O Preto Velho Canta Seu Enredo - Significância Cultural do GRES Preto Velho

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Significância Cultural do G.R.E.S. Preto Velho





Universidade Federal de Pernambuco Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Significância Cultural do G.R.E.S. Preto Velho

Thiago Pinheiro de Almeida

Recife 2019



Thiago Pinheiro de Almeida

Significância Cultural do G.R.E.S. Preto Velho

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial à obtenção de grau de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Pernambuco.

Recife 2019



Dedicatória

Dedico este trabalho aos meus queridos avós: meu avô materno, Sr. Pinheiro e minha avó paterna, Dona Marliete (in memorian), os quais partiram para um novo plano no decorrer da graduação. Em que ambos foram fundamentais no meu processo evolutivo, pela sabedoria

passada e perpetuada em cada gesto que carrego na minha jornada. Pelo olhar humano ao próximo, pelo legado de contribuir para uma sociedade mais justa e humana. Pela espiritualidade que foi transpassada ao longo da minha infância e adolescência, e que contribuíram veemente para o profissional que me torno ao fim desta etapa conclusiva.



Agradecimentos

Gratidão, primeiramente, a toda espiritualidade que contribuiu de alguma forma, não explicável, para conclusão deste trabalho. Gratidão aos meus pais, Lêda e Sérgio, por todos os ensinamentos ao longo da minha vida. Em especial pelo apoio nesses anos de graduação. Agradeço pelo amor, companheirismo e paciência. Gratidão a todos aqueles que estiveram comigo nessa longa, bela, árdua,

desgastante e apaixonante maratona. Pelas descobertas, pelas trocas de experiências, pelos risos, pelas noites e noites sem dormir, pelo aprendizado compartilhado. Momentos esses que levarei comigo sempre. Em especial a um grupo enorme de pessoas lindas que tive o prazer de compartilhar grandes temporadas. De forma cronológica, menciono esses lindos que fizeram parte desse grande show: Rebeca, Laurinha, Sammires, Marcella, André, Júlia, Lucas, Jéssica Motta, Leila, Andrezza, Juliane, Danielle, Thaís e Ricardo. Gratidão à professora Ana Rita Sá Carneiro, que desde as primeiras aulas, lá no início, já parecia que entendia minha missão. E ao professor Roberto Araújo que abraçou a causa para finalizar esse trabalho. Gratidão pelas maravilhosas pessoas que ‘reencontrei’ em uma das mais incríveis e mágicas experiências de vida que já tive. Que esses amores sejam eternos como nossa Roma que nos uniu: Jéssica Oliveira, Núbia, Bruno, Rainara, Allana,

Roberto, Talys e tantos outros que jamais esquecerei os capítulos vividos.


Gratidão a Nara por todo o aprendizado passado no DPP. Levarei cada ensinamento, à cada persistência de fazer o melhor. Gratidão ímpar a Bel, essa mulher maravilhosa que teve um amor e carinho de mãe nesses dois anos de DPP. Obrigado por tudo! Pela amizade, pelo companheirismo, por todo conhecimento passado, pela confiança no meu trabalho, e principalmente, pela paciência e compaixão. Gratidão a Marina por todo o apoio nessa reta final. Cada palavra dita era mais um gás pra continuar nessa missão. Gratidão aos meus familiares que me transmitem tanto amor e estabilidade emocional. Sem vocês eu não seria metade do que sou. Obrigado pelas tias incríveis que tenho, agradecendo especialmente a tia Lurdes, tia Lúcia e tia Gracinha, pelo amor dado ao longo da minha jornada. Pelas primas maravilhosas que contribuem para minha renovação espiritual, especialmente a Andrea, Annaly e Ana. Gratidão àqueles que, de forma direta ou indiretamente, sempre estiveram presentes e acompanhando meus processos nessa etapa que se conclui: Jamesson, Rodrigo e Fernando. Aos novos amigos da vida que contribuem para me tornar uma pessoa cada vez melhor. Gratidão a Dave pelo companheirismo

fundamental nessa conquista. Gratidão a todos que acreditaram, que acreditam e que estão comigo. Que venha uma nova fase! Amém! Axé! Gratidão, gratidão, gratidão!

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v  v  Zvv ddddd?  d



Ilustração 01 - Que bom que suncê veio! Pode entrar, zifio As portas abertas da Escola de Samba Preto Velho é umas de suas características, chamando aqueles que visitam Olinda, especificamente o Alto da Sé, para adentrar, geralmente curiosos pelo batuque da bateria que ressoa de porta a fora. O linguajar típico de Preto Velhos, “Suncê”, “Zifio”, “fio”, “veio”, para começar essa narrativa no clima desse pai da sabedoria: Preto Velho


 Tdg

Agd jg gd dAddAg


Faixa 01 - Saravá Umbanda - Alegria da Zona Sul - 2019 Compositores: Márcio André, Neyzinho do Cavaco, Lopita 77, Ribeirinho, Elson Ramires, Beto Rocha, Telmo Augusto, Fábio Xavier, China, Girão e Samir Trindade Intérprete: Igor Vianna



Ilustração 02 - Pai Francisco de Aruanda “Adorei as almas!” Figura do Preto Velho presente em quadros nos centros de Umbanda visitados.


"Quando nesta casa entrei, eu louvei Maria Santo nome de Jesus, eu louvei a luz do dia...“ Ainda era pequenino a primeira vez que fui levado à um terreiro de Umbanda pelos meus pais. Eu tinha a alma infinita de pureza, mas, já sabia que muitos não entendiam aquela religião. Não quê, eu criança, soubesse direito sobre tudo que aconteceria, mas, a minha curiosidade sobre o que eu iria encontrar me levou até aquele lugar. Quando adentrei aquele espaço sagrado, o som dos tambores e o cheiro das ervas queimando no pequeno braseiro me chamou atenção. Haviam pessoas de vestes alvas e algumas velas acesas no grande altar iluminado. As palmas ecoavam firme junto ao som de uma pequena sineta que parecia badalar ao longe um chamado. Perto daquele altar havia um senhor e uma senhora sentados, cada um em seu velho toco. Ele - com seu velho chapéu de palha sob a cabeça - tinha o corpo curvado sustentado por uma bengala de madeira e um cachimbo que soltava uma branca fumaça. Ela - com um lenço branco que cobria os cabelos -tomava um bocado de café servido em uma cuia.

"A fumaça do cachimbo, defumou congá E o rosário de Maria, clareou congá! Ô clareou! Ô clareou! Clareou, seu congá, clareou!“ Com a fala meio embolada, diferente de qualquer pessoa que lá estava, aquele senhor me chamou: - "Se achega, meu "fio"! "Nego véio" tem história "pá" "contá". É o que "suncê" veio buscar, né?". [...]


Trecho da sinopse do GRES Alegria da Zona Sul, “Saravá,Umbanda!”, para o carnaval de 2019


Quando falamos em Preto Velho, nos referimos a uma linhagem vibracional de

Prefácio

espíritos que possuem uma mesma missão. Tais entidades são cultuadas nas giras de Umbanda, sendo também presentes em centros de outras linhas espirituais. Na Umbanda, prestam auxílio religioso e espiritual aqueles que procuram a paz e a serenidade tanto para si, quantos para seu lar e entes queridos.

Essa linhagem espiritual é composta de espíritos de negros que foram escravizados, assim como de negros africanos que não chegaram a ser escravos. Consta também, dessa linha de espíritos, que alguns não possuem nenhuma relação com negros e com período escravocrata, mas que devido às afinidades vibracionais escolhem a Umbanda para seguirem sua missão espiritual. Em plano terreno, devido sua idade avançada, eram entidades que possuíam o poder de viver longamente graças a sua sabedoria, e que apesar da vida rude no cativeiro, demonstraram fé para suportar as adversidades que a vida coloca. São espíritos guias associados à experiência, refletem em nomes como: velho,

veio, vovô ou vovó, sinalizando, assim, sua sabedoria de vida, subentendendo que tal entidade tenha vivido por um período de tempo na vida terrena e que ao longo dela, o mesmo adquiriu saberes e, consequentemente, mais experiências e coisas para contar, e repassar para gerações mais novas.

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Principalmente, repassam conselhos que prezam a paciência, a compreensão, e que seus filhos tenham menos ansiedade para a vida. As marcas dessa linha são: a tolerância, a simplicidade e a caridade. As indumentárias que compõem tais entidades são carregadas de elementos simplórios, que não necessitam de muitos artifícios para trabalhar, diferentes de outras entidades que possuem indumentárias rebuscadas e trabalhadas aos detalhes. As vestimentas são compostas, geralmente, de roupas brancas, guias, colares, lenços, bengalas, toalhas e, às vezes, dependendo da linhagem do Preto Velho e do local onde se pratica o ritual, o uso fumo de rolo, cachimbo, cigarro de palha e o uso de velas brancas. Usam também copo com líquido, que pode ser água ou ainda vinho branco licoroso, e o cafezinho, que está sempre presente e associado ao período de escravidão nas lavouras de café. Tal simplicidade reflete até na forma de incorporação, sem grandes danças, apenas com movimentos leves, geralmente sentados ou parados com pés fixados

no chão. Devido à vibração, inicia com um peso nas costas que gera uma inclinação de tronco para frente. Já sobre locomoção diante da gira, acontece apenas quando incorporam para saudar entidades chefes e em seguida sentam e praticam sua caridade Há rituais que, para entrar no campo vibracional da linha dos Pretos Velhos, faz-se o uso de ervas, que canalizam a vibração por meio de banhos e defumação.

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Os atendimentos prezam pela simplicidade, como parte da sua essência, refletindo até em seu linguajar, e são bastantes objetivos em suas palavras. Para início do ritual, para que haja a facilitação por parte do médium o qual irá incorporar a entidade, se faz necessário, por meio de uma pessoa responsável de puxar os cantos, chamados geralmente de pontos, juntamente com toques

de atabaques, instrumento de percussão utilizado para inicio de toques em rituais de Umbanda. Após a incorporação há-se o ritual de iniciação e em seguida as entidades se acomodam em lugares pré-determinados, geralmente banquinhos os quais sentam e iniciam-se as consultas. Conectados, em alguns casos, à linha vibracional de Omolu, o Orixá da cura, costumam em seus rituais fumar cachimbo e baforar seus consulentes, acreditando que tal rito é um processo de limpeza e harmonização das vibrações. Utilizam, também, de ramos de arruda, rezas com uso de terços e borrifadas de água fluidificada. Os pontos cantados servem para saudar a presença das entidades, firmar sua força durante os trabalhos espirituais e envolver a todos presentes, mas principalmente aos médiuns de incorporação, como uma harmonia a ajudá-los a se concentrarem para que esta ocorra. Na Umbanda, os Preto Velhos são homenageados no dia 13 de maio, data a

O café, como visto, é uma das bebidas que fazem relação com a entidade dos Preto Velhos. Ao longo da elaboração do trabalho, após a pintura do Preto Velho (Ilustração 02) era colocado uma xícara de café ao lado do quadro como uma forma de conexão com a simbologia forte. Alguns dos desenhos executados foram pintados com o próprio café, juntamente à aquarela para conseguir um aspecto de papel envelhecido ou de madeira.

qual, foi assinada a Lei Áurea, a abolição do período escravocrata brasileiro.

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Ad 28


Apresentação Introdução Metodologia Objetivos

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Sumário

37 41 45

Patrimônio Cultural Brasileiro História, Identidade e Memória Significância Cultural 72

53 66

1.0 – Patrimônio Cultural Imaterial – “Na alma das coisas acreditei” 86 1.1- Instrumentos e métodos de Salvaguarda aplicados pelo IPHAN 90 1.2- Planos de Salvaguarda de bens imateriais 96 1.3- Educação Patrimonial 100 2.0 – Objeto Empírico: Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho – “Preto Véio me contou, Preto Véio me contou!” 107 2.1- O lugar – Sítio Histórico de Olinda 135 2.2- O arruado - Entorno Imediato 151 2.3- O lote – O bem construído 161 2.4- O samba – Das congêneres à Olinda 168 2.5- Levantamento histórico do Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho 175 3.0 – Identificação de atributos e significados - “É verde e rosa a cor da sua bandeira!” 197 3.1- Identificação dos atributos – Listagem dos Atributos 203 3.2- Lista de atributos sugeridos para validação com atores sociais 247 Considerações Finais Referências Bibliográficas ANEXO ANEXO ANEXO ANEXO

249 253

A - CD com os Sambas de Enredo B – Registro Documental - Diário de Pernambuco C – Registro Documental – Noticiários em meio virtual D – Letras dos sambas de enredo do GRES Preto Velho


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Evv v Rd d CgdvB v vvdd  gdd  v Ev




Faixa 02 - História de um Preto Velho - Estação Primeira de Mangueira - 1964 Compositores: Hélio Turco, Pelado e Comprido Intérprete: José Bispo Clementino dos Santos (Jamelão)

https://www.youtube.com/watch?v=W6WjMCTcKgQ



Ilustração 03 - Retornando a ‘senzala’ para historiar seu passado


Apresentação

“E ra uma vez um Preto Velho...” O Preto Velho é um elemento com bastante significação na natureza da Escola de Samba Preto Velho, a qual é objeto de estudo nesse trabalho. Significado esse refletido desde

o

seu

pavilhão,

com

a

gravura de um Preto Velho bordado às cores verde e rosa da sua bandeira, (Imagem 02) revelando-o como

o

agremiação

símbolo

maior

da

carnavalesca

da

Imagem 02 – Pavilhão da Escola de Samba Preto Velho. Fonte: Blogpost da Agremiação

Cidade Alta de Olinda, e, assim, se tornando o fio condutor para narrar a história dessa agremiação. casa As cores do pavilhão foram inspiradas nas cores da bandeira da congênere carioca Estação Primeira de Mangueira. O GRES Preto Velho está localizado na Rua Bispo Coutinho, no Alto da Sé, no

Sítio Histórico de Olinda.

Fundada em 24 de dezembro de 1974. a escola

possui uma grande significância social e carnavalesca para cidade de Olinda.

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Como dito pela Umbanda, os Pretos Velhos são entidades tidas, na sua fase terrena, como contadores de histórias, e nessa sua essência do contar, o próprio Preto Velho toma seu partido, faz de sua entonação mais pura e põemse a cantar a sua própria história de 42 anos no Alto da Sé, no sítio Histórico de Olinda, e na vida de muitos pernambucanos, especialmente os olindenses. Agregado a um conjunto de diversos atributos, os quais fomentaram diversos significados ao longo do tempo, o Preto Velho revelará no decorrer deste trabalho os significados que compõem o seu pavilhão, desde por seus fundadores, passando por aqueles, que ao longo da sua história, somaram e contribuíram para a Significância Cultural desse patrimônio imaterial olindense. O Preto Velho canta o seu enredo através de um gênero musical genuinamente brasileiro, e que fomenta um dos maiores atributos que orbem estudado possui: o samba-enredo. E desta forma, a narrativa se dará de forma fluida, informal e poética, mergulhando nas letras dos diversos sambas de

enredo que cantam a história do Samba do Preto Velho e revelam sua Significância Cultural. Sabendo

que

apresentando

o de

gênero forma

samba-enredo linear,

possui

cronológica

ou

um de

caráter forma

descritivo,

segmentada,

descrevendo dessa forma o enredo com riqueza de detalhes. Usando desse artifício descritivo, utilizo de uma seleção de sambas de enredo para

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para contar a história do GRES Preto Velho. Visto que, tais sambas refletem, em suas letras e melodias, particularidades e atributos que descrevem a escola, revelando assim, sua singularidade histórica, artística e cultural como um bem único que merece os devidos olhares e cuidados, para assim, preservar seus valores, assegurando a sua continuidade, e, consequentemente, protegendo e

garantindo seus atributos às gerações futuras. Este trabalho foi realizado sob a inspiração dos mais puros e singulares exemplares da música popular brasileira, escritos por uma nata de brasileiros que são genuinamente representantes da Música Popular, os quais compuseram belíssimas obras, representando, por meios dos seus sambas de enredo, uma das mais poéticas e espontâneas expressões musicais brasileira. Com suas essências cantadas em magníficos versos musicados, atestando a composição artística dessas obras como voz de um povo, refletindo suas histórias, lutas e verdades, que traz consigo a representatividade das minorias e que dá voz a elas. Sambas esses suficientemente criativos e extremamente sensíveis para enaltecer, comentar ou criticar, quando preciso, os fatos acontecidos no passado ou no presente, e, assim, assegurando a sua existência para as próximas gerações: os registros de muitas histórias, de muitas lutas, e, sobretudo, das bandeiras

desfraldadas da resistência de muitos personagens, fieis aos seus princípios, sendo imortalizados pela sua voz maior: o samba.

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E das poéticas letras desse repertório de sambas cantados em suas rodas de samba, reflete-se em um conjunto pitoresco de ilustrações que emergem na história do Samba do Preto Velho e retrata na fluidez da pintura em aquarela sua verdadeira e estreme essência do samba pernambucano, legitimamente olindense. Enquadrando na história, a história não contada de um sambista que desce as ladeiras de Olinda no período momesco, e afirma que na terra dos

altos coqueiros, a árvore do samba gerou muitos frutos pelas bandas de cá também!

‘d‘

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Edgd Fg d vdg gg   ddd  []


Faixa 03 - Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão? - Paraíso do Tuiuti - 2018 Compositores: Cláudio Russo, Moacyr Luz, Jurandir, Zezé e Aníbal Intérpretes: Nino do Milênio, Celsinho Moddy e Grazi Brasil https://open.spotify.com/track/6ZmHPUuW0FEOXejn9GqhQJ



Ilustração 04 - Preto Velho me contou, onde mora a senhora liberdade não ferro, nem feitor. Ilustração de uma das maiores comissões de frente que já passaram na Marquês de Sapucaí, em particular, a que mais me fez derrabar lágrimas e perceber o quão todos os elementos que fomentavam a apresentação me representavam, sem falar do magnífico samba enredo que encanta a cada verso.


Introdução

“Preto Velho me contou...” Este trabalho de conclusão de curso intitula-se - O Preto Velho Canta Seu

Enredo - Significância Cultural da Escola de Samba Preto Velho - e procura refletir sobre a construção da significância cultural de bens de cunho imaterial artístico cultural, a partir da perspectiva da significância cultural e os valores que os bens desta natureza carregam em seus diversos atributos. A partir disso, revelando e, consequentemente, afirmando a representatividade que o bem possui a um grupo social, a complexidade de sua existência ao longo de sua conformação, e todos os fatores e agentes, que ao longo do tempo, contribuíram para a sua singularidade. Espera-se contribuir para o pensamento critico diante dos bens de cunho imaterial como corpo necessário para contar a história de uma parcela da sociedade civil, e que intervenções no seu corpo material e na sua essência imaterial estejam sob a ótica da conservação da significância

cultural,

para

que

possamos

compreender

e

proteger

adequadamente tais bens. Tendo como objeto de estudo o Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho, localizado no Alto da Sé, no centro Histórico de Olinda, Estado de Pernambuco - Brasil. O estudo apoiou-se em um recorte temporal que vai de 1974, ano de fundação da agremiação, até 2019, e em um recorte espacial que abrange o lote 681, na rua Bispo Coutinho, onde localiza-se a agremiação,

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agremiação e o seu entorno imediato, com atenção paras relações entre o objeto estudado e elementos como a praça da Sé, o casario, os monumentos e as ruas do Sítio Histórico no período momesco. Acrescentando nessa pesquisa, como a história do bem estudado adere à memória afetiva de todos os agentes que compuseram a narrativa da Escola de Samba Preto Velho, e como eles decantaram a trama de sua história em versos e riscaram as ladeiras da Cidade Alta com seu mais genuíno e olindense samba. Um das problemáticas levantadas é sobre como o IPHAN aborda bens de tal natureza, visto que, um dos problemas atuais está na relação conflituosa entre o IPHAN e os dirigentes do GRES Preto Velho. Isso devido à negligência, interpretada pelos especialistas do IPHAN, por parte dos proprietários, que por meio de intervenções na edificação, ameaça integridade do bem, alterando atributos tipológicos e morfológicos que, consequentemente, contribuem para a perda de valores arquitetônicos, paisagísticos e artísticos do conjunto onde

encontra-se o bem, elementos estes que fomentam a justificativa do Sítio Histórico de Olinda como Patrimônio Cultural da Humanidade, pela UNESCO, em 1982. O bem estar localizado no polígono de tombamento, dentro Zona Especial de Proteção Cultural (ZEPC 01), no Setor Cultural do Alto da Sé; Incluso na lista das centenas das agremiações que desfilam no carnaval de Olinda, organizado pela Secretaria de Patrimônio, Ciência , Cultura e Turismo da

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da Prefeitura de Olinda, considerada dentre das mais importantes no Sítio Histórico, tida como símbolo de empoderamento, identidade, resistência social, racial e espacial. Em contrapartida a estas ações, o GRES Preto Velho é objeto de ação judicial, por conta das tais obras irregulares. E teve projeto de reversão de danos e

regularização aprovado pelo IPHAN, sob o acompanhamento da Justiça. Porém nota-se a dificuldade de diálogo entre os agentes responsáveis pela proteção, no caso o IPHAN, e os usuários do bem. Diante disso, este trabalho tem como um dos seus objetivos explanar como o órgão responsável pela sua conservação, o IPHAN, utiliza de seus programas e métodos de conservação e como o mesmo gesticula e documenta os bens de cunho imaterial, de forma que, através de seus planos de conservações, permita a manutenção e preservação destes bens que possuem uma subjetividade complexa. Uma das discursivas deste trabalho é sobre a relação, devido à promoção de intervenções inadequadas de cunho material, entre o IPHAN e o GRES Preto Velho, afirmando que a resposta dada pelo IPHAN não assegura, de antemão, a significância cultural do bem, e por consequência, a continuidade do Samba do Preto Velho, o qual fomenta, juntamente às outras atividades culturais do SHO, a ‘alma’ significativa do Sitio Histórico de Olinda.

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Concomitantemente ao desenvolvimento da pesquisa, verificou-se a precária

Metodologia

fonte de registros físicos do bem estudado, dificultando a exploração de informações relevantes para desdobramento dos recortes que compuseram a história da agremiação. Foi necessário o uso de metodologias que explorassem a expressão cultural de outras formas, visto que a história pode está expressa em diversos signos que o bem pode revelar por meio dos seus diversos atributos. Para tanto, o trabalho passou por diversos processos, os quais não possuíram uma linearidade, e sim uma troca mútua das diversas fontes da essência do bem

estudado, que por sua vez, geravam reflexões e interpretações diversas. A seguir, alguns dos processos adotados para extrair os diversos significados que compõem o bem analisado e proporcionar a narrativa desse trabalho: 1) Fez-se inicialmente o uso de desenhos de observação, para assim não apenas retratar o presente das formas de expressão do bem, mas como uma ferramenta de apreensão e conexão com a cerne que compõem todos os predicados do bem. E tal instrumento, o desenho e pintura, foi usada ao longo da pesquisa como elemento canalizador para retratar, pitorescamente, a história e significados do Preto Velho;

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2) Ao longo de todo o trabalho buscou-se por materiais que registrassem

a

história

do

bem,

como:

registros,

informações

documentais, pesquisas digitais em sites de busca e hemerotecas, sites de noticias que retratassem reportagens, notícias ou depoimentos que fomentasse um conteúdo, que além de explorar a história do bem, revelasse elementos que o torna singular; 3) Vivências contínuas e exploradoras que proporcionasse uma conexão o lugar,, com o tema, com a atmosfera estuda, de modo a explorar lugares de mesmo uso, ou de lugares que possuem elementos que compõem e estão diretamente ligados às raízes que conformaram o que o bem é hoje. Foram feitas visitas em escolas de samba tidas como congêneres do samba brasileiro, as escolas de samba do Rio de Janeiro; a visitação a terreiros de Umbanda, Candomblé e centros espíritas que trabalham na linha da do Preto Velho e Jurema, para

apreensão da atmosfera religiosa que está extramente intrínseca nas origens das escolas de samba; Além de inúmeras visitações às rodas de samba e das festas proporcionadas pela agremiação estudada, de modo a compreender a sua ambiência, a logística do espaço e como sua expressão cultural se desenvolve atualmente;

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4) O diálogo com agentes que fazem parte da agremiação, para assim, a partir de uma troca, produzir reflexões e conhecimentos provenientes de discursos orais; 5) Um grande estudo das letras dos sambas de enredo, atributo esse primordial ao se falar de escolas de samba. Sendo interpretados e

relacionados à própria história da agremiação. 6) Ao fim de todo o processo, elaboração de ilustrações expressivas que reflitam as interações entre os signos que compõem

a significância

cultural do bem estudado.

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Os processos destacados anteriormente fizeram parte para o desenvolvimento

Objetivos

desta narrativa, de forma a construir um material que revelasse uma nova interpretação da Significância Cultural do Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho., revelando os signos que compõem a essência significativa do objeto analisado. Diante disto esta pesquisa tem como produtos e objetivos específicos: 1) Uma narrativa que proporcionasse um material com caráter de dossiê do GRES Preto Velho, com os registros coletados que compuseram sua história; 2) Relevar os atributos que compõem a imaterialidade e materialidade, os quais mutuamente, fomentam Significância Cultural do bem analisado; 3)

Propor

diretrizes

que

configurem

a

seguridade

tanto

da

imaterialidade, quanto da integridade material do GRES Preto Velho; 4) Gerar reflexões diante da forma como são explorados, analisados, coletados e interpretados os elementos imateriais de bens desta natureza. De forma que a arquitetura é um dos elementos materiais que solidificam

esse

registro

imaterial

e

que

as

duas

vertentes,

a

materialidade e imaterialidade, estão interligadas ao longa da história;

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5)

Ponderações que fomentem posturas que agreguem um olhar mais crítico e inclusivo diante do patrimônio brasileiro de origem afro, indígena e de comunidades menos favorecidas, para que tenhamos uma

sensibilidade

para

a

produção

cultural,

da

produção

arquitetônica e da história dessa massa que compõem também o Patrimônio Cultural Brasileiro.

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 g  AdB gCd  vdd dv [] g gjg Evd


Faixa 04 - 100 anos de liberdade, realidade ou ilusão? - Estação Primeira de Mangueiral - 1988 Compositores: Hélio Turco, Jurandir e Alvinho Intérprete: José Bispo Clementino dos Santos (Jamelão)

https://open.spotify.com/track/0zUJceYP71gYPJl3Gps7Gw



Ilustração 05 - Moço, não se esqueça que o negro também construiu as riquezas do nosso Brasil Versos de um samba que questiona se a liberdade é uma realidade ou uma ilusão, acentuando que o negro também construiu a história do nosso país, que ele faz parte de nossa história, da nossa memória, e que as mãos deles estão nas riquezas construídas, tanto as materiais quanto as imateriais


O que é morar em uma cidade patrimônio da humanidade? Como o patrimônio cultural é integrado e se integra ao cotidiano da cidade e de seus moradores? Quantas histórias de vida, significados, lembranças, estão escondidos em uma ladeira, em uma casa, em uma paisagem? E como esse conjunto de lembranças contribui na construção da memória coletiva, do universo afetivo e, finalmente, da identidade cultural de uma comunidade inteira? [...] Patrimônio depende, portanto, de uma comunidade que o reconhece como tal, e a sua salvaguarda é tarefa, em primeiro lugar, de quem aquele patrimônio vivencia, utiliza, faz. Então, os moradores do local, são os atores principais, os fazedores e os guardiões de uma cidade patrimônio, os que dão sentido a seus aspectos físicos (casarios, igrejas, ladeiras, monumentos, áreas naturais), bem como as suas práticas intangíveis (manifestações culturais, religiosas, saberes e fazeres). [...] É na memória coletiva da sua comunidade que a cidade tem guardado seus significados mais profundos, seus segredos, seus dramas, e por fim, toda a sua essência. [...]

Em suas entrelinhas, existem toda a poesia, o saudosismo e a unicidade daquele conjunto de sensações que hoje todos percebemos quando mencionamos o nome da cidade patrimônio. [...]


Trecho do prefácio do livro “Olinda – Patrimônio Cotidiano – Memória Coletiva dos seus moradores”, ICEI BRASIL, Olinda , Pernambuco, agosto de 2017


Patrimônio Cultural Brasileiro Parafraseando a última citação,

essa narrativa, pautada de versos que

exprimem um canto, a voz de um povo abastardo em boa parte da sua história pela sociedade, ressoados por batuques que percorrem ladeiras assentadas nas mais petrificadas histórias, são plasmado no papel na fluidez da aquarela, sendo assim: <Uma contribuição simples e necessária para consolidar a memória coletiva de uma comunidade que luta para conhecer, reconhecer e manter seus costumes, tradições e histórias que compõem sua identidade. E nos ajuda a entender que o patrimônio está em cada um de nós.’> (ICEI Brasil, 2017).

Ao falar de Patrimônio Cultural notamos a vasta amplitude em que o mesmo pode abraçar e representar. De acordo com as definições o conceito de patrimônio foi ampliado de Patrimônio Histórico e Artístico, como estabelecida pelo Decreto-lei nº25, de 30 de novembro de 1937, para um conceito mais amplo e abrangente, denominado de Patrimônio Cultural Brasileiro, como esta pautado na Constituição Federal de 1988, em seu Artigo 216. Com tal definição a amplitude de reconhecimento de bens, sobretudo, aqueles que são passíveis de proeminência e importância, principalmente aqueles de natureza imaterial, os quais possuem uma abrangência maior e complexidade de análise e compreensão na sua magnitude. Seguindo a Constituição, a qual estabelece que a responsabilidade de administração, ao falar de gestão do patrimônio, cabe aos órgãos públicos, como o IPHAN, no âmbito nacional, juntamente

A palavra patrimônio vem de pater, que significa pai e tem origem no latim. Patrimônio é o legado que pai deixa para o seu filho. Assim, a palavra patrimônio passou a ser usada quando nos referimos aos bens ou riquezas de uma pessoa, de uma família, de um grupo de indivíduos. Essa ideia começou a adquirir o sentido de propriedade coletiva com a Revolução Francesa no século XVIII. Logo podemos fazer uma notória analogia com a essência do arquétipo da entidade do Preto Velho: passar a sua sabedoria para as gerações mais novas.

nacional, juntamente aos devidos órgãos municipais e estaduais, fomentando assim. 59


aos devidos órgãos municipais e estaduais, fomentando assim uma parceria entre o poder publico e as comunidades para, assim, assegurar o Patrimônio Cultural Brasileiro. Ao estabelecer que patrimônio cultural é o conjunto de bens de cunho material e imaterial, toma-se como elemento de referência, de identidade, de memória dos diferentes grupos e povos que fomentam a sociedade brasileira pelas suas representatividades e autenticidades. Nessa nova conformação dada pela Constituição, estão classificadas as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; os documentos, objetos, obras, edificações e demais lugares destinados às expressões artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, artístico, paisagístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. Se tratando do IPHAN, o mesmo tem como função assegurar pelo cumprimento

dos marcos legais, efetivando a gestão do Patrimônio Cultural Brasileiro e dos bens

reconhecidos

Humanidade.

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pela

UNESCO,

reconhecidos

como

Patrimônio

da


Como visto, a nova perspectiva que a Constituição de 1988 trouxe para avanço da dimensão imaterial, proporcionou as reflexões sobre a relativização dos conceitos de e noções de excepcionalidade, a qual vem sido substituída pela palavra representatividade, visto que, o reconhecimento de um grupo excluído, tornando-os inclusos diante das inúmeras manifestações culturais que

existem no nosso pais, fazendo com que aqueles grupos se sintam incluídos, com voz e direito de manifestar sua crença, suas verdades e saberes, promovendo ainda mais a importância dos grupos que compõem a sociedade brasileira. De tal forma, tal mudança reflete diante do conceito de referência cultural, a qual incorpora uma significativa e inestimável visão e reconhecimento de bens passíveis de serem distinguidos como patrimônio cultural brasileiro. Segundo Torrely, em Notas sobre a evolução do conceito de patrimônio cultural, as dificuldades que impediram uma maior abrangência do patrimônio cultural vão além das questões políticas e ideológicas, embora estas estejam sempre presentes e fazem parte de um mal que atinge outras políticas públicas: a insuficiência de recursos financeiros e a reduzida capacidade de gestão, frente a um desafio que tem como parâmetro a diversidade cultural do País e suas dimensões continentais.

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Esse quadro é agravado pela velocidade desproporcional dos meios de difusão de valores dissociados das nossas manifestações e tradições culturais – sem que essa afirmativa se constitua em um preceito xenófobo – das quais, muitas mínguam e morrem sem que possam nem mesmo ser conhecidas, quanto mais salvaguardadas e protegidas como é o caso de muitas manifestações populares de origem indígena e afro-brasileira. E relata um segundo aspecto, o qual se diz respeito à delimitação do que vem a ser patrimônio cultural, sobre compreender a dinâmica é essência para compreender e atenuar o choque entre gerações e evitar comportamentos arredios, visto que cada sistema cultural estará sempre em constante mudança, o que também vale para a conceituação de patrimônio, visto que a cultura é dinâmica e mutante ao passar do tempo. Daí a relevância da substituição do conceito de excepcionalidade, elitista e propenso a estabelecer uma hegemonia cultural, pelo de representatividade,

capaz

de

assegurar

aos

diferentes

segmentos

socioculturais

seu

referenciamento. TORELLY, 2012. A

substituição

gradativa

do

conceito

de

excepcionalidade

pelo

de

representatividade reflete diretamente em uma sensibilidade e compromisso com a cidade e a preservação de bens que representam um grupo de indivíduos. plenitude

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Logo, é notória a importância de políticas que integrem os aspectos de preservação do patrimônio cultural, juntamente aos fatores econômicos e sociais, ao pautar as relações entre os agentes que compõem a singularidade do bem e toda sociedade que o entorna. De modo que as reflexões diante da preservação do patrimônio cultural seja uma ferramenta para o desenvolvimento

sustentável

e,

principalmente,

elemento

que

configure

a

justiça

social:

reconhecendo nossa pluralidade, assegurando-a e proporcionando um legado para as gerações futuras de um povo. Contudo, é importante salientar que quanto mais abrangente for o conceito de patrimônio, maior será a diversidade e riqueza cultural.

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64


HISTÓRIA PRA NINAR GENTE GRANDE é um olhar possível para a história do Brasil. Uma narrativa baseada nas “páginas ausentes”. Se a história oficial é uma sucessão de versões dos fatos, o enredo que proponho é uma “outra versão [...] De forma geral, a predominância das versões históricas mais bem-sucedidas está associada à consagração de versões elitizadas, no geral, escrita pelos detentores do prestígio econômico, político, militar e educacional - valendo lembrar que o domínio da escrita durante período considerável foi quase que uma exclusividade das elites – e, por consequência natural, é esta a versão que determina no imaginário nacional a memória coletiva dos fatos. [...] Sem saber quem somos, vamos a “toque de gado” esperando “alguém pra fazer a história no nosso lugar”, quiçá uma “princesa”, como a ISABEL, a redentora, que levou a “glória” de colocar fim ao mais tardio término de escravidão das Américas. Nunca esperaremos ser salvos pelos tipos populares que não foram para os livros. Se “heróis são símbolos poderosos, encarnações de ideias e aspirações, pontos de referências, fulcros de identificação” a construção de uma narrativa histórica elitista e eurocêntrica jamais concederia a líderes populares negros uma participação definitiva na abolição oficial. Bem mais “exemplar” a princesa conceder a liberdade do que incluir nos livros escolares o nome de uma “realeza” na qual ZUMBI, DANDARA, LUIZA MAHIN, MARIA FELIPA assumissem seu real papel na história da liberdade no Brasil. O fato é que a atuação de “gente comum”, ou mesmo a incansável luta negra organizada em quilombos, em fugas, no esforço pessoal ou coletivo na compra de alforrias e em revoltas ou conspirações, já enfraqueciam o sistema escravocrata àquela altura. [...]


Esses nomes não serviram para eles. Para nós, eles servem. Para nós, sentinelas dos “ais” do Brasil, heróis de lutas sem glórias ainda deixados “de tanga” ou preso aos “grilhões”, eles são as ideias que usaremos para “gestar” o que virá. “Engravidados” de novas ideias, jorrará leite novo para “amamentar” os guris que virão. Sabendo outra versão de quem é o Brasil, - não a que nos “ninou” para quando fôssemos adultos – sabendo que CABRAL “invadiu” e que, ao invés de quinhentos e dezenove anos, somos brasileiros há quase doze mil anos. Conhecendo CUNHAMBEBE, a CONFEDERAÇÃO DOS CARIRIS, cientes da participação dos CABOCLOS na luta do 02 DE JULHO NA BAHIA, e sabendo que os índios lutaram e resistiram por mais de meio século de dominação, talvez se orgulhem da porção de sangue que faz de TODOS NÓS, sem exceção, índios. Sabendo que a “bondosa” princesa Isabel deu vez a “Chico da Matilde”, “Luiza Mahin” e “Maria Felipa”, é possível que reconheçam em si a bravura que vive à espreita da hora de despertar e aí, talvez, o “gigante desperte sem ser para se distrair com a TV”. Cientes de que nossa história é de luta, teremos orgulho do Brasil. Alimentados de leite novo e bom, varreremos de nossos “porões” o complexo de “vira-latas” que fomenta nossa crença de inferioridade. Veremos tanta beleza na escultura de ANTÔNIO FRANCISCO LISBOA quanto no quadro que eterniza o sorriso da Monalisa. Nos orgulharemos do “tupi” que falamos – mesmo sem saber. Daremos mais cartaz ao saci do que à “bruxa”. Brincaremos mais de BUMBA MEU BOI, CIRANDA E REISADO. Nossas crianças enxergarão tanta coragem no CANGACEIRO quanto no “cowboy”. Vibraremos quando SUASSUNA estrear em “ROLIÚDE” sem tradução para o SOTAQUE de João Grilo e Chicó. Não estranharemos caso o Mickey suba a ESTAÇÃO PRIMEIRA, troque "my love" por "minha nêga" e mande pintar o "parquinho" da Disney com o VERDE E O ROSA DA MANGUEIRA.

Trecho da sinopse da Estação Primeira de Mangueira, “História pra ninar gente grande”, por Leandro Vieira, para o Carnaval 2019


Bgd A vdg g Bdggg Evvg dv  Tgd Addd  E


Faixa 05 - História pra ninar gente grande - Estação Primeira de Mangueira - 2019 Compositores: Deivid Domênico, Tomaz Miranda, Mama, Marcio Bola, Ronie Oliveira e Danilo Firmino Interprete: Marquinhos Art’Samba https://open.spotify.com/track/5ofP0ayCr1BAMVxvsmyx7x



Ilustração 06 - Eu quero um país que não está no retrato. Índios, negros e pobres. Inspirado no trecho do samba da Estação Primeira de Mangueira para o Carnaval de 2019, o qual reflete em versos o quão o pobre, o índio e o negro não tiveram protagonismo nos registros históricos. E trago essa indagação no corpo do trabalho e retrato a história de um povo que resistiu as intempéries de uma sociedade segregadora e excludente. O Preto Velho vai cantar seu enredo!’

“Localizando a história da escola em cada letra, aconteceu algo improvável e da ordem do milagre: do singular ao comum, as multidões se tornaram todas verde-rosa. A bandeira, símbolo do ufanismo verde e amarelo nos foi devolvida: no lugar de ordem e progresso a invocação de todas as vozes inaugurais: índios, pretos e pobres numa bandeira verde e rosa. Uma subversão da linguagem passou a habitar o espanto de nossos corpos, valorizando a função utópica da palavra num samba que é um poema, que traz em seu seio versos apagados dos livros. [...]” Bianca Dias, 2019


História, Identidade e Memória

Uma consciência histórica se faz presente e está, historicamente falando, relacionada com os monumentos arqueológicos e arquitetônicos, e acredita-se que tais monumentos

são marcos que representam e conformam símbolos

constituídos de conhecimento, transmitindo compreensões e fatos históricos. Acreditando que não há identidade sem memória, que quando se perde a memória,

se

perde

a

identidade,

compreende-se

arquitetônicos e os artefatos arqueológicos agregam

que

os

monumentos

signos que transmitem

mensagens a partir da interpretação dos elementos que compõe o objeto. E que por sua vez, por serem elementos materiais, tomam a essência e tornam-se portadores da voz da história: sendo o código, primeiramente, para leitura e produção de significados diante dos atores sociais. Seria uma forma de materializar conceitos, desde uma identidade nacional, por exemplo, até referências étnicas. Diante disso a leitura desses corpos está simplesmente aberta à diversas interpretações. O agente que interpreta, é o que definirá, por meio de registros, um parecer historiográfico. Logo podemos constatar que a história existe, mas quem a conta, a partir de interpretações, é o historiador, sendo quem realmente define o que ela foi, ou o que ela significa, e de certa forma, mensura a sua importância. Logo, conclui-se que a história pode ser contada por diversos ângulos, com perspectivas

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diversas que pode gerar: um registro verídico; com partes de uma verdade; que pode ser manipulada, podendo ocultar elementos, como sujeitos ou objetos que fazem parte do contexto da história registrada. Que uma abordagem antropológica do

próprio

patrimônio

cultural

ajuda a desmascarar

a

manipulação do passado (Haas 1996 apud Funari 2001). Isso é evidenciado no patrimônio brasileiro, onde os bens patrimoniais tombados em sua grande maioria são reflexos de uma classe dominante que fomentaram o que era patrimônio brasileiro, excluindo o outro lado, o avesso do mesmo lugar, que não é valorado, visto que está fora do seleto grupo que esteve no poder por grande parte da história brasileira As relações analíticas para com o patrimônio foram deixadas para uma nata de escritores, arquitetos, artistas, que se tornaram os descobridores e porta-vozes do patrimônio brasileiro. E é notória observar quem eram esses detentores da voz do patrimônio brasileiro, que determinavam o que configuravam a identidade brasileira. Considerando primeiramente as igrejas e monumentos coloniais o acervo primordial, acima de qualquer artefato indígena que também conforma a nossa memória nacional. Assim como novas gerações colocam

o

progresso acima de qualquer conjunto que reflete a identidade coletiva, sobrepondo o capital e crescimento acima da história e memória. Vide, por exemplo, a escolha da nova capital

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capital brasileira, moderna e sem história, acima dos edifícios ‘velhos’ e não mais notáveis de identidade como na antiga capital Rio de Janeiro. Sem mencionar o tanto de história e povos indígenas foram dizimados nessa missão de ocupação do centro-oeste brasileiro. Trazemos a nossa realidade pernambucana, o Sítio Histórico de Olinda, com sua memória anexada aos anais da história brasileira, sem colecionar fatos históricos que refletem também povos periféricos, mas que construíram a história da cidade. Revela-se no documento que coloca Olinda como Patrimônio da

Humanidade, elementos que foram frutos da colonização, excluindo os ribeirinhos das margens da Cidade Alta, do casario mais humilde que também configurava no traçado da cidade. Vale pensar que essa parcela de olindenses também escreveram a história de Olinda, e tiveram papel no conjunto excepcional adotado ao lugar pelos especialistas de uma elite. A distância entre o povo e as autoridades sempre esteve presente na história do Brasil, e que, claramente, reflete nas ideologias de patrimônio, de identidade nacional, e dos elementos que consideram parte da memória coletiva. Memória essa seletiva, segregadora e excludente. Autoridades essa que nas gerações atuais implementaram ideologias de progresso, como sinônimo de negar o passado, e que está escrito não nos serve mais. E esses pensamentos refletem no mais simples cidadão, que

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não reconhece seu próprio valor, e que idealiza, desde a sua casa, um pouco desse ‘progresso’

nada democrático, que mais separa o povo do seu

patrimônio que fomenta uma reflexão do que é ter identidade, ter memória e ser agente também desse meio. Tais reflexos de uma sociedade que não trata seus

cidadãos como conscientizadores patrimonial, reflete na citação que Funari (2001) traz nas palavras de Grammont (1998): <A distância entre as autoridades e o povo é a mesma daquela entre a sociedade civil e o passado, devido à falta de informação, ainda que os habitantes das cidades coloniais dependam do turismo para sua própria sobrevivência. Quem são os maiores inimigos da preservação dessas cidades coloniais? Em primeiro lugar, a própria administração municipal, não afetada pelos problemas sociais e ignorante das questões culturais em geral mas, às vezes, os moradores também, inconscientes da importância dos monumentos, contribuem para a deformação do quadro urbano. Novas janelas, antenas parabólicas, garagens, telhados e casas inteiras bastam para transformar uma cidade colonial em uma cidade moderna, uma mera sombra de uma antiga cidade colonial, como é o caso de tantas delas.> (GRAMMONT,1998 apud FUNARI , 2001, p. 03)

A conscientização patrimonial é uma das diretrizes fundamentais para situar o

cidadão comum diante do que faz parte da sua história, que fomenta sua identidade e memória. Passando também aos especialistas em conservação e patrimônio a sensibilidade de compreender os patrimônio

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porquês que levam as atitudes de descaracterização do patrimônio construído. E quais as reflexões que as mudanças causam nas relações entre o patrimônio e os sujeitos envolvidos, se trouxe novos significados, que ao longo do tempo se firmaram como parte da identidade, ou apenas uma melhoria aos olhos de uma classe que não se sente representada pelo o que se é imposto. Vale salientar que não se propõe abster discussões sobrearquiteturas que reflitam um falso-histórico, ou uma modificação que enquadre num pastiche, o

que se releva na discussão, são as motivações que levam ao cidadão comum sentirem tais necessidades de modificações, como elas interagem com o novo estado conformado. E como a educação patrimonial pode ser fundamental para assegurar a continuidade da materialidade que traz em si um registro histórico e como a consciência da classe civil diante do que é seu, do que faz parte da sua história, da sua identidade e de sua memória. <Devemos concordar com Byrne (1991: 275) quando afirma que é comum que os grupos dominantes usem seu poder para promover seu próprio património, minimizando ou mesmo negando a importância dos grupos subordinados, ao forjar uma identidade nacional à sua própria imagem, mas o grau de separação entre os setores superiores e inferiores da sociedade não é, em geral, tão marcado quanto no Brasil. Neste contexto,

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Significância Cultural O conceito de Significância Cultural foi introduzido no campo da conservação como um instrumento o qual abrange todos os critérios que fomenta um bem como representativo e singular. Instrumento este reconhecido pela UNESCO, como um dos fatores relevantes para a inscrição de um bem na Lista do Patrimônio Mundial. Como ressalta Valentim (2018), a primeira menção do termo “significado cultural”

advém na publicação da Carta de Veneza (1964), na

definição conceitual de Monumento Histórico: <Compreende a edificação isolada, bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou de um acréscimo histórico. Entende-se não só às grandes criações, mas também às obras modestas, que tenham adquirido, com o tempo, significação cultural”> (CARTA DE VENEZA, 1964 apud VALENTIM, 2018, p. 03)

O conceito de significância foi oficialmente definido na Carta de Burra (1979), na Carta do Icomos Austrália para conservação de sítios com significado cultural. Está definido, no Artigo 1º: “O termo significação cultural designará valor estético, histórico, científico, social ou espiritual para as gerações passadas, atual ou futuras” (CARTA DE BURRA, 1979, p.01 apud VALENTIM, 2018 ).

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Na quarta edição da Carta de Burra em 1999, o conceito de significado cultural

toma

nova

abrangência,

envolvendo

a

partir

disso,

novas

compreensões, como nota-se no Artigo 1.2 está definido: <Em suma, entende-se a partir de tal definição que Significância Cultural, segundo a Carta de Burra, é compreendida a partir dos valores atribuídos ao bem patrimonial, levando em consideração os determinantes locais, os agentes e grupos sociais envolvidos e, consequentemente, a sua importância histórica.> (CARTA DE BURRA,1999, p. 05 apud VALENTIM, 2018, p. 03)

De acordo com a carta de Burra, a Significância Cultural é compreendida a partir dos valores estabelecidos ao bem, considerando os fatores locais, os especialistas e atores sociais que estão envolvidos com o patrimônio e sua importância histórica. Os conceitos de autenticidade e integridade também são relacionados à significância cultural no campo da conservação, tendo os caráter de legitimidade e plenitude, respectivamente.

Os valores atribuídos ao bem, segundo Zachetti (2009) devem ser aceitos, mediante o processo de julgamento, por meio da consultas ao atores sociais, com propósito para validação de tal documento. Diante de tais critérios e métodos, faz-se pensar no legado histórico de uma parcela da sociedade que não possuía meios e recursos para registros físicos de sua história e como tais grupos de diferentes origens e

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fins sociais afirmam e configuram aos órgãos responsáveis pela salvaguarda do patrimônio e a sua continuidade. Dando continuidade no levantamento dos processos de estudos para reconhecimento da significância de um bem, os meios de investigações metodológicas estruturam o processo nas seguintes etapas: (i) levantamento e identificação do bem; (ii) julgamento dos valores junto aos atores sociais; (iii) redação da declaração; (iv) elaboração de diretrizes de conservação e, (v) a

revisão do processo. Medidas emergências para assegurar o patrimônio cultural brasileiro são adotados constantemente e novas discussões diante dos meios e formas como gerir tais seguranças ao patrimônio são levantadas. A paisagem e outros tipos de patrimônios começam a ser discutidos e valorados no início da década de 80, onde, em Pernambuco, medidas e diretrizes de conservação do patrimônio histórico foram adotadas. O tombamento torna a ser a medida mais preventiva e aplicada a partir disso. Porém não podemos desconsiderar os inúmeros fatores que estão associados ao tombamento, como

a valoração de certo tecido

urbano, em que, consequentemente gera uma expulsão dos moradores locais, perdendo parte da imaterialidade do recorte tombado, visto que, são também os atores sociais, os moradores que conformam os valores que o patrimônio material tombado também possui.

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Tal

estratégia

de

preservação

cresce

como

sendo

a

solução

mais

representativa para cessar as desvalorizações que geram depredações e

arruinados da memória histórica coletiva através dos conjuntos e bens de valor histórico construído. Porém Valentim ressalta elementos que a Carta de Amsterdã já apontavam duas necessidades da conservação integrada: <A importância da escala local nas práticas de preservação e, acima de tudo, a participação da sociedade civil: “A conservação integrada conclama à responsabilidade os poderes locais e apela para a participação dos cidadãos” (DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ, 1975, p.05). > (VALENTIM, 2018 p. 05)

Os valores atribuídos a um bem são de diferentes interpretações e diferentes razões, de acordo com os pensamentos e afeições dos atores

sociais

envolvidos, ressaltando que todos tem a mesma finalidade: a salvaguarda de um bem. Desta maneira compõem a significância cultural. Salientando que os métodos e interpretações aplicados para a revelação da significância precisam ser periodicamente revisados e ter o envolvimento dos atores sociais. Porém, Valentim (2018) acredita que a significância, como instrumento de conservação patrimonial, precisa superar alguns desafios para sua maior efetividade.

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Valentim (2018) revela em seu artigo, novas interpretações diante da significância cultural, abordando olhares críticos novos diante da conduta das metodologias e dos órgãos responsáveis pelo reconhecimento de um bem especifico, trazendo pensamento de teóricos americanos: <Primeiro, a significância tem sido usada, muitas vezes, como um instrumento contundente - ou pior, uma caixa preta. O julgamento na significância é desenhado, atento à arquitetura e aos cânones históricos, associados e validados por acadêmicos. Como um campo, a

preservação mostrou pouco apetite por pensar criticamente sobre a significância, ou teorizando o significado. Em vez disso, tem confiado em um padrão de “auto-evidência” semelhante ao usado pelo US Supreme Courte Justice Potter em 1964 para definir pornografia e obscenidade: “eu sei quando eu vejo.> (MASON, 2004; p.64; apud VALENTIM 2018, p. 06.)

Revelando

que

na

maioria

das

vezes

os

órgãos

responsáveis

pelo

reconhecimento e avaliação dos bens, são especialistas da conservação, envolvendo um número menor de atores sociais. Em que Manson (2004) ressalta que tal postura levam a esses profissionais priorizar aspectos materiais e elementos históricos. Afirmando que a necessidade de mais vozes para contemplar a plenitude significativa do bem.

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Diante desta reflexão, este trabalho toma partidos na metodologia para levantar e aferir os significados revelados ao bem estudo, a Escola de Samba Preto Velho, visto que a experiência vivida dentro das atmosferas que compõem o bem, a visitação de cultos religiosos que agregam referencias às escolas, a presença em festividades do bem, das suas rodas de samba, do conhecimento de perto de como os atores se conformam no espaço, como eles expressam os atributos que tecem a cadeia de signos que fomentam a significância do GRES Preto Velho. Como constata Valentim: <Considerando que a significância também é cambiável, no tempo, e de acordo com os atores sociais envolvidos, o desafio metodológico, na verdade, está centrado nos meios de compreensão dos valores socialmente atribuídos. Entretanto, mais importante que pensar um “modelo-padrão” de análise da significância, é se aprofundar na investigação destes valores frutos da relação entre os sujeitos e o objeto, que compõem o patrimônio cultural de uma sociedade.>

(VALENTIM, 2018 p. 07)

Tal postura refletem de forma significativa para as interpretações dos cânones que conferem as características singulares do bem estudado. Visto que a experiência in loco reflete uma nova perspectiva e assimila novos olhares e a quebra de paradigmas pré-estabelecidos socialmente.

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O novo olhar diante de um bem que possui expressões singulares, apesar de intrínsecas, senti-las a pele faz das percepções sensoriais fomentar pensamentos e sensibilidades que expressam um novo conceito e revela a sua essência. Visto que é por meio do processo de interação entre os agentes envolvidos e o bem, que o conjuntos de significados são fomentados e, desta maneira, evidenciados e, posteriormente, registrados para a conceituação de sua significância. As experiências vividas dentro do GRES Preto Velho, dos terreiros de Umbanda e Candomblé, das visitas aos ensaios e festividade de outras escolas de samba, foi de suma importância para compreender e assimilar de forma mais límpida e fiel os signos que compõem uma agremiação carnavalesca deste tipo. A qual foi notório compreender e observar a sua origem humilde, negra, que tem como samba a sua voz e reflete uma parcela da sociedade brasileira, que por muitas vezes não tem notoriedade na história. A reflexão anterior vem das inquietações diante das formas como são exploradas as informações e como a limitação de informação pode limitar o reconhecimento de bem. Trago como uma nova forma de pensar e agir na hora de configurar estratégias e metodologias para absorver e interpretar os significados de um bem, principalmente aqueles que palavra

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abracem os dois lados, que, consequentemente, iriam proporcionar melhores interpretações e os bens seriam melhor contemplados e suas diretrizes de salvaguarda seriam mais amplas e contundentes. Teóricos como Wells (2011), acredita que a busca de pensamentos ideológicos que fomentem a fenomenologia a partir da extração de aspectos emocionais por parte dos atores sociais, aqueles do senso comum, são tidos como atores que agregam apego ao bem e, facilmente, atribuem valores a estes bens. Como

Valentim traz as teorias de Wells (2011), ao revelar que é possível chegar a um método que avalie como “como as pessoas se relacionam com o bem e, principalmente, como as práticas de preservação devem conservar a relação das pessoas com o bem”, visto que por meio dos seus estudos que os significados históricos estão relacionados como as experiências no mundo das pessoas, que por sua vez, refletem como as mesmas enxergam e entendem como seu patrimônio.

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Foto 03 - do autor, 2018


 Ad gdA Ad ddg A  dddvd [] A d Egd dd


Faixa 06 - Igbá Cubango, a Alma Das Coisas e a Arte Dos Milagres - Acadêmicos do Cubango - 2019 Compositores: Robson Ramos, Sardinha, Duda Tonon, Anderson Lemos, Ailtinho, Sérgio Careca, Carlão do Caranguejo e Samir Trindade Intérprete: Thiago Brito https://open.spotify.com/track/6Ml8XomQKx7Um45KHChUS6



Ilustração 07 - Na alma das coisas acreditei A alma das coisas, uma referência a essência e simbologia que objetos possuem culturalmente, os signos, as cargas de identidade diante de um simples objeto ou elemento natural que possui materialidade. O quanto as relações com as coisas fazem parte da imaterialidade de tantos bens culturais. Nas religiões de matriz africana e nas cristãs, a vela tem uma carga simbólica que reúne não somente a fé do devoto ou filho de santo, mas uma forma de comunicação com sua espiritualidade. O Preto Velho traz essa fusão por meio do sincretismo religioso peculiar da religiosidade brasileira, traz elementos afros, como arruda, figa, e guias, com a fusão com terços, velas e altares. Símbolos da imaterialidade cultural.


1.0 Patrimônio Cultural Imaterial

“N a alma das coisas acreditei!” O conceito de Patrimônio Imaterial compreende-se em um conjunto de práticas

e domínios da vida social que refletem em saberes, ofícios e modos de fazer, desde celebrações, formas de expressão cênicas, plásticas, musicais ou lúdicas; os quais são evidenciados nos lugares onde ocorrem: como mercados, feiras ou santuários que abrigam tais atividades culturais de cunho coletivo. A partir da Constituição de 1988, em seus artigos 215 e 216, abrangeu a noção de Patrimônio Imaterial a partir do reconhecimento da existência de patrimônios que abordavam não somente os aspectos materiais, mas também o viés imaterial. Nos dois artigos da nova Constituição, reconhece o patrimônio a ser preservado pelo Estado juntamente com a comunidade, de forma que abrangesse e reconhecesse as diversidades de referências culturais nas camadas e grupos formadores de opinião da sociedade brasileira. Acreditando que a transmissão do patrimônio imaterial é um legado passado de geração a

geração, em que as recriações constantes por parte das comunidades e grupos fomentam a configuração da sua história e suas relações entre a natureza, o ambiente, gerando sentimentos de pertencimento, identidade e continuidade, contribuindo à promoção do respeito à diversidade cultural e à criatividade humana.

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De acordo com a UNESCO, as definições de Patrimônio Imaterial é constituída pelas “Práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas - com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais os quais são associados – que os grupos sociais, as comunidades, e em alguns casos os indivíduos, reconhecem como parte complementar de seu patrimônio cultural.” Esta conceituação está de acordo com a Convenção da UNESCO para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial, ratificada pelo Brasil em março de 2006, em que a mesma considera e reconhece os seguintes aspectos: <1) Considera a importância do patrimônio cultural imaterial como fonte de diversidade cultural e garantia de desenvolvimento sustentável, conforme

destacado

na

Recomendação

da

UNESCO

sobre

a

salvaguarda da cultura tradicional e popular, de 1989, bem como na Declaração Universal da UNESCO sobre a Diversidade Cultural, de 2001, e na Declaração de Istambul, de 2002, aprovada pela Terceira Mesa Redonda de Ministros da Cultura; 2) Considera a profunda interdependência que existe entre o patrimônio cultural imaterial e o patrimônio material cultural e natural; 3) Reconhece que os processos de globalização e de transformação social, ao mesmo tempo em que criam condições propícias para um diálogo renovado entre as comunidades,

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geram também, da mesma forma que o fenômeno da intolerância, graves

riscos de deterioração, desaparecimento e destruição do patrimônio cultural imaterial, devido em particular à falta de meios para sua salvaguarda; 4) Consciente da vontade universal e da preocupação comum de salvaguardar o patrimônio cultural imaterial da humanidade; 5) Reconhece que as comunidades, em especial as indígenas, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos desempenham um importante papel na produção, salvaguarda, manutenção e recriação do patrimônio cultural

imaterial, assim contribuindo para enriquecer a diversidade cultural e a criatividade humana; 6) Considera a necessidade de conscientização, especialmente entre as novas gerações, da importância do patrimônio cultural imaterial e de sua salvaguarda; 7) Considera que a comunidade internacional deveria contribuir, junto com os Estados Partes na presente Convenção, para a salvaguarda desse patrimônio, com um espírito de cooperação e ajuda mútua;

8) Considera a inestimável função que cumpre o patrimônio cultural imaterial como fator de aproximação, intercâmbio e entendimento entre os seres humanos.> UNESCO, 2003

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A consideração destacada pela UNESCO reflete atualmente nas posturas estabelecidas diante como se lidam e estabelecem as relações entre os agentes especialistas e o Patrimônio Imaterial, porém nota-se a ineficiência de abranger e reconhecer os inúmeros bens que estão a mercê do descaso devido a pouca as demandas grandes de estudo e avaliações para poucos profissionais habilitados nos órgãos brasileiros responsáveis por gerir os instrumentos adequados ao reconhecimento e à preservação desses bens imateriais, de forma a atender às determinações legais e suprir a demanda. Diante de tais limitações, o IPHAN coordenou estudos que resultaram na edição do Decreto nº. 3.551, de 4 de agosto de 2000 - que instituiu o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial e criou o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI) - e consolidou o Inventário Nacional de Referências Culturais (INCR). Posteriormente, em 2004, foram estabelecidas novas políticas de salvaguarda que estruturassem e sistematizassem melhores implementações de diretrizes mais adequadas ao reconhecimento e valoração do Patrimônio Imaterial. Diante disso o IPHAN criou o Departamento do Patrimônio Imaterial (DPI). Em 2010 foi instituído pelo

Decreto nº. 7.387, de 9 de dezembro de 2010 o Inventário

Nacional da Diversidade Linguística (INDL), utilizado para reconhecimento e valorização das línguas portadoras de referência à identidade, ação e memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira.

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1.1- Instrumentos e métodos de Salvaguarda aplicados pelo IPHAN A partir do Decreto nº 3.551, em 4 de agosto de 2000, o qual instituiu o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial, definindo uma programa destinado para esses patrimônios deste cunho. O registro, a partir de sua conceituação do IPHAN, é um instrumento de cunho legal para preservação, reconhecimento e valorização do patrimônio imaterial brasileiro, patrimônio este responsável para conformação da identidade e memória da sociedade brasileira. O Registro é um instrumento direcionado ao conjunto de bens que respeitam as categorias estabelecidas pelo Decreto: celebrações, formas de expressão, saberes e lugares, que, grupos sociais reconhecem como parte integrante da sua identidade, compreendendo representações, conhecimentos, expressões e técnicas. Ao serem registrados, os bens recebem a titulação de Patrimônio Cultural Brasileiro e, posteriormente, são inscritos em um dos quatros Livros de Registro, estabelecido no grupo apropriado. Os pedidos de registro de bens culturais imateriais devem ser feitos de acordo com os artigos 2º a 4º da

Resolução Nº 001, de 3 de agosto de 2006.

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Para instrução de um processo de registro é necessário uma pesquisa documental e de campo, juntamente a uma mobilização social sobre as induções e proposições que levam a inscrição do bem. Se faz necessário argumentações sobre o valor patrimonial do bem cultural; juntamente a um diagnóstico sobre a vulnerabilidade e recomendações para salvaguarda do bem cultural. Tal processo culmina na inscrição do bem em um dos livros do Patrimônio Imaterial: Celebrações, Lugares, Saberes e Formas de Expressão. A reavaliação do registro dado a um bem cultural imaterial é realizada a cada dez anos. Segundo o IPHAN, se tem como um dos objetivos, nesse processo, mediar a construção de um consenso entre os segmentos ou atores da política, em torno do que deve ser registrado. Na fase de registro, espera-se que aconteça um movimento de interlocução entre Estado e segmentos sociais a partir do qual possam ser realizadas as seguintes ações:

•produzir e sistematizar conhecimento sobre o universo cultural em questão; promover a mobilização dos segmentos sociais no debate sobre aspectos e razões do registro; identificar demandas e possíveis ações de salvaguarda; identificar os atores envolvidos sejam eles pessoas, grupos, comunidades, segmentos sociais e instituições; e identificar as tensões sociais mais evidentes em relação à salvaguarda do bem cultural.

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Nota-se também, o quanto para incluir um bem na lista de patrimônio, é necessário a inscrição deste seguindo um decreto. Vale considerar que, os agentes que irão reconhecer a necessidade desse registro, requer um olhar sensível a ponto de perceber a sua importância e singularidade. Vai além de um olhar empático diante de um patrimônio, requer um olhar sensível e cauteloso. Visto que muitas das manifestações e expressões culturais não possuem a consciência por parte daqueles que conformam sua identidade, seus agentes atuantes no patrimônio, sendo necessário um garimpo por parte de especialistas juntamente ao grupo que configura o bem, com o intuito de preservar e garantir a continuidade deste tipo de patrimônio, que devido a sua subjetividade, possui múltiplas interpretações que, consequentemente, gera grandes limitações para valoração e reconhecimento. O livro de Registro é categorizado em quatro grupos:

Livro de Registro dos Saberes – Destinado a auferir os registros de bens de cunho imaterial que configuram conhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidiano dos grupos e comunidade. Os Saberes são um conjunto de conhecimentos tradicionais associados às atividades desenvolvidas pelo grupo de agentes sociais reconhecidos como detentores de técnicas, ofícios e matérias-primas que refletem na identidade deste grupo, fazendo-os serem reconhecidos pelo seu saber e pela sua localidade.

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Livro de Registro das Celebrações – Reúne nesta categoria os rituais e festas que marcam a vivência coletiva, religiosidade, entretenimento e outras práticas da vida social. Considerados importantes para o fomento da cultura, da identidade e memória coletiva de um grupo social, as celebrações configuram ritos e festividades que expressa a vivência deste grupo, os quais acontecem em lugares e territórios específicos e podem estar relacionados à celebrações cívicas, religiosas, aos ciclos do calendário, como feriados. São ocasiões que possuem aspectos diferenciados de interação social, que envolvem práticas complexas e possuem suas próprias regras para a destinação dos papéis diante do grupo social, como a preparação de comidas e bebidas, produção de vestuário e indumentárias, entre outras formas de expressão.

Livro de Registro das Formas de Expressão – Destinado a registrar as manifestações de cunho artístico de modo geral. Formas de Expressão são formas de interações entre

determinado grupo social, que são reconhecidos

pela comunidade e em relação às quais o determinado costume estabelece normas, expectativas e padrões de qualidade. Abordam a compreensão e apreensão das performances culturais de grupos sociais, como manifestações musicais, plásticas, literárias, cênicas ou lúdicas, as quais consideradas importantes ao fomento da identidade de um grupo e de sua memória, configurando as diversas formas de expressões culturais brasileiras.

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Livro de Registro dos Lugares – nessa categoria são inscritos os lugares que produzem praticas culturais coletivas, como feiras, santuários, mercados, praças ou lugares que concentram uma coletividade social. Tendo um cunho diferenciado por representar um sentido particular para a comunidade local, tornando um lugar representativo no sentido cultural. Sendo locais que são realizadas atividades de diferentes naturezas, tanto do cotidiano, quanto extraordinárias,

de

maneira

vernacular

quanto

oficiais.

Podendo

ser

conceituados como ambientes que refletem a vida social de uma localidade, cujos

valores

e

atribuições

são

reconhecidos

e

materializados

em

representações simbólicas e narrativas, fomentando a construção dos signos de

pertencimento, territorialidade, identidade e memória. Apesar das classificações de registros do IPHAN, podemos considerar que bens podem encontrar novas significações ou/e encaixar-se em mais de um grupo de registros. Visto que a complexidade da interpretação de bens de natureza imaterial, por possuírem a capacidade de diferentes vertentes. Sendo, assim, amplos e passíveis de múltiplas particulares e interpretações.

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1.2- Planos de Salvaguarda de bens imateriais. Um dos instrumentos de salvaguarda de bens de natureza imaterial é o Apoio e Fomento, acreditando que salvaguarda é assegurar a continuidade de um bem cultural imaterial de forma sustentável, atuando na melhoria das condições e relações sociais, por meio dos materiais de transmissão e reprodução, os quais promovem a sua existência. O conhecimento adquirido durante os processos de inventário e registro é o que possibilita identificar de forma mais eficiente e precisa, os modos mais apropriados de seguridade do bem imaterial. Essas formas dependem de aspectos financeiros e de agentes detentores de saberes específicos com vistas à sua transmissão, por meio de sua organização em comunidade e a facilidade de acesso as suas matérias primas. O Plano de Salvaguarda é um instrumento de apoio e fomento de fatos culturais aos quais são atribuídos sentidos e valores que constituem referências de identidade para os grupos sociais envolvidos, e que são registrados como Patrimônio Cultural Brasileiro, conforme o estabelecido no Decreto no. 3.551, de 4 de agosto de 2000. Segundo o IPHAN, a mobilização social ao longo da

instrução do registro é uma condição fundamental para o processo, e permite que a sociedade aceite, ou não, a proposta e, por sua vez, apresente seu ponto de vista, apontando questões que podem ser elaboradas como recomendações para a salvaguarda - item obrigatório na instrução do processo.

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Para a implementação do Plano, se faz necessário, primeiramente, a inscrição em um dos Livros de Registros do IPHAN. Diante disso, são elaborados um planejamento com estratégias baseado no diagnostico e nas recomendações indicadas pelo processo de registro, assim, salvaguardo o bem. Para executar com eficiência esse plano, é necessária a interlocução contínua entre o Estado e a comunidade, grupos ou segmentos sociais que estão ligados diretamente no âmbito cultural abordado. Tal instrumento de salvaguarda foi configurado a partir do acordo entre a instrução do processo de registro, dos inventários elaborados, das pesquisas complementares e a compreensão preliminar entre os agentes envolvidos na produção e reprodução do bem cultural em questão. Contribuindo para um reconhecimento e valorização dos segmentos envolvidos ao bem, sua produção

e, consequentemente, reprodução, juntamente ao seu contexto sociocultural e histórico. Dentro os programas direcionado ao Patrimônio Imaterial, temos o PNPI, Programa Nacional do Patrimônio Imaterial, o qual instituído pelo Decreto nº 3.551, de 4 de agosto de 2000, onde viabiliza projetos de identificação, reconhecimento, salvaguarda e ascensão da dimensão imaterial do Patrimônio Cultural Brasileiro. Sendo um programa de Apoio e Fomento que busca estabelecer parcerias com instituições dos governos

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federal, estaduais e municipais, universidade, organizações não governamentais, agências de desenvolvimento e organizações privadas ligadas à cultura e à pesquisa. Entre as atribuições do PNPI está a elaboração de indicadores para

acompanhamento e avaliação de ações de valorização e salvaguarda do patrimônio cultural imaterial. Outros objetivos são a captação de recursos e promoção da formação de uma rede de parceiros para preservação, valorização e ampliação dos bens que compõem o Patrimônio Cultural Brasileiro, além do incentivo e apoio às iniciativas e práticas de preservação desenvolvidas pela sociedade. Nas políticas de fomento e apoio do PNPI, estão as diretrizes previstas a ascensão da inclusão social e a melhoria das condições básicas de vida dos produtores e detentores do patrimônio cultural imaterial, e medidas que aumentem a participação dos grupos que produzem, expressão, transmite e atualizam as manifestações culturais de cunho imaterial nos projetos de preservação e valorização desse tipo de patrimônio. Contudo, a promoção da salvaguarda dos bens de natureza imaterial deverá ocorrer de maneira que sejam apoiados às suas condições materiais, os quais propiciam sua existência e que possibilite o acesso de forma ampla às benesses geradas por este tipo de preservação de patrimônio, juntamente com a criação de mecanismos de proteção patrimônio

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efetiva dos bens que estão em situação de risco, que estão a mercê de perder seus atributos e consequentemente, a sua significância cultural, a qual fomenta o bem único e singular. Devido a produção cultural ampla brasileira, a falta de políticas públicas que abracem todas essas manifestações, não só incluindo aquelas grandiosas e tidas como as mais importantes, visto que a conformação da sociedade brasileira também é composta de grupos pequenos, com suas singularidades, e

que configuram a identidade cultural brasileira. Sendo assim, apesar dos planos de conservação exemplificados aqui que o IPHAN traz, nota-se a necessidade de apoio a esses planos e se faz também, necessário planos de conservação apoiados de políticas de inclusão, que reconheça e levante os bens imateriais dos grupos e comunidades brasileiras.

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1.3- Educação Patrimonial – A catarse da consciência do patrimônio. Na catarse a sociedade reconhece que a realidade até então conhecida por ela, tida como algo ‘natural’, não é exatamente desta forma, mas sim um complexo contexto histórico, o qual configurado por uma sociedade com

intenções políticas implícitas ou explicitas, produzidas em determinado lugar e recorte temporal, os quais refletem nas formas como lidamos hoje com o nosso patrimônio. A alienação patrimonial é umas das objeções do fomento da memória, o qual contribui para o esquecimento do nosso patrimônio, que ficam a mercê das intempéries do tempo e da conjuntura social que o nega, pois, se a sociedade não

valoriza

e

compreende

sua

importância,

resvala

ao

descaso

e,

consequentemente, a perda de seus atributos, de sua memória, de sua identidade. Funari (2001) revela que existem três elementos, dentre os inúmeros que podemos ressaltar, que ameaçam os bens culturais: o fato das pessoas estarem interessadas em ter acesso à uma infraestrutura moderna, renegando o que é seu, e julgando sem valor; o roubo arqueológico, visto que a valorização de sítios e tombamentos de conjuntos geram olhares de abutres diante dos objetos e da arquitetura, visto as inúmeras igrejas e monumentos coloniais a mercê, sem as devidas seguranças; e a deterioração dos monumentos devido à falta de manutenção e abrigo. E acentua:

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<Estes

três

perigos

para

a

manutenção

dos

bens

culturais,

aparentemente não relacionados, revelam uma causa subjacente comum: a alienação da população, o divórcio entre o povo e as autoridades, a distância que separa as preocupações corriqueiras e o ethos e políticas oficiais.> (FURARI, 2001)

Evidencia-se que o povo possui uma alienação diante da sua própria cultura, como se a mesma não fosse relevante, sem valor e digna de reconhecimento e atenção. E diante disso, uma das ações fundamentais para preservação do Patrimônio cultural está na educação patrimonial, a qual está composta de uma consciência coletiva diante do patrimônio. Em que se trata de um processo permanente e sistemático de trabalho educacional, acreditando que o patrimônio é fonte primária de conhecimento e enriquecimento individual e coletivo. Traduzidos em conceitos e conhecimento, o objetivo se faz em tomar objetos e expressões

do

patrimônio

cultural

como

mecanismo

para

atividades

pedagógicas, analisando-os e apreendendo-os para fomentar um conjunto de informações que gera a consciência patrimonial: reconhecimento da sua identidade, resgate da memória e valoração de forma que assegure o conhecimento apreendido e que o mesmo seja repassado às novas gerações. <a educação patrimonial pode ser um instrumento de “alfabetização cultural” que possibilita o indivíduo fazer a leitura do mundo que o rodeia, levando-o à compreensão do universo

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sociocultural e da trajetória histórico-temporal em que está inserido. Este processo leva ao desenvolvimento da auto-estima dos indivíduos e comunidade, e a valorização da sua cultura.> (Medeiros e Surya, 2009 p. 07)

O olhar crítico, juntamente à apropriação consciente da sociedade, por parte dos grupos e indivíduos, para com seu patrimônio, configura um processo de preservação de forma sustentável desses bens, fomentando o fortalecimento das relações entre os indivíduos e seu patrimônio, engrandecendo e afirmando os símbolos de identidade e cidadania. A conscientização de que todos os povos, em sua pluralidade e diversidade cultural, acreditando que todos possuem sua cultura, que não há cultura melhor que a outra, e nem cidadãos sem cultura. Com a aplicabilidade de uma consciência patrimonial, faz o cidadão perceber

e analisar os objetos expostos, extraindo deles aspectos políticos, econômicos, sociais, tecnológicos e culturais da sociedade brasileira, resgatando, assim, as relações e laços de comunidade, visto que uma comunidade produz sua cultura, e que a mesma consciente de seu valor, valoriza e preservar os significados que fomentam sua singularidade. A conscientização patrimonial gera uma discussão diante das formas como os bens podem ser melhores apropriados, capacitando o grupo social a compreender e melhor usufruir de seus bens. Gerando maiores pessoas

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interações, enriquecimento dos elementos que configura os signos culturais, num processo contínuo de produção e reprodução cultural. Porém a historia reflete muito os porquês dessa política de alienação patrimonial, em que povos renegados ao longo da história, negros, índios e pobres, são abastados da historia, e colocados como uma camada não detentora de valores, que sua formação cultura não possui relevância para a identidade nacional. E tais visões foram impregnadas na sociedade brasileira, que apesar de vivermos uma realidade mais aberta a pluralidade, ainda deparamos com elementos que refletem a desvalorização das pequenas camadas, objetivando elementos patrimoniais de elite, de uma era colonial. Como retalha historicamente Funari (2001): O resultado de uma sociedade baseada na escravidão, desde o início houve sempre dois grupos de pessoas no país, os poderosos, com sua cultura material esplendorosa, cuja memória e monumentos são dignos de reverência e preservação e os vestígios esquálidos dos subalternos,

dignos de desdém e desprezo. Como enfatizou o grande sociólogo brasileiro, Octávio Ianni (1988: 83), o que se considera património é a Arquitetura, a música, os quadros, a pintura e tudo o mais associado às famílias aristocráticas e à camada superior em geral. A Catedral, frequentada pela “gente de bem”, deve ser preservada, enquanto a Igreja de São Benedito, dos “pretos da terra”, não é protegida e é, com frequência, abandonada.

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Os monumentos considerados como património pelas instituições oficiais, de acordo com Eunice Durham (1984: 33), são aqueles relacionados à

“história das classes dominantes, os monumentos preservados são aqueles associados aos feitos e à produção cultural dessas classes dominantes. A História dos dominados é raramente preservada.> (FUNARI, 2001)

Evidencia que a alienação é um reflexo histórico e político, visto que um grupo que não sabe seus valores, não se reconhece, e acredita numa falsa identidade, ou numa projeção do que faz parte de sua cultura e de sua memória. Diante disso, a educação patrimonial é uma ação fundamental para a preservação do patrimônio, a não realização repercute de forma negativa, pois se torna difícil obter o apoio da sociedade para a preservação destes bens, por desconhecimento quanto à importância que os mesmos têm para a manutenção da memória coletiva, não valoriza, e principalmente, rejeita as medidas de preservação impostas pelo poder público. (Medeiros e Surya, 2009) Quando há o reconhecimento das camadas que compõem a sociedade

brasileira, a mesma se apropria e está apta a elencar os objetos e significados que

compõe

sua

identidade,

sendo

assim,

facilitada

as

formas

de

reconhecimento dos bens que possuem valor patrimonial, e posteriormente, melhores planos para salvaguardar os mesmo.

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Em suma, é notória que a consciência patrimonial é fundamental para garantir a preservação do patrimônio coletivo, visto que quando um povo compreende o que é seu, ressurge os sentimentos de representatividade e pertencimento, que promove cuidados mais pertinentes aos bens patrimoniais e ajudando fortemente na aplicabilidade de políticas de preservação. O patrimônio cultural pertence aos grupos e a comunidade que produzem sua significância. Para se pensar em proteção destes bens, é necessário pensar no interesse da própria comunidade em salvaguardar. Pois se uma sociedade souber reconhecer e valorizar o seu patrimônio, estará dando considerável avanço para garantir a continuidade das relações entres os agentes e seus bens patrimoniais, e, consequentemente, emancipação cultural das gerações futuras. Para o IPHAN a Educação Patrimonial constitui-se de: <todos os processos educativos formais e não formais que têm como foco o patrimônio cultural, apropriado socialmente como recurso para a compreensão sócio-histórica das referências culturais em todas as suas manifestações, a fim de colaborar para seu reconhecimento, sua valorização e preservação. Considera-se, ainda, que os processos educativos devem primar pela construção coletiva e democrática do conhecimento, por meio da participação efetiva das comunidades detentoras e produtoras das referências culturais, onde convivem diversas noções de patrimônio cultural.> (IPHAN)

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A aplicabilidade de políticas educacionais rebate a uma série de premissas conceituais: os grupos sociais envolvidos devem participar efetivamente das ações educativas; os bens culturais fazem parte da espacialidade das pessoas e consequentemente, da vida das pessoas; A medição é fundamental para o sucesso do processo de conscientização do patrimônio; acreditando que o

patrimônio é um complexo campo de conflitos e de interesses de diferentes partes; a tese de que os territórios são detentores da contemplação educativa; as políticas

públicas voltadas

às ações

educativas

devem

levar

em

consideração as inter-relações e a intersetorialidade. No IPHAN temos o projeto Casas do Patrimônio, a qual sendo a principal iniciativa nesse sentido. As principais diretrizes que devem nortear as ações de Educação Patrimonial decorrem de um longo processo de debates institucionais, aprofundamentos teóricos e avaliações das práticas educativas voltadas à preservação do patrimônio cultural. Tal programa educacional tem como diretrizes um projeto pedagógico, com ações de educação patrimonial e de capacitação que visam fomentar e favorecer a construção do conhecimento e a participação social para o aperfeiçoamento da gestão, proteção, salvaguarda, valorização e usufruto do patrimônio cultural. Fundamentam-se, ainda, na necessidade de estabelecer novas formas de relacionamento entre o IPHAN, a sociedade e os poderes públicos locais.

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Um dos seus objetivos é interligar experiências e espaços que promovam práticas e atividades de natureza educativa de valorização do patrimônio cultural. Não restritas à instalação de uma estrutura física, as Casas do Patrimônio têm como desafio ampliar o diálogo com a sociedade a partir da educação patrimonial, multiplicando locais de gestão compartilhada de ações educativas e de construção das políticas públicas de patrimônio cultural. As intenções desse programa é transformar as sedes do IPHAN e instituições parceiras em polos de referência sobre o patrimônio cultural, promovendo a criação de novas práticas de preservação, sobretudo por meio de ações educacionais formais e não formais em parceria com escolas, agentes culturais, instituições educativas não formais, coletivos, grupos e demais segmentos sociais e econômicos. Contudo, constata-se que a consciência patrimonial da sociedade é um dos mecanismos mais eficiente para garantir a continuidade e preservação dos bens

patrimoniais. Visto que além de uma sociedade que reconhece seu patrimônio, como parte da sua identidade, da sua memória e sua história, a mesma reflete nos cuidados e contribui para a manutenção dos valores significativos que fomentam a significância cultural dos patrimônios brasileiros.

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2.0 - Objeto Empírico: Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho


Imagem 04 - do autor (2018)


g  d dd Tddg d Ed [] gddg Fgvd d-dd g g


Faixa 07 - Exaltação à Mangueira - Estação Primeira de Mangueira – Hino da Mangueira -

https://www.youtube.com/watch?v=dYtJHVCKOLM



Ilustração 08 - É verde e rosa a cor da tua bandeira Símbolo maior de uma escola de samba, o seu pavilhão, traz a fusão de todos os elementos de pertencimento e simbologia que uma escola de samba traz: as suas cores, a sua ancestralidade, a sua religiosidade, a luta de resistência de uma voz, de um povo, de um samba, que persistem em representar uma comunidade. É tudo isso que fomenta um pavilhão. Inspirada nas cores da congênere Estação Primeira de Mangueira, a Escola de Samba Preto Velho, abre seu desfile trazendo em seu pavilhão, a referência da sua memória. Das cores escolhidas por Cartola para representar o povo de Mangueira, que a portabandeira, em seu maior respeito, conduz nos seus rodopios, o desfraldar de um pavilhão que representa seu povo: em suas cores e emoções.


N

N

Imagem 05– Foto Satélite de Olinda Fonte: Google Maps, 2019

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N

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Imagem 06 - Planta de Situação e Locação. Do autor, 2019


“É verde e rosa a cor da tua bandeira...” Mergulhar nesse mundo do samba é de um grande prazer, mas não acreditava que estaria debruçando num universo tão amplo e rico na verde e rosa do Alto da Sé. Amor ao samba sempre fez parte da minha essência, mas conhecer a história do Preto Velho, me fez reacender e descobrir verdades sobre mim profundamente, reconhecer minha ancestralidade, minha identidade, e resgatar parte da minha memória desconhecida até então. Ao desbravar a história dessa agremiação rebati, desde o início, com dificuldades, resistências e limitações que poderiam, facilmente, fazer-me desistir de revelar a importância desse bem. Mas com persistência, ao acreditar que

temos uma responsabilidade diante do que consideramos nosso e do papel que podemos somar ao cuidar, contribuindo de alguma maneira para a sociedade. Além de enriquecer meu eu, foi uma das maiores motivações de conhecer, pesquisar e tornar-se visível a história desta escola de samba, o Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho. Tentar interpretar e compreender minhas intuições foram os maiores alicerces para persistir na continuidade deste trabalho. As inquietações foram muitas, e a

intenção de trazer esse legado para meio acadêmico, esse bem com tanta riqueza, como elemento de resistência e valor patrimônio

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excepcional para a comunidade olindense, pernambucana e brasileira, pois fomentam culturalmente nossa identidade, memória e historia da cultura popular brasileira. Ao debruçar na pesquisa da história da Escola de Samba Preto Velho foram encontrados

diversas

dificuldades

em

todos

os

âmbitos:

do

registro

historiográfico, do acesso a informações desde a procura pelos seguimentos da escola, presidentes e diretoria, os quais foram encontrado algum tipo de resistência em contatar e obter respostas. Em conversas paralelas com amigos que teria certa intimidade com os dirigentes atuais, descobri dessa maneira informal, que a agremiação estava passando por um processo jurídico. Em busca de tais informações, foi constatado, ao comunicar ao IPHAN, que o bem passava por um processo jurídico o qual mesmo diante de pesquisa acadêmica, as informações do processo, ou informações sobre a agremiação só poderiam ser consultadas diante da autorização do

responsáveis legais do imóvel, e além de tudo, o IPHAN em seu acervo afirmou que não havia nenhum tipo de registro em seu acervo que constatasse informações do Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho. Diante dos percalços encontrados, foram encontrados, como dito anteriormente, uma resistência em comunicação com os dirigentes do bem. Tais tentativas de comunicações ocorreram por volta de agosto de 2018 quando este trabalho se encontrava na fase de elaboração inicial.

122


Mesmo diante das dificuldades, a insistência em trabalhar com o Samba do Preto Velho não me fez cessar, e sim pelo contrário: buscar outras alternativas que, seguindo o objetivo primordial deste trabalho, de explanar a significância cultural deste bem. Passando alguns meses, em fevereiro, conheci uma senhora chamada dona Juju, durante o carnaval na Marques de Sapucaí e de forma instintiva contei a história das dificuldades que havia acontecendo para dar continuidade a este trabalho. Perguntei se tais problemas ocorriam por alguma intervenção espiritual. Visto que ao estudar as estórias dos carnavais encontra-se bastante presente a necessidade de autorizações espirituais para adentrar em estudos e até mesmo fazer um carnaval que abrangesse entidades espirituais. Em continuidade a conversa, Dona Juju me esclarece duas coisas que considerei relevante: toda escola de samba ao nascer, ao surgir, ela tem uma finalidade e um propósito, todas possuem um fundamento. E frisou novamente: tudo tem um fundamento! E

em continuidade aconselhou procurar o fundador, ou os fundadores da agremiação que através dele ou deles eu conseguiria desatar os nós que estão impedindo o andamento da pesquisa. Passou-se o carnaval e voltei a pesquisa deste trabalho e na primeira manchete que surge ao pesquisar Escola de Samba Preto Velho no Google, encontro uma notícia bastante triste a qual destaco a seguir. (Imagem 07)

123


Ao ler a notícia (Imagem 07) algumas esclarecimentos são revelados:

Ele sempre teve empenho em manter a cultura e a arte do samba viva. É uma perda irreparável para todos nós. Clóvis tinha um jeito bem calado, mas com muita seriedade e respeito tirou muitos jovens das drogas e os colocou em aulas de percussão. Ele tinha o poder de resgatar a cultura e salvar as pessoas. Jacy Lima “Dinda” integrante do Associação Carnavalesca de Samba de Olinda (Acaso) Clóvis foi um dos principais incentivadores do samba em Olinda e ajudou difundir o ritmo nas ladeiras de cidade não apenas no carnaval, mas ao longo de todo o ano. O corpo do sambista está sendo velado na Sede da Escola de Samba Preto Velho até as 15h. O enterro acontecerá na tarde deste sábado (10), no Cemitério de Guadalupe, também em Olinda. Ele também foi cofundador da Associação Carnavalesca de Samba de Olinda

(Acaso). Como diretor da escola de samba, intensificou os ensaios, realizados sempre aos domingos, na sede da agremiação, localizada no Alto da Sé. “Ele vivia para o Preto Velho. Sempre batalhou pela melhoria da escola e defendeu o samba de corpo e alma”, afirmou Henrique Guimarães, mais conhecido como Deco, presidente da Acaso e diretor de bateria do grupo de samba Patusco.

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Imagem 07: Manchete da reportagem do Redação OP9 novembro 10, 2018 às 08:47 - Por: Redação OP Captura de tela em 04-06-2019 Disponível em: < https://www.op9.com.br/pe/noticias/morrepresidente-da-escola-de-samba-preto-velho-de-olinda/>

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Como forma de financiar a agremiação e melhorar a estrutura da sede, Clóvis também abriu as portas do Preto Velho para outros estilos, festas e manifestações culturais. “Sempre teve essa cabeça de abrir o espaço para outras coisas. Ele sabia que isso ajudava na manutenção do lugar. E também era muito tranquilo. Caía o Mundo e ele não estava nem aí”, recorda a DJ e produtora cultural Lala K, que há mais de dez anos realiza festas e prévias de blocos carnavalescos no salão da escola. Orlando de Paula, amigo de infância de Clóvis, lembra que o Preto Velho é a única agremiação de Olinda que defende o samba-enredo de raiz. “E ele insistia muito nisso e achou outras formas de expandir isso. Foi assim que ele levou a escola pra concorrer no desfile de escolas de samba do Carnaval do Recife”, pontua o amigo. Nascido na Rua Bertioga, no Carmo, Olinda, Clovis morava no mesmo local e frequentava a sede da escola quase todos os dias. Ele deixa um

filho, que mora em São Paulo. (Por: O Portal do Sistema Opinião) Na reportagem é revelado o quanto Clóvis possuía um amor a sua agremiação e como refletia em suas atitudes um papel social juntamente a Escola de Samba Preto Velho, sendo um dos principais incentivadores e

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resistentes em perpetuar o samba em Olinda, abrindo as portas do Preto Velho para outras manifestações culturais da cidade de Olinda, com consciência de que estava fomentando a permanência do samba do Preto Velho no Alto da Sé. E vale ressaltar no ultimo comentário da reportagem, o depoimento do seu amigo Orlando de Paula, ao afirmar que Clóvis defendia a essência do samba de enredo de raiz, estilo de samba esse que caracteriza essencialmente as escolas de samba e reflete todas as dificuldades e resistência do ritmo continuar existindo. Partindo de Clóvis Ferreira, defensor do samba na cidade de Olinda, e ultimo presidente do Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho, inicia-se o desdobramento da historia dessa escola de samba, revelando desde a sua significância cultural e mostrando a sua importância e resistência do samba na Cidade Alta de Olinda.

A seguir o depoimento na íntegra de Clóvis Ferreira ao livro “Olinda – Patrimônio Cotidiano – Memória Coletiva dos seus moradores”, ICEI BRASIL, Olinda, de agosto de 2017. O qual faz-se menção no início deste trabalho. Onde os autores procuraram explanar as vozes dos moradores que fomentam a identidade e memória coletiva do Sítio Histórico de Olinda. Revelando histórias que costuram os recortes e refletem na essência de cada lugar e expressão cultural q habita nesse recorte espacial tão valoroso e rico de brasilidade.

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<Meu nome é Clóvis Ferreira Barbosa, sou presidente da agremiação Preto Velho há dez anos. Quase ninguém me chama pelo nome da carteira de identidade: chama por Clóvis do Preto Velho ou Clóvis do Alto da Sé. Trabalho com uma manifestação da cultura carnavalesca, que é a escola de samba. Acompanhei a fundação do afoxé Alafin Oyo, em 1986. Pouco depois, de 1988 para 1989, foi o envolvimento com o samba

reggae-Mandela,

em

homenagem

ao

sul-africano

Nelson

Mandela, que, mesmo na cadeia, liderou o movimento contra o apartheid. Quando o apartheid terminou, em 1990, a banda mudou de nome para Azane e Cauã. Depois desse trabalho, foi quando eu me engajei como diretor da Escola de Samba Preto Velho, da qual, atualmente, sou o presidente. A escola de Samba Preto Velho foi fundada em 24 de dezembro de

1974 pelo pessoal da Galeria Preto Velho, um ponto comercial de fabricação e revenda de artesanato, no Alto da Sé; Hélio Lobo, que na época, era cobrador da empresa Oliveira de ônibus; Mario Moreno, marceneiro da prefeitura; e Ercílio Berlamino, que era advogado e também trabalhava na Prefeitura de Olinda; e outros. Como eu disse, a galeria era um ponto comercial, alugado por Póca, para vender artesanato fabricado por ele e por seus irmãos.

128


Era uma alternativa de um trabalho extra para quem, por exemplo, dava expediente na prefeitura, pois à tarde eles abriam a galeria. Todo mundo era artesão e produzia talhas com motivos dos casarões e das igrejas de Olinda e bustos do preto velho (figura dos cultos de Jurema). Depois passaram a revender, também, réplicas das peças do Mestre Vitalino, produzidas por artesãos de Caruaru. Isso era a galeria. As peças para venda na galeria eram feitas por eles, que compravam talhas de madeira bruta, o cedro em que desenhavam e talhavam com formão. Eles faziam as próprias talhas e colocavam à venda e , às vezes, até revendiam para um cidadão que tinha lá, chamado Tonho Negão, que comprava em quantidade e levava pra Caruaru para revender. Tonho Negão era da rua Bispo Coutinho, numa casa do lado da sede do Preto Velho, ele também fazia talhas e colocava para revender na sua casa o material de barro vindo de Caruaru. Hélio passou a guardar na galeria os instrumentos musicais de um time de peladeiros, empregados da empresa Oliveira. O surdo, o tarol, a caixa-reqpique, os tamborins e o agogô serviram para animar as rodas de samba de uma charanga do time. As rodas de samba, na galeria, era estilo pagode – quando se

cantavam musicas de Agepê, Fundo de Quintal, Martinho da Vila e

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e outros. Acontecia nas tardezinhas dos sábados, quando a galeria fechava e as pessoas iam tomar uma cervejinha. Logo, passaram a vir pessoas de outros bairros – o pessoal da família de seu Pinininho, que eram fundadores da Pitombeira antiga; Nininho da Rua da Palha; vieram pessoas do Amaro Branco, onde já existia o Oriente, clube onde se fazia samba; depois, vieram alguns meninos do Amparo participar dessas rodas de samba. Daí foi crescendo e tomando proporção de coisa grande. Foi se intensificando cada vez mais e com pessoas da comunidade. Depois que Olinda “começou a frequentar o ambiente”, não demorou muito para surgir a ideia da criação de uma escola de samba no Alto da Sé. Nasceu a Escola de Samba Preto Velho. Para não fugir do modelo das outras escolas de samba de Pernambuco, tudo procura copiar o que se faz no Rio de Janeiro. Não existem mais escolas de samba 5 de Outubro, Vai Quem Quer,

Marrom Branco e a Escola do Zé. Todas essas desistiram. Hoje em dia, aqui em Olinda, pelo meu conhecimento, só desfilam no carnaval as escolas Preto Velho, Oriente, Acadêmicos de Sítio Novo e os recentes blocos D’Breck e Patusco. Este último já é um nome antigo, fundado como um clube anárquico, de 1962. Nenhum dos fundadores era filiado ao santo’. Na verdade todos eram católicos. Até os anos 1990 ninguém era da religião dos casamento

130


Orixás. Depois, eu aderi ao culto da Jurema, no qual eu presto homenagem ao mestre Preto Velho. Faço parte da mesa de dona Lia,

da

rua

Bertioga,

onde

tenho

organizado um ponto para manter a paz. Entre os desfilantes, no entanto, muitos pertencem ao “santo”. Algumas meninas que saem de baianas são mães de santo, assim como alguns batuqueiros e diretores

ogãs.>

Clovis

Barbosa,

Olinda

são –

Patrimônio Cotidiano – Memória Coletiva dos seus moradores, 2017

Imagem 08 – Clóvis Barbosa Fonte: Olinda – Patrimônio Cotidiano – Memória Coletiva dos seus moradores, 2017

131


132


 Av dv A g Cd Evv Agg-Z  g dvd  TdF []


Faixa 08 - A Grande Constelação das Estrelas Negras - Beija-flor de Nilópolis – 1983 Compositores: Neguinho da Beija-flor e Nêgo Intérprete: Neguinho da Beija-flor

https://open.spotify.com/track/45WhTnvV3FSbneIGRJ2nys



Ilustração 09 - As pretas velhas Yaôs Como uma sábia preta velha, Dona Juju, aquela senhora que conheci na Marquês de Sapucaí, com seu jeito doce parecia saber o que estava dizendo, no pequeno conselho de procurar os fundadores para conhecer os fundamentos da escola, parecia até os conselhos de minha mãe, se revelou tanto ao deparar com uma importante parte da história dessa escola ao descobrir o depoimento de Clóvis ao livro Olinda – Patrimônio Cotidiano – Memória Coletiva dos seus moradores, e nas suas intenções como defensor do samba e sua resistência, seu legado com certeza foi deixado para muitos.


d d  Bdd g  [] vd d Ed Td Avd dd

137


Faixa 09 - Linda, eternamente Olinda - Portela - 1997 Compositores: Doutor, Renato Vale, Tonico da Portela e Eli Penteado IntĂŠrprete: Rixxa

https://www.youtube.com/watch?v=5rM6SCJQ9_s



Ilustração 10 - Oh Linda, Eternamente Olinda! O belo samba de enredo da Portela para o Carnaval de 1997 retrata elementos que compõem a paisagem e a essência da cidade de Olinda, cidade onde encontra-se a Escola de Samba Preto Velho. Elementos estes que estão presentes na Declaração de Significância de Olinda, documento utilizado na inscrição para inserção na Lista de Patrimônio Mundial. E o Samba do Preto Velho pincela seu lugar nessa paisagem singular. Oh, linda! Olinda!


2.1 O lugar – Sítio Histórico de Olinda Para compreender a Significância Cultural de um bem se faz necessário somarse os elementos que compõem espacialmente o seu entorno. Situado no polígono de tombamento do Sítio Histórico de Olinda (SHO), o Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho, tem em sua essência elementos que compõem particularidades que estão presentes em diversas esferas simbólicas que fomenta o Sítio. O SHO está localizado no Estado de Pernambuco, na região Nordeste do Brasil perfazendo uma área territorial de 44 km². Fazendo parte da região metropolitana do Recife, Olinda possui aproximadamente 400 mil habitantes segundo IBGE 2010. Em seus limites temos ao norte a cidade de Paulista, ao sul

e oeste com a cidade do Recife e ao leste o Oceano Atlântico. (Ver Imagem XX). Em 1968 o SHO foi tombado pela antiga Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – DPHAN, atualmente IPHAN, e elevado a monumento nacional em 1980. E em 1982 foi inscrito na Lista de Patrimônio Mundial (WHL) como bem cultural e recebeu o título de Patrimônio da Humanidade pela Organização das Nações Unidas (UNESCO). Contando com aproximadamente 120 ha de

extensão territorial do núcleo inscrito na Lista de Patrimônio e com 920 ha como zona de amortecimento, abrangendo os bairros de Amaro Branco, Amparo, Bonsucesso, Carmo, Guadalupe, Monte, Rosário, Sé e Varadouro.

141


Imagem 09: Município de Olinda, limites e localização do Sítio Histórico (ZEPEC 1 – Lei 4849/92). Fonte: DIM/ SEPLAMA 2004 apud Moreira 2006,32. 142


Imagem 10: PolĂ­gono de Tombamento do SHO - CECI, 2010

143


Imagem 11 - Guia ilustrado do Sítio Histórico de Olinda Fonte: TripAdvisor, 2018 144


Os critérios considerados para inscrição do SHO no WLH foram: (ii) exibi um importante intercambio de valores humanos, durante um período de tempo ou dentro de uma área cultural do mundo, sobre a evolução da arquitetura ou da tecnologia, das artes monumentais, do planejamento urbano ou Paisagismo; e o critério (iv) – exemplo excepcional de um tipo de construção, conjunto

arquitetônico ou tecnológico ou de paisagem que ilustra estagio significativo na historia da humanidade. Na declaração de significância do SHO, cada bem identificado foi listado e caracterizado, nota-se que na lista encontra-se apenas bens construídos de cunho material, os quais totalizando aproximadamente trinta edificações entre igrejas, passos e palácios. Porem é destacado que o valor excepcional atribuído vem do conjunto integrado entre os elementos construídos e os naturais, levando a inscrição à categoria de “Grupo de Edificações”, com a seguinte consideração: “o equilíbrio harmonioso entre as construções, jardins, vinte igrejas barrocas, conventos e numerosas pequenas capelas (passos), associados, contribui para o charme particular de Olinda.”. No trecho da declaração de significância de Olinda revela as descobertas que o caminhar pelo SHO pode proporcionar: “Uma das vinte e tantas igrejas e conventos barrocos, ou os numerosos “passos” (capelas ou oratórios), surge inesperadamente ao virar um canto – o requinte de sua decoração em contraste com a simplicidade encantadora das casas, que são pintadas em cores vivas ou revestidas com azulejos.”.

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encantadora das casas, que são pintadas em cores vivas ou revestidas com azulejos.”. Nota-se que o atributo das casas com “cores vivas” está associado à sua forma de pintura, em cores vibrantes e colorido no conjunto, elemento esse adicionado com o passar dos anos pelos moradores do SHO, se tornando, hoje, um dos atributos que compõem uma das características do SHO, sendo reconhecida e tida como uma das suas marcas de identidade. E é notório que tal característica que fomenta o casario seja incorporada as novas construções e até nas novas edificações que, de forma indevida ou não, adicionaram tal elemento em suas fachadas. Visto que o empoderamento do SHO devido seu reconhecimento mundial como Patrimônio da Humanidade, torna-se um lugar vulnerável a alterações por parte dos seus moradores em decorrência dessa valoração que torna o lugar sensível as tais decorrências inapropriadas. Visto que é notória a importância da permanência do tecido material urbano

das edificações que compuseram um marco histórico do SHO, desde antes da invasão holandesa, como todo o conjunto edificado constituído após o retorno dos portugueses ao domínio. Porem, mais que esses registros históricos que são revelados pela materialidade da arquitetura existente, vale considerar a permanência da essência do lugar por meio da forma como se usufrui do espaço: o inesperado virar de um canto, o casario simplório e as suntuosas igrejas e suas torres que

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marcam pontos focais e de descoberta do lugar, a massa arbórea dos quintais, os quais fomentam uma paisagem singular. Um verdadeiro conjunto de elementos que compõem uma singularidade ao SHO e que são revelados ao desbravar esse polígono valioso. O valor histórico está expresso no traçado urbano, por meio de suas ruas,

becos e vielas, que traçam em ladeiras e configuram trajetos dos mais inusitados e cheios de história. Traçado esse testemunho do processo de ocupação que ocorrera no período português, o qual seguia um desenho medieval refletido na defesa por meio da altura. Valor expresso também no casario, conjunto arquitetônico composto de casas de forma homogênea e com sua composição com os monumentos religiosos de mesmo estilo. E nota-se diante da conjuntura espacial a singularidade da paisagem, fomentando ao lugar um valor paisagístico expresso na relação harmoniosa entre o traçado, os elementos construídos, casario e igrejas, à massa vegetal dos quintais e jardins, juntamente com a relação com o mar, configurando uma paisagem única ao SHO. No Plano de Gestão da Conservação do Sítio Histórico de Olinda/PE, pelo (ITUC-CECI 2009) destaca-se em sua produção: “o Sítio Histórico está implantado sobre um conjunto de colinas contínuas ao mar, cuja singularidade do meio ambiente construído é conferida especialmente pelas igrejas com suas torres, que estruturam o tecido urbano e compartilham o protagonismo da cena com o meio ambiente

147


natural ondulado dos quintais mescla-se aos tons terrosos dos telhados e dialoga com o azul do mar, compondo assim, uma paisagem singular”. Diante de todos os atributos e elementos que compuseram a Significância Cultural do SHO, expressa pelo o conjunto de valores que resistiram na história desse

polígono,

revelando

valores

históricos,

paisagísticos,

artísticos,

arquitetônicos e urbanísticos, é notório que as relações com tais valores às formas de viver no passar dos anos conformaram novos valores ao Sítio e aqueles agentes que diariamente compõem as particularidades que o lugar apresenta, agregando nessas novas relações novos valores, como os valores de usos e os simbólicos. Que por sua vez, em suas complexas relações sociais configuraram a significância imaterial do SHO, as quais estão reveladas nas suas manifestações culturais, nos hábitos dos moradores, na resistência de suas agremiações

carnavalescas,

fomentando,

assim,

a

identidade

de

uma

sociedade e de um grupo de olindenses, e que ultrapassa as limites de uma

comunidade, de um bairro e de uma cidade, e se torna marcos da sociedade contemporânea brasileira. Os valores simbólicos atribuídos e expressos no SHO vem da resistências de testemunhos do passado, que se refletem nas suas tradições, desde as religiosas às profanas, como procissões e carnaval, as manifestações culturais, as danças, a culinária expressa nas tapioqueiras, o artesanato que configura um dos elementos expressivos pelo artesão olindense e as amor

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artes plásticas. Configurando, assim, um inestimável conjunto de elementos culturais que configuram uma imaterialidade inestimável. O sentimento de pertencimento, de memória coletiva compartilhada entre os moradores com sua essência e suas raízes, gerando uma profunda relação afetiva ao sitio: relações sociais, com participação ativa das camadas que compõem o SHO e

redondezas. O valores de uso são revelados desde outrora como o valor que faz o lugar existir e possuir essa identidade viva e singular. As relações dos moradores com o espaço, como refletem em suas manifestações artísticas e religiosas, na conformação do carnaval, por exemplo, como elemento de fusão das massas culturais e artísticas do sítio, se faz tudo devido a permanência dos seus moradores e a preservação das características que fomentam os valores de uso, como a permanência do uso residencial ao longo do tempo, o uso religioso refletido nas procissões. A presença dos ateliês e galerias de arte no SHO. Tais elementos que ao longo do tempo refletiram na identidade do polígono, em consequência da interação entre os moradores, os artistas plásticos, poetas, músicos e todos aqueles que fomentam a cultura popular em Olinda. É notório que os valores destacados e valorados na Declaração de Significância do SHO, apesar de quase 40 anos após o reconhecimento e listado no WLH (1982), o polígono de tombamento possui a permanência de tais atributos e valores que afirmam a sua excepcionalidade cultural.

149


Todavia, mesmo diante do reconhecimento o caráter excepcional do acervo histórico-cultural do Sítio Histórico de Olinda, eles não garantem que áreas livres e os imóveis que compõem esse grande acervo sejam objetos de obras e intervenções irregulares. Visto que tais atuações colaboram para à perda dos aspectos autênticos dos bens, colocando, assim, em risco a manutenção dos valores atribuídos ao conjunto tombado. A partir do registro do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE), em que constata a perda da qualidade da preservação do SHO e na sua ambiência, recomentou a elaboração de um Programa de Educação Patrimonial. Visto tamanha demanda, o Centro de Estudos Avançados da Conservação Integrada, realiza a elaboração de um manual de boas normas perante o casario, denominado “Conservar – Olinda boas práticas no casario”, com a finalidade de indicar aos moradores informações e condutas adequadas. Mesmo diante da proteção dos valores patrimoniais por meio d leis e títulos que

atestam e promovem a condição singular do SHO, os mesmo não garantem a seguridade dos bens, o que pode gerar sérios riscos de desaparecimento. Além da possibilidade do Sítio Histórico entrar na lista de patrimônios em estado de risco, da UNESCO e do IPHAN.amor

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O objetivo do manual é orientar os moradores, desde proprietários aos locatários, arquitetos e publico em geral sobre as Boas Práticas de intervenção nos imóveis do SHO, de forma que minimizem as intervenções que acarretam a perda dos atributos significativos dos bens e proporcionem boas condições de uso e habitabilidade dos imóveis e, principalmente, a garantia da continuidade

dos aspectos que fomentam a Significância Cultural do Sítio. Para que as intervenções no SHO garantam a conservação dos valores patrimoniais do Sítio, é necessário o reconhecimento social dos atributos do mesmo. Visto que são através dos atributos de um bem tombado que deferidos os devidos valores patrimoniais. Os atributos reconhecidos pelo SHO são entendidos como a base física que compõe e estrutura o conjunto tombado e que se expressa nas relações entre a os objetos construídos e a natureza. Porém, nota-se que o as relações sociais não são citadas como relevantes para o fomento da significância do Sítio, fazendo pensar que o Sítio é reconhecido pelos aspectos paisagístico, arquitetônicos e monumentais, pelo traçado e pelo seu valor histórico. Porém vale refletir que tipo de cidade valorizamos quando quem faz ela pulsar no dia-a-dia não é frisado ao se reconhecer como patrimônio da humanidade. Visto que todos os valores que compõem a significância do Sítio foram provenientes das relações entre aqueles que ali registraram a história.

151


Ao diluir os elementos que compõem a paisagem do Sítio, são mencionados o casario antigo, a diversidade tipológica do mesmo, seus elementos estilísticos e suas técnicas construtivas; revela-se o mar, a vegetação dos quintais, praças e parques; juntamente ao traçado urbano e a topografia acentuada, que se harmoniza com a volumetria do casario e seus telhados em tons terrosos. Conformando um conjunto de elementos que representa uma harmonia visual singular. Observa-se que ao citar os elementos que compõem a singularidade do SHO, os elementos que compõem sua significância cultura, são elementos que apresentam aspectos materiais, desde naturais aos construídos. Enquanto as relações sociais, as manifestações culturais provenientes no espaço, o encontro entre o dia-a-dia do morador e os lugares que compõem o sítio, não são mencionados, considerando fatos apenas históricos que datam de um tempo passado.

Mas e o presente? As relações entre a comunidade local e adjacências, a interatividade por parte de todas as camadas sociais e culturais que compõem o Sítio. Vale considerar que tais elementos são totalmente relacionados com a forma de viver e preservar o patrimônio, e que conformam juntamente aos aspectos históricos e materiais, a significância cultural de Olinda.

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Mesmo diante do conhecimento de que a permanência dos atributos e significados culturais reconhecidas ao Sítio Histórico de Olinda seja pautada por tais elementos, e que o mesmo tenham significância devido a conservação ao longo do tempo, vale considerar que a cidade de Olinda e seu Sítio é pautado de aspectos que permanecem devido um olhar particular de cada

agente que fomentou seus valores ao longo do tempo. E que as relações do presente devem afirmar juntamente aos aspectos materiais e históricos. O Olinda é uma constante fonte de produção de significados, devido a sua rica história e acervo. E que a mesma não deve ser olhada como um cemitério ou museu da historia, da arqueologia e da arquitetura mundial, e sim como uma cidade, com vivencias, relações, produção cultural, manifestações artísticas, etc. de forma dar continuidade na escrita da historia de Olinda. Entretanto para continuidade dos atributos e significados

atribuídos e

reconhecidos ao SHO, é anunciado por um conjunto de valores, os quais são considerado o tempo como o critério maior para afirmação de tal valoração, visto que é pelo estado do bem e como ele se manteve ao longo do tempo. Diante dessa perspectiva de valoração, foram constatados os seguintes valores: valores históricos, paisagísticos, urbanísticos, arquitetônicos, artísticos e culturais.

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As relações da Escola de Samba Preto Velho com o Sítio Histórico de Olinda, se fez presente ao longo da sua história, pelas interações do seu cortejo carnavalesco nos dias de carnavais, percorrendo o Sítio Histórico, levando seu samba, ressoando seus tambores ladeiras a baixo, com o gingado no pé de seus passistas, dos rodopios e cortejo do mestre-sala para a sua dama portabandeira, das suas baianas que giram levando axé e ancestralidade pelas ruas da Cidade Alta. O percorrer pelas ruas marcaram histórias, fizeram dos foliões que procuraram seguir seus batuques, a extravasar sua alegria e afirmar ao longo desses mais de 40 anos, que Olinda tem samba e que muitos dos olindenses se sentem representados. O percurso que a escola faz em seus carnavais agregam valor ao espaço, a relação do folião com o percorrer de vias, ladeiras, pulando seu carnaval. A simbologia dessa expressão cultural é magistralmente representativa, reflete a identidade de uma comunidade.

As ruas da Cidade Alta não são as mesmas sem o gingado do samba do Preto Velho. Visto que a rua e o carnaval de rua, é uma das manifestações mais democráticas culturais brasileiras, que não difere quem brinca, quem pular ou quem apenas observa. Ela é inclusiva, ela é popular, ela é do povo! Que o carnaval de rua olindense seja sempre agraciado pela presença do samba do Preto Velho.

154



Ilustração 09 - Vem pode chegar. Que a rua é nossa mas é por direito. A rua Bispo Coutinho, onde encontra a agremiação, é um extensão do seu interior. Eventos, festividades, esquentas de carnaval, tudo começa e termina na rua. Um dos palcos que o Preto Velho usufrui para mostrar seu samba


2.2 O arruado e o Alto da Sé - Entorno Imediato A rua Bispo Coutinho agrega um conjunto de casas, em sua grande maioria, centralizadas no

lote;

possui

o

mercado

de

artesanato

exatamente ao lado da Escola de Samba Preto Velho, o qual foi construído como uma das propostas do IPHAN para

realocação de

vendedores de artesanato. Verifica-se na imagem ao lado (Imagem 12), que as casas possuem características diversas do casario das demais rua do SHO, nota-se que sua ocupação é mais contemporânea das demais casas e sobrados encontrados no SHO. Na fotografia (Imagem 14), datada de meados dos anos 30, notamos que só no inicio da rua havia algumas construções Imagem 12– Rua Bispo Coutinho. Fonte: Autor desconhecido

constatando que a o lote da agremiação passa a ser ocupado, com construções, a partir de no mínimo anos 30. O primeiro registro da Rua Bispo Coutinho no Jornal Diário de Pernambuco, é datado de 14 de fevereiro de 1893. (Imagem 15).

157


Na rua Bispo Coutinho circunda toda a Praça da Sé, nela encontramos a Caixa D’água de Olinda, o Museu de Arte Sacra de Pernambuco e a icônica Igreja da Sé de Olinda. Apesar de receber o logradouro da Rua Bispo Coutinho como endereço, o GRES Preto Velho se encontra em um arruado abaixo da praça, numa depressão com um nível de cerca de 2,5 m do nível da Praça da Sé.

Imagem 13: Mapa doAlto da Sé, detalhe para Rua Bispo Coutinho e arruado. Fonte: Google Maps, 2019 Legenda:

158

Rua Bispo Coutinho

Arruado onde localiza-se o GRES Preto Velho


Imagem 14 -Vista aérea do Alto da Sé e adajaências. Detalhe para o arruado da Rua Bispo Coutinho em meados dos anos 30. Fonte: Antônio Oliveira, Pernambuco Arcaico., S/Ano A arruado da Bispo Coutinho hoje é considerada uma extensão da Escola de Samba Preto Velho, onde ensaios são realizados, esquentas de saída de desfiles de carnaval, sendo um local de concentração para as festividades que ocorrem no Preto Velho, como verifica-se na Imagem 14.

159


Imagem 15 Fonte Diário de Pernambuco., 1893

Imagem 16 Fonte Diário de Pernambuco., 1980

Convite para prestigiar a Procissão de Cinzas, a qual tinha como parte do seu trajeto a rua Bispo Coutinho. Quase cem anos mais tarde, a rua continua a fazer parte de procissões, como verificamos no noticiário do dia 31 de março de 1980. Desta vez a Procissão do Senhor Morto. (Imagem 16) 160


dg Cvdd vg dd  EKC [] dd  dd Edd Z


Faixa 10 - Kizomba, a Festa da Raça - Unidos de Vila Isabel - 1988 Compositores: Rodolpho, Jonas e Luiz Carlos da Vila Intérprete: Gera e Jorge Tropical

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Ilustração 10 - Nossa sede é nossa sede No carnaval de 1988, a Unidos de Vila Isabel ganhava seu primeiro carnaval e gritava pela sua maior vontade: ter sua quadra. A escola ensaiava nas ruas de Vila Isabel e seu refrão desse carnaval antológico ela não só fazia uma grande Kizomba ela marcava seu espaço, seu território e aclamava pela sua cede. E não é diferente com a Escola de Samba Preto Velho, a mesma luta arduamente para manter sua sede no Alto da Sé, e consta da sua fundação a partir do momento que a sede é agraciada aos fundadores da escola. Uma escola sem cede, é uma escola sem terreiro, uma escola sem terreiro, ela não é ninguém! A territorialidade faz parte da essência das escolas de samba, as quais gritam pela sua comunidade e seu povo, seu bairro, seu morro, sua rua.


2.4 O lote - O bem construído Em 1988, a Unidos Vila Isabel, escola de samba do Rio de Janeiro, fazia uma grande ‘Kizomba’ na Sapucaí, e juntamente ao cantar os cem anos do fim da

escravidão, a escola afirmava no refrão do seu samba o anseio em ter sua quadra: “nossa sede é nossa sede..” O que firmava não somente o grito de festa pela liberdade que ali se comemorava, mas pela sua ânsia de ter sua sede oficial. Para quem conhece o mundo das escolas de sambas, sabe que a posse de uma quadra tem um significado extremo que vai além da utilidade como um espaço para ensaios para os desfiles, rodas de samba ou shows. As quadras das escolas de samba possuem em suas comunidades um papel social fundamental, o qual podemos verificar até mesmo na Escola de Samba Preto Velho., além de referências que ancestralidade, aspectos de territorialidade, como verdadeiros terreiros espirituais de candomblé ou umbanda. A relação de identidade e territorialidade entre os usuários, moradores e visitantes para com as manifestações simbólico-culturais nos arredores do Alto da Sé, enriquece e materializa os signos que definem a identidade dos sujeitos que usufruem, que por sua vez, constituído dos elementos que compõe esse espaço, atribuindo uma identidade a este território, proporcionando um lugar. detentor de expressividades culturais.

165


Evidencia-se a territorialidade formada juntamente aos moradores, e das interferências frequentes devido o forte turismo ao local. Diante deste fato, observa-se que a GRES Preto Velho como elemento de identidade cultural direta para a comunidade que reside no Alto da Sé, no próprio sítio histórico inserido e nos arredores da Cidade Alta. Quanto ao objeto como bem arquitetônico inserido num conjunto urbanístico e paisagístico de valor cultural, vale-se avaliar seu estado de conservação. Quantos aos órgãos responsáveis pelas suas fiscalizações, visto uma grande preocupação com estado de conservação dos bens, sendo o bem autuado pelo IPHAN por inapropriadas modificações na estrutura física do edifício. Como problematiza PEDROSA (2011), em sua dissertação, sobre o estado de conservação do conjunto arquitetônico civil no CHO, em que o sítio sofre com a promoção de intervenções arquitetônicas no conjunto civil patrimonial que alteram atributos morfológicos e tipológicos que contribuem para a perda de

valores urbanísticos, arquitetônicos, artísticos

e paisagísticos que foram

atribuídos ao Sítio como Patrimônio Cultural da Humanidade em 1982. Ao analisar o edifício se evidencia, em meio ao conjunto inserido, uma arquitetura vernacular através da presença de características comuns, pelo sistema construtivo e ao casario de seu entorno, o qual composto por:

166


1) a localização do lote na quadra, por meio de lotes estreitos; 2) a localização do edifício no lote, geminado nas duas laterais, ou seja, no limite do lote; 3) adaptação do terreno e edificação na topografia do terreno; 4) nos aspectos volumétricos, são observados as linhas de cumeeira paralela ao alinhamento da rua, a inclinação das águas. 5) Fachada com modificações e adaptações são logo da sua história, com uma linguagem de pastiche, vide uma referência ao casario mais nobre do entorno da Sé; 6) sistema de coberta, com estrutura em madeira (traves, caibros e ripas), as quais com o passar do tempo foram alteradas, adaptadas, e, devido a falta de um profissional apto a intervir num edifício que possui características peculiares, a coberta foi perdendo, ao longo do tempo, sua integridade, e até mesmo se distinguindo do casario inserido; possui seu fechamento por

meio de telha tipo cerâmica colonial, tipo capa e bica, com beiral e platibanda com calha; 7) alvenaria tipo mista, composta por tijolo de 8 furos e pedras; 8) revestimento da alvenaria em argamassa de cal e areia; 9) revestimentos internos do piso em cimento queimado, cerâmicas; 10) quintal revestido de cimento queimado, não possuindo solo impermeável.

167


Quanto aos usos do espaço, evidencia-se uma configuração de adaptação interna do edifício para uso tipo ‘salão’, tendo sua parte coberta em sua grande parte aberta para as rodas de samba e festividade, possuindo apenas quatro cômodos: a bilheteria, o bar, um depósito e os sanitários. Devido a não autorização para levantamento do edifício e impedimento de plantas baixas por parte do IPHAN, devido a autorização do proprietário , segue uma planta esquemática do lote:

Imagem 17 - Vista da Caixa D’água Fonte Autor desconhecido, S/Ano 168

Imagem 18 - Vista da Caixa D'água de Olinda Fonte Autor desconhecido, S/Ano


Imagem 19 - Fachada do GRES Preto Velho. Fonte: Autor Desconhecido, S/Ano

Imagem 21 - Fachada do GRES Preto Velho. Fonte: Autor Desconhecido, S/Ano

Imagem 20 - Fachada do GRES Preto Velho. Fonte: Autor Desconhecido, S/Ano

Imagem 22 - Fachada do GRES Preto Velho. Fonte: Autor Desconhecido, S/Ano

169


Imagem 23 - Fonte: Blogpost da escola, S/Ano

Imagem 24 - Planta Esquema – 1: Salão|2: Bilheteria | 3:Bar |4: Terreiro;|5: Wc Fem.;|6: Wc Masc. | Sem escala Fonte: O Autor, 2019

Imagem 25 - Fonte: Blogpost da escola, 2012

170

Imagem 24 - Corte Esquemático | Sem escala Fonte: O Autor, 2019


d E Ivd vdv Rd v d d [] Tg dg ggdg dg


Faixa 09 - Tambor - Acadêmicos do Salgueiro - 2009 Compositores: Moisés Santiago, Paulo Shell, Leandro Costa e Tatiana Leite Intérprete: Quinho

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2.4 O samba – Ancestralidade – Das congêneres à Olinda A musicalidade africana está notoriamente refletida nos acordes do samba, gênero

musical

tido

como

um

dos

ritmos

brasileiros

mais

conhecidos

mundialmente, resumindo um dos maiores atributos dados a uma escola de samba. O samba surgiu nos terreiros brasileiros por meio da derivação de batuques produzidos por negros escravizados, em que os mesmos remetiam tal expressão às suas ancestralidades. Rituais religiosos que faziam associação a elementos da natureza, gerando uma difusão pessoas ritualística através do bailado e do toque de tambores de couro esticado, gerando uma percussão e, consequentemente, uma dança característica.

Imagem 26 - Pintura de J. Mortiz Rugendas registra o batuque de negros no Brasil do século XIX Fonte: Commos 173


Sobre a etimologia da palavra samba há diversos consensos por parte daqueles que historiam esse ritmo genuinamente brasileiro. O primeiro registro em meio físico, se tem em 1838, no estado de Pernambuco, especificamente na revista O Carapuceiro. Com divergências por parte dos estudiosos sobre a origem do samba e da palavra propriamente dita, temos algumas definições diante da real origem por parte dos pesquisadores e historiadores: tem-se, segundo Nei Lopes, origem étnica quioco, significando ‘brincar’, entretanto, para outros historiadores vem do quimbundo “semba”, com significado de oração ou umbigo, nome este que designa um ritmo ainda praticado pelos povos angolanos. Como dito, a música para as religiões de origem africana, conformavam um dos atributos que compõem o ritual religioso como todo, e na umbigada, o batuque e dança estava diretamente associada ao sagrado para esses povos, através da associação com elementos da natureza e rituais de fertilidade, e também, a

uma força maior a qual eles cultuavam e acreditavam.

174


A partir do Semba, dança africana do Congo e Angola, que os portugueses descobriram no século 18, que o etnólogo Camara Cascudo descobriu três tipos de danças que continham a base do ritmo que originou os sambas brasileiros. Essas danças são: a dança da umbigada, a de pares e a de roda. Trazidos ao Brasil pelos escravizados, esse ritmo e dança, se desenvolveram-se

em uma área de colonização que vai desde o Maranhão até São Paulo, recebendo em cada estado brasileiro, um nome diferente e um jeito diferente de se expressarem e serem tocadas. Dessas ramificações deste ritmo africano, originaram-se ritmos como o Tambor de Crioula no Maranhão; o bambelô no Rio Grande do Norte; o coco, o milindo, o Piauí e samba no Ceará e na Paraíba; o coco de parelha trocada, o coco solto, o troca parelha ou coco trocado, o virado e coco em fileira em Pernambuco; o samba de roda e o batebaú na Bahia; o jongo, o samba-lenço, o samba-rural e o samba de roda em São Paulo; o caxambú, o jongo, o samba e o partido alto no Rio de Janeiro. Na

configuração

atual

das

escolas

de

samba,

encontramos

diversos

seguimentos tradicionais que utilizam da dança como forma de expressão artística: temos o bailado do mestre-sala e porta-bandeira, a ala de passistas e ala de baianas.

175


O casal de porta-bandeira e mestre-sala apresentam-se usando trajes que representam a nobreza do século XVIII, porém com adição de elementos mais volumosos e trabalhados em plumas, paetês e pedrarias. Historicamente falando, o surgimento da figura do casal nas escolas de samba vem do período da colonização quando a corte portuguesa realizava o entrudo nas casas grandes. Registro constatam que durante o entrudo, um casal de escravos, encantado com a festa, passou a acompanhar o movimento andando atrás do festejo, observando ao longe o bailar elegante da corte com suas roupas de gala. Com o passar dos anos, os negros adotaram o entrudo como uma festa, e durante as festividades, um casal imitava seus senhores, com tons de gozação. Com o passar, do tempo o casal passou a fazer parte da tradição da festa. Tornando um dos elementos que conformam a identidade de uma escola de samba. Nos desfiles das escolas de samba por todo o Brasil, o casal apresenta um

bailado avaliado pela corte julgadora,com uma apresentação especial para os jurados, com o objetivo de atingir a nota máxima. Tendo como critérios de julgamento, o bailar suave ao ritmo do samba, fazendo passos considerados obrigatórios, como meneios, giros, meias-voltas, mesuras e torneados.

176


Além desses critérios, o casal é julgado pela harmonia entre o seu bailado, a interação entre os mesmos, pelo cortejo do mestre-sala em proteção e cortesia a porta-bandeira e ao seu pavilhão. Considerando, também, para a portabandeira, aspectos como o cuidado de não deixar enrolar a bandeira ou bater no corpo do mestre-sala, de forma graciosa e correspondendo aos

cortejos do mestre-sala. A vestimenta do casal deve apresentar aspectos como:acabamentos

bem

feitos

e

extremamente

luxuosos,

adequadas

à

apresentação e ao enredo defendido. Outra expressão de dança encontrada nas escolas de samba, são as tradicionais alas de passistas, que refletem o verdadeiro samba no pé. Tradicionalmente, elas foram chamadas de cabrochas, para as mulheres, e bambas para os homens. O passista, na atualidade, é uma das poucas figuras das escolas de samba que fazemos relação do samba no pé, que seria a fusão da música, ritmo gerando o movimento de dançante. Na escola de samba Preto Velho, as passistas que compõem a ala durante os desfiles no período momesco, são dos bairros dos arredores do Sítio Histórico de Olinda, vindo do Amparo, Guadalupe e bairros adjacentes.

177


178


 Agv d B IvK Eg Td dg [] dd dd v vv


Faixa 10 - Você Semba de Lá, Que Eu Sambo de Cá - O Canto Livre de Angola - Unidos de Vila Isabel - 2012 Compositores: Evandro Bocão, Arlindo Cruz, André Diniz, Leonel e Artur das Ferragens Intérprete: Tinga

https://open.spotify.com/track/5o0LeeXCxAh96bMe1vO2LM


2.5 Levantamento histórico do Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho 1974 • Uma família de artesões, da Galeria Preto Velho (Imagem 28), de escultura em madeira de talha de Olinda aos domingos fazem rodas de samba no fim da tarde, após o fechamento da galeria,e aos poucos atraem moradores do Alto da Sé e arredores;

• Em 24 de dezembro de 1974 a Escola de Samba Preto Velho é fundada na rua Bispo Coutinho, 581, no Alto da Sé pelo grupos de artesões da Galeria

Imagem 28 - Foto da Galeria Preto Velho e seus Fundadores. Meados da década de 70 Fonte: Blogpost da escola, S/Ano

Preto Velho.

1976 • Primeiro registro no Jornal Diário de Pernambuco (Imagem 29 Anexo B01) data de 7 de novembro de 1976, onde o Preto Velho é citado como a escola

Imagem 29 - Fonte: Diário de Pernambuco, 1976

de samba do personagem que gerou o famoso bloco da quarta de cinzas Bacalhau do Batata.

181


1977 • O samba do Preto Velho começa a abrilhantar participando dos festivos carnavalesco. É uma das atrações do bloco

Elefante (Imagem 30 –

Anexo B 03) • Participação na programação do Micarema, na Rua do Bonfim, ganhadora do prêmio de melhor decoração do carnaval anterior. Nota-se a relação entre os festejos , com a presença do samba do Preto Velho, acontece a procissão da

Imagem 30 - Fonte: Diário de Pernambuco, 1977

Ressurreição da Igreja de São Francisco percorre o SHO. (Imagem 31- Anexo B 04) As relações das manifestações carnavalescas juntamente com as festividades religiosas da igreja católica, com procissões e missas, é uma das características das festividades da cultura brasileira: Uma fusão entre o sagrado e o profano.

Imagem 31 - Fonte: Diário de Pernambuco, 1977

182


1978 • O uso do espaço público como meio de territorialidade, expressar seu samba, por meio de seus

batuqueiros,

de

forma

gratuita,

com

participação do publico que visita Olinda à procura de lazer (Imagem 32 – Anexo B 08). Os

ritmistas

tomam

caráter

importante

na

identificação da agremiação, os ‘batuqueiros’ tomam protagonismo ao referir-se à escola, visto que são eles que produzem o som característico

das escolas de samba.

Imagem 32 - Fonte: Diário de Pernambuco, 1978

183


1978 • Nas vésperas do carnaval de 78, a escola de samba

Preto

Velho

despontava

na

programação do carnaval, como divulgado em janeiro, do mesmo ano, pela Prefeitura de Olinda. (Anexo B 05). Informando a saída do desfile a frente da Galeria Preto Velho, no alto da Sé. O lugares que o Preto Velho marca presença começam a ser revelados, a relação com a sua sede, seu entorno imediato., com a praça da Sé e

a rua Bispo Coutinho. Além de se torna uma entidade carnavalesca se despontando como relevante destacada

no na

carnaval

olindense.

programação

do

Sendo carnaval,

juntamente a tradiconais blocos e manifestações carnavalescas de Olinda, como Homem da MeiaNoite, Mulher do Dia, entre outros (Imagem 33 –

Anexo B 07)

Imagem 33 - Fonte: Diário de Pernambuco, 1978

184


1979

Imagem 34 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1979 185


1979

Imagem 35 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1979

186

Imagem 36 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1979


1979 • As reportagens para o carnaval de 79 já reflete com mais consistência, a afirmação da escola no carnaval de Olinda, desde a sua repercussão e as reações dos foliões durante seus últimos desfiles. • Para este ano, a escola canta um enredo que aborda a história de Olinda no período holandês, e já destaca, (Imagem 34), como a agremiação vem composta para este desfile. As relações com a comunidade se afirma, e o papel social se destaca neste ano. O samba de enredo toma papel relevante como articulador entre a comunidade carnavalesca e a agremiação. Devido a gravação do samba enredo juntamente às músicas de outras agremiações carnavalescas; • E apesar das dificuldades em por o carnaval na rua, a escola destaca a ambição de se torna uma das maiores escolas de samba de Olinda.

1980

Imagem 37– Fonte: Diário de Pernambuco, 1980 187


1980

Imagem 38 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1980

188

Imagem 39 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1980


1980

Imagem 41 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1980 189


1980

Imagem 42 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1980

190

Imagem 43 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1980


1981

Imagem 44 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1981

Imagem 45 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1981

191


1982

Imagem 46 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1982

192

Imagem 47 - Fonte: Diรกrio de Pernambuco, 1982


1983

Imagem 48 – Fonte: Diário de Pernambuco, 1982

Imagem 49 – Fonte: Diário de Pernambuco, 1982 193


1984

Imagem 50 – Fonte: Diário de Pernambuco, 1982 194

Imagem 51 – Fonte: Diário de Pernambuco, 1982


Anos 2000 Ano

Colocação

2009 2010

Campeã

2011

4º lugar

2012

Campeã

Carnavais da Escola de Samba Preto Velho Grupo Enredo Uma viagem cultural, Pernambuco, 2 imortal, imortal! Da origem da vida, a cada dia a dia, as 1 mãos em forma de fantasia Vou dançar, vou festejar, balançar, fazer Especial zueira, numa viagem as festas brasileiras. 1

O piano minha paixão, a musica uma vida inteira muito prazer, sou Nelson Ferreira

Carnavalesco Mario Canuto Mario Canuto Mario Canuto

Ricardo Angeiras

Tabela 01. Fonte: Blogpost da escola. 2008

•Apenas em 2009 que o GRES Preto Velho conseguiu desfilar ao lado das grandes escolas de Recife. As letras dos sambas de enredo desses 4 carnavais estão no anexo D deste trabalho.

195


2008

Imagem 52. Fonte: Blogpost da escola. 2008

196


2009

Imagem 53. Fonte: Blogpost da escola. 2009

197


2009

Imagem 54. Fonte: Blogpost da escola. 2009 198


2012

Imagem 55. Fonte: Blogpost da escola. 2012

199


2012

Imagem 56. Fonte: Blogpost da escola. 2012

200


j Bd Rdvd Agdgd Rd  dd Cdg jdd []


Faixa 13 - Candaces - Acadêmicos do Salgueiro - 2007 Compositores: Dudu Botelho, Marcelo Motta, Zé Paulo e Luiz Pião Intérprete: Quinho

https://open.spotify.com/track/4Dsk2XsSy8FYanrRSyzdoj


3.0 - Identificação de atributos e significados


204


A Partir do levantamento histórico documental; das vivências nas escolas de samba, nos terreiros de Umbanda e Candomblé; das visitas à Escola de Samba Preto Velho e a troca de conversas e informações informais com segmentos e visitantes; dos estudos dos elementos que compõem uma escola de samba, desde o samba enredo até a logística do processo de conformação de um

desfile e de funcionamento de uma escola; foi possível fazer uma interpretação dos signos que compõem a agremiação carnavalesca, e que conformam sua significância cultural. Diante desse processo, das metodologias de observação, de desenho de observação, leituras e vivências nos campos que conformam a escola, foram elencados 17 atributos que, com sua particularidade, e em conjuntos, nas suas diversas formas de interação, revelam a Significância Cultural do Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho. Sendo elementos sugeridos para validação juntamente os agentes envolvidos diretamente com a agremiação, para assim, proporciona um documento que fomente os atributos e significados que configuram a essência imaterial e material da escola, que representam os valores patrimoniais do bem estudo, para que propiciem melhores diretrizes de intervenção para o bem. Assegurando os aspectos sensíveis a interpretação e reconhecimento de cunho imaterial, os quais representam a sua singularidade.

205


206


dv Cgdd Egdd  dg g gv

 gd  j dg


Faixa 14 - Com dinheiro ou sem dinheiro, eu brinco- Estação Primeira de Mangueira - 2018 Compositores: Lequinho, Júnior Fionda, Alemão do Cavaco, Gabriel Machado, Wagner Santos, Gabriel Martins e Igor Leal Intérprete: Ciganerei https://open.spotify.com/track/660Ac2MDjp8pSq9ByyRsD6


3.1 - Lista de atributos interpretados Nº

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18

A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

209


210


3.1.1 – A sede O valor arquitetônico, dado pela sua sede é

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

representado pela própria edificação onde se

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18

A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

encontra a escola, refletindo uma tipologia local,

nas

técnicas,

materiais

e

sistemas

construtivos aplicados no decorrer da história da construção da história de Olinda, os quais foram verificados a partir de levantamento iconográfico, conversa com usuários e agentes especialistas

em

arquitetura

e

construção.

Verificam-se também modificações que o bem sofreu ao longo dos anos desde a inserção da escola

de

samba.,

funcionalidades

da

se

adaptando

escola,

como

as a

necessidade de um salão livre para as rodas de samba.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados Logo, para compreender o bem arquitetônico, situado no Alto da Sé, se fez necessário o embasamento por meio do manual Conservar: Olinda Boas Práticas no Casario, em que o mesmo fornece informações e parâmetros de intervenções adequadas ao Sítio , e tem

211


3.1.1 – A sede

“Nossa sede é nossa sede...” 2019 1974

Imagem 57: Esquema da evolução da pintura da fachada Fonte: do autor, 2019 como objetivo orientar àqueles que desejam realizar obras de conservação, reformas ou restauração no casario antigo da Cidade Alta. Neste manual levanta informações pertinentes e básicas para compreender o contexto do bem analisado está inserido. A sede é um tipo de terreiro, onde os segmentos da escola de samba fazem sua

história, afirmam sua ancestralidade e soltam sua voz através do samba.

212



Ilustração 11 - Nossa sede, é nossa sede Sede da agremiação desde 1974. Localizada na rua Bispo Coutinho, número 681 no Carmo, em Olinda


3.1.2 – Rodas de samba de enredo

“Bate na lata pro povo sambar!” Desde sua fundação, as rodas de samba do

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

Preto Velho sempre estiveram na agenda do

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

caderno de atrações e festividades do jornal Diário de Pernambuco. Os eventos, na maioria das vezes aos domingos, chamava os sambistas dos arredores de Olinda, turistas que visitam o sítio histórico, e, claro, seus segmentos.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

215


3.1.3 – Rodas de samba aos domingos O domingo sempre foi um dia sagrado para as

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

rodas de samba do Preto Velho. Tido como um

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

dia de descanso para muitos, era a forma como os fundadores

tinham de fazer seu sambinha

depois de uma semana de trabalho. A efetividade das festas, celebrações

e

esquentas de carnaval ainda se afirma nos domingos, afirmando um dos seus atributos e características

mais

marcantes

para

a

agremiação. O domingo no Preto Velho faz parte da memória do samba olindense.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

216


3.1.4 – A musicalidade A produção musical da agremiação é refletida

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

em seus cantores, nos seus ritmistas e no

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

repertório musical. Os sambas cantados são um reflexo da própria historia do samba, da agremiação e das pessoas que ali convivem. O samba é voz de um povo, o tambor que ressoa é o pulsar em vibração e os acordes da melodia dos sambas são a forma de envolver os signos

que

conformaram

o

samba:

ancestralidade, percussão, negritude e voz de um povo. Refletidos em sambas de roda, sambas de enredo, samba raiz, pagode, swingueira e todos os ritmos que o Samba do Preto Velho abraça e envolve aqueles que se deixam levar por essa musicalidade.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

217



Ilustração 12- Na ginga do corpo, na batida do pé. Axé! Axé Desfile e dança dos foliões e integrantes da GRES Preto Velho pelas ruas do Sítio Histórico.


3.1.5 – A dança maior

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

representatividade no samba. Derivado da

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

A

dança

é

um

dos

elementos

de

comunicação corporal desde os primórdios, dos ancestrais

africanos,

que

utilizam

dos

movimentos do corpo para cultuar e reverenciar seus orixás e mestres espirituais. O sambar nas rodas do Preto Velho é uma das expressões artísticas tão genuínas e comuns de cada grupo de dança e escolas de samba.

Agregando ao bailado influencias de outros ritmos locais. Ao longo da história do GRES Preto Velho verificamos as rodas de sambas e desfiles que o bailado

característico

está

diretamente

presente e associado à todos os eventos que ocorrem na agremiação.

220

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados



Ilustração 13- Nos Quatro Cantos cheguei Bailado da Porta-bandeira e do mestre-sala Nos Quatro Cantos em Olinda


3.1.6 – O samba de enredo Intitulado como Patrimônio cultural do Brasil, o samba-enredo, em destaque nesse trabalho, ultrapassa as fronteiras da Cidade Maravilhosa, do limite geopolítico, e se lança no território nacional, assim, percorrendo e adentrando por todo o território brasileiro, se afirmando e contribuindo

para

além

da

cultura

local

carioca: tornando um bem de identidade nacional. E um dos atributos mais relevantes do Samba do Preto Velho. Tomado

como uma dos

atributos mais relevantes desse bem. Sendo não apenas simples gêneros musicais, mas uma forma de expressão, que reflete modos de socialização e referencias de pertencimento., sendo também referencia cultual brasileira. Atributo presente em todas as festividades e

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

eventos na agremiação.

223


3.1.7 – Desfile no carnaval

“Pecado é não brincar o carnaval!” O desfile durante o carnaval, especificamente

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

na terça feira de carnaval, é um dos atributos

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

mais relevantes do bem. Ele envolve um fusão dos

seus

demais

atributos,

fazendo

uma

expressão cultural artística excepcional. O desfile da escola é um dos dias mais esperados

pela

agremiação,

a

produção

criativa de indumentárias, fantasias, elementos alegóricos que fundem a essência das escolas

de samba: um profusão de cores, significados e representatividade.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

224



Ilustração 14 - Pecado é não brincar o carnaval. Desfile da Escola de Samba Preto Velho arrastando multidões descendo a Ladeira da Misericórdia no período momesco na terça-feira de carnaval. Ao alto o detalhe da torre da Igreja da Misericórdia. Marcando um ponto focal.


3.1.8 – Percurso do desfile no Sítio Histórico Nos carnavais do início da década de 80, o percurso do desfile da Escola de Samba Preto Velho era divulgado no Diário de Pernambuco, e tal atributo do bem, é pertinente para sua Significância, visto que é a sua forma de apropriação

do

espaço

do

seu

entorno,

expressando sua manifestação cultural, onde podemos observar as relações entre os agentes da agremiação, os moradores, os foliões e, principalmente,

as

relações

espaciais,

a

territorialidade afirmada a cada lugar da

Cidade Alta. Vale salientar os pontos focais, os de paradas e os elementos arquitetônicos, monumentos urbano

e

são

juntamente colocados

com

o

traçado

como

pontos

estratégicos de forma que o folião se situe espacialmente.

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

227


Imagem 58 – Fonte: Diário de Pernambuco, 1982

228



Ilustração 15 - Ôôô, somo a voz do povo. Vem como pode no meio da multidão. Desfile da Escola de Samba Preto Velho arrastando multidões descendo a Ladeira da Misericórdia no período momesco na terça-feira de carnaval.


3.1.9 – Contemplação da paisagem Vista panorâmica do Sítio Histórico de Olinda, a

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

partir do quintal (fundos) da agremiação, tendo

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

como composição dessa paisagem singular a presença do convento de São Francisco com o mar ao fundo, o conjunto de igrejas do SHO, especialmente avista para Igreja do Carmo, o descortino da cidade de Recife ao longe, podendo observar o Istmo, o Porto do Recife, as edificações que compõem a zona central, norte

e até o inicio da zona Sul da cidade do Recife. A perspectiva que os fundos do Preto Velho proporciona, afirma uma dos seus maiores atributos, que por sua vez, reflete com um dos atributos que mais caracterizam e definem o SHO: a paisagem singular., relação entre o mar, o sítio com seu casario, telhados terrosos e

vegetação abundante dos quintais, jardins e

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

praças.

231


232



Ilustração 16 - O morro desnudo e sem vaidade Participar das rodas de samba e das festividades do Preto Velho é ganhar o privilégio de sambar c contemplar uma das paisagens mais belas e conhecidas mundialmente: uma contemplação da Do Sítio Histórico do Alto da Sé, juntamente com a beleza de seu casario, coqueiros, jardins, conversando com o mar e ao fundo o descortino da cidade do Recife


3.1.10 – Expressão afro-brasileira As escolas de samba refletem em seus elementos,

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

a ancestralidade afro. As escolas de samba

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

provenientes dos terreiros , dos batuques do negros escravizados, é uma conexão com à história dos negros

no Brasil. Refletindo sua

produção artística e cultural, que perpetua nas escolas de samba.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

235


3.1.11 – Relações religiosas As relações às festividades religiosas, festa do

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

Preto Velho em 13 de maio, as representações

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

do

seu

símbolo

maior

aos

elementos

da

Umbanda, da conexão espiritual com o lugar, o terreiro

do

samba

tido

como

um

terreiro

religioso. Como um forma de expressar a essência religiosa do samba, refletida também na Escola de Samba Preto Velho.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

236



Ilustração 17 - Oxalá, derrame bênçãos sobre nós


3.1.12 – Escultura do Preto Velho da fachada A escultura da fachada da agremiação é uma

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

forma de ressiginifcar a relação com a sua

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social

história da galeria de artes, pela escultura talhadas em madeiras; com o seu símbolo; pela religiosidade; e também uma apropriação da arquitetura.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados A escultura chama atenção dos turista que Imagem 59: Escultura do Preto Velho da Fachada da agremiação. Fonte: do autor, 2018

visitam a Sé. E já se tornou um dos ‘cartões

postais’ para aqueles que gostam de fotografia.

239


240



Ilustração 18 - Pergunte aos seus ancestrais. Dos antigos carnavais, nossa raça costumeira Símbolo da agremiação, com bastante relação à ancestralidade, a religiosidade, está esculpido na fachada da sede, e atrai todos os curiosos que visitam a agremiação ou a Sé de Olinda. E sempre chama atenção dos turistas para uma fotografia a frente da sede ao seu lado.


3.1.13 – Escultura do Preto Velho A escultura do Preto Velho que fica no interior da agremiação, foi uma escultura utilizada em seus desfiles, que ficou como uma espécie de

totem

da agremiação. Que nela reflete seu

período de desfiles em Recife, quando a escola disputou na liga das escolas de samba durante os carnavais de 2009 até 2013.

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na Fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

Imagem 60: Escultura de Preto Velho. Fonte: Preto Velho, Blogpost do GRES Preto Velho. Ano desconhecido

243


3.1.14 – O pavilhão O pavilhão da agremiação é um símbolo maior que uma escola de samba carrega. Nele reflete todo o seu povo, suas lutas, seu canto, e sua história. O respeito a este bem, é uma forma de respeitar todos os segmentos da escola, sua ancestralidade e sua história.

Imagem 61: Bandeira da Escola de Samba Fonte:Preto Velho, Blogpost da escola. Ano desconhecido

244

Nº 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na Fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social Tabela 01 – Lista de Atributos e significados


3.1.15 – Acervo documental A precariedade de registro documentais da agremiação é um dos problemas enfrentados durante a pesquisa. Porém uma coleta do que se tem, é uma forma de proporcionar a memória do bem. A documentação em forma de dossiê é uma estratégia para guardar registros da história e proporcionar a sua memória às futuras gerações.

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18

A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na Fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência social Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

245


3.1.16 – Acervo fotográfico O registro fotográfico é uma técnica a qual

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

historiadores podem usar como métodos de

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na Fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência Social

leitura de uma história. Devido a simplicidade da agremiação, poucos registros fotográficos foram feitos durante sua história, e os poucos exemplares dessa história refletidos

em

fotografias

devem

ser

considerados e preservados. Pois reflete uma memória que compõem a identidade deste bem.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

Imagem 62: Fundadores da agremiação a frente da Galeria Preto Velho, Fonte: Blogpost da escola. Meados de 80/82

246


Imagem 64: Visita da Cantora Alcione Fonte: Blogpost da escola. 1980 Imagem 63: Visita da Cantora Alcione Fonte: Blogpost da escola. 1980

Imagem 65: Visita da Cantora Alcione Fonte: Blogpost da escola. 1980

247


3.1.17 – Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé O bem arquitetônico está situado em um Sítio

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

Histórico, em que o mesmo é regido por leis de

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na Fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência Social

proteção

nos âmbitos federal,

estadual e

municipal. Além de ser detentor de títulos de patrimônio em escalas internacionais, como o titulo concebido pela UNESCO como Patrimônio Cultural

da

Humanidade

em

1982,

categorizando-o como Sítio Histórico.

e

E as

vivências e relações com o arruado da Bispo

Coutinho

e

a

Praça

da

afirmam

a

territorialidade, que é um dos atributos mais fortes nas escolas de samba. O sentimento de pertencimento a um lugar, reflete diretamente nos aspectos que promovem a identidade desse grupo social.

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

248



Ilustração 19 - Vem, pode chegar. Que a rua é nossa, mas é por direito As relações com a Praça da Sé e a rua Bispo Coutinho vem desde os primeiros carnavais do Samba do Preto Velho. Seus desfiles sempre iniciam e terminam no largo da praça. E a rua Bispo Coutinho é quase uma extensão da sede, com ensaios e esquentas de carnaval, tudo acontece ali.


3.1.18 – Resistência Social

“Mas o samba faz Essa dor dentro do peito ir embora...” As relações de resistência social está muito

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

agregada as políticas de exclusão do negro

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18

A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na Fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência Social

na sociedade, e em consequência, reflete diretamente nas suas manifestações culturais. Com o samba não foi diferente, a resistência de um cantar sempre foi uma marca dos chicotes de uma elite que tentam negar a importância e valor desse povo. O Samba do Preto Velho é uma casa de

resistência,

abriga

um

grupo

renegado

socialmente, desde sendo por negros, pobres, homossexuais, mulheres

negras,

entre

outras

minorias que se sentem abraçados nesse terreiro de samba. Que a voz do samba seja a voz desse povo. E que o Samba do Preto Velho possa abraçar

todas as causas e necessidades que uma

Tabela 01 – Lista de Atributos e significados

sociedade enfrenta diariamente.

251


252c



Ilustração 19 - Meu canto é resistência no ecoar de um tambor! O ressoar do tambor do Preto Velho, é um marcação no espaço do grito de existência. O samba cura! O samba faz dor ir embora! O samba é a voz do povo!


3.2 - Lista de atributos sugeridos para validação com atores sociais Nº

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

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A sede Rodas de samba de enredo Rodas de samba aos domingos A musicalidade A dança O samba de enredo Desfile no carnaval Percurso do desfile no Sítio Histórico Contemplação da paisagem Expressão afro-brasileira Relações religiosas Escultura do Preto Velho na Fachada Escultura do Preto Velho O pavilhão Acervo documental Acervo fotográfico Rua Bispo Coutinho e Praça da Sé Resistência Social

1 Não entra

2 Inclinad o a não

3 Inclinad o a sim

4 Extra

Tabela 02 – Lista de Atributos e significados para serem validados pelo agentes sociais do bem SUGESTÕES DE OUTROS ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS Nº

ATRIBUTOS E SIGNIFICADOS

1 Não entra

2 Inclinad o a não

3 Inclinad o a sim

4 Extra

Tabela 03 – Lista de Atributos e significados sugeridos pelos agentes sociais do bem 255


256


Considerações Finais Este trabalho de conclusão de curso se propôs revelar a Significância Cultural do Grêmio Recreativo Escola de Samba Preto Velho, e proporcionar reflexões sobre as relações e interpretações do Patrimônio Imaterial, a partir da descoberta da memória de um povo, que reflete a sua identidade, e consequentemente, registra a sua história no tempo e no espaço. Trazendo reflexões diante das maneiras como os especialistas da conservação valida um bem, os métodos de reconhecimento do patrimônio, e como ele as relações direta com o bem estudado pode proporcionar visões mais precisas da realidade e essência do objeto que se analisa. Tais conclusões são confirmadas a partir da experiência nos âmbitos que compõem os atributos da escola de samba analisada, desde a visitação de terreiros e outras escolas de

samba para compreender os signos que configuram a identidade do objeto. Acreditando que o desenho de observação pode extrair elementos que compõem a Significância de um bem cultural, ou até mesmo a interpretação dos seus atributos por métodos não convencionais. Podendo ser ferramenta, junta a outros métodos mais pragmáticos, para obtenção de novas formas de leitura do patrimônio.

257


A conexão com a realidade que bens de cunho imaterial confrontam, contribui veementes para melhores avaliações e reconhecimento de peculiaridades que podem passar despercebidas ao avaliar um bem patrimonial. E frisa a necessidade de consciência patrimonial por partes de todos os sujeitos que confrontam os elementos que contribuem para a significância cultural de bens desta natureza. Diante de inúmeras formas, métodos e ferramentas para estudar, analisar e compreender um objeto patrimonial faz-se pensar que a mescla de métodos, pragmáticos e subjetivos, fundissem um olhar novo diante do patrimônio. Visto que as gestões do IPHAN trabalham com setores paralelos, entre o patrimônio cultural imaterial e o material, havendo uma maior necessidade de congruência entre esses dois elementos que não se desassociam, ou ao menos, não deveriam. No mais, este trabalho teve como objetivo explanar uma forma não convencional de leitura de bens culturais. A diversidade e complexidade dos

signos que compuseram o bem analisado, só confirma as inúmeras interpretações diante da magnitude dos seus atributos. E como os mesmos refletem em valores tão intrínsecos no SHO, mas que, por ventura da vida, não são percebidos, entendidos e protegidos. Visto que o patrimônio é um ser vulnerável às mãos e olhos que circundam.

258


O material apresentado é um corpo que está aberto a novas interpretações, e sua alma ela paira por diversas atmosferas, tocando aqueles que permitem compreender algo a partir do olhar novo do próximo. Sendo assim, finalizam-se estas considerações, enfatizando que as reflexões desejadas com este trabalho não questiona as formas e métodos de avaliação do patrimônio, mas que se podem existir outras formas, e que tais formas sejam mais conectadas a métodos mais focados na vivencia nos espaços, no sentir na pele,já que essa perspectiva sensorial pode trazer um olhar novo diante de todas as formas de valorizar nossa identidade e fomentar nossa memória coletiva, para assim, compreender a memória e identidade de outros grupos e expressões culturais e proporcionar a continuidade para a gerações presentes

e as próximas.

259


260


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Moderna – MARC/AL. CECI – ICCROM, 2009. Disponível em: <www.ceci-br.org>. Acesso: 10 abril 2019.para UNESCO. Convenção para a salvaguarda do patrimônio cultural imaterial. Paris, 2006. VALENTIM, Davi. Desafios contemporâneos da significância cultural. Paisagem cultural e patrimônio. Rio de Janeiro, 2018; VINÃS, S. M. Contemporary Theory of Conservation. Oxford: Elsevier, 2005;

ZANCHETI, S.;

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Samba, Agoniza mas não morre, Alguém sempre te socorre, Antes do suspiro derradeiro. Samba, Negro, forte, destemido, Foi duramente perseguido, Na esquina, no botequim, no terreiro. Samba, Inocente, pé-no-chão, A fidalguia do salão, Te abraçou, te envolveu, Mudaram toda a sua estrutura, Te impuseram outra cultura, E você não percebeu, Mudaram toda a sua estrutura, Te impuseram outra cultura, E você não percebeu. Samba, Agoniza mas não morre, Alguém sempre te socorre, Antes do suspiro derradeiro. Nelson Sargento


Na noite da morte da madrinha do Samba, Beth Carvalho, decidi ouvir suas músicas. Ao debruçar com suas letras, me fazia refletir do porquê de nomeação de ‘madrinha do samba’. Beth tinha a humildade de reconhecer grandes artistas que despontavam em rodas de samba, e tornava madrinha desses grandes artistas que eram revelados por ela. Penso que Beth tinha uma missão de não deixa o samba morrer, e quanto mais nomes e vozes a cantar o samba, mais ele resistiria. Ainda a ouvir as músicas, me deparei, visto que estava com a playlist tocando no modo aleatório, com esse samba de composição de Nelson Sargento, que até então era desconhecido para mim. Esse samba reflete e afirma a resistência eterna que o samba possui, um cantar de dor que ecoa, como diria Clara Nunes no Cantos de Areia, é um eco que entoa uma dor de perseguição. Mas seguiremos resistindo! 00:52 01-05-19



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