Edgar Allan Poe

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Principais obras O gato preto Narrado em primeira pessoa, O gato preto, de Edgar Allan Poe, trata da história de um homem simples que adorava animais e que desenvolve no decorrer da narrativa uma postura doentia, um espírito perverso capaz de atitudes com requinte de crueldade. Poe envolve o leitor numa atmosfera de suspense e obscuridade, causando sobressaltos e gerando uma sensação estranha de terror.


O corvo Neste poema Poe é obscuro, no texto cria uma ficção realista em que a morte é a figura principal. Seu narrador é em primeira pessoa e mostra-se apático, o leitor tem impressão pessoal de conhecê-lo de tão intimo que ele esta com a narrativa. A narrativa é símbolo da dor do poeta, ele anseia o final do sofrimento entediante do quarto que parece muitas vezes assombrado pelos sons da escrita. O terror da noite e da solidão assombra o narrador personagem, é uma verdadeira assolação da alma do escritor.


Ligéia O narrador começa por descrever Ligeia, uma bonita, apaixonada e intelectual mulher de olhos negros. Não se recorda de mais nenhum pormenor sobre a vida de Ligeia, apenas a sua magnífica aparência. No entanto, a beleza de Ligeia não é uma beleza convencional. Casam e Ligeia surpreende o seu marido com o seu conhecimento profundo sobre matemática e física. Passado algum tempo ela adoece e acaba por morrer. O homem casa novamente com outra mulher chamada Lady Rowena. Pouco tempo depois Rowena adoece e morre também. O narrador destroçado fica toda a noite com o corpo de Rowena e repara que, lentamente, aquele corpo vai voltando à vida, transformado em Ligeia.


O gato preto

Não espero nem peço que se dê crédito à história sumamente extraordinária e, no entanto, bastante doméstica que vou narrar. Louco seria eu se esperasse tal coisa, tratando-se de um caso que os meus próprios sentidos se negam a aceitar. Não obstante, não estou louco e, com toda a certeza, não sonho. Mas amanhã posso morrer e, por isso, gostaria, hoje, de aliviar o meu espírito. Meu propósito imediato é apresentar ao mundo, clara e sucintamente, mas sem comentários, uma série de simples acontecimentos domésticos. Devido a suas consequências, tais acontecimentos me aterrorizaram, torturaram e destruíram. No entanto, não tentarei esclarecê-los. Em mim, quase não produziram outra coisa senão horror — mas, em muitas pessoas, talvez lhes pareçam menos terríveis que grotesco. Talvez, mais tarde, haja alguma inteligência que reduza moeu fantasma a algo comum — uma inteligência mais serena, mais lógica e muito menos excitável do que, a minha, que perceba, nas circunstâncias a que me refiro com terror, nada mais do

que uma sucessão comum de causas e efeitos muito naturais. permitiam possuir grande variedade deles Desde a infância, tornaram-se patentes a docilidade e o sentido humano de meu caráter. A ternura de meu coração era tão evidente, que me tomava alvo dos gracejos de meus companheiros. Gostava, especialmente, de animais, e meus pais me . Passava com eles quase todo o meu tempo, e jamais me sentia tão feliz como quando lhes dava de comer ou os acariciava. Com os anos, aumentou esta peculiaridade de meu caráter e, quando me tomei adulto, fiz dela uma das minhas principais fontes de prazer. Aos que já sentiram afeto por um cão fiel e sagaz, não preciso dar-me ao trabalho de explicar a natureza ou a intensidade da satisfação que se pode ter com isso. Há algo, no amor desinteressado, e capaz de sacrifícios, de um animal, que toca diretamente o coração daqueles que tiveram ocasiões frequentes de comprovar a amizade mesquinha e a frágil fidelidade de um simples homem.


Casei cedo, e tive a sorte de encontrar em minha mulher disposição semelhante à minha. Notando o meu amor pelos animais domésticos, não perdia a oportunidade de arranjar as espécies mais agradáveis de bichos. Tínhamos pássaros, peixes dourados, um cão, coelhos, um macaquinho e um gato. Este último era um animal extraordinariamente grande e belo, todo negro e de espantosa sagacidade. Ao referir-se à sua inteligência, minha mulher, que, no íntimo de seu coração, era um tanto supersticiosa, fazia frequentes alusões à antiga crença popular de que todos os gatos pretos são feiticeiras disfarçadas. Não que ela se referisse seriamente a isso: menciono o fato apenas porque aconteceu lembrar-me disso neste momento. Pluto — assim se chamava o gato — era o meu preferido, com o qual eu mais me distraía. Só eu o alimentava, e ele me seguia sempre pela casa. Tinha dificuldade, mesmo, em impedir que me acompanhasse pela rua. Nossa amizade durou, desse modo, vários anos, durante os quais não só o meu caráter como o meu temperamento — enrubesço ao confessá-lo — sofreram, devido ao demônio da intemperança, uma modificação radical para pior. Tomava-me, dia a dia, mais taciturno, mais irritadiço, mais indiferente aos sentimentos dos outros. Sofria ao empregar linguagem desabrida ao dirigir-me à minha mulher. No fim, cheguei mesmo a tratá-la com violência. Meus animais, certamente, sentiam a mudança operada em meu caráter. Não apenas não lhes dava atenção alguma, como, ainda, os maltratava


Quanto a Pluto, porém, ainda despertava em mim consideração suficiente que me impedia de maltratá-lo, ao passo que não sentia escrúpulo algum em maltratar os coelhos, o macaco e mesmo o cão, quando, por acaso ou afeto, cruzavam em meu caminho. Meu mal, porém, ia tomando conta de mim — que outro mal pode se comparar ao álcool? — e, no fim, até Pluto, que começava agora a envelhecer e, por conseguinte, se tomara um tanto rabugento, até mesmo Pluto começou a sentir os efeitos de meu mau humor. Certa noite, ao voltar a casa, muito embriagado, de uma de minhas andanças pela cidade, tive a impressão de que o gato evitava a minha presença. Apanhei-o, e ele, assustado ante a minha violência, me feriu a mão, levemente, com os dentes. Uma fúria demoníaca apoderou-se, instantaneamente, de mim. Já não sabia mais o que estava fazendo. Dir-se-ia que, súbito, minha alma abandonara o corpo, e uma perversidade mais do que diabólica, causada pela genebra, fez vibrar todas as fibras de meu ser. Tirei do bolso um canivete, abri-o, agarrei o pobre animal pela garganta e, friamente, arranquei de sua órbita um dos olhos! Enrubesço, estremeço, abraso-me de vergonha, ao referir-me, aqui, a essa abominável atrocidade. Quando, com a chegada da manhã, voltei à razão — dissipados já os vapores de minha orgia noturna — , experimentei, pelo crime que praticara, um sentimento que era um misto de horror e remorso; mas não passou de um sentimento superficial e equívoco, pois minha alma permaneceu impassível. Mergulhei novamente em excessos, afogando logo no vinho a lembrança do que acontecera. trementes, o gato se restabeleceu, lentamente. A órbita do olho perdido apresentava, é certo, um aspecto horrendo, mas não parecia mais sofrer qualquer dor. Passeava pela casa como de costume, mas, como bem se poderia esperar, fugia, tomado de extremo terror, à minha aproximação.


Restava-me ainda o bastante de meu antigo coração para que, a princípio, sofresse com aquela evidente aversão por parte de um animal que, antes, me amara tanto. Mas esse sentimento logo se transformou em irritação. E, então, menos terríveis que grotesco. Talvez, mais tarde, haja alguma inteligência que reduza o meu fantasma a algo comum — uma inteligência mais serena, mais lógica e muito menos excitável do que, a minha, que perceba, nas circunstâncias a que me refiro com terror, nada mais do que uma sucessão comum de causas e efeitos muito naturais. Desde a infância, tornaram-se patentes a docilidade e o sentido humano de meu caráter. A ternura de meu coração era tão evidente, que me tomava alvo dos gracejos de meus companheiros. Gostava, especialmente, de animais, e meus pais me permitiam possuir grande variedade deles. Passava com eles quase todo o meu tempo, e jamais me sentia tão feliz como quando lhes dava de comer ou os acariciava. Com os anos, aumentou esta peculiaridade de meu caráter e, quando me tomei adulto, fiz dela uma das minhas principais fontes de prazer. Aos que já sentiram afeto por um cão fiel e sagaz, não preciso dar-me ao trabalho de explicar a natureza ou a intensidade da satisfação que se pode ter com isso. Há algo, no amor desinteressado, e capaz de sacrifícios, de um animal, que toca diretamente o coração daqueles que tiveram ocasiões freqüentes de comprovar a amizade mesquinha e a frágil fidelidade de um simples homem. Casei cedo, e tive a sorte de encontrar em minha mulher disposição semelhante à minha. Notando o meu amor pelos animais domésticos, não perdia a oportunidade de arranjar as espécies mais agradáveis de bichos. Tínhamos pássaros, peixes dourados, um cão, coelhos, um macaquinho e um gato. Este último era um animal extraordinariamente grande e belo, todo negro e de espantosa sagacidade. Ao referir-se à sua


inteligência, minha mulher, que, no íntimo de seu coração, era um tanto supersticiosa, fazia freqüentes alusões à antiga crença popular de que todos os gatos pretos são feiticeiras disfarçadas. Não que ela se referisse seriamente a isso: menciono o fato apenas porque aconteceu lembrar-me disso neste momento. Pluto — assim se chamava o gato — era o meu preferido, com o qual eu mais me distraía. Só eu o alimentava, e ele me seguia sempre pela casa. Tinha dificuldade, mesmo, em impedir que me acompanhasse pela rua. Nossa amizade durou, desse modo, vários anos, durante os quais não só o meu caráter como o meu temperamento — enrubesço ao confessá-lo — sofreram, devido ao demônio da intemperança, uma modificação radical para pior. Tomava-me, dia a dia, mais taciturno, mais irritadiço, mais indiferente aos sentimentos dos outros. Sofria ao empregar linguagem desabrida ao dirigir-me à minha mulher. No fim, cheguei mesmo a tratá-la com violência. Meus animais, certamente, sentiam a mudança operada em meu caráter. Não apenas não lhes dava atenção alguma, como, ainda, os maltratava. Quanto a Pluto, porém, ainda despertava em mim consideração suficiente que me impedia de maltratá-lo, ao passo que não sentia escrúpulo algum em maltratar os coelhos, o macaco e mesmo o cão, quando, por acaso ou afeto, cruzavam em meu caminho. Meu mal, porém, ia tomando conta de mim — que outro mal pode se comparar ao álcool? — e, no fim, até Pluto, que começava agora a envelhecer e, por conseguinte, se tomara um tanto rabugento, até mesmo Pluto começou a sentir os efeitos de meu mau humor. • Certa noite, ao voltar a casa, muito embriagado, de uma de minhas andanças pela cidade, tive a impressão de que o gato evitava a minha presença. Apanhei-o, e ele, assustado ante a minha violência, me feriu a mão, levemente, com os dentes. Uma fúria demoníaca apoderou-se, instantaneamente, de mim. Já não sabia mais o que estava fazendo. Dirse-ia que, súbito,


minha alma abandonara o corpo, e uma perversidade mais do que diabólica, causada pela genebra, fez vibrar todas as fibras de meu ser.Tirei do bolso um canivete, abri-o, agarrei o pobre animal pela garganta e, friamente, arranquei de sua órbita um dos olhos! Enrubesço, estremeço, abraso-me de vergonha, ao referir-me, aqui, a essa abominável atrocidade. Quando, com a chegada da manhã, voltei à razão — dissipados já os vapores de minha orgia noturna — , experimentei, pelo crime que praticara, um sentimento que era um misto de horror e remorso; mas não passou de um sentimento superficial e equívoco, pois minha alma permaneceu impassível. Mergulhei novamente em excessos, afogando logo no vinho a lembrança do que acontecera. Entrementes, o gato se restabeleceu, lentamente. A órbita do olho perdido apresentava, é certo, um aspecto horrendo, mas não parecia mais sofrer qualquer dor. Passeava pela casa como de costume, mas, como bem se poderia esperar, fugia, tomado de extremo terror, à minha aproximação. Restava-me ainda o bastante de meu antigo coração para que, a princípio, sofresse com aquela evidente aversão por parte de um animal que, antes, me amara tanto. Mas esse sentimento logo se transformou em irritação. E, então, menos terríveis que grotesco. Talvez, mais tarde, haja alguma inteligência que reduza o meu fantasma a algo comum — uma inteligência mais serena, mais lógica e muito menos excitável do que, a minha, que perceba, nas circunstâncias a que me refiro com terror, nada mais do que uma sucessão comum de causas e efeitos muito naturais. Desde a infância, tornaram-se patentes a docilidade e o sentido humano de meu caráter. A ternura de meu coração era tão evidente, que me tomava alvo dos gracejos de meus companheiros. Gostava, especialmente, de animais, e meus pais me permitiam possuir grande variedade deles. Passava com eles quase todo o meu tempo, e jamais me sentia tão feliz como quando lhes dava de comer ou os acariciava.


Com os anos, aumentou esta peculiaridade de meu caráter e, quando me tomei adulto, fiz dela uma das minhas principais fontes de prazer. Aos que já sentiram afeto por um cão fiel e sagaz, não preciso dar-me ao trabalho de explicar a natureza ou a intensidade da satisfação que se pode ter com isso. Há algo, no amor desinteressado, e capaz de sacrifícios, de um animal, que toca diretamente o coração daqueles que tiveram ocasiões freqüentes de comprovar a amizade mesquinha e a frágil fidelidade de um simples homem. Casei cedo, e tive a sorte de encontrar em minha mulher disposição semelhante à minha. Notando o meu amor pelos animais domésticos, não perdia a oportunidade de arranjar as espécies mais agradáveis de bichos. Tínhamos pássaros, peixes dourados, um cão, coelhos, um macaquinho e um gato. Este último era um animal extraordinariamente grande e belo, todo negro e de espantosa sagacidade. Ao referir-se à sua inteligência, minha mulher, que, no íntimo de seu coração, era um tanto supersticiosa, fazia freqüentes alusões à antiga crença popular de que todos os gatos pretos são feiticeiras disfarçadas. Não que ela se referisse seriamente a isso: menciono o fato apenas porque aconteceu lembrar-me disso neste momento. Pluto — assim se chamava o gato — era o meu preferido, com o qual eu mais me distraía. Só eu o alimentava, e ele me seguia sempre pela casa. Tinha dificuldade, mesmo, em impedir que me acompanhasse pela rua. Nossa amizade durou, desse modo, vários anos, durante os quais não só o meu caráter como o meu temperamento — enrubesço ao confessá-lo — sofreram, devido ao demônio da intemperança, uma modificação radical para pior. Tomava-me, dia a dia, mais taciturno, mais irritadiço, mais indiferente aos sentimentos dos outros. Sofria ao empregar linguagem desabrida ao dirigir-me à minha mulher. No fim, cheguei mesmo a tratá-la com violência. Meus animais, certamente, sentiam a mudança operada em meu caráter. Não apenas não lhes dava atenção alguma, como, ainda, os maltratava. Quanto a Pluto, porém, ainda despertava em mim consideração suficiente que me impedia de maltratá-lo, ao passo que não sentia escrúpulo algum em maltratar os coelhos, o macaco e mesmo o cão, quando, por acaso ou afeto, cruzavam em meu caminho. Meu mal, porém, ia tomando conta de mim — que outro mal pode se comparar ao álcool? — e, no fim, até Pluto, que começava agora a envelhecer e, por conseguinte, se tomara um tanto rabugento, até mesmo Pluto começou a sentir os efeitos de meu mau humor. Certa noite, ao voltar a casa, muito embriagado, de uma de minhas andanças pela cidade, tive a impressão de que o gato evitava a minha presença. Apanhei-o, e ele, assustado ante a minha violência, me feriu a mão, levemente, com os dentes. Uma fúria demoníaca apoderou-se, instantaneamente, de mim. Já não sabia mais o que estava fazendo. Dir-se-ia que, súbito, minha alma abandonara o corpo, e uma perversidade mais do que diabólica, causada pela genebra, fez vibrar todas as fibras de meu ser.Tirei do bolso um canivete, abri-o, agarrei o pobre animal pela garganta e, friamente, arranquei de sua órbita um dos olhos! Enrubesço, estremeço, abraso-me de vergonha, ao referir-me, aqui, a essa abominável atrocidade. Quando, com a chegada da manhã, voltei à razão — dissipados já os vapores de minha orgia noturna — , experimentei, pelo crime que praticara, um sentimento que era um misto de horror e remorso; mas não passou de um sentimento superficial e equívoco, pois minha alma permaneceu impassível. Mergulhei novamente em excessos, afogando logo no vinho a lembrança do que acontecera. Entrementes, o gato se restabeleceu, lentamente. A órbita do olho perdido apresentava, é certo, um aspecto horrendo, mas não parecia mais sofrer qualquer dor. Passeava pela casa como de costume, mas, como bem se poderia esperar, fugia, tomado de extremo terror, à minha aproximação. Restava-me ainda o bastante de meu antigo coração para que, a princípio, sofresse com aquela evidente aversão por parte de um animal que, antes, me amara tanto. Mas esse sentimento logo se transformou em irritação. E, então,


caminho. Meu mal, porém, ia tomando conta de mim — que outro mal pode se comparar ao álcool? — e, no fim, até Pluto, que começava agora a envelhecer e, por conseguinte, se tomara um tanto rabugento, até mesmo Pluto começou a sentir os efeitos de meu mau humor. Certa noite, ao voltar a casa, muito embriagado, de uma de minhas andanças pela cidade, tive a impressão de que o gato evitava a minha presença. Apanhei-o, e ele, assustado ante a minha violência, me feriu a mão, levemente, com os dentes. Uma fúria demoníaca apoderou-se, instantaneamente, de mim. Já não sabia mais o que estava fazendo. Dir-seia que, súbito, minha alma abandonara o corpo, e uma perversidade mais do que diabólica, causada pela genebra, fez vibrar todas as fibras de meu ser.Tirei do bolso um canivete, abri-o, agarrei o pobre animal pela garganta e, friamente, arranquei de sua órbita um dos olhos! Enrubesço, estremeço, abraso-me de vergonha, ao referir-me, aqui, a essa abominável atrocidade. Quando, com a chegada da manhã, voltei à razão — dissipados já os vapores de minha orgia noturna — , experimentei, pelo crime que praticara, um sentimento que era um misto de horror e remorso; mas não passou de um sentimento superficial e equívoco, pois minha alma permaneceu impassível. Mergulhei novamente em excessos, afogando logo no vinho a lembrança do que acontecera. Entrementes, o gato se restabeleceu, lentamente. A órbita do olho perdido apresentava, é certo, um aspecto horrendo, mas não parecia mais sofrer qualquer dor. Passeava pela casa como de costume, mas, como bem se poderia esperar, fugia, tomado de extremo terror, à minha aproximação. Restava-me ainda o bastante de meu antigo coração para que, a princípio, sofresse com aquela evidente aversão por parte de um animal que, antes, me amara tanto. Mas esse sentimento logo se transformou em irritação. E, então, como para perder-me final e irremissivelmente, surgiu o


espírito da perversidade. Desse espírito, a filosofia não toma conhecimento. Não obstante, tão certo como existe minha alma, creio que a perversidade é um dos impulsos primitivos do coração humano - uma das faculdades, ou sentimentos primários, que dirigem o caráter do homem. Quem não se viu, centenas de vezes, a cometer ações vis ou estúpidas, pela única razão de que sabia que não devia cometê-las? Acaso não sentimos uma inclinação constante mesmo quando estamos no melhor do nosso juízo, para violar aquilo que é lei, simplesmente porque a compreendemos como tal? Esse espírito de perversidade, digo eu, foi a causa de minha queda final. O vivo e insondável desejo da alma de atormentar-se a si mesma, de violentar sua própria natureza, de fazer o mal pelo próprio mal, foi o que me levou a continuar e, afinal, a levar a cabo o suplício que infligira ao inofensivo animal. Uma manhã, a sangue frio, meti-lhe um nó corredio em torno do pescoço e enforquei-o no galho de uma árvore. Fi-lo com os olhos cheios de lágrimas, com o coração transbordante do mais amargo remorso. Enforqueio porque sabia que ele me amara, e porque reconhecia que não me dera motivo algum para que me voltasse contra ele. Enforquei-o porque sabia que estava cometendo um pecado — um pecado mortal que comprometia a minha alma imortal, afastando-a, se é que isso era possível, da misericórdia infinita de um Deus infinitamente misericordioso e infinitamente terrível. Na noite do dia em que foi cometida essa ação tão cruel, fui despertado pelo grito de "fogo!". As cortinas de minha cama estavam em chamas. Toda a casa ardia. Foi com grande dificuldade que minha mulher, uma criada e eu conseguimos escapar do incêndio. A destruição foi completa. Todos os meus bens terrenos foram tragados pelo fogo, e, desde então, me entreguei ao desespero. Não pretendo estabelecer relação alguma entre causa e efeito - entre o desastre e a atrocidade por mim cometida. Mas estou descrevendo uma seqüência de fatos, e não desejo omitir nenhum dos elos dessa cadeia de


acontecimentos. No dia seguinte ao do incêndio, visitei as ruínas. As paredes, com exceção de uma apenas, tinham desmoronado. Essa única exceção era constituída por um fino tabique interior, situado no meio da casa, junto ao qual se achava a cabeceira de minha cama. O reboco havia, aí, em grande parte, resistido à ação do fogo — coisa que atribuí ao fato de ter sido ele construído recentemente. Densa multidão se reunira em torno dessa parede, e muitas pessoas examinavam, com particular atenção e minuciosidade, uma parte dela, As palavras "estranho!", "singular!", bem como outras expressões semelhantes, despertaram-me a curiosidade. Aproximei-me e vi, como se gravada em baixo-relevo sobre a superfície branca, a figura de um gato gigantesco. A imagem era de uma exatidão verdadeiramente maravilhosa. Havia uma corda em tomo do pescoço do animal. Logo que vi tal aparição — pois não poderia considerar aquilo como sendo outra coisa — , o assombro e terror que se me apoderaram foram extremos. Mas, finalmente, a reflexão veio em meu auxílio. O gato, lembrei-me, fora enforcado num jardim existente junto à casa. Aos gritos de alarma, o jardim fora imediatamente invadido pela multidão. Alguém deve ter retirado o animal da árvore, lançando-o, através de uma janela aberta, para dentro do meu quarto. Isso foi feito, provavelmente, com a intenção de despertar-me. A queda das outras paredes havia comprimido a vítima de minha crueldade no gesso recentemente colocado sobre a parede que permanecera de pé. A cal do muro, com as chamas e o amoníaco desprendido da carcaça, produzira a imagem tal qual eu agora a via. Embora isso satisfizesse prontamente minha razão, não conseguia fazer o mesmo, de maneira completa, com minha consciência, pois o surpreendente fato que acabo de descrever não deixou de causar-me, apesar de tudo, profunda impressão. Durante meses, não pude livrar-me do fantasma do gato e, nesse espaço de tempo, nasceu em meu espírito uma espécie de sentimento que parecia remorso, embora não o fosse. Cheguei, mesmo, a lamentar a perda do animal e a procurar, nos


sórdidos lugares que então freqüentava, outro bichano da mesma espécie e de aparência semelhante que pudesse substituí-lo. Uma noite, em que me achava sentado, meio aturdido, num antro mais do que infame, tive a atenção despertada, subitamente, por um objeto negro que jazia no alto de um dos enormes barris, de genebra ou rum, que constituíam quase que o único mobiliário do recinto. Fazia já alguns minutos que olhava fixamente o alto do barril, e o que então me surpreendeu foi não ter visto antes o que havia sobre o mesmo. Aproximei-me e toquei-o com a mão. Era um gato preto, enorme — tão grande quanto Pluto — e que, sob todos os aspectos, salvo um, se assemelhava a ele. Pluto não tinha um único pêlo branco em todo o corpo — e o bichano que ali estava possuía uma mancha larga e branca, embora de forma indefinida, a cobrir-lhe quase toda a região do peito.Ao acariciar-lhe o dorso, ergueu-se imediatamente, ronronando com força e esfregando-se em minha mão, como se a minha atenção lhe causasse prazer. Era, pois, o animal que eu procurava. Apressei-me em propor ao dono a sua aquisição, mas este não manifestou interesse algum pelo felino. Não o conhecia; jamais o vira antes.Continuei a acariciá-lo e, quando me dispunha a voltar para casa, o animal demonstrou disposição de acompanhar-me. Permiti que o fizesse — detendome, de vez em quando, no caminho, para acariciá-lo. Ao chegar, sentiu-se imediatamente à vontade, como se pertencesse a casa, tomando-se, logo, um dos bichanos preferidos de minha mulher.De minha parte, passei a sentir logo aversão por ele. Acontecia, pois, justamente o contrário do que eu esperava. Mas a verdade é que não sei como nem por quê — seu evidente amor por mim me desgostava e aborrecia. Lentamente, tais sentimentos de desgosto e fastio se converteram no mais


amargo ódio. Evitava o animal. Uma sensação de vergonha, bem como a lembrança da crueldade que praticara, impediam-me de maltratá-lo fisicamente. Durante algumas semanas, não lhe bati nem pratiquei contra ele qualquer violência; mas, aos poucos - muito gradativamente — , passei a sentir por ele inenarrável horror, fugindo, em silêncio, de sua odiosa presença, como se fugisse de uma peste. Sem dúvida, o que aumentou o meu horror pelo animal foi a descoberta, na manhã do dia seguinte ao que o levei para casa, que, como Pluto, também havia sido privado de um dos olhos. Tal circunstância, porém, apenas contribuiu para que minha mulher sentisse por ele maior carinho, pois, como já disse, era dotada, em alto grau, dessa ternura de sentimentos que constituíra, em outros tempos, um de meus traços principais, bem como fonte de muitos de meus prazeres mais simples e puros. No entanto, a preferência que o animal demonstrava pela minha pessoa parecia aumentar em razão direta da aversão que sentia por ele. Seguia-me os passos com uma pertinácia que dificilmente poderia fazer com que o leitor compreendesse. Sempre que me sentava, enrodilhava-se embaixo de minha cadeira, ou me saltava ao colo, cobrindo-me com suas odiosas carícias. Se me levantava para andar, metia-se-me entre as pemas e quase me derrubava, ou então, cravando suas longas e afiadas garras em minha roupa, subia por ela até o meu peito. Nessas ocasiões, embora tivesse ímpetos de matá-lo de um golpe, abstinha-me de fazê-lo devido, em parte, à lembrança de meu crime anterior, mas, sobretudo — apresso-me a confessá-lo — , pelo pavor extremo que o animal me despertava. Esse pavor não era exatamente um pavor de mal físico e, contudo, não saberia defini-lo de outra maneira. Quase me envergonha confessar — sim, mesmo nesta cela de criminoso — , quase me


• envergonha confessar que o terror e o pânico que o animal me inspirava eram aumentados por uma das mais puras fantasias que se possa imaginar. Minha mulher, mais de uma vez, me chamara a atenção para o aspecto da mancha branca a que já me referi, e que constituía a única diferença visível entre aquele estranho animal e o outro, que eu enforcara. O leitor, decerto, se lembrará de que aquele sinal, embora grande, tinha, a princípio, uma forma bastante indefinida. Mas, lentamente, de maneira quase imperceptível — que a minha imaginação, durante muito tempo, lutou por rejeitar como fantasiosa —, adquirira, por fim, uma nitidez rigorosa de contornos. Era, agora, a imagem de um objeto cuja menção me faz tremer... E, sobretudo por isso, eu o encarava como a um monstro de horror e repugnância, do qual eu, se tivesse coragem, me teria livrado. Era agora, confesso, a imagem de uma coisa odiosa, abominável: a imagem da forca! Oh, lúgubre e terrível máquina • de horror e de crime, de agonia e de morte! • Na verdade, naquele momento eu era um miserável — um ser que ia além da própria miséria da humanidade. Era uma besta-fera, cujo irmão fora por mim desdenhosamente destruído... uma besta-fera que se engendrara em mim, homem feito à imagem do Deus Altíssimo. Oh, grande e insuportável infortúnio! Ai de mim! Nem de dia, nem de noite, conheceria jamais a bênção do descanso! Durante o dia, o animal não me deixava a sós um único momento; e, à noite, despertava de hora em hora, tomado do indescritível terror de sentir o hálito quente da coisa sobre o meu rosto, e o seu enorme peso — encarnação de um pesadelo que não podia afastar de mim — pousado eternamente sobre o meu coração! • Sob a pressão de tais tormentos, sucumbiu o pouco que restava em mim de bom. Pensamentos maus converteram-se em meus únicos companheiros — os mais sombrios e os mais perversos


dos pensamentos. Minha rabugice habitual se transformou em ódio por todas as coisas e por toda a humanidade — e enquanto eu, agora, me entregava cegamente a súbitos, freqüentes e irreprimíveis acessos de cólera, minha mulher - pobre dela! - não se queixava nunca convertendo-se na mais paciente e sofredora das vítimas. Um dia, acompanhou-me, para ajudar-me numa das tarefas domésticas, até o porão do velho edifício em que nossa pobreza nos obrigava a morar, O gato seguiu-nos e, quase fazendome rolar escada abaixo, me exasperou a ponto de perder o juízo. Apanhando uma machadinha e esquecendo o terror pueril que até então contivera minha mão, dirigi ao animal um golpe que teria sido mortal, se atingisse o alvo. Mas minha mulher segurou-me o braço, detendo o golpe. Tomado, então, de fúria demoníaca, livrei o braço do obstáculo que o detinha e cravei-lhe a machadinha no cérebro. Minha mulher caiu morta instantaneamente, sem lançar um gemido. Realizado o terrível assassínio, procurei, movido por súbita resolução, esconder o corpo. Sabia que não poderia retirá-lo da casa, nem de dia nem de noite, sem correr o risco de ser visto pelos vizinhos. Ocorreram-me vários planos. Pensei, por um instante, em cortar o corpo em pequenos pedaços e destruí-los por meio do fogo. Resolvi, depois, cavar uma fossa no chão da adega. Em seguida, pensei em atirá-lo ao poço do quintal. Mudei de idéia e decidi metê-lo num caixote, como se fosse uma mercadoria, na forma habitual, fazendo com que um carregador o retirasse da casa. Finalmente, tive uma idéia que me pareceu muito mais prática: resolvi emparedá-lo na adega, como faziam os monges da Idade Média com as suas vítimas. Aquela adega se prestava muito bem para tal propósito. As paredes não haviam sido construídas com muito cuidado e, pouco antes, haviam sido cobertas, em toda a sua extensão, com um reboco que a umidade impedira de endurecer. Ademais, havia uma saliência numa das paredes, produzida por alguma chaminé ou lareira, que fora tapada para que se assemelhasse ao resto da adega. Não duvidei de que poderia facilmente retirar os tijolos naquele lugar, introduzir o corpo e recolocá-los do mesmo modo, sem que nenhum olhar pudesse descobrir nada que despertasse suspeita. E não me enganei em meus cálculos. Por meio de uma alavanca, desloquei facilmente os tijolos e tendo depositado o corpo, com cuidado, de encontro à parede interior. Segurei-o nessa posição, até poder recolocar, sem grande esforço, os tijolos em seu lugar, tal como estavam anteriormente. Arranjei cimento, cal e areia e, com toda a precaução possível, preparei uma argamassa que não se podia distinguir da anterior, cobrindo com ela, escrupulosamente, a nova parede. Ao terminar, senti-me satisfeito, pois tudo correra bem. A parede não apresentava o menor sinal de ter sido rebocada. Limpei o chão com o maior cuidado e, lançando o olhar em tomo, disse, de mim para comigo: "Pelo menos aqui, o meu trabalho não foi em vão". O passo seguinte foi procurar o animal que havia sido a causa de tão grande desgraça, pois resolvera, finalmente, matá-lo. Se, naquele momento, tivesse podido encontrá-lo, não haveria dúvida quanto à sua sorte: mas parece que o esperto animal se alarmara ante a violência de minha cólera, e procurava não aparecer diante de mim enquanto me encontrasse naquele estado de espírito. Impossível descrever ou imaginar o profundo e abençoado alívio que me causava a ausência de


tão detestável felino. Não apareceu também durante a noite — e, assim, pela primeira vez, desde sua entrada em casa, consegui dormir tranqüila e profundamente. Sim, dormi mesmo com o peso daquele assassínio sobre a minha alma. Transcorreram o segundo e o terceiro dia — e o meu algoz não apareceu. Pude respirar, novamente, como homem livre. O monstro, aterrorizado fugira para sempre de casa. Não tomaria a vê-lo! Minha felicidade era infinita! A culpa de minha tenebrosa ação pouco me inquietava. Foram feitas algumas investigações, mas respondi prontamente a todas as perguntas. Procedeu-se, também, a uma vistoria em minha casa, mas, naturalmente, nada podia ser descoberto. Eu considerava já como coisa certa a minha felicidade futura. No quarto dia após o assassinato, uma caravana policial chegou, inesperadamente, a casa, e realizou, de novo, rigorosa investigação. Seguro, no entanto, de que ninguém descobriria jamais o lugar em que eu ocultara o cadáver, não experimentei a menor perturbação. Os policiais pediram-me que os acompanhasse em sua busca. Não deixaram de esquadrinhar um canto sequer da casa. Por fim, pela terceira ou quarta vez, desceram novamente ao porão. Não me alterei o mínimo que fosse. Meu coração batia calmamente, como o de um inocente. Andei por todo o porão, de ponta a ponta. Com os braços cruzados sobre o peito, caminhava, calmamente, de um lado para outro. A polícia estava inteiramente satisfeita e preparava-se para sair. O júbilo que me inundava o coração era forte demais para que pudesse contê-lo. Ardia de desejo de dizer uma palavra, uma única palavra, à guisa de triunfo, e também para tomar duplamente evidente a minha inocência.


Senhores — disse, por fim, quando os policiais já subiam a escada — , é para mim motivo de grande satisfação haver desfeito qualquer suspeita. Desejo a todos os senhores ótima saúde e um pouco mais de cortesia. Diga-se de passagem, senhores, que esta é uma casa muito bem construída... (Quase não sabia o que dizia, em meu insopitável desejo de falar com naturalidade.) Poderia, mesmo, dizer que é uma casa excelentemente construída. Estas paredes — os senhores já se vão? — , estas paredes são de grande solidez. Nessa altura, movido por pura e frenética fanfarronada, bati com força, com a bengala que tinha na mão, justamente na parte da parede atrás da qual se achava o corpo da esposa de meu coração. Que Deus me guarde e livre das garras de Satanás! Mal o eco das batidas mergulhou no silêncio, uma voz me respondeu do fundo da tumba, primeiro com um choro entrecortado e abafado, como os soluços de uma criança; depois, de repente, com um grito prolongado, estridente, contínuo, completamente anormal e inumano. Um uivo, um grito agudo, metade de horror, metade de triunfo, como somente poderia ter surgido do inferno, da garganta dos condenados, em sua agonia, e dos demônios exultantes com a sua condenação. Quanto aos meus pensamentos, é loucura falar. Sentindo-me desfalecer, cambaleei até à parede oposta. Durante um instante, o grupo de policiais deteve-se na escada, imobilizado pelo terror. Decorrido um momento, doze braços vigorosos atacaram a parede, que caiu por terra. O cadáver, já em adiantado estado de decomposição, e coberto de sangue coagulado, apareceu, ereto, aos olhos dos presentes. Sobre sua cabeça, com a boca vermelha dilatada e o único olho chamejante, achava-se pousado o animal odioso, cuja astúcia me levou ao assassínio e cuja voz reveladora me entregava ao carrasco. Eu havia emparedado o monstro dentro da tumba!


Cenas O Corvo





The Black Cat


• One night, returning home, much intoxicated, from one of my haunts about town, I fancied that the cat avoided my presence. I seized him; when, in his fright at my violence, he inflicted a slight wound upon my hand with his teeth. The fury of a demon instantly possessed me. I knew myself no longer. My original soul seemed, at once, to take its flight from my body; and a more than fiendish malevolence, ginnurtured, thrilled every fibre of my frame. I took from my waistcoatpocket a pen-knife, opened it, grasped the poor beast by the throat, and deliberately cut one of its eyes from the socket ! I blush, I burn, I shudder, while I pen the damnable atrocity. When reason returned with the morning -- when I had slept off the fumes of the night's debauch -- I experienced a sentiment half of horror, half of remorse, for the crime of which I had been guilty; but it was, at best, a feeble and equivocal feeling, and the soul remained untouched. I again plunged into excess, and soon drowned in wine all memory of the deed. In the meantime the cat slowly recovered. The socket of the lost eye presented, it is true, a frightful appearance, but he no longer appeared to suffer any pain. He went about the house as usual, but, as might be expected, fled in extreme terror at my approach. I had so much of my old heart left, as to be at first grieved by this evident dislike on the part of a creature which had once so loved me. But this feeling soon gave place to irritation. And then came, as if to my final and irrevocable overthrow, the spirit of PERVERSENESS. Of this spirit philosophy takes no account. Yet I am not more sure that my soul lives, than I am that perverseness is one of the primitive impulses of the human heart -- one of the indivisible primary faculties, or sentiments, which give direction to the character of Man. Who has not, a hundred times, found himself committing a vile or a silly action, for no other reason than


• because he knows he should not? Have we not a perpetual inclination, in the teeth of our best judgment, to violate that which is Law, merely because we understand it to be such? This spirit of perverseness, I say, came to my final overthrow. It was this unfathomable longing of the soul to vex itself -- to offer violence to its own nature -- to do wrong for the wrong's sake only -- that urged me to continue and finally to consummate the injury I had inflicted upon the unoffending brute. One morning, in cool blood, I slipped a noose about its neck and hung it to the limb of a tree; -- hung it with the tears streaming from my eyes, and with the bitterest remorse at my heart; -- hung it because I knew that it had loved me, and because I felt it had given me no reason of offence; -- hung itbecause I knew that in so doing I was committing a sin -- a deadly sin that would so jeopardize my immortal soul as to place it -- if such a thing were possible -- even beyond the reach of the infinite mercy of the Most Merciful and Most Terrible God. On the night of the day on which this cruel deed was done, I was aroused from sleep by the cry of fire. The curtains of my bed were in flames. The whole house was blazing. It was with great difficulty that my wife, a servant, and myself, made our escape from the conflagration. The destruction was complete. My entire worldly wealth was swallowed up, and I resigned myself thenceforward to despair. I am above the weakness of seeking to establish a sequence of cause and effect, between the disaster and the atrocity


• . But I am detailing a chain of facts -- and wish not to leave even a possible link imperfect. On the day succeeding the fire, I visited the ruins. The walls, with one exception, had fallen in. This exception was found in a compartment wall, not very thick, which stood about the middle of the house, and against which had rested the head of my bed. The plastering had here, in great measure, resisted the action of the fire -- a fact which I attributed to its having been recently spread. About this wall a dense crowd were collected, and many persons seemed to be examining a particular portion of it with very minute and eager attention. The words "strange!" "singular!" and other similar expressions, excited my curiosity. I approached and saw, as if graven in bas relief upon the white surface, the figure of a gigantic cat. The impression was given with an accuracy truly marvellous. There was a rope about the animal's neck. FOR the most wild, yet most homely narrative which I am about to pen, I neither expect nor solicit belief. Mad indeed would I be to expect it, in a case where my very senses reject their own evidence. Yet, mad am I not -- and very surely do I not dream. But to-morrow I die, and to-day I would unburthen my soul. My immediate purpose is to place before the world, plainly, succinctly, and without comment, a series of mere household events. In their consequences, these events have terrified -- have tortured -- have destroyed me. Yet I will not attempt to expound them. To me, they have presented little but Horror -- to many they will seem less terrible than barroques.


• Hereafter, perhaps, some intellect may be found which will reduce my phantasm to the common-place -- some intellect more calm, more logical, and far less excitable than my own, which will perceive, in the circumstances I detail with awe, nothing more than an ordinary succession of very natural causes and effects. From my infancy I was noted for the docility and humanity of my disposition. My tenderness of heart was even so conspicuous as to make me the jest of my companions. I was especially fond of animals, and was indulged by my parents with a great variety of pets. With these I spent most of my time, and never was so happy as when feeding and caressing them. This peculiarity of character grew with my growth, and, in my manhood, I derived from it one of my principal sources of pleasure. To those who have cherished an affection for a faithful and sagacious dog, I need hardly be at the trouble of explaining the nature or the intensity of the gratification thus derivable. There is something in the unselfish and self-sacrificing love of a brute, which goes directly to the heart of him who has had frequent occasion to test the paltry friendship and gossamer fidelity of mere Man. I married early, and was happy to find in my wife a disposition not uncongenial with my own. Observing my partiality for domestic pets, she lost no opportunity of procuring those of the most agreeable kind. We had birds, gold-fish, a fine dog, rabbits, a small monkey, and a cat. This latter was a remarkably large and beautiful animal, entirely black, and sagaciousto an astonishing degree. In speaking of his intelligence, my wife, who at heart was not a little tinctured with superstition, made frequent allusion to the ancient popular notion, which regarded all black cats as witches in disguise. Not that she was ever serious upon this point -- and I mention the matter at all for no better reason than that it happens, just now, to be remembered.


• Pluto -- this was the cat's name -- was my favorite pet and playmate. I alone fed him, and he attended me wherever I went about the house. It was even with difficulty that I could prevent him from following me through the streets. Our friendship lasted, in this manner, for several years, during which my general temperament and character -- through the instrumentality of the Fiend Intemperance -- had (I blush to confess it) experienced a radical alteration for the worse. I grew, day by day, more moody, more irritable, more regardless of the feelings of others. I suffered myself to use intemperate language to my wife. At length, I even offered her personal violence. My pets, of course, were made to feel the change in my disposition. I not only neglected, but ill-used them. For Pluto, however, I still retained sufficient regard to restrain me from maltreating him, as I made no scruple of maltreating the rabbits, the monkey, or even the dog, when by accident, or through affection, they came in my way. But my disease grew upon me -- for what disease is like Alcohol ! -- and at length evenPluto, who was now becoming old, and consequently somewhat peevish -- even Plutobegan to experience the effects of my ill temper. When I first beheld this apparition -- for I could scarcely regard it as less -- my wonder and my terror were extreme. But at length reflection came to my aid. The cat, I remembered, had been hung in a garden adjacent to the house. Upon the alarm of fire, this garden had been immediately filled by the crowd -- by some one of whom the animal must have been cut from the tree and thrown, through an open window, into my chamber. This had probably been done with the view of arousing me from sleep. The falling of other walls had compressed the victim of my cruelty into the substance of the freshly-spread plaster; the lime of which,


• with the flames, and the ammonia from the carcass, had then accomplished the portraiture as I saw it. Although I thus readily accounted to my reason, if not altogether to my conscience, for the startling fact just detailed, it did not the less fail to make a deep impression upon my fancy. For months I could not rid myself of the phantasm of the cat; and, during this period, there came back into my spirit a half-sentiment that seemed, but was not, remorse. I went so far as to regret the loss of the animal, and to look about me, among the vile haunts which I now habitually frequented, for another pet of the same species, and of somewhat similar appearance, with which to supply its place. One night as I sat, half stupified, in a den of more than infamy, my attention was suddenly drawn to some black object, reposing upon the head of one of the immense hogsheads of Gin, or of Rum, which constituted the chief furniture of the apartment. I had been looking steadily at the top of this hogshead for some minutes, and what now caused me surprise was the fact that I had not sooner perceived the object thereupon. I approached it, and touched it with my hand. It was a black cat -- a very large one -- fully as large as Pluto, and closely resembling him in every respect but one. Pluto had not a white hair upon any portion of his body; but this cat had a large, although indefinite splotch of white, covering nearly the whole region of the breast. Upon my touching him, he immediately arose, purred loudly, rubbed against my hand, and appeared delighted with my notice. This, then, was the very creature of which I was in search. I at once offered to purchase it of the landlord; but this person made no claim to it -- knew nothing of it -- had never seen it before.


• I continued my caresses, and, when I prepared to go home, the animal evinced a disposition to accompany me. I permitted it to do so; occasionally stooping and patting it as I proceeded. When it reached the house it domesticated itself at once, and became immediately a great favorite with my wife. For my own part, I soon found a dislike to it arising within me. This was just the reverse of what I had anticipated; but -- I know not how or why it was -- its evident fondness for myself rather disgusted and annoyed. By slow degrees, these feelings of disgust and annoyance rose into the bitterness of hatred. I avoided the creature; a certain sense of shame, and the remembrance of my former deed of cruelty, preventing me from physically abusing it. I did not, for some weeks, strike, or otherwise violently ill use it; but gradually -- very gradually -- I came to look upon it with unutterable loathing, and to flee silently from its odious presence, as from the breath of a pestilence. • What added, no doubt, to my hatred of the beast, was the discovery, on the morning after I brought it home, that, like Pluto, it also had been deprived of one of its eyes. This circumstance, however, only endeared it to my wife, who, as I have already said, possessed, in a high degree, that humanity of feeling which had once been my distinguishing trait, and the source of many of my simplest and purest pleasures. With my aversion to this cat, however, its partiality for myself seemed to increase. It followed my footsteps with a pertinacity which it would be difficult to make the reader comprehend. Whenever I sat, it would crouch beneath my chair, or spring upon my knees, covering me with its loathsome caresses. If I arose to walk it would get between my feet and thus nearly throw


• me down, or, fastening its long and sharp claws in my dress, clamber, in this manner, to my breast. At such times, although I longed to destroy it with a blow, I was yet withheld from so doing, partly by a memory of my former crime, but chiefly -- let me confess it at once -- by absolute dread of the beast. This dread was not exactly a dread of physical evil -- and yet I should be at a loss how otherwise to define it. I am almost ashamed to own -- yes, even in this felon's cell, I am almost ashamed to own -- that the terror and horror with which the animal inspired me, had been heightened by one of the merest chimÌras it would be possible to conceive. My wife had called my attention, more than once, to the character of the mark of white hair, of which I have spoken, and which constituted the sole visible difference between the strange beast and the one I had destroyed. The reader will remember that this mark, although large, had been originally very indefinite; but, by slow degrees -degrees nearly imperceptible, and which for a long time my Reason struggled to reject as fanciful -- it had, at length, assumed a rigorous distinctness of outline. It was now the representation of an object that I shudder to name -- and for this, above all, I loathed, and dreaded, and would have rid myself of the monster had I dared -- it was now, I say, the image of a hideous -- of a ghastly thing -- of the GALLOWS ! -- oh, mournful and terrible engine of Horror and of Crime -- of Agony and of Death !


• And now was I indeed wretched beyond the wretchedness of mere Humanity. And a brute beast -- whose fellow I had contemptuously destroyed -- a brute beast to work out for me -- for me a man, fashioned in the image of the High God -- so much of insufferable wo! Alas! neither by day nor by night knew I the blessing of Rest any more! During the former the creature left me no moment alone; and, in the latter, I started, hourly, from dreams of unutterable fear, to find the hot breath of the thing upon my face, and its vast weight -- an incarnate Night-Mare that I had no power to shake off -incumbent eternally upon my heart ! Beneath the pressure of torments such as these, the feeble remnant of the good within me succumbed. Evil thoughts became my sole intimates -- the darkest and most evil of thoughts. The moodiness of my usual temper increased to hatred of all things and of all mankind; while, from the sudden, frequent, and ungovernable outbursts of a fury to which I now blindly abandoned myself, my uncomplaining wife, alas! was the most usual and the most patient of sufferers. One day she accompanied me, upon some household errand, into the cellar of the old building which our poverty compelled us to inhabit. The cat followed me down the steep stairs, and, nearly throwing me headlong, exasperated me to madness. Uplifting an axe, and forgetting, in my wrath, the childish dread which had hitherto stayed my hand, I aimed a blow at the animal which, of course, would have proved instantly fatal had it descended as I wished. But this blow was arrested by the hand of my wife. Goaded, by the interference, into a rage more than demoniacal, I withdrew my arm from her grasp and buried the axe in her brain. She fell dead upon the spot, without a groan.


• This hideous murder accomplished, I set myself forthwith, and with entire deliberation, to the task of concealing the body. I knew that I could not remove it from the house, either by day or by night, without the risk of being observed by the neighbors. Many projects entered my mind. At one period I thought of cutting the corpse into minute fragments, and destroying them by fire. At another, I resolved to dig a grave for it in the floor of the cellar. Again, I deliberated about casting it in the well in the yard -- about packing it in a box, as if merchandize, with the usual arrangements, and so getting a porter to take it from the house. Finally I hit upon what I considered a far better expedient than either of these. I determined to wall it up in the cellar -- as the monks of the middle ages are recorded to have walled up their victims. For a purpose such as this the cellar was well adapted. Its walls were loosely constructed, and had lately been plastered throughout with a rough plaster, which the dampness of the atmosphere had prevented from hardening. Moreover, in one of the walls was a projection, caused by a false chimney, or fireplace, that had been filled up, and made to resemble the rest of the cellar. I made no doubt that I could readily displace the bricks at this point, insert the corpse, and wall the whole up as before, so that no eye could detect any thing suspicious. And in this calculation I was not deceived. By means of a crow-bar I easily dislodged the bricks, and, having carefully deposited the body against the inner wall, I propped it in that position, while, with little trouble, I re-laid the whole structure as it originally stood. Having procured mortar, sand, and hair, with every possible precaution, I prepared a plaster which could not be distinguished from the old, and with this I very carefully went over the new brick-work. When I had finished, I felt satisfied that all was right. The wall did not present the slightest appearance of having been disturbed. The rubbish on the floor was picked up with the minutest care. I looked around triumphantly, and said to myself -- "Here at least, then, my labor has not been in vain."


My next step was to look for the beast which had been the cause of so much wretchedness; for I had, at length, firmly resolved to put it to death. Had I been able to meet with it, at the moment, there could have been no doubt of its fate; but it appeared that the crafty animal had been alarmed at the violence of my previous anger, and forebore to present itself in my present mood. It is impossible to describe, or to imagine, the deep, the blissful sense of relief which the absence of the detested creature occasioned in my bosom. It did not make its appearance during the night -- and thus for one night at least, since its introduction into the house, I soundly and tranquilly slept; aye, slept even with the burden of murder upon my soul! The second and the third day passed, and still my tormentor came not. Once again I breathed as a freeman. The monster, in terror, had fled the premises forever! I should behold it no more! My happiness was supreme! The guilt of my dark deed disturbed me but little. Some few inquiries had been made, but these had been readily answered. Even a search had been instituted -- but of course nothing was to be discovered. I looked upon my future felicity as secured. Upon the fourth day of the assassination, a party of the police came, very unexpectedly, into the house, and proceeded again to make rigorous investigation of the premises. Secure, however, in the inscrutability of my place of concealment, I felt no embarrassment whatever. The officers bade me accompany them in their search. They left no nook or corner unexplored. At length, for the third or fourth time, they descended into the cellar. I quivered not in a muscle. My heart beat calmly as that of one who slumbers in innocence. I walked the cellar from end to end. I folded my arms upon my bosom, and roamed easily to and fro. The police were thoroughly satisfied and prepared to depart. The glee at my heart was too strong to be restrained. I burned to say if but one word, by way of triumph, and to render doubly sure their assurance of my guiltlessness.


Edgar Allan Poe 19/1/1809, 7/10/1849, Baltimore, EUA.

Boston,

EUA

Segundo filho de David Poe e Elizabeth Arnold, ambos atores, Edgar Poe ficou órfão ainda criança e foi adotado por um casal rico de Richmond, Virgínia, Jonh Allan e Frances Kelling Allan. Isso lhe permitiu ter uma educação de qualidade, bem como fazer uma longa viagem pela Inglaterra, Escócia e Irlanda com os pais adotivos. Regressou aos Estados Unidos em 1822 e continuou seus estudos sob a orientação dos melhores professores dessa época. Dois anos depois, entrou para a Universidade de Charlotesville, distinguindo-se tanto pela inteligência quanto pelo temperamento inquieto, que o levou a ser expulso da escola. A seguir, verificou-se um período ainda pouco esclarecido na vida de Poe, no qual se registram viagens fora biografia

dos Estados Unidos. Retornou a seu país em 1829 e manifestou desejo de seguir a carreira militar. Foi admitido na célebre Academia de West Point, mas acabou expulso poucos meses depois por indisciplina. Com a morte da mãe adotiva, John Allan voltou a casar-se, com uma mulher muito jovem que lhe deu dois filhos. Isso impediu que Poe se tornasse herdeiro da fortuna paterna e ele se afastou da casa do pai adotivo, deixando Richmond. Após um período de relativa dificuldade, conheceu uma certa prosperidade ao vencer simultaneamente os concursos de conto e poesia promovidos pela revista "Southern Literary Messager


O fundador da publicação, Thomas White, convidou-o a dirigir a revista que rapidamente se impôs ao público. Durante dois anos, Poe esteve a frente do periódico, onde pôde exibir seu talento, que se manifestava num estilo novo, no conto e na poesia, bem como pelos artigos de crítica literária que revelavam seu rigor e sensibilidade estética. Escritor bem-sucedido, Poe casou-se com Virginia Clemm. Entretanto, ao fim de dois anos, White cortou relações com o escritor, que já desenvolvera a doença do alcoolismo. Poe passou a produzir como "free-lancer", em grande quantidade, mas sem ganhar o suficiente para manter uma vida digna e saudável, o que o levou a afundar-se ainda mais na bebida. A morte de sua mulher agravou o problema. O escritor passou a beber cada vez mais e já sofria os primeiros ataques de delirium tremens. Numa viagem a Nova York, para tratar de negócios, parou em Baltimore e hospedou-se numa taberna onde se distraiu durante horas bebendo com amigos. Era a noite de 6 de outubro de 1849. O escritor morreu na madrugada do dia 7, aos 40 anos. Hoje Poe é um escritor estudado e cultuado em todo o Ocidente. Entre suas obras destacam-se: The Raven (O Corvo, poesia, 1845), Annabel Lee (poesia, 1849) e o volume Histórias Extraordinárias (1837), onde aparecem seus contos mais conhecidos, como "A Queda da Casa dos Usher", "O Gato Preto", "O Barril de Amontillado", "Manuscrito encontrado numa Garrafa", entre outros, considerados obras-primas do terror


Todos, mas principalmente os jovens são movidos por desejos, vontades e por coisas que fazem sonhar e dão prazer. Alves (2005) diz que o sonho é um pequeno paraíso que dá ordem à inteligência. E ressalta que “Se o sonho não existe, é inútil dar ordens à inteligência. Ela não obedece” (ALVES, p. 19, 2005). Por conseguinte, fazer com que o jovem tenha contato com uma leitura leve e ágil (outra característica da juventude) é estimulá-lo a sonhar. O sonho que segundo o mesmo autor inicia um processo de estímulo da inteligência. (PEREIRA, 2012)


EXPEDIENTE Presidente: Thalia Gandolfo, Mariana Rudey Diretor Editorial: Thalia Gandolfo, mariana Rudey Superintendentes: Thalia Gandolfo, mariana Rudey Editor-executivo: Thalia Gandolfo, mariana Rudey Conselho Editorial: Thalia Gandolfo, mariana Rudey Diretoria-executiva: Thalia Gandolfo, mariana Rudey Trabalho realizado pelos alunos da EEEFM Heitor Villa-Lobos Professor: Marcos Pereira *Produção sem fins lucrativos *Objetivo: Divulgação de obras e autores de romance policial/ incentivo a leitura.


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