo de pedestres se dá no eixo da praça da Presidente Wilson e da praça em frente à rua Guaratinguetá, na Borges de Figueiredo. A praça da avenida Presidente Wilson é um importante acesso pois é ali que se encontra o ponto de ônibus mais próximo. Além disso, ela fica praticamente em frente à rua Serra de Paracaina, via direta até a avenida do Estado e o Expresso Tiradentes. Esse eixo se configura uma importante otimização dos fluxos no eixo metropolitano, incentivando à intermodalidade entre os modos de transportes. A praça da rua Borges de Figueiredo é importante não só por se configurar o único acesso público intermitente, mas também por se encontrar a frente da rua Guaratinguetá, eixo que termina no Largo São Rafael, referência para o bairro, em meio a residências e comércio e serviços locais.
Área de projeto Fluxos e transposição
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Área de projeto
Transporte Público
Ponto de ônibus Trajeto ônibus Estação de trem Linha férrea
44
45
46
6.2- praça Presidente Wilson A praça voltada para a avenida Presidente Wilson, junto aos galpões da São Paulo Atual estação de Railway e ao pátio de manobras, está incluído trem Mooca na resolução de tombamento de 2007 do Conpresp. Nele está prevista a preservação do espaço que conforma a praça de acesso à estação de trem nas suas características Atual Associação atuais. A resolução deixa em aberto o tipo de intervenção que poderá ser feita, por isso foi preciso analisar a praça em sua configuração atual para determinar quais as características que devem ser mantidas. Através de visitas e fotografias, percebeu-se que o que caracterizava
Propriedade partcular
dos trabalhadores da CPTM Antigos armazéns da São Paulo Railway
Lanchonete
esse espaço é a perspectiva formada pelos três galpões paralelos à ferrovia juntamente com os blocos laterais construídos, finalizando na estação de trem da Mooca atual. A proposta é de reinventar o espaço da praça, mantendo suas características mais marcantes. [1] Praça em suas configurações atuais. Foto tirada pela autora em julho de 2010
Apesar dos blocos construídos ajudarem na
formação da perspectiva da praça, eles não formam um elemento único e portanto serão desconsiderados nesse trabalho. Além disso, propõe-se a retirada do muro que divide a praça do conjunto da Antarctica, integrando-o ao espaço público. Com isso, consegue-se uma maior visibilidade da ferrovia e dos edifícios do outro lado. No entanto, a perspectiva se desfaz. 47
Através de estudos de volumetria e de perspectiva, foi proposta uma marquise, que resgata o que foi considerado a configuração atual da praça. Essa marquise formará um eixo até o rio Tamanduateí e o Expresso Tiradentes, [1] Configuração atual da praça com todos os volumes [2] A circulação elevada configurando o final da praça. e a estação de trem no final dela estabelecendo uma conexão modal entre a estação de trem e o Veículo Leve sobre Pneu (VLP). Essa integração é reafirmada através da proposição de uma área verde livre seguindo o eixo da marquise. Esta estará a meio nível da plataforma elevada, conformando também uma passarela. No lugar da fachada da estação de trem atual foi proposta uma escadaria de acesso à circulação elevada, configurando assim o fim da perspectiva. Ela foi pensada de maneira a não confinar os três galpões da São Paulo Railway e ainda assim atender ao fluxo de pedestres.
[3] Retirada do primeiro volume.
[4] Retirada do segundo volume. Já é possível observar o conjunto da Antarctica e parte dos galpões da RFFSA.
[5] Retirada do último volume e a perda toral da perspectiva. É possível avistar os galpões da RFFSA.
[6] Recuperação da perspectiva através da marquise/ passarela proposta.
Como este acesso é o mais importante da avenida Presidente Wilson, pensou-se numa rampa, de acessibilidade universal, que leva o pedestre e o ciclista até a circulação elevada. Para o Conjunto da Antarctica, que hoje encontra-se desativado, foi pensado num uso de lazer, como salas de cinema, espaços de exposição e salas de espetáculos. 48
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6.3- parque linear ao longo da ferrovia Ainda no terreno da praça voltada para a avenida Presidente Wilson foi proposto um parque ao longo da ferrovia que se estende até o Viaduto São Carlos. Tal proposta se baseia na já prevista implantação de um parque linear ao longo da orla ferroviária, do PRES-MO. Este parque assume, então, um papel importante tanto para a escala metropolitana, com sua configuração linear que cruza e costura a cidade, otimizando e conectando espaços, quanto para a escala local, por ser uma área livre pública estruturadora que permite a readequação da orla.
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Tomando-se esse elemento como eixo estruturador, propõe-se um sistema de áreas verdes que se ramifica a partir da “espinha” do parque linear, interligando, assim, as praças e as quadras através dos corredores verdes. A criação de infraestrutura verde em rede tem o objetivo de beneficiar a biodiver-sidade e a mobilidade, interligando também os diversos sistemas de transporte disponíveis na região. Nesse sentido, foi proposta uma grande área verde de comércio e lazer que liga o parque linear da ferrovia ao rio Tamanduateí, que deverá ser despoluído e todo o seu entorno
requalificado, e ao Expresso Tiradentes. Esta conexão será reafirmada através da marquise/ passarela. Desta forma, o parque permite a recuperação e revalorização da ferrovia e de seus galpões lindeiros, justificando a implantação de diversos equipamentos de lazer e esporte. Isto qualifica a região a ser mais do que área de passagem, torna-se lugar que convida as pessoas a paradas, descansos ou a simples contemplação da paisagem.
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1. Antigos galpões da São Paulo Railway [centro de convivência- equipamento do parque] 2. Área de lazer para crianças [projeto] 3. Quadras poliesportivas [projeto] 4. Área de exercícios e curso d’água à vista [projeto]
5. Continuação do parque linear ao longo da ferrovia até o Viaduto São Carlos [proposta] 6. Área verde que se extende até o rio Tamanduateí [proposta] 7. Marquise/passarela [conexão modal]
Área de projeto integrada a áreas verdes propostas 0
50m
200m
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PÁTIO DE MANOBRAS O terreno está inserido numa área tombada onde está previsto a preservação dos trilhos abandonados da ferrovia dispostos dentro do terreno. O desenho do parque então foi pensado de maneira a seguir a própria disposição dos trilhos abandonados no terreno. Esta disposição dos trilhos já sugere o antigo uso dos galpões da São Paulo Railway: carga e descarga de mercadorias. Portanto a manutenção de tais equipamentos para o entendimento da função daquele galpão é extremamente importante para resgatar a memória histórica daquele lugar. No entanto, manter fisicamente os trilhos ao longo de todo o terreno iria de encontro com o próprio uso proposto, já que eles impedem a livre circulação de pedestres e ciclistas. Portanto, pensou-se em manter apenas onde não haveria circulação, nos canteiros verdes. Onde haveria circulação, propõe-se um desenho de piso, sugerindo o trilho da ferrovia e valorizando o patrimônio industrial inserido no terreno.
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Quadras poliesportivas
Antigos armazéns da São Paulo Railway
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Conjunto da Antarctica
Rampa de acesso à circulação elevada e à estação de trem
Plataforma de embarque e desembarque
Avenida Presidente Wilson
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Nova estação da Mooca
Trilhos da ferrovia mantidos
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Avenida Presidente Wilson
Antigos armazéns da São Paulo Railway
Curso d`água à vista
Conjunto da Antarctica
Rampa de acesso à circulação elevada e à estação de trem
Plataforma de embarque e desembarque
Marquise/passarela
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Passarela metálica Área de leitura e jogos Área da biblioteca
Conjunto da Antarctica
Nova estação de trem
Área da varanda Avenida Presidente Wilsnon
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ANTIGOS ARMAZÉNS DA SÃO PAULO duas áreas distintas. RAILWAY Por isso, pensou-se num uso múltiplo, onde Para o conjunto de armazéns da antiga São várias atividades podem ser desenvolvidas Paulo Railway foi pensado num uso público, e organizadas nessas duas plataformas, que funcione como equipamento para o parque conectadas por passarelas metálicas. ao longo da ferrovia. Propõe-se, portanto, um centro de convivência, O conjunto também é tomado, prevendo-se com uma biblioteca regional, espaços de sua preservação integral. leitura, estudo e jogos. Atualmente, dentro dos galpões existem alguns vagões de trem abandonados, exatamente no eixo longitudinal, amparado por duas plataformas, uma de cada lado, formando 58
organizados na plataforma do acesso. A entrada do conjunto está voltada para a ferrovia propositalmente, tentado resgatar a questão das fachadas voltadas para a ferrovia e incluindo-a no percurso do pedestre. Do lado oposto do conjunto em relação à ferrovia, na avenida Presidente Wilson, propõe-se a recuperação da plataforma de carga e descarga, transformando-a numa varanda de estudo.
O espaço da biblioteca pode se organizar na plataforma oposta ao acesso, controlando Propõe-se também a recuperação da fachada melhor a entrada e saída dos usuários através voltada à praça de acesso. das passarelas conectoras. Os outros usos são
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1. Área de jogos 2. Área de leitura de jornais e revistas 3. Guarda-volumes e entrada da biblioteca 4. Trem abandonado existente a ser mantido
5. Passarela metálica 6. Biblioteca regional 7. Área de estudos 8. Varanda
Planta dos antigos armazéns da São Paulo Railway - nivel 734.5 0
5m
20m
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CURSOS D’ÁGUA Os rios de São Paulo foram lenta e gradualmente desaparecendo da paisagem urbana, substituídos por canais retilíneos, confinados, margeados por vias expressas ou recobertos por ruas, avenidas e edifícios. Caso emblemático dessa transformação é do rio Tamanduateí. Hoje, o que vemos é a rede hídrica ignorada e repudiada pela sociedade; apenas é percebida em situações de inundações. Este trabalho acredita na importância de entender os elementos naturais como parte integrante das transformações urbanas, e nesse sentido, o potencial urbanístico dos rios urbanos deve ser explorado como elemento fundamental no processo de requalificação urbana. Dentro deste cenário, este trabalho procurou resgatar a questão hídrica, através da volta de cursos de água para o contato direto com o homem, estabelecendo uma relação mais próxima entre as pessoas e o recurso hídrico. Sobrepondo-se o mapa de 1890 e da área de projeto deste trabalho, foi possível observar a existência de um córrego atravessando o parque ao longo da ferrovia. Foi então proposto que este córrego fique aberto e visível na paisagem urbana. 60
[1] Planta Geral da Capital de São Paulo organizada sob a direção do Dr. Gomes Cardim, Intendente de Obras, 1897. Câmara Municipal de São Paulo
[2] Foto aérea com o traçado atual do Rio Tamanduateí. Base: Google Earth, 2010.
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6.4- galeria comercial e telecentro GALPÕES DA RFFSA Os três galpões da RFFSA, paralelos à ferrovia, apesar de estarem incluídos nos estudos de tombamento, ainda não são tombados, pois no Plano Diretor de 2004 não foram indicados como ZEPEC e, portanto, não foi aberto um processo de tombamento para o conjunto. Apesar desses três galpões industriais serem tratados como um conjunto único, inclusive historicamente, arquitetonicamente aquele primeiro paralelo à ferrovia apresenta algumas diferenças em relação aos demais. Já pela fachada é possível perceber que existe ali uma diferença nesses conjuntos. Enquanto o primeiro possui uma fachada recortada com uma inscrição de siglas, os outros dois possuem uma fachada mais alinhada, com muitas aberturas decorrentes do novo uso. A observação da estrutura da cobertura também mostra a diferença entre os conjuntos. Apesar de terem usado a mesma solução de cobertura metálica com nós espaciais, visualmente é possível perceber a diferença entre ambos. Como diretriz de intervenção em bens de interesse histórico, é preciso decidir o que deverá ser preservado e por que. Nesse sentido, o que mais se destaca nesse conjunto é a estrutura 62
da cobertura metálica, pois além de serem pioneiras para a época da construção dos estimada para os galpões, elas são os elementos diferenciadores dos conjuntos. Assim, tentou-se não apenas mantê-las, mas também destacálas no espaço interno, deixando em contraste com a iluminação natural produzida pelos lanternins em telhas de material transparente. Apesar da fachada dos galpões também se configurar um elemento de diferenciação, optou-se por manter apenas a fachada frontal do primeiro galpão paralelo à ferrovia, pois é o que menos havia intervenções e descaracterizações. Como uso para o conjunto, optou-se pelo comercial, com um acesso para a estação de trem. A plataforma elevada “entra” no conjunto, formando um mezanino, com lojas e cafés. No nível da rua tem mais lojas, um restaurante e alguns boxes comerciais. Apesar do uso não ser compatível com uma rua sem saída, o uso comercial foi pensado por causa da proximidade com a rua da Mooca, importante eixo comercial da região. Na fachada do galpão voltada à ferrovia propõe-se a recuperação da plataforma de carga e descarga de materiais, criando ali
uma varanda voltada a uma área verde e à ferrovia. Uma alvenaria de tijolos aparentes e um brise metálico fazem a integração da fachada dos conjuntos. A vedação é feita por panos de vidro, possibilitando uma maior relação ruaedifício-ferrovia.
Fachada envidraçada
Brise metálico
Alvenaria em tijolo aparente
Fachada em alvenaria pintada existente a ser mantida
Antigas Officinas Vnorden
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Fachada rua Monsenhor João Fellipo - proposta
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Fachada rua Monsenhor João Fellipo - atual 63
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RUA MONSENHOR JOÃO FELLIPO
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1. Térreo - boxes comerciais 2. Lojas
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3. Área de café 4. Passarela de ligação a estação de trem
Planta dos galpões da RFFSA - nivel 740 0
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RUA MONSENHOR JOテグ FELLIPO
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1.Boxes comerciais 2. Sanitテ。rios e depテウsito 3. Lojas
4. Restaurante 5. Varanda
Planta dos galpテオes da RFFSA - nivel 734.5 0
5m
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Área de café Restaurante
Rampa de acesso ao mezanino
Rua Borges de Figueiredo
Circulação elevada
Rampa de acesso ao mezanino
Antigas Officinas Vanorden [telecentro]
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Antigas Officinas Vanorden [telecentro]
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Boxes comerciais Rampa Escada
Terreno pertencente aos Moinhos Gamba - atualmente indĂşstria Tecnoplast
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ANTIGAS OFFICINAS VANORDEN
rua Monsenhor João Fellipo.
dividido em três partes, oito galpões construídos em 1909, nove galpões da ampliação de 1911 e o antigo escritório de esquina com dois pavimentos, foi pensado em três usos para cada um. O primeiro seria um espaço com salas de aula para cursos voltados para a área da informática, o segundo seria um telecentro e o último a área de administração dos cursos.
Hoje em dia toda a sua fachada está descaracterizada, pintada e com algumas janelas que se transformaram em portas de acesso intenro. Este trabalho propõe a retirada da pintura decorrente do novo uso O conjunto é tombado pelo Conpresp, que e a recuperação da fachada com alvenaria indica sua preservação integral, incluindo de tijolos aparentes, resgatando assim sua remanescentes de seu sistema construtivo, como presença urbana. Como o telecentro é um espaço coletivo, de estruturas, tesouras, coberturas, alvenarias, acesso livre, e serve de apoio para a estação O espaço interno é amplo, intensificado de trem, seu acesso se dá apenas pela galeria envasaduras e caixilhos. pela iluminação natural que os sheds comercial, integrando-o com todo o conjunto Ele é importante pela sua presença urbana, sua proporcionam. Por isso foi proposto um uso da estação. fachada em tijolos aparentes e sheds tradicionais que permitisse a utilização do espaço aberto, de construções industriais é marcante quem sem compatimentação, pelos menos em parte, O acesso do espaço de cursos se dá apenas passa pela rua Borges de Figueiredo. O antigo para sua apreensão. pela única porta do projeto original na rua edifício de escritórios de dois pavimentos faz a Borges de Figueiredo, permitindo assim a finalização da rua, marcando a esquina com a Como o próprio espaço interno edifício é recuperação das aberturas da fachada. Ao lado do conjunto industrial da galeria comercial existe hoje o conjunto das antigas Officinas Vanorden, uma antiga gráfica e fábrica de papel.
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1.Sala técnica 2. Recepção cursos 3. Sanitários 4. Sala de aula
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5. Área de estudo 6. Área wireless 7. Computadores 8. Espera
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8 Planta dos galpões da RFFSA - nivel 734.5 0
5m
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9. Adminisração dos cursos
Construção em 1909 (fonte: arquivo municipal) Ampliação em 1911 (fonte: arquivo municipal)
Planta dos galpões da RFFSA - nivel 734.5 0
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14-Mapa-Tombamento Rua Borges de Figueiredo-Mooca.jpg (1754x1240x16M jpeg)
6.5- praça Guaratinguetá Esse espaço foi pensado para configurar o acesso principal da rua Borges de Figueiredo à estação de trem e à transposição. Através da análise do mapa de tombamento do Conpresp, percebeu-se que havia um espaço dentro do terreno pertencente aos antigos Moinhos Gamba que não havia sido tombado. Ele era perfeito para se colocar ali um acesso/praça, pois ficava exatamente na continuação do eixo da rua Guaratinguetá, dando continuidade a via pública. A praça de acesso à estação se dá principalmente por uma escadaria/rampas que configuram uma grande praça. Esses espaços criam um lugar agradável de estar e de encontro com áreas verdes, com o intuito de garantir a qualidade do percurso realizado pelo pedestre e trabalhar a sua mobilidade urbana como questão que vai além da funcionalidade.
[1] Bens tombados no entorno da estação da Mooca (cinza escuro) e área envoltória. Fonte: Conpresp Resolução 14 de 2007
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Neste momento, em que a rotina das pessoas está cada vez mais controlada e ocupada, sentar-se no espaço público converte-se praticamente em ação de cidadania, dentro de um processo de apropriação temporária de fragmentos urbanos no qual cria-se em situações
efêmeras a percepção de urbanidade. Um dos problemas dessa solução era a produção de um espaço abaixo da escadaria de difícil utilização, sem iluminação e ventilação, confinado entre os edifícios adjacentes. A solução foi criar um desenho de escada-praça com recuos, criando áreas verdes no nível da rua, que permitisse a iluminação e ventilação natural abaixo da escadaria. E assim, foi possível colocar um espaço de convivência dos trabalhadores da estação Mooca, já que o programa da estação teve de ser bastante reduzido por conta do espaço diminuto disponível, e a Associação dos Trabalhadores da CPTM, que hoje localiza-se em um dos blocos da praça da avenida Presidente Wilson. Nesse espaço está organizado um vestiário, um refeitório com acesso para a área verde externa e salas de trabalho com iluminação e ventilação natural. Os funcionários da estação Mooca tem acesso direto à estação através de um bloco de circulação vertical.
RUA
BORGES
DE
FIGUEIREDO
RUA
BORGES
DE
FIGUEIREDO
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Planta Praça Borges de Figueiredo, em frente a rua Guaratinguetá
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Planta Associação dos trabalhadores da CPTM - nivel 734.5 1. Refeitório 2. Vestiários 3. Sala
4. Auditório 5. Circulação vertical para acesso à estação de trem
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Espaço da associação dos trabalhadores da CPTM Estação de trem proposta
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Praça de acesso à circulação elevada e à estação de trem
Rua Borges de Figueiredo
Área do refeitório externa
Centro de convivência dos funcionários da estação da Mooca
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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS Quando este trabalho ainda era apenas uma ideia surgindo, a vontade de discutir o patrimônio industrial se restringia apenas à escala do edifício e o produto final era totalmente diferente do que foi exposto. Ao longo do processo de análise da área percebeu-se que não seria possível abordar a questão do patrimônio industrial, sem deixar de tratar das questões urbanas que estavam envolvidas no processo de formação da cidade. Então, cada vez mais foi amadurecida a ideia de que o patrimônio deve ser pensado na escala da cidade, abordando as questões de planejamento urbano junto com as questões de memória. Afinal, os dois devem andar juntos e não um subordinado ao outro. Por isso, este trabalho foi sendo direcionado para uma perspectiva não imaginada antes, mas nem por isso foi deixado de lado a questão principal desejada desde o início: como preservar e valorizar o patrimônio industrial da cidade de São Paulo. Nesse processo, o projeto procurou a todo o momento articular a escala do edifício com a escala da cidade.
necessariamente ser reanalisadas quando se aumenta a escala, para o posterior detalhamento dos projetos dos edifícios, equipamentos e espaços livres públicos. No entanto, todas as soluções ficam subordinadas às diretrizes urbanísticas gerais e aos parâmetros de implantação propostos. O entendimento do que realmente envolve um projeto de requalificação urbana, envolvendo conjuntos de interesse histórico foi um ganho considerável, e talvez somente possível, para mim, pelo aprofundamento e imersão total na problemática que decidiu-se estudar. Portanto termino este trabalho tendo a certeza de que as questões de preservação do patrimônio devem estar relacionadas com as questões da cidade e integradas ao planejamento urbano. Desde o momento da escolha do perímetro a ser trabalho até o processo de projeto, cada edifício escolhido e cada elemento projetado foi pensado de maneira a articular a questão urbana com os conjuntos a serem valorizados e preservados.
Entende-se que as soluções adotadas devem 77
8- BIBLIOGRAFIA ARCE, Rodrigo Perez de. URBAN TRANSFORMATIONS & The Architecture of Additions. Architectural Design n.4, 1978 ARINI, Ruy. Transformação urbana: Mooca. BO BARDI, Lina. Lina Bo Bardi. Instituto Lina Bo e P.M.Bardi. Organizador: Marcelo Carvalho Ferraz. 1993. São Paulo. CALDEIRA, Vasco; FANUCCI, Francisco; FERRAZ, Marcelo; SANTOS, Cecilia Rodrigues dos – Francisco Fanucci, Marcelo Ferraz: Brasil Arquitetura. São Paulo: Cosac Naify, 2005. CARTA DE NIZHINY TAGIL CARTA DE VENEZA CARTA DE WASHINGTON DEAN, Warren. A Industrialização de São Paulo. São Paulo. DIFEL, s.d. DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ JORGE, Luís Antonio. O espaço seco. FAU-USP. Tese de doutorado 1999. São Paulo KÜHL, Beatriz Mugayar. Preservação da Arquitetura Industrial em São Paulo: questões teóricas (relatório científico elaborado em apoio
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