CELAM – Conselho Episcopal Latino Americano Seção Juventude - SEJ
CIVILIZAÇÃO DO AMOR: TAREFA E ESPERANÇA ORIENTAÇÕES PARA A PASTORAL DA JUVENTUDE LATINOAMERICANA
EDITORA PAULINAS
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil
Conselho Episcopal Latino-Americano – CELAM. Seção Juventude. Civilização do amor: tarefa e esperança: orientações para a pastoral da juventude Latino-Americana / Seção Juventude; [tradução Hilário Dick]. – São Paulo: Paulinas, 1997. – (Documentos da Igreja na América)
Bibliografia ISBN 85-7311-776-1 1.Amor 2.Igreja-Trabalho com jovens3.Teologia Pastoral I.Título.II.Série
97-2429
CDD-253-7
Índices para catálogo sistemático: 1. Jovens : Evangelização: Cristianismo 253.7 2. Pastoral da juventude: Cristianismo 253.7 Digitalizado por
www.pjsorocaba.com.br TMotta
Título original da obra CIVILIZACIÓN DEL AMOR – TAREA Y ESPERANZA © CELAM – Conselho Episcopal Latino-Americano / Seção Juventude, 1995. Tradução Pe.Hilário Dick Revisão e preparação dos originais Jonas Pereira dos Santos
Paulinas Av. Indianópolis, 2752 04062-003 – São Paulo – SP http://www.paulinas.org.br editora@paulinas.org.br Telemarketing – Fone: 0800-157412 © Pia Sociedade Filhas de São Paulo – São Paulo – 1997
Apresentação da edição brasileira A Pastoral da Juventude do Brasil faz chegar até você, na versão em português, este precioso livro Civilização do amor: tarefa e esperança, com orientações para uma pastoral da juventude latino-americana. São quatro grandes capítulos – o Marco da Realidade, o Marco Doutrinal, o Marco Operacional e o Marco Celebrativo – que nos brindam com uma riqueza impressionante de elementos, permitindo-nos reavaliar, reorganizar, reafirmar e redescobrir nossas opções pastorais e pessoais. A PJ do Brasil, com a 11ª Assembléia Nacional em julho de 1995, redefiniu sua missão e organização. Está em suas mãos, de fato, o marco referencial da Pastoral da Juventude Latino-Americana e Caribenha e que deve ser o grande horizonte que orienta também a ação, a formação e a espiritualidade da Pastoral da Juventude do Brasil. Convido você a mergulhar nessas páginas e descobrir a riqueza e a novidade da experiência vivida pela pastoral da juventude deste nosso continente: Pátria Grande, Amada Terra, Ameríndia, Amerafro, América Jovem. Lembro, com saudade e reconhecimento, de Juan Ramón, Daniel Bassano, Hilário, Derry, Alejo, Germán, Pe.Horácio Penengo, na época assessor da Pastoral da Juventude Latino-Americana, representaram a PJ das quatro regiões do continente, “trabajaran duro y nos regalaran este maravilhoso documento”1. Que Deus os recompense por este serviço. E termino com uma prece: “Espírito Santo de Deus, ilumine a Pastoral da Juventude do Brasil e todas as pessoas que amam os jovens, para que se convençam de que a Civilização do Amor é tarefa e esperança a ser abraçada por todos. Maria, mãe da juventude, dá-nos tua audácia e ternura neste bela e desafiante missão. Amém”. Com carinho, Pe.Vilson Basso,dehoniano Assessor Nacional da PJ do Brasil
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Trabalharam duro e nos presentearam este maravilhoso documento.
Apresentação da edição brasileira Foi com satisfação que aceitei o convite de escrever a apresentação da edição brasileira deste livro, Civilização do Amor, tarefa e esperança. O livro é fruto de uma evolução importante do trabalho pastoral da Igreja latinoamericana com jovens. Tive o privilégio de participar da articulação inicial da pastoral da juventude latino-americana nos anos 80, como assessor nacional do Brasil. A mola mestra da evolução desse processo foi, e continua sendo, o encontro anual de responsáveis nacionais da pastoral da juventude. A presença contínua de cerca de vinte países fez dessa pastoral talvez a mais dinâmica e comprometida do continente. Não era um secretário-executivo no CELAM fazendo tudo sozinho. Todos assumiram a caminhada; todos participaram das decisões mais importantes. No início, o desnível de clareza do projeto e metodologia de pastoral. Como em todo início de caminhada, houve tensões e conflitos. Depois de vários anos afastados dos encontros latino-americanos, fui convidado para assessorar o XI Encontro em Porto Rico, em 1996. Foi uma surpresa agradável perceber os delegados de todos os países participando em pé de igualdade e comungando o mesmo projeto pastoral. Não havia mais as tensões e conflitos anteriores. Gradualmente, todos haviam chegado ao mesmo nível de reflexão pastoral. Uma mística comum uniu bispos, padres, irmãs, leigos adultos e jovens em seu entusiasmo e esforço por encontrar caminhos mais eficazes de evangelização desse grupo social que tem uma presença-chave no continente. Desde o início, a Pastoral da Juventude do Brasil deu uma contribuição importante. Não conheço outra pessoa na América Latina que tenha feito uma caminhada tão rica e que tenha conseguido aprofundar sua reflexão sem sofrer quebras de continuidade. Não conheço também outro continente que tenha uma experiência pastoral tão significativa. Como expressão desse avanço em termos de clareza de um projeto consequente de pastoral da juventude foi publicado, em 1987, o livro Pastoral da juventude, sim à civilização do amor. Essa obra foi logo traduzida para o português. Participei da equipe de redação desse livro. Foi um grande sucesso e teve papel importante para solidificar os avanços feitos. Mas a velocidade das mudanças culturais, políticas, econômicas, sociais e religiosas criou a necessidade de uma nova edição. A juventude de hoje não é mais a juventude dos anos 80. Nasceu este livro, Civilização do amor, tarefa e esperança, como resposta pastoral aos novos desafios. Os membros da equipe de redação são todos conhecidos pelo seu nível de reflexão e experiência de trabalho pastoral com jovens. A bibliografia no final do livro deixa claro que foram recolhidas as melhores experiências e reflexões no continente. O livro apresenta algo que frequentemente falta aos assessores e coordenadores de pastoral da juventude: uma visão global. Muitos líderes se fixam em visões parciais e são pouco eficientes porque lhes falta a visão do conjunto. Todos os temas tratados no livro são importantes; no entanto, gostaria de chamar a atenção para a riqueza de idéias na análise da realidade, as mudanças culturais, a pedagogia, as etapas dos grupos e a assessoria. Trata-se de uma leitura importante para quem quer fazer um trabalho pastoral sério com jovens e caminhar com a Igreja da América Latina. A Pastoral da Juventude do Brasil deu uma contribuição importante para essa caminhada, mas também tem muito a aprender. Hoje uma crescente consciência latino-americana integra nossa pastoral na tarefa da construção da Pátria Grande. Somos o único continente católico, e, a partir desta fé, a juventude é chamada a construir a Civilização do Amor, que é tanto uma tarefa quanto uma esperança. Jorge Boran
Apresentação Na aurora do Terceiro Milênio, os jovens ocupam um lugar especial no coração da Igreja. Não é exagerado dizer que na geração jovem de hoje se inscreve o futuro da humanidade. O que eles e elas são, hoje, assim serão a Igreja e a sociedade do próximo milênio. É o que intui, certeiramente, o Santo Padre ao dar aos jovens e às jovens um lugar tão destacado em seu pontificado. Com eles celebra encontros e jornadas. A eles dedica tempo, cartas e mensagens. E, quando se encontra no meio da algaravia juvenil, o papa fala sua linguagem e se faz muito sensível a suas preocupações e expectativas. Na Igreja da América e do Caribe, os jovens são opção preferencial. Muito se faz para servi-los e há muitíssimo ainda a ser feito. Não é em vão que a população jovem nos países costuma aproximar-se de 25% do total. Este é nosso orgulho e nosso desafio: ser um continente jovem. Portanto, com um futuro de esperança. Em seu serviço às Conferências Episcopais, o CELAM tem procurado traduzir essa opção em encontros e publicações muito valorizadas. Entre as publicações destaca-se o livro Pastoral da juventude, sim à civilização do amor, com uma enorme difusão nos diversos países da América Latina e do Caribe. Devido a seu impacto, a Seção Juventude do CELAM, ouvido o parecer das Comissões Nacionais de Pastoral da Juventude, decidiu reunir um grupo de especialistas neste campo para atualizá-lo e transformá-lo num obra ainda mais completa. É a que estamos apresentando agora. Seu título é semelhante ao primeiro: Civilização do amor, tarefa e esperança. Nela se poderá encontrar desde uma correta tipografia da juventude de nossos países até uma proposta de espiritualidade jovem que, sem dúvida, será de grande ajuda. Dada a grande envergadura desta obra, desejo agradecer explicitamente, em nome do CELAM, a todos que nela colaboraram, sob a orientação do Pe. Hilário Penengo, que acaba de concluir sua missão na Seção Juventude. Todos eles são pastores e leigos conhecidos por sua contribuição à pastoral da juventude em seus respectivos países e na América Latina. A cada um deles, nossa gratidão e bênção. Estou certo de que essa gratidão e bênção aderirão, alegres, todos os que utilizarem este livro. D.Jorge Enrique Jiménez Carvajal Bispo de Zipaquirá Secretário-geral do CELAM
Prefácio Há quase vinte anos o Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM) criava a Seção Juventude. Iniciava-se, então, um longo caminho de animação e de serviço à evangelização da juventude do continente. Os esforços iniciais por conhecer os problemas e tendências do mundo jovem e fazer uma reflexão teológica e pastoral que fornecesse orientações claras para implementar uma Pastoral da Juventude Orgânica viram-se reforçados a partir de 1983, quando começaram a se realizar os Encontros Latino-Americanos de Responsáveis Nacionais pela Pastoral da Juventude. Com o tempo, estes Encontros foram se tornando um espaço privilegiado de comunhão e participação para bispos, sacerdotes e jovens que trabalham na Pastoral da Juventude da Igreja Latino-Americana. A troca de experiências e a reflexão a que esses Encontros deram ensejo permitiram a progressiva elaboração de um proposta global de pastoral da juventude, construtora da civilização do amor; uma pedagogia para acompanhar os processos de formação humana e cristã dos jovens; uma metodologia adequada para o trabalho de grupo; uma espiritualidade para o seguimento de Jesus e uma organização participativa que têm dinamizado a ação evangelizadora das Comissões Episcopais de Pastoral da Juventude dos países do continente. Um dos frutos mais visíveis desse processo foi a publicação, em abril de 1987, do livro Pastoral da Juventude, sim à civilização do amor. Sua redação, efetuada após um longo e participativo processo de recopilação e sistematização de colaborações e experiências, favoreceu a formulação e difusão da proposta da Pastoral da Juventude Latino-Americana, promoveu uma maior unidade de critérios e impulsionou decisivamente o trabalho comum e a organização. Traduzido para o português e o francês, reeditado em sete países, com uma tiragem superior a 27 mil exemplares, conhecido popularmente como o “livro verde” ou o “livro laranja”, em alusão à cor da capa de algumas de suas edições mais difundidas, passou a ser referência obrigatória para o trabalho da pastoral da juventude. A reflexão dos anos posteriores continuou aprofundando aspectos apenas intuídos ou pouco desenvolvidos no livro anterior. Os processos de educação na fé, a cultura jovem, a assessoria, a espiritualidade e as pastorais específicas de juventude foram, entre outros, alguns dos capítulos que amadureceram e consolidaram a reflexão e a proposta. Ultimamente fez-se sentir, com força cada vez maior, o reclamo dos agentes de pastoral quanto à necessidade de contar com uma edição atualizada, que recolhesse as novas contribuições refletidas e servisse para apoiar o trabalho de formação dos coordenadores, animadores e assessores e para orientar melhor os múltiplos esforços da pastoral da juventude que se realizaram no continente. A Seção Juventude acolheu essa solicitação e encaminhou um proposta de trabalho inspirada nas mesmas características de ampla participação, de coleta e de sistematização das contribuições e experiências com que se preparou a publicação anterior. Os participantes do 10º Encontro Latino-Americano de Responsáveis Nacionais por Pastoral da Juventude, realizado em Mogi das Cruzes (Brasil), de 8 a 15 de outubro de 1994, responderam favoravelmente a uma consulta realizada pela Seção Juventude e propuseram uma lista de nomes de pessoas capacitadas para a redação dos diferentes capítulos. Com essas propostas, a Seção integrou uma Comissão Redatora de assessores leigos e sacerdotes, representativa das quatro Regiões, tendo sido convidados a participar o Pe. Daniel Bazzano, diretor do Instituto Paulo VI de Montevidéu (Uruguai); o Sr. Juan Ramón Córdova, secretário-executivo da Comissão Episcopal de Juventude de El Salvador e assessor regional de Pastoral da Juventude do México e da América Central; o Pe.Hilário Dick SJ, do Instituto de Pastoral da Juventude de Porto Alegre (Brasil); o Pe. Derry Healy, ex-coordenador da Comissão Nacional de Pastoral da Juventude do Chile; o Pe. Alejandro Londono SJ, da Casa de la Juventud de Santafé de Bogotá (Colômbia); o Pe. Germán Medina, assessor diocesano de Pastoral da Juventude de Higuey (República Dominicana), e o Pe. Feliciano Rodríguez, assessor diocesano de Pastoral da Juventude de Caguas (Porto Rico). Sob a coordenação do P. Horácio G. Penendo SDB, secretário-executivo da Seção Juventude, do CELAM, a Comissão Redatora reuniu-se na sede do próprio Conselho Episcopal Latino-Americano em Santafé de Bogotá
(Colômbia), de 23 a 30 de abril de 1995. Os participantes apresentaram suas propostas de trabalho, chegou-se a um esquema geral e cada um se dedicou à redação do capítulo que lhe havia sido designado. As redações formuladas foram imediatamente revisadas, corrigidas, melhoradas e complementadas por todos, um longo processo que se iniciou naquela semana e se completou várias semanas depois, até se chegar à presente redação final. Durante esse período os textos redigidos foram submetidos à apreciação de outros agentes pastorais nos diversos países, com pedido de opiniões, contribuições e sugestões. O livro é, portanto, um trabalho coletivo de muitas pessoas. Este é, talvez, seu maior mérito. Não se trata de reflexões teóricas nem individuais, mas de experiências vividas, recolhidas, partilhadas, organizadas e sistematizadas para serem oferecidas como orientação para a ação pastoral. Não é, por conseguinte, um livro terminado. Como se chegou até aqui, deve-se continuar caminhando, buscando, aprofundando, abrindo horizontes e descobrindo dimensões novas na sempre apaixonante tarefa da evangelização dos jovens latino-americanos. Sua apresentação encerra, de algum modo, o período que vai de 1991 a 1995, da Seção Juventude do CELAM. Queremos expressar um enorme agradecimento a todos os que, de uma forma ou outra, redigindo, corrigindo, apoiando, estimulando e manifestando suas expectativas pela publicação, tornaram possível transformar esse sonho em realidade. Oferecemo-lo com muito carinho a todos os agentes da Pastoral da Juventude Latino-Americana e, em especial, aos que, silenciosamente, em todos os rincões do continente, fazem acontecer, dia a dia, a pastoral da juventude. Neles pensamos permanentemente durante esses meses de trabalho. Eles são, na verdade, os primeiros destinatários do esforço que realizamos. Acreditamos que será uma contribuição para tornar mais efetiva a opção preferencial pelo jovens e, especialmente, para apresentar uma proposta evangelizadora séria, capaz de responder às exigências das mudanças culturais do mundo de hoje, entusiasmar os jovens no seguimento de Jesus e tornar real a tão desejada civilização do amor. P.Horácio G.Penendo SDB Secretário-executivo SEJ-CELAM
Parte 1
I
Com a intenção de sermos fiéis à atitude do Deus de Jesus Cristo, que, com olhar amoroso, está atento às necessidades de seu povo, escuta seus clamores e dispõe todas as coisas para a sua libertação, queremos olhar a realidade dos povos do continente latino-americano, e sobretudo do povo jovem, para escutar seus gritos, reconhecer e compreender suas situações de exclusão e fazer o possível para que, com a ajuda do Espírito, se realiza a salvação. Seguindo o exemplo de Jesus, é necessário abrir os olhos para compreender, com razão compassiva, a vida dos povos. O simples olhar da ciência não é suficiente para explicar sua existência. O estético e suas diferentes expressões, o poético, o mítico, o utópico, o épico e o trágico são também visões válidas que podem estar, talvez, mais próximas das suas buscas de sentido e das suas experiências do sagrado e da fé, tanto dos jovens como dos povos em geral. É preciso educar a visão da realidade para que se possa descobrir nela o dom de Deus, experimentar seu chamado a sermos acolhidos e amados, e a encarnar-nos no mundo dos jovens pela solidariedade humana e evangélica. O contato direto permite ver, ouvir, e se emocionar com suas vidas, seus sinais, suas sensibilidades e seus sentidos. Conhecer a realidade dos jovens a partir da perspectiva de Jesus exige estabelecer uma relação de intimidade. Exige dialogar e agir junto com eles. Somente assim será possível experimentar – “conhecer” – suas necessidades reais e perceber suas verdadeiras alegrias e amarguras. O desconhecimento da perspectiva dos outros, de suas formas de ver e compreender o mundo, já gerou demasiada violência na história. A vida não seguirá sendo possível pela via do extermínio de quem pensa diferente. Deve-se começar por reconhecer e compreender as diferenças e buscar sempre, razoavelmente, novas e melhores condições de comunicação, compreensão, transformação, justiça e vida. Ao olhar a realidade da América Latina e, nela, a realidade dos jovens, sente-se o chamado ao mesmo compromisso apaixonado de Jesus, de realizar sinais de vida que instaurem esperanças, possibilidades e oportunidade de vida nova, superando os sinais de morte, de decrepitude e da não-vida. A dupla dimensão morte-vida faz desejar e tornar real, já, a páscoa para e com os jovens do continente. Santo Domingo confirmou, tanto para a pedagogia como para a metodologia da pastoral da juventude, caminhos que partem da vida, das experiências e da realidade (SD 119). É a epistemologia, o modo de acercar-se da realidade e da verdade, vigente nas ciências, na filosofia e na teologia atuais. Seguilos parece ser o único modo de nos situarmos na cultura atual e nas perspectivas de uma pastoral da juventude que sintonize com a psicologia dos jovens. Este foi, por outro lado, o modo habitual do agir de Jesus, que aparece no Evangelho partindo da vida, dos problemas, das necessidades e das aspirações dos destinatários de sua caridade pastoral. O grande desafio da pastoral da juventude é olhar o contexto social, econômico, político, cultural e religioso de forma global e não fragmentária (DP 15). Não fácil nem se pode pretender chegar à certeza e à verdade plenas. O que se pode, sim, é tentar conhecer, da melhor forma possível, a realidade na qual se deve intervir, para acertar nos diagnósticos e escolher as melhores alternativas de ação pastoral.
1. O CONTEXTO LATINO-AMERICANO DE MUDANÇA A experiência de mudança vivida pelos homens e pelas mulheres do continente e as mais variadas análises e estudos especializados realizados nos últimos anos estimulam a percepção e reafirmam a convicção de que algo novo está ocorrendo em nosso mundo. Não se trata apenas de novas situações particulares ou de novo elementos que simplesmente se acrescentam aos já existentes. Trata-se de grandes transformações globais que afetam profundamente a compreensão e as percepções que as pessoas têm de si mesmas e de suas relações com a natureza, com a sociedade e com Deus. Está-se dando uma profunda mudança cultural. Os jovens da América Latina, na variedade de seus processos históricos e de suas diversidades étnicas e culturais (SD 244), são particularmente sensíveis ao novo que está acontecendo. Eles são, ao mesmo tempo, filhos e construtores dessa nova realidade cultural que apresenta múltiplas e diversificadas manifestações que condicionam suas vidas e geram novas e variadas compreensões, relações e formas de expressão. Conhecê-las e valorizá-las é um grande desafio para a Igreja e para a pastoral da juventude (SD 253), que o acolhem como um convite a questionar suas práticas, revisá-las e, sobretudo, a recriar, nesta nova situação, a experiência da permanente novidade de Jesus Cristo, “o mesmo, ontem, hoje e sempre” (Hb 13,8). 1.1 Algumas manifestações da mudança cultural. Não se pretende, aqui, uma análise completa dessa nova situação cultural. Quer-se apenas assinalar algumas de suas principais manifestações, que devem ser particularmente consideradas na pastoral da juventude. 1.1.1 Mudanças em relação à natureza São poucos, hoje, os que se espantam diante das descobertas científicas e do desenvolvimento tecnológico. Entretanto, está-se dando uma crescente tomada de consciência dos limites da ciência e da tecnologia, insuficientes quando tentam resolver, por si mesmas, os problemas fundamentais da vida e da pessoa humana. A crescente sensibilidade a esse problema expressa-se na busca de uma nova relação com o meio ambiente que permita viver mais dignamente neste terra que Deus entregou ao ser humano para que a trabalhasse e a cuidasse. 1.1.2 Mudança em relação à sociedade A interdependência da vida social manifesta-se principalmente no caráter transnacional da economia, dos meios de comunicação social e nos acelerados processos de urbanização. Essa influência econômica e cultural do chamado “Primeiro Mundo” marca a vida das sociedades e das pessoas. Molda seus interesses, aspirações e modelos de consumo. A crise das ideologias e o fracasso dos projetos históricos de transformação social vão dando lugar ao império do pragmatismo e da ideologia neoliberal, com sua política de mercado. Ela se apresenta como a aparentemente única racionalidade social e como inquestionável modo de intercâmbio. Não sem dificuldades, os países latino-americanos estão em transição de regimes autoritários para sistemas democráticos. Muitos partidos sofreram importantes transformações. Também surgiram outros, novos. Mudou a política das alianças. O movimento sindical não tem a mesma ressonância de antes; busca implementar suas demandas através do diálogo com empresários e governos. Mudam os modos de fazer política e o interesse que se tem por ela. Não é tão claro, hoje, que o Estado, os políticos ou simplesmente os grupos econômicos sejam os únicos detentores do poder. Também tem poder, igualmente, quem domina a tecnologia e a informação.
A própria situação de pobreza tem hoje características novas. A pobreza da maioria convive ao lado do desenvolvimento, do consumo e da modernidade. Os setores populares, e seus modos históricos de resolver os desafios fundamentais da existência, parecem cada vez menos unidos num projeto histórico de libertação. As idéias e os movimentos gestados nas décadas passadas já não têm a força transformadora de então nem constituem um elemento significativo de seu ideário social. A sociedade manifesta-se cada vez mais pluralista. Crescem a valorização das diferenças e o chamado ao diálogo num sociedade pluralista. Ao mesmo tempo, porém, esse pluralismo estimula posturas subjetivistas. Em muitos casos gera atitudes de sincretismo e de grande confusão. 1.1.3 Mudanças na relação com Deus Apesar das propostas de diversas correntes materialistas que vaticinaram o desaparecimento da religião e a “morte de Deus”, persiste fortemente a busca de um sentido transcendente e absoluto para a vida humana e a necessidade de encontrar valores, critérios e normas éticas que a orientem. As principais ideologias já não parecem ter a força mobilizadora de antes. As principais perguntas pelo sentido voltam a se fazer presentes. Essa busca está muito viva nas diversas expressões da religiosidade popular, nas quais o povo recria suas vivências religiosas em meio às situações que a vida moderna impõe. “O povo resiste às condições adversas da vida moderna que o marginaliza, recriando espaços de piedade – peregrinações, novenas, devoção às almas, festas de padroeiro, devoção cotidiana etc. – que constituem verdadeiras formas de mística popular muito profunda diante do individualismo, da competição e da lógica mercantil da dominação que pautam a modernização das culturas oficiais”.2 A persistência do sagrado verifica-se também no crescimento sintomático das seitas e das propostas que recorrem ao esoterismo e à magia como resposta à busca de sentido. Coexistem, assim, diversas manifestações e “ofertas” religiosas. A Igreja Católica aparece, entre elas, como uma alternativa a mais, entre as muitas possíveis. Olhando o conjunto desses elementos, constata-se que se está diante de um novo tempo histórico no continente latino-americano. Já não se vivem as grandes esperanças revolucionárias, de profundas mudanças sociais, que caracterizaram a década de 60. Não se vive, igualmente, um tempo de confrontação violenta, de repressão e de morte que caracterizou a década de 70 e parte da de 80. Nem se vive tampouco o tempo de recuperação da democracia que caracterizou a década de 80 e parte dos anos 90. Muitos poderiam pensar que essa problemática da história recente pouco interfere nos reais problemas e desafios enfrentados pelos jovens de hoje. Contudo, os jovens de qualquer época histórica não criam a realidade na qual vivem. Mais ainda: as condições sociais, econômicas, política e culturais são, para eles, uma realidade que lhes é dada, independentemente de sua vontade. Nessa realidade se socializaram, foram construindo sua própria identidade e sonharam um futuro melhor. 1.2 Chaves de Leitura Duas chaves de leitura parecem fundamentais para procurar uma melhor compreensão dos fenômenos que estão acontecendo: o neoliberalismo, sua repercussão na sociedade e na cultura, e a pós-modernidade, que impregna todos os ambientes no complexo fenômeno da comunicação. 1.2.1 O neoliberalismo A sociedade atual é resultado de várias décadas de frustrada tentativas para sair do subdesenvolvimento. Após a queda do socialismo, o neoliberalismo passou a ser, ao menos no momento, o único modelo socioeconômico viável. Quando um modelo social não é único e tem que competir com os demais, necessita suavizar-se e humanizar-se para não ser substituído por outras alternativas; porém, quando um modelo é único, não precisa ser transigente. É o que acontece com o neoliberalismo, que está se desenvolvendo de forma quase selvagem na sociedade atual.
2
Cristian Parker. “Lo espiritual de fines de siglo”. Revista Mensaje 423, Santiago do Chile, 1993, p.511.
O neoliberalismo postula a preeminência do mercado e da livre concorrência. Sustenta uma série de políticas econômicas desregulamentadoras, privatizantes e liberalizadoras das econômias nacionais e dos protecionismos tradicionais dos países do Terceiro Mundo, impostas pelo organismos internacionais, dominados pelos Estados Unidos. Essas políticas aplicam-se de modo diversos nos diferentes espaços nacionais. Aludindo ao fim do socialismo e seus anseios de uma sociedade sem explorados, o neoliberalismo afirma que as utopias e os projetos de futuro terminaram: o que conta é a ação imediata. O mercado capitalista e a democracia liberal surgem como os únicos com possibilidade histórica de realização e de sucesso. Fala-se do fim das ideologias. Legitimaram-se as propostas neoliberais como as únicas e as melhores alternativas para a economia mundial. O neoliberalismo significa, concretamente: • No econômico: as privatizações e o fortalecimento do capital privado; a desregularização dos mercados; a orientação da economia em função do mercado internacional e o fomento das exportações; a abertura ao capital estrangeiro e a internacionalização do mercado interno. Isso traz, como consequências, graves custos sociais como a queda do salário real, uma maior taxa de desemprego, uma brecha maior entre os ricos e pobres e a multiplicação das situações de pobreza extrema. • No político: a função do Estado se reduz praticamente a ser garantidor do equilíbrio social e favorecedor da atuação do capital privado. Reduz-se também o papel dos sindicatos e das organizações populares. Enfraquece-se a real participação do povo e da sociedade civil. A absolutização do mercado como critério único para regular a atividade econômica nacional e internacional agudiza a subordinação dos países pobres aos países hegemônicos. Os governos diminuem drasticamente o gasto público e os investimentos em educação, saúde e seguridade social. Suas alianças visam, antes, assegurar os privilégios econômicos e integrar-se nos processos internacionais do que promover o verdadeiro desenvolvimento, o crescimento e o bem-estar dos povos. • No cultural: o consumo, a produção e a eficiência, o pragmatismo e o mercado convertem-se nos valores sociais máximos. A educação, orientada para a produtividade e a competição, conduz inevitavelmente a um materialismo prático no qual se desenvolvem o individualismo, o utilitarismo e o hedonismo e do qual estão ausentes as exigências da justiça social e do bem comum. • No religioso: o materialismo prático eclipsa o sentido de Deus e da própria pessoa humana. Apesar disso, muitos querem, inclusive no âmbito católico, legitimar esse sistema em bases religiosas. Nesses esforços, há uma clara tendência a suavizar o compromisso exigido por Jesus e a acomodá-lo aos postulados neoliberais, comungando com a Nova Era, a chamada religião do neoliberalismo. O neoliberalismo favorece ao máximo o desenvolvimento das empresas transnacionais, que, para promover o consumo, privilegiam certos modelos de vida – o “american way of life” – e tendem universalizar e uniformizar, pela propaganda, uma cultura do espetáculo, do ter e do parecer. As culturas indígenas e autóctones sentem-se esmagadas. Os processos, as formas concretas e os ritmos com que se vai implementando o modelo neoliberal dependem do lugar e da orientação que se dá às economias nacionais para se inserirem na economia mundial. Os países latino-americanos são considerados como centros industriais, produtores de artigos manufaturados, exportadores de produtos agrícolas e matérias-primas, com particular interesse na produção petrolífera. Apesar de a maioria dos planos neoliberais proclamar seus resultados positivos e os grandes indicadores econômicos, como o crescimento do produto interno bruto, a queda da inflação, o crescimento econômico, o aumento das exportações e dos investimentos de capital estrangeiro e os maiores níveis de consumo, serem geralmente favoráveis, na realidade não geraram melhores condições de vida e, especialmente, não mudaram as formas de distribuição da riqueza produzida, mantendo, e até mesmo acirrando, as condições de pobreza.
A pobreza extrema de que se aproxima a camada mais fraca da população está produzindo uma exclusão violenta das grandes maiorias, no que se refere aos benefícios do esforço coletivo dos povos. A deterioração ecológica também se faz sentir em todos os aspectos. Os recursos materiais, a biodiversidade e as riquezas naturais são sacrificados por planos economicamente rentáveis a curto prazo para as transnacionais, mas de consequências desastrosas para o futuro. Não se teme sacrificar populações inteiras e aniquilá-las pela fome, pelo desemprego e pela violência, como sucedeu com muitas comunidade negras, indígenas e camponesas. O neoliberalismo agride violentamente os estilos de vida e as cosmovisões dos povos latinoamericano. Influi de modo negativo especialmente nos jovens, sobre os quais se concentram seus efeitos mais dramáticos: profundas carências materiais e de vida digna, desemprego, ocupações insalubres, mal-remuneradas e sem previdência social; crise do sistema educacional, incapaz de uma absorção, maior evasão escolar e má qualidade do ensino; inexistência de espaços para as atividades culturais e de lazer, discriminação dos jovens das camadas populares como grupo social indesejado, a ponto de legitimar seu extermínio físico; a criminalização de suas tentativas de organização e expressão; e a ausência de projetos de participação social e de políticas direcionados para essa camada da população. 1.2.2 A pós-modernidade A chamada “era pós-moderna” toma consciência dos fracassos e dos limites da modernidade. Sente que seus ideais humanistas e a absolutização da racionalidade técnico-científica não engendraram o mundo igualitário, livre e fraterno que sonhava, e sim um mundo de dominantes e dominados em que o projeto igualitário fracassou. Isso gerou um ambiente de desencanto que se expressa em vários âmbitos da vida pessoal e coletiva. A modernidade esperava um futuro grandioso para todos os homens, no qual existiria igualdade entre as nações e entre os indivíduos; confiava na abolição da guerra, da propriedade e dos colonialismos; esperava a alfabetização universal, o domínio da natureza, a erradicação das doenças e o triunfo definitivo da ciência e da tecnologia. O século XX demonstrou que esses grandes sonhos foram dolorosamente frustadas. O mais importante agora é procurar sobreviver e fazê-lo da melhor for Deus de cada uma possível. Para as grandes maiorias já não interessam as utopias. O que importa é o que se vive aqui e agora. Se não há progresso, se não importa para onde se vai, o que vale então é aproveitar o momento. Se para a modernidade importava produzir, para a pós-modernidade, importa consumir. “O que dá prazer” e “o que se sente” passam a ser critério último de verdade e a motivação profunda do agir. A modernidade deu ênfase especial ao valor da vida e ao bem-estar coletivo. A pós-modernidade converte a vida privada na medida de todas as coisas. OS problemas dos outros são dos outros e devem ser enfrentado e solucionados por eles. Predomina a lógica da vida privada: satisfazer os próprios desejos, comportar-se segundo o estilo de cada um, crer no Deus de cada um. A pós-modernidade nega a existência de uma lei de caráter universal. Crê que a sociedade não se fundamenta num pacto social, mas em pequenos acordos que possam ser estabelecidos entre partes que estão sempre em conflito. Tudo é pergunta. Não há respostas. Se houver, serão formuladas em termos de novas perguntas. A pós- modernidade é uma crise no interior da modernidade. Eis algumas de suas principais características: • Um neo-individualismo, entendido como afirmação radical de auto determinação e como desconfiança do coletivo, do solidário, e de tudo o que sugira compromisso com os demais. Reivindica a autonomia da pessoa humana. Valoriza a criatividade e a subjetividade, tendendo a construir um pessoa sem sentido histórico, autocentrada, preocupada tão só com o presente e com sua vida pessoal, facilmente inclinada a sucumbir na solidão, no isolamento e no anonimato. • Uma nova forma de niilismo que destrói qualquer possível fantasia utópica. Nega-se que a força das utopias possa chegar a mudar o mundo. É a cultura do grande vazio e da descrença, em que
nada tem fundamento suficiente para orientar globalmente a existência. Recupera a dimensão do pessoal, do íntimo e do privado em face o público, mas reduz os horizontes, promove o imediatismo, a ausência de visão de longo prazo e a falta de entusiasmo para trabalhar pela mudança da realidade. Leva a evitar os compromissos permanentes e a não aderir a propostas de projetos históricos. • Uma maior permissividade na conduta moral, fruto do neo-individualismo e consequência da falta de pontos universais e de valores absolutos. Antes, a família, a educação e a própria religião impunham as normas de conduta, as formas de pensamento, as evidências coletivas e os princípios de legitimação. Hoje há uma multiplicidade de âmbitos de vida e de comunicação em que todos se expressam livremente, sem que haja um poder capaz de impor idéias e condutas a todos. Promove-se uma ética pessoal em função da qual vale mais o convencimento que a norma; • Legitima-se a busca de felicidade no tempo presente; reafirma-se a liberdade individual, a necessidade de ser, sentir e expressar-se segundo a originalidade de cada um e o direito à diferença. A busca da salvação, contudo, situa-se no presente; debilitam-se e relativizam-se as convicções éticas; centra-se a atenção mais nos direitos do que nos deveres; desencadeia-se a crise do amor e da sexualidade e opera-se a perda do sentido de felicidade e do compromisso. • Um pensamento débil em face das ideologias mais ou menos radicais. Esse pensamento débil quer pôr abaixo um mundo que tenha consistência em si mesmo e uma consciência capaz de descobrir, conhecer e expressar o mundo real. Prefere antes experimentar as coisas a discutir teorias; recupera o valor do cotidiano, o sentido do simbólico e do ritual. Aumenta, no entanto, a fragmentação da vida, dificulta a elaboração de projetos globais e favorece a manipulação pela publicidade, pela moda, pelos meios de comunicação de massa e pelas imposições culturais. Como movimento cultural, o pós-modernismo tem uma mensagem muito simples: “vale-tudo”. Essa mensagem não é nem conservadora, nem revolucionária nem progressista. Torna irrelevantes as distinções deste tipo... Todos podem participar dele. Trata-se de um onde em que são possíveis todos os tipos de movimentos artísticos, políticos e culturais. Essas fortes correntes culturais, econômicas e políticas, portadoras de uma concepção de sociedade baseada na eficiência, promovem uma verdadeira cultura da morte. Criam e consolidam autênticas estruturas de pecado contra a vida, nas quais os jovens ficam envoltos e condicionados.3 Em meio a essa realidade, contudo, os jovens tentam sobreviver com valores que possuem. Lutam para encontrar um lugar na história. É uma juventude cujo sentido existencial foi em grande parte destruído pela cultura da morte. Necessita, urgentemente, encontrar uma “boa nova” que lhe devolva o desejo de viver e lhe abra as portas a uma cultura de vida.
2. CONHECER A JUVENTUDE NÃO É FÁCIL Hoje em dia, já não é possível falar, simplesmente, de “juventude”. É quase impossível abarcar o amplíssimo aspecto da realidade e as variadíssimas situações em que os jovens vivem, segundo suas raízes e origens étnicas, suas influências culturais e suas condições políticas, sociais e econômicas. É necessário admitir que conhecer e compreender o mundo dos jovens não é tarefa fácil. Os diferentes estudos realizados sobre a realidade juvenil mostram claramente a grande diversidade de opiniões existente entre os pesquisadores. Há muita imprecisão sobre o próprio conteúdo do termo e sobre o que se quer dizer quando se fala de jovens e de juventude. Proliferam idéias, opiniões e julgamentos, por trás dos quais muitas vezes se ocultam interesses que projetam nos jovens os desejos e temores dos adultos, deformando a realidade juvenil e promovendo ações pedagógicas corretivas de comportamentos considerados mais ou menos anti-sociais. Por outro lado, não é fácil concretizar e expressar as motivações e formas de comportamento de uma vida em contínua evolução: o jovem é sempre uma incógnita. Um convite a deixar os próprios 3
Cf. João Paulo II, encíclica Evangelium vitae, 12.24.
esquema pré-fabricados e a abandonar-se ao incerto e ao imprevisível. Para poder dizer algo sobre os jovens, é preciso ser, estar e viver com eles. A sociedade atual mostra um enorme interesse pelos adolescentes e jovens. Para eles se dirigem muitos olhares. Embora se trate de tentativas parciais de abordar a realidade deles, são úteis na medida em que permitem maiores delimitações e precisões. Em todo o caso, trata-se de perspectivas que não pretendem ser exaustivas. Em toda aproximação à realidade dos jovens é necessário considerar as variáveis que intervêm e, muitas vezes, determinam seu universo cultural. O uso da categoria “juventude” deve considerar essa multiplicidade de diferenças. 2.1 A visão biocronológica Define a juventude em termo de idade. A juventude é a idade da pessoa em crescimento. Um período compreendido entre os quinze e os vinte e cinco anos, no qual se toma consciência de estar vivendo uma realidade vital, distante da infância mas ainda não identificada com o mundo adulto. Trata-se de uma etapa de transição marcada por grandes mudanças fisiológicas, fruto do amadurecimento hormonal. O resultado dessas transformações é a consciência e a vivência do próprio ser corporal. A imagem do corpo e sua valorização são símbolos do eu e da personalidade. A significação do sexual passa para o primeiro plano. Essa valorização do corpo e da sexualidade expressa-se numa série de aspectos: psicológicos, como a consciência de sua força e de sua capacidade física; psicossociais, como o cuidado extremo com a apresentação externa, e psico-biológico-sexuais, como a descoberta do sexo como estímulo-demanda. Quando se absolutiza essa forma de olhar os jovens, corre-se o risco de perder de vista os contrastes e as oposições, de unificar o que é diverso, de eliminar as diferenças e assim diluir e confundir a marginalização e a riqueza, o rural e o urbano, as diferenças sociais e culturais, os estudante e o e o aluno que se evade da escola, o homem e a mulher, o trabalhador e o desempregado, o pai a mãe jovens, os filhos de mães solteiras e os filhos de famílias constituídas etc. Não se pode desconhecer, além disso, que a juventude, como grupo etário, está sujeita a uma imagem social e a um processo de construção das características que a definem como tal e assinalam os limites e as possibilidades de suas práticas, de seu ser e de seu dever-ser como membro de uma comunidade. Esses elementos definidores criam expectativas de comportamento. Delimitam-se as características consideradas próprias dessa idade transitória e intermediária entre a infância e a idade adulta. Elas circulam atráves dos mais diversos espaços sociais. 2.2 A visão psicológica Identifica a juventude como o período conflitivo da vida da pessoa, em que ela se vê a si mesma com a vida nas mãos, já não estando na infância mas ainda não sendo adulta, com uma vida afetiva, moral, cultural e espiritual próprias que devem ser garantidas e construídas mais plenamente. É como um segundo nascimento. É final e começo: final de uma forma de vida no ambiente protegido da família e início de algo novo, desconhecido, de um mundo que, muitas vezes, apresenta-se ao mesmo tempo hostil e perigoso, atraente e estimulante. É a passagem do mundo interior da família para o mundo exterior das responsabilidade e das decisões pessoais. Supõe percorrer um caminho estreito, cheio de incertezas, temores e esperanças que identifica o ser jovem. Um caminho do qual deve se apropriar: passagem de um passado definido, que deve ser abandonado, para um futuro por identificar e com o qual deve identificar-se. É uma etapa de busca e crescimento. De construção da identidade e de construção de um novo lugar no mundo. Não se trata de um processo unívoco nem linear. Pelo contrário, é múltiplo e contraditório, fruto do tecido das relações com diversas instâncias socializadoras, como a família, a Igreja, a escola, o grupo de companheiros, a vizinhança, os partidos políticos, os meios de comunicação, etc. A partir do jogo das inter-relações que se dá entre essas instituições e os jovens, definem-se os papéis, as exigências de comportamento, os limites e as possibilidades de seu agir , de seu ser e de seu dever-ser. Tudo condicionado pela pertença dos jovens a um grupo social e cultural determinado e pela biografia de cada um.
É um tempo de opções e de definição de vocações. É um caminho aberto, onde se dá a possibilidade de tentativa e erro. É um tempo de valorização do subjetivo, dos sentimentos e da capacidade de agir moralmente. Um tempo para configurar-se como pessoa, com direitos e deveres no mundo adulto. Situam-se, aqui, muitos diagnósticos que falam das feridas afetivas e dos desequilíbrios psicológicos e de personalidade dos jovens. Por circunstância muito variadas, de ordem familiar, social ou econômica, muitos sofrem hoje uma carência generalizada de afeto e de relações pessoais. Estão sós. Precisam de amigos. Buscam um grupo ao qual possam pertencer e participar e sentir-se protagonistas. Um refúgio que os liberte da solidão e os faça sentir-se acolhidos e compreendidos. João Paulo II afirmou recentemente este caráter pessoal dos problemas vividos pela juventude: ”O problema essencial da juventude é profundamente pessoal. A juventude é o período da personalização da vida humana. É, também, o período da comunhão. Os jovens e as jovens sabem que têm de viver para os demais e com os demais. Sabem que sua vida tem sentido na medida em que se faz dom gratuito para o próximo”.4 2.3 A visão sociológica Do ponto de vista da sociologia, a juventude é um grupo social com uma posição determinada dentro do conjunto da sociedade, caracterizado por um modo peculiar de ver e entender a vida e o mundo, próprio de quem deixou para trás a dependência total de criança, mas não chegou ainda à responsabilidade própria do adulto. É uma etapa substantiva da vida, com identidade e valores próprios, embora mediada pela posição que a juventude ocupa em cada sociedade e influenciada pelo que essa sociedade aceita ou impõe. Daí a variedade de seus comportamentos, tanto de submissão aos patrões sociais como de protesto e rebelião contra toda tentativa de manipulação. Os modelos econômicos inspirados no neoliberalismo aguçaram a exclusão e a marginalização dos povos-latinos americanos. Como consequência, “muitos jovens são vítimas do empobrecimento e da marginalização social, do desemprego e do subemprego, de uma educação que não responde às exigências de suas vidas, do narco-tráfico, da guerrilha e das gangues. Muitos jovens vivem adormecidos pela propaganda dos meios de comunicação de massa e alienados por imposições culturais e pelo pragmatismo imediatista que tem gerado novos problemas em seu amadurecimento afetivo” (SD 112). “Há, contudo, adolescente e jovens que reagem ao consumismo imperante e se sensibilizem diante das debilidades do povo e da dor dos mais pobres. Buscam inserir-se na sociedade, rejeitando a corrupção e gerando espaços de participação genuinamente democráticos... Vão carregados de perguntas vitais. Representam o desafio de articular um projeto de vida pessoal e comunitário que dê sentido a suas vidas, logrando assim a realização de suas capacidades” (SD 112). No conjunto da juventude, considerada como corpo social, surgem setores determinados pela condições socioeconômicas ou culturais e relacionados com os ambientes em que vivem os jovens. É importante considerá-los detidamente porque o meio específico no qual se desenvolve a vida dos jovens, suas necessidades, problemáticas e interesses influem decisivamente na definição da ação pastoral e das propostas de formação e espiritualidade que se quer desenvolver. 2.3.1. Os jovens da roça e do campo São jovens que vivem no campo, realizando tarefas agrícolas, ou em povoados onde estudam e/ou trabalham. Sua relação fundamental se dá com a terra, gerando características culturais particulares e um especial forma de viver e entender a relação com a vida, a terra e a religião. Apesar da importância que o trabalho de campo e seus produtos têm para as economias latino-americanas, as estruturas tradicionais do setor e os condicionamentos da sociedade os impedem de intervir, muitas vezes, como grupo social coerente no processo de desenvolvimento. Em muitos casos, a terra deixou de ser a “mãe” para tornar-se fonte de dor e de morte. Algumas características desse setor são:
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Cf. João Paulo II, No limiar da esperança
◊ O período juvenil no mundo camponês é muito breve. Os jovens assumem, desde cedo, responsabilidade próprias do mundo adulto, tanto pelo trabalho como pelo casamento e pela nova família. ◊ Diferentemente dos que vivem em zonas urbanas, esses jovens têm poucas possibilidades para expressar-se e progredir. Quando as têm, são muitas vezes manipulados e/ou alienados por agentes externos às suas comunidades. As organizações sociais e políticas do campo são, com frequência, fortemente reprimidas, o que dificulta seu funcionamento e sua ação em defesa dos direitos e da melhoria das condições de vida. ◊ A não propriedade da terra, o alto custo dos insumos agrícolas, o baixo preço que se paga pela produção e a falta de políticas governamentais para o desenvolvimento do campo obrigam-se a abandonar a terra e migrar para as cidades em busca de melhores oportunidades. Surgem, assim, grandes setores de sem-terra, com todas as consequências que esse fenômeno gera. ◊ Embora tenha aumentado a escolaridade, grande número de jovens não tem possibilidades ainda de ingressar no ensino médio. Muito poucos conseguem chegar à universidade. Os programas educativos oferecidos os mundo do campo e da roça não respondem, em geral, a seus valores culturais nem às suas necessidades básicas de desenvolvimento. Muito poucos são bilíngues. ◊ A família continua sendo salvaguarda e potencial básico para o desenvolvimento e o crescimento dos jovens do campo e da roça. A situação social geral, contudo, incide de tal forma que, pouco a pouco, também a família do campo e da roça vai se desagregando e sofrendo as consequências da migração. ◊ As comunidades do campo e da roça mantêm vivos valores humanos, profundos, como a hospitalidade e a solidariedade. A religiosidade popular e um espírito cristão enraizado dão-lhes uma sabedoria e uma espiritualidade que se caracterizam pela confiança em Deus, pela honestidade, pela valorização e pela compreensão dos sofrimentos próprios e , sobretudo, dos sofrimentos dos outros. ◊ Os jovens do campo e da roça estão abertos ao comunitário e ao cooperativo. Sua experiência e valorização da pobreza e do sacrifício fazem-nos capazes de tentar novas formas de empresas comunitárias, guiadas por critérios realmente humanos e não meramente economicistas. ◊ Em maior escala que outros, alguns setores jovens do capo e da roça são pressionados e muitas vezes utilizados pelo movimentos guerrilheiros, pelos que se dedicam ao cultivo da droga e ao narcotráfico e pelo Exército. 2.3.2. Os jovens estudantes Os jovens estudantes do 1º e do 2º grau não recebem, em geral, uma atenção especializada e diferenciada. Trata-se de um grupo no qual coexistem quem ainda é adolescente e quem já ingressou na etapa juvenil. Sua caracterização provém de sua localização no ambiente escolar, que continua sendo, apesar de tudo, um dos meios onde se congrega, normalmente, maior quantidade de jovens. Algumas características desse setor são: ◊ Valorizam a escola como espaço de encontro, formação, socialização e desenvolvimento pessoal. Muitos deles, contudo, não sabem para que estudam. Fazem-no por obrigação, para ocupar o tempo, encontrar-se com seu amigos ou por costume. Muitos estudam procurando chegar a “ter coisas”, profissionalizar-se, ganhar dinheiro ou vencer na vida. São poucos os que, conscientemente, buscam a escola como espaço para a cultura, a humanização, a ciência e o conhecimento. ◊ Apesar do avanço das ciências pedagógicas, os métodos utilizados não respondem, muitas vezes, os dinamismos reais da vida dos jovens. Continua-se ensinando em relações verticais, e o método de repetição deixa pouco espaço para a criatividade e a iniciativa. O sistema de aprovação promove a competição e impulsiona a querer ser mais que os outros. A educação continua sendo considerada por muitos como um processo de acumulação de conhecimentos. Descuidam-se outros aspectos importantes da formação integral, como a educação dos sentimentos, o
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desenvolvimento da sensibilidade e do sentido ético. Nas aulas, promovem-se práticas e valores relacionados com o neoliberalismo vigente. O sistema educacional ainda se mantém vivo alheio à realidade. Não prepara para a vida e os compromissos na sociedade. Ao terminar seus estudos, muitos se sentem frustrados. Descobrem que não lhes servirão nem para conseguir um trabalho ou assegurar o futuro. A crise econômica faz com que os estudantes se vinculem cada vez mais ao mundo do trabalho, para colaborar economicamente com suas famílias ou para manter-se nos estudos. O tempo limitado para dedicar-se ao estudo leva a um rendimento acadêmico menor e a menor formação. Nos primeiros anos das aberturas democráticas, e por influência do espírito pós-moderno, os estudantes aparecem como grupo apático, desorganizado e com pouca capacidade de ação, até na estrutura acadêmica. Apesar de tudo, buscam espaços para serem protagonistas, aceitando propostas fáceis como a violência, as gangues, as drogas e o álcool, ou as respostas construtivas como os grupos de estudo, o encontro, o esporte, a ação social ou a participação no movimento estudantil. Nesse grau de ensino normalmente se abrem ao sentido crítico, à inquietude social e às primeiras experiências da participação ativa. As atividades solidárias ou comunitárias e o encontro com situações de maior pobreza movem-nos a querer novos modelos de educação e novas formas de sociedade. Têm uma forte influência, imposta ou herdada, da vida de fé de seus pais. Têm, por isso mesmo, uma atitude de inconsciência e inércia ou de rejeição e questionamento à religião. O sentido da fé se faz mais vivo, porém, quando os motiva para o compromisso e a solidariedade e quando lhes é apresentada como resposta às suas buscas de uma religiosidade alegre, espontânea e juvenil.
2.3.3. Os jovens operários/trabalhadores São jovens das famílias populares de operários, trabalhadores, empregados, subempregos, desempregados e artesãos. Seu número aumenta cada vez mais como consequência das novas situações de pobreza geradas pela aplicação de políticas neoliberais. A maior parte deles tem dificuldades para encontrar trabalho. Quando o encontram, vêem-se forçados muitas vezes a ser “mão-de-obra barata” e não especializada. Inseguros diante das transformações que a tecnologia impõe ai trabalho industrial, estão continuamente expostos à possibilidade de desemprego. São economicamente frágeis e frequentemente não têm possibilidades para uma realização vocacional verdadeira. Algumas características desse setor são: ◊ Faltam empregos. Os que existem são instáveis. As exigências de “experiência” e “garantias” que lhes fazem para dar-lhes uma oportunidade de trabalho estão, na maioria da vezes, muito além de suas possibilidades. Isso os condena a ficar desempregados ou subempregados e permite que só uma minoria consiga um trabalho estável e bem-remunerado. ◊ Vivem uma situação crítica pelo baixo nível salarial e pela instabilidade do trabalho. Seu trabalho é menos considerado que o capital. Muito deles – especialmente as mulheres – são explorados de diversas formas, com tratamentos desiguais e desumanizantes. ◊ Os sofrimentos, a repressão e o sentido de luta deram aos operários e trabalhadores um espírito popular autêntico na ação pela verdade e pela justiça, embora, em alguns casos, a politização distorça a finalidade de suas organizações. ◊ Tentam viver num espírito solidário e de luta por seus direitos. Fazê-lo, no entanto, torna-se cada vez mais perigoso. As leis trabalhistas são aplicadas arbitrariamente e as organizações sindicais são mal-vistas limitadas ou reprimidas. Apesar das dificuldades, os sindicatos ainda são um expressão viva e válida do Movimento Popular. ◊ Com frequência são utilizados pelos partidos políticos, mais para suas finalidades e estratégias do que para defender seus direitos e responder às suas necessidades. Muitos se prestam a esse jogo com a esperança de sair de sua situação e superar seus problemas econômicos.
◊ Cansados das difíceis circunstâncias de sua semana de trabalho, procuram esquecer sua situação de excluídos e divertem-se em busca de algo diferente que nem sempre conseguem identificar.
2.3.4. Os jovens universitários Os jovens universitários são os que têm mais possibilidades de viver sua juventude. Têm um campo de ação vital e relacional no qual podem desenvolver ações próprias à sua condição de jovens, como assembleias, participação no movimento estudantil, participação nos conselhos das Universidades e muitas outras formas que o meio lhes proporciona. Algumas características desse setor são: ◊ O crescimento dos espaços físicos e o sistema aberto, implantado nas Universidades nas últimas décadas, permitiram o acesso ao ensino superior a jovens provenientes dos setores médios da sociedade e, também, embora em menor medida, os jovens dos setores populares. O ingresso cada vez mais marcado, contudo, pela competição, pelos altos custos e pelas exigências dos programas de excelência acadêmica. ◊ Muitos jovens universitários vivem marcados pela insegurança. Seu futuro profissional é incerto. Com muito esforço, conseguem obter o diploma universitário. Mesmo com o diploma, não conseguem emprego nem colocação profissional na sociedade. Não são poucos os formados que se vêem obrigados a realizar trabalhos diferentes e, muitas vezes, até mais bem remunerados que as próprias profissões. ◊ A realidade universitária leva-os a enfrentar, frequentemente, de maneiras muito diferentes e com maior ou menor grau de consciência, a relação entre fé e ciência. Nos últimos anos, vem-se percebendo uma abertura maior aos valores espirituais e religiosos e a todo tipo de experiências – especialmente orientais e mágicas – em busca do transcendente. Entretanto, nem sempre há oportunidades para a formação e aprofundamento dos critérios éticos. Por isso, a vida de muitos jovens universitários está desarticulada. Agem de maneira diferente na Universidade do que com sua família, seu namorado(a), seus amigos e a Igreja. ◊ O ambiente universitário e os níveis de formação adquiridos provocam em muitos jovens uma certa atitude de rejeição de seus ambientes e classes de origem. O serviço profissional não é percebido como ligado à comunidade; nem a atividade profissional a um modo de vida sem busca de lucro. ◊ A grande maioria dos universitários trabalha e estuda. Isso dificulta sua vida universitária plena e sua participação como protagonistas nas atividades, na tomada de decisões e nas ações de extensão e pesquisa da Universidade. ◊ Muitas organizações acadêmicas e políticas de universitários que tiveram, por certo tempo, importante protagonismo estão atualmente desarticuladas e sem capacidade de ação. É necessário encontrar formas novas e novos canais de participação. Existe apatia, igualmente, pelas atividades políticas e partidárias. São consideradas manipuladoras e falsas. Há ceticismo quanto às propostas de desenvolvimento e de participação comunitária. ◊ Alguns cristãos são reconhecidos pelos valores evangélicos que são capazes de testemunhar e pela força das opções da Igreja latino-americana pelos pobres, a luta pela justiça e pelos direitos humanos, a defesa da vida, a promoção social e a transformação das estruturas e situações injustas. Mas não devem se considerar os únicos que têm esse tipo de compromisso. 2.3.5. Os jovens indígenas A cultura latino-americana deve boa parte de suas características às culturas indígenas que foram conhecidas quando do descobrimento e da conquista do continente. Sua sobrevivência constitui um desafio para a evangelização, não somente porque no contato com a religião dominante – a católica – deuse uma forma peculiar de mestiçagem religiosa, mas porque o esmagamento socioeconômico que esses povos suportam está exigindo uma conscientização libertadora que não pode esquecer o componente religioso de suas etnias.
Algumas características desse setor são: ◊ Os povos originários têm um sentido de unidade familiar e tribal, caracterizando-os por sua solidariedade e pelos valores comunitários. Isso os leva a lutar contra a desagregação e o individualismo que a sociedade neoliberal lhes impõe. Os jovens participam dessa luta de todos os povos. ◊ Seu sentido religioso expressa sua relação transcendente com Deus a partir das próprias vidas e da relação que têm com a natureza das coisas. Daí, valores tão genuínos como a contemplação, a piedade, a sabedoria popular, as festas e a arte expressarem suas íntimas e mais fecundas vivências espirituais. ◊ A maioria dos povos, despojados de suas terras, marginalizados e vivendo em situações inumanas, aparece com os mais pobres entre os pobres da América Latina. Sendo os primeiros habitantes e donos destas terras, devem ser reconhecidos seus direitos a uma justa demarcação e a um espaço vital que não só garanta sua sobrevivência, mas permita, sobretudo, conservar sua identidade como grupo humano, como povo e nação. Seu patrimônio cultural e sua participação social dão vigor renovado ao continente. ◊ Há um crescente despertar para os valores autóctones e para o respeito à originalidade das culturas e comunidades indígenas. Esse sinal de esperança, contudo, vê-se ameaçado pela influência dos modelos culturais das sociedades nacionais, majoritárias e dominantes, cujas formas de vida, critérios e escalas de valores geralmente atentam contra essas culturas. ◊ A defesa da identidade e da cultura de seus povos, a integração com outras culturas e outros desenvolvimentos sociais e sua própria articulação são alguns dos grandes desafios que estão sendo colocados nas mãos da juventude indígena. 2.3.6. Os jovens afro-americanos Constituem uma parte considerável da população juvenil do continente. São um grupo étnico cuja identidade se estabelece em relação às suas raízes africanas e à sua inserção no continente americano. Têm sido vítimas da escravidão e de um longo processo de marginalização histórica, social e econômica, bem como de uma atenção evangelizadora deficiente. Algumas características desse setor são: ◊ Sua história é marcada pelo desenraizamento do continente africano, de sua cultura, de sua terra e de sua família. Trezentos anos de escravidão deixaram uma profunda marca de ressentimento e negatividade em seu estilo de vida e em sua maneira de ser. ◊ O racismo e os preconceitos sociais continuam sendo muito reais. Isso pode ser constatado no trabalho, ao se perceber que a maioria da população negra trabalha em ocupações manuais com remuneração muito baixa; na discriminação que os impede de viver como pessoas iguais às demais e na forma como são tratados por muitos meios de comunicação, que os apresentam como seres inferiores e perigosos. ◊ É cada vez maior o número de jovens e pessoas que optam por uma reafirmação de sua identidade cultural e de suas raízes africanas. Assumem sua negritude e lutam para resgatar, recriar e vivenciar elementos valiosos de sua cultura. Ao mesmo tempo, a manipulação sociocultural da estrutura dominante lava-os a não assumir a sua cultura, a envergonhar-se de sua origem e a assumir formas de comportamento próprias de outros grupos culturais. ◊ É cada vez maior o número de jovens e pessoas que optam por uma afirmação de sua identidade cultural e de suas raízes africanas. Assumem sua negritude e lutam para resgatar, recriar e vivenciar elementos valiosos de sua cultura. Ao mesmo tempo, a manipulação sociocultural, a envergonhar-se de sua origem e a assumir formas de comportamento próprio de outros grupos culturais.
◊ Assim como os jovens indígenas, a defesa da identidade e da cultura de seus povos, a integração com outras culturas e outros desenvolvimentos sociais e sua própria articulação são alguns dos grandes desafios que estão nas mãos dos jovens afro-americanos. 2.3.7. Os jovens em situações críticas Trata-se d setor de jovens que se encontram em situações sociais conflitivas ou em desvantagem social, não lhes permitindo um pleno desenvolvimento como pessoas. São consequência das contradições da própria sociedade que, na vida diária, contradiz o significado original do que é a juventude – etapa de aprendizagem, de opções, de estudos, de incorporação na vida social e produtiva, de idade do dinamismo, da alegria e da esperança – e mostra um contexto de pobreza, desigualdade, marginalidade e desumanização. É o que se vem chamando de “cultura da morte”. Ao falar em situações críticas, deve-se ter em conta que a crise da juventude é uma crise generalizada. Todo o setor juvenil vive uma situação de desvantagem simplesmente pelo fato de ser jovem e viver num contexto social conflitivo. É uma crise diversificada que, tendo uma mesma raiz, expressa-se em diferentes manifestações e condutas, como a toxicomania, a delinquência, a prostituição etc. É uma crise individualizada. Cada jovem vive sua própria história de sofrimento diferentemente das demais pessoas. As situações de crise que a juventude vive não é senão reflexo das crises que a sociedade vive. Podem ser entendidas como as tensões ou problemáticas agudas do setor juvenil em suas distintas ordens ou como momentos de ruptura com o estabelecido, mas com infinitas possibilidades de mudança e de transformação. Alguns elementos para uma descrição dos jovens em situações críticas podem ser os seguintes: ◊ São os que vivem ou convivem em situações de injustiça, miséria, intolerância, desintegração familiar e desamor que os levam a situações-limite toxicomania, alcoolismo, prostituição, abuso sexual, violência, infração à lei, suicídio, uso inadequado da sexualidade, infecção por HIV, etc – e a atentar contra a sua própria vida e a vida dos que os rodeiam. ◊ São os mais vulneráveis ao envolvimento em alguma situação crítica, por dificuldades pessoais como a baixa auto-estima, a insegurança, a solidão, a timidez, a ansiedade, o ressentimento e a pouca capacidade de questionar, analisar e tomar decisões. ◊ São os que, não encontrando espaço em instituições fundamentais como a sociedade, o Estado, a Igreja, a escola, a família – porque lhes negaram os direitos primordiais para se desenvolver e crescer como pessoas -, optam por alternativas que os levam a situações limites. ◊ São os que, vítimas da manipulação e da alienação dos meios de comunicação de massa, criam para si mesmo falsas necessidades que buscam satisfazer de maneira equivocada, a partir de uma percepção distorcida da realidade, assumindo atitudes e comportamentos que os levam a perder a sua identidade. Os jovens em situações críticas não são um grupo específico fácil de delimitar socialmente. Nem sempre se encontram os grupos com características comuns. A classificação apresentada a seguir ajuda a localizar o tipo de problemática e a maneira de atendê-los. a) Os jovens dependentes das drogas A toxicomania – incluído o álcool – é um problema crescente entre a juventude. A toxicomania é entendida como um problema de saúde; a pessoa torna-se dependente dos efeitos físicos e psicológicos produzidos por uma substância alheia a seu organismo. O abuso de tais substância tem efeitos nocivos para sua vida individual, familiar e social. A toxicomania tem entre suas causas, a personalidade fraca dos adolescentes e sua baixa autoestima; a influência do meio ambiente; as relações com outros jovens consumidores; os interesses econômicos de quem produz, processa e trafica; a desorganização familiar e a falta de educação que previna contra os danos causados pela às substância tóxicas.
• Há diferentes tipos jovens consumidores de drogas; os que somente as experimentam por curiosidade ou por pressão do grupo, os que as usam de maneira frequente, porém mantendo certo controle; e os que já estão numa etapa em que necessitam da droga para poder viver. • Caracteristicamente, os jovens dependentes têm problemas afetivos, são manipuladores, abandonam a escola, evitam a autoridade e rejeitam o cumprimento de normas sociais, como compromissos familiares, profissionais e políticos. Alguns negam a própria doença; outros a reconhecem e solicitam apoio para se reabilitar. • A toxicomania tende a aumentar nas grandes cidades. A idade em que se inicia o consumo é cada vez menor, o que significa que muitos estão começando a se drogar ainda crianças. b) Os jovens que delinquem A delinquência de adolescentes e jovens pode ter diferentes causas. A principal é a pobreza, que os leva a delinquir para buscar subsistência e ajudar a economia familiar. Também pode ser produzida por fatores de personalidade, pela dinâmica disfuncional da família, pelo meio ambiente criminógeno e pela resposta de alguns jovens à repressão ou ao fato de se sentirem vítimas da exploração. • Deve-se distinguir os jovens que têm alguma conduta anti-social ou delituosa, imprudente ou pouco grave, daqueles que adotam um estilo de vida totalmente fora das regras sociais ou que já fazem parte da delinquência organizada. São situações diferentes. • A maioria dos jovens delinquentes reproduz o modo de vida da sociedade a que pertencem. Reagem com a mesma violência, desonestidade e corrupção que imperam na sociedade e com as quais esta os agride. Alguns viveram situações dramáticas. Não tiveram uma socialização adequada e têm um baixo nível de controle dos impulsos e de tolerância à frustração. A introjeção de normas e limites é muito deficiente. Os “delinquentes” não surgem de um momento para o outro. Surgem como consequência de um processo em que as pessoas ou grupos vão se afastando progressivamente de um comportamento socialmente aceitável. • São jovens muito sensíveis à crítica e à provação ou desaprovação de quem os rodeia. Por serem estigmatizados pela sociedade, costumam isolar-se. Suas relações são superficiais. Eliminados os estigmas sociais, desaparece o sentimento de culpa e aumenta a possibilidade de reintegração à sociedade, buscando-se uma atividade produtiva honesta e estabelecendo-se relações de confiança. • Quando têm problemas com a lei ou estão presos, atemorizam-se, deprimem-se e procuram mudar. Muitas vezes, porém, sua própria realidade impede a transformação e os leva a problemas ainda maiores. Por causa das deficiências do sistema judiciário, muitos têm de suportar abusos de autoridades e a violação de seus direitos. Normalmente, recebem mais castigos que medidas de orientação e de reintegração social. c) Os jovens na prostituição As jovens entram na prostituição geralmente por razões econômicas. Como na situação anterior, também aqui a pobreza leva a essa forma de atividade como meio de consecução dos recursos necessários à subsistência. Influem, igualmente, os conflitos familiares, especialmente os relacionados com a figura do pai ou de algum familiar. Já casos em que a própria família as obriga a se prostituir. Agem sob pressão de máfias que primeiro as atraem e seduzem, e depois as exploram até deixa-las enredadas em “obrigações” e “serviços”. • Caracteristicamente, são mulheres que se valorizam pouco. Desde pequenas tiveram problemas afetivos ou foram vítimas de abusos sexuais, de maus-tratos físicos ou psicológicos. Normalmente são desconfiadas. Têm dificuldades para manter relações conjugais estáveis. São inseguras e necessitam de alguém que as proteja. • Quando engravidam, costumam proporcionar boa atenção a seus filhos, embora às vezes os abandonem. Reproduzem os padrões de educação e relacionamento que receberam. Envolvem-se facilmente no consumo e no tráfico de drogas e são muito sensíveis ao reconhecimento que recebem da sociedade. • Nas grandes cidades está aumentando a prostituição masculina, homossexual e infantil que, assim como a prostituição feminina, consiste no oferecimento de satisfações sexuais em troca de dinheiro. Acarreta graves consequências a quem a exerce, porque perde o sentido de sua vida e o
valor de sua dignidade. Ficam sujeitos à exploração e ao abuso, além de correrem graves riscos de saúde e de segurança. Alguns dos que vivem essa situação aceitam-na e não têm dificuldades para apresentar-se socialmente como homossexuais. A grande maioria, contudo, sofre por ter de expor-se assim numa sociedade que não reconhece e castiga a homossexualidade como uma conduta moralmente desviada. Nos últimos anos têm surgido numerosos movimentos de homossexuais e lésbicas exigindo respeito à sua condição, proteção a seus direitos humanos e maior participação sócio-política. Como é próprio das minorias ativas, alguns de seus posicionamentos têm sido assumidos pelo pensamento social. Por isso encontram-se, especialmente entre os jovens, expressões a favor de uma cultura que seja mais tolerante com os homossexuais. Esses debates sacodem igualmente a Igreja e repercutem na postura que esta toma para atender pastoralmente a esse setor, tendo em conta que se trata de um grupo normalmente sensível ao transcendente e a espiritual. d) Os jovens soropositivos e doentes de AIDS Trata-se de um grupo em crescimento, já que a síndrome da imunodeficiência adquirida é uma doença que avança em ritmo acelerado, particularmente entre os jovens e os adultos em idade produtiva. A doença tem duas fases. Na primeira, chamada soropositividade assintomática, a pessoa que incorreu em alguma conduta de risco infectou-se com o vírus da imunodeficiência humana, porém não desenvolve a doença, embora possa transmiti-la. Na segunda fase, aparecem os diferentes sintomas e sinais, e a doença se manifesta plenamente até levar à morte. • Num primeiro momento, procurou-se identificar esses setores com a população homossexual, com as prostitutas e drogados. Os estudos, no entanto, confirmaram que não se trata de uma doença exclusiva de quem vive em situações sociais críticas. Qualquer pessoa pode vir a contraí-la, na medida em que se desenvolva comportamentos de risco como contatos sexuais com troca de fluxos, promiscuidade, uso compartilhado de seringas de drogas intravenosas, via perineal, transfusões de sangue, etc. • Muitas pessoas e, principalmente, muitos jovens, mesmo sem sabê-lo, estão contagiados. Quem já se sabe contaminado costuma sucumbir ao desespero e à angústia. Os que estão na etapa de manifestação da doença sofrem de corpo e alma. Desesperam-se porque sabem que por ora não há cura possível, os remédios que atenuam o processo são muito caros e os serviços de saúde, insuficientes. Sofrem igualmente porque começam a experimentar a rejeição e a separação de suas próprias famílias, de seus amigos e comunidades. • A AIDS abriu espaços para a discussão e para que se suscitassem grandes desafios de natureza psicossocial, pastoral e moral, relacionados, entre outros, com o uso de preservativos, a fidelidade, a castidade, os exames de laboratório para a detecção do HIV, o tratamento dos doentes, o apoio familiar, os direitos dos doentes, as políticas sociais de saúde e a dotação orçamentária, a educação, a prevenção, a atenção pastoral, os grupos religiosos que, diante desta situação, procuram se aproximar da população contaminada, etc. e) Os jovens com deficiências Trata-se de um setor socialmente desarticulado, mas numerosamente significativo. São jovens que sofrem algum tipo de invalidez e que têm sérios problemas físicos, psicológicos e sociais, como paralisia cerebral, síndrome de Down, psicoses e outras doenças mentais, deficiência visual ou auditiva, paralisia, etc. Muitos sofrem essa situação de desvantagem social desde o nascimento ou desde a infância. Outros foram acometidos mais recentemente, como é o caso daqueles gravemente vitimados por intoxicação com drogas ou pela violência e pela guerra. • Alguns estão sob cuidados de suas famílias. Outros permanecem em hospitais ou centros especializados. Há quem viva e morra relegado à solidão e ao abandono. Sofrem por suas próprias doenças e limitações permanentes, pela constante necessidade de receber serviços reabilitadores de saúde, pela insatisfação existencial, pelo estado psicológico de depressão, angústia familiar, pela dificuldade de serem reconhecidos e ajudados socialmente e pelos problemas econômicos que sua situação e recuperação acarreta. • É particularmente preocupante sua difícil integração à sociedade, de maneira produtiva e autosuficiente. O sistema econômico neoliberal exclui os improdutivos, obrigando-os a ser
dependentes, a se tornar um fardo para as suas famílias e a viver sujeitos à assistência e até mesmo à mendicância. • Requerem uma atenção especializada em matéria educativa, legal, de saúde, econômic, trabalhista profissional e, evidentemente, pastoral. Neste campo, as experiências que existem são, na maioria do tipo assistencial. Não promovem a auto-suficiência nem a participação social e o compromisso com os deficientes. • Junto aos deficientes, suscita-se o desafio de acompanhar também os que os atendem e suprem suas necessidades familiares, amigos, profissionais, agentes de pastoral, homens e mulheres de boa vontade com um alto espírito de entrega, mas que, ao mesmo tempo, precisam satisfazer suas próprias necessidades e resolver seus próprios problemas para poder ajudar aos necessitados. f) Outras possíveis situações críticas Com uma situação social tão difícil e com uma juventude tão vulnerável, é bem provável que existam outras situações críticas que obstaculizem seu pleno desenvolvimento e promoção humana. Analisando a realidade da juventude e acompanhando de perto os grupos de jovens, será possível descobrir novas situações críticas que, sem deixar de lado a visão e a ação integral e de conjunto, podem ser atendidas pastoralmente. É o caso das mães solteiras, das vítimas de abuso sexual, dos casais novos em crise, dos jovens encarcerados, etc. 2.4 A nova visão cultural-simbólica A visão cultural simbólica não desconhece as contribuições das visões anteriores para compreender os jovens. Pelo contrário, integra-as e lhes dá um sentido novo. Busca responder aos questionamentos que surgem sobretudo quando se olham as aceleradas e profunda mudanças culturais que estamos vivendo. Não se deve esquecer que a juventude surge, historicamente, como um fenômeno próprio da cultura emergente, a partir dos processos de urbanização. Desde o começo a juventude aparece pouco homogênea. Diferentes formas culturais correspondem a uma variada gama de condições juvenis que evoluem em ritmos próprios. Por isso, pode-se falar de um universo cultural dos jovens, definido por uma enorme variedade de formas de viver a vida e de encontrar sentido para a existência. Nele se dá um processo múltiplo e contraditório de formas, fruto do tecido de relações que os jovens vão estabelecendo com as diversas instâncias socializadoras. Esse universo se compõe de “culturas jovens” ou espaço sociais de confluência, de encontro, de identificação, de liberdade entre iguais, que expressam traços semelhantes, como uso do espaço, gostos, formas expressivas e de significação, linguagens, etc. Apesar das diferenças, todas se caracterizam pela contestação à cultura tradicional. Põem em xeque e reelaboram as propostas das diferentes instituições. Constituem fontes de resistência contra toda ordem imposta e de rejeição ao código dominante. Ultimamente, estão-se compreendendo mais como “ambientes”, “atmosfera”,”sensibilidades”, “comunidades culturais” geradoras de significação, nas quais coexistem elementos de diferente natureza, sociais, políticos e econômicos. Para entender essa nova sensibilidade dos jovens, é necessário retomar a referência à pós-modernidade, que está gerando um fenômeno cultural de polaridades em tensão: de uma cultura do “uno”, está-se passando para uma cultura do “plural”; do “definido” para o “ambíguo”; do “linear” para a “rede”. Nesse sentido amplo, as culturas juvenis referem-se à maneira como as experiências sociais dos jovens se expressam coletivamente mediante a construção de estilos de vida diferentes, localizados fundamentalmente no tempo livre ou em espaços intersticiais da vida institucional. Num sentido mais restrito, são microsociedades com graus significativos de autonomia em relação às instituições adultas. Os jovens de hoje criaram verdadeiros movimentos culturais que conjugam fatores institucionais com fatores de ordem subjetiva. Recentes estudos apontam alguns traços das sensibilidades dessas culturas juvenis. São diversas, não-homogêneas e contra-culturais; têm a ver com atmosferas ou ambientes geradores de significado que não coexistem nem constituem em período cronológico nem um setor. Alguns desses ambientes são a irracionalidade, expressa no delírio, na droga e nas seitas; a rebelião expressa no antiautoritarismo, na não-escola e na evasão; a intimidade, expressa no afetivo-sexual e nas
novas formas de ser família, como as comunidades; a identidade no consumo, expressa nas modas; e a paz. Expressa no antibelicismo e no não à guerra. Sua característica comum é a mutabilidade permanente, a instabilidade, o nomadismo e o estar de passagem. Não obstante seu caráter nômade, podem esboçar-se modas ou horizontes comuns de gostos que fazem com que se tornem familiares uns aos outros e, ao mesmo tempo, os diferenciam. Os jovens vivem e apreciam modas que não obedecem a um princípio ordenador da realidade, mas à possibilidade de correspondência. O “gosto” é a correspondência, mais ou menos conflitiva, de objetos culturais e valores. A moda é uma forma de expressar publicamente sentidos compartilhados culturalmente. Na comunicação ou no âmbito dinâmico de circulação de sentidos partilhados, os jovens tomam objetos culturais de alto consumo (vídeos, músicas, roupas...) e os ressignificam. Neste contexto, aparece o lúdico como um dos eixos e conceitos explicativos das identidades juvenis. O lúdico entendido como o território dos estados de disponibilidade e abandono nos quais os jovens se situam. São estados que escapam a toda intencionalidade utilitária. Levam-nos a uma forte experiência de ser jovem, cuja raiz está na liberdade do jogo. Um jogo sem regras, nas atividades livres do prazer, na festa, na criação artística, nos sonhos e na prática do imaginário. Recupera-se, assim, a dimensão estética da vida, que permite um acesso à totalidade da realidade a partir de um ângulo que não o da racionalidade iluminista. Trata-se de uma compreensão do mundo a partir das formas sensíveis. A partir do gosto, da relação mediada por símbolos e do universo dos desejos. A partir dessa dimensão tomam sentido, para as culturas juvenis, todos os demais assuntos e temas. Ao observar essas culturas juvenis, não se pode deixar de perceber as notáveis diferenças entre os jovens das grandes cidades, os jovens dos pequenos povoados ou dos jovens que vivem no campo. Em todos esses casos, é necessário um especial discernimento das riquezas de sua cultura juvenil. A visão sociológica, que considera a juventude como corpo social, permitiu reconhecer diferentes setores, condicionados por distintas características socioeconômicas e culturais. Pela caminhada da Pastoral da Juventude Latino-Americana e pelo papel decisivo que os fatores socioeconômicos desempenham no passado, presente e no futuro do continente, deu-se uma ênfase especial à apresentação da situação social dos jovens em seus respectivos setores. Não se deve desconhecer, contudo, o papel dessas novas comunidades culturais ou de sentido, as novas sensibilidades a partir das quais os jovens se apropriam e ressignificam sentidos e modos de ver e de viver. É necessário explorar melhor as novas sensibilidades que se constituem em novas pistas para conhecer e amar os jovens. Essa tentativa de olhar de forma mais ampla o juvenil leva a reconhecer a importância da pessoa de cada jovem, do contexto socioeconômico a partir do qual eles constroem suas identidades e das novas comunidades culturais ou sensibilidades que impregnam todos os ambientes e setores. Uma pastoral da juventude que queira responder realmente às necessidades dos jovens não pode desconhecer nenhuma dessas dimensões. Ao olhar os jovens hoje, a Igreja percebe que eles não são somente destinatários da evangelização. Cada geração aporta uma sensibilidade própria à sua vivência cristã, possui a capacidade de descobrir novas dimensões da fé e revela sinais de vida ainda suficientemente explicitados na experiência cristã (P1169). 3. CONHECER A JUVENTUDE NÃO É FÁCIL A fé na presença e na ação libertadora de Deus e de seu Espírito na história leva a reconhecer os sinais de vida que se manifestam na grande diversidade de realidades nas quais vivem os jovens do continente. Nesses sinais de vida celebra-se a juventude como um dom especial de Deus para toda a humanidade. ○ Através de caminhos muito diferentes, os jovens buscam respostas à sua necessidade de Deus e às suas perguntas pelo sentido. De fato, a imensa maioria diz crer em Deus, e um número significativo está comprometido com o conhecimento e o seguimento de Jesus. ○ Defendem decididamente seu direito de ser sujeitos e protagonistas de toda proposta que tenha relação com suas vidas. O valor da pessoa e de sua própria subjetividade é um traço muito significativo que marca a identidade geracional dos jovens de hoje.
○ A mentalidade técnico-racionalista, adquirida na escolaridade, torna-os menos expostos à resignação e ao fatalismo. Não se sentem obrigados a repetir modelos pelo simples argumento do costume ou da tradição. A convicção pessoal tem caráter de critério último para a decisão de suas opções de vida. ○ Desejam menos distância, menos formalismo e maior espontaneidade no trato entre pais e filhos, entre professores e alunos, entre leigos e sacerdotes e, em geral, em todas as suas relações. Agrada-lhes conhecer-se a si mesmos e partilhar suas inquietações e intimidades com seus iguais. Mantêm a mais democrática relação entre os sexos que já houve na história. Têm muitas ocasiões para participar das experiências geracionais que reúnem outros jovens de diferentes classes sociais. ○ Vivem a felicidade do momento presente com um sentido de gratuidade, e não como consequência de merecimentos ou sacrifícios. Têm um forte sentido e grande admiração pela celebração e pela festa. A par dessas, há também situações do mundo juvenil ameaçadas por sinais de morte, que se deve ser anotados e combatidos no trabalho pastoral que se realiza com os jovens. o No mundo de hoje, o sentido da vida tornou-se plural. Existe um amplo campo de sentidos da vida. Supõe-se que cada um possa escolher como, por que e para que viver, com autonomia e independência pessoal. Contudo, o mercado de sentidos manobra muitos jovens e frequentemente disfarça de escolha a manipulação publicitária que se faz com eles. As diversas e contrapostas ofertas de estilo de vida debilitam as certeza de muitos jovens, confundem-nos e, não poucas vezes, levam-nos a experimentar graves contradições internas. Essa confusão agride sua saúde espiritual, pois produz sentimentos de divisão e rupturas em sua identidade pessoal. o Muitos jovens se sentem distantes do mundo adulto da participação social e política e das figuras de autoridade. Em muitos casos, essa atitude esconde um desinteresse por crescer e amadurecer. Não são poucos os que sentem a tentação de permanecer como estão e renunciar ao esforço e ao desafio de superar-se, melhorar e assumir novas responsabilidades. o Na medida em que os jovens se socializam, são impelidos a considerar os demais rivais. Incorporam desconfiança e temor para a relação com os outros. São cada vez mais escassas as possibilidades que têm de fazer experiências de solidariedade e cooperação, embora se sintam naturalmente inclinados a tanto. o A dificuldade de ingressar na educação superior e, portanto de entrar com relativo êxito no mercado de trabalho faz com que muitos jovens incorporem uma espécie de desilusão pelas ofertas e possibilidades que a sociedade tem para eles. São e se sentem excluídos. o A cultura pós-moderna tende a desencadear um falso sentido de espontaneidade e da responsabilidade moral. Na prática, isso se traduz num imaturo sentimento de inocência pessoal em face do mal cometido e do bem omitido. É necessário ajudar a superar essa falsa consciência moral. o A sociedade de consumo multiplica os produtos e, para assegurar seu mercado, exacerba a capacidade de consumir. Um modo de consegui-lo é fazer com que nenhum produto satisfaça efetivamente as necessidades mais profundas de quem o adquire. Manipula os consumidores para que vivam num nível superficial, sem contato com as genuínas motivações. Isso leva, principalmente os jovens, a uma espécie de incapacidade para vivenciar e para interiorizar. Essa incapacidade faz recorrer permanentemente a estímulos e a novidades para se chegar a sentir que se está vivo. É o polo oposto da espontaneidade e da vital expressão da alegria de viver. o A convicção de que a felicidade pode ser uma experiência do presente, e não somente algo que se alcançará apenas no futuro, encheu a vida de muitos jovens de uma nova luz. A experiência demonstra, no entanto, que a felicidade completa só se desfruta quando acompanhada da capacidade de comprometer as energias em tarefas de longo alcance, com horizonte amplo e projeção social. Uma visão apenas de curto alcance torna estéril a capacidade de gozar e a esgota.
Todas essas situações convidam a estarmos atentos, a discenir e a não permitir que se debilite o sentido de Deus, de sua ação e presença que convida a apostar, sempre, na vida. Contra a morte.
4. OS JOVENS E A IGREJA Não obstante a tendência á privatização do religioso e a criação de campos religiosos próprios, longe do modelo institucional, os jovens latino-americano estabeleceram um diálogo com a Igreja especialmente atráves da Pastoral da Juventude. Ela já tem um longo caminho percorrido que deve ser valorizado e avaliado em todos os seus dinamismos e limitações. Um momento forte desse diálogo foi o Primeiro Congresso Latino-Americano de Jovens, realizado em Cochabamba (Bolívia), de 18 de dezembro de 1991 a 5 de janeiro de 1992. Ali os jovens manifestaram sua consciência sobre as riquezas do continente. Ao mesmo tempo, contudo, denunciaram sua situação de empobrecimento, manipulação, marginalização e até extermínio, como consequência de “um processo histórico que violentou nossas culturas, direitos e dignidade humana”5 e os fez dependentes econômica, política, cultural e socialmente. Definiram-se como jovens “com rostos muito concretos, de classe popular, urbanos, rurais, trabalhadores, estudantes, desocupados, mineiros, pescadores... com um caminho comum de lutas e conquistas... porém necessitados de uma identidade latino-americana que nos dê oportunidades e formas de protagonismos”6, unidos pela fé em Jesus Cristo numa “busca de perspectivas comuns para enfrentar a opressão e a marginalização porque seguimos crendo num Deus que nos faz transmitir vida a partir da pobreza”7. Disseram querer “que a Igreja, especialmente a hierarquia, se faça pobre com os pobres, tenha contato com o povo que sofre, seja servidora e, através de sua ação, assuma a luta do povo pela libertação, inserindo-se na dinâmica social; que ela seja profética, denunciando a dependência e a pobreza no continente e os abusos econômicos e políticos, chamando por seu nome a cada injustiça”8. Junto com a denúncia clara da injustiça, consideram “necessário o anúncio de critérios e meios para a construção da sociedade fraterna, alternativa à falsa liberdade que o neoliberalismo propaga e à falta de liberdade que fez o socialismo real fracassar. Essa atitude deve brotar da reconciliação da Igreja com o passado e do pedido de perdão pelas sombras que projetou, valorizando também as luzes geradas na vida da América Latina”9. Propuseram “uma Igreja comunidade de comunidades, fraterna, dialogante, compreensiva, igualitária e sem distinções, organizada com unidade de critérios e de planos pastorais feitos de forma participativa com pastores amigos dos jovens, em atitude de escuta e de serviço, com leigos responsáveis em sua vocação... Uma Igreja que priorize a formação de pequenas comunidades encarnadas no ambiente cultural dos povos... onde a mulher seja reconhecida e valorizada como dinamizadora do corpo eclesial e social”10. Os bispos, por sua vez, reunidos na IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano em Santo Domingo, constataram que “são cada vez mais os adolescentes e jovens que se reúnem em grupos, movimentos e comunidades eclesiais para rezar e realizar distintos serviços de ação missionária e apostólica” (SD 112). Reconheceram que “os jovens católicos, organizados em grupos, pedem aos pastores acompanhamento espiritual e apoio em suas atividades. Necessitam, sobretudo, em cada país, de linhas pastorais claras que contribuam para uma pastoral Juvenil orgânica” (SD 113). A Igreja continua tendo um grave problema de comunicação com os jovens. Muitas vezes desconhece suas linguagens, suas sensibilidades, suas lógicas e seus códigos. A rapidez das mudanças culturais e a condição instável da cultura e do próprio jovem criam-lhe dificuldades para gerar e 5
I Congresso Latino-Americano de Jovens, Quem somos? Nº1, CCJ, São Paulo, 1992. Idem, nº6. 7 Idem, nº8. 8 Idem, Contribuição à IV Conferência Geral do CELAM, nº22. 9 Idem, nº23. 10 Idem, nº24-25 6
acompanhar processos de amadurecimento humano e cristão. Assim o expressam os responsáveis nacionais da pastoral da juventude em seus âmbitos latino-americanos de encontro: “A mentalidade clerical ainda existente; o medo e a insegurança de muitos pastores, seu desconhecimento e conflito com as novas gerações e seu frequente afã de controle; a não-aplicação dos documentos do Magistério da Igreja em relação à vocação específica dos leigos e de maneira dualista de entender a relação Igrejamundo; a falta de um plano integral e progressivo para o acompanhamento de todo o processo formativo dos jovens e o paternalismo de alguns assessores... fazem com que se experimente uma falta de valorização e de aceitação afetiva e efetiva da pastoral da juventude por parte de diferentes setores da Igreja, pastores e leigos adultos.”11. “A existência de diferentes modelos de Igreja leva à separação que se percebe, muitas vezes entre uma Igreja que afirma mais os aspectos institucionais e uma Igreja que promove mais seu aspecto de Povo de Deus... Uma visão demasiadamente institucionalista da Igreja, reforçada por um excessivo clericalismo, promove frequentemente uma espiritualidade desencarnada, um sacramentalismo sem sentido e uma tendência excessiva a moralizar a vivência da espiritualidade... Alguns setores do mundo adulto relativizam ou até mesmo desvalorizam a participação dos jovens na Igreja e no mundo. Como não existe uma busca de diálogo com eles, desconhece-se o esforço que os jovens realizam pessoal e grupalmente para viver sua espiritualidade”12. Não se pode desconhecer os esforços que a Igreja realizou e realiza por encarnar-se e responder com fidelidade aos desafios do mundo de hoje. A Pastoral da juventude continua abrindo espaços para que o jovem se expresse e seja Igreja. A Igreja latino-americana adquire um rosto jovem precisamente pela presença e pelo protagonismo de milhares de grupos e de jovens que a dinamizam e a renovam com sua ação. De todas as formas, é preciso que a opção preferencial pelos jovens seja mais efetiva que afetiva, isto é, que seja “uma opção concreta por uma pastoral da juventude orgânica em que haja um acompanhamento e apoio reais com diálogo mútuo entre jovens, pastores e comunidades” e na qual se destinem efetivamente “maiores recursos pessoais e materiais por parte das paróquias e das dioceses” (SD 114). “ O que requer hoje é uma Igreja que saiba responder às expectativas dos jovens. Jesus deseja dialogar com eles e propor-lhes, através de seu corpo que é a Igreja, a perspectiva de uma escolha que comprometa suas vidas. Como Jesus com os discípulos de Emaús, assim a Igreja deve fazer-se companheira de viagem dos jovens, com frequência marcados pelas incertezas, resistências e contradições, para anunciar-lhes a “nova” sempre maravilhosa de Cristo Ressuscitado”13.
11
SEJ – CELAM, Assessoria e acompanhamento na pastoral da juventude – XI Encontro Latino-Americanos de Responsáveis Nacionais pela Pastora da Juventude, CCJ, São Paulo, 1993, p.9. 12 Espiritualidad y misión de la pastoral juvenil, Santafé de Bogotá, 1995, pp.22-23. 13 João Paulo II, Mensagem à XXXII Jornada Mundial de Oração pela Vocações, 7 de maio de 1995, nº2.
II
Todo grupo humano tem uma memória coletiva que influi em seu comportamento. Se se quer impulsionar a Pastoral da Juventude no continente, não se pode partir do zero. Deve-se conhecer e utilizar a experiência que a Igreja vem realizando em seu trabalho com a juventude. O passado é importante. Dele se pode aprender os acertos e os erros e nele é possível encontrar uma fonte de inspiração para o futuro. Uma pastoral sem memória histórica não tem identidade. Esta condenada a não avançar e a repetir os erros do passado. A recuperação da memória histórica é importante para que a pastoral possa ter raízes profundas, realizar processos com continuidade e evitar a tentação de estar começando sempre de novo. A Igreja veio elaborando instrumentos teóricos e estratégias diferentes para a evangelização da juventude, de acordo com as exigências de cada época. Os modos de pensar e de agir e as características culturais variam de uma geração para a outra. Por isso, um instrumento teórico que foi válido para uma época pode não o ser, necessariamente, para a outra. Embora haja traços comuns em quase todos os países, há igualmente grandes diferenças. Esta retrospectiva histórica procura dar uma visão de conjunto que ajude a situar a proposta que está sendo apresentada atualmente. 1. ESCOLAS E UNIVERSIDADES CATÓLICAS Nunca, talvez, a Igreja investiu tantos esforços, recursos humanos e financeiros para atender um setor do Povo de Deus como o fez no século passado com a juventude. Para chegar a ela, organizou uma vasta rede de escolas e Universidades Católicas. Muitas Congregações Religiosas foram fundadas para trabalhar com a juventude. Esse instrumento de evangelização teve grandes influência na formação de várias gerações de cristãos, sobretudo num época em que o Estado não proporcionava escolas, especialmente para os mais pobres. Nas últimas décadas, a situação mudou. Em muitos casos as escolas e Universidades converteram-se num instrumento limitado e insuficiente de evangelização. Embora a Igreja mantenha um bom número delas e insista em sua validade pastoral, grande quantidade de jovens, especialmente dos setores mais populares, não pode chegar a elas por seus altos custos. Por outro lado, a participação dos “formando” nas tarefas de promoção e realização da mudança social não é muito visível. 2. OS MOVIMENTOS MARIANOS Os Movimentos Marianos, como a Congregação Mariana, as Filhas de Maria e a Legião de Maria, tiveram forte influência na formação de gerações anteriores ao Concílio Vaticano II. Neles havia participação de jovens, mas sempre sob a direção dos adultos. Eram movimentos de espiritualidade e ação apostólica em visitas a bairros e famílias como serviço de assistência ou como missão popular. Com a renovação conciliar, alguns desses Movimentos, como a Congregação Mariana, transformada em Comunidades de Vida Cristã, adequaram suas estruturas para formas mais comunitárias e
participativas, oferecendo uma catequese mais vivencial e acentuando a dimensão da promoção humana através da realização de ações de ajuda e serviço social. Nesse período foram muito significativas, também, as iniciativas apostólicas promovidas por Ordens e Congregações Religiosas, motivadas, na maioria do casos, por uma preocupação vocacional e pelo desejo de fazer participar da espiritualidade de seu carisma as famílias de seus alunos e ex-alunos. 3. A AÇÃO CATÓLICA GERAL Nas décadas de 1930 a 1940 difundiu-se, com intensidade diversa, nas Igrejas da América Latina, a Ação Católica Geral, segundo o modelo italiano, com seus diversos ramos segundo as várias idades e sexos. Esse movimento, eminentemente laical, fruto da inspiração de Pio XI, marcou a Igreja durante um longo período que chegou, praticamente, até o Concílio Vaticano II e teve grande influência na formação dos jovens católicos. A tomada de consciência do fenômeno da “descristianização” exigia uma revitalização e um incentivo de todas as forças vivas da Igreja com relação a recristianização da sociedade, fundamentalmente em suas áreas urbanas. O objetivo fundamental desse “ação” era apoiar o laicato militante, preservando-o das influências secularizantes das ideologias e políticas da época, formando-o para uma consciência social de participação nos ambiente da sociedade a que não chegavam os sacerdotes e onde, por seu testemunho, a mensagem evangélica e a Doutrina Social da Igreja pudessem concretizar experiências de organização social que defendessem a promoção e os direitos da Igreja na vida da sociedade. Embora partisse do pressuposto de que os leigos participavam do apostolado não por direito próprio, mas por haver recebido um “mandato” especial da hierarquia, a Ação Católica Geral significou uma sementeira e uma escola multiplicadora de formação, participação e promoção dos leigos na vida e missão da Igreja. Foi a matriz fundadora dos dinamismos apostólicos de organização social que se desenvolveriam depois, na segunda metade do século XX. Acompanhou e fecundou os tempos de superação de um rosto excessivamente clerical da Igreja pela abertura à dimensão do “Corpo Místico” e à dinâmica dos estudos eclesiológicos e experiências pastorais que prepararam o Concílio Vaticano II. Nos fins da década de 1950 parece esgotar-se seu ciclo de maior pujança. Não houve uma reflexão profunda a respeito das causas dessa crise na América Latina. Parece que não basta apontar, como explicação fundamental, seu caráter “pré-conciliar” já que, em países como a Argentina e o México, conservou sua vigência, e até se podem apreciar, nos últimos anos, alguns esforços para sua difusão, revitalização e reivindicação como interlocutora de todo apostolado laical organizado. Parece que a crise da Ação Católica tem sua origem na desarticulação, dispersão e isolamento de seus integrantes, no surgimento de novas formas de grupos associativos e na insuficiente revisão e projeção de uma pastoral orgânica de movimentos de apostolado laical, sobre cuja necessidades do documento de Puebla (P 806-810) já advertia. 4. A AÇÃO CATÓLICA ESPECIALIZADA Desde o final da década de 1940, começam a difundir-se, na América Latina, os movimentos laicais conhecidos como movimentos ambientais, que surgem, ao mesmo tempo, como continuidade e ruptura da Ação Católica Geral. Nascem, principalmente, na França e na Bélgica. Os mais conhecidos são a Juventude Operária Católica (JOC), a Juventude Agrária Católica (JAC), a Juventude Estudantil Católica (JEC), a Juventude Universitária Católica (JUC) e a Juventude Independente Católica (JIC). Da JOC surgirá, mais tarde, com características próprias, o Movimento Operário de Ação Católica (MOAC). Da mesma forma, os universitários formarão o Movimento Universitário Católico (MCU) para assumir o acompanhamentos aos militantes que passavam ao mundo adulto e se abriram a novas experiências e compromissos. A mística apostólica desses Movimentos desenvolve-se a partir da tomada de consciência das mudanças da realidade social e cultural, do valor da especificidade e da necessidade de “humanização” e “evangelização” dos meios sociais que não haviam sido suficientemente, o impacto da secularização. As mudanças da realidade fazem descobrir a necessidade de buscar respostas pastorais mais adequadas às novas exigências. Revaloriza-se a convicção de que os operários, e os estudantes, os
melhores evangelizadores dos estudantes, como será ensinado, explicitamente, mais adiante pelo Magistério eclesial. Esses Movimentos promovem um plano evangelizador renovado que se fundamenta, de um lado, nas problemáticas, solidariedades e desafios dos diversos grupos sociais (agricultores, estudantes, operários e universitários) e, do outro, na prática de uma nova sensibilidade e de uma nova pedagogia pastoral que acentua o testemunho cristão, adota a metodologia mais indutiva do “ver-julgar-agir” e privilegia o valor do “compromisso” para a promoção dos respectivos ambientes na perspectiva da transformação social. Organizam-se em “equipes de base”, traduzindo-se em pequenas comunidade onde se revisa a ação dos militantes em seu meio à luz da fé e se procura superar o divórcio entre a fé e vida, desenvolvendo uma pedagogia ativa, promovendo a formação na ação e utilizando o método da “revisão de vida”. Tiveram seu momento mais pujante na época da preparação e da difusão do espírito conciliar. Ofereceram uma boa contribuição a renovadas instituições teológicas e sensibilidades pastorais, uma experiência histórica que foi preparando a opção preferencial pelo pobres, um modelo de Igreja como povo organizado a caminho da libertação e uma reflexão que se desenvolveria como “Teologia da Libertação”. Durante os anos 60, sua história está marcada por uma dupla orientação. Por um lado, sua tentativa de assumir o desafio de ser uma presença de fermento da Igreja nos setores sociais mais dinâmicos do convulsionado processo sociopolítico latino-americano daqueles anos. Por outro lado, sua participação crítica na dinâmica das transformações pastorais da Igreja, originadas pelo impulso renovador do Concílio Vaticano II e dos documentos da II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, em Medelín. No final daquela década, muitos desses Movimentos chegaram a viver momentos culminantes e de crise, nos quais esteve em jogo até sua própria existência. A densidade e a criticidade dos desafios que quiseram assumir nesse contexto eclesial e social tão tumultuado superaram, muitas vezes, sua capacidade de assimilação e crescimento. A falta de um maior acompanhamento pastoral e sua própria impaciência por conseguir as mudanças de maneira imediata produziram uma crise de comunhão eclesial, acentuada pelo ritmo lento do processo de renovação e da prática da pastoral de conjunto libertadora e transformadora, proclamada nas orientações dos documentos eclesiais. Sofreram, também, a influência das radicalizações e das contradições das sociedade latino-americana da época. Muitos deles se viram envolvidos num processo muito politizado e ideologizado que ofuscou sua intencionalidade e seu horizonte evangelizador e os fez destinatários diretos da ação das forças repressoras que dominaram o continente a partir da década de 70. O esforço, contudo, não foi inútil. Embora muitos militantes tenham se afastado da Igreja, e muito grupos e Movimentos quase tenham desaparecido como tais, em pouco tempo surgiram novas expressões eclesiais que incorporaram essa pedagogia e essas propostas pastorais renovadoras. Alguns desses Movimentos se organizaram e continuam a sua ação pastoral em diversos países do continente. Movimentos como o MIEC-JECI, a JOC-América e o MIJARC têm coordenação continental. Animados pelo novo impulso dado às Pastorais Específicas da Juventude, volta a fazer-se atual, para eles, o desafio de ser presença evangelizadora coerente e incisiva nesses espaços ambientais” tão determinantes na realidade atual da América Latina. 5. OS MOVIMENTOS DE ENCONTRO A desarticulação dos Movimentos da Ação Católica provocou um retrocesso significativo na trajetória da Pastoral da Juventude. A partir de 1970, surgiu, com rapidez, uma nova maneira de trabalhar com os jovens que, em alguns lugares, ainda se mantém vigente: os Movimentos de Encontro. Segundo os países, foram adquirindo nomes diferentes, porém todos com um elemento comum: a inspiração na metodologia dos Cursilhos de Cristandade, um movimento para a evangelização dos adultos, nascido na Espanha. Esses Movimentos reuniam jovens em encontros de fim de semana. Utilizava-se, para isso, uma metodologia de impacto emocional. Os encontros eram coordenados por adultos. Os jovens somente desenvolviam tarefas secundárias. Buscavam resolver, principalmente, os problemas pessoais dos jovens. Consideravam que as raízes dos problemas sociais estavam no egoísmo dos indivíduos e acreditavam que, mudando os jovens, mudar-se-ia automaticamente a sociedade. Como se as estruturas econômicas,
políticas e sociais não influíssem nas pessoas e como se estas não pudessem, por sua vez, influir nas estruturas... Num primeiro momento, esses Movimentos tiveram muito êxito. Muitas dioceses tinham seu movimento de jovens. Nos encontros de fim de semana, conseguiram-se transformações de impacto. Os jovens voltavam às paróquias entusiasmados, falando de Jesus Cristo e querendo participar da comunidade. Através dos encontros, muitos chegaram a participar, pela primeira vez, da Igreja. As dificuldades, no entanto, apareciam depois do encontro. A emoção duravam pouco, e, como não havia uma proposta clara de continuidade, muitos jovens voltavam facilmente à sua vida anterior. O nascimento de uma pastoral da juventude orgânica será um passo importante para garantir essa continuidade. Muitos jovens, formados nos Encontros, ajudariam a fazer a passagem dos Movimentos de Encontros para a Pastoral da Juventude. Apesar dessas limitações, os Movimentos de Encontro tiveram elementos positivos: aproximaram os jovens da Igreja e a apresentaram como uma realidade mais atraente, na qual se valorizavam os apectos comunitários e se procurava dar atenção aos problemas dos jovens. Os Encontros promoveram também o surgimento de um grande número de grupos de jovens nas paróquias. Em muitos casos, foram a base para constituir o que hoje chamamos de Pastoral da Juventude. Em contato com ela, alguns Movimentos de Encontros foram evoluindo e incorporando novos elementos que enriqueceram sua proposta evangelizadora e possibilitaram um trabalho em comum com a Pastoral da Juventude Orgânica. 6. OS MOVIMENTOS INTERNACIONAIS A partir do 1980, crescem e se desenvolvem vários Movimentos Internacionais, como os Cursilhos de Cristandade, os Focolarinos, a Renovação Carismática, o Neocatecumenato, os Encontros de Casais, Comunhão e Libertação e outros. Alguns deles desenvolveram um trabalho específico também com os jovens. Diferenciam-se das organizações anteriores porque põem uma ênfase especial na espiritualidade, maior que a preocupação pela missão no mundo e sua transformação. Esses Movimentos se caracterizam: • Porque são internacionais, isto é, recrutam seus próprios quadros, dirigentes e sacerdotes, independentemente das Igrejas locais. Com frequência estão ausentes dos planejamentos pastorais destas porque respondem a orientação que vêm de seus centros internacionais. Sua referência não é o mundo das Igrejas locais latino-americana, com as contradições, problemas e conflitos de um povo empobrecido, mas o mundo de uma classe média homogênea e transnacional. Seus materiais são elaborados e trazidos da Europa, sem tomar em conta as características próprias de cada realidade; • Porque muitos deles crescem rapidamente ao mostrar uma eficiência superior à das pastorais locais. Dispõem de recursos e meios que lhes permite ser autônomos na organização e na realização de suas atividades; • Porque boa parte do sucesso que conseguem deriva, principalmente, de sua capacidade em usar duas formas psicológicas importantes: a experiência da conversão que leva à adesão ao movimento, e a experiência de fraternidade, que deixa a pessoa com a sensação de que não está só e tem apoio efetivo de outros; • Porque conseguem atrair ao jovens da classe média. Oferecem-lhes uma mensagem adaptada à sua condição: alegria, emoções e sensações de felicidade que buscam; segurança e identidade que não encontram nas situações que lhes apresenta a cultura pós-moderna; • Porque não insistem muito na formação teológica. A mensagem que apresentam é simples e compreensível para os leigos. Estes podem habilitar-se, facilmente, a repeti-la. Acentuam mais a emotividade e a sensibilidade e, geralmente, não despertam a consciência crítica ante a realidade. O surgimento e o crescimento desses Movimentos Internacionais não podem ser ignorados pela Pastoral da Juventude Orgânica. Ela está desafiada a encontrar uma forma de relacionar-se com eles, de ajudá-los a perceber que o seguimento de Jesus não se reduz aos drama pessoais e familiares, mas é um compromisso com o drama da humanidade, e de fazer com que sua proposta tenha um conteúdo
libertador e transformador da realidade latino-americana. Assim se poderá tornar real a recomendação de Santo Domingo: “É necessário acompanhar os movimentos num processo de enculturação mais definido e fomentar a formação de movimentos com um maior perfil latino-americano” (SD 102). 7. A PASTORAL DA JUVENTUDE ORGÂNICA É a nova forma de trabalhar com os jovens que começa a nascer em quase todos os países da América Latina, a partir da segunda metade da década de 70. É conhecida pelo nome de “Pastoral da Juventude”. A Pastoral da Juventude surge de uma necessidade sentida pela coordenação dos grupos de jovens em seus diferentes níveis: paroquial, pastoral, diocesano, regional e nacional. Vários fatores influíram para que esta resposta se concretizasse e se fizesse real. Entre esses fatores, podemos citar: ○ As limitações e a falta de continuidade dos Movimentos de Encontro. Num primeiro momento esses fatores foram atribuídos à inconstância dos jovens. Muitos agentes pastorais descobriram, contudo, que o problema central era a metodologia usada e que a educação da fé exigia um processo mais complexo, mais lento e mais compreensivo do que a experiência emocional de um fim de semana. Não se pode esperar um compromisso duradouro depois de uma experiência breve, por mais forte que esta tenha sido. ○ A dispersão e o isolamento dos grupos de jovens. Os Movimentos de Encontro favoreceram a formação de uma grande quantidade de grupos de jovens nas paróquias e comunidades. No entanto, em pouco tempo esses grupos, sem maiores recursos, esgotaram suas possibilidades de crescimento e de retroalimentação. Sem a troca de experiências com outros grupos e sem a cobertura de um organismo que lhes dê ajuda e condições de contato com a realidade global, param, retrocedem e morrem. Para a vitalidade de qualquer experiência neste campo, é indispensável a comunicação com outras experiências. A falta deste intercâmbio foi uma das causas da curta existência de muitas e boas iniciativas e o fermento para a busca de novas alternativas. ○ A falta de objetivos claros. Além desta dispersão empobrecedora, foi muito grave também a falta de clareza em relação aos objetivos da ação. Muitos sabiam dizer muito bem “o que” estavam fazendo e “como” o estavam fazendo. Poucos, contudo, podiam definir claramente “para que” o que estavam fazendo. Faltavam objetivos claros para a ação. Convocar, atrair, reunir em grupo, fazer vibrar os jovens em torno da amizade, dos valores da fé e do Evangelho não é difícil. O problema é continuar e perseverar quando já não há novidade, quando diminui a motivação e quando se tem clareza sobre o que se quer e o que se busca. ○ As pequenas comunidades locais eclesiais e a pastoral de conjunto. Outro fator importante que influi no nascimento da Pastoral da Juventude Orgânica foi a evolução da própria pastoral de Igreja. Depois do Concílio Vaticano II, de Medellín e de Puebla, a Igreja latino-americana insistiu cada vez mais na importância das pequenas comunidades eclesiais e na necessidade de somar as forças pastorais numa pastoral de conjunto. A Pastoral da Juventude Orgânica é reflexo desta caminhada da Igreja nos últimos anos, na medida em que parte de pequenos grupos de base, nas comunidades, e procura evitar a dispersão por meio de uma pastoral coordenada e planejada. ○ Os processos de planejamento participativo. Também foi decisivo, para a criação e o fortalecimento da Pastoral da Juventude, o desenvolvimento dos processos de planejamento participativo a partir da realidade. Neles se descobriu que não se pode implementar uma pastoral da juventude sem a participação de seus atores imediatos: os próprios jovens. A possibilidade de opinar, debater, apresentar propostas e tomar decisões fez com que se sentissem sujeitos, e os ajudou a ver que a pastoral era deles mesmos, dos jovens. Levou-os a participar com mais entusiasmo na definição do novo modelo como meio e instrumento para construir uma Igreja nova e uma nova sociedade. ○ O novo lugar dos jovens. Os desejos de liberdade política começavam a mobilizar novamente os jovens, e sentia-se a necessidade de uma pastoral que não pensasse somente em sua participação na vida interna da Igreja, mas também na sua missão no meio da sociedade. A necessidade de
formar militantes para serem fermento do Reino no mundo voltava a ter a força e a vigência da época da Ação Católica Especializada. ○ Esta renovada presença e protagonismo dos jovens viu-se fortalecida pela opção preferencial pelo pobres e pelos jovens feita pela Igreja latino-americana na III Conferência Geral do Episcopado, realizada em Puebla, em 1979, e pelo Ano Internacional da Juventude, promovido pelas Nações Unidas, em 1985. Desde o início da década de 80, trabalha-se na sistematização e definição do marco teórico da Pastoral da Juventude. Numerosas reuniões, assembleias, cursos, documentos, escritos, etc, vão recolhendo e sistematizando, num processo amplamente participativo, as experiências e dando forma à nova proposta. Este caminho continua até hoje, porque não se trata de um projeto fechado e definitivo, mas de um projeto aberto para integrar as novas situações e realidades do mundo e da história e as novas propostas evangelizadoras que vão surgindo constantemente. 8. O CELAM E A PASTORAL DA JUVENTUDE LATINO-AMERICANA O Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM) teve uma participação muito ativa na animação e consolidação desta proposta de Pastoral da Juventude. Em 1968, a II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, reunida em Medellín, estimulada pela importância que o papa Paulo VI deu à juventude quando afirmou, em seu discurso inaugural, que era um tema “digno do máximo interesse e de grandíssima atualidade”, dedicou seu documento nº 5 à juventude. Foi a primeira vez que se produziu, no continente, um documento oficial da Igreja sobre o tema. Medellín foi, assim, a força geradora e renovadora do processo de pastoral da juventude que avança atualmente no continente. Em fevereiro de 1976, o CELAM, respondendo a uma das quatro prioridades estabelecidas em seu primeiro Plano Global, criou a Seção Juventude (SEJ). Suas primeiras ações estiveram voltadas para o descobrimento dos grandes problemas e tendências do mundo dos jovens, visando realizar uma reflexão teológica que comtemplasse uma orientação clara e coerente, promotora de uma pastoral da juventude orgânica no continente. Promoveu, também, o intercâmbio entre os países e sua participação ativa na preparação da III Conferência Geral do Episcopal Latino-Americano, convocando, durante 1977 e 1978, Encontros Regionais de Pastoral da Juventude que se realizaram em Bogotá, México e Puntas de Tralca (Chile).14 Fruto desses primeiros passos de organização continental e da crescente presença dos jovens e da pastoral da juventude na vida das comunidades paroquiais e diocesana, na opção preferencial pelos jovens foi proclamada em Puebla, em janeiro de 1979. Da mesma III Conferência sairia a decisão de propor, como meta e desafio para a juventude latino-americana, a construção da civilização do amor.15 Desde Puebla, através de numerosos e diversos programas, a Seção Juventude converteu-se em importante força dinamizadora da animação, do estudo, da pesquisa, formação dos agentes pastorais e difusão das orientações e propostas da Pastoral da Juventude no continente. 8.1. Os Encontros Latino- Americanos A partir de 1983, o principal meio para o crescimento, amadurecimento e consolidação deste processo em âmbito latino-americano tem sido a realização dos Encontros Latino-Americanos de Responsáveis Nacionais pela Pastoral da Juventude. Convocados pela Seção Juventude, foram convidados a participar os Bispos Responsáveis pela Pastoral da Juventude das Conferências Episcopais, os secretários executivos das Comissões Nacionais ou Episcopais dos países e um jovem e uma jovem comprometidos com o trabalho nacional deste campos da ação pastoral. Com o passar do tempo, os Encontro Latino-Americanos converteram-se num espaço privilegiado de comunhão e participação pelos bispos, sacerdotes e jovens que trabalham na Pastoral da Juventude. A 14
A Pastoral da Juventude dividiu a América Latina em quatro grandes “regiões”: a Região Cone Sul, a Região Bolivariana, a Região Caribe e a Região México-América Central. Quando se fala aqui em “regional”, são estas “regiões” que estão em jogo (N.doT.). 15 Cf. Mensagem aos povos da América Latina, n.8.
troca de experiências e a reflexão teológico-pastoral geradas permitiram que se fosse elaborando uma proposta global, a civilização do amor: uma metodologia para o trabalho grupal e uma pedagogia para acompanhar os processos de formação humana e cristão dos jovens. Tudo isso foi uma grande contribuição para dinamizar a ação evangelizadora das Comissões Episcopais de Pastoral da Juventude do continente. O valor da contribuição destes Encontros está em que não se trata de reflexões teóricas mas de experiências vividas que foram sendo recolhidas, organizadas, refletidas e sistematizadas, para serem oferecidas, depois como orientação da ação pastoral. A experiência que gerou a convocação destes Encontros Latino-Americanos foi a realização de um Encontro de Responsáveis Nacionais pela Pastoral da Juventude do Cone Sul, em Buenos Aires, Argentina, de 19 a 30 de dezembro de 1982, ao qual foi convidado a participar o secretário-executivo da Seção Juventude do CELAM. Já foram realizados dez encontros, dos quais faremos, aqui, uma breve descrição: O primeiro realizou-se de 17 a 21 de 1983, em Fusagasugá, Colômbia, com a participação de trinta delegados de doze países. Fez-se um primeiro esboço dos elementos a ter em conta para a formulação da proposta da civilização do amor. O segundo realiza-se de 28 de julho a 2 de agosto de 1984, em Zipaquirá, Colômbia, com a participação de trinta e três delegados de onze países. Preparou-se um subsídio para a celebração do Ano Internacional da Juventude, como uma aproximação ao tema da civilização do amor. Elaborou-se e publicou-se o “Credo” e o “Decálogo da Civilização do Amor”. O terceiro realizou-se de 10 a 16 de novembro de 1985, em Bogotá, Colômbia, com a participação de trinta e seis delegados de quatorze países. Fez-se uma avaliação das atividades desenvolvidas durante o Ano Internacional da Juventude; começou-se a trabalhar num projeto de “Diretório” que contivesse algumas linhas operacionais comuns para a ação da pastoral da juventude no continente; iniciou-se o estudo da Pastoral da Juventude dos Meios Específicos; enviou-se uma mensagem aos jovens intitulada “Como jovens cristãos latino-americanos ao jovens da América Latina” e propôs-se, pela primeira vez, a idéia de realizar um “Concílio Latino-Americano de Jovens”. O quarto realizou-se de 19 a 25 de outubro de 1986, em Bogotá, Colômbia, com a participação de quarenta delegados de quatorze países. Trabalhou-se na redação do “Diretório”; aprofundou-se o estudo iniciado sobre a Pastoral da Juventude dos Meios Específicos; começou-se a preparar o possível Concílio Latino-Americano de Jovens e um Curso Latino-Americano de Assessores e programou-se a participação na 2ª Jornada Mundial da Juventude, a realizar-se em Buenos Aires, Argentina, em abril de 1987. O quinto realizou-se de 19 de novembro a 5 de dezembro de 1987, em Bogotá, Colômbia, com a participação de cinquenta e um delegados de dezesseis países. Reafirmou-se o valor das orientação do livro, publicado recentemente, intitulado Pastoral da juventude, sim à civilização do amor; deu-se continuidade à preparação do Concílio Latino-Americano de Jovens e do Curso Latino-Americano de Assessores; criaram-se as Regiões16 e foram designados os Assessores Regionais. O sexto realizou-se de 15 a 23 de outubro de 1988, em Caracas, Venezuela, com a participação de sessenta e quatro delegados de dezessete países. Aprofundou-se a reflexão e o estudo sobre a Operação Pedagógica e sobre as Etapas de Nucleação e Iniciação no Processos de Educação na Fé dos Jovens e continuou-se trabalhando na preparação do Concílio Latino-Americano de Jovens, ao qual se decidiu chamar, a partir de então, de “Primeiro Congresso Latino-Americano de Jovens”. O sétimo realizou-se de 7 a 15 de outubro de 1989, em Quito, Equador, com a participação de setenta e oito delegados de vinte e um países. Completou-se a reflexão do Encontro anterior, aprofundando a Etapa da Militância, e prosseguiu-se na preparação do – cada vez mais próximo – Primeiro Congresso Latino-Americano de Jovens. O oitavo realizou-se de 20 a 27 de outubro de 1990 em São José, Costa Rica, com a participação de oitenta e oito delegados de vinte e dois países. Foi a primeira vez que se conseguiu ter representantes de todas as Conferências Episcopais do continente. Trabalhou-se sobre “Pastoral da Juventude Cultura”, em
16
Ver nota 14.
preparação à IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, em Santo Domingo, e definiram-se os últimos aspectos da preparação ao Primeiro Congresso Latino-Americano de Jovens. O nono realizou-se de 17 de fevereiro a 6 de março de 1993, em Zipaquirá, Comlômbia, com a participação de setenta e sete delegados de vinte países. Trabalhou-se sobre “Assessoria e Acompanhamento na Pastoral da Juventude” e deu-se impulso a novos campos de ação, como a Pastoral da Juventude dos Meios Específicos, os Cursos de Formação e a participação nos Conselhos Nacionais de Juventude. O décimo realizou-se de 8 a 15 de outubro de 1994, em Mogi das Cruzes, Brasil, com a participação de setenta e cinco delegados de dezoito países. Trabalhou-se sobre “Espiritualidade e Missão da Pastoral da Juventude” e decidiu-se promover a Pastoral da Juventude de Situações Críticas e a Pastoral dos Adolescentes. No Encontro aprovou-se também o processo de re-edição do livro Pastoral da juventude, sim à civilização do amor. A partir de sexto Encontro Latino-Americano, começa a ser permanente o convite de participação a delegados da Subcomissão de Juventude da Comissão Episcopal do Apostolado Secular da Espanha e da Seção de Jovens do Pontifício Conselho de Leigos. A partir do nono encontro são convidados, também, delegados da Rede Latino-Americana de Institutos e Centros de Formação de Juventude da América Latina. Essas vinculações e a participação mais permanente nos Foros Internacionais e nas Jornadas Mundiais da Juventude ajudaram a abrir o processo latino-americano à dimensão da Igreja Universal. 8.2. As publicações Em colaboração com diferentes instâncias pastorais, a Seção Juventude preparou, publicou e difundiu diversos livros sobre diferentes aspectos da ação pastoral, como Pastoral Juvenil (1979), Elementos para um directorio de pastoral juvenil (1982), Juventud, Iglesia y cambio (1985), Pastoral juvenil y educación em la fe de los jóvenes (1989), Los processos de educacion em la fe de los jóvenes (1993), Asesoría y acompañamiento em la pastoral juvenil (1994) e Espiritualidad y mission de la pastoral juvenil (1995). A contribuição fundamental neste aspecto foi o livro Pastoral juvenil, sí a civilización del amor (1987), que, traduzido para o português e o francês e reeditado em sete países do continente, favoreceu a difusão e o conhecimento da proposta da Pastoral da Juventude Latino-Americana e promoveu a organização que é o motivo de esperança na realidade eclesial atual. A necessidade de atualizá-lo e de incorporar-lhe os novos elementos de reflexão elaborados nos Encontros Latino-Americanos dos últimos anos motivou a presente reedição. 8.3. Os cursos de formação Para responder às solicitações de capacitação de agente de pastoral da juventude apresentadas pelos responsáveis nacionais, a Seção Juventude, em colaboração com o Instituto Teológico-Pastoral para a América Latina (ITEPAL), do CELAM, ofereceu em 1988 e 1989 e oferece novamente, a partir de 1994, um Curso Latino-Americano de Pastoral da Juventude. Promoveu e animou, também, numerosos serviços de capacitação nas regiões e nos países. 8.4. A organização regional A partir de 1987, para melhor responder à diversidade de situações no continente e oferece um acompanhamento mais próximo a cada realidade, a Seção Juventude assumiu a organização regional com que já trabalhavam outros departamentos e seções do CELAM. Surgem, assim, quatro regiões: a Região Bolivariana, integrada por Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela; a Região Caribe, integrada por Antilhas, Cuba, Haiti, Porto Rico e República Dominicana; a Região Cone Sul, integrada por Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai, e a Região México-CentroAmérica, integrada por México, Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Panamá e Nicarágua. A partir de 1989, Venezuela solicitou sua incorporação à Região Caribe.
Para a animação e coordenação de cada Região, designou-se um Assessor Regional, que também cumpre a função de assessoria ao secretári-executivo da SEJ-CELAM. Junto com outros assessores regionais constituem a Equipe de Assessores Regionais. A partir desse momento, iniciam-se processos de organização regional que também foram se expressando nos Encontro Regionais da Pastoral da Juventude, as Reuniões Regionais de Bispos, Secretários-Executivos e Assessores Nacionais de Pastoral da Juventude, os Cursos Regionais de Formação, os Boletins Regionais e outras formas de comunicação e intercâmbio. 8.5. O Primeiro Congresso Latino-Americano de Jovens Realizou-se de 28 de dezembro de 1991 a 5 de janeiro de 1992, em Cochabamba, Bolívia, com o lema “Jovens, com Cristo construamos uma nova América Latina”. Participaram 461 leigos, jovens e assessores de dezenove países, dezoito bispos, cinquenta e nove sacerdotes e vinte e três religiosos(as), junto com delegações da Alemanha, Espanha, Itália e do Pontifício Conselho para Leigos. Estiveram presentes, também, 604 observadores de sete países latino-americanos. O Congresso se propôs “incrementar um maior compromisso e testemunho da juventude latinoamericana na construção de uma nova civilização no continente” e concluiu com a aprovação de dez “Conclusões Finais”, uma “Carta Aberta aos Jovens da América Latina”, uma “Contribuição à IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano”” e três monções intituladas “Lutamos pela vida”, “Contra o Extermínio de Crianças e Adolescentes no Continente” e “Por uma Reforma Urbana e Agrária Urgente”. O Congresso é um ponto culminante e uma referência fundamental para o caminhar da Pastoral da Juventude no continente. Sua realização constitui um fato eclesial inédito, por sua amplitude geográfica e por sua representatividade continental. Mostrou o vigor, a força e o trabalho de base da Pastoral da Juventude Latino-Americana; promoveu nos jovens a consciência e a vivência da latino-americanidade; reafirmou os elementos fundamentais da proposta pedagógica e metodológica e abriu novos horizontes com relação à formação integral, à Pastoral da Juventude dos Meios Específicos, à assessoria e à integração regional; permitiu viver uma experiência de Igreja diferente, com um real protagonismo juvenil e com pastores acompanhando e orientando seus processos; promoveu a busca de uma liturgia juvenil participativa, criativa e vivencial e fez ver a realidade concreta da Pastoral da Juventude, com seus avanços e carências e com tudo o que ainda faltava fazer para ter uma pastoral da juventude construtora da civilização do amor. Seus documentos e conclusões, amplamente difundidos no continente, terão uma influência muito grande no que se dirá sobre a juventude e a Pastoral da Juventude na VI Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano de Santo Domingo, em 1992. 8.6. A Pastoral da Juventude dos Meios Específicos O início, desenvolvimento e crescimento dos processos da Pastoral da Juventude Orgânica aos quais se fez referência deu-se principalmente nos grupos de jovens paroquiais. No entanto, ao mesmo tempo, e em alguns casos antes, em continuidade com as experiências da Ação Católica Especializada, foram-se desenvolvendo também processos com grupos de jovens nucleados a partir de sua realidade de camponeses, estudantes, operários ou universitários, o que deu origem à chamada Pastoral da Juventude dos Meios Específicos ou às Pastorais Específicas da Juventude. Puebla pediu que se desenvolvesse uma “pastoral específica” que levasse em conta “os condicionamentos próprios e as exigências distintas que têm diante do processo evangelizador” os diversos setores juvenis, segundo a sua “situação social concreta” (P1187). O livro Pastoral da juventude, sim à civilização do amor apresentou um esboço de seus objetivos, prioridades e campos de ação a partir das primeiras experiências realizadas nos países.17 O Primeiro Congresso Latino-Americano de Jovens reafirmou seu valor e importância e impulsionou seu desenvolvimento. A Seção Juventude acaba de promover um novo âmbito de intercâmbio e aprofundamento, com a convocação de um Encontro Latino-Americano de Pastoral da Juventude dos Meios Específicos, que se realizou em Santafé de Bogotá, Colômbia, de 3 a 8 de maio de 1994. 17
SEJ-CELAM, Pastoral juvenil, sí a civilización del amor, Bogotá, 1987, pp.166-185.
9. O TEMPO PRESENTE A voz e o sentir dos jovens, expressos nas vivências e nos documentos de seu Primeiro Congresso Latino-Americano, chegaram até a IV Conferência Geral do Episcopado, reunida em Santo Domingo. As “Conclusões” aprovadas pelos bispos contêm uma série de afirmações que indicam claramente a orientação que a Igreja latino-americana quer dar à pastoral da juventude: • Reafirma-se a “opção preferencial pelos jovens proclamada em Puebla” e se diz que deve ser assumida “não só de modo afetivo, mas também efetivamente”, o que implica “uma opção concreta por uma pastoral da juventude orgânica em que haja um acompanhamento e apoio real, com diálogo mútuo entre jovens, pastores e comunidades” (SD 114); • Insiste em “ter em conta e fortalecer todos os processos orgânicos válidos e longamente analisados pela Igreja desde Puebla até hoje” (SD 119), o que significa o reconhecimento e a decisão de continuar apoiando o processo de pastoral da juventude orgânica que vem sendo implementado no continente; • Apela-se para “um especial protagonismo dos leigos e, entre eles, dos jovens” (SD 302), os quais são convocados, “uma vez mais, para que sejam uma força renovadora da Igreja e esperança no mundo” (SD 293); • Assumem-se e confirmam-se os elementos centrais da proposta que foi sendo consolidada no caminhar da Pastoral da Juventude Latino-Americana: os processos de formação integral (SD 115), a espiritualidade do seguimento de Jesus (SD 116), o protagonismo juvenil (SD 119), a pedagogia “experiencial, participativa e transformadora” e a metodologia do “ver-julgar-agir-revisar-celebrar” (SD 119), a Pastoral da Juventude dos Meios Específicos (SD 119) e a opção pelos grupos e comunidades juvenis (SD 120); • Pede-se uma especial atenção à dimensão vocacional da pastoral da juventude (SD 114), à “importância especial” do sacramento da Confirmação (SD 115), ao anúncio do Deus da Vida (SD 118), à necessidade de apresentar Jesus Cristo e os ideais evangélicos com uma “linguagem atraente e acessível” (SD 119-120), à exigência de “assumir as novas formas celebrativas da fé, próprias da cultura dos jovens” (SD 117) e à atenção aos adolescentes (SD 111, 112, 119). As mudanças sociais e culturais dos últimos anos, o esforço por tornar reais estas orientações pastorais e o compromisso de fidelidade ao processo histórico estão gerando novas buscas, novos enfoques e novas alternativas para a pastoral da juventude. As respostas não surgem de um dia para o outro. Deve-se continuar a buscá-las pacientemente, atento à nova realidade em que vivem os jovens e à proposta libertadora de Jesus de Nazaré. Este livro faz parte e que ser uma contribuição para esta busca.
Parte 2
I
1. A PRESENÇA DE DEUS NO CAMINHAR E NA VIDA DOS JOVENS Deus de manifesta e se dá a conhecer na criação obra maravilhosa de seu amor. O campo, o mar e os rios, as estrelas, a montanha e a planície, as ilhas do Caribe e as selvas do Amazonas, o amanhecer e o entardecer, as selvas nativas, as minas e o deserto constituem para muitos jovens latino-americanos o lugar da sua primeira experiência de Deus. No contato com a natureza descobrem sua presença. Sentem-se parte do mistério do universo e da existência e chegam a vê-lo na mão do oleiro que criou o homem e a mulher à sua imagem e semelhança (Gn 1,27). Em cada pessoa, a obra mais perfita da criação, descobrem uma revelação e um sinal de amor ao Deus da Vida. 1.1. O Deus da Vida que os jovens O Deus da Vida, que criou todas as coisas e acompanha todas as suas criaturas ao longo da existência, teve a iniciativa de se fazer presente no caminhar e na vida dos jovens. Não quer deixá-los a sós, especialmente nas situações mais difíceis ou quando crêem que estão mais abandonados. É nestes momentos que sua presença se faz mais visível e próxima. O relato bíblico de Jacó o comprova. Escapando de seu irmão Esaú e voltando a sua terra em busca de novas possibilidades para refazer e realizar a sua vida, teve um sonho que o transformou e fez dele um homem novo, convencido da presença e proximidade de Deus em seu caminho. As palavras ditas a Jacó são as que torna a repetir, hoje, aos jovens: “Estou contigo. Te protegerei aonde vás. Não te abandonarei”. Elas fazem Jacó reconhecer que, “realmente, Javé está neste lugar e eu não o sabia”. (Gn 28, 10-17). É um Deus vivo e verdadeiro que aposta em favor da vida. Age contra tudo o que a ameaça ou a destrói e chama a optar sempre por ela. “Te ofereci, neste dia, a vida ou a morte, a bendição ou a maldição... Escolhe a vida, para que vivas tu e tua descendência, amando a Javé, escutando sua voz e unindo-te a ele. Nisso está a tua vida e a duração de teus dias” (Dt 30, 15-20). A opção de Deus pelos jovens situa-se dentro de sua opção pelos pobres. A falta de liberdade, a fragmentariedade da vida, a falta de educação e de atenção às necessidades fundamentais que muitos jovens latino-americanos vêm enfrentando, como vítimas do pecado social de um sistema que os considera objetos num mundo mercantil, são também sinais da pobreza de um povo esmagado por um modelo econômico injusto e opressor. Como os pobres, muitos jovens sofrem na própria carne a exclusão social e as consequências da crescente brecha entre ricos e pobres. A experiência do Êxodo mostra que Javé escuta o clamor de seu povo (Ex 3,7) e está disposto a fazer-se presente para salvá-lo da escravidão do Egito e torná-lo protagonista de sua própria libertação. O Deus da Vida quer que os jovens e os pobres sejam, hoje, os novos atores da história e uma força para a libertação da América Latina.
1.2. O Deus da Vida chama os jovens ao protagonismo Esta presença de Deus no caminhar e na vida dos jovens é um chamado para que sejam protagonistas de seu plano de salvação, descubram sua identidade de filhos de Deus e respondam, comprometendo-se com o projeto que tem para seu povo. Assim poderão ir construindo suas vidas junto com todos os que são chamados a caminhar até o cumprimento da promessa. Não se trata de um protagonismo triunfalista, mas de um protagonismo de serviço à vida como dom de Deus, ao amor, à misericórdia, à solidariedade, à justiça e à paz. Os jovens chamados por Deus para serem protagonistas de momentos importantes da história da salvação viveram num sociedade que lhes dava pouca participação e onde lhes era muito difícil expressar-se e ser escutados: “Se és jovem, fala somente quando necessário” (Eclo 32,7). Geralmente não eram considerados mais que mão-de-obra, quase sempre gratuita, a serviço de seus pais ou do Estado. Muitos deles foram vítimas dos conflitos e das guerras entre as nações vizinhas: “Escutai todos vós, ó povos, e vede minha dor... Meus jovens foram conduzidos ao exílio... Não dedilham lira” (Lm 1,18; 5,14). Foram capazes, contudo, de responder e cumprir a missão que lhes era confiada. Os jovens de Deus chama, hoje, a ser protagonistas das lutas de seu povo tampouco escapam do mesmo povo que querem ajudar a libertar. Suas atitudes de coragem ,fidelidade, lucidez, amor e generosidade misturam-se, muitas vezes, às atitudes de medo, traição, dúvida, egoísmo, tentação de abandono e desprezo. O Deus da Vida, contudo, continua chamando... “Numerosos jovens de hoje desejam ser protagonistas da evangelização e artífices da renovação social... É preciso orientar suas qualidades e sua capacidade criativa para o objetivo mais elevado que pode atraí-los e entusiasmá-los: o bem da sociedade, a solidariedade com todos os irmãos, a difusão do ideal evangélico de vida e de compromisso concreto em favor do próximo e a participação nos esforços de Igreja para favorecer a construção de um mundo melhor”18. 1.3
O Deus da Vida conta com os jovens para seu Plano de Salvação.
Um breve apanhado da história da salvação permite perceber como Deus contou com os jovens para constituir seu povo e colaborar com ele em sua ação salvadora. Isaac, “o filho da promessa”, teve que passar pela prova de confiar plenamente em seu pai Abraão, a ponto de deixar a própria vida em suas mãos (Gn 22,1-18). Javé recompensou sua fé e sua disponibilidade e, por ele e seus descendentes, a promessa continuou fazendo-se real até seu pleno cumprimento. Moisés, perseguido desde seu nascimento, foi chamado por Deus para pôr-se à frente do povo de Israel em sua saída do Egito e em sua marcha pelo deserto rumo a Terra Prometida (Ex 1,7-14). Seu caráter e seu compromisso com a libertação de seu povo não fizeram desaparecer seus medos e crises para responder a este chamado. O encontro pessoal com ele, contudo, junto à sarça ardente (Ex 3,1-6), transformou-lhe a vida e o converteu em líder valente e decidido. Para suceder Moisés, Deus escolheu o jovem Josué o pôs à frente de seu povo para que o conduzisse no momento decisivo da entrada na Terra Prometida (Dt 31,3). Chamou Samuel, muito jovem para confiar-lhe sua missão. No início, não foi fácil interpretar com clareza a origem do chamado. A atitude orientadora do velho Eli, contudo, ajudou-o logo a descobrir sua voz e a dispor-se para responder com docilidade: “Fala, Senhor, que teu servo escuta” (1 Sm 3,1-21). Ordenou ungir Davi como rei depois de ele ter sido esquecido e não ter sido considerado entre seus irmãos por ser jovem e estar cuidando de ovelhas (1 Sm 16,1-13). Na luta com Golias (1 Sm 17,4-50), Deus mostrou como protege a vida dos jovens quando são capazes de arriscá-la em defesa de seu povo. Aos olhos humanos, a vitória de Davi foi a vitória do fraco sobre o poderoso; ao olhar de Deus, contudo, foi a vitória de que pôs sua confiança somente nele, de quem tomou a sério o compromisso de servi-lo acima do poder dos ídolos e das armas. Eleito por Deus, sua vida não escapou à condição de pecador (2 Sm 11,1-25), assim como também não escapam das tentações os jovens protagonistas eleitos por Deus no mundo de hoje. Quando a monarquia entrou em decadência, Deus escolheu como rei Josias, um jovem de apenas 18 anos. Encomendou-lhe a tarefa de empreender, com coragem e destemor, uma audaciosa reforma da organização social e da vida religiosa que levasse o povo a voltar “com todo o coração, com toda a alma e com todas as forças” ao cumprimento da lei de Javé e às exigências da Aliança (2 Rs 22-23). Em plena juventude, chamou Jeremias para uma difícil missão profética (Jr 1,6). Teve de assumi-la com a incerteza de agira numa situação de violência e injustiça social e com o medo próprio da responsabilidade que se 18
João Paulo II, A Igreja dos jovens, catequese durante a audiência geral de 31 de agosto de 1994.
lhe havia confiado. Cumpriu-a com muitas dificuldades. Os problemas puseram à prova sua perseverança (Jr 11,18-23). Nunca se afastou do povo e se sentiu participante de sua dor e de sua situação de crise (Jr 10,23-25). Sofreu profundamente ao se dar conta de que sua presença e sua palavra criavam conflitos em todo o país. Nem sempre entendeu a razão de seu sofrimento. Duvidou em meio à solidão e até chegou a pensar em se rebelar contra Deus. A crise, contudo, não o desanimou. Pelo contrário, fê-lo crescer em sua capacidade de optar com liberdade pelo projeto de Javé (Jr 20,7-11) e de estar disponível como o jarro moldado pelo oleiro (Jr 18,1-6). Na história de Rute, a jovem mulher estrangeira, Deus mostrou como recompensa a quem tudo abandona para seguir o pobre e o necessitado (Rt 1,16) e a quem luta em favor da dignidade e do direito de todos à terra e à descendência. Quando seu povo estava submetido à dominação de reinos estrangeiros, elegeu mulheres jovens, generosas, decididas e cheias de confiança nele, para conduzi-lo à libertação e a reavivar sua fé no cumprimento definitivo da promessa. Deixando de lado suas comodidades e sua vida tranquila (Jt 8,7), superando a desconfiança, a apatia e a falta de fé de seus compatriotas (Jt 8,9-17), Judite assumiu a defesa de seu povo até enfrentar e vencer a Holofernes (Jt 10-13). Eleita providencialmente para ser rainha (Est 2,17), Ester não esqueceu seu povo. Teve a coragem de tomar decisões difíceis e defendê-lo em momentos importantes (Est 4,14). Foi capaz de pedir “a vida para mim e para meu povo” (Est 7,3) quando o rei lhe oferecia “a metade de seu reino” (Est 7,2). Com a confiança no Deus da Vida que “os ressuscitará para uma vida eterna” (2 Mc 7,1-42), os sete jovens irmãos macabeus – animados por sua mãe – enfrentaram a tortura e a morte por lutar contra as imposições da cultura dominante e por defender, até o fim, os valores e as tradições de seu povo.
1.4 Deus Pai Deus convida os jovens a ser destinatários de seu amor. Faz-se presente em suas vidas como pai terno e bondoso, “lento na cólera e rico de misericórdia” (Ex 34,6) , sempre próximo e atento às suas necessidades e também às necessidades de seu povo. Dá resposta, assim, a suas buscas de um Deus que os ame e acompanhe, que sempre esteja a seu lado e não os abandone, especialmente nos momentos mais difíceis. No batismo, acolhe-os como seus filhos; chama-os pelo nome, partilha com eles sua vida para que sejam capazes de amar e ser amados, de se sacrificar pelo bem de todos, de apostar na verdade, contra toda a mentira e falsidade, e de se comprometer na construção da nova humanidade já iniciada em seu próprio filho Jesus. 2. JESUS CRISTO VIVO E PRESENTE NO MUNDO DOS JOVENS Quando a “plenitude dos tempos” (Gl 4,4), Deus se fez homem, encarnando-se na pessoa de Jesus. Nele, o “Emanuel”, o “Deus conosco” (Is 7,14), alcança sua plenitude a presença de Deus no caminhar e na vida dos jovens. Em Jesus, Deus se fez homem. Em Jesus, Deus se faz jovem. Ele é o testemunho fiel e verdadeiro da vida nova e da nova humanidade : “Vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10), pois “não há maior amor do que dar a vida pelos amigos” (Jo 15,13). Em Jesus, vivo e presente, os jovens encontram a plenitude de suas vidas. 2.1. Jesus viveu e cresceu em Nazaré Jesus nasceu pobre (Lc 2,6-7) . Fez parte de uma família trabalhadora. Seu pai foi carpinteiro e sua mãe dedicou-se às tarefas do lar. Muito pequeno ainda, Jesus teve de fugir com seus pais para o Egito porque o rei Herodes “buscava o menino para mata-lo” (Mt 2,13). Quando lhes foi possível regressar, foram viver em Nazaré, um povoado simples da Galiléia. Cumprindo as leis religiosas de Israel, aos 12 anos Jesus subiu com seus pais ao templo de Jerusalém. Encontrou-se com os doutores da lei, partilhou com eles sua maneira de entender as Escrituras e os deixou deslumbrados por seu conhecimento e profundidade (Lc 2,46-47). Ele próprio reconheceu depois que aquele momento havia começado a realizar o trabalho que o Pai lhe havia ordenado e que, nesta forma, estava preparando para a missão que lhe havia sido confiada (Lc 2,49). Em Nazaré, vivendo a vida normal de um jovem de sua época, cresceu “em sabedoria, idade e graça diante de Deus e dos homens” (Lc 2,52). Teve amigos, trabalhou numa profissão, conheceu a história, a cultura e a religiosidade de seu povo. Interessou-se pelos problemas de sua gente. Não deixou passar nenhuma oportunidade para assumir responsabilidades e participar. Partilhou e celebrou a fé. Foi à sinagoga e conheceu a vida e a maneira de agir dos sacerdotes e dos fariseus.
No seu processo de amadurecimento, Jesus teve de discernir o que Deus queria dele e definir seu projeto de vida. Sensível a busca religiosa e às expectativas messiânicas de seu povo, decidiu ir ao Jordão para se fazer batizar por João Batista. Neste momento, o Pai fê-lo ouvir a sua voz: “Tu és meu Filho amado! Em ti encontro o meu agrado”. O Espírito Santo também fez sentir sua presença (Lc 3,21-22). A partir de então, Jesus relacionou-se cada vez mais intimamente com o Pai. Dedicou-se mais plenamente a realizar sua ação libertadora no meio do povo, procurando seguir, com docilidade, as inspirações do Espírito que habitava nele. Foi tentado pela vida fácil e sem esforço, pela vanglória, pelo prestígio e pelo poder e pela idolatria do dinheiro e a ânsia de ter (Mt 4,1-11). Manteve-se, no entanto, fiel à sua opção e ao projeto de vida que havia assumido. 2.2. Jesus anunciou o Reino de Deus Quando Jesus sentiu que havia chegado a “sua hora” (Jo 2,4), iniciou-se sua missão evangelizadora na sinagoga de Nazaré. Ali, onde o haviam visto crescer e onde celebrava a fé com a gente de seu povo, surpreendeu a todos quando tomou o livro das Escrituras e, depois da leitura, anunciou com firmeza e convicção: “Hoje se cumprem aqui as profecias que acabam de ouvir” (Lc 4,21). Suas palavras foram o anúncio de que o Reino de Deus estava começando. O Reino é o grande projeto do Pai, a grande utopia de Deus de fazer uma família de filhos e irmãos, um lar para todos, uma humanidade libertada de toda opressão, reconciliada com a natureza, entre si e com Deus, onde o homem possa se sentir e ser, verdadeiramente, senhor do mundo, irmão dos outros e filho de Deus (P332). É realizar “os novos céus e a nova terra” anunciados pelos profetas (Is 65, 17-25). É um Reino de Vida, pois, em Jesus, Deus oferece sua própria vida em abundância (Jo 10,10). É um Reino de Verdade, pois “Deus é luz e nele não há trevas (1 Jo 1,5). É um Reino de Justiça e Liberdade, porque “Cristo nos libertou para que fôssemos realmente livres” (Gl 5,1). É um Reino de Alegria e Paz, pois se fundamenta no triunfo de Jesus ressuscitado (Jo 20,20). O Reino de Deus é inseparável da pessoa de Jesus. Nele, o Reino se encarna e se personifica. Com ele, o Reino de aproxima e se faz presente na humanidade (Lc 11,20). Cumpre-se, assim, o projeto histórico que Deus tinha para seu povo e se dá resposta a longa espera vivida por Israel, reanimada nos últimos tempos por João Batista. Ele convidava, como voz que clama no deserto, a “mudar de vida e de coração porque o Reino dos Céus está próximo” (Mt 3,2). O Reino não é uma doutrina que se ensina, não é uma moral que se impõe nem uma ideologia que se transmite. Não é um lugar. Não se pode reduzir a um conceito, a um modelo político ou a um programa de livre elaboração. O Reino é uma atitude, uma prática e uma vida. É uma pessoa que tem o rosto e o nome de Jesus de Nazaré, “imagem de Deus invisível” (Cl 1,15); um testemunho que revela a presença gratuita de Deus agindo, libertando seu povo, realizando seu plano de salvação, mostrando que é o Senhor da história e convidando a participar de seu grande projeto. O Reino dá sentido à história e à vida que está em processo de plena realização. É o “já-ainda não”. Um presente que ainda não alcançou a plenitude nem a realização definitiva (Lc 21,31). Para que o povo simples pudesse entender melhor esta misteriosa presença do Reino nos fatos da vida, Jesus utilizou parábolas e milagres. As parábolas do Reino falam desta grande utopia de Deus como um tesouro e uma pérola, por cuja aquisição vale a pena deixar tudo (Mt 13,44-46); como uma árvore que deve ser cultivada para que dê bom fruto (Mt 13,1-23); como uma pequena semente, cheia de vitalidade, que chega a ter um crescimento extraordinário (Mt 13,21-32); como um pouco de levedura que se mistura com a farinha, fermenta a massa e a faz crescer (Mt 13,33); como um campo semeado de trigo e joio (Mt 13,24-30); como uma rede que recolhe todo o tipo de peixes (Mt 13,47-48)... Os milagres são ações salvíficas que expressam esta presença do Reino: “Os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e anuncia-se aos pobres a Boa Nova”(Lc 7,22). Esta Boa Nova só pode ser acolhida a partir da fé. Por isso Jesus convidou a “crer na Boa Nova” (Mc 1,15). Sem fé na palavra e na pessoa de Jesus, “caminho, verdade e vida” (Jo 14,6), vendo-o como se vê o Pai (Jo 14,9), é impossível entender seu anúncio. Para entrar no Reino, é necessário converter-se (Mc 1,15), nascer de novo (Jo 3,3-21), ter coração de criança (Mc 10,15), amar a Deus e aos irmãos (Mc 12,28-34), entender que o sábado é para o homem
e não o homem para o sábado (Mc 2,27), reconhecer que ninguém pode marginalizar o outro se Deus o acolhe como filho (Mt 5,45)... Sem esta nova atitude é impossível entender a mensagem de Jesus. Jesus entregou sua vida pela realização deste projeto. Por isso Deus Pai ressuscitou, fê-lo Senhor da história e da humanidade nova e, junto com ele, enviou seu Espírito (At 2,17) para que aqueles que o seguem possam agir na verdade, na justiça, no amor e na paz e ser fermento do Reino, proclamando que “Cristo vive” para a vida do mundo. Quando os jovens percebem e chegam a descobrir que Jesus é e faz passível esta utopia de Deus, que “o Reino de Deus está próximo” (Mc 1,15) e, mais ainda, “está no meio deles” (Lc 17,20-21), entendem que “só o Reino de Deus é absoluto e tudo o mais é relativo”19 e que se deve “buscar primeiro o Reino de Deus e sua justiça” porque “tudo o mais será dado por acréscimo” (Mt 6,33). 2.2.1 Jesus optou pelos pobres O Reino, como o grande projeto de Deus, é universal. Seus destinatários privilegiados, contudo, são os que sofrem as consequências do pecado e do anti-reino: os pobres. O Reino de Deus está próximo deles (Mt 11,5). Jesus optou pelos pobres (Lc 4,16-22), identificou-se com eles e a partir deles anunciou a Boa Nova de que o Reino de Deus estava se tornando realidade (Lc 6,20-21). Nos anos de sua vida pública, Jesus conviveu com os que não tinham ligar dentro do sistema social e religioso da época. Acolheu os que não eram acolhidos: os pecadores (Mt 9,13), as prostitutas (Mt 21,31), os pagãos (Mt 15,21-28) e os samaritanos (Jo 4,22-24), os leprosos e endemoninhados (Lc 5,12-14; Mc 1,23-26), os marginalizados, as mulheres (Lc 8,1-3), os enfermos (Mt 4,24; Mt 8,15; Mt 14,14) e as crianças (Mt 18,1-5), os coletores de impostos (Lc 15,1) e os soldados (Mt 18,1-5) os fracos e os pobres sem poder (Lc 14,15-24). Identificou-se tanto com eles que considerou como feito a si mesmo o que se fizesse ou se deixasse de fazer a eles (Mt 25,31-46). Com sua atitude deu a entender claramente que não é possível ser amigo de Jesus e continuar apoiando um sistema que marginaliza tanto as pessoas. Deus manifestou assim sua força, seu poder e sua grandeza porque “escolheu o que é loucura no mundo para confundir os sábios; e escolheu o que é fraqueza no mundo para confundir os fortes” (1Cor 1,26). Ao encarnar-se no homem, faz história a partir dos pobres. Os pobres entendem essa linguagem (Mt 11,25), pois o Reino anunciado por Jesus é deles e para eles (Lc 4,18). O jovem rico afastou-se triste porque tinha muitas riquezas e não quis aceitar o projeto de fraternidade universal de Jesus (Mt 19,22). As riquezas são um grande empecilho para segui-lo (Mt 19,1626; Lc 6,24-26; Lc 12,13-34). Sua escolha não visa somente aqueles que têm possibilidades e são capazes de assumir responsabilidades. De maneira privilegiada, visa os que não têm voz nem vez no mundo. Aceitou e compreendeu as situações humanas de fragilidade e pecado, compadeceu-se de todos e os chamou à conversão. 2.2.2 Jesus proclamou as bem-aventuranças A vida de Jesus foi a vida de um homem pleno, autêntico, íntegro e feliz. Nas bem-aventuranças (Mt 5,1-12) apresentou um caminho de vida novo e original, uma escala de valores radicalmente distinta daquela que reinava na realidade de sua época e a propôs como caminho seguro de felicidade e de realização pessoal. O próprio Jesus foi o primeiro a dar testemunho deste novo estilo de vida como caminho para o Reino. Um caminho para a felicidade que implica ser pobre e comprometer-se com os pobres; partilhar alegrias e dores, gozos e esperanças; trabalhar para saciar a fome e a sede de justiça, ser compassivo e ter um coração limpo; lutar pela paz e ser capaz de aceitar a incompreensão, a perseguição e até o martírio pelo anúncio do Evangelho. As bem-aventuranças são o caminho da liberdade, da fraternidade e da solidariedade com o povo pobre. São o caminho do Evangelho que leva à vida. O caminho da vida que leva à ressurreição. 2.2.3 Jesus formou uma comunidade de discípulos Para realizar sua missão, Jesus reuniu em torno de si um grupo de gente simples, alguns jovens e outros com experiência de vida e do mundo do trabalho. Embora os tenha chamado um a um, 19
Paulo VI, exortação apostólica Evangelii nuntiandi, 8.
pessoalmente, formou com ele um grupo. O grupo do “Doze” (Mc 3,13-19), aos quais se foram juntando, depois, outros mais para formar a comunidade dos seguidores de Jesus (Lc 6,17). Jesus convidou para formar uma comunidade porque somente assim se pode experimentar e entender o Reino. Seu modo de agir responde ao plano de Deus em formar um povo que fosse, ao mesmo tempo, semente e fermento do Reino. Só na pequena comunidade é possível aprender os valores fundamentais do novo estilo de vida que Jesus propõe: os bens partilhados (Mt 6,24), a fraternidade e a igualdade entre todos (Mt 23,8-10) e o poder como serviço: “Quem quiser ser o primeiro, que se faça o servidor de todos” (Mc 9,35); a amizade até o ponto de não ter mais segredos (Jo 15,15) e a nova forma de viver a relação entre homem e mulher (Mt 19,1-9). Agrada-lhe passar muito tempo com seus discípulos. Vive momentos especiais com Pedro, Tiago e João (Mc 9,2). Faz-se amigo de Lázaro, Marta e Maria (Jo 11,5). Toma exemplos da natureza para ajudar as pessoas a entender o que quer ensinar sobre a “vida verdadeira” (Mt 7,16-19; Mt 6,26). Caminha muito, pesca no lago e desfruta a tranquilidade da noite. Compartilha a mesa de ricos e pobres (Lc 7, 3650); vai a festas (Jo 2,1-11); não recusa comer nem beber (Mt 11,19). Acompanha os discípulos em seu processo de crescimento em seu processo de crescimento como pessoas e no amadurecimento de sua fé (Lc 9,18-20). Vai ensinando-os, na prática, a superar o afã de poder (Mc 9,33-35) e a não buscar os primeiros lugares (Lc 14,7-11). Ensina-lhes como chegar ao coração das pessoas (Lc 21,1-4), a pôr sua fé em Deus e a superar os obstáculos da vida (Mt 6,25-34), a confiar nele como a “único que tem palavras de vida eterna” (Jo 6,68) e a colocar toda a sua esperança no triunfo definitivo do Reino (Mt 20,17-19). Avalia suas ações e questiona seus gestos, fazendo-os revisar suas vidas (Mc 9,33). Ajuda-os a ter senso crítico em face das autoridades e dos fariseus (Lc 20,45-47). Não deixa escapar nenhuma oportunidade para afirmar a vida da comunidade e ensiná-los a ser servidores de todos (Jo 13,13-15). A prática comunitária de Jesus estende-se por todo o seu ministério. O encontro de cada pessoa com ele converte-se num compromisso com a comunidade. Não é possível uma relação com Jesus que seja somente para si. Jesus é “o homem para os demais” e chama a todos a ser como ele: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estarei no meio deles” (Mt 18,20). É na comunidade e no serviço aos demais que se compreende, em plenitude, o projeto da salvação. A proposta de Jesus é difícil e exigente. Porém impressiona e faz com que muitos a sigam, porque chama a viver o que ele já havia realizado em sua própria vida (Mt 10,38-39). 2.3. Jesus apresenta um estilo de vida aos jovens 2.3.1 Rezar a partir da vida A vida de Jesus é um constante louvor e uma constante referência ao Pai. “Meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (Jo 4,34). Frequentemente, ao fim das atividades de cada dia, passava noites inteiras em oração, conversando com seu Pai (Lc 6,12; Mc 1,35). Isto lhe permitiu viver em intimidade e chegar a sentir-se um com ele: “Eu estou no Pai e o Pai está em mim... Quem me viu, viu também o Pai” (Jo 14,9-10) e experimentar a realidade de uma vida nova em Deus e a partir de Deus (Jo 14,1-31). Impressionados por sua maneira de rezar e de se relacionar com o Pai, os discípulos pediram-lhe um dia: “Senhor, ensina-nos a rezar!” e Jesus lhes respondeu: “Quando quiserem rezar digam Pai nosso...” (Lc 11,1-4). O pai-nosso não é uma fórmula para rezar, mas uma síntese do programa de vida de Jesus: que o Reino de faça realidade, que se cumpra sempre a vontade do Pai, que haja pão na mesa de todos, que se perdoem as ofensas que separam os irmãos, que se possa vencer as tentação e que o bem predomine sempre sobre o mal. Assim testemunhou sua relação íntima, de diálogo, com seu Pai e deu confiança aos discípulos para que também eles se animassem a se comunicar da mesma forma com ele (Mt7,7). A oração foi seu alimento diário: bendiz o Pai ao ver como revela seu Reino aos pobres, antecipa-se aos acontecimentos, velando em oração, e se afasta de todos para passar longas horas junto a seu Pai. Não poderia ter escutado e servido tanta gente de deu povo sem haver escutado profundamente a Deus. Por isso advertiu a seus discípulos que “não fossem como os hipócritas, aos quais agrada rezar de pé. Nas
sinagogas, para serem vistos pelas pessoas” (Mt 6,5). Ensinou-lhes a rezar a partir da vida e da história, com gestos e palavras (Mt 6,5-8). Rezou com as pessoas do povo, antes de curá-las (Mc 7,34) e de perdoá-las (Jo 8,1-11); rezou com palavras de ânimo e de agradecimento ao descobrir as maravilhas de Deus (Lc 10,21); rezou desde o mais profundo do seu coração quando se sentiu tocado pelas necessidades (Lc 9,16) e pela dor e o sofrimento do povo (Jo 11,41). Convidou a rezar sempre, com insistência e sem desânimos (Lc 18,1-8; Lc 11,9-11). Para ajudar os discípulos em seu processo de crescimento na fé, convidou-os a viver momentos fortes de oração como o da Transfiguração (Mt 17,1-13) e o do Monte das Oliveiras (Lc 22,39-43). Sua confiança no Pai chegou ao ponto culminante quando entregou sua vida, na cruz, exclamando: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23,46). 2.3.2 Construir um projeto de vida Durante os anos silenciosos de Nazaré, lendo com atenção as Escrituras e olhando detidamente a situação e as necessidades de seu povo, Jesus amadureceu sua resposta e concretizou seu projeto de vida. Quando viu que havia chegado o momento conveniente, deu-o a conhecer. Começou a trabalhar para torna-lo realidade e convidou outros à aderir à sua proposta e a se comprometer em seu seguimento. Segundo a situação de cada pessoa, chamou uns, questionou outros, reformulou a vida de muitos. Convidou Nicodemos a nascer de novo (Jo 3,1-8); chamou Zaqueu à conversão (Lc 19,1-9) promoveu o diálogo entre Marta e Maria (Lc 10,38-42); ofereceu água vida à mulher samaritana (Jo 4,1-45); devolveu a vida à filha de Jairo (Mc 5,21-43); perdoou a mulher adúltera e lhe pediu que não pecasse mais (Jo 8,111); convidou Pedro e André a ser “pescadores de homens” (Mc 1,17) e propôs um caminho de plenitude ao jovem rico (Mc 10,17-22). Na comunidade dos seguidores de Jesus, todo projeto de vida se inscreve dentro de seu grande projeto: buscar, anunciar e viver pelo Reino de Deus. Os discípulos, guiados por ele, foram descobrindo, no processo comunitário, seu próprio projeto pessoal e comprometendo-se pouco a pouco. Não tiveram a clareza de um dia para o outro. Em alguns momentos, julgaram-se preparados (Jo 6,67-69) e, em outros, simplesmente temeram (Mc 4,35-41) e procuraram escapar (Mc 14,50). Seu compromisso definitivo com Jesus foi fruto de uma longa caminhada, junto com ele, e da ação do Espírito, que, finalmente, os ajudou a “Entender toda a verdade” (Jo 16,13). 2.3.3 Ser solidário com os “caídos à margem do caminho” Jesus não foi insensível aos pobres, abandonados e marginalizados de sua época. Sentiu compaixão de que o seguia porque “estavam como ovelhas sem pastor” (Mc 6,32); deteve-se a escutar o clamor do cego que gritava à margem do caminho (Lc 19,35-43); atendeu os leprosos que pediam ajuda sem poder se aproximar (Lc 17,11-19); curou a mulher que chegou até ele para tocar seu manto (Lc 9,43-48); ressuscitou o filho da viúva de Naim, com cujo cortejo se encontrou na porta da cidade (Lc 7,11-17); repreendeu os discípulos que procuravam afastar as crianças (Mt 19,13-14) e consolou as mulheres que choravam junto ao caminho da cruz (Lc 23,28). Na parábola do bom samaritano (Lc 10,25-37), mostrou qual é a maneira de comportar-se antes as necessidades humanas no Reino de Deus. Com seu testemunho e com suas palavras, “vai e faze tu o mesmo”, convidou a não passar adiante e, sim, a olhar com ternura e afeto, a deter-se, a levantar e acompanhar, a preocupar-se pela situação para além do urgente e do imediato e a oferecer uma nova esperança. Numa palavra, chamou para a proximidades aos “caídos à margem do caminho”, à não indiferença diante das situação de marginalidade e a partilhar, neles, a paixão de toda a humanidade. 2.3.4 Amar com o coração inteiro As pessoas que se encontravam com Jesus sentiam seu afeto e o calor da sua acolhida. Foi capaz de dar a cada um seu lugar; de aceitar e respeitar a particularidade de cada situação e de cada processo; de oferecer, sempre, sua amizade; de entregar sua vida pelos que amava; de abrir a todos o caminho para o encontro com o Pai (Lc 3,10-14). Ninguém pôde sentir-se excluído de seu amor. Quando quis deixar o testamento de sua vida, falou do mandamento novo: “Amem-se uns aos outros como eu os tenho
amado... Você são meus amigos se cumprirem o que lhes mando” (Jo 15,12-14; Jo 13,34) porque “não há amor maior do que dar a vida pelos amigos” (Jo 15,12). O amor está no coração de toda experiência de encontro com Jesus. É o maior dom que se recebe do Pai e o maior dom que se pode dar. Constitui o cume e a chave de toda a vida humana, Será distintivo pelo qual o mundo reconhecerá os verdadeiros discípulos de Jesus (Jo 13,35). O amor entre os irmãos se expressa com carinho e ternura: restaura as feridas, desenvolve a personalidade, confia nas pessoas, é capaz de perdoar e ser misericordioso e faz desfrutar a vida. Jesus convida os jovens a viver um estio de vida no amor, a anunciar, com suas vidas alegres e intensas, que o amor autêntico é possível e a reconhecer, neste caminho que percorrem com fé e coragem, a presença do Deus da Vida. Trata-se de sermos capazes de dialogar, aprender a escutar e a partilhar, de sermos constantes e perseverante nos compromissos assumidos, de olharmos os interesses dos outros antes dos nossos, de entregarmos as próprias capacidade sem esperar recompensa, de darmos a vida nas ações humildes e simples de cada dia. Trata-se, definitivamente, de sermos testemunhas da civilização do amor. 2.3.5 Perdoar e ser perdoado O amor supõe e exige o perdão, parte integrante da conduta humana e do novo estilo de vida que Jesus propõe. Como dom de Deus, o perdão liberta das ataduras do pecado pessoal e social; derruba os muros que se criam entre as pessoas, os povos e as culturas; favorece a vida no amor e na felicidade e possibilita construir, juntos, uma sociedade mais justa, fraterna e solidária. O perdão não é uma palavra ou um verniz exterior. É um gesto gratuito que nasce do interior da pessoa. Exige arrependimento e mudança de coração. Abre as portas ao encontro de uns com os outros, como irmãos. Jesus mostrou Deus como um Pai misericordioso e cheio de ternura, que não hesita em sair e receber com afeto e carinho o filho que volta à casa depois de ter-se afastado de seu amor e de ter gastado toda a sua herança. Não pergunta porque saiu, o que fez nem onde esteve. Acolhe-o, perdoa-o e o devolve ao seu lugar e à sua dignidade de filho (Lc 15,11-32). Ele mesmo perdoou a quem se arrependera, prometera mudar de vida e reafirmara seu compromisso de segui-lo: Zaqueu (Lc 19,1-10), Madalena (Jo 8,3-11), o paralítico (Lc 5,18-26), Pedro (Jo 21,15-17) e na hora de sua morte, o ladrão arrependido (Lc 23,43) e aos seus próprios executores (Lc 23,34). Ensinou seus discípulos a perdoar sempre, como ele os perdoou (Mt 6,12), todas as vezes que for necessário (MT 18,21), para ser como o Pai do Céu (Mt 5,48), “que faz o sol brilhar sobre os bons e maus e chover sobre justos e injustos” (Mt 6,45). 2.3.6 Dignificar a vida da mulher Numa sociedade onde as mulheres eram submissas e não eram consideradas, nem tinham possibilidades de participar da vida do povo, Jesus teve com elas um comportamento muito especial. Olhou-as com amor, respeitou-as, tratou-as com dignidade e as valorizou como pessoa. Muitas mulheres o seguiram, o escutaram e o estimaram: Marta e Maria, suas amigas (LC 10,38ss), Mara Madalena (Jo 20,1-2), a adúltera (Jo 8,1-11); a samaritana (Jo 4,1-30), a mulher que derramou perfume sobre sua cabeça (Mt 26,6-16). Elas foram as primeiras testemunhas da ressurreição (Mc 16,5-7) e as enviadas a anunciá-la aos discípulos (Mc 16,9-10). 2.4. Jesus convida os jovens a segui-lo “Olhem o Senhor! O que vêem? Um homem sábio? Não! Mais do que isso! Um profeta? Sim! Porém, mais ainda! Um reformador social? Muito mais! Olhem o Senhor com olhos atentos e descobrirão nele o rosto do próprio Deus. Jesus é a palavra que Deus tinha para dizer ao mundo” (João Paulo II aos jovens chilenos, em Santiago, no dia 2 de abril de 1987). 2.4.1 “Segue-me!” Jesus convidou frequentemente que o escutava a segui-lo: “Venham e vejam” (Jo 1,39); “Se querer ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres; depois vem e segue-me” (Mt 19,21);
“Quem põe a mão no arado e olha para trás não serve para o Reino de Deus” (Lc 9,62); “Ide! Eu vos envio como cordeiros no meio de lobos. Não leveis bolsa nem sacola, nem sandálias...” (Lc 10,3-4); “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a todas as criaturas”(Mc 16,15). Não se pode ser cristão longe da figura histórica de Jesus de Nazaré. Ser cristão não é aderir a uma doutrina, a certos ritos ou a algumas tradições religiosas. Ser cristão é seguir a Jesus (Mt 9,9). Estar com ele (Jo 1,39) e fazer-se seu discípulo (At 11,26). Seguir a Jesus implicou, para os apóstolos, reconhecê-lo como senhor, aceitar seu projeto, começar a viver seu estilo de vida evangélico, entrar para fazer parte de sua comunidade, participar de sua missão e se deixar guiar por seu Espírito. Embora houvesse momentos de alegria e de plenitude (Lc 10,17; Mt 17,4; Lc 20,37-38), não foi fácil para os apóstolos segui-lo sempre em seu peregrinar pela Palestina, especialmente quando acharam que suas palavras eram “muito duras” (Jo 6,60-69) ou quando tiveram de enfrentar o primeiro anúncio (Mt 16,22-23) e, logo depois, a realidade da chegada do momento final da crucificação (Mc 14,50). Por isso, antes de partir, prometeu enviar-lhes seu Espírito (Jo 16,13) como força para animar, vivificar, guiar e levar à plenitude o seguimento de Jesus. 2.4.2 “Toma a tua cruz e segue-me” O seguimento de Jesus passa pela cruz. “Se alguém quiser me seguir, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz de cada dia e siga-me”(Lc 9,23). Não foi fácil para Jesus enfrentar a realidade da cruz. No momento culminante de sua vida, pediu a seus amigos mais próximos que o acompanhassem (Mt 26,36-46); rogou ao Pai que o sofrimento fosse evitado (Mt 26,42); sentiu-se enganado pela traição de Judas (Lc 22,48), pela atitude de Pedro (Jo 18,10-11) e pela fuga de seus discípulos (Mt 26,56). Chegou ao Calvário quase só, acompanhado unicamente por João, sua mãe e algumas mulheres (Jo 19,25-26). Mas, mesmo assim, foi forte e teve coragem de aceitar, com serenidade, a vontade do Pai (Mc 14,36) para entregar-se a quem o iria condenar (Mc 14,42), chegar até a cruz e oferecer a sua vida pela salvação do mundo (Jo 19,30). Também não foi fácil para os discípulos. Apesar de terem estado com ele três anos, não puderam entender o que estava acontecendo. Com a vida que tinham pela frente, muitos de seus projetos e esperanças apareciam desmoronar. Era noite... 2.4.3 “Eu sou a ressureição e a vida” Muito cedo, pela manhã, no dia de Páscoa, os discípulos foram ao sepulcro e encontraram o túmulo vazio (Jo 20,1-9). Jesus havia triunfado sobre a morte e “passado” da morte para a vida. “Deus o ressuscitou, livrando-o das dores da morte das dores da morte, porque a morte não podia tê-lo dominado” (At 2,24). “Uma vez ressuscitado dentre os mortos, não morre mais. A morte já não tem domínio sobre ele, porque sua morte foi um morrer para o pecado de uma vez para sempre, e seu viver é, agora, um viver para Deus” (Rm 6,9-10). O anúncio da ressurreição de Jesus transformou a vida dos discípulos e converteu sua dor em alegria (Mt 28,8; Jo 21,7). Os primeiros relatos refletem o dinamismo, a alegria e a certeza de que a vida nova, oferecida por Jesus, havia se tornado realidade para sempre: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, embora morto viverá. Quem vive pela fé em mim, não morrerá para sempre” (Jo 11,25-26). Apenas recebido o dom do Espírito Santo, e já os discípulos da pequena e jovem igreja saíram a proclamar com entusiasmo esta Boa Nova (At 2,14-40). Nem sempre foram ouvidos (At 2,12-13). Tiveram que sofrer muitas incompreensões e superar tempos de perseguição (At 4,3), mas nunca abandonaram sua nova missão de serem “testemunhas da ressurreição” (At 2,32). 2.4.4 “Para que tenham vida em abundância” Jesus continua oferecendo, hoje, a todos os seus seguidores a plenitude da vida da ressurreição. “Do encontro com Jesus surge a vida. Longe dele só há obscuridade e morte. Vocês têm sede de vida. De que vida? Da vida eterna! Busquem-na e encontrem-na em quem não somente dá a vida, mas em quem é a própria Vida! Ele! Este é, meus amigos, a mensagem da vida. Busquem a Cristo! Olhem a Cristo! Vivam em Cristo!” (João Paulo II aos jovens de Santiago do Chile, em 1987).
Jesus continua convidando-nos a encontrar nele o caminho, a verdade e a vida (Jo 14,6), o pão da vida (Jo 6,1-71), a luz (Jo 8,12), a porta (Jo 10,7), o bom pastor (Jo 10,11-14), a palavra viva de Deus (Jo 1,14), o Cristo, Filho de Deus vivo (Mt 16,16), o Senhor Ressuscitado (Jo 20,21), o princípio e o fim, aquele que é, que era e que virá. O Senhor do universo (Ap 1,8). 2.4.5 “Pôs-se a caminhar com eles” Jesus continua também convidando-nos a percorrer com ele o caminho dos discípulos de Emaús (Lc 24,13-35). Faz-se presente no meio deles como “companheiro de caminho”, partilha os acontecimento da vida e as experiências que os afetam, escuta com atenção seus relatos, ajuda-os a entender o que aconteceu naqueles dias em Jerusalém, explicando-lhes as Escrituras e, no final do conhecer em plenitude. O encontro com Jesus ressuscitado tem seu momento culminante na mesa da Eucaristia, em que se renova, com gozo e esperança, a celebração de sua morte e de sua ressurreição. O encontro com Jesus mudou a perspectiva dos discípulos. Fez com que passassem da tristeza para a alegria de sentir “arder seus corações” (Lc 24,32) e os ajudou a descobrir o sentido mais profundo de suas vidas e da história. A mesma coisa continua acontecendo com os jovens de hoje quando percorrem o caminho de Emaús. 2.4.6 “Não sejas incrédulo, mas crente” Se foi difícil para os discípulos aceitar a condenação e a morte de Jesus, mais difícil ainda foi, para alguns deles, crer na ressurreição. Tomé não estava com os demais quando Jesus apareceu depois de haver ressuscitado. As palavras e o testemunho de seus companheiros não foram suficientes. Não se convenceu até que colocou as mãos no lugar dos cravos e nas feridas de Jesus (Jo 20,27). Embora tivesse passado muito tempo junto com ele e tivesse se iniciado em seu seguimento, quando chegou a hora da fé e do compromisso, duvidou. Jesus não quis que Tomé ficasse no caminho e, por isso, voltou a buscá-lo e a convidá-lo a que se reencontrasse com ele, descobrisse toda a verdade e recebesse seu convite: “Não sejas incrédulo, mas crente”. A este convite Tomé só pode responder: “Senhor meu e Deus meu!”. (Jo 20,28). A experiência de Tomé é, também, a experiência de muitos jovens seguidores de Jesus. 2.4.7 “Amas-me mais que a estes?” Jesus queria muito a Pedro. Havia participado do processo de formação pessoal e comunitária que realizou com seus discípulos no grupo dos Doze. Conhecia-o muito a fundo. Sabia de seu valor (Jo 18,10) e de sua decisão (Mt 26,35). Sabia, também, de sua euforia momentânea (Jo 13,6-9) e de sua debilidade (Mt 15,30). Pedro reconheceu-o como Messias (Mc 8,27-29), porém custou-lhe aceitar que a cruz se fizesse presente em sua vida (Mc 8,32-33). Embora se sentisse forte e com coragem, o susto e o medo foram mais fortes na hora de se pronunciar por Jesus. Negou-o três vezes (Mt 26,69-75), Jesus compreendeu Pedro, superou a dor da traição e não abandonou a sua amizade. Haviam passado muito tempo juntos e queria contar com ele para continuar o anúncio e a construção do seu Reino. No reencontro, depois da ressurreição, perguntou três vezes a Pedro se o queria (Jo 21,15-17), até que conseguiu o reconhecimento de sua debilidade, renovação de sua fé e sua adesão plena. A insistência de Jesus ajudou-o a ver que seu seguimento não poder ser somente emotivo, e sim um compromisso que muda e envolve toda a vida e todo o seu ser. Jesus pede o mesmo aos jovens de hoje. É fácil responder-lhe pela primeira vez. Porém, quando se faz a experiência de caminhar junto com ele, descobrem-se as exigências de seu Reino e se torna mais difícil segui-lo. Os jovens comprometidos no seguimento de Jesus são convidados, como Pedro, a repetir pela terceira vez: “Senhor, tu sabes tudo, tu sabes que te quero!” (Jo 21,17). 2.4.8 “Levanta-te e anda” É impressionante a sensibilidade de Jesus diante da debilidade, da enfermidade e da morte das crianças e dos jovens. Cura o empregado do capitão de Cafarnaum (Mt 8,5-13); ressuscita a filha de Jairo (Mc 5,21-43); expulsa um demônio da filha da mulher siro-fenícia (Mc 7,24-30); amaldiçoa a quem
escandaliza os pequenos (Mt 18,6); cura o jovem epilético cujo espírito mau dos discípulos não haviam conseguido expulsar (Lc 9,37-43). O sinal mais claro, contudo, desta preocupação de Jesus para que os jovens cheguem a viver sua vida em plenitude foi o sucedido no povoado de Naim. Aproximava-se da entrada da cidade quando saía o enterro do filho único de uma viúva. Então ele disse: “Jovem, eu te ordeno, levanta-te!” Tendo ele tornado a viver, entregou-o à sua mãe (Lc 7,11-17). Essa mesma voz continua sendo ouvida, hoje, para animar a tantos jovens caídos e desanimados pelas dificuldades da vida. “Jovem! Levanta-te! Participa da incansável tarefa de anunciar o Evangelho e cuidar, com ternura, dos que sofrem nesta terra, buscando maneiras de construir um país justo e de paz. A fé em Jesus nos ensina que vale a pena defender o inocente, o oprimido e o pobre; que vale a pena sofrer para diminuir o sofrimentos dos demais. Jovem, levanta-te! És chamado a ser um pessoa apaixonada na busca da verdade, um cultivador incansável da bondade, um homem e uma mulher com vocação de santidade. Que as dificuldades que te cabem viver não sejam obstáculo ao teu amor e à tua generosidade. Que sejam um grande desafio. Não te canses de servir; não cales a verdade; supera teus temores; sê consciente de teus próprios limites pessoais. Tens de ser forte e valente, lúcido e perseverante. Não te deixes seduzir pela violência e as mil razões que aparentam justificá-la. Engana-se quem diz que, atráves dela, conseguir-se-á justiça e paz” (João Paulo II aos jovens do Chile, em 1987).
2.5. Os jovens latino-americanos proclamam Jesus vivo e presente em suas vidas e em sua história. Milhares de jovens procuraram e continuam procurando, hoje, viver o seguimento de Jesus na América Latina. Sua experiência de fé vivida e partilhada expressou-se, assim, em Chocabamba, durante o Primeiro Congresso Latino-Americano de Jovens: • Cremos em Jesus vivo e presente na alegria e na esperança do povo latino-americano, marcado por uma história de dor e pobreza; na multiplicidade das culturas, no jovem indígena, no negro, no mestiço, no branco e no amarelo de nosso continente, especialmente naquele que não é valorizado e que tem poucas possibilidades de vida e muitas dificuldades, em nós mesmo, como força transformadora das realidades específicas da pastoral da juventude. • Cremos em Jesus vivo e presente quando reafirmamos nosso compromisso para com a formação integral e permanente dos jovens, aceitando, assumindo e anunciando o Evangelho a partir de nossa vivência pessoal e comunitária e sendo protagonistas da história; nos jovens que, à luz da fé, optam por um compromisso social nos diferentes espaços políticos, em Comissões de Direitos Humanos, em organizações populares ou respondendo a uma vocação ministerial; na Igreja jovem, comunitária, profética e missionária, que tem propostas de vida transformadoras e respeitosas de cada pessoa, assumindo um compromisso evangélico e libertador. • Cremos em Jesus vivo e presente nos jovens que estão em situações críticas e marginalizados por estruturas desumanizantes; no pobre que sofre, no encarcerado triste, no enfermo abandonado, no menor marginalizado, no jovem desorientado, no operário explorado, no mineiro e no camponês oprimidos que clamam por justiça; nas mulheres latino-americana, nas mães que buscam filhos desaparecidos, nas trabalhadoras que lutam pela vida, nas donas de casa e operárias que conduzem as comunidades e se comprometem com a organização da sociedade. Nas mulheres consagradas que fazem de suas vidas uma oferenda de amor. • Cremos em Jesus vivo e presente no sangue derramado por nossos mártires, quando reafirmamos a esperança do triunfo da vida sobre a morte que consolidou estruturas injustas; no grito dos jovens do continente latino-americano lutando por fazê-lo novo, com a força do amor.
3. O ESPÍRITO SANTO SE MANIFESTA NA VIDA DOS JOVENS 3.1. O Espírito no mundo Desde o começo da criação, o Espírito de Deus “pairava sobre a superfície das águas” (Gn 1,2). Inspirou a palavra criadora que separou a luz da escuridão e pôs ordem ao caos primitivo. Fecundou a terra e os mares e fez a vida germinar neles. Iluminou o rosto do primeiro homem e incentivou os caminhos de libertação dos povos. É possível reconhece-lo animando a vida humana, unindo e promovendo a comunicação entre as pessoas inspirando os artistas, impulsionando as lutas dos pobres pela justiça, desenvolvendo a ciência para o serviço da humanidade e despertando a necessidade de buscar a Deus até encontrálo. Ele está silenciosamente presente, também, nos acontecimentos e na história dos povos, nas correntes de pensamento e na diversidade de modalidades que o transcorrer da vida humana assume. Promove a busca da verdade, as iniciativas de progresso e cooperação e a permanente urgência de construir um mundo que esteja mais a serviço do homem e mais de acordo com a vontade de Deus. Embora não seja percebido com os sentidos e enquanto seu ritmo não coincida, muitas vezes, com os dos homens, vive e palpita no coração do mundo. É possível experimentar sua ação e sua presença quando ele se dá a conhecer como “vento forte” (At 2,3), como “força de vida” (At 1,8) ou como “torrente de água que brota para a vida eterna” (Jo 4,14). Foi “derramado sobre toda criatura” (At 2,17) porque “a promessa é para vocês e seus filhos e para todos os estrangeiros que o Senhor chamar” (At 2,39). Sua ação chega, ainda, para “aqueles que não conhecem a Jesus Cristo, pois o Senhor quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade”.20 3.2. O Espírito se manifesta aos jovens Na América Latina de hoje é possível descobrir muitos sinais da presença do Espírito. O Espírito se manifesta nos jovens indígenas, em sua riqueza de tradições, em sua linguagem e no amor e respeito que têm pela natureza; no jovens afro-americanos, em suas lutas pela dignidade e pela superação de toda forma de escravidão; nos jovens rurais, na defesa de seus direitos à posse da terra, nos campos coloridos e nas sementes que germinam; no jovens mineiros, no suor de suas frontes com que buscam, nas profundezas da terra, os minerais que asseguram sua subsistência; nos jovens pescadores, nas redes e remos que lançam ao mar e à força dos ventos; nos jovens urbanos, na pobreza e riqueza de suas cidades, na música, no futebol, nos vendedores ambulantes e no barulho da rua; nos jovens operários, em suas longas jornadas de trabalho e em suas lutas por um salário que lhes permita ganhar o pão de cada dia; nos jovens estudantes, em seus cadernos, livros e no tempo de vida que partilham com suas famílias e seus companheiros; nos jovens marginalizados, no silêncio da noite e no abandono do dia. Em cada uma dessas realidade e situações, o Espírito se faz presente e semeia de esperança e transformação para que os jovens se comprometam com o esforço de construir a civilização do amor. “Muitos povos, depois de uma longa e dura escravidão sob regimes de opressão, reconquistaram, felizmente, a liberdade. Nesta mudança radical de situações, os jovens buscam a liberdade. Mas que liberdade? A do espírito ou a da carne? Porque se corre o risco de cair em novas escravidões, mais tenazes e opressoras que as primeiras: p consumismo, a droga, o sexo, a fome de poder e de ter. Só seremos livres com aquela liberdade com a qual Cristo nos libertou (Gl 5,1). Cristo trouxe a libertação plena e integral com sua encarnação, morte e ressurreição; isto é, com seu mistério pascal que se faz nosso pela ação do Espírito Santo no batismo. “Porque o Senhor é o Espírito e onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade (2Cor 3,17)”.21 20 21
Vaticano II, constituição dogmática Lumen gentium, 16. Cardeal Eduardo Pirônio, abertura do III Fórum Internacional de Jovens, Czestochowa, 7 de agosto de 1991.
3.3. Os dons do Espírito Santo O Espírito Santo é o grande presente de Deus aos jovens. Anima suas vidas, fortalece seus trabalhos, livra-os de seus temores, torna-os ativos na tarefa de transformar a realidade. “Limpa os pecados, rega a aridez e cura as feridas, suaviza a dureza, elimina com seu calor a frieza e endireita os caminhos”22. Realiza a profecia de Ezequiel: “Dar-lhes-ei um coração novo e porei dentro de vocês um espírito novo. Tirar-lhes-ei do corpo o coração de pedra e lhes porei um coração de carne” (Ez 36,26). Concede-lhes, para que possam viver em plenitude o seguimento de Jesus e ser protagonistas e testemunhas da civilização do amor, a multiplicidade de seus dons: ○ A audácia, que os torna capazes de assumir tarefas sem temer as dificuldades e de superar a tentação da apatia e do desânimo diante do que parece impossível de mudar. Leva-os a pôr sua confiança em Deus e a se deixar guiar por ele. ○ O dinamismo que os mantém inquietos e os enche de energia para participar da vida da comunidade, contribuir com suas iniciativas e capacidades de realização e celebrar ativamente a presença de Deus em suas vidas; ○ A espontaneidade, que lhes permite expressar-se livremente como são e como se sentem, superar as visões estruturadas e formalistas do mundo que os rodeia, responder com atitudes oportunas aos desafios e acontecimentos da vida diária e celebrar sua fé com simplicidade e entusiasmo; ○ A amizade, que os faz querer e se deixar querer pelas pessoas, gostar das ações grupais e da vida em comunidade, desfrutar a gratuidade dos momentos para se encontrar e partilhar e ser, assim, manifestação do amor de Deus. ○ O espírito de luta, que os ajuda a fazer suas as aspirações do povo, e se comprometer na defesa da vida e dos direitos humanos, a não desanimar nem cruzar os braços diante das situações de pobreza e injustiça e a apostar, sempre, na causa do Reino; ○ A solidariedade, que os impulsiona a fazer seu o espírito do Bom Samaritano (Lc 10,25-37), a ser sensíveis para partilhar, as misérias da condição humana e a paixão dos homens e mulheres de seu povo e a não se cansar de levantar os caídos pelo caminho e a oferecer esperança aos que vivem na marginalidade; ○ A alegria, que os motiva a continuar celebrando a festa da vida, mesmo em meio às dificuldades e obstáculos de cada dia. Nela, Deus se faz presente para renovar o triunfo da vida sobre a morte e reafirmar o compromisso de todos; ○ A criatividade, que desperta os interesses e articula os sentimentos mais profundos do coração dos jovens. Permite-lhes expressar, através da arte, da poesia, da música e da dança, a presença de Deus Criador no meio de seu povo e os ajuda a compreender melhor e a aprofundar o mistério da vida como tal. 3.4. “Receberão a força do Espírito Santo...” Os apóstolos esperaram com Maria “perseverantes na oração e na unidade de coração” (At 1,14), a chegada do Espírito que Jesus havia anunciado e que os converteria em suas “testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e Samaria e até os confins do mundo” (At 1,8). Muitos jovens celebram o sacramento da Confirmação como um acontecimento transcendente de seu processo de educação na fé e como o momento de comprometer-se mais responsavelmente a ser atores e protagonistas de sua vida de fé e de seu seguimento de Jesus (SD 115). Pelo dom do Espírito Santo que recebem, sentem-se envolvidos definitivamente em sue grande projeto de anunciar e construir o Reino. Os jovens recebem o mesmo Espírito que, com sua sombra envolveu Maria na anunciação (Lc 1,26-38), o mesmo Espírito que foi prometido a João Batista na visão de Zacarias (Lc 1,15), o mesmo Espírito que inspirou Isabel e a fez proclamar Maria “bendita entre todas as mulheres” (Lc 1,41-42), 22
Sequência da Liturgia de Pentecostes.
o mesmo Espírito que estava com Simeão e lhe revelou que não morreria sem ver o Messias Salvador (Lc 2,25-26), o mesmo Espírito que desceu sobre Jesus quando foi batizado por João no rio Jordão (Lc 3,21-22), o mesmo Espírito que o guiou pelo deserto quando foi tentado (Lc 4,1-2) e o mesmo Espírito que estava sobre ele quando anunciou o começo de sua missão na sinagoga de Nazaré (Lc 4,18-20). O Espírito prometido por Jesus (Jo 14,16) é o “Espírito da verdade” (Jo 15,26), aquele que falará em nome de seus seguidores quando perseguidos (Mc 13,11), aquele que os apóstolos receberam para cumprir sua missão (At 4,8) e aquele que os guiou e acompanhou, mostrando-lhes o que deviam fazer (At 8,29; At 11,12; At 13,2). É o Espírito dos “sete dons”, que simbolizam a plenitude concedida à pessoa para que possa ser um Cristo neste mundo. Pelo dom do Espírito, os jovens chegam a crer em Deus como Pai e em Jesus como Senhor, e a entrar no mistério de comunhão do Deus Trinitário, em cujo nome foram batizados (Mt 28,19). O Espírito leva-os a celebrar este mistério em sua vida de comunidade e a realizar seu processo de amadurecimento na fé, em relação pessoal com o Pai, o Filho e o Espírito. Assim descobrem também sua identidade de filhos de Deus, irmãos do Senhor Jesus e templos do Espírito Santo. 3.5. O Espírito envia os jovens O Espírito é uma fonte inesgotável de imaginação de criatividade e de vida. Impele os jovens a “viver segundo o Espírito” (Gl 5,16), convida-os a formar comunidades (At 2,42-47), envia-os como missionários (Mt 28,18-20), especialmente aos não-evangélicos (At 13,46-48), e os convida a estar atentos para discernir, à luz da palavra, os sinais dos tempos através dos quais continua manifestando-se na história. Em meio às cambiantes realidades culturais do mundo atual, o Espírito chama os jovens a reviver a experiência de Pentecostes. “O Espírito Santo está suscitando gerações novas de jovens alegres, profundos, comprometidos”23. Oferece-lhes sua força e seu alento de vida para que deixem de lado os sonhos de construção de babéis individualistas e colaborem na construção de ambientes vitais de comunhão e participação que tornem realidade o projeto de Jesus.
4. MARIA, MÃE DE JESUS,CAMINHA COM OS JOVENS Num contexto social, religioso e cultural como o do povo de Israel, onde o predomínio do homem sobre a mulher era aceito naturalmente, pode-se valorizar melhor a singular ação de Deus ao escolher uma jovem mulher para ser a mãe de seu Filho, Maria, a jovem mulher de Nazaré, ocupa, assim, um lugar privilegiado na história da salvação. Nela, a mulher recupera sua dignidade, sua igualdade e sua liberdade. Maria, a criatura que Deus aproximou mais de si mesmo, o rosto feminino do amor de Deus, e a mulher da nova criação, o símbolo da humanidade liberta e a manifestação mais evidente de que a utopia de Deus está se realizando na história da humanidade. 4.1. Maria é jovem Maria era jovem e virgem. Uma mulher alegre e simples do povo. Seus pais, Joaquim e Ana, a haviam ensinado a ler e interpretar as Escrituras. Conhecia a história de Israel e as promessas de Deus. vibrava com as expectativas messiânicas de seu povo. Quando recebeu a visita do anjo, deuse conta de que Deus a havia escolhido e, embora não entendesse plenamente o que isso significava, pôs-se à disposição com fé e entrega e aceitou ser a Mãe de Deus (Lc 1,26-38). Compreensiva e cheia de ternura, saiu imediatamente e subiu a montanha para encontrar sua prima Isabel e acompanhá-la durante sua gravidez (Lc 1,39; Lc 1,56). Reconhecendo a presença e a ação do Espírito nas maravilhas que estavam ocorrendo, louvou a Deus dizendo: “Celebro com todo o meu ser a grandeza do Senhor e meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, porque olhou a humilde condição de sua serva...”(Lc 1,46-55).
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Cardeal Eduardo Pirônio, abertura do III Fórum Internacional de Jovens, Czestochowa, 7 de agosto de 1991.
4.2. Maria é mãe de Deus e mãe da Igreja Maria esteve, desde o começo junto de Jesus. Nela, o Filho de Deus se fez homem por obra do Espírito Santo (Lc 1,35). Ela o apresentou ao mundo quando nasceu na pobre gruta de Belém (Lc 2,6-7). Ela o levou ao templo para consagrá-lo ao Senhor (Lc 2,22) e recebeu as enigmáticas palavras do velho Simeão: “Uma espada te atravessará a alma” (Lc 2,35). Ela o levou consigo quando peregrinaram em Jerusalém para cumprir os preceitos religiosos de seu povo e o procurou entre o povo quando ele ficou na cidade (Lc 2,41-52). Ela acompanhou sua etapa de crescimento em Nazaré e foi “guardando todas as coisas em seu coração” (Lc 2,51). Ela fez com que realizasse o primeiro sinal milagroso, em Caná, ordenando aos serviçais: “Façam tudo o que ele disser” (Jo 2,5). Ela o acompanhou com discrição durante sua vida pública (Lc 8,19-20), seguiu-o de perto a caminho do Calvário e ficou junto dele, ao pé da cruz, até o fim (Jo 19,25). Pouco antes de morrer, Jesus a entregou como mãe a seu jovem discípulo João (Jo 19,26-27). Por esse supremo gesto de generosidade, Maria se converteu em mãe de todos os homens. Quando os discípulos se reuniram em oração para esperar o advento do Espírito, esteve no meio deles (At 1,14) acompanhando o nascimento da jovem Igreja de Jerusálem. Da mesma forma prosseguiu, ao logo dos séculos, possibilitando o nascimento de inúmeras comunidades de seguidores de seu filho Jesus. 4.3. Maria acompanha os jovens no caminho para Jesus A presença de Maria entre as multidões crentes é uma constante da América Latina. O povo a reconhece como mãe de Jesus e mãe de todos os crentes. Ela é a presença maternal de Deus, a mãe próxima que escuta e dá apoio nos momentos de dificuldades. Mãe dos pobres, anima e conforta a caminhada do povo sofrido , rumo a libertação. Os jovens peregrinam continuamente para seus santuários. Mostram-lhe seu carinho e seu afeto, chamam-na e reconhecem-na por seu próprio nome em meio às suas múltiplas invocações. Identificam-se com Juan Diego, que com ela se encontra e conversa nas colinas do Tepeyac. Maria é exemplo de amor e amizade juvenil quando visita sua prima Isabel (Lc 1,39-45); é exemplo de humildade e simplicidade quando louva a Deus por ter fixado o olhar em sua condição humilde (Lc 1,47); é exemplo de sensibilidade social e preocupação pelos pobres quando canta sua alegria porque Deus age com justiça “arruinando os soberbos, destronando os poderosos e despedindo os ricos de mãos vazias” (Lc 1,52-53). Seu canto de louvor o Magnificat reflete sua alma, preludia o anúncio das Bem-Aventuranças (Mt 5,3-12) e expressa o ponto culminante da espiritualidade dos pobres de Javé. Maria continua mostrando aos jovens de hoje sua ternura de mãe. Ajuda-os a conhecer e a seguir seu filho Jesus, acompanha-os em seus processos de crescimento na fé, intercede pelo que estão longe ou o buscam sem encontrá-lo e abre caminhos de esperança para os excluídos e para os que não têm voz. Com seu exemplo, propõe um projeto de vida para os jovens e os convida a dizer “sim” a Jesus e a pôr-se em disponibilidade total para o serviço do Reino.
5. A IGREJA COM OS JOVENS O Reino de Deus encontra na Igreja uma expressão muita particular. Ela é seu sinal perceptível, seu instrumento privilegiado, seu germe e seu princípio, na medida em que vive o Evangelho e, dia a dia, identifica como Corpo de Cristo. A Igreja é um mistério de fé porque continua, na história, o mistério de Cristo e de seu Espírito e porque nela o Reino encontra sua expressão consciente e institucionalizada. É também a resposta humana organizada que os seguidores de Jesus deram ao plano de Deus. Por isso é sem divisão nem confusão, divina e humana. Participa ao mesmo tempos da debilidade do humano e da glória do divino. Desde o começo da história latino-americana, a Igreja está presente no meio do povo, anunciando Jesus, denunciando a injustiça, chamando à conversão. Às vezes foi cúmplice na colonização desintegradora das culturas autóctones. Foi, igualmente, promotora de liberdade e
solidária com a libertação. Nas últimas décadas, diante da crescente pobreza e degradação da vida e da dignidade humana, tomou consciência de que sua missão é uma evangelização libertadora. A melhor maneira de evangelizar os pobres é permitir que os próprios pobres se façam Igreja e ajudem a Igreja a ser uma Igreja pobre e dos pobres: um povo de Deus que caminha, que se articula em comunidades vivas e que se organiza para a transformação da realidade. 5.1. Uma Igreja que celebra a vida O ser humano precisa parar em meio à correria do dia-a-dia; não pode viver fustigado pelas preocupações, premido pelos compromissos, pelos conflitos, pelo trabalho e pela luta pela sobrevivência. Precisa descansar, meditar, rezar, sorrir... Precisa festejar, desfrutar momentos de alegria, de expansão e de celebração. Conhece-se um povo quando se consegue partilhar de suas festas. No sétimo dia, depois de sua obra criadora, Deus “descansou” (Gn 2,2). O povo eleito também aprendeu a fazer assim (Lv 23,1-7; Lv 25). Fiéis à mesma tradição, os cristãos começaram a celebrar o domingo como o dia do descanso, mantendo viva a fé em Jesus, ressuscitado. Nesse dia, o povo de Deus se renova ao celebrar o encontro partilhando a mesa da Vida e recebendo a força que brota do sacrifício da salvação. A páscoa de Jesus se faz presença viva: “Façam isso em minha memória” (Lc 22,19). A Eucaristia é, portanto, a festa do povo de Deus. A antecipação da grande festa para a qual o Pai nos convida. A festa na qual “Deus enxugará as lágrimas de nossos olhos porque, ao contemplálo como ele é, seremos para sempre semelhantes a ele e cantaremos eternamente seus louvores”24. Em cada celebração, anuncia-se que a humanidade inteira é chamada a poder entoar, um dia, o canto novo e definitivo da libertação.25 As comunidades cristã celebram sua vida, sua fé e suas lutas no encontro, nos sinais, nos cantos, nos ritos e nas variadas formas de expressar a alegria, a dor, a penitência, a fé, a esperança, o amor, a ação de graças e a libertação. Os jovens, particularmente sensíveis às expressões festivas e comunitárias, são chamados a ter uma participação ativa na liturgia e nas celebrações, para dar expressão viva e atual, encarnada e inteligível, a esses momentos da vida do povo de Deus. 5.2. Uma Igreja povo de Deus e povo de irmãos “Deus não quis salvar os homens isoladamente, sem relação uns com os outros, mas constituindo um povo que o confessasse na verdade e o servisse santamente”26. A Igreja é, hoje, este povo. Vive a mesma vida nova de Jesus e o dinamismo de seu Espírito em cada uma de suas pequenas comunidades. Povo a caminho, continuamente fazendo-se e renovando-se, sente-se chamado a trabalhar para introduzir, o Reino de Deus na história, e fazer de todos os povos um único povo de irmãos (1 Pd 2,9-10). Um povo é uma articulação de comunidades vivas que elaboram sua consciência, projetam sua caminhada e se organizam para a ação. Quando esse povo, pela fé, pelo batismo e pela prática do Evangelho, adere a Jesus Cristo, concretiza-se como povo de Deus na história. Na América Latina, esse povo de Deus está cada vez mais encarnado nos pobres, buscando assumir mais plenamente as características da cultura e religiosidade popular. No caminhar do povo de Deus e na vida das comunidades, vão surgindo os diferentes ministérios e serviços para dar resposta às necessidades humanas e religiosas. As funções são redefinidas, e as formas de agir dos agente pastorais tornam-se mais claras. As tarefas da evangelização vão sendo assumidas em co-responsabilidade. Assim, a Igreja se manifesta como um sinal da libertação integral que Deus quer para seus filhos e como instrumento adequado para sua implementação na história.
24
Oração Eucarística III. Vaticano II, constituição dogmática Lumen Gentium, 9. 26 Idem,1. 25
5.3. Uma Igreja comunhão e participação A Igreja entendeu a si mesma, no Concílio Vaticano II, como “o sacramento ou o sinal e instrumento da comunhão dos homens com Deus e dos homens entre si”. Puebla estabeleceu a ação evangelizadora da Igreja na América Latina como um obra de “comunhão e participação”(P 563). Seu grande desafio é viver a unidade, característica fundamental dos seguidores de Jesus (Jo 17,22-24), anuncia-la e construí-la até que se torne real a comunhão de todos os homens num autêntica fraternidade universal. “ Cada comunidade eclesial deveria esforçar-se por constituir para o continente um exemplo do modo de convivência em que se consiga unir a liberdade e a solidariedade. Em que a autoridade se exerça com o espírito do Bom Pastor. Em que se viva uma atitude diferente diante da riqueza. Em que se ensaiem formas de organização e estruturas de participação capazes de abrir caminhos para um novo tipo mais humano de sociedade. E, sobretudo, se manifeste inequivocamente que, sem uma radical comunhão com Deus em Jesus Cristo, qualquer outra forma de comunhão puramente humana acaba se tornando incapaz de sustentar-se e termina fatalmente voltando-se contra o próprio hoem. O desejo de tornar real o mandamento de Jesus fez surgir na América Latina numerosas e variadas formas de vida comunitária, constituindo novas maneiras de ser Igreja. Entre elas, destacam-se as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), “um sinal de vitalidade da Igreja, instrumento de formação e de evangelização, ponto de partida válido para uma nova sociedade fundada na civilização do amor”27. “As CEBs são expressão do amor expressão do amor preferencial da Igreja pelo povo simples. Nelas se expressa, se valoriza e se purifica sua religiosidade, dando-selhe a possibilidade concreta de participação na tarefa eclesial e no compromisso de transformar o mundo” (P 643). Também os jovens são sensíveis a essa experiência eclesial do continente: “Queremos uma América Latina com uma Igreja família de Deus, comunidade de comunidades, participativa, gestadora de libertação a partir das Comunidades Eclesiais de Base”28 5.4. Uma Igreja pobre que opta pelos pobres Num continente empobrecido, a Igreja é chamada a descobrir, nos rostos sofridos dos pobres, o rosto do próprio Senhor (Mt 25,31-46): “Rostos desfigurados pela fome... rostos desiludidos pelos políticos... rostos humilhados por pertencer a uma cultura que não é respeitada, quando não desprezadas; rostos aterrorizados pela violência diária e indiscriminada; rostos angustiados dos menores abandonados... rostos sofridos das mulheres humilhadas e desprezadas; rostos cansados dos migrantes... rostos envelhecidos pelo trabalho dos que não têm o mínimo para sobreviver dignamente” (SD 178). Rosto de jovens “vítimas do empobrecimento e da marginalização social, do desemprego e do subemprego, de uma educação que não responde às exigências de suas vidas, do narcotráfico, da guerrilha, da prostituição, do alcoolismo, dos abusos sexuais...” (SD 112). A grande maioria dos homens e mulheres do continente mostra, hoje, esses rostos sofridos e fazem sentir seu clamor de justiça. A Igreja acredita em sua dignidade e no valor de sua contribuição para a transformação da história. Por isso, fiel ao seguimento de Jesus, faz uma opção preferencial pelos pobres como os primeiros destinatários da Boa Nova do Reino, chamados a ser evangelizadores e construtores de uma sociedade mais justa, fraterna e solidária. Essa opção exige que a Igreja se converta a um estilo de vida pobre como o de Jesus, dê seu testemunho pessoal e comunitário que torne crível sua mensagem, “viva a pobreza sem aliar-se com as estruturas de poder”29, solidarize-se com os pobres e com suas lutas por condições de vida mais justas e mais conformes à vontade do Criador e promova suas organizações de base para que possam ter voz e participação ativa na sociedade. 27
João Paulo II, encíclica Redemptoris missio, 51. I Congresso Latino-Americano de Jovens, “La nueva América Latina que queremos”,9. 29 I Congresso Latino-Americano de Jovens, “La nueva América Latina que queremos”,11 28
“O compromisso com os pobres e oprimidos tem ajudado a Igreja a descobrir o potencial evangelizador dos pobres, enquanto a interpelam, constantemente, chamando-a à conversão, e pelo muito que eles realizam em sua vida os valores evangélicos da solidariedade, serviço, simplicidade e disponibilidade para acolher o dom de Deus” (P 147). Os jovens latino-americanos, em sua grande maioria pobres, são convidados a fazer parte desse povo de Deus que se solidariza com ele e trabalha em prol de sua promoção, Na Igreja, eles encontrarão um lugar onde podem viver o desafio de dar aos outros de sua própria pobreza. 5.5. Uma Igreja profética e libertadora A crescente brecha entre ricos e pobres, a corrupção, o ódio, a violação dos direitos humanos, o desprezo pela vida, a violência institucionalizada, a incredulidade, o abuso de poder, o narcotráfico e outros males do continente latino-americano constituem “uma injustiça que brada aos céus (M 1,1), “um escândalo e uma contradição com o ser cristão” (P 28). Seguindo Jesus comprometido com seu povo e com o Evangelho de seu Pai, a Igreja ergue sua voz para denunciar com firmeza o pecado presente nas injustiças e desigualdades sociais, para anunciar a pessoa e a mensagem daquele que inaugurou na história o reino de justiça, de verdade, de amor e de paz e para proclamar, como novo caminho de santidade, o caminho dos santos da promoção da dignidade humana, da reconciliação, da fraternidade, da solidariedade e da esperança. Muitos leigos, religiosos, sacerdotes e bispos sacrificaram suas vidas por seguir Jesus, procurando tornar realmente verdadeiras o Reino a Deus e da Vida Nova que ele anunciou. Seus martírios são prova fidedigna da que o Evangelho penetra a vida dos homens e mulheres das comunidades, selando, com a dor da cruz e a esperança da ressurreição, a causa da construção do amor e Deus no amor aos irmãos. “Cristo nos libertou para que fôssemos realmente livres” (Gl 5,1). “O Evangelho é uma mensagem de liberdade e uma força de libertação”30. “A Igreja tem o dever de anunciar a libertação a milhões de seres humanos, de ajudá-la a nascer, de dar testemunho dela e de fazer com que seja plena. Nada disso é alheio à evangelização”31. “Uma meta da evangelização inculturada será sempre a salvação e a libertação integral de determinado povo ou grupo humano...” (SD 243). Sendo assim, é impossível separar a mensagem e a ação da Igreja do compromisso concreto com a libertação. A liberdade de toda opressão, injustiça e maldade é uma esperança sempre presente no mais profundo do coração humano. Os jovens são especialmente sensíveis à liberdade, buscam-na, lutam por ela e procuram vivê-la em plenitude. Consideram-na uma das experiências mais maravilhosas de suas vidas. A Igreja assegura-lhes que, nela, sempre haverá paixão pela liberdade e por tudo o que leva à libertação integral das pessoas e dos povos. 5.6. Uma Igreja solidária “As alegrias e as esperanças, as tristeza e as angústias dos homens de nosso tempo, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo”32. Ele “se compadeceu” das multidões que o seguiam (Mt 15,32), repartiu o pão multiplicado até que “todos comessem e se saciassem” (Mc 6,34-44), passou no meio de seu povo “fazendo o bem” (At 10,38). Na parábola do Bom Samaritano (Lc 10,25-37), ensinou a solidariedade que ele mesmo viveu encarnando-se, morrendo e ressuscitando, para assumir a realidade de todos os homens, libertá-los do pecado e transformá-los em homens novos. “A solidariedade humana não pode realizar-se verdadeiramente senão em Cristo, que dá a paz que o mundo não pode dar”(M 2,14). No seu caminhar junto com o povo latino-americano, a Igreja continua encontrando um grande número de homens, mulheres e jovens “caídos no caminho”. Para responder a essa realidade, surgem os seus serviços de promoção e solidariedade e uma pastoral comprometida e atenta às 30
Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, instrução Libertatis Conscientiae, 43. Paulo VI, exortação apostólica Evangelii nuntiandi, 30. 32 Vaticano II, constituição pastoral Gaudium et spes, 1. 31
situações de sofrimento, pobreza e opressão dos mais necessitados e marginalizados. Mostra-se, assim, sua convicção de que “a paz é fruto da justiça”33. Para tornar efetiva e verdadeira essa solidariedade, a Igreja precisa da generosidade, do vigor e da audácia dos jovens, cujo coração “está aberto à fraternidade, à amizade e à solidariedade”34. De sua criatividade e capacidade de compromisso surgirão novas possibilidades para realizar criativamente outras ações de promoção e de serviço na América Latina.
5.7. Uma Igreja evangelizadora “Evangelizar constitui a felicidade e a vocação própria da Igreja. É sua identidade mais profunda. Ela existe para evangelizar” 35. A Igreja nasce da missão de Jesus, que é o Evangelho mesmo de Deus (Mc 1,1; Lc 4,43). É enviada a evangelizar (Lc 4,43) e a anunciar “um reino, o Reino de Deus, tão importante que, em relação a ele, tudo se converte no a mais que é dado por acréscimo36. Por isso, “o anúncio da mensagem evangélica não constitui, para a Igreja, algo de ordem facultativa. É uma mensagem necessária, única, que de forma alguma pode ser substituída. Traz consigo uma sabedoria que não é deste mundo. Por si mesma é capaz de suscitar a fé. É a Verdade. Merece que o apóstolo lhe dedique todo o seu tempo, todas as suas energias e que, se necessário, lhe consagre sua própria vida”37. Todo chamado de Deus tem por objetivo arregimentar alguém para fazê-lo portador da Boa Nova de Salvação para os outros, para o povo e para a humanidade. A Boa Nova é comunicada através das próprias ações do mensageiro, transformado em testemunha pela Palavra e pela força de Deus. É comum também, pelas palavras que, em sua atualidade, revelam o sentido salvífico das ações. Essa comunicação da salvação de Deus, feita com palavras e gestos concretos, é a evangelização. “Para a Igreja, evangelizar significa levar a Boa nova a todos os ambientes da humanidade e, com sua influência, transformar a partir de dentro e renovar a própria humanidade. Não se trata somente de pregar o Evangelho em zonas geográficas cada vez mais vastas ou em regiões cada vez mais numerosas, mas de atingir e transformar, com a força do Evangelho, os critério de julgamento, os valores determinantes, os pontos de interesse, as linhas de pensamento, as fontes inspiradoras e os modelos de vida da humanidade que se acham em contraste com a Palavra de Deus e com o desígnio da salvação”38. 5.7.1 O processo evangelizador A evangelização apresenta Jesus como o Senhor que nos revela o Pai e no comunica seu Espírito. Segundo a Evangelii nuntiandi, é um processo dinâmico de elementos variados, complementares e mutuamente enriquecedores que chama à conversão e à vida nova em Cristo Jesus, levam à comunhão com o Pai que nos torna filhos e irmãos e promove a justiça, o perdão e a paz como frutos do Espírito. A Boa Nova é proclamada, em primeiro lugar, através do testemunho. Pelas suas ações, convicções e estilo de vida, a testemunha presentifica os valores do Evangelho: a capacidade de compreensão e de aceitação, a comunhão de vida com os outros, a solidariedade com tudo o que existe de nobre e bom no mundo, a propagação da fé e da esperança... Esse testemunho, para o qual são chamados todos os cristãos, é por si só uma proclamação silenciosa, mas também muito clara e eficaz da Boa Nova.
33
João Paulo II, encíclica Sollicitudo rei socialis, 39. João Paulo II, exortação apostólica Christifideles laici, 46. 35 Paulo VI, Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi, 14. 36 Idem, 8. 37 Idem, 5. 38 Idem, 18-19. 34
O testemunho suscita questionamentos e inquietações a respeito desse estilo de vida diferente, predispondo seu destinatário a receber um anúncio explícito do nome, da pessoa, da vida, das promessas e do Reino de Jesus de Nazaré, o Filho de Deus. Quando o anúncio é escutado, aceito e assimilado, faz surgir naquele que o recebe uma adesão de coração não só às verdades reveladas, mas também, fundamentalmente, ao programa de vida proposto, isto é, uma adesão ao Reino, à nova maneira de ser, pensar, viver e agir que o Evangelho inaugura. Essa adesão não pode ser abstrata nem desencarnada. Ela adquire visibilidade pela incorporação a uma comunidade de fiéis na qual se vive, e se compartilha a fé. Viver a fé é aprender a viver juntos, numa comunidade concreta e a celebrar a vida e os sacramentos como anúncios do mundo que já começou a se tornar realidade. O evangelizado sente a necessidade de evangelizar os outros. Essa é a prova da autenticidade da adesão a Jesus. É impensável que alguém que acolhe a Palavra e se comprometeu a trabalhar na construção do Reino não se converta por sua vez, em testemunha e anunciador daquilo que transformou sua vida39. 5.7.2 Uma evangelização inculturada no mundo juvenil Pela encarnação, Jesus Cristo se insere no coração da humanidade através de uma cultura concreta. Mostra, assim, que toda evangelização exige uma enculturação. “A enculturação do Evangelho é um processo que supõe o reconhecimento dos valores evangélicos que se mantêm mais ou menos puros na cultura atual e o reconhecimento de novos valores que coincidem com a mensagem de Cristo. Mediante a enculturação, busca-se fazer com que a sociedade descubra o caráter cristão desses valores, aprecie-os e os mantenha como tais. Procura-se, além disso, a incorporação dos valores evangélicos que estão ausentes da cultura ou porque se obscureceram ou porque vieram a desaparecer” (SD 230). O universo juvenil atual caracteriza-se, entre outras coisas, por um dinamismo cultural vertiginoso, em que existe uma grande pluralidade de culturas juvenis em permanente e rápido processo de mudança e evolução. A evangelização requer, portanto, um esforço especial de enculturação e uma atitude de constante abertura, renovação e atualização que responda a esta mutabilidade cultural. A adaptação às culturas dos jovens não é um falseamento do Evangelho, mas uma resposta à exigência de vivê-lo, pensá-lo e anunciá-lo de modo juvenil (SD 119), de maneira que possa fazer vida na realidade e na cultura dos jovens. Por isso, os jovens “devem tornar-se os primeiros e imediatos apóstolos dos jovens, realizando o apostolado no meio deles e através deles, levando em conta o ambiente social em que vivem”40. Evangelizar a partir da realidade dos jovens é “anunciar, nos compromissos assumidos e na vida cotidiana, que o Deus da vida ama os jovens e quer para eles um futuro diferente, sem frustração nem marginalizações, em que a vida plena seja fruto acessível para todos” (SD 118). 5.8. Uma Igreja que conta com os jovens O desejo da Igreja de ser “jovem com os jovens” foi se tornando real a partir do Concílio Vaticano II: “A Igreja olha-os com confiança e amor... Ela tem o que faz a força e o encanto da juventude: a faculdade de alegrar-se com o que começa, de dar-se em recompensa, de renovar-se e recomeçar para novas conquistas. Olhem-na e verão nela o rosto de Cristo, o herói verdadeiro, humilde e sábio, o profeta da verdade e do amor, o companheiro e amigo dos jovens”41. A Igreja latino-americana vê, na juventude um “sinal dela própria” e um “chamado a uma constante renovação e a um incessante rejuvenescimento” (M 5,12). Expressa seu desejo de “auscultar atentamente as atitudes dos jovens” e de aceita-los “com alegria em seu seio e em suas estruturas e promovê-los a uma ativa participação nas tarefas humanas e espirituais” (M 5,13). Tendo em conta seu “papel cada vez mais decisivo no processo de transformação do continente, 39
Paulo VI, exortação apostólica Evangelii nuntiandi 21-24. Vaticano II, decreto Apostolicam actuasitatem, 12. 41 Vaticano II, Mensagem aos jovens, 6. 40
bem como seu insubstituível lugar na missão profética da Igreja” (M 5,13), propôs-se desenvolver uma “autêntica pastoral de juventude que lhes permita a plena participação na comunidade eclesial, assumindo consciente e cristãmente seu compromisso temporal” (M5,14). Reconhecendo na juventude um “verdadeiro potencial para o presente e o futuro da evangelização”, a Igreja reafirmou esse compromisso fazendo “uma opção preferencial pelos jovens” (P 1186), reiterada posteriormente, em Santo Domingo, “não só afetiva mas efetivamente” (SD 114), e que se concretizou na opção por uma pastoral da juventude orgânica (SD 119). Não se trata de fazer uma opção estratégica por um grupo majoritário da população do continente, tendo em vista a importância que possa ter para o presente e o futuro da América Latina. A opção preferencial pelos jovens significa que Deus Pai pôs neles seu olhar e pede que sua Igreja também faça o mesmo. Significa reconhecer o amor de Deus pelos jovens e a confiança que deposita neles. Implica que toda a Igreja aceite dispensar sua atenção, sua preocupação e seu tempo aí onde Deus pôs sua vontade carinhosa. Isso só é possível se se acredita realmente que Deus Pai, antes de todos, quer cada um dos jovens na Igreja de seu Filho; se se está convencido de que, independentemente de suas virtudes e defeitos, o Pai decidiu oferecer-lhes a Igreja para que nela vivam plenamente e para que trabalhem em sua obra de evangelização. Por isso , a Igreja convida os jovens a “se sentir Igreja e experimentá-la como lugar de comunhão e participação” (P 1184). “Hoje se requer uma Igreja que saiba responder às expectativas dos jovens. Necessita-se de uma Igreja para os jovens, que saiba falar a seu coração, aquecê-lo, consolá-lo, entusiasmá-lo; uma Igreja que saiba acolher e fazer-se desejar por quem busca um ideal; uma Igreja que não tenha medo de pedir muito, depois de muito ter dado”42. “A Igreja tem tantas coisas a dizer aos jovens e os jovens têm tantas coisas a dizer à Igreja...”43. 5.9. Uma Igreja que chama os jovens à missão Pelo batismo, os jovens são chamados a trabalhar, com todas as suas forças, na missão salvífica da Igreja. Eles são considerados, hoje, de modo especial, “sujeitos ativos e protagonistas da evangelização”44. A “nova evangelização deve ser capaz de despertar um novo fervor missionário numa Igreja cada vez mais arraigada na força e no poder perene de Pentecostes” (SD 124). No chamado a ultrapassar as fronteiras de seus grupos, de suas comunidades, de suas paróquias ou dioceses, inclusive de seus países, a Igreja reconhece um sinal da confiança de Deus em sua capacidade de entrega e serviço ao Evangelho. A partir de suas pequenas experiências de missão, jovens vão descobrindo e testemunhando que “a fé se fortalece, dando-a!”45. A enorme quantidade de jovens que não conhecem Jesus, para os quais ainda não chegou, o anúncio libertador do Evangelho, é um desafio que exige um renovado entusiasmo e a busca de formas criativas para uma pastoral da juventude missionária que possibilite o anúncio do Evangelho às grandes massas jovens do continente. Os jovens são chamados também a abrir novos horizontes, a acolher o chamado da missão “ad gentes” e a partilhar, de sua pobreza, a experiência de Deus e a experiência da Igreja latinoamericana com outros povos e outras culturas. “Para a América Latina, providencialmente animada com um novo ardor evangélico, chegou a hora de levar sua fé aos povos que ainda não conhecem a Cristo” (SD 12): este será o maior sinal de sua vitalidade cristã e de seu agradecimento pelo dom recebido há mais de quinhentos anos. 6. OS JOVENS SÃO CHAMADOS A SER PROFETAS E TESTEMUNHAS DO REINO NA AMÉRICA LATINA Os jovens cristãos estão sendo chamados a ser profetas e testemunhas do Reino na América Latina, a ser protagonistas e construtores da nova civilização do amor.
42
João Paulo II, Mensagem à XXXII Jornada Mundial de Oração pelas Vocações, 7 de maio de 1995. João Paulo II, exortação apostólica Christifideles laici, 46. 44 Idem, 46. 45 João Paulo II, encíclica Redemptoris missio, 2. 43
É uma tarefa que não pode ser adiada para o próximo milênio, as uma urgente responsabilidade de hoje. Ele não podem permanecer calados e passivos enquanto o egoísmo humano, o aborto e os assassinatos, a injustiça social, o armamentismo suicida, a violência institucionaliza, a miséria e a pobreza de muitos, junto à riqueza e abundância de poucos, continuam sendo obstáculos à possibilidade de que o Reino se faça realidade na Terra. Atualizando o “levanta-te e anda” (Jo 5,8) do Evangelho a Igreja repete aos jovens de hoje: “Levanta-te e anda! Tenha fé na paz, tarefa árdua, tarefa de todos. Não caias na apatia diante do que parece impossível. Em ti se agitam as sementes da vida e do amanhã. O futuro da justiça e da paz passa por tuas mãos e surge do mais profundo de teu coração. Seja protagonista na construção de uma nova convivência, de uma sociedade mais justa, sã e fraterna”46. Como testemunhas, os jovens são chamados a viver sua fé em Deus e seu amor ao próximo no meio de seu povo, a refleti-los em seu protagonismo em face dos grandes desafio da realidade. Sensíveis ao que acontece ao seu redor, eles sabem discernir a opção do Senhor pela vida do povo. Sabem descobrir sua presença próxima e não deixam de dar graças e reconhecer, seu Nome a cada dia. Anunciam sua fé em Jesus e a apresentam aos outros para que “evangelizados, evangelizem e contribuam com uma resposta de amor a Jesus Cristo, à libertação integral do homem e da sociedade” (P 1166). Como profetas, os jovens são chamados a mobilizar-se em prol da causa de Jesus, sem temor às oposições nem aos conflitos. Carregam nos ombros a dor e o sofrimento alheio e fazem seu o grito dos pobres e oprimidos. Querem encontrar o “gesto e a palavra oportuna frente ao irmão só e abandonado” e mostrar-se “disponíveis a quem é explorado e oprimido”47. Lutadores incansáveis da justiça e da paz, não deixam para os outros o que eles mesmos podem fazer. Abrem caminhos de esperança e solidariedade para os que são mais desprezados. Não existe tarefa e vocação mais nobre do que ser testemunha e profeta do Reino de Jesus, isto é, continuar fazendo o que ele fez, continuar dizendo o que ele disse e continuar vivendo o estilo de vida que ele viveu. Muitos homens e mulheres já fizeram isso na América Latina e se tornaram exemplos de vida para os jovens. Das cinzas de um continente marcado pela pobreza, pela marginalização e pelo martírio, os jovens cristãos reavivam e fazem renascer, o fogo da esperança e da vida nova. “Jovens, com Cristo construamos uma nova América Latina”48. Jesus os acompanha como Mestre e Senhor. Derrama seu Espírito em seus corações e lhes dá força e poder para que possam impulsionar a humanidade a aproximar-se, sempre mais, da grande utopia do Reino de Deus. Da mesma forma que Deus animou Jeremias a cumpri sua missão profética: “Não digas sou um jovem! Eu ponho minhas palavras em tua boca e te encarrego dos povos e das nações!” (Jr 1,7-10). Anima, hoje, todos os seus seguidores: “Ânimo! Não tenha medo! Eu venci o mundo!” (Jo 16,33). “Eu estarei com vocês até o fim!” (Mt 28,20).
46
João Paulo II aos jovens chilenos, Santiago, 2 de abril de 1987. Oração eucarística V/b. 48 Lema do I Congresso Latino-Americano de Jovens 47
II
Cada dia se torna mais evidente no mundo atual o conflito entre os sinais de uma cultura de morte e os sinais que procuram tornar presente uma cultura da vida49. Em meio a essa situação, muitos jovens perderam ou têm dificuldades para encontrar o sentido pleno de sua existência e esperam ansiosamente uma “boa notícia” que lhes devolva a alegria de viver e lhes dê oportunidades de contribuir, com suas energias, a tornar real uma nova civilização. Segundo a intuição de Paulo VI50, os bispos latino-americanos, reunidos em Puebla, propuseram aos jovens da América Latina um projeto de vida que tem implicações nos planos pessoal, familiar, comunitário, social e eclesial: construir a civilização do amor (P1188). Já são muitos os jovens que, chamados por Deus Pai, presente em seu caminhar e em sua vida; acompanhados por Jesus Cristo, vivo e presente em sua história; animados pelo Espírito Santo, que se manifesta em suas vidas e os envia. Seguindo o exemplo de entrega, compromisso e coragem de Maria e integrados na Igreja, comunidade dos seguidores de projeto de Jesus, se converteram em testemunhas e profetas da civilização do amor no continente. Como o fez no processo da Pastoral da Juventude Orgânica, que vem se consolidando em diversos países e no continente nos últimos anos, a Pastoral da Juventude Latino-Americana apresenta mais uma vez a proposta da civilização do amor como resposta aos questionamentos existenciais dos jovens e como projeto pessoal e comunitário que dê sentido e plenitude às suas vidas (SD 112). Quer continuar sendo uma Pastoral da Juventude construtora da civilização do amor. 1. DESCRIÇÃO 1.1 Abordagem da proposta Pode-se entender a civilização como um conjunto de características e valores próprios de uma cultura e de um povo. Diante da “crise de civilização” do mundo atual, em que ao mesmo tempo ocorre a perda de valores e antivalores tradicionais e o surgimento de valores e antivalores novos, a civilização do amor se apresenta como uma proposta “fundada em valores universais de paz, solidariedade, justiça e liberdade, que encontram em Cristo sua plena realização”51. A civilização do amor é “aquele conjunto de condições morais, civis e econômicas que permite à vida humana uma condição melhor de existência, uma racionalidade plena e um feliz destino eterno”52: dignidade, libertação, pleno desenvolvimento de toda pessoa e da pessoa toda, nova cultura da vida e da solidariedade, verdade, justiça e liberdade plenificadas pelo amor. A civilização do amor é um chamado a reconhecer que o Reino de Deus cresce na América Latina entre os pobres e s que sofrem. Embora seja pequeno como o grão de mostarda, tornar-se-á uma árvore em cujos ramos os pássaros farão seus ninhos (Mt 13,31-32). 1.2 O amor a serviço da vida A civilização do amor é um serviço à vida e uma opção incondicional pelo amor. Parte da convicção de que a cultura da morte procede, em última instância, da falta de amor, e de que só o amor é capaz de gerar um nova cultura da vida. “Pede que amemos e respeitemos a vida de cada homem e de cada 49
João Paulo II, encíclica Evangelium vitae, 12. Paulo Vi, discurso de encerramento do Ano Santo, 25 de dezembro de 1975. 51 João Paulo II, carta apostólica Tertio millenio adveniente, 52. 52 Paulo VI, discurso de encerramento do Ano Santo, 25 de dezembro de 1975. 50
mulher e trabalhemos com constância e audácia para que finalmente se instaure em nosso tempo, marcado por tanto sinais de morte, uma nova cultura da vida, fruto da cultura da verdade e do amor”53. A civilização do amor supõe acreditar que o estilo de vida inaugurado por Jesus e proclamado nas Bem-Aventuranças é o mais humano e o mais atual. Supõe acreditar que viver o estilo de Jesus, com seus critérios e valores, originará mudança profundas na consciência coletiva dos povos da América Latina e fará surgir novas e mais justas estruturas sociais. É um esforço sério, de leigos e pastores, para viver o Evangelho não só no âmbito pessoal, mas também na realidade social, oferecendo uma alternativa de vida à cultura de morte que a sociedade proporciona, quase que sistematicamente aos jovens do continente. É um ideal cristão, fundado no mandamento novo de Jesus: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 15,12), que se oferece a todos os homens e mulheres de boa vontade. Os cristãos trazem uma contribuição específica na medida em que aderem e se comprometem a viver a espiritualidade do mandamento novo. É, ao mesmo tempo, um compromisso criador para sermos construtores ativos de novos modos de convivência e de relações humanas baseados no amor. “O ser humano não pode viver sem amor. Se o amor não lhe for revelado, se não se encontrar com o amor, se não o experimentar e se não o fizer próprio, surgirá diante de si mesmo como um ser incompreensível, e sua vida carecerá de sentido”54. 1.3 Uma visão do mundo a partir do Evangelho A civilização do amor é uma visão de mundo que surge do Evangelho, “se inspira na palavra, na vida e na entrega plena de Jesus”55. É chamada a dar resposta aos imperativos do momento presente e a transformar as convicções mais profundas, os ideias e os valores éticos que norteiam as relações humanas em todos os seus níveis. Não se trata de uma nova ideologia, nem de um sistema técnico e orgânico para o qual a Igreja pede adesão. A elaboração de modelos históricos, sociopolíticos e econômicos não é a missão própria da Igreja. É tarefa de toda a sociedade, na qual os cristãos trabalham com sentido pluralista, contribuindo com suas visões, propostas e valores sejam quais forem os sistemas e as estratégias vigentes. A civilização do amor é entrega e serviço. É critério inspirador e realização no tempo. É luta para que as normas do direito, as leis que estruturam a convivência, a ação política, as relações trabalhistas e sociais, os projetos de cada país, as culturas, os modos de ser, as novas sensibilidades... reflitam cada vez mais a escala de valores que ela propõe. 2. CARACTERÍSTICAS A reflexão e a experiência geradas pela Igreja e pela Pastoral da Juventude Latino-Americana durante os últimos anos permitem assinalar algumas das características próprias da civilização do amor que se quer construir. A civilização do amor é uma proposta total. Não está orientada apenas para a satisfação de vivências religiosas nem de esferas intimistas da vida juvenil. É um projeto de vida que traz consequências para todos os âmbitos da existência: família, relações pessoais, vivência de fé, comunidade eclesial, compromisso sociopolítico, trabalho, lazer, ciência arte, cultura... e dá um sentido novo e uma plenitude nova a quem dedica sua vida a torna-la real. A civilização do amor é um compromisso. Exige um esforço decidido e organizado. “O Reino dos Céus sofre violência e somente os que se esforçam chegam até ele” (Mt 11,12). Não é um ideal vago que serve de refúgio para esquecer as sangrentas injustiças que afetam o continente. Implica converter os sinais de morte em sinais de vida, a dispersão em unidade, a dureza e a violência em ternura e paz, a falta de ânimo e a resignação em esperança do triunfo final. Para impulsioná-la, o Espírito, abundantemente, derrama nos jovens audácia, dinamismo, espontaneidade, amizade, espírito de luta, solidariedade, alegria e criatividade... 53
João Paulo II, Encíclica Evangelium vitae, 27. João Paulo II, Encíclica Redemptor Hominis, 10. 55 Puebla, Mensagem aos povos da América Latina, 8. 54
A civilização do amor é, ao mesmo tempo, utopia e realidade. Por se tratar da transformação da sociedade por meio do amor, é um ideal atraente, grandioso e fascinante. Uma utopia pela qual vale a pena arriscar-se e entregar a vida. É um ideal, contudo, que vai se concretizando e se historicizando nos pequenos e grandes compromissos de cada dia que anunciam e fazem acreditar na possibilidade de sua plena realização. A civilização do amor é tarefa e esperança. Não se trata de um sonho adiável para o futuro, nem de um desafio que se pode realizar num só dia ou numa só geração. Não se trata, igualmente, de gestos heroicos, nem de ações isoladas ou voluntariosas. É tarefa diária. É paciente construção de dinamismos que motivam opções, compromissos e projetos que vão transformando, lenta mais radicalmente, a realidade. É tempo de semeadura e de esperança permanente, em que os passos dados e as conquistas alcançadas convidam a prosseguir. 3. UMA REAFIRMAÇÃO DE VALORES Em meio à crise de valores do mundo de hoje, a civilização do amor propõe reafirmar, com palavras e gestos, com pensamentos e sentimentos, com atitudes e compromissos, alguns valores que atualizam o projeto de Deus no continente. 3.1
Sim à vida “Viver é nascer, crescer, desenvolver-se; viver, contudo, é também entender amar e aprender a doar-se. Viver é contemplar e amar a natureza, entrar em comunhão profunda com todos os homens, caminhar juntos na esperança até os novos céus e a nova terra que Deus nos prometeu... Viver é ter a capacidade de ler e entender, de conhecer a verdade e de buscá-la, de preparar-se para um trabalho digno e para uma participação ativa na vida da comunidade... Viver é amar e dar-se. Viver é ser feliz e contagiar os outros com a alegria de haver descoberto a Vida, de haver encontrado Cristo... Viver é entrar em comunhão com os outros, romper nossa solidão, sair de nosso egoísmo...”56. No contexto da dramática luta entre a cultura da morte e a cultura da vida, é necessário amadurecer um forte senso crítico para discernir os verdadeiros valores e as autênticas exigências que permitam acolher, servir e defender a vida, principalmente a que se encontra em condições de maior debilidade. O próprio Jesus pediu que o amassem e o servissem nos irmãos sofredores: famintos, sedentos, forasteiros, despidos, enfermos, encarcerados... (Mt 25,35-36). Uma profusão de pequeno e desinteressados gestos em favor da vida constrói dia a dia, a civilização do amor. Embora ninguém os conheça e permaneçam escondidos para a grande maioria, Jesus assegura que o Pai, “que vê o secreto” (Mt 6,4), não só saberá recompensá-los, mas os fará fecundos, com frutos duradouros para todos57. “Nós, jovens, optamos pela vida, nós a amamos e a respeitamos em todas as suas manifestações: a cultura, a família, a possibilidade de uma moradia digna, o acesso à saúde e à educação, ao trabalho e ao salário justos, os direitos humanos e o cuidado da natureza. Porque cremos no Deus da Vida, queremos gritar um sim à vida, transformando todas as situações de morte e repudiando todas as formas de violência para construir uma grande pátria que respeite a dignidade da pessoa humana58. 3.2
Sim ao Amor como vocação humana O amor é a manifestação do próprio Deus. A vocação inata e fundamental de todo ser humano, a energia transformadora dos povos e das pessoas. Todos somos chamados à existência por amor e convidados a encontrar no amor o sentido mais pleno de nossas vidas (1 Jo 4,7-8). “O amor cristão supera as categorias de todos os regimes e sistemas porque traz consigo a força insuperável do Mistério Pascal, o valor do sofrimento da cruz e os sinais de vitória da ressurreição59. Diante da pergunta pelo sentido da vida e da existência humana, a civilização do amor é um convite a crer “no amor de Deus manifestado em Cristo Jesus” (Rm 8,39) e a construir um mundo de 56
Cardeal Eduardo Pirônio, discurso de Abertura do IV Forúm Internacional de Jovens, Denver, agosto de 1993. João Paulo II, encíclica Evangelium vitae, 27. 58 I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Carta aberta aos jovens da América Latina”, 19-20. 59 Puebla, Mensagem aos povos da América Latina, 8. 57
irmãos. “Crer no amor, de Deus não é tarefa fácil: requer doação pessoal, não tranquilizando egoisticamente a consciência ou deixando o coração indiferente, e sim fazendo-o mais generoso, mais fraterno, mais liberto de tantas escravidões que acabam deixando-o vazio e angustiado, impedindo o verdadeiro amor e a autêntica felicidade”60. 3.3
Sim à Solidariedade A vivência do amor como vocação humana leva pessoas, povos e nações a encontrar-se e relacionar-se como irmãos e a ajudar-se mutuamente como se a felicidade e as possibilidades de autorealização dependessem da felicidade e das possibilidades de realização do outro. A solidariedade não é um enternecimento superficial perante os problemas, as tristezas, injustiças e marginalizações dos seres humanos, e sim “a determinação firme e perseverante de empenhar-se pelo bem comum; isto é, pelo bem de todos e de cada um, para que todos nós sejamos verdadeiramente responsáveis por todos”61. “A solidariedade ajuda a ver o ´outro´ - pessoa, povo ou nação – não como instrumento qualquer, de que se explora a baixo preço, a capacidade de trabalho e a resistência física, para o abandonar quando já não serve; mas, sim, como um ´semelhante´ nosso, uma ´ajuda, que se há de tornar participante, como nós, no banquete da vida, para o qual todos os homens são igualmente convidados por Deus”62. A partir de suas experiências grupais, os jovens podem impulsionar o nascimento de uma sociedade nova fundada na partilha, na vida comunitária, na sensibilidade diante da dor e da desesperança dos mais necessitados, que supere isolamentos, egoísmos e indiferenças e torne visível o chamado de Deus a viver autenticamente como irmão e filhos de um mesmo Pai. “Somos jovens alegres e esperançosos, com valores de fraternidade e solidariedade... Descobrimos Jesus no rosto de nosso irmãos mais pobres; caminhamos juntos, buscamos transformar a história para construir o Reino de paz, justiça e liberdade”63. 3.4
Sim à Liberdade Os jovens sentem um profundo desejo de liberdade. Amam a liberdade. Querem ser livres. Sabem, contudo, que viver em liberdade não é um caminho fácil e que não se pode criar ilusões nem cair em otimismos enganosos. A ânsia de liberdade leva-os muitas vezes a afastar-se de tudo o que parece imposição ou escravidão, até que se descobrem prisioneiros de si mesmo ou de modismos e modelos impostos, sós, sem saber o que fazer com sua liberdade. Com a sensação de que, embora acreditou tê-la conseguido, ela não lhes dá resposta aos desejos mais íntimos de felicidade que pulsam em seu coração. Sentem-se vítimas dos mecanismos de morte de uma sociedade que apresenta como sinais de liberdade o que na realidade não passa de manipulações interesseiras. Quando se descobrem “chamados à liberdade” (Gl 5,13), feitos para a liberdade do Evangelho “os liberta” (Jo 8,32), sentem que só apartir da liberdade interior, plenamente vivida, respeitada e partilhada, podem ser portadores e mensageiros de liberdade e se esforçam por vive-la não como a possibilidade de “fazer qualquer coisa”, sem limites nem critérios, mas como uma entrega de si mesmo ao serviço de tudo o que faz mais humana a vida de que os rodeia64 e da construção de uma sociedade livre e verdadeira. A luta pela própria liberdade une-se, assim, à luta da criação que espera ser “libertada de toda escravidão para partilhar a liberdade dos filhos de Deus” (Rm 8,21), com a esperança de tornar real a liberdade de todos os homens e de todos os povos. 3.5
Sim à Verdade e ao Diálogo Jesus veio ao mundo para ser “testemunha da Verdade” (Jo 18,37). Ele é “o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14,6), a “luz verdadeira que ilumina todo homem” (Jo 1,9). 60
João Paulo II, discurso na II Jornada Mundial da Juventude, Buenos Aires, 11 de abril de 1987. João Paulo II, encíclica Sollicitudo rei socialis, 38. 62 João Paulo II, encíclica Sollicitudo rei socialis, 39. 63 I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Quiénes somos los jóvenes?”, 9. 64 Cf. João Paulo II, encíclica Veritatis splendor, 87. 61
Em todos os homens se manifesta, portanto, uma plena verdade de Jesus Cristo. Isso fundamenta e exige que se viva em atitude de diálogo. Dialogar é caminhar junto com os outros. É partilhar as percepções, os reflexos e os espaços de luz que Jesus Cristo já iluminou. É descobrir a Verdade plena agindo na história. É reconhecer, no mais profundo de cada pessoa, sua capacidade de abertura e de busca autêntica da verdade. É aceitar que ninguém é “dono da verdade”... “Não é de fora que salvamos o mundo; assim como o Verbo de Deus se fez homem, assim é necessário que nós nos identifiquemos, até certo ponto, com as formas de vida daqueles a quem desejar levar a mensagem de Cristo; e preciso tomarmos, sem distância de privilégios os ou divisões a linguagem incompreensível, os hábitos comuns, contando que estes sejam humanos e honestos, sobretudo os hábitos dos mais pequenos, se queremos ser ouvidos e compreendidos. É necessário ainda, antes de falar, auscultar a voz e mesmo o coração do homem, compreendê-lo e, na medida do possível, respeitá-lo. E, quando merece, devemos fazer-lhe a vontade. Temos de nos mostrar irmãos dos homens, se queremos ser pastores, pais e mestres. O clima do diálogo é a amizade; melhor, o serviço”65. Os jovens com sua atitude de abertura ao novo e ao diferente, com sua ânsia de busca e seu desejo de autenticidade, com sua capacidade de olhar as coisas sem preconceitos, são chamados a ser testemunhas da verdade e construtores do diálogo na sociedade. 3.6
Sim à Participação “Devemos fazer-nos todos plenamente conscientes de que estamos diante de um enorme e dramático choque entre o bem e o mal, entre a morte e a vida, entre a cultura da morte e a cultura da vida. Não estamos apenas “diante”, mas necessariamente “no meio” desse conflito. Estamos todos envolvidos e somos obrigados a participar, com a responsabilidade iniludível de optar, incondicionalmente pela vida”66. “Se o não-comprometimento é sempre inaceitável, hoje ele o é ainda menos. A ninguém é licito permanecer passivo”67. “A crescente necessidade de participação é um dos traços característicos da humanidade atual. Um autêntico `sinal dos tempos` que amadurece sobretudo no mundo juvenil... Ser protagonista é uma exigência universal.68” Sem a participação de todos, será impossível alcançar as mudanças que a Igreja e a sociedade reclamam. A Igreja, que estimulou os jovens a ser “fatores de mudança” (P 1187), convoca-os, “mais uma vez a ser força renovadora da Igreja e esperança do mundo” (SD 293). O chamado à participação e ao protagonismo nas associações culturais e desportivas, nos grupo ecológicos, nos partidos políticos, nas sociedades amigos de bairro, no sindicatos, nas organizações populares e rurais, nos grupos eclesiais, etc, é muito claro. Essa também é a vontade dos jovens. “Queremos participar com entusiasmo em nossa sociedade porque sofremos a injustiça... A vontade de nos apropriar-mos de nosso futuro nos impele a buscar e criar espaços reais de participação”69 3.7
Sim ao esforço permanente pela Paz “ A paz não é mera ausência de guerra, nem se reduz ao simples equilíbrio de forças entre os adversários, nem é resultado de uma hegemonia despótica”70. É, antes de tudo, uma “obra da justiça”, um “trabalho permanente”, um “fruto do amor” (Mt 2,14). “Supõe e exige a instauração de uma ordem justa na qual os homens possam realizar-se como homens, onde sua dignidade seja respeitada, suas legítimas aspirações satisfeitas, seu acesso à verdade reconhecido e sua liberdade garantida. Uma ordem na qual os homens não sejam objetos, mas agentes de sua própria história” (M 2,14). Jesus chamou de felizes “os que trabalham pela paz” (Mt 5,9). Trabalhar pela paz é, antes de tudo, viver um estilo de vida evangélico baseado no amor, que leve ao reconhecimento e ao respeito dos
65
Paulo VI, encíclica Ecclesiam suam, 49. João Paulo II, encíclica Evangelium vitae, 28. 67 João Paulo II, exortação apostólica Christifideles laici, 3. 68 João Paulo II, exortação apostólica Christifideles laice, 5. 69 I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Quienes somos los jóvenes?”, 7. 70 Vaticano II, constituição pastoral Gaudium et spes, 78. 66
direitos humanos, salvando da indiferença e da passividade e promovendo compromisso concretos com a justiça e a liberdade. Trabalhar pela paz exige um pedagogia que eduque a comunidade na solução não-violenta dos conflitos, que forme para o respeito, para a fraternidade e para a convivência num democracia participativa. Trabalhar pela paz significa assimilar valores como a justiça, a solidariedade, a verdade e o perdão e expulsar o rancor, a vingança, a violência e o medo. Significa recuperar o sentido da dignidade da pessoa, delinear estratégias para erradicar as situações geradoras de violência e assimilar comportamentos de uma cultura de paz, como a capacidade de negociação, o respeito ao legítimo pluralismo de opiniões e opções, a fé no diálogo como mecanismo para dirimir os conflitos... 3.8
Sim ao respeito pelas Culturas “O Reino que o Evangelho anuncia é vivido por homens profundamente vinculados a uma cultura. A construção do Reino não pode deixar de levar em conta os elementos da cultura e das culturas humanas”71. Só a partir do respeito às culturas será possível caminhar para uma humanidade nova e para um conhecimento cada dia mais profundo da verdade de Deus que se manifesta nelas. “Deus quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” (1 TM 2,4). Foi o que os jovens representantes da juventude latino-americana reconheceram no I Congresso Latino-Americano de Cochabamba: “Olhamo-nos nos olhos uns dos outros e verificamos com alegria a riqueza das culturas que representamos. Sentimo-nos orgulhosos de ser indígenas, negros, brancos, orientais conformando um continente culturalmente mestiço... A grande pátria latino-americana da qual somos parte precisa respeitar, recuperar e enriquecer-se com todas as culturas, porque nelas se manifesta, com plenitude, o ser humano criado por Deus”72. Sim ao respeito pela Natureza Impelidos mais pelo desejo de ter e desfrutar do que pelo de ser e crescer, muitos estão consumindo os recursos da Terra de maneira excessiva e desordenada, deteriorando a relação do homem com a natureza, pondo em risco sua conservação e ameaçando tornar-se as próprias vítimas dessa degradação. “O homem, chamado a cultivar e guardar o jardim do mundo, tem um responsabilidade específica pelo ambiente de vida, ou seja, pela criação que Deus pôs a serviço de sua dignidade pessoa e de sua vida, não apenas quanto ao presente, mas também com relação às gerações futuras”73. Os jovens, principais vítimas das agressões do mundo consumista, mas especialmente sensíveis à beleza e à harmonia da natureza, são chamados a promover e dinamizar a nova consciência ecológica que está surgindo na humanidade. São chamados a reafirmar e a viver o amor pela natureza, a descobrir a presença de Deus na criação e a acolhê-la com reverência e respeito, não como objeto de dominação mas como fator de sobrevivência para a humanidade, de hoje e de amanhã (SD 169-170). Não se trata de ser especialista em botânica, zoologia ou outras ciências da natureza. Trata-se de denunciar a exploração irracional dos recurso naturais e a poluição ambiental. De recriar a vida e valorizar e apoiar as iniciativas de sustentabilidade, sobrevivência física e cultural e de preservação do meio ambiente, que estão surgindo como fruto da nova sensibilidade ecológica do mundo de hoje. 3.9
3.10 Sim à integração latino-americana “A civilização do amor condena as divisões absolutas e as muralhas psicológicas que separam violentamente os homens, as instituições e as comunidades nacionais. Por isso, defende com ardor a tese da integração da América Latina. Na unidade e na diversidade há elementos de valor continental que merecem ser muito mais apreciados e aprofundados do que os interesses meramente nacionais”74.
71
Paulo VI, exortação apostólica Evangelii nuntiandi, 20. I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Carta aberta a los jóvenes de América Latina”, 4.18. 73 João Paulo II, encíclica Evangelium vitae, 42. 74 Puebla, Mensagem aos povos da América Latina, 8. 72
“Queremos uma América Latina que seja uma Pátria grande e sem fronteiras!75. O processo de integração latino-americana, que tem a seu favor fatores como os laços culturais, o passado histórico comum e a presença generalizada da fé católica, pode levar – se realizada a partir “de uma perspectiva de solidariedade” (SD 209) – os povos a viver um fraternidade mais autêntica, a expressar o sentido do povo único que Deus quer, a superar o isolamento, a favorecer a luta em comum pela dignidade e pelo bem-estar de todos e a deixar de lado as fronteiras que os separam e dividem. 4. REPÚDIO AOS ANTIVALORES Além de reafirmar os valores supracitados, comprometer-se com o projeto de construção da civilização do amor, implica o repúdio e a luta contra os antivalores, que são a expressão do pecado como força de ruptura pessoal, com os outros e com Deus. 4.1 Não ao individualismo A sociedade neoliberal reafirma de tal maneira a importância do indivíduo que deixa de lado a comunidade. Converte-o na medida de todas as coisas; faz com que se preocupe quase que exclusivamente com seus próprios interesses e entre em competição com os outros para ir mais longe e fica acima de todos. Essa postura leva ao isolamento, diminui o senso crítico e torna o indivíduo mais vulnerável aos mecanismos e às propostas do sistema. As experiências grupais e comunitárias que a Pastoral da Juventude propõe oferecem aos jovens a possibilidade de rejeitar o individualismo, desenvolver o senso crítico, abrir-se ao outro descobrindo e experimentando o valor do encontro interpessoal e comunitário. 4.2 Não ao consumismo A sociedade neoliberal cria a ilusão de que a felicidade se encontra na eficiência, na produção e no consumo. Tende a fazer crer que neles está o sentido da vida e a chave do sucesso, da realização, da valorização e da auto-estima do indivíduo. Parece que a pessoa só interessa na medida em que consome. Por tal razão, essa sociedade promove uma série de mecanismos desencadeadores de uma “carreira consumista” que desperdiça energias e esperanças, deixando, frequentemente, uma sensação de insatisfação, impotência e um vazio de sentido. É a experiência de muitos jovens, público-alvo da publicidade e da moda. São permanentemente incitados a consumir, criando-se para eles necessidade supérfluas e fictícias que provocam sua despersonalização, alienação e frustração, além de impedi-los de pensar e agir livremente76. “Não é mau o desejo de viver melhor. É equivocado, contudo, o estilo de vida que se presume como o melhor, quando orientado a ter e a não ser, a querer ter mais não para ser mais, mas para consumir a existência num gozo que se propõe como fim em si mesmo”77. 4.3 Não à absolutização do prazer Outra sedução importante da sociedade contemporânea é o prazer meramente material e superficial da vida, e em detrimento das dimensões pessoais mais profundas, relacionais, espirituais e religiosas da existência humana. Um estilo de vida como este leva a uma progressiva perda do sentido da transcendência, a uma relativização dos valores e dos princípios éticos e a uma distorção do sentido das relações interpessoais. É o império do sensível. A sexualidade se reduz a um contato meramente ocasional que não contempla a entrega profunda num relação conjugal estável. Os compromissos permanentes se diluem e perdem sentido. Proliferam a droga, o jogo o álcool, a pornografia, o erotismo e a sexualidade desenfreada...
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I Congresso Latino-Americano de Jovens, “La nueva América Latina que queremos”, 9. Idem, “Carta aberta a los jóvenes de América Latina”, 7. 77 João Paulo II, encíclica Centesimus annus, 36. 76
4.4 Não à intolerância A intolerância é a falta de disposição para admitir que os outros podem ter uma maneira de ser, pensar e agir diferente da nossa. Para o intolerante, a verdade é uma só: a sua. Ele acredita fazer um bem ao próximo impondo-a, até pela força, se necessário. O intolerante vê na diferença uma ameaça a seu modo de entender a vida; a seu ver, o encontro e o diálogo são impossíveis. Ele se torna incapaz de trabalhar em conjunto, radicaliza e corre o risco de isolar grupos e pessoas só pelo fato de pensarem diferente ou de terem opções pessoais, políticas, sociais ou religiosas divergentes. A intolerância gera os vanguardismos, os abusos e a absolutização do poder, bem como as repressões e os totalitarismos que ignoram os direitos humanos, suprimem com a liberdade de pessoas, grupos e nações e cerceiam a convivência democrática. 4.5 Não à injustiça “Um surdo clamor brota de milhões de homens, pedindo a seus pastores uma libertação que não lhes advém de parte nenhuma” (M 14,2). “Do coração dos vários países do continente está subindo aos céus um clamor cada vez mais tumultuoso e impressionante. É o grito de um povo que sofre e exige justiça, liberdade, respeito aos direitos fundamentais do homem e dos povos. O clamor pode ter parecido surdo naquela ocasião. Agora é claro, crescente, impetuoso e, em alguns casos, ameaçador” (P 87-89). “O crescente empobrecimento em que estão mergulhados milhões de irmãos nossos, que chega a intoleráveis extremos de miséria, é o mais devastador e humilhante flagelo que vive a América Latina e o Caribe. Assim o denunciamos tanto em Medellín como em Puebla, e hoje voltamos a fazê-lo com preocupação e angústia. As estatísticas mostram com eloquência que na última década as situações de pobreza cresceram tanto em números absolutos como relativos” (SD 179). “Vemos, à luz da fé, como um escândalo e uma contradição com o ser cristão, a crescente brecha entre os ricos e pobres. O luxo de uns poucos converte-se em insulto contra a miséria das grandes massas. Isto é contrário ao plano do Criador e à honra que lhe é devida. Nesta angústia e dor a Igreja discerne uma situação de pecado social tanto mais grave por ocorrer, em países que se dizem católicos e que têm a capacidade de mudar” (P 28). “A situação de injustiça que descrevemos nos leva a refletir sobre o grande desafio que nossa pastoral enfrenta para ajudar o homem a passar de situações menos humanas situações mais humanas. As profundas diferença sociais, a extrema pobreza e a violação dos direitos humanos que ocorrem em muitas regiões são desafios à evangelização. Nossa missão de levar Deus aos homens e os homens a Deus implica também construir, com eles, uma sociedade mais fraterna” (P90). 4.6 Não à discriminação e marginalização “Nem todos os homens se equiparam na capacidade física, que é variada, e nas forças intelectuais e morais, que são diversas. Contudo, qualquer forma de discriminação no direitos fundamentais da pessoa, seja social, seja cultural, por motivos de sexo, raça, cor, condição social, língua ou religião, deve ser superada e eliminada, porque contrária ao plano divino”78. A maioria dos desempregados, subempregados e marginalizados do continente são jovens. Muito deles, desalentados pelas dificuldades da vida e por um futuro incerto, consomem drogas ou álcool. Nem sempre se valoriza a dignidade da mulher. Em muitos casos, os indígenas são marginalizados e até exterminados; as culturas autóctones discriminadas. Favorece-se a imposição de culturas estrangeiras. Em face dessa realidade de discriminação e marginalização, os jovens cristãos proclamaram: “Cremos em Jesus vivo e presente no pobre que sofre, no presidiário triste, no doente solitário, nas crianças marginalizadas, nos jovens desorientados, no operário explorado, no mineiro e no camponês que sofrem situações de opressão e clamam por justiça”79.
78 79
Vaticano II, constituição pastoral Gaudium et spes, 29. I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Jesus Cristo Vivo e Presente...”, 8.
4.7 Não à corrupção “A corrupção de generaliza. Há um mau uso dos recursos econômicos públicos; aumentam a demagogia, o populismo, a mentira política nas promessas eleitorais; burla-se a justiça, generaliza-se a impunidade, e a comunidade se sente impotente e indefesa diante do delito. Com tudo isso, fomenta-se a insensibilidade social e o ceticismo ante a falta de aplicação da justiça, promulgam-se leis contrárias aos valores humanos e cristãos fundamentais. Não há uma equitativa distribuição dos bens da terra, abusa-se da natureza e agride-se o ecossistema” (SD 233). Para a sociedade neoliberal, tudo tem um preço. Tudo pode ser comprado, inclusive as pessoas, as convicções, os princípios... Ela traz em seu bojo, portanto, a semente da corrupção e a faz crescer, abundantemente, tanto na esfera pública como na esfera privada da vida social. É perigoso pensar que a corrupção é um fenômeno que viceja somente nos escalões de influência e poder. Ela se faz presente também em atitudes cotidianas com o não cumprimento do horário de trabalho, a “cola” mas provas, a prescindência de princípios e crenças quando “não convém”, a condescendência criminosa para com as práticas de corrupção, o tráfico de influências... 4.8 Não à violência “Somos um continente com grandes riquezas humanas e materiais, mas empobrecido e manipulado, porque vítimas de um processo histórico que violentou nossas culturas, nosso direitos e nossa dignidade”80. A proliferação indiscriminada de todas as formas de violência física e psicológica, visível e encoberta, seletiva ou indiscriminada, ocasional ou sistemática, promovida por indivíduos ou por organizações, baseada em motivos políticos, econômicos, culturais, raciais ou religiosos, dirigida contra homens e mulheres, crianças e jovens, adultos e velhos, revela um claro desprezo pela vida humana e é um dos mais desafiadores sinais da presença da cultura da morte. A civilização do amor diz não às divisões absolutas e às muralhas psicológicas que separam violentamente pessoas, instituições e comunidades nacionais. Diz não a toda ideologia baseada na desconfiança, no ódio social ou de classe, nas tentativas de dominação nacional, religiosa ou cultural. Diz não à carreira armamentista e aos gastos com “defesa”, que reduzem os investimentos em educação, saúde e promoção de pessoas e comunidades que pretendem defender. Diz não à violência institucionalizada, estrutural ou revolucionária, subversiva ou repressiva (P 531-534). Diz não ao descaso para com a vida humana e ao fundamentalismo religioso... Aceitar a violência é desconfiar definitivamente da força transformadora do amor. 5. PRIMADOS DA CIVILIZAÇÃO DO AMOR Contra a generalizada mentalidade do “vale tudo” que se alastra hoje pelo mundo, a civilização do amor afirma a existência de uma escala de valores que sempre conclama a escolher o que a humaniza e plenifica a pessoa. Além da reafirmação de valores e do repúdio aos antivalores, o compromisso com a construção da civilização do amor supõe uma série de primados a serem considerados não somente na elaboração dos projetos históricos de sociedade e dos modelos de desenvolvimento, mas também no delineamento dos projetos pessoais de vida. 5.1 Primado da vida humana sobre qualquer outro valor ou interesse O Deus da Vida encarnou-se em Jesus para que todos os homens “tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10). Esse evento salvífico revela não somente o amor infinito de Deus, “que tanto amou o mundo que lhe enviou seu Filho único” (Jo 3,16) mas, sobretudo, o incomparável valor de cada pessoa humana. Considerações éticas, projetos econômicos, modelos de desenvolvimento, políticas sociais, descobertas científicas ou técnicas, formas de governo, leis humanas, programas demográficos ou
80
Idem, “Quiénes somos los jóvenes?”, 1.
motivações religiosas – nada nem ninguém, por nenhum motivo, poderá antepor qualquer outro valor ou interesse ao supremo valor da vida. Uma vida digna e “em abundância” é o primeiro e fundamental direito de toda pessoa humana. O aborto, a violência, a repressão, o terrorismo, as guerras, a poluição são certamente atentados contra a vida humana. São-no, também, as condições extremas de pobreza, as estruturas econômicas injustas, as desigualdades, a falta de possibilidades, a marginalidade, o analfabetismo... (SD 167). “Queremos uma América Latina que opte pela vida, que respeite e promova os direitos humanos”81, que promova a vida, que a entregue com generosidade, que a projeta, que a defenda, que a melhore e que a faça cada dia mais digna e mais humana. 5.2 Primado da pessoa sobre as coisas A pessoa humana “vale mais pelo que é do que pelo que tem”82. Em que pesa isso, uma cultura do consumismo e o enorme desenvolvimento da produção de bens e serviços estão promovendo, uma tendência cada vez mais generalizada a valorizar as pessoas mais pelo que elas têm do que pelo que são. Essa inversão na escala de valores compromete o crescimento pessoal e comunitário, frustra quem não consegue satisfazer a ânsia de “ter” e engendra novas formas de injustiça e de opressão. Os bens materiais são necessários. A carência dos bens indispensáveis impede a realização da pessoa humana, não lhe permite uma existência digna e nega-lhe a possibilidade de passar de “situações de vida menos humanas a situações de vida mais humanas”83. Ao mesmo tempo, a busca exclusiva do ter fecha os espíritos, endurece o coração, materializa a existência, obstaculiza o crescimento, faz predominar o interesse sobre a amizade, gera a competição, invejas e desuniões. O “ter” e o “ser” não se excluem sempre que o “ter” se situe no horizonte do “ser”, e o “ser” tenha o sustento indispensável do “ter”. O “ter” de alguns não pode redundar em detrimento do “ser” de tantos outros84. 5.3 Primado da ética sobre a técnica Os jovens de hoje vivem um tempo marcado por enormes avanços científicos e tecnológicos. As novas descobertas favorecem-lhes o seu crescimento, ajuda-nos a delinear melhor os problemas e a ser mais eficazes; criam neles uma nova sensibilidade e uma nova maneira de ver, entender e posicionar-se diante da realidade. Contudo, o mito do desenvolvimento tecnológico já demonstrou ser incapaz de solucionar, por si só, todos os problemas da humanidade. Muitas vezes, aliás, a própria técnica foi usada contra o homem, para sua destruição física e moral. A civilização do amor quer dar prioridade à ética do Evangelho e pôr a técnica a serviço da vida, da liberdade e da paz. Os técnicos trazem seus conhecimentos, o valor de seus estudos e pesquisas e suas propostas para “melhorar” as condições de vida do povo. A responsabilidade ética de tomar decisões que afetam a realidade e a vida das pessoas, no entanto, não pode depender unicamente das exigências das soluções técnicas, dos cálculos frios e dos resultados estatísticos. Para promover a pessoa, para fazer um mundo mais humano, para viver o amor e suas exigências de justiça e solidariedade, é necessário discernir ativamente a vontade e o querer do Deus da Vida na concretude de cada situação histórica. 5.4 Primado do testemunho e da experiência sobre as palavras e as doutrinas “Nem todos os que dizem: ‘Senhor, Senhor’, entrarão no Reino do Céus; mas sim os que fazem a vontade de meu Pai” (Mt 7,21). “De que serve alguém dizer: ‘Tenho fé’, se não tiver as obras? Será que essa fé o salvará? Se um irmão ou uma irmã estiverem nus e desprovidos do pão de cada dia, e alguém de vós lhes disser: ‘Ide em paz, aquecei-vos e fartai-vos’, sem lhes dar o necessário para a vida corporal, o que adiantaria? Assim também se passa com a fé: se não for acompanhada pelas obras, por si mesma está morta” (Tg 2,14-17). 81
Idem, “La nueva América Latina que queremos”, 6. Vaticano II, constituição pastoral Gaudium et spes, 35. 83 Paulo VI, encíclica Populorum progessio, 21. 84 João Paulo II, encíclica Sollicitudo rei socialis, 31. 82
O divórcio entre a fé e a vida, entre o que se professa e o que se vive, e a incoerência entre o que diz e que se faz são reconhecidos, quase que unanimemente, como alguns dos grandes males do momento atual. Do ponto de vista da fé, essa atitude desacredita a anúncio do Evangelho. Na vida social, deslegitima os sistemas políticos, as formas de convivência e os modos de agir baseados, principalmente em declarações e promessas que não são cumpridas e frustram as expectativas dos povos. Não se trata de negar a importância da palavra e da doutrina. A palavra explica o testemunho; a doutrina sistematiza, questiona e reorienta a experiência. O mundo de hoje, no entanto, e particularmente os jovens, “que sofrem horrores ante o fictício, ante a falsidade, e que, além disso, são decididamente partidários da verdade e da transparência”85, “dão mais atenção aos que testemunham do que aos que ensinam. Se ouvem os que ensinam, é porque dão testemunho”86. “Crêem mais na experiência do que na doutrina, mais na vida e nos fatos do que nas teorias”87. 5.5 Primado do serviço sobre o poder “Como vocês sabem, os que se consideram chefes das nações as governam como se fossem seus donos, e os que tem algum posto fazem sentir seu poder. Não será assim entre vocês. Ao contrário, quem quiser ser mais importante, que se faça o servidor de todos: e quem quiser ser o primeiro, que se faça o servo de todos. Assim como o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida como resgate por muito” (Mc 10,42-45). “ O homem é necessariamente fundamento, causa e fim de todas as instituições sociais”88. Não há poder ou autoridade, sistema econômico ou ideologia que possa constituir-se à margem, por cima ou contra as pessoas. A missão da autoridade é “dirigir as energias de todos os cidadãos para o bem comum, não de forma mecânica ou despótica, mas antes de tudo como autoridade moral que se apóia na liberdade e na consciência do cargo e da responsabilidade assumida”89. Contra todos os autoritarismo e privilégios, a civilização do amor reconhece o sentido e o valor da autoridade (P 499) como um serviço generoso e desinteressado à promoção de pessoas, povos e comunidades; como um esforço para conseguir adesões, construir consensos e comprometer a participação na tarefa comum; como uma responsabilidade de liderança que não se considera dada em proveito próprio, mas confiada pelo outros, para o bem de todos. 5.6 Primado de uma economia solidária sobre a produção de riqueza Os ensinamentos do Santo Padre apontam para a necessidade de ações concretas dos poderes públicos para que a economia de mercado não se converta em algo absoluto ao qual tudo se sacrifica, acentuando a desigualdade e a marginalização dos grandes maiorias. Não pode haver uma economia de mercado criativa e, ao mesmo tempo, socialmente justa, sem um sólido compromisso de toda a sociedade e de seus atores com a solidariedade, através de um marco jurídico que assegure o valor da pessoa, a honra, o respeito à vida e a justiça distributiva e a preocupação efetiva com os mais pobres” (SD 195). Portanto, deve-se “lançar os fundamentos de uma economia solidária, real e eficiente...Fomentar a busca e a implementação de modelos socioeconômicos que conjuguem a livre iniciativa, a criatividade de pessoas e grupos e a função moderadora do Estado, sem deixar de dar atenção especial aos setores mais necessitados. Tudo isso orientado para a realização de uma economia da solidariedade e da participação” (SD 201). Sob o nome de “economia solidária” englobam-se diferentes experiências econômicas que têm em comum elementos como a organização, a cooperação, a ação comunitária, a autogestão, etc. que lhe dão uma racionalidade diferente da de outros sistemas econômicos. Essas diferentes expressões compreendem formas que vão de micro e pequenas empresas, oficinas familiares, organizações 85
Paulo Vi, exortação apostólica Evangelii nuntiandi, 76. Idem, 42. 87 João Paulo II, encíclica Redemptores missio, 42. 88 João XXIII, encíclica Mater et magistra, 19. 89 Vaticano II, constituição pastoral Gandium et spes 74. 86
econômicas populares e cooperativas até propostas de caráter assistencial e estratégias de sobrevivência e subsistência. “Queremos uma América Latina com uma economia baseada na solidariedade, em que se pratique uma distribuição justa da riqueza, da terra e do trabalho., que promova os mais fracos e esteja a serviço do povo latino-americano, e não de países poderosos”90. 5.7 Primado do trabalho sobre o capital O trabalho humano possui uma “significação humanizadora e salvífica, que tem sua origem na vocação co-criadora do homem como ‘imagem de Deus’ e que foi resgatado e elevado por Jesus, trabalhador e ‘filho de carpinteiro’ (SD 182). Seu valor ético vincula-se diretamente ao fato de que quem o realiza é uma pessoa. Por isso há um primado do trabalho e do trabalhador sobre o capital e a empresa, de maneira que o ser humano possa ser tratado como verdadeiro sujeito e não como simples meio de todo o processo produtivo91. Quando os benefícios da empresa se antepõem, como ocorre tantas vezes, aos direitos de trabalhador a jornada de trabalho humano, a um salário justo, à seguridade social... não se está respeitando esse primado. Sob o pretexto de que ainda não têm responsabilidades familiares, ou aproveitando-se da saturação do mercado de trabalho, muitos empregadores exploram os jovens com salários baixos, longas jornadas, condições injustas, etc. As necessidades próprias de sua situação de pobreza e as dificuldades para conseguir outro trabalho digno e produtivo obrigam-nos muitas vezes a aceitar essas condições. Esse pecado social projetou-se nas relações injustas entre os que são chamados a viver uma vocação de irmãos. É o principal obstáculo à realização do projeto da civilização do amor, na qual todos são chamados a participar com igualdade de dons, destinados por Deus para o benefício de todos. 5.8 Primado da identidade cultural latino-americana sobre outras influências culturais hegemônicas Deus e seu amor libertador encarnou-se no mundo. Desde então, fez história de salvação com todos os homens, ensinando que o ponto de partida para anunciar e construir a civilização do amor não pode ser outro senão a própria realidade e a própria cultura. A diversidade de culturas é um sinal da presença do Espírito e um chamado a crescer através do intercâmbio, da complementação e do enriquecimento mútuo. A América Latina é um continente dotado de ricas e variadas tradições culturais construídas durante séculos e que, em muitos casos, sobrevivem até hoje; elas têm modos próprios de entender a Deus, a vida, o homem, a Terra e a história. Como toda realidade humana, comportam luzes e sombras. Nos últimos anos, vem se renovando o interesse por conhece-las e revalorizá-las. Ao mesmo tempo, a América Latina está sofrendo uma agressão cultural pela imposição homogeneizante de modelos políticos, sociais, econômicos, ideológicos e até eclesias, que tende a suprimir formas culturais próprias a fim de obter uma uniformidade que torne os povos mais facilmente manipuláveis. Isso não traz riquezas novas às culturas latino-americanas. Pelo contrário, ameaça-as em sua identidade e atenta contra o direito dos homens e das mulheres desta terra de se sentirem e de serem latino-americanos. “Comprometemo-nos a conhecer e a amar nossas culturas, a lutar pelo direito de sermos latinoamericanos... e a promover a dignidade de todos os homens e mulheres do continente”92. 5.9 Primado da fé e da transcendência sobre toda tentativa de absolutizar o ser humano O homem, feito à imagem e semelhança de Deus, é chamado ao absoluto, ao qual deve chegar com seus compromissos concretos e históricos, vividos e animados pelo amor. Quando se perde o sentido de Deus, também o sentido do homem fica ameaçado. A maior consciência da humanidade sobre o valor e a dignidade da pessoa humana, o respeito a seus direitos fundamentais, a autonomia das realidades temporais, a valorização dos avanços técnicos e 90
I Congresso Latino-Americano de Jovens, “La nueva América Latina que queremos”,3. Cf. João Paulo II, encíclica Laborem exercens, 6. 92 I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Carta aberta a los jóvenes de América Latina”, 24. 91
científicos levam a situar a pessoa cada vez mais no lugar de senhor da criação (Gn 2,19-20). Com todos esses valores, no entanto, deve estar cada vez mais claro que todas as realidades humanas adquirem sua real plenitude quando abertas e tendentes ao encontro com a transcendência. “Na realidade, o mistério do homem só se torna verdadeiramente claro no mistério do Verbo encarnado”93. “Somos jovens latino-americanos que descobriram a Cristo... Continuamos crendo num Deus que nos faz transmitir a vida a partir de nossa pobreza...”94 “Queremos uma América Latina... que tenha Deus presente em todas as suas estruturas”95.
93
Vaticano II, constituição pastoral Gaudium et spes, 22. I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Quiénes somos los jóvenes?”, 8. 95 Idem, “La nueva América Latina que queremos”, 9. 94
III
1. A PASTORAL NA IGREJA Jesus, enviado do Pai, veio salvar o que estava perdido e reunir o que estava disperso (Mt 18,11). Passou fazendo o bem a todos e a cada um dos que encontrava em seu caminho. Viveu a situação de seu tempo e identificou-se com a dor de todos para fazê-los participantes da vida divina e integrá-los em seu Reino. Pastor por excelência, olhou o povo, compadeceu-se dele e ensinou os discípulos a fazer o mesmo. Associou-os a sua tarefa de pastor, formando-os para guiar e acompanhar o processo de nascimento, crescimento e expansão de sua Igreja (Mt 28,17-20) e o cuidado de todos os homens e de todos os povos. Preocupou-se com seus apóstolos e discípulos, particularmente e como grupo. Atendeu às suas necessidades concretas e os ensinou com sua prática como deviam viver o serviço aos outros. Ele próprio curou os enfermos, libertou muitos da ignorância, exigiu de outros que dessem mais de si, conscientizou os que lhe abriram o coração, perdoou, chamou à conversão e guiou todos para o Pai. Essa mesma tarefa e missão, a Igreja retorna hoje para ser mensageira e realizadora da aliança de Deus com os homens. Procura ir ao seu encontro em todas as suas necessidades e sua vocação a serviço da comunidade humana. Com esta ação pastoral, a Igreja prolonga o cuidado que Jesus teve com o povo de seu tempo, atualiza hoje sua ação e colabora em sua missão de construir o Reino. Para atender diferentes pessoas e grupos, com suas situações, realidades e necessidades particulares, a Igreja realiza ações pastorais diferenciadas que se integram e fazem parte de sua pastoral de conjunto. Assim, existe a pastoral familiar, a pastoral social, a pastoral catequética... Uma delas é a pastoral da juventude. 2. A PASTORAL DA JUVENTUDE 2.1. Descrição A expressão pastoral da juventude é comumente utilizada para aludir a diferentes conteúdos e realidades. Às vezes, designa o processo mesmo de educação na fé que a Igreja realiza para a evangelização dos jovens (P 1193); outras vezes, aplica-se ao conjunto de jovens integrados nesses processos e, outras vezes ainda assinala o conjunto de estruturas e organismos que, nos diferentes níveis, possibilitam este processo pastoral. Tal diversidade mostra as variadas perspectivas a partir dos quais se pode abordar o esforço evangelizador que a Igreja realiza no mundo juvenil. Embora complementares, são, contudo, necessariamente incompletas. A Pastoral da Juventude é a ação organizada da Igreja para acompanhar os jovens a descobrir, seguir, e comprometer-se com Jesus Cristo e sua mensagem, a fim de que, transformados em homens novos, e integrando sua fé e sua vida, se convertam em protagonistas da civilização do amor. Essa ação evangelizadora da Igreja com os jovens teve diversas concretizações históricas. As experiências realizadas no continente nos últimos anos configurara um modelo de Pastoral da Juventude latino-americana, aqui sucintamente descrito, cujas características peculiares serão abordadas depois, quando foram analisadas mais detidamente as opções pedagógicas e metodológicas.
“Evangelizar não é um ato individual e isolado, mas um ato profundamente eclesial”96. A evangelização dos jovens é, pois, um desafio para toda a Igreja. Não pode ser considerada apenas como uma “coisa de jovens”. Toda ela se compromete para que, com seu apoio e orientação, os jovens possam crescer e desenvolver-se como pessoas; conhecer Jesus, aceitá-lo, segui-lo e integrar-se na comunidade eclesial sendo promotores e artífices da mudança na América Latina. É uma aposta para que, a partir deles e com eles, possa se construir a civilização do amor. A Pastoral da Juventude é, assim, a expressão concreta da missão pastoral da comunidade eclesial no que tange à evangelização dos jovens. É, também, uma boa nova para a Igreja e uma proposta de transformação para as pessoas e a sociedade. 2.2. Características Como proposta e convite, a evangelização não pode estar à margem do momento histórico e da situação real em que vivem seus destinatários. O ponto de partida da Pastoral da Juventude é o próprio jovem, assumido em sua realidade pessoal, cultural e social. A Pastoral da Juventude não inventa jovens: encontra-os como são e onde estão... A ação evangelizadora não se realiza através de ações isoladas, mas através de um processo – um conjunto de dinamismos que levam o jovem a abrir-se, a buscar resposta às suas inquietudes, a valorizar o que constrói sua pessoa, a amadurecer motivações pessoais profundas e a concretizar seu projeto de vida e sua opção vocacional. Esse processo evangelizador é vivido de forma participativa em pequenos grupos ou comunidades nos quais os jovens partilham a fé e a vida, alegrias e tristezas, reflexão e ação, ilusões e preocupações, a oração, a festa, as inquietudes, tudo o que são e querem ser, o que vivem, o que crêem, o que sentem, o que esperam. Nesse processo, tem um lugar privilegiado a apresentação atraente e motivadora de Jesus Cristo “caminho, verdade e vida” (Jo 14,6) como resposta a suas ânsias de realização pessoal e a suas buscas de sentido da vida. No encontro com Jesus vivo, os jovens se evangelizam, isto é descobrem, vivem, testemunham e anunciam seu estilo de vida e aprendem a ver a realidade e os fartos de todos os dias como sinais de uma história de amor que relaciona Deus com os homens como seus filhos, e os homens entre si como irmãos. Nessa experiência, eles encontram o chamado a uma nova maneira de ser, pensar, agir, viver e amar; o chamado a uma nova ordem e a uma renovada compreensão do homem, do mundo e da história. O estilo de vida de Jesus se faz estilo de vida dos jovens. Seu seguimento converte-se num discipulado e numa missão de entrega e serviço para tornar realidade a civilização do amor. É o chamado de alguns jovens a outros jovens, através do anúncio e do testemunho, para servir à vida, alentá-la, zelar por ela e respeitá-la; defendê-la e organizá-la em formas de convivências que sejam práxis de verdade, justiça e amor que tornem presente a Deus como “pai de todos”. É viver em comunhão e participação; é realizar a libertação integral do homem e da sociedade; é viver o trabalho, o estudo, a profissão, a vida inteira, com vocação de serviço comunitário e solidário. O processo se realiza a partir dos jovens e com os jovens. Eles são o ponto de partida e sujeitos ativos de seus próprios processos, e são chamados a ser os primeiros e imediatos evangelizadores dos outros jovens. Esse protagonismos é elemento fundamental da pedagogia, da metodologia e da organização da Pastoral da Juventude. Dada a pluralidade de realidades juvenis, é necessário construir uma pastoral diferenciada que leve em conta e responda às diversas situações e atitudes dos jovens diante da fé e da vida. Apesar da diversidade de ações, haverá sempre um mesmo ponto de partida – a situação do jovem – e um mesmo ponto de chegada – seu amadurecimento pessoal, adesão a Jesus Cristo, sua participação na Igreja e seu compromisso com a civilização do amor. A preocupação evangelizadora não visa apenas aos jovens que se integram aos grupos ou que participam regularmente das comunidades ou outras organizações eclesiais. Com sentido missionário,
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Paulo VI, exortação apostólica Evangelii nuntiandi, 60.
chega também aos que participam ocasional e esporadicamente e, sobretudo, à grande massa juvenil afastada dos ambientes eclesiais e que ainda não recebeu, o anúncio libertador de Jesus Cristo. A comunidade eclesial acompanha os jovens especialmente através de assessores adequadamente formados, que os estimem de verdade, em atitude de escuta, compreensão e proximidade, e que conheçam suficientemente as características pedagógicas e metodológicas do processo de Pastoral da Juventude. Essa atitude pastoral libertadora personaliza os jovens, tornando-os responsáveis por seu processo e por sua própria existência. Para cumprir sua missão, a Pastoral da Juventude organiza-se de maneira participativa por intermédio de coordenações nos diferentes níveis. Através delas, os jovens se educam na comunhão e na participação, crescem como pessoas, vão se integrando ativamente na vida da Igreja, formulam propostas novas para a sociedade e se sentem realmente protagonistas. Essas instâncias só podem ser entendidas e vividas com base numa atitude de co-responsabilidade e serviço aos demais jovens e grupos. Mantendo a memória histórica, resgatando suas conquistas e corrigindo seus erros, a Pastoral da Juventude continua aprofundando seu próprio processo e sistematizando-o para oferecê-lo como serviço aos que se integram em sua caminhada.
Parte 3
I
1. PEDAGOGIA E PEDAGOGIA DE DEUS A Pastoral da Juventude é uma proposta educativa e evangelizadora que surge como resposta da Igreja à situação da juventude na América Latina. Como tal, fundamenta-se numa pedagogia pastoral, tem uma proposta de processos integrais de formação e uma metodologia para realizá-los, supõe um determinada forma de organização para torná-los possíveis e exige agentes de pastorais especialmente preparados para acompanhá-los. A pedagogia é a relação que se estabelece entre educador e educando e que se expressa numa forma de comunicação, de comportamento e atitudes que se dão no contexto de um espaço e de um tempo determinados. Toda pedagogia se materializa numa prática pedagógica e, mais concretamente, num momento desta prática: o encontro educativo. Essa visão coloca em primeiro plano o tipo de relação que deve se estabelecer numa pedagogia pastoral cuja finalidade é a evangelização. Para além dos conteúdos, o que se ensina e o que se aprende na relação pedagógica é uma forma de ser, de viver, de manifestar-se e de comunicar-se. A proposta evangelizadora e formadora não pode descuidar a reflexão rigorosa a respeito do modo mais adequado de anunciar e transmitir o Evangelho. Uma pedagogia que pretenda acompanhar um processo de educação na fé deverá inspirar-se necessariamente na pedagogia do próprio Deus, isto é, relação de amor e de encontro que o Pai quis estabelecer com os homens. Deus ama primeiro. Toma a iniciativa e sai ao encontro de seu povo. Porque ama, ouve seu clamor e inicia a comunicação na própria situação a partir da qual o povo o busca. Comunica-se através de sinais próprios da linguagem humana, como os acontecimentos, as pessoas, os gestos e as palavras proféticas. Assume tanto formas como conteúdos e os preenche de um significado “novo”, num renovado impulso libertador. Acompanha a história e o caminhar de seu povo. Respeita sua liberdade, espera sua resposta, propõe ao passos a dar e, amo mesmo tempo, não deixa esquecer a meta final que procura alcançar. Nessa história, e ao longo de seu desenvolvimento, o povo vai conhecendo que é seu Deus e vai amadurecendo a autoconsciência de sua identidade e de sua missão. Na “plenitude dos tempos” (Hb 1,1), a expressão definitiva desse pedagogia divina é Jesus Cristo. Ele mesmo, em sua pessoa, em sua vida, em seu modo de agir e de falar, é o vínculo que Deus Pai quer estabelecer para sempre com a humanidade. Ele é a fonte de toda a pedagogia pastoral. Sua mensagem é, ao mesmo tempo, um conteúdo e uma pedagogia. Nele também se inspira a pedagogia que a Pastoral da Juventude latino-americana propõe. Ela se realiza, antes de tudo, numa relação de amor e de encontro entre evangelizador e evangelizando. Jesus se aproxima das pessoas, capta suas buscas e inquietudes, sua situação; considera o contexto em que vivem, expressa-se em sua linguagem... Caminha a seu lado e inicia um diálogo que as leva a encontrar-se consigo mesmas e a descobrir, no fundo de seu ser, a proposta de amor do Pai. Essa descoberta é um chamamento à conversão. Se o convite é aceito e livremente respondido, a pessoa recebe o dom do Espírito, e sua vida é transformada. De sujeito passivo de suas circunstâncias, ela se faz geradora de uma nova comunhão com os irmãos a partir de sua nova comunhão com o Pai e é enviada a lutar pela mudança da realidade histórica. A abrir espaços para a presença do Reino. Foi a experiência que viveram a mulher samaritana (Jo 4,1-45), Zaqueu (Lc 19,1-9), Nicodemos (Jo 3,122), os discípulos de Emaús (Lc 24,13-35), o próprio Pedro em sua barca (Lc 5,1-10), o cego de nascimento (Jo 9,1,41) e tantos outros dos quais Jesus se aproximou.
Uma pedagogia evangelizadora da juventude da América Latina tem isso muito presente, pois se trata: • De formar um jovem maduro na fé; • De promover uma espiritualidade do seguimento de Jesus que seja juvenil, laical, libertadora, encarnada e integradora da fé e da vida; • De viver a opção preferencial pelos pobres, o que implica o duplo desafio de fazê-la real na própria vida e de promover a mudança das situações que provocam a pobreza; • De propor, como meta final, o Reino escatológico de Jesus, a civilização do amor, a construção de uma nova sociedade; • Não se trata de uma simples “transmissão” da mensagem nem de um mero ensino de conhecimentos intelectuais, mas de animar um processo integral de amadurecimento e de formação na ação. 2. CARACTERÍSTICAS DE UMA PEDAGOGIA PASTORAL A pedagogia de Jesus é um convite permanente a participar do Reino e a viver a plena dignidade dos filhos de Deus em relações de fraternidade e acolhida, e como lugar para a participação de todos. Daí derivam as características fundamentais da pedagogia pastoral: é experiencial, transformadora e libertadora, comunitária, coerente e testemunhal, participativa, personalizante e personalizada, integral. 2.1. Uma pedagogia pastoral experiencial A evangelização tem de ser feita vitalmente, partindo das experiências de vida e procurando reelaborá-las à luz do Evangelho. A melhor maneira de considerar integramente o jovem em sua formação é levar em conta sua experiência como elemento central e o ponto de partida da pedagogia, dos métodos e das técnicas que vão ser utilizados. Não se trata de partir da experiência como motivo ou pretexto para comunicar conhecimentos abstratos, nem de induzir ou provocar “vivências fortes” por meio de técnicas que tocam e mexem com o emocional. O encontro com “o Deus da vida”, dom do Pai que transforma a própria experiência em fonte de água viva para a vida eterna (Jo 4,14), produz-se no mais profundo da experiência dos jovens. O Deus que salva e liberta não está ausente das situações que eles vivem. Deus é o Senhor do mundo e é da situação concreta que chama à mudança e à conversão. Esse ponto de partida ajudará para que a fé seja percebida como um aprofundamento da própria experiência de vida, e não como fuga. Ao mesmo tempo, permitirá a revisão profunda dos “critérios de julgamento, dos valores determinantes, dos pontos de interesse, das linhas de pensamento, das fontes inspiradoras, dos modelos de vida”... Numa palavra: da “visão de mundo” dos jovens, que é o que interessa à evangelização97. 2.2. Uma pedagogia pastoral transformadora e libertadora A partir da exortação apostólica Evangelii nuntiandi de Paulo VI, e da reflexão da Igreja latinoamericana em Medellín, Puebla e Santo Domingo, a evangelização é concebida como uma Boa Nova que liberta, convida a viver a plena dignidade dos filhos de Deus, cria novas formas de relação fundadas na fraternidade e no acolhimento e promove a participação de todos para a construção de uma nova sociedade98. Partir da experiência pessoal situa-nos na complexidade da realidade. Permite perceber melhor os múltiplos condicionamentos da pessoa e a necessidade de um mudança de vida não somente no plano pessoal, mas também na esfera pública. A evangelização eficaz provoca a conversão: uma profunda transformação pessoal e social, mutuamente dependentes. Essa pedagogia considera o jovem como um ser aberto à realidade; valoriza a ação transformadora, porque vai tornando-o mais livre e contribui para desenvolver seu senso de responsabilidade. Atende a todas as dimensões de sua existência: não o afasta da vida, não o mentem na simples compreensão intelectual da realidade, mas o leva a buscar caminhos para atuar nela e 97 98
Idem, 19. Cf. Paulo VI, exortação apostólica Evangelli nuntiandi 21-24; M 6,8; P 487, SD 157.
transformá-la. Leva-o a enfrentar o dilema existencial de ser ou não ser livre, de querer ser ou ter medo de ser, de ser ele mesmo ou de ser outro, de expulsar de si o opressor ou de conservá-lo dentro dele, de fazer opções ou de cumprir ordens, de participar ou de ser espectador. Por isso, no cerne de sua ação transformadora, há o chamamento a uma profunda conversão a Deus e à lógica do Evangelho. 2.3. Uma pedagogia pastoral comunitária Deus quis salvar-nos “não isoladamente, mas formando um povo”99. Não é possível viver a fé sem a comunidade. Nela se recebe, nela se celebra e a partir dela se é enviado à missão. A relação pedagógica passa, pois, pela comunidade eclesial. A transformação pessoal e social requer uma experiência comunitária como lugar onde se geram experiências novas de relação, de encontro e de fraternidade. Nesse sentido, a comunidade reforça e confirma a verdade da transformação que se realizou, estimula a criatividade para transformações mais amplas e profundas e é expressão e fruto das novas atitudes e valores assumidos em liberdade. 2.4. Uma pedagogia pastoral coerente e testemunhal Na pedagogia pastoral não há diferença entre o que se aprende – a experiência do amor do Pai, a presença de Jesus, o dinamismo do Espírito – e a forma como se aprende: vivendo relações fraternas na comunidade. O meio se identifica com a mensagem. O anúncio é uma mensagem que se acolhe pela coerência que existe entre o conteúdo que se anuncia e o modo de anuncia-lo; entre o que se vê e o que se ouve. Do contrário, a evangelização se torna incoerente e inconsequente. 2.5. Uma pedagogia pastoral participativa A relação pedagógica evangelizadora não estabelece distâncias entre o evangelizador e o evangelizado. A evangelização é fruto da ação do Espírito e não obra do evangelizador100. Daí não se poder opor o evangelizador ao evangelizando em papéis separados ou opostos, como o de quem sabe e o de quem não sabe; o de quem manda e o de quem obedece; o de quem fala e o de quem escuta... A relação entre evangelizador e evangelizando traz em seu bojo um enriquecimento mútuo em que ambos vivem uma experiência de fraternidade que evangeliza os dois. Na realidade, ambos são evangelizados pelo próprio Espírito, cada um participando do processo de fé com base em sua experiência, dando e recebendo o testemunho do Evangelho que desperta a semente do Reino, localizada no mais íntimo de cada ser. A pedagogia participativa gera nos jovens uma capacidade reflexiva e criativa. Estimula o intercâmbio, promove o uso da palavra e as ações de conjunto, educa na capacidade de pensar e tomar decisões. Valoriza o ponto de vista de cada um, e não só o da autoridade, e expressa a convicção de que a verdade surge da busca comum e de que todos têm possibilidade de acesso a ela. A participação não anula a autoridade. Entende-a como guia, orientação e serviço, especialmente quando o evangelizador partilha com o evangelizando uma experiência de vida. Esse traço da pedagogia pastoral fundamenta-se numa eclesiologia de comunhão e participação que reconhece os jovens como responsáveis e protagonistas do processo de sua própria evangelização e quer que assumam um real protagonismo dentro da Igreja. 2.6. Uma pedagogia pastoral personalizante e personalizada A pedagogia pastoral assume o jovem em sua condição de pessoa e procura seu crescimento como pessoa e como cristão. Responde especialmente às suas necessidades de amadurecimento afetivo (SD 115). Reconhece e estimula a descoberta, o desenvolvimento e a utilização de suas qualidades. Acompanha o discernimento de sua própria vocação e a elaboração de seu projeto de vida no seguimento de Jesus, inserido em sua realidade e comprometido com a Igreja e com a sociedade. 99
Vaticano II, constituição dogmática Lumen gentium, 9. Cf. Paulo VI, exortação apostólica Evangelii nuntiandi, 75.
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2.7. Uma pedagogia pastoral integral A experiência humana é a vivência da realidade através de uma totalidade que inclui processos cognoscitivos (percepção, memória, fantasia, pensamento), processos afetivos (necessidades, emoções, sentimentos, preferências, gostos) e processos ativos (ações, condutas, hábitos, costumes) que funcionam de forma conjunta, sem que seja possível distinguir qual o primeiro ou o mais importante. Esses três processos básicos estão em jogo, ao mesmo tempo, em toda experiência humana. A pedagogia pastoral assume a pessoa e a experiência do jovem de forma integral. Leva em conta os ritmos e as etapas de amadurecimento de que todo ser-em-crescimento necessita e a multiplicidade de dimensões da personalidade nas quais o jovem vai amadurecendo e consolidando seu processo de formação.
II
As opções pedagógicas referem-se tanto aos instrumentos como às atitudes e estratégias consideradas prioritárias para a evangelização da juventude, em coerência com a pedagogia pastoral e de acordo com a realidade do jovem do continente. A Pastoral da Juventude Latino-Americana propõe estas cinco: 1) O grupo ou comunidade Jovem; 2) O processo de educação na fé; 3) A especificidade; 4) A organização; 5) O acompanhamento.
1. O GRUPO OU COMUNIDADE JOVEM O grupo ou comunidade Jovem é a experiência central da proposta evangelizadora da pastoral da juventude. A experiência latino-americana mostra que existe uma grande variedade de acepções e concepções no que se refere à expressão “grupo” ou “comunidade Jovem”. Em alguns lugares, com a palavra “grupo” ou “grupo Jovem” designa-se todo o conjunto de jovens que se reúnem de um modo mais ou menos regular. Em outros lugares o mesmo termo serve de referência a uma experiência comunitária mais específica, experiência que em outros países se denomina “comunidade Jovem”. O termo “comunidade Jovem” significa também, para alguns. O conjunto de grupos jovens de uma mesma área pastoral. Para outros, refere-se àqueles grupos cujo processo de formação os levou a um certo grau de discernimento e amadurecimento de sua vivência comunitária. Os bispos latino-americanos dizem que “a pastoral da juventude... deverá favorecer a criação e a animação de grupos e comunidades Jovens” (SD 120). Aqui usaremos indistintamente ambas as expressões. 1.1. Características De pequenos grupos, de doze a quinze jovens, de ambos os sexos, de idade homogênea, com um nível de participação regular e com um ritmo periódico de encontros ou reuniões, que se constituem em lugar de crescimento, amadurecimento, formação e realização pessoal e comunitária. Afirmamos isso porque: • Facilitam a criação de laços profundos de fraternidade, em que cada um é reconhecido como pessoa e valorizado como tal; • Permitem partilhar critérios, valores, visões e pontos de vista; compreender o sentido das experiências da vida e elaborar a própria identidade geracional; • Ajudam a enfrentar os desafios dessa etapa da vida, tão decisiva para o amadurecimento na fé e para a integração social, assegurando a continuidade e a perseverança do processo educativo; • Educam para olhar e descobrir a realidade junto com os outros, para partilhar experiências e desenvolver os valores da vida em comunidade; • Permitem encontrar Jesus de Nazaré, o único libertador, aderir a ele e a seu projeto de vida, alimentar-se da Palavra e rezar em comum;
• Impulsionam a renovação permanente do compromisso de serviço e de colaboração com a Igreja e a sociedade a construção de um futuro digno e solidário para todos; • Dão solidez à projeção missionária, expressa no testemunho pessoal, no amadurecimento da opção vocacional por um estado de vida e de ministerialidade eclesial e no compromisso com a promoção humana e a transformação da sociedade. 1.2. Dinamismo O sentido mais pleno da experiência comunitária está em seu dinamismo evangelizador. O seguimento de Jesus em suas atitudes, mensagem e missão; a celebração de sua presença na vivência do grupo e nos sinais litúrgicos e a acolhida simples e profunda do Espírito no processo de conversão são elementos fundamentais da vida comunitária. Esse dinamismo inclui duas dimensões correlatas: A primeira é ser uma comunhão dinâmica de pessoas que se comunicam entre si através de relações de conhecimento, amizade e integração. Nessas relações elas se comprometem mutuamente, aceitam-se como são, ajudam-se na superação dos problemas e vão criando uma linguagem, um conjunto de “regras” e objetivos comuns que lhes dão um sentido de pertença e identidade grupal. Desse comunicação vai emergindo uma solidariedade que as leva a partilhar profundamente a vida. Nascem e se desenvolvem amizades, as pessoas aprendem a dialogar francamente, a resolver seus conflitos, a perdoar-se mutuamente, a cuidar-se fraternalmente e a olhar a vida com otimismo. É uma autêntica descoberta do amor fraterno vivido em seus múltiplos aspectos. A segunda é a presença ativa do Espírito do Senhor no dinamismo grupal. Através da experiência do amor fraterno, o Espírito reúne os jovens e os anima a viver unidos, a perdoar-se, a ajudar-se e a cuidar-se mutuamente. Transforma suas experiências em encontros com o amor do Pai e de Jesus. Vai ajudando a interpretar a história à luz da Palavra, a descobrir na vida do grupo a história da própria salvação e a celebrá-la, principalmente na Eucaristia. É o Espírito quem os vai congregando, fazendo-os partilhar seus bens e pôr em comum suas limitações e fragilidades. O Espírito vai ajudando-os a superar suas angústias, animando sua esperança e comprometendo sua vida na solidariedade e no compromisso com os mais necessitados. Pela presença ativa do Espírito, a experiência do amor fraterno que se vive no grupo pode ressignificar-se como revelação do projeto do Pai para o jovem e, portanto, como uma fonte para sua definição vocacional será, assim, a culminação do processo de amadurecimento na fé e do seguimento de Jesus (SD 114). Nesse dinamismo comunitário vai se consolidando a maturidade humana. Vai se construindo a liberdade, integrando a personalidade e afinando-se as motivações profundas, os sentimentos, o caráter. A salvação do pecado – realidade presente em cada indivíduo, que toma corpo nas estruturas sociais e não permite às pessoas e aos povos manter um diálogo de fidelidade com Deus – vem pelo dom do Espírito Santo, que vai curando este tecido humano, pessoal e social. Ambas as dimensões – de comunhão interpessoal e de presença ativa do Espírito – ocorrem em permanente inter-relação. Uma se realiza na e através da outra. Daí a importância da vida comunitária para os jovens, e a necessidade de que esse dinamismo comunitário seja profundo, bem orientado e bem acompanhado em seu crescimento. 1.3. Etapas Todo grupo, seja de jovens, seja de adultos, nucleado com fins religiosos ou com qualquer outro fim, tem sua própria evolução. Desenvolve-se durante um determinado período, passando por sucessivas etapas. Numerosos estudos têm sido publicados sobre a realidade. Quase todos admitem que as fases e as sequências são comuns na grande maioria dos casos, embora seus conteúdos e duração variem segundo tipo de grupo e a tarefa desenvolvida. Muito autores comparam a vida e o crescimento do grupo com a vida e o crescimento das pessoas, desde o nascimento até a morte. Logicamente, o grupo não é igual à pessoa, pois tem leis próprias,
baseadas na inter-relação e na tomada de consciência coletivas. Passa, contudo, por fases muito semelhantes e se desenvolve em etapas muito similares às do crescimento humano. É necessário esclarecer que, ao falar de etapas, não se pretende dizer que elas se dêem de maneira mecânica e obrigatória. Não há limites absolutamente claros entre uma etapa e outra. É possível que, às vezes, umas se sobreponham a outras e que ocasionalmente se possa saltar alguma delas. Mas parece importante ter consciência de sua existência e de sua contribuição para entender o que ocorre na vida dos grupos. 1.3.1. Nascimento O grupo nasce como a pessoa... Com grande dificuldade. Como a vida que começa, precisa de muitos cuidados, pois há o riso de morte prematura. Como o recém-nascido, surpreende-se com o que o rodeia, balbucia as primeiras palavras e dá os primeiros passos com incerteza. Ao mesmo tempo, alegra-se porque começa a falar, porque prestam atenção a sua linguagem e porque descobre que é capaz de movimentar-se e andar. Gosta de estar junto dos outros, de ser e de sentirse grupo... Como a mãe para o recém-nascido, é importante a presença do assessor para acompanhar os primeiros momentos do grupo que nasce. 1.3.2. Primeira Infância O grupo começa a crescer... Embora muitos passem a participar só para ver o que acontece ou o que se pode fazer, não há maior conhecimento interpessoal. É grande a dependência do assessor, e há um afã imediatista de conseguir logo grandes coisas. Descobre-se lentamente que é possível que diferentes pessoas possam vir a fazer algo em comum. Apesar dos temores e das expectativas não reveladas e de não haver objetivos definidos, começa a vislumbrar-se para onde se vai. Sente-se o prazer de estar juntos, de apoiar-se e de acompanhar-se mutuamente. Cresce o desejo de conhecerse mais e de desenvolver uma identidade própria. Essa vivência grupal favorece a relação sistemática com outros que geralmente pensam diferente, têm experiências diferentes, gostos variados e escalas de valores nem sempre coincidentes com a nossa. É um período de imaginação, de planos fabulosos e de imitação de outros grupos. O sensível desempenha um papel fundamental. Razão pela qual facilmente surgem disputas, assumem-se entusiasticamente responsabilidades que depois não podem ser cumpridas, e há pouca capacidade de avaliação: momentos amargos, momentos agradáveis. 1.3.3. Adolescência É a fase da tomada de consciência do eu grupal, da crise de integração e de autoridade, da busca de sentido do grupo e de sua inserção na realidade. É o momento de sua afirmação como grupo e de sua busca de identidade e dos caminhos para a sua realização. Tempo de crescimento, de incertezas, de definições, de avanços e recuos. Face a face com a crise o grupo ou se auto-afirma ou se desintegra. É muito importante identificar a fonte da crise. O diálogo é fundamental. Com sua experiência, o assessor poderá prestar uma ajuda inestimável. No aprofundamento da inter-relação pessoal que faz surgir um “nós” do grupo, na busca de tudo quanto faça “sentir-se bem no grupo” e na realização de ações que permitam pôr em prática seus ideais, surgem caminhos de superação da crise e novas etapas de amadurecimento. 1.3.4. Juventude Superada a crise, o grupo alcança maior estabilidade, adquirindo uma personalidade grupal mais definida e uma maior autonomia em relação ao assessor; aprofunda as relações humanas, assume compromissos com mais seriedade, começa a definir uma escala de valores, busca o verdadeiro sentido do amor, abre-se mais à realidade social e passa a fazer opções importantes na vida. O próprio amadurecimento leva-o a buscar mais o sentido comunitário e a efetividade, a definir seus objetivos de modo mais realista e a exigir de seus membros compromissos concretos e firmes.
1.3.5. Fase adulta Um grupo é adulto quando se torna praticamente uma comunidade sincera e sem barreiras, com objetivos claros e definidos, decisão de continuar juntos níveis de comunicação profunda e correção fraterna, aceitação mútua incondicionada, compromisso encarnado na realidade e uma organização que lhe permite cumprir os fins previstos. Quando consegue isso, o grupo descobre a necessidade de ser multiplicador e de fazer nascer dele outros grupos com impulsos novos. Pode acontecer, também, que o grupo sinta que atingiu a meta e caia na tentação de parar e descansar. 1.3.6. Morte-vida nova O grupo não pode permanecer para sempre. Não é imortal. Assim como a família se divide, formando outras novas o grupo é chamado a multiplicar-se e a formar novos grupos. Não se trata de morrer e desaparecer, mas de transformar-se e continuar vivendo de uma nova maneira. É a lei do crescimento, a lei de todo grupo rico em potencialidades e que não se fecha em si mesmo. Os novos grupos poderão tornar-se independentes e realizar-se segundo a sua própria criatividade, mas mantendo uma ativa coordenação entre si. Sem esse necessário morrer para renascer, os grupos, geralmente se tornam rotineiros. Começam a se contentar com pouco, vivem sobretudo em função do passado, entram em fase de estagnação e por fim acabam morrendo sem dar origem a uma nova vida. 2. OS PROCESSOS DE EDUCAÇÃO NA FÉ A opção pedagógica fundamental da Pastoral da Juventude é o reconhecimento do caráter processual e dinâmico da formação e da educação na fé. Não é possível entender a ação da pessoa sem esta tarefa que se converte num projeto diário e num desafio cada vez mais original. Nem o ser humano nem os grupos nascem feitos. Pelo contrário, têm diante de si um longo caminho de formação que abarca diversos aspectos e comporta diversas exigências. Isso significa que se deve ter em conta os “tempos” de crescimento, de identificação afetiva, de assimilação e de compromisso próprios dos jovens. Significa, também, reconhecer que o processo educativo é um caminho que o próprio jovem trilha. Ele é o principal responsável pelos passos a serem dados. Dele são os méritos dos resultados obtidos. Sua também é a responsabilidade pelo que não conseguir. 2.1. A formação integral Mas o que é formar? Muitos entendem a formação como mera instrução. Formar seria, então, a tarefa de uns poucos “já formados” que, unilateralmente, indicariam o caminho aos outros, fazendo da formação um exercício mais intelectual que experiencial e vivencial. Para a Pastoral da Juventude LatinoAmericana, formar é gerar nos jovens e nos grupos novas atitudes de vida e novas capacidades que lhes permitam ser, clarificar seus projetos de vida, viver em comunidade e intervir eficazmente para a transformação da realidade. Nessa visão, a formação é um processo de crescimento, tanto pessoal como grupal e social, com metas claras a alcançar e profundamente encarnado nas condições históricas e sociais em que se vive. Trata-se de um processo de educação não-formal que requer do assessor uma grande capacidade de escuta, uma enorme disponibilidade para “perder tempo” com os jovens onde e quando eles quiserem e um decidido impulso a uma pastoral que responda a suas verdadeiras necessidades. Não é a mesma coisa ser um professor num instituto de formação em determinado horário, numa sala de aula, com um programa predefinido de objetivos e conteúdos, e assessorar grupos de jovens numa paróquia ou num ambiente aonde o próprio assessor tem de ir ao encontro dos jovens, chama-los, motivá-los, animá-los e acompanhá-los. Muitos pensam também que a formação é um conjunto amplo e bem elaborado de “atividades formativas”. Formar seria, então, fazer cursos, jornadas e encontros, nem sempre muito articulados e coerentes entre si. Num processo de educação não-formal, o doutrinal e o conceitual são o ponto de chegada, e não o ponto de partida. Não se nega a importância de todas essas atividades; quer-se dizer
apensar que elas por si só não bastam e que são válidas na medida em que estejam ligadas ao núcleo formativo por excelência, que é a ação. Não se quer cair na tentação do “primeiro formar para depois agir” nem na do ativismo da “ação pela ação”. Por meio de metodologias adequadas, propõe-se uma formação na ação, em que se ofereça ao jovem a possibilidade de realizar uma ação refletida e de ter uma reflexão comprometida. Desde colaborar na preparação do local da reunião ou coordenar uma atividade lúdica, até sistematizar sua própria experiência, dialogar com o grupo, orientar uma reunião, preparar uma celebração, organizar uma atividade ou planejar uma ação, os jovens vão adquirindo a capacitação técnica para se desempenhar bem. A ação concreta em sua realidade de trabalho, na universidade, na família, no bairro, é a melhor escola de formação: forma-se para a vida na própria vida. A reflexão não é um momento deslocado da ação. Ao falar da pedagogia pastoral, fez-se referência ao caráter integral desse processo de educação na fé. Para ter em conta a multiplicidade e a riqueza de aspectos do crescimento da pessoa e o caráter processual de seu amadurecimento, a Pastoral da Juventude Latino-Americana propõe um processo de formação integral que atende a cinco DIMENSÕES – a relação consigo mesmo, a relação com o grupo, a relação com a sociedade, a relação com Deus libertador e a relação com a Igreja – e se desenvolve em três ETAPAS: a nucleação, a iniciação e a militância. 2.2. Dimensões da formação integral Foi dito que a formação é um processo teórico-prático que tem como ponto de partida a vida do jovem e que retorna à vida para projetar-se em novas atitudes e capacidades. Se o centro de formação é a vida do jovem, os planos de formação deverão responder às diversas dimensões que a conformam. Para que a formação seja integral, deve-se procurar abarcar o jovem em sua totalidade e ajudá-lo a integrar sua pessoa numa unidade que facilite a realização de seu projeto de vida. Cada uma das cinco dimensões apontadas e os correspondentes processos de crescimento que se desenvolvem na vida dos jovens são sucintamente descritos a seguir. 2.2.1. Relação do jovem consigo mesmo Corresponde à realidade psicoafetiva e ao processo de personalização que o jovem vive. É a busca constante de uma resposta, não especulativa, mas existencial, à pergunta: “quem sou eu?”. É o esforço de crescer e amadurecer como pessoa, de tornar-se responsável e livre perante si mesmo para ser capaz de entregar-se aos outros. Nessa dimensão, o jovem desenvolve processos de conhecimento contínuo de si mesmo, de suas aptidões e qualidades e de seus sentimentos e interesses em relação aos demais. É um processo de autocrítica, de conversão e de superação de suas crises e conflitos; um processo de descoberta de sua dignidade pessoal, de crescimento de sua auto-estima e de abertura para sentir-se amado e capaz de amar. Nessa dimensão, é especialmente importante sua capacidade de ser sujeito de seu próprio crescimento e de optar por valores e princípios que serão a base de sua existência, até chegar à definição de um projeto de vida que assuma os valores da proposta da civilização do amor. 2.2.2. Relação com o grupo Corresponde à dimensão social, essencial a toda pessoa e ao processo de formação para ser capaz de integrar-se numa comunidade onde viva e alimente continuamente seu crescimento pessoal integral. O grupo oferece um espaço para que se descubra, de modo concreto e vivencial, a necessidade de realizar-se como pessoa na relação com o outro. Essa relação ajudará a crescer exercitando a crítica e a autocrítica como meio de superar-se pessoalmente e de colaborar no crescimento dos outros. O processo de amadurecimento leva o jovem a construir paulatinamente relações de companheirismo, de amizade e de fraternidade até incorporar essas atitudes numa valorização da experiência comunitária como referência permanente para sua vida. O jovem aprenderá a viver em grupo, aceitando e valorizando cada pessoa, reconhecendo seus valores e tornando-se capaz de renunciar aos interesses pessoais para assumir os da comunidade. Desenvolverá sua
capacidade de trabalhar em equipe e de viver numa atitude de serviço que o faça crescer na responsabilidade por sua própria vida e pelas situações do grupo. 2.2.3. Relação com a sociedade Corresponde ao processo de socialização ou de inserção do jovem na sociedade. Essa dimensão formará o jovem para ser capaz de projetar-se em sua comunidade local, nacional e internacional. A experiência de grupo é o ponto de partida para abrir-se a relações mais amplas e complexas que se dão fora do grupo e descobrir as organizações sociais intermediários como espaço possíveis de compromisso transformador. Isso implica um processo de amadurecimento a partir de ações que são a princípio, muitas vezes, apenas assistenciais, o jovem vai descobrindo os níveis de organização da própria sociedade, valorizando especialmente o papel dos organismos políticos, sindicais, de bairro, populares, etc e assumindo a opção pelos pobres como uma atidude de serviço e solidariedade, até incorporá-la em seu projeto de vida. Essa dimensão lhe dará elementos e o capacitará a criar e participar de todo tipo de projetos alternativos de caráter econômico, político, educativo, etc que fortaleçam o processo de luta popular por estruturas mais humanas e pela construção da civilização do amor. 2.2.4. Relação com Deus, Pai e Libertador Corresponde à experiência de fé do jovem. É a progressiva experiência da presença de Deus agindo nos acontecimentos de sua vida, da vocação mais profunda de ser filho e irmão, da descoberta de Jesus como Senhor e Libertador, da opção por segui-lo, do discernimento da ação do Espírito nos sinais dos tempos da história pessoal, grupal, eclesial e social e do compromisso radical de viver os valores do Evangelho. Partindo de sua experiência religiosa básica, o processo tende a educar o jovem no discernimento cristão para que vá descobrindo e vivenciando sua vocação, elaborando um projeto de vida de Jesus e a proposta da civilização do amor. Na realidade, essa dimensão está presente e é a base das outras quatro dimensões. A pessoa de Jesus e sua proposta libertadora são o centro do processo formativo da Pastoral da Juventude. 2.2.5. Relação com a Igreja Corresponde ao processo de inserção do jovem na Igreja. Seu núcleo desencadeador e eixo articulador é o grupo ou comunidade jovem, que se propõe como experiência primária de “pequena Igreja”, numa escala apta para o jovem. No grupo, é possível descobrir que a fé não se vive sozinho. Que é na vida da pequena comunidade que Jesus faz acontecer e torna possível o Reino que anuncia, e que a Igreja é uma comunidade de comunidades. O processo passa também pela assunção das contradições e dos conflitos que se dão no interior dos diferentes níveis da comunidade eclesial. A meta é que o jovem descubra seu lugar dentro dela e desenvolva sua consciência e seu sentido de pertença e responsabilidade ao reconhecer-se como membro ativo do povo de Deus, com vocação própria e papel específico a cumprir. O desenvolvimento dessas cinco dimensões não se realiza num processo linear, sempre progressivo. Mais propriamente, poder-se-ia representa-lo na forma de uma linha espiral, que acentua dois aspectos igualmente importantes: os momentos de “baixa” e retrocesso que ocorrem no processo de amadurecimento e a necessidade de estar atento para que o processo de amadurecimento se desenvolva harmonicamente em todas as dimensões. Um grupo que só desenvolve a dimensão psicoafetiva de seus membros transforma-se num grupo de terapia; se só desenvolver a dimensão grupal, será um grupo de amigos; um amadurecimento exclusivo da dimensão social fará dele um grupo de ativistas; restringir-se apenas à experiência religiosa leva ao risco de viver uma fé desencarnada; e a pretensão de amadurecer o gruo apenas em sua dimensão eclesial pode acarretar facilmente sua instrumentalização.
2.3. Etapas do processo de educação na fé A sistematização do processo da formação integral em etapas procurar respeitar as fases de crescimento dos jovens. Entende que a pessoa humana não está “feita”, mas “vai se fazendo” em sua própria história. A experiência da Pastoral da Juventude Latino-Americana reconhece três etapas: a nucleação, a iniciação e a militância. 2.3.1. A etapa da nucleação Nessa etapa os jovens são convocados, respondem afirmativamente e decidem começar sua participação nos grupos de jovens. A experiência demonstra a incapacidade dos instrumentos tradicionais da ação pastoral para atingir eficazmente a juventude de hoje. O jovem aceita a religião e adere a Jesus Cristo somente na medida em que está motivado e convencido da validade e da importância que isso têm para sua vida. Uma fé meramente sociológica já não consegue a adesão da juventude. Numa pedagogia mais adaptada à nova realidade juvenil, o próprio grupo de jovens é o instrumento privilegiado para a nucleação. Enquanto o jovem rejeita ou fica indiferente à aula de religião, entusiasma-se com a idéia de participar de um grupo de jovens. A quase totalidade dos grupos de jovens hoje existentes foi nucleada a partir dos próprios grupos de jovens paroquiais e dos meios específicos ou das comunidades de base. As formas de nucleação podem ser muito variadas: • O convite pessoal. Feito por amizade entre os jovens ou a partir da motivação ou do testemunho de vida dos próprios jovens ou dos assessores. É o mais eficaz e personalizante. • A captação de grupos naturais. É fruto da aproximação do assessor, ou dos próprios jovens já nucleados, a grupos que se formam espontaneamente em torno de interesses comuns como a amizade, o esporte, a vizinhança, etc. O fato de tratar-se de grupos já constituídos favorece o processo que se vai desenvolver depois. • Os convites amplos. São feitos a partir de atividades cujo objetivo é precisamente atrair os jovens e propor-lhes a possibilidade de sua integração num grupo. Pode-se citar, entre outras, a catequese, a preparação ao sacramento da Confirmação, as celebrações juvenis da Eucaristia, a pastoral dos adolescentes, os retiros, as convivências, os próprios grupos paroquiais, os convites abertos através de cartazes, cartas, meios de comunicação social, homilias; os festivais e eventos artísticos, musicais, teatrais, etc. • O convite nos meios específicos. Nesses ambientes, a convocação pode ser feita a partir de grupos já existentes ou chamando jovens destes meios que já participam das comunidades. Mas normalmente é feito no próprio meio, através do testemunho de vida dos jovens, do convite pessoal e de outros recursos que respondem às características próprias de cada meio específico. • Os convites maciços. São feitos através de atividades para as quais se convoca uma grande quantidade de jovens, formulando-se o convite para viver um processo formativo pela integração num grupo. Entre essas atividades pode-se citar os congressos, as peregrinações, as marchas e caminhadas, as semanas da juventude, as comapanhas de solidariedade, a celebração dos acontecimentos litúrgicos fortes, como páscoas juvenis, vigílias de Pentecostes, etc. Para que o processo de convocação e nucleação seja efetivo, deve-se ter em conta alguns critérios que o sendo comum e a práxis pastoral identificam como muito importantes: A proposta deve ser eclesial. A convocação não pode ser assunto apenas do assessor ou do grupo de jovens já constituído: tem de ser expressão da responsabilidade de toda a comunidade cristã preocupada com a evangelização dos jovens. Por isso, é muito conveniente que toda atividade de nucleação seja resultado de um discernimento comunitário e que sua realização comprometa toda a comunidade.
A proposta deve ser clara. Não é possível atrair os jovens com uma proposta e depois apresentar-lhes outra. O convite tem de ser honesto e os objetivos bem explicados; devese explicitar, desde o começo, que a convocação inclui uma proposta de vivência e realização de um caminho de amadurecimento na fé. A proposta deve partir da realidade dos jovens que são convidados, de suas necessidades, de suas buscas, de suas inquietações e expectativas; só assim será uma proposta atraente. Deve ser também uma proposta participativa, na qual o jovem se sinta envolvido e descubra que poderá ser protagonista de seu próprio processo de formação. O calor fraterno e a acolhida da comunidade cristã aos jovens convocados que aceitam o convite de integrar-se num grupo de jovens. A acolhida deve ser expressão de alegria por sua chegada e um convite a sentir-se parte, desde o início, de uma comunidade mais ampla cuja vida e caminho eles começam a partilhar. Tratando-se da convocação e integração de novos jovens a grupos já existentes, os assessores e coordenadores deverão discernir quais os tempos mais adequados para realizá-la, sem afetar o processo e a estabilidade do grupo. A etapa de nucleação não se reduz apenas à atividade pela qual se realiza a convocação dos jovens. Só pode ser considerada cumprida quando o novo grupo tiver se estabilizado, seus integrantes tiverem conseguido um nível mínimo de conhecimento e confiança e houver um certo grau de clareza nos objetivos. Com isso eles estarão em condições de passar para a etapa seguinte. 2.3.2. A etapa de iniciação É a etapa efetivamente percorrida pela maioria dos grupos de jovens. Do que nela dor feito dependem, na prática, os processos de formação na fé vividos por muito jovens latinoamericanos. Um bom acompanhamento e uma boa pedagogia durante a etapa de iniciação garantirão a possibilidade de crescimento e amadurecimento até o compromisso da militância. O ponto de partida da iniciação são as variadas motivações e os graus de consciência e adesão a Jesus Cristo que os jovens que respondem à convocação, trazem. O desconhecimento dessa realidade ou as tentativas de utilizar outros pontos de partida mais idealizados levam frequentemente a erros que, mais cedo ou mais tarde terminam truncando e frustrando os processos iniciados. Para facilitar uma consecução mais harmônica dos objetivos e uma melhor organização dos conteúdos e das atividades promovidos para desenvolver as diferentes dimensões, algumas sistematizações mostram que, durante esta etapa, ocorrem diversos “momentos” que se pode distinguir claramente e que assinalam a progressividade do processo de crescimento que os jovens realizam. Alguns até vivem o final de cada momento com celebrações especiais que marcam a passagem de um momento para o outro e estimulam o prosseguimento na caminhada. O importante é reconhecer que a etapa de iniciação tem um ritmo próprio de desenvolvimento que deve ser respeitado e que seus diferentes momentos variam segundo características do grupo, seus objetivos, circunstâncias, etc. O desenvolvimento e o amadurecimento das cinco dimensões geram um processo que basicamente se realiza de acordo com o que se propõe em seguida. a) A relação do jovem consigo mesmo O jovem inicia um processo de amadurecimento pessoal pelo qual, partindo da aceitação de si mesmo e de sua dignidade como filho de Deus, desenvolve diversos aspectos de sua personalidade: assume sua afetividade e sexualidade e questiona atitudes machistas; exercita-se na autocrítica e no autoperdão, adquire auto-estima e confiança em si mesmo, cultiva valores humanos como a fraternidade, a autenticidade, a solidariedade, a comunicação profunda e a capacidade de acolhida do outro; descobre os mecanismos psicológicos que operam nele mesmo, como a evasão-sublimação, a compensação, a racionalização e a projeção; assume sua vida com
otimismo e olha sua juventude com esperança; descobre-se como ser histórico – em situação, em relação e em projeto – e formula-se perguntas sobre o sentido da vida que o levarão à elaboração de um projeto de vida pessoal e à opção vocacional. b) A relação com o grupo O jovem inicia um processo de integração grupal tomando consciência de que a conflitividade das relações humanas, se bem assumida, leva à maturidade pessoal, ao aprofundamento da amizade e à descoberta dos outros. Pouco a pouco, ele vai sentindo o prazer e a satisfação de estar num grupo. Nele, vai encontrando resposta a suas expectativas e, através de um processo de seleção espontâneo, vai passando de relações mais amplas no grupo maior a relações mais personalizadas nos grupos mais reduzidos. O grupo também o ajuda a passar da preocupação com os objetivos e interesses individuais para a busca e o desenvolvimento de objetivos e interesses comuns e grupais. Nesse processo, ele descobre o papel da coordenação como serviço. O grupo vai dando passos para uma organização interna flexível e funcional que lhe permite exercitar-se no consenso e na co-responsabilidade. Para isso contribuem, sem dúvida, a metodologia do ver-julgar-agir-revisar e os momentos fortes de celebração da fé. c)
A relação com a sociedade O jovem inicia um processo caracterizado pela passagem de relações, problemas e interesses imediatos, para a formulação das questões mais amplas da economia, da política, da cultura e da sociedade. Num primeiro momento, ele sofre passivamente, a problemática social, mas logo começa a questioná-la a partir das situações que vive diariamente. Pela reflexão do Evangelho, a partir da realidade e pela própria experiência grupal, vai descobrindo sua pessoa como ser original e em relação, seu entorno social imediato com seus valores, antivalores e problemáticas e com as causas estruturais que as geram; sua pertença a um povo com valores culturais próprios e a opção preferencial pelos pobres como expressão da fidelidade a Jesus Cristo encarnado na história. Nas suas atividades, o grupo começa expressando um primeiro sentido de solidariedade e realizando ações de caráter assistencial, para descobrir a importância da ação comum e desenvolver atividades menos ingênuas e mais libertadoras. d) A relação com o Deus libertador O jovem vive um processo de amadurecimento que parte de sua fé própria de criança e chega a uma relação mais adulta com um Deus próximo e amigo na pessoa de Jesus. Ao mesmo tempo, vai se libertando das imagens deformadas de Deus que adquiriu e que com frequência condicionam negativamente sua fé. Isso implica valorizar as “sementes do Verbo” já presentes em sua experiência juvenil e descobrir que Deus o ama e lhe propõe um projeto de vida. Desse modo, o jovem vai descobrindo a fé como um “estilo de vida” que expressa sua opção consciente de seguir Jesus Cristo e viver os valores do Evangelho. Essa necessidade de optar pelo seguimento de Jesus é o ponto de partida de sua formação ético-moral. Enquanto realiza esse processo, o jovem vai se interessando cada vez mais pelo aprofundamento teórico dos conteúdos da fé, especialmente da verdade sobre Jesus Cristo, sobre a Igreja e sobre a pessoa humana; desenvolve sua vida de oração e celebra os sacramentos com maior profundidade; vai descobrindo o sentido da missão e do compromisso do cristão com o mundo e tendo um contato mais direto e pessoal com a Bíblia, especialmente com o Novo Testamento. e) A relação com a Igreja Através de seu grupo, o jovem começa a desenvolver seu sentido de pertença a uma comunidade crente que lhe propõe uma vivência de fraternidade, de comunhão e de participação.
Dá-se às vezes, neste processo, a interação da família, especialmente através da participação na celebração dos sacramentos. O jovem descobre também a realidade eclesial com suas virtudes e defeitos. Aprende a amá-la realística e concretamente e percebe a necessidade de estar em atitude de permanente conversão. Começa a aprofundar a reflexão teórica sobre a Igreja como comunidade de comunidades, servidora da vida, pobre e solidária com os pobres, sacramento da presença de Deus. Na medida em que age e se compromete, descobre também a organização mais ampla da Pastoral da Juventude dentro da Igreja e conhece e se vincula às demais pastorais dentro de uma pastoral de conjunto. Como já se disse, os momentos e as dimensões descritos não são compartimentos estanques. Foram separados por razão de clareza. Na vida real, além disso, influem-se mutuamente e podem ocorrer e combinar-se de muitas e diversas formas. Não é possível determinar antecipadamente o prazo para passar de um momento a outro, pois cada grupo tem sua história, que deve ser respeitada. Nem todo grupo chega ao final da etapa de iniciação. Muitos se desfazem nos momentos iniciais por falta de boa coordenação, assessoria ou metodologia. A debilidade principal está muitas vezes na superficialidade e na falta de preparação com que se realizam muitas reuniões e atividades, o que gera desencanto, desânimo e abandono dos grupos. O processo descrito aqui se refere especialmente aos grupos paroquiais. Dever-se-ia fazer algumas adaptações para os grupos de iniciantes nucleados nos meios específicos. Para eles, a etapa de iniciação é frequentemente mais curta que a dos grupos nucleados nas paróquias e comunidades de base. Os grupos nucleados nos próprios meios já começam com certo grau de consciência. Não são jovens que se nucleiam só por motivos de amizade ou curiosidade. Normalmente buscam algo mais. Embora seu nível de consciência política e social seja avançado, seu nível de cultura religiosa e seu compromisso de fé são muitas vezes bem fracos. Com os grupos que se iniciam nas comunidades frequentemente acontece o contrário. Embora o trabalho de conscientização seja mais difícil, o de educação na fé costuma encontrar menos dificuldades. f)
A passagem da iniciação para a militância Uma etapa de iniciação bem realizada leva o jovem lentamente a um compromisso mais sério e radical que se concretiza na militância. A passagem da iniciação para a militância geralmente se dá no nível pessoal. O jovem pertence a um grupo de jovens dentro do qual o crescimento é normalmente desigual: uns avançam mais em termos de consciência, conversão e compromisso; outros o fazem mais lentamente, é há aqueles que simplesmente não avançam. Para muitos dos primeiros, o grupo deixa de ser um espaço para refletir e continuar crescendo na militância que estão começando. Ocorrem então várias alternativas: alguns decidem desvincular-se e prosseguir suas militância de forma isolada; outros continuam ligados à Pastoral da Juventude e assumem responsabilidades de coordenação ou animação em algum de seus níveis; e outros optam por formar novos grupos, mais estáveis, nucleados em torno de interesses ou em espaços comuns de militância. Nessa etapa de sua via, muito jovens já começam a assumir responsabilidades próprias da vida adulta, no que se refere ao trabalho, aos estudos e mesmo à formação de uma família. É o tempo de definir mais concretamente seus projetos de vida e realizar a opção vocacional que os situará como cristãos adultos – leigos, religiosos ou sacerdotes – na Igreja e na sociedade. 2.3.3. A etapa da militância A palavra “militante” tem uma longa história na vida da Igreja. Refere-se à ação eficaz do cristão e a seu compromisso, testemunho, luta e agir concretos no mundo e na própria Igreja. A militância exercida pelos jovens cristãos define-se como aquela ação cada vez mais refletida, intencionada, consciente, contextualizada e organizada, visando promover uma renovação na Igreja e na sociedade. Entende-se como a opção feita pelos jovens cristãos de assumirem o estilo de vida de Jesus de Nazaré e de viverem sua vida como uma entrega aos demais.
Dentro do processo evolutivo da personalidade do jovem, a militância é uma etapa ativa e criativa. Desenvolve-se uma vez superada a adolescência, e supõe a integração dinâmica dos elementos cognoscitivos, afetivos, sociais e transcendentes numa opção e projeto de vida. É, ao mesmo tempo, uma realidade e um projeto a construir. Uma realidade, porque os processos pastorais dos países latino-americanos mostram experiências concretas de militância tanto em nível eclesial como em organismos intermediários da ordem político-social. Em alguns casos, contudo, tais experiências são ainda limitadas e parciais, o que mostra que é também um projeto a construir. É uma meta proposta a todo jovem sujeito de um processo de educação na fé, uma meta a que se deve tentar chegar, um compromisso iniludível que todo jovem cristão deve assumir para cumprir responsavelmente sua missão libertadora e transformadora no mundo. Exige uma atitude de constante conversão e discernimento sobre o estilo de vida que se deseja assumir, assim como sobre os espaços nos quais se pode e se deve agir e sobre as organizações com as quais se deve trabalhar para favorecer a construção da civilização do amor, em justiça e fraternidade. a) Espaços de militância O jovem militante recebe o chamado ao compromisso tanto da comunidade eclesial como dos organismos sociais intermediários. À medida que avança a etapa de iniciação, os jovens vão tendo suas primeiras experiências de compromisso com a comunidade eclesial, especialmente na nucleação e na coordenação de outros grupos de jovens. Quando chegam à militância, geralmente assumem responsabilidades pastorais nos níveis paroquiais, diocesanos e até nacionais, tanto na própria Pastoral da Juventude como em outros organismos pastorais. Assim, há jovens militantes coordenadores de grupos de iniciantes, coordenadores de paróquias, zonas ou dioceses, integrantes de conselhos pastorais, agentes de pastoral social, catequistas, membros de equipe de meios de comunicação, de programas de educação popular, etc. Há, contudo, muitos jovens que, percebendo o sofrimento e a injustiça em que vivem amplos setores da humanidade, querem trabalhar pela mudança da realidade e assumem sua militância no âmbito social, participando das organizações intermediárias: partidos políticos, movimentos populares, organizações estudantis, associações de bairro, grupo de defesa dos direitos humanos, de promoção da mulher, movimentos ecológicos, etc. Muitos dos que optam por um maior protagonismo nessas organizações intermediárias mantêm contato com a comunidade cristã, seja através da participação em encontros ou celebrações litúrgicas, seja através de sua própria comunidade de reflexão. A militância em ambos os espaços é importante. Alguns jovens conseguem fazê-lo, desenvolvendo assim dupla militância. É necessário ter em conta que os militantes que priorizam o espaço pastoral e não desenvolvem compromissos na sociedade devem ter pelo menos uma presença testemunhal nela. Os militantes das organizações intermediárias por sua vez, precisam manter sua referência com a comunidade eclesial para alimentar e celebrar sua fé. Da mesma forma, as ações de militância no espaço pastoral, que têm como finalidade promover o fortalecimento da comunhão eclesial, necessitam desenvolver-se também tendo em vista a missão transformadora no mundo. E as ações de militância no espaço social, cujo objetivo é a transformação da sociedade, devem dar também sua colaboração para a transformação da vida da comunidade eclesial. b) Formação, acompanhamento e organização Os jovens militantes têm exigências especiais no campo da formação, do acompanhamento e da organização. A primeira exigência é aprofundar sua própria formação. O espaço dos organismos intermediários é de grande conflitividade e pluralismo ideológico, determinado, portanto, a necessidade de uma sólida formação teológica e sociológica para que os jovens possam fazer um sadio discernimento de suas opções. A Doutrina Social da Igreja tem aqui um lugar muito importante.
Essa mesma necessidade pode ser reconhecida naqueles que se comprometem nos espaços pastorais. A participação mais intensa na vida intra-eclesial e em seus organismos de comunhão, a necessidade de assumir co-responsavelmente opções pastorais concretas e a percepção dos conflitos existentes na próprias estruturas pastorais exigem uma visão mais profunda do ser e da missão da Igreja, e da própria vocação do jovem militante, no contexto de uma teologia atualizada. As exigências de um serviço eficiente no âmbito de compromisso escolhido requerem também, cada vez mais, uma maior preparação e capacitação. A segunda exigência é instrumentalizar uma estrutura específica para o acompanhamento dos militantes. Em muitas ocasiões, os jovens militantes são abandonados pela Igreja por causa de sua atividade questionadora. A Igreja deve enfrentar o desafio de apresentar o Evangelho também para um jovem crítico, pois, do contrário perderá os elementos mais dinâmicos que terão um papel importante na transformação da história, que avança com ou sem a participação da Igreja. Não os acompanhar na etapa da militância implicará perder os anos gastos na preparação dessas lideranças e desperdiçar a oportunidade de preparar leigos cristãos que sejam verdadeiro fermento nos organismos intermediários que trabalham pela nova sociedade. Em virtude da atual crise da militância, muitos jovens se sentem desanimados diante da aparente esterilidade de seus esforço generosos. Perdem o sentido do que estão fazendo e correm o risco de cair na tentação de “amoldar-se” às circunstâncias, de aproveitar suas qualidades de organização e liderança para tirar vantagens pessoais nos organismos intermediários ou de abandonar, decepcionados, seus compromissos para dedicar-se a “fazer de seu jeito”, no plano profissional, afetivo e familiar. Os jovens militantes têm que encontrar na Igreja um espaço para se sentir entre iguais e poder refletir sua nova prática com outros que têm o mesmo nível de consciência e compromisso. É preciso uma estrutura de acompanhamento através de grupos de militantes, coordenações próprias, cursos, subsídios e do apoio do método da revisão de vida. Uma estrutura desse tipo poderá dar continuidade ao projeto de evangelização começado na etapa de iniciação e oferecer ao jovem os apoios de formação que continuam sendo necessários. Essa necessidade de acompanhamento é particularmente importante no caso dos jovens que têm uma militância na sociedade, já que os que têm uma militância nos âmbitos pastorais, mesmo que saiam da Pastoral da Juventude, continuam sendo acompanhados pela própria comunidade. A terceira exigência é a necessidade da organização. Sem a articulação entre si nos diferentes níveis, os grupos de militantes se fechariam numa missão particular e limitada. Existiriam com um fim em si mesmos. A articulação permite a troca de experiências. Através do diálogo, leva à sistematização de vivências e reflexões, preservando a memória histórica, suscita e conduz a um amadurecimento no plano teórico e no plano organizacional. c)
Dimensões formadoras Na etapa de militância, continuam sendo desenvolvidas as cinco dimensões da formação integral que começaram na etapa de iniciação. Apresenta-se, aqui, um breve descrição dos processos que vão sendo gerados nos jovens. I. A relação do jovem consigo mesmo O jovem militante sente a necessidade de dar continuidade a seu processo de formação, de permanente crescimento e de maior compromisso, que vai exigindo dele um testemunho cada vez mais coerente. Requer, por isso, uma formação mais sólida, baseada fundamentalmente na busca de respostas a seus constantes questionamentos sobre a realidade e sobre o próprio compromisso assumido. À luz dos compromisso já assumidos a opção vocacional que vinha se concretizando desde a passagem da iniciação para a militância se torna mais clara, sendo dados passos concretos para começar a realizar o projeto de vida familiar e profissional.
II. A relação com o grupo O jovem militante necessita revisar sua vida e seu compromisso numa pequena comunidade, onde também celebra sua fé, cresce na dimensão comunitária e se motiva em suas relações. Afirmam-se, assim, seus valores pessoais, a dimensão social de seu compromisso e o sentido da mudança interior, aprofundando-se suas atitudes de solidariedade. O grupo adquire traços muito próprios, mais adaptados às características de seus integrantes e de suas militâncias e às suas possibilidades de tempo e mobilidade, etc. III. A relação com a sociedade A experiência grupal e a tomada de consciência da sociedade em que ele vive levam o jovem militante a questioná-la, sobretudo a partir das situações que deve enfrentar diariamente. Vaise gerando uma mudança em sua maneira de pensar, de sentir de agir, que faz formular as grandes questões políticas, sociais e culturais a resolver em sua vida. Ele começa a assumir compromissos de liderança em organismos intermediários. Na medida em que se incorpora claramente, em seu projeto de vida, reafirma-se sua opção pelos pobres, o que vai dando sentido libertador à sua atividade profissional. IV. A relação com o Deus Libertador O jovem militante vive uma experiência pessoal e comunitária de Jesus e aceita radicalmente o compromisso de segui-lo. Isso vai dando forma a uma espiritualidade já consolidada, expressa e alimentada pela vivência sacramental e pela formação teológica. Sua oração se torna mais interiorizada. Em seu contato com a Palavra de Deus, “descobre” o Antigo Testamento e a História da Salvação como caminho do povo que culmina na vinda libertadora de Jesus Cristo. Vive a Páscoa como um chamado ao crescimento contínuo numa experiência de libertação integral. V. A relação com a Igreja O jovem militante tem maior consciência de sua pertença à Igreja e de sua relação com ela. Assume um papel mais protagônico na comunidade, o que lhe permite ter mais consciência da vida interna da Igreja, com suas contradições e riquezas. Apesar das contradições, chega a comprometer-se com a missão de anunciar o Reino na história: um reino de fraternidade, de justiça e de paz, que não se esgota na sociedade, mas que a transcende até abranger a pessoa humana em sua totalidade. Sua vida na comunidade é testemunho de sua vida eclesial. Os jovens militantes costumam ser o “rosto” da comunidade eclesial, que, através deles, se faz presente nos meios específicos, nas associações de bairro e em todo o tipo de organizações intermediárias. Costumam converter-se também nos membros mais dinâmicos das estruturas pastorais de animação, coordenação e decisão. Com muita frequência, assumem aí importantes responsabilidades. 2.4. Outras formas de sistematização do processo Esse delineamento das “dimensões” e das “etapas” promoveu, na América Latina, o surgimento de diversos “modelos” concretos, que utilizam diferentes terminologias, mas que sistematizam os traços comuns da mesma experiência rica dos processos grupais. Assim, por exemplo: • A Pastoral da Juventude do Brasil propõe cinco dimensões: personalização, integração social, teológico-pastoral, política e capacitação técnica, e seis momentos – referidos sobretudo à etapa de iniciação: descoberta do grupo, descoberta da comunidade e do problema social, descoberta de uma estrutura organizativa mais ampla, descoberta das causas estruturais, descoberta da militância e descoberta das etapas percorridas. • A Pastoral da Juventude do Chile propõe quatro dimensões: personalização, socialização, crescimento grupal e discernimento cristão, e três etapas: motivação e iniciação, amadurecimento da fraternidade e amadurecimento da missão.
• A Pastoral da Juventude do México propõe cinco dimensões: pessoal, grupal, críticoconstrutiva, projeção comunitária e dimensão cristã, e quatro etapas: iniciação, aprofundamento, opções e compromisso. Essas sistematizações, bem como outras que mantêm as mesmas denominações apresentadas neste livro, foram se construindo e verificando sempre a partir da experiência concreta da vida dos grupos de jovens. Significam, por isso, um enriquecimento contínuo à reflexão latino-americana. Na diversidade de suas denominações e conteúdos, assim como na incorporação de novas dimensões – em alguns países estão sendo propostas outras, como a vocacional ou a relação com a natureza –, revelam-se duas realidades: em primeiro lugar, a notável coincidência nos conteúdos, pois todas apontam para a descoberta de um caminho de amadurecimento rumo a um projeto de vida cristã através de uma progressiva abertura do jovem ao mundo e à história; e, em segundo lugar, a consciência de que esses modelos não são esquemas rígidos nem prontos e que sua função é oferecer marcos teóricos válidos para orientar os que querem desencadear e acompanhar processos de formação dos jovens sem cair em improvisações, confusões e manipulações. 2.5. Pastoral Juventude e Pastoral Vocacional 2.5.1. A situação Nos últimos anos, vem-se falando muito das relações que devem existir entre a Pastoral da Juventude e a Pastoral Vocacional. Cada vez mais os animadores vocacionais vão descobrindo que a proposta e o acompanhamento vocacional pressupõem aspectos fundamentais da formação humana e cristã, a que devem fazer referência. Têm consciência de que ser pessoa e ser cristão é a primeira grande vocação a que todos são chamados e à qual está ligada qualquer outra vocação particular. Cada vez mais, também, os agentes da Pastoral da Juventude vão descobrindo que a proposta de formação humana e cristã que apresentam aos jovens leva estes a se comprometer com um projeto de vida que tem a ver com todos os aspectos de sua pessoa, incluindo a definição vocacional. 2.5.2. A fundamentação Medellín já dizia que, “para ser plenamente autêntica, a pastoral da juventude deve levar os jovens, por meio de um amadurecimento pessoal e comunitário, a assumir um compromisso concreto perante a comunidade eclesial em algum dos mencionados estilos de vida” (M 13,25) e capacitá-los, “através de uma autêntica orientação vocacional, a assumir sua responsabilidade social como cristãos no processo de mudança da América Latina” (M5,16). Puebla reconhece, onze anos depois, os frutos da ação neste sentido, afirmando que em muitos países os grupos de jovens, “têm sido ambientes efetivos de pastoral vocacional” (P 850). Ratifica que “toda Pastoral de Juventude, deve ser, ao mesmo tempo, pastoral vocacional” (P 865) e diz ser mister “reativar uma intensa ação pastoral que, partindo da vocação cristã em geral e de uma pastoral da juventude entusiasta, dê à Igreja os servidores de que necessita” (P865, cf. P 1189). Insiste em que os grupos de jovens “são lugares privilegiados da Pastoral Vocacional” (P 867) e em que “se deve dar à pastoral vocacional o posto prioritário que tem na pastoral de conjunto e, mais concretamente, na pastoral da juventude e familiar” (P 885). Propõe uma pastoral da juventude “que leve em conta a realidade social dos jovens de nosso continente; atenda ao aprofundamento e ao crescimento da fé para a comunhão com Deus e com os homens; oriente a opção vocacional dos jovens; ofereça-lhes elementos para se converterem em fatores de mudança e lhes proporcione canais eficazes para a participação ativa na Igreja e na transformação da sociedade” (P 1187). Santo Domingo constata que “cresceu o interesse por uma pastoral que apresente com clareza aos jovens a possibilidade de um chamado do Senhor” (SD 79); reafirma a necessidade de estruturar “uma pastoral vocacional inserida na pastoral orgânica da diocese, em estreita vinculação com a pastoral da juventude e familiar” (SD 80) e recorda, novamente, que “a pastoral da juventude deve ter sempre uma dimensão vocacional” (SD 114).
Na mesma linha, o Documento da Congregação para a Educação Católica, intitulado “Desenvolvimento da Pastoral das Vocações nas Igrejas Particulares” , afirma que a “pastoral da juventude e a pastoral vocacional são complementares”101.E acrescenta: “A pastoral da juventude e a pastoral vocacional não são duas atividades separadas, justapostas e ocasionais”102 “A pastoral da juventude é completa e eficaz quando se abre à dimensão vocacional”103. Segundo esse magistério eclesial, a pastoral vocacional está “dentro da”, não “junto da” e muito menos “fora” da pastoral da juventude, e a pastoral da juventude inclui, entre seus objetivos, a proposta vocacional, embora esta tenha aspectos específicos, já que se preocupa com cada vocação, atende todas as vocações de modo diferenciado e seu alcance atinge toda a comunidade eclesial. 2.5.3. A proposta O processo de educação na fé ora descrito, mostra que a Pastoral da Juventude LatinoAmericana, tem muito claro que esses processos integram a definição vocacional, pois, sem ela, o amadurecimento humano e cristão dos jovens ficaria truncado. Isso porque crê que as vocações surgem onde se dão processos que permitem aos jovens encontrar-se com Jesus, descobrir as necessidade do mundo e da Igreja, receber propostas vocacionais concretas e ser contagiado pelo testemunho entusiasta de quem os acompanha. É a mesma convicção do Documento da Congregação para a Educação Católica: “A pastoral da juventude tem dado muitas vocações à Igreja”104. Uma pastoral da juventude realizada da maneira aqui exposta tem muitos pontos de encontro com elementos fundamentais de uma Pastoral Vocacional: O chamado do Senhor é sempre concreto e se encarna na situação real de cada pessoa. “Vocação” e “projeto de vida” são dois aspectos de uma mesma realidade: o chamamento de Deus através de sinais que são interpretados à luz da fé e o caminho de realização intuído, descoberto, assumido e elaborado pela pessoa. O método “ver-julgar-agir-revisar-celebrar” e a experiência grupal e comunitária criam hábitos de discernimento que capacitam para a resposta vocacional. A ação direta em favor dos demais é um exercício de entrega, um encontro com as necessidades dos irmãos e uma experiência da força libertadora da ação de Deus, que predispõe à entrega total da vida a serviço do Reino. A reflexão sobre o próprio projeto de vida treina para uma atuação prazeirosa das opções feitas em resposta às necessidades da Igreja e da sociedade. A relação pessoal cm um assessor ajuda a descobrir as próprias disposições e inclinações e dar coerência às respostas. Todo grupo Jovem assim trabalhado torna-se “vocacional”. “Os grupos de jovens possuem, por sua própria natureza, uma pedagogia mais apta para favorecer as vocações sacerdotais, religiosas, missionárias e leigas consagradas, precisamente porque cooperam mais diretamente no ministério pastoral e, portanto, na vida e missão da Igreja”105. Toda pastoral da juventude que procura ajudar o jovem a descobrir sua vocação como projeto de vida, necessita da pastoral vocacional para iluminar e levar a bom termo esse projeto. Toda pastoral vocacional que procura desenvolver um proposta educativa precisa de uma pastoral da juventude que a apoie e a sustente. A pastoral vocacional não articulada com a pastoral da juventude pode produzir alguns resultados imediatos, mas logo se reconhecerá ineficaz e até perigosa pela desorientação que pode provocar nos jovens e pelo desgaste de energias a que submete os agentes pastorais. 101
Sagrada Congregação para a Educação Católica, Desenvolvimento da pastoral das vocações nas Igrejas particulares, 6 de janeiro de 1992, nº67. 102 Ib, 68. 103 Ib, 70. 104 Ib, 70. 105 Ib, 86.
A pastoral vocacional não poderá ser um conjunto, de ações isoladas, à margem da pastoral da juventude, pois faz parte de seu processo. Cumprindo sua missão orientadora, estará recordando-lhe continuamente a meta a que esta deve chegar. A pastoral da juventude, por sua vez, terminará na pastoral vocacional. Cumprindo sua missão, preparará o caminho para que os jovens possam descobrir o lugar específico em que Deus os chama para construir o Reino. Ambas as pastorais, portanto, necessitam-se mutuamente. “Um projeto da pastoral da juventude deve propor-se como fim último o amadurecimento num diálogo pessoal, profundo, decisivo, do jovem com o Senhor. A dimensão vocacional, portanto, é parte integrante da pastoral da juventude, a ponto de afirmar sinteticamente: a pastoral específica das vocações encontra na pastoral da juventude seu espaço vital, e a pastoral da juventude, é completa e eficaz quando se abre à dimensão vocacional”106 3. AS PASTORAIS ESPECÍFICAS DE JUVENTUDE Para poder apresentar “de modo atraente e acessível à vida dos jovens os ideais evangélicos” (SD 120), é necessário chegar não só ao jovem em geral, mas ao jovem em sua situação e meio particular, no momento e nas dificuldade pelas quais ele passa diariamente. Só assim será possível uma pastoral da juventude “que anuncie, nos compromisso assumidos e a na vida cotidiana, que o Deus da Vida ama os jovens e quer para eles um futuro diferente, sem frustrações nem marginalizações, em que a vida plena seja fruto acessível para todos” (SD 118). Por isso a Pastoral da Juventude Latino-Americana opta por uma pastoral da juventude orgânica e diferenciada que se desenvolva nos meios e ambientes próprios “onde os jovens vivem e agem” (SD 119. 3.1. Fundamentação 3.1.1. O projeto criador de Deus e os meios específicos O sistema neoliberal intensifica a pobreza e a miséria, destrói o meio ambiente e altera as condições de saúde psíquica e física, atentando contra a integridade da pessoa humana. Provoca uma crise de subjetividade pessoal e social porque desenraiza o ser humano de sua terra, deixandoo sem identidade nem povo, cidadão do mundo, perambulando em busca de trabalho, do pão e de um lugar digno para viver e descansar. Essa situação contrasta radicalmente com o plano de salvação revelado por Deus, no qual a pessoa humana é criada para participar de um projeto de salvação em que a unidade e a diversidade se expressam harmonicamente. • A pessoa humana foi criada especificamente homem e mulher. Como tais, são responsáveis diante de Deus pela realidade criada, cujo cuidado lhes foi confiado (Gn 1,27). • Deus manifestou sua imagem fomentando, ao mesmo tempo, as diferenças e a unidade dos diferentes. Rejeitou a uniformidade e estabelecei a diversidade de línguas para que as pessoas humanas se dedicassem às tarefas cotidianas e não a construir “babéis” que as desnaturalizam, enchendo-as de vanglórias (Gn 11,1-9). • Escolheu um poro concreto e projetou, a partir dessa concreção e particularidade, uma universalidade que inclui uma profusão de especificidades. É o projeto do Reino: ser pai de uma multidão de povos (Gn 17,4-5), anunciar suas maravilhas a todos fazendo com que cada um as entenda em sua própria língua (At 2,1-11), ser um Reino de que participe todo tipo de povo. (Ap 7,9). • Quis salvar todos os homens por meio do povo de Israel. Apesar da recusa deste, manteve sua vontade de fazer uma aliança definitiva através de seu Filho, Palavra Encarnada que habita num povo concreto. A salvação é, assim, o dom da vida que Deus continua oferecendo “hoje” (Lc 19,9) a todos os homens (At 1,8) em Jesus Cristo, por mediação da Igreja. Isso tem a ver com o sentido profundo da 106
João Paulo II, Mensagem à XXXII Jornada Mundial de Oração pela Vocações, 7 de maio em 1995, nº3.
vida e com a fé pessoal e específica no chamado feito por Jesus (Lc 7,50; Mc 5,33). Tem a ver também com a resposta ao chamado para construir um mundo no qual se realizem, cada vez mais fortemente, os valores do Reino, a partir da realidade de pessoas singulares, “únicas e irrepetíveis”107 que participam livremente dele. Desde a criação, cada homem e cada mulher recebem, como dons, qualidades e valores específicos, capazes de presentificar e prolongar sacralmente a ação salvífica de Deus na história. A própria criação já supõe um chamado (Ef 1,5) à vida. A resposta a este chamado, contudo, só pode concretizar-se a partir da especificidade do dom que cada um recebeu. Por isso, cada vocação particular no mundo é raiz de uma missão sagrada, insubstituível, que marca indelevelmente a vida pessoal de cada indivíduo. A juventude é o momento da vida mais propício para descobrir esse chamado e apropriar-se dessa missão. 3.1.2. Jesus e os meios específicos Como parte de sua ação salvífica, Jesus passou pelas diversas etapas do crescimento humano e agiu de acordo com elas (SD 111). Anunciou a salvação universal a partir de setores bem concretos do povo: pobres, cativos, presos, cegos e coxos (Lc 4, 16-19; Mt 11, 4-6). Chamou os jovens não somente em geral, mas a partir de situações específicas: o jovem “rico” (Lc 19,23), o jovem “filho único” (Lc 7,12), a jovem “filha (Mc 5,23). Chamou cada um dos discípulos a partir de sua situação específica, convidando-os a ser “pescadores de homens” (Mc 1,18). Deslocou-se continuamente do meio rural para o meio urbano, passando por aldeias, dirigindose a pessoas de ocupações diferentes e de diversos setores sociais, chamando a todos a participar da salvação e a converter-se a partir de sua situação específica. Também a primeira Igreja se preocupou com os ambientes e as problemáticas particulares: tratou Atenas como cidade intelectual (At 1,18) e mostrou a cada cidade a situação particular da qual devia se converter (Ap 2,3). Salvou no caminhar cotidiano de sua vida e de sua pregação, particularmente quando concluiu sua missão em Jerusalém. Não morreu no templo; entregou sua vida fora da cidade, a céu aberto, para “penetrar assim no templo do céu” (Hb 9,24). O Evangelho é anunciado e ocorre sempre “em meio” a situações específicas (At 17,20; Jo 20,19). Os setores específicos concretizam e mediatizam a salvação universal. O lugar privilegiado para realizar o encontro salvífico com o Senhor é o espeço da vida cotidiana. É na rua, como lugar concreto e como encruzilhada histórica, que os jovens têm de encontrar hoje os sinais de vida que lhes permitam alcançar a vocação plena a que são chamados. 3.1.3. A Igreja e os meios específicos A Igreja é uma comunidade uma e diversa: um corpo e muitos membros, um só Espírito e diversidade de carismas (1 Cor 12,12). Na unidade do corpo da Igreja, reconhecem-se tanto as partes que a compõem e a expressam como as atividades próprias de cada uma. Como membros da Igreja, os jovens não são um todo monolítico, mas um conjunto de pluralidades dinâmicas, setores e realidades que os conformam e os definem. Por essa razão, a Igreja, chamada a evangelizar o mundo do jovens, não pode estar ausente dos meios nos quais eles vivem, trabalham, estudam e lutam dia a dia. Esses meios são parte constitutiva de suas pessoas. A Igreja se faz presente e se encarna em cada meio específico atráves dos jovens que, tendo escutado o chamado do Senhor para transformar a sociedade segundo os valores do Reino, são sensíveis e fazem suas as aspirações, valores, sofrimentos e frustrações que animam as buscas de seu espaço. A salvação não é um chamado nem um dom abstrato e geral. Por sua própria natureza, acontece encarnada nas circunstâncias espaço-temporais-relacionais de cada pessoa e de cada grupo humano. Por isso, os meios específicos constituem, para a Pastoral da Juventude, o ambiente humano privilegiado onde anunciar, encontrar e realizar a salvação. 107
João Paulo, exortação apostólica Christifideles laici, 37.
3.1.4. A Pastoral da Juventude e os meios específicos A Pastoral da Juventude Orgânica é uma, mas sua organicidade se expressa de diferentes maneiras. É uma, porque se dirige a todo jovem como sujeito de uma dignidade e uma vocação que a Igreja reconhece, acolhe, suscita e alenta. Mas se realiza de diferentes maneiras, segundo a enorme diversidade de experiências que se dão no meio da juventude: dedicando-se a cultivar, a partir do Evangelho, os valores juvenis nos diferentes ambientes da vida paroquial, na base da Igreja e em suas ações mais amplas a serviço dos jovens; cultivando esses mesmos valores nas Pastorais Específicas de Juventude, a partir das categorias da vida social; desenvolvendo novas formas de evangelização em resposta às necessidades de situações novas, críticas, recreativas ou artísticas; abrindo caminhos à juventude popular na diversidade de realidades que envolve em meio ao atual processo de exclusão. 3.2. Descrição de meio específico O passar do tempo e o aprofundamento da reflexão e da prática ajudam a descrever a realidade do meio específico. O meio específico é, portanto: • Um espaço claramente delimitado por motivos econômicos, políticos ou culturais onde o jovem se desenvolve e passa a maior parte ou uma parte muito significativa de seu tempo; • Um espaço onde o jovem partilha interesses, preocupações e linguagem comum com outros jovens, o que lhes permite criar condições suficientes para organizar-se na busca de respostas a suas necessidades e problemas; • Um espaço onde é possível dar impulso a processos de educação sistemática que o capacite a cumprir seu papel como cidadão; • Um espaço a partir de onde o jovem é chamado a intervir na sociedade e na Igreja como protagonista. 3.3. Características das Pastorais Específicas de Juventude As Pastorais Específicas de Juventude são uma opção, a partir da fé, por uma ação concreta que busca presentificar o Reino de Deus e transformar, com a força do Evangelho, a complexa realidade do mundo em que se vive. Elas privilegiam a participação em espaços humanos próprios, definidos por certa institucionalidade, no interior da sociedade, onde as pessoas se nucleiam em torno de preocupações específicas comuns, relacionadas principalmente com problemas de sobrevivência, trabalho, saúde, estudo, identidade étnica ou cultural e situações críticas de marginalização. As Pastorais Específicas de Juventude promovem processos educativos conscientizadores para a transformação social. Buscam a conversão pessoal e social de cada meio ao Evangelho e a aquisição, por parte dos jovens, de uma identidade madura e de um sentido de pertença a uma realidade concreta que lhes permita anunciar a proposta do Reino com sinais, linguagens, organizações e valores próprios. As Pastorais Específicas de Juventude querem favorecer o protagonismo dos jovens na evangelização das realidades temporais e formar cristãos comprometidos na construção da civilização do amor. As Pastorais Específicas de Juventude querem servir aos jovens em seus ambientes específicos e, a partir daí, iluminar suas vidas no seguimento de Jesus, mediante uma evangelização integral que proporcione meios, mística, alternativas e propostas novas de estilos de vida e de militância, sem tirá-los de seu ambiente, de suas raízes, culturas e valores, e os faça conscientes de sua realidade e solidários com os mais necessitados e oprimidos. As Pastorais Específicas de Juventude não podem desenvolver-se em torno de problemáticas circunstanciais. Sendo seu objetivo promover mudanças pessoais e sociais, exigem períodos de tempo suficientemente amplos para poder promover processos globais de educação. Sem uma certa organizacidade, é impossível conseguir mudanças substanciais quer na Igreja, quer na sociedade. As Pastorais Específicas de Juventude são uma forma concreta e válida de tornar efetiva a opção preferencial pelos pobres, de viver uma Igreja com sentido missionário e uma pastoral da
juventude que saia em busca dos mais afastados. Elas colocam a Igreja e a pastoral da juventude cara a cara com o mundo e a realidade, chamam-nas a ser “sal” (Mt 5,13) e “fermento” (Mt 13,33) e lhes dão possibilidade de trabalhar junto com que não pertence à Igreja, mas que busca, igualmente o bem e a promoção dos jovens e da sociedade. 3.4. Descrição das Pastorais Específicas de Juventude As Pastorais Específicas de Juventude atualmente vigentes e com organização própria são a Pastoral da Juventude Rural-Camponesa, a Pastoral da Juventude Estudantil, a Pastoral da Juventude Operária de Trabalhadores, a Pastoral da Juventude Universitária e a Pastoral de Jovens em Situações Críticas. Os nomes dessas pastorais variam de um país para o outro, e os termos aqui usados não são admitidos universalmente. 3.4.1. A Pastoral da Juventude Rural-Camponesa Desafios Um grande número de jovens latino-americanos vive ainda no ambiente rural. É um grupo humano que possui valores morais, sociais, culturais e religiosos próprios. Contudo, é cada vez menos atendido e escutado e frequentemente carece de recursos necessários para uma vida humana digna. A partir de sua própria cultura, de sua visão de mundo e dos valores de suas vivências cotidianas, a Pastoral da Juventude é chamada a anunciar-lhes a boa nova do Evangelho e a colaborar na busca de respostas concretas para que possam manter seu papel ativo na produção e para que continuem lutando por conservar seus valores e suas raízes no contato com o mundo urbano. Objetivo geral Acompanhar o jovem rural-camponês em seu crescimento pessoal e comunitário, na redescoberta de sua identidade e de seus valores religiosos e na tomada de consciência de seus direitos sobre a terra para que, junto com outros jovens e adultos rurais-camponeses, abra canais de expressão e organização e se constitua em agente de mudança e semeador de esperança de uma sociedade justa e fraterna. Propostas Fortalecer a identidade cultural dos camponeses, resgatando seus valores, defendendo a idiossincrasia própria de suas comunidades e purificando sua religiosidades popular. Desenvolver a consciência do direito à posse, produção e proteção da terra, conhecendo e analisando profundamente sua problemática, mantendo contatos com os Movimentos de Defesa da Terra, gerando formas alternativas de produção e propiciando uma transferência de tecnologia adequada. Redescobrir e revalorizar as histórias e as tradições das comunidade rurais e promover a conservação, defesa, recriação e enriquecimento dos valores próprios de seu estilo de vida, especialmente a hospitalidade, a comunitariedade e a solidariedade. Promover os grupos de jovens como espaços de crescimento pessoal, conhecimento da realidade, aprendizagem da produção, e amadurecimento do compromisso cristão a serviço da realidade e elaborar com eles, a partir de sua realidade social, cultural, econômica, política, religiosa, planos de formação que os capacitem para seu protagonismo na Igreja e na sociedade. Educar a consciência política e social e promover a participação dos jovens nos organismos intermediários existentes ou a serem criados para que se tornem fatores de mudança. Fortalecer as organizações rurais e coordená-las com instâncias eclesiais e não-eclesiais que trabalham no meio, promovendo espaços de encontro para o mútuo conhecimento, intercâmbio de serviços e execução de ações conjuntas.
3.4.2. A Pastoral da Juventude Estudantil Desafios • Manter um diagnóstico atualizado sobre a realidade dos sistemas educativos e do meio estudantil e estar atento à emergência de novos sujeitos sociais e à revalorização de novas dimensões da vida dos estudantes. • Gerar espaços onde os estudantes possam discutir mais sistematicamente os princípios e as práticas do sistema educativo, a partir de suas experiências cotidianas de participação na vida estudantil. • Ajudar os jovens a descobrir e desenvolver sua identidade pessoal e a ser capazes de forjar seus próprios projetos de vida e suas opções vocacionais a partir da realidade estudantil. • Estimular processos educativos da fé que permitam os jovens estudantes assumir um estilo de militância no qual conjuguem fé e vida e se realiza o serviço aos mais pobres, a partir da perspectiva de sua realidade estudantil. Objetivos Gerais Acompanhar os jovens estudantes num processo de formação humano-cristã que lhes permita perceber e viver o comunitário em íntima relação com Cristo, com seus irmãos e com o mundo e os anime a descobrir seus valores e a ser agentes transformadores do meio estudantil, para que construam comunidades evangelizadoras e sejam protagonistas da nova sociedade. Campos de ação Para desenvolver uma ação evangelizadora mais integral e eficaz, a Pastoral da Juventude Estudantil considera importante realizar sua tarefa em quatro campos de ação: Na escola. Na escola costumam coexistir, ao mesmo tempo, duas formas de ação pastoral que é importante distinguir: a “pastoral do aluno”, que realiza a escola e tem como agente a própria comunidade educativa, da qual o aluno faz parte, e a “pastoral da juventude estudantil”, que tem um marco teórico próprio e cujos agentes são os próprios jovens, assessorados pelos adultos. Uma autêntica pastoral do aluno deverá levar a uma pastoral da juventude estudantil. No bairro. Todo jovem geralmente tem seu grupo natural de amigos de bairro com o qual costuma reunir-se para conversar, sair, divertir-se e tratar de seus assuntos de jovens. Embora esses grupos nem sempre ajam de modo construtivo, devem ser levados em consideração pela influência que exercem na formação do jovem estudante. Alguns militantes desenvolvem atividades transformadoras nos bairros populares, vinculando, assim, a escola e o projeto popular. Muitas vezes é possível chegar a eles através de ações que os próprios jovens militantes impulsionam. Nas organizações estudantis. São grupamentos que procuram reunir os estudantes em torno de atividades culturais, recreativas ou sociais, com os quais buscam promovê-los e oferecer-lhes novos espaços e possibilidades para completar a ação educativa. Aparecem como a expressão organizada do corpo estudantil. Na política estudantil. O jovem estudante não pode ignorar a existência dos grêmios estudantis e do movimento estudantil. É importante participar deles para evitar manipulações políticas de outros setores interessados e assegurar que, efetivamente, sejam instrumentos a serviço das necessidades e interesses do meio estudantil. Propostas o Promover a Pastoral da Juventude Estudantil onde não exista e fortalecer qualitativamente as já existentes, formando novos grupos, promovendo o intercâmbio entre os já existentes, a formação integral de seus membros, e capacitando assessores e animadores para que possam dar um acompanhamento adequado aos grupos.
o Organizar estruturas de acompanhamento e coordenação que garantam espaços de avaliação, planejamento e aprofundamento e ofereçam serviços de cursos, seminários, retiros, subsídios, livros, etc. para a formação de jovens. o Formar a consciência crítica dos Jovens, de maneira que questionem constantemente a realidade estudantil e social e seu próprio trabalho à luz do Evangelho, descubram os sinais de vida e de morte que há neles e colaborem, assim, na construção da nova sociedade. o Impulsionar a participação ativa dos jovens nas organizações estudantis, capacitando-os adequadamente no conhecimento da realidade e nas linhas principais das discussões sobre a problemática estudantil. o Formar assessores, de preferência educadores e leigos, que animem e acompanhem os estudantes em seu processo de formação na fé e em sua ação cada vez mais comprometida no meio estudantil. 3.4.3. A Pastoral da Juventude Operária/de Trabalhadores Desafios Melhorar as condições de vida cada vez mais difíceis dos ambientes operários/populares, submetidos a uma crescente marginalização econômica, política, social e educativa. Desenvolver a consciência dos jovens operários quanto à pertença deles a um povo oprimido; quanto à sensibilidade por tudo o que se vive e se sofre em seus diversos ambientes e quanto à solidariedade com todos os esforços por libertá-los de toda exploração, injustiça e individualismo. Responder ao dinamismo e à disponibilidade generosa e criativa dos jovens, em sua caminhada de fé, solidária, eclesial, crítica e ativa, para a construção de uma nova sociedade segundo os desígnios de Deus Pai. Apresentar a Igreja de Jesus ao mundo dos trabalhadores, comprometendo-se com eles, reconhecendo na vida e na lita dos jovens operários a presença do Espírito de Jesus e gerando, a partir dos próprios ambientes de trabalho, jovens cristãos comprometidos com a vivência do Evangelho e com a construção da civilização do amor. Convidar os jovens à esperança, com a certeza de que é possível viver hoje segundo o amor de Jesus e de que as lutas por uma vida digna não são em vão, pois Deus mesmo apostou nessa vida digna para seu povo. Objetivo geral Evangelizar, a partir da opção preferencial pelos pobres, os jovens operários e trabalhadores, no próprio mundo do trabalho, para que se tornem agentes construtores de uma nova sociedade, justa e fraterna, pré-anúncio do Reino de Deus. Propostas ◊ Aprofundar o conhecimento dos pressupostos, dos mecanismos e das ações do sistema neoliberal e sua repercursão nos processos econômicos-sociais da realidade e na vida dos joves trabalhadores. ◊ Possibilitar a relação, o reconhecimento e o intercâmbio de todas as experiências pastorais que procuram servir e acompanhar os processos de crescimento humano e cristão dos jovens trabalhadores. ◊ Motivar os jovens operários a ser construtores de uma sociedade mais justa e fraternal, onde possam descobrir sua própria dignidade e viver o verdadeiro sentido humano do trabalho. ◊ Descobrir os valores da cultura operário-trabalhadora e participar, com senso crítico, de seus movimentos e organizações, para que fiquem imunes à manipulação política e possam servir às necessidades dos próprios trabalhadores e à construção de uma sociedade mais justa e democrática.
◊ Sensibilizar toda a comunidade quanto à importância de uma presença eclesial no mundo do trabalho e convocar à solidariedade para com as causas justas dos trabalhadores. 3.4.4. A Pastoral da Juventude Universitária Desafios A tendência à especialização do saber e as tentativas de privatização da universidade não ajudam o desenvolvimento de uma visão global da pessoa humana e o desejo de encurtar as distâncias entre o saber acadêmico e o saber popular. O rigor científico e o saber acadêmico podem converter-se em ferramentas eficazes a serviço da promoção e do desenvolvimento dos povos. O processo global de exclusão de mão-de-obra a que estão submetidos os jovens universitários pela falta de trabalho faz com que eles estudem em permanente insegurança e estejam sujeitos a um sistema de competição que não lhes permite o desenvolvimento profissional para o qual se capacitaram. As situações de exclusão, as influências ideológicas, a confusão vocacional, a necessidade de ter de trabalhar, a falta de recursos econômicos e a multiplicidade de atividades de que são obrigados a participar favorecem a fragilidade psicológica de muitos jovens universitários. A perda de identidade como universitário protagonistas da sociedade e a perda do sentido de classe que se produz em muitos deles impedem-nos de entender realmente os processos históricos, pessoais e sociais em que vivem e de comprometer-se em grupos , instituições e serviços de promoção dos setores populares. A racionalidade funcional e política e algumas características da sociedade pós-moderna, como o ceticismo, a fragmentação da consciência e a subjetividade reduzida ao individualismo, dificultam uma educação humanista que continua no sentido de levar os jovens universitários a forjar convicções profundas e definidas. Uma grande interrogação é como ajudar os jovens universitários a descobrir o sentido da Igreja, quando a principal razão do afastamento de muitos deles são as posições, os antitestemunhos e as posturas da própria Igreja. Objetivo geral Ser presença evangelizadora no meio que, como sinal do Reino de Deus, convoque os universitários a viver comunitariamente a sua fé, a confrontá-la com a ciência e com a cultura e a concretizá-la num compromisso para a transformação para a nova sociedade. Propostas o Qualquer proposta evangelizadora da juventude universitária deve partir e assumir conscientemente sua situação concreta e, daí, apresentar a pessoa de Jesus Cristo vivo e próximo em toda a sua integridade e propor a adesão dele e a seu estilo de vida. o Promover uma pedagogia da razão e da sensibilidade, uma linguagem do sentido, ao mesmo tempo intuitiva e discursiva, e uma teologia e uma eclesiologia que permitam passar do superficial ao profundo, facilitem a vida e a celebração da fé e levem a descobrir o mistério de Deus a partir do mistério pessoal. o Fazer da universidade um espaço de confrontação e dialogo entre fé e ciência, fé e cultura, fé e desenvolvimento tecnológico e um lugar onde se possa vivera fé como risco, como confrontação e como luta contra o crescimento de visões religiosas intimistas, espiritualistas e de fuga, voltadas para o fundamentalismo religioso. o Fazer da Pastoral da Juventude Universitária uma pastoral integrada nos processos de mudança da sociedade, em que os jovens dêem suas contribuições solidárias com as diferentes formas de organização popular, com os movimentos sociais e com as novas formas de ação política e de participação democrática.
o Incentivar a participação dos universitários cristãos nas organizações estudantis, organismos intermediários e nas estruturas sociais, como lugares privilegiados para a transformação da universidade e para a construção da civilização do amor. 3.4.5. A Pastoral de Jovens em Situações Críticas Desafios A organização socioeconômica contemporânea gera cada vez mais, uma desigualdade tal que poucos são os que vivem em condições de abundância, enquanto a grande maioria encontra-se em situações de pobreza, com todas as suas manifestações e consequências. Esse quadro estrutural é gerador de situações de marginalização e desvantagem social, especialmente para os jovens, que por si só constituem, um setor já vulnerável. Os jovens sucumbem a graves problemas, como a delinquência, a toxicomania ou a prostituição, após processos de desintegração pessoal de curta duração. Tais processos geralmente se iniciam na infância, por influência do ambiente familiar, escolar e comunitário. Embora as manifestações de crise dos jovens possam ser muito variadas – toxicomania, violência, delinquência, prostituição, homossexualismo, vadiagem, etc. – suas origens são comuns: pobreza, desintegração da pessoa, desvantagem diante do mundo adulto e consequências herdadas de um sociedade cada vez mais desumanizadora. Os jovens em situações críticas não se concentram num mesmo lugar, como ocorre claramente com os demais setores específicos. A unidade do setor radica-se nas condições de sofrimento e desintegração em que vivem. Ocasionalmente é possível encontrá-los no bairro, na rua, na prisão ou em algum centro de recuperação, porém a grande maioria está só e isolada. Todos os jovens correm o risco de sucumbir a alguma situação crítica. Daí a forte relação deste setor com os demais. É cada vez mais urgente uma ação preventiva, que eduque e promova, evitando que a grande maioria dos jovens chegue a tais situações. Requer-se também uma ação direta em nível de reabilitação e uma intervenção direta nos grupos já afetados, para devolver-lhes sua humanidade e sua dignidade. Objetivo geral Promover os jovens que vivem em situações críticas de marginalização e desvantagem social para que possam chegar à plena realização pessoal e sejam capazes de reintegrar-se à vida social. Campos de ação Os campos naturais são os espaços próprios onde os jovens vivem e interagem: o bairro, a rua, as zonas de prostituição, a família, etc. Os campos artificiais são os espaços onde os jovens estão com uma finalidade específica de reabilitação: cárceres, centros de recuperação, hospitais, escolas, etc. Também existem espeço próprios de natureza eclesial, como as paróquias, embora não seja comum que a ação pastoral com esses jovens se realize inicialmente aí. As experiências pastorais podem estar dirigidas a algum grupo em particular, mas não devem esquecer que, muito facilmente, um mesmo jovem pode estar em várias situações críticas ao mesmo tempo, como o jovem de rua que se droga e comete atos delitituosos. Propostas ◊ Conscientizar jovens e adultos de que as situações críticas podem afetar qualquer pessoa e de que não se trata de situações e problemas distantes da realidade cotidiana. ◊ Que a Pastoral da Juventude se comprometa numa ação mais solidária com aqueles que vivem essas situações de sofrimento e desvantagem social. Que não se limite exclusivamente ao
tipo de serviço prestado aos jovens que não sofrem problemas graves, são socialmente aceitos e ligados ao ambiente eclesial. ◊ Que a Pastoral da Juventude em Situações Críticas seja principalmente preventiva, ou seja, procure formar o jovem para enfrentar as situações e vencer os obstáculos que podem acarretar a desintegração de sua vida e de sua personalidade. ◊ Desenvolver experiências de atenção pastoral integral aos jovens com alguma situação crítica específica, visando tratar problemas mais ou menos comuns, apoiando-se nos aspectos científicos e conseguindo a co-responsabilidade da sociedade na atenção aos mais necessitados. ◊ Trabalhar na promoção humana dos jovens que têm algum problema específico, superando as ações meramente assistenciais e orientando-os para uma participação política que favoreça a mudança estrutural. ◊ Capacitar agente de pastoral especializados, que conheçam a realidade e sejam sensíveis ao sofrimento dos jovens em cada situação concreta. ◊ Animar uma espiritualidade que nasça da realidade difícil vivida pelos jovens e vislumbre a esperança de uma vida nova, baseada no mistério da cruz e na ressureição de Jesus. 3.5. As Pastorais Específicas de Juventude na Pastoral da Juventude Orgânica A experiência das Pastorais Específicas de Juventude na Pastoral da Juventude Orgânica veio se concretizando nos últimos anos. Surge como um caminho novo para aprofundar e melhorar a presença nos diversos ambientes Jovens. Embora dotadas de características diferentes, trata-se de uma mesma proposta: ser Igreja jovem, viva e comprometida com o povo, para a construção do Reino de Deus nos diferentes ambientes específicos em que os jovens vivem. Por isso, trabalham em coordenação e apoio mútuo, assumindo a diversidade como fonte de enriquecimento. A preocupação com a evangelização dos ambientes específicos não pode ser apensas das Pastorais Específicas de Juventude: deve ser de todos, já que é uma opção pedagógica da única Pastoral da Juventude Latino-Americana. As Pastorais Específicas da Juventude estarão atentas para não incorrer num paralelismo com a Pastoral da Juventude Orgânica ou com a pastoral de conjunto de toda a Igreja. Falou-se apenas destas Pastorais Específicas de Juventude porque elas já conseguiram uma certa articulação no âmbito latino-americano. É um desafio para que os demais setores alcancem também uma articulação semelhante. Além das Pastorais Específicas de Juventude, há muitas outras organizações não-eclesiais que atuam no campo dos meios específicos e visam promover e melhorar a situação dos jovens que vivem neles. As Pastorais Específicas de Juventude têm como desafio relacionar-se com elas. Tal relação permite um aprendizado mútuo. Estabelece-se um intercâmbio de experiências visando à promoção dos valores de responsabilidade, justiça, igualdade e solidariedade e à soma de esforços na tarefa de construir a civilização do amor. 4. A ORGANIZAÇÃO DA PASTORAL DA JUVENTUDE A organização é outra opção pedagógica da Pastoral da Juventude. Como parte fundamental de sua missão, ela organiza-se a partir da base, gerando um processo dinâmico de comunhão e participação e criando estruturas de coordenação, animação e acompanhamento que permitem o intercâmbio entre as experiências que se realizam nos diferentes níveis da Igreja: grupos ou comunidades, paróquias, áreas pastorais, vicariatos ou decanatos; dioceses, país, região e continente. A organização favorece a formação na ação dos jovens, gera espaços de diálogo e de decisão para a condução co-responsável de toda a ação pastoral e educa sua inserção na sociedade para fomentar, a partir daí, as urgentes mudanças de estruturas que se fazem necessária. A organização promove, também, o protagonismo juvenil. Abre aos jovens novas dimensões e setores da vida da Igreja. Educa-os para o diálogo com outras experiências do mundo juvenil e da sociedade e possibilita sua incorporação na tarefa concreta de transformação da realidade, com base em sua participação consciente, dialogante e protagônica nas estruturas da sociedade.
Como expressão do espírito de fraternidade que brota do Evangelho, a organização privilegia a pessoa sobre a estrutura, é um vínculo construtivo de relações interpessoais que humanizam e se converte em espaço evangelizador que torna real uma nova ordem eclesial e social. A partir do grupo juvenil, com espírito de co-responsabilidade e serviço, nascem coordenações e serviços que buscam responder às etapas de seu desenvolvimento integral e abarcar os meios específicos onde os jovens atuam, criando espaços de participação e acompanhamento e favorecendo sua incorporação ativa na vida da Igreja e da sociedade. Sem organização entre si, os grupos se fechariam numa visão parcial e limitada e perderiam a memória histórica, a fidelidade à ação evangelizadora e o sentido de Igreja. A organização deverá ter em conta as diferentes experiências pastorais da Igreja. Procurará uma relação especial com a Pastoral dos Adolescentes, a Pastoral Vocacional, a Pastoral Catequética, a Pastoral Educacional e a Pastoral Familiar, respeitando sempre os processos e dinamismos próprios de cada um. Terá de assumir o caminho, as contribuições e a organização próprios das Pastorais Específicas de Juventude e estabelecerá relações com os Movimentos Apostólicos de Juventude e com todos os grupos ou organismos juvenis que participam da formação das diversas juventudes do continente. A coordenação e a organização fazem parte da mesma missão evangelizadora (P 1306). Não se trata, pois, de algo sem importância e ao qual se pode ser indiferente, participar ou não. Se não existem, é preciso cria-las; se são deficientes é preciso ajudar a melhorá-las; se estão a caminho é preciso incentiválas e dinamizá-las. O que não pode é isolar-se e criar uma ação paralela. A Pastoral da Juventude só pode ser uma verdadeira pastoral na medida em que esteja articulada com a pastoral de conjunto das Igrejas locais e assuma como próprios os seus desafios. Nesse sentido, a Pastoral da Juventude Orgânica é uma expressão concreta de toda a pastoral de conjunto. 4.1. Níveis de ação pastoral Dada a heterogeneidade do mundo juvenil, toda ação pastoral, para ser eficaz, deve ter em conta os desafios próprios dos jovens aos quais quer chegar. Tem de prever também diversos níveis de ação, de acordo com seu grau de incorporação na Pastoral da Juventude e no meio específico em que se desenvolvem suas vidas. 4.1.1. O nível coletivo São ações que visam apresentar o Evangelho e seus valores a todos os jovens. Podem ser, por exemplo, mensagens, cartas abertas, pronunciamentos que assumam e denunciem seus problemas, iluminem, com o Evangelho e o ensino da Igreja, as diversas situações juvenis e dêem esperança, alento e orientação em momentos e cincunstâncias conjunturais. É o caso da “Carta Aberta aos Jovens da América Latina”108 enviada pelos delegados do I Congresso Latino-Americano de Jovens; das “Mensagens” que surgem em muitos Encontros, Congressos ou Assembléias Nacionais ou por motivo dos Dias ou Semanas da Juventude, etc. Podem ser também outras ações que permitam vislumbrar que o Reino inaugurado por Jesus continua sendo construído hoje e que todos os jovens são convidados a incorporar-se e participar dele: encontros de oração, festivais, peregrinações, vigílias, jornadas, etc. Esse nível adquire uma importância especial, se se considera o enorme contingente de jovens do continente que não participam – e talvez nunca participarão – das estruturas eclesiais, e aos quais ainda não chegou o anúncio libertador de Jesus de Nazaré. Ao mesmo tempo, e nível exige um esforço e uma capacitação especiais porque, para chegar “à rua”, é preciso uma linguagem e o conhecimento de algumas leis, critérios e códigos muito diferentes aos que são normalmente utilizados no interior da vida da Igreja e das comunidades.
108
SEJ-CELAM, “I Congresso Latino-Americano de Jovens”, separata do Boletim CELAM, nº 245, janeiro-fevereiro de 1992, pp. 20-23.
4.1.2. O nível de incorporação esporádica Trata-se do acompanhamento de jovens que, sem estar integrados em grupos, participam com frequência da paróquia e das diversas atividades juvenis que são programadas. Para este nível, são próprias as atividades como missões jovens, jornadas de formação, seminários, encontros e convivências, retiros, casas abertas, etc. Em muitos casos, essas experiências possibilitam e facilitam a incorporação dos jovens aos níveis de participação regular. 4.1.3. O nível de participação regular É o nível para o qual se volta a maior parte dos esforços da Pastoral da Juventude. Trata-se de tudo o que se faz para incentivar a experiência do grupo juvenil como o meio mais adequado para acompanhar o processo de amadurecimento humano e cristão e de crescimento pessoal, comunitário e social dos jovens. A organização é uma ação de participação regular que se desenvolve nos diversos níveis, através de assembleias, encontros, conselhos, equipes, comissões, etc. Tem caráter deliberativo, isto é, assegura que os jovens participem diretamente do processo decisório e da condução da ação pastoral. Isso ocorre tanto na pastoral territorial como na pastoral ambiental, embora cada uma tenha seu estilo próprio de articulação e participação. Para a pastoral que atua a partir da territorialidade, ou seja, a que se realiza a partir dos grupos de jovens paroquiais, propõe-se uma série de espaços de participação e organização apresentados a seguir. As Pastorais Específicas de Juventude – rurais-camponeses, estudantes, operários, universitários – utilizam, em seu nível, várias dessas estruturas, mas têm também outras formas de organização própria, que variam de acordo com sua realidade e situação. 4.2. Espaços de participação e estruturas de organização É impossível esboçar aqui uma proposta de estrutura organizacional idêntica para todas as realidades da América Latina. São apresentadas apenas aquelas estruturas julgadas convenientes para animar e incentivar participativamente uma Pastoral da Juventude Orgânica. Elas deverão ser adaptadas às diferentes circunstâncias territoriais e ambientais, à variadíssima nomenclatura utilizada nos países e às formas particulares de organização e níveis de desenvolvimento presentes em cada realidade. A validade dessa proposta consiste em que não é um esquema de organização burocrático e preconcebido, mas fruto da experiência da caminhada e da busca de formas organizacionais que respondam às exigências do processo formador, desenvolvam o protagonismo e a participação dos jovens e sirvam ao desenvolvimento e crescimento da Pastoral da Juventude Orgânica. 4.2.1. O grupo ou comunidade juvenil É o nível básico de organização. Favorece a animação, formação e coordenação do trabalho com os jovens através de processos de educação na fé e de uma estrutura mínima interna e necessária para seu desenvolvimento e crescimento. O responsável imediato pela condução do grupo é um coordenador. Ele promove a vida grupal, as tarefas de coordenação interna e os demais serviços executados pelos próprios jovens. É também quem, em comunhão com o assessor ou com a equipe de assessores, faz a coordenação com os demais grupos no nível paroquial. Essa tarefa pode ser realizada – e é conveniente que o seja – por outro jovem, escolhido como delegado do grupo, o que favorece a participação e evita a sobre carga de responsabilidades na pessoa do coordenador. 4.2.2. Em nível paroquial A paróquia é a “comunidade das comunidades” (SD 58) que vivem em determinado território. Atenta às diversas experiências de juventude que surgem em seu interior, torna-se em “centro de coordenação e animação de comunidades, grupos e movimentos” (P 644) juvenis. Ajuda a integrar a pastoral da juventude à pastoral de conjunto e promove sua plena participação em suas estruturas organizacionais, através de sua presença no Conselho Pastoral, em que os jovens fazem ouvir sua voz e se integram com toda a comunidade paroquial.
A organização paroquial supõe a participação de todos os jovens e grupos e uma coordenação regular e dinâmica, que se expressam na Assembléia Paroquial e na Equipe Paroquial de Pastoral da Juventude. A Assembléia Paroquial de Pastoral da Juventude é a reunião de todos os jovens integrantes dos grupos de jovens da paróquia, quer territoriais, quer ambientais, junto com seus assessores e com todos os que têm algum tipo de responsabilidade em relação à Pastoral da Juventude. É normalmente convocada para planejar, decidir e avaliar as linhas e as iniciativas comuns que nortearão a ação pastoral em nível paroquial. É também um espaço para o encontro do pároco e dos demais agentes com a grande maioria dos jovens que estão participando dos processos grupais. A Equipe Paroquial de Pastoral da Juventude é integrada pelos jovens coordenadores e delegados dos grupos de jovens da paróquia. Eles permanecem por dois a três anos, após esse período, é conveniente sua renovação, para permitir a participação de outros coordenadores e delegados e para favorecer que o processo continue sendo assumido como uma responsabilidade de todos. Suas principais tarefas são: Animar o processo de educação na fé dos jovens dos grupos. Concretizar as linhas e os projetos determinados pela Assembléia Paroquial de Pastoral da Juventude. Promover atividades de animação, formação, coordenação e planejamento para todos os grupos de jovens da paróquia. Articular a Pastoral da Juventude paroquial, especialmente através da participação no Conselho Pastoral. Sensibilizar a comunidade paroquial quanto à realidade juvenil e favorecer a tomada de consciência e a realização prática e efetiva da opção preferencial pelos jovens. É animada normalmente por um Coordenador Paroquias, que pode ser designado pelo pároco, mas também pela Assembléia ou pela própria equipe, em comunhão com ele. O Coordenador Paroquial de Pastoral da Juventude, em comunhão com a Equipe e com o Assessor, é o responsável pela articulação das experiências juvenis da paróquia. Anima a Equipe a assumir as tarefas que lhe cabem. Busca garantir a implementação dos processos e facilita a utilização dos serviços oferecidos pelas instâncias zonais, diocesanas e nacionais. Favorece a comunicação da Equipe e do Assessor com o pároco e com os demais agentes de pastoral da paróquia. Assegura a presença da Pastoral da Juventude nas instâncias de coordenação mais ampla. Em nome da Equipe, convoca a Assembléia e representa a Pastoral da Juventude na coordenação zonal e diocesana. O processo paroquial de evangelização dos jovens é acompanhado por um Assessor Paroquial de Pastoral da Juventude. O Assessor favorece o protagonismo juvenil, facilita recursos de formação e apóia prioritariamente a ação do Coordenador Paroquial e dos coordenadores de grupos, serve como ele de ligação entre o mundo juvenil e o mundo adulto da paróquia e proporciona um apoio fundamental para a Pastoral da Juventude. Quando existe uma Equipe Paroquial de Assessores, esse papel é assumido em conjunto por todos eles. 4.2.3. Em nível de área pastoral, forania ou setor Nas dioceses territorialmente muito extensas, bem povoadas ou que apresentam realidades sociais e pastorais bastante diferenciadas as paróquias articulam-se em Áreas Pastorais, Vicariatos ou Decanatos para conseguir uma melhor animação e uma maior eficácia no trabalho pastoral. Nesses âmbitos, reproduzem-se – no nível correspondente – as linhas básicas de organização apresentadas em nível paroquial109.
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No Brasil fala-se tanto em área pastoral e forania como em setor ou região. Em algumas existem também os vicariatos. Preferimos aqui falar área pastoral.
A Assembléia da Área Pastoral da Pastoral da Juventude é a reunião das Equipes Paroquiais, das Equipes de Pastorais Específicas de Juventude e de Movimento Apostólicos, junto com seus assessores e com aquele que têm algum tipo de responsabilidade em relação à Pastoral da Juventude da Área. É convocada, normalmente para planejar, decidir e avaliar as linhas e iniciativas comuns que nortearão a ação pastoral em nível de área. A articulação mais comum é a das Equipes de Área da Pastoral da Juventude, integradas pelos Coordenadores Paroquiais ou Delegados das Equipe Paroquiais, designados por um período não superior a três anos. Suas principais tarefas são: Animar os processos de pastoral da juventude das paróquias da área. Concretizar as linhas e os projetos determinados pela Assembléia Zonal da Pastoral da Juventude. Promover atividades de animação, formação, coordenação e planejamento para as Equipes Paroquiais da área. Articular a pastoral da juventude com a pastoral zonal, especialmente através da participação no Conselho Pastoral Zonal. Acompanhar de perto os esforços das equipe nos processos de cada paróquia. Sensibilizar a área sobre a realidade juvenil e favorecer a tomada de consciência e a realização prática e efetiva da opção preferencial pelos jovens. É animada normalmente por um Coordenador da Área da Pastoral da Juventude, que desenvolve, em seu nível, as mesmas funções do Coordenador Paroquial. Pode-se designar também um Assessor da Área da Pastoral da Juventude, proposto pelas Equipes Paroquiais, para que acompanhe de perto esse nível de organização pastoral. 4.2.4. Em nível diocesano Toda pastoral da juventude deve estar inserida na pastoral diocesana e desenvolver sua ação tendo em vista as orientações e os planos pastorais dessa Igreja particular. Como nos níveis anteriores, e em continuidade com as características de organização já assinaladas, implementam-se algumas estruturas diocesanas. A Assembléia Diocesana de Pastoral da Juventude é a instância mais ampla e representativa das experiências de pastoral da juventude que existem na diocese: jovens, coordenadores, delegados, animadores e assessores dos grupos paroquiais, das Pastorais Específicas de Juventude e dos Movimento Apostólicos. É o espaço onde se trocam iniciativas, se detectam as necessidades comuns, se buscam caminhos de resposta, se fazem as opções e se aprova o plano da Pastoral da Juventude da Diocese, em comunhão com as orientações da Igreja local. Por convocar um número importante de pessoas, reúne-se ordinariamente uma só vez ao ano e extraordinariamente, sempre que alguma das finalidades estabelecidas assim o requeira. O Conselho Diocesano de Pastoral da Juventude é constituído pelos jovens coordenadores e delegados das Equipes de Área, pelos jovens delegados das Equipes das Pastorais Específicas de Juventude e da Coordenação dos Movimentos Juvenis, pelos assessores e por representantes das Equipes de Apoio que trabalham com a juventude da diocese. É uma instância ampla e de caráter decisório. É onde, na prática, se coordena a ação da Pastoral da Juventude da diocese. Suas principais tarefas são: Refletir, projetar e avaliar o desenvolvimento orgânico da Pastoral da Juventude diocesana. Concretizar e operacionalizar as conclusões da Assembléia Diocesana de Pastoral da Juventude. Articular, com espírito de comunhão e participação, todas as expressões juvenis ou de serviço aos jovens que ocorrem na diocese e vinculá-la à pastoral diocesana, especialmente através da participação no Conselho Pastoral Diocesano.
Favorecer a identidade eclesial e diocesana, programando e realizando, pelo menos anualmente, alguma atividade comum que expresse a presença dos jovens e desenvolva seu sentido diocesano. Acompanhar as Equipes Paroquiais existentes, promover a criação de outras novas e apoiar o Assessor e o Coordenador Diocesano na tarefa de consolidação da Pastoral da Juventude na diocese. Sensibilizar a diocese quanto à realidade juvenil e favorecer a tomada de consciência e a realização prática e efetiva da opção preferencial pelos pobres. Manter estreita vinculação com a Comissão Nacional de Pastoral da Juventude, levando a voz da diocese e fazendo chegar a esta a coordenação e a ação pastoral proposta nesses níveis. Em algumas dioceses, para facilitar as tarefas de comunicação, articulação e formação, o Conselho Diocesano constitui, em seu interior, uma Equipe ou Comissão ou Secretariado Diocesano. Esta Equipe não substitui o Conselho; é apenas um serviço de animação especial, uma ajuda para operacionalizar suas decisões. Seus membros fazem parte do mesmo Conselho e podem ser renovados na medida em que o próprio Conselho assim o decida. Suas principais tarefas são: ◊ Apoiar os esforços de coordenação do Conselho e do Coordenador Diocesano. ◊ Manter uma visão atualizada da realidade e da cultura juvenil. ◊ Fortalecer os processos de formação se desenvolvem nos grupos de jovens, elaborando itinerários formadores e material de apoio adequado às diferentes realidades. ◊ Facilitar a capacitação dos animadores e assessores, implementando cursos de formação, seminários, retiros, intercâmbios, convivências, etc. ◊ Incentivar o planejamento e a avaliação permanentes da Pastoral da Juventude. ◊ Promover o desenvolvimento e a articulação das Pastorais Específicas de Juventude, manter uma comunicação direta com os organismos da pastoral de conjunto e participar, através de seus delegados, da Comissão Nacional de Pastoral da Juventude e de organizações extraeclesiais que desenvolvam trabalhos de promoção da juventude. A Equipe Diocesana deve ser formada por pessoas com experiência pastoral, capacidade técnica, espírito de serviço, clareza de visão quanto à realidade diocesana e à problemática dos jovens e condições para operacionalizar as opções assumidas, gerando iniciativas que estejam a serviço dos grupos, dos agentes de pastoral e dos jovens em geral. Para poder desenvolver sua tarefa de forma eficiente, a Equipe tem que ser constituída por um número regular de pessoas que tenham possibilidade de dedicar seu tempo e contar com os recursos econômicos necessários para atingir os objetivos propostos. Dessa forma, poderá se tornar – como ocorre em muitas realidades – um verdadeiro dinamizador da Pastoral da Juventude Diocesana. O Conselho Diocesano é animado por um Coordenador Diocesano de Pastoral da Juventude chamado, em muitos lugares, de Secretário-Executivo. É um jovem do Conselho Diocesano, designado pelos próprios jovens para coordenar suas reuniões, operacionalizar questões práticas, tomar decisões imediatas e servir de ligação entre o Assessor Diocesano e o próprio Conselho. Em muitas dioceses, tem dedicação integral ou é “liberado”, o que constitui uma boa opção, sempre que forem previstos os recursos econômicos necessários tanto para sua sobrevivência como para o desenvolvimento de seu trabalho. Onde isso foi possível, constatou-se um maior compromisso por parte da diocese, maior facilidade de conseguir espaços físicos para dinamizar a comunicação, elaborar materiais e fazer reuniões de trabalho e até lugar para instalar um “escritório” ou “secretaria”, funcionando como um ponto de referência para assegurar a continuidade e manter viva a memória histórica da Pastoral da Juventude Diocesana. O Assessor Diocesano da Pastoral da Juventude é o delegado pastoral do bispo para o serviço evangelizador da Igreja local aos jovens. Para executar sua tarefa, deverá contar com o apoio dos
demais assessores e ter simpatia pelo mundo juvenil. Os jovens podem participar de sua escolha, propondo nomes de quem considerem mais aptos para esse serviço. Esse assessor acompanha os processos e as experiência juvenis em curso na diocese. Sua presença orienta, esclarece, apóia, organiza, sempre em diálogo e promovendo a participação dos organismos diocesanos e o protagonismo juvenil. Suas principais tarefas são: Favorecer a Pastoral da Juventude Diocesana, convidando todos os que envidam esforços para evangelizar os jovens a incorporar-se organicamente numa caminhada comum, buscando critérios, multiplicando esforços, racionalizando recursos e animando a criação de uma mística e de um espírito diocesano. Apoiar as comunidades paroquiais em sua tarefa de evangelização dos jovens, visitando as paróquias, dialogando com os agentes de pastoral, orientando, esclarecendo, animando e contagiando com seu entusiasmo para realizar esta tarefa. Acompanhar o trabalho do Coordenador, da Equipe e do Conselho Diocesano de Pastoral da Juventude. Manter um diálogo aberto com os jovens dos grupos e das paróquias, participando, sempre que possível, dos encontros em nível local. Impulsionar a formação de animadores e assessores, mostrando-se aberto para dialogar sobre suas dificuldades, atender a suas necessidades e favorecer um clima fraterno nas relações. Facilitar a relação e o encontro entre os jovens e o bispo, buscando interpretar as inquietudes de ambos e promovendo o diálogo, o intercâmbio e a confiança mútua. Promover as Pastorais Específicas de Juventude, a integração dos jovens e a relação destas com os demais setores da Pastoral da Juventude. Promover ações que tenham como destinatários os jovem mais afastados e os que só participam de atividades esporadicamente. Para que esse dinamismo evangelizador se possa fazer realidade, a diocese deverá dispor de recursos humanos e econômicos necessários. O bispo, como primeiro responsável pela animação dessa parte majoritária de sua Igreja particular, deverá assumir com responsabilidade o que com todos os seus irmãos foi reafirmado em Santo Domingo: “A efetiva opção pelos jovens exige maiores recursos pessoais e materiais por parte das paróquias e das dioceses” (SD 114). 4.2.5. Em nível nacional A medida que se fortalece a organização e cresce o intercâmbio interdiocesano, surge a organização nacional. Da mesma forma que nas paróquias, nas áreas pastorais e nas dioceses, no país se organiza também a Pastoral da Juventude Nacional. O decorrer do tempo permitiu comprovar a riqueza das trocas de experiências interdiocesana e nacionais e sua importância para a elaboração de projetos verdadeiramente orgânicos que partam das experiências dos grupos de base e se consolidem em âmbitos e organismos de serviço em nível nacional. A Assembléia Nacional de Pastoral da Juventude é o espaço em que os Jovens delegados dos Conselhos Diocesanos, das Pastorais Específicas de Juventude e dos Movimentos Apostólicos, assessores, representantes das Equipe de Apoio e membros da Comissão Nacional definem os rumos da Pastoral da Juventude no país. É o maior âmbito de caráter deliberativo da Pastoral da Juventude. Nela, aprofunda-se a proposta, fazem-se as opções pedagógicas e metodológicas para o trabalho, elaboram-se os planos nacionais e nascem os projetos que serão implementados no país para a evangelização dos jovens e para a construção da civilização do amor. Segundo as diversas realidades, a Assembléia Nacional pode se reunir anualmente ou cada dois ou três anos. Exige muita preparação, participação de um grande número de delegados e tempo para que as decisões sejam implementadas, executadas e avaliadas.
A Comissão Nacional de Pastoral de Juventude surge normalmente no âmbito da Conferência Episcopal. É composta do bispo presidente da Comissão Episcopal, do Assessor Nacional, do Secretário-Executivo, dos delegados dos Assessores Diocesanos e dos Conselhos Diocesanos e de representantes dos organismos nacionais das Pastorais Específicas, dos Movimentos Apostólicos e das Equipes de Apoio110. Suas principais tarefas são: ◊ Refletir, projetar e avaliar o desenvolvimento orgânico da Pastoral da Juventude Nacional. ◊ Concretizar e operacionalizar os acordos e decisões da Assembléia Nacional da Pastoral da Juventude. ◊ Favorecer o surgimento de estruturas básicas de animação, formação e coordenação nas dioceses e no país e incentivar as Assembléias e Encontros Nacionais como espaços para discernir e aprofundar o caminhar da Pastoral da Juventude Nacional. ◊ Promover a criação de centros que permitam manter um conhecimento atualizado da realidade juvenil e capacitem os agentes pastorais na implementação da proposta da Pastoral da Juventude. ◊ Acompanhar os Conselhos Diocesanos, promover a criação de outros e novos e apoiar o Secretário-Executivo e o Assessor Nacional na tarefa de difundir a proposta e consolidar a Pastoral da Juventude nacional. ◊ Manter contato permanente com os bispos das dioceses. ◊ Sensibilizar a Conferência Episcopal quanto à realidade juvenil e à realização prática e efetiva da opção preferencial pelos jovens e apoiá-la em sua reflexão e na elaboração de orientações para a evangelização do mundo juvenil. ◊ Favorecer e fortalecer o intercâmbio, a comunicação e a integração com a Pastoral da Juventude Regional e Latino-Americana111. A Comissão Nacional é coordenada por um Secretário-Executivo. Preferentemente, é um jovem leigo, com dedicação – na medida das possibilidades – em tempo integral, com visão clara do processo diocesano, nacional, regional e latino-americano, indicado pela própria Comissão Nacional e confirmado oficialmente pela Conferência Episcopal. A duração de seu mandato geralmente é determinada pelos Estatutos das Conferências Episcopais. Suas principais tarefas são: ○ Organizar e coordenar as reuniões da Comissão Nacional da Pastoral da Juventude e concretizar e operacionalizar suas conclusões. ○ Facilitar a comunicação no interior da Pastoral da Juventude do país e mantê-la vinculada com as Pastorais da Juventude da Região e do continente. ○ Favorecer a articulação das Pastorais da Juventude diocesanas. ○ Colaborar com o Assessor Nacional no acompanhamento às Pastorais da Juventude diocesana e na criação de estruturas básicas de formação, animação e coordenação. ○ Representar a Pastoral da Juventude Nacional nas reuniões e encontros regionais e latinoamericanos. ○ Apoiar o Assessor Nacional e o bispo responsável, no que se refira à Pastoral da Juventude em nível de Conferência Episcopal. O Assessor Nacional de Pastoral da Juventude é um adulto – leigo, religioso ou sacerdote – com clara vocação para o acompanhamento e com capacidade para assessorar os processos diocesanos e o processo nacional da Pastoral da Juventude. Como o Secretário-Executivo é indicado pela Comissão oi Assembléia Nacional de Pastoral da Juventude e confirmado oficialmente pela Conferência 110
No Brasil, existe a Coordenação Nacional da Pastoral da Juventude, constituída por jovens eleitos para tal, acompanhados pelo bispo referencial, indicado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, e pelo Assessor Nacional. Existe também a Comissão Nacional de Assessores(as), constituída por assessores(as) indicados(as) para tal pelos Regionais da CNBB. 111 O “Regional” refere-se às quatro Regiões em que se divide a América Latina (ver nota 13).
Episcopal. A duração de seu mandato depende também do que estiver estipulado nos Estatutos da Conferência Episcopal. É uma agente fundamental para o desenvolvimento da Pastoral da Juventude. É ele que normalmente assume a responsabilidade pela articulação dos diversos organismos nacionais de decisão e acompanhamento e representa os jovens perante as estruturas eclesiais, para abrir os espaços que possibilitem o desenvolvimento e o crescimento dos processos pastorais. Em alguns países, têm surgido ultimamente Equipes Nacionais de Assessores, que respondem a necessidades concretas do acompanhamento dos processos educativos dos jovens. Essas equipe não substituem nenhum organismo decisório; são uma ação participativa do papel da assessoria e, sobretudo, espaços sérios de reflexão, aprofundamento e capacitação para o acompanhamento da ação pastoral realizada com os jovens. Apóiam, fundamentalmente, formando e assessorando os processos em nível nacional. O Bispo Presidente da Comissão Episcopal de Pastoral da Juventude é designado pela Conferência Episcopal como delegado e responsável por tudo o que se relaciona com a Pastoral da Juventude no país. Por suas características, que o identificam muito com a juventude, e por sua clareza sobre o valor e a importância da opção preferencial pelos jovens, é o primeiro apoio institucional da Pastoral da Juventude Nacional. É o dinamizador da opção preferencial pelos jovens na Conferência Episcopal. Preside a Comissão Nacional de Pastoral da Juventude e a representa nas instâncias nacionais, regionais e continentais que correspondem a seu nível. Atua em fraterna comunicação e colaboração com o bispo responsável pela Seção Juventude do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM)112. Quer-se valorizar aqui o testemunho daqueles bispos que, embora com muitas ocupações de animação em suas dioceses, encontram tempo para acompanhar determinadas instâncias do trabalho juvenil e são capazes, além disso, de confrontar com coragem evangélica seus próprios irmãos no episcopado, para que a opção preferencial pelos jovens se torne efetiva e para que haja apoio decidido à sua ação pastoral. 4.2.6. Em nível regional Com o desenvolvimento e o crescimento do intercâmbio entre as pastorais da juventude nacionais e com o fortalecimento da identidade e da proposta da Pastoral da Juventude LatinoAmericana, surgiu a necessidade de criar os âmbitos regionais para favorecer a animação e o intercâmbio e para fortalecer os processos das pastorais da juventude nacionais. Existem quatro Regiões, nucleadas pela vizinhança geográfica e pelas características culturais semelhantes dos países que as integram: a Região Bolivariana, com Bolívia, Colômbia, Equador e Peru; a Região Caribe, com Antilhas, Cuba, Haiti, Porto Rico, República Dominicana e Venezuela; a Região Cone Sul, com Argentina, Brasil, Paraguai, Chile e Uruguai; e a Região México-América Central, com Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua e Panamá. Cada Região é animada por um Assessor Regional de Pastoral da Juventude. Tem dupla responsabilidade: animar, coordenar e fortalecer o processo da pastoral da juventude regional e integrar a Equipe de Assessores Regionais do Secretário-Executivo da seção Juventude do CELAM. Por essa dupla missão, o Assessor Regional é eleito pelos Responsáveis Nacionais pela Pastoral da Juventude dos países da Região, em acordo com o Secretário-Executivo da SEJ-CELAM. Normalmente seu mandato tem duração de quatro anos e coincide com o do assessor da Seção Juventude do CELAM. A organização regional mantém a mesma estrutura dos níveis considerados anteriormente. A instância mais ampla de representatividade, participação e decisão é o Encontro Regional de Pastoral da Juventude, do qual participam jovens e assessores delegados da Comissão Nacional junto aos Responsáveis Nacionais pela Pastoral da Juventude dos países. O Encontro Regional tem como finalidade revisar, refletir, planejar e definir a caminhada da Pastoral da Juventude na Região, a partir 112
No Brasil, existem os bispos referenciais, em nível nacional e regional, da Pastoral da Juventude, indicado pelos bispos nestes níveis.
das linhas e dos projetos das Comissões Nacionais e em consonância com as propostas da Pastoral da Juventude Orgânica Latino-Americano. Nos últimos anos, foi criada também a instância da Reunião Regional de Pastoral da Juventude, que convoca os Bispos Responsáveis pela Pastoral da Juventude, os Assessores Nacionais e os Secretários –Executivos das Comissões Nacionais de Pastoral da Juventude dos países da Região. Essa reunião permite pôr em prática as decisões do Encontro Regional, programar serviços de formação e intercâmbio nesse nível e operacionalizar as conclusões latino-americanas para a Região.
4.2.7. Em nível latino-americano A implementação do projeto de Pastoral da Juventude Orgânica gerou no continente uma dinâmica e efetiva articulação animada pela Seção Juventude do Conselho Episcopal LatinoAmericano (SEJ-CELAM). A presença desta nos países, a estruturação das Regiões, a realização do I Congresso Latino-Americano de Jovens, os Encontros Latino-Americanos de Responsáveis Nacionais pela Pastoral da Juventude, os Cursos Latino-Americanos de Pastoral da Juventude e os numerosos materiais publicados permitiram não somente consolidar e aprofundar os elementos da proposta, mas também fortalecer a articulação e a organização da Pastoral da Juventude nos países e no continente. Da experiência dos grupos de jovens até as instâncias mais abrangentes de organização continental, existe uma organização que permite a comunhão fraterna e a participação efetiva dos jovens nos projetos da Igreja e nas propostas de transformação da sociedade. Essa organização latino-americana acompanha, através dos diferentes esforços, a diversa e complexa realidade dos jovens do continente e permite viabilizar suas contribuições ao processo de mudança. O Congresso Latino-Americano de Jovens é a instância mais ampla de encontro que marca a caminhada da Pastoral da Juventude em nível continental. Nele, jovens, coordenadores e delegados, em comunhão com assessores e bispos responsáveis pela juventude, determinam as grandes linhas que orientarão a ação pastoral, no continente. É o espaço adequado para que os jovens, organizados no projeto da Pastoral da Juventude Latino-Americana, expressem suas propostas à Igreja e à sociedade do continente. Os Encontros Latino-Americanos de Responsáveis Nacionais pela Pastoral da Juventude são espaço de intercâmbio, reflexão, animação e coordenação para aprofundar aspectos da proposta e definir linhas de ação comuns para apoiar o trabalho da Comissões Nacionais de Pastoral da Juventude e para fortalecer a Pastoral da Juventude Orgânica, construtora da civilização do amor. Convocados pela Seção Juventude do CELAM, realizam-se praticamente a cada dois anos, após um longo processo participativo de preparação e consulta. Participam os Bispos Responsáveis pelas Comissões Episcopais de Juventude, os Secretários-Executivos, os Assessores Nacionais e dois jovens, membros das Comissões Nacionais de Pastoral da Juventude de cada país. A Seção Juventude é o organismo especializado do CELAM para a animação e o acompanhamento da Pastoral da Juventude no continente e para a realização da opção preferencial pelos jovens. Anima as pastorais da juventude nacionais e regionais, promove o estudo e a pesquisa de temas vinculados à realidade juvenil e à proposta evangelizadora que está sendo impulsionada. Oferece serviços para a formação e a capacitação dos agentes pastorais, difunde materiais de apoio e favorece o intercâmbio e a vinculação dos organismos continentais – eclesiais e não-eclesiais – que trabalham com os jovens. Há um bispo responsável, designado pela presidência do CELAM para um período de quatro anos, e um Secretario-Executivo, em tempo integral, designado para o mesmo período. Sua sede é na cidade de Santafé de Bogotá, Colômbia. Além das estruturas de animação e acompanhamento já referidas, que servem organicamente para uma participativa tomada de decisões, nos último anos surgiu uma série de outro organismos e Equipes de Apoio que, sem fazer parte dessa estrutura orgânica, acompanham, com seus serviços e contribuições especializados, o processo da pastoral da juventude nos diversos níveis. Trata-se de Equipes de Assessoria e Acompanhamento, Escolas de Formação, Casas de Juventude, Institutos,
Centros de Formação de Juventude, Centros de Reflexão Juvenil, Clubes Juvenis, Redes de Juventude, etc. As estruturas organizacionais deverão tê-los em conta não só para oferecer-lhes a possibilidade de participarem e trazerem o fruto de seus trabalhos, pesquisas e novas propostas para responder, cada dia com mais sensibilidade, às realidades culturais do mundo de hoje. 4.3. Alguns recursos pedagógicos para a organização 4.3.1. O planejamento “A ação pastoral planejada é a resposta específica, consciente e intencional às necessidades da evangelização” (P 1307). Sem planejamento, as forças se dispersam, há frustração e desalento; ocorrem choques contínuos e superposição de atividades. Há desperdício de energias. Mais que algo imposto “de cima”, o planejamento é um processo decisório que deve envolver o maior número possível de pessoas comprometidas com a realização do projeto. O planejamento assegura a projeção de longo prazo e faz com que as decisões tomadas tenham garantia de continuidade. “Deverá realizar-se num processo de participação em todos os níveis das comunidades e das pessoas interessadas, educando-as numa metodologia de análise da realidade, para depois refletir sobre essa realidade do ponto de vista do Evangelho e optar pelos objetivos e meios mais aptos e fazer deles um uso mais racional na ação evangelizadora” (P1307). Todo planejamento, portanto, deve partir da realidade dos jovens e dos ambientes nos quais eles vivem (ver), deve iluminar essa realidade com as luzes da fé e com a mensagem do Evangelho (julgar), para decidir depois as atividades que se desenvolverão para muda-la (agir). Esse processo coletivo, de participação ampla e de base, permite uma percepção mais próxima da realidade, um aprofundamento mais sério do seu julgamento e uma busca mais ordenada dos critérios de ação para transformá-la. Muda a mentalidade dos seus participantes e favorece a formação de consensos sobre os modos de desenvolver a tarefa pastoral. Normalmente, o processo é muito mais importante do que as próprias decisões tomadas. O planejamento facilita a distribuição de responsabilidades e a participação mais ativa dos jovens. Evita a acumulação de atividades num mesmo momento e canaliza, mais racionalmente, as energias de todos os agentes pastorais. Todo grupo, equipe, conselho, comissão ou coordenação, no nível correspondente, deve planejar sua ação pastoral e buscar os recursos para implementá-la. Este é “o caminho mais prático para realizar concretamente as opções pastorais fundamentais da evangelização” (P 1306). Como processo educativo, gradual e global, o planejamento se transforma num processo de conversão do individualismo ao comunitário e da separação entre fé e vida à vivência autêntica dos valores do Evangelho. 4.3.2. A avaliação É outro recurso pedagógico importante para a organização. Através dela, ajustam-se cada vez melhor os passos que são dados e se aperfeiçoa a ação. Sem avaliação, incorre-se nos mesmos erros, não se valorizam as conquistas, nem se aprende com os fracassos; a ação deixa de ser transformadora e não estimula novas iniciativas, o processo começa a emperrar e a organização pode vir a morrer. A avaliação permite descobrir o que foi bem feito, o que se deve mudar, melhorar e projetar. É uma atitude permanente de revisão das motivações, dos processos, dos resultados alcançados, dos objetivos, da distribuição de funções, etc. A avaliação também deve partir das observações dos fatos ocorridos, com suas causas e consequências (ver), fazer um julgamento a partir de critérios e valores cristãos (julgar), para impulsionas novas pistas de ação (agir). Nessa revisão, descobre-se a presença de Deus agindo na história, chamando à conversão e motivando a novos compromissos (celebrar). A avaliação não é eficaz quando se limita a arrolar as dificuldades, sem investigar seriamente as causas que as produziram e sem proporcionar as soluções reclamadas. Uma boa avaliação leva a descobrir os verdadeiros problemas e a buscar as soluções adequadas.
5. O ACOMPANHAMENTO. OS AGENTES DA PASTORAL DA JUVENTUDE 5.1. O animador 5.1.1. Identidade e características O animador é um jovem chamado por Deus na Igreja para assumir o serviço de motivar, integrar e ajudar os jovens a crescer no processo comunitário. Animar não é pôr em prática um conjunto de técnicas. É um modo de ver, de entender, de relacionar-se e viver a vida em grupo. É “dar a alma”, “dar ânimo”, “dar vida”. É partilhar a vida para que outros também tenham vida. É acompanhar os jovens nas etapas de seu crescimento pessoal, em seus processo de educação na fé e de integração na comunidade eclesial, continuadora da missão de Jesus, e em seu compromisso de serem protagonistas na transformação da sociedade. Para que esse serviço evangelizador possa se realizar e ser eficaz, são necessárias algumas características, como o conhecimento da realidade, a capacidade de aproximação, a atitude positiva de apoio e colaboração, a facilidade para a relação pessoal, uma maturidade segundo a idade, uma relação pessoa com o Senhor e uma certa experiência no caminho da fé, que podem ser considerados, por sua vez, como sinais válidos de uma vocação para a animação. Junto com o conhecimento das linhas fundamentais do processo formador, a capacitação permanente e o acompanhamento dos assessores, essas características asseguram que o jovem animador poderá levar adiante e realizar proficuamente seu serviço evangelizador aos outros jovens. O seguimento de Jesus (Lc 22, 25-26) e seu compromisso com o projeto da civilização do amor convidam o animador a agir sempre com espírito de serviço. O animador não impõe. Dialoga. Não ensina. Busca em comum. Não tem a segurança de quem sabe tudo, mas a certeza do caminhante que sabe orientar e dizer aonde quer chegar. Não assume todas as tarefas; sabe partilhar responsabilidades. Não monopoliza a palavra; busca a participação de todos. Dá-se a conhecer tal qual é, com suas virtudes e defeitos. Não exalta sua personalidade nem busca adesões. Preocupa-se com os integrantes de seu grupo e lhes oferece sua amizade sincera e cordial. Sabe acolher, respeitar e inspirar confiança. Aprende a valorizar cada pessoa e a respeitar seu ritmo de crescimento. Evita das mais importância às estruturas e ao êxito dos planos e da organização que à própria vida. Desenvolvendo seu serviço de animação, o jovem continua formando-se. Sabe que, como seus irmãos do grupo de jovens, também ele está em processo de crescimento e, por isso, se esforça por equilibrar seus compromissos de serviço com as exigências de sua formação pessoal, da direção espiritual e da atenção à vida familiar e do bairro em que vive. Procura ser um testemunho vivo para não se tornar um mero ideólogo, um demagogo ou um líder auto-suficiente e individualista. Aspira à santidade e à excelência de seu serviço e faz dele a fonte de seu entusiasmos e de sua espiritualidade. A animação é uma experiência formadora. Confiando-a aos jovens, a Igreja oferece-lhes uma oportunidade para o protagonismo e entrega-lhes uma responsabilidade compatível com sua idade e com as etapas do processo de amadurecimento humano e cristão que estão vivendo. 5.1.2. Tarefas As principais tarefas do animador de grupo são: • Preparar e animar as reuniões do grupo ou comunidade juvenil; • Detectar os anseios, preocupações, interesses e inquietudes e questionamento dos jovens, como grupo e como indivíduos, para juntos realizam um processo formador e experiencial que dê respostas significativas às suas necessidades; • Favorecer a convivência fraterna, a expressão alegre, a solidariedade e a criatividade, de modo que os jovens de sentiam permanentemente convidados a viver e a desejar o ideal da civilização do amor; • Criar no grupo um clima democrático, de comunicação aberta e de acolhida de iniciativas, que estimule a participação e a co-responsabilidade da animação comunitária; • Alentar a experiência de Deus na oração, a leitura da Palavra e a celebração viva da fé, tanto em suas expressões litúrgicas como em outras expressões próprias e criativas do grupo;
• Propiciar as iniciativas que projetem a vivência da fé dos jovens em ações solidárias com os pobres e com os que mais sofrem; • Manter um contato permanente, por meio dos organismos de coordenação, com os processos pastorais de sua comunidade eclesial, de sua paróquia e de sua diocese, assim como os organismos da Pastoral da Juventude Nacional, para favorecer o sentido de comunhão eclesial; • Assumir, se for delegada, alguma função de coordenação dentro ou fora do grupo, procurando não abarcar todas as funções ou tarefas; • Fazer todo o grupo ou comunidade juvenil participante das experiência significativas de novos animadores. Quando numa realidade pastoral existem vários animadores, é muito bom integrar com eles uma Equipe de Animadores em que seja possível comunicar e trocar experiências, ajudar-se e animarse mutuamente, assegurar a continuidade de uma formação permanente, evitar que cada um se feche em sua experiência particular, potencializar os encontros intergrupais, preparar as atividades e os serviços comuns a todos os grupos, etc. 5.2. O assessor 5.2.1. Identidade e características A palavra “assessor” provém de “sedere ad”, que quer dizer “sentar junto a” e sugere a idéia de motivar, acompanhar, orientar e integrar a contribuição e a participação dos jovens na Igreja e na sociedade e propiciar a acolhida dessa ação juvenil na comunidade. O assessor de Pastoral da Juventude é um cristão adulto chamado por Deus para exercer o ministério de acompanhar, em nome da Igreja, os processos de educação na fé dos jovens. A ministerialidade da assessoria se fundamenta em Jesus Cristo servidor (Mt 20,28), que se realiza o projeto do amor libertador de Deus; na ministerialidade da Igreja, que serve à humanidade atualizando a libertação integral realizada em Jesus Cristo; no caráter batismal, pelo qual todo cristão participa da missão ministerial da Igreja por obra do Espírito e da opção preferencial pelos jovens assumida pela Igreja latino-americana, como fruto do discernimento do projeto de Deus para a juventude do continente. Os ministérios são serviços conferidos a determinadas pessoas para o benefício da comunidade e para uma melhor realização de sua missão no mundo. Portanto, são mediados e discernidos pela Igreja. Neste caso, os pastores, a comunidade e os próprios jovens percebem, juntos, a necessidade de um acompanhamento real de seus processos de educação na fé e reconhecem a oportunidade e a validade de um ministério que o possibilite. A assessoria como ministério de serviço aos jovens só pode ser exercida por quem fez uma opção pessoal, recebeu o envio por parte da Igreja e conta com a aceitação dos próprios jovens. Não é um ministério exclusivo do sacerdote ou do religioso. Em todos os níveis e experiências da Pastoral da Juventude, e especialmente nas Pastorais Específicas de Juventude, cresce cada dia mais o reconhecimento de que é, também e fundamentalmente um ministério laical. Não se trata, pois, de um “título”, nem de um “cargo de confiança” da autoridade. Não se trata de designar alguém porque “é jovem”, porque “lhe agrada” ou simplesmente porque se deve cumprir uma “função”. Trata-se de reconhecer um carisma ou vocação especial para este serviço. O reconhecimento desse carisma por parte da comunidade e, especialmente, dos próprios jovens permite resistir à visão “burocrática” da assessoria, segundo a qual bastaria ser designado para exercer corretamente o serviço, o que não é certo, muito menos no mundo juvenil. Por isso, aceitar esse ministério implica aceitar a necessidade de uma capacitação para poder desenvolvê-lo de acordo com as orientações da Igreja latino-americana, num salutar equilíbrio entre a participação juvenil e o reconhecimento da autoridade dos pastores. A reflexão e a prática da Pastoral da Juventude Latino-Americana sistematizaram algumas características da identidade do assessor da pastoral da juventude, arroladas a seguir.
Identidade psicológica O assessor é um adulto, isto é, uma pessoa que já passou pela etapa da juventude e viveu um processo de amadurecimento no qual definiu seu projeto de vida e atingiu uma estabilidade afetiva para optar livremente e para assumir com responsabilidade os desafios próprios de sua escolha. Essa situação vital o capacita a olhar o caminho dos jovens a partir de outra perspectiva e a oferecer-lhes, ao mesmo tempo, a possibilidade de terem um modelo de referência para discernir seus próprios projetos. É uma pessoa aberta, capaz de escutar e de dialogar com os jovens e de valorizar os aspectos positivos e negativos de suas vidas e de suas situações. Sabe ter uma visão de conjunto da realidade, não se restringindo aos seus elementos componentes. Não foge dos compromissos e das dificuldades. É responsável. Toma posição diante dos problemas e conflitos. Conhece o meio em que os jovens desenvolvem suas potencialidades e procura encarnar-se o mais possível em sua realidade, com a clara consciência de que não se trata de ser “um” entre eles, mas de ter a capacidade de entender e acompanhar, partir de sua visão de adulto, o processo pessoal e comunitário que os jovens estão realizando. Guia seus afetos por um autêntico amor de doação, evitando todo o paternalismo ou possessividade e promovendo o crescimento e o amadurecimento dos jovens. Vive com muita liberdade, porque é capaz de autocrítica e de perdão. Prefere trabalhar em equipe. Tem paixão pela verdade, o que lhe permite reconhecer nos jovens a mesma capacidade de apaixonar-se pela verdade que ele vive. É capaz de propor e esperar, porque sabe que acompanha um processo que não é seu, mas dos jovens. Não se preocupa tanto em “fazer” coisas, mas em “ser” amigo e irmão e dar testemunho de uma vida alegre e feliz, capaz de entusiasmar os demais. O amadurecimento da pessoa se constrói dia-a-dia, num processo que nunca termina (Mt 5,48). O assessor, portanto, tem consciência de que também seu processo de amadurecimento psicológico e de formação humana é constante e permanente. Aceita a companhia dos jovens e, junto com ele, continua seu caminho de realização pessoal. Identidade espiritual O assessor é uma pessoa de fé. Vive o seguimento de Jesus na opção que faz pelos jovens. Neles reconhece, diariamente, o rosto de Deus e a voz profética do Espírito. Descobre a presença de Jesus no meio deles (Mt 18,20); encontra-o vivo e presente nos sinais de vida juvenil e o segue no caminho (Lc 24,13-35) que oferece aos jovens para levá-los à sua realização e à sua plenitude. Crê em Deus e crê nos jovens. Sabe que a grandeza de sua vocação está na escolha que Deus lhe fez para confiar-lhe a juventude, para fazê-lo participante do amor com que ele mesmo ama os jovens (SD 118) e para enviá-lo a acompanhá-los e estar presente no meio deles como sinal de seu amor. Como cristão, o assessor é uma pessoa que já esclareceu seu projeto de vida, fez sua opção vocacional e luta, diariamente para viver com fidelidade os compromissos assumidos. Coerente com sua opção, esforça-se por integrar em sua espiritualidade a fé e a vida e por encarnar-se na realidade e nas circunstâncias e acontecimentos da vida dos jovens. Em sua busca de resposta ao projeto de Deus para a juventude, encontra-se com o jovem empobrecido, sofredor e marginalizado, fazendo-o objeto especial de sua predileção (Mt 25,31-46). Dedica sua atenção, sua preocupação e seu tempo àqueles a quem Deus quis pôr seu olhar carinhoso. Sabe que, antes de acompanhar o grupo como cristão, ele mesmo é acompanhado por Deus e que, na realidade, ele é que toma a iniciativa de propor a civilização do amor a partir da força e da franqueza da própria juventude. Por isso, não se atribui honras nem êxitos exclusivos. A verdade de sua missão o faz humilde. Identidade teológico-pastoral Falar de ministério é falar de vocação. O assessor é, antes de tudo, um vocacionado, uma pessoa chamada por Deus para cumprir uma missão na Igreja. Como toda vocação, não é um chamado para si
mesmo, mas para um serviço aos demais. Através do bispo ou do pároco que o designa, o assessor é um enviado da comunidade para anunciar e testemunhar o amor de Deus no meio dos jovens. Por sua própria natureza, a assessoria não é um ministério protagônico, mas de apoio. Exige conhecer, respeitar, acompanhar e promover os processos de educação na fé dos jovens. É um serviço de amor que reconhece o valor da contribuição do jovem em nome da Igreja. O assessor é uma pessoa de Deus: uma pessoa de oração testemunho que fala a partir da profundidade e da experiência de sua vida, e não a partir da teoria e das coisas aprendidas. Vai crescendo, vivendo e amadurecendo com os jovens e fazendo-se assessor a partir do processo do próprio grupo. É uma pessoa que conhece, ama e serve à Igreja. Faz comunidade com os jovens e os ajuda a sentir a Igreja como uma comunidade. Está em comunhão com ela, é fiel a seus ensinamentos e reconhece tanto sua realidade divina como suas limitações humanas. Preocupa-se por conhecer e seguir as linhas pastorais e as orientações da Igreja local em que está trabalhando, da Pastoral da Juventude nacional e latino-americana e, especialmente, procura ser fiel à proposta da civilização do amor como núcleo central do projeto que a Igreja propõe aos jovens. É consciente de ser enviado a todos os jovens. Isso o leva a superar os limites de pequeno grupo ou dos jovens que estão integrados nos grupos da Pastoral da Juventude e dirigir seu olhar e sua atenção a todos os jovens, especialmente aos mais pobres e àqueles aos quais nunca foi anunciado Jesus Cristo Libertador. Leva-o também a não olhar os jovens em seu conjunto, mas na diversidade de situações em que eles vivem, sejam pelas atividades que realizam (agricultores, estudantes, operários, universitários), seja por sua própria cultura (indígena, afro-americanos), seja pelas situações que condicionam suas vidas (migrantes, marginalizados, jovens em situações críticas...). Identidade pedagógica O assessor é um educador. Age de acordo com a pedagogia de Deus, seguindo o modelo que Jesus utilizou com os discípulos. Como Deus com seu povo, o assessor faz aliança com os jovens, escuta seus clamores, caminha com eles, dá-lhes a vida e os deixa construir seu caminho com liberdade. Tem uma proposta educativa clara e concreta para os jovens, que não impõe, mas propõe e sabe como levá-la à prática e fazê-la realidade. Educa a partir da vida e para a vida. Acompanha os processos pessoais e grupais dos jovens integrando ação, reflexão, convivência e oração num proposta de mudança que dá sentido novo às suas vidas. Transmite dados e elementos culturais de interesse para a juventude, para seu crescimento e para seu protagonismo no processo libertador. Contribui, principalmente, com o testemunho de sua própria vida e de seu compromisso com a transformação da Igreja e da sociedade, em coerência com o projeto de Jesus e segundo os sinais dos tempos. Desenvolve uma pedagogia experiencial, participativa e transformadora (SD 119) e uma metodologia que integra o ver-julgar-agira-revisar-celebrar (SD 119). Promove um trabalho planejado e integrado na pastoral de conjunto e nas demais instâncias de coordenação, em todos os níveis. Vela pela memória histórica dos processos gerais e específicos e ajuda os jovens a formular seus projetos de vida e a descobrir seu lugar e seus desafios nas situações que lhes cabe viver. Reconhece o protagonismo dos jovens, mas expressa, ao mesmo tempo, a consciência de que eles precisam de vínculos estreitos e eficazes com as comunidades cristãs e em geral com o mundo adulto, que condiciona os jovens e ao qual, por sua vez, são chamados para oferecer sua contribuição vital e criativa. O assessor tem claro que seu acompanhamento não é passividade nem não-intervenção. Sabe muito bem que a questão não é influir ou não influir, mas como influir e em quê e para quê. Por isso realiza intervenções educativas para gerar mudanças na vida dos jovens e as reafirma com seu testemunho de ator social, e não só de anunciante ou de ideológico que foge da responsabilidade e do conflito. Como educador, situa-se entre os jovens como amigo maduro e orientador. Ajuda a formular seus problemas, a objetivar seus interesses e a possibilitar a busca de soluções; colabora na
sistematização de suas vivências e em sua confrontação com as teorias elaboradas. Impulsiona a articulação de sua unidade de organização e ação e promove sua inserção no meio e sua vinculação com a sociedade mais ampla. Individualiza as lideranças e desenvolve as estratégias para a capacitação de novos agentes a serviço do processo. Faz os jovens ver que seu modo de agir já contém, de certa forma, o resultado que se quer alcançar. Para assegurar a continuidade dos processos iniciados, expõe a necessidade de definir um tempo regular e prudencial para prestar seu serviço. Identidade social O assessor é uma pessoa encarnada em sua realidade social e com profundo sentido de pertença a ela. Conhece e assume as esperanças e as dores de seu povo. Sente empatia com essa realidade, especialmente com a dos jovens, e procura identificar-se com a situação concreta dos que ele tem que acompanhar. É capaz de chorar com os que choram, rir com os que riem e sofrer com os que sofrem. Procura ser um ator social, e não ficar passivo ante os desafios da realidade. Sente-se chamado a transformá-la, denunciando os sinais de morte, anunciando os sinais de vida e fazendo opções concretas para que estes se tornem realidade. Respeitoso pela pluralidade de critérios e ideologias, está profundamente convencido da força dos jovens para a transformação da sociedade e a construção da civilização do amor.
5.2.2. Tarefas A identidade do assessor de Pastoral da Juventude, com toda a riqueza de dimensões que envolve, determina também seu papel, isto é, o conjunto de atitudes e ações, tomadas de posição e estilos de vida e ação que ele põe em prática para o cumprimento de sua missão de assessor, em íntima e coerente relação com seu próprio ser e com sua própria realidade. Sua identidade psicológica leva-o a assumir com maturidade um papel de escuta, abertura, acompanhamento e encarnação; sua identidade espiritual faz com que viva seu papel a partir do amor de Deus a ele e aos jovens; sua identidade teológico-pastoral leva-o a assumir seu papel na dimensão ministerial; sua identidade pedagógica determina seu papel de educador com uma pedagogia de proposta e acompanhamento; e sua identidade social se plasma em seu papel de ator na transformação da sociedade. Esse papel pluridimensional explicita-se em diversos âmbitos: na relação consigo mesmo, no acompanhamento pessoal aos jovens, no acompanhamento aos grupos, em sua relação com os outros assessores e em sua relação com a comunidade eclesial e social. a) Em relação consigo mesmo As exigências do acompanhamentos aos jovens fazem-no tomar consciência da necessidade de capacitar-se teológica, pedagógica, científica e tecnicamente para ter uma visão mais clara e sempre atualizada da realidade e da cultura juvenil, para definir critérios precisos que orientem sua presença e sua ação no meio deles e para saber utilizar os instrumentos adequados no momento oportuno. A capacitação não se obtém de um dia para o outro. É um processo de busca e conquista. Um processo formador às vezes difícil e questionador, porém muito enriquecedor, pelo qual se assimilam qualidade e se adquirem aptidões para desempenhar mais eficazmente missão recebida. O assessor se preocupa com sua formação integral, gradual e permanente, e está atento para aproveitar e participar das instâncias especializadas que se oferecem para “formar formadores”. Incansável pesquisador da verdade e da plenitude, vive em atitude de abertura, sempre disposto a renovar-se e mudar. Lê, sistematiza materiais e experiências, organiza seu trabalho, distribui suas tarefas e seu tempo para uma melhor realização de seu serviço e para não afetar os demais compromissos de sua vida pessoal, e avalia constantemente seu ser e seu agir como assessor.
b) Em relação com a pessoa do jovem A grande maioria dos assessores geralmente começa sua experiência animando e acompanhando grupos de jovens. Logo, contudo, a própria vida os leva a um nível muito mais delicado, profundo e de maior responsabilidade, que é o acompanhamento pessoal de cada jovem. Este é um elemento essencial da tarefa do assessor. Por ele, de um modo mais direto e concreto, o assessor ajuda os jovens a clarear e definir seu projeto de vida e a fazer as opções que configurarão seu ser e seu agir na Igreja e na sociedade. É um acompanhamento integral, que atende a todos os aspectos e dimensões da vida, e é um acompanhamento processual e gradual. Um seguimento que tem sua própria lógica e que não pode ser feito de uma forma apenas espontânea e voluntariosa. O acompanhamento pessoal deve ter em conta sobretudo a dimensão afetiva do jovem, sua escolha profissional e sua opção vocacional, seu compromisso e participação ativa, consciente e responsável, não só nas estruturas eclesiais, mas também, e principalmente, nas estruturas sociais e políticas; seu processo de crescimento na fé e amadurecimento de uma espiritualidade que integre a fé e a vida e leve a uma opção cada vez mais madura e consciente por Jesus e seu Evangelho, articulada com seu projeto global de vida. c) Em relação com o grupo Outro elemento essencial da tarefa do assessor é acompanhar os processos dos grupos de jovens para que possam vir a ser verdadeiros espaços de crescimento humano e de amadurecimento na fé. Nesse sentido, o assessor tem um vasto e variado campo de ação. Como pessoa integradora, dialogante, capaz de estabelecer um tipo de relação horizontal e de igualdade com os jovens, cria e favorece o clima de amizade e confiança necessário para que possam desenvolver nos grupos seus processos de conversão e crescimento. Educa para o diálogo e a fraternidade, celebra a dimensão festiva de sua vida, valoriza seus gestos, seus sinais e suas expressões simbólicas. A partir da realidade pessoal e social dos jovens do grupo, promove processos de formação integral, crítica e libertadora, e lhes dá continuidade ao longo de suas diferentes etapas. Anima a integração dos recém-convocados , fomenta o crescimento e o amadurecimento dos iniciantes e apoia o compromisso dos militantes. Dedica especial atenção à formação e ao acompanhamento dos coordenadores. Promove as lideranças, descobre e estimula as aptidões pessoais dos jovens, e delega funções para propiciar o desenvolvimento de suas capacidades. Utiliza metodologias e pedagogias que promovem o protagonismo juvenil e integram elementos atraentes como o teatro, o esporte, a música, o cinema, a arte... (SD 119). Educa para a organização, respeitando o que os jovens propõem e se disponibilizando para entender e orientar a sua criatividade. Ajuda a clarear funções dentro do grupo, impulsiona coresponsável dos planos e dos programas previstos e favorece a sistematização das experiências realizadas. Estimula tudo o que promove e fortalece a identidade do grupo e, ao mesmo tempo, ajuda-o a abrir-se a dimensões eclesiais e sociais mais amplas do trabalho com os jovens. Desperta a sensibilidade e o compromisso com os mais fracos e empobrecidos e apoia o grupo em sua projeção sociopolítica, acompanhando-o na ação e fornecendo-lhe elementos de formação e discernimento para entender sua ação como uma concretização de sua fé cristã. Com mentalidade aberta e pluralista, favorece o encontro e o intercâmbio com outras organizações que também trabalham por um mundo mais humano, aceitando que estas também existem para além das experiências cristãs e eclesiais. Promove a experiência comunitária da fé, respeita e valoriza as expressões religiosas dos jovens e leva o grupo a aprofundar a Palavra de Deus e a ter uma forte e sólida vivência e compreensão da oração e dos sacramentos. É uma permanente referência a Jesus e ao Evangelho. Anima, convida e ensina, com seu testemunho, o valor e o lugar da oração, dos sacramentos e das celebrações na vida dos seguidores de Jesus.
No acompanhamento grupal, o assessor se assegura de não trabalhar sozinho, mas em íntima colaboração com os coordenadores e em vinculação com as instâncias de coordenação correspondentes. d) Em relação com os outros assessores A assessoria de pastoral da juventude é um ministério eminentemente colegial. O assessor não trabalha sozinho e isolado em seu grupo; é chamado a relacionar-se com os outros assessores, especialmente a Equipe de Assessores. A Equipe de Assessores possibilita a complementação não só em nível de aptidões pessoais e de distribuição das tarefas, mas principalmente em nível de contribuição que as diferentes experiências de vida dos assessores – leigos, religiosos, diáconos, sacerdotes – oferecem aos jovens como modelos de projetos de vida cristã. A Equipe de Assessores não é uma instância de planejamento ou de coordenação de atividades para os jovens. É um âmbito para partilhar a vida; para confrontar com outros assessores idéias e experiências, para discernir comunitariamente os sinais da vida juvenil; para encontrar apoio na oração, na reflexão e na avaliação de seu serviço; e para celebrar, juntos a presença de Jesus vivo nas diversas situações dos processos juvenis que são acompanhados. e) Em relação com a sociedade O papel do assessor tem implicações na comunidade eclesial e na comunidade social nas quais realiza seu serviço. • Na interface com a comunidade eclesial, o assessor procura concretizar uma presença maior dos jovens na vida da Igreja, abrindo-lhes melhores e mais reais “espaços de participação” (SD 119). Preocupa-se, também, em chegar aos jovens e acompanhar aqueles que participam esporadicamente da vida da Igreja ou não estão integrados no processo orgânico da Pastoral da Juventude. Anima a celebração de uma liturgia “viva, participativa e com projeção para a vida” (SD 145). Fomenta a comunhão eclesial, sendo elo de ligação entre as gerações adultas e os jovens, promovendo o “diálogo mútuo entre jovens, pastores, e comunidades” (SD 114), assegurando a coordenação da Pastoral da Juventude geral e das Pastorais Específicas de Juventude com a pastoral de conjunto e abrindo caminhos para oferecer um itinerário de amadurecimento humano e cristão que não se esgote na iniciação ou na militância juvenil. • Na interface com a comunidade social, o assessor busca desenvolver o potencial dos jovens e levalos a uma maior presença e ação a favor das “necessárias transformações da sociedade” (SD 115). Fomenta a análise e o estudo sistemático dos fatos sociais e colabora na busca de respostas às necessidades dos jovens e da sociedade. Educa nos valores democráticos e oferece espaços de formação “visando uma atuação política dirigida ao saneamento e ao aperfeiçoamento da democracia e ao serviço efetivo da comunidade” (SD 193). Promove a consciência social dos jovens para que sejam capazes de “conhecer e responder criticamente aos impactos culturais e sociais que recebem” (SD 114). Ele sabe que isso implica litar contra “certas mentalidades eclesiais que privam de dar respostas eficazes aos desafios atuais da sociedade” (SD 96), motivo pelo qual se esforça para que os jovens sintam sempre “todo o respaldo de seus pastores” (SD 99). Como adulto, o assessor se situa, tanto dentro da comunidade eclesial como dentro da comunidade social, como um enviado ao mundo juvenil. O mundo juvenil geralmente se propõe os melhores ideais para transformar a sociedade e a Igreja. Costuma, no entanto, encontrar oposição e indiferença por parte do mundo adulto. Muitos problemas dos jovens não são problemas da juventude como tal, mas problemas do mundo adulto refletidos no mundo juvenil. Boa parte dos problemas da juventude encontra sua explicação no rompimento da relação com o mundo adulto e na distância que se criou entre ambos. Será tarefa do assessor ajudar o mundo adulto a entender o mundo juvenil. Com sua maturidade e atitude de diálogo, falará e discutirá com ele sobre seu conceito de juventude e influirá para que deixem de considerar os jovens somente como “problemas” e descubram seu potencial e o valor de sua contribuição questionadora e renovadora. Ao mesmo tempo, ajudará os jovens a entender o
mundo adulto e a valorizar a contribuição de sua experiência e de seu modo de ver e entender o mundo e a história. Poderá tornar-se, assim, um elemento reconciliador entre o mundo adulto e o mundo juvenil. Ajudará a superar o conflito de gerações e promoverá uma unidade comunitária que será sinal e anúncio do novo modo de relação de jovens e adultos na civilização do amor que se quer construir. 5.2.3. Níveis de Assessoria A identidade e o papel do assessor se enriquecem com funções e responsabilidades que acarretam novos conteúdos e exigem tomadas de posição mais determinantes, segundo os níveis nos quais se realiza a assessoria. Um primeiro nível é a assessoria ao grupo. O mais correto é que o assessor inicie aí seu serviço. Sem essa experiência de trabalho de base, a assessoria poderia tornar-se um ofício meramente técnico ou desencarnado, e até poderia haver assessorias sem grupos nem comunidades. Quando os grupos paroquiais ou das Pastorais Específicas de Juventude se multiplicam, começam as articulações ou coordenações em nível paroquial, diocesano, nacional, regional e latino-americano. A assessoria assume, então, um matiz especial como elo de unidade e comunhão. O papel do assessor que participa desses níveis de coordenação se define de acordo com as características e exigências do nível que ele assessora. Em todos os casos cuidará particularmente para que os organismos estejam realmente a serviço dos jovens e promovam o desenvolvimento e o amadurecimento de seus processo de formação. Há assessores que acompanham a etapa da iniciação e assessores que acompanham a etapa de militância. Os que acompanham a etapa de iniciação zelam pela que os processos de formação dos jovens culminem na militância, em sua integração criativa e dialogante com a comunidade adulta, e no discernimento de sua opção vocacional. Os que acompanham a etapa de militância alimentam a vinculação concreta dos jovens com suas comunidades cristãs. Ajudam-nos a aprofundar suas motivações de fé para enfrentar os riscos do compromisso militante, animam-nos a revisar e celebrar sua vida e sua prática e os acompanham na realização plena de sua opção vocacional. A assessoria das Pastorais Específicas de Juventude supõe um conhecimento particular da realidade de cada meio e o uso de metodologias e estruturas de coordenação adequadas a cada situação. O assessor vai se formando no acompanhamento e crescendo ao caminhar junto com os jovens. Sabe que não existem processos totalmente uniformes e que é preciso abertura e flexibilidade para poder responder às novas exigências que as diversas situações juvenis suscitam. 5.3. O pároco Como “cooperador principal do bispo”113 em determinado território da diocese, o pároco é o primeiro responsável pela evangelização dos jovens da comunidade para a qual foi enviado. A Igreja lhe pede que, em meio à dedicação a todos, “atenda com particular diligência os jovens114. O pároco se interessa por conhecê-los pessoalmente e por compreender as características de seu novo mundo cultural. Tenta pôr em prática a opção preferencial pelos jovens da Igreja latino-americana, procurando fazer com que sua comunidade paroquial seja um espaço aberto e um ambiente acolhedor que possibilite o encontro e a comunicação, o crescimento pessoal e o compromisso a serviço dos demais. Leva em conta suas iniciativas e favorece sua realização. Ajuda a comunidade a tomar consciência da realidade dos jovens, e os jovens a tomar consciência da realidade da comunidade mais ampla, na qual são chamados a participar e a oferecer sua contribuição renovadora. Faz com que a pastoral da juventude esteja integrada na pastoral de conjunto e seja protagonista e destinatária privilegiada da tarefa evangelizadora de toda a comunidade. Não permite que os jovens fiquem sós. Busca os animadores e assessores necessários para que possam acompanha-los e cuida particularmente de sua capacitação, formação e direção espiritual. Em consulta a eles, delega algumas de suas responsabilidade a um Assessor ou Responsável Paroquial qualificado – sacerdote, religioso ou leigo. Porém, de todas as formas, mantém-se a par do processo da Equipe Paroquial da Pastoral de Juventude e 113 114
Vaticano II, decreto Christus dominus, 30. Vaticano II, decreto Presbyterorum ordinis, 6.
faz o possível para seguir de perto a vida dos grupos. Como pastor e sacerdote, escuta-os, anima-os, serveos e está presente em seus momentos mais significativos. Promove espaços especiais, para que os jovens possam expressar e celebrar sua fé de acordo com suas características. No trato com os jovens e nas decisões que possam afetá-los, evita cisões e conflitos desnecessários. 5.4. O bispo O bispo é o “princípio e fundamento visível da unidade em sua Igreja particular”115. Como “mestre da verdade, sinal e construtor da unidade, pontífice e santificador” (P 687-689), é o primeiro responsável pela missão evangelizadora de sua comunidade diocesana. Na fidelidade à Palavra de Deus e aos sinais dos tempos, discerne, junto com ela, o projeto do Senhor para seu povo e anima, ao estilo de Jesus, a busca de critérios e a implementação das opções pastorais. Em comunhão com a Igreja latino-americana, esforça-se para que a opção preferencial pelos jovens se torne realidade em sua diocese “não só afetiva, mas efetivamente” (SD 114)116 e se interessa por conhecer e promover as orientações que os bispos e responsáveis nacionais pela Pastoral da Juventude formularam nos últimos anos no âmbito da Seção Juventude do CELAM. Anima os párocos e as comunidades a se preocupar com a evangelização dos jovens, destina pessoas e recursos e, com sua palavra e sua presença, motiva sua ação e seu compromisso. Presta especial atenção à seleção, capacitação e formação permanente dos assessores para que possam cumprir eficazmente seu serviço de acompanhamento aos jovens. Em consulta a eles e aos organismos de coordenação e participação juvenil, designa um Assessor Diocesano – sacerdote, leigo ou religioso -, a quem confia a responsabilidade de acompanhar mais de perto e animar o trabalho diário da pastoral da juventude. Nem por isso delega seu amor de pai e de bom pastor que cuida permanentemente de todos, em especial dos que estão “perdidos, desgarrados, feridos e doentes...” (Ez 34,16). Na medida de suas possibilidades, participa da vida dos jovens, conhece-os, está presente em suas atividades, celebra com eles a fé, especialmente nos dias mais significativos. Esforça-se por falar sua linguagem, apresentalhes propostas atraentes para suas vidas, entusiasma-os com seu testemunho no seguimento de Jesus e anima seu compromisso com a construção da civilização do amor.
115
Vaticano II, constituição dogmática Lumen gentium, 23. É muito significativa a reiterada insistência do papa às Conferências Episcopais da América Latina em suas visitas ad limina, durante 1994 e 1995, no sentido de atender aos jovens e à Pastoral da Juventude. Cf. discurso à Conferência Episcopal do Panamá (21 de janeiro de 1994), 4; à Conferência Episcopal das Antilhas (29 de janeiro de 1994),4 ; à Conferência Episcopal do Uruguai (12 de fevereiro de 1994),2 ; à Conferência Episcopal da Nicarágua (18 de fevereiro de 1994), 6 ; à Conferência Episcopal da Costa Rica (19 de fevereiro de 1994), 8; à Conferência Episcopal da Guatemala (4 de março de 1994),6; à Conferência Episcopal de Porto Rico (14 de março de 1994), 8; à Conferência Episcopal do Haiti (18 de março de 1994), 6; à Conferência Episcopal da República Dominicana (25 de março de 1994), 4; à Conferência Episcopal do Equador (21 de junho de 1994), 10; à Conferência Episcopal de Cuba (25 de junho de 1994), 9; à Conferência Episcopal do Paraguai (30 de agosto de 1994), 6; à Conferência Episcopal do Chile( 18 de outubro de 1994), 6; ao terceiro grupo de bispos mexicanos (29 de novembro de 1994), 2; ao primeiro grupo de bispos argentinos (7 de fevereiro de 1995), 3; e à Conferência Episcopal da Venezuela (9 de maio de 1995), 5. 116
III
Quando chega o momento de acompanhar o processo de um grupo concreto, surge imediatamente, a pergunta: “Como” fazê-lo? Que passos dar? Que instrumentos utilizar?... É a pergunta pelo método. O método é, pois, o conjunto de passos e procedimentos que encaminha um grupo para a consecução de seus objetivos. A pergunta pelo método comporta dois níveis: um visa o processo global dos jovens e do grupo; neste caso, o método deve responder aos objetivos gerais das pastorais de juventude diocesanas e nacionais, ao processo integral da educação na fé e à vida do grupo num intervalo de tempo pelo menos anual; o outro visa as reuniões do grupo. O método refere-se, então ao objetivo e aos passos concretos que devem ser dados para o desenvolvimento de cada reunião. Não é qualquer método que serve aos objetivos evangelizadores da pastoral da juventude. O método a ser utilizado é determinado pelos sujeitos, isto é, pelos jovens, com suas características e realidades próprias; pelo contexto geográfico, social, cultural e econômico em que vivem; pelas opções pedagógicas descritas anteriormente, pelo momento do processo em que se encontra o grupo e pelo objetivo próprio de cada reunião. 1. CRITÉRIOS PARA UMA METODOLOGIA DA PASTORAL DA JUVENTUDE Entre a pedagogia e o método, há uma instância intermediária que é a metodologia, a série de princípios práticos que concretizam a pedagogia e condicionam o método. Santo Domingo estabelece que “a pastoral da juventude promoverá o protagonismo atráves da metodologia do ver, julgar, agir, revisar e celebrar” (SD 119). Isso significa que, para ser apta para a pastoral da juventude, uma metodologia precisa: • Ser coerente com a pedagogia de Jesus e com a pedagogia pastoral proposta, e atender ao processo integral de educação na fé, em suas cinco dimensões e em suas três etapas; • Assumir a vida dos jovens, sua realidade e sua experiência, e ajuda-los a partilhar sua vida e a ser protagonistas de sua história; • Levar a confrontar suas vidas com a Palavra de Deus e possibilitar o encontro pessoal e comunitário com Jesus Cristo; • Favorecer uma experiência comunitária, participativa e dialogal, e um crescimento no sentido de pertença à Igreja local, diocesana, nacional, latino-americana e universal; • Criar consciência missionária, fomentando o testemunho e o anúncio explícito de Jesus na vida cotidiana. Mais concretamente, uma metodologia apta para a pastoral da juventude tem de ter momentos próprios para: o Tornar expressamente presente a vida real do jovem, suas buscas, sua realidade pessoal e social e as causas que a produzem. Mais ainda: deve tornar presentes também aqueles aspectos da realidade nas quais o jovem não está subjetivamente envolvido, mas em relação aos quais deve estar sensibilizado, por aí se manifestarão novos chamados de Deus; o A personalização e a socialização, em que o jovem possa assumir a si mesmo; reconhecer-se como pessoa em sua própria realidade e em relação ao seu contexto familiar, de bairro, educativo e profissional, etc. e tomar distância em relação aos mecanismos massificadores, individualistas e utilitaristas da sociedade;
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A iluminação com a Palavra de Deus e o Magistério da Igreja, em que se explicite claramente a proposta libertadora de Jesus e o jovem possa confrontar sua vida com ela; O compromisso, pelo qual o jovem possa amadurecer a dimensão missionária da fé e expressá-la em ações transformadoras de sua realidade pessoal e social; A revisão, onde através da qual possa observar o processo vivido, em seus diversos níveis: o compromisso pessoal, a reunião e as atividades do grupo e o planejamento geral. Os momentos de revisão e de avaliação desenvolvem no jovem sua atitude crítica e o ajudam a reconhecer as etapas de crescimento e amadurecimento por que passa com o seu grupo; A celebração, em que os jovens possam expressar as vivências de alegria, dor, compromisso, etc. da vida grupal. Podem ser momentos espontâneos nos quais a celebração litúrgica, a presença de Deus na vida de cada jovem e do grupo; ou momentos motivados por situações concretas do grupo que expressem a alegria de estar juntos, o agradecimento pela vida, o pedido de perdão, etc.
2. A METODOLOGIA DO VER-JULGAR-AGIR-REVISAR-CELEBRAR A longa experiência educadora da Igreja gerou, por iniciativa do cardeal Cardijn para a Juventude Operária Católica da Bélgica, na primeira metade desta século, a clássica metodologia do “ver – julgar – agir”. Dela dizia o papa João XXIII: “É muito oportuno convidar os jovens frequentemente, a refletir sobre essas três fases e coloca-las em prática, sempre que for possível. Assim, os acontecimentos aprendidos e assimilados não ficam neles como idéia abstrata, mas os capacitam, na prática, a levar à realidade concreta os princípios e as diretrizes sociais”117. O ver-julgar-agir surgiu como uma metodologia para a ação transformadora dos cristãos em seus ambientes e para a superação do divórcio entre fé e vida. A Igreja latino-americana assumiu em Medellín, cujos documentos seguem exatamente os três momentos propostos. O mesmo aconteceu em Puebla. Santo Domingo a reassumiu explicitamente para a Pastoral da Juventude (cf. SD 119) e, segundo a proposta do I Congresso Latino-Americano de Jovens de Cochabamba118, incorporou os novos momentos: o “revisar” e o “celebrar”. Desde os primórdios a Pastoral da Juventude Latino-Americana reconheceu nela a metodologia que melhor respondia às condições e exigências de suas opções pedagógicas, e a assumiu criativamente. À medida que foi colocando em prática na diversidade de grupos, situações e momentos históricos, surgiram variações, adaptações, inclusões, enriquecimentos de todo tipo, até chegar ao momento atual, em que é possível reconhecer muitos métodos que derivaram diretamente dela e que articulam em passos concretos suas instituições fundamentais de partir da realidade, iluminá-la a partir da fé, propor uma atitude de conversão e um compromisso transformador, revisá-lo e celebrá-lo. Mais que uma metodologia, o ver-julgar-agir-revisar-celebrar é, hoje, um estilo de vida e uma espiritualidade, que vive e celebra a descoberta da presença de Deus na história, a atitude de conversão pessoal contínua e o compromisso para a transformação da realidade. 2.1. VER É o momento da tomada de consciência da realidade. É partir dos fatos concretos da vida cotidiana para não se enredar em suposições nem abstrações e buscas suas causas, os conflitos presentes que os geram e as consequências que se pode prever para o futuro. Isso permite uma perspectiva mais ampla, profunda e global que motivará, depois, a execução de ações transformadoras direcionadas para as raízes dos problemas. Sem pretender ser exaustivo, pode ser útil, às vezes, utilizar alguns dos instrumentos de conhecimento da realidade propostos pelas ciências sociais. Deve-se ter em conta também que nenhuma visão da realidade é neutra: sempre comporta pressupostos teóricos inspirados em critérios, valores, ideologias, etc.
117 118
João XXIII, encíclica Mater et magistral, 72. I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Contribuição à IV Conferência do Episcopado Latino-Americano”, 14.
2.2. JULGAR É o momento de analisar os fatos da realidade à luz da fé e da vida, da mensagem de Jesus e de sua Igreja, para descobrir o que está ajudando ou impedindo as pessoas de alcançar sua libertação integral, de viver como irmãos e de construir uma sociedade de acordo com o projeto de Deus. É o momento de interpelar a Palavra de Deus e os documentos da Igreja, deixando que questionem a situação analisada e os pressupostos teóricos que condicionaram a visão do momento anterior. O julgar ajuda a tomar consciência do pecado pessoal presente na vida de cada um e do pecado social presente nas estruturas da sociedade. Julgar exige um conhecimento cada vez mais profundo da mensagem cristã, um ambiente de oração, um diálogo profundo com Jesus Cristo presente na vida dos cristãos e na vida sacramental da Igreja, uma purificação cada vez maior do egoísmo e uma explicitação das razões fundamentais que animam a fé. É um momento privilegiado, pois nele se situa a especifidade cristã dessa proposta metodológica. 2.3. AGIR É o momento de concretizar, num ação transformadora, o que se compreendeu acerca da realidade (ver) e o que se descobriu do plano de Deus sobre ela (julgar). É o momento da prática nova e do compromisso. O agir impede que a reflexão fique no abstrato. Deve-se estar atento para que o que se propõe realizar não seja fruto de intuições momentâneas ou decisões voluntaristas, mas fruto maduro da reflexão realizada. A ação transformadora é antes de tudo uma ação libertadora. Parte das necessidades das pessoas e busca atacar as raízes do problema. Envolve a participação de todos. Não se restringe à esfera do pessoal, mas procura incidir de fato na realidade social. É um processo lento e exige muita paciência. Ser agente transformador é ser fermento na massa, é fazer da própria vida um testemunho de fé da presença de Jesus Cristo na vida e na história e uma vivência comprometida de seu seguimento. É colaborar ativamente na construção da civilização do amor. 2.4. REVISAR É o momento da avaliação. É tomar consciência hoje do que foi feito ontem para melhorar a ação de amanhã. Já que a realidade é dinâmica, a avaliação enriquece e aperfeiçoa a própria visão da realidade e, ao mesmo tempo, sugere ações novas, mais profundas, críticas e realistas. Trata-se de verificar o grau de cumprimento dos objetivos e a forma de assumir as responsabilidades, de avaliar o processo, de perguntar-se pelas consequências das ações que estão sendo realizadas e de encontrar formas de garantir os avanços, superar as dificuldades e continuar avançando. A avaliação valoriza as conquistas alcançadas, permite experimentar alegria pelo caminho percorrido, torna consciente o crescimento das pessoas e põe em comum as experiências vividas pelos jovens que compartilharam o mesmo compromisso. É um momento muito importante da metodologia, muitas vezes esquecido ou deixado de lado. Sem ele, não se pode alcançar os frutos esperados. Sem avaliação, a ação deixa de ser transformadora, não se valorizam os avanços nem se aprende com os erros, não se estimulam novas ações, o grupo para e morre. 2.5. CELEBRAR A percepção do conjunto de todo o processo: a descoberta do Deus da vida na realidade pessoal e social (ver), o encontro com ele na Palavra (julgar) e o compromisso com a transformação da realidade (agir) levam espontaneamente à celebração gratuita e agradecida da experiência vivida. Para o cristão, fé e vida estão integrados. Por isso, deve-se celebrar as vitórias, as conquistas e os fracassos, as alegrias e as tristezas, as angústias e as esperanças, a vida do grupo, a penitência e a conversão, a união e a organização. Celebrando a vida concreta, reconhece-se a presença de Deus libertador fazendo história com seu povo. O celebrar revela e alimenta a dimensão litúrgica e sacramental da realidade (ver), do discernimento da vontade de Deus (julgar) e do compromisso transformador (agir). A celebração fortalece a fé e põe o grupo e seus membros em contato direto com o Mistério central do cristianismo: a paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo.
3. OS MÉTODOS A Pastoral da Juventude Latino-Americana tem uma metodologia, mas poder usar diferentes métodos. A lista apresentada a seguir não pretende ser exaustiva nem fazer deste capítulo um “manual de metodologia”. A intenção é facilitar um breve conhecimento de alguns dos métodos mais usados no continente, considerados válidos na medida em que concretizam e realizam os critérios da metodologia do ver-julgar-agir-revisar-celebrar. Deve-se ter presente que cada método tem seu próprio objetivo e é válido para conseguir determinados resultados. A experiência demonstra que é importante que o assessor coordenador conheçam e lidem com vários métodos e, sobretudo, que discirnam a oportunidade de utilizar a um ou outro em função da etapa do grupo e dos objetivos que se tem em mira no processo em curso. 3.1. O método da revisão de vida A revisão de vida não é simplesmente uma técnica para desenvolver uma reunião de grupo. É um método e, sobretudo, um caminho de espiritualidade visando tornar coerente e adulta a vida cristã vivida em comunidade e construir uma comunidade eclesial presente no mundo, a serviço do Reino oferecido como destino e salvação para toda a humanidade. Primeiro momento: ver O objetivo deste momento é abordar um “fato da vida” em que se ache pessoalmente envolvido algum dos integrantes do grupo, com o fim de, analisando-o juntos, vir a descobrir as atitudes e os modos de pensar, valorizar e agir dos membros do grupo em relação a esse fato da vida e a outros semelhantes que ele possa sugerir. A análise busca desvelar o valor-antivalor central que está em jogo no fato apresentado, levando a descobrir como é vivido pelos integrantes do grupo e pelo contexto social. Normalmente são apresentados vários fatos da vida. Escolhe-se um dos apresentados, por ser mais significativo para o grupo ou por afetar especialmente algum dos seus membros. Fornece-se a maior quantidade possível de elementos para facilitar a sua melhor compreensão, determina-se o núcleo central a partir do qual ele será analisado, buscam-se as causas e analisam-se as consequências que possa ter sobre as pessoas e organizações sociais e conclui-se universalizando-o, isto é, envolvendo todos os participantes no fato apresentado ou em outros semelhantes vividos por eles. Segundo momento: julgar É o momento central da revisão de vida. Seu objetivo é tomar posição diante do fato analisado, explicitar o sentido que a fé descobrem a experiência de Deus que implica e o chamado à conversão que surge dele. Procura-se fazer com que as pessoas envolvidas se confrontem com o Deus vivo que revela sua vontade e seu projeto – o Reino – na história da salvação e na experiência pascal de Jesus Cristo. Para isso, valoriza-se – positiva ou negativamente – o fato. Buscam-se textos do Evangelho ou da Palavra de Deus que mostrem como Jesus viveu esse valor ou como questionou esse antivalor, explicitando-se as consequências de encontro com Deus e o chamado à conversão que a reflexão do fato significou. Não se trata de uma análise teórica, mas da busca dócil do discípulo que se põe em atitude de abertura para acolher a Palavra de Deus que julga e liberta, chama à conversão e ao seguimento. Não se trata de um debate, mas de uma partilha fraterna, feita em espírito de oração. Importa a lucidez do julgamento; importa mais ainda, porém, a vontade de conversão manifestada perante a comunidade. Terceiro momento: agir O objetivo deste momento é determinar aquelas atitudes que as pessoas devem mudar em suas vidas, os critérios de julgamento que devem ser transformados, os hábitos que são questionados pela Palavra de Deus e as ações que serão desenvolvidas para pôr em prática as novas responsabilidades assumidas. Responde à questão: “O que o Senhor exige diante dos fatos revisados?”.
As ações devem procurar atender não só à mudança pessoal, mas também à mudança da comunidade e dos ambientes em que se desenvolve a vida dos jovens. O compromisso é antes um propósito concreto de conversão pessoal e de compromisso social do que uma ação grupal. Embora não sejam considerados explicitamente como momentos do método, a revisão de vida também contempla tempos especiais para a revisão e a celebração. As reuniões do grupo começam geralmente com a avaliação dos compromissos assumidos na revisão anterior e incluem momentos de oração e celebração, especialmente da Reconciliação e da Eucaristia. Por outro lado, o ambiente em que se realiza a revisão de vida só pode ser entendido se se parte com o Deus da Vida e o Homem novo em Jesus Cristo, num clima de autenticidade, conversão e esperança. 3.2. O método da formação experiencial O grupo ou comunidade juvenil é uma experiência na qual os jovens partilham sua vida e são acompanhados no processo de elaboração do que vivem, revisando-o à luz da fé e celebrando em comum os acontecimentos do seguimento de Jesus. O método da formação experiencial propõe-se acompanhar os encontros comunitários, permitindo aos jovens pôr em comum suas experiências, aprofundá-las e iluminá-las e, assim, transformar progressivamente suas vidas através da adesão à mensagem de Jesus. Cada encontro comunitário procura alcançar um objetivo operacional que nasce da conjugação dos interesses e das inquietações dos jovens com uma proposta evangelizadora adequada ao momento que o grupo vive e ao processo de educação na fé. Este objetivo é alcançado numa sequencia que contempla quatro momentos. Primeiro momento: motivação É uma breve atividade para despertar e centralizar o interesse dos jovens na experiência que se pretende abordar. Deve ajudar a provocar perguntas a seu respeito e a criar as condições para seu posterior aprofundamento. Deve estar diretamente relacionada com o objetivo da reunião, mas não se deve antecipar respostas a respeito. Pode-se ouvir canções, ler poemas, apresentar cartazes previamente preparados, etc. Segundo momento: descrição da experiência É o momento de criar condições para que os jovens possam pôr em comum sua experiência pessoal acerca do tema abordado e tomar contato com o que vivem, sentem, pensam e fazem, como primeiro passo para compreender melhor a si mesmo e o meio em que vivem. A descrição da experiência é um passo necessário para restituir a palavra aos jovens e ajuda-los a dar nome ao que vivem. O exercício ou técnica empregada deve facilitar a expressão pessoal e assegurar a possibilidade de que todos se sintam envolvidos. Terceiro momento: análise da experiência É o aprofundamento da experiência para poder compreendê-la melhor e descobrir nela os aspectos não percebidos inicialmente e os elementos não tomados suficientemente em conta, mas que realmente condicionam e influem nas situações que cabe viver. Esse momento pretende retomar as experiências pessoais e trabalhar seus significados, facilitando o processo de “conscientização”, já que elas expressam os critérios, as valorizações conscientes ou inconscientes, a informação que se lida, a auto imagem, a consciência social, as possibilidades reconhecidas de ação, o que se considera bom ou mau... enfim, tudo o que constitui sua “visão de mundo”, que é o que se quer evangelizar. É preciso estar atento para que essa etapa tenha continuidade com a anterior e, ao mesmo tempo, signifique um avanço na reflexão. Além das perguntas facilitadoras, e o momento para que o grupo possa receber um contribuição à reflexão que o ajude a realizar melhor a análise.
Quarto momento: discernimento da experiência Uma vez compreendida e assumida melhor a experiência, é possível fazer sua leitura a partir de seu sentido mais profundo, o significado da fé. Discernir a experiência é captar nela a ação salvífica de Deus e as resistências ou rejeições a essa ação. Trata-se de acolher a palavra de Deus e de responder ao convite que ele faz para uma mudança de vida e de atitudes, deixando-se levar pela forço do Espírito e abrindo-se à ação de Deus, sempre presente em toda experiência humana. A etapa metodológica do discernimento apóia-se na atitude pessoal de busca de um novo sentido para as experiências pessoais; na proclamação da Palavra, que convida a viver um mensagem que desvela, interpreta e consolida as experiências de vida e na dimensão comunitária, que fortalece o processo e faz da comunidade um lugar de encontro e de celebração do acontecimento e um espaço de testemunho e apoio ao discernimento. 3.3. O método catequético Seu objetivo é comunicar vivencial e integralmente a fé da Igreja, de modo que se descubra a presença de Jesus na situação em que as pessoas vivem. Supõe um itinerário sistemático, organizado em função dos conteúdos explícitos da fé, mas que leva em conta a realidade das pessoas dos catequizandos119. Num primeiro momento, por meio de técnicas apropriadas, como fotos, vídeos, dispositivos, cantos, etc, evoca-se uma realidade humana fazendo o grupo tomar consciência de uma experiência ou situação real. Uma vez evocada, essa experiência é aprofundada e enriquecida, procurando-se compreendê-la mais plenamente em suas causas. Motivações, consequências, etc. Trata-se de descobri-la como própria, vivida, com as peculiaridades e as características de cada um. É o momento de partilhar as vivências pessoais respeitando o nível de confiança, intimidade e abertura que se tenha obtido no grupo. Num segundo momento, procura-se descobrir a situação evocada e personalizada como lugar de encontro com Jesus Cristo, que dá um sentido novo, libertador e transcendente ao que está ocorrendo. Parte-se da leitura de algum texto da Escritura, de preferência um que narre a vida de Jesus ou de algum outro personagem bíblico, e constata-se como eles viveram também a mesma experiência que o grupo está analisando. Daí surge o sentido novo e salvífico que Deus dá a essa situação e seu chamado a viver de uma forma diferente a experiência de vida que está sendo analisada. Embora a presença de Deus se faça real e seja vivida durante todo o desenrolar, a reunião se encerra com um momento explícito de oração e de encontro com quem se descobriu presente, deu sentido novo a uma determinada situação de vida dos jovens e chama a vivê-la de acordo com a mensagem anunciada. 3.4. O método do planejamento pastoral O objetivo deste método é a elaboração de um plano pastoral global no respectivo nível em que se planeja. A elaboração de um plano pode levar vários meses, e sua execução pode abarcar um longo período, de três a cinco anos. Em sua elaboração, definição, execução e avaliação, deve haver o envolvimento de todas as pessoas integrantes do processo pastoral, cada qual em seu próprio nível e segundo o papel que desempenhe. Pode haver planos pastorais paroquiais, de área, diocesanos e nacionais. Cada nível exige modalidades diversas de participação de grupos, comunidades, agentes pastorais e organismos de coordenação, apoio e serviço. É muito importante encontrar formas concretas de fazer com que todos se sintam participando efetivamente. Pode-se fazer entrevistas, convocar assembleias, formar comissões de trabalho, confeccionar materiais a serem discutidos nos grupos, etc. Essa participação deve ser garantida especialmente no momento da tomada de decisões, como a escolha de prioridades, a definição dos objetivos e a aprovação de linhas de ação. A experiência da Pastoral da Juventude Latino-Americana mostra a validade das assembleias – nos níveis correspondentes – para os momentos culminantes desse tipo de processo.
119
Cf. DECAT-CELAM, Líneas comunes de orientación para la catequeses en América Latina, Santafé de Bogotá, 1992, nº50.
O marco da realidade O primeiro passo é determinar que aspectos da realidade se quer conhecer a partir de que ponto de vista se pretende fazê-lo. Pode fazer-se uma pesquisa para saber em que âmbitos o jovem se sente reconhecido, aceito e encontra espaço para seu crescimento e realização e em quais ele enfrenta dificuldades especiais. A informação “objetiva” das pesquisas e estatísticas é importante; mais importante, contudo, é conhecer a realidade tal como percebida e vivida pelos jovens. Uma vez coletada a informação, passa-se a detectar os “núcleos” ou os “nós” problemáticos da realidade revelada e a buscar as causas, consequências e implicações sobre os núcleos detectados. O marco doutrinal A ação evangelizadora não é resultado de uma mera elaboração estratégica e calculada: surge do mandato apostólico e da experiência de fé da Igreja. Por isso, em todo plano pastoral, deve haver uma expressão dessa fé em Deus Trinitário e da utopia sobre a Igreja e o projeto de homem e sociedade que se quer construir a partir do Evangelho. Nessa elaboração, integram-se os elementos que surgem da Palavra de Deus, das orientações do Magistério e das opções da Igreja local. Não se trata de elaborar um “tratado teológico” completo, mas de expressar com simplicidade a fé eclesial e a utopia que os que estão elaborando o plano querem viver e construir. O diagnóstico pastoral É o momento de cotejar o marco da realidade e o marco doutrinal para verificar não só a distância entre o que se “é” e o que se “quer ser”, mas, sobretudo, para descobrir as situações que reclamam respostas mais urgentes. O resultado é a definição de uma lista de prioridades às quais a ação pastoral deve responder. Como não é possível atender a todas as prioridades detectadas no cotejo, é inevitável selecionar as que parecem mais prioritárias. Essa etapa é sumamente importante e delicada, porque implica optar entre as diversas possibilidades, todas elas válidas e necessárias. Mas, deve-se correr o risco, confiante em que o Espírito de Jesus guia a escolha. As prioridades selecionadas – que não devem ser mais de três ou quatro – passam a ser as da ação pastoral que serão atendidas no plano em elaboração. A programação Estabelecidas as prioridades dos esforços pastorais futuros, é necessário definir também o que se quer alcançar e qual a intencionalidade das ações a serem realizadas. Isso se expressa num objetivo geral. Além do objetivo geral, convém estabelecer também para cada prioridade algumas linhas de ação que expressem as orientações fundamentais através das quais se procurara atingir o objetivo geral. A última etapa do plano é a elaboração dos programas que implementarão as linhas de ação escolhidas. A programação deverá ser feita pelo menos uma vez ao ano, claramente as metas a alcançar, as atividades a realizar, as datas, os responsáveis e os recursos necessários. A revisão e a celebração A revisão do plano se realiza em três instâncias: a avaliação periódica e geral, que cada organismo faz de seus próprios programas; a avaliação geral do andamento do plano, por parte dos organismos de coordenação, com uma frequência aproximadamente anual; e a avaliação final, após a conclusão do período de vigência determinado. Convém que da avaliação participe sempre o maior número possível de pessoas que estiveram presentes na elaboração e na execução. No início da vigência do plano, pode-se realizar uma celebração litúrgica na qual se distribui o seu texto, apresentam-se os responsáveis por sua animação e se comprometem todos num esforço conjunto para executá-lo. Cada avaliação periódica também pode ser marcada com uma celebração de agradecimento pelo que já se conseguiu, renovando-se a motivação para o que ainda resta por fazer. 3.5. O método da leitura orante da Bíblia
O objetivo desse método é a interiorização da Palavra de Deus encarnada na vida dos jovens e em seu contexto. Muito utilizado nas Comunidades Eclesiais de Base, tem-se mostrado de grande utilidade para que o povo simples conheça, vivencie e concretize a Palavra de Deus em sua realidade atual. O ponto de partida é uma situação, um fato, uma realidade pessoal e social contidos ou aludidos no texto da Escritura escolhido para leitura e reflexão. Sua descrição é semelhante à dos métodos apresentados anteriormente. Uma vez apresentada a situação, lê-se o texto escolhido, primeiro em voz alta e depois em silêncio, e passasse a seu estudo, atendendo especialmente a três níveis: • O nível literário: utiliza-se do texto escolhido para iluminar a situação, a partir de sua riqueza literária: seu estilo, seus personagens, suas expressões, os ambientes geográficos, a sequencia das cenas, etc.; • O nível sociológico ou histórico: analisa-se a problemática social em que se desenrola a cena do texto, na qual se compôs sua redação e na qual se encontram seus destinatários: os conflitos que viviam, as perguntas que se faziam, as necessidades que tinham, etc.; • O nível teológico formula-se a pergunta-chave do processo: Qual a mensagem do texto para os destinatários daquele tempo e para nós, hoje? O que Deus lhes queria dizer em sua situação histórica e o que nos quer dizer hoje, em nossa realidade? O encontro culmina numa celebração da passagem do Senhor pela vida do grupo, cujas formas concretas podem ser muito variadas: orações espontâneas, oração com um salmo ou com um canto, etc. Nela se expressa o compromisso surgido da meditação. A mensagem recebida pode ser resumida numa frase – escrita e afixada no lugar da reunião, para animar a vida e o compromisso dos participantes até o encontro seguinte. Por fim, escolhe-se o texto para a reunião seguinte, verificam-se os aspectos da realidade a serem considerados e distribuem-se os subsídios e as responsabilidades da preparação. 3.6. Dinâmica grupal, exercícios e técnicas Apenas um comentário final sobre esses elementos metodológicos pelos grupos e comunidades juvenis. Antes de tudo, é necessário esclarecer que as dinâmicas, os exercícios e as técnicas não são métodos, enquanto conjunto de etapas que levam a um objetivo. São recursos utilizados para a implementação dos métodos. A dinâmica grupal é o conjunto de forças que interagem num grupo de pessoas. É também o nome que se dá ao estudo sistemático dessas forças. Que podem ser expectativas e temores – e ao grupo – os objetivos em torno dos quais se nucleou, as relações que se tecem entre seus integrantes – ou externas a ambos – os objetivos da instituição à qual o grupo pertence. Com frequência, fala-se em “dinâmica de grupos” em alusão aos exercícios que visam realizar uma experiência ou canalizar o dinamismo do grupo para determinada meta. O tempo geralmente exigido para esse tipo de exercício pode variar muito de uns poucos minutos até mais de uma hora. Para que não sejam condicionados em sua participação, os membros do grupo não conhecem, de início, o objetivo visado. Os exercícios devem ser cuidadosamente selecionados em função das necessidades do grupo e cuidadosamente executados não de qualquer forma e a qualquer momento. Embora alguns pareçam, não são “jogos”, pois podem provocar situações pessoais ou grupais que, se foram inoportunas ou mal administradas, poderão se revelar contraproducentes ao crescimento do grupo. As técnicas são instrumentos concretos para implementar as etapas correspondentes de uma reunião. O diálogo em duplas, o uso de dispositivos, de vídeos ou de música; o chamado “Philips 66”, a discussão em subgrupos e em plenário, etc. São algumas das técnicas mais usadas tanto em reuniões de grupos como em encontros mais amplos. Há uma enorme variedade de técnicas. Convém ao coordenador manejá-las com facilidade, para enriquecer a reunião com maior dinamismo e eficácia.
Parte 4
Já faz algum tempo que a reflexão da Pastoral da Juventude Latino-Americana vem falando do “celebrar” como um momento explícito de sua proposta metodológica. Descobriu-se que, para os jovens, uma vida sem movimento nem celebrações não tem sentido nem dinamismo e que, portanto, a dimensão celebrativa é um elemento fundamental do estilo de vida que eles assumem no processo de amadurecimento humano e cristão que realizam. A existência cotidiana, com suas alegrias e tristezas, seus problemas e dificuldades, seus temores e esperanças, suas ações simples e compromissos radicais, é sinal da presença e da ação de Deus na história e na vida das pessoas. Encontrar-se com ele, reconhecer sua presença salvadora e seu chamado a responder com coerência e a comprometer-se na construção do Reino é celebrar a vida. Depois de haver feito os céus e a terra, o homem e a mulher e tudo o que vive, Deus Criador reservou um tempo para contemplar sua obra criadora (Gn 1,31). Quis também que suas criaturas se reservassem um tempo para reconhecer as maravilhas do Senhor e oferecer-lhes a sua luta e seu compromisso para dar continuidade a essa obra criadora. Celebrar a vida permite recuperar o sentido da gratuidade num mundo interesseiro e competitivo; dignifica o trabalho humano num mundo materialista e consumista; faz participar do dinamismo do projeto do Deus da vida num mundo de dependência, manipulação e morte; presentifica a dimensão da festa e do novo em face da rotina de cada dia; e explicita a fé na presença de Deus, que dá identidade cristã ao grupo e à própria vida. O momento da celebração é um momento privilegiado, para unir fé e vida, para reavivar a esperança e para reafirmar que, em meio a uma cultura da morte, os jovens querem viver e crescer num cultura de vida. Assim entendido, o “celebrar” que a Pastoral da Juventude Latino-Americana propõe é a plenitude de sua pedagogia e de sua metodologia. Não é o “último” marco, mas a culminância de todo o processo. Como os demais elementos da proposta, também a dimensão celebrativa se gera lentamente na experiência de Deus que os jovens vão descobrindo, assumindo e comprometendo-se a viver durante seu processo formador. Celebrar a vida diz respeito também à busca de sentido, ao que se é e ao que se faz, ao que anima e sustenta o cotidiano, ao que dá força para caminhar, às motivações profundas das opções feitas à espiritualidade. 1. A ESPIRITUALIDADE JUVENIL EMERGENTE “O vento sopra onde quer e tu ouves o seu som, mas não sabes de onde vem nem para onde vai. Assim é que nasceu do Espírito” (Jo 3,8). Essa experiência da ação do Espírito, que o evangelista João põe na boca de Jesus, leva a Igreja a discernir e a reconhecer essa ação na história e nas culturas concretas dos povos. Nos últimos anos, por influência das mudanças culturais, a experiência religiosa sofreu uma profunda transformação, passando de um discurso mais nacional ou racional, centrado sobretudo no institucional, para outro, centrado na própria vida e nas experiências individuais e grupais. Para muitos jovens, é mais fácil – e também mais verdadeiro – ter um experiência do sagrado no dia-a-dia da vida do que no ambiente da instituição religiosa. Daí sua adesão a movimentos religiosos, grupos ou organizações que frequentemente são considerados periféricos pela instituição, mas onde eles encontram experiências religiosas que, ao menos temporariamente, os satisfazem. É indispensável esforçar-se para recolher essa experiência, discernir seus dinamismos e valorizar seus frutos e dificuldades, se se quer acompanhar realmente os jovens em seus processos de crescimento no seguimento de Jesus e na vida segundo o Espírito. A Pastoral da Juventude é chamada a estabelecer um diálogo entre a experiência do Espírito de Jesus que os jovens estão vivendo hoje em seus diversos meios e com suas diferentes sensibilidades e a experiência recolhida na vivência e na tradição da comunidade crente. O critério fundamental e permanente para um adequado discernimento nesse diálogo é o Evangelho de Jesus.
1.1. Novas visões e novas linguagens No mundo jovem da atualidade, estão se produzindo novas visões globais que precisam ser levadas em consideração pela relação que têm com a espiritualidade e pelas suas consequências para a proposta que queremos apresentar. • Como herdeiros de uma visão dualista do ser humano e do mundo, muitos jovens estabelecem uma distinção e até uma oposição entre as “coisas terrenas”, o “material”, o “prático e concreto” e o “espiritual”, o “do outro mundo”, o “abstrato e ideal”. Essa dicotomia leva-os muitas vezes a considerar o espiritual como “o que me tira deste mundo”, a “ser realistas” e a acomodar-se à lógica do “material”, a não lutar por se superar e a aprofundar o vazio existencial produzido pelo divórcio entre fé e vida. • Outros jovens consideram que a medida absoluta para a valorização da vida, das crenças e das relações e a experiência individual e o que essas realidades significam “para mim”. É uma manifestação profunda da “busca de sentido” e uma reafirmação do valor da subjetividade e da experiência pessoal, em face do mundo que oferece poucas possibilidades de encontrar uma orientação para suas vidas que os satisfaça plenamente. Frequentemente, porém, essa atitude leva a um espiritualismo alienado da história, sentimentalista, fechado sobre si mesmo e pouco comprometido com a realidade de cada dia. • É comum também encontrar muitos jovens que buscam o sentido de suas vidas no “fazer”. Para eles, a experiência espiritual é entendida e realizada a partir da lógica do que “se deve fazer”. Nessa situação, reforça-se o “dever-ser”, as atitudes moralistas e exigentes, o valor dos méritos próprios e, como consequência, diluir-se o sentido da gratuidade de Deus. O Evangelho da misericórdia e da graça é substituído pelo cumprimento de uma “lei” como obra e esforço da pessoa humana. • No momento atual, está se configurando entre os jovens uma nova maneira de buscar o sentido da vida e de tentar encontrar respostas às perguntas fundamentais que o ser humano desde sempre se formula. Essa nova visão e a linguagem que a expressa não têm ainda contornos definidos, mas se situam de modo integrador e em processo dialético com as anteriores. Como proposta de vida e como experiência que se comunica para ser reconhecida por outros, a espiritualidade está intimamente vinculada à linguagem que se utiliza para manifestá-la. A linguagem é a expressão da pessoa; nela se encerra e se comunica muito mais que o mero significado das palavras: comunica-se um universo de sentido e a percepção que a pessoa tem do mundo e do lugar que ocupa nele. Cada uma das “visões” assinaladas acima se expressa através de uma “linguagem” própria e definida. 1.2. Traços da espiritualidade juvenil emergente No caso da espiritualidade juvenil emergente, trata-se de uma linguagem através da qual os jovens buscam viver e expressar um sentido marcante do transcendente em seu agir diário, viver e comunicar a “plenitude de sentido” que experimentam quando se sentem amados por Deus e reconhecidos por uma comunidade, encontrar sentido para a “ação transformadora” e viver com coerência sua relação fé-vida através de um compromisso no mundo. É uma linguagem que está nascendo da experiência de muitos jovens e que, gradualmente vai caracterizando suas tentativas de viver as relações que estabelecem consigo mesmos, com os demais, com a natureza e com Deus, “segundo o Espírito” (Gl 5,16). 1.2.1. Na relação dos jovens consigo mesmo Numa sociedade com crise de projetos históricos, muitos jovens têm dificuldades de assumir um “projeto de vida”, porque não depõem de maiores elementos de referência. Quem consegue dar resposta às perguntas fundamentais “quem sou?”, “para que vivo?”, “para onde vou?”, depara logo com a questão: “Que projeto pode dar sentido à minha vida?”. É a oportunidade de poder descobrir o futuro como “vocação” e orientar-se para uma realização pessoal que dê sentido e plenitude à sua vida. Numa cultura que privilegia as posturas científico-tecnológicas e dá preponderância à racionalidade, muitos jovens exploram o amplo espectro possível de sensações e a partir delas valoram suas experiências espirituais. Nessa situação, o simbólico torna-se meio fundamental, porque permite aprofundar e
expressar melhor as experiências muito pessoais de encontro, relação, interioridade e compromisso que eles descobrem e vivem. Imersos numa sociedade competitiva e consumista, muito jovens se sentem levados a acumular o maior repertório possível de “práticas” espirituais. É importante discernir seus conteúdos, porque isso significa necessariamente a irrupção salvífica em suas vidas do Deus que transforma a história pessoal e comunitária ferida e deformada pelo pecado. A maior sensibilidade à natureza e a mais equilibrada orientação psicológicas fazem com que muitos jovens valorizem positivamente seu corpo e consigam assumir sua sexualidade sem traumas e com criatividade; já outros, ao contrário, a banalizam e consideram que as relações não estão sujeitas a normas ou, no máximo, aceitam as que são impostas pelo ambiente social. Em face da estreiteza alienante de uma consciência exclusivamente objetiva, muito jovens consideram a experiência espiritual individualista como algo absoluto, reduzindo o seguimento de Jesus a uma busca de sentido só para si, esquecendo a abertura aos outros e aos desafios da história. Também há grupos de jovens que superam a necessidade de auto-afirmação própria de sua idade e descobrem a riqueza da fé e da experiência partilhada do seguimento de Jesus e da vida no Espírito. 1.2.2. Na relação dos jovens com os outros Muitos jovens descobrem que a única possibilidade de triunfo na sociedade neoliberal é pela via da associação, e que a afirmação da própria identidade passa pelo grupo. Daí a forte necessidade que sentem de definir sua pertença a grupos com características próprias, que lhes permitem afirmar-se como “diferentes”. As consequências injustas do modelo econômico neoliberal fazem surgir em muito jovens a solidariedade para com os mais pobres e marginalizados. Alguns se sentem chamados a participar de movimentos populares de organizações que lutam pela dignidade da pessoa, pela defesa dos direitos humanos, pela justiça e por iniciativas tendentes a melhorar a qualidade de vida. Outros se deixam absorver pelo ambiente competitivo e fazem o jogo da engrenagem social opressora, com a esperança, de galgar posições de mando e o bem-estar. Uma ampla maioria, preocupada principalmente com a luta pela sobrevivência, sofre os flagelos desse modelo sem ter consciência da opressão, ou com um sentimento de angústia ou impotência por não poder superar sua situação. Os reiterados exemplos de exercício do poder sem ética, noticiados diariamente nos meios de comunicação, levam muitos jovens a considerar a política como “intrinsecamente má” e a se recusar a participar e pertencer a grupos que os identifiquem com partidos políticos. Os processos de educação na fé vêm sendo implementados na América Latina permitem que muitos jovens integrados a grupos da Pastoral da Juventude estejam hoje na etapa de militância, onde vivem a solidariedade, se esforçam por iluminar sua realidade diária a partir do Evangelho, procurando, assim, seguir a Jesus e realizar sua vontade salvífica na Igreja e no mundo. Alguns respondem afirmativamente ao chamamento missionário e se tornam evangelizadores de outros jovens. Outros desenvolvem seu protagonismo na comunidade, onde vivem um ambiente fraterno que valorizam e potencializam e onde concretizam a opção preferencial pelos pobres. 1.2.3. Na relação dos jovens com a natureza Muitos jovens desenvolvem sua atividade profissional em permanente contato com a ciência e a tecnologia. Participam, assim, da transformação da natureza em proveito da humanidade e demonstram que a evangelização não supõe a rejeição da ciência e da técnica. Sentem-se responsáveis pela criação e aplicam seus conhecimentos na promoção de um emprego mais eficaz dos recursos naturais que Deus criou para benefício de todos. Em face da devastação ecológica do mundo de hoje, muito deles se filiam a grupos que denunciam abertamente a impiedosa destruição da natureza e pesquisam técnicas alternativas para produzir e conservar o ambiente. Já outros, absorvidos pelos avanços fascinantes da ciência e da tecnologia, perdem a capacidade crítica e criativa e se distanciam progressivamente da experiência graficante da natureza e do encontro com os outros, aceitando e até participando de projetos em que o essencial é o avanço científico ou
produtivo em si mesmo, à margem de qualquer princípio ético. Mas continuam sendo muitos os que descobrem Deus na paz e no silêncio da criação e a sentem como obra de Deus e lugar da presença do Espírito. 1.2.4. Na relação dos jovens com Deus A falta de sentido da vida produzida pela crise das ideologias e pela absolutização do modelo materialista-consumista, levou os jovens a buscar esse sentido no transcendente. Suas buscas são mediadas às vezes pelo esotérico, outras vezes pelo sincretismo e outras tantas pela experiência do Deus da fé cristã, transmitida pela família, pelos catequistas ou pelo modo de vida das comunidades cristãs. Se a mensagem transmitida é autêntica, os jovens acabam descobrindo um Deus que os ama e que, por amor, lhes comunica sua vida. Isso os leva a uma relação de pessoa a pessoa com esse Deus Pai que toma a iniciativa, aproxima-se deles, estabelece uma comunicação, especialmente no Jesus do Evangelho, e intervém em suas vidas para comprometer-se e formar com eles uma comunidade. Quando os jovens descobrem que Deus os ama primeiro e tem a iniciativa do encontro mútuo, sentem a necessidade de conhecer o que fez por eles na natureza e na história das pessoas. Sentem-se chamados, então, a celebrar, a fazer festa e utilizar nela os símbolos que lhes permitem expressar-se como autenticamente jovens, uma festa que se plenifica com o sentido gozoso da ressurreição de Jesus. A alegria de saber-se buscado e encontrado por Deus Pai em Jesus se torna mais profunda quando descobrem que há outros jovens que têm sua mesma experiência e sua mesma necessidade de fazer deste encontro uma “festa de todos”. Para eles, então, o que desagrada a Deus não é cumprir ou deixar de cumprir certas normas pelas quais, às vezes, sentem indiferença, mas as situações que obstaculizam ou impedem essa “festa de todos”. 2. ESPIRITUALIDADE Todo ser humano tem inspirações e motivações para a sua vida. As múltiplas experiências religiosas existentes fazem parte dos vários caminhos pelos quais a humanidade busca incessantemente chegar ao encontro com Deus. O processo de educação na fé que os jovens vivem revela-lhes progressivamente um projeto original de vida cristã e os ajuda a tomar consciência dele. Os jovens aprendem a viver de um jeito novo de ser crente no mundo e organizam suas vidas em torno de critérios de fé, opções de valores e atitudes evangélicas: vivem uma espiritualidade. Entendemos a espiritualidade como a experiência de Deus que se revela em Jesus Cristo; experiência esta que é obra do Espírito, transforma a pessoa e desencadeia um processo novo em sua vida. A espiritualidade é, pois, diferente e original em relação a outras motivações ou forças inspiradoras da vida das pessoas. Sua fonte é a experiência de fé em Jesus Cristo morto e ressuscitado e a conversão e adesão a ele e ao Evangelho, vividas com os outros na comunidade Igreja. A experiência de Jesus inaugura um caminho de vida no Espírito. É um caminho de seguimento de Jesus, cuja meta é o Reino do Pai. Isso permite a toda pessoa ter uma visão nova da realidade e descobrir especialmente seu sentido transcendente. É um processo paciente e inacabado, através do qual o Espírito vai transformando o amor do Pai, revelado em Jesus, em vida, dinamismos, modos de pensar, estilos de agir e relacionar-se, vivências da unidade inseparável do amor a Deus e do amor ao próximo. É a seiva que alimenta e dá fecundidade à comunidade, à pastoral e à teologia. 2.1. A espiritualidade é obra do Espírito A espiritualidade cristã é um dinamismo do Espírito Santo que anima e orienta para fazer “memória” e viver no seguimento de Jesus: “Eles lhes ensinará tudo e lhes recordará o que eu lhes disse” (Jo 14,27). É fazer a experiência de ser habitado pelo mesmo Espírito que habitou Jesus de Nazaré, para poder , assim, fazer o que ele fez dizer o que ele disse e viver o “estilo de vida” que ele viveu. É centrar o olhar em Jesus vivo, testemunha fiel e veraz, que dá a chave da interpretação para reconhecer a ação de Deus em cada pessoa e na história.
É viver conforme o espírito das Bem-aventuranças, desde a intimidade da consciência até os conflitos políticos, econômicos e sociais; desde a vida familiar até as diversas manifestações da nova cultura. A espiritualidade não é, portanto, um mero conjunto de “práticas espirituais” estabelecidas pelos homens. É a irrupção insuspeitada, vigorosa e transformadora de Deus, que se faz presente de modo singular na vida de toda pessoa. E, quando Deus se faz presente, o faz como amor fecundo e criativo, como salvação que transforma a história ferida pelo pecado e como vida que “faz novas todas as coisas” (Ap 21,5). 2.2. A vida segundo o Espírito de Jesus A vida cristã é a vida do Espírito de Deus no crente. É ele quem o ajuda a conhecer, aceitar, seguir e viver Jesus Cristo: “Ninguém pode dizer ‘Jesus é o Senhor!’ senão com o Espírito Santo” (1 Cor 12,3). É ele quem leva ao conhecimento, à conversão e á adesão a Jesus Cristo e aos valores que realizou em sua vida. É ele que foi enviado para não se viver mais na escravidão, mas na liberdade dos filhos que podem se dirigir a Deus como “pai” (Rm 5,16-25). É ele quem possibilita a experiência original que faz de uma pessoa cristã: ser habitada pelo mesmo Espírito que habitou Jesus de Nazaré em seu ministério, em seus critérios e opções, em sua relação filial com o Pai, em suas lutas e na entrega de sua vida pela salvação de todos. Esse viver segundo o Espírito se contrapõe ao “viver segundo a carne” (Rm 8,5-13; Gl 5,16-25), orientada pelos “esquemas do mundo presente” (Rm 12,2). Por se tratar de uma vida, acarreta um dinamismo processual de conversão que envolve todas as dimensões da pessoa, dinamiza a transformação das próprias convicções, valorações e compromissos segundo o exemplo de Jesus e conclama a estar sempre em atitude de escuta e de abertura disponível ao Espírito, “que sopra onde quer” (Jo 3,8). 2.3. A vida segundo o Espírito e o seguimento de Jesus A espiritualidade cristã tem, assim, seu primeiro e fundamental critério de discernimento na centralidade da pessoa de Jesus, sua existência histórica e sua manifestação pascal. Essa referência à realidade concreta de Jesus não aponta somente ao conhecimento de sua pessoa e de sua missão, mas sobretudo à possibilidade de participar de sua vida e de recriá-la na própria história. O seguimento de Jesus não é a aceitação de um conjunto de verdades teóricas, mas a possibilidade concreta de encontrar-se com ele e estabelecer uma relação pessoal que leve a reconhece-lo como Filho de Deus (Jo 20,31) e como autêntico libertador. Só há seguimento onde há encontro pessoal com Jesus Cristo. Ele chamou os apóstolos “para que estivessem com ele” (Mc 3,14). Esse “estar com ele” é a experiência fundante do seguimento de Jesus. É estabelecer uma relação que envolve toda a existência e o modo de vida do discípulo; é presença, companhia, afeto, intimidade; é pôr o outro no centro da vida e fazer dele o principal motivo daquilo de que se gosta ou do que não se gosta, do que se prefere ou do que se rejeita, do que se faz ou do que se deixa de fazer... “Para mim, a vida é Cristo” (Fl 1,21). “Estar com o outro” implica também “ser para o outro” e participar de sua missão (Mc 3,14; Jo 20,21). Seguir Jesus não será um passeio triunfal pela história, mas o convite a uma vida entregue até a cruz: “Quem não toma sua cruz e me segue, não é digno de mim” (Mt 10,38). Para seguir Jesus, o discípulo será muitas vezes “levado onde não quer ir” (Jo 21,18). O seguimento de Jesus não se esgota no olhar o Jesus pré-pascal como modelo exemplar a imitar. É seguimento do Jesus pré-pascal para participar com ele de sua morte e ressurreição por obra do Espírito. A meta final é viver o estilo de vida de Jesus, que é a vida segundo o Espírito (1 Cor 6,11). 2.4. A vida segundo o Espírito e a missão O seguimento de Jesus não se dá na solidão do indivíduo, mas na complexa trama de relações pessoais e sociais do mundo e da história, convocando daí à criação a uma nova ordem e de um novo estilo de relações. A contribuição à construção da Igreja como comunidade fraterna e em missão é um critério fundamental para discernir os sinais de uma vida segundo o Espírito. A experiência cristã se dá na Igreja, e
a Igreja existe para sua missão no mundo. Nos sinais dos tempos, deverá descobrir os chamados de Deus para atualizar e fazer presente a novidade de Jesus e colaborar na construção de seu Reino. Neste mundo onde a Igreja acontece, o Espírito já está agindo e convocando ao seguimento de Jesus, especialmente a partir dos pobres e pequeninos. Aí se realiza também a experiência espiritual dos jovens de hoje, que a Igreja e a Pastoral da Juventude têm por desafio reconhecer e discernir. 3. CARACTERÍSTICAS DE UMA ESPIRITUALIDADE JUVENIL PARA A AMÉRICA LATINA A partir da experiência de fé em Deus revelado em Jesus, assinalam-se algumas características de uma espiritualidade cristã, isto é, de uma vida segundo o Espírito no seguimento de Jesus, para ser vivida pelos jovens de hoje na América Latina: “Uma espiritualidade do seguimento de Jesus que propicie o encontro entre a fé e a vida, que seja promotora da justiça, da solidariedade e que alente um projeto promissor e gerador de uma nova cultura de vida” (SD 116). 3.1. Encontrara Deus na vida: espiritualidade do cotidiano Na base de toda espiritualidade cristã, está o maravilhoso acontecimento da encarnação de Deus em Jesus de Nazaré (Jo 1,14). Daquele momento em diante, toda a realidade humana ficou impregnada por sua presença, e o humano, a vida de cada dia, o cotidiano passaram a ser lugares privilegiados para o encontro com Deus. A encarnação esta dizendo que não é necessário renunciar ao humano nem afastar-se da vida diária para encontrar-se com Deus, por que ele se fez Deus-conosco (Is 7,14) e se tornou presente na história, especialmente nos mais pobres e necessitados (Mt 25,31-46). Quem quiser fazer a experiência de Deus é chamado, antes de tudo, a fazer a experiência do outro. Do encontro de amor com o outro nasce o encontro com Deus, o Senhor da Vida. Seguir a Jesus é reconhecer, celebrar e comprometer-se com essa presença. É viver uma espiritualidade encarnada, histórica e incorporada nos acontecimentos da vida pessoal (Afetividade, Sexualidade, Vocação, etc.) e social (família, trabalho, amizade, cultura, política, economia, etc). Uma espiritualidade inculturada que assume as formas e os conteúdos das relações criadas pelo próprio povo, e uma espiritualidade comprometida, que dá uma significação nova aos acontecimentos e à cultura a partir da perspectiva da opção preferencial pelos pobres, com um sentido libertador. Assumir com coerência a cotidianidade da existência; aceitar os desafios, as interpelações e as tensões do crescimento; trabalhar para suportar as ambiguidades da vida de cada dia, fermentar com o amor qualquer opção são passos obrigatórios para descobrir e amar o cotidiano como realidade nova em Deus está presente, age e se dá a conhecer como pai. A confrontação cotidiana com o projeto de vida de Jesus questiona e chama para uma nova atitude pessoal e social. Exercita na prática do discernimento e gera uma sabedoria que vem de Deus, à semelhança de Jesus, que “crescia em sabedoria, idade e graça” (Lc 2,52). Promove também uma atitude positiva diante da vida e da história, sempre atenta a descobrir o Senhor que se manifesta nos sinais dos tempos. 3.2. Viver como Jesus viveu: espiritualidade do seguimento de Jesus vivo e presente No I Congresso Latino-Americano de Cochabamba, os jovens manifestaram sua experiência fundamental do que os faz ser e sentir-se cristãos, expressando sua fé em “Jesus vivo e presente em nossa vida e em nossa história”120. A experiência inicial de descobrir Jesus como pessoa viva e Filho de Deus é um dom do Espírito Santo que chega de muitas e imprevistas maneiras ao fundo de cada pessoa. É, contudo, o ponto de partida para poder segui-lo durante toda a vida. Jesus chama cada um por seu nome. Propõe uma adesão livre e radical a seu projeto de amor e justiça e convida a seu seguimento. Seguir a Jesus exige uma conversão. Uma mudança do caminho próprio pelo caminho que ele indica. Implica assumir, com força do Espírito, seu estilo de vida, seus critérios de julgamentos, sua maneira de relacionar-se com os demais e com o Pai, seus conflitos; sua cruz 120
I Congresso Latino-Americano de Jovens, “Carta aberta a los jóvenes de América Latina”, 17.
e sua ressurreição. Numa palavra: implica uma amizade íntima que leva a fazer o ele faz e a dizer o que ele diz, fazer e pôr o projeto de vida pessoal a serviço do Reino de Deus. O caminho é a cruz (Mc 8,34-38) e a atitude fundamental, o serviço (Jo 13,1-16) e a partilha (mc 10,17-23). Essa experiência impactante de discipulado é fonte de realização humana e de alegria para o jovem, que vai construindo, dessa forma, seu projeto de vida em consonância com a proposta de Jesus “caminho, verdade e vida” (Jo 14,6). 3.3. Comunhão e serviço: espiritualidade de pertença à comunidade eclesial Deus se revela em seu mistério como comunidade. A vocação à fé em Jesus, transmitida historicamente pela comunidade de seus seguidores, é um chamado a pertencer a um povo de irmãos. A experiência do seguimento de Jesus gera o encontro dos que têm nele um amigo comum. Por isso, os jovens se reúnem e partilham a alegria de viver e de ajudar-se uns aos outros. Vão descobrindo, assim, a Igreja. Uma comunidade local que é, ao mesmo tempo, sinal e realização da comunidade universal. A vida no Espírito é a vida em comunidade eclesial. A igreja nasce naquele grupo de pessoas “que perseveravam na oração com Maria, a Mãe do Senhor” (At 1,14), em Pentecostes, é o ambiente que garante a autenticidade da opção pessoal porque permite confrontá-la com o testemunho dos mártires e dos santos e reafirmá-la pelo discernimento comunitário. Toda experiência pessoal de Deus necessita, também, fundamentar-se na interpretação comunitária dos acontecimentos cotidianos à luz da fé (Lc 10,17-20) e no serviço aos pobres (Lc 14,12-14). A Igreja é a comunidade convocada para manter viva a memória de Jesus e fazê-lo presente na história. Reunida como uma grande família, converte-se em lugar para viver a fraternidade e ser sinal da presença do Reino. É também o lugar do encontro sacramental com o Senhor, especialmente na “partilha do pão” (At 2,42), na reconciliação e na oração comunitária, que leva ao compromisso de testemunhar essa vida nova segundo o Espírito, sendo luz e sal no mundo (Mt 5,13-14). A proposta de Jesus aos jovens é uma opção livre e radical por ele, que, simultaneamente, os incorpora a um grupo – o dos discípulos – e a um novo povo – o povo de Deus – segundo o projeto do Pai. A comunidade se converte, assim, em lugar privilegiado para o amadurecimento da fé e da vida no Espírito. Abre os jovens à relação com os outros, à descoberta de sua pertença à Igreja e a responsabilidade pela missão evangelizadora. 3.4. Alegria e esperança: espiritualidade litúrgica e celebrativa A vida, vivida no Senhor e animada pelo Espírito, é entendida como um dom gratuito de Deus. Só quem a entende assim é capaz de dar-lhe glória e louvá-lo. A ação de graças é a resposta do coração que reconhece a gratuidade do dom recebido, experimenta a alegria de saber-se chamado e oferece esse dom aos demais. A gratidão leva a viver em constante ação de graças e faz com que a pessoa ofereça, sem esperar nada. Sua alegria esta em dar (At 20,35). Dando-se aos demais, desfruta de sua própria entrega: “Quando tiverdes cumprido com vosso dever, dizei: ‘Somos servos inúteis, só fizemos nossa obrigação ‘ “ (Lc 17,10). O Evangelho é um constante chamado à gratuidade, a dar o que mais se ama, até a própria vida. A morte e a ressureição de Jesus são o exemplo supremo de generosidade e entrega. A atitude de ação de graças só é possível como fruto de um coração generoso e de uma consciência pura. Um jovem que vive em atitude de ação de graças é capaz de entregar generosamente sua juventude, e até sua própria vida, a serviço dos demais. A alegria juvenil e a atitude de ação de graças se manifestam especialmente na celebração e na festa. Não se faz festa para encontrar alegria; e a alegria que motiva a realização da festa. Esta será mais eficaz e verdadeira na medida em que os sinais ajudem a expressar o que estão vivendo os que participam da ação de graças. Os sacramentos são a grande festa da vida. Celebram, na memória do acontecimento pascal de Jesus, os momentos mais significativos da vida. Além da Eucaristia, fonte e alicerce para o seguimento de Jesus, e da Reconciliação, que seria nessa vida com a graça do perdão, a espiritualidade leva o jovem a buscar momentos privilegiados de encontro com ele através da oração pessoal e comunitária, que lhe permite experimentá-lo como amigo e companheiro de caminhada. Na oração, os jovens expressam suas
inquietudes pessoais e sua busca de respostas concretas aos grandes questionamentos. Reafirmam sua adesão e compromisso com o Deus da Vida. A espiritualidade da alegria favorece o otimismo e a confiança porque leva a considerar a vida e as pessoas como dons em que o Senhor está presente. Estimula a bondade, favorece a partilha, ajuda a enfrentar as dificuldades e os sofrimentos como oportunidades para a solidariedade, a conversão e a reconciliação e faz assumir a própria missão com disponibilidade de serviço. 3.5. Anúncio e compromisso: espiritualidade laical e missionária A decisão vocacional e missionária é fruto do crescimento e do amadurecimento no seguimento de Jesus. Deus chama e pede escuta e capacidade de resposta. Se aceitar segui-lo, a vida irá-se fazendo diálogo e comunhão com ele e participação consciente em sua obra salvadora: “Senhor, a quem iremos: Só tu tens palavras de vida eterna” (Jo 6,68). A experiência de conhecer, encontrar e aceitar a Jesus leva a descobrir seu chamado para servir os demais e anunciar “o que vimos e ouvimos” (1 Jo 1,1). O anúncio do Evangelho é a expressão do desejo profundo de dar a conhecer a outros a própria experiência de graça e misericórdia de Deus, manifestada em Jesus Cristo. É comunicar a Boa Nova como um estilo de vida capaz de realizar plenamente a pessoa e de responder à sua busca de felicidade. O seguimento de Jesus implica um chamado à missão. O próprio Espírito conduz os jovens a partilhar com outros o anúncio do Reino e a assumir sua opção vocacional dentro da Igreja na consagração sacerdotal, na vida religiosa ou no compromisso laical para a transformação do mundo e a construção da civilização do amor. A vivência da espiritualidade conduz os jovens a assumir seu ser laical e a fazer presente o Espírito de Jesus, a partir de seu compromisso de fé, como Igreja, nas realidades temporais em que vivem, crescem e agem (SD 98). Reconhece também a ação do Espírito nos ambientes próprios da vida. Aprofunda sua missão de agentes transformadores e de evangelizadores dos outros jovens. 3.6. Pequenos e excluídos: espiritualidade da opção pelos pobres Deus sempre manifestou sua predileção misericordiosa pelo pobre e pelo humilhado e sua atitude de defensor do oprimido e libertador do povo escravizado. Da a encarnação à pascoa, a vida de Jesus foi a vida de um pobre no meio dos pobres. Nasceu, viveu e escolheu seus apóstolos de preferência entre os mais pobres. Não é um detalhe acidental em sua vida! Quis identificar-se expressamente com eles, aos quais se dedicou preferencialmente e entre os quais passou fazendo o bem. Pragado na cruz, despido de todo poder, levantado entre o céu e a terra, fora da cidade, a entrega de sua vida é o sinal último e definitivo de seu compromisso radical com os pobres. O seguimento de Jesus é um caminho de conversão para “uma identificação cada dia mais plena com Cristo pobre e com os pobres” (P 1140). O Espírito impele a seguir Jesus “numa clara e profética e solidária pelos pobres” (P 1134) que inspire “toda ação evangelizadora comunitária e pessoal” (SD 178). A opção preferencial pelos pobres implica descobrir o rosto do Senhor nos rostos desfigurados dos irmãos que sofrem as consequências de violências e injustiças muito concretas e aceitar o desafio de comprometer-se com “uma profunda conversão pessoal e social” (SD 178) para transformar as condições que geram a desigualdade e a marginalização. Por isso, essa opção define o lugar e a perspectiva a partir da qual se questiona, se reza, se contempla e se lê a realidade histórica e o Evangelho. A autenticidade de toda experiência de fé será julgada pela capacidade de compromisso, de amor solidário ou pela atitude de omissão egoísta. 3.7. Morte e ressurreição: espiritualidade pascal A revelação plena do amor de Deus à humanidade dá-se no acontecimento pascal. Na cruz, Jesus é proclamado Filho de Deus (Mc 15,39); pela ressurreição, é reconhecido “Deus e Senhor” (Jo 20,28). A páscoa é o momento da libertação definitiva da pessoa humana. A vida no Espírito é participar desses dois aspectos da páscoa de Jesus: a cruz, que dá sentido aos sofrimentos próprios de uma vida entregue no amor; e a ressurreição, que abre à realidade da vida nova, na fonte primordial da esperança.
O seguimento de Jesus em sua páscoa faz-se realidade na vida de cada dia. É o processo do amor, da conversão, do compromisso solidário, no qual se experimenta a dor da renúncia e a alegria dos frutos que já são recebidos. Todo sofrimento, assumido a partir da cruz, é transformado em grito de esperança de uma nova vida. 3.8. Maria, jovem, mulher, mãe: espiritualidade mariana O Espírito de Jesus leva a reconhecer em Maria a primeira seguidora de Jesus, a jovem feliz porque acreditou que se cumpriria nela a Palavra de Deus (Lc 1,45). Pela fé, Maria é mãe. Nela, Deus se faz carne e história. Despojada de si mesma, está completamente aberta ao projeto e à ação de Deus. Maria é a expressão da total disponibilidade à sua vontade. A manifestação de uma radical pobreza cumulada de uma plenitude de graça. Em seu seio, acolheu o filho de Deus feito homem, e viveu atenta à sua vida e à sua palavra, “conservando-a em seu coração” (Lc 2,51). Jovem mãe de Jesus, Maria é sinal da ternura de Deus e expressão da dimensão feminina de sua obra salvadora. Testemunha da vida no Espírito, acompanha os jovens em seu silêncio e obediência ao Pai; em seu exemplo de compromisso juvenil com o amor e a amizade (Lc 1,39-45); e em sua disponibilidade e compromisso libertador com o povo que sofre. Seu canto de louvor por haver sido escolhida (Lc 1,46-54) e seu convite a “fazer o que ele lhes disser” (Jo 2,5) fazem dela um exemplo privilegiado para os jovens comprometidos no seguimento de Jesus. Maria é presença viva, inspiradora, guia e mestra. Ela é mãe imaculada, cheia de graça, totalmente disponível, modelo de fidelidade ao serviço do Reino. Maria é também modelo de mulher plena em sua oração e em seu trabalho, em sua fraternidade e em sua maternidade, em seu olhar contemplativo e em sua vida de serviço, na graça da Anunciação da Visitação e da Assunção. Na América Latina. Maria encarnou-se na cultura e na história dos indígenas, dos negros e dos pobres, sendo para eles sinal de esperança e promessa de libertação. As múltiplas formas de invocá-la e chamá-la expressam a fé simples de um povo que quer sempre próxima sua presença materna, que a descobre como o caminho mais acessível para o encontro com seu filho Jesus. 3.9. Dar a vida: espiritualidade martirial “O discípulo não pode ser maior que o mestre. Se perseguiram a mim, perseguirão também a vós” (Jo 15,20). “Prender-vos-ão e vos perseguirão; entregar-vos-ão aos tribunais e vos levarão aos cárceres; arrastar-vos-ão à presença de autoridade por causa de meu nome” (Lc 21,12-13) “Virá a hora em que quem vos matar julgará prestar culto a Deus” (Jo 16,2). A América Latina é uma Igreja de mártires. Inúmeros homens e mulheres, jovens e adultos, de todas as raças, línguas, povos e condições deram sua vida por Jesus e pelo Evangelho: catequistas, celebrantes da palavra, leigos comprometidos, religiosos, sacerdotes e bispos, defensores dos direitos humanos, militantes de causas populares, camponeses, operários, estudantes e universitários, lutadores sociais, membros das comunidades eclesiais de base... Seu martírio é um testemunho de fé no Deus da Vida: “Não podemos calar o que vimo e ouvimos” (At 4,20). É uma prova, definitiva de que a presença entre os pobres é o que deu e continuará dando sempre credibilidade à Igreja. É uma prova também de que as sementes do Verbo presentes nos povos e nas culturas do continente estão dando frutos abundantes de salvação. Apesar das tentativas de calar sua voz, eles “vivem para sempre” (Jo 11,26) e “seus nomes estão escritos no Livro da Vida” (Fl 4,3). As comunidades os recordam com carinho. Fazem-nos presentes em seus símbolos, escritos e celebrações e vão tecendo, com os acontecimentos de suas histórias, um novo martirológo latinoamericano em preparação para o terceiro milênio cristão. Sua fidelidade convoca e anima novas fidelidades. Convida a levar a cada dia mais a sério as exigências do seguimento de Jesus, a ser mais a plenamente coerente com o Evangelho, a continuar denunciando a injustiça e tudo o que se opõe à dignidade e à realização da pessoa e anunciando e lutando pela realização dos valores do Reino. Como os mártires da Igreja primitiva, os mártires de hoje são testemunho da fé e expressão de plenitude do seguimento de Jesus, presença de seu Reino transformando a história, sinal de vitalidade de uma Igreja que reconhece, também seus erros históricos, e realização visível da esperança de ser fiel a Jesus até o fim.
4. MEIOS PARA PROMOVER A ESPIRITUALIDADE JUVENIL Jesus Cristo é o único mediador. Os meios aqui mencionados são concebidos como instrumentos que conduzem e aproximam dessa mediação fundamental da salvação (Hb 7,6-7; Hb 9,15-20)121. Como “meios”, nenhum deles pode ser absolutizado, pois só têm sentido na medida em que favorecem o encontro com Jesus e sua ação libertadora na história. Esses meios para promover a espiritualidade juvenil não são extraordinários. Todos eles já são utilizados no trabalho diário da Pastoral da Juventude. A partir da realidade dos próprios jovens, o Espírito de Deus contribui para uma vivência da espiritualidade que responda efetivamente a suas necessidades e aspirações. 4.1. A leitura e reflexão da Palavra de Deus É um meio privilegiado para o encontro dos jovens com Jesus e com seu anúncio do Reino de Deus (Lc 4,16-21). A espiritualidade do seguimento de Jesus parte da Palavra de Deus encarnada nele. Dela o Espírito faz “memória” e ensina a conhecer e entender como iluminação para a vida de hoje. No apreço da Palavra de Deus, em sua leitura e meditação assídua, os jovens encontrarão a “experiência de Jesus que salva, revela o Pai e continua sempre presente entre nós, por seu Espírito”. Descobrirão que ela é “a alma da evangelização” (P 372). Faz-se necessário promover cada vez mais o conhecimento da Sagrada Escritura. Facilitar o acesso dos jovens a ela e dar-lhes os elementos necessários para que possam compreendê-la melhor, lê-la a partir de sua realidade juvenil e aceitá-la como mensagem que orienta e questiona suas vidas e opções. 4.2. A vida comunitária “Deus quis santificar e salvar os homens não isoladamente, sem nenhuma conexão uns com os outros, mas constituindo um povo, que o confessasse na verdade e o servisse santamente”122. Jesus anunciou o Evangelho e ensinou a vive-lo formando grupos e criando comunidades. Ser Igreja é fazer parte da comunidade dos seguidores de Jesus. Os primeiros cristãos assim o entenderam e formaram imediatamente as primeiras comunidade fundadas no ensinamento dos apóstolos, na convivência fraterna, na Eucaristia e a oração e na prática da partilha dos bens (At 2,42ss). A mediação comunitária é fundamental para uma fé que se recebe pelo anúncio e pelo testemunho de outros. A comunidade é um espaço adequado para que os jovens possam fazer e refazer suas vidas (At 2,42-47) e um horizonte a partir de onde abrir-se para ser luz do mundo e sal da história (Mt 5,13-16), acolher a ação do Espírito na história e trabalhar coletivamente na construção de uma sociedade mais justa e solidária. 4.3. A oração pessoal e comunitária Jesus, inteiramente entregue à missão de realizar o projeto do Pai, viveu em permanente oração, falando com ele num clima de confiança filial e de intimidade incomparável. Ensinou seus discípulos a entrar na mesma dinâmica de encontro pessoal e comunitário (Mt 6,9-13). Seguindo Jesus e animados pelo Espírito, os jovens encontram também na oração uma expressão concreta de encontro e diálogo com Deus, pai e amigo, uma motivação para sua vida e seu trabalho diário, um tempo para o louvor e a ação de graças. Uma força renovadora para sua fé e sua esperança, uma fonte de alegria e de gozo pascal e um impulso para continuar entregando-se e vivendo em comunidade fraterna com os demais. Como a de Jesus, a oração dos jovens apresenta ao Pai as alegrias e as esperanças, as angústias e as tristezas próprias e as do seu povo, recolhidas no esforço de viver o seguimento de Jesus e anunciar seu Evangelho em todo lugar e a toda criatura (Mt 9,35-39; Mc 6,34-44; Jo 17). O encontro e a relação frequente com o Senhor possibilitam o discernimento (Ef 5,9-11) e o reconhecimento da ação do Espírito no mundo e na Igreja. Esse discernimento abre os jovens ao novo. Ajuda-os a descobrir o que o Espírito ou o pecado estão operando no mundo. Promove os 121 122
Cf. Puebla 214, Puebla 1116, Santo Domingo 121. Vaticano II, constituição dogmática Lumen gentium, 9.
questionamentos pessoais, leva a encontrar Deus presente em suas vidas cotidianas e a acolher seu Espírito, que faz novas todas as coisas (Ap 21,5). Dever-se-á buscar formar renovadas de oração que permitam aos jovens encontram a Deus e experimentar seu amor e sua misericórdia (Lc 15), integrar todos os momentos de sua vida pessoal e fortalecer seu compromisso com a transformação da realidade. 4.4. Os testemunhos de santidade Os jovens de hoje estão cansados de palavras. Exigem testemunhos vivos do Evangelho e do seguimento de Jesus. É possível encontrar muito desses testemunhos no caminhar da Igreja pela história. Mas é necessário estar aberto a novos testemunhos de santidade e à existência de pessoas próximas aos jovens que digam algo de Jesus Cristo para suas vidas: jovens mártires, assessores, homens e mulheres dos povos latino-americanos que entregaram suas vidas a serviço da construção do Reino, na promoção e defesa dos direitos humanos, na luta contra a injustiça, na vida partilhada com os mais pobres e marginalizados, na defesa da paz... Dessa maneira, os jovens compreendem melhor que é possível viver o Evangelho e o seguimento de Jesus e descobrem que também eles, com toda a comunidade, são chamados à santidade. Consideram os santos não como magos nem como ídolos, mas como homens e mulheres muito concretos e próximo, que se deixaram habitar e transformar pelo Espírito, que fizeram uma opção radical pelo Reino e que os convidam a um compromisso para ser melhores, servir aos demais e viver com plenitude a fé, a esperança e o amor. 4.5. A religiosidade popular A diversidade cultural da América Latina expressa-se visivelmente numa religiosidade popular autóctone que e, muitas vezes, a primeira experiência de fé que os jovens vivem. Seus sinais e símbolos estão muito presentes em sua espiritualidade. “A religiosidade popular, enquanto contém encarnada a Palavra de Deus, é uma forma ativa pela qual o povo se evangeliza continuamente a si mesmo” (P 450). Deve-se “compreender cada vez melhor, e acompanhar com atitudes pastorais, as maneiras de sentir e viver, compreender e expressar o mistério de Deus e de Cristo por parte de nossos povos, para que, purificadas de suas possíveis limitações e desvios, cheguem a encontrar seu lugar próprio em nossas Igrejas locais e em sua ação pastoral” (SD 36). É comum a participação de jovens, junto com suas comunidades, em festas de padroeiro, peregrinações e outras expressões da religiosidade popular. Identificam-se com estas porque lhes falam uma linguagem que eles entendem e os expressa. Como o povo simples, que vive sua fé a partir de uma experiência de Deus encarnada em sua realidade, em sua maneira própria de ver a vida e no caráter festivo que esta implica, também a Pastoral da Juventude tem como desafio saber reconhecer e recuperar os valores presentes nessas formas de manifestação da fé e propor caminhos para que os jovens possam expressar-se através delas e chegar, assim, ao encontro com Deus. 4.6. O acompanhamento pessoal Como para todos os aspectos do processo de educação na fé que os jovens vivem, também a formação na espiritualidade exige um acompanhamento pessoal atento aos sinais que eles vão percebendo em suas vidas. De modo especial, deve-se estar atento aos questionamentos que eles vivem no seguimento de Jesus, na experiência de Igreja, na vivência de sua sexualidade, na tomada de decisões para sua inserção social e sua opção vocacional. Um acompanhamento adequado ajuda-los-á a amadurecer em seu projeto de vida e alcançar sua realização pessoal e seu amadurecimento cristão. 4.7. O compromisso com a transformação da realidade O compromisso social e a participação em organizações de promoção humana são também um espaço privilegiado para desenvolver e promover a espiritualidade laical. Os jovens descobrem a ação na sociedade como uma fonte de apostolado que lhes fornece novas esperanças de justiça social e lhes permite formas concretas de viver a solidariedade com os mais pobres e marginalizados.
O trabalho, o estudo, a vida política, as relações interpessoais, a relações interpessoais, a relação homem-mulher, as ciências, as artes, a família e o cotidiano da vida dos jovens – não só as práticas comumente reconhecidas como “espirituais” e “eclesiais” – são chamados a ser expressão histórica da salvação de Deus. Em Puebla, os bispos disserem aos jovens que não deveriam fugir “das realidades temporais para buscar a Deus, mas perseverar, presentes e ativos, no meio delas e ali encontrar o Senhor” (P 977)123. A situação atual do continente exige a busca de alternativas para alcançar uma verdadeira promoção humana e uma nova cultura de comunhão e participação. Para isso, requer-se jovens “novos”, com uma espiritualidade nova. 4.8. As celebrações litúrgicas e os sacramentos A liturgia é o ápice “para o qual tende a atividade da Igreja e, ao mesmo tempo, a fonte de onde emana toda a força”124. Nela se expressa e se realiza a vida segundo o Espírito e se manifesta a presença viva de Jesus na história, assumindo e transformando a vida das pessoas e as realidades do mundo. A celebração dos sacramentos, e particularmente a celebração da Eucaristia (M 9,3), é sinal eficaz dessa ação libertadora de Deus. Na medida em que os jovens vão amadurecendo em seu processo de educação na fé, descobrem que os acontecimentos mais significativos de sua vida adquirem plenitude de sentido quando celebrados festivamente na comunidade cristã, como manifestação do Reino de Deus que vai-se fazendo presente em suas vidas e na história. O encontro e a relação com Jesus vivo e presente são particularmente experimentados na celebração dos sacramentos. Em cada um deles há uma realidade humana que assume e um dom singular que se concede. A integração na comunidade dos seguidores de Jesus e o compromisso de ser testemunha e viver segundo o Espírito são celebrados com alegria e entusiasmo no Batismo e na Confirmação. A ação de graças, a fraternidade e a entrega gratuita a serviço dos irmãos, a experiência de partilhar os bens e a vida, a entrega de tudo o que os jovens são e têm, a memória da Nova Aliança e da Páscoa de Jesus são celebradas na Eucaristia. O Encontro pessoal com o Deus misericordioso que perdoa e renova a fidelidade do seguimento de Jesus é celebrado na Reconciliação. O amor conjugal e a vida familiar, no sacramento do Matrimônio; a consagração ao serviço da comunidade, no sacramento da Ordem; e a participação no sofrimento redentor de Jesus, através da enfermidade e dos sofrimentos assumidos com serenidade e esperança, é celebrada na Unção dos Enfermos. “ A celebração da fé na liturgia, cume da vida da Igreja, deve-se realizar com alegria, de forma a permitir uma participação mais viva, ativa e comprometida na realidade de nossos povos” (SD 294), adotando “as formas, sinais e ações próprios das culturas” (SD 53) latino-americanas. 5. CELEBRAR A VIDA E CELEBRAR A FÉ O mandado de Santo Domingo de impulsionar uma Pastoral da Juventude que promova uma ação pastoral “que assuma as novas formas celebrativas da fé, próprias da cultura dos jovens, e fomente a criatividade e a pedagogia dos sinais” (SD 117) gerou uma vivificante tomada de consciência sobre a importância da celebração e da forma concreta de prepara-la e realiza-la. 5.1. A festa, tempo para celebrar a vida A vida transcorre muitas vezes em meio a acontecimentos rotineiros que ocupam quase que mecanicamente as horas e os dias. Mas é também a oportunidade para que ocorram outros fatos, expressamente buscados ou simplesmente inesperados, capazes de alterar essa rotina e fazer com que lhes dediquemos um tempo especial para “celebrar”. A diferença entre uns e outros não consiste tanto no que se faz, mas na forma e no sentido como são vividos. São essencialmente significativos não porque se diferenciam daqueles que são cotidianos, mas porque são vividos de outra forma.
123 124
Cf. Santo Domingo 98 e 111. Vaticano II, constituição Sacrosanctum concilium, 10.
Essa realidade tão cotidiano ajuda a perceber a importância de saber parar para viver um tempo diferente do rotineiro: um tempo para desfrutar mais intensamente a vida e seus momentos. Isso, embora possa ser experimentado nas atividades do dia-a-dia, é mais palpável nesses momentos especiais. Celebrar é uma dimensão própria da vida das pessoas; é um dos momentos em que elas mais podem se expressar enquanto tais. As formas de celebração variam muito, de acordo com os ambientes e as culturas. Há uma, no entanto, que tem um sentido muito especial, particularmente no mundo juvenil: a festa. A festa é um tempo dedicado a celebrar um acontecimento. Elemento importante na vida dos jovens, ela permite sair da rotina, experimentar a profundidade da vida, senti-la como dádiva e descobrir que vale a pena ser vivida. Possibilita-lhes manifestar-se como são, num clima de liberdade e espontaneidade. Ajuda-os a superar a solidão, porque é impossível festejar sozinho: a alegria sempre pressupõe partilha. Dá-lhes liberdade para “matar o tempo” porque, o tempo da festa ou não passa ou se passa de modo muito agradável e prazeroso. A festa é um tempo de personalização. De ser mais em profundidade. De recriar e recriar-se. De criatividade, de encontro, de comunicação, de diálogo. Numa sociedade cujo cotidiano é norteado pelo interesse, a festa é um tempo de gratuidade. Numa realidade de injustiça e dependência, a festa é participação no dinamismo da libertação e da utopia. Num mundo materialista e individualista, a festa permite expressar a própria fé, vive-la em comunidade e abrir-se ao sentido pleno do transcendente. Nesses termos, a festa é uma realidade profundamente humana que eleva e dignifica. Alçando-nos da dimensão meramente horizontal da existência, leva a Deus e permite celebrar a vida. Nesses termos, a festa é uma realidade profundamente humana que eleva e dignifica. Alçando-nos da dimensão meramente horizontal da existência, leva a Deus e permite celebrar a vida. Celebrar é, pois, dispor de um tempo e de um espaço para que, através de gestos, sinais, palavras e atitudes, um acontecimento se faça realmente vital. O aniversário, a formatura, o reencontro com um ente querido e um sem-número de celebrações alegram e enriquecem o viver diário. Como na vida das pessoas, há também momentos significativos nas famílias, nos grupos de jovens, nas comunidades, na história dos povos, etc. 5.2. A liturgia, tempo para celebrar a fé em Jesus Cristo Isso vale também para a celebração da fé. Da mesma forma que é necessário encontrar um amigo ou celebrar determinados momentos da vida, também é necessário encontrar-se com Deus, e com a vida nova que ele oferece, para renovar-se, entusiasmar-se e animar-se. Celebrar a fé é dispor desse tempo para o encontro, com o Senhor da vida e da história. Para seguir Jesus, não basta “saber” muito a respeito dele e de seu Evangelho. É necessário “experimentar” sua presença e relacionar-se com sua pessoa viva. A celebração é o tempo privilegiado em que o Senhor se faz presente para acompanhar a caminhada dos homens pela história. Esse tempo privilegiado é momento de festa porque celebra a salvação, a libertação e a presença de Jesus ressuscitado no meio de seu povo. As celebrações litúrgicas e os sacramentos da fé são momentos fortes da celebração cristã. É importante, contudo, valorizar também outras formas de celebrar a fé, através das quais os jovens podem igualmente viver e expressar o seguimento de Jesus e a vida segundo o Espírito. 5.3. O domingo, tempo para celebrar o Dia do Senhor Celebrar o dia do Senhor com sua comunidade é um momento muito importante para a espiritualidade dos jovens. É certo que o domingo, como dia de descanso semanal, como oportunidade para passar o tempo sem pressa nem preocupações, como dia de família e de “recolhimento”, como tempo para desenvolver a cultura do encontro e da solidariedade e para dedicar-se mais especialmente a Deus, parece coisa do passado. Talvez por isso mesmo tenha perdido sua dimensão festiva e cristã. Urge, porém, resgatá-lo como dia diferente. Um espaço para o encontro semanal dos cristãos. Ocasião para celebrar a festa e preencher vazio de sentido produzido pelo ritmo alucinante da vida moderna, com sua tendência a uniformizar e homogeneizar o tempo. Como sacramento semanal, o domingo cristão reúne a centralidade de Jesus Cristo e de sua Páscoa, a experiência comunitária da Igreja, a escuta da Palavra e a celebração da Eucaristia, elementos
fundamentais para o crescimento e amadurecimento de toda vida cristã. É a oportunidade para celebrar, a cada oito dias, a presença salvadora do Senhor Ressuscitado, que comunica sua vida e chama a seu seguimento. Jovens e adultos, independentemente dos laços de amizade e de cultura, são convidados a participar juntos da mesa da Palavra e da Eucaristia e a encontrar ali a fonte do dinamismo para sua vida pessoal e para seu compromisso eclesial. Experimentar a presença do Senhor Ressuscitado no meio de seu povo operando maravilhas faz do domingo um dia de festa, de libertação e de alegria. O domingo oferece, também, possibilidade de lazer, de um maior contato e comunhão com a natureza, de uma maior dedicação à vida familiar e à amizade, de cultivar valores como o esporte, a cultura, o passeio, a convivência ou a música e até de dedicar um pouco mais de tempo aos velhos, aos enfermos e aos necessitados. Vivendo-o desta forma, reafirmar-se o primado da pessoa humana sobre o trabalho e se resgata a importância da gratuidade num cultura em que a eficiência econômica e a busca desenfreada da produtividade passaram a constituir critérios cardeais. Por tudo isso, o domingo pode ser um fecundo instrumento evangelizador. Cinquenta e duas vezes ao ano, a presença do Senhor Ressuscitado na comunidade convida a renovar a fé e o seguimento. Motiva a viver em clima de alegria, liberdade interior e dinamismo pascal. Quebra a rotina que desgasta, desmotiva e corrói o sentido da vida e da história. A sábia pedagogia dos tempos litúrgicos da Igreja permite reviver, semana a semana, os momentos-chaves da história da salvação e oferecer a todos os cristãos um motivo para sua constante renovação. A celebração comunitária da Eucaristia não invalida as chamadas “missas jovens”, tão difundidas em muitas comunidades. Sua celebração concretiza mais ainda o “dia do Senhor” para os jovens. Possibilita celebrar a particularidade da vida juvenil com sua linguagem e suas expressões próprias. Permite referir mais a palavra e a presença viva de Jesus a suas situações e processos pessoais e grupais. Ajuda a recuperar a característica marcadamente juvenil de algumas celebrações do ciclo litúrgico anual. É importante, por isso, estabelecer um saudável equilíbrio entre o respeito e a valorização da realidade própria dos jovens e sua necessária integração à comunidade mais ampla, onde eles também têm seu lugar e tanto podem dar sua contribuição dinamizadora como estar abertos a receber o testemunho dos demais. 5.4. As novas formas celebrativas da fé A realidade transcendente de Deus impede que o homem possa entrar em relação direta e imediata com ele e exige, para expressar-se e comunicar-se, o recurso necessário a formas sensíveis. Em toda manifestação religiosa, Deus se faz presente na comunidade, e a comunidade entra em relação com ele através de expressões e gestos. Como fez o próprio Jesus, para falar de Deus e para anunciar o Evangelho, deve-se utilizar a linguagem simbólica. O símbolo toca mais fundo o ser da pessoa. Mais que fazer pensar, faz viver. É uma linguagem sugestiva, de sentidos mais plenos, de ritmos e sons, de relatos e imagens, que mobiliza para a mudança de atitudes e novas formas de comportamento. Os jovens não gostam de blábláblá. Querem manifestar sua fé com expressões sensíveis mais próximas de sua vida. É certo que a forma habitual de comunicar e expressar o que se passa no íntimo de cada um são as palavras, os signos, e que ambos se complementam mutuamente, já que a palavra explicita o conteúdo do signo, e o signo dá força e credibilidade ao que a palavra expressa. Os jovens de hoje, contudo, são muitos mais sensíveis ao simbólico. A uma linguagem que inclua a expressão corporal, as sensações e os sentimentos, em que haja um lugar muito particular para a natureza, a espontaneidade, o visual, a música, o silêncio, etc. Desenvolvendo essa novas formas de expressão, será mais fácil superar as dificuldades da linguagem essencialista, muitas vezes filosófica e a-histórica de boa parte das celebrações e ritos da Igreja. Obviamente, o uso litúrgico dos símbolos deverá ser educado para que promova realmente a experiência de comunicação e comunhão que se propõe, sem risco de horizontalismo, superficialidade, emotividade exagerada ou abundância indiscriminada. Na diversidade cultural da América Latina, poder-se-ão encontrar os gestos e símbolos que ajudem a celebração da fé a ser mais histórica, vivencial e juvenil, possibilitando, mais efetivamente um real encontro com Deus.
Sem esquecer o lugar central da Eucaristia e dos demais sacramentos na vida cristã, será bom promover também outras formas de celebrar a fé, mais criativas e menos estruturadas que, assumindo as características da cultura juvenil atual, eduquem essa dimensão tão particular da vida de fé dos jovens. 5.4.1. As vigília Nos último anos, os grupos de jovens têm revalorizado o antigo costume eclesial de fazer vigílias para preparar as celebrações mais importantes da fé e da história da salvação. A vígilia pascal – estendida em muitos casos a processos mais amplos de “páscoas juvenis” - , as vigílias de Natal e de Pentecostes, as vigílias de oração em preparação da celebração de alguns sacramentos constituem hoje momentos importantes da vida dos jovens e das comunidades de jovens. A ambientação, os cantos e a música, a variedade de gestos e sinais, uma preparação mais esmerada de tudo o que se realiza, o clima festivo, a alegria do encontro e a experiência comunitária da fé, unidos muitas vezes aos ambientes naturais, e sua realização ao cair da tarde ou à noite, favorecem uma vivência mais plena, profunda e significativa ao acontecimento litúrgico que se quer celebrar. Os jovens estão mais abertos e disponíveis a escutar a mensagem da palavra de Deus, a celebrar a reconciliação e a participar ativamente da Eucaristia, porque isso os marca frequentemente e os anima a continuar fazendo o mesmo tempo ordinário. Sua eficácia pastoral deve-se também ao fato de levar em conta e assumir elementos muito próprios da cultura juvenil, como o estar juntos, a expectativa pelo que virá, a acolhida de pessoas ou acontecimentos importantes para a vida e o desejo de companhia nos momentos transcendentes da vida, entre outros. Essa forma de realizar as vigílias permite redescobrir o valor e o sentido dos acontecimentos que perderiam boa parte de seu significado se se reduzissem ao rotineiro ritmo das celebrações ordinárias. Ao mesmo tempo, educa os jovens a construir sua vida cristã sobre momentos fortes de encontro com Deus, distribuídos ao longo do ano. Em alguns casos, as vigílias podem servir como instâncias de nucleação, mas normalmente são parte do processo grupal ao qual necessariamente devem estar integradas. Em ambos os casos, dever-se-á evitar que sejam apenas momentos de impacto emocional, isolados e desvinculados da dinâmica comunitária. 5.4.2. As peregrinações Antes do “fica conosco porque já esta tarde e o dia termina” (Lc 24,29), Jesus e os discípulos caminharam juntos vivendo, até que descobriram sua interpretação mais profunda e seu sentido mais pleno. O caminho é símbolo universal da existência humana e evoca, especialmente, a juventude como dinamismo cheio de vida e como tempo de passagem para a maturidade. Tempo para olhar o passado e aprender com as fraquezas, as contradições e grandezas. Tempo para descobrir o presente como dom e oportunidade única e irrepetível e tempo para vislumbrar o final feliz, renovando a esperança de alcançar as metas propostas. O estilo do peregrino sintoniza com a sensibilidade juvenil. Peregrinar é pôr-se a caminho junto com outros para descobrir o novo. É desfrutar da solidariedade na austeridade e no sacrifício; é lutar e dar tudo de si para alcançar a meta que renova e ressignifica a própria vida e a própria história. É descobrir que toda meta envolve um esforço, cuja recompensa é obtida ao se atingi-la. O êxodo que todo processo de educação na fé pressupõe se vincula muito bem com essa experiência de fazer caminho, própriada peregrinação. O caminho desinstala, põe em atitude de busca, rompe a tranquilidade cômoda do já adquirido e projeta para a frente, para a consecução de novas metas. A vida humana é peregrinação: há pontos de partida e de chegada, trajetos definidos e novas possibilidades para investigar, motivações e purificações, dor pelas dificuldades e alegrias pelas metas conseguidas. O caminho dos peregrinos, como o exôdo, faz sair da rotina, dos velhos esquemas e dos pequenos mundo que impedem o encontro e a solidariedade; faz pôr-se a caminho para olhar com olhos renovados as realidades de cada dia; dá oportunidade para amadurecer, sentindo a insatisfação de não buscar, curando as feridas produzidas pelo pecado, relativizando ídolos e falsos deuses, superando as tentações de querer voltar sempre a pontos de partida cômodos, de instalar-se na metade do caminho, de
viajar e não peregrinar. Faz tomar consciência de que estar a caminho é comprometer-se. A volta à casa e as atitudes subsequentes serão a chave para aferir os objetivos propostos na peregrinação foram ou não atingidos. Os jovens de hoje aderem com entusiasmo às propostas de caminhada e peregrinação. A profusão de sinais disponíveis – a caminhada, a subida, a descida, o avanço, a parada, o olhar para trás, etc. – oferece uma linguagem muito concreta e vital que toca facilmente suas vidas. Na América Latina, esse peregrinar adquire dimensões novas, porque evoca e atualiza não apenas a vida dos jovens, mas também a luta diária do povo pobre que, animado pela presença do Deus da Vida, caminha para a terra prometida e para a libertação. 5.4.3. Os encontros de jovens Cada dia mais os jovens buscam encontrar-se, reunir-se e partilhar seus sentimentos e atividades. Basta ver as gigantescas multidões que são atraídas para os shows, os festivais, as competições esportivas, os eventos turísticos ou religiosos. É muito importante acompanhar esses eventos para que sejam realmente educativos e promovam o amadurecimento humano e cristão dos jovens. Isso mostra que, além um associacionismo informal e espontâneo, praticado por muito jovens, que se expressa especialmente quando encontram em torno de proposta de lazer. A recreação e o lazer adquirem cada vez mais força como lugar de socialização e evangelização dos jovens. OS jovens preferem sair de seus ambiente, encontrar os amigos para bater um papo, ir a algum lugar, conhecer gente nova, curtir a vida e a amizade, fora dos ambientes habituais, com o máximo de descontração e o mínimo de organização. É nesse contexto que se pode inserir os encontros de jovens promovidos em todos os níveis como resposta a essa necessidade de expressão coletiva sentida pelos jovens. Os encontros são atraentes porque oferecem um ambiente festivo, alegre, agitado, com intenda vivência afetiva e comunitária, e permitem superar a insegurança, reafirmar a identidade, expressar as inquietudes e esperanças, descobrir o valor das metas e compromissos comuns e sentir-se parte de uma comunidade mais ampla que convida a ultrapassar os limites da realidade pessoal e grupal e projetar-se sucessivamente à dimensão paroquial, diocesana, nacional e latino-americana. Entre os encontros de jovens destacam-se os Dias Nacionais da Juventude, os Congressos Continentais de Jovens e as Jornadas Mundiais da Juventude que, em seus respectivos níveis, convocam os jovens em torno de temas de seu interesse, facilitam sua sintonia como jovens cristãos, servem de estímulo para um compromisso e uma inserção mais consciente e ativa na vida eclesial e na realidade social. São momentos fortes de evangelização, de comunhão eclesial e de renovação no seguimento de Jesus e no anúncio missionário de seu Reino no mundo juvenil. Esses eventos, que exigem uma preparação séria e um acompanhamento que assegura sua continuidade, têm também um forte conteúdo de mensagem e testemunho sobre o valor e o lugar da juventude e sua contribuição para a Igreja e a sociedade. 5.4.4. Os retiros Jesus descobria a presença de seu Pai nas coisas da natureza (Mt 6,26), na vida e nas atitudes do povo (Lc 18, 9-17; Lc 21,1-4) e nas pequenas conquistas da missão dos apóstolos (Lc 10,21). A partir dessas mesmas realidades, ele anunciava a Boa Nova, chamava à conversão e convidava ao seguimento e ao compromisso com o Reino. Muitas vezes, porém, para preparar decisões importantes (Lc 6,12; Mt 26,36ss) e para encontrar-se mais pessoalmente com seu Pai (Mt 14,23) e com seus apóstolos (Lc 9,10) visando aprofundar e reafirmar o sentido da missão, preferia retirar-se (Mc 1,35), afastar-se do povo (Mt 4,35), “subir ao monte” (Mt 14,23) e passar a noite em oração. Com muita frequência, “chamaca à parte” os discípulos (Mt 20,17), levava-os “para a outra margem do lago” (Mc 4,35) ou simplesmente “lhes ia ensinando” no caminho (Mc 9,31). Os seguidores de Jesus sempre viram nessas atitudes um convite a tomar certa distância da realidade de todos os dias para viver momentos de maior plenitude de encontro consigo mesmos e com Deus e para reafirmar o compromisso de viver segundo o Evangelho.
A mesma experiência se repetiu de diferentes formas ao longo da história e chegou até os dias de hoje, manifestando-se nas comunidades e no mundo dos jovens através dos “retiros”. Como momentos de encontro juvenil, os retiros oferecem muitos dos valores apontados antes, mas que trazem também elementos novos muito apreciados pelos jovens da cultura atual: o silêncio, o afastamento temporário da vida cotidiana, a interioridade, a paz e a beleza da natureza, o desejo de mudar e sem melhor, a tranquilidade, um tempo para pensar, revisar a vida, encontrar-se consigo mesmo, para partilhar com outros em profundidade, para rezar e estar com Deus. Os retiros não podem ser momentos de refúgio nem de fuga da realidade. É muito importante não transmitir a idéia de que para encontrar-se com Deus é necessário abandonar a vida diária, afastar-se do mundo e criar um ambiente especial, muitas vezes acolhedor, porém também muitas vezes artificial. Os retiros deverão estar em continuidade com as orientações teológicas, pedagógicas, metodológicas e de espiritualidade que animam o processo de educação na fé que os jovens vivem normalmente nos grupos. Por isso, partirão da vida e da experiência grupal e se preocuparão por voltar a ela, já que os retiros não são um fim em si mesmos, mas devem estar a serviço de um maior aprofundamento e vivência do seguimento de Jesus e de um compromisso mais radical com o mundo e com a história.
Credo da Civilização do Amor Cremos que nosso DEUS nos chamou a viver na América Latina para construir seu Reino. Cremos que todos os HABITANTES DESTA TERRA têm direito a viver com dignidade, com justiça, com paz e liberdade. Cremos que todos os CRISTOS CRUCIFICADOS da América se levantarão ressuscitados e gloriosos pela solidariedade entre os povos. Cremos que podemos VIVER EM COMUNHÃO sem violência, sem guerras e sem opressão. Cremos que os POBRES, os indígenas, as crianças e os tristes são preferencialmente amados pelo Pai, e, por isso, nos declaramos irmãos deles. Cremos que cada FAMÍLIA de nossa terra necessita viver na fidelidade e na ternura. Cremos que os JOVENS americanos não podem viver passivamente suas horas e seus dias, mas devem ser os primeiros cidadãos dessa nova civilização. Cremos que uma PÁTRIA GRANDE é possível entre nós, Povos do Caribe, do Atlântico e do Pacífico, de modo que nossas fronteiras não sejam muralhas que os dividem, mas linhas de encontro fraternal. Cremos que o ESPÍRITO DE DEUS anima a Santa Igreja, que, como um grande Povo de libertação, peregrina no continente. Cremos que MARIA, Mãe de Jesus, nos protege com carinho ao longo de nossa história. Ela nos impulsiona a partilhar o pão com os famintos, e a levantar do pó os humildes. Cremos ardentemente num céu novo e numa terra nova. E pedimos com insistência que a civilização do amor seja muito em breve realidade entre nós. Amém.
DECÁLOGO DA CIVILIZAÇÃO DO AMOR
1. Amo DEUS PAI e creio que ele conduz nossa história. 2. Amo o SENHOR JESUS CRISTO e, segundo seu estilo, quero viver entre meus irmãos. 3. Amo o ESPÍRITO SANTO e creio que ele anima o serviço da Igreja. 4. Amo o HOMEM da América Latina e busco promover seu direito a viver com diginidade. 5. Amo a VIDA e defendo-a contra todo tipo de violência. 6. Amo a VERDADE e quero proclamá-la em todas as minhas ações. 7. Amo a JUSTIÇA e quero instaurá-la em todos os ambientes. 8. Amo a LIBERDADE e luto contra toda forma de escravidão. 9. Amo a PAZ e busco a integração entre nossos povos. 10. Amo os POBRES e FRACOS e promovo, com eles, um mundo solidário.
E me comprometo a trabalhar, em minha vida pessoal, Em minha família e na sociedade, Pela construção da CIVILIZAÇÃO DO AMOR, Com a ajuda de Maria, Mãe e Senhora da América Latina.