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QUE É UM PROBLEMA?

Este trabalho partiu da ideia de criar um espetáculo para o público infantil e juvenil, estando eu, como bailarina e formadora, ligada à educação e aprendizagem, desenvolvendo trabalho como professora de dança contemporânea em várias escolas do país, o que me permite um envolvimento direto com crianças e adolescentes de uma forma mais constante e permanente. Como bailarina intérprete, tenho participado em processos de criação que envolvem, direta ou indiretamente, os adolescentes. Vou tendo assim, ao longo da minha vida, oportunidade de contracenar com eles, estar lado a lado, questionar e lançar desafios, criando e partilhando ideias, o que é pouco habitual.

Estas experiências têm-me feito questionar que lugar têm os adolescentes na sociedade, que palavra lhes é dada e que confiança recebem dos seus familiares, amigos e professores. Comecei então por perguntar o que os perturba e o que gostariam de mudar no mundo, tentando entender também como enfrentam e solucionam as questões e dilemas com que se deparam. Apesar de não ser algo totalmente recente para mim, comecei a acompanhar com maior atenção os anseios e questões particulares dos mais jovens quando comecei este processo, há cerca de dois anos.

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Todo este percurso por escolas e instituições vem demonstrar o quão importante é a educação pela arte, o desenvolvimento do pensamento crítico e a reflexão, especialmente num mundo tão complexo como este, que muitas vezes não dá voz aos jovens como eles merecem.

Durante as oficinas realizadas neste projeto, fui-me apercebendo que, após a pergunta “O que é um problema?”, surgem muitas outras: O que é realmente um problema e como o ultrapassamos? Que problemas existem no mundo? Eu tenho problemas? O que sinto quando tenho um?

E se eu pudesse mudar o mundo? Tenho sempre de encontrar uma solução? Quanto tempo tenho para encontrar a solução? Após reflexão e debate sobre estas ideias, surgiu o grande impulso para este projeto - o problema enquanto construção de uma solução e de uma conquista. Que caminho percorro nessa descoberta? E como o percorro? Como encontrar soluções coletivas e individuais?

Oficina Artística com a ASAS –Instituição de Solidariedade Social © direitos reservados

Em O Que é um problema?, há elementos que vão aparecendo: definem-se espaços em que se vai dançar, acumulam-se instrumentos que vão originar a música. Os próprios corpos vão aparecendo progressivamente, tal como a música se vai construindo em cena, recorrendo a algumas gravações feitas em directo. Tanto a construção coreográfica como a musical vão sendo pontuadas pela disparidade, criando sobressaltos nas figuras, no continuum da dança ou na harmonia da música. Está-se sempre no domínio dos limites e das limitações, de margens, mas também da expansão para lá dessa delimitação, contrapondo-se à fragmentação do corpo e à contenção do movimento o recurso a vectores de força centrífuga. Paralelamente, a predominância inicial de linhas e formas rectas vai dando lugar à circularidade e a elementos redondos.

Esta opção por dar a ver e a ouvir progressivamente, e por elementos de metamorfose corporal e transformação geométrica, tem uma ressonância particular ao considerarmos que o processo criativo assentou na observação da adolescência. É na assunção de escolhos e contrariedades que se vai desenhando uma identidade, é na percepção do que é um problema e no equacionar de uma solução que traçamos quem somos, redesenhando a nossa relação com as outras pessoas, com o mundo. Esta vontade de se colocarem no lugar da adolescência não acontece com as intérpretes a forçarem uma caracterização nesse sentido, mas sim deixando surgir uma respiração impregnada desse estádio de desenvolvimento pessoal, às vezes quase num estado de candura.

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