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"A amamentação ajuda no desenvolvimento emocional e cognitivo do bebé"
A importância da amamentação infantil e os seus benefícios para a mamã e o bebé colocados em perspetiva pela Bastonária da Ordem dos Médicos de Angola, Dra. Elisa Gaspar.
A amamentação é um processo no qual o bebé cria muitos laços com a mãe. Na sua opinião, quais são os principais benefícios da amamentação?
Tem benefícios importantes para garantir a saúde do bebé e para fortalecer o sistema imunológico e o seu crescimento. Tem a forma equilibrada dos teores de proteínas, carboidratos, gorduras e água, absorção de nutrientes, previne anemias, evita diarreias, desenvolve o sistema nervoso, previne a obesidade, previne alergias e está sempre pronto para ser consumido.
A mãe tem benefícios em amamentar? Quais?
É uma ação benéfica para saúde e bem-estar da mãe, o contacto pele a pele, aumenta o fluxo de ocitocina no seu corpo. Fazer o bebé pegar a mama logo, e com frequência, ajuda o útero a contrair-se, estimula a expulsão da placenta, protege a mãe da perda excessiva de sangue. Quando a mãe amamenta, o seu útero retraise mais rápido, tem menos sintomas de ansiedade e depressão, reduz o risco de doença cardíaca e diabetes tipo 2 e também reduz o risco de desenvolver alguns tipos de cancro, como o da mama, ovário e útero. A perda de peso que ganhou durante a gestação também é um factor a ter em conta.
Qual a principal diferença entre o leite materno e os leites de fórmula?
Existem diferenças qualitativas e quantitativas entre as proteínas do leite materno e do leite de vaca. O leite materno é um líquido rico em gordura, proteína, carboidratos, minerais, vitaminas, enzimas e imunoglobulinas que protegem contra várias doenças. O leite materno é composto por 87% de água, sendo que os 13% restantes são elementos fundamentais para o crescimento e desenvolvimento perfeito da criança. O leite humano é rico em leucócitos e anticorpos que protegem o bebé contra infecções e alergias, possui factores de crescimento que aceleram a maturação intestinal, também prevenindo alergias e intolerâncias. É, ainda, rico em vitamina A. Por sua vez, o leite de vaca também contém factores imunológicos, mas para o bezerro. Esses factores só funcionam para a mesma espécie e serão destruídos pela armazenagem e fervura do leite, pelo que a composição de proteínas e o desequilíbrio entre os minerais pode, por isso mesmo, causar transtornos ao ser humano. O leite bovino contém, ainda, a beta lacto globulina, uma proteína que não existe no leite humano e é comprovadamente a mais alergénica do leite de vaca para o ser humano, principalmente por não termos enzimas que digerem esta proteína. O leite de vaca tem três vezes mais proteína que o leite humano.
Amamentar é mais do que uma questão de nutrição. Qual a relação entre a amamentação e a imunidade do bebé?
O leite humano tem substâncias que beneficiam o sistema imunológico, apresentando anticorpos ao organismo do bebé e também protegem o bebé de várias doenças infecciosas, assim como reduz o risco da criança ter diabetes. Até aos dois anos de idade o sistema imunológico da criança ainda está em desenvolvimento, começando a sua própria produção de anticorpos. A amamentação ajuda no desenvolvimento emocional e cognitivo do bebé.
Da sua experiência, quais são os factores que influenciam a prática do aleitamento materno exclusivo?
O aleitamento materno e a amamentação fazem parte de uma acção fisiológica normal após o nascimento do bebé. Dizer que a amamentação garante a sobrevivência e o crescimento saudável do bebé. Já há mais evidências científicas de que a amamentação é a melhor forma de alimentar a criança até o sexto mês de vida e é uma prática recomendada pelas autoridades de saúde através de políticas e acções que previnam o desmame precoce. O leite materno é livre de contaminação.
O colostro é uma das fases mais importantes do leite materno e, muitas vezes, menosprezado pelas mamãs. Qual a sua constituição e porque é tão fundamental incentivarmos as mamãs a não rejeitarem o colostro?
O colostro possui macro e micronutrientes necessários para manter o estado nutricional do bebé e o seu crescimento, é rico em proteínas, principalmente imunoglobulinas, antimicrobianos, anticorpos e outras moléculas bioactivas que possuem propriedades imunomoduladoras e anti-inflamatórias que ajudam a estimular e a desenvolver o sistema imune do bebé, protegendo contra diversas doenças. É o primeiro leite materno e é de fácil digestão, contribuindo para o desenvolvimento do sistema gastrointestinal, além de ser rica em electrólitos e zinco, o colostro possui cor amarela devido ao facto de ser rico em carotenóides, que são transformados no organismo em vitamina A, que exerce o papel no sistema imune e na saúde visual, além de actuar como antioxidante, ajudando a diminuir o risco de desenvolver doenças crónicas.
As mastites assumem-se como um problema fisiológico que pode ocasionar dificuldades na amamentação. Estatisticamente, quantas mulheres apresentam esta situação anualmente em Angola? Quais os conselhos dados às futuras e recém mamãs para evitar esta situação?
A mastite puerperal, também chamada de mastite lactacional ou mastite da amamentação, é uma inflamação das glândulas mamárias que ocorre em mulheres em fase de aleitamento materno e cursa com vermelhidão nos seios, dor, calafrios e febre alta. Cerca de 10 a 20% das mulheres desenvolvem um episódio de mastite durante o período de amamentação. Na maioria dos casos, a inflamação ocorre nos três primeiros meses de aleitamento, mas nada impede que ela possa ocorrer em fases posteriores. O principal factor de risco para a mastite puerperal é a estase láctea, ou seja, a permanência de leite num dos ductos mamários por tempo prolongado. Outro factor importante são as fissuras do mamilo, que favorecem a invasão de bactérias da pele para dentro do tecido mamário. O melhor modo de prevenir a mastite do puerpério é através da correcta técnica de amamentação, com adequada pega do bebé, visando um eficaz esvaziamento da mama a cada mamada e evitando a ocorrência de lesões nos mamilos que servem de porta de entrada para a invasão de bactérias.
Tendo em linha de conta as vantagens do aleitamento materno, muitos têm sido os esforços no sentido de o promover. Nesse sentido, a Organização Mundial de Saúde (2000) recomenda na estratégia global para a alimentação do recém-nascido e do bebé, nomeadamente o aleitamento materno exclusivo até aos seis meses de vida, o que implica não oferecer nenhum outro alimento sólido ou líquido até essa idade (nem mesmo água) e dar continuidade ao aleitamento materno complementado com outros alimentos dos seis meses de vida, até aos dois anos de idade, no mínimo. Qual a sua opinião profissional sobre esta estratégia e quais as principais barreiras e dificuldades que se verificam no terreno?
A estratégia do apoio e promoção ao aleitamento materno é bem acertada em benefício das crianças que são o futuro dos países.
Quanto aos bebés prematuros. A amamentação é mais relevante para estes?
Amamentar prematuros é, sem dúvida, um desafio. Em função da imaturidade dos órgãos, o tracto gastrointestinal, a incoordenação ou a falta de reflexos de sucção, deglutição, respiração, as crianças que nasceram muito prematuras necessitam receber as suas primeiras calorias por via intravenosa. Paralelamente a esta nutrição, a alimentação enteral, também chamada de nutrição trófica, deve ser iniciada, por meio de sonda orogástrica. Mesmo que seja em quantidades insuficientes para nutrir o bebé, é de grande importância para evitar a atrofia das vilosidades da mucosa intestinal e a prevenção de infecções graves.
A escolha pela amamentação é uma opção que cabe única e exclusivamente à mãe. Como profissional de saúde, que conselhos dar às mães?
Aconselho as mães a darem de mamar sempre.
Existem profissionais que são apologistas dos horários da amamentação e outros do regime livre. O que aconselhar aos pais na sua opinião profissional?
Aconselho a livre demanda, dar de mamar sempre que o bebé quiser.
Relativamente ao Banco de Leite Humano, como surgiu e quais os principais desafios que encontram diariamente?
O Banco de Leite Humano surgiu da necessidade da oferta de leite materno aos bebés internados na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, bebés abandonados, bebés órfãos e bebés que, por outros, motivos não tinham o leite da sua mãe.
Como imagina o Banco de Leite Humano daqui a 5 anos?
Imagino a rede angolana de Banco de Leite Humano com capacidade para satisfazer as necessidades de todo público-alvo, em várias províncias.