Revista primeiro ato

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Primeiro ATO


Editorial Diagramação e Arte: Jorge Inoue Textos: Thuran Simas Flora Pitombo Luisa Amaral Natalia Ghacham

Orientação das Performances Juliana Moraes Centro Univesitario Belas Artes de São Paulo Apresentadas em 2013


Apresentação Esta é uma revista de performance de artistas feita por artistas. Compreende-se como um treino do olhar crítico sobre um momento pelo qual dividimos com os três artistas em formação citados a diante. A revista tem como objetivo gerar questionamentos, e análises sobre três obras de artistas em processo de produção na área de performance. O objetivo não é traçar o próximo passo, nem tratar dos trabalhos como finalizados, é evidente que cada artista apresenta um tempo e um caminho especifico. No entanto, nos interessa entender o processo individual e as motivações pessoais para cada obra, visando tratar cada trabalho na etapa em que se apresenta até então. Acreditamos que é importante para o artista entender a onde se encontra e o que apresenta de fato na pesquisa e nos estudos para um trabalho de conclusão de curso. E é uma das poucas oportunidades de olharmos de perto as minúcias de cada trabalho desse grupo de artistas em formação. Assim podendo também criar reflexões sobre nosso próprio papel também como artistas, nesta revista analisamos os primeiros passos de um trabalho de conclusão, analisamos o primeiro ato destes diferentes artistas. Por Jorge Inoue


Yasmin de Liz Branco Pg 4

João Claro Pg 8

Thisby Khury Pg 12

índice


Yasmin de Liz Branco

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Yasmin aborda em seu trabalho questões de sua própria identidade em contraste com a cultura oriental, os sonhos que seu pai tem pra ela e os seus próprios. É nítido que existem dois trabalhos diferentes dentro de um só. Utilizando a linguagem audiovisual e a linguagem performática, seu trabalho se divide em duas partes completamente distintas. Tanto o vídeo quanto a ação ao vivo se sustentam como obra, porém juntos, atrapalham a abordagem do assunto escolhido pela artista. A performance inicia com Yasmin ajoelhada de frente à projeção de um vídeo, esta esculpida por seu pai. Vestida com um Quimono e uma faixa branca na cintura, típicas da cultura oriental, e um véu que cobre seu corpo, remetendo ao casamento, ao compromisso com sua criação. O vídeo-performance não possui nenhum elemento da cultura oriental e não é possível perceber que o homem que a esculpe é seu pai. O vídeo é fraco para a abordagem do assunto e pode abrir para diferentes interpretações, como o artista e sua criação, a estética feminina e até mesmo uma relação entre homem e mulher. Os efeitos de espelhamento criados no vídeo são desnecessários, não acrescentando nada à obra além de um recurso estético. Yasmin assiste ao vídeo junto ao público três vezes antes da segunda parte de sua performance, o que pode ser cansativo, já que a ação passada é bastante clara. O vídeo não seria fraco dentro da proposta se sua cultura estivesse impregnada nele, dando ao público o entendimento de seus vínculos familiares e do meio ao qual se formou. Na segunda parte da ação,

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a artista se levanta e deixa cair o véu, se direciona até um pano branco, e ajoelhada, solta o cabelo, desenrola outro pano que esta a sua frente e tira uma faca tipicamente japonesa, com ela, começa a pentear seus cabelos inicialmente devagar até se tornar rápido e brusco, por fim faz um movimento com a faca como se fosse cortar os cabelos, mas não os corta, pelo menos não no teste. A ação ao vivo é suficiente para abordar as questões de sua cultura e de sua identidade própria, a vestimenta e os elementos orientais presentes na ação forte e aflitiva, além de seus traços orientais, revelam um conflito pessoal dentro de seus costumes. Nota-se um processo de libertação desde o momento em que o véu cai até a parte em que solta e penteia os cabelos com a faca. O risco de se ferir com a faca é grande, assim como há riscos em todas as situações de mudanças. Yasmin deveria cortar seus cabelos em seu trabalho, além de torna-lo mais interessante, já é um caminho para a busca de sua própria identidade. Ao corta-los, serão colocados no pano branco e guardados como algo de valor, assim como suas referencias trazidas até então. Na performance realizada por Yoko Ono, “Cut a Peace”, Yoko em cima de um palco deixa sua ação ser guiada pelo público, que utilizando uma tesoura, cortam partes de suas roupas. Yasmin não possui a participação do público em sua ação, o que dá a noção de um próprio querer rasgar-se do velho. Tal necessidade só pode vir a ser despertada pelo meio a qual se insere, assim como Yoko tem suas roupas rasgadas pelo meio a qual se inseriu. Ambas mostram uma necessidade de moldar-se às circunstâncias, não exatamente por quererem, mas sim, por aceitação e encaixe social. Yasmin quer moldar-se ao ambiente fora de seu lar, para isso precisa deixar sua cultura em casa, e isso só depende dela. A performance num todo tem duração de aproximadamente 15 minutos, sendo um desdobramento de uma outra ação sua realizada no sexto semestre, onde ao invés de uma faca, Yasmin utilizou um pente para pentear seus cabelos e guardar os fios que caíram. Por Natalia Ghacham

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Entrevista Para você como acontece a vontade de produzir? É repentina e espontânea como um impulso inquietante que surge de uma fração ou coleção de sentimentos, ideias e sonhos. Por que a performance é a melhor linguagem para o seu trabalho? Não posso afirmar que seja a melhor linguagem, pois o trabalho se encontra no desafio de realizar uma obra híbrida entre performance e áudio visual. Entretanto, a performance é o principal dispositivo que me motiva a realizar trabalhos em outras linguagens, em forma de desdobramento. Qual a importância dos símbolos no seu trabalho e em que momentos eles aparecem? Os elementos mais importantes e simbólicos são: cabelo, véu, quimono, faca, gesso e a cor branca. Estes elementos aparecem para destacar pontualmente uma fase do ritual, no entanto, o cabelo permanece durante todo o processo, por simbolizar a passagem cíclica de um início, meio e fim, pela busca, conquista, e o desfeche de um projeto, sonho e de identidade. A cor branca também aparece durante todo o processo simbolizando a paz / início (significado ocidental) e a morte / fim (significado oriental), tentando hibridizar estes significados junto à tradição ritualística do casamento ocidental, junto com a tradição nipônica em desfazer a própria vida ou o cabelo por honra, gratidão e/ou perdão, por algo desonroso que tenha cometido perante as pessoas ou a família que o criou. A cor e seus significados são evidenciados pelo véu e quimono. Apesar de o gesso ser branco, ele não simboliza o mesmo que o véu e quimono, mas sim, o projeto e sonho que está para nascer, ser esculpido e ao mesmo tempo protegido. A faca simboliza o desfeche do ritual e do sonho.

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Jo達o Claro 8


Alguém que brinca com o corpo O artista dispôs como elementos de produção para sua obra, resultados em diversas linguagens. Entre contos, desenhos, fotos e vídeos, fica evidente o ritmo acelerado da busca pelo trabalho final. As pesquisas são muitas, a temática do Conto de Fadas e a contraposição da realidade humana imperfeita, são bem estudadas pelo artista. A produção tem potencial e apesar de habilidoso em várias linguagens se sobressai utilizando o de vídeo. Parece-nos que todo processo começa em seu imaginário, em algum espaço reservado as inspirações provenientes do que é onírico. Desse ímpeto de produzir surgem seus contos atrelados a sua bagagem de infância e de intenso interesse pela forma literária. Escritos numa abordagem didática, mas poética e super adjetivada com repetições, rimas e poesia que parecem querer dar conta de um preenchimento visual. Acessar e compreender todos os ensaios do artista e achar a temática neles a princípio é difícil. João jogou muitas migalhas de pães diferentes e pode acabar não achando o caminho para casa. Reflexo desses pensamentos e atos criativos surge o desejo de experimentar com a matéria o contato com o mundo físico e tornar-se representação. Vem o desenho, que às vezes aparece com a pintura, com traços reconhecíveis de animação, e por vezes vem como croqui de atos performáticos ou algo que compreendo dessa forma. Uma figurinha a imagem do próprio autor surge para enunciar a busca de identidade de um João genérico de diversos contos para esse menino-homem real. Em algumas pesquisas para os trabalhos não vemos a criança presente, como nos desenhos: “Criança de bigode”. Será que o João subiu no pé de feijão, descobriu que tudo era mentira e virou um gigante cansado de tanto brincar?

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De vários experimentos com desenho, pintura, fotografia e vídeo, temos a ultima amostragem de sua pesquisa, que são os registros fotográficos Blocos I em que o artista trabalha com elementos mais sintéticos ao expressar os símbolos oníricos, valendo-se de algodões (que por vezes lembram nuvens), um punhado de feijão e pequenos tijolinhos de brinquedo (presente na memória coletiva). João parece expressar um princípio de Lîla, que em sânscrito significa jogo, brincadeira, se permitindo interagir com esses objetos simbólicos da maneira mais primordial - brincando - para libertar a força criativa de seu trabalho. Em nossa língua não temos um termo que abranja todo significado da palavra que deriva da cultura hindu. Para nós se aproximaria do termo brincadeira divina, algo a ser entendido como criação, destruição, recriação e desdobramento. Expressar-se por meio de Lîla é experimentar a liberdade. Existe ainda uma distância dos objetivos no conteúdo teórico apresentado para os trabalhos práticos. Uma questão pontual para um trabalho que tem como ambição tratar de fantasia x realidade e que trata através dos contos de fada, querendo levar o real para dentro desse mundo imaginário e não o oposto. é a tarefa muito mais complexa de se criar a atmosfera que talvez propicie a empatia necessária no expectador para atingir o objetivo, mesmo que seja esse de causar estranheza com esse herói imperfeito, que pode ter insucessos. Como referência literária para o trabalho apresentamos a obra “Ser Criativo” o poder da improvisação de Stephen Nachmanovitch que trata de diversos assuntos dentro da criação em arte além de trazer aspectos sobre a poetica abordada Por Thuran Simas e Flora Pitombo

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Para você, como que acontece a vontade de produzir? A produção surge. Se surge, é porque algo invariavelmente está em algum tipo de estado de latência. E se existe algum tipo de urgência, é porque as palavras ou qualquer outro código em comum já não são suficientes, já não dão conta daquilo que é plantado, brota e cresce. Logo, a produção vem antes da vontade. Vem da necessidade e da impossibilidade. Estranho pensar desse jeito, mas saindo de um insucesso, ou seja, da impossibilidade de comunicação em um meio, a mensagem nunca fica retida. Sai de alguma maneira, brota onde tem que brotar e se ramifica pra onde a poda não alcançar. Por que a performance é a melhor linguagem para o seu trabalho ? Acho que não é a melhor, mas sim a que o resolve - por hora. E porque na verdade, tudo que sai de mim gira em torno da fonte. É um tipo de estado febril onde novamente, ou grito, ou morro. Quer dizer, se não tenho mais sentido um jeito de exprimir tudo em outros corpos, por que não exprimir no/pelo meu? Procuro uma forma de ser bloco, fundação e morador de toda a construção que ergo. Talvez na performance dê certo.

Entrevista com

João Claro

A escolha do genérico personagem “João” dos contos infantis para a pesquisa em artes, por parte de um artista de mesmo nome, não implicaria em um aprofundamento sobre a busca da identidade? Implica. Com toda certeza. E ainda assim, dentro disso, procuro uma forma de me fazer parte de um cosmo que todo leitor imagina ser micro. Ao me tornar genérico, não anulo minha identidade, só a reforço através da identidade do outro. Ou pelo menos é o que eu espero. Se coloco-me dentro daquilo que imagino parte do todo, é porque notei ligações entre tudo o que a realidade do outro - interpretada como uma fantasia - articula e se fez pertinente numa tentativa de unificação do ser. Ou seja, me identificando com a fantasia, tenho a possibilidade de evoluir a realidade. Me identificando com a vivência do outro, tenho a possibilidade de enxergar melhor.

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Thisby Khury 12


A artista Thisby Khury propõe uma performance onde ela própria apresenta dois vídeos nos quais mostra seus seios e seu queixo, em um a artista deforma o seus seios com fitas adesiva transparentes e depois tira, no outro vídeo Khury cobre seus seios com gazes colando-as com fita e costurando em cima dessa gaze. No primeiro vídeo é possível sentir aflição ao ver a artista remover as fitas adesivas, já no segundo existe a aflição e o medo quando ela começa a costurar as gazes que estão nos seus seios, ambas dão a impressão que irá se machucar. Observando como a artista faz as suas ações em seus seios pensamos logo em cirurgias plásticas, pois dá a impressão de ser um curativo de pós-operatório. Este aspecto pode ser percebido nos dois vídeos, ou seja, quando Khury transforma seus seios com a fita adesiva transparente e ao retirá-la, como também com os curativos gaze e ao costura. Nos dois vídeos a artista parece chorar ao fazer a ação, dando a impressão de algo que é muito íntimo e doloroso. A performance não permite uma leitura generalizada, onde todos que vêem percebam o que ela quis transmitir com estes vídeos e provoca nos espectadores uma expectativa por uma explicação sobre este choro. Quando a artista conta a sua história de vida conseguimos entender a motivação dos seus experimentos em vídeo. Percebemos o caráter terapêutico no registro de sua produção, pois a artista na semana anterior de fazer o vídeo passou por uma experiência muito marcante com uma pessoa da família. Fazendo parecer que a intenção da artista não era transmitir para os outros e sim para si mesma a sua ideia, o que pensa, sente e quer com as suas ações, intendendo também o que estava sentindo naquele instante. Portanto, pode ser percebido pela qualidade dos vídeos que a artista está no processo de entender o seu tema e o que ela quer com ele. Ela deve estar pensando em como e porque ela quer fazer isso, mas precisa levar em consideração o que efetivamente as pessoas vão compreender e sentir com a sua performance. Por Luisa Amaral

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Entrevista com Thisby Khury Para voce como que acontece a vontade de produzir?

Produzir algo para mim esta relacionado a tentar entender minhas inquietudes,

ou seja, coisas da minha vida, tudo o que leio e tento absorver. Por que a performance? é a melhor linguagem para o seu trabalho?

Acho que usar o corpo como material primordial de um trabalho sintetiza mui-

tas questões que para mim são caras, pois poderia usar outras linguagens mais perderia o essencial. O essencial é falar de relações, do corpo do individuo no mundo e da condição humana, Por ser um SER humano, acredito que o meu corpo representa as questōes de SER um humano. O que te interessa no tempo da performance feito em video?

Ele é o resultado de um processo de idas e vindas de diferentes projetos e lingua-

gens que cuminou no desejo de ver imagens que poderiam organizar meus pensamentos.

Já pensei muito sobre o uso do registro no meu trabalho, acredito que eles como

já falei ele ficaram com um caráter de ter em mãos o que se passa na minha cabeça. Estou considerando mudar a minha ideia atual e pretendo fazer a ação pessoalmente e incluindo outros elementos.

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A referência A artista referência é Jenny Saville com sua série “Closed Contact” onde a própria se fotografa distorcendo seu corpo em um vidro. Abarcando as questões dos estereótipos feminina, fazendo uma contraposição com seu corpo por ser gorda. Esta série surgiu da fascinação de Saville com a possibilidade de criar uma beleza através das cirurgias plásticas. Vejo neste trabalho de Saville uma relação direta com os vídeos de Khury, pois Khury também faz suas açōes pensando nas cirurgias plásticas e trabalhando este tema com a distorção dos seus seios. Sendo feita a distorção, por ambas as artistas, com objetos diferentes onde Saville usa o vidro e Khury usa fita adesiva e gaze.

Simbologia

“Closed Contact” serie fotografica de Jenny Saville

Nos videos de Khury podemos perceber vários simbolos existentes dentre eles os seios, a mulher e a tristeza. Os seios na simbologia tem como simbolo a feminilidade, sendo fonte de vida, alimento e prazer. Nos seios podem ser diagnosticadas doenças das quais a retirada do seio seja necessária. O termo mulher é usada para distinguir biológicamente quanto socialmente. Considerada a passage da adolescência para a idade adulta. A tristeza por sua vez é um sentimento que expressa desânimo ou frus-

tração em relação a alguém ou a algo. Nos videos de Khury vemos os seios como simbolo de faminilidade, pois a artista utiliza os seus seios para tranformá-los em algo não reconhecivel como tal, tendo a impresão de cirurgias plásticas. A mulher é usada para destinguir biológicamente o corpo a ser tratada e a tristeza vem como símbolo de mágoa, arrependimento ou uma incapacidade por algo que a artista esta sentindo no momento.

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