O Discurso Simbólico da Arquitetura

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O DISCURSO SIMBÓLICO DA ARQUITETURA PROJETO DE UMA IGREJA CATÓLICA

Thaísa Helena Inglez de Castro



Thaísa Helena Inglez de Castro

O discurso simbólico da arquitetura: projeto de uma igreja católica

Monografia

apresentada

como

exigência

para obtenção do grau de Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Orientadora: Prof. Ms. Roseli Maria Martins D’Elboux

São Paulo Jun/2015



Thaísa Helena Inglez de Castro

O discurso simbólico da arquitetura: projeto de uma igreja católica Monografia

apresentada

como

exigência

para obtenção do grau de Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Banca Examinadora

Prof. Ms. Roseli Maria Martins D’Elboux Prof. Ms. Adhemar Carlos Pala Dr. Sabrina Studart Fontenele Costa São Paulo 17 de junho de 2015



Aos meus pais, os her贸is da minha vida.



AGRADECIMENTOS Primeiramente a Deus, por sempre olhar por mim. À minha mãe, Vania, meu exemplo de vida e a quem devo tudo que sou, por todo seu amor e sua dedicação. Ao meu pai, Francisco, que mesmo distante se faz sempre próximo, por seu companheirismo e amor. À minha avó, Aida, pela paciência com meus pedidos de oração e pelo carinho durante toda a minha vida. Às minhas amigas, Ana Cláudia, Jéssica e Vanessa,

pela

amizade

e

pelas

risadas,

principalmente nesse último ano. Aos amigos que, apesar da distância, sempre me apoiaram e me incentivaram. À Professora Roseli, por me acolher, pela atenção e pelas palavras tranquilizantes. A todos aqueles que de alguma forma também colaboraram com a execução deste trabalho.



RESUMO Este trabalho analisa os diversos elementos (sejam eles concretos ou abstratos) dos quais a arquitetura é composta de modo que essa seja capaz de transmitir mensagens àqueles que a vivencia. Para concretizar as teorias estudadas, uma igreja católica foi projetada. Além

disso,

também

é

estudado

o

aspecto

social

do

catolicismo,

possibilitando assim a interação entre as duas faces da fé (simbólica e social) para a mais completa elaboração do projeto final. Palavras-chave: igreja, simbologia, sensações, apoio social

ABSTRACT This work analyzes the several elements (either concrete or abstract) that composes the architecture so that it can send messages to its viewers.

In order to materialize these theories, a catholic church was

designed. Furthermore, the social aspect of the catholicism is also studied, making it possible to create a interaction between the two faces of faith (simbolic and social) to better elaborate the final project. Keywords: church, simbology, sensations, social support


12


LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ACB – Ação Católica Brasileira CEB – Comunidades Eclesiais de Base CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil DSI – Doutrina Social da Igreja FMI – Fundo Monetário Internacional JEC – Juventude Estudantil Católica JOC – Juventude Operária Católica JUC – Juventude Universitária Católica ONU – Organização das Nações Unidas SSBs – Semanas Sociais Brasileiras TdL – Teologia da Libertação

13



SUMÁRIO Introdução ......................................................... 18 Justificativa ....................................................... 22 1. O enredo da arquitetura ......................................... 27 1.1 Prazer e sentido .......................................... 30 1.2 Detalhe ................................................... 37 1.3 Signos e significados ...................................... 45 1.3.1 Pragmática ........................................ 48 1.3.2 Semântica ......................................... 50 1.3.3 Sintática ......................................... 55 2. O dever social da Igreja ........................................ 59 2.1 A DSI e a TdL ............................................. 62 2.2 A Igreja e as lutas sociais no Brasil ..................... 72 3. Referências ..................................................... 81 4. O projeto ...................................................... 109 4.1 Localização .............................................. 112 4.2 O bairro ................................................. 115 4.3 Composição do projeto .................................... 119 4.4 Simbologia ............................................... 4.5 Conclusão ................................................ 5. Desenhos técnicos .............................................. Bibliografia ....................................................... Fontes das imagens ................................................

124 134 137 147 153



INTRODUÇÃO


INTRODUÇÃO O presente trabalho analisa a capacidade da arquitetura

de

transmitir

“mensagens”

ao

usuário de modo que ela o comova e provoque a manifestação de sentimentos e sensações. Para a demonstração dessa teoria, foi elaborado o projeto de uma igreja católica. A associação de elementos concretos e etéreos da fé gera uma arquitetura distinta e significativa que seduz e fascina, apesar de algumas vezes não se compreender claramente o motivo desse encantamento. A união desse caráter simbólico à natureza social da igreja e a tênue linha de conexão entre eles é capaz de conceber um local particular e marcante. Sendo assim, propõe-se a explicação dos meios utilizados para representar simbolicamente o 18


sagrado no projeto e a investigação do percurso do

dever

social

no

catolicismo

através

de

documentos pontifícios e eventos históricos. No primeiro capítulo, dividido em três partes, é discutida a questão do prazer na arquitetura, os impactos da mesma sobre o observador e os meios

empregados

para

que

seja

atingido

o

deleite. Na primeira parte do capítulo, foram utilizados textos

dos

arquitetos

e

teóricos

Juhani

Pallasmaa, Tadao Ando e Bernard Tschumi para compreender o sentido aprazível da arquitetura. Na duas partes conseguintes, foram estudadas formas de criar uma narrativa arquitetônica. A preocupação com detalhes e como eles podem ser trabalhados de forma a contribuir com essa narrativa

é

tratada

na

segunda

parte,

e

a

semiótica e suas sutis nuances quando aplicada à arquitetura, na terceira. 19


No segundo capítulo, em adição ao lado imaterial da simbologia, a face social da Igreja e da religião

é

estudada.

São

analisadas

duas

vertentes teóricas para o entendimento do dever social do catolicismo:

a Doutrina Social da

Igreja (DSI) e a Teologia da Libertação (TdL). Ainda nesse capítulo, também é apresentada a relação entre a igreja católica e as lutas sociais no Brasil. Para esse fim, é exposto um breve histórico que auxilia no entendimento da criação de diversas organizações sociais no país. No

terceiro

referências

capítulo

projetuais

são que

apresentadas

de

alguma

forma

ajudaram na concepção do projeto final. São elas: a Igreja da Luz (Tadao Ando), a Iglesia Del

Santíssimo

Architects),

o

Redentor Holy

Rosary

(Fernando Church

Menis Complex

(Trahan Architects) e a Sede da Padre Rubinos (Elsa Urquijo Arquitectos). 20


O quarto capítulo foi dividido em seis partes. Nas duas primeiras, são apresentados a localização do terreno de projeto, o motivo da escolha de tal localização e, respectivamente, um breve histórico do bairro em que esse terreno se encontra. Na terceira parte é explanada a composição do projeto, desde a implantação até o programa inserido

nos

edifícios.

Na

quarta,

são

revelados os detalhes arquitetônicos e seus respectivos

valores

simbólicos

no

contexto

do projeto. Para finalizar, foi elaborada uma conclusão do trabalho. Por fim, no último capítulo, são apresentados os desenhos técnicos do projeto da igreja.

21


JUSTIFICATIVA Durante algum tempo, foi considerada irrelevante e até banal a construção de edificações que possuíssem

algum

tipo

de

significado

e

que

pudessem provocar sentimentos. A arquitetura da década de 20 dita “funcionalista”, por exemplo, repudiou o sentimentalismo e ditou novas regras arquitetônicas que tornaram seus prédios frios e formais. Ultimamente, essa visão tem sido transformada e cada vez mais arquitetos, como Peter Eisenman e Robert Venturi, estão se tornando adeptos à “arquitetura significativa”. Porém há, ainda assim (e esse fato é muito notável no Brasil), diversas construções que, sujeitas à ganância do mercado imobiliário, acabaram

se

construções,

tornando sem

quaisquer

propósitos emblemáticos. 22

realmente

apenas

significados

ou


Dito isso, o objetivo desse trabalho é projetar um edifício que possa “contar uma história” através

de

detalhes

e

signos.

Talvez,

a

edificação em que essa narrativa simbólica seja mais evidente é a igreja. As diversas maneiras de transmitir os tênues e delicados símbolos da fé inspiraram este projeto. Além disso, o caráter caridoso do catolicismo também orientou a escolha da religião para o templo. Por certo período, o catolicismo se limitou a auxiliar seus fiéis ou a quem o procurasse. Porém, a partir da Revolução Industrial, a Igreja começou a se impor através de documentos pontifícios trabalhista

oficiais dos

ao

criticar

operários

das

a

condição

grandes

e

ascendentes indústrias da época e o próprio governo, a quem sugeria que devesse intervir na economia a favor dos mais pobres. No Brasil, com a criação da CNBB1 1

em meados

Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

23


dos anos 40, programas favorecendo operários e estudantes se popularizaram. Durante a ditadura militar a Igreja Católica exerceu um importante papel,

apoiando

sindicatos,

mobilizações

nacionais e educação popular. Atualmente,

a

Igreja

é

responsável

por

importantes programas sociais, principalmente de auxílio a indivíduos em situação de extrema pobreza, como por exemplo com o programa das CEBs2. Segundo pesquisa complementar feita pelo IBGE para o Censo 2010, cerca de 6% da população brasileira favelas.

(11.425.644

Surgidas

a

pessoas)

partir

de

um

vive

em

contexto

histórico complexo, foram negligenciadas pelo Estado e até mesmo consideradas como áreas não pertencentes à cidade. Ultimamente, apesar da situação financeira e social de alguns moradores das favelas ter melhorado, ainda há aqueles que 2

24

Comunidade Eclesial de Base


necessitam de apoio. Sendo assim, pretende-se projetar uma igreja católica

no

bairro

de

Cangaíba,

em

frente

à favela do Jaú. Levando em consideração a perspectiva e realidade da sociedade brasileira e o aspecto social da catolicismo, a igreja poderá também servir socialmente à população que ali habita. Harmonizando esse aspecto social com a essência simbólica eminente que a instituição possui, pretende-se inserir um novo equipamento não somente

de

caráter

religioso,

mas

também

educacional e comunitário nessa região mais carente da cidade.

25



CAPÍTULO 1

O ENREDO DA ARQUITETURA



“Em arquitetura não existe boa ideia, só existe expressão.” Carlo Scarpa 29


1.1 PRAZER E SENTIDO O

prazer

máximo

da

arquitetura

está

naquele momento impossível em que um ato arquitetônico, levado ao excesso, revela ao mesmo tempo os vestígios da razão e

a

experiência

imediata

do

espaço.

(Tschumi, 2010, p.580)

O declínio da arquitetura significativa, aquela que provoca sentimento de alguma forma, tem se tornado cada vez mais evidente nas práticas projetuais Pallasmaa

atuais. em

seu

De

acordo

ensaio

“A

com

Juahani

geometria

do

sentimento: um olhar sobre a fenomenologia da arquitetura” as construções modernas e atuais podem despertar o interesse pela ousadia e criatividade, porém o sentimento não se estende além disso. Nesse mesmo ensaio, Pallasmaa questiona se as formas de uma edificação e os elementos básicos de projeto, como vedações, aberturas, etc, são, 30


de fato, o que caracterizam a arquitetura. Segundo ele, é um erro pensar que o edifício é somente o resultado de uma composição formal e que seu jogo excessivo de formas faz dele “boa arquitetura”. Nos últimos tempos, a arquitetura passou a ser reduzida à arte que afeta fundamentalmente o sentido da visão, ou seja, passou a ser vista como

um

conjunto

de

elementos

que,

quando

associados, dão sentido visual na forma e no espaço. Porém, uma obra de arte (e alguns projetos de arquitetura podem ser considerados como tal) não é caracterizada somente por seus aspectos visuais. Sem dúvida, o visual é importante, porém mais relevante é a capacidade da obra de provocar sentimentos. Esses sentimentos são causados pela análise introspectiva e pessoal de cada um.

31


“Seus significados [da obra] não estão contidos

nas

transmitidas

formas, pelas

mas

formas

nas e

imagens

na

força

emocional que elas carregam.” (Pallasmaa, 2010, p. 484)

A arte em geral só tem sentido e significado quando está em contato com o subconsciente e com as memórias sensoriais do indivíduo que a interpreta e, sem esse contato, pode-se até mesmo dizer que a arte perde o sentido de ser e

se

torna

somente

um

objeto

de

decoração

utilizado para embelezar, de maneira frívola, o espaço. A arquitetura, que é essencialmente arte, também está sujeita à essa situação. Tadao Ando (2010, p. 495) acredita que o valor intrínseco da arquitetura está na capacidade do

arquiteto

de

abstrair

o

mundo

real

e

transformá-lo em uma construção, um espaço, com lógica transparente. Ele critica também algumas arquiteturas pós-modernas que tentaram resgatar as essências sensitivas que o modernismo havia 32


renegado sucumbindo, no entanto, a “expressões de vulgaridade”. A lógica transparente de Tadao Ando consiste no estudo de elementos externos que são capazes influenciar o projeto, como o local, a história, a natureza. Talvez o elemento mais evidente que influencia o arquiteto seja a natureza, não somente de forma imediata e clara (com vegetações, por exemplo) mas também de forma extremamente sutil. O uso da luz e da água em seus projetos é um grande exemplo de abstração da natureza que enriquece a edificação e provoca variados sentimentos em quem os vivencia. As visões de Bernard Tschumi sobre o prazer na arquitetura são mais provocativas do que as

de

Pallasmaa

e

Ando.

Para

efeito

deste

trabalho, foram utilizados três “fragmentos” de seu ensaio a fim de estudar as impressões causadas pela arquitetura. São eles: “O prazer da arquitetura”: “Um duplo prazer (lembrete)”, 33


“Jardins do prazer” e “Metáfora da Sedução – Máscara”. No

primeiro,

“Um

duplo

prazer”,

Tschumi

descreve dois prazeres, o do espaço e o da geometria e da ordem. De acordo com ele, é impossível descrever um espaço e suas nuances em palavras. As brincadeiras espaciais podem ser tão intensas que levam o observador à “poética do inconsciente”, à reclusão mental para a verdadeira experiência espacial. Já o prazer da geometria e da ordem advém das proporções arquitetônicas

e

das

ordenações

de paredes, pilares, etc.

sintáticas

Essa manipulação

sofisticada também é capaz de levar ao prazer mental e inconsciente. Já no segundo fragmento, “Jardins do prazer”, Tschumi faz uma declaração polêmica ao citar pela primeira vez a inutilidade da arquitetura. Os jardins são projetados exclusivamente para o 34

prazer

e,

de

uma

certa

forma,

completam


as

construções,

porém

são

completamente

(e

aceitavelmente) inúteis3. No

último

Máscara”,

“disfarces”

fragmento, são

“Metáfora

discutidos

utilizados

da os

pela

Sedução diversos

arquitetura

para seduzir o observador. Tschumi denominou esses disfarces de máscaras e elas podem ser qualquer coisa, desde fachadas até conceitos arquitetônicos. O arquiteto diz também que é impossível enxergar por detrás dessa máscara, por mais desesperadamente que se tente, pois será descoberta uma nova máscara e, após essa, outra. “[…]

elas

desvelam, detrás

de

correntes

simultaneamente simulam

e

todas

as

misteriosas

velam

e

dissimulam.

Por

máscaras,

fluem

e

inconscientes

que não podem ser dissociadas do prazer da arquitetura.” (Tschumi, 2010, p. 580)

3

Nota-se que isso não significa que são dispensáveis, apenas que não possuem uma utilidade latente.

35


Segunda

Pallasmaa

sentimentos pode

mais

transmitir

(2010, fortes

é

o

da

p. que

487) a

um

dos

arquitetura

solidão.

Quando

se

tem uma impactante experiência arquitetônica o silêncio que domina o observador é notável e independe da quantidade de pessoas que o rodeiam. A sensação de estar em um lugar único só pode ser transmitida pela arquitetura. Uma paisagem natural, por mais bela que seja, não tem o mesmo impacto no observador. A

arquitetura

é

capaz

de

deixar

marcas

e

sensibilizar o estado físico e mental. Apesar disso, ela não deve existir com o objetivo de

representar

indivíduos;

ela

e

realizar

somente

pode

os

desejos

fazer

de

aflorar,

inconscientemente, os mais singelos e genuínos sentimentos humanos.

36


1.2 DETALHE O detalhe conta história. (Jean Labatut)4

Os detalhes em arquitetura consistem não somente de “um pequeno pedaço, parte ou elemento mínimo de um conjunto” ou de uma “particularidade de

uma

obra

projetada”,

como

definido

por

alguns dicionários5, mas também de algo tão importante quanto a própria construção. Sem o detalhamento, não somente em pequena escala, como também em escalas maiores, a arquitetura seria, essencialmente, desinteressante e até mesmo descartável. Para melhor entendimento do assunto, o presente capítulo se baseará na primeira parte do texto “O detalhe narrativo” de Marco Frascari onde o autor discute a conceituação de detalhes e sua função no ofício arquitetônico em diferentes 4

Citação retirada do texto de Marco Frascari, 2010, p. 540

5

Definições retiradas dos dicionários Houaiss e Aurélio, respectivamente

37


escalas. Segundo Frascari (2010, pag. 539), os detalhes nada mais são do que geradores de significados em arquitetura. É notório que a elaboração e a constituição de arquitetura se deve ao desenho, à modificação e à colaboração entre si de detalhes diversos. Esses detalhes podem ser de natureza funcional ou estética, sendo que ambas têm a mesma importância arquitetônica na elaboração de um projeto e na qualidade final do mesmo. Historicamente, a palavra detalhe somente começou a ser empregada formalmente em arquitetura em meados do século XVII por teóricos franceses da architecture parlante6. Frascari ressalta que os detalhes eram comparados pelos franceses a palavras que, quando associadas, poderiam formar

diversos

semelhante, 6

38

os

tipos detalhes

de

frases.

quando

De

forma

relacionados

Arquitetura que explica a sua própria identidade e função


entre si e a algum estilo, poderiam criar uma infinidade de arquiteturas. A partir desse pensamento, já no Beaux-Arts, surgiu a chamada analytique, um novo meio de representação gráfica que enfatiza a importância dos detalhes na formação da individualidade e da originalidade do edifício. Nesse método, os detalhes eram representados em uma escala maior e, muitas vezes, a própria edificação [1] Desenhos dos detalhes das colunas do Templo de Hércules elaborados por D’Espouy no movimento analytique.

era

desenhada

em

uma

escala

extremamente

pequena, como se o próprio edifício não tivesse importância muito evidente. Frascari (2010, p. 542) ressalta que, na época supracitada, porém, não havia a necessidade de apresentar um projeto dos detalhes elaborado previamente à sua construção, uma vez que os artesãos que os manuseavam e os construiam eram

[2] Desenhos dos detalhes da fachada do Templo de Hércules elaborados por D’Espouy no movimento analytique.

capazes

de

os

desenhar

com

exatidão.

A analytique era então somente uma forma de analisar os detalhes dentro de uma composição 39


maior. Porém,

assim

que

a

produção

industrial

se

desenvolveu, as características dos detalhes também

se

modificaram.

Os

edifícios

não

eram mais tão importantes culturalmente como eram

economicamente.

Os

desenhistas

foram

substituídos por simples trabalhadores manuais e os detalhes passaram a ser desenvolvidos de maneira impessoal e serem vistos apenas como desenhos necessários para a execução total de um projeto. Essa

situação

novamente

se

modificou

com

o

surgimento do movimento Arts and Crafts. Com seu caráter anti-industrial e revolucionário, os arquitetos e designers necessitavam novamente dos conhecimentos específicos sobre os detalhes, já que era também a sua responsabilidade delegar as tarefas para cada produtor. Frascari, ao refletir sobre a “arquitetura como 40

[3] Desenhos de detalhes da cobertura de um poço elaborados pelo arquiteto Phillip Speakman Webb para a Red House, projeto de sua autoria


arte do apropriado”7, cita Alberti ao afirmar que “a beleza é a união habilidosa de partes segundo uma norma de que nada pode ser acrescentado, subtraído ou modificado sem prejuízo para o conjunto” (Frascari, 2010, p. 543) Segundo o autor, essa afirmativa, porém, não significa que o projeto deva estar finalizado ou até mesmo completo, somente que cada parte [4] Leon Battista Alberti

adicionada

a

ele,

após

ter

sido

pensada

minuciosamente para tal, passa a fazer parte de um todo do qual não poderá mais se desvincular. Caso esse rompimento ocorra, o projeto perderá o seu significado primário e se tornará deficitário de alguma forma. Para Alberti, a beleza parte de um processo de três fases: numerus, finitio e collocatio. O primeiro se refere ao estabelecimento de relações numéricas entre elementos a serem desenhados; 7

“Ele [Alberti] pensa a arquitetura como arte da escolha dos detalhes apropriados, cujo resultado é a beleza, que é, em si, um objetivo importante.” (Frascari, 2010, p.543)

41


o segundo, à designação de dimensões para a criação arquitetônica; e, por fim, o terceiro, ao posicionamento e à função de cada detalhe. Outro aspecto tratado no texto de Frascari é a geometria empregada na arquitetura. De acordo com ele, a geometria é uma técnica sobre a qual o arquiteto se apoia para criar espaços com signos específicos para cada evento que ali acontecerá. A geometria utilizada nos detalhes desempenha papel similar, porém em uma escala diferente. A

ordenação

dos

detalhes

de

uma

forma

geométrica específica permite que a visão crie uma interrelação e uma reciprocidade expressiva entre esses elementos, de forma que, caso a geometria fosse modificada, todo o conjunto se transformaria, positiva ou negativamente. […] a geometria não enuncia fatos, mas proporciona as formas com as quais os fatos são enunciados. (Frascari, 2010, p. 544)

42

[5] À direita, fachada do pavimento superior da Basílica de Santa Maria Novella elaborada por Alberti. A imagem demonstra o senso geométrico e simétrico do arquiteto.



Herman

von

Helmholz,

em

seu

texto

“Über

Geometrie”8, discorre sobre a percepção dos detalhes de maneira individual e a denomina de “visão indireta”.

Conforme Helmholz, somente

uma parcela da visão é capaz de gerar imagens nítidas e, portanto, apenas uma parte do todo é

distintamente

retratado.

Sendo

assim,

a

arquitetura nunca é vista de maneira plena e os “sinais” (detalhes) dela são os verdadeiros vetores para o seu entendimento. Frascari explana que os detalhes são sinais cujos significados são apreendidos pela experiência (2010, p. 545).

Os detalhes estão intimamente

relacionados com a percepção do ambiente e as respectivas sensações que eles proporcionam. Portanto, a noção espacial se da não somente pelo percurso da edificação, como também, e principalmente, pela associação de formas e cenas com as quais o espaço é idealizado.

8

44

Referência também retirada do texto de Marco Frascari


2.3 SIGNOS E SIGNIFICADOS Todo edifício cria associações na mente do observador, quer o arquiteto queira ou não. (Nikolaus Pevsner9)

Durante algum tempo a teoria dos signos não foi bem aceita dentre os arquitetos e estudiosos de arquitetura que criam na arquitetura funcional e racional projetada quase mecanicamente. Porém, atualmente essa situação mudou. Arquitetos como Roberto Venturi afirmam que a arquitetura feita com uma intenção de possuir um significado está tomando à frente daquelas que são projetadas unicamente de maneira funcional. Segundo Broadbent (2010, p. 144), até mesmo os edifícios modernos construídos com a intenção de ser somente funcionais, se transformaram em símbolos da época em que foram projetados, se

9

Citação retirada do texto de Geoffrey Broadbent (2010, p.144)

45


tornando “portadores de significados”10. Sendo assim, para o autor, o conceito funcionalista nunca passou de uma utopia, de um sonho. Broadbent defende também que, posto que os edifícios é

contêm

um

responsabilidade

como

esses

significado do

significados

intrínseco,

arquiteto serão

antever

interpretados

pelo observador. Ele deve também induzí-los a assimilar a real intenção de cada decisão tomada. Dessa forma, o projeto se torna mais requintado e interessante aos olhares de quem o percorre. Para melhor compreender a teoria dos signos, Broadbent analisa os estudos que Ferdinand di Saussure e Charles Sanders Pierce elaboraram para criar uma teoria geral dos significados. Essa teoria geral foi denominada semiótica e foi

10

O autor cita Pevsner e seu conceito de “evocação” para explicar as associações feitas por aqueles que analisam a construção, concluindo que “tudo remete à alguma coisa”.

46


dividida, mais tarde, por Charles Morris11, em três grandes campos: a pragmática, a semântica e a sintática. A pragmática trata das origens dos signos e o efeito que esses têm sobre o observador; a semântica estuda a significação de cada signo de todas as maneiras em que possa haver um significado; e a sintática dedica-se a estudar a organização e a combinação dos signos para que um significado específico seja dado a eles.

11

Filósofo americano e discípulo de Charles Sanders Pierce

47


1.3.1 PRAGMÁTICA Na arquitetura, a pragmática é utilizada para analisar os efeitos que a construção (essa vista como um conjunto de signos) têm sobre aqueles

que

a

utilizam.

Diferentemente

de

outras artes, como a literatura e a música, a arquitetura causa maior impacto naquele que a interpreta pois os signos nela empregados não afetam somente um sentido, mas sim vários, como

visão,

audição,

olfato,

etc.

Segundo

Broadbent, a arquitetura também é capaz de afetar os sentidos humanos mais “esotéricos” como o equilíbrio e a cinestesia. Considerando que uma edificação é um transmissor de

informações

imagens

ao

que

observador

incessantemente e

que

esse,

envia

por

sua

vez, é munido de experiências próprias, pode se dizer os efeitos causados pelos signos na edificação inseridos são variáveis e únicos para cada indivíduo que os vivencia. São também 48


variáveis os graus de importância dados às sensações: enquanto um é capaz de ser afetado mais pela visão, outro pode ser sensibilizado prioritariamente pela audição. Esse

fato

explica

porque

a

diferença

de

tipologias arquitetônicas torna os locais em que essas estão inseridas tão interessantes. Se todos dispusessem da mesma opinião sobre beleza, conforto, etc, as construções tornarse-iam monótonas e, ironicamente, deixariam de ser preferidas e perderiam o seu atrativo. [6] Foto de Londres demonstrando o contraste arquitetônico entre o The Gherkin e os edifícios em seu entorno.

49


1.3.2 SEMÂNTICA Saussure divide o signos em duas partes: o significante e o significado. O significante pode ser qualquer coisa, desde de algo etéreo, como o som, até algo concreto, como um edifício. Já o significado é “o conceito ao qual a palavra se refere”(Broadbent, 2010, p. 153). Em arquitetura, o conceito de significado é muito relativo, diferentemente desse mesmo conceito em linguagem, por exemplo. Uma palavra muitas vezes um

significa

elemento

somente

uma

arquitetônico

coisa, pode

enquanto

transmitir

diversos significados dependendo do contexto em que se está inserido, da intenção projetual do arquiteto e das experiências pessoais do usuário. Já

Pierce

desenvolve

seu

pensamento

fragmentando-o em três partes: ícone, índice e símbolo. O ícone é um signo que retrata, por 50


similaridade, um objeto (exemplo: um quadro que retrata um homem); o índice é um signo que representa uma outra “coisa”12 por relação e proximidade (exemplo: a fumaça que sugere que há fogo por perto); e, por fim, o símbolo é o signo que representa qualquer associação de ideias e não tem relação direta com o objeto [7] Museu de História Natural de Lille, França. Demonstração de um edifício índice a partir dos percursos gerados pelo próprio uso.

representado (exemplo: uma cor que representa um sentimento). Para Broadbent, o conceito mais descomplicado para ser aplicado na arquitetura é o índice. Galerias, museus e rodoviárias, por exemplo, são edifícios índices: há um caminho claro que deve ser percorrido e esse caminho é indicado pelo próprio edifício. Ainda segundo o autor, edifícios

ditos

funcionais

foram

projetados

para serem índices, uma vez que indicam as suas funções através das suas formas. O conceito de símbolo também é relativamente 12

A “coisa” não.

pode

ser

qualquer

elemento,

concreto

ou

51


simples de compreender: trata-se de um significado genérico dado a algo. Porém, esse significado, deve ser ensinado pelo artista e aprendido pelo espectador para que ele possa coerentemente ser entendido. Utilizando o exemplo de Broadbent, uma

catedral

gótica

é,

evidentemente,

um

símbolo do cristianismo. Todavia, deve-se ter o conhecimento da relação entre a forma do edifício gótico com a essência da religião para que seja possível tal associação. Já o ícone pode ser entendido na arquitetura como qualquer desenho, foto ou representação

[8] Museu Judáico em Berlim. A obra de Daniel Liebskind é repleta de símbolos da história do holocausto.

gráfica que aluda à uma edificação, construída ou não. Entretanto, o próprio prédio pode ser um ícone quando esse faz alusão (na mente do observador) à outra coisa. Um exemplo desse tipo de edificação é a Catedral de Brasília, onde os 16 arcos sugerem duas mãos com os dedos abertos em súplica. Há também o que Broadbent denomina metáfora. 52

[9] Catedral de Brasília, de Oscar Niemeyer. Ícone para mãos abertas em súplica.


Metáfora é uma espécie de símbolo, porém muito mais sutil e quase ilusório, como, por exemplo, a representação do nacionalismo catalão na casa Battló, de Antoni Gaudí. Esse nacionalismo é evidenciado pelo conjunto de mosaicos, pela cruz e pelas pedras na fachada do edifício (respectivamente

simbolizando

o

dragão,

a

religião e ossos de mártires nacionalistas). Quando a

associados,

história

do

esses

dragão

elementos

morto

por

São

narram Jorge,

padroeiro de Barcelona. Esse tipo de simbologia é muito difícil de ser notada, a não ser que se tenha um grande conhecimento do assunto e, até mesmo, sensibilidade para entendê-la.

53



1.3.3 SINTÁTICA A sintática estuda a organização de signos e a maneira com a qual esses se agrupam para construir um significado (ou um novo significado). Ou seja, a sintática nada mais é do que a estrutura da linguagem visual do projeto. Por um lado, é de fato importante a análise da

relação

entre

elementos

arquitetônicos

concretos e básicos (paredes, pilares, etc) para efeito narrativo, porém, por outro, é arriscado quando não se consideram as faces semânticas do conjunto. [...] a meu ver, os que investigam a sintaxe pela sintaxe em detrimento das dimensões semânticas, acabam se expondo ao mesmos insucessos dos funcionalistas. (Broadbent, 2010, p. 152) [10] À esquerda, Casa Battló de Antoni Gaudi. A foto mostra os elementos utilizados para a representação metafórica para o nacionalismo catalão

Broadbent narra que Peter Eisenman, enquanto projetava a Casa II, utilizou a sintaxe para 55


obter a “perfeição abstrata” de seu projeto. A

subdivisão

conseguintes

da

forma

espaços

cúbica

inicial,

negativos

os

(vazios)

deixados por essa divisão e a interligação entre os ambientes gerados se transformaram em uma linguagem arquitetônica visual única. Contudo, Eisenman foi malsucedido ao acreditar que

seu

projeto

seria

interpretado

somente

através de regras sintáticas. De acordo com Broadbent, o conjunto tem um apelo semântico tão forte que até mesmo as paredes brancas remetem ao Internacional Style de 1920. As

decisões

de

composição

determinam

o

significado que o conjunto irá transmitir ao espectador. Diferentemente de como ocorre na linguagem, em arquitetura não é possível prever que essa composição será compreendida da mesma forma por todos. Isso pôde ser comprovado no projeto de Eisenman supracitado.

56

[11] Casa II, Peter Eisenman


O

resultado

final

é

a

verdadeira

manifestação do artista. O significado, porém, depende da resposta do espectador, que

também

através

da

a

modifica rede

de

e

a

interpreta

seus

critérios

subjetivos. Um só fator é a moeda corrente entre o artista e o público, [...] o aparato sensorial através do qual vemos. (Dondis, 2003, p. 31)

57


58


CAPÍTULO 2

O DEVER SOCIAL DA IGREJA 59


60


“[...] o amor preferencial pelos pobres representa uma opção fundamental da Igreja, e ela o propõe a todos os homens de boa vontade.” Doutrina Social da Igreja 61


2.1 A DSI E A TdL Além da face sensível e simbológica da igreja, há também aquela mais palpável e concreta que é seu caráter beneficente. Esse aspecto social sempre foi eminente na religião porém, foi somente a partir da criação da Doutrina Social da Igreja, que ele se tornou um dever. A Doutrina Social da Igreja é um conjunto de documentos pontifícios formado por 9 cartas encíclicas13 respeito

da

escritas situação

dentre social

1891

e

1991

mundial.

a

Foi

sistematizada em 2004 e publicada como Compêndio da Doutrina Social da Igreja em 29 de junho, no Vaticano. A primeira encíclica, Rerum Novarum, publicada 13

Rerum Novarum (Leão XIII, 1891), Quadragesimo anno (Pio XI, 1931), Mater et Magistra (João XXIII, 1961), Pacem in Terris (João XXIII, 1963), Populorum Progressio (Paulo VI, 1967), Octagesima Adveniens (Paulo VI, 1971), Laborem Exercens (João Paulo II, 1981), Sollicitudo Rei Socialis (João Paulo II, 1987) e Centesimus annus (João Paulo II, 1991)

62


em 15 de maio de 1891 pelo Papa Leão XIII, teve

como

objetivo

principal

denunciar

as

explorações do capital e da mão de obra dos trabalhadores submetidos aos proprietários das grandes indústrias e às desumanas condições de trabalho da Revolução Industrial do século XVIII. […] é necessário, com medidas prontas e eficazes, vir em auxílio dos homens das [12] Papa Leão XIII

classes inferiores, atendendo a que eles estão, pela maior parte, numa situação de infortúnio e de miséria imerecida. […]

os

princípios

e

o

sentimento

religioso desapareceram das leis e das instituições públicas, e assim, pouco a pouco, os trabalhadores, isolados e sem defesa, têm-se visto, com o decorrer do tempo, entregues à mercê de senhores desumanos e à cobiça duma concorrência desenfreada. (Papa Leão XIII, 1891,n. 2)

Leão XIII defende o princípio de que é preciso que

se

ajude

os

mais

pobres,

a

saber

os

operários, através da luta por direitos humanos 63


e

trabalhistas,

porém

desaprova

da

solução

socialista, enfatizando que “[os socialistas] para curar este mal, instigam nos pobres o ódio invejoso contra os que possuem” (Papa Leão XIII, 1891, n.3). Defende a propriedade privada, uma vez que acredita que aqueles que ganham salário visam possuir bens e economizam para tal, tornando esse bem um direito do assalariado. Diz ainda que isso “não é só o direito ao salário, mas ainda um direito estrito e rigoroso para usar dele como entender.” (Papa Leão XIII, 1891, n. 4). Nessa carta, Leão XIII sugere a intervenção do Estado na economia em favorecimento à classe mais pobre, visando uma melhor distribuição da riqueza. Ressalta ainda que não é a favor da luta entre classes, mas sim da concórdia entre elas:

64


O erro capital na questão presente é crer que as duas classes são inimigas natas uma da outra, como se a natureza tivesse para

armado

se

os

ricos

combaterem

e

os

pobres

mutuamente

num

duelo obstinado. […] Elas têm imperiosa necessidade uma da outra: não pode haver capital sem trabalho, nem trabalho sem capital. (Papa Leão XIII, 1891, n. 9)

A

última

encíclica,

Centesimus

annus

foi

elaborada pelo Papa João Paulo II, em 1991, e marca o centenário da Rerum Novarum. Nessa carta, João Paulo II afirma que a Rerum Novarum representa a correta compreensão do que é o valor humano, finalizando a análise da obra de seu predecessor com a seguinte confirmação: […] além dos direitos que cada homem adquire com o próprio trabalho, existem direitos

que

qualquer

obra

não por

são

correlativos

ele

realizada,

a

mas

derivam da sua dignidade essencial de pessoa. (Papa João Paulo II, 1991, n.11).

65


Da mesma forma que Leão XIII, João Paulo II também faz críticas ao socialismo, argumentando que esse sistema enxerga o indivíduo apenas como uma parte de um modelo socio-econômico que é

essencial para que tal sistema funcione

de maneira eficaz, distorcendo assim o real significado de direitos humanos. Repudia ainda o militarismo e o nacionalismo exarcebados impunidade

que, pelas

somados

ao

injustiças

sentimento sociais,

que

de a

classe menos abastada guardou desde o começo da Revolução Industrial, resultaram nas duas grandes Guerras Mundiais que, por sua vez, foram tão violentas que acabaram até mesmo por exterminar povos e culturas em sua totalidade. Recorde-se aqui, em particular, o povo hebreu, cujo destino terrível se tornou um símbolo da aberração a que se pode chegar o homem quando se volta contra Deus. (Papa João Paulo II, 1991, n. 17)

66


João Paulo II elogia a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), atentando porém que em diversas vezes essa organização ainda não tinha sido capaz de remediar ou acalentar alguns problemas e disputas no mundo que causavam mortes e outros despropósitos injustificáveis, enfatizando que este era o assunto internacional mais urgente e importante que ela teria que resolver. Além disso, como Leão XIII, concorda que a propriedade privada é um direito do homem, mas que, quem a possui, deve estar ciente de que ela não pode partir de uma natureza egoísta, como era comum dentre os proprietários das grandes indústrias do século XIX, mas que essa deveria ser utilizada em prol de outros. João Paulo II entende também como propriedade privada nos tempos modernos algo muito mais abrangente: da

técnica

a e

“propriedade do

saber”

do

conhecimento,

(João

Paulo

II, 67


1991, n. 32). Relata que por diversas vezes esse tipo de propriedade passou a ser mais relevante (nos países industrializados) do que os recursos naturais propriamente ditos, pois sem ela a economia não se sustentaria. Invoca, portanto, as autoridades para que assumam esse conhecimento e, assim, o compromisso de dar assistência aos excluídos. A Centesimus annus é também a primeira encíclica a fazer menção à problemática ecológica. Segundo A. Silva

(1993, p. 785), a partir

dos anos 60, as Cartas Encíclicas adotaram um tom menos defensivo e mais dialogal e a DSI progrediu nos assuntos tratados, ampliando suas abordagens. Apesar de ainda haver a preocupação com a situação de operários, temáticas como desenvolvimento

social,

questão

ecológica

e

paz mundial começaram a ser tratadas com maior cuidado,

aperfeiçoando

significado de

68

a

noção

“valor humano”.

concreta

do


A partir das manifestações pontífices sobre a situação social em nível mundial através das cartas encíclicas que mais tarde fariam parte da chamada DSI, começou, em Medellín (Colômbia) em 1968 durante a II Conferência Geral dos Bispos Latinos Americanos, uma reflexão sobre a situação precária em que se encontrava a América Latina nessa época, dentre disputas civis, regimes militares e miséria extrema. Esse novo movimento foi denominado Teologia da Libertação. Os

adeptos

à

TdL,

principalmente

Gustavo

Gutiérrez, considerado fundador da teologia e Leonardo Boff, um dos principais consolidadores da

mesma

no

enfrentar

os

americana

a

Brasil,

tinham

desafios partir

da

de

como

propósito

realidade

uma

análise

latinosocial

concreta e profunda da sociedade. Segundo o Pe. Paulo Ricardo (informação verbal14) a TdL abole 14

Entrevista dada pelo Pde. Paulo Ricardo ao Prof. Felipe Aquino no programa Escola da Fé, televisionado pela TV Canção Nova em 28 de janeiro de 2010. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=0KNslYLGGyE>

69


todo sentido transcendente da fé, ou seja, não há explicações místicas para os fatos, tudo é imanente. Apesar

de

ter

sido

elaborada

a

partir

das

ideias iniciais da DSI, essa visão se chocou inteiramente com os princípios do Vaticano, que a considerou como herética, uma vez que contava com

princípios

marxistas,

principalmente

na

materialização da fé e negação do divino. Durante muito tempo os adeptos à TdL foram perseguidos pela Igreja Católica e muitas vezes punidos por representarem “um perigo fundamental para a fé da Igreja” (RATZINGER, 1984, n. 2) Ela [a TdL] se concebe, antes, como uma nova

hermenêutica

da

cristã,

quer

dizer, como nova forma de compreensão e de realização do cristianismo na sua totalidade. (Ratzinger, 1984, n. 3a)

A partir do fim dos anos 80 e início dos 90, a TdL entrou em declínio devido a diversas 70


controvérsias em sua concepção e escândalos encobertos pela própria Igreja Católica. Segundo Libânio (2012, ps. 6 e 7), a mudança da e

sociedade o

com

capitalismo,

os cada

avanços vez

tecnológicos

mais

descarado,

contribuíram para tal ruína, uma vez que fizeram com que a figura do pobre mudasse. Ao mesmo tempo em que se viu a diminuição da pobreza depois dos anos 70, o contraste com as classes mais abastadas se tornou muito mais aparente e

escandaloso,

porém,

ao

se

entregar

ao

consumismo tão declarado pela sociedade atual, o próprio pobre se “camuflou” e se fez difícil de libertar, como pretendia a TdL, que, por consequencia, perdeu o controle da situação e mostrou a sua fragilidade. A TdL ainda está em atividade atualmente, embora não com a mesma força e, certamente, não tão aparente como na época de sua criação.

71


2.2 A IGREJA E AS LUTAS SOCIAIS NO BRASIL A trajetória da Igreja Católica no Brasil ocorre concomitantemente com a própria história do país. Inicialmente a religião, na época conhecida como Cristandade, era utilizada como meio de dominação social e a Igreja se submetia às mãos do Estado. Segundo Azevedo (2004, p. 111),

em

meados

do

século

XVIII,

ocorre

o

declínio desse modelo devido ao novo pensamento iluminista-racionalista, livrando a Igreja do domínio da Coroa e dando abertura ao modelo regrado diretamente pelo Papa. Durante os anos seguintes, a Igreja passou por diversas etapas, até que, já no início do século XX, retomou a filiação com o Estado em troca do reconhecimento como principal religião do país. Para isso, Dom Sebastião Leme, juntamente com

diversos

outros

intelectuais,

fundou

a Liga Eleitoral Católica com o objetivo de 72


atrair a elite brasileira mais uma vez para o catolicismo. A

primeira

manifestação

católica

social

no

Brasil partiu do Pe. Júlio Maria em 1899 quando, inspirado pela publicação da Rerum Novarum oito anos antes, publicou um artigo em que sugeria [13] Padre Júlio Maria

que a Igreja e o povo se unissem para que combatessem as injustiças sociais. Durante muito tempo, o padre tentou inserir os princípios da Encíclica de Leão XIII no país, porém seus interesses conflitavam com os de Dom Sebastião que, tendo maior influência sobre o Estado,

não

permitiu

qualquer

“intromissão”

oficial de Pe. Júlio Maria na religião. No governo de Getúlio Vargas, a Igreja selou ainda mais os laços com o Estado, dando apoio, por

diversas

vezes

meramente

simbólico,

ao

então presidente em seus projetos de leis para direitos trabalhistas. Também foi introduzida 73


nessa época pela CNBB15 a Ação Católica Brasileira (ACB), com os movimentos

JEC, JUC e JOC16, que,

baseados na DSI, tinha como objetivo formar leigos para que esses pudessem passar adiante os ensinamentos da Igreja. Esse fato comprova o paradoxo existente na Igreja Católica, uma vez que, 30 anos antes, a mesma não havia permitido a influência de cunho social do Pe. Júlio Maria, porém, quando se fez necessário para a continuidade da força da Igreja no Brasil, houve o consentimento, por parte da Igreja, da utilização desse cunho, incluindo até mesmo novos programas sociais para tal. Segundo Zambón (2006, p. 6), a CNBB se impunha diante da crise social, principalmente durante a ditadura militar que se extendeu de 1964 a 15

Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Fundada em meados dos anos 40 e começo dos anos 50, tinha como objetivo atuar socialmente nos campos estudantis e operários 16

Juventude Estudantil Católica, Juventude Universitária Católica e Juventude Operária Católica.

74


1985, tanto através de publicações, educação popular e sindicatos e mobilizações de diversos tipos, como na denúncia de violência militar. Durante

os

anos

70,

como

idealizados

pelos

adeptos

Libertação,

surgem

as

um à

CEBs

17

dos

projetos

Teologia que,

da

atuantes

até hoje, auxiliam os necessitados com seus problemas, sejam eles de natureza doméstica, profissional

ou

até

mesmo

de

sobrevivência.

Atualmente se encontram principalmente na área [14] 13o encontro interclesial Comunidades Eclesiais de Base Juazeiro do Norte, CE.

de em

rural e nas cidades pequenas mais pobres do Brasil onde há maior número de necessitados, desde sertanejos até indígenas. Sendo assim, o interesse da Igreja em permanecer conectada ao Estado decaiu, uma vez que, com a chegada de novas associações e novos movimentos sociais contrários à realidade brasileira da época, não se via mais o propósito em continuar mantendo essa relação política. 17

Comunidade Eclesial de Base

75


Já na década de 90, três iniciativas da CNBB, através

do

Programa

Pastoral

Social18,

se

destacaram e ficaram marcadas como fundamentais para

o

desenvolvimento

de

novos

movimentos

sociais. As Semanas Sociais Brasileiras (SSBs), primeira iniciativa destacada, foram formadas por três períodos onde assuntos diversos foram discutidos. No primeiro, em 1991, devido ao centenário da Rerum Novarum, foram discutidas as novas tecnologias instaladas no mercado de trabalho e o consequente desemprego gerado por elas. No segundo, em 1994, perspectivas e novas propostas para o país foram colocadas em pauta. Por fim, no terceiro, dentre os anos de 1997 e 1999, vários encontros nacionais, municipais e regionais foram realizados para discutir as “dívidas sociais”, em preparação para a segunda iniciativa da CNBB que se destacou no final dos anos 90: a Campanha Jubileu 2000. Concluiuse, nesse último período que as dívidas socias 18

76

Programa sócio-transformador e de cunho evangelizador


estavam

intrinsicamente

relacionadas

com

as

dívidas econômicas externas. A Campanha Jubileu 2000, foi uma votação acerca das dívidas externas e sociais, como descrito anteriormente. Compareceram mais de seis milhões de pessoas que se mostraram descontentes com a submissão ao FMI19. Em síntese, o plebiscito representou uma das atividades mais marcantes da história recente das lutas e organizações sociais no Brasil. Significou um verdadeiro exercício de cidadania, colocando em prática um processo de educação [15] Grito dos Excluídos, realizado em 2007 em Goiânia, GO.

política amplo e popular. (CNBB, 2001, p. 36) A

última,

porém

não

menos

importante,

iniciativa da CNBB foi um movimento criado em 1995 denominado o Grito dos Excluídos. Tratase de um protesto contra a subserviência do país 19

ao

capital

internacional,

gerando

uma

Fundo Monetário Internacional

77


grande disputa mercantil e a intensificação da desigualdade social. O Grito dos Excluídos é realizado, até os dias de hoje, na data de 7 de setembro.

Tal protesto abrangeu não somente o

Brasil como também toda América Latina e ficou conhecido como Grito Continental.

78


79


80


CAPÍTULO 3

REFERÊNCIAS PROJETUAIS 81


IGREJA DA LUZ Tadao Ando

82


[16] Cruz que corta a parede leste da edificação.

83


Localização: Ibaraki, Japão Área do projeto: 113 m2 Materiais de construção: Concreto e madeira Ano de conclusão da obra: 1989 (edifícios); 1999 (escola) A Igreja da Luz é considerada como uma das obras primas de Tadao Ando e representa a filosofia do arquiteto ao associar a natureza (luz) à arquitetura (construção). O projeto substituiu a antiga igreja católica que se localizava na mesma área. A capela, finalizada em 1989, é constituída por um volume retangular que, por sua vez, é cortado por uma parede construída no ângulo de 15o. Essa parede direciona os visitantes à entrada da capela de forma que, ao adentrarem o edifício, estejam completamente alinhados à “cruz de luz” na parede oposta. Já em 1999, Tadao Ando foi chamado novamente 84

[17] Detalhe da fenda entre a parede e o teto.


[18] Implantação com térreo


para

construir

anexada à

uma

escola

(Sunday

School)

capela. A escola tem a forma muito

similar à da capela – retangular, com uma parede a perfurá-la – sendo, porém, menos simbólica do que a primeira. Além disso, apesar da sua evidente simplicidade ao primeiro olhar, Tadao Ando atentou a diversos detalhes construtivos, como a perfeita junção

[19] Detalhe da parede que atravessa a igreja e da junção das placas de concreto.

das placas de concreto e a delicadeza da fenda existente entre uma das paredes e o teto da igreja. O principal objetivo do arquiteto era incentivar a percepção do divino através do contraste entre concreto e subjetivo, claro e escuro, cheio e vazio. O mais evidente elemento representativo desse contraste é a cruz que corta uma das paredes do edifício, funcionando não só como elemento simbólico mas também, de um modo mais lógico,

como

uma

janela

que

visualização do espaço externo. 86

proporciona

a [20] Exterior da igreja


O minimalismo característico de Tadao Ando, seu cuidado com a incidência de iluminação natural no

edifício

e

o

uso

destemido

do

concreto

armado aparente influenciaram abundantemente a concepção do projeto elaborado neste trabalho. Além disso, a sutileza e destreza com o qual o arquiteto tratou a característica simbológica da religião (apenas com formas e luz) também inspiraram o projeto final.

[21] Detalhe da cruz

87


IGLESIA DEL SANTÍSSIMO REDENTOR Fernando Menis Architects

88


[22] Nave e presbitĂŠrio da igreja.

89


Localização:

San

Cristoban

de

La

Laguna,

Espanha Área do projeto: 1050 m2 Materiais de construção: Concreto e picón Ano

de

conclusão

da

obra:

2008

(centro

paroquial); igreja ainda sendo finalizada O projeto consiste em um único volume inteiramente de concreto que foi dividido em quatro partes e desconstruído a partir do deslocamento de cada uma delas. A iluminação foi feita em cada espaço criado por esse deslocamento, de modo que produzisse um forte significado espiritual para o edifício. A igreja foi organizada em dois andares. No nível térreo encontram-se a nave, o altar, uma pequena sacristia e um depósito. Já no segundo andar, localiza-se um pequeno centro de cultura e banheiros. Segundo os arquitetos, o concreto foi escolhido 90

[23] Detalhe de uma das aberturas entre as fendas criadas pelo deslocamento.


[24] Plantas do tĂŠrreo e do 1o pavimento


para o projeto devido à sua natural eficiência energética. Outro material utilizado foi uma rocha local chamada picón que, após fragmentada e

combinada

com

o

concreto,

proporcionou

melhor acústica para o templo. Isso ocorreu em consequência de sua característica porosa que permite que o som seja absorvido de maneira mais eficaz. [25] Área externa da igreja.

O

edifício

devido pelos

ao

foi

escolhido

projeto

arquitetos.

de

como

iluminação

Diversas

referência elaborado

aberturas

foram

posicionadas estrategicamente, ora na cobertura, ora na fachada, de modo que, em determinados horários, a luz incidisse em locais específicos da igreja tornando-a o elemento mais simbólico do projeto.

92

[26] Detalhe das rochas picón.


[27] Esquema de iluminação da igreja. Tradução: “[...] ao amanhecer, nas primeiras horas do sol, a luz atravessa que a cruz no altar simboliza a abertura do tumulo de Jesus. [...] Ao meio dia, a luz atravessa a abertura zenital e simboliza a confirmação da eucaristia. [...] A transição do escuro para claro na igreja simboliza a passagem da morte para a vida”.

93


HOLY ROSARY CHURCH COMPLEX Trahan Architects

94


[28] Vista externa do complexo

95


Localização: Lousiana, EUA Área do projeto: 1.586 m2 Materiais de construção: Concreto Ano de conclusão da obra: 2004 Localizado em uma área rural de Lousiana, o complexo é constituído por uma capela, por dois edifícios de educação católica e por um edifício administrativo.

Os

blocos

educacionais

e

o

administrativo são lineares e se intercalam, enquanto a capela é distanciada e desenhada em forma de cubo. Essa distinção entre desenhos ajuda a

acentuar a importância do caráter

religioso do projeto. A capela foi construída em concreto branco moldado in loco e vidros comuns e jateados utilizados de acordo com a quantidade de iluminação e a respectiva simbologia necessárias. Segundo o escritório, a intenção era criar um espaço que não fosse nem austero e nem 96

[29] Detalhe da iluminação indireta


[30] Implantação com térreo


exuberante e que alcançasse a peculiaridade de

[31] À direita, capela.

um espaço meditativo delicado e aprazível. A combinação da incidência da luz com o concreto claro, a

gera,

sensação

de

de

acordo

proteção

com ao

os mesmo

arquitetos, tempo

que

transmite a característica misteriosa do divino e do sublime. O projeto foi destacado como referência devido ao programa de necessidades e a conseguinte distribuição

dele

pelos

edifícios.

A

interconexão de todas as edificações e o uso da luz como elemento simbólico também motivaram a escolha.

[32] Fachada do complexo.



SEDE DA PADRE RUBINOS Elsa Urquijo Architectos


[33] Praรงa interna do complexo


Localização: A Coruña, Espanha Área do projeto: 15.882,00 m2 Materiais de construção: Alvenaria e madeira Ano de conclusão de projeto: 2014 A Padre Rubinos é uma instituição de caridade católica espanhola que foi criada há quase um século com a intenção de abrigar os necessitados e idosos e acomodar escolas infantis.

Com o

auxílio da arquiteta Elsa Urquijo, a nova sede da instituição foi projetada em 2014. De acordo com o escritório, o uso predominante de linhas horizontais permitindo que o projeto se

dispersasse

homogeneamente

pelo

terreno

despontou da procura pela tranqüilidade e pelo relaxamento. Uma

das

projeto

características é

a

criação

de

mais

marcantes

praças

abertas

do ao

público em geral. A principal delas, que também atua como conectora das duas alas do projeto, 102

[34] Vista do campanário


[35] Implantação com térreo


funciona como uma espécie de claustro, dado o caráter religioso da instituição. As pequenas praças foram concebidas como potencializadoras da clareza e ininterrupção visual. O programa destinado para idosos ocupa maior parte da edificação: no nível térreo encontramse

as

áreas

comuns,

oficinas

profissionais,

salas de terapia, etc; já no segundo pavimento

[36] Principal praça conectora reinterpretação de claustro.

e

situam-se os dormitórios. O espaço infantil também encontra-se no primeiro pavimento e é articulado com as áreas comuns da residência para idosos. Segundo a arquiteta, essa articulação se dá de maneira simbólica, de modo que representa a estreita relação entre as duas gerações. Além disso, há ainda um albergue para moradores

[37] Ala de educação infantil com conexão visual com espaços comuns da residência para idosos.

de rua (que também se localiza no pavimento térreo), à

uma

residência

capela das

e

uma

freiras

área que

destinada

comandam

a

[38] À direita, capela.



instituição. Os materiais (madeira, tecidos, etc) e as cores (branco, cinza claro, bege, etc) selecionados para o projeto foram pensados simbolicamente de modo que demonstrassem “humanidade, serenidade e aconchego”. A Padre Rubinos foi escolhida como referência pelo uso das praças como elementos articuladores do

projeto

e

também

pela

utilização

dos

materiais de acordo com a sensação que desejava ser transmitida por eles.

[39] Entrada freiras.

para

a

residência

de


107



CAPÍTULO 4

O PROJETO



“Arquitetura é linguagem e em toda linguagem há uma arquitetura, no sentido de criação. Arquitetura é símbolo, pois como linguagem não é por si, mas representa.” Marcos Monteiro 111


4.1 LOCALIZAÇÃO Para a escolha do terreno de projeto, foi feita uma pesquisa a fim de descobrir o local mais apropriado para a inserção de uma Igreja Católica na cidade. Com o auxílio de uma pesquisa feita pelo Estadão em que se comparava a presença de católicos em relação a evangélicos em bairros paulistas, foi comprovado que o bairro mais católico de São Paulo é o Jardim Paulista. Portanto,

inicialmente,

o

projeto

seria

elaborado ali, mais especificamente na esquina entre a Av. Brasil e a Rua Dr. David Campista. Porém,

após

ser

levado

em

consideração

o

caráter social da Igreja, foi decidido que seria mais relevante, tanto do ponto de vista projetual quanto teórico, se o terreno fosse localizado em outra região. Assim, uma nova pesquisa foi elaborada com ajuda dos arquivos da Cúria Metropolitana de São Paulo, dessa vez dando maior enfoque à quantidade de igrejas por 112


bairro. Ao confrontar os dados encontrados com aqueles previamente obtidos através do banco de dados do Estadão, o bairro Cangaíba foi escolhido por [40] Terreno visto da Governador Carvalho Pinto.

Avenida

sua acentuada escassez de Igrejas Católicas e por sua vicinalidade ao bairro da Penha, local esse com considerável e relevante população católica e religiosa. Em Cangaíba, foi encontrado um terreno fronteiro à favela do Jaú que atualmente é utilizado como campo de futebol pela mesma. Essa proximidade com a favela enfatizou o caráter social do projeto

e

permitiu

que

novos

usos

fossem

acrescentados ao que previamente seria somente [41] Terreno visto da Rua Amorim Diniz.

um edifício religioso.

113


TERRENO ÁREA: 10.800 m

FAVELA DO JAÚ

PARQUE LINEAR TIQUATIRA


[42] À esquerda, mapa de localização do terreno.

4.2 O BAIRRO O bairro de Cangaíba tem origem no início do século XX quando acredita-se ter surgido a partir de um pequena igreja católica na região dedicada a Bom Jesus (atualmente conhecida como Paróquia Bom Jesus do Cangaíba). A área, ao redor da antiga Estrada de Cangaíba, se desenvolveu graças

a

imigrantes

japoneses,

italianos

e

espanhóis que ali lotearam chácaras. Segundo Ponciano (2004, p. 54), nas décadas de 20 e 30 novas vilas foram criadas, como a Vila Londrina e a Vila Rui Barbosa, essas caracterizando a região como zona rural. Porém, [43] Antiga Paróquia Bom Jesus. Imagem datada do final da década de 1950.

em meados da década de 20, obras de retificação do rio Tietê começaram a causar um importante impacto na área. Olarias aproriaram-se dos locais desobstruídos entre as regiões da Penha e de São Miguel, consequentemente atingindo Cangaíba. Segundo 115


estudo

realizado

pelo

Arquivo

Histórico

de

São Paulo (2010, p. 4), tornou-se possível o abastecimento de madeira para as fábricas do local e a distribuição dos materiais construtivos nelas produzidos para a cidade graças às novas embarcações no rio Tietê. Além disso, o desenvolvimento do bairro se deu também pela sua proximidade com o bairro da Penha. Esse último há percurso histórico intimamente relacionado com a própria história de São Paulo devido ao fato de suas rotas serem usadas por bandeirantes para desbravar o novo território. Ponciano (2004, p. 220) afirma que a Penha foi fundada por volta de 1660 pelo padre Mateus Nunes Siqueira e por seu irmão Jacinto Nunes Siqueira

que

ali

possuiam

uma

fazenda

com

uma igreja à qual nomearam Nossa Senhora da Penha. Ao passar dos anos, essa Igreja, graças às diversas doações que à ela foram feitas, 116

[44] Obras de retificação do rio Tietê, 1986.


prosperou e cresceu,

assim como o povoado ao

seu redor. Há, porém, uma lenda sobre a origem do bairro que conta a história de um viajante francês que sempre levava consigo a imagem de Nossa Senhora. Esse viajante transitava pelo Brasil [45] Basílica Nossa Senhora da Penha.

e decidiu, certa noite, pernoitar em São Paulo nos arredores do que hoje é o bairro da Penha. Ao continuar sua rota na manhã seguinte, notou a ausência da Santa e decidiu retornar ao local onde havia repousado para procurar por ela. Após encontrá-la, seguiu viagem, notando, horas depois, novamente o desaparecimento da imagem. Ao mais uma vez se deparar com ela no mesmo local, o francês presumiu que a Santa havia escolhido aquela área para ficar e alí construiu então uma capela. Essa lenda contribui em grande parte para o desenvolvimento do bairro, uma vez que dezenas 117


de fiĂŠis passaram a visitar o local acreditando que o mesmo era sagrado. As procissĂľes eram tantas e tĂŁo intensas que deram origem a duas importantes avenidas da zona leste: a Rangel Pestana e a Celso Garcia.

118


4.3 COMPOSIÇÃO DO PROJETO O partido arquitetônico surgiu a partir da temática e do programa de necessidades. Uma vez determinado o valor social do complexo que estaria sendo projetado, optou-se por montar um programa em que houvesse a interligação de algumas

atividades,

educacionais,

sendo

esportivas

elas: e

de

religiosas,

lazer.

Sendo

assim, foram projetados dois prédios distintos, (a Igreja, propriamente dita, e um anexo), interligados por um jardim na área externa. [46] Croquis do posicionamento projeto no terreno.

do

A posição do projeto no terreno foi determinada a partir do que foi considerada “classificação hierárquica” de cada edifício e por estética do desenho do jardim. Sendo a Igreja o principal objetivo

deste

projeto,

foi

posicionada

na

esquina do terreno, tendo sua entrada voltada para a Av. Governador Carvalho Pinto e para o parque Tiquatira, onde há movimento intenso e relevante fluxo de pessoas. O anexo foi inserido 119


diretamente na avenida funcionando como uma barreira entre o caótico tráfego e o jardim do complexo. A partir disso, foram adotadas quatro entradas para o projeto, duas principais (em laranja, no esquema ao lado) e duas secundárias (em amarelo). O acesso principal pela Av. Governador Carvalho Pinto acontece através de um pórtico projetado no anexo. Isso se deu devido ao posicionamento do anexo que, apesar de resguardar o jardim,

[47] Croquis sinalizando os acessos para o projeto.

resultou no fechamento da entrada da igreja para a avenida mais movimentada da área. Na área externa há uma quadra poliesportiva e uma horta que apoiam as oficinas profissionalizantes inseridas

no

anexo

e

incentivam

também

as

atividades de lazer e cultura. As duas atividades localizam-se na Rua Amorim Diniz devido ao fato da mesma não ter saída, proporcionando assim maior tranquilidade e segurança.

120

[48] Perspectiva mostrando o pórtico criado no anexo.


Ao lado da quadra, há um grande espaço em desnível contendo um espelho d’água com uma cruz em seu centro. Esse espaço é reservado para contemplação.

Largas

passagens

também

foram

projetas para que pudessem acomodar ocasionais eventos, como quermeces. O anexo foi dividido em duas partes: comunitária e privada. A comunitária é constituída por oficinas profissionalizantes (artes, marcenaria, esportes, línguas, jardinagem, etc), um espaço expositivo para exibição de trabalhos elaborados nas oficinas, um auditório para palestras e demais apresentações e uma biblioteca. Já na privada, encontram-se os escritórios, uma sacristia de apoio, os dormitórios para padres [49] Usos do anexo.

e uma área de convivência. A última dá acesso à uma área externa, embora murada, que funciona como uma reescrita de um pátio de claustro e só pode ser usufruída por padres, funcionários da igreja e pessoas autorizadas. 121


Os usos da área comunitária foram determinados de acordo com a as características do serviço social praticado pela Igreja. Para este projeto, foram adotas as atividades didáticas como as mais relevantes para a

formação de caráter.

O edifício da igreja é constituído por dois andares: No nível térreo há o próprio espaço de celebração, a essência da Igreja.

Esse

espaço é composto pelo átrio, pela nave e pelo presbitério (vide planta, p. 139). O átrio funciona como um anteparo entre o exterior e o interior da igreja, protejendo a última das intempéries. É também, simbolicamente, onde se “deixam as energias ruins” antes de adentrar o local sagrado. A nave é o local de encontro de fiéis e, de acordo com o Missal Romano20, deve-se ser disposta Livro aprovado pelo Papa que contem instruções gerais para a celebração de missas e eventos eclesiásticos. As instruções vão desde ritos até disposições de móveis e ambientação de espaços sacros. 20

122


de

modo

a

permitir

que

aqueles

que

estão

presentes na celebração possam dela participar devidamente. A comodidade e conforto devem ser garantidos, assim como a imposição de respeito e

silêncio pelo próprio ambiente.

O presbitério, onde situa-se o altar, deve ser o foco principal de todos os participantes da celebração. O Missal Romano afirma que o altar deve ser fixo e ornamentado com moderação. No subsolo da igreja há uma capela, uma sacristia (que é acessada através de uma escada no altar da igreja e pela capela), um salão para eventos [50] Croquis mostrando a iluminação no subsolo.

e uma sala para ensinos catequistas. Para que houvesse iluminação suficiente para este andar, foi projetado uma espécie de pátio no próprio subsolo

que

também

pode

ser

acessado

pelo

jardim através de uma escadaria. Esse pátio também pode ser utilizado como um espaço mais reservado para descanso e reflexão

123


4.4 SIMBOLOGIA Para esse estudo, foi adotada a divisão de signos em ícones, índices e símbolos, como elaborada por

Pierce.

Adicionalmente,

o

conceito

de

metáfora de Broadbent também foi analisado e empregado para a explicação de alguns signos nesse projeto. A simbologia foi traballhada no edifício desde a escolha dos materiais até os detalhes e tem como

objetivo

transmitir

variadas

sensações

e sentimentos. A mais relevante sensação que deveria ser transmitida era, evidentemente, o da presença divina. Era a intenção do projeto que os edifícios, principalmente a Igreja, tivessem a volumetria mais simples possível, sem muitos adornos ou excessivas composições de fachada. O objetivo desse minimalismo era induzir cada indivíduo a projetar a sua própria crença e experiência na 124

[51] Perspectiva da entrada da igreja mostrando a simplicidade das formas utilizadas no projeto.


arquitetura, tornando a construção única para cada um. A utilização do concreto aparente para o corpo principal da igreja e para o anexo é símbolo da sobriedade (e até mesmo da austeridade) da religião. Seu aspecto frio induz também à introspecção e ao silêncio, ambos característicos da fé. Decidiu-se utilizar somente pequenas aberturas em certos pontos do projeto. Duas estreitas fendas – uma na face leste e outra na oeste [52] Imagem que inspirou a iluminação do altar da igreja.

(vide corte B, p. 141) – foram posicionadas no encontro entre parede e forro da nave para proporcionar uma sensação de leveza ao edifício, já que o mesmo é inteiramente projetado em concreto. O altar, porém, recebeu uma iluminação mais direcionada. Essa iluminação se originou de uma fotografia que retrata raios solares perfurando 125


126


[53] Perspectiva do interior da igreja mostrando as fendas nas paredes leste e oeste e a iluminação do altar.

127


nuvens escuras. Essa imagem, que possui um forte apelo

divino,

foi

transformada

na

abertura

zenital sobre o altar, permitindo que uma luz quase sublime o banhasse. A combinação das fendas da nave com a abertura zenital do altar formam ainda um novo signo. Os indívuos adentram pela nave, área mais escura (símbolo do mundano), e são direcionados para a mais clara, o altar (símbolo do divino e da salvação). O mesmo princípio de iluminação do altar foi utilizado na capela localizada no subsolo da igreja. Aberturas no piso térreo foram feitas para que a luz incidisse somente na área para a qual são voltados os assentos. [54] Iluminação da capela no subsolo.

A iluminação do átrio da igreja foi feita através de uma abertura zenital e de uma placa metálica perfurada que encobre essa abertura, filtrando a luz que atinge o ambiente. Essa placa é formada 128


por diversas perfurações quadradas:

cinquenta

e oito de 0,30 x 0,30 m e doze de 0,60 x 0,60 m. Nas

perfurações

maiores,

metáforas

simbolizam os apóstolos de Cristo,

que

encontram-

se doze sinos de bronze cunhados com letras dos nomes dos apóstolos e salmos escritos por [55] Perspectiva mostrando metálica no átrio.

a

placa

eles ou que se referem a eles.

As perfurações

menores também são metáforas representando os fiéis e devotos do cristianismo. Já no subsolo da igreja foi utilizado outro material na fachada: a madeira. Essa mudança ocorre devido ao programa ali inserido: um salão de confraternizações e uma sala de aula para ensinos catequistas. Em contraste com a austeridade do concreto, a madeira transmite maior

sutileza

e

sensação

de

conforto

e

acolhimento para essas atividades, se tornando, portanto, símbolo dessas sensações. A

madeira

também

foi

utilizada

em

outros 129


ambientes, como nas salas de aula para oficinas, na biblioteca e no espaço de convivência da área privada do anexo. Outra característica do projeto foi a utilização do concreto translúcido no muro que oculta o “claustro” no segundo andar do anexo. Esse concreto foi utilizado para que, ao mesmo tempo que

proporcionasse

o

isolamento

[56] Espaço de descanso mostrando a utilização da madeira na fachada do subsolo.

necessário

que esse espaço exige, possibilitasse também a

comunicação

com

o

exterior

do

edifício.

Além disso, a translucidez aprimora o caráter simbólico que há no projeto, uma vez que agrega uma característica enigmática a ele. Na

área

externa,

a

sobriedade

da

Igreja

é

mesclada com a fluidez da natureza. O jardim desenhado com linhas geométricas e angulares conversa com as formas retangulares utilizadas no

projeto,

sendo,

porém,

presença de vegetação.

130

amenizadas

pela

[57] Perspectiva do “claustro” mostrando a parede de concreto translúcido voltada para a praça.


O

padrão

do

piso

predominantemente

da

praça

triangulares

com

formas

e

três

tonalidades da mesma cor é também uma metáfora para a santa trindade (pai, filho e espírito santo). Já a combinação da cruz com o espelho d’água [58] Perspectiva mostrando o padrão do piso do complexo.

no espaço dedicado à comtemplação representa a passagem bíblica em que Jesus caminha sobre a água. A fluidez da água também transmite serenidade e calma, ambos sentimentos necessários para uma área de reflexão.

Nesse caso específico, a

cruz é um índice da imagem de Jesus, a água é um símbolo da tranquilidade e o conjunto é uma metáfora para a passagem bíblica.

[59] “Jesus andando sobre as águas”, 1888, Ivan Konstantinovich Aivazovsky.

131


132


[60] Perspectiva mostrando o padr達o do piso do complexo.

133


4.5 CONCLUSÃO Criou-se uma linguagem artística e simbólica a partir das características da Igreja Católica e da fé cristã. O resultado do projeto final é uma grande sobreposição de máscaras, como tituladas por Tschumi. Diversos artifícios foram criados no projeto para seduzir o observador e o instigálo a desfrutar os ambientes mais intensamente. Essas máscaras tornam o projeto mais refinado e instigante e, o que anteriormente parecia somente um edifício projetado de acordo com a sua função, se tornou um símbolo da própria fé cristã. Os

significantes

(assim

denominados

segundo

os estudos de Pierce) inseridos no projeto nada mais são do que detalhes arquitetônicos aprimorados e relacionados para que pudessem, além de enriquecer projetualmente a edificação, transmitir mensagens sutis e místicas.

134


Além

disso,

o

próprio

caráter

social

da

religião também contribui para o enobrecimento do projeto. A benfeitoria humaniza o complexo e o deixa mais próximo da realidade da região. Em suma, a união de todas as partes (detalhes) do projeto e a narrativa criada por essa união que gera formas e cenas é o que reafirma a harmonia do projeto na sua essência.

135



CAPÍTULO 5

DESENHOS TÉCNICOS


[1] Igreja [2] Anexo comunitário [3] Espaço de convívio [4] Horta [5] Quadra [6] Espaço de reflexão [7] Estacionamento 5 4

1

3

6

2

7

IMPLANTAÇÃO

138


[1] Átrio [2] Santuário [3] Nave [4] Altar [5] Espaço expositivo [6] Oficina [7] Auditório

4

3 1 2

6

6

6

7

5

PLANTA DO

TÉRREO

139


[1] Terraço [2] Biblioteca [3] Sacristia de apoio [4] Escritório [5] Área de convivência [6] Copa e Lavanderia [7] Dormitório [8] Sala de leitura e estudo

1

1 2

3 4

4

5

6

7

7 8

PLANTA DO 1O PAVIMENTO

140


[1] Sacristia [2] Capela do Santíssimo [3] Salão para eventos [4] Sala para catequese [5] Espaço de convívio

1

2

3 5

4

PLANTA DO

SUBSOLO

141


CORTE A

CORTE B

CORTE C

142


ELEVAÇÃO NORTE

ELEVAÇÃO SUL

143


144

ELEVAÇÃO OESTE

ELEVAÇÃO SUL (IGREJA)

ELEVAÇÃO LESTE

ELEVAÇÃO LESTE (IGREJA)


DETALHE DA DIVISÓRIA ARTICULADA

DETALHE DA PLACA METÁLICA

145



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elsa-urquijo-arquitectos> Imagem 37: disponível em <http://www.archdaily.com.br/br/627744/padre-rubinoselsa-urquijo-arquitectos> Imagem 38: disponível em <http://www.archdaily.com.br/br/627744/padre-rubinoselsa-urquijo-arquitectos> Imagem 39: disponível em <http://www.archdaily.com.br/br/627744/padre-rubinoselsa-urquijo-arquitectos> Imagem 40: retirada do Google Maps Imagem 41: retirada do Google Maps Imagem 42: autoria da autora Imagem 43: retirada de “Cangaíba, uma história: Ensaio fotográfico sobre o bairro do Cangaíba (SP) realizado pelo Arquivo Histórico de São Paulo” Imagem 44: retirada de “Cangaíba, uma história: Ensaio fotográfico sobre o bairro do Cangaíba (SP) realizado pelo Arquivo Histórico de São Paulo” Imagem 45: disponível em <http://gazetavirtual.com.br/penha-pintura-da-novovisual-a-igrejas-historicas/> Imagem 46: autoria da autora Imagem 47: autoria da autora Imagem 48: autoria da autora Imagem 49: autoria da autora Imagem 50: autoria da autora Imagem 51: autoria da autora 157


Imagem

52:

disponĂ­vel

em

<http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Shaft_of_

light,_Westing_-_geograph.org.uk_-_583541.jpg> Imagem 53: autoria da autora Imagem 54: autoria da autora Imagem 55: autoria da autora Imagem 56: autoria da autora Imagem 57: autoria da autora Imagem 58: autoria da autora Imagem

59:

disponĂ­vel

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<http://pt.wikipedia.org/wiki/Jesus_andando_sobre_

as_%C3%A1guas> Imagem 60: autoria da autora

158


159


160


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