Mestre Divino

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL - HABILITAÇÃO EM JORNALISMO

MESTRE DIVINO - AS HISTÓRIAS QUE ENVOLVEM SENHORZINHO.

GEISIANY GARNES DE ANDRADE KEMILA PELLIN DOS SANTOS

Campo Grande NOVEMBRO /2013


GEISIANY GARNES DE ANDRADE KEMILA PELLIN DOS SANTOS MESTRE DIVINO - AS HISTÓRIAS QUE ENVOLVEM SENHORZINHO.

Relatório apresentado como requisito para aprovação na disciplina Projetos Experimentais do Curso de Comunicação Social / Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Para realização de vídeo documentário. Orientador (a): Prof. Dra. Taís Marina Tellaroli Fenelon.

UFMS Campo Grande NOVEMBRO - 2013



SUMÁRIO

Resumo ........................................................................................04 1 - Alterações no plano de trabalho .............................................05 2 - Atividades desenvolvidas .......................................................06 2.1 Período Preparatório..................................................06 2.2 Execução....................................................................07 2.3 Revisão Bibliográfica..................................................08 2.3.1 Referências bibliográficas.............................11 3 - Suportes teóricos adotados .....................................................12 4 - Objetivos alcançados ..............................................................17 5 - Dificuldades encontradas ........................................................18 6 - Despesas (orçamento) ............................................................19 7 - Conclusões .............................................................................20 8 - Apêndices ...............................................................................22 9 - Anexos ....................................................................................23


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MESTRE DIVINO. AS HISTÓRIAS QUE ENVOLVEM SENHORZINHO

Resumo O documentário "Mestre Divino. As histórias que envolvem Senhorzinho", conta a passagem de um homem pela região onde hoje está localizada a cidade de Bonito-MS. Considerado um profeta por moradores locais, Senhorzinho apareceu na década de 1940, quando o local ainda era um vilarejo. Quase não há documentos impressos sobre ele, e a principal fonte de pesquisa é a memória das pessoas que o conheceram. Suas particularidades e os mistérios que envolvem sua morte mechem com o imaginário e nos desperta o desejo de conhecer melhor esse personagem. Afinal, ele não só foi um grande líder messiânico, como esteve presente na história da cidade (1948), desafiando autoridades da época, como coronéis e comerciantes poderosos. Neste contexto foram coletados depoimentos e imagens para a construção do documentário, que reforçam a presença deste ser místico e o valor cultural dele para a cidade, como a roupa que ele usava e objetos de seu pertence.

Palavras-chave: Cultura, Misticismo, Bonito-MS, Vídeo-documentário.


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1- ALTERAÇÕES DO PLANO DE TRABALHO

No modelo inicial do trabalho o objetivo principal era a produção de um vídeodocumentário para mostrar as transformações que a crença no Profeta Senhorzinho sofreu no decorrer dos anos, em Bonito – MS. Para isso, sentimos a necessidade de construir uma “linha do tempo” que ilustrasse esta progressão, através da coleta de informações sobre a vida do profeta com pessoas de todas as idades. Conforme realizamos as entrevistas percebemos o quão importante este personagem deveria ser para a cultura local, uma vez que sua história é rica em detalhes característicos da cidade e mexem com a fé de toda uma geração. Porém ao decorrer do trabalho foi notado a falta de conhecimento a fundo da historia por grande parte da população, impossibilitando mostrar as transformações dessa crença sem antes contar quem realmente foi Senhorzinho . Por isso, resolvemos mudar o foco inicial do trabalho, para melhor divulgar a história deste personagem e suas curiosidades, buscando depoimentos que reforçam e explicam a passagem do profeta pela cidade de Bonito. Desta forma esperamos transformar o vídeo-documentário em instrumento de divulgação e pesquisa para possíveis estudos sobre o tema.


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2- ATIVIDADES DESENVOLVIDAS Foram desenvolvidas pesquisas bibliográficas de cunho cultural e social, levantamento de documentos históricos a respeito do assunto com moradores da cidade de Bonito, assim como na biblioteca local. Pesquisas de campo para determinar locais passiveis de gravação e pontos relevantes para o documentário. Gravação de seis entrevistas e de imagens de apoio. E por fim, acompanhamento e gravação da peregrinação dos fiéis até a Capela do Senhorzinho, aproximadamente 12 quilômetros, no dia de 12 de outubro, dia de Nossa Senhora da Aparecida, a quem o profeta era devoto.

2.1 Período Preparatório Inicialmente foi desenvolvido o pré-projeto no qual definimos a metodologia e o foco do trabalho e realizamos o levantamento bibliográfico, onde conseguimos alguns documentos que reforçam a existência do Senhorzinho. No levantamento bibliográfico buscamos também autores que explicam a importância da cultura local, e que defendem a lembrança, história oral, como sendo a matéria-prima de produção da cultura, reforçando o sentido do trabalho. Após leitura e estudos realizados para termos embasamento teórico partimos para a pesquisa de campo. Buscamos conhecer os locais ainda frequentados pelos fieis, assim como pontos estratégicos da cidade, como a Praça da Liberdade e a Capela Sagrada Família, primeira igreja do local, para construção e ambientação do documentário e para melhor compreensão do tema.

2.2 Execução

O documentário foi construído com base em depoimentos de pessoas que conhecem em detalhe a história de Senhorzinho, para que a passagem do profeta pela cidade fosse retratada com fidelidade. Para isso montamos um roteiro no qual optamos por entrevistar primeiro os fieis diretos do Senhorzinho, ou seja, pessoas que conviveram com ele, acreditando que


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assim teríamos uma versão mais real dos fatos. O casal João Davi Vargas Machado, 78, e Elza de Moraes Vargas, 74, comerciantes nascidos em Bonito, cotam que ainda eram muito jovens quando o Senhorzinho passou pela região, mas se lembram com clareza dos milagres e transformações que o profeta realizou no local. Elza descreve detalhes do momento em que os oficiais capturam Senhorzinho, enquanto Davi complementa com o nome do delegado, Panta Brum, que foi responsável pela prisão. Outra contribuição importante do casal, é no momento em que Elza narra como um de seus irmãos foi curado pelo profeta . Margarida Ovando, 83, é peça fundamental na construção do documentário, por possuir as vestimentas que o profeta usava, reafirmando a existência do mesmo. Além de conhecer a rotina dos seguidores de Senhorzinho e a maneira como eram feitas as orações. Na sequência entrevistamos fieis, que mesmo mais novos, conheciam a história a fundo, por ser uma fé passada de geração para geração dentro das famílias. Como a comerciante Paula Balbueno Trindade, 58, que teve contato com Senhorzinho através de sua mãe, e até hoje guarda o objeto utilizado pelo profeta para acordar os fieis nas novenas que costumavam adentrar a madrugada. Paula também desmistifica uma das lendas mais contadas pelos moradores, a da serpente gigante, presa por Senhorzinho em uma caverna na fazenda Serra Limpa, e que se libertada, destruiria a cidade de Bonito. A guia turística, Fernanda de Souza Reverdito, 32, descendente dos fundadores da cidade e sobrinha de Theodorico de Góes Falcão, poeta e escritor da cidade nas décadas de 40 á 70, é a personagem que melhor descreve os passos do Mestre Divino, por crescer na fazenda ao lado da capela, na qual também está localizada a fonte sagrada de onde o profeta retirava água para fazer as curas. Em 2004 gravou o documentário "Entre rios e histórias" que também aborda a história de Senhorzinho. O ultimo entrevistado, foi o professor, Luiz Carlos Souza Coelho, formado em Língua Portuguesa e que ministra história e literatura em algumas escolas. Sua entrevista foi necessária para dar um embasamento técnico para a suposta morte do Mestre.


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Para a gravação de todas as entrevistas e imagens de apoio,além da procissão de Nossa Senhora Aparecida, santa na qual Sinhozinho era devoto, que aconteceu no dia 12 de Outubro, foram realizadas cinco viagens para Bonito-MS. A decupagem e montagem do vídeo documentário só teve inicio após todas as gravações. O documentário tem cerca de 16 minutos e foi dividido por episódios. O primeiro narra as características físicas e as peculiaridades do profeta. A segunda parte relata a peregrinação a Capela do Mimoso, onde os fiéis fazem uma caminhada de 13 km. No capitulo três é descrita histórias de devoção e milagres, além de alguns contos relacionados ao Senhorzinho, como o conto da serpente. E por ultimo, a quarta parte é marcada pela perseguição e suposta morte do Mestre Divino.

2.3 Revisão Bibliográfica

Bonito é uma cidade do interior de Mato Grosso do Sul, fundada em 1948 pelo Capitão Luiz da Costa Leite Falcão,sendo ele, também o primeiro escrivão e tabelião da cidade. Segundo a última pesquisa do IBGE, em 2010, Bonito possui 19.587 habitantes. A cidade já recebeu diversos prêmios relacionados ao turismo e a preservação da natureza. O mais recente foi em outubro de 2013, quando Bonito foi considerado o Melhor Destino para Turismo Responsável no World Responsible Tourism Awards (WTM London). Sua história é marcada por lendas e mitos que mexem com a imaginação é a fé dos habitantes, como o a lenda das 700 luas, que conta a história da jovem índia Cacai que se apaixonou por um prisioneiro estrangeiro, com o qual tentou fugir mas foi perseguida pelo noivo guerreiro e morta nas águas do rio formoso, onde o sangue dela e de seu amado foram derramados deixando assim as águas cristalinas. Outro personagem importante da cultura local é o Profeta Senhorzinho, que por ter feito parte da história da cidade de maneira marcante, desafiando autoridades locais e intensificando a fé dos moradores, escolhemos para ser o personagem de nosso documentário.


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O primeiro a documentar a passagem do profeta por Bonito foi Theodorico de Góes Falcão, poeta e escritor da cidade nas décadas de 40 à 70, que publicou quatro obras sobre Bonito, usadas até hoje como material de pesquisa; entre elas o livro "Amor, Justiça e Verdade - O Senhorzinho". Senhorzinho viveu na cidade por volta de 1940, quando Bonito era um vilarejo com características de uma sociedade rústica, que contava apenas com alguns estabelecimentos que supriam as necessidades dos moradores do local, não mais que mil habitantes, como residências, pequenos comércios, uma farmácia, o cartório, a delegacia, uma escola, e uma igreja (Capela Sagrada Família). O termo "Profeta", quando pensado em sua essência (aquele que entre os hebreus predizia o futuro supostamente por inspiração divina; vidente; adivinho) pode parecer contraditório quando atribuído a Senhorzinho, uma vez que o mesmo era mudo e pregava apenas por gestos, sinais e escrituras. Suas características físicas também eram muito particulares. Cabelos longos e loiros, apesar da pele levemente morena. Barba comprida e a ausência do braço esquerdo, que não se sabe ao certo, se não o tinha ou apenas o mantinha escondido. A força física é um elemento destacado por todos os fiéis. A personalidade era algo intrigante. Muito sistemático, não entrava na casa de ninguém e nem comia ou bebia nada que lhe era oferecido. O que para os fiéis era um sinal de simplicidade e não arrogância, como muitos podem entender. Tinha orações próprias, que exaltam a natureza e tudo que ela oferece. Procurava mostrar a seus seguidores que comportamentos contrários a vontade de Deus seriam repudiados e quem os praticasse seria castigado. Mesmo sendo devoto de Nossa Senhora de Aparecida, Senhorzinho não estava diretamente ligado a Igreja Católica. Na verdade, ele surge no vilarejo em uma época em que Bonito estava esquecido, tanto pela Igreja como pelo Estado. Mesmo tendo predominância da religiosidade católica não havia uma autoridade religiosa que pudesse orientar e sustentar as crenças. Era comum, de tempos em tempos, a vinda de um padre das cidades vizinhas, Miranda e Bela Vista, para realizar bênçãos, batismos, casamentos e missas em datas de comemoração.


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Arthur Flores (2006), explica na monografia " Sinhozinho, um movimento messiânico em Bonito-MS", que é exatamente em contextos como este que uma figura messiânica se torna necessária e ganha força.

De maneira geral, o messias seria o líder religioso com poderes especiais que vem ao encontro das necessidades de um grupo oprimido, esperado por um grupo que acredite na vinda de um enviado divino libertador. Quando consideramos essa concepção para entender o movimento messiânico de Bonito, é possível, imediatamente, perceber esse líder em Sinhozinho, e a sociedade de Bonito no grupo predisposto a se envolver com a presença de um enviado (FLORES, 2006, p. 53). A maneira como é conhecido, Mestre Divino, os ritos ainda cultivados, e a procissão para Nossa Senhora, que leva todos os anos, no dia 12 de outubro, os fieis a uma caminhada de 12 quilômetros até a capela construída por Senhorzinho, mostra a importância desse personagem até os dias de hoje. O artigo escrito por Isabella Banducci Amizo e Álvaro Banducci Júnior (2012), descreve a romaria do Senhorzinho.

A peregrinação, envolvendo os sacrifícios, as orações e a visita à capela sagrada, constitui se numa espécie de ritual religioso. É possível notar que esse ritual tem início desde o momento em que os romeiros partem de suas casas, quando deixam para trás seu cotidiano e começam a entrar em contato com o âmbito sagrado, o que se fortalece ao longo do percurso (BANDUCCI JUNIOR; GOMES, 2012, p. 19). Ainda em torno dessa figura divina foram se formando histórias, passadas de geração a geração. A mais conhecida e também mais discutida é o conto da serpente. Conta-se que Senhorzinho prendeu em um morro da cidade uma serpente gigantesca que aterrorizava os moradores, e marcou o local com uma cruz. Outro fato curioso sobre o profeta, é que o mesmo não entrava na casa de ninguém, por isso, eram construídas capelinhas de bambu e madeira pelos locais onde passava para que ele pudesse realizar as orações e novenas. As capelas eram seladas com cruzes feitas pelo próprio profeta.


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Com o tempo, muitas dessas construções foram depredadas, sejam por novos moradores, vândalos, ou mesmo os próprios fiéis que acreditam na cura de doenças com remédio feito de lascas de madeira das cruzes.

2.3.1 Referências bibliográficas BANDUCCI JUNIOR, A. AMIZO, I. B. GOMES, L. S. Romaria do Sinhozinho devoção e fé em Bonito-MS. 2010 BARBERO, Martin. Dos meios às mediações, matrizes históricas da mediação de massa. Rio de Janeiro: UFRJ, 1997. BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. FLORES, Artur Silveira. Sinhozinho, um movimento messiânico em Bonito-MS. Trabalho de Conclusão de Curso em Ciências Sociais. Campo Grande: UFMS, 2006. PUCCINI, Sérgio. Roteiro de documentário, da pré-produção à pós-produção. Campinas: Papirus, 2009. SANTOS. F. S. D. Histórias de vida e história da cultura. História, Ciências, Saúde Moranguinhos. V. 1, p. 85-98, mar./jun. 1998. VALENTE, Ana Lúcia E. F. Educação e Diversidade Cultural, Um desafio da atualidade. São Paulo: Editora Moderna. 1999. LARAIA, Roque de Barros. Cultura um Conceito Antropológico. Rio de Janeiro: Zahar Ed. 2001. ROUSSO, Henry. A memória não é mais o que era. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO, Janaína. Usos e abusos da história oral. 3ª ed. Rio de Janeiro: FGV, 2000, p.93 - 102. BECKER, Jean-Jacques. O handicap do a posteriori. in: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO, Janaína. Usos & abusos da história oral. Rio de Janeiro, FGV 1996, p. 27- 31. FALCÃO, Theodorico de Góes. Bonito o gigante adormecido. Mato Grosso do Sul. 1980, p 25 -26. BALBUENO, André Paz. Carta ao Mestre Senhorzinho. Ano desconhecido. SOUZA. Jose Antônio. Literatura e Identidade Cultural em MS: Algumas Fronteiras e a (Des)Identificação com o Pantanal. Londrina, 2008, p. 33. OLIVEIRA, Sebastião Monteiro; LIMA Antonia Silva de. O mito na formação da identidade. UFAM, 2006, p. 12


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3- SUPORTES TEÓRICOS ADOTADOS

Para o desenvolvimento deste trabalho e construção de um vídeo documentário iniciamos a coleta de informações a partir da pesquisa bibliográfica, na qual definimos como o documentário será desenvolvido. Usando a internet, a biblioteca da cidade, entrevistas com moradores e documentos cedidos por eles, conseguindo levantar materiais que solidificaram o trabalho. Roque de Barros Laraia e Ana Lúcia Valente contextualizam o termo cultura dentro da sociedade. Valente (1999) explica que a cultura se baseia em uma transmissão contínua de conhecimento, e que tal processo é inseparável da condição social do homem. "Não se pode compreender o homem dissociado da sociedade, da cultura e da educação construídas historicamente por ele próprio. Isso porque o homem é universal é ele mesmo histórico e se transforma". Laraia, por sua vez, defende que a herança cultural é desenvolvida através de inúmeras gerações. Indivíduos de culturas diferentes podem ser facilmente identificados por uma série de características, como o modo de agir, vestir, caminhar, comer e falar.

O modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e mesmo as posturas corporais são assim produtos de uma herança cultural, ou seja, o resultado da operação de uma determinada cultura. (LARAIA, 2001, p. 68). José Antonio de Souza, no artigo "Literatura e Identidade Cultural em MS: Algumas Fronteiras e a (Des)Identificação com o Pantanal", publicado em 2008, comenta alguns pontos da cultura brasileira, explicando que "a diversidade cultural do país, assim como o processo de identificação nacional, relaciona-se à construção de identidades regionais distintas". Neste contexto, Souza detalha que existe uma preocupação significativa dos estados com a consolidação de uma identidade própria, principalmente os criados á pouco tempo, com uma tradição cultural que não faz parte dos grandes centros. Mato Grosso do Sul se encaixa neste grupo por possuir apenas 36 anos e estar em uma constante busca da reafirmação de sua cultura, que para alguns historiadores,


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é fragmentada e se baseia num conjunto de manifestações artístico-culturais desenvolvidas pela população sul-mato-grossense, com influencia em outras culturas. Uma mistura de várias contribuições das muitas migrações ocorridas em seu território.

Assim, se por um lado temos a emergência de nações e de indivíduos multifacetados, por outro se evidencia uma espécie de necessidade da construção de identidades regionais. (SOUZA. Jose Antônio, 2008, p. 33) Entendido isso, partimos para uma forma específica de manifestação cultural, que será base para a compreensão do no trabalho. O livro Dialética da Colonização, de Alfredo Bosi (1992) trata de temas como Culturas Brasileiras e das formas de manifestações de cada povo, sendo importante sua leitura para compreender como funcionam as crenças populares e de onde são oriundas. Se nos ativermos fielmente à concepção antropológica do termo cultura, que é, de longe, a mais fecunda, logo percebemos que um sem-número de fenômenos simbólicos pelos quais se exprime a vida brasileira tem a sua gênese no coração dessa vida, que é o imaginário do povo formalizado de tantos modos diversos, que vão do rito indígena ao candomblé, do samba-de-roda à festa do Divino, das Assembleias pentecostais à tenda de umbanda, sem esquecer as manifestações de piedade do catolicismo que compreende estilos rústicos e estilos cultos de expressão. (BOSI, 1992, p. 161). O catolicismo rústico, é manifestado em sociedades em condições de isolamento, e tem como características as formas de religiosidade populares católicas baseadas nas festas, danças, rezas e romarias que se realizam sem a interferência e oficiais da Igreja. Esta forma de catolicismo comentada por Bosi e fundamentada por Maria Pereira de Queiroz (1965), é a principal vertente da cultura popular que iremos explorar em nosso trabalho. Visto que, segundo Pereira de Queiroz, os messias sertanejos foram todos líderes reformistas e não revolucionários, que se envolviam em lutas políticas ao lado de mandatários locais, contra forças políticas, ou mesmo, "ditadores", fazendeiros e comerciantes da época.


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Segundo ela, o agrupamento de algumas ou muitas famílias, vinculadas pelo sentimento de localidade, pela convivência, pelas práticas de auxílio mútuo e pelas atividades lúdico-religiosas, definem uma sociedade rústica, e nesse tipo de sociedade é comum, ou até mesmo obrigatório, a existência de uma figura messiânica. Mesmo com uma história tão rica, a existência de Senhorzinho, aos poucos, vai deixando de ser repassada entre os moradores da cidade, um pouco por falta de incentivo da cultura local, ou mesmo pela idade já avançada dos

habitantes que

conhecem e viveram com o profeta. Outro fator agravante para o desaparecimento deste personagem é o desinteresse de alguns governantes de Bonito, que durante um longo período, eram de religiões que vão contra as práticas do catolicismo, principalmente a idolatria a "Santos". Além dos próprios líderes católicos, que ao chegar na cidade, não reconhecem a importância de Senhorzinho para a população local e acaba ignorando sua presença, ou reprimindo as manifestações de fé que envolvem o mesmo. Para Martin Barbero (1997) o descaso cultural é inevitável dentro de uma sociedade onde a cultura popular não é compatível com os interesses do Estado. “Os foros e particularidades regionais, em que se expressam as diferenças culturais, se convertem em obstáculos à unidade nacional que sustenta o poder estatal”, isso porque o Estado é incompatível com uma sociedade polissegmentada, como as formadas pela cultura popular regional, local, onde as relações e equilíbrio internos são regidos por rituais e sistemas de normas. Para resgatar a passagem de Senhorzinho por Bonito, usamos como base os conceitos de Fernando Sergio Dumas dos Santos e Henry Rousso, uma vez que o documentário é constituído através da historia oral, devido a falta de materiais sobre o assunto. O objetivo da história oral é recuperar e recriar por intermédio da memória dos informantes, momentos importantes do passado, com o intuito de lapidar e reconstituir informações relevantes para a sociedade.

A memória [...] acarreta de fato uma representação seletiva do passado, um passado que nunca é aquele do indivíduo somente,


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mas de um indivíduo inserido num contexto familiar, social, nacional. (ROUSSO, 2000: 94). Em "O mito na formação da identidade", Sebastião Monteiro Oliveira e Antonia Silva de Lima defendem que a validade do mito está na cultura local. O homem busca a plenitude e é o mito que vai responder essa inquietação, preencher o "vazio". Isso mostra a importância desse conhecimento no individuo contemporâneo, deixando transparecer implicações na identidade individual e coletiva. Mas o mito não desaparece, porque estabelece um elo de ligação entre o homem e suas origens, sua memória cultural, e a explicação da história dos povos primitivos. Representando um dos últimos redutos para a preservação de importantes valores culturais e a própria existência de comunidades inteiras [...]. ( OLIVEIRA, LIMA, 2006, p.12). Todavia não devemos confundir os termos "memória" e "história". A memória segundo Becker, é o elemento principal para reconstituição da história. Principalmente quando esta ligada a um grupo restrito, que possui a oralidade como único arquivo.

"Em história devemos mesmo utilizar o que temos. Quando falo de fonte objetiva, não digo que ela o seja no sentido pleno do termo, mas simplesmente que ela existe. É um documento que se encontra ali e que o historiador explora. A história oral é extremamente útil para preencher as lacunas da história, para compensar a falta de documentação. Há porém um grande risco: preenchê-la de modo falso. Quando nada mais temos senão a história oral, realmente incorremos no pecado a que me referi há pouco, ter uma história de fonte única, o que é dramático para a história. (BECKER, Jean Jacques, 1996, p.31) Nesse sentido a história oral e a comunicação se completam, uma vez que a primeira ajuda a reviver momentos e acontecimentos importantes do passado, que não foram registrados. Enquanto a segunda não só divulga, mas também atribui autenticidade ao fato. Dumas (1998) explica que é a partir da memória do depoente que se constrói a narrativa. " Esta pode ser mais ou menos conduzida por um roteiro, mas a dimensão que dá o tom, o ritmo e o encadeamento dos fatos é, efetivamente, a memória" .


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Segundo ele quando se trabalha com histórias vividas, sentidas, sofridas, entramos em contato com a memória e a noção de cultura de um povo. Sendo esses pressupostos a base do nosso documentário.


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4- OBJETIVOS ALCANÇADOS Após a entrega do pré-projeto os objetivos foram alterados, transformando um dos objetivos específicos, resgatar a história do Profeta Senhorzinho a partir de entrevistas com moradores e coleta de documentos, na principal linha do trabalho. O objetivo foi alcançado e através da produção do vídeo-documentário, "Mestre Divino. As histórias que envolvem Senhorzinho" resgatamos detalhes da vida do profeta e de sua passagem pela cidade.


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5- DIFICULDADES ENCONTRADAS A maior dificuldade encontrada foi em relação aos equipamentos, uma vez que a faculdade não poderia disponibilizar os mesmos por longos períodos e nossas gravações foram feitas em viagens para Bonito. Essa complicação elevou o custo do nosso TCC muito além do programado. Outra grande dificuldade foi o embasamento teórico do trabalho, uma vez que o assunto é muito restrito à cidade e não há quase nada publicado sobre o tema. Como a maioria das fontes se tratava de pessoas mais idosas o diálogo e o convencimento de filmagem foi muito difícil. Algumas entrevistas foram marcadas e na hora da gravação, sem mais explicações, os entrevistados desistiam da filmagem. Muitos alegavam já estar cansados de dar depoimentos sobre o tema. No dia da peregrinação nos deparamos com outra realidade, ao contrario do que esperávamos, a procissão era feita separadamente pelos fieis, e não em multidão, o que dificultou a captação das imagens. Além disso, muitos deles realizavam o percurso de 13 km apenas em promessa a Nossa Senhora Aparecida. Os devotos de Senhorzinho chegavam na capela, faziam suas orações e iam embora, impossibilitando as entrevistas nesse dia. Todas as etapas do documentário foram desenvolvidas por nós, desde a filmagem até a edição e montagem do vídeo, sendo esta á última dificuldade encontrada, já que durante a graduação esse processo não foi ensinado e não tínhamos o domínio dos programas de edição, devido a isso tivemos que aprender apenas com tutoriais na internet e em pouco tempo.


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6- DESPESAS (ORÇAMENTO)

Transporte até Bonito (4 viagens)

R$ 600,00

Aparelho de filmagem

R$ 2.400,00

Gravador

R$ 200,00

Microfone Lapela:

R$ 90,00

Tripé:

R$ 104,00

Gasolina com locomoção dentro da cidade R$100,00 Alimentação

R$100,00

Xerox e impressões

R$ 50,00

Total

R$ 3.644,00


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7- CONCLUSÕES Após muitas entrevistas e pesquisas sobre o tema, e a produção do documentário, "Mestre Divino - As histórias que envolvem Senhorzinho", o profeta ainda continua sendo um mistério para nós em muitos aspectos. Ouvimos diferentes narrativas, e nenhuma igual a outra, mas também não muito diferente. A maioria conta com detalhes alguns acontecimentos marcantes da passagem do Senhorzinho pela cidade, como a força que ele tinha, capaz de levantar uma viga de aroeira inteira com apenas uma mão, enquanto muitos homens faziam esforço para levantar a outra ponta. As orações próprias que exaltavam a natureza e a maneira de ensinar seus fiéis a seguir o caminho Divino. Os mitos e temores em torno da lenda da Serpente presa em uma gruta na fazenda Serra Limpa e as particularidades que fizeram de Senhorzinho um Mestre amado e respeitado por seus discípulos. Porem, ainda hoje percebemos que há receios quando tentamos conhecer melhor sua história. Segundo o professor Luiz Carlos, a figura do profeta Senhorzinho ainda gera muita polemica, o que leva algumas pessoas mais conservadoras a manter sua fé reprimida. Com o desenvolvimento deste trabalho foi possível ter uma noção da importância de se preservar uma cultura e mais que isso disseminá-la para todas as gerações, visto que estamos retratando um personagem histórico, que envolve muito mais que lendas e mitos. A riqueza de detalhes da história de Senhorzinho abre a possibilidade de novos estudos e trabalhos sobre o tema, não só no jornalismo, mas em quase todas as áreas da ciências humanas. Reafirmando assim sua importância para a cidade e sua


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população, servindo de incentivo para a disseminação desta parte tão linda da história de Bonito e fortalecendo os laços culturais sul-mato-grossenses.


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8 - APÊNDICES Constam neste item as entrevistas realizadas com: • Fernanda Reverdito, 32, tataraneta do fundador de Bonito, Luiz da Costa Leite Falcão e sobrinha de Theodorico Góes Falcão. • João Davi Vargas Machado, 78 e Elza de Moraes Vargas, 74, que conheceram Senhorzinho em sua passagem pela fazenda Serra Limpa. • Paula Baubueno Trindade, 58, filha de Paulo Balbueno, que conviveu com o Mestre, sendo discípulo fiel e estando presente em momentos como a prisão da serpente e o levantamento da grande cruz. • Luiz Carlos Souza Coelho, professor de Língua Portuguesa, e que ministra aulas de literatura e história nas escolas públicas e particulares da cidade. Explica com detalhes a suposta morte de Senhorzinho. • Margarida Ovando, 83, possui roupas que diz ser de Senhorzinho e sabe detalhes das orações feitas na época do Mestre.


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9 - ANEXOS Constam nos Anexos: • Relatos de Theodorico de Góes Falcão, poeta e escritor nas décadas de 40 á 70, extraídos do livro "Bonito um gigante adormecido" publicado em 1980. • Uma carta de André Paz Balbueno, nascido em 1927, que se diz discípulo de Senhorzinho. • A oração "Estrela do Céu" ensinadas por Senhorzinho • Cartas de aviso de Nosso Senhor Jesus Cristo e a Carta Celeste, também escritas por ele. • Imagens de documentos e reportagens que contam a história do Mestre.


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