Barro – Folha de sala

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TEATRO MUNICIPAL DE VILA REAL | TEATRO MUNICIPAL DE BRAGANÇA

BARRO TERRA MOLHADA ONDE A BOTA ESCORREGA

© PAULO ARAÚJO

MAFALDA DEVILLE / COMPANHIA INSTÁVEL

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© PAULO ARAÚJO

© PAULO ARAÚJO


‘BARRO’

‘TERRA MOLHADA ONDE A BOTA ESCORREGA’ Pela água, pelo fogo, pelo tempo, pelas mãos. São corpos que moldam e são moldados. Que questionam na sua existência, no seu estado, na relação com os outros – a si próprios. A solidão da eternidade das pedras cravadas na terra. O festim da descoberta. Memórias e sonhos ressoam, na caixa do tempo, onde o passado e o futuro nem sempre se sucedem por esta ordem. Pela água, pelo fogo, pelas mãos. O corpo, matéria mutável, da lânguida sedução à catástrofe do caco. Tudo a preto e a vermelho. Como na roleta, os corpos entram no jogo. Mafalda Deville

> VILA REAL SEX.17.NOV 21h30

SÁB.18.NOV 21h30

> BRAGANÇA SEX.24.NOV 21h00

SÁB.25.NOV 15h00

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Entrevista de Eduarda Freitas

Barro – Terra Molhada Onde a Bota Escorrega é a primeira criação original em que o Município de Vila Real está totalmente envolvido, desde a ideia à produção. O tema do barro molda-se de forma pertinente à actualidade: no final deste mês de Novembro celebra-se o primeiro aniversário da inscrição do processo de fabrico do Barro Preto de Bisalhães na lista de Património Cultural Imaterial da UNESCO. Com a ajuda das artes, à volta de uma roda de oleiro feita à medida da imaginação de um cenógrafo, divulga-se muito mais do que o barro. «É uma forma de promover a cidade e a região através daquilo que temos e que nos identifica. Este espetáculo tem a ver com o barro, que é muito característico do norte de Portugal e Galiza. É, por isso, uma marca identitária. E nós, ao promovermos a interpretação artística daquilo que culturalmente nos vem sendo passado pelos nossos antepassados, afirmarmos a região», refere Eugénia Almeida. Através do envolvimento da comunidade, daquilo que sonha, projecta e expurga em cima de um palco, é possível fazer com que mundos aparentemente distantes se cruzem e todos fiquem a ganhar. «Temos apostado em espectáculos de ligação com comunidade, onde esta intervém e se revê naquilo que está a fazer. Isso tem um efeito multiplicador porque consegue levar a mais pessoas novos projectos, e também um efeito educativo, que é muito importante, porque, para além do público habitual, organizam-se workshops para públicos mais jovens, e formar públicos é também a missão de uma autarquia», refere a vereadora da cultura. É com a intenção de aproximar a comunidade das artes e de assim também divulgar ao resto do país, e ao mundo, o nome de Vila Real de uma forma diferenciada, que a autarquia tem apostado em projectos culturais mais arrojados: «Os ciclos de rua, como a Arruada, que temos vindo a fazer, assim como o Pitoresco, por exemplo, são projectos que têm abertura à sociedade. Surgiram durante Vila Real Capital da Cultura do Eixo Atlântico 2016 e ficaram. Até porque era objetivo dessa capitalidade deixar algo para o futuro. E ficou. A cultura é para todos através das diferentes manifestações possíveis», conclui a vereadora Eugénia Almeida. Uma coisa parece certa: Barro – Terra Molhada Onde a Bota Escorrega começa mas não acaba no barro.

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EUGÉNIA ALMEIDA Vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Vila Real

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BARRO: PATRIMÓNIO E COMUNIDADE UNIDOS PELA DANÇA CONTEMPORÂNEA

O espectáculo Barro – Terra Molhada Onde a Bota Escorrega resulta de uma encomenda dos Teatros Municipais de Vila Real e Bragança, integrada na operação Algures a Nordeste – Projecto Para a Promoção do Território Cultural do Nordeste Português.

No âmbito deste projecto, criadores nacionais de reconhecida experiência e mérito são convidados a olhar a região e a construir a partir dela um objecto artístico, contribuindo deste modo para a divulgação de aspectos do património cultural material e imaterial da região de Trás-os-Montes e Alto Douro. Barro desenvolve-se no domínio da dança contemporânea e procura incorporar, de forma sensorial, aspectos do imaginário ligado ao barro, particularmente ao Barro Negro de Bisalhães e ao Barro de Pinela. Não se pretende uma recriação ou dramatização teatral de episódios tradicionais, mas antes convocar emoções, memórias, sensações, impressões; invocar a plasticidade do barro para sugerir a moldagem dos corpos, dos gestos, dos movimentos. Paralelamente, procura-se com este espectáculo envolver a comunidade na interpretação e criação artística, convidando-a a participar com as suas experiências de vida, sonhos, histórias pessoais e comunitárias. Barro é assim um mundo outro, novo, que se constrói em palco com os intérpretes profissionais e comunitários, com reminiscências da tradição mas vivendo no seu tempo, para o seu tempo, e expressando-se numa linguagem que é a da dança contemporânea — teatral e coreográfica, abstracta e sensorial, mais emotiva do que narrativa ou figurativa, que convida à imersão dos sentidos no momento único e irrepetível da representação, que convida à pura fruição. Se Barro pretende estimular a descoberta do Barro de Bisalhães e de Pinela, provocando a curiosidade de quem se cruze com o espectáculo nos teatros ou com as suas referências nos meios de comunicação, tem também, por outro lado, o desejo de proporcionar experiências artísticas à comunidade local, promovendo a coesão social em volta do património identitário, da arte e da criatividade sem fronteiras. Barro é uma criação de Mafalda Deville mas também dos bailarinos da Companhia Instável e das pessoas da região que generosa e dedicadamente se entregaram a uma produção inédita de dança contemporânea. A partir de hoje, Barro é por si mesmo um património cultural imaterial de todos os que nele trabalharam e daqueles que assistem ao espectáculo. Rui Ângelo Araújo Director Artístico do Teatro Municipal de Vila Real

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MAFALDA DEVILLE Coreógrafa Entrevista de Eduarda Freitas

© CARLOS CHAVES

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MAFALDA DEVILLE é formada pela London Contemporary Dance School of The Place em Dança Contemporânea e Coreografia. Actualmente finaliza o Mestrado em Educação de nível superior na Royal Holloway University of England, onde leccionou no Curso de Pós graduação em Teatro Físico para bailarinos e actores. É, desde Setembro de 2016, directora de departamento de Dança na PERA – School of Performing Arts, na Girne American University, no Chipre. Trabalhou e viveu em Londres durante onze anos como bailarina, assistente de coreografia e directora de projecto educacional com a Jasmin Vardimon Company. Actualmente reside entre Portugal e Chipre, onde assume com Israel Pimenta (artista plástico) a direcção artística de OPUNTIA DANCE, tendo ali recriado, em colaboração, as peças: Mata-me em Séries, In Between Bliss, Unconnected, Departed, entre outras. Em paralelo, Mafalda Deville desenvolve o seu trabalho coreográfico em diferentes países (Portugal, Reino Unido, Alemanha, Grécia e Estados Unidos), tendo já colaborado com companhias e instituições como: Mundo Perfeito (de Tiago Rodrigues), Companhia Instável, Ao Cabo Teatro (de Nuno Cardoso), The Lyric Opera of Chicago (EUA), JV2, Shoreditch Dance Company, RAD, Trinity Laban - CAT Project, Royal Opera House e Sadlers Wells (em Londres) e Occupy Theatre (em Stralsund, Alemanha).

Foi pelo palco que Mafalda Deville descobriu o barro. É certo que já tinha ouvido falar no Barro Preto de Bisalhães e no Barro de Pinela mas só quando o Teatro de Vila Real convidou a Companhia Instável — e a companhia desafiou Mafalda a criar uma obra original tendo como inspiração o barro — é que a coreógrafa começou a verdadeira descoberta. Visitou Bisalhães, conheceu os oleiros, tentou descobrir os segredos guardados nas estórias de cada peça, as diferenças entre o barro preto e os outros, criou laços e começaram todas as dúvidas. Transpor o barro das mãos dos oleiros para os pés dos bailarinos e da comunidade começou a povoar-lhe todos os pensamentos ainda o Verão ia no início. O tempo foi passando entre o estúdio — com os bailarinos — as visitas à região e as sessões com a comunidade, esse nome que engloba mas é constituído por muitos outros nomes com gente dentro. Entre 30 a 40: a Mariana, a Joana, o João, o Paulo, a Catarina, tantas vidas com experiências, sonhos, vontades e até cidades diferentes. Mafalda começou a ouvi-los, a perceber o que sentiam e a ligação que tinham — ou não — ao barro. E o pé, dentro da bota, foi escorregando para o espectáculo que agora se apresenta. «É um espectáculo criado muito a partir da comunidade, a partir de questões, da exploração de movimento, de tentar perceber como se vive e como se passa o tempo em Vila Real. Como são as festas, as tradições? Como se passa um domingo em Vila Real?» Partindo da descoberta de cada um, foi-se descobrindo o todo, com espaço para aquelas singularidades que fazem sorrir quem conhece a história e as estórias de Vila Real e que levantam a curiosidade de quem não as conhece. O barro gravita em toda a obra, às vezes sem segredo, outras, quase sempre, entre os passos dos bailarinos que dão vida a diferentes personagens. Sim, o barro não é o personagem principal. «O barro foi o ponto de partida. Através da comunidade fui tentando criar os personagens da peça. O barro está sempre nas entrelinhas... e a comunidade faz de si própria, o mais honestamente possível», conta Mafalda. «Desde a primeira sessão que as pessoas se mostraram muito disponíveis, a querer dar e a quer receber muito. É, sem dúvida, um espectáculo de descoberta. Até ao fim...», sorri. Porque o barro molda-se e os corpos também.

Não é bem uma composição mas sim uma junção de várias composições, de experiências, partilhas e sons. Através de sonoplastia e da interação dos músicos em tempo real com essa base sonora, a composição — que não o é Entrevista de Eduarda Freitas no sentido formal — não tem nome mas tem alma: «Tem elementos que achei interessantes. A água, o barro, gravei sons do corpo, das mãos, dos pés, do trabalho», conta Rui Rodrigues, compositor. Ao trabalho da electrónica juntaram-se vozes que entram em palco mas que distorcidas fazem uma espécie de melodia. Pormenores nem sempre perceptíveis à primeira mas que desafiam o ouvido do público. Do Conservatório Regional de Música de Vila Real chegaram vários músicos, prontos para entrar na dança do improviso. «Cada um trouxe um pouco de si para a música. Tal como o resto da comunidade fez com o espectáculo», diz Rui Rodrigues. Sons que se misturam para dar forma ao Barro. RUI RODRIGUES Sonoplastia

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A COMPANHIA INSTÁVEL é um projecto apoiado pelo Ministério da Cultura/ DGARTES, cujos objectivos se centram no desenvolvimento da dança contemporânea e na criação de oportunidades profissionais a intérpretes de dança contemporânea. Anualmente, um coreógrafo de renome internacional é convidado a criar para e a partir de um conjunto de jovens intérpretes seleccionados por audição, que entram em residência coreográfica, para depois apresentarem o trabalho final em palcos nacionais e internacionais. Os coreógrafos convidados pela Companhia Instável foram, entre outros: Nigel Charnock, Bruno Listopad, Ronit Ziv, Javier de Frutos, Wim Vandekeybus, Rui Horta, Madalena Victorino, Sofia Dias, Vítor Roriz, Karine Ponties, Victor Hugo Pontes, Hofesh Shechter, Gregory Maqoma, Tiago Rodrigues, Emmanuelle Huynh e, mais recentemente Laurence Yadi & Nicolas Cantillon.

A Companhia Instável é subsidiada pelo Ministério da Cultura / Direção Geral das Artes. É uma estrutura em residência no Teatro Campo Alegre, no Porto, no âmbito do programa Teatro em Campo Aberto. É também apoiada pelo programa Bolsas para a formação GDA.

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Entrevista de Eduarda Freitas

O nome diz quase tudo mas nem tudo o que parece é. A Companhia Instável nasceu em 1998 e já tem estabilidade suficiente para se apresentar como uma companhia de dança consolidada. «O nome parece contraditório, não é? Por um lado temos a designação de Companhia, que é algo seguro, por outro lado temos a palavra Instável, que é o contrário disso tudo», refere Ana Figueira, a directora da companhia. «Costumo dizer que a Companhia Instável não existe. Porque nós só existimos por projectos», conta. É um modelo de funcionamento particular e de grande rotatividade. Somente uma pequena equipa de pessoas é fixa, todas as outras são escolhidas e convidadas consoante o projecto a desenvolver. «Tudo se recria à volta do coreógrafo que convidamos, e de outros co-criadores. Só o director técnico, eu e a produtora é que somos sempre os mesmos!», graceja. De resto, é um entra e sai de pessoas. «Isto permite-nos convidar sempre grandes nomes, grandes coreógrafos, mesmo a nível internacional. E eles costumam adorar, porque podem trabalhar com quem quiserem. Não impomos bailarinos. Aliás, impomos que não sejam impostos. Que se façam audições. E também impomos que pelo menos metade sejam portugueses», conta. Limites? «Só os financeiros», diz. Quando recebeu o convite do Teatro de Vila Real para fazer um espectáculo tendo como ponto de partida o barro, Ana conta que a reacção foi a melhor possível. «Foi fantástico. Porque a ideia de moldar está ligada ao movimento dos corpos. E a história, a tradição... achei logo que ia ser um tema muito interessante também para a coreógrafa», conta Ana Figueira, a directora estável da Companhia Instável. Também a parte de envolver elementos da comunidade – mesmo que não tivessem dotes especiais para a dança – foi recebida com grande entusiasmo. «Desde o primeiro encontro com a comunidade que tudo correu muito bem. As pessoas trouxeram para o palco uma grande riqueza», conta. Sendo um dos pilares da Companhia Instável a formação, também em Vila Real foram realizados workshops paralelos à criação. De experiência em experiência, de vida em vida, de tradição em tradição, o espectáculo foi acontecendo e crescendo «como uma bola de barro».

© EDUARDA FREITAS

ANA FIGUEIRA Directora da Companhia Instável

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Textos de João Ribeiro da Silva

A LOUÇA PRETA DE BISALHÃES (VILA REAL) desenha e põe a secar a louça “verde”; e quem leva a louça já seca para o forno, ajudando o oleiro a enchê-lo. A cozedura é, a par da utilização da roda manual baixa, talvez o elemento mais característico (e caracterizador) do processo de confecção da louça preta de Bisalhães – o mesmo que foi inscrito no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial e na Lista de Património Cultural Imaterial que Necessita de Salvaguarda Urgente da UNESCO. Importa a escolha do dia para cozer, por causa da humidade do ar; o acastelamento das peças no forno é tarefa demorada, pelo que o trabalho costuma começar de madrugada. A lenha já preparada é introduzida na câmara baixa do forno (uma “inovação” de meados do séc. XX), e quando o oleiro decide começa o abafamento, lançando terra negra por cima da louça que coze, avivando o lume no topo e fechando tudo por completo quando sabe que tem de o fazer, criando uma atmosfera redutora que transmite às peças assim cozidas a sua cor característica. Como também sabe quando tirar a louça do forno. E como a preparar e vender aos seus clientes, nas bancas à entrada de Vila Real ou na Feira dos Pucarinhos. E os oleiros, que antes eram trabalhadores rurais, que trabalhavam por comida – por vida! – na sua aldeia, são agora mais respeitados: artesãos, Artistas, de Bisalhães E de Vila Real. E sentem-se assim mesmo. Felizmente.

Quando apreciamos um fantástico arroz de forno feito num alguidar de barro preto – de Bisalhães, claro – ou quando vemos os miúdos a “jogarem o panelo”, por alturas do São Pedro (29 de Junho), numa tentativa de reavivar uma tradição que se julgava quase perdida, a maior parte de nós está longe de imaginar as voltas que o barro dá, nas mãos de quem ou há quanto tempo. Sendo a olaria uma arte milenar, e estando documentada na área de Vila Real desde o século XIII (em 1258 mencionamse os oleiros que vão às barreiras de Parada de Cunhos), o processo de confecção pouco terá mudado ao longo dos séculos. Já não se extrai barro nesse local, mas o que chega às mãos dos oleiros (e das suas mulheres) precisa de ser picado, peneirado e amassado, num trabalho árduo e demorado. O oleiro continua a fazer as péis, os beloiros e os embolados à mão, a mesma com que molda as simples e belas peças (utilitárias ou decorativas) à roda baixa, sentado no seu banco de três pernas. A mesma com que faz e utiliza os fanadouros, a moca ou a cega (com que separa a peça, feita com perícia e intuição, da roda que roda também por força da sua mão). As mulheres (avós, mães, filhas, netas, tias, sobrinhas, primas…) ainda têm um papel fundamental. São elas quem pica, peneira e amassa a matéria-prima: quem goga (com gogos, simples pedrinhas do rio) para alisar e decorar, quem

A LOUÇA DE PINELA (BRAGANÇA) Mulheres ajoelhadas em frente da roda baixa, qual altar, joelhos assentes em rude almofada artesanal, cheia de palha. Mulheres ajoelhadas a esmagar o barro seco, usando um maço de madeira, preparando-o para a transformação. A mesma posição em fases distintas de um trabalho quase exclusivamente executado por mulheres de Pinela, as louceiras de antanho. Já foram muitas as louceiras de Pinela. Dois fornos comunitários – um deles ainda existente, centenário – testemunharam a passagem de milhares de peças elaboradas na aldeia, tendo como destino a venda nas feiras da região. Cântaros, alguidares, talhas, pichorras, caçoilas, vasos e miniaturas – as famosas cantarinhas, entre outras – eram vendidas ou trocadas por bens de primeira necessidade nas feiras dos Chãos, Izeda, Vimioso, Vinhais ou Mirandela, ou nas aldeias que ficavam a caminho. A preparação do barro era (ainda é) complexa. De duas qualidades, o barro propriamente dito – esbranquiçado – vinha de Paredes e o “fermento”, ou barro grosso, de Izeda. Chegado a Pinela o barro era estendido na eira e picado, abrindo-se sulcos ou regos com o sacho para que secasse por todo. Esmagado, moído, peneirado, era depois guardado nos baixos ou nos cobertos das casas das louceiras. Quando queria trabalhar, a este barro juntava-se obrigatoriamente o “fermento” (preparado na mesma altura num masseirão, de pedra ou madeira, com água) amassando-se à procura de uma pasta uniforme, transformada em boroas ou

paralelepípedos prontos a usar. Sempre que possível as oleiras trabalhavam ao ar livre – fazerem-no principalmente na Primavera e no Verão ajudaria à tarefa. Criavam as peças mais pequenas (pichorrinhas ou cantarinhas) de uma só vez, e as maiores em três etapas: primeiro o “caco” (fundo), depois o bojo e no fim o pescoço, o bordo e a asa – faziam “cacos” em série, e só a prática de anos permitia saber quando passar para a fase seguinte. É preciso o caco “entesar tantinho” para começar a fazer subir o bojo… No forno comunitário se juntavam cerca de 500 peças feitas pelas várias louceiras – cada uma com sua marca distinta. Paredes de xisto, cobertura em forma de falsa cúpula, uma câmara de combustão e outra de enfornamento acessíveis por portas independentes, abrigavam a louça cozida a altas temperaturas, sempre com cuidado para a manter clara, cozendo-a através do calor do fogo e do reflectido pelas paredes, e poupando-a ao fumo – principalmente na fase final do processo de cozedura. Sendo praticamente desnecessária a louça utilitária, substituída por plásticos baratos, e havendo apenas uma oleira a trabalhar em Pinela nos dias de hoje, continuam a fazer-se as Cantarinhas que dão o nome à Feira que se realiza em Bragança a 3 de Maio – e aí se vendem. Já não se oferecem apenas às raparigas solteiras, pelos seus pretendentes, antes àqueles a quem se quer bem. E felizmente procuram-se outras formas, num salutar regresso ao passado. 10


CÂMARA MUNICIPAL DE VILA REAL Presidente: Rui Santos Vereadora da Cultura: Eugénia Almeida

CÂMARA MUNICIPAL DE BRAGANÇA Presidente: Hernâni Dias Vereadora da Cultura: Fernanda Silva

TEATRO MUNICIPAL DE VILA REAL Equipa de Produção e Técnica Direcção: Rui Ângelo Araújo Produção Artística: Paulo Araújo Produção: Carlos Chaves e João Nascimento Coordenador Técnico: Pedro Pires Cabral Técnico de Luz: Vítor Tuna Técnico de som: Henrique Lopes Manutenção: José Carlos Penelas

TEATRO MUNICIPAL DE BRAGANÇA Equipa de Produção e Técnica Direcção: Helena Genésio Técnicos de Iluminação: José Barradas e Paulo Barrigão Técnicos de Audiovisuais: Nilton Mendonça e Inocência Rodrigues Maquinista: António Ferreira Bilheteira e Produção: Miguel Andrade Divulgação: João Ferreira

FICHA TÉCNICA DA PUBLICAÇÃO: Folha de sala ‘Barro’ | Novembro de 2017 | Tiragem: 1500 exemplares Edição: Município de Vila Real Produção: Teatro Municipal de Vila Real Coordenação: Rui Ângelo Araújo | Design gráfico: Paulo Araújo | Apoio à produção: Eduarda Freitas

Apoio à divulgação

Louça preta de Bisalhães

Apoio

Louça de Pinela


‘BARRO’ ‘TERRA MOLHADA ONDE A BOTA ESCORREGA’

MAFALDA DEVILLE / COMPANHIA INSTÁVEL

Um espectáculo criado por encomenda dos Teatros Municipais de Vila Real e Bragança, no âmbito do projecto Algures a Nordeste Com a participação de elementos da COMUNIDADE LOCAL Inspirado nos processos de fabrico e no imaginário cultural do Barro Negro de Bisalhães e do Barro de Pinela. Estreia absoluta por ocasião do primeiro aniversário da inscrição do Barro Negro de Bisalhães na Lista de Património Cultural Imaterial da UNESCO. Direcção artística: Mafalda Deville Direcção musical e sonoplastia: Rui Rodrigues Consultoria musical: Drumming GP Assistência artística: Ricardo Machado Cenografia e vídeo: Israel Pimenta Direcção técnica e desenho de luz: Ricardo Alves Responsável por figurinos: Mariana Morgado Produção executiva: Rita Santos Consultoria: João Ribeiro da Silva Agradecimentos: Edmundo Pires, Conservatório de Vila Real, Oleiros de Bisalhães, Viveiros Sonhos Verdes, Pastelaria Gomes e TNSJ

Intérpretes: Beatriz Valentim, Duarte Valadares, Inês Galrão, Liliana Oliveira, Michael de Haan e Sabrina Gargano Intérpretes da comunidade local: Anabela Nave, Ana Paula Gomes, Andreia Alberto, Carlos Silva, Catarina Lima, Cláudia Costa, Cláudia Esteves, Cristina Parente, Dina Guedes, Gisela Parafita, Gisela Santos, Goreti Miranda, João Cardoso, João Ribeiro, Lília Maceirinha, Lina Carvalho, Luís Reboredo, Maria da Conceição Rodrigues, Maria José Cunha, Mariana Falcato Simões, Marta Ferreira, Pedro Teixeira e Sónia Botelho Interpretação musical: Drumming GP, Ana Luísa, Carlos Saraiva, Cláudio Miranda, Fernando Lopes, Francisco Mansilha, Gabriel Fernandes, Helena Liberato, José Magalhães, Lia Melo, Lourenço Afonso, Matilda Perdicoúlis, Pedro Miranda, Sara Barreira, Tiago Rocha e Yoan Ramos

Co-produção: TEATRO MUNICIPAL DE VILA REAL / TEATRO MUNICIPAL DE BRAGANÇA / COMPANHIA INSTÁVEL M/6 anos

© PAULO ARAÚJO


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