NUTRIÇÃO Por Thaís Barcellos | Fotos divulgação
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Transtornos alimentares afetam a saúde e também atingem crianças e adolescentes Irritabilidade, tristeza e isolamento são alguns dos sintomas apresentados por crianças que sofrem de transtornos alimentares. A pré-adolescência é a época em que mais se manifestam esses distúrbios, que geralmente se originam da vontade de estar de acordo com a turma da escola, seguir um padrão de beleza rígido e idealizado, além de ser aceito no grupo. Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Juiz de Fora (MG), mostra que cerca de 80% dos jovens entre 10 e 16 anos não se sentem satisfeitos com sua imagem corporal. A influência psicológica das frustrações sofridas faz com que o jovem desconte na comida sua raiva ou lamentação. De acordo com o psicólogo e psicanalista clínico, Clenilson Costa, a “ditadura da beleza” é a principal culpada pela elevação de adolescentes insatisfeitos consigo mesmos.
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“É um encadeamento teoricamente simples. Para uma grande parcela da sociedade, ser bonito e perfeito implica em ser magro e/ou ter corpo musculoso e bem definido, o que nem todos podem, devem e, muito menos, têm a obrigação de ser. Porém, quem não quer ser bem quisto?”. Mas, não é apenas o desejo de se inserir em um determinado grupo que leva os jovens a desenvolverem problemas alimentares. O psicólogo explica que muitos outros fatores podem contribuir para que uma criança ou adolescente desenvolva uma relação pouco saudável com a comida. “Posso te dar o exemplo da convivência com os colegas de escola, a imensa disseminação dos fast foods e é claro que, principalmente na primeira idade - entre dois e cinco anos -, a criança tende a comportamentos de imitação dos pais em vários aspectos, inclusive na questão alimentar. Então, se os pais comem de forma inadequada, podem influenciar os filhos a adotar a mesma prática”, acrescenta o especialista.
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Com a rotina cada vez mais intensa, muitos pais não têm tempo para observar o comportamento diário dos filhos e descobrir se eles estão com algum problema de saúde relacionado à alimentação. O alerta surge com mudanças bruscas de comportamento em casa ou no ambiente escolar ou com o aumento da ingestão de alimentos gordurosos e com muito açúcar. Clenilson Costa sugere ainda outra maneira de se observar o filho: “Prestar atenção às falas da criança, pois muitas delas conseguem expressar seu sofrimento através da fala. Outra proposta importante é a questão do brincar e dos desenhos, em se tratando de crianças, esses podem se tornar fortes aliados na expressão de dores e angústias”, orienta o psicólogo. Desconhecimento Para o pediatra José Luiz Couto, a grande incidência de jovens e crianças com transtornos alimentares tem relação também com a falta de conhecimento dos pais e familiares em relação à alimentação desse grupo. “A criança, desde bebê, possui o hábito de comer se estiver necessitando. Se ela não come tudo, é porque não está precisando daquela quantidade. Nas próximas refeições, poderá compensar comendo mais, se necessitar. Porém os adultos, diante de uma recusa parcial ou total de uma refeição, geralmente
movidos por medo, acabam insistindo demais e forçam para que a criança coma tudo. Isso é uma agressão e fere o instinto da vitalidade. Mais tarde, pode levar a bulimia, anorexia nervosa e diversos transtornos psíquicos e físicos”, enumera. O médico alerta para outra atitude errada dos pais, que é a substituição das refeições recusadas pela criança. “Nesse caso, a criança é treinada para comer mesmo estando sem fome, só pelo prazer. Mais tarde, isso pode levar a compulsão pela comida, a obesidade, diabetes e diversas outras doenças correlatas”, complementa José Couto. Comer de forma desregrada e não ter um hábito alimentar saudável faz com que muitas crianças engordem e se adaptem a comer doces, beber refrigerantes e consumir alimentos que não oferecem nenhum tipo de benefício nutricional ao corpo. Mas educar o filho a comer frutas e legumes é uma tarefa da família, alertam os especialistas. Tratamento multidisciplinar Após o diagnóstico de algum transtorno, o tratamento psicológico é aliado ao alimentar. Nesse caso, a procura de um psicólogo é importante para que o jovem consiga se
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NUTRIÇÃO É importante estimular a flexibilidade na seleção e escolha dos alimentos, introduzindo sempre novos sabores para melhorar a aceitação”. Luan Lisboa, nutricionista
expressar e assim adquirir confiança em si mesmo. Clenilson Costa explica que é fundamental ouvir a criança ou adolescente e gerar uma empatia, conquistando a confiança do jovem. “A ideia é que possamos saber dessa criança as questões que a fizeram desencadear tal transtorno e, a partir desse momento, nos utilizarmos de intervenções que possam suscitar questões e respostas sobre seus comportamentos disfuncionais em relação à alimentação”, detalha.
Saiba identificar alguns transtornos alimentares: >> Compulsão Alimentar A compulsão alimentar é um transtorno comum, em que um indivíduo consome regularmente uma grande quantidade de comida de uma vez só, mesmo quando não tem fome ou se sente fisicamente desconfortável por comer tanto. Diferente da bulimia, quem come compulsivamente não sente culpa e nem tenta colocar para fora por meio de vômito ou ingestão de laxantes o excedente de comida, nem pratica com frequência exercícios em excesso na tentativa de queimar calorias. Para identificar se uma pessoa sofre de compulsão alimentar, é só observar se ela consome de forma exagerada grandes quantidades de comida para sanar vergonha ou situações embaraçosas. A comida torna-se refúgio das emoções e geralmente os adolescentes que têm esse transtorno aumentaram de peso de forma muito rápida e repentina.
Juntamente com o tratamento psicológico será necessária uma reeducação alimentar para que a criança diagnosticada com o transtorno volte a consumir vitaminas e minerais para recuperar a saúde. O nutricionista Luan Lisboa diz que o primeiro passo para a retomada da alimentação é a mudança dos hábitos e a criação de um plano alimentar para corrigir deficiências e excessos nutricionais. “É importante estimular a flexibilidade na seleção e escolha dos alimentos, introduzindo sempre novos sabores para melhorar a aceitação”.
>> Bulimia A bulimia é um transtorno marcado por episódios de voracidade com a comida e depois arrependimento de ter ingerido quantidade tão grande. Para os bulímicos, comer compulsivamente e vomitar constitui um ciclo, mas eles podem não ganhar ou perder peso suficiente para que se torne óbvio que padecem de um transtorno alimentar. Esse constante ciclo faz com que pessoas portadoras desse transtorno raramente retenham vitaminas e minerais suficientes para se manterem saudáveis.
O nutricionista explica que desde cedo é importante acostumar a criança com uma alimentação variada e rica em nutrientes. “A formação de hábitos alimentares saudáveis é muito importante e começa cedo. É comum a criança recusar novos alimentos nas primeiras tentativas, mas nunca deixe de oferecer. Outra questão importante são os exemplos dados pelos pais, não adianta oferecer frutas às crianças e comer biscoito recheado, lembre-se de que as crianças se espelham bastante nos pais”, destaca Luan.
Observar se o jovem ou criança esconde comida embaixo da cama, dentro do armário ou na mochila e se ele se esconde após um episódio de voracidade intensa é importante para detectar se a pessoa está ou não com a doença.
Para as crianças que não têm a tradição de comer frutas, legumes e verduras, uma dica importante para os pais é tornar esse alimento atrativo para os pequenos. “Uma alternativa bem simples, e que na maioria das vezes funciona, é tornar a alimentação algo atrativo aos olhos. Mude a apresentação do prato, montando figuras de animais ou de paisagem com os alimentos, isso torna a alimentação um momento agradável e divertido. Lembre-se que alimentar-se, além de nutrir-se, é um momento de sociabilidade, por isso esse momento deve ser agradável para os pequenos. Não force a criança a comer algo que ela não quer e não ofereça recompensas”, orienta o nutricionista.
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A desaprovação com o corpo, baixa autoestima e falta de autoconfiança são algumas das características associadas aos bulímicos, que usam a comida como fuga, mas se arrependem logo em seguida, achando que já estão acima do peso.
>> Anorexia A anorexia é mais comum nas garotas, mas pode ocorrer também entre os meninos. A doença afeta bastante o psicológico, pois o anoréxico sempre acha que está muito acima do peso e evita comer para não engordar. Pessoas que passam por esse transtorno se limitam severamente e também fazem exercícios em excesso, numa tentativa de queimar as calorias que acreditam ter ingerido. Mesmo quando se desgastam fisicamente e os outros os acham excessivamente magros, os anoréxicos ainda acham que os seus corpos são muito pesados e continuam a comer o menos possível. A falta de nutrientes pode levar os órgãos internos do doente a falhar, e o problema pode acarretar a morte por inanição. Obsessão com a contagem das calorias, pular refeições e esconder a comida em vez de comê-la são alguns dos sintomas da anorexia.